Processo nº 5092806-13.2025.8.09.0051
ID: 299766607
Tribunal: TJGO
Órgão: Goiânia - 5ª Vara da Fazenda Pública Estadual
Classe: TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE
Nº Processo: 5092806-13.2025.8.09.0051
Data de Disponibilização:
16/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FABIANA MENDES COELHO
OAB/MT XXXXXX
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5a Vara da Fazenda Pública EstadualGoiânia - GoProcesso: 5092806-13.2025.8.09.0051Autor: Olivar Galdino FerreiraRéu: Estado De Goias Secretaria De Estado E Gov E Justica Ementa: DIREITO C…
5a Vara da Fazenda Pública EstadualGoiânia - GoProcesso: 5092806-13.2025.8.09.0051Autor: Olivar Galdino FerreiraRéu: Estado De Goias Secretaria De Estado E Gov E Justica Ementa: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO ONCOLÓGICO NÃO INCORPORADO AO SUS. PEDIDO PROCEDENTE. I. Caso em exame: Ação de obrigação de fazer com pedido de tutela de urgência proposta por pessoa idosa de 65 anos, portadora de carcinoma papilar diferenciado de tireoide com metástases ósseas e pulmonares, pleiteando o fornecimento gratuito do medicamento LAROTRECTINIBE (VITRAKVI) 100mg. O fato relevante. O requerente foi submetido a cirurgia parcial, quimioterapia convencional com inibidores multiquinase (lenvatinibe e pazopanibe) sem sucesso, sendo contraindicada a radioterapia. Teste genético evidenciou fusão gênica EML4-NTRK3, indicando o medicamento pleiteado. As decisões processuais. Deferida a tutela de urgência após análise técnica do NATJUS que confirmou o diagnóstico e a indicação do medicamento. O Estado contestou alegando ausência de prévio requerimento administrativo e falta de incorporação no SUS. II. Questão em disCussão: Há três questões em discussão: (i) saber se a ausência de prévio requerimento administrativo impede o ajuizamento da ação; (ii) saber se estão preenchidos os requisitos dos Temas 6 e 1234 do STF para fornecimento de medicamento não incorporado ao SUS; e (iii) saber se o direito fundamental à vida e à saúde justifica o fornecimento do medicamento oncológico específico. III. Razões de decidir: A ausência de prévio requerimento administrativo não constitui requisito absoluto, especialmente quando o medicamento sabidamente não está disponível na rede pública, configurando formalismo excessivo em detrimento do direito fundamental à vida. Os requisitos dos Temas 6 e 1234 do STF foram plenamente atendidos: comprovação da necessidade através de relatório médico especializado; registro definitivo na ANVISA; evidências científicas de alta qualidade confirmadas pelo NATJUS; inexistência de substituto terapêutico no SUS após falha dos tratamentos convencionais. A indicação específica para pacientes com fusão do gene NTRK, comprovada através de teste genético, diferencia o caso da análise genérica da CONITEC, superando os fundamentos da recomendação desfavorável baseada em estudos de fases iniciais. Os direitos fundamentais à vida e à saúde possuem aplicação imediata e configuram-se como mandados de otimização, exigindo sua máxima efetivação possível, especialmente em casos de tratamento oncológico específico sem alternativas terapêuticas. IV. dispositivo e tese: Pedido parcialmente procedente. Confirmação da tutela antecipada para fornecimento do medicamento LAROTRECTINIBE (VITRAKVI) 100mg, condicionado a prescrições médicas atualizadas e relatórios periódicos de acompanhamento. Tese de julgamento: "1. A ausência de prévio requerimento administrativo não impede o fornecimento judicial de medicamento oncológico quando sabidamente não disponível na rede pública. 2. O fornecimento de medicamento não incorporado ao SUS é devido quando preenchidos cumulativamente os requisitos dos Temas 6 e 1234 do STF, incluindo confirmação genética específica que supera fundamentos genéricos de não incorporação. 3. O direito fundamental à vida justifica o fornecimento de medicamento oncológico específico quando esgotadas as alternativas terapêuticas convencionais e comprovada a indicação técnica." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 1º, III, 5º, caput e §1º, e 196; CPC, arts. 355, I, 487, I, e 496, §3º, I. Jurisprudência relevante citada: STF, RE 566.471 (Tema 6), Rel. Min. Marco Aurélio, Plenário; STF, RE 1.366.243 (Tema 1234), Rel. Min. Gilmar Mendes, Plenário, j. 19.09.2024; STF, RE 1440574, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Primeira Turma, j. 18.09.2023. SENTENÇA Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA proposta por OLIVAR GALDINO FERREIRA em desfavor do ESTADO DE GOIÁS, partes qualificadas.Narra a inicial, a parte requerente pessoa idosa de 65 anos, afirma ser portador de neoplasia maligna da glândula tireoide (CID C73), especificamente carcinoma papilar diferenciado com metástases ósseas e pulmonares, diagnosticado em 2022.Segundo a narrativa inicial, o requerente foi submetido a cirurgia para retirada parcial do tumor, quimioterapia convencional sistêmica com inibidores multiquinase (lenvatinibe e pazopanibe), sendo contraindicada a radioterapia devido às características do tumor.Alega que, realizou teste genético que evidenciou a fusão gênica EML4-NTRK3, sendo prescrito pelo médico assistente o medicamento LAROTRECTINIBE (VITRAKVI) 100mg, na dosagem de 100mg, duas vezes ao dia, para reduzir ou estabilizar as metástases existentes.Sustenta que, o medicamento possui registro na ANVISA, mas não está incorporado no SUS, tendo custo mensal entre R$ 74.540,00 e R$ 90.000,00, valor incompatível com sua aposentadoria de um salário-mínimo (R$ 1.518,00).Pleiteia, em sede de tutela de urgência, o fornecimento gratuito do medicamento ou o depósito judicial de R$75.000,00 para aquisição do tratamento.Por fim, requer a procedência.Despacho intimando a parte requerente a comprovar a hipossuficiência (evento 06).Recebida a exordial (evento 10), foi deferida a gratuidade da justiça e, sensível à complexidade da demanda de saúde, este Juízo determinou a remessa dos autos ao Núcleo de Apoio Técnico do Poder Judiciário (NATJUS) para a emissão de parecer técnico.Parecer do NATJUS (evento 12) solicitou a complementação da prova, requerendo o anatomopatológico de biópsia de tireoide e o teste genético evidenciando a fusão gênica NTRK. Em resposta (evento 15), a parte requerente prontamente colacionou os documentos solicitados, reiterando o risco de morte.Despacho encaminhando os autos ao NATJUS (evento 16).O NATJUS, após a análise da documentação completa, emitiu a Nota Técnica n. 29497/2025 (evento 20) - a Nota Técnica n. 31246/2025, ambos os pareceres confirmam o diagnóstico, a indicação do medicamento e a suficiência dos exames para apoiar a indicação. Embora não classifiquem o caso como urgência ou emergência imediata, ressalvam que "a interrupção ou demora no tratamento pode ocasionar malefícios ao paciente e os tratamentos visam evitar a progressão e a piora do quadro clínico provocada pela doença".Decisão proferida (evento 22), deferiu a tutela de urgência para fornecer o medicamento Larotrectinibe e determinou a citação do Réu e solicitou a juntada do laudo do exame genético. A parte requerente no evento 26, requereu a exclusão do Distrito Federal do polo passivo, o que demonstra a intenção de focar a demanda exclusivamente no Estado de Goiás.Despacho encaminhando os autos para o NATJUS (evento 31).Certidão informando que houve o transcurso do prazo para o requerido Estado manifestar (evento 32).O requerido Estado de Goiás apresentou Contestação (evento 33), arguindo, preliminarmente, a ausência de prévio requerimento administrativo, com base nos Temas 06 e 1234 do STF, pugnando pela extinção do feito sem resolução de mérito. No mérito, sustentou a improcedência do pedido, alegando ausência de previsão do fármaco em protocolos e listas oficiais do SUS. Subsidiariamente, requereu condicionantes para o fornecimento, caso o pedido fosse deferido. Anexou também Parecer Técnico ATC (mov. 33, Contestação 2) que, paradoxalmente, confirmou o diagnóstico e a suficiência dos exames para tal confirmação.O requerido Estado de Goiás também interpôs Agravo de Instrumento (evento 34) contra a decisão que citou o Réu, tendo o Exmo. Desembargador Relator Algomiro Carvalho Neto indeferido o pedido de efeito suspensivo, asseverando que "o dano maior será ocasionado ao agravado e não ao ente público, diante da possibilidade de agravamento do problema de saúde que o acomete (perigo de dano reverso)".Despacho intimando a parte requerente para impugnar a contestação (evento 36).O NATJUS, após a análise da documentação completa, emitiu a Nota Técnica n. 31246/2025 (evento 40). Ambos os pareceres confirmam o diagnóstico, a indicação do medicamento e a suficiência dos exames para apoiar a indicação. Embora não classifiquem o caso como urgência ou emergência imediata, ressalvam que "a interrupção ou demora no tratamento pode ocasionar malefícios ao paciente e os tratamentos visam evitar a progressão e a piora do quadro clínico provocada pela doença".Finalmente, a parte requerente apresentou Impugnação à Contestação (evento 41), rebatendo a preliminar e reiterando os pedidos da exordial, pugnando pelo julgamento antecipado do mérito.Vieram-me os autos conclusos.É o relatório. Decido.O feito comporta o julgamento antecipado, pois a matéria constante dos autos é de direito e de fato, não havendo a necessidade de produção de provas em audiência, nos termos do artigo 355, inciso I, do CPC/15.De logo, tenho como praticável o julgamento antecipado do mérito, eis que basta a documentação coligida nos autos para a análise segura das questões debatidas, de direito e de fato. Preenchidos os pressupostos processuais, adentro ao merito causae, ante a inexistência de outras provas a serem produzidas e de outras questões a serem sanadas.PRELIMINARES:1- AUSÊNCIA DE PRÉVIO REQUERIMENTO PRÉVIO ADMINISTRATIVO. REQUISITO DE PROCEDIBILIDADE. TEMA 6 E 1234 DO STF. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO:Interpretação dos Temas 6 e 1234 do STF: Os Temas 6 e 1234 do STF não exigem, como requisito absoluto, o prévio esgotamento da via administrativa. O que exigem é a demonstração da ilegalidade do ato de não incorporação pela CONITEC, o que pode ser feito através da comprovação dos demais requisitos (evidências científicas, registro na ANVISA, etc.).No caso concreto, o medicamento sabidamente não está disponível na rede pública (evento 01), pedido administrativo uma formalidade inútil que apenas retardaria o acesso ao tratamento necessário.A exigência de pedido administrativo prévio, nesta hipótese, configuraria formalismo excessivo em detrimento do direito fundamental à vida e à saúde.O Superior Tribunal de Justiça, pacificou o entendimento de que "o esgotamento da via administrativa não é condição de admissibilidade da ação" que objetiva o fornecimento de medicamentos pelo Poder Público.Ementa: AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TEMA 793 DA REPERCUSSÃO GERAL. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO/TRATAMENTO ONCOLÓGICO. ÔNUS SUPORTADO POR ESTADO-MEMBRO. RESSARCIMENTO. AÇÃO DE REGRESSO EM FACE DA UNIÃO. POSSIBILIDADE, INDEPENDENTEMENTE DO EXAURIMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA. 1. Discute-se no presente Recurso Extraordinário se o ente federativo condenado a custear medicamento para pessoa hipossuficiente pode ajuizar ação de regresso em face da União, independentemente do exaurimento da via administrativa. 2. As instâncias de origem reputaram inviável a pretensão, porque (a) o Estado não esgotou as vias administrativas e (b) a União não participou da demanda originária, na qual estabelecida a condenação ao fornecimento do medicamento . 3. O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, no julgamento do RE 855.178-RG (Rel. Min. LUIZ FUX, Tema 793), reafirmou a jurisprudência desta CORTE no sentido da responsabilidade solidária dos entes federados quanto ao dever de prestar assistência à saúde. 4. Embora se reconheça a existência de solidariedade entre os entes federados nas questões envolvendo a saúde pública, o STF decidiu, na tese fixada nos referidos embargos, que a autoridade judicial tem o dever de direcionar o cumprimento dessas demandas, de acordo com as regras de repartição de competências estabelecidas pela lei orgânica do SUS, bem como determinar ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro. 5. No caso dos autos, o Estado de Alagoas foi condenado a fornecer medicamento/tratamento oncológico que não faz parte do elenco do RENAME, em processo julgado na Justiça Estadual, do qual não participou a União. 6. O fato de a União não ter participado da referida lide não afasta sua responsabilização em regresso. Isso porque a solidariedade entre as unidades federadas no fornecimento de medicamento/tratamento não implica transferir para determinado ente o encargo financeiro que, de fato, é de outra pessoa política . 7. Por outro lado, o esgotamento da via administrativa não é condição para o ajuizamento da ação de regresso. 8. Agravo Interno a que se nega provimento. (STF - RE: 1440574 AL, Relator.: Min. ALEXANDRE DE MORAES, Data de Julgamento: 18/09/2023, Primeira Turma, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 06-10-2023 PUBLIC 09-10-2023)E ainda outros Tribunais:EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO NÃO INCORPORADO PELO SUS. EXIGÊNCIA DE CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS DO TEMA 1234 DO STF. REVOGAÇÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA. RECURSO PROVIDO. I . CASO EM EXAME Agravo de instrumento interposto pelo Estado de Minas Gerais contra decisão que, em ação civil pública, concedeu tutela provisória de urgência para determinar o fornecimento solidário, pelo tempo necessário, do medicamento "Pentasa 500 mg" à parte autora, mediante retenção periódica de receituário médico. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) verificar se estão presentes os requisitos cumulativos estabelecidos pelo Tema 1234 do STF para a concessão de medicamentos não incorporados pelo SUS; e (ii) definir se, diante da ausência de comprovação do cumprimento desses requisitos, é possível manter a decisão que determinou o fornecimento do medicamento. III . RAZÕES DE DECIDIR A concessão judicial de medicamentos não incorporados no SUS é excepcional e condicionada ao cumprimento cumulativo dos seguintes requisitos, conforme o Tema 1234 do STF: (a) negativa de fornecimento na via administrativa; (b) ilegalidade do ato de não incorporação pela CONITEC, ausência de pedido de incorporação ou mora na sua apreciação; (c) impossibilidade de substituição por medicamento incorporado; (d) comprovação da eficácia e segurança do fármaco com base em evidências científicas de alto nível; (e) imprescindibilidade clínica do tratamento, demonstrada mediante laudo médico fundamentado; e (f) incapacidade financeira do paciente. A parte autora não comprova o cumprimento cumulativo dos requisitos estabelecidos no Tema 1234, apresentando apenas relatório médico sem evidências científicas de alto nível que demonstrem a eficácia e a imprescindibilidade do medicamento pleiteado. Após o julgamento do Tema 1234, o juiz não pode determinar o fornecimento de medicamentos não padronizados sem a comprovação de que o ato de não incorporação do medicamento foi ilegal ou que houve mora na sua apreciação pela CONITEC. A atuação judicial limita-se ao controle da legalidade, sem possibilidade de reanálise do mérito administrativo . Diante da ausência de elementos que demonstrem a probabilidade do direito, revoga-se a decisão de primeira instância que concedeu a tutela de urgência. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso provido. Tese de julgamento: A concessão judicial de medicamento não incorporado pelo SUS é excepcional e depende do cumprimento cumulativo dos requisitos definidos pelo Tema 1234 do STF. A mera apresentação de relatório médico, desacompanhado de evidências científicas de alto nível e de comprovação da ilegalidade do ato de não incorporação pela CONITEC, não é suficiente para autorizar o fornecimento de medicamento não padronizado. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 196; Lei nº 8.080/1990, arts . 19-Q e 19-R; Decreto nº 7.646/2011. Jurisprudência relevante citada: STF, RE 1.366 .243 (Tema 1234), rel. Min. Gilmar Mendes, Plenário, j. 19 .09.2024; STF, RE 855.178 RG/SE (Tema 793), rel. Min . Luiz Fux, Plenário, j. 16.06.2015; STJ, REsp nº 1 .657.156/RJ (Tema 106), rel. Min. Benedito Gonçalves, j . 04.05.2018. (TJ-MG - Agravo de Instrumento: 16823198220248130000, Relator.: Des .(a) Armando Freire, Data de Julgamento: 03/02/2025, Câmaras Cíveis / 1ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 10/02/2025).Os Temas 6 e 1234 do STF não exigem, como requisito absoluto, o prévio esgotamento da via administrativa. O que exigem é a demonstração da ilegalidade do ato de não incorporação pela CONITEC, o que pode ser feito através da comprovação dos demais requisitos (evidências científicas, registro na ANVISA, etc.).No caso concreto, o medicamento sabidamente não está disponível na rede pública (conforme documento juntado pelo próprio autor – evento 01), tornando o pedido administrativo uma formalidade inútil que apenas retardaria o acesso ao tratamento necessário.A exigência de pedido administrativo prévio, nesta hipótese, configuraria formalismo excessivo em detrimento do direito fundamental à vida e à saúde.Assim, REJEITO a preliminar de ausência de prévio requerimento administrativo.2- DA IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA:Na impugnação à contestação, o autor retificou o valor da causa para R$900.000,00 (novecentos mil reais), correspondente ao custo anual do tratamento, fundamentando-se no art. 292, §2º do CPC:"Art. 292. O valor da causa constará da petição inicial ou da reconvenção e será: § 2º O valor das prestações vincendas será igual a uma prestação anual, se a obrigação for por tempo indeterminado ou por tempo superior a 1 (um) ano, e, se por tempo inferior, será igual à soma das prestações."O art. 293 do CPC permite a correção do valor da causa até a sentença:"Art. 293. O réu poderá impugnar, em preliminar da contestação, o valor atribuído à causa pelo autor, sob pena de preclusão, e o juiz decidirá a respeito, impondo, se for o caso, a complementação das custas."Considerando que se trata de tratamento contínuo por tempo indeterminado, o valor anual de R$ 900.000,00 mostra-se adequado e proporcional ao benefício econômico perseguido.ACOLHO a retificação do valor da causa para R$900.000,00 (novecentos mil reais).3- DA COMPETÊNCIA:Com a retificação do valor da causa para R$900.000,00, que ultrapassa os 60 salários-mínimos (R$90.600,00 em 2025), mantém-se a competência desta Vara da Fazenda Pública, afastando-se a incidência da Lei 12.153/2009.REJEITO a preliminar de incompetência.MÉRITO:APLICAÇÃO DOS TEMAS 6 E 1234 DO STF:A controvérsia central reside na aplicação dos Temas 6 e 1234 do STF, que estabeleceram critérios rigorosos para o fornecimento judicial de medicamentos não incorporados ao SUS.TEMA 6 (RE 566.471) - Requisitos para medicamentos não incorporado: (a) Comprovação da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento; (b) Ilegalidade do ato de não incorporação do medicamento pela CONITEC, ausência de pedido de incorporação ou mora na apreciação; (c) Existência de evidências científicas que demonstrem que o medicamento é eficaz para o tratamento da moléstia que acomete o paciente, preferencialmente ensaios clínicos randomizados, revisões sistemáticas e meta-análises; (d) Inexistência de substituto terapêutico incorporado pelo SUS; (e) Comprovação de que o registro foi feito perante a ANVISA. TEMA 1234 (RE 1.366.243) - Medicamentos oncológicos: Estabeleceu procedimentos específicos para medicamentos oncológicos, incluindo a necessidade de análise da ilegalidade do ato administrativo de não incorporação pela CONITEC.Análise Detalhada dos Requisitos:REQUISITO (a) - COMPROVAÇÃO DA NECESSIDADE: PLENAMENTE ATENDIDO.A necessidade do medicamento está fartamente demonstrada através de:1- Relatório médico especializado elaborado pela Dra. Fabiane Kellem Oliveira dos Santos Cesário (CRM: 12741/DF), oncologista, detalhando o quadro clínico; 2- Diagnóstico preciso: Carcinoma papilífero de tireoide com metástases ósseas e pulmonares; 3- Falha terapêutica: Comprovada ineficácia dos tratamentos convencionais (cirurgia, quimioterapia com lenvatinibe e pazopanibe); 4- Contraindicação: Radioterapia contraindicada; 5- Teste genético específico: Confirmação da fusão EML4-NTRK3, requisito específico para uso do larotrectinibe. No caso, em análise sumária do pleito aviado pela parte requerente juntou os devidos documentos, porquanto o relatório médico emitido pela médica assistente, demonstra a gravidade e urgência da medicação reclamada, sob pena de, em caso de não controle da doença, evolução a óbito.Nesse sentido:EMENTA: APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO (OMALIZUMABE). VALOR DA CAUSA. FIXAÇÃO DOS HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS EQUITATIVIDADE IMPOSSIBILIDADE. SENTENÇA TERATOLÓGICA. INOCORRÊNCIA. PARECER DO NATJUS NÃO VINCULATIVO. INDICAÇÃO DE TERAPIAS ALTERNATIVAS PELO PLANO DE SAÚDE. IMPOSSIBILIDADE DE INGERÊNCIA NA ATIVIDADE MÉDICA. ALEGAÇÃO DE DESEQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO. NÃO OCORRÊNCIA. […]. 5. O médico assistente é o responsável pela orientação terapêutica adequada à paciente, decidindo se aquele medicamento é indicado ou não para a doença. Desta forma, quando o IPASGO diz que a indicação médica não serve para aquela patologia, ele está substituindo a decisão do profissional, atribuição que não lhe é cabível. APELAÇÕES CÍVEIS CONHECIDAS. 1º RECURSO PROVIDO E O 2º APELO DESPROVIDO. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 5247425-37.2021.8.09.0051, Rel. Des(a). Sebastião José de Assis Neto, 2ª Câmara Cível, julgado em 20/09/2023, DJe de 20/09/2023). REQUISITO (b) - REGISTRO NA ANVISA: PLENAMENTE ATENDIDO: O LAROTRECTINIBE (VITRAKVI®) possui registro definitivo na ANVISA:Número do processo: 25351566346/2018-54; Data da regularização: 01/07/2019; Vencimento: 07/2024;Empresa detentora: BAYER S.A (CNPJ: 18.459.628/0001-15);Princípio ativo: Sulfato de Larotrectinibe;Categoria regulatória: Novo; REQUISITO (c) - EVIDÊNCIAS CIENTÍFICAS DE ALTO NÍVEL: ATENDIDO: Este é o ponto mais controvertido, mas que resta satisfeito pelas seguintes razões:c.1) Análise do NAT-JUS: O NAT-JUS, após análise técnica especializada, concluiu na Nota Técnica nº 31246/2025:"Há evidências científicas de alta qualidade que respaldam a indicação do larotrectinibe para o tratamento de pacientes adultos e pediátricos com tumores sólidos localmente avançados ou metastáticos que apresentam fusão do gene NTRK."c.2) Especificidade da Indicação: O larotrectinibe não é um medicamento de aplicação genérica, mas específico para pacientes com fusão do gene NTRK, comprovada através do teste genético. Esta especificidade torna as evidências científicas mais robustas para o caso concreto.c.3) Registro ANVISA "on-label": A indicação é exatamente aquela aprovada no registro ANVISA: "tratamento de pacientes adultos e pediátricos com tumores sólidos localmente avançados ou metastáticos que apresentam fusão do gene NTRK".c.4) Análise da CONITEC: Embora a CONITEC tenha dado parecer desfavorável, o fundamento foi a fase precoce dos estudos à época da análise (2021), não a ausência de evidências. A situação específica da parte requerente (confirmação genética) diferencia seu caso da análise genérica.REQUISITO (d) - INEXISTÊNCIA DE SUBSTITUTO NO SUS: PLENAMENTE ATENDIDO:d.1) Protocolo do SUS para Carcinoma de Tireoide: A Portaria nº 7 de 03/01/2014 (Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas do Carcinoma Diferenciado da Tireoide) prevê apenas: Cirurgia; Radioiodoterapia; Radioterapia externa; Quimioterapia (apenas doxorrubicina para tratamento paliativo).d.2) Situação Específica do Autor: Cirurgia: Já realizada (retirada parcial); Radioiodoterapia: Sem indicação/contraindicada; Radioterapia: Contraindicada; Quimioterapia convencional: Falhou (lenvatinibe e pazopanibe testados sem sucesso).d.3) Conclusão do NAT-JUS: "Não há possibilidade de substituir o fármaco requerido por outro medicamento constante das listas do SUS e dos protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas."REQUISITO (e) - ILEGALIDADE DO ATO DE NÃO INCORPORAÇÃO: DEMONSTRADO: Este requisito é o mais complexo, mas resta atendido pelas seguintes considerações:e.1) Análise Específica vs. Genérica: A CONITEC fez análise genérica do medicamento, mas o caso do autor apresenta características específicas que justificam tratamento diferenciado: Comprovação genética da fusão NTRK; Falha dos tratamentos convencionais; Indicação "on-label" precisa. e.2) Fundamento da Decisão da CONITEC: A recomendação desfavorável baseou-se em: "os estudos sobre benefícios e segurança são de fases 1 e 2, ainda em andamento, nos quais se utiliza um desfecho clínico substituto. Além disso, para determinados tipos de tumor, o número de pacientes é bastante reduzido."e.3) Superação dos Fundamentos: As evidências científicas evoluíram desde 2021; O caso específico tem confirmação genética (não disponível à época da análise da CONITEC); A indicação é precisa e específica. e.4) Ilegalidade por Desproporcionalidade: A negativa torna-se desproporcional quando confrontada com: Direito fundamental à vida; Situação específica com confirmação genética; Ausência de alternativas terapêuticas; Evidências científicas de qualidade. Direitos Fundamentais Envolvidos:O caso envolve direitos fundamentais de primeira grandeza:Art. 5º, caput, CF/88: "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida[…]"Art. 196, CF/88: "A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação."Aplicação Imediata dos Direitos Fundamentais:Art. 5º, §1º, CF/88: "As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata."Como leciona Robert Alexy, os direitos fundamentais possuem natureza principiológica e configuram-se como mandados de otimização, exigindo sua máxima efetivação possível.Pertinente colacionar um precedente do E. Tribunal de Justiça do TJSP, em caso semelhante:APELAÇÃO CÍVEL – Mandado de Segurança – Fornecimento de medicamento a portadora de Diabetes Mellitus Tipo 1 – Direito à vida e à saúde, cabendo ao Estado propiciar o fornecimento de medicamento prescrito – Artigos 5º e 196 da Constituição Federal – É necessário que esse direito venha a ser respeitado e implementado pelo Estado, destinatário do comando Constitucional – Temas 1234 STF e 106 STJ devidamente observados – Sentença de reformada. Recurso provido. (TJSP; Apelação / Remessa Necessária 1058359-24.2024.8.26.0053; Relator (a): Magalhães Coelho; Órgão Julgador: 1ª Câmara de Direito Público; Foro Central - Fazenda Pública/Acidentes – 16ª Vara da Fazenda Pública; Data do Julgamento: 24/03/2025; Data de Registro: 24/03/2025). Princípio da Proporcionalidade:A aplicação do princípio da proporcionalidade exige análise tríplice:Adequação: O fornecimento do medicamento é meio adequado para preservar a vida e saúde do autor.Necessidade: Inexistem alternativas menos restritivas (todos os tratamentos convencionais falharam).Proporcionalidade em sentido estrito: O benefício (preservação da vida) supera amplamente o ônus (custo financeiro) para o Estado.STJ - AgInt no AREsp 1702630 PR (2020/0114837-0): "A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que é dever do Estado fornecer gratuitamente às pessoas carentes a medicação necessária para o efetivo tratamento médico, conforme premissa contida no art. 196 da Constituição Federal. [...] é solidária a responsabilidade dos referidos entes no cumprimento dos serviços públicos de saúde prestados à população. [...] O direito constitucional à saúde faculta ao cidadão obter de qualquer dos Estados da federação (ou do Distrito Federal) os medicamentos de que necessite[…]"Nesse sentido o Tribunal de Justiça de Goiás:O próprio TJ-GO tem jurisprudência consolidada no sentido do fornecimento de medicamentos em casos similares, desde que preenchidos os requisitos legais.Súmula Vinculante 61: "A concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de Saúde, deve observar as teses firmadas no julgamento do Tema 6 da Repercussão Geral (RE 566.471)."Como demonstrado, todos os requisitos do Tema 6 foram atendidos no caso concreto.Custo Benefício:Custo do tratamento: R$600.806,28 anuais (conforme NAT-JUS); Benefício: Preservação da vida humana (valor inestimável).O fornecimento para um único paciente, embora oneroso, não compromete significativamente o orçamento estadual da saúde, especialmente considerando a obrigação constitucional do Estado.Da análise das alegações da defesa:Quanto à Ausência de Evidências Científicas:REFUTADA pela análise técnica do NAT-JUS que confirmou a existência de evidências científicas de alta qualidade para o caso específico com fusão do gene NTRK.Quanto à Recomendação Desfavorável da CONITEC:Embora reconheça a recomendação desfavorável, o caso específico do autor supera os fundamentos genéricos da decisão da CONITEC, especialmente pela confirmação genética que não estava disponível à época da análise.Quanto aos Custos:Os custos, embora elevados, não podem sobrepor-se ao direito fundamental à vida, especialmente quando todos os demais requisitos legais estão preenchidos.É o que basta.Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na inicial, com resolução de mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para CONFIRMAR a tutela antecipada concedida (evento 22) e CONDENAR o réu ESTADO DE GOIÁS a fornecer à parte requerente OLIVAR GALDINO FERREIRA, CPF: 218.153.301-63 o medicamento “LAROTRECTINIBE (VITRAKVI®) 100mg”, nas seguintes condições: a) Posologia: 02 (dois) comprimidos por dia, conforme prescrição médica;b) Prazo: Pelo tempo que se fizer necessário ao tratamento, conforme orientação médica especializada;c) Forma de cumprimento: Preferencialmente através da rede própria do SUS ou, subsidiariamente, mediante ressarcimento ao preço PMVG (Preço Máximo de Venda ao Governo).2- O fornecimento fica condicionado ao cumprimento das seguintes exigências, visando a adequada utilização dos recursos públicos:a) Prescrição médica atualizada: Renovação da prescrição a cada 06 (seis) meses por médico especialista;b) Relatórios médicos periódicos: Apresentação de relatórios médicos a cada 03 (três) meses, elaborados por oncologista, atestando: Eficácia do tratamento; Necessidade de continuidade; Ausência de efeitos colaterais graves; Definição de metas terapêuticas.c) Exames de acompanhamento: Realização de exames de controle conforme protocolo médico (tomografias, marcadores tumorais, etc.);d) Prestação de contas: Comprovação trimestral da utilização integral dos medicamentos fornecidos, mediante apresentação das embalagens vazias ou declaração médica;e) Termo de responsabilidade: Assinatura de termo de responsabilidade pelo autor ou seu representante legal, comprometendo-se com o uso adequado da medicação.FIXO o prazo de 30 (trinta) dias, contados do trânsito em julgado desta sentença, para que o Estado de Goiás inicie o fornecimento do medicamento.Em caso de descumprimento da obrigação principal, MANTENHO a multa diária já fixada de R$1.000,00 (um mil reais), limitada ao teto de R$100.000,00 (cem mil reais).3- Medidas Complementares:a) Intimação dos gestores: Determino a intimação pessoal do Secretário de Estado da Saúde de Goiás para ciência desta decisão e adoção das providências administrativas necessárias;b) Comunicação aos órgãos competentes: Oficie-se à CONITEC e ao Ministério da Saúde para conhecimento do caso e eventual reavaliação da incorporação do medicamento, considerando as especificidades dos pacientes com fusão do gene NTRK;c) Registro no sistema: Determino o registro desta decisão no sistema informatizado do Tribunal de Justiça para fins estatísticos e acompanhamento de casos similares.Reexame necessário: Não se aplica o reexame necessário, nos termos do art. 496, §3º, I, do CPC, considerando que não há condenação em quantia certa.Esta sentença produz efeitos imediatos, independentemente do trânsito em julgado, por tratar-se de obrigação relacionada ao direito fundamental à vida e à saúde.Condeno a parte requerida ao pagamento dos honorários advocatícios, que fixo em R$3.000,00 (três mil reais), nos termos do artigo 85, §8º do Código de Processo Civil.”Caso seja interposto Recurso de Apelação, considerando que não há mais juízo de admissibilidade neste grau de jurisdição, de acordo com o art. 1.010, §3º, do CPC, escoado o prazo sem manifestação do recorrido, após certificação pela Escrivania, ou juntadas as contrarrazões, remetam-se os autos ao egrégio Tribunal de Justiça, com as homenagens deste juízo.Após o trânsito em julgado sem qualquer manifestação das partes, arquivem-se com as baixas de estilo.Publique-se. Registre-se. Intimem-se.Cumpra-se. GOIÂNIA/GO, 13 de junho de 2025.(Assinado Eletronicamente)EVERTON PEREIRA SANTOSJuiz de Direitoa1
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