Processo nº 1008050-18.2025.8.11.0041
ID: 292338608
Tribunal: TJMT
Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 1008050-18.2025.8.11.0041
Data de Disponibilização:
09/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
HEBER AZIZ SABER
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008050-18.2025.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Desconto em folha de pagamento, Indenização por …
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008050-18.2025.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Desconto em folha de pagamento, Indenização por Dano Moral, Bancários, Cartão de Crédito] Relator: Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES] Parte(s): [WELINGTON PEREIRA DE SOUZA - CPF: 009.696.391-39 (APELANTE), HEBER AZIZ SABER - CPF: 062.290.048-01 (ADVOGADO), MARIANNA BARROS SABER - CPF: 046.353.241-41 (ADVOGADO), BANCO BMG SA - CNPJ: 61.186.680/0001-74 (APELADO), ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO - CPF: 038.499.054-11 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A APELANTE(S): WELINGTON PEREIRA DE SOUZA APELADO(S): BANCO BMG S.A. EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO C/C DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA, REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS – CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO – CONTRATAÇÃO REGULAR – DOCUMENTAÇÃO APRESENTADA – AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE OU MÁ-FÉ – DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Recurso de apelação interposto por consumidor contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados em ação revisional de contrato cumulada com declaração de inexistência de relação jurídica, repetição de indébito e indenização por danos morais, fundada na alegação de contratação irregular de cartão de crédito consignado pelo Banco BMG S.A.. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Delimita-se a controvérsia sobre a existência válida do contrato de cartão de crédito consignado, bem como a ocorrência de vício de consentimento, abusividade de encargos, aplicação da IR 28/2008 PRES/INSS e eventual direito à repetição do indébito e à indenização por danos morais. III. RAZÕES DE DECIDIR A existência de contrato assinado e a realização de saques e compras com o cartão consignado demonstram a relação jurídica válida entre as partes, afastando a tese de ausência de contratação. A alegação de vício de consentimento é afastada diante da plena capacidade da parte autora, de seu uso reiterado do produto contratado e da ausência de prova de induzimento a erro. A teoria da quebra da base objetiva do negócio jurídico não se aplica, pois inexiste fato superveniente que tenha desequilibrado o vínculo contratual. Não foi comprovada abusividade nos encargos cobrados, sendo incabível a substituição da taxa de juros por média de mercado de outra modalidade contratual. A Instrução Normativa nº 28/2008 do INSS aplica-se exclusivamente a contratos de empréstimo, não se estendendo à modalidade de cartão de crédito consignado. Ausente qualquer ato ilícito ou cobrança indevida, não há fundamento para repetição do indébito. Não configurada ofensa à honra ou dano concreto, a indenização por danos morais não é cabível. IV. DISPOSITIVO E TESE 11. Recurso desprovido. Tese de julgamento: “É válida a contratação de cartão de crédito consignado quando comprovada a adesão expressa e utilização mesmo que na modalidade saque e/ou compras no comércio local, sendo incabível a alegação de vício de consentimento diante da ausência de prova de induzimento a erro ou abusividade contratual.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, LXXIV; CPC, arts. 98, 99, 487, I, e 85, §11; CDC, art. 6º, V; IN nº 28/2008 PRES/INSS, art. 13, II. Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 297 e Súmula 381; TJMT, Apelações Cíveis nº 1001598-74.2023.8.11.0004, nº 1024408-80.2022.8.11.0003, nº 1000578-50.2022.8.11.0047. R E L A T Ó R I O RELATÓRIO EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO DE ARRUDA ALMEIDA. Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de APELAÇÃO CÍVEL, interposto por WELINGTON PEREIRA DE SOUZA, contra sentença (ID. 286806875 – Autos de Origem nº 1008050-18.2025.8.11.0041), proferida pelo Juízo da 2ª Vara Especializada em Direito Bancário da Comarca de Cuiabá-MT, nos autos da Ação de Declaração de Inexistência de Débito c/c Nulidade Contratual, Restituição e Danos Morais, que julgou improcedente os pedidos da inicial, sob os seguintes fundamentos: “O limite de desconto (RMC), resta demonstrado o cumprimento por parte do requerido sua observância, não havendo prova em contrário pelo autor. Diante do exposto e considerando o que mais consta nos autos, Julgo por Resolução de Mérito, a presenteAÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL E RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, e NÃO ACOLHO o pedido inicial, com fulcro no que dispõe os artigos 487-I do Novo Código de Processo Civil. Condeno a parte autora nas custas, despesas processuais, como nos honorários advocatícios que arbitro em dez por cento da causa, atualizados a partir do ajuizamento da ação, pelos índices da E. CGJ/MT”. Em suas razões recursais (ID 286806877), a apelante invoca os seguintes questionamentos fático-jurídicos: Pedido de justiça gratuita; Conversão da operação Cartão de Crédito para Empréstimo consignado; 3. Suposta abusividade dos encargos e onerosidade excessiva 4. Pleiteia a condenação do banco apelado em repetição do indébito; 5. Dos danos morais; 6. Da Instrução Normativa 28/2008 PRES/INSS. A parte recorrida apresenta contrarrazões (ID. 286806881) nas quais rebate as alegações do recorrente, sem suscitar preliminares. Dispensado o Parecer Ministerial em razão da matéria e por inexistir parte incapaz. Recurso tempestivo, conforme certidão de ID. 286806880, custas sobrestadas até decisão do Relator. (ID. 287432875). É o relatório. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator V O T O R E L A T O R APELANTE(S): WELINGTON PEREIRA DE SOUZA APELADO(S): BANCO BMG S.A. VOTO Egrégia Câmara: De proêmio, consigno que o presente comporta juízo de admissibilidade positivo, em relação aos requisitos extrínsecos e intrínsecos da espécie recursal. Conforme relatado, trata-se de recurso de APELAÇÃO CÍVEL, interposto por WELINGTON PEREIRA DE SOUZA, contra sentença (ID. 286806875 – Autos de Origem nº 1008050-18.2025.8.11.0041), proferida pelo Juízo da 2ª Vara Especializada em Direito Bancário da Comarca de Cuiabá-MT, nos autos da Ação de Declaração de Inexistência de Débito c/c Nulidade Contratual, Restituição e Danos Morais, que julgou improcedente os pedidos da inicial. Em síntese, o Juízo a quo entendeu que a parte autora não comprovou a inexistência do contrato impugnado, tampouco a abusividade dos encargos, sendo os descontos compatíveis com os valores contratados. Além disso, considerou que não houve ofensa à dignidade da pessoa capaz de configurar dano moral. O Apelante, em suas razões de recurso, afirma que houve uma indução a erro no momento da contratação, posto que estava pensando contratar um empréstimo consignado e não um cartão de crédito consignado. Voto preliminar Da justiça gratuita A parte apelante, WELINGTON PEREIRA DE SOUZA, pleiteou o benefício da justiça gratuita, nos termos do artigo 98 do Código de Processo Civil, alegando hipossuficiência econômica. Para tanto, apresentou declaração formal de insuficiência de recursos (Id 286806426), bem como ficha financeira e planilha de descontos mensais (Ids 286806427 e 286806428), que demonstram comprometimento significativo de sua renda líquida em razão de descontos efetuados ao longo de 12 anos, no montante superior a R$ 30.000,00. Nos termos do art. 99, §3º do CPC, a alegação de insuficiência financeira goza de presunção relativa de veracidade, não tendo sido, até o momento, impugnada de forma eficaz pela parte contrária. Ademais, é de conhecimento jurisprudencial que o vínculo com o serviço público, por si só, não descaracteriza automaticamente a hipossuficiência, sobretudo quando comprovado que os rendimentos estão comprometidos por dívidas ou encargos financeiros regulares e vultosos. A Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso LXXIV, garante o direito à assistência jurídica integral e gratuita àqueles que comprovarem insuficiência de recursos, o que se aplica, de forma concreta, ao presente caso. Dessa forma, presentes os requisitos legais e ausente má-fé, DEFIRO o benefício da justiça gratuita à parte apelante, com fundamento no art. 98 e seguintes do CPC, para que possa litigar sem o pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, enquanto persistir a condição declarada. Passo ao exame das teses sustentadas pelo recorrente. Voto de mérito 2. Alegação de Ausência de Contratação Válida – Cartão de Crédito Consignado A parte recorrente alega que jamais contratou cartão de crédito consignado, tratando-se de empréstimo que foi indevidamente caracterizado como tal pelo banco recorrido. Todavia, compulsando os autos, verifica-se que foi juntado o instrumento contratual assinado (ID. 286806871), no qual consta expressamente a modalidade de “Termo de Adesão - Cartão de Crédito BMG CARD”, com autorização para consignação em folha de pagamento. Dessa forma, presente o instrumento contratual com cláusulas claras e assinatura do autor, além da demonstração de saque complementar nas faturas e do uso do cartão de crédito na sua forma genuína, ou seja, saques e compras em estabelecimentos comerciais (id 286806872 – págs. 45, 49 e 51), resta evidenciada a existência da relação jurídica. Ausente prova de vício de consentimento ou má-fé da instituição financeira, não se pode declarar a inexistência da contratação. Ademais, extrai-se dos autos que a parte é plenamente capaz e possui experiência em operações de crédito, o que lhe permite discernir entre as modalidades contratadas. Somam-se a isso as fichas financeiras anexadas aos autos (ID 286806427 – págs. 01 a 74), que evidencia um intenso relacionamento com diversas modalidades de crédito oferecidas por distintas instituições financeiras, afastando qualquer alegação de indução a erro. Assim, a parte apelante celebrou contrato de cartão de crédito, e não de empréstimo consignado. Inclusive, conforme ressaltado pelo próprio consumidor, as características e benefícios do cartão de crédito e do empréstimo consignado são distintos, de modo que a alegação de engano não se sustenta, especialmente porque tal equívoco poderia ser mais plausível caso as modalidades fossem similares. Outrossim, a modalidade contratual em questão prevê o desconto de uma reserva de margem consignável previamente estabelecida, sendo responsabilidade do consumidor quitar eventuais valores que ultrapassem essa reserva. Não há, nos autos, qualquer indício de que o consumidor tenha adimplido os valores excedentes. Imperioso destacar, que por mais de dez anos, foram descontados valores referentes ao cartão de crédito com reserva de margem consignável em seus proventos, sendo ainda identificado nas faturas valores sobre a rubrica de saque complementar (ID 286806872 – fls. 45 (04/09/2020 – 1.650,00 e 21/09/2020 – 445,24), 62 (04/02/2022 1.601,00). Tal circunstância, por si só, descaracteriza a contratação de um empréstimo consignado, ainda que, neste momento, a parte alegue ter se equivocado na contratação. Mesmo diante desse cenário, somente após mais dez anos a parte busca o Poder Judiciário para pleitear a declaração de inexistência do contrato, a restituição de valores e a condenação do apelado ao pagamento de indenização por danos morais, sob a alegação de ter sido enganada. Com efeito, é cediço que o ordenamento jurídico brasileiro veda o comportamento contraditório, ou seja, a adoção de condutas que se contrapõem aos atos previamente praticados e acordados. Esse princípio, conhecido no brocardo latino como Venire Contra Factum Proprium, impede comportamentos contraditórios e inesperados que possam surpreender a outra parte. Sua aplicação decorre dos princípios da boa-fé objetiva e da lealdade contratual, os quais são exigíveis de todos os contratantes. Assim, pautando-se na boa-fé contratual, não é possível alegar, neste momento, a existência de vício de consentimento na contratação, quando os atos praticados ao longo da vigência do contrato demonstram incoerência com essa alegação. Portanto, uma vez evidenciado que a parte apelante se beneficiou do contrato firmado mediante termo de adesão e com a devida autorização para desconto em folha de pagamento ou benefício, não há que se falar em vício de consentimento no negócio jurídico celebrado entre as partes. No mesmo sentido, colhe-se julgado do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso (TJMT): RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – IMPROCEDÊNCIA – EMPRÉSTIMO ATRAVÉS DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL – RMC –PRELIMINAR – NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO POR AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE – REJEIÇÃO – MÉRITO – ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE INFORMAÇÃO/ESCLARECMENTO QUANTO A CONTRATAÇÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO – DESCABIMENTO – CRÉDITO LIBERADO NA CONTA DA AUTORA – AQUIESCÊNCIA COM OS TERMOS CONTRATADOS – REGULARIDADE DOS DESCONTOS POR MAIS DE SETE ANOS – VEDAÇÃO DO COMPORTAMENTO CONTRADITÓRIO – VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM - AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO – ILEGALIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADOS – NÃO CONSTATAÇÃO – ÍNDICES AQUÉM DA TAXA MÉDIA DE MERCADO – RECURSO DESPROVIDO. Rejeita-se a preliminar de não conhecimento do recurso por ausência de dialeticidade, em razão de a recorrente ter atendido aos requisitos previstos no artigo 1.010 do CPC/15, trazendo os fundamentos de fato e de direito, havendo pedido expresso de reforma da sentença para que a ação seja julgada procedente. Se restou evidenciada a contratação de empréstimo através de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável - RMC, visto que após a juntada do contrato e das faturas de cartão de crédito pelo requerido, em nenhum momento negou a autora o recebimento do crédito a ele correspondente e tampouco a utilização do cartão, há que ser mantida a sentença de improcedência da lide. Não há como acolher a tese de que a autora não contratou empréstimo na modalidade Cartão de Crédito Consignado, se restou incontroverso o depósito do crédito em sua conta bancária e os descontos do valor mínimo das respectivas faturas durante mais de três (3) anos – data a partir da qual somente tomou as primeiras medidas cabíveis para obstar os débitos, o que evidencia a inexistência de fraude, ante a vedação ao venire contra factum proprium. Não há falar-se em ilegalidade dos juros remuneratórios contratados, se estes encontram-se aquém da taxa média para operações da mesma espécie divulgadas pelo Banco Central (RESp. 1.061.530/RS, sob o rito de recurso repetitivo).- (N.U 1001598-74.2023.8.11.0004, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 03/04/2024, Publicado no DJE 09/04/2024) (grifo nosso) APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ANULATÓRIA POR VÍCIO DE CONSENTIMENTO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS –EMPRÉSTIMOCONSIGNADONA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE A AUTORA UTILIZOU DO CARTÃO PARA COMPRAS EM ESTABELECIMENTOS – CIÊNCIA DA MODALIDADE DEEMPRÉSTIMOADQUIRIDA E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Verificando-se que a contratação doempréstimose deu na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento do consumidor, e não havendo prova da indução a erro ou deonerosidadeexcessiva, notadamente na hipótese em que o autor se utiliza do cartão para realização de saques e compras em vários estabelecimentos, inviável falar-se na aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações deempréstimosconsignados. (N.U 1024408-80.2022.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 25/03/2024, Publicado no DJE 28/03/2024) (grifo nosso) Tais nuances do contexto fático-probatório devem ser devidamente ponderadas, uma vez que não restou evidenciado, nos autos, qualquer induzimento a erro. Como mencionado anteriormente, os elementos volitivos e cognitivos necessários à celebração do contrato estão comprovados nos autos. Além disso, a simples utilização do cartão para a realização de saques é suficiente para descaracterizar a natureza de empréstimo consignado, refutando a tese arguida pela parte apelante. No mesmo sentido se manifesta a jurisprudência caseira: RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE NEGÓCIO JURÍDICO C.C. INDENIZATÓRIA POR DANO MORAL – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE O AUTOR UTILIZOU DO CARTÃO PARA REALIZAR SAQUES E COMPRAS EM ESTABELECIIMENTOS – VIOLAÇÃO AO DEVER DE INFORMAÇÃO, TRANSPARÊNCIA E VÍCIO DE VONTADE NÃO CONFIGURADOS – AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO – DANOS MORAIS INDEVIDOS – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. I - Não há que se falar em indução a erro do consumidor na contratação de cartão de crédito consignado, quando demonstrado a utilização efetiva do referido cartão. Juntado aos autos as faturas do cartão de crédito, demonstrando a utilização do cartão pela parte, não só correspondente a saques, que por si só já desvirtua o empréstimo consignado, como em compras diversas, não havendo se falar em violação ao direito de informação. II - As faturas constituem provas mais que suficientes, de que o autor/apelante utilizou do cartão de crédito disponibilizado pelo requerido/apelado, não havendo como desconsiderar a transação bancária. III - Optando o apelante ao desconto mínimo, o não pagamento do valor integral da fatura acaba por acarretar a incidência de encargos financeiros sobre o saldo devedor, conforme discriminados nas próprias faturas, motivo pelo qual os descontos continuam sendo devidos. (TJ-MT - AC: 10005785020228110047, Relator: SEBASTIAO DE MORAES FILHO, Data de Julgamento: 10/05/2023, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 16/05/2023) (grifo nosso). No que tange à tese de onerosidade excessiva, saliento que, ao Código de Defesa do Consumidor, adotou a Teoria da Base Objetiva, conforme entendimento firmado no Informativo 556 do Superior Tribunal de Justiça, in verbis: A teoria da base objetiva ou da base do negócio jurídico tem sua aplicação restrita às relações jurídicas de consumo, não sendo aplicável às contratuais puramente civis. A teoria da base objetiva difere da teoria da imprevisão por prescindir da imprevisibilidade de fato que determine oneração excessiva de um dos contratantes. Pela leitura do art. 6°, V, do CDC, basta a superveniência de fato que determine desequilíbrio na relação contratual diferida ou continuada para que seja possível a postulação de sua revisão ou resolução, em virtude da incidência da teoria da base objetiva. O requisito de o fato não ser previsível nem extraordinário não é exigido para a teoria da base objetiva, mas tão somente a modificação nas circunstâncias indispensáveis que existiam no momento da celebração do negócio, ensejando onerosidade ou desproporção para uma das partes. Com efeito, a teoria da base objetiva tem por pressuposto a premissa de que a celebração de um contrato ocorre mediante consideração de determinadas circunstâncias, as quais, se modificadas no curso da relação contratual, determinam, por sua vez, consequências diversas daquelas inicialmente estabelecidas, com repercussão direta no equilíbrio das obrigações pactuadas. Nesse contexto, a intervenção judicial se daria nos casos em que o contrato fosse atingido por fatos que comprometessem as circunstâncias intrínsecas à formulação do vínculo contratual, ou seja, sua base objetiva. Em que pese sua relevante inovação, a referida teoria, ao dispensar, em especial, o requisito de imprevisibilidade, foi acolhida em nosso ordenamento apenas para as relações de consumo, que demandam especial proteção. Ademais, não se admite a aplicação da teoria do diálogo das fontes para estender a todo direito das obrigações regra incidente apenas no microssistema do direito do consumidor. De outro modo, a teoria da quebra da base objetiva poderia ser invocada para revisão ou resolução de qualquer contrato no qual haja modificação das circunstâncias iniciais, ainda que previsíveis, comprometendo em especial o princípio pacta sunt servanda e, por conseguinte, a segurança jurídica. Por fim, destaque-se que, no tocante às relações contratuais puramente civis, quer dizer, ao desamparo das normas protetivas do CDC, a adoção da teoria da base objetiva, a fim de determinar a revisão de contratos, poderia, em decorrência da autuação jurisdicional, impor indesejáveis prejuízos reversos àquele que teria, em tese, algum benefício com a superveniência de fatos que atinjam a base do negócio. REsp 1.321.614-SP, Rel. Número 556 Brasília, 23 de fevereiro a 4 de março de 2015. TERCEIRA TURMA DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. HIPÓTESE DE INAPLICABILIDADE DA TEORIA DA BASE OBJETIVA OU DA BASE DO NEGÓCIO JURÍDICO. 1 originário Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Rel. para acórdão Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 16/12/2014, DJe 3/3/2015. (grifo nosso) Logo, para que se caracterize o estremecimento das bases objetivas do contrato, é necessária a existência de um fato superveniente que desequilibre a relação entre as partes. Todavia, não se verifica, no caderno processual, a ocorrência de qualquer elemento capaz de ensejar a quebra dessa relação jurídica. Isso porque a modalidade contratual em questão prevê o desconto de uma reserva de margem consignável previamente estabelecida, sendo responsabilidade do consumidor quitar os valores que excedam essa reserva, ou seja, a totalidade do valor mensal. Nesse diapasão, não há nos autos qualquer indício de que o consumidor tenha adimplido o valor excedente. A simples impossibilidade de cumprimento da avença não é suficiente para validar a aplicação da teoria da quebra da base objetiva do negócio jurídico. Em suma, não restou comprovado a conduta ilícita da instituição financeira no caso dos autos, motivo pelo qual, deve ser mantida a sentença objurgada, não havendo que se falar em ocorrência de danos morais e materiais no caso dos autos. 3. Suposta abusividade dos encargos e onerosidade excessiva A parte autora alega que os descontos se prolongam por tempo indefinido, com incidência de encargos excessivos, caracterizando onerosidade excessiva e prática abusiva, arguindo a necessidade de aplicação da taxa média de mercado conforme a modalidade empréstimo consignado, todavia, não há como aplicar modalidade de juros de modalidade contratual diversa daquela inicialmente contratada (cartão de crédito consignado). Nesse sentido se manifesta o Tribunal de Justiça de Mato Grosso: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C RESTITUIÇÃO DE VALORES E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – EMPRÉSTIMO CONSIGNADO NA MODALIDADE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) – CONJUNTO PROBATÓRIO QUE DEMONSTRA QUE O AUTOR UTILIZOU DO CARTÃO PARA COMPRAS EM VÁRIOS ESTABELECIMENTOS, ALÉM DE TER EFETUADO PAGAMENTOS PARCIAIS DA FATURA – CIÊNCIA DA MODALIDADE DE EMPRÉSTIMO ADQUIRIDA E DA FORMA DE EXECUÇÃO DO CONTRATO – JUROS REMUNERATÓRIOS – EQUIPARAÇÃO AOS JUROS COBRADOS NOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO – IMPOSSIBILIDADE – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PROVIDO. Tratando-se de contratação na modalidade de cartão de crédito com desconto na folha de pagamento do consumidor, não havendo prova da indução a erro ou de onerosidade excessiva, notadamente na hipótese em que o autor utiliza-se do cartão para realização de saques e compras em vários estabelecimentos, inviável falar-se na aplicação dos juros remuneratórios incidentes sobre operações de empréstimos consignados. (TJ-MT - AC: 10043014020218110006, Relator: ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Data de Julgamento: 22/03/2023, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 28/03/2023) (grifo nosso). Ademais, o apontamento genérico de abusividade dos juros remuneratório não autoriza o conhecimento da referida tese. Nesse sentido se manifesta a jurisprudência hodierna: ESTADO DE MATO GROSSO TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 1000371-94.2019.8.11. 0002 Apelação nº 1000371-94.2019.8.11.0002 Apelante: Higor Souza Rodrigues Apelado: Banco Bradesco S.A. Vara Especializada em Direito Bancário da Comarca de Várzea Grande EMENTA APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA - CRÉDITO EM CONTA CORRENTE - CONTRATAÇÃO COMPROVADA PELO BANCO E NÃO DESCONSTITUÍDA NEM NEGADA PELO REQUERIDO - SENTENÇA PROCEDÊNCIA - ALEGAÇÕES GENÉRICAS DE ABUSIVIDADE CONTRATUAL - REVISÃO - IMPOSSIBILIDADE - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Em sede de ação de cobrança de crédito bancário, a contestação apresentada pelo requerido que traz apenas alegações genéricas acerca de suposta abusividade contratual não autoriza a apreciação do pedido revisional. (TJ-MT - AC: 10003719420198110002 MT, Relator: GUIOMAR TEODORO BORGES, Data de Julgamento: 22/07/2020, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 22/07/2020) (grifo nosso). Entretanto, conforme se extrai da própria inicial, os descontos decorreram de operação contratada como “cartão de crédito consignado”, a qual, por sua natureza, não possui parcelamento fixo, mas sim amortização mínima mensal. A jurisprudência reconhece a legalidade da cobrança nessas condições, desde que pactuada e informada ao consumidor. Nessa esteira a Súmula 381 do Colendo Superior Tribunal de Justiça, está assim ementada: Súmula 381. Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas. Não restou comprovado nos autos que os encargos superam a média de mercado ou que a instituição financeira tenha se omitido quanto às informações essenciais. Ao contrário, os documentos trazidos pelo banco demonstram a formalização da contratação e os termos aplicáveis. Diante dessas considerações, concluo pela rejeição da presente tese recursal, mantendo a taxa de juros do contrato pactuado entre as partes. 4. Pleito de Repetição do Indébito. Em relação ao pleito em comento, anoto que já rejeitei o reconhecimento de responsabilidade civil do banco apelante no tópico 2, bem como, ausente prova robusta acerca da ventilada abusividade contratual, por consequência resta prejudicado o pleito por repetição do indébito. 5. Indenização por danos morais Ainda, requer a parte apelante o pagamento de indenização por danos morais, sob o argumento de que sofreu prejuízos em virtude da conduta do banco. Ocorre que a jurisprudência consolidada desta Corte tem entendido que a simples existência de cláusula contratual tida como abusiva ou a alegação de vício na contratação, sem prova de dano efetivo ou conduta dolosa do réu, não enseja, por si só, o dever de indenizar. No caso em apreço, ausente qualquer comprovação de ilicitude ou de efetivo abalo à honra da parte autora, a indenização pleiteada não encontra amparo, conforme já discutido no tópico 2. Por consequência resta prejudicado o pleito de indenização por danos morais. 6. Da Instrução Normativa 28/2008 INSS/PRES. A parte apelante postula a aplicação da norma prevista no art. 13, inciso II, da Instrução Normativa nº 28/2008 do INSS/PRES, referente à taxa de juros, sob a alegação de cobrança abusiva na modalidade de crédito contratada. Todavia, tal pleito não merece prosperar, pois o dispositivo mencionado aplica-se exclusivamente aos contratos de empréstimo. No caso em exame, a modalidade contratada trata-se de cartão de crédito consignado. Assim, cumpre trazer à baila o referido texto normativo: Art. 13. Nas operações de empréstimos são definidos os seguintes critérios, observado o disposto no art.56 desta Instrução Normativa: [...] II - a taxa de juros não poderá ser superior a um inteiro e oitenta centésimos por cento (1,80%) ao mês, devendo expressar o custo efetivo do empréstimo; (g.n.) Portanto, da leitura da aludida norma, conclui-se pela sua inaplicabilidade a espécie analisada, motivo pelo qual rejeito o presente pleito recursal. Conclusão Diante do exposto, conheço do recurso e NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo incólume a sentença de improcedência proferida em primeiro grau. Nos termos do art. 85, §11, do CPC, majoro os honorários advocatícios de 10% (dez por cento) para 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, observada a gratuidade da justiça deferida à apelante. É como voto. Sebastião de Arruda Almeida Desembargador Relator Data da sessão: Cuiabá-MT, 03/06/2025
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