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Gidenilson Rodrigues Da Silva x Sociedade De Ensino Superior Estácio De Sá Ltda

ID: 281604115

Tribunal: TJMT Órgão: 2º JUIZADO ESPECIAL DE VÁRZEA GRANDE Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1004078-60.2025.8.11.0002

Data de Disponibilização: 28/05/2025

Polo Ativo:

GIDENILSON RODRIGUES DA SILVA

Polo Passivo:

SOCIEDADE DE ENSINO SUPERIOR ESTÁCIO DE SÁ LTDA

Sentença

Advogados:

ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

CAMILLE FADEL DA SILVA REIS

OAB/RJ XXXXXX Desbloquear

KAYQUE PEDRO LIMA KLEINSORGEN MOTTA

OAB/RJ XXXXXX Desbloquear

LUIZ FLAVIANO VOLNISTEM

OAB/RO XXXXXX Desbloquear

MINUTA DE SENTENÇA Processo: 1004078-60.2025.8.11.0002 RECLAMANTE: GIDENILSON RODRIGUES DA SILVA RECLAMADA: SOCIEDADE DE ENSINO SUPERIOR ESTÁCIO DE SÁ LTDA. Vistos, 1. SÍNTESE DOS FATOS Relatou o rec… MINUTA DE SENTENÇA Processo: 1004078-60.2025.8.11.0002 RECLAMANTE: GIDENILSON RODRIGUES DA SILVA RECLAMADA: SOCIEDADE DE ENSINO SUPERIOR ESTÁCIO DE SÁ LTDA. Vistos, 1. SÍNTESE DOS FATOS Relatou o reclamante que, no segundo semestre de 2023, acreditando que havia sido contemplado com uma “bolsa incentivo Estácio”, a qual prometia a cobrança de R$ 49,00 nos primeiros 03 meses, se matriculou na instituição reclamada no intuito de cursar “Gestão de Segurança Pública” na modalidade semipresencial, atrelado ao polo de Juazeiro do Norte. Alegou que, após frequentar inicialmente o curso, precisou proceder com a solicitação de trancamento da matrícula, pois, estava com problemas de saúde e precisava realizar o devido tratamento. Aduziu que, ao contatar a reclamada, esta passou a criar óbices aos procedimentos relacionados ao trancamento da matrícula. O reclamante destacou que, no ano de 2024, ao tentar realizar uma compra, tomou conhecimento de que havia sido negativado pela reclamada, em decorrência de uma suposta dívida. Frisou ainda que vem sendo atormentado por ligações cobrando um débito que entende ser indevido. Ressaltou que jamais lhe foi esclarecido sobre a possibilidade da incidência de qualquer penalidade pela eventual solicitação de trancamento de matrícula. Informou que não possui mais acesso ao Portal do Aluno, bem como que não conseguiu solucionar a questão administrativamente e ainda, que a negativação está lhe proporcionando prejuízos. Nos pedidos, requereu a declaração de nulidade/cancelamento do contrato educacional, a inexigibilidade do débito, a retirada da anotação restritiva e a reparação por danos morais. Na contestação, a reclamada esclareceu que o reclamante se matriculou na instituição para cursar “Gestão de Segurança Pública”. Sustentou que, na ocasião, o reclamante optou por um benefício denominado DIS (Diluição Solidária da Estácio), o qual permite ao aluno efetuar o pagamento de R$ 49,00 nos primeiros meses, cuja diferença com o valor integral é dividida em uma quantidade de parcelas correspondente ao prazo do curso. Ressaltou que o regulamento do referido programa/benefício está disponibilizado no sítio eletrônico da instituição. Destacou que, nos termos do programa, resta disposto que, caso configurado o cancelamento ou trancamento da matrícula, haverá o vencimento antecipado do valor diluído. A reclamada ressaltou que o reclamante anuiu com o DIS mediante aceite eletrônico e, apesar de ter efetuado o pagamento da matrícula no valor de R$ 49,00, deixou de adimplir as mensalidades referentes ao período de 08/2023 a 12/2023. Frisou que não há nenhum registro de requerimento de cancelamento por parte do reclamante, contudo como não houve renovação da matrícula, esta acabou cancelada por abandono. Defendeu que, em decorrência de uma situação de inadimplemento, apenas exerceu o direito de credora, motivo pelo qual, entende que inexistem danos morais indenizáveis. Ao final, pugnou pela improcedência dos pedidos. Dispensado o relatório mais detalhado nos termos do artigo 38 da Lei 9.099/95. Passo a fundamentar e a decidir. 2. FUNDAMENTOS Do julgamento antecipado. Compulsando os autos, verifico que não há necessidade de serem produzidas outras provas, razão pela qual o julgamento antecipado da lide, nos moldes do art. 355, I, do CPC é a medida adequada. Do Mérito. Insta assentar que o presente caso é regulado pelo Código de Defesa do Consumidor, tendo em vista que a parte autora é a destinatária final da prestação do serviço, enquanto a reclamada figura como fornecedora, enquadrando-se nos conceitos legais dos artigos 2º e 3º da Lei nº 8.078/90. Inicialmente, verifico que, em consonância com o artigo 6º, VIII, do CDC, a MM. Juíza Togada DEFERIU a inversão do ônus da prova em favor do reclamante (Id. 183277337). Oportuno esclarecer que, embora seja um direito básico inerente à pessoa do consumidor, a inversão do ônus da prova não pode ser interpretada de forma absoluta, a ponto de eximir o reclamante de apresentar provas mínimas para embasar as suas pretensões. No intuito de corroborar o entendimento em questão, segue destacada a jurisprudência do TJMT: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE ANULABILIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EMPRÉSTIMO. DESCONTOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. INDEFERIMENTO DA INICIAL POR AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS NECESSÁRIOS. EXTRATOS BANCÁRIOS. DOCUMENTOS DE FÁCIL ACESSO AO TITULAR DA CONTA. DESOBEDIÊNCIA À ORDEM JUDICIAL. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA QUE NÃO AFASTA DEVER DE PROVA MÍNIMA. RECURSO DESPROVIDO. 1- A juntada de documento a se aferir o mínimo dos elementos que evidenciem o direito da parte autora, qual seja o extrato de sua conta pessoal, é de fácil obtenção, e a desobediência do determinado convola no indeferimento da inicial. 2- “Em termos de provas, mesmo com a aplicação do CDC e a inversão do ônus da prova, em face da hipossuficiência da parte, deve esta demonstrar, ainda que de forma mínima, que tem o direito pretendido. Suas alegações, baseadas no CDC, não gozam de presunção absoluta de veracidade.” (N.U 1013614-32.2020.8.11.0015, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 23/08/2022, Publicado no DJE 30/08/2022). (TJ-MT 10196461920218110015 MT, Relator: NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO, Data de Julgamento: 11/10/2022, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 19/10/2022).”. (Destaquei). Após promover a análise das manifestações e provas vinculadas ao caderno processual, tenho que o direito não milita em favor das pretensões inaugurais. Extrai-se das alegações de ingresso que o próprio reclamante reconhece que houve por parte da reclamada uma ampla divulgação das condições especiais relacionadas ao que acreditava se tratar de uma “bolsa incentivo Estácio”, a qual prometia a cobrança de apenas R$ 49,00 nos primeiros 03 meses do curso. Ademais, consoante reconhecido pelo requerente, o mesmo efetuou a sua matrícula junto à instituição de ensino. Pois bem, não obstante os argumentos do autor, os esclarecimentos defensivos pontuaram que, ao efetuar a matrícula, o reclamante aderiu a um benefício denominado DIS (Diluição Solidária da Estácio), o qual permite ao aluno efetuar o pagamento de apenas R$ 49,00 nos primeiros meses e ainda, cuja diferença é dividida em uma quantidade de parcelas correspondente ao prazo do curso (Id. 185982773). Verifico que, no intuito de corroborar seus argumentos, a reclamada apresentou algumas telas sistêmicas, dentre elas uma correspondente ao aceite digital, tanto é que foi registrado o número da matrícula, a data/horário do aceite e o IP da máquina utilizada pelo autor (Id. 185982777). Malgrado as telas sistêmicas possam ser consideradas como provas unilaterais, entendo que àquelas que se encontram anexadas à defesa, excepcionalmente, não merecem ser desprezadas, precipuamente em razão do incontroverso vínculo mantido entre as partes e do pagamento da taxa de matrícula efetuada pelo consumidor (Id. 185982774). Nesse sentido, colaciono abaixo, por analogia, a jurisprudência do TJSP: “APELAÇÃO CÍVEL. BANCÁRIO. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL POR NEGATIVAÇÃO INDEVIDA. Sentença de procedência. Insurgência de ambas as partes. Alegação de desconhecimento do débito afastada. Existência de relação jurídica entre as partes incontroversa. Origem comprovada. Gastos com cartão de crédito. Anotação restritiva correspondente à fatura não adimplida, vencida em abril de 2022. Validade de cópias de telas sistêmicas apreciadas em conjunto com o acervo probatório. Débito exigível. Anotação regular. Dano moral afastado. Ainda que indevida fosse a anotação, a autora possuía anotações pretéritas sem notícia de que seriam ilegítimas. RECURSO DO RÉU PROVIDO, com inversão do ônus da sucumbência. RECURSO DA AUTORA PREJUDICADO. (TJ-SP - Apelação Cível: 10102575520238260004 São Paulo, Relator.: Inah de Lemos e Silva Machado, Data de Julgamento: 29/01/2025, Núcleo de Justiça 4.0 em Segundo Grau – Turma V (Direito Privado 2), Data de Publicação: 29/01/2025).”. (Destaquei). No caso, conquanto tenha ventilado que, em decorrência de problemas de saúde, “precisou proceder com a solicitação de trancamento de sua matrícula”, verifico que o reclamante, em patente descumprimento ao artigo 373, I, do CPC, não apresentou provas mínimas para respaldar os seus argumentos, seja um protocolo de atendimento (contato telefônico), envio de e-mail ou ainda, a entrega de um requerimento específico diretamente junto à instituição de ensino. Outrossim, de forma diversa do que tentou fazer prevalecer o reclamante, inexistem nos autos provas mínimas de que a reclamada tenha criado qualquer óbice à pretensão de trancamento da matrícula. No que concerne à origem do débito motivador do apontamento restritivo (R$ 150,61), cujo vencimento ocorreu em 21/08/2023, entendo que a mesma restou devidamente esclarecida. No intuito de atestar a credibilidade das considerações defensivas, o juízo tomou a liberdade de consultar o sítio eletrônico da instituição de ensino (https://estacio.br/) e, como resultado, atestou que o regulamento do benefício DIS está disponível para qualquer usuário, ou seja, não há como o consumidor sustentar a tese de que não tinha conhecimento das regras aplicáveis ao programa anteriormente aderido. Ao analisar o documento disponibilizado no site da reclamada, o juízo atestou que, caso o aluno solicite o cancelamento ou tenha o contrato rescindido, haverá o vencimento antecipado do valor diluído pelo DIS, o que, inclusive, está em consonância com a disposição colacionada ao corpo da defesa. Peço vênia para colacionar um pequeno trecho da disposição contratual visualizada por este juízo no sítio eletrônico (a qual, por razões óbvias, é contemporânea) e daquela inserta no corpo da contestação (a qual representa o benefício aderido à época pelo reclamante): Tendo em vista que o reclamante não obteve êxito em comprovar que solicitou oportunamente o trancamento de sua matrícula, verifico que a reclamada, ao atestar que não houve a renovação da matrícula para a semestralidade 2024/01, cancelou de forma legítima o contrato por abandono do aluno e ainda, se limitou a cobrar as mensalidades inadimplidas e, consequentemente, a diferença proveniente do DIS. Embora a reclamada deva responder objetivamente, ou seja, independentemente da configuração de culpa, pelos danos ocasionados aos consumidores por eventual falha proveniente da prestação dos seus serviços, tempestivo esclarecer que existem no diploma consumerista algumas hipóteses excludentes da responsabilidade da figura do “fornecedor”. Preconiza o artigo 14, § 3º, I e II, do CDC, que: “Art. 14. (...) § 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.”. (Destaquei). Concatenando o dispositivo supra ao caso em comento, bem como considerando que o reclamante não comprovou ter efetuado o trancamento ou cancelamento de sua matrícula, entendo que, ao negativar o nome do aluno e ainda, cobrar as mensalidades que constam como inadimplidas junto aos seus sistemas, a parte reclamada apenas exerceu o seu direito de credora, não havendo como reconhecer qualquer falha na prestação dos seus serviços, tampouco como lhe imputar a prática de ato ilícito (artigo 188, I, do Código Civil). Para a configuração da responsabilidade civil, resta necessário o preenchimento de 03 requisitos, quais sejam: ação/omissão do agente, nexo de causalidade e dano suportado pela vítima. Considerando que os requisitos supra não se fazem concomitantemente presentes, bem como com respaldo em toda a fundamentação exarada em linhas anteriores, entendo que não há como proporcionar guarida às pretensões de ingresso, sejam elas de cunho obrigacional, declaratório ou indenizatório. Visando fortalecer todo o alegado, transcrevo abaixo a jurisprudência do TJMS: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PROVA DA RELAÇÃO CONTRATUAL ENTRE ALUNO E INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR – DÉBITO DEMONSTRADO – AUSÊNCIA DE PROVA DE PAGAMENTO – REGULAR INSCRIÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES – EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO – AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Restando provada a contratação entre as partes, bem assim a dívida inadimplida, a inscrição nos órgãos de proteção ao crédito caracteriza exercício regular de direito, devendo ser considerada legítima a negativação, o que descaracteriza os requisitos para a responsabilização civil pretendida. (TJ-MS - Apelação Cível: 08416224720228120001 Campo Grande, Relator.: Des. Marcelo Câmara Rasslan, Data de Julgamento: 02/10/2024, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: 07/10/2024).”. (Destaquei). Por fim, considerando que o reclamante não apresentou provas acerca dos fatos constitutivos do seu direito (artigo 373, I, do CPC), seja no tocante ao pedido de trancamento/cancelamento da matrícula ou ainda, ao adimplemento das mensalidades devidas à instituição de ensino reclamada, entendo que outro caminho não há a ser trilhado, senão contemplar a improcedência da ação. 3. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES as pretensões deduzidas na petição inicial, extinguindo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC. Por derradeiro, REVOGO a decisão interlocutória vinculada ao Id. 183277337. Sem custas processuais e sem honorários advocatícios neste grau de jurisdição (art. 54 e 55 da Lei nº 9.099/95). Decisão sujeita à homologação da Douta Juíza de Direito, conforme o art. 40 da Lei nº 9.099/95. Intimem-se. KLEBER CORREA DE ARRUDA Juiz Leigo Vistos, HOMOLOGO, para que surtam seus jurídicos e legais efeitos, o Projeto de Sentença da lavra do Juiz Leigo deste Juizado Especial. Tudo cumprido, ARQUIVE-SE, com as cautelas de estilo e baixa no estoque. Intimem-se as partes da sentença. Várzea Grande/MT, data do sistema. VIVIANE BRITO REBELLO Juíza de Direito

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Processo nº 1004078-79.2024.8.11.0007

ID: 260130566

Tribunal: TJMT Órgão: 5ª VARA DA COMARCA DE ALTA FLORESTA Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1004078-79.2024.8.11.0007

Data de Disponibilização: 24/04/2025

Polo Ativo:

ELZA RODRIGUES DA SILVA

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

JOICE GABRIELE MENDES DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 5ª VARA DA COMARCA DE ALTA FLORESTA SENTENÇA Processo: 1004078-79.2024.8.11.0007. REQUERENTE: ELZA RODRIGUES DA SILVA REQUERIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SO… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 5ª VARA DA COMARCA DE ALTA FLORESTA SENTENÇA Processo: 1004078-79.2024.8.11.0007. REQUERENTE: ELZA RODRIGUES DA SILVA REQUERIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS I – RELATÓRIO. Trata-se de ação previdenciária para reestabelecimento de auxílio por incapacidade temporária ou aposentadoria por incapacidade permanente, proposta por ELZA RODRIGUES DA SILVA em desfavor do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, todos qualificados nos autos. Narra a parte autora que possui 61 anos de idade e é vinculada ao regime geral da previdência social na condição de segurada obrigatória (empregada). Afirma que desde 2019 possui diagnóstico de: CID M19 - artrose, osteoartrose, osteoartrite e doença articular degenerativa; M54 - Dorsalgia – Dor na coluna torácica; M51 - transtornos de discos intervertebrais. Em razão disso, fora beneficiária de auxílio por incapacidade temporária de 05/01/2020 até 22/07/2020, quando cessado indevidamente. Alegando o atendimento aos requisitos legais respectivos, postulou: a) a concessão da AJG; b) concessão da tutela de urgência, para imediata implantação do benefício ou da aposentadoria por invalidez; e c) ao final, a confirmação da medida urgente. Juntou documentos (id. 155187045). Deferida a AJG (id. 156309887). Laudo médico pericial (id. 169532013). Contestação (id. 174254221). Impugnação à contestação (id. 176999705). II – FUNDAMENTAÇÃO. DO JULGAMENTO ANTECIPADO. A demanda comporta julgamento antecipado, pois a matéria de fato prescinde da produção de prova em audiência, sendo suficientes a documental e a pericial já produzidas (art. 355, I do CPC). DA PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. A autarquia alega que o pedido administrativo foi indeferido forçadamente por falta de apresentação de atestado médico conforme exigido por lei. Afirma que a presente demanda versa sobre o reestabelecimento do auxílio por incapacidade temporária c/c com aposentadoria por invalidez, todavia, o procedimento administrativo versou sobre antecipação do auxílio por incapacidade temporária, com previsão da Lei nº 13.982/2020, alegando ser incabível a concessão do ora pleiteado, uma vez que o indeferimento administrativo ocorreu em relação a pedido diverso. Alega, ainda, que a apresentação de novos documentos em juízo exigiria nova análise administrativa, sendo vedada a atuação judicial nesse caso, por equivalência a inexistência de requerimento administrativo, o que afastaria o interesse de agir da autora e justificaria a extinção do processo sem julgamento de mérito. Contudo, em que pese o alegado, não comprovou a suposta divergência, contrariando o ônus probatório conforme previsto no art. 373, II, do CPC. Limitou-se a juntar extratos de sistemas internos, sem apresentar documentos capazes de comprovar qual foi o pedido realizado administrativamente e o eventual descumprimento de exigências. Também não provou que os documentos juntados em juízo são novos, sequer demonstrou quais foram os documentos fornecidos na esfera administrativa. Ainda, em se tratando o presente caso de reestabelecimento de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder o benefício mais vantajoso possível, conforme bem exposto na impugnação a contestação apesentada, somente seria caso de afastar o entendimento firmado pelo STF no julgamento do Tema 350, se dependesse de análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da administração, o que, frisa-se, não restou comprovado pela autarquia nos autos. Ante o exposto, a rejeição da preliminar suscitada é medida que se impõe. DA REGULARIDADE DO FEITO. Regular a tramitação processual, dou o feito por apto ao julgamento de mérito (art. 355, I, do CPC). DO MÉRITO. Depreende-se da Lei n. 8.213/91 os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez: a) qualidade de segurado; b) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, salvo nas hipóteses previstas no art. 26, II, da mesma lei; c) incapacidade parcial ou total e temporária (auxílio-doença) ou permanente e total (aposentadoria por invalidez) para a atividade laboral. De início, as partes convergem quanto a qualidade de segurado e o período de carência, uma vez que ambos restaram incontroversos (id. 174254221). Constam dos documentos anexados a exordial, laudos médicos que comprovam as patologias alegadas, demonstrando que a parte autora buscou por tratamento médico desde o ano de 2019. A prova pericial produzida nos autos corrobora a alegação de incapacitada total e permanente (id. 169532013): A autora, com 61 anos de idade, apresenta um quadro de dores nas costas associado a diagnósticos de artrose lombar e hérnia de disco nas regiões entre L3-L4 e L5-S1, classificadas sob os CIDs M19 (outras artroses), M54 (dorsalgia) e M51 (transtornos de discos intervertebrais). Estes diagnósticos são frequentemente associados a processos degenerativos naturais do envelhecimento, particularmente em pacientes com histórico de trabalho braçal, como é o caso da periciada, que exerceu a função de zeladora por grande parte da vida. A incapacidade da autora foi avaliada como permanente e total, com início provável em 23/03/2020, de acordo com documentos médicos e exames de imagem (RNM). Isso sugere que o quadro vem se agravando ao longo do tempo devido à natureza progressiva da doença, uma característica comum em patologias osteomusculares degenerativas. O envelhecimento natural, somado às condições socioeconômicas da autora, como baixa escolaridade e um histórico de trabalho físico extenuante, contribui para a incapacidade de continuar exercendo suas funções habituais. Além disso, a condição pessoal da autora, como idade avançada e pouca qualificação educacional, impede que ela se reabilite para outras atividades profissionais. Portanto, há um consenso de que a doença decorre da progressão natural da patologia osteomuscular, agravada com o tempo, sem evidências de que tenha relação com acidente de trabalho ou condições ocupacionais específicas. A periciada não requer assistência permanente de outra pessoa para realizar atividades cotidianas e, até o momento, não há tratamentos reversíveis ou cirúrgicos em curso ou oferecidos pelo SUS para sua condição. A progressão da doença é irreversível, e o tratamento atual se concentra apenas no controle dos sintomas. CONCLUSÃO. A periciada apresenta uma incapacidade total e permanente para o trabalho, decorrente de doenças degenerativas crônicas, que se agravaram ao longo do tempo. A data do início da incapacidade foi estimada em 23/03/2020. Embora a autora não necessite de assistência permanente para atividades diárias, não há previsão de recuperação ou possibilidade de reabilitação para outra atividade laboral. A condição degenerativa associada à idade e à natureza física de seu trabalho anterior são os principais fatores que contribuem para sua incapacidade. Nesse sentido, verifica-se que a incapacidade da requerente se apresentou de forma total e permanente para a atividade laboral exercida (zeladora/faxineira). Soma-se a isso, ainda, o grau de escolaridade (fundamental incompleto - id. 155189602), idade (62 anos – id. 155188599), condição socioeconômica (id. 155189593), profissional e cultural, bem como sua incapacidade advir das dores e gravidade das lesões, pelo que entendo fazer jus a requerente à aposentadoria por invalidez. Destarte, preenchidos os requisitos essenciais para a concessão de aposentadoria por incapacidade permanente, não resta outra alternativa, senão a procedência do pleito, consoante decidiu o E. Tribunal Regional Federal da 1ª Região: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. TRABALHADORA URBANA. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADA DEMONSTRADA. INCAPACIDADE PARCIAL E DEFINITIVA PARA ATIVIDADES HABITUAIS. SITUAÇÃO DE INCAPACIDADE LABORAL RECONHECIDA EM RAZÃO DAS CONDIÇÕES PESSOAIS. APELAÇÃO PROVIDA. 1. Sentença proferida na vigência do CPC/2015. 2. Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez são: a) a qualidade de segurado; b) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, salvo nas hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei n. 8.213/91; c) a incapacidade parcial ou total e temporária (auxílio-doença) ou permanente e total (aposentadoria por invalidez) para atividade laboral. 3. Embora na inicial (fl. 72) a autora alegue ser trabalhadora rural, não foi juntado aos autos nenhum documento que fizesse referência ao desempenho de atividade rural, não obstante tenha sido produzida prova testemunhal. 4. Entretanto, o CNIS de fls 148 comprova a existência de vínculo empregatício, como trabalhadora doméstica, de 03/1998 a 03/2002, e recolhimentos como contribuinte facultativo de 05/2012 a 11/2012 (7 contribuições) e de 01/2013 a 03/2015 (26 contribuições). Considerando o histórico de contribuições previdenciárias da autora, é de se concluir que ela manteve a sua qualidade de segurada até maio/2016, aplicando-se o período de prorrogação de 12 (doze) meses previsto no art. 15, II, da Lei n. 8.213/91. 5. No que se refere ao requisito da incapacidade, o laudo pericial (fl. 244) atestou que a parte autora sofre de espondiloartrose lombar a incapacitam parcial e permanentemente para toda atividade que exija esforço físico. Questionado quanto à data de início da incapacidade, o expert se reportou à seguinte conclusão no ponto: "Há tomografia de coluna lombar com laudo de 25-04-2017: anterolistese grau I de L5 sobre SI por espondilólise ístmica à esquerda. Espondiloartrose lombar e abaulamento discai posterior". 6. Embora o laudo pericial tenha se reportado a exame realizado pela autora em 2017 para a fixação da data de início da incapacidade laboral, há outros elementos de prova que evidenciam que a incapacidade laboral surgiu em momento anterior, como os exames de ultrassonografia de quadril e de veias, realizados em agosto/2015, que já apontavam para o mesmo quadro clínico diagnosticado no exame de 2017 em que se baseou o perito. Conclui-se, pois, que a autora ainda mantinha a sua qualidade de segurada na data de início de sua incapacidade laboral. 7. Em que pese o perito conclua que a incapacidade da parte autora é parcial, porquanto limitada a serviços gerais/esforço físico, entendo que, no caso, tal incapacidade configura-se em total e permanente, eis que, do que se vê dos autos, atividades que envolvam esforços físicos foram a única atividade desempenhada pela parte autora ao longo da vida (doméstica). Assim, deve ser considerada a realidade vivida pelo segurado, sendo necessário ponderar sua escolaridade, idade, condição socioeconômica, profissional e cultural, sendo forçoso reconhecer que dificilmente conseguirá sua reinserção no mercado de trabalho. Dessa forma, averiguada a incapacidade total e permanente para o labor braçal e a impossibilidade de readaptação do segurado em outra atividade, em observância do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, mostra-se devida a concessão da aposentadoria por invalidez. (STJ, AgRg no AREsp n. 318.761/PR, relator Ministro Castro Meira, Segunda Turma, julgado em 28/5/2013, DJe de 5/6/2013.) 8. Devida a concessão de aposentadoria por invalidez desde o requerimento administrativo, conforme entendimento firmado pelo e. STJ no Tema 626 do rito dos recursos especiais repetitivos. 9. Correção monetária e juros de mora calculados nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal. 10. Condenação do INSS em honorários de advogado fixados no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor das prestações devidas até a data da prolação deste acórdão (Súmula 111/STJ). 11. Apelação da parte autora provida. (AC 1001079-02.2023.4.01.9999, DESEMBARGADOR FEDERAL MORAIS DA ROCHA, TRF1 - PRIMEIRA TURMA, PJe 23/11/2023 PAG.) Ademais, em relação ao pedido de majoração em 25% sobre o valor do benefício concedido, verifica-se que não faz jus a requerente, uma vez que restou constatado em perícia médica que ela não necessita de assistência permanente de outra pessoa, nos termos do art. 45 da Lei 8.213/1991: A periciada não requer assistência permanente de outra pessoa para realizar atividades cotidianas e, até o momento, não há tratamentos reversíveis ou cirúrgicos em curso ou oferecidos pelo SUS para sua condição. A progressão da doença é irreversível, e o tratamento atual se concentra apenas no controle dos sintomas. Em relação as questões de mérito trazidas pela autarquia, verifica-se que toda a defesa fora pautada na suposta divergência entre o pedido e documentos apresentados pela requerente em sede administrativa e judicial, o que, conforme já exposto na preliminar analisada anteriormente, não restou comprovado nos autos. Por fim, fixo como a data de início do benefício (DIB) o dia imediato ao da cessação do auxílio-doença (22/07/2020 - id. 155188623), consoante art. 43 da Lei n. 8.213/91. Acerca do assunto, segue o entendimento do E. TRF1: PREVIDENCIÁRIO. RECURSOS DE APELAÇÃO DO INSS. TRABALHADOR URBANO. RESTABELECIMENTO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ . INCAPACIDADE LABORAL TOTAL E PERMANENTE CONSTATADA. REQUISITOS COMPROVADOS. SENTENÇA MANTIDA. 1 . Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social INSS, contra a sentença, e sentença integrativa, que julgou procedente o pedido de concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, desse a cessação do benefício de auxílio-doença, em 17/12/2019. 2. Em suas razões recursais, o INSS sustenta, em síntese, a necessidade de reforma da sentença, uma vez que o laudo pericial oficial não se encontra em conformidade com a perícia federal, requerendo, subsidiariamente, que a data inicial do benefício seja fixada na data de juntada do laudo do perito do juízo. 3 . Os requisitos indispensáveis para a concessão do benefício previdenciário de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez são: a) a qualidade de segurado; b) a carência de 12 (doze) contribuições mensais; c) a incapacidade parcial ou total e temporária (auxílio-doença) ou permanente e total (aposentadoria por invalidez) para atividade laboral. 4. Na hipótese, a parte autora, nascida em 07/12/1952, gozou do benefício de auxílio-doença no período de 01/06/2017 a 17/12/2019, e cessado pela perícia revisional, ante a não constatação de incapacidade laborativa. 5 . Relativamente à incapacidade, a perícia médica oficial realizada em 11/08/2022, foi conclusiva quanto a incapacidade a ensejar a concessão do benefício previdenciário, no sentido de que: "Queixa dor em coluna cervical, lombar e sacral que irradia para membros inferiores. Refere ainda que faz tratamento para Diabetes e Hipertensão; Lesões físicas ósseas que acometem a coluna e as articulações dos membros; CID 10. M54.5 - Dor lombar baixa CID 10 . M54.4 - Lumbago com ciática; CID 10 - M51.1, Transtornos de discos lombares e de outros discos intervertebrais com radiculopatia; CID 10. M54 .2 - Cervicalgia; CID 10 - M51.0, Transtornos de discos lombares e de outros discos intervertebrais com mielopatia; CID 10 - M50.1, Transtorno do disco cervical com radiculopatia, CID 10. M79 .7 Fibromialgia, CID 10. R52.1 - Dor crônica intratável; Incapacidade total, permanente e omniprofissional com início em 05/2017; Não se cogita tempo de recuperação, pois trata-se de incapacidade total permanente; Trata-se da mesma incapacidade observada anteriormente, no entanto, com seus agravos e progressão evidentes; Ao passo da cessação observava-se sim a presença de incapacidades." 6 . Deste modo, considerando os documentos apresentados, bem como a conclusão da perícia médica judicial quanto à incapacidade total e permanente da autora, tenho como presentes os requisitos necessários à concessão do benefício de aposentadoria por invalidez a partir do dia seguinte a data de cessação do benefício de auxílio-doença indevido, uma vez que a perícia oficial constatou que nesta data ainda persistia o estado de incapacidade total, permanente e omniprofissional, decotados eventuais valores pagos a qualquer título, conforme fixado na sentença. 7. Atualização monetária e juros devem incidir nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, atendendo-se aos parâmetros estabelecidos no julgamento do RE 870.947 (Tema 810/STF) e REsp 1 .492.221 (Tema 905/STJ). 8. Publicada a sentença na vigência do NCPC, e desprovido o recurso de apelação, incide o quanto disposto no art . 85, § 11, do Código de Processo Civil de 2015. Honorários majorados em 1% (um por cento) sobre o valor da condenação, em favor do patrono da parte recorrida. 9. Nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição federal ( CF/1988, art . 109, § 3º), o INSS está isento das custas somente quando lei estadual específica prevê a isenção, o que ocorre nos estados de Minas Gerais, Goiás, Rondônia e Mato Grosso. Em se tratando de causas ajuizadas perante a Justiça Federal, o INSS está isento de custas por força do art. 4º, I da Lei 9.289/1996, abrangendo, inclusive, as despesas com oficial de justiça . 10. Recurso de apelação do INSS desprovido. (TRF-1 - (AC): 10171637820234019999, Relator.: DESEMBARGADOR FEDERAL LUIS GUSTAVO SOARES AMORIM DE SOUSA, Data de Julgamento: 02/09/2024, PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: PJe 02/09/2024 PAG PJe 02/09/2024 PAG). III – DISPOSITIVO. Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido para efeito de condenar o INSS a implantar o benefício da aposentadoria por invalidez em favor da parte autora, com a RMI a ser calculada pela ré, resolvendo o mérito da presente demanda, com fundamento no art. 487, inciso I, do CPC. Fixo a DIB no dia 22/07/2020. As prestações em atraso devem ser pagas de uma só vez, monetariamente corrigidas de acordo com a Lei n. 6.899/81, pelos índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, incidindo tal correção desde a data do vencimento de cada parcela em atraso (Súmulas n.s 148 do STJ e 19 do TRF - 1ª Região) e com juros de mora, a contar da citação, devidos à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês (Lei 11.960/09) - até 08/12/2021 e, a partir de 09/12/2021, deverá incidir a taxa SELIC, conforme dispõe o art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021 - ou outro índice que eventualmente venha a ser estabelecido - até a apuração definitiva dos cálculos de liquidação. Em atenção ao caráter alimentar, concedo à parte autora a antecipação dos efeitos da tutela, devendo o INSS implementar o benefício concedido no prazo de 30 dias, contados de sua ciência desta sentença, sob pena de multa diária no valor de R$200,00 até o limite de R$ 6.000,00, consoante art. 537 do CPC. Condeno o INSS, ainda, ao pagamento das custas e honorários advocatícios, estes últimos no patamar de 10% sobre as parcelas vencidas até esta sentença (Súmula 111/STJ), segundo as modulares do art. 85, §3º, do CPC. Dispensada a remessa necessária (CPC, art. 496, §3º, I). Intimem-se. Alta Floresta/MT, data registrada no sistema. JACOB SAUER, Juiz de Direito

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Processo nº 1002303-65.2020.8.11.0008

ID: 292156245

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara Criminal Classe: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº Processo: 1002303-65.2020.8.11.0008

Data de Disponibilização: 09/06/2025

Polo Ativo:

ELITON CARLOS ZARDO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

LUHAN BRUNNO VINHAL BORGES BRITO

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EUSTAQUIO INACIO DE NORONHA NETO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1002303-65.2020.8.11.0008 Classe: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) Assunto: [Homicídio Qualificado, Crimes de Trânsito, Cr… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1002303-65.2020.8.11.0008 Classe: RECURSO EM SENTIDO ESTRITO (426) Assunto: [Homicídio Qualificado, Crimes de Trânsito, Crime Tentado] Relator: Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). RUI RAMOS RIBEIRO, DES(A). JORGE LUIZ TADEU RODRIGUES, DES(A). JUANITA CRUZ DA SILVA CLAIT DUARTE] Parte(s): [ELITON CARLOS ZARDO - CPF: 015.217.311-01 (RECORRENTE), EUSTAQUIO INACIO DE NORONHA NETO - CPF: 691.720.211-87 (ADVOGADO), ANDRESA FERREIRA DOS SANTOS - CPF: 059.247.851-30 (ADVOGADO), POLÍCIA JUDICIÁRIA CIVIL DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0029-45 (RECORRIDO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (RECORRIDO), RIVALDO JOSE RODRIGUES - CPF: 352.560.441-68 (TERCEIRO INTERESSADO), ANDERSON DE SOUZA - CPF: 012.773.151-24 (TERCEIRO INTERESSADO), PAULO RICARDO MORAIS DE SOUZA PINTO - CPF: 055.509.581-98 (TERCEIRO INTERESSADO), JEISIELLE MILLENA CAMPOS DA SILVA - CPF: 062.852.111-16 (TERCEIRO INTERESSADO), DANIELLY LIMA DA SILVA - CPF: 023.215.381-71 (TERCEIRO INTERESSADO), ALBERT MATHEUS RAMOS DA SILVA - CPF: 074.805.231-30 (TERCEIRO INTERESSADO), JOEL FERREIRA LEITE - CPF: 429.403.541-20 (VÍTIMA), ANA PAULA BARBOSA RODRIGUES - CPF: 034.999.471-45 (VÍTIMA), LUHAN BRUNNO VINHAL BORGES BRITO - CPF: 056.227.501-05 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – HOMICÍDIO SIMPLES CONSUMADO, HOMICÍDIO SIMPLES TENTADO E FUGA DO LOCAL DO ACIDENTE – PRONÚNCIA – INSURGÊNCIA DEFENSIVA – 1. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA COM BASE NO PRINCÍPIO DA INEVITABILIDADE – ALEGAÇÃO DE QUE O RESULTADO MORTE OCORRERIA MESMO SE O RECORRENTE ESTIVESSE DENTRO DO LIMITE DE VELOCIDADE – IMPOSSIBILIDADE – AUSÊNCIA DE PROVA INEQUÍVOCA DA EXCLUDENTE – CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS QUE APONTAM PARA CONDUTA ARRISCADA – QUESTÃO A SER APRECIADA PELO TRIBUNAL DO JÚRI – 2. PRETENSÃO DE RECONHECIMENTO DE ESTADO DE NECESSIDADE QUANTO À FUGA DO LOCAL DO ACIDENTE – TEMOR DE LINCHAMENTO – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO INEQUÍVOCA DO PERIGO ATUAL – DEPOIMENTO DE POLICIAL INDICANDO A INEXISTÊNCIA DE AGLOMERAÇÃO NO LOCAL – MATÉRIA A SER DECIDIDA PELO CONSELHO DE SENTENÇA – 3. PEDIDO SUBSIDIÁRIO DE DESCLASSIFICAÇÃO DOS CRIMES DE HOMICÍDIO PARA HOMICÍDIO CULPOSO E LESÃO CORPORAL CULPOSA NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR – DOLO EVENTUAL VERSUS CULPA CONSCIENTE – ELEMENTOS QUE APONTAM POSSÍVEL ASSUNÇÃO DO RISCO – ALTA VELOCIDADE EM CONDIÇÕES ADVERSAS, DESRESPEITO AOS REDUTORES DE VELOCIDADE, VEÍCULO DE GRANDE PORTE – DÚVIDA A SER DIRIMIDA PELO TRIBUNAL DO JÚRI – 4. PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE FUGA DO LOCAL DO ACIDENTE PARA OMISSÃO DE SOCORRO – CONEXÃO COM CRIMES DOLOSOS CONTRA A VIDA – IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE MERITÓRIA EM SEDE DE PRONÚNCIA – USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL DO JÚRI – RECURSO DESPROVIDO. A absolvição sumária com fundamento no princípio da inevitabilidade, corolário da teoria da imputação objetiva, exige prova inquestionável de que o resultado teria ocorrido da mesma forma caso o agente tivesse adotado comportamento conforme o direito. Inexistindo essa certeza, especialmente quando há elementos probatórios apontando que o acusado trafegava em velocidade incompatível com a via, em condições climáticas adversas e desrespeitando redutores de velocidade, impõe-se a submissão da causa ao Tribunal do Júri. Para o reconhecimento do estado de necessidade como excludente de ilicitude a justificar a absolvição sumária, imprescindível a demonstração inequívoca de todos os seus elementos constitutivos, especialmente a existência de perigo atual, não provocado voluntariamente pelo agente, e a inevitabilidade do comportamento lesivo. Não havendo prova cabal do alegado temor de linchamento, a questão deve ser submetida ao Tribunal do Júri para apreciação. A linha divisória entre dolo eventual e culpa consciente é tênue, residindo basicamente no elemento volitivo. Havendo elementos que, em tese, possam indicar que o acusado assumiu o risco de produzir o resultado (condução de veículo de grande porte em alta velocidade, durante a noite, com chuva e sem reduzir a velocidade nos quebra-molas), a dúvida acerca do elemento subjetivo deve ser dirimida pelo Conselho de Sentença, juiz natural da causa. A conexão entre crimes dolosos contra a vida e outros delitos atrai a competência do Tribunal do Júri para o julgamento de todos eles, sendo defeso ao julgador togado fazer qualquer juízo de mérito em relação aos crimes conexos ainda na primeira etapa do procedimento bifásico, sob pena de usurpação da competência constitucional atribuída ao Conselho de Sentença. R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso em sentido estrito interposto por Eliton Carlos Zardo, contra decisão proferida pelo Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Barra do Bugres/MT, nos autos da ação penal n. 1002303-65.2020.8.11.0008, que o pronunciou como incurso nas sanções do artigo 121, caput, do Código Penal, artigo 121, caput, c/c artigo 14, inciso II (tentado) e artigo 305 do Código de Trânsito Brasileiro, na forma do artigo 70 do Código Penal Brasileiro. Inconformada, a defesa interpôs o presente recurso, pleiteando, em síntese: a) Absolvição sumária em relação aos crimes de homicídio consumado e tentado, com fundamento no artigo 415, III, do CPP, sob o argumento da aplicação do princípio da inevitabilidade, também chamado de comportamento alternativo conforme o direito, baseando-se na teoria da imputação objetiva; b) Absolvição sumária em relação ao crime de fuga do local do acidente, com fulcro no artigo 415, IV, do CPP, c/c artigo 23, I, do Código Penal, alegando que o recorrente agiu em estado de necessidade, ante o temor de linchamento; c) Subsidiariamente, a desclassificação dos crimes de homicídio consumado e tentado para os delitos de homicídio culposo e lesão corporal culposa na direção de veículo automotor (artigos 302 e 303 do CTB), sob o fundamento de ausência de dolo eventual; d) Subsidiariamente, a desclassificação do crime de fuga do local do acidente (art. 305 do CTB) para o crime de omissão de socorro (art. 304 do CTB), alegando ausência de dolo específico. Em contrarrazões, o parquet pugnou pelo desprovimento do recurso apresentado pela defesa, devendo ser mantida a respeitável decisão impugnada. (Id. 269563906) Por outro lado, a Procuradoria de Justiça em parecer subscrito pelo i. Procurador de Justiça – Dr. Gill Rosa Fetchtner, manifestou-se pelo desprovimento do recurso defensivo, assim sintetizando: (Id. 273238853) Recurso em sentido estrito. Pronúncia. Duplo homicídio (um tentado e outro consumado) na direção de veículo automotor e fuga do local do crime. Irresignação da Defesa. 1) Pretende-se a absolvição sumária ou a desclassificação para homicídio culposo e lesão corporal culposa na condução de veículo automotor. Inviabilidade. A ausência de animus necandi não foi comprovada cabalmente. A dúvida acerca do animus do agente deve ser apreciada pelo Tribunal do Júri. 2) Almeja absolvição sumária ou desclassificação quanto ao crime conexo. Improcedência. O crime de fuga do local do acidente, conectado aos crimes dolosos contra a vida, deve ser submetido ao Júri Popular, competente para julgar o evento em sua integralidade. 3) Parecer pelo desprovimento do recurso defensivo. É o relatório. V O T O R E L A T O R Conheço o presente recurso, por preencher os requisitos de admissibilidade. Como visto, trata-se de recurso em sentido estrito interposto por Eliton Carlos Zardo, contra decisão proferida pelo Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Barra do Bugres/MT. De acordo com a denúncia, no dia 22/11/2019, por volta das 23h50min, na Avenida José Antônio de Faria, Bairro Centro, cidade de Barra do Bugres/MT, o recorrente, agindo com dolo eventual, matou a vítima Joel Ferreira Leite e tentou matar Ana Paula Barbosa Rodrigues, bem como afastou-se do local do acidente para fugir da responsabilidade penal que lhe seria atribuída. Conforme o Ministério Público, os fatos teriam ocorrido após o recorrente sair de um churrasco, quando trafegava em alta velocidade na via pública. As vítimas estavam em outro veículo, trafegando em baixa velocidade devido à chuva, quando foram surpreendidas pelo recorrente que invadiu a via preferencial. Da colisão resultou a morte de Joel Ferreira Leite e lesões em Ana Paula Barbosa Rodrigues. Após o acidente, o recorrente teria ligado para Paulo Ricardo Morais de Souza Pinto, também denunciado no processo original, que compareceu ao local, momento em que o recorrente fugiu com a caminhonete de Paulo Ricardo. Foi realizado laudo pericial que atestou que a causa do acidente teria sido a invasão de preferencial por parte do veículo conduzido pelo recorrente, agravada pela sua velocidade, estimada em cerca de 70 km/h. As condições climáticas eram adversas, com chuva, o que prejudicava a visibilidade. Recebida a denúncia e concluída a instrução processual, o réu foi pronunciado como incurso nas sanções do artigo 121, caput, do Código Penal Brasileiro, artigo 121, caput, c/c artigo 14, inciso II (tentado) e artigo 305 do Código de Trânsito, na forma do artigo 70 do Código Penal Brasileiro. Na mesma decisão, foi determinado o desmembramento do feito em relação ao corréu Paulo Ricardo Morais de Souza Pinto, com remessa ao Juizado Especial Criminal. Inconformado, o recorrente interpôs o presente recurso em sentido estrito, argumentando, em síntese: 1. DA ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA EM RELAÇÃO AOS CRIMES DE HOMICÍDIO CONSUMADO E TENTADO – PRINCÍPIO DA INEVITABILIDADE O recorrente postula sua absolvição sumária em relação aos crimes de homicídio consumado e tentado, com fundamento no artigo 415, III, do Código de Processo Penal, sob o argumento de aplicação do princípio da inevitabilidade ou comportamento alternativo conforme o direito, embasado na teoria da imputação objetiva desenvolvida por Claus Roxin. Sustenta que, segundo o Relatório Pericial de Acidente de Trânsito nº 023/2023 (ID n.º 132160414), mesmo que estivesse trafegando dentro do limite de velocidade permitido para a via (40 km/h), o resultado fatal ainda assim ocorreria, em razão da grande energia envolvida no impacto. Desta forma, demonstrado que um comportamento lícito alternativo em nada teria servido para evitar o resultado, a imputação objetiva deveria ser excluída. Contudo, após análise detida do caso, entendo que não merece acolhimento a pretensão absolutória, pois não se verifica, de plano, a configuração de causa excludente de ilicitude ou culpabilidade, tampouco a atipicidade manifesta do fato ou prova inequívoca da inocência do acusado, hipóteses autorizadoras da absolvição sumária, na forma do artigo 415 do Código de Processo Penal. Com efeito, a tese defensiva de aplicação do princípio da inevitabilidade, embora tenha fundamentação jurídica relevante, não encontra respaldo nos elementos probatórios dos autos, de forma a justificar a absolvição sumária neste momento processual. Primeiro, porque o próprio laudo pericial oficial apontou que o veículo do recorrente estava trafegando em velocidade aproximada de 69 km/h, quando o limite permitido para a via era de 40 km/h. Em segundo lugar, porque, mesmo que se considere o relatório técnico particular apresentado pela defesa (ID n.º 132160414), este não é categórico ao afirmar que o acidente ocorreria da mesma forma e com o mesmo resultado caso o réu estivesse dirigindo dentro do limite de velocidade. Ademais, a hipótese de inevitabilidade do resultado levantada pela defesa demanda análise aprofundada do conjunto probatório, não sendo possível sua aferição de plano, especialmente diante de outras circunstâncias relevantes apontadas nos autos, como as condições climáticas adversas (chuva), visibilidade reduzida, e ausência de sinalização no local. Conforme bem pontuou o douto Procurador de Justiça em seu parecer, "a Constituição da República de 1988 outorgou soberanamente ao Tribunal do Júri a competência para a apreciação dos crimes dolosos contra a vida, sejam eles tentados ou consumados." Nesta etapa processual, não é permitido ao juízo togado proceder a um exame aprofundado da prova, sob pena de usurpação da competência constitucional do Tribunal do Júri. Basta que esteja comprovada a materialidade delitiva e que existam indícios suficientes de autoria demonstrando que o pronunciado possa ter cometido os ilícitos penais, agindo com alguma das modalidades do dolo aplicáveis ao crime contra a vida. O conjunto probatório carreado aos autos indica que o recorrente conduzia o veículo em velocidade acima do permitido para a via, em condições climáticas adversas (chuva), durante o período noturno, e que não teria respeitado os redutores de velocidade existentes no trajeto percorrido. Além disso, a testemunha Anderson Gonçalves dos Santos, que presenciou o momento do acidente, afirmou categoricamente que o recorrente dirigia em alta velocidade, "rampando quebra-molas invertidos", circunstâncias estas que demonstram, ao menos em tese, que o recorrente assumiu o risco de produzir o resultado. Tais circunstâncias fáticas, neste momento processual, afastam a aplicação da tese do princípio da inevitabilidade, pois não há como se afirmar, com a certeza necessária para uma absolvição sumária, que mesmo com uma conduta adequada ao ordenamento jurídico (direção dentro do limite de velocidade permitido), o resultado seria o mesmo. Portanto, não sendo o caso de absolvição sumária, a pretensão defensiva deve ser rejeitada, cabendo ao Tribunal do Júri, juiz natural da causa, a análise aprofundada da questão. 2. DA ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA EM RELAÇÃO AO CRIME DE FUGA DO LOCAL DO ACIDENTE – ESTADO DE NECESSIDADE O recorrente também pleiteia sua absolvição sumária em relação ao crime de fuga do local do acidente (artigo 305 do CTB), com fundamento no artigo 415, IV, do CPP, c/c artigo 23, I, do Código Penal, alegando ter agido em estado de necessidade, ante o temor de linchamento por populares. Sustenta que apenas se evadiu do local devido às ameaças e ao receio de linchamento pelas pessoas que estavam no local do acidente, conforme teria relatado em seu interrogatório, tanto na fase policial quanto judicial, e corroborado pelas testemunhas Albert Matheus Ramos da Silva, Anderson Gonçalves dos Santos e Josielle Millena Campos da Silva. Contudo, tal como ocorre em relação ao pedido anterior, não verifico a presença dos requisitos necessários para a absolvição sumária com base em excludente de ilicitude. Para o reconhecimento do estado de necessidade é imprescindível a demonstração inequívoca de todos os seus elementos constitutivos, quais sejam: a) situação de perigo atual; b) perigo não provocado voluntariamente pelo agente; c) inevitabilidade do comportamento lesivo; d) inexigibilidade de sacrifício do bem ameaçado; e) conhecimento da situação justificante. No caso em análise, não há prova inequívoca da existência de perigo atual e concreto que justificasse a fuga do local do acidente sem prestar socorro às vítimas. Os depoimentos colhidos nos autos apresentam versões contraditórias acerca das reais circunstâncias que teriam motivado a saída do recorrente do local. A testemunha Augusto Renato Magri Arantes, investigador de polícia, afirmou categoricamente que "pelo horário e pela condição climática, tava chovendo, não tinha aglomeração de gente, pra risco de linchamento, que é o que poderia se alegar, de fuga do local pra preservar a integridade, né. Tava bem tarde, por sinal, e bem chuvoso." Ademais, mesmo considerando as declarações do recorrente e das testemunhas arroladas pela defesa, estas não são suficientes para comprovar, de forma inequívoca, a existência de um perigo atual e real que justificasse sua saída do local sem prestar assistência às vítimas. É importante ressaltar que, conforme depoimentos colhidos, o recorrente, ao invés de acionar diretamente os serviços de emergência (SAMU, Polícia), optou por ligar para seu amigo Paulo Ricardo, o que demonstra, ao menos a princípio, a intenção de se evadir do local. Desta forma, não estando cabalmente demonstrada a situação de estado de necessidade, não há como acolher o pedido de absolvição sumária em relação ao crime de fuga do local do acidente, devendo a questão ser submetida à análise do Tribunal do Júri, que decidirá, com soberania, sobre a existência ou não da excludente alegada. 3. DA DESCLASSIFICAÇÃO DOS CRIMES DE HOMICÍDIO CONSUMADO E TENTADO Subsidiariamente, o recorrente pugna pela desclassificação dos crimes de homicídio consumado e tentado para os delitos de homicídio culposo e lesão corporal culposa na direção de veículo automotor, previstos nos artigos 302 e 303 do Código de Trânsito Brasileiro, sob o fundamento da ausência de dolo eventual. Argumenta que o excesso de velocidade por si só não caracteriza dolo eventual, mas sim imprudência, e que não estava em velocidade exorbitante, já que trafegava a 69 km/h, ou seja, 29 km/h acima do limite permitido para a via (40 km/h), o que não ultrapassaria o limite de 50 km/h acima da velocidade permitida, estabelecido pelo artigo 291, §1º, III, do Código de Trânsito Brasileiro como impeditivo de benefícios processuais. Alega ainda que a vítima também teria contribuído para a ocorrência do acidente, pois estaria trafegando a uma velocidade aproximada de 53 km/h, também acima do permitido, em uma via que não seria preferencial, segundo o disposto no artigo 29, III, "c", do Código de Trânsito Brasileiro. Sobre a pretensão desclassificatória, é importante esclarecer que, para que ocorra a desclassificação nesta fase processual, é necessário que exista prova cabal, incontroversa, de que o crime praticado não é doloso contra a vida, o que não se verifica no caso em análise. A linha divisória entre dolo eventual e culpa consciente é tênue, residindo basicamente no elemento volitivo, ou seja, na aceitação ou não do resultado pelo agente. Consoante a doutrina e a jurisprudência, no dolo eventual o agente prevê o resultado como possível e, mesmo assim, assume o risco de produzi-lo, prosseguindo na prática da conduta. Já na culpa consciente, embora o agente também preveja o resultado como possível, acredita sinceramente que conseguirá evitá-lo, não o aceitando. No caso em tela, existem elementos nos autos que indicam, ao menos nesta fase processual, a possibilidade de configuração do dolo eventual. Conforme destacado na decisão de pronúncia e corroborado pelos depoimentos testemunhais, o recorrente dirigia um veículo de grande porte (Dodge Ram) em alta velocidade, durante a noite, em condições climáticas adversas (chuva), e não respeitando os quebra-molas invertidos existentes no trajeto. A testemunha Anderson Gonçalves dos Santos, que presenciou o momento do acidente, foi categórica ao afirmar que o recorrente conduzia o veículo em "altíssima velocidade" e "rampando os quebra-molas invertidos", tendo declarado que "foi uma roleta russa, né, ele ia fazendo, em todos os cruzamentos. Mesmo com os quebra-molas invertidos (...) a velocidade era muito grande". Questionado pelo assistente de acusação, a testemunha afirmou expressamente que o recorrente "assumiu o risco de matar. Ou de morrer também, né. De tirar a sua própria vida." Por sua vez, os investigadores de polícia Augusto Renato Magri Arantes e Anderson Antonio da Silva confirmaram, com base nas imagens coletadas, que o recorrente dirigia em velocidade incompatível com a via e não reduziu a velocidade em nenhum dos cruzamentos percorridos. Diante desse contexto fático, não é possível afirmar, de plano e com a certeza necessária, que o recorrente agiu apenas com culpa, e não com dolo eventual. A dúvida acerca do elemento subjetivo que norteou a conduta do agente deve ser dirimida pelo Conselho de Sentença, juiz natural da causa, após amplo debate em plenário. Cumpre destacar que, embora o Superior Tribunal de Justiça tenha firmado entendimento de que o binômio embriaguez ao volante e excesso de velocidade não implica, necessariamente, a presença de dolo eventual, no caso em análise, outros elementos fáticos indicam, em tese, a possibilidade de sua configuração, como a condução de veículo de grande porte, em alta velocidade, durante a noite, com chuva e sem reduzir nos quebra-molas invertidos. O fato de o recorrente estar a 29 km/h acima da velocidade permitida para a via não é, por si só, determinante para afastar o dolo eventual, especialmente quando considerado o conjunto das circunstâncias em que ocorreu o acidente. Quanto à alegação de que a vítima teria contribuído para o acidente por também estar em excesso de velocidade e por não estar em via preferencial, trata-se de matéria que demanda análise aprofundada do conjunto probatório, não sendo possível sua aferição de forma definitiva neste momento processual. O laudo pericial apresentado pela defesa, que afirma que o veículo conduzido pela vítima trafegava a aproximadamente 53 km/h e que o recorrente teria preferência no cruzamento por estar à direita da vítima, nos termos do artigo 29, III, "c", do CTB, não é suficiente para, de plano, afastar o dolo eventual e impor a desclassificação pretendida. Ademais, o próprio laudo pericial oficial juntado aos autos (ID n.º 45722910 - Pág. 26) afirma que "Não há no local nenhuma indicando qual a via preferencial, portanto, os peritos ficam impossibilitados de afirmar com base nas informações de local, qual veículo detinha preferência de trânsito". Portanto, havendo dúvida razoável acerca da caracterização do elemento subjetivo da conduta do agente – se dolo eventual ou culpa consciente –, impositiva é a manutenção da decisão de pronúncia, devendo a questão ser submetida ao Tribunal do Júri, que decidirá, com soberania, sobre a existência ou não do dolo. 4. DA DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE FUGA DO LOCAL DO ACIDENTE Por fim, o recorrente pleiteia, subsidiariamente, a desclassificação do crime de fuga do local do acidente (artigo 305 do CTB) para o crime de omissão de socorro (artigo 304 do CTB), alegando a ausência de dolo específico de se eximir da responsabilidade penal ou civil. Sustenta que sua fuga do local foi motivada pelo medo de linchamento, tratando-se de um dolo genérico, e não do dolo específico exigido para a configuração do crime do artigo 305 do CTB. No entanto, tal como ocorre em relação ao pedido de desclassificação dos crimes de homicídio, não verifico a possibilidade de acolhimento da pretensão defensiva neste momento processual. A conexão entre os crimes dolosos contra a vida e outros delitos atrai a competência do Tribunal do Júri para o julgamento de todos eles, conforme preceitua o artigo 78, I, do Código de Processo Penal. Neste sentido, as questões relacionadas aos crimes conexos - como materialidade e autoria delitiva, bem como a presença de eventuais causas de isenção de pena ou de exclusão do crime - que exigem valoração fático-probatória definitiva, são de natureza meritória e escapam ao juízo prelibatório, devendo, por isso, ser também submetidas e analisadas pelo Conselho de Sentença em sua integralidade. É defeso ao julgador togado fazer qualquer juízo de mérito em relação aos crimes conexos ainda na primeira etapa do procedimento bifásico do Tribunal do Júri, sob pena de usurpação da competência constitucional atribuída ao Conselho de Sentença. Neste sentido, já se manifestou o Tribunal de Justiça de Mato Grosso: “[...] Na fase da pronúncia, tendo em vista a sua natureza de simples juízo de admissibilidade da imputação, não é dado decidir se está presente ou não a figura delitiva tida como conexa, cujos pressupostos, autoria e materialidade deverão ser apreciados pelo Conselho de Sentença, juízo natural da causa. [...](N.U 1002230-31.2022.8.11.0006, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RUI RAMOS RIBEIRO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 03/12/2024, Publicado no DJE 09/12/2024) “[...] Compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes dolosos contra a vida e os a eles conexos, e não havendo provas de que o réu portasse a arma com o fim único de praticar o delito de homicídio, improcede, nesta fase sumária, a exclusão do crime do artigo 14 da Lei n. 10.826/03 da decisão de pronúncia. “Se os preceitos normativos foram observados e integrados à fundamentação, afigura-se ‘desnecessário que o julgador esmiúce cada um dos argumentos e dispositivos legais tidos por violados, bastando que esclareça os motivos que o levaram à determinada conclusão’ (TJDF, RESE nº 20120510091147)” [TJMT, Ap. 83322/2015, DES. MARCOS MACHADO, SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL, Julgado em 11/11/2015, Publicado no DJE 19/11/2015]. (N.U 1004078-08.2021.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, ORLANDO DE ALMEIDA PERRI, Primeira Câmara Criminal, Julgado em 20/07/2021, Publicado no DJE 23/07/2021) O Enunciado Orientativo n. 38 do TJMT: “Ao Tribunal do Júri compete o julgamento dos crimes dolosos contra a vida e os a eles conexos, entre eles, o delito de porte ilegal de arma de fogo utilizada pelo agente, sob pena de afronta à Constituição Federal”. Desta forma, inviável o acolhimento do pedido de desclassificação do crime de fuga do local do acidente (artigo 305 do CTB) para o crime de omissão de socorro (artigo 304 do CTB), devendo a questão ser submetida à análise do Tribunal do Júri, que decidirá, com soberania, sobre a correta tipificação da conduta. Diante do exposto, em consonância com o parecer ministerial, NEGO PROVIMENTO ao recurso em sentido estrito, mantendo integralmente a decisão de pronúncia de ELITON CARLOS ZARDO, determinando que seja submetido a julgamento perante o Tribunal do Júri da Comarca de Barra do Bugres. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 04/06/2025

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