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Aneli Do Carmo Valentim x Banco Bmg S.A. e outros

ID: 330340033

Tribunal: TJMT Órgão: 1ª VARA DE CAMPO NOVO DOS PARECIS Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1001281-98.2024.8.11.0050

Data de Disponibilização: 21/07/2025

Polo Ativo:

ANELI DO CARMO VALENTIM

Polo Passivo:

BANCO BMG S.A. BANCO DAYCOVAL S.A.

Sentença

Advogados:

IGNEZ LUCIA SALDIVA TESSA

OAB/ES XXXXXX Desbloquear

DAYANE DA SILVA ROCHA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

JOSELIA RIBEIRO DA SILVA REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO JOSELIA RIBEIRO DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

SERGIO GONINI BENICIO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA DE CAMPO NOVO DOS PARECIS SENTENÇA Número do Processo: 1001281-98.2024.8.11.0050 REQUERENTE: AUTOR: ANELI DO CARMO VALENTIM REQUERIDO: REU: BANCO BMG S.… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 1ª VARA DE CAMPO NOVO DOS PARECIS SENTENÇA Número do Processo: 1001281-98.2024.8.11.0050 REQUERENTE: AUTOR: ANELI DO CARMO VALENTIM REQUERIDO: REU: BANCO BMG S.A., BANCO DAYCOVAL S.A. Vistos etc., Trata-se de ação declaratória de nulidade de contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável c.c inexistência de débito c.c restituição de valores c.c indenização por dano moral com pedido de tutela de urgência antecipada proposta por ANELI DO CARMO VALENTIM em desfavor de BANCO BMG S.A. e BANCO DAYCOVAL S.A., ambos qualificados nos autos. Narra a exordial que a parte requerente constatou em seu beneficio previdenciário diversos descontos empreendidos pelas rés decorrentes de empréstimos consignados, nos valores de R$ 47,70 (quarenta e sete reais e setenta centavos); e R$ 60,60 (sessenta reais e sessenta centavos), incluídos, respectivamente, em 08/03/2018 e 08/11/2022. Relata, entretanto, que desconhece tal cobrança e o contrato que lhe originou. Assim, pugnou pela concessão de tutela de urgência consistente na determinação ao réu que se abstenha de realizar descontos mensais nos valores supramencionados, decorrentes dos empréstimos consignados não contratos, bem como proceda ao cancelamento das deduções indevidas. No mérito, requer seja declarado a nulidade do negócio jurídico e a inexistência do contrato com a cessação dos descontos mensais, bem como pugna pela devolução em dobro os valores subtraídos indevidamente, além de indenização por danos morais. A inicial foi recebida ao ID 156357766, tendo o juízo indeferido a tutela de urgência pleiteada. A parte requerida, Banco Daycoval S/A, apresentou contestação ao ID 158870124, pugnando pela inaplicabilidade da inversão do ônus da prova, além de questões de mérito. Ao ID 164801542, o requerido, Banco BMG S.A., ofereceu contestação pleiteando, em síntese, a improcedência da demanda. O autor apresentou impugnação ao ID 181750547/181750547. Em decisão saneadora proferida ao ID 182110302, o CDC foi aplicado ao caso com consequente inversão do ônus da prova; fixado os pontos controvertidos; e determinado a intimação das partes para informar as provas que pretendiam produzir. Instadas, a autora e a ré, Banco Daycoval S.A., pugnaram pela produção de prova oral consistente no depoimento pessoal da parte autora (IDS 182396873 e 183156874). Em contrapartida, o requerido, Banco BMG S.A., requereu o julgamento antecipado do feito ao ID 183619567. Audiência de Instrução e Julgamento realizada ao ID 193196990 com o depoimento pessoal da parte autora e oitiva de testemunhas. Após, as partes apresentaram alegações finais escritas (IDs 194818927, 194919960 e 195301809). Vieram-me os autos conclusos. É o relato do necessário. Fundamento e DECIDO. Nos termos do artigo 487, inciso I, passo ao julgamento do mérito. Segundo a regra contida nos artigos 336 e 341 do Código de Processo Civil/2015, compete ao Réu alegar, na contestação, toda a matéria de defesa, expondo as razões de fato e de direito que impugna o pedido do Autor, sob pena de presumirem verdadeiros os fatos não impugnados. No caso em apreço, o autor impugna a validade da contratação de dois empréstimos consignados que teriam sido realizados em seu nome junto às instituições financeiras rés. O primeiro contrato foi firmado com o BANCO BMG S.A., no valor de R$ 1.265,00, estando registrado sob o nº 13656610. O segundo, por sua vez, foi celebrado com o BANCO DAYCOVAL S.A., no montante de R$ 1.660,00, identificado pelo nº 53-1764304/22. Pois bem. Em sua defesa, o Banco Daycoval S.A. anexou aos autos o documento intitulado “Termo de Adesão às Condições Gerais de Emissão e Utilização do Cartão de Benefício Consignado” n. 53-1764304/22 (ID 158870127), formalizado por meio de assinatura digital com validação biométrica facial, além disso, o referido instrumento apresenta o valor total contratado, o qual é compatível com os lançamentos identificados no extrato do benefício previdenciário da autora (ID 156031289), embora este não detalhe os valores exatos das deduções mensais. Destaca-se, ainda, que o número do contrato indicado no termo de adesão (n. 53-1764304/22) corresponde precisamente àquele que consta no histórico de empréstimos consignados da autora, o que reforça a vinculação objetiva entre a contratação e os descontos realizados. Ademais, foram juntadas aos autos fotografias do documento pessoal de identificação da demandante, utilizadas, ao que tudo indica, para a validação biométrica da assinatura digital, o que contribui para reforçar a autenticidade formal da contratação. Por fim, verifica-se convergência entre a data de formalização do contrato e a data de inclusão do débito no benefício previdenciário, além da compatibilidade entre o valor ajustado e aquele lançado a débito, circunstâncias que, em seu conjunto, conferem verossimilhança à alegação de que a contratação foi regularmente realizada pela autora. Nessa esteira, causa evidente estranheza a inconsistência da narrativa apresentada pela autora ao longo da demanda, o que compromete a credibilidade de sua alegação de desconhecimento da contratação, uma vez que, na petição inicial, afirmou ter tomado ciência da existência do contrato ao procurar uma instituição financeira com o intuito de solicitar novo empréstimo, sendo então surpreendida com a informação de que já havia um cartão RMC vinculado ao seu benefício previdenciário. Todavia, em audiência de instrução, ao ser ouvida em juízo, a autora alterou substancialmente essa versão, passando a afirmar que só teve conhecimento da contratação quando recebeu, em sua residência, um cartão que alegadamente jamais solicitou. Essa contradição entre os relatos prestados em momentos processuais distintos afasta a verossimilhança de sua narrativa e fragiliza a tese de ausência de consentimento na contratação, sobretudo diante dos elementos objetivos apresentados pela instituição financeira, os quais denotam regularidade formal e vinculação direta com o benefício da demandante. Nessa toada, preleciona o colendo Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso. In verbis: “Recurso Inominado nº 1002463-07.2022.8.11.0013. Origem: Juizado Especial Cível de Pontes e Lacerda. Recorrente: TELEFÔNICA BRASIL S.A. Recorrida: JAQUELINE MOTA MORAIS. Data do Julgamento: 17/02/2023. E M E N T A RECURSO INOMINADO - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - ALEGAÇÃO DE FRAUDE - FATURAS TELEFÔNICAS APRESENTADAS PELA RECLAMADA - NEGATIVAÇÃO LEGÍTIMA - DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DO DÉBITO - INDEVIDA – RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1. Comprovada a contratação dos serviços, resta demonstrada a relação jurídica, não havendo que se falar em ato ilícito, porquanto a contratação foi feita e não houve comprovação do pagamento. 2. Não pratica ato ilícito a empresa que, verificando o inadimplemento da dívida, insere o nome do consumidor nos órgãos de proteção ao crédito, agindo no exercício regular do direito. 3. Não havendo falha na prestação do serviço, não há que se falar em indenização por dano moral e declaração de inexistência do débito. 4. Recurso conhecido e provido.” (TJ-MT 10024630720228110013 MT, Relator: VALDECI MORAES SIQUEIRA, Data de Julgamento: 17/02/2023, Turma Recursal Única, Data de Publicação: 17/02/2023). Logo, a meu ver, a referida contratação questionada pelo autor foi comprovada pelo réu, não havendo ato ilícito a ser reparado, tampouco nulidade ou inexistência a ser declarada. Não obstante, o liame jurídico que envolve as partes está circunscrito dentro dos limites permissivos da legalidade, de modo que é impossível a repetição dos valores descontados, tendo em vista a legitimidade da cobrança. Não há, portanto, fundamento para anular o ato jurídico e afastar as cobranças no caso em tela. Consequentemente, não há que se falar em indenização por dano moral. É o que indica a jurisprudência da egrégia Corte Estadual. Ipsis litteris: “EMENTA RECURSO INOMINADO – DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO – REPETIÇÃO DE INDÉBITO – DANOS MORAIS – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA–INSURGÊNCIA RECLAMANTE - RELAÇÃO JURÍDICA COMPROVADA - LEGALIDADE DE COBRANÇA – PRELIMINARES - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1.A parte reclamada apresentou, em contestação, documentos que comprovam o valor do adiantamento do 13º salário do reclamante, o valor total do financiamento e o valor dos descontos em conta. 2. Restando evidenciada a existência de relação jurídica entre as partes, assim como, o valor total do adiantamento do 13º salário e da operação financeira, os descontas constituem exercício regular de direito e não dá ensejo à repetição de indébito e indenização por dano moral. 3. Sentença mantida. 4. Recurso conhecido e não provido.” (TJ-MT 10052134920218110002 MT, Relator: LUIS APARECIDO BORTOLUSSI JUNIOR, Data de Julgamento: 13/12/2022, Turma Recursal Única, Data de Publicação: 15/12/2022). Logo, diante da regularidade documental comprovada e da fragilidade da narrativa da autora, notadamente pelas contradições verificadas, impõe-se o indeferimento do pedido inicial relativo ao corréu Banco Daycoval S.A. Por sua vez, em contestação, a requerida Banco BMG S.A. alega a legitimidade da contratação, anexando aos autos o suposto contrato (ID 164801560) firmado entre as partes, devidamente assinado pela autora. Todavia, verifica-se no presente caso que a ré deixou de instruir os autos com documento hábil que autorizasse o reconhecimento da legitimidade da referida contratação. Alega que o negócio jurídico guerreado é oriundo do “TERMO DE ADESÃO CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO BANCO BMG E AUTORIZAÇÃO PARA DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO” n. 38834526, formalizado em 04/09/2015, constante no ID 164801560. Todavia, analisando detidamente o citado instrumento jurídico extrai se tratar de contrato diverso daquele impugnado pela autora, vez que possuem numeração diferente e foram firmados em datas divergentes, além disso, não é possível verificar o limite do cartão contrato através do documento de n. 38834526, e, caso o extrato de pagamento de ID 164801560/pág. 7 corresponda ao valor do crédito supradito, este se afasta, e muito, do montante supostamente pactuado e impresso ao Histórico de Empréstimo Consignado de ID 156031289. Nessa toada, indico pormenorizadamente as discrepâncias entre os contratos em questão: o contrato impugnado pela parte autora é identificado sob o n. 13656610, datado de 08/03/2018, e apresenta como valor do crédito o montante de R$1.265,00 (ID 156031289/pág. 5). Por outro lado, o instrumento apontado pela ré como legítimo corresponde ao contrato n. 38834526 (ID 164801560/pág. 1-3), firmado em 04/09/2015, cujo suposto valor, conforme se infere do extrato de pagamento constante no ID 175201662/pág. 5, seria de R$ 788,00. Dessa forma, resta evidente que se trata de negócios jurídicos distintos, tanto quanto à numeração e data de contratação quanto ao valor efetivamente disponibilizado, o que enfraquece a tese de legitimidade da contratação defendida pela parte ré. Na mesma linha, também não se pode conferir valor probante ao áudio apresentado pela parte requerida ao ID 164801568. Isso porque, além de não haver qualquer menção à data da suposta contratação, o conteúdo revela referência a quantia de apenas R$ 200,00, completamente destoante do valor de R$ 1.265,00 que figura no contrato impugnado pela parte autora. Assim, perante a ausência de elementos objetivos que vinculem o áudio ao negócio jurídico efetivamente controvertido nos autos, impõe-se reconhecer que se trata de contratação distinta e avulsa, não servindo, portanto, como comprovação da legitimidade do ajuste objeto da presente demanda. Nesse ínterim, preleciona a colenda Corte Estadual. In verbis: “AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO C/C DANOS MORAIS. CESSÃO DE CRÉDITO. NEGATIVAÇÃO. TERMO DE CESSÃO CRÉDITO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA RECLAMANTE. AUSÊNCIA DO CONTRATO ORIGINAL. APENAS TERMO DE CESSÃO DE CRÉDITO E TELAS SISTÊMICAS. FATURAS DE CONSUMO SEM INDICAÇÃO DE CONTA E AGÊNCIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA RELAÇÃO CONTRATUAL. INSCRIÇÃO INDEVIDA. DANO MORAL CONFIGURADO. DANO IN RE IPSA. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO 1. Recurso inominado. Sentença de improcedência. 2. Pretensão recursal é o julgamento de procedência para declarar a inexigibilidade do débito discutido na lide e condenar a parte ré em danos morais. 3. Diante da negativa do consumidor em ter celebrado contrato com a empresa Recorrida, cabia a esta o ônus de provar a regularidade do débito, entretanto, não acostou aos autos documentação capaz de demonstrar a existência ou validade do crédito que alega ter sido objeto de cessão de crédito. 4. Os documentos juntados à contestação, desacompanhados do contrato originário do débito, entre o consumidor e a Banco cedente nada esclarecem a respeito da controvérsia, porquanto não demonstra sequer a legitimidade do débito. 5. Como cediço, o dano moral decorrente do cadastro indevido nos órgãos restritivos de crédito caracteriza-se como “in re ipsa”, prejuízo verificável pela própria ocorrência do evento, não necessitando de demonstração. 6. Sentença reformada. 7. Recurso conhecido e parcialmente provido.” (TJ-MT 10185868720208110001 MT, Relator: LUIS APARECIDO BORTOLUSSI JUNIOR, Data de Julgamento: 17/08/2021, Turma Recursal Única, Data de Publicação: 19/08/2021). Diante disso, em que pese as razões da primeira requerida, no caso, não há como afastar a sua responsabilidade diante da teoria objetiva adotada pelo Código de Defesa do Consumidor. No caso é clara a ofensa aos direitos do consumidor que se encontra protegido, além da Lei Civil, pelo Código de Defesa do Consumidor que veio ao nosso ordenamento jurídico para suprir a sua hipossuficiência, norma esta para sua defesa e proteção, consideradas de ordem pública e de interesse social, em atenção previsão constitucional contida nos artigos 5º, inciso XXXII, 170, inciso V, e artigo 48 das Disposições Transitórias. Com efeito, o que se tem de relevante para o deslinde da controvérsia é que a parte autora sustenta que nunca celebrou qualquer tipo de contrato com corréu Banco BMG S.A. que autorizasse a cobrança. Assim, alega como fato constitutivo do seu direito a inexistência de negócio jurídico firmado com a parte ré e esta, embora alegue a relação jurídica, deixou de instruir os autos com documento hábil que autorizasse o reconhecimento da legitimidade da cobrança de crédito cedido. Ressalta-se que a controvérsia se limita a legalidade ou não da contratação. Com efeito, competia à parte ré comprovar o negócio jurídico consubstanciado na relação jurídica da parte autora com a empresa e a legitimidade da contratação, com a comprovação da origem do negócio jurídico. Assim como a primeira requerida não comprova a legitimidade da contratação de Reserva de Margem para Cartão (RMC), a declaração de inexistência dos débitos oriundos do contrato n. 13656610 é medida que se impõe. No caso, portanto, restou caracterizada a prestação defeituosa de serviços bancários no que concerne aos descontos relativos ao contrato n. 13656610, ensejando o dever de devolução, em dobro, dos valores mensais indevidamente descontados. É o que preleciona o exímio Superior Tribunal de Justiça. In verbis: “RECURSO ESPECIAL. BANCÁRIO. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. TARIFA DE MANUTENÇÃO DE TÍTULO VENCIDO. COBRANÇA. PESSOA JURÍDICA. PREVISÃO CONTRATUAL. NECESSIDADE. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. MÁ-FÉ. INEXISTÊNCIA. ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC. AFASTAMENTO. (...) 6. A aplicação do parágrafo único do art. 42 do Código de Defesa do Consumidor, que determina a devolução em dobro do indébito, exige, além da cobrança de quantia indevida, a configuração de má-fé do credor, o que não se verifica no caso em apreço. 7. Recurso especial parcialmente provido.” ( REsp 1626275/RJ. Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva. Terceira Turma. Julgamento em 04/12/2018. DJe 07/12/2018). Na colenda Corte Estadual o entendimento não destoa. Ipsis litteris: APELAÇÃO CÍVEL – REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS E MORAIS – CONTA BANCÁRIA – COBRANÇA INDEVIDA DE TARIFAS BANCÁRIAS – CONTRATAÇÃO DE PACOTE DE SERVIÇOS NÃO COMPROVADA – DEFEITO NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS EVIDENCIADA - REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO– NECESSIDADE – INTELIGÊNCIA DO ART. 42 DO CDC - DANO MORAL CONFIGURADO - DANO IN RE IPSA – RECURSO DO AUTOR PROVIDO – RECURSO DO BANCO NÃO PROVIDO. É abusiva a cobrança de tarifas bancárias em conta aberta apenas para recebimento de proventos de aposentadoria, máxime quanto não comprovada a contratação/utilização do pacote de serviços. Considerando que a instituição financeira efetuou descontos, sem a existência de relação jurídica capaz de alicerçar essa conduta, é evidente o dano material suportado, ensejando a repetição do indébito e, dobro, porque evidenciada a má-fé na cobrança de serviços não contratados. Sofre abalo psicológico, passível de indenização, pessoa que tem descontado indevidamente da conta bancária utilizada para recebimento de benefício previdenciário, valores relacionados a tarifas por serviços não contratados. O dano decorre diretamente do ato ilícito perpetrado pela requerida, consistente na efetivação de descontos, sem prova da contratação dos serviços, tendo em vista que esse tipo de dano é in re ipsa, ou seja, prescinde de comprovação. (TJ-MT 10003061220208110052 MT, Relator: SERLY MARCONDES ALVES, Data de Julgamento: 03/11/2022, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 04/11/2022). Eis o teor do art. 42, parágrafo único do CDC: Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça. Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. Percebe-se que a conduta exigida para a repetição em dobro do indébito se refere à violação da boa-fé em sua acepção subjetiva, entendida como a crença do fornecedor em estar agindo conforme o Direito. Considerando que a instituição financeira efetuou descontos no benefício previdenciário do autor, sem a existência de relação jurídica capaz de alicerçar essa conduta, é evidente a violação à boa-fé subjetiva no caso em tela, autorizando a repetição do indébito, na forma qualificada. Sendo assim, é caso de condenação da ré, Banco BMG S.A., a devolver, em dobro, os valores descontados do benefício previdenciário da autora relativos ao contrato n. 13656610. Relativamente ao pedido de indenização por dano moral formulado na exordial em face da primeira requerida, tenho que comporta procedência. Como bem se sabe, a CF/88 autoriza a reparação dos danos materiais, nos termos do artigo 5º, X, nestes termos: “Art. 5. (...) X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.” Por sua vez, a responsabilidade civil decorre da ilicitude, ou seja, quando o agente age em desconformidade ao ordenamento jurídico, lesando direito privado. A teoria da responsabilidade civil tem por base fundamental o preceito de que a ninguém é dado causar prejuízo a outrem, regra consagrada no artigo 186, do Código Civil, in verbis: “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” Do dispositivo, colhem-se os elementos da responsabilidade civil, quais sejam a conduta humana (positiva ou negativa), o dano ou prejuízo, bem como o nexo de causalidade entre a conduta e o dano. Uma vez constatado o dano, cabe ao causador do prejuízo repará-lo, consoante art. 927, do Código Civil, litteris: “Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.” No caso em exame, restou devidamente comprovado nos autos que a parte autora não contratou o serviço representado pelo contrato n. 13656610. Comprovou-se que a operação foi realizada à sua revelia, inexistindo manifestação válida de vontade, o que resultou, inclusive, na anulação do suposto contrato. A autora é idosa, recebe reduzido benefício previdenciário e foi privada de valores essenciais à sua subsistência, indevidamente, em razão da conduta da ré. Por isso, não se pode afirmar que tenha sofrido mero aborrecimento, justificando-se a reparação por dano moral em sua dupla finalidade, compensatória e punitiva. Assim, evidenciada a falha na prestação de serviço por parte da instituição financeira, encontra-se caracterizado o ato ilícito, uma vez que a conduta perpetrada pela ré representa afronta direta à esfera moral do autor, que se viu surpreendido com desconto indevido em seus proventos e com os transtornos decorrentes da necessidade de buscar o Poder Judiciário para desconstituir obrigação inexistente. O dano moral, nesse contexto, prescinde de comprovação específica, uma vez que é presumido (in re ipsa) diante da própria gravidade da violação perpetrada, conforme já decidiu o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, em julgamento recente: RECURSO INOMINADO – DESCONTOS INDEVIDOS DE VALORES DOS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS DA AUTORA – DIREITO À REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO COMO PRESCREVE O ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC – DANO MORAL CONFIGURADO IN RE IPSA – QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJ-MT 10395471220218110002 MT, Relator: GONCALO ANTUNES DE BARROS NETO, Data de Julgamento: 04/08/2022, Turma Recursal Única, Data de Publicação: 08/08/2022) (destaquei); APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE – INEXIGIBILIDADE DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS – DESCONTO DE VALORES EM CONTA QUE RECEBE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO – RESTITUIÇÃO EM DOBRO – DANO MORAL IN RE IPSA – DEVER DE INDENIZAR CONFIGURADO – QUANTUM INDENIZATÓRIO – OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE – PRECEDENTES DO STJ – TERMO DE INCIDÊNCIA DOS JUROS DE MORA – EVENTO DANOSO – RECURSO CONHECIDO E CONHECIDO E DESPROVIDO. A instituição financeira, diante da atividade de risco que desenvolve, responde pelas disfunções de seus serviços, absorvendo os danos daí decorrentes, a teor do que disciplina a Súmula nº 479 do STJ. Demonstrado o ato ilícito pelo desconto em aposentadoria por empréstimo consignado não contratado, nasce a obrigação de indenizar os danos morais, independentemente da prova de prejuízo, bem como o de devolver em dobro os valores cobrados indevidamente. A indenização fixada em valor razoável e proporcional ao grau de culpa do ofensor, à extensão dos danos e à capacidade econômica das partes não comporta alteração. Os juros de mora, no caso de responsabilidade extracontratual, incidem a partir do evento danoso (Súmula nº 54 do STJ). (TJ-MT 10007691720218110052 MT, Relator: DIRCEU DOS SANTOS, Data de Julgamento: 08/02/2023, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 14/02/2023) (destaquei). Assim, evidenciada a falha na prestação de serviço por parte do Banco BMG S.A., que permitiu a formalização de empréstimo sem a devida autorização do consumidor, encontra-se caracterizado o ato ilícito ensejador de reparação por danos morais. Passo à análise, portanto, do quantum indenizatório, cuja finalidade se assenta tanto no efeito repressivo-pedagógico do agente, como também na satisfação do ofendido, sem, contudo, representar um enriquecimento sem causa. Quanto a esse aspecto, o juiz deve estar atento a todas as circunstâncias que regem o caso concreto, firme nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, assim como nas diretrizes do art. 944 do Código Civil Brasileiro. Sobre o tema, Rui Stoco, em sua obra Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial, Ed. Revista dos Tribunais, 3ª ed., 1997, p. 564, sustenta que: “(...) o eventual dano moral que ainda se possa interferir, isolada ou cumulativamente, há de merecer arbitramento tarifado, atribuindo-se valor fixo e único para compensar a ofensa moral perpetrada”. Daí caber ao juiz a árdua tarefa de arbitrar o valor da reparação, sem que possibilite lucro fácil à parte autora ou reduza a indenização a montante ínfimo ou simbólico. A doutrina e a jurisprudência têm procurado estabelecer parâmetros para o arbitramento do valor da indenização, traduzidos, por exemplo, nas circunstâncias do fato, bem como nas condições do autor do ilícito e do ofendido, devendo a condenação corresponder a uma sanção ao responsável para que não volte a cometê-lo. Também há de se levar em consideração que o valor da indenização não deve ser excessivo a ponto de constituir-se em fonte de enriquecimento do ofendido, nem apresentar-se irrisório, como observa Maria Helena Diniz: “Na reparação do dano moral, o juiz determina, por equidade, levando em conta as circunstâncias de cada caso, o quantum da indenização devida, que deverá corresponder à lesão e não ser equivalente, por ser impossível, tal equivalência. A reparação pecuniária do dano moral é um misto de pena e satisfação compensatória. Não se pode negar sua função: penal, constituindo uma sanção imposta ao ofensor; e compensatória, sendo uma satisfação que atenue a ofensa causada, proporcionando uma vantagem ao ofendido, que poderá, com a soma de dinheiro recebida, procurar atender a necessidades materiais ou ideais que repute convenientes, diminuindo, assim, seu sofrimento” (“A Responsabilidade Civil por Dano Moral”, in Revista Literária de Direito, ano II, nº 9, jan./fev. de 1996, p. 9). Nossa toada, trago à baila a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. In verbis: “Para a fixação do valor da indenização por danos morais deve-se considerar as condições pessoais e econômicas das partes e as peculiaridades de cada caso, de forma a não haver o enriquecimento indevido do ofendido e que sirva para desestimular o ofensor a repetir o ato ilícito”. (STJ - AGA 425317 - RS - 3ª T. - Relª. Minª. Nancy Andrighi - J. 24.06.02). No caso vertente, embora a conduta da instituição financeira requerida revele-se indiscutivelmente reprovável e merecedora de firme reprimenda judicial, conforme já amplamente fundamentado, não há nos autos elementos que evidenciem repercussão pública significativa, exposição da parte autora a vexame social ampliado ou impactos devastadores em sua vida pessoal, profissional ou familiar que ultrapassem os dissabores ordinariamente decorrentes da indevida contratação e desconto. Trata-se, a rigor, de lesão moral relevante, decorrente de grave falha na prestação do serviço bancário, que comprometeu a esfera de tranquilidade da autora. No entanto, os efeitos permaneceram circunscritos ao âmbito privado da relação de consumo, não havendo prova de abalo de grande repercussão externa. Tal circunstância justifica a fixação da indenização por danos morais em valor inferior ao montante postulado na inicial, sem, contudo, esvaziar a dupla função, compensatória e pedagógica, que a reparação deve desempenhar. Assim, em atenção a todas as circunstâncias que regem o caso concreto, firme nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, reputo correto fixar o valor da indenização em R$ 2.000,00 (dois mil reais). A condenação, nessa quantia, obviamente, não apaga o ilícito cometido pela ré, também não enseja enriquecimento da autora, todavia, coloca a ofensora em situação de alerta para que não volte a violar o patrimônio personalíssimo de outrem. Por fim, no que tange ao pedido de compensação formulado pelo corréu Banco BMG S.A., este não merece acolhida. Com efeito, embora alegue ter realizado transferências em favor da parte autora, não logrou demonstrar, de forma clara e inequívoca, a que títulos tais repasses se referem. Importa destacar que as alegadas transferências realizadas pela parte ré não só carecem de demonstração quanto à sua finalidade específica, como também apresentam caráter esparso e desuniforme, sendo lançadas em diversos períodos ao longo dos anos e, em sua maioria, muito antes da data em que se afirma ter sido formalizado o contrato objeto da presente demanda. Tal circunstância compromete de forma decisiva o nexo de correlação entre os valores transferidos e a obrigação discutida nos autos, revelando-se incompatível com os requisitos exigidos para a compensação legal, a qual, nos termos do artigo 368 do Código Civil, pressupõe reciprocidade de créditos entre as partes. Portanto, não há se falar em compensação no caso dos autos. Feitas tais considerações, a procedência parcial dos pedidos iniciais é a medida que se impõe. Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão contida na inicial para o fim de: a) DECLARAR a inexistência da contratação de Reserva de Margem para Cartão (RMC) decorrente do contrato n. 13656610, datado de 08/03/18; b) CONDENAR o requerido Banco BMG S.A. à restituição em dobro dos valores indevidamente descontados e não estornados em decorrência do contrato mencionado, observada a prescrição quinquenal, corrigidos monetariamente pelo INPC e acrescido de juros de mora de 1% ao mês a partir do desembolso/pagamento de cada dedução indevida (Súmulas n. 43 e 54 do STJ). c) CONDENAR o requerido Banco BMG S.A. ao pagamento da quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais), a título de indenização por danos morais, em favor da autora ANELI DO CARMO VALENTIM, acrescida de correção monetária a partir desta data (data da sentença) (STJ, Súmula 362) e juros moratórios de 1% ao mês a contar do evento danoso (STJ, Súmula 43). E, JULGO IMPROCEDENTES os demais pedidos. CONDENO o primeiro requerido, Banco BMG S.A., ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais arbitro em 10% (dez por cento) da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º do Código de Processo Civil. CONDENO, ainda, exclusivamente o autor ao pagamento de honorários advocatícios ao corréu, Banco Daycoval S.A., os quais arbitro em 10% (dez por cento) do valor da causa, nos termos do artigo 85, § 2º do Código de Processo Civil. Consigno que a exigibilidade da cobrança permanecerá suspensa, em qualquer das hipóteses, desde que a parte seja beneficiária da gratuidade da justiça. Anote-se que, no caso de oposição de embargos de declaração manifestamente protelatórios, aplicar-se-á multa de até 2% sobre o valor da causa, nos termos do artigo 1.026, §2º, do CPC, e, em caso de reincidência, a multa será elevada em até 10%, nos termos do §3º do mesmo artigo. Sobrevindo recurso, certifique-se a tempestividade e intime-se a parte recorrida para contrarrazões. Após, remetam-se ao E. TJMT, com as nossas homenagens. Após o trânsito em julgado, certifique-se e arquivem-se os autos com as devidas baixas e cautelas de estilo. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Cumpra-se, expedindo-se o necessário. Campo Novo do Parecis/MT, data do sistema. BRUNO CÉSAR SINGULANI FRANÇA Juiz de Direito

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Aneli Do Carmo Valentim x Banco Bmg S.A. e outros