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Processo nº 1003165-92.2024.8.11.0041

ID: 276639898

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1003165-92.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 22/05/2025

Polo Ativo:

M. V. D. S.

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

MILTON JONES AMORIM VIEIRA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003165-92.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Atraso de vôo, Overb… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003165-92.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Atraso de vôo, Overbooking] Relator: Des(a). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO Turma Julgadora: [DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, DES(A). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, DES(A). SERLY MARCONDES ALVES] Parte(s): [M. V. D. S. - CPF: 118.350.161-70 (APELANTE), MILTON JONES AMORIM VIEIRA - CPF: 021.624.601-65 (ADVOGADO), ALAN ALMEIDA SANTOS - CPF: 057.257.421-56 (ADVOGADO), JOSE EDUARDO REZENDE DE OLIVEIRA - CPF: 022.271.161-29 (ADVOGADO), FRANKSLANE ANGELICA DA SILVA - CPF: 697.625.621-00 (APELANTE), AZUL LINHAS AEREAS BRASILEIRAS S.A. - CNPJ: 09.296.295/0001-60 (APELADO), FLAVIO IGEL - CPF: 370.018.638-07 (ADVOGADO), LUCIANA GOULART PENTEADO - CPF: 106.909.398-09 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), FRANKSLANE ANGELICA DA SILVA - CPF: 697.625.621-00 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: PROVIDO. UNÂNIME. E M E N T A APELAÇÃO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ATRASO SUPERIOR A 12 HORAS EM VOO. NENHUMA ASSISTÊNCIA AO PASSAGEIRO. AUTOR MENOR DE IDADE. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. SITUAÇÃO QUE ULTRAPASSA O MERO ABORRECIMENTO. REPARAÇÃO DEVIDA. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação de sentença que julgou improcedente Ação de Indenização por Danos Morais decorrentes de atraso superior a 12 horas em voo com conexões. O autor alega que não houve aviso prévio nem assistência adequada. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) analisar se houve falha na prestação do serviço pela companhia aérea, configurando responsabilidade objetiva e dano moral; (ii) avaliar o valor a ser fixado para a reparação, bem como se é aplicável ao caso a inversão do ônus da sucumbência. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A responsabilidade da companhia aérea é objetiva (art. 14 do CDC), independentemente de culpa. 4. A Resolução ANAC n. 400/2016 estabelece a obrigação de assistência material em atrasos superiores a 4 horas, a qual não foi comprovada nestes autos. 5. A ausência de aviso prévio e de assistência adequada em atraso substancial configura falha contratual e gera dano moral presumido (in re ipsa), decorrente da violação da dignidade do consumidor. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Recurso provido. Tese de julgamento: 1. A alteração de voo sem aviso prévio (art. 12 da Resolução n. 400 da ANAC) e a falta de assistência adequada aos passageiros pela companhia aérea caracterizam falha na prestação do serviço contratado e impõem o dever de indenização por dano moral. Dispositivos relevantes citados: CC, artigos 389 e 406, § 1º; CDC, artigos 6º, VIII, e 14; Resolução ANAC n. 400/2016; CPC, art. 85, § 2º; Lei n. 14.905/2024. Jurisprudência relevante citada: TJMT, Quarta Câmara de Direito Privado, AC 1001031-38.2023.8.11.0038, Desa. Serly Marcondes Alves, j. 30-4-2025; AC 1020862-80.2023.8.11.0003, Des. Guiomar Teodoro Borges, j. 5-6-2024; AC 1008332-32.2023.8.11.0007, Desa. Serly Marcondes Alves, j. 10-7-2024; AC 1032718-24.2023.8.11.0041, Des. Guiomar Teodoro Borges, j. 17-7-2024; TJMG, 10000220785612001, 13ª Câmara Cível, relator Roberto Apolinário de Castro (JD convocado), j. 26-5-2022, publicação em 27-5-2022. R E L A T Ó R I O Apelação Cível em Ação de Indenização por Danos Morais julgada improcedente, com a condenação do autor ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade foi suspensa em razão da concessão da justiça gratuita. O apelante, menor de idade, representado nos autos por sua genitora, alega que faz jus à reparação por danos morais decorrentes do cancelamento do voo com itinerário Maceió-AL – Cuiabá-MT, com conexões em Belo Horizonte-MG e Goiânia-GO. Aduz que a partida inicial estava prevista para às 2h55min, com chegada ao destino final às 10h40min do mesmo dia, mas durante a conexão em Goiânia foi informado unilateralmente pela companhia aérea sobre a impossibilidade de embarque no voo seguinte, sob a justificativa de excesso de reservas (overbooking). Ressalta que foi realocado em voo posterior, com saída às 19h5min, chegando em Cuiabá com atraso superior a 12 horas em relação ao horário originalmente contratado. Argumenta que não recebeu aviso prévio nem assistência material adequada durante a longa espera. Destaca que a demora e a incerteza provocaram-lhe transtornos significativos, incluindo abalo emocional e psicológico. Por fim, requer a condenação da apelada em danos morais, além da inversão dos honorários de sucumbência. Contrarrazões no Id 281026354. É o relatório. V O T O R E L A T O R O apelante, menor de idade, representado nos autos por sua genitora, busca indenização por dano moral decorrente do cancelamento de voo originalmente previsto para sair de Maceió-AL com destino a Cuiabá-MT, com conexões em Belo Horizonte-MG e Goiânia-GO, programado para partir às 2h55min, com chegada ao destino final às 10h40min do mesmo dia. Contudo, durante a conexão em Goiânia, o autor foi informado unilateralmente pela companhia aérea que não poderia embarcar no trecho seguinte, devido ao excesso de reservas (overbooking). Em razão disso, foi realocado em voo posterior, com partida às 19h5min, chegando em Cuiabá com atraso superior a 12 horas em relação ao horário contratado. Por se tratar de relação de consumo, aplica-se o CDC, que, no presente caso, determina a inversão do ônus da prova em benefício do consumidor. Confira-se: “Art. 6°. São direitos básicos do consumidor: (...) VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências”. Consoante artigo 14 do CDC, “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”. Importante registrar que o contrato de transporte gera para o transportador uma obrigação de resultado, consistente em conduzir o passageiro ao destino convencionado, observando as condições pactuadas, como data, horário e aeronave. Quando a empresa aérea não cumpre essas cláusulas nem comprova circunstância de força maior ou caso fortuito que justifique a alteração ou cancelamento do voo, responde pelos prejuízos causados. Na presente hipótese, competia à apelada demonstrar que eventuais problemas técnicos impediram a prestação adequada do serviço, ônus do qual não se desincumbiu. Nesse sentido: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE AÉREO. ATRASO DE VOO SUPERIOR A 26 HORAS. FALTA DE ASSISTÊNCIA MATERIAL ADEQUADA. DANO MORAL IN RE IPSA. FORTUITO INTERNO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. RECURSO PROVIDO. (...) IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso provido. Tese de julgamento: 1. A responsabilidade da companhia aérea por atraso de voo é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, sendo irrelevante a demonstração de culpa. 2. Problemas técnicos e operacionais caracterizam fortuito interno e não afastam a responsabilidade da empresa aérea. 3. A assistência material insuficiente diante de atraso superior a 4 horas configura falha na prestação do serviço, nos termos da Resolução nº 400/2016 da ANAC. 4. O dano moral decorrente de atraso substancial em voo e ausência de assistência adequada é presumido, por violar a dignidade do consumidor. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CC, art. 927, parágrafo único; CDC, arts. 6º, VI, 14 e 22; Resolução ANAC nº 400/2016, arts. 8º e 14. Jurisprudência relevante citada: TJMT, Apelação Cível nº 1026027-91.2023.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 29.01.2025, DJE 02.02.2025. (N.U 1001031-38.2023.8.11.0038, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/04/2025, Publicado no DJE 03/05/2025) A Resolução n. 400 da ANAC, ao tratar de atraso, cancelamento, interrupção de serviço e preterição de voos, prevê o seguinte: Art. 21. O transportador deverá oferecer as alternativas de reacomodação, reembolso e execução do serviço por outra modalidade de transporte, devendo a escolha ser do passageiro, nos seguintes casos: I - atraso de voo por mais de quatro horas em relação ao horário originalmente contratado; II - cancelamento de voo ou interrupção do serviço; III - preterição de passageiro; e IV - perda de voo subsequente pelo passageiro, nos voos com conexão, inclusive nos casos de troca de aeroportos, quando a causa da perda for do transportador. Parágrafo único. As alternativas previstas no caput deste artigo deverão ser imediatamente oferecidas aos passageiros quando o transportador dispuser antecipadamente da informação de que o voo atrasará mais de 4 (quatro) horas em relação ao horário originalmente contratado. Assistência material Art. 26. A assistência material ao passageiro deve ser oferecida nos seguintes casos: I - atraso do voo; II - cancelamento do voo; III - interrupção de serviço; ou IV - preterição de passageiro. Art. 27. A assistência material consiste em satisfazer as necessidades do passageiro e deverá ser oferecida gratuitamente pelo transportador, conforme o tempo de espera, ainda que os passageiros estejam a bordo da aeronave com portas abertas, nos seguintes termos: I - superior a 1 (uma) hora: facilidades de comunicação; II - superior a 2 (duas) horas: alimentação, de acordo com o horário, por meio do fornecimento de refeição ou de voucher individual; e III - superior a 4 (quatro) horas: serviço de hospedagem, em caso de pernoite, e traslado de ida e volta. § 1º O transportador poderá deixar de oferecer serviço de hospedagem para o passageiro que residir na localidade do aeroporto de origem, garantido o traslado de ida e volta. (...) § 3º O transportador poderá deixar de oferecer assistência material quando o passageiro optar pela reacomodação em voo próprio do transportador a ser realizado em data e horário de conveniência do passageiro ou pelo reembolso integral da passagem aérea. É incontroverso nos autos que houve atraso superior a 12 horas na chegada ao destino. Além disso, não foi demonstrado que o apelante, menor impúbere, tenha recebido qualquer tipo de assistência. Ademais, a simples juntada de captura de tela do sistema interno da ré configura prova unilateral, frágil e insuficiente para atestar a manifestação de vontade do consumidor. Mesmo que os prints tivessem sido apresentados tempestivamente, não possuem eficácia para comprovar a regularidade do aviso prévio. Sobre a matéria: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - TRANSPORTE AÉREO – CANCELAMENTO DE VOO - REESTRUTURAÇÃO DE MALHA AÉREA – FORTUITO INTERNO – REALOCAÇÃO DE VOO 2 MESES APÓS O PERÍODO CONTRATADO - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO EVIDENCIADA - PRINTS DE TELA SISTÊMICA – PROVA UNILATERAL - DANO MORAL CONFIGURADO - QUANTUM INDENIZATÓRIO ADEQUADO - RECURSO DESPROVIDO. A reestruturação da malha aérea, noticiada nos autos, caracteriza-se como fortuito interno, inerente ao risco da atividade profissional, de modo que é incapaz de isentar a responsabilidade da companhia aérea. O simples cancelamento de voo adquirido pela companhia aérea não caracteriza o dever de indenizar, apenas quando comprovado o prejuízo. O “print” de tela sistêmica colacionada não é prova suficiente para atestar a existência da relação contratual entre as partes, tampouco a legalidade do débito em questão ou mesmo da efetiva prestação de serviço, por tratar-se de prova unilateral. O valor arbitrado a título de danos morais deve levar em conta as circunstâncias do caso concreto, as condições das partes, o grau de culpa e, principalmente, a finalidade da reparação do dano moral, o qual é a de compensar o dano ocorrido, bem como inibir a conduta abusiva. (N.U 1020862-80.2023.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 05/06/2024, Publicado no DJE 08/06/2024) APELAÇÃO CÍVEL – TRANSPORTE AÉREO – CANCELAMENTO DE VOO – COMUNICAÇÃO PRÉVIA AO CONSUMIDOR INDEMONSTRADA - REACOMODAÇÃO – EXCESSIVA DEMORA PARA O VOO REMARCADO – FRUSTAÇÃO NO PLANEJAMENTO DE FÉRIAS – DANO MORAL CARACTERIZADO – PRECEDENTES – SENTENÇA REFORMADA - RECURSO PROVIDO. 1. A alteração de malha aérea, genericamente alegada pela companhia aérea, caracteriza fortuito interno, incapaz de afastar o dever de indenizar. 2. Embora o mero cancelamento ou atraso no início de voo não faça presumir o dano moral, este se configura na hipótese em que a reacomodação é disponibilizada com excessiva demora, causando frustração no planejamento de férias há muito tempo realizado. (N.U 1008332-32.2023.8.11.0007, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 10/07/2024, Publicado no DJE 13/07/2024) EMENTA: APELAÇÃO - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - PRELIMINAR - INDEVIDA CONCESSÃO DA JUSTIÇA GRATUITA - REJEITAR - CONTRATAÇÃO DE SERVIÇO - PRINT DE TELA SISTEMA INTERNO - INSUFICIENTE - PROVA UNILATERAL - FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO - DANOS MORAIS - DAR PROVIMENTO. Sabe-se que, nos termos do art. 98 do Código de Processo Civil, a pessoa física conta com presunção de miséria, entretanto está não é absoluta, devendo ser comprovada a miserabilidade. Comprovada a miserabilidade e deferida à justiça gratuita, está só poderá ser revogada se comprovada a mudança da situação financeira. Incumbe ao Réu comprovar a existência e legitimidade dos negócios jurídicos celebrados, nos termos do artigo 373, inciso II, do CPC, haja vista a impossibilidade da parte Autora produzir prova negativa. Os prints de tela do sistema eletrônico interno, sem documentos pessoais e assinatura da suposta contratante, não têm o condão de comprovar a contratação, pois é prova unilateral, sem dados hábeis a comprovar relação jurídica contratual. Constatada a falha na prestação de serviços a condenação em danos morais é medida que se impõe. (TJ-MG - AC: 10000220785612001 MG, Relator: Roberto Apolinário de Castro (JD Convocado), Data de Julgamento: 26/05/2022, Câmaras Cíveis / 13ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 27/05/2022) Logo, é evidente o ato ilícito que gerou o dano moral, e o valor da reparação deve atender às funções pedagógica, compensatória e punitiva da medida. Assim, mostra-se razoável e proporcional o montante de R$10.000,00 A propósito: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE DANO MORAL - TRANSPORTE AÉREO – ALTERAÇÃO DE VOO – MALHA AÉREA – FORTUITO INTERNO – CONEXÃO DE MAIS DE 9 HORAS - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO EVIDENCIADA - DANO MORAL CONFIGURADO - QUANTUM INDENIZATÓRIO ADEQUADO - RECURSO DESPROVIDO. A ocorrência de problemas técnicos caracteriza-se como fortuito interno, inerente ao risco da atividade profissional, de modo que é incapaz de isentar a responsabilidade da companhia aérea. A alteração de voo adquirido, sem aviso prévio, conforme o estabelecido pelo Art. 12º Resolução Nº 400 da ANAC, bem como a ausência de assistência adequada aos passageiros pela companhia aérea caracteriza falha na prestação do serviço contratado e gera o dever de indenizar. O valor arbitrado a título de danos morais deve levar em conta as circunstâncias do caso concreto, as condições das partes, o grau de culpa e, principalmente, a finalidade da reparação do dano moral, que é a de compensar o dano ocorrido, bem como inibir a conduta abusiva.(N.U 1032718-24.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 17/07/2024, Publicado no DJE 20/07/2024) Outros julgados desta Câmara: AC n. 179407/2016, julgamento em 15-2-2017; AC n. 152984/2016, julgamento em 16-11-2016; AC n. 124263/2015, DJe de 25-9-2015; AC n. 119763/2015, DJe de 21-9-2015, e AC n. 29009/2014, DJe de 7-7-2014. Pelo exposto, dou provimento ao Recurso para reformar a sentença e julgar procedente a Ação. Condeno a apelada ao pagamento de R$10.000,00 de danos morais, corrigidos monetariamente pelo IPCA, conforme apurado pelo IBGE, a partir do arbitramento (Súmula 362 do STJ) acrescidos de juros de mora calculados pela taxa SELIC, deduzido o IPCA, a contar da citação, nos termos dos artigos 389, parágrafo único, e 406, § 1º, do Código Civil, alterados pela Lei n. 14.905/2024. Inverto o ônus da sucumbência, atribuindo-o à apelada, e fixo os honorários advocatícios em 15% sobre o montante da condenação (art. 85, § 2º, do CPC). Data da sessão: Cuiabá-MT, 21/05/2025

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Processo nº 1003165-92.2024.8.11.0041

ID: 276639916

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1003165-92.2024.8.11.0041

Data de Disponibilização: 22/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

AZUL LINHAS AEREAS BRASILEIRAS S.A.

Acórdão

Advogados:

FLAVIO IGEL

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003165-92.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Atraso de vôo, Overb… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1003165-92.2024.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Atraso de vôo, Overbooking] Relator: Des(a). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO Turma Julgadora: [DES(A). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, DES(A). ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, DES(A). SERLY MARCONDES ALVES] Parte(s): [M. V. D. S. - CPF: 118.350.161-70 (APELANTE), MILTON JONES AMORIM VIEIRA - CPF: 021.624.601-65 (ADVOGADO), ALAN ALMEIDA SANTOS - CPF: 057.257.421-56 (ADVOGADO), JOSE EDUARDO REZENDE DE OLIVEIRA - CPF: 022.271.161-29 (ADVOGADO), FRANKSLANE ANGELICA DA SILVA - CPF: 697.625.621-00 (APELANTE), AZUL LINHAS AEREAS BRASILEIRAS S.A. - CNPJ: 09.296.295/0001-60 (APELADO), FLAVIO IGEL - CPF: 370.018.638-07 (ADVOGADO), LUCIANA GOULART PENTEADO - CPF: 106.909.398-09 (ADVOGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS), FRANKSLANE ANGELICA DA SILVA - CPF: 697.625.621-00 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: PROVIDO. UNÂNIME. E M E N T A APELAÇÃO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. ATRASO SUPERIOR A 12 HORAS EM VOO. NENHUMA ASSISTÊNCIA AO PASSAGEIRO. AUTOR MENOR DE IDADE. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. SITUAÇÃO QUE ULTRAPASSA O MERO ABORRECIMENTO. REPARAÇÃO DEVIDA. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação de sentença que julgou improcedente Ação de Indenização por Danos Morais decorrentes de atraso superior a 12 horas em voo com conexões. O autor alega que não houve aviso prévio nem assistência adequada. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) analisar se houve falha na prestação do serviço pela companhia aérea, configurando responsabilidade objetiva e dano moral; (ii) avaliar o valor a ser fixado para a reparação, bem como se é aplicável ao caso a inversão do ônus da sucumbência. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A responsabilidade da companhia aérea é objetiva (art. 14 do CDC), independentemente de culpa. 4. A Resolução ANAC n. 400/2016 estabelece a obrigação de assistência material em atrasos superiores a 4 horas, a qual não foi comprovada nestes autos. 5. A ausência de aviso prévio e de assistência adequada em atraso substancial configura falha contratual e gera dano moral presumido (in re ipsa), decorrente da violação da dignidade do consumidor. IV. DISPOSITIVO E TESE 6. Recurso provido. Tese de julgamento: 1. A alteração de voo sem aviso prévio (art. 12 da Resolução n. 400 da ANAC) e a falta de assistência adequada aos passageiros pela companhia aérea caracterizam falha na prestação do serviço contratado e impõem o dever de indenização por dano moral. Dispositivos relevantes citados: CC, artigos 389 e 406, § 1º; CDC, artigos 6º, VIII, e 14; Resolução ANAC n. 400/2016; CPC, art. 85, § 2º; Lei n. 14.905/2024. Jurisprudência relevante citada: TJMT, Quarta Câmara de Direito Privado, AC 1001031-38.2023.8.11.0038, Desa. Serly Marcondes Alves, j. 30-4-2025; AC 1020862-80.2023.8.11.0003, Des. Guiomar Teodoro Borges, j. 5-6-2024; AC 1008332-32.2023.8.11.0007, Desa. Serly Marcondes Alves, j. 10-7-2024; AC 1032718-24.2023.8.11.0041, Des. Guiomar Teodoro Borges, j. 17-7-2024; TJMG, 10000220785612001, 13ª Câmara Cível, relator Roberto Apolinário de Castro (JD convocado), j. 26-5-2022, publicação em 27-5-2022. R E L A T Ó R I O Apelação Cível em Ação de Indenização por Danos Morais julgada improcedente, com a condenação do autor ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade foi suspensa em razão da concessão da justiça gratuita. O apelante, menor de idade, representado nos autos por sua genitora, alega que faz jus à reparação por danos morais decorrentes do cancelamento do voo com itinerário Maceió-AL – Cuiabá-MT, com conexões em Belo Horizonte-MG e Goiânia-GO. Aduz que a partida inicial estava prevista para às 2h55min, com chegada ao destino final às 10h40min do mesmo dia, mas durante a conexão em Goiânia foi informado unilateralmente pela companhia aérea sobre a impossibilidade de embarque no voo seguinte, sob a justificativa de excesso de reservas (overbooking). Ressalta que foi realocado em voo posterior, com saída às 19h5min, chegando em Cuiabá com atraso superior a 12 horas em relação ao horário originalmente contratado. Argumenta que não recebeu aviso prévio nem assistência material adequada durante a longa espera. Destaca que a demora e a incerteza provocaram-lhe transtornos significativos, incluindo abalo emocional e psicológico. Por fim, requer a condenação da apelada em danos morais, além da inversão dos honorários de sucumbência. Contrarrazões no Id 281026354. É o relatório. V O T O R E L A T O R O apelante, menor de idade, representado nos autos por sua genitora, busca indenização por dano moral decorrente do cancelamento de voo originalmente previsto para sair de Maceió-AL com destino a Cuiabá-MT, com conexões em Belo Horizonte-MG e Goiânia-GO, programado para partir às 2h55min, com chegada ao destino final às 10h40min do mesmo dia. Contudo, durante a conexão em Goiânia, o autor foi informado unilateralmente pela companhia aérea que não poderia embarcar no trecho seguinte, devido ao excesso de reservas (overbooking). Em razão disso, foi realocado em voo posterior, com partida às 19h5min, chegando em Cuiabá com atraso superior a 12 horas em relação ao horário contratado. Por se tratar de relação de consumo, aplica-se o CDC, que, no presente caso, determina a inversão do ônus da prova em benefício do consumidor. Confira-se: “Art. 6°. São direitos básicos do consumidor: (...) VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências”. Consoante artigo 14 do CDC, “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”. Importante registrar que o contrato de transporte gera para o transportador uma obrigação de resultado, consistente em conduzir o passageiro ao destino convencionado, observando as condições pactuadas, como data, horário e aeronave. Quando a empresa aérea não cumpre essas cláusulas nem comprova circunstância de força maior ou caso fortuito que justifique a alteração ou cancelamento do voo, responde pelos prejuízos causados. Na presente hipótese, competia à apelada demonstrar que eventuais problemas técnicos impediram a prestação adequada do serviço, ônus do qual não se desincumbiu. Nesse sentido: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE AÉREO. ATRASO DE VOO SUPERIOR A 26 HORAS. FALTA DE ASSISTÊNCIA MATERIAL ADEQUADA. DANO MORAL IN RE IPSA. FORTUITO INTERNO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. RECURSO PROVIDO. (...) IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso provido. Tese de julgamento: 1. A responsabilidade da companhia aérea por atraso de voo é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, sendo irrelevante a demonstração de culpa. 2. Problemas técnicos e operacionais caracterizam fortuito interno e não afastam a responsabilidade da empresa aérea. 3. A assistência material insuficiente diante de atraso superior a 4 horas configura falha na prestação do serviço, nos termos da Resolução nº 400/2016 da ANAC. 4. O dano moral decorrente de atraso substancial em voo e ausência de assistência adequada é presumido, por violar a dignidade do consumidor. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CC, art. 927, parágrafo único; CDC, arts. 6º, VI, 14 e 22; Resolução ANAC nº 400/2016, arts. 8º e 14. Jurisprudência relevante citada: TJMT, Apelação Cível nº 1026027-91.2023.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 29.01.2025, DJE 02.02.2025. (N.U 1001031-38.2023.8.11.0038, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/04/2025, Publicado no DJE 03/05/2025) A Resolução n. 400 da ANAC, ao tratar de atraso, cancelamento, interrupção de serviço e preterição de voos, prevê o seguinte: Art. 21. O transportador deverá oferecer as alternativas de reacomodação, reembolso e execução do serviço por outra modalidade de transporte, devendo a escolha ser do passageiro, nos seguintes casos: I - atraso de voo por mais de quatro horas em relação ao horário originalmente contratado; II - cancelamento de voo ou interrupção do serviço; III - preterição de passageiro; e IV - perda de voo subsequente pelo passageiro, nos voos com conexão, inclusive nos casos de troca de aeroportos, quando a causa da perda for do transportador. Parágrafo único. As alternativas previstas no caput deste artigo deverão ser imediatamente oferecidas aos passageiros quando o transportador dispuser antecipadamente da informação de que o voo atrasará mais de 4 (quatro) horas em relação ao horário originalmente contratado. Assistência material Art. 26. A assistência material ao passageiro deve ser oferecida nos seguintes casos: I - atraso do voo; II - cancelamento do voo; III - interrupção de serviço; ou IV - preterição de passageiro. Art. 27. A assistência material consiste em satisfazer as necessidades do passageiro e deverá ser oferecida gratuitamente pelo transportador, conforme o tempo de espera, ainda que os passageiros estejam a bordo da aeronave com portas abertas, nos seguintes termos: I - superior a 1 (uma) hora: facilidades de comunicação; II - superior a 2 (duas) horas: alimentação, de acordo com o horário, por meio do fornecimento de refeição ou de voucher individual; e III - superior a 4 (quatro) horas: serviço de hospedagem, em caso de pernoite, e traslado de ida e volta. § 1º O transportador poderá deixar de oferecer serviço de hospedagem para o passageiro que residir na localidade do aeroporto de origem, garantido o traslado de ida e volta. (...) § 3º O transportador poderá deixar de oferecer assistência material quando o passageiro optar pela reacomodação em voo próprio do transportador a ser realizado em data e horário de conveniência do passageiro ou pelo reembolso integral da passagem aérea. É incontroverso nos autos que houve atraso superior a 12 horas na chegada ao destino. Além disso, não foi demonstrado que o apelante, menor impúbere, tenha recebido qualquer tipo de assistência. Ademais, a simples juntada de captura de tela do sistema interno da ré configura prova unilateral, frágil e insuficiente para atestar a manifestação de vontade do consumidor. Mesmo que os prints tivessem sido apresentados tempestivamente, não possuem eficácia para comprovar a regularidade do aviso prévio. Sobre a matéria: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - TRANSPORTE AÉREO – CANCELAMENTO DE VOO - REESTRUTURAÇÃO DE MALHA AÉREA – FORTUITO INTERNO – REALOCAÇÃO DE VOO 2 MESES APÓS O PERÍODO CONTRATADO - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO EVIDENCIADA - PRINTS DE TELA SISTÊMICA – PROVA UNILATERAL - DANO MORAL CONFIGURADO - QUANTUM INDENIZATÓRIO ADEQUADO - RECURSO DESPROVIDO. A reestruturação da malha aérea, noticiada nos autos, caracteriza-se como fortuito interno, inerente ao risco da atividade profissional, de modo que é incapaz de isentar a responsabilidade da companhia aérea. O simples cancelamento de voo adquirido pela companhia aérea não caracteriza o dever de indenizar, apenas quando comprovado o prejuízo. O “print” de tela sistêmica colacionada não é prova suficiente para atestar a existência da relação contratual entre as partes, tampouco a legalidade do débito em questão ou mesmo da efetiva prestação de serviço, por tratar-se de prova unilateral. O valor arbitrado a título de danos morais deve levar em conta as circunstâncias do caso concreto, as condições das partes, o grau de culpa e, principalmente, a finalidade da reparação do dano moral, o qual é a de compensar o dano ocorrido, bem como inibir a conduta abusiva. (N.U 1020862-80.2023.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 05/06/2024, Publicado no DJE 08/06/2024) APELAÇÃO CÍVEL – TRANSPORTE AÉREO – CANCELAMENTO DE VOO – COMUNICAÇÃO PRÉVIA AO CONSUMIDOR INDEMONSTRADA - REACOMODAÇÃO – EXCESSIVA DEMORA PARA O VOO REMARCADO – FRUSTAÇÃO NO PLANEJAMENTO DE FÉRIAS – DANO MORAL CARACTERIZADO – PRECEDENTES – SENTENÇA REFORMADA - RECURSO PROVIDO. 1. A alteração de malha aérea, genericamente alegada pela companhia aérea, caracteriza fortuito interno, incapaz de afastar o dever de indenizar. 2. Embora o mero cancelamento ou atraso no início de voo não faça presumir o dano moral, este se configura na hipótese em que a reacomodação é disponibilizada com excessiva demora, causando frustração no planejamento de férias há muito tempo realizado. (N.U 1008332-32.2023.8.11.0007, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 10/07/2024, Publicado no DJE 13/07/2024) EMENTA: APELAÇÃO - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - PRELIMINAR - INDEVIDA CONCESSÃO DA JUSTIÇA GRATUITA - REJEITAR - CONTRATAÇÃO DE SERVIÇO - PRINT DE TELA SISTEMA INTERNO - INSUFICIENTE - PROVA UNILATERAL - FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO - DANOS MORAIS - DAR PROVIMENTO. Sabe-se que, nos termos do art. 98 do Código de Processo Civil, a pessoa física conta com presunção de miséria, entretanto está não é absoluta, devendo ser comprovada a miserabilidade. Comprovada a miserabilidade e deferida à justiça gratuita, está só poderá ser revogada se comprovada a mudança da situação financeira. Incumbe ao Réu comprovar a existência e legitimidade dos negócios jurídicos celebrados, nos termos do artigo 373, inciso II, do CPC, haja vista a impossibilidade da parte Autora produzir prova negativa. Os prints de tela do sistema eletrônico interno, sem documentos pessoais e assinatura da suposta contratante, não têm o condão de comprovar a contratação, pois é prova unilateral, sem dados hábeis a comprovar relação jurídica contratual. Constatada a falha na prestação de serviços a condenação em danos morais é medida que se impõe. (TJ-MG - AC: 10000220785612001 MG, Relator: Roberto Apolinário de Castro (JD Convocado), Data de Julgamento: 26/05/2022, Câmaras Cíveis / 13ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 27/05/2022) Logo, é evidente o ato ilícito que gerou o dano moral, e o valor da reparação deve atender às funções pedagógica, compensatória e punitiva da medida. Assim, mostra-se razoável e proporcional o montante de R$10.000,00 A propósito: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE DANO MORAL - TRANSPORTE AÉREO – ALTERAÇÃO DE VOO – MALHA AÉREA – FORTUITO INTERNO – CONEXÃO DE MAIS DE 9 HORAS - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO EVIDENCIADA - DANO MORAL CONFIGURADO - QUANTUM INDENIZATÓRIO ADEQUADO - RECURSO DESPROVIDO. A ocorrência de problemas técnicos caracteriza-se como fortuito interno, inerente ao risco da atividade profissional, de modo que é incapaz de isentar a responsabilidade da companhia aérea. A alteração de voo adquirido, sem aviso prévio, conforme o estabelecido pelo Art. 12º Resolução Nº 400 da ANAC, bem como a ausência de assistência adequada aos passageiros pela companhia aérea caracteriza falha na prestação do serviço contratado e gera o dever de indenizar. O valor arbitrado a título de danos morais deve levar em conta as circunstâncias do caso concreto, as condições das partes, o grau de culpa e, principalmente, a finalidade da reparação do dano moral, que é a de compensar o dano ocorrido, bem como inibir a conduta abusiva.(N.U 1032718-24.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 17/07/2024, Publicado no DJE 20/07/2024) Outros julgados desta Câmara: AC n. 179407/2016, julgamento em 15-2-2017; AC n. 152984/2016, julgamento em 16-11-2016; AC n. 124263/2015, DJe de 25-9-2015; AC n. 119763/2015, DJe de 21-9-2015, e AC n. 29009/2014, DJe de 7-7-2014. Pelo exposto, dou provimento ao Recurso para reformar a sentença e julgar procedente a Ação. Condeno a apelada ao pagamento de R$10.000,00 de danos morais, corrigidos monetariamente pelo IPCA, conforme apurado pelo IBGE, a partir do arbitramento (Súmula 362 do STJ) acrescidos de juros de mora calculados pela taxa SELIC, deduzido o IPCA, a contar da citação, nos termos dos artigos 389, parágrafo único, e 406, § 1º, do Código Civil, alterados pela Lei n. 14.905/2024. Inverto o ônus da sucumbência, atribuindo-o à apelada, e fixo os honorários advocatícios em 15% sobre o montante da condenação (art. 85, § 2º, do CPC). Data da sessão: Cuiabá-MT, 21/05/2025

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Processo nº 1077976-46.2024.8.11.0001

ID: 283625068

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Turma Recursal Classe: RECURSO INOMINADO CíVEL Nº Processo: 1077976-46.2024.8.11.0001

Data de Disponibilização: 29/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

MYCHELLE FABIANE CARVALHO BUENO SATO

Decisão

Advogados:

TALITA OLIVEIRA DE SANT ANA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE 4. SEGUNDA TURMA GABINETE 4. SEGUNDA TURMA RECURSO INOMINADO (460) 1077976-46.2024.8.11.0001 RECORRENTE: LATAM AIRLINES GROUP S/A R… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA GABINETE 4. SEGUNDA TURMA GABINETE 4. SEGUNDA TURMA RECURSO INOMINADO (460) 1077976-46.2024.8.11.0001 RECORRENTE: LATAM AIRLINES GROUP S/A RECORRIDO: MYCHELLE FABIANE CARVALHO BUENO SATO EMENTA - DECISÃO MONOCRÁTICA RECURSO INOMINADO – TRANSPORTE AÉREO – CANCELAMENTO DE VOO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA (ART. 14 DO CDC) – FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO – REACOMODAÇÃO INADEQUADA – AUTORA GESTANTE E ACOMPANHADA DE DUAS CRIANÇAS – DANO MORAL CONFIGURADO – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. Trata-se de recurso inominado interposto pela companhia aérea visando a reforma da sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais para condená-la ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 8.000,00, insurgindo-se contra a condenação e, subsidiariamente, pleiteando a redução do montante arbitrado. 2. Os autos demonstram que a autora e sua família — composta por dois adultos, uma criança e um bebê, sendo que a autora se encontrava gestante de 31 semanas — enfrentaram diversas adversidades no retorno de viagem aérea do trecho Navegantes/Cuiabá, com cancelamento de voo alegadamente motivado por mau tempo, sem, contudo, terem sido notificados previamente. 3. A autora foi surpreendida com o cancelamento do voo apenas no momento do embarque, sendo-lhe oferecida reacomodação para mais de 22 horas após o horário original, sem comunicação prévia e com alternativas inviáveis diante do estado de saúde dos filhos — um deles posteriormente hospitalizado com quadro de desidratação. 4. A alegação de mau tempo, por si só, não exime a Recorrente do dever de indenizar, sobretudo quando ausente prova suficiente da inviabilidade operacional do trajeto ou da prestação adequada de assistência. 5. A tese defensiva de que o cancelamento se deu por mau tempo não veio acompanhada de provas robustas que comprovassem a magnitude do evento meteorológico, tampouco a indisponibilidade de outras alternativas de reacomodação. Inaplicável, portanto, a excludente de responsabilidade. 6. Conquanto seja sabido que o mau tempo pode impossibilitar/dificultar os pousos e decolagens, necessária se faz a comprovação de quanto isso implica para que um atraso da monta do que foi o caso em tela seja aceitável, tal como fechando do aeroporto, o que não há nos autos. 7. Nesse sentido, já me posicionei: “RECURSO INOMINADO – TRANSPORTE AÉREO – CANCELAMENTO DE VOO – ALTERAÇÃO DE VOO DIRETO POR VOO COM CONEXÃO - OVERBOOKING -ATRASO SUPERIOR A 15 HORAS EM CADA UM DOS TRECHOS – ALEGAÇÃO DE ADVERSIDADE DAS CONDIÇÕES METEOROLÓGICAS – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA MAGNITUDE DO EVENTO CLIMÁTICO – ASSISTÊNCIA MATERIAL NÃO PRESTADA DE FORMA SATISFATÓRIA - FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO – RESPONSABILIDADE OBJETIVA (ART. 14, CAPUT, CDC) – DEVER DE INDENIZAR (ART. 186 E 927, CC) – INAPLICABILIDADE DA LEI 14.034/2020 - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO.” (N.U 1000207-81.2023.8.11.0005, TURMA RECURSAL CÍVEL, JOAO ALBERTO MENNA BARRETO DUARTE, Segunda Turma Recursal, Julgado em 31/10/2023, Publicado no DJE 23/11/2023).” 8. Sobre o tema vale ainda transcrever: “Ementa: RECURSO INOMINADO. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. TRANSPORTE AÉREO NACIONAL. VOO DE RETORNO PARTINDO DO RIO DE JANEIRO COM DESTINO A PORTO ALEGRE CANCELADO. ATRASO APROXIMADO DE 14 HORAS NA CHEGADA AO DESTINO FINAL. ALEGAÇÃO DE CASO FORTUITO, EM RAZÃO DE CONDIÇÕES METEOROLÓGICAS ADVERSAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA EFETIVA MAGNITUDE DO EVENTO CLIMÁTICO ALEGADO. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. DANO MATERIAL COMPROVADO. DEVER DE RESSARCIMENTO PELA RÉ. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO REDUZIDO PARA R$ 3.000,00 (TRÊS MIL REAIS), ATENDENDO ÀS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO E AOS PRINCÍPIOS DE PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. UNÂNIME.(Recurso Inominado, Nº 50274438420218210019, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Elaine Maria Canto da Fonseca, Julgado em: 05-04-2023)”. 9. No caso vertente, não houve reacomodação tempestiva, nem comprovação de indisponibilidade de outros voos, mesmo que em outras companhias. 10.Constatada a falha na prestação do serviço, diante do transtorno excepcional causado à consumidora e sua família, mostra-se devida a indenização por danos morais. 11.Em relação aos danos morais, a situação extrapola o mero aborrecimento e configura falha na prestação do serviço do que sobressai o dever de indenizar, ainda mais no caso da Autora que se encontrava gestante e acompanhada de crianças, sendo notório que a lei lhes confere proteção e prioridade, dever esse que não foi respeitado pela Recorrente. 12.Na fixação do montante da condenação a título de reparação pelos danos morais, deve-se atender a uma dupla finalidade: reparação e repressão. Portanto, há que se observar a capacidade econômica do atingido, mas também a do ofensor, com vistas a evitar o enriquecimento injustificado, mas também garantir o viés pedagógico da medida, desestimulando-se a repetição do ato ilícito. 13.O quantum fixado na sentença de R$ 8.000,00 (oito mil reais), se mostra adequado e de acordo com a Jurisprudência deste Tribunal: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE AÉREO. ATRASO DE VOO SUPERIOR A 26 HORAS. FALTA DE ASSISTÊNCIA MATERIAL ADEQUADA. DANO MORAL IN RE IPSA. FORTUITO INTERNO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente ação de indenização por danos morais, diante de atraso de mais de 26 horas em voo com origem em Bauru e destino final em Juazeiro do Norte, incluindo perda de conexão e ausência de assistência material adequada. A sentença entendeu não haver prova de dano moral, condenando o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. O autor sustenta falha na prestação do serviço e pleiteia reforma da sentença, com reconhecimento do dano moral e condenação da ré à indenização correspondente. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se o atraso significativo e a assistência material insuficiente caracterizam falha na prestação do serviço aéreo; e (ii) determinar se tais falhas configuram dano moral indenizável. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A responsabilidade do transportador aéreo é objetiva, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, bastando a demonstração do defeito na prestação do serviço e do dano sofrido pelo consumidor, independentemente da comprovação de culpa. 4. A justificativa apresentada pela companhia aérea — problemas técnicos operacionais — configura fortuito interno, inerente ao risco da atividade, não sendo apta a afastar a responsabilidade da ré, nos termos do art. 927, parágrafo único, do Código Civil. 5. A assistência material prestada pela ré mostrou-se deficiente, restringindo-se à oferta de alimentação, sem hospedagem e translado, em afronta ao disposto nos arts. 8º e 14 da Resolução nº 400/2016 da ANAC. 6. O atraso de mais de 26 horas, somado à ausência de assistência adequada e à situação de espera prolongada no aeroporto, configura abalo à dignidade do passageiro, ensejando dano moral presumido (in re ipsa). 7. O valor de R$ 10.000,00 revela-se adequado às peculiaridades do caso concreto, observados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso provido. Tese de julgamento: 1. A responsabilidade da companhia aérea por atraso de voo é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, sendo irrelevante a demonstração de culpa. 2. Problemas técnicos e operacionais caracterizam fortuito interno e não afastam a responsabilidade da empresa aérea. 3. A assistência material insuficiente diante de atraso superior a 4 horas configura falha na prestação do serviço, nos termos da Resolução nº 400/2016 da ANAC. 4. O dano moral decorrente de atraso substancial em voo e ausência de assistência adequada é presumido, por violar a dignidade do consumidor. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CC, art. 927, parágrafo único; CDC, arts. 6º, VI, 14 e 22; Resolução ANAC nº 400/2016, arts. 8º e 14. Jurisprudência relevante citada: TJMT, Apelação Cível nº 1026027-91.2023.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 29.01.2025, DJE 02.02.2025. (N.U 1001031-38.2023.8.11.0038, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/04/2025, Publicado no DJE 03/05/2025). 14.Escorreita a sentença, que guarda relação com os critérios da proporcionalidade e da razoabilidade, com a fixação do valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) pelos danos morais sofridos. 15.Sentença mantida por seus próprios fundamentos (Lei 9.099/95, art. 46). 16.RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO, monocraticamente. 17.Nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/95, a parte Recorrente arcará com custas e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da condenação. 18.Por fim, anoto que será aplicada multa entre um a cinco por cento do valor atualizado da causa, caso haja interposição de agravo interno manifestamente inadmissível ou infundado (art. 1.021, § 4º, NCPC) 19.Intimem-se. 20.Preclusa a via recursal, devolvam-se os autos à origem. Juiz JOÃO ALBERTO MENNA BARRETO DUARTE Relator

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Amanda Oliveira Vieira x Latam Airlines Group S.A.

ID: 332777110

Tribunal: TJMT Órgão: 4º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1040122-81.2025.8.11.0001

Data de Disponibilização: 23/07/2025

Polo Ativo:

AMANDA OLIVEIRA VIEIRA

Polo Passivo:

LATAM AIRLINES GROUP S.A.

Sentença

Advogados:

FABIO RIVELLI

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ANTONIO GOULART GUIMARAES NETO

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ARACELLY COUTO MACEDO MATTOS

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ Sentença Processo: 1040122-81.2025.8.11.0001. AUTOR: AMANDA OLIVEIRA VIEIRA REQUERIDO: LATAM AIRLINES GROUP S.A. Vistos, Dis… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4º JUIZADO ESPECIAL CÍVEL DE CUIABÁ Sentença Processo: 1040122-81.2025.8.11.0001. AUTOR: AMANDA OLIVEIRA VIEIRA REQUERIDO: LATAM AIRLINES GROUP S.A. Vistos, Dispensado relatório na forma do disposto no artigo 38 da Lei 9.099/95. Verifica-se que as provas contidas no caderno processual são suficientes para a compreensão e resolução da demanda, não se vislumbrando necessidade da produção de prova oral, de modo que cabível o julgamento antecipado do mérito, nos moldes do artigo 355, inciso I, do CPC. Registro, que, no sistema dos Juizados Especiais, o juiz não está obrigado a rebater uma a uma as teses apresentadas pelas partes, bastando que consigne na sentença os elementos formadores da sua convicção. Preliminares Justiça Gratuita A parte autora requereu os benefícios da Justiça Gratuita, mas não se mostra possível analisar nesse momento a justiça gratuita, uma vez que, conforme o artigo 55 da Lei nº 9.099/95, o acesso ao primeiro grau de jurisdição nos Juizados Especiais prescinde do recolhimento de custas, taxas ou despesas processuais, assim, deixo a análise do pedido para momento oportuno. Prevalência Código Brasileiro de Aeronáutica em Detrimento do Código De Defesa do Consumidor Não comporta acolhimento a tese de que as disciplinas ditadas pela Convenção de Varsóvia (Convenção de Montreal) e pelo Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei n.º 7.565/86) devem ser aplicadas em detrimento do Código de Defesa do Consumidor. Isso porque, o tratado, ao ser internalizado, adquire em nosso ordenamento jurídico força de lei ordinária, e como tal, não subsiste à Lei n.º 8.078/90, como lei posterior específica destinada a tutelar os interesses do consumidor, expressa como garantia fundamental (art. 5º, inciso XXXII, da Constituição Federal), inclusive a alegada Convenção. Recusa ao Juízo 100% Digital A empresa requerida, sem nenhuma justificativa plausível, se manifestou contrária à tramitação deste feito através do Juízo 100% digital. Sucede que o processo tramita em Juizado Especial Cível, local em que os processos são todos virtuais, independente da vontade das partes, certo que não estão sendo realizadas audiências presenciais, até mesmo em atenção aos princípios da celeridade e da eficiência da prestação jurisdicional. Deste modo, a manifestação da parte não tem o condão de alterar método de trabalho imposto, não por este Juízo, mas pelo Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso, inclusive com citações e intimações via sistema, o qual, inclusive, a empresa já aderiu. Logo rejeita-se a preliminar suscitada. Convenção de Montreal A defesa da ré baseia-se na aplicação da Convenção de Montreal para limitar ou excluir a sua responsabilidade. Todavia, a jurisprudência nacional, inclusive do Supremo Tribunal Federal, admite a aplicação da Convenção de Montreal apenas para fins de limitação de responsabilidade patrimonial o que não se aplica ao presente caso, pois, não há pedido de indenização por danos materiais. Assim, rejeita-se a aplicação da Convenção de Montreal no tocante à exclusão da responsabilidade objetiva da ré. Mérito Trata-se de ação de indenização por danos morais proposta por Amanda Oliveira Vieira em desfavor de TAM Linhas Aéreas S.A., em razão do cancelamento de voo internacional, com posterior reacomodação e alegada falha na prestação de assistência material, especialmente a ausência de hospedagem durante longa conexão. Relata a parte autora que o voo com origem em Cusco e destino a Cuiabá, com conexões em Lima e Brasília, foi cancelado horas antes da decolagem e substituído por novo itinerário, com atraso total superior a 16 horas e conexão de mais de 7 horas em São Paulo sem fornecimento de hospedagem. A ré apresentou contestação alegando a ocorrência de caso fortuito (presença de pássaros na pista – bird hazard), além da aplicação da Convenção de Montreal e do Código Brasileiro de Aeronáutica para afastar a responsabilidade objetiva prevista no Código de Defesa do Consumidor. A presente demanda versa sobre prestação de serviço de transporte aéreo, enquadrando-se como típica relação de consumo, conforme os artigos 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor. Reconhecida a hipossuficiência técnica da autora frente à empresa aérea, impõe-se, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC, a inversão do ônus da prova, cabendo à ré demonstrar o cumprimento integral de suas obrigações contratuais e legais. Verifica-se que a ré alegou que o cancelamento do voo decorreu da presença de aves na pista (bird hazard), como fator imprevisível de risco operacional. Contudo, conforme entendimento pacífico no STJ e no TJMT, eventos dessa natureza são classificados como fortuito interno, por se tratar de riscos previsíveis e inerentes à atividade empresarial do transporte aéreo, vejamos: “A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que problemas técnicos na aeronave e eventos como colisão com pássaros (bird strike) são considerados fortuito interno, riscos inerentes à atividade empresarial, e não afastam a responsabilidade objetiva do transportador.” (STJ – AgRg no AREsp 766.618/PE, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 17/09/2015). “A alteração de malha aérea é considerada fortuito interno, risco inerente à atividade econômica do transporte aéreo, não afastando a responsabilidade objetiva do fornecedor.” (TJMT, ApCiv 1013245-18.2024.8.11.0041, Rel. Des. Sebastião de Arruda Almeida, DJE 23/05/2025). Portanto, a alegação de fortuito não afasta a responsabilidade da companhia aérea, que é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC. Ademais, embora tenha havido comunicação imediata e fornecimento de alimentação, comprovados pela ré, não foi demonstrado o cumprimento do dever de oferta de hospedagem, exigido pela Resolução nº 400/2016 da ANAC, art. 27, III, nos casos de pernoite e espera superior a quatro horas. A espera da autora em São Paulo foi superior a 7h30, em voo internacional, sem hospedagem, o que representa falha na prestação do serviço, que gera direito à reparação moral. A jurisprudência do Estado de Mato Grosso a respeito entende: “A assistência material insuficiente diante de atraso superior a 4 horas configura falha na prestação do serviço, nos termos da Resolução nº 400/2016 da ANAC.” (TJMT, ApCiv 1013245-18.2024.8.11.0041, DJE 23/05/2025). No que tange ao dano moral, a ausência parcial de assistência, somada ao desgaste da autora em ambiente internacional, longas conexões e o não cumprimento de obrigação expressa da ANAC, ultrapassam o mero dissabor. Assim, um atraso total de mais de 16 horas, durante o qual a autora enfrentou deslocamentos longos, conexões noturnas e falta de apoio integral, geram o dano moral, que é presumido (in re ipsa), diante da violação da dignidade do consumidor. A jurisprudência a esse respeito nos mostra: “Mesmo quando há reacomodação, a ausência de hospedagem em caso de pernoite demonstra falha no dever de assistência e enseja dano moral.” (STJ, AgInt no AREsp 2196444/RS, Rel. Min. Raul Araújo, j. 26/06/2025). “A ausência de assistência adequada, ainda que parcial, somada à espera prolongada no aeroporto por mais de 20 horas, configura abalo à dignidade do passageiro, ensejando dano moral. Fortuito interno não exclui o dever de indenizar.” (TJMT, ApCiv 1001031-38.2023.8.11.0038, Rel. Des. Serly Marcondes Alves, DJE 03/05/2025). Ante o exposto, nos moldes do artigo 487, I, do Código de Processo Civil c/c artigo 6.º da Lei n.º 9.099/95, julgo procedentes os pedidos formulados pela parte autora na exordial para condenar a ré ao pagamento de R$ 3.000,00 (três mil reais), a título de danos morais, corrigidos monetariamente pelo índice IPCA (CC, art. 389, “caput”, e parágrafo único), desde o arbitramento, (Súmula/STJ n.362), e juros moratórios pela taxa Selic, contados da citação, deduzindo-se dela o índice de atualização monetária (CC, art. 406, “caput” e parágrafos). Transitado em julgado, após apresentada a memória do cálculo pela parte autora, no requerimento de cumprimento de sentença, intime-se a parte requerida para efetuar o pagamento voluntário no prazo de quinze dias, sob pena de incidir na multa prevista no artigo 523, § 1º, do Código de Processo Civil, em consonância com a Súmula nº. 18, editada pela Turma Recursal Única do Estado de Mato Grosso. Sem custas e honorários, conforme artigo 55, da Lei n. 9.099/95. Sentença sujeita à homologação da magistrada, nos termos do artigo 40 da Lei nº 9.099/95. Fabíola Brito de Freitas Juíza Leiga do 4º Juizado Especial Cível da Capital Visto, Homologa-se a sentença derradeira elaborada pelo Juíza Leiga, com espeque no artigo 40 da Lei nº 9.099/95. Publicada e registrada na presente data pelo sistema informatizado. Intimem-se. Cumpra-se. Cuiabá, data registrada no sistema. (assinado digitalmente) GLENDA MOREIRA BORGES Juíza de Direito

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Ivanilson Rodrigues Dos Santos x Gol Linhas Aéreas S.A.

ID: 282168617

Tribunal: TJMT Órgão: JUIZADOS ESPECIAIS DE LUCAS DO RIO VERDE Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1000964-81.2025.8.11.0045

Data de Disponibilização: 28/05/2025

Polo Ativo:

IVANILSON RODRIGUES DOS SANTOS

Polo Passivo:

GOL LINHAS AÉREAS S.A.

Sentença

Advogados:

DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ANA PAULA FIGUEIREDO DE AQUINO DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO JUIZADOS ESPECIAIS DE LUCAS DO RIO VERDE SENTENÇA Processo: 1000964-81.2025.8.11.0045. REQUERENTE: IVANILSON RODRIGUES DOS SANTOS REQUERIDO: GOL LINHAS AÉREAS S… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO JUIZADOS ESPECIAIS DE LUCAS DO RIO VERDE SENTENÇA Processo: 1000964-81.2025.8.11.0045. REQUERENTE: IVANILSON RODRIGUES DOS SANTOS REQUERIDO: GOL LINHAS AÉREAS S.A. Vistos, etc. Trata-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS proposta por IVANILSON RODRIGUES DOS SANTOS em face de GOL LINHAS AÉREAS S.A. relatando que adquiriu bilhetes de passagens aéreas de Cuiabá-MT para Guarulhos-SP com conexão em Brasília-DF. Relatou que o voo 1419 de Brasília-DF para Guarulhos-SP deveria sair às 20h40m do dia 09/01/2025, entretanto foi cancelado e o novo voo 1409 saiu 06h05m do dia 10/01/2025. Afirma, por fim, que em decorrência do cancelamento houve atraso de mais de 10 horas e requereu indenização por danos morais no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais). É a suma do essencial. REJEITO a preliminar de inépcia da inicial, tendo em vista que a parte reclamante cumpriu os requisitos dos art. 320 e 321, do Código de Processo Civil. Quanto ao pedido de aplicação do Código Brasileiro de Aeronáutica, destaco que o contrato de transporte aéreo configura relação de consumo, sendo aplicáveis as normas do Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/1990), e não o Código Brasileiro de Aeronáutica. Superadas as preliminares, passo a análise do mérito da presente destacando que o feito se amolda aos requisitos para julgamento antecipado da lide. Em razão de se tratar de relação de consumo, aplica-se a inversão do ônus da prova elencada no art. 6º, VIII, do CDC, com o fito de proporcionar equilíbrio na relação processual. Além disso, incumbe à reclamada provar a veracidade de seus alegados na qualidade de fornecedora de serviços, seja em razão da inversão do ônus da prova, seja porque as suas assertivas são fato extintivo de direito, nos termos do art. 373, II, do CPC. Perscrutando os autos, verifico que a parte reclamante adquiriu passagem aérea de Cuiabá-MT para Guarulhos/SP com conexão em Brasília-DF (id. 183159810) com partida às 20h40min do dia 09/01/2025. Constato que o Voo 1419 de Brasília-DF para Guarulhos-SP foi cancelado e o reclamante foi reacomodado no voo 1409 cujo partida se deu às 06h05min do dia 10/01/2025, acarretando um atraso de mais de 10 horas. A parte reclamada aduziu que não houve dano moral, entretanto sequer apresentou detalhes sobre os motivos que justificaram o cancelamento do voo. Nesse sentido, constato que a parte reclamada não apresentou nenhuma evidência capaz de excluir a sua responsabilidade civil objetiva, à luz do §3º, do Art. 14, do CDC. Sem provas de ausência de defeito na prestação dos serviços ou de fortuito externo, resta evidente a falha na prestação dos serviços e o dever de indenizar. Nesse sentido: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE AÉREO. ATRASO DE VOO SUPERIOR A 26 HORAS. FALTA DE ASSISTÊNCIA MATERIAL ADEQUADA. DANO MORAL IN RE IPSA. FORTUITO INTERNO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente ação de indenização por danos morais, diante de atraso de mais de 26 horas em voo com origem em Bauru e destino final em Juazeiro do Norte, incluindo perda de conexão e ausência de assistência material adequada. A sentença entendeu não haver prova de dano moral, condenando o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. O autor sustenta falha na prestação do serviço e pleiteia reforma da sentença, com reconhecimento do dano moral e condenação da ré à indenização correspondente. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se o atraso significativo e a assistência material insuficiente caracterizam falha na prestação do serviço aéreo; e (ii) determinar se tais falhas configuram dano moral indenizável. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A responsabilidade do transportador aéreo é objetiva, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, bastando a demonstração do defeito na prestação do serviço e do dano sofrido pelo consumidor, independentemente da comprovação de culpa. 4. A justificativa apresentada pela companhia aérea — problemas técnicos operacionais — configura fortuito interno, inerente ao risco da atividade, não sendo apta a afastar a responsabilidade da ré, nos termos do art. 927, parágrafo único, do Código Civil. 5. A assistência material prestada pela ré mostrou-se deficiente, restringindo-se à oferta de alimentação, sem hospedagem e translado, em afronta ao disposto nos arts. 8º e 14 da Resolução nº 400/2016 da ANAC. 6. O atraso de mais de 26 horas, somado à ausência de assistência adequada e à situação de espera prolongada no aeroporto, configura abalo à dignidade do passageiro, ensejando dano moral presumido (in re ipsa). 7. O valor de R$ 10.000,00 revela-se adequado às peculiaridades do caso concreto, observados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso provido. Tese de julgamento: 1. A responsabilidade da companhia aérea por atraso de voo é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, sendo irrelevante a demonstração de culpa. 2. Problemas técnicos e operacionais caracterizam fortuito interno e não afastam a responsabilidade da empresa aérea. 3. A assistência material insuficiente diante de atraso superior a 4 horas configura falha na prestação do serviço, nos termos da Resolução nº 400/2016 da ANAC. 4. O dano moral decorrente de atraso substancial em voo e ausência de assistência adequada é presumido, por violar a dignidade do consumidor. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CC, art. 927, parágrafo único; CDC, arts. 6º, VI, 14 e 22; Resolução ANAC nº 400/2016, arts. 8º e 14. Jurisprudência relevante citada: TJMT, Apelação Cível nº 1026027-91.2023.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 29.01.2025, DJE 02.02.2025. (N.U 1001031-38.2023.8.11.0038, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/04/2025, Publicado no DJE 03/05/2025) (Sem destaque no original) Reforço que quando uma companhia aérea não cumpre o horário do voo sem apresentar uma justificativa válida, ela comete falha na prestação dos serviços e, portanto, fica obrigada a indenizar os danos sofridos pelo(a) consumidor(a). Assim sendo, não havendo prova de existência de excludente de responsabilidade, tenho que restou demonstrada a falha na prestação dos serviços, diante do atraso injustificado do serviço em aproximadamente 10 horas para chegar no destino final. Quanto ao dano moral, entendo que todo o imbróglio suportado pela parte reclamante lhe ensejou dano moral passível de indenização, em decorrência do atraso na finalização do serviço em aproximadamente de 10 horas. In casu, observo que a parte reclamada aduz que competiria à parte reclamante provar a existência de dano extrapatrimonial em decorrência da falha na execução do serviço, à luz do art. 251-A, do Código Brasileiro da Aeronáutica. Ocorre que, as provas acostadas aos autos são contundentes em demonstrar a falha na prestação dos serviços, o desvio produtivo, o descumprimento contratual e, especialmente, que a parte reclamante passou por situação degradante em decorrência do atraso. Nesse sentido, o atraso superior a 10 horas configura conduta ilícita da companhia aérea, de modo que resta configurado a responsabilidade civil e o dever de indenizar. No mais, tenho que a indenização por danos morais deve ser fixada de acordo com o juízo prudencial, não podendo ser arbitrada em valor irrisório a ponto de servir de desestímulo ao lesante, tampouco em quantia que fomente o enriquecimento sem causa. Deve-se buscar um equilíbrio entre as possibilidades do lesante, as condições do lesado e fazer com que se dote a sanção de um caráter inibidor. Assim, seguindo os critérios fornecidos pela doutrina e jurisprudência, e considerando a extensão do dano, as circunstâncias das partes e demais peculiaridades do caso concreto, fixo a indenização por danos morais em R$ 4.000,00 (quatro mil reais). Por fim, a parte reclamada pretende a condenação da parte reclamante em litigância de má-fé, entretanto verifiquei a inexistência de provas suficientes a demonstrar que houve má-fé. A má-fé, diferente da boa-fé, deve ser provada, de forma que a mera alegação de má-fé não é suficiente para satisfazer os requisitos legais. Assim, REJEITO o pedido de condenação em litigância de má-fé. Diante do exposto, proponho, com fulcro no art. 487, I, do CPC, JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado para CONDENAR a Requerida ao pagamento de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) para a reclamante, a título de danos morais, corrigido monetariamente pelo IPCA a partir da presente data, nos termos do art. 389, do Código Civil, mais juros mensais pela SELIC, contados da data citação, nos termos do art. 406, do Código Civil. Sem custas processuais e honorários advocatícios (art. 54 e art. 55 da lei nº 9.099/95). SUBMETO o presente projeto de sentença à homologação do MM. Juiz de Direito, nos termos do art. 40 da Lei 9.099/95. João Celestino Batista Neto Juiz Leigo Vistos, etc. HOMOLOGO, para que produza seus jurídicos e legais efeitos, o projeto de sentença elaborado pelo Juiz Leigo, na forma do artigo 40 da Lei n. 9.099/1995. Transitada em julgado, devidamente certificado e nada sendo requerido, ARQUIVE-SE com as baixas e anotações de estilo. Cumpra-se. Às providências. Lucas do Rio Verde/MT, data da assinatura digital. Maurício Alexandre Ribeiro Juiz de Direito

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Rozane Ramos Machado x Gol Linhas Aéreas S.A.

ID: 331346101

Tribunal: TJMT Órgão: JUIZADOS ESPECIAIS DE LUCAS DO RIO VERDE Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1004041-98.2025.8.11.0045

Data de Disponibilização: 22/07/2025

Polo Ativo:

ROZANE RAMOS MACHADO

Polo Passivo:

GOL LINHAS AÉREAS S.A.

Sentença

Advogados:

ANA SONAIRA HORTENCIO SILVESTRE

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DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO JUIZADOS ESPECIAIS DE LUCAS DO RIO VERDE SENTENÇA Processo: 1004041-98.2025.8.11.0045. AUTOR(A): ROZANE RAMOS MACHADO REU: GOL LINHAS AÉREAS S.A. Vistos, etc. T… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO JUIZADOS ESPECIAIS DE LUCAS DO RIO VERDE SENTENÇA Processo: 1004041-98.2025.8.11.0045. AUTOR(A): ROZANE RAMOS MACHADO REU: GOL LINHAS AÉREAS S.A. Vistos, etc. Trata-se de AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS proposta por ROZANE RAMOS MACHADO em face de GOL LINHAS AÉREAS S.A. relatando que adquiriu bilhetes de passagens aéreas de Belém para Sinop com escala em Guarulhos-SP. Relatou que o desembarque em Guarulhos atrasou e houve perda da conexão, de modo que foi reacomodado em voo que saia do aeroporto de Campinas. Afirma, por fim, que “a chegada ao destino final, inicialmente previsto para as 10h30, somente ocorreu às 15h30” e requereu indenização por danos no importe de R$ 10.067,90 (dez mil reais). É a suma do essencial. Quanto a impugnação ao pedido de justiça gratuita, o art. 54, da Lei n. 9.099/95 dispõe que o acesso ao Juizado Especial “independerá, em primeiro grau de jurisdição, do pagamento de custas, taxas ou despesas.”. Assim, rejeito a impugnação. Quanto ao pedido de aplicação do Código Brasileiro de Aeronáutica, destaco que o contrato de transporte aéreo configura relação de consumo, sendo aplicáveis as normas do Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/1990), e não o Código Brasileiro de Aeronáutica. Superadas as preliminares, passo a análise do mérito da presente destacando que o feito se amolda aos requisitos para julgamento antecipado da lide. Em razão de se tratar de relação de consumo, aplica-se a inversão do ônus da prova elencada no art. 6º, VIII, do CDC, com o fito de proporcionar equilíbrio na relação processual. Além disso, incumbe à reclamada provar a veracidade de seus alegados na qualidade de fornecedora de serviços, seja em razão da inversão do ônus da prova, seja porque as suas assertivas são fato extintivo de direito, nos termos do art. 373, II, do CPC. Perscrutando os autos, verifico que a parte reclamante adquiriu bilhete de passagem aérea (id. 192996365) de Belém para Sinop com conexão em Guarulhos com partida no dia 28/01/2025 às 04h05min e chegada às 10h35min. Constato que, em decorrência de atraso, a parte autora perdeu a conexão e a reclamada reacomodou o autor no voo 4554 da Azul (id. 192996367) com partindo do aeroporto de Campinas às 14h55min. A parte reclamada aduziu que “o atraso se originou em virtude de problemas operacionais decorrentes da infraestrutura aeroportuária, fato esse que foge ao controle e à responsabilidade direta da GOL” e que “a parte autora não mencionou nenhum sofrimento moral significativo decorrente da mudança de seu voo”, de modo que a ação deveria ser julgada improcedente. Das provas dos autos é possível constatar que a parte reclamada confessa que houve atraso no voo e reacomodação em voo de outra companhia. Conquanto a reclamada alegue que houve “problemas operacionais”, tenho que tais problemas não furtam a reclamada de cumprir o contrato com atraso que não impactem significativamente na vida do consumidor. Ademais, a parte reclamada não apresentou nenhuma prova de ausência de defeito na prestação dos serviços, tampouco qualquer outra prova de cumprimento dentro das condições estabelecida pela ANAC. Nesse sentido, constato que a parte reclamada não apresentou nenhuma evidência capaz de excluir a sua responsabilidade civil objetiva, à luz do §3º, do Art. 14, do CDC. Sem provas de ausência de defeito na prestação dos serviços ou de fortuito externo, resta evidente a falha na prestação dos serviços e o dever de indenizar. Nesse sentido: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE AÉREO. ATRASO DE VOO SUPERIOR A 26 HORAS. FALTA DE ASSISTÊNCIA MATERIAL ADEQUADA. DANO MORAL IN RE IPSA. FORTUITO INTERNO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente ação de indenização por danos morais, diante de atraso de mais de 26 horas em voo com origem em Bauru e destino final em Juazeiro do Norte, incluindo perda de conexão e ausência de assistência material adequada. A sentença entendeu não haver prova de dano moral, condenando o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios. O autor sustenta falha na prestação do serviço e pleiteia reforma da sentença, com reconhecimento do dano moral e condenação da ré à indenização correspondente. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se o atraso significativo e a assistência material insuficiente caracterizam falha na prestação do serviço aéreo; e (ii) determinar se tais falhas configuram dano moral indenizável. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A responsabilidade do transportador aéreo é objetiva, nos termos do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, bastando a demonstração do defeito na prestação do serviço e do dano sofrido pelo consumidor, independentemente da comprovação de culpa. 4. A justificativa apresentada pela companhia aérea — problemas técnicos operacionais — configura fortuito interno, inerente ao risco da atividade, não sendo apta a afastar a responsabilidade da ré, nos termos do art. 927, parágrafo único, do Código Civil. 5. A assistência material prestada pela ré mostrou-se deficiente, restringindo-se à oferta de alimentação, sem hospedagem e translado, em afronta ao disposto nos arts. 8º e 14 da Resolução nº 400/2016 da ANAC. 6. O atraso de mais de 26 horas, somado à ausência de assistência adequada e à situação de espera prolongada no aeroporto, configura abalo à dignidade do passageiro, ensejando dano moral presumido (in re ipsa). 7. O valor de R$ 10.000,00 revela-se adequado às peculiaridades do caso concreto, observados os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso provido. Tese de julgamento: 1. A responsabilidade da companhia aérea por atraso de voo é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, sendo irrelevante a demonstração de culpa. 2. Problemas técnicos e operacionais caracterizam fortuito interno e não afastam a responsabilidade da empresa aérea. 3. A assistência material insuficiente diante de atraso superior a 4 horas configura falha na prestação do serviço, nos termos da Resolução nº 400/2016 da ANAC. 4. O dano moral decorrente de atraso substancial em voo e ausência de assistência adequada é presumido, por violar a dignidade do consumidor. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CC, art. 927, parágrafo único; CDC, arts. 6º, VI, 14 e 22; Resolução ANAC nº 400/2016, arts. 8º e 14. Jurisprudência relevante citada: TJMT, Apelação Cível nº 1026027-91.2023.8.11.0041, Quarta Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho, j. 29.01.2025, DJE 02.02.2025. (N.U 1001031-38.2023.8.11.0038, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/04/2025, publicado no DJE 03/05/2025) (Sem destaque no original) Reforço que quando uma companhia aérea não cumpre o horário do voo sem apresentar uma justificativa válida, ela comete falha na prestação dos serviços e, portanto, fica obrigada a indenizar os danos sofridos pelo(a) consumidor(a). Assim sendo, não havendo prova de existência de excludente de responsabilidade, tenho que restou demonstrada a falha na prestação dos serviços, diante do atraso injustificado de aproximadamente 6 horas para embarque para o destino final. Quanto ao dano material, a parte reclamante afirma que sofreu prejuízos materiais no importe de R$ 67,90 (sessenta e sete reais e noventa centavos). Analisando as provas, verifico que a parte autora apresentou cupom fiscal que não identifica o consumidor. A responsabilidade civil por danos materiais demanda que a parte demonstre o efetivo decréscimo patrimonial, o que não ocorreu no presente caso. Assim, entendo que o pedido de indenização por danos materiais não merece acolhimento. Quanto ao dano moral, entendo que todo o imbróglio suportado pela parte reclamante lhe ensejou dano moral passível de indenização, em decorrência do atraso na finalização do serviço em aproximadamente de 6 horas. In casu, observo que a parte reclamada aduz que competiria à parte reclamante provar a existência de dano extrapatrimonial em decorrência da falha na execução do serviço, à luz do art. 251-A, do Código Brasileiro da Aeronáutica. Ocorre que, as provas acostadas aos autos são contundentes em demonstrar a falha na prestação dos serviços, o desvio produtivo, o descumprimento contratual e, especialmente, que a parte reclamante passou por situação degradante em decorrência do atraso. Nesse sentido, o atraso aproximado de 6 horas configura conduta ilícita da companhia aérea, de modo que resta configurado a responsabilidade civil e o dever de indenizar. No mais, tenho que a indenização por danos morais deve ser fixada de acordo com o juízo prudencial, não podendo ser arbitrada em valor irrisório a ponto de servir de desestímulo ao lesante, tampouco em quantia que fomente o enriquecimento sem causa. Deve-se buscar um equilíbrio entre as possibilidades do lesante, as condições do lesado e fazer com que se dote a sanção de um caráter inibidor. Assim, seguindo os critérios fornecidos pela doutrina e jurisprudência, e considerando a extensão do dano, as circunstâncias das partes e demais peculiaridades do caso concreto, fixo a indenização por danos morais em R$ 2.000,00 (dois mil reais). Diante do exposto, proponho, com fulcro no art. 487, I, do CPC, JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado para CONDENAR a Requerida ao pagamento de R$ 2.000,00 (dois mil reais) para a reclamante, a título de danos morais, corrigido monetariamente pelo IPCA a partir da presente data, nos termos do art. 389, do Código Civil, mais juros mensais pela SELIC, contados da data citação, nos termos do art. 406, do Código Civil. Sem custas processuais e honorários advocatícios (art. 54 e art. 55 da lei nº 9.099/95). SUBMETO o presente projeto de sentença à homologação do MM. Juiz de Direito, nos termos do art. 40 da Lei 9.099/95. João Celestino Batista Neto Juiz Leigo Vistos, etc. HOMOLOGO, para que produza seus jurídicos e legais efeitos, o projeto de sentença elaborado pelo Juiz Leigo, na forma do artigo 40 da Lei n. 9.099/1995. Transitada em julgado, devidamente certificado e nada sendo requerido, ARQUIVE-SE com as baixas e anotações de estilo. Cumpra-se. Às providências. Lucas do Rio Verde/MT, data da assinatura digital. Maurício Alexandre Ribeiro Juiz de Direito

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Processo nº 1017244-68.2025.8.11.0000

ID: 330126445

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1017244-68.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 21/07/2025

Polo Ativo:

LEONIDAS BENEDITO MONTEIRO DA SILVA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ADRIANA REGINA RAGNINI

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1017244-68.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Esbulho / Turbação / Ameaça] Relator: Des… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1017244-68.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Esbulho / Turbação / Ameaça] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [ADRIANA REGINA RAGNINI - CPF: 514.625.401-04 (ADVOGADO), LEONIDAS BENEDITO MONTEIRO DA SILVA - CPF: 009.693.761-03 (AGRAVANTE), RONNES PINTO DO NASCIMENTO - CPF: 026.999.651-62 (AGRAVADO), HELIO CASTELO BRANCO DE OLIVEIRA JUNIOR - CPF: 459.203.891-68 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. TUTELA POSSESSÓRIA. DOCUMENTAÇÃO CONTROVERTIDA. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA DE ESBULHO. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. DESIGNAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que deferiu tutela possessória em favor do Agravado, determinando a desocupação voluntária do imóvel pelo Agravante, em ação de reintegração de posse fundada em alegada cadeia possessória documental, boletim de ocorrência e suposta declaração de confrontantes. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se estavam presentes os requisitos do art. 561 do CPC para concessão da tutela possessória liminar, diante de impugnação à autenticidade da cadeia documental apresentada e da ausência de demonstração segura de esbulho, bem como se era necessária a designação de audiência de justificação prévia diante da controvérsia fática. III. Razões de decidir 3. O deferimento da tutela possessória exige prova suficiente da posse do autor, do esbulho pelo réu e da data do esbulho (CPC, art. 561). 4. Verificou-se fragilidade na documentação apresentada pelo Agravado, notadamente a existência de indícios de erro material relevante e possível falsidade na escritura de cessão de posse, ausência de demonstração inequívoca do esbulho e exercício da posse pelo Agravante há mais de três décadas. 5. Em situações de conflito fático e documental relevante, impõe-se a designação de audiência de justificação prévia, a teor do art. 562 do CPC, como garantia mínima do contraditório e da ampla defesa, especialmente quando a prova documental é insuficiente à formação do convencimento judicial. 6. Prevalece, nesses casos, o princípio da manutenção do estado fático (“quieta non movere”) até deliberação final após regular instrução probatória. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de agravo de instrumento provido para reformar a decisão agravada e indeferir a tutela possessória, mantendo o Agravante na posse do imóvel até ulterior deliberação fundamentada após instrução. Tese de julgamento: “1. A concessão de liminar em ação possessória exige prova robusta da posse pelo autor, do esbulho praticado pelo réu e da data do esbulho. 2. Em havendo controvérsia relevante sobre a cadeia possessória e indícios de documentação irregular, impõe-se a realização de audiência de justificação prévia, nos termos do art. 562 do CPC. 3. Deve ser preservado o estado fático consolidado até deliberação final após ampla instrução probatória.” Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 1.196, 1.207; CPC, arts. 561 e 562. Jurisprudência relevante citada: TJMT, N.U 1007473-66.2025.8.11.0000, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 12/05/2025; TJMT, N.U 1007888-83.2024.8.11.0000, Rel. Des. Sebastião de Moraes Filho, 2ª Câmara de Direito Privado, j. 08/07/2024; TJMT, N.U 1031495-28.2024.8.11.0000, Rel. Tatiane Colombo, 2ª Câmara de Direito Privado, j. 22/05/2025. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES [RELATOR] Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto por LEONIDAS BENEDITO MONTEIRO DA SILVA contra a decisão proferida pelo Dr. Alexandre Paulichi Chiovitti, Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Santo Antônio do Leverger, nos autos da Ação de Reintegração de Posse n. 1001031-56.2024.8.11.0053, ajuizada por RONNES PINTO DO NASCIMENTO, que concedeu tutela possessória para determinar a desocupação voluntária do imóvel pelo Agravante no prazo de 15 dias, sob pena de reintegração forçada, fundamentando-se em suposta cadeia possessória comprovada por escrituras públicas, boletim de ocorrência e alegada declaração de confrontantes (ID. 192482877, na origem). Em suas razões recursais (ID. 289548397), o Agravante alega, em síntese, que a decisão agravada se fundamentou em documentos de autenticidade questionável, notadamente escritura pública que apresenta vícios formais relevantes, inclusive com nome incorreto de seu genitor constando como “Anízio Ribeiro Galio” quando o correto é “Anízio Ribeiro da Silva”, além de suspeita de falsidade da escritura de cessão de posse, tendo já protocolado pedido de verificação de autenticidade junto ao cartório competente e registrado boletim de ocorrência relatando a suposta falsificação. Aduz, ainda, que a decisão menciona expressamente “declaração dos confrontantes” como elemento probatório quando tal documento sequer consta dos autos de origem, o que compromete a higidez da fundamentação, sustentando que exerce posse direta e duradoura sobre o imóvel há mais de 36 anos, de forma contínua, mansa, pacífica e com ânimo de dono, circunstância que afasta a caracterização de esbulho possessório e demonstra o preenchimento dos requisitos para usucapião extraordinária. Por fim, aponta violação aos princípios constitucionais do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, pois não foi oportunizada a realização de audiência de justificação prévia nem a oitiva da parte contrária antes da concessão da tutela possessória. Com essas considerações, requereu a concessão de efeito suspensivo ao presente recurso. No mérito, pleiteia o provimento do agravo para reformar integralmente a decisão recorrida, indeferindo a tutela possessória concedida. O pedido de efeito suspensivo foi deferido para sustar os efeitos da decisão que determinava a desocupação voluntária do imóvel pelo Agravante. Na mesma decisão, também foram concedidos os benefícios da justiça gratuita ao Agravante (ID. 290238377). Em contrarrazões (ID. 295757864), o Agravado defende a manutenção da decisão, alegando que demonstrou documentalmente a cadeia possessória legítima do imóvel, desde o Sr. Anízio até sua transferência para o Agravado, por meio de documentos públicos dotados de presunção de veracidade. Impugna os argumentos do Agravante sobre suposta falsidade documental, apontando que os questionamentos surgiram apenas após a concessão da liminar e não são respaldados por provas concretas. Sustenta que não há nulidade pela ausência de audiência de justificação, uma vez que a prova documental foi suficiente para a concessão da medida. Ao final, se manifesta pelo desprovimento do recurso, a revogação do efeito suspensivo concedido, o indeferimento da justiça gratuita e a condenação do Agravante ao pagamento das custas processuais e honorários recursais. É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES [RELATOR] Egrégia Câmara: Conforme relatado, o agravante LEONIDAS BENEDITO MONTEIRO DA SILVA pretende a reforma da decisão interlocutória que, nos autos da Ação de Reintegração de Posse n. 1001031-56.2024.8.11.0053, deferiu liminar em favor do Agravado, RONNES PINTO DO NASCIMENTO, determinando sua desocupação voluntária do imóvel objeto da lide, sob pena de reintegração forçada. Do cotejo dos autos, verifico que, de fato, o recurso comporta provimento. Vejamos. No caso sub judice, constou da decisão agravada, no que pertine: “[...] Cuida-se de ação de imissão na posse formulada por RONNES PINTO DO NASCIMENTO em face de LEONIDAS BENEDITO MONTEIRO DA SILVA, qualificados nos autos. Afirma na inicial que o autor adquiriu a posse do imóvel descrito na exordial, mediante escritura pública de cessão e transferência de direito de posse. Contudo, afirma que após efetivação da transferência da posse, tomou conhecimento que o requerido, que reside em imóvel ao lado do imóvel da exordial, vem utilizando-o. Emenda à inicial para transformar os pedidos em reintegração de posse. Vieram-me os autos conclusos. É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO. Recebo a emenda à inicial para o trâmite do feito como ação de reintegração de posse. Cuida-se de se apreciar o pedido de concessão da tutela possessória. [...] Pois bem. In casu, com o fito de comprovar a efetiva posse do requerente, bem como a data da turbação/esbulho, pelo requerido, foram juntados aos autos boletim de ocorrência, documento da propriedade e declaração dos confrontantes. Neste caso, com lastro nas provas colacionadas em juízo até o momento, tenho estar suficientemente comprovado que o requerente exerce a posse sobre o imóvel descrito na exordial. Isto porque, o documento de ID 169811814, confirma a posse do imóvel por ANIZIO, qual a transferiu para NILDA, isso no ano de 2009. Já o documento de ID 169811818, consta a transferência da posse de NILDA para MARCIO THEODORO. Por fim, o documento de ID 169811815 comprova a transferência da posse de MARCIO THEODORO para RONNES PINTO. Destarte, imperioso o deferimento da liminar, visto que presentes os requisitos do art. 561, do Código de Processo Civil, pois que, demonstrado, em juízo de cognição sumária, a posse do autor, o esbulho do requerido e a data deste. No ponto, convém destacar que a posse do autor é oriunda, portanto, da acessão possessória (CC, art. 1.207), pois é faculdade ao sucessor singular unir sua posse à posse do seu antecessor. Considerando que há comprovação da cadeia possessória, bem assim o direito ao resguardo do atual possuidor (posse adquirida - possuidor indireto), temos que preenchido o requisito autorizador do art. 561, I, do CPC. O esbulho possessório fica comprovado através do boletim de ocorrência anexado aos autos (ID 169811813), qual atesta a ocorrência da invasão no imóvel autoral. Portanto, temos pela concessão da tutela possessória. Por fim, friso novamente que nesta fase de cognitio non plena não se reclama prova cabal e irrefutável, bastando que, dos elementos coligidos na inicial, deflua razoável convencimento quanto à necessidade da concessão da medida antecipatória. Isto posto, e pelo que mais consta dos autos, CONCEDO A TUTELA POSSSESSÓRIA prevista no rito especial possessório para DETERMINAR a desocupação voluntária do imóvel pela requerida no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de reintegração forçada. [...]” (ID. 192482877, na origem). Em sua insurgência recursal, o Agravante alega que a decisão recorrida se baseou em escritura com indícios de falsificação e erro na identificação de seu genitor, cuja autenticidade está sendo questionada em cartório e por boletim de ocorrência. Sustenta que exerce posse mansa e contínua sobre o imóvel há mais de 36 anos, sem prova de esbulho, e que a liminar foi concedida sem audiência de justificação, em afronta ao contraditório e ao devido processo legal, conforme previsão do artigo 562 do Código de Processo Civil. Pois bem. Inicialmente, cumpre consignar que o agravo de instrumento é um recurso secundum eventum litis, ou seja, tem a sua matéria de análise restrita ao acerto ou desacerto técnico da decisão recorrida, não podendo extrapolar para a matéria de fundo e nem para as que não foram deduzidas em primeiro grau, sob pena de supressão de instância. Nos termos do artigo 1.196 do Código Civil, a posse é tutelada como direito autônomo, independentemente do domínio. Em caso de turbação ou esbulho, ao possuidor assiste o direito de ser protegido pelas ações possessórias, sendo a reintegração o instrumento cabível para reprimir o esbulho. O artigo 561 do Código de Processo Civil, por sua vez, estabelece os pressupostos específicos para a concessão de tutela liminar possessória: “Art. 561. Incumbe ao autor provar: I - a sua posse; II - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu; III - a data da turbação ou do esbulho; IV - a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, ou a perda da posse, na ação de reintegração”. No caso concreto, observa-se que o Juízo a quo considerou presentes esses requisitos com base em cadeia possessória retratada em três escrituras públicas de cessão de direitos possessórios, boletim de ocorrência e suposta declaração de confrontantes (ID. 169811813, 169811814, 169811815, 169811818 e 169811819, na origem). Contudo, uma análise mais acurada revela fragilidades substanciais na documentação apresentada. Verifica-se, com efeito, que a escritura de cessão atribuída ao suposto possuidor originário, “ANIZIO RIBEIRO GALIO” (ID. 169811814, na origem), contém erro material relevante no nome do outorgante, cujo nome correto, conforme documentos públicos apresentados pelo Agravante, é “Anízio Ribeiro da Silva” (ID. 289559873). Desse modo, embora o Agravado afirme se tratar de mero erro formal, a justificativa se mostra insuficiente diante da ausência de qualquer confirmação cartorária quanto à autenticidade da escritura, sobretudo diante de impugnação fundamentada e apresentação de documentos pessoais que demonstram divergência substancial quanto à identidade do outorgante. Ademais, a alegação de falsidade documental encontra respaldo inicial em boletim de ocorrência registrado pela própria genitora do Agravante (ID. 289552878), no qual afirma jamais ter outorgado qualquer cessão possessória referente ao imóvel, bem como em requerimento formal dirigido ao cartório competente (ID. 289552875), por meio do qual se pleiteiam esclarecimentos quanto à autenticidade e regularidade da escritura pública que embasa a pretensão do Agravado. Soma-se a isso a ausência de qualquer elemento robusto quanto à data e natureza do suposto esbulho, não havendo demonstração objetiva de que o Agravante tenha invadido ou turbado a posse do Agravado. Ao contrário, os elementos constantes nos autos indicam que o Agravante exerce posse direta sobre o imóvel desde a década de 1980, fato corroborado por documentos diversos (ID. 289559865, 289559867, 289559869 e 289559870) e por testemunhos de confrontantes (ID. 289559861, 289559863 e 289559864). Destarte, ausente a comprovação segura da posse anterior do Agravado, bem como do alegado esbulho, não se revela legítima a concessão de liminar possessória, sendo imprescindível a dilação probatória para apuração dos fatos controvertidos. Nos termos do artigo 562 do Código de Processo Civil, “Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá, sem ouvir o réu, a expedição do mandado liminar de manutenção ou de reintegração, caso contrário, determinará que o autor justifique previamente o alegado, citando-se o réu para comparecer à audiência que for designada”. Por oportuno, impende ressaltar que a realização de audiência de justificação prévia é faculdade do magistrado, a ser exercida conforme o juízo de suficiência das provas iniciais apresentadas pelo autor (TJMT, N.U 1011090-34.2025.8.11.0000, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 02/07/2025, DJe 02/07/2025). Dessa forma, a sua não realização, por si só, não configura ofensa automática aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Todavia, no caso concreto, diante das peculiaridades da demanda - notadamente, a antiguidade da posse alegada pelo Agravante, os indícios de irregularidade na cadeia documental apresentada pelo Agravado, a existência de boletim de ocorrência noticiando falsificação e a controvérsia quanto à identidade do suposto antecessor possessório - a designação da audiência de justificação se impunha como instrumento necessário de aferição mínima da verossimilhança dos fatos e da higidez da posse invocada. Assim, a despeito de sua natureza facultativa, a não realização da audiência de justificação, em cenário de flagrante conflito fático e documental, comprometeu a formação do juízo de cognição sumária, tornando prematuro o deferimento da liminar possessória. Aliás, a jurisprudência desta Egrégia Corte reconhece a imprescindibilidade da audiência de justificação prévia nas hipóteses em que a prova documental apresentada na inicial se mostra insuficiente para a concessão da tutela possessória, especialmente diante de controvérsia sobre a existência da posse e a ocorrência do suposto esbulho. Confira-se: “DIREITO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. AUSÊNCIA DE AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. [...] A revogação da procuração só foi formalizada após os fatos narrados como constitutivos do esbulho, sendo a notificação extrajudicial ineficaz por ausência de comprovação de ciência. A ausência de audiência de justificação, diante de prova documental insuficiente, contraria o disposto no art. 562 do CPC, que impõe sua realização quando não demonstrados os requisitos do art. 561. A designação da audiência é necessária para aferição da posse e da ocorrência de esbulho, dado o conflito sobre a existência de posse consentida e a legitimidade do rompimento do vínculo jurídico. IV. Dispositivo e tese. Recurso conhecido em parte e provido para anular a decisão que deferiu a liminar e determinar a realização de audiência de justificação. Tese de julgamento: “A concessão de liminar em ação possessória exige, quando ausente prova documental robusta, a prévia realização de audiência de justificação, conforme art. 562 do CPC. A revogação de procuração posterior ao alegado esbulho e a ausência de comprovação de ciência inequívoca do rompimento do vínculo de permissão de uso demandam dilação probatória mínima.” [...]” (TJMT, N.U 1007473-66.2025.8.11.0000, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 12/05/2025, DJe 12/05/2025 - grifo nosso). Para mais, em hipóteses como a presente, em que ambas as partes alegam posse e o conflito sobre sua titularidade remonta a fatos de longa duração, prevalece, como medida de cautela e equilíbrio, o princípio “quieta non movere”, segundo o qual deve ser mantido o estado fático consolidado até deliberação final após ampla instrução. Nesse sentido: “AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE - DEFERIMENTO DA LIMINAR APÓS A REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO PRÉVIA - REVOGAÇÃO - AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 561, DO CPC - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO “QUIETA NON MOVERE” - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. [...] A demanda possessória envolve a comprovação da posse e, no caso, ambas as partes sustentam a posse do imóvel, necessitando a matéria em debate de dilação probatória, principalmente porque a posse é questão de fato, não de direito, fazendo-se necessária a instrução do feito para formação de um juízo de convicção mais seguro. Assim, mostrando-se conveniente que se mantenha a situação fática existente ao tempo da propositura da demanda, por força do princípio “quieta non movere”, que aconselha a conservação da situação fática já existente ao tempo da propositura da demanda; notadamente quando necessária ampla dilação probatória.” (TJMT, N.U 1007888-83.2024.8.11.0000, Rel. Des. Sebastião de Moraes Filho, 2ª Câmara de Direito Privado, j. 08/07/2024, DJE 08/07/2024 - grifo nosso). À vista disso, a remoção forçada do Agravante, em sede de cognição sumária, sem que haja demonstração clara de posse anterior legítima do Agravado e sem a devida instrução, viola o equilíbrio processual e impõe risco irreparável à segurança possessória. A propósito: “DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. LIMINAR DEFERIDA NA ORIGEM. PROBABILIDADE DO DIREITO NÃO DEMONSTRADA. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 561 DO CPC. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. DECISÃO REFORMADA. RECURSO PROVIDO. [...] 3. A posse alegada pelo Espólio não restou comprovada nos autos, uma vez que o título dominial não se confunde com exercício de posse efetiva, especialmente diante da ausência de elementos probatórios produzidos na audiência de justificação. 4. O Agravante apresentou documentação robusta apontando indícios concretos de posse, como matrícula contígua, auto de infração ambiental, contrato de compra e venda e registros fotográficos da área. 5. A controvérsia sobre os limites entre as propriedades exige dilação probatória, sendo incabível a concessão de medida liminar em tais circunstâncias. 6. A ausência de provas pela parte autora, a despeito de provocada, compromete a higidez da decisão concessiva da tutela possessória. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso provido. Revogada a liminar de reintegração de posse. Tese de julgamento: "1. A concessão de liminar em ação de reintegração de posse exige prova mínima da posse efetiva pelo autor, não sendo suficiente o título de propriedade, especialmente quando há controvérsia sobre os limites do imóvel. 2. Havendo dúvida relevante quanto à posse anterior e ao esbulho, impõe-se a realização de audiência de instrução antes da concessão da reintegração de posse."” (TJMT, N.U 1031495-28.2024.8.11.0000, Rel. Tatiane Colombo, 2ª Câmara de Direito Privado, j. 22/05/2025, DJe 22/05/2025 - grifo nosso). Com tais considerações, ausente prova segura da posse legítima pelo Agravado, diante das dúvidas quanto aos documentos apresentados, dos indícios de posse contínua do Agravante por mais de três décadas e da ausência de audiência de justificação em cenário fático controvertido, impõe-se a reforma da decisão recorrida. Diante do exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso de agravo de instrumento interposto por LEONIDAS BENEDITO MONTEIRO DA SILVA, para REFORMAR a decisão agravada, INDEFERINDO a tutela possessória concedida em favor de RONNES PINTO DO NASCIMENTO, com a consequente suspensão de qualquer medida de desocupação até ulterior deliberação no Juízo de origem, devidamente fundamentada, após regular instrução probatória. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/07/2025

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Processo nº 1017244-68.2025.8.11.0000

ID: 330126464

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1017244-68.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 21/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

RONNES PINTO DO NASCIMENTO

Acórdão

Advogados:

HELIO CASTELO BRANCO DE OLIVEIRA JUNIOR

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1017244-68.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Esbulho / Turbação / Ameaça] Relator: Des… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1017244-68.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Esbulho / Turbação / Ameaça] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [ADRIANA REGINA RAGNINI - CPF: 514.625.401-04 (ADVOGADO), LEONIDAS BENEDITO MONTEIRO DA SILVA - CPF: 009.693.761-03 (AGRAVANTE), RONNES PINTO DO NASCIMENTO - CPF: 026.999.651-62 (AGRAVADO), HELIO CASTELO BRANCO DE OLIVEIRA JUNIOR - CPF: 459.203.891-68 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. TUTELA POSSESSÓRIA. DOCUMENTAÇÃO CONTROVERTIDA. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA DE ESBULHO. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. DESIGNAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que deferiu tutela possessória em favor do Agravado, determinando a desocupação voluntária do imóvel pelo Agravante, em ação de reintegração de posse fundada em alegada cadeia possessória documental, boletim de ocorrência e suposta declaração de confrontantes. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se estavam presentes os requisitos do art. 561 do CPC para concessão da tutela possessória liminar, diante de impugnação à autenticidade da cadeia documental apresentada e da ausência de demonstração segura de esbulho, bem como se era necessária a designação de audiência de justificação prévia diante da controvérsia fática. III. Razões de decidir 3. O deferimento da tutela possessória exige prova suficiente da posse do autor, do esbulho pelo réu e da data do esbulho (CPC, art. 561). 4. Verificou-se fragilidade na documentação apresentada pelo Agravado, notadamente a existência de indícios de erro material relevante e possível falsidade na escritura de cessão de posse, ausência de demonstração inequívoca do esbulho e exercício da posse pelo Agravante há mais de três décadas. 5. Em situações de conflito fático e documental relevante, impõe-se a designação de audiência de justificação prévia, a teor do art. 562 do CPC, como garantia mínima do contraditório e da ampla defesa, especialmente quando a prova documental é insuficiente à formação do convencimento judicial. 6. Prevalece, nesses casos, o princípio da manutenção do estado fático (“quieta non movere”) até deliberação final após regular instrução probatória. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso de agravo de instrumento provido para reformar a decisão agravada e indeferir a tutela possessória, mantendo o Agravante na posse do imóvel até ulterior deliberação fundamentada após instrução. Tese de julgamento: “1. A concessão de liminar em ação possessória exige prova robusta da posse pelo autor, do esbulho praticado pelo réu e da data do esbulho. 2. Em havendo controvérsia relevante sobre a cadeia possessória e indícios de documentação irregular, impõe-se a realização de audiência de justificação prévia, nos termos do art. 562 do CPC. 3. Deve ser preservado o estado fático consolidado até deliberação final após ampla instrução probatória.” Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 1.196, 1.207; CPC, arts. 561 e 562. Jurisprudência relevante citada: TJMT, N.U 1007473-66.2025.8.11.0000, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 12/05/2025; TJMT, N.U 1007888-83.2024.8.11.0000, Rel. Des. Sebastião de Moraes Filho, 2ª Câmara de Direito Privado, j. 08/07/2024; TJMT, N.U 1031495-28.2024.8.11.0000, Rel. Tatiane Colombo, 2ª Câmara de Direito Privado, j. 22/05/2025. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES [RELATOR] Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto por LEONIDAS BENEDITO MONTEIRO DA SILVA contra a decisão proferida pelo Dr. Alexandre Paulichi Chiovitti, Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Santo Antônio do Leverger, nos autos da Ação de Reintegração de Posse n. 1001031-56.2024.8.11.0053, ajuizada por RONNES PINTO DO NASCIMENTO, que concedeu tutela possessória para determinar a desocupação voluntária do imóvel pelo Agravante no prazo de 15 dias, sob pena de reintegração forçada, fundamentando-se em suposta cadeia possessória comprovada por escrituras públicas, boletim de ocorrência e alegada declaração de confrontantes (ID. 192482877, na origem). Em suas razões recursais (ID. 289548397), o Agravante alega, em síntese, que a decisão agravada se fundamentou em documentos de autenticidade questionável, notadamente escritura pública que apresenta vícios formais relevantes, inclusive com nome incorreto de seu genitor constando como “Anízio Ribeiro Galio” quando o correto é “Anízio Ribeiro da Silva”, além de suspeita de falsidade da escritura de cessão de posse, tendo já protocolado pedido de verificação de autenticidade junto ao cartório competente e registrado boletim de ocorrência relatando a suposta falsificação. Aduz, ainda, que a decisão menciona expressamente “declaração dos confrontantes” como elemento probatório quando tal documento sequer consta dos autos de origem, o que compromete a higidez da fundamentação, sustentando que exerce posse direta e duradoura sobre o imóvel há mais de 36 anos, de forma contínua, mansa, pacífica e com ânimo de dono, circunstância que afasta a caracterização de esbulho possessório e demonstra o preenchimento dos requisitos para usucapião extraordinária. Por fim, aponta violação aos princípios constitucionais do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, pois não foi oportunizada a realização de audiência de justificação prévia nem a oitiva da parte contrária antes da concessão da tutela possessória. Com essas considerações, requereu a concessão de efeito suspensivo ao presente recurso. No mérito, pleiteia o provimento do agravo para reformar integralmente a decisão recorrida, indeferindo a tutela possessória concedida. O pedido de efeito suspensivo foi deferido para sustar os efeitos da decisão que determinava a desocupação voluntária do imóvel pelo Agravante. Na mesma decisão, também foram concedidos os benefícios da justiça gratuita ao Agravante (ID. 290238377). Em contrarrazões (ID. 295757864), o Agravado defende a manutenção da decisão, alegando que demonstrou documentalmente a cadeia possessória legítima do imóvel, desde o Sr. Anízio até sua transferência para o Agravado, por meio de documentos públicos dotados de presunção de veracidade. Impugna os argumentos do Agravante sobre suposta falsidade documental, apontando que os questionamentos surgiram apenas após a concessão da liminar e não são respaldados por provas concretas. Sustenta que não há nulidade pela ausência de audiência de justificação, uma vez que a prova documental foi suficiente para a concessão da medida. Ao final, se manifesta pelo desprovimento do recurso, a revogação do efeito suspensivo concedido, o indeferimento da justiça gratuita e a condenação do Agravante ao pagamento das custas processuais e honorários recursais. É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES [RELATOR] Egrégia Câmara: Conforme relatado, o agravante LEONIDAS BENEDITO MONTEIRO DA SILVA pretende a reforma da decisão interlocutória que, nos autos da Ação de Reintegração de Posse n. 1001031-56.2024.8.11.0053, deferiu liminar em favor do Agravado, RONNES PINTO DO NASCIMENTO, determinando sua desocupação voluntária do imóvel objeto da lide, sob pena de reintegração forçada. Do cotejo dos autos, verifico que, de fato, o recurso comporta provimento. Vejamos. No caso sub judice, constou da decisão agravada, no que pertine: “[...] Cuida-se de ação de imissão na posse formulada por RONNES PINTO DO NASCIMENTO em face de LEONIDAS BENEDITO MONTEIRO DA SILVA, qualificados nos autos. Afirma na inicial que o autor adquiriu a posse do imóvel descrito na exordial, mediante escritura pública de cessão e transferência de direito de posse. Contudo, afirma que após efetivação da transferência da posse, tomou conhecimento que o requerido, que reside em imóvel ao lado do imóvel da exordial, vem utilizando-o. Emenda à inicial para transformar os pedidos em reintegração de posse. Vieram-me os autos conclusos. É O RELATÓRIO. FUNDAMENTO E DECIDO. Recebo a emenda à inicial para o trâmite do feito como ação de reintegração de posse. Cuida-se de se apreciar o pedido de concessão da tutela possessória. [...] Pois bem. In casu, com o fito de comprovar a efetiva posse do requerente, bem como a data da turbação/esbulho, pelo requerido, foram juntados aos autos boletim de ocorrência, documento da propriedade e declaração dos confrontantes. Neste caso, com lastro nas provas colacionadas em juízo até o momento, tenho estar suficientemente comprovado que o requerente exerce a posse sobre o imóvel descrito na exordial. Isto porque, o documento de ID 169811814, confirma a posse do imóvel por ANIZIO, qual a transferiu para NILDA, isso no ano de 2009. Já o documento de ID 169811818, consta a transferência da posse de NILDA para MARCIO THEODORO. Por fim, o documento de ID 169811815 comprova a transferência da posse de MARCIO THEODORO para RONNES PINTO. Destarte, imperioso o deferimento da liminar, visto que presentes os requisitos do art. 561, do Código de Processo Civil, pois que, demonstrado, em juízo de cognição sumária, a posse do autor, o esbulho do requerido e a data deste. No ponto, convém destacar que a posse do autor é oriunda, portanto, da acessão possessória (CC, art. 1.207), pois é faculdade ao sucessor singular unir sua posse à posse do seu antecessor. Considerando que há comprovação da cadeia possessória, bem assim o direito ao resguardo do atual possuidor (posse adquirida - possuidor indireto), temos que preenchido o requisito autorizador do art. 561, I, do CPC. O esbulho possessório fica comprovado através do boletim de ocorrência anexado aos autos (ID 169811813), qual atesta a ocorrência da invasão no imóvel autoral. Portanto, temos pela concessão da tutela possessória. Por fim, friso novamente que nesta fase de cognitio non plena não se reclama prova cabal e irrefutável, bastando que, dos elementos coligidos na inicial, deflua razoável convencimento quanto à necessidade da concessão da medida antecipatória. Isto posto, e pelo que mais consta dos autos, CONCEDO A TUTELA POSSSESSÓRIA prevista no rito especial possessório para DETERMINAR a desocupação voluntária do imóvel pela requerida no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de reintegração forçada. [...]” (ID. 192482877, na origem). Em sua insurgência recursal, o Agravante alega que a decisão recorrida se baseou em escritura com indícios de falsificação e erro na identificação de seu genitor, cuja autenticidade está sendo questionada em cartório e por boletim de ocorrência. Sustenta que exerce posse mansa e contínua sobre o imóvel há mais de 36 anos, sem prova de esbulho, e que a liminar foi concedida sem audiência de justificação, em afronta ao contraditório e ao devido processo legal, conforme previsão do artigo 562 do Código de Processo Civil. Pois bem. Inicialmente, cumpre consignar que o agravo de instrumento é um recurso secundum eventum litis, ou seja, tem a sua matéria de análise restrita ao acerto ou desacerto técnico da decisão recorrida, não podendo extrapolar para a matéria de fundo e nem para as que não foram deduzidas em primeiro grau, sob pena de supressão de instância. Nos termos do artigo 1.196 do Código Civil, a posse é tutelada como direito autônomo, independentemente do domínio. Em caso de turbação ou esbulho, ao possuidor assiste o direito de ser protegido pelas ações possessórias, sendo a reintegração o instrumento cabível para reprimir o esbulho. O artigo 561 do Código de Processo Civil, por sua vez, estabelece os pressupostos específicos para a concessão de tutela liminar possessória: “Art. 561. Incumbe ao autor provar: I - a sua posse; II - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu; III - a data da turbação ou do esbulho; IV - a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, ou a perda da posse, na ação de reintegração”. No caso concreto, observa-se que o Juízo a quo considerou presentes esses requisitos com base em cadeia possessória retratada em três escrituras públicas de cessão de direitos possessórios, boletim de ocorrência e suposta declaração de confrontantes (ID. 169811813, 169811814, 169811815, 169811818 e 169811819, na origem). Contudo, uma análise mais acurada revela fragilidades substanciais na documentação apresentada. Verifica-se, com efeito, que a escritura de cessão atribuída ao suposto possuidor originário, “ANIZIO RIBEIRO GALIO” (ID. 169811814, na origem), contém erro material relevante no nome do outorgante, cujo nome correto, conforme documentos públicos apresentados pelo Agravante, é “Anízio Ribeiro da Silva” (ID. 289559873). Desse modo, embora o Agravado afirme se tratar de mero erro formal, a justificativa se mostra insuficiente diante da ausência de qualquer confirmação cartorária quanto à autenticidade da escritura, sobretudo diante de impugnação fundamentada e apresentação de documentos pessoais que demonstram divergência substancial quanto à identidade do outorgante. Ademais, a alegação de falsidade documental encontra respaldo inicial em boletim de ocorrência registrado pela própria genitora do Agravante (ID. 289552878), no qual afirma jamais ter outorgado qualquer cessão possessória referente ao imóvel, bem como em requerimento formal dirigido ao cartório competente (ID. 289552875), por meio do qual se pleiteiam esclarecimentos quanto à autenticidade e regularidade da escritura pública que embasa a pretensão do Agravado. Soma-se a isso a ausência de qualquer elemento robusto quanto à data e natureza do suposto esbulho, não havendo demonstração objetiva de que o Agravante tenha invadido ou turbado a posse do Agravado. Ao contrário, os elementos constantes nos autos indicam que o Agravante exerce posse direta sobre o imóvel desde a década de 1980, fato corroborado por documentos diversos (ID. 289559865, 289559867, 289559869 e 289559870) e por testemunhos de confrontantes (ID. 289559861, 289559863 e 289559864). Destarte, ausente a comprovação segura da posse anterior do Agravado, bem como do alegado esbulho, não se revela legítima a concessão de liminar possessória, sendo imprescindível a dilação probatória para apuração dos fatos controvertidos. Nos termos do artigo 562 do Código de Processo Civil, “Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá, sem ouvir o réu, a expedição do mandado liminar de manutenção ou de reintegração, caso contrário, determinará que o autor justifique previamente o alegado, citando-se o réu para comparecer à audiência que for designada”. Por oportuno, impende ressaltar que a realização de audiência de justificação prévia é faculdade do magistrado, a ser exercida conforme o juízo de suficiência das provas iniciais apresentadas pelo autor (TJMT, N.U 1011090-34.2025.8.11.0000, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 02/07/2025, DJe 02/07/2025). Dessa forma, a sua não realização, por si só, não configura ofensa automática aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Todavia, no caso concreto, diante das peculiaridades da demanda - notadamente, a antiguidade da posse alegada pelo Agravante, os indícios de irregularidade na cadeia documental apresentada pelo Agravado, a existência de boletim de ocorrência noticiando falsificação e a controvérsia quanto à identidade do suposto antecessor possessório - a designação da audiência de justificação se impunha como instrumento necessário de aferição mínima da verossimilhança dos fatos e da higidez da posse invocada. Assim, a despeito de sua natureza facultativa, a não realização da audiência de justificação, em cenário de flagrante conflito fático e documental, comprometeu a formação do juízo de cognição sumária, tornando prematuro o deferimento da liminar possessória. Aliás, a jurisprudência desta Egrégia Corte reconhece a imprescindibilidade da audiência de justificação prévia nas hipóteses em que a prova documental apresentada na inicial se mostra insuficiente para a concessão da tutela possessória, especialmente diante de controvérsia sobre a existência da posse e a ocorrência do suposto esbulho. Confira-se: “DIREITO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. AUSÊNCIA DE AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. [...] A revogação da procuração só foi formalizada após os fatos narrados como constitutivos do esbulho, sendo a notificação extrajudicial ineficaz por ausência de comprovação de ciência. A ausência de audiência de justificação, diante de prova documental insuficiente, contraria o disposto no art. 562 do CPC, que impõe sua realização quando não demonstrados os requisitos do art. 561. A designação da audiência é necessária para aferição da posse e da ocorrência de esbulho, dado o conflito sobre a existência de posse consentida e a legitimidade do rompimento do vínculo jurídico. IV. Dispositivo e tese. Recurso conhecido em parte e provido para anular a decisão que deferiu a liminar e determinar a realização de audiência de justificação. Tese de julgamento: “A concessão de liminar em ação possessória exige, quando ausente prova documental robusta, a prévia realização de audiência de justificação, conforme art. 562 do CPC. A revogação de procuração posterior ao alegado esbulho e a ausência de comprovação de ciência inequívoca do rompimento do vínculo de permissão de uso demandam dilação probatória mínima.” [...]” (TJMT, N.U 1007473-66.2025.8.11.0000, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 12/05/2025, DJe 12/05/2025 - grifo nosso). Para mais, em hipóteses como a presente, em que ambas as partes alegam posse e o conflito sobre sua titularidade remonta a fatos de longa duração, prevalece, como medida de cautela e equilíbrio, o princípio “quieta non movere”, segundo o qual deve ser mantido o estado fático consolidado até deliberação final após ampla instrução. Nesse sentido: “AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE - DEFERIMENTO DA LIMINAR APÓS A REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO PRÉVIA - REVOGAÇÃO - AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 561, DO CPC - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO “QUIETA NON MOVERE” - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. [...] A demanda possessória envolve a comprovação da posse e, no caso, ambas as partes sustentam a posse do imóvel, necessitando a matéria em debate de dilação probatória, principalmente porque a posse é questão de fato, não de direito, fazendo-se necessária a instrução do feito para formação de um juízo de convicção mais seguro. Assim, mostrando-se conveniente que se mantenha a situação fática existente ao tempo da propositura da demanda, por força do princípio “quieta non movere”, que aconselha a conservação da situação fática já existente ao tempo da propositura da demanda; notadamente quando necessária ampla dilação probatória.” (TJMT, N.U 1007888-83.2024.8.11.0000, Rel. Des. Sebastião de Moraes Filho, 2ª Câmara de Direito Privado, j. 08/07/2024, DJE 08/07/2024 - grifo nosso). À vista disso, a remoção forçada do Agravante, em sede de cognição sumária, sem que haja demonstração clara de posse anterior legítima do Agravado e sem a devida instrução, viola o equilíbrio processual e impõe risco irreparável à segurança possessória. A propósito: “DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. LIMINAR DEFERIDA NA ORIGEM. PROBABILIDADE DO DIREITO NÃO DEMONSTRADA. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 561 DO CPC. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. DECISÃO REFORMADA. RECURSO PROVIDO. [...] 3. A posse alegada pelo Espólio não restou comprovada nos autos, uma vez que o título dominial não se confunde com exercício de posse efetiva, especialmente diante da ausência de elementos probatórios produzidos na audiência de justificação. 4. O Agravante apresentou documentação robusta apontando indícios concretos de posse, como matrícula contígua, auto de infração ambiental, contrato de compra e venda e registros fotográficos da área. 5. A controvérsia sobre os limites entre as propriedades exige dilação probatória, sendo incabível a concessão de medida liminar em tais circunstâncias. 6. A ausência de provas pela parte autora, a despeito de provocada, compromete a higidez da decisão concessiva da tutela possessória. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso provido. Revogada a liminar de reintegração de posse. Tese de julgamento: "1. A concessão de liminar em ação de reintegração de posse exige prova mínima da posse efetiva pelo autor, não sendo suficiente o título de propriedade, especialmente quando há controvérsia sobre os limites do imóvel. 2. Havendo dúvida relevante quanto à posse anterior e ao esbulho, impõe-se a realização de audiência de instrução antes da concessão da reintegração de posse."” (TJMT, N.U 1031495-28.2024.8.11.0000, Rel. Tatiane Colombo, 2ª Câmara de Direito Privado, j. 22/05/2025, DJe 22/05/2025 - grifo nosso). Com tais considerações, ausente prova segura da posse legítima pelo Agravado, diante das dúvidas quanto aos documentos apresentados, dos indícios de posse contínua do Agravante por mais de três décadas e da ausência de audiência de justificação em cenário fático controvertido, impõe-se a reforma da decisão recorrida. Diante do exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso de agravo de instrumento interposto por LEONIDAS BENEDITO MONTEIRO DA SILVA, para REFORMAR a decisão agravada, INDEFERINDO a tutela possessória concedida em favor de RONNES PINTO DO NASCIMENTO, com a consequente suspensão de qualquer medida de desocupação até ulterior deliberação no Juízo de origem, devidamente fundamentada, após regular instrução probatória. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/07/2025

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Processo nº 1001224-37.2023.8.11.0108

ID: 259832975

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1001224-37.2023.8.11.0108

Data de Disponibilização: 24/04/2025

Polo Ativo:

HELITON MACHADO DE SOUZA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

GIOVANNA BARROSO MARTINS DA SILVA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001224-37.2023.8.11.0108 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Inadimplemento, Alienação Fiduciária] Relator: D… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001224-37.2023.8.11.0108 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Inadimplemento, Alienação Fiduciária] Relator: Des(a). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [HELITON MACHADO DE SOUZA - CPF: 974.833.201-25 (APELANTE), GIOVANNA BARROSO MARTINS DA SILVA - CPF: 402.972.598-81 (ADVOGADO), OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO - CNPJ: 92.228.410/0001-02 (APELADO), GIULIO ALVARENGA REALE - CPF: 639.139.336-20 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. PRELIMINARES DE INTERESSE PROCESSUAL E VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE REJEITADAS. JUROS REMUNERATÓRIOS. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. SEGURO PRESTAMISTA E ASSISTÊNCIA 24 HORAS. ALEGADA VENDA CASADA. INEXISTÊNCIA. CONTRATAÇÃO AUTÔNOMA. MANIFESTAÇÃO DE VONTADE. AUSÊNCIA DE IMPOSIÇÃO OU COAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados em ação revisional de contrato de financiamento de veículo, na qual o autor questiona a inclusão de valores referentes a seguro prestamista (R$ 1.329,15) e assistência 24 horas (R$ 400,00), alegando caracterizar venda casada, com postulação de recálculo das parcelas, restituição em dobro dos valores pagos e reconhecimento da ilegalidade das cobranças. II. Questão em discussão 2. Há três questões em discussão: (i) verificar preliminarmente a existência de interesse processual do apelante após a quitação do contrato e o atendimento ao princípio da dialeticidade; (ii) analisar a regularidade dos juros remuneratórios e do custo efetivo total do contrato de financiamento firmado entre as partes; e (iii) examinar se a contratação de seguro prestamista e serviço de assistência 24 horas configura prática de venda casada vedada pelo ordenamento jurídico, especificamente à luz do art. 39, I, do Código de Defesa do Consumidor e do entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema 972. III. Razões de decidir 3. A quitação do contrato não constitui óbice ao prosseguimento da ação revisional, conforme entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça, que assegura a possibilidade de discussão sobre eventuais ilegalidades em contratos já extintos pelo adimplemento, preservando-se o interesse processual do apelante. 4. O recurso atende ao princípio da dialeticidade, pois, embora reproduza parcialmente argumentos da inicial, mantém pertinência temática com o conteúdo decisório, impugnando especificamente os fundamentos da sentença recorrida, em conformidade com a jurisprudência do STJ que afasta a caracterização de ofensa ao referido princípio pela mera reiteração argumentativa. 5. Os juros remuneratórios pactuados em 1,67% ao mês (20,04% ao ano) situam-se em patamar consideravelmente inferior ao limite de abusividade calculado com base nas taxas médias de mercado contemporâneas à contratação, não caracterizando desvantagem exagerada prevista no art. 51, §1º, do CDC. 6. O Custo Efetivo Total (CET) de 70,32% ao ano possui autonomia conceitual e normativa em relação aos juros remuneratórios stricto sensu, compreendendo a totalidade dos encargos incidentes sobre a operação, não se submetendo aos mesmos parâmetros limitativos, conforme disciplinado no art. 3º da Resolução nº 4.881/2020 do Conselho Monetário Nacional. 7. A documentação acostada aos autos evidencia que os serviços acessórios foram objeto de contratação autônoma, mediante instrumentos formalmente independentes do contrato principal de financiamento, com destaque suficiente para permitir a cognoscibilidade das condições contratuais. 8. O termo de adesão apartado para o seguro de proteção financeira contém informações detalhadas sobre valores, coberturas e condições para eventual cancelamento, inclusive com previsão expressa de "cancelamento a qualquer tempo, com devolução do prêmio pago referente ao período a decorrer, se houver". 9. A tese firmada no Tema 972/STJ não estabelece vedação absoluta à comercialização de seguros em conexão com contratos bancários, mas sim a proibição de condicionamento do contrato principal à aquisição compulsória de seguro com entidade predeterminada, configurando-se abusividade apenas quando evidenciada a ausência de liberdade de escolha pelo consumidor. 10. Inexistência de elementos probatórios que indiquem coação para a contratação do seguro ou restrição à escolha da seguradora, tendo o autor manifestado concordância expressa com a contratação mediante aposição de assinatura em documento específico, afastando a caracterização de venda casada ou onerosidade excessiva. IV. Dispositivo e tese 11. Recurso de apelação desprovido, com majoração dos honorários advocatícios de 10% para 15% sobre o valor atualizado da causa, observada a suspensão de exigibilidade em razão da gratuidade judiciária. Tese de julgamento: "1. A quitação integral do contrato não impede a revisão judicial das cláusulas contratuais, preservando-se o interesse processual do contratante. 2. Os juros remuneratórios não se presumem abusivos pela mera superação da taxa média de mercado, exigindo-se demonstração cabal de significativa discrepância no caso concreto. 3. Não configura venda casada a contratação de seguro prestamista e assistência 24 horas quando realizadas mediante instrumentos autônomos e formalmente destacados do contrato principal de financiamento, com informações claras sobre as condições aplicáveis e possibilidade de cancelamento, ausente comprovação de imposição ou condicionamento do contrato principal à aquisição compulsória desses serviços." Dispositivos relevantes citados: CDC, art. 3º, §2º; CDC, art. 39, I; CDC, art. 51, §1º; CC, arts. 406 e 591; CPC, art. 98, §3º; Resolução CMN nº 4.881/2020, art. 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, Tema 972/STJ; STJ, REsp 1.061.530/RS (recurso repetitivo); STJ, AgRg no REsp 1223799, Terceira Turma, Rel. Min. Sidnei Benetti, j. 17.05.2011; STJ, AgInt no REsp 1695125/SP, Rel. Min. Regina Helena Costa, Primeira Turma, j. 08.02.2018; STJ, AgRg no REsp 1414469/SC, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma; STF, Súmula 596; TJ-MT, Apelação Cível nº 1000510-31.2023.8.11.0091; TJ-MT, Apelação Cível nº 1038330-74.2022.8.11.0041, Rel. Des. Dirceu dos Santos, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 22/05/2024. R E L A T Ó R I O EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por HELITON MACHADO DE SOUZA em face de decisão proferida pelo juízo singular da VARA ÚNICA DE TAPURAH, nos autos da Ação Revisional de Contrato nº 1001031-85.2024.8.11.0011, que julgou improcedentes os pedidos iniciais com fundamento na: (i) constatação de que o percentual objeto de questionamento refere-se ao Custo Efetivo Total (CET), não se limitando exclusivamente à taxa de juros; (ii) legitimidade das tarifas bancárias em consonância com entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça; e (iii) ausência de comprovação de abusividade ou de serviços não prestados. O dispositivo sentencial impôs ao autor condenação em custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa, com exigibilidade suspensa em razão do deferimento da gratuidade da justiça. Em suas razões recursais, o apelante sustenta que a instituição financeira inseriu indevidamente no instrumento contratual valores referentes a seguro (R$ 1.329,15) e assistência (R$ 400,00), configurando prática comercial de venda casada, vedada pelo entendimento do Superior Tribunal de Justiça (Tema 972). Demonstra, mediante cálculos aritméticos, que a exclusão das cobranças impugnadas resultaria na redução do valor das parcelas de R$ 1.078,47 para R$ 979,90, perfazendo economia total de R$ 4.731,14. Aduz, ainda, que o próprio apelado reconheceu parcialmente o equívoco, procedendo ao estorno de R$ 637,56, remanescendo pendente a restituição de R$ 691,59. Invocando a vulnerabilidade do consumidor e a natureza adesiva do contrato, postula o apelante: o reconhecimento da ilegalidade das tarifas contestadas, o recálculo integral das parcelas, a devolução em dobro dos valores indevidamente adimplidos e a condenação da instituição financeira em custas e honorários advocatícios. Em sede de contrarrazões, a OMNI S/A suscita preliminarmente: (a) carência de interesse processual do apelante em razão da quitação integral do contrato; e (b) violação ao princípio da dialeticidade, argumentando que o recurso limita-se a reproduzir os argumentos da exordial sem impugnar especificamente os fundamentos da sentença. Quanto ao mérito, defende a legitimidade das taxas de juros praticadas, justificando-as pelo elevado risco inerente ao financiamento de veículos de fabricação não recente, amparando-se na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que considera a taxa média apenas como parâmetro referencial. Assevera que os seguros foram contratados voluntariamente em instrumentos apartados, tendo a cobertura securitária permanecido disponível durante toda a vigência contratual, destacando que o seguro prestamista foi objeto de cancelamento administrativo. Nega a cobrança de serviços prestados por terceiros e afirma ter agido em observância ao princípio da boa-fé, circunstância que obstaria a devolução em dobro. Por derradeiro, requer o não conhecimento do recurso ou, subsidiariamente, sua improcedência, com a consequente manutenção da sentença proferida em primeiro grau de jurisdição. Em conformidade com a norma insculpida no art. 178 do Código de Processo Civil, não se vislumbra hipótese que enseje a intervenção obrigatória do Ministério Público. É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Egrégia Câmara: Constata-se, conforme narrativa processual antecedente, a interposição de recurso apelatório por Heliton Machado de Souza contra sentença da Vara Única de Tapurah que, nos autos da Ação Revisional nº 1001031-85.2024.8.11.0011, julgou improcedentes os pedidos iniciais ao reconhecer a regularidade do CET, a legitimidade das tarifas bancárias e a ausência de abusividade. O apelante alega venda casada pela inclusão indevida de seguro (R$ 1.329,15) e assistência (R$ 400,00), apontando redução nas parcelas e economia de R$ 4.731,14. Destaca estorno parcial (R$ 637,56) e requer a restituição do valor remanescente (R$ 691,59), o recálculo das parcelas, devolução em dobro dos valores pagos e condenação do banco em custas e honorários. A controvérsia recursal cinge-se à legalidade da cobrança de valores referentes a seguro e assistência inseridos no contrato de financiamento firmado entre o apelante e a instituição financeira, sob a alegação de prática de venda casada, em afronta ao art. 39, I, do Código de Defesa do Consumidor e ao entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema 972 dos recursos repetitivos. O apelante sustenta que tais cobranças foram incluídas de forma impositiva e sem a devida autonomia contratual, postulando, assim, a restituição dos valores, o recálculo das parcelas contratuais e o reconhecimento da abusividade da prática. Por outro lado, a instituição financeira defende a legalidade da contratação, aduzindo que os serviços foram prestados mediante adesão expressa e autônoma, afastando a configuração de venda casada. ANÁLISE PRELIMINAR DA ALEGADA FALTA DE INTERESSE DE AGIR – PERDA DO OBJETO DA AÇÃO A parte recorrida suscita preliminarmente a perda superveniente do interesse processual, fundamentada na quitação integral do instrumento contratual objeto da demanda. Tal argumento, contudo, não merece acolhimento. O ordenamento jurídico brasileiro não contempla impedimento normativo à revisão judicial de negócio jurídico já integralmente adimplido. Neste sentido, manifesta-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO REGIMENTAL - RECURSO ESPECIAL - BANCÁRIO - AÇÃO REVISIONAL - CONTRATO QUITADO - REVISÃO - POSSIBILIDADE - DISSÍDIO NOTÓRIO - REEXAME DE PROVAS E INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS - DESNECESSIDADE - IMPROVIMENTO. I. A quitação da dívida não impede a discussão sobre eventuais ilegalidades do contrato extinto. [...]” (STJ - AgRg no REsp 1223799. Terceira Turma. Min. Rel. Sidnei Benetti. 17.05.2011). Ante o exposto, rejeita-se a preliminar arguida. DA ALEGADA AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE A parte recorrida postula preliminarmente o não conhecimento do recurso por inobservância do princípio da dialeticidade, sustentando que o recorrente não impugnou especificamente os fundamentos da decisão objurgada. Tal pretensão, todavia, não comporta acolhimento. É assente que a admissibilidade recursal está condicionada ao preenchimento de requisitos legais específicos. O princípio da dialeticidade, pressuposto intrínseco de admissibilidade, exige contraposição específica aos fundamentos da decisão impugnada. Na hipótese sub examine, verifica-se que a argumentação desenvolvida pelo apelante, embora parcialmente reproduza fundamentos já apresentados na peça inaugural, mantém pertinência temática com o conteúdo decisório, não configurando, por si só, violação ao referido princípio. O Superior Tribunal de Justiça já pacificou entendimento neste sentido: “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. [...] II - O acórdão recorrido adotou entendimento consolidado nesta Corte, segundo o qual, a repetição dos argumentos elencados na petição inicial ou na contestação não implica, por si só, ofensa ao princípio da dialeticidade. [...]” (AgInt no REsp 1695125/SP, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 08/02/2018, DJe 21/02/2018). Considerando que as razões recursais guardam pertinência com a fundamentação da sentença apelada, rejeita-se a preliminar. MÉRITO Extrai-se dos autos que HELITON MACHADO DE SOUZA ajuizou ação revisional de contrato em face de OMNI S/A CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, alegando, em síntese, que celebrou contrato de alienação fiduciária com a instituição requerida, no valor total de R$ 23.138,51 (vinte e três mil, cento e trinta e oito reais e cinquenta e um centavos), a ser adimplido em 48 prestações, com parcela inicial de R$ 1.078,47 (um mil e setenta e oito reais e quarenta e sete centavos). O instrumento contratual celebrado apresentou dados do financiamento e planilha do custo efetivo total (CET), conforme documentação acostada aos autos. O exame da controvérsia sub judice demanda pormenorizada análise quanto à caracterização de eventual abusividade na pactuação de juros remuneratórios em contrato de natureza bancária, à luz dos parâmetros normativos e jurisprudenciais consolidados na ordem jurídica pátria. Preliminarmente, cumpre registrar a inequívoca incidência do Código de Defesa do Consumidor às relações contratuais bancárias, conforme expressa previsão do artigo 3º, §2º, do referido diploma legal, posicionamento corroborado pela doutrina especializada de Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, que asseveram a submissão integral das operações bancárias ao microssistema consumerista, em virtude da natureza comercial da atividade e do enquadramento das instituições financeiras no conceito de fornecedor previsto no caput do artigo 3º do CDC. A controvérsia central gravita em torno da alegada abusividade dos juros remuneratórios pactuados, questão amplamente dirimida pela Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça quando do julgamento do REsp 1.061.530/RS, sob o rito dos recursos repetitivos, ocasião em que se firmaram diretrizes hermenêuticas basilares: (i) não incidência da limitação da Lei de Usura às instituições financeiras, por força da Súmula 596/STF; (ii) ausência de abusividade presumida pela mera superação do patamar de 12% ao ano; (iii) inaplicabilidade do regramento civilista subsidiário (artigos 591 c/c 406, CC) aos mútuos bancários; e (iv) excepcionalidade da intervenção judicial revisional, condicionada à demonstração cabal da abusividade no caso concreto. Para a verificação objetiva dessa excepcional abusividade, a jurisprudência do STJ, em diversos julgados paradigmáticos (REsp 271.214/RS, REsp 1.036.818 e REsp 971.853/RS), desenvolveu metodologia comparativa com as taxas médias de mercado divulgadas pelo Banco Central, estabelecendo como potencialmente excessivas aquelas que excedam significativamente tais parâmetros – seja em uma vez e meia, no dobro ou no triplo, conforme as circunstâncias específicas da relação contratual. Não obstante, consoante reiterado entendimento jurisprudencial, evidenciado no AgRg no REsp 1414469/SC (Quarta Turma, Rel. Min. Marco Buzzi), a mera superação da taxa média mercadológica não induz, automaticamente, à conclusão de abusividade, constituindo tal parâmetro referencial interpretativo, e não limite absoluto. Na hipótese vertente, o instrumento contratual celebrado em julho/2021 estabeleceu juros remuneratórios de 1,67% mensais, equivalentes a 20,04% anuais, percentual consideravelmente inferior ao limite de 60,12% ao ano, apurado mediante aplicação dos critérios jurisprudenciais às taxas médias praticadas à época da contratação, conforme dados extraídos do repositório oficial do Banco Central. No que concerne ao Custo Efetivo Total (CET) de 70,32% ao ano, imprescindível destacar a autonomia conceitual e normativa deste instituto em relação aos juros remuneratórios stricto sensu. O CET, conforme sedimentado na jurisprudência desta Corte (APELAÇÃO CÍVEL nº 1000510-31.2023.8.11.0091) e disciplinado no artigo 3º da Resolução nº 4.881/2020 do Conselho Monetário Nacional, compreende a totalidade dos encargos incidentes sobre a operação – incluindo tarifas, tributos, seguros e demais despesas acessórias – não se confundindo com a remuneração do capital propriamente dita e, por conseguinte, não se submetendo aos mesmos parâmetros limitativos. A análise circunstanciada dos elementos fáticos e jurídicos evidencia, portanto, a conformidade da pactuação de juros remuneratórios de 56,81% ao ano com os critérios objetivos de razoabilidade estabelecidos pela jurisprudência qualificada, situando-se consideravelmente aquém do limite de abusividade calculado com base nas taxas médias mercadológicas contemporâneas à contratação. Por conseguinte, impõe-se reconhecer a inexistência de fundamento jurídico para a pretensão revisional, preservando-se a autonomia negocial manifestada pelas partes no instrumento contratual, em consonância com os princípios da segurança jurídica, da boa-fé objetiva e da força obrigatória dos contratos. A intervenção judicial nas relações contratuais, conforme sedimentado na jurisprudência majoritária, deve restringir-se às hipóteses excepcionais de manifesto desequilíbrio, não se verificando, no caso em apreço, elementos suficientes à caracterização da desvantagem exagerada prevista no artigo 51, §1º, do Código de Defesa do Consumidor, requisito indispensável à configuração da abusividade contratual. A controvérsia sub examine refere-se à alegação de abusividade na contratação de seguro de proteção financeira (seguro prestamista) e assistência 24 horas em contrato de financiamento bancário, suscitando-se questionamento acerca da possível configuração de venda casada, prática vedada pelo ordenamento consumerista, especificamente pelo art. 39, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor. Conforme se depreende da documentação acostada aos autos (Id. 137768554 – pág. 01/25, Id. 187795026 – pág. 01/02 e Id. 187795023 – Pág. 1), evidencia-se que os serviços acessórios foram objeto de contratação autônoma, mediante instrumentos formalmente independentes do contrato principal de financiamento. Os serviços de seguro prestamista e assistência 24 horas (Mondial Serviços Ltda.) foram disponibilizados ao contratante por meio de documentos específicos, com destaque suficiente para permitir a cognoscibilidade das condições contratuais, tendo sido validamente aderidos pelo autor. A análise pormenorizada dos documentos contratuais revela a existência de termo de adesão apartado para o seguro de proteção financeira (Id.137768554 - Pág. 23/24), instrumento no qual constam, de forma detalhada, os valores envolvidos, as coberturas oferecidas e as condições para eventual cancelamento, tendo sido expressamente consignada a possibilidade de "cancelamento a qualquer tempo, com devolução do prêmio pago referente ao período a decorrer, se houver". A questão encontra-se substantivamente dirimida pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Tema 972/STJ, sob o rito dos recursos repetitivos, ocasião em que se fixou a tese de que "nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada". A ratio decidendi do precedente qualificado não estabelece vedação absoluta à comercialização de seguros em conexão com contratos bancários, mas sim a proibição de condicionamento do contrato principal à aquisição compulsória de seguro com entidade predeterminada pela instituição financeira, configurando-se abusividade apenas quando evidenciada a ausência de liberdade de escolha pelo consumidor. No caso concreto, evidencia-se a inexistência de elementos probatórios que indiquem coação para a contratação do seguro ou restrição à escolha da seguradora, tendo o autor manifestado concordância expressa com a contratação mediante aposição de assinatura em documento específico, no qual constavam claramente as condições aplicáveis. Relevante destacar que o seguro de proteção financeira não constitui serviço inerente à atividade bancária, mas prestação acessória destinada a oferecer proteção ao próprio mutuário contra riscos predeterminados que poderiam comprometer sua capacidade de adimplemento da obrigação principal. Os documentos contratuais demonstram ainda a existência de efetiva contrapartida para o prêmio pago, consistente nas coberturas oferecidas, bem como a previsão expressa de possibilidade de cancelamento unilateral pelo segurado, com devolução proporcional dos valores correspondentes ao período não fruído, circunstâncias que afastam a caracterização de onerosidade excessiva ou desequilíbrio contratual significativo. O entendimento ora adotado encontra respaldo em recente julgado desta Corte: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA PARA AQUISIÇÃO DE VEÍCULO – TARIFAS – AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE – MANUTENÇÃO DA COBRANÇA – SEGURO PRESTAMISTA – VENDA CASADA – NÃO OCORRÊNCIA – ASSINATURA EM TERMO DE ADESÃO APARTADO, DEMONSTRANDO, DE FORMA CLARA, A ANUÊNCIA MUTUÁRIO QUANTO À CONTRATAÇÃO – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA CONFIRMADA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Permanece válida a Tarifa de Cadastro expressamente tipificada em ato normativo padronizador da autoridade monetária, a qual somente pode ser cobrada no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira. [...].” (STJ – REsp 1.251.331/RS, Rel . Min. Maria Isabel Gallotti, 2ª Seção. J. 28 .08.2013, DJe 24.10.2013; e REsp 1 .255.513/RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 2ª Seção . J. 28.08.2013, DJe 24 .10.2013) Os custos relativos aos serviços de terceiros, quando especificados e efetivamente prestados, podem ser exigidos do consumidor (REsp 1578553/SP). O Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, definiu a validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com o registro do contrato (Tema 958 - Resp. 1 .578.553/SP) e, apesar de ressalvar hipótese de abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado, tal exceção somente tem aplicação quando houver controvérsia a respeito. A Contratação de Seguro de Proteção Financeira visa ao interesse do contratante e, não havendo indicação de que o consumidor tenha sido coagido a contratá-lo com a seguradora indicada pela ré, tendo sido objeto de proposta de adesão em separado do contrato, em que constam todas as informações inerentes ao produto contratado, bem como não havendo indícios de venda casada, não é ilegal ou abusiva sua cobrança. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1038330-74 .2022.8.11.0041, Relator.: DIRCEU DOS SANTOS, Data de Julgamento: 22/05/2024, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 29/05/2024) Ex positis, evidencia-se a regularidade da contratação do seguro de proteção financeira e assistência 24 horas, porquanto realizadas mediante instrumentos autônomos e formalmente destacados do contrato principal, com informações claras e precisas acerca das condições aplicáveis, ausência de elementos probatórios indicativos de coação ou restrição à livre escolha da seguradora, e previsão expressa de possibilidade de cancelamento unilateral pelo contratante, com restituição proporcional do prêmio pago. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação, mantendo inalterada a sentença recorrida por seus próprios fundamentos. Em razão do resultado do julgamento, majoro os honorários advocatícios de 10% para 15% sobre o valor atualizado da causa, com a ressalva do art. 98, § 3º, do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025

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Processo nº 1001224-37.2023.8.11.0108

ID: 259832976

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1001224-37.2023.8.11.0108

Data de Disponibilização: 24/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO

Acórdão

Advogados:

GIULIO ALVARENGA REALE

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001224-37.2023.8.11.0108 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Inadimplemento, Alienação Fiduciária] Relator: D… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001224-37.2023.8.11.0108 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Inadimplemento, Alienação Fiduciária] Relator: Des(a). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [HELITON MACHADO DE SOUZA - CPF: 974.833.201-25 (APELANTE), GIOVANNA BARROSO MARTINS DA SILVA - CPF: 402.972.598-81 (ADVOGADO), OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO - CNPJ: 92.228.410/0001-02 (APELADO), GIULIO ALVARENGA REALE - CPF: 639.139.336-20 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. PRELIMINARES DE INTERESSE PROCESSUAL E VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE REJEITADAS. JUROS REMUNERATÓRIOS. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. SEGURO PRESTAMISTA E ASSISTÊNCIA 24 HORAS. ALEGADA VENDA CASADA. INEXISTÊNCIA. CONTRATAÇÃO AUTÔNOMA. MANIFESTAÇÃO DE VONTADE. AUSÊNCIA DE IMPOSIÇÃO OU COAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados em ação revisional de contrato de financiamento de veículo, na qual o autor questiona a inclusão de valores referentes a seguro prestamista (R$ 1.329,15) e assistência 24 horas (R$ 400,00), alegando caracterizar venda casada, com postulação de recálculo das parcelas, restituição em dobro dos valores pagos e reconhecimento da ilegalidade das cobranças. II. Questão em discussão 2. Há três questões em discussão: (i) verificar preliminarmente a existência de interesse processual do apelante após a quitação do contrato e o atendimento ao princípio da dialeticidade; (ii) analisar a regularidade dos juros remuneratórios e do custo efetivo total do contrato de financiamento firmado entre as partes; e (iii) examinar se a contratação de seguro prestamista e serviço de assistência 24 horas configura prática de venda casada vedada pelo ordenamento jurídico, especificamente à luz do art. 39, I, do Código de Defesa do Consumidor e do entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema 972. III. Razões de decidir 3. A quitação do contrato não constitui óbice ao prosseguimento da ação revisional, conforme entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça, que assegura a possibilidade de discussão sobre eventuais ilegalidades em contratos já extintos pelo adimplemento, preservando-se o interesse processual do apelante. 4. O recurso atende ao princípio da dialeticidade, pois, embora reproduza parcialmente argumentos da inicial, mantém pertinência temática com o conteúdo decisório, impugnando especificamente os fundamentos da sentença recorrida, em conformidade com a jurisprudência do STJ que afasta a caracterização de ofensa ao referido princípio pela mera reiteração argumentativa. 5. Os juros remuneratórios pactuados em 1,67% ao mês (20,04% ao ano) situam-se em patamar consideravelmente inferior ao limite de abusividade calculado com base nas taxas médias de mercado contemporâneas à contratação, não caracterizando desvantagem exagerada prevista no art. 51, §1º, do CDC. 6. O Custo Efetivo Total (CET) de 70,32% ao ano possui autonomia conceitual e normativa em relação aos juros remuneratórios stricto sensu, compreendendo a totalidade dos encargos incidentes sobre a operação, não se submetendo aos mesmos parâmetros limitativos, conforme disciplinado no art. 3º da Resolução nº 4.881/2020 do Conselho Monetário Nacional. 7. A documentação acostada aos autos evidencia que os serviços acessórios foram objeto de contratação autônoma, mediante instrumentos formalmente independentes do contrato principal de financiamento, com destaque suficiente para permitir a cognoscibilidade das condições contratuais. 8. O termo de adesão apartado para o seguro de proteção financeira contém informações detalhadas sobre valores, coberturas e condições para eventual cancelamento, inclusive com previsão expressa de "cancelamento a qualquer tempo, com devolução do prêmio pago referente ao período a decorrer, se houver". 9. A tese firmada no Tema 972/STJ não estabelece vedação absoluta à comercialização de seguros em conexão com contratos bancários, mas sim a proibição de condicionamento do contrato principal à aquisição compulsória de seguro com entidade predeterminada, configurando-se abusividade apenas quando evidenciada a ausência de liberdade de escolha pelo consumidor. 10. Inexistência de elementos probatórios que indiquem coação para a contratação do seguro ou restrição à escolha da seguradora, tendo o autor manifestado concordância expressa com a contratação mediante aposição de assinatura em documento específico, afastando a caracterização de venda casada ou onerosidade excessiva. IV. Dispositivo e tese 11. Recurso de apelação desprovido, com majoração dos honorários advocatícios de 10% para 15% sobre o valor atualizado da causa, observada a suspensão de exigibilidade em razão da gratuidade judiciária. Tese de julgamento: "1. A quitação integral do contrato não impede a revisão judicial das cláusulas contratuais, preservando-se o interesse processual do contratante. 2. Os juros remuneratórios não se presumem abusivos pela mera superação da taxa média de mercado, exigindo-se demonstração cabal de significativa discrepância no caso concreto. 3. Não configura venda casada a contratação de seguro prestamista e assistência 24 horas quando realizadas mediante instrumentos autônomos e formalmente destacados do contrato principal de financiamento, com informações claras sobre as condições aplicáveis e possibilidade de cancelamento, ausente comprovação de imposição ou condicionamento do contrato principal à aquisição compulsória desses serviços." Dispositivos relevantes citados: CDC, art. 3º, §2º; CDC, art. 39, I; CDC, art. 51, §1º; CC, arts. 406 e 591; CPC, art. 98, §3º; Resolução CMN nº 4.881/2020, art. 3º. Jurisprudência relevante citada: STJ, Tema 972/STJ; STJ, REsp 1.061.530/RS (recurso repetitivo); STJ, AgRg no REsp 1223799, Terceira Turma, Rel. Min. Sidnei Benetti, j. 17.05.2011; STJ, AgInt no REsp 1695125/SP, Rel. Min. Regina Helena Costa, Primeira Turma, j. 08.02.2018; STJ, AgRg no REsp 1414469/SC, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma; STF, Súmula 596; TJ-MT, Apelação Cível nº 1000510-31.2023.8.11.0091; TJ-MT, Apelação Cível nº 1038330-74.2022.8.11.0041, Rel. Des. Dirceu dos Santos, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 22/05/2024. R E L A T Ó R I O EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por HELITON MACHADO DE SOUZA em face de decisão proferida pelo juízo singular da VARA ÚNICA DE TAPURAH, nos autos da Ação Revisional de Contrato nº 1001031-85.2024.8.11.0011, que julgou improcedentes os pedidos iniciais com fundamento na: (i) constatação de que o percentual objeto de questionamento refere-se ao Custo Efetivo Total (CET), não se limitando exclusivamente à taxa de juros; (ii) legitimidade das tarifas bancárias em consonância com entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça; e (iii) ausência de comprovação de abusividade ou de serviços não prestados. O dispositivo sentencial impôs ao autor condenação em custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa, com exigibilidade suspensa em razão do deferimento da gratuidade da justiça. Em suas razões recursais, o apelante sustenta que a instituição financeira inseriu indevidamente no instrumento contratual valores referentes a seguro (R$ 1.329,15) e assistência (R$ 400,00), configurando prática comercial de venda casada, vedada pelo entendimento do Superior Tribunal de Justiça (Tema 972). Demonstra, mediante cálculos aritméticos, que a exclusão das cobranças impugnadas resultaria na redução do valor das parcelas de R$ 1.078,47 para R$ 979,90, perfazendo economia total de R$ 4.731,14. Aduz, ainda, que o próprio apelado reconheceu parcialmente o equívoco, procedendo ao estorno de R$ 637,56, remanescendo pendente a restituição de R$ 691,59. Invocando a vulnerabilidade do consumidor e a natureza adesiva do contrato, postula o apelante: o reconhecimento da ilegalidade das tarifas contestadas, o recálculo integral das parcelas, a devolução em dobro dos valores indevidamente adimplidos e a condenação da instituição financeira em custas e honorários advocatícios. Em sede de contrarrazões, a OMNI S/A suscita preliminarmente: (a) carência de interesse processual do apelante em razão da quitação integral do contrato; e (b) violação ao princípio da dialeticidade, argumentando que o recurso limita-se a reproduzir os argumentos da exordial sem impugnar especificamente os fundamentos da sentença. Quanto ao mérito, defende a legitimidade das taxas de juros praticadas, justificando-as pelo elevado risco inerente ao financiamento de veículos de fabricação não recente, amparando-se na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que considera a taxa média apenas como parâmetro referencial. Assevera que os seguros foram contratados voluntariamente em instrumentos apartados, tendo a cobertura securitária permanecido disponível durante toda a vigência contratual, destacando que o seguro prestamista foi objeto de cancelamento administrativo. Nega a cobrança de serviços prestados por terceiros e afirma ter agido em observância ao princípio da boa-fé, circunstância que obstaria a devolução em dobro. Por derradeiro, requer o não conhecimento do recurso ou, subsidiariamente, sua improcedência, com a consequente manutenção da sentença proferida em primeiro grau de jurisdição. Em conformidade com a norma insculpida no art. 178 do Código de Processo Civil, não se vislumbra hipótese que enseje a intervenção obrigatória do Ministério Público. É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. DES. LUIZ OCTÁVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO Egrégia Câmara: Constata-se, conforme narrativa processual antecedente, a interposição de recurso apelatório por Heliton Machado de Souza contra sentença da Vara Única de Tapurah que, nos autos da Ação Revisional nº 1001031-85.2024.8.11.0011, julgou improcedentes os pedidos iniciais ao reconhecer a regularidade do CET, a legitimidade das tarifas bancárias e a ausência de abusividade. O apelante alega venda casada pela inclusão indevida de seguro (R$ 1.329,15) e assistência (R$ 400,00), apontando redução nas parcelas e economia de R$ 4.731,14. Destaca estorno parcial (R$ 637,56) e requer a restituição do valor remanescente (R$ 691,59), o recálculo das parcelas, devolução em dobro dos valores pagos e condenação do banco em custas e honorários. A controvérsia recursal cinge-se à legalidade da cobrança de valores referentes a seguro e assistência inseridos no contrato de financiamento firmado entre o apelante e a instituição financeira, sob a alegação de prática de venda casada, em afronta ao art. 39, I, do Código de Defesa do Consumidor e ao entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema 972 dos recursos repetitivos. O apelante sustenta que tais cobranças foram incluídas de forma impositiva e sem a devida autonomia contratual, postulando, assim, a restituição dos valores, o recálculo das parcelas contratuais e o reconhecimento da abusividade da prática. Por outro lado, a instituição financeira defende a legalidade da contratação, aduzindo que os serviços foram prestados mediante adesão expressa e autônoma, afastando a configuração de venda casada. ANÁLISE PRELIMINAR DA ALEGADA FALTA DE INTERESSE DE AGIR – PERDA DO OBJETO DA AÇÃO A parte recorrida suscita preliminarmente a perda superveniente do interesse processual, fundamentada na quitação integral do instrumento contratual objeto da demanda. Tal argumento, contudo, não merece acolhimento. O ordenamento jurídico brasileiro não contempla impedimento normativo à revisão judicial de negócio jurídico já integralmente adimplido. Neste sentido, manifesta-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO REGIMENTAL - RECURSO ESPECIAL - BANCÁRIO - AÇÃO REVISIONAL - CONTRATO QUITADO - REVISÃO - POSSIBILIDADE - DISSÍDIO NOTÓRIO - REEXAME DE PROVAS E INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS - DESNECESSIDADE - IMPROVIMENTO. I. A quitação da dívida não impede a discussão sobre eventuais ilegalidades do contrato extinto. [...]” (STJ - AgRg no REsp 1223799. Terceira Turma. Min. Rel. Sidnei Benetti. 17.05.2011). Ante o exposto, rejeita-se a preliminar arguida. DA ALEGADA AUSÊNCIA DE DIALETICIDADE A parte recorrida postula preliminarmente o não conhecimento do recurso por inobservância do princípio da dialeticidade, sustentando que o recorrente não impugnou especificamente os fundamentos da decisão objurgada. Tal pretensão, todavia, não comporta acolhimento. É assente que a admissibilidade recursal está condicionada ao preenchimento de requisitos legais específicos. O princípio da dialeticidade, pressuposto intrínseco de admissibilidade, exige contraposição específica aos fundamentos da decisão impugnada. Na hipótese sub examine, verifica-se que a argumentação desenvolvida pelo apelante, embora parcialmente reproduza fundamentos já apresentados na peça inaugural, mantém pertinência temática com o conteúdo decisório, não configurando, por si só, violação ao referido princípio. O Superior Tribunal de Justiça já pacificou entendimento neste sentido: “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. [...] II - O acórdão recorrido adotou entendimento consolidado nesta Corte, segundo o qual, a repetição dos argumentos elencados na petição inicial ou na contestação não implica, por si só, ofensa ao princípio da dialeticidade. [...]” (AgInt no REsp 1695125/SP, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 08/02/2018, DJe 21/02/2018). Considerando que as razões recursais guardam pertinência com a fundamentação da sentença apelada, rejeita-se a preliminar. MÉRITO Extrai-se dos autos que HELITON MACHADO DE SOUZA ajuizou ação revisional de contrato em face de OMNI S/A CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, alegando, em síntese, que celebrou contrato de alienação fiduciária com a instituição requerida, no valor total de R$ 23.138,51 (vinte e três mil, cento e trinta e oito reais e cinquenta e um centavos), a ser adimplido em 48 prestações, com parcela inicial de R$ 1.078,47 (um mil e setenta e oito reais e quarenta e sete centavos). O instrumento contratual celebrado apresentou dados do financiamento e planilha do custo efetivo total (CET), conforme documentação acostada aos autos. O exame da controvérsia sub judice demanda pormenorizada análise quanto à caracterização de eventual abusividade na pactuação de juros remuneratórios em contrato de natureza bancária, à luz dos parâmetros normativos e jurisprudenciais consolidados na ordem jurídica pátria. Preliminarmente, cumpre registrar a inequívoca incidência do Código de Defesa do Consumidor às relações contratuais bancárias, conforme expressa previsão do artigo 3º, §2º, do referido diploma legal, posicionamento corroborado pela doutrina especializada de Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, que asseveram a submissão integral das operações bancárias ao microssistema consumerista, em virtude da natureza comercial da atividade e do enquadramento das instituições financeiras no conceito de fornecedor previsto no caput do artigo 3º do CDC. A controvérsia central gravita em torno da alegada abusividade dos juros remuneratórios pactuados, questão amplamente dirimida pela Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça quando do julgamento do REsp 1.061.530/RS, sob o rito dos recursos repetitivos, ocasião em que se firmaram diretrizes hermenêuticas basilares: (i) não incidência da limitação da Lei de Usura às instituições financeiras, por força da Súmula 596/STF; (ii) ausência de abusividade presumida pela mera superação do patamar de 12% ao ano; (iii) inaplicabilidade do regramento civilista subsidiário (artigos 591 c/c 406, CC) aos mútuos bancários; e (iv) excepcionalidade da intervenção judicial revisional, condicionada à demonstração cabal da abusividade no caso concreto. Para a verificação objetiva dessa excepcional abusividade, a jurisprudência do STJ, em diversos julgados paradigmáticos (REsp 271.214/RS, REsp 1.036.818 e REsp 971.853/RS), desenvolveu metodologia comparativa com as taxas médias de mercado divulgadas pelo Banco Central, estabelecendo como potencialmente excessivas aquelas que excedam significativamente tais parâmetros – seja em uma vez e meia, no dobro ou no triplo, conforme as circunstâncias específicas da relação contratual. Não obstante, consoante reiterado entendimento jurisprudencial, evidenciado no AgRg no REsp 1414469/SC (Quarta Turma, Rel. Min. Marco Buzzi), a mera superação da taxa média mercadológica não induz, automaticamente, à conclusão de abusividade, constituindo tal parâmetro referencial interpretativo, e não limite absoluto. Na hipótese vertente, o instrumento contratual celebrado em julho/2021 estabeleceu juros remuneratórios de 1,67% mensais, equivalentes a 20,04% anuais, percentual consideravelmente inferior ao limite de 60,12% ao ano, apurado mediante aplicação dos critérios jurisprudenciais às taxas médias praticadas à época da contratação, conforme dados extraídos do repositório oficial do Banco Central. No que concerne ao Custo Efetivo Total (CET) de 70,32% ao ano, imprescindível destacar a autonomia conceitual e normativa deste instituto em relação aos juros remuneratórios stricto sensu. O CET, conforme sedimentado na jurisprudência desta Corte (APELAÇÃO CÍVEL nº 1000510-31.2023.8.11.0091) e disciplinado no artigo 3º da Resolução nº 4.881/2020 do Conselho Monetário Nacional, compreende a totalidade dos encargos incidentes sobre a operação – incluindo tarifas, tributos, seguros e demais despesas acessórias – não se confundindo com a remuneração do capital propriamente dita e, por conseguinte, não se submetendo aos mesmos parâmetros limitativos. A análise circunstanciada dos elementos fáticos e jurídicos evidencia, portanto, a conformidade da pactuação de juros remuneratórios de 56,81% ao ano com os critérios objetivos de razoabilidade estabelecidos pela jurisprudência qualificada, situando-se consideravelmente aquém do limite de abusividade calculado com base nas taxas médias mercadológicas contemporâneas à contratação. Por conseguinte, impõe-se reconhecer a inexistência de fundamento jurídico para a pretensão revisional, preservando-se a autonomia negocial manifestada pelas partes no instrumento contratual, em consonância com os princípios da segurança jurídica, da boa-fé objetiva e da força obrigatória dos contratos. A intervenção judicial nas relações contratuais, conforme sedimentado na jurisprudência majoritária, deve restringir-se às hipóteses excepcionais de manifesto desequilíbrio, não se verificando, no caso em apreço, elementos suficientes à caracterização da desvantagem exagerada prevista no artigo 51, §1º, do Código de Defesa do Consumidor, requisito indispensável à configuração da abusividade contratual. A controvérsia sub examine refere-se à alegação de abusividade na contratação de seguro de proteção financeira (seguro prestamista) e assistência 24 horas em contrato de financiamento bancário, suscitando-se questionamento acerca da possível configuração de venda casada, prática vedada pelo ordenamento consumerista, especificamente pelo art. 39, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor. Conforme se depreende da documentação acostada aos autos (Id. 137768554 – pág. 01/25, Id. 187795026 – pág. 01/02 e Id. 187795023 – Pág. 1), evidencia-se que os serviços acessórios foram objeto de contratação autônoma, mediante instrumentos formalmente independentes do contrato principal de financiamento. Os serviços de seguro prestamista e assistência 24 horas (Mondial Serviços Ltda.) foram disponibilizados ao contratante por meio de documentos específicos, com destaque suficiente para permitir a cognoscibilidade das condições contratuais, tendo sido validamente aderidos pelo autor. A análise pormenorizada dos documentos contratuais revela a existência de termo de adesão apartado para o seguro de proteção financeira (Id.137768554 - Pág. 23/24), instrumento no qual constam, de forma detalhada, os valores envolvidos, as coberturas oferecidas e as condições para eventual cancelamento, tendo sido expressamente consignada a possibilidade de "cancelamento a qualquer tempo, com devolução do prêmio pago referente ao período a decorrer, se houver". A questão encontra-se substantivamente dirimida pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Tema 972/STJ, sob o rito dos recursos repetitivos, ocasião em que se fixou a tese de que "nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada". A ratio decidendi do precedente qualificado não estabelece vedação absoluta à comercialização de seguros em conexão com contratos bancários, mas sim a proibição de condicionamento do contrato principal à aquisição compulsória de seguro com entidade predeterminada pela instituição financeira, configurando-se abusividade apenas quando evidenciada a ausência de liberdade de escolha pelo consumidor. No caso concreto, evidencia-se a inexistência de elementos probatórios que indiquem coação para a contratação do seguro ou restrição à escolha da seguradora, tendo o autor manifestado concordância expressa com a contratação mediante aposição de assinatura em documento específico, no qual constavam claramente as condições aplicáveis. Relevante destacar que o seguro de proteção financeira não constitui serviço inerente à atividade bancária, mas prestação acessória destinada a oferecer proteção ao próprio mutuário contra riscos predeterminados que poderiam comprometer sua capacidade de adimplemento da obrigação principal. Os documentos contratuais demonstram ainda a existência de efetiva contrapartida para o prêmio pago, consistente nas coberturas oferecidas, bem como a previsão expressa de possibilidade de cancelamento unilateral pelo segurado, com devolução proporcional dos valores correspondentes ao período não fruído, circunstâncias que afastam a caracterização de onerosidade excessiva ou desequilíbrio contratual significativo. O entendimento ora adotado encontra respaldo em recente julgado desta Corte: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA PARA AQUISIÇÃO DE VEÍCULO – TARIFAS – AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE – MANUTENÇÃO DA COBRANÇA – SEGURO PRESTAMISTA – VENDA CASADA – NÃO OCORRÊNCIA – ASSINATURA EM TERMO DE ADESÃO APARTADO, DEMONSTRANDO, DE FORMA CLARA, A ANUÊNCIA MUTUÁRIO QUANTO À CONTRATAÇÃO – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA CONFIRMADA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. Permanece válida a Tarifa de Cadastro expressamente tipificada em ato normativo padronizador da autoridade monetária, a qual somente pode ser cobrada no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira. [...].” (STJ – REsp 1.251.331/RS, Rel . Min. Maria Isabel Gallotti, 2ª Seção. J. 28 .08.2013, DJe 24.10.2013; e REsp 1 .255.513/RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 2ª Seção . J. 28.08.2013, DJe 24 .10.2013) Os custos relativos aos serviços de terceiros, quando especificados e efetivamente prestados, podem ser exigidos do consumidor (REsp 1578553/SP). O Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, definiu a validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com o registro do contrato (Tema 958 - Resp. 1 .578.553/SP) e, apesar de ressalvar hipótese de abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado, tal exceção somente tem aplicação quando houver controvérsia a respeito. A Contratação de Seguro de Proteção Financeira visa ao interesse do contratante e, não havendo indicação de que o consumidor tenha sido coagido a contratá-lo com a seguradora indicada pela ré, tendo sido objeto de proposta de adesão em separado do contrato, em que constam todas as informações inerentes ao produto contratado, bem como não havendo indícios de venda casada, não é ilegal ou abusiva sua cobrança. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1038330-74 .2022.8.11.0041, Relator.: DIRCEU DOS SANTOS, Data de Julgamento: 22/05/2024, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 29/05/2024) Ex positis, evidencia-se a regularidade da contratação do seguro de proteção financeira e assistência 24 horas, porquanto realizadas mediante instrumentos autônomos e formalmente destacados do contrato principal, com informações claras e precisas acerca das condições aplicáveis, ausência de elementos probatórios indicativos de coação ou restrição à livre escolha da seguradora, e previsão expressa de possibilidade de cancelamento unilateral pelo contratante, com restituição proporcional do prêmio pago. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação, mantendo inalterada a sentença recorrida por seus próprios fundamentos. Em razão do resultado do julgamento, majoro os honorários advocatícios de 10% para 15% sobre o valor atualizado da causa, com a ressalva do art. 98, § 3º, do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025

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