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Adalberto Grando x Azul Linhas Aéreas Brasileiras S.A.

ID: 258286158

Tribunal: TJMT Órgão: JUIZADOS ESPECIAIS DE SORRISO Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 1001212-62.2025.8.11.0040

Data de Disponibilização: 17/04/2025

Polo Ativo:

ADALBERTO GRANDO

Polo Passivo:

AZUL LINHAS AÉREAS BRASILEIRAS S.A.

Sentença

Advogados:

BRUNO DE ARAUJO MOREIRA LEITE

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

FLAVIO IGEL

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO JUIZADOS ESPECIAIS DE SORRISO SENTENÇA Processo: 1001212-62.2025.8.11.0040. REQUERENTE: ADALBERTO GRANDO REQUERIDO: AZUL LINHAS AÉREAS BRASILEIRAS S.A. I. RELAT… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO JUIZADOS ESPECIAIS DE SORRISO SENTENÇA Processo: 1001212-62.2025.8.11.0040. REQUERENTE: ADALBERTO GRANDO REQUERIDO: AZUL LINHAS AÉREAS BRASILEIRAS S.A. I. RELATÓRIO Dispensado o relatório, conforme art. 38 da Lei 9.099/95. II. PRELIMINARES A requerida suscita preliminar de inépcia da petição inicial e consequente incompetência territorial, sob o argumento de que o autor não apresentou comprovante de residência em seu nome, o que inviabilizaria a fixação da competência no foro escolhido. Tal alegação não merece acolhimento. Assim, não compete neste momento processual obstar o prosseguimento da demanda com base em formalismo excessivo, quando a matéria poderá ser aferida em momento oportuno, inclusive por meio de eventual contradita. Dessa forma, não há vício na petição inicial, tampouco se constata incompetência territorial manifesta capaz de justificar a extinção do feito sem julgamento do mérito. Dessa forma, rejeita-se a preliminar. III. MÉRITO Adalberto Grando propôs ação de indenização por danos materiais e morais em face de Azul Linhas Aéreas Brasileiras S/A, alegando que teve seu voo cancelado no momento do embarque, sob a justificativa de condições meteorológicas adversas. Alega que não havia aeronave no aeroporto de origem e que, em razão do compromisso inadiável, precisou custear deslocamento terrestre por conta própria, o que gerou desgaste físico, emocional e frustração profissional. A Ré estrutura sua defesa alega que o voo foi cancelado devido às condições climáticas desfavoráveis em Cuiabá/MT, caracterizando caso fortuito/força maior. Segundo a jurisprudência: Ementa: APELAÇÃO 1. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. CANCELAMENTO DE VOO. DANOS MORAIS. COMPROVAÇÃO DE EFETIVO ABALO MORAL. AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO DE ASSISTÊNCIA ADEQUADA POR PARTE DA COMPANHIA AÉREA. VIAGEM A TRABALHO. AUTORES QUE NÃO PODERIAM ESPERAR O DIA SEGUINTE PARA PEGAR NOVO VOO DIANTE DA POSSÍVEL PERDA DE COMPROMISSO PROFISSIONAL. EMPRESA QUE NÃO FORNECEU OUTRAS SOLUÇÕES. DANOS MORAIS DEVIDOS. SENTENÇA REFORMADA. recurso PARCIALMENTE PROVIDO.APELAÇÃO 2. ALEGAÇÃO DE MAU TEMPO. EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE POR OCORRÊNCIA DE FORÇA MAIOR. FORTUITO INTERNO. PRECEDENTES. DANOS MATERIAIS. COMPROVAÇÃO DE GASTOS COM ALUGUEL DE AUTOMÓVEL, COMPRA DE PASSAGENS, COMBUSTÍVEL E ALIMENTAÇÃO. INDENIZAÇÃO MATERIAL DEVIDA. RECURSO DESPROVIDO. 1. A jurisprudência tem entendido que a ocorrência de cancelamentos de voos devido a condições climáticas e problemas técnicos caracterizam riscos inerente à própria atividade desempenhada pela companhia aérea, configurando fortuito interno. 2. Em situações como a descrita, espera-se que a companhia aérea tenha zelo com os passageiros e ofereça um serviço adequado, de forma a amenizar os transtornos causados com o cancelamento do voo e, in casu, conclui-se que a empresa não forneceu a solução adequada para amenizar os transtornos vivenciados pelos requerentes. (TJPR - 10ª C.Cível - 0009445-81.2020.8.16.0014 - Londrina - Rel.: DESEMBARGADORA ANGELA KHURY - J. 04.11.2021) TJ-PR - Apelação: APL 94458120208160014 Londrina 0009445-81.2020.8.16.0014 (Acórdão) O dano moral, conforme entendimento dos Tribunais, é prescindindo de prova do efetivo prejuízo. Igualmente, é dispensável a prova do prejuízo, como tem proclamado o Egrégio Superior Tribunal de Justiça: "A jurisprudência desta Corte está consolidada no sentido de que na concepção moderna da reparação do dano moral prevalece a orientação de que a responsabilização do agente se opera por força do simples fato da violação, de modo a tornar-se desnecessária a prova do prejuízo em concreto" (REsp n° 196:024 - MG, in RSTJ 124/396). Nesse caso, os danos morais são presumidos e independem de prova. A reparação pela ofensa moral fundamenta-se na titularidade individual de direitos integrantes da personalidade, tal qual preconizam os artigos 5º, incisos V e X, da Carta da República de 1988 e artigos 186 c.c. 927 e seguintes do Código Civil. Consoante iterativa jurisprudência, o dano essencialmente moral, sem repercussão patrimonial, não há como ser detidamente comprovado pela vítima, emergindo da própria ofensa, porque dela se presume. Contenta-se o legislador com a prova de conduta ofensiva e do nexo causal que mantém com os danos suportados, os quais, na hipótese, restaram satisfatoriamente evidenciados. No mesmo sentido, restou patenteado no Colendo Superior Tribunal de Justiça que "o dano moral não depende de prova; vislumbra-se 'in re ipsa'" (REsp. n. 721.137, DJ 03/10/05), pois, na concepção moderna do ressarcimento por dano moral, prevalece a responsabilização do agente por força do 'simples fato de violação, de modo a tornar-se desnecessário a prova do prejuízo em concreto, ao contrário do que se dá quanto ao dano material' (REsp. n. 611.973, DJ 13/9/04). Em relação ao valor do dano moral, em virtude da ausência de critérios legais objetivos, devem ser adotados os parâmetros majoritariamente fixados pela doutrina e a jurisprudência, os quais ficam aqui respeitados: i) a capacidade econômica das partes; ii) a intensidade do dolo ou culpa e iii) o valor desestímulo para dissuadir o ofensor de igual prática futura e a extensão do dano, vedando-se sempre o indesejável enriquecimento sem causa. Deve a quantia representar um valor compatível com os sentimentos desagradáveis experimentados pelo ofendido. Assim, servindo de desestímulo, impondo maior zelo na prestação dos serviços, arbitro os danos morais em R$ 5.500,00, quantia que reputo suficiente para compensar o ocorrido sem gerar enriquecimento sem causa da ofendida. O valor pleiteado na inicial mostra-se excessivo, motivo pelo qual não merece guarida judicial. Seu afastamento, contudo, não faz reconhecer a sucumbência recíproca sob tal perspectiva, uma vez que, à vista do verbete sumular 326 do Colendo Superior Tribunal de Justiça, “Na ação de indenização por dano moral, a condenação em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca". IV. DISPOSITIVO Ante o exposto e por tudo mais que dos autos consta, confirmo a liminar e julgo PROCEDENTES os pedidos deduzidos na inicial, para: - CONDENO a parte requerida a pagar o valor de R$ 5.500,00 (cinco mil e quinhentos reais), pelos danos morais sofridos, o qual deverá ser acrescido de juros legais a partir da citação, conforme art. 405 do CC, devendo ser corrigido e atualizado pela taxa SELIC, nos termos do art. 406, § 1º, do Código Civil, conforme os novos critérios determinados Lei n. 14.905/2024; Sem custas e honorários, conforme disposto nos artigos 54 e 55 da Lei nº 9.099/95. Submeto a presente decisum à homologação do Juiz de Direito, nos termos do artigo 40 da Lei 9.099/95. Homologada, intimem-se as partes, por intermédio de seus patronos. Princesa Mélanie Beraldino Leite Rubiale Juíza Leiga Vistos, etc. Homologo, para que produza seus jurídicos e legais efeitos, o Projeto de Sentença elaborado pela Juíza Leiga, nos termos do artigo 40 da Lei 9.099/95. Preclusa a via recursal, em nada sendo requerido, arquive-se com as baixas necessárias. Publicada no sistema PJe. Intimem-se. Data registrada automaticamente pelo sistema. Lener Leopoldo da Silva Coelho Juiz de Direito

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Processo nº 1019161-25.2025.8.11.0000

ID: 324803164

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1019161-25.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

GILBERTO MARCELO BAZZAN

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

SILVIO CESAR DOS SANTOS

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1019161-25.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Aquisição, Bloqueio de Matrícula] Relat… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1019161-25.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Aquisição, Bloqueio de Matrícula] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [SILVIO CESAR DOS SANTOS - CPF: 218.817.072-53 (ADVOGADO), GILBERTO MARCELO BAZZAN - CPF: 966.893.581-00 (AGRAVANTE), SPERAFICO AGROINDUSTRIAL LTDA. - CNPJ: 75.215.756/0001-57 (AGRAVADO), EZEQUIAS VICENTE DA SILVA - OFICIAL/REGISTRADOR DO ( 1.OFICIO) DE REGISTRO DE IMOVEIS,TITULOS E DOCUMENTOS. - CNPJ: 07.386.713/0001-84 (TERCEIRO INTERESSADO), ANTONIO DA SILVA - CPF: 089.974.039-15 (TERCEIRO INTERESSADO), MARIA HELENA DA SILVA (TERCEIRO INTERESSADO), ARIANE VETTORELLO SPERAFICO - CPF: 214.833.208-20 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. EMENTA AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO ORDINÁRIA DE ANULAÇÃO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO C/C PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE PARA BLOQUEIO DE MATRÍCULA – EXCEÇÃO DE USUCAPIÃO ALEGADA EM CONTESTAÇÃO – INADEQUAÇÃO NA DEMANDA DE NATUREZA EXCLUSIVAMENTE REGISTRAL – AUSÊNCIA DE DISCUSSÃO SOBRE DOMÍNIO OU POSSE – DEMANDA QUE VISA AO CONTROLE DA LEGALIDADE DO ATO DE REGISTRO E À PROTEÇÃO DA ORDEM PÚBLICA REGISTRAL – SÚMULA 237 DO STF – CABIMENTO RESTRITO A AÇÕES POSSESSÓRIAS OU PETITÓRIAS – IRRELEVÂNCIA DA ALEGAÇÃO DE USUCAPIÃO COMO DEFESA PARA OBSTAR O EXAME DE NULIDADE REGISTRAL – POSSIBILIDADE DE VEICULAÇÃO EM AÇÃO PRÓPRIA – ART. 214, § 5º, DA LEI DE REGISTROS PÚBLICOS – LIMITE MATERIAL À EFICÁCIA DA NULIDADE QUANDO COMPROVADO O PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DA USUCAPIÃO POR TERCEIRO DE BOA-FÉ – DECISÃO AGRAVADA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. A ação originária tem natureza eminentemente registral, voltada à anulação de matrícula imobiliária supostamente aberta com base em documentação inverídica e formação fraudulenta da cadeia dominial, visando ao controle da legalidade do ato registral e à preservação dos princípios da continuidade e unicidade do registro, sem qualquer pedido possessório ou petitório. A exceção de usucapião, embora admitida em defesa conforme a Súmula 237 do STF, destina-se ao deslinde de ações em que se controverte diretamente sobre posse ou domínio, não se prestando a afastar o exame da regularidade de ato registral eivado de nulidade em ação de natureza estritamente registral. A alegação de usucapião poderá ser deduzida em ação própria, não sendo cabível transformar o feito anulatório registral em instrumento de reconhecimento da prescrição aquisitiva, sob pena de desvirtuamento do objeto da demanda e prejuízo à celeridade processual. O art. 214, § 5º, da Lei de Registros Públicos impõe ao magistrado o dever de ponderar, no julgamento do mérito, se a nulidade atingiria terceiro de boa-fé que já tiver preenchido as condições legais da usucapião, o que constitui limite material à eficácia do provimento anulatório, mas não torna a exceção de usucapião defesa processualmente cabível na presente ação. Recurso desprovido. Decisão agravada mantida. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1019161-25.2025.8.11.0000 AGRAVANTE: GILBERTO MARCELO BAZZAN AGRAVADO: SPERAFICO AGROINDUSTRIAL LTDA. RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto por GILBERTO MARCELO BAZZAN, contra decisão interlocutória proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Brasnorte, Juiz Substituto Romeu da Cunha Gomes, o qual, nos autos da ação ordinária de anulação de registro imobiliário c/c pedido de tutela antecipada antecedente para bloqueio de matrícula, processo nº. 1001212-47.2023.8.11.0100, movida por Sperafico Agroindustrial Ltda., o qual rejeitou o conhecimento da exceção de usucapião arguida pelo agravante na contestação, ao fundamento de que a demanda em exame versa sobre direito registral, e não sobre domínio ou posse, motivo pelo qual entendeu inaplicável a Súmula 237 do STF. Em suas razões recursais, o agravante sustenta, em síntese, que: a decisão agravada errou ao não conhecer da exceção de usucapião suscitada na contestação; a Súmula 237 do STF autoriza expressamente a arguição de usucapião como matéria de defesa, sem restringir o cabimento a ações possessórias ou petitórias; o entendimento do juízo de origem, ao limitar a aplicabilidade da súmula a tais ações, revela uma leitura restritiva, formalista e dissociada da realidade do direito material debatido; embora o pedido imediato da ação seja a anulação de registro imobiliário por suposta fraude, o cerne da controvérsia está relacionado ao direito de propriedade sobre o imóvel; a exceção de usucapião seria cabível porque visa demonstrar a aquisição originária da propriedade pelo réu, de modo que eventual nulidade da matrícula atacada perderia relevância, já que o domínio do bem estaria consolidado por outro título (a usucapião); a usucapião é modo originário de aquisição da propriedade, purgando eventuais vícios e irregularidades de registros anteriores e tornando inútil a discussão sobre a cadeia dominial antecedente; a negativa de conhecimento da exceção afronta os princípios da ampla defesa, da economia processual e da celeridade, forçando o réu a ajuizar ação própria para discutir direito que já poderia ser analisado na presente demanda; o risco de decisões conflitantes e a desnecessária multiplicação de processos; a decisão interlocutória que impede o exame da exceção de usucapião, além de gerar prejuízo imediato, tem caráter de mérito sobre o direito de defesa, razão pela qual cabível o agravo de instrumento (art. 1.015, II, CPC), sendo adequada a interpretação extensiva do rol do referido artigo, à luz do julgamento do Tema 988 do STJ. Pede o provimento do agravo para que o juízo de origem conheça e processe a exceção de usucapião, com a admissão da produção das provas especificadas na contestação (documental suplementar, testemunhal, pericial e depoimento pessoal). Custas de preparo recolhidas (Id. 292963878). Sem pedido de tutela recursal. A agravada, em suas contrarrazões Id. 295638861, sustenta que: a decisão agravada está correta ao não conhecer da exceção de usucapião, porque a presente ação é de natureza registral, destinada à anulação de matrícula supostamente fraudulenta, visando resguardar o sistema registral público, e não discutir posse ou domínio propriamente ditos; a Súmula 237 do STF autoriza a alegação de usucapião como matéria de defesa apenas nas ações possessórias e petitórias, em que se controverte diretamente sobre o direito das coisas, o que não ocorre no presente caso; a discussão posta nos autos refere-se a vícios formais e substanciais na constituição da matrícula n.º 6.019, de interesse público, pois afeta os princípios da continuidade e da unicidade do registro imobiliário; a alegação de usucapião como defesa, neste contexto, seria inadequada e inócua, porque não elimina a necessidade de cancelamento de matrícula obtida mediante suposta fraude; a exceção de usucapião constitui verdadeira tentativa de desviar o foco da controvérsia principal, que é a preservação do fólio real, e que sua admissão transformaria indevidamente a ação de nulidade registral em ação petitória; o reconhecimento da usucapião não pode impedir o exame da higidez dos atos registrais atacados, pois o cancelamento de registro viciado decorre do interesse público e não se submete à alegação de domínio por usucapião como defesa; a decisão agravada deve ser mantida, sob pena de comprometimento da segurança jurídica, do sistema registral e da credibilidade do serviço público de registro imobiliário. Formula pedido de não conhecimento ou, subsidiariamente, improvimento do recurso, mantendo-se a decisão agravada pelos seus próprios fundamentos. É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Conforme relatado, trata-se de agravo de instrumento interposto por Gilberto Marcelo Bazzan contra decisão proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Brasnorte/MT, nos autos da ação ordinária de anulação de registro imobiliário c/c pedido de tutela antecipada antecedente para bloqueio de matrícula, ajuizada por Sperafico Agroindustrial Ltda. A decisão agravada rejeitou o conhecimento da exceção de usucapião suscitada pelo agravante na contestação, ao fundamento de que a demanda não versa sobre direito das coisas, mas sim sobre direito registral e interesse público na higidez do sistema registral imobiliário. Eis o teor da decisão recorrida no ponto que interessa a análise do recurso: “(...) II.2 – Da exceção de usucapião Sustenta o requerido que é cabível a formulação de exceção de usucapião em ação anulatória. Melhor sorte não lhe assiste. A Súmula 237/STF dispõe que a usucapião pode ser arguida como matéria de defesa, contudo, quando a discussão se refere ao direito das coisas. Isso porque a posse é um direito tutelado no ordenamento jurídico pátrio, de modo que é evidente que em ação petitória ou ação possessória a usucapião pode ser alegada em contestação, porque tanto a posse do autor quanto do réu podem ser objeto de análise. No presente caso, não há discussão sobre domínio, nem sobre posse, mas sobre a suposta nulidade da matrícula nº 6.019, do CRI de Brasnorte, em razão de ter sido originada de deslocamento de área, gerando sobreposição à matrícula nº 30.019, do CRI de Diamantino. A discussão aqui travada não é, portanto, de direito das coisas, mas de direito registral e o deslinde da controvérsia é, inclusive, de interesse público, porque obrigatória a observância dos princípios da continuidade e unicidade de registro. Desse modo, DEIXO DE CONHECER da exceção de usucapião. (...)” Pois bem. Quanto ao cabimento do presente agravo de instrumento, salienta-se que, embora o rol do artigo 1.015 do Código de Processo Civil seja, em regra, taxativo, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema 988, firmou orientação no sentido de que é admissível a interposição do recurso em hipóteses em que a decisão interlocutória cause ao recorrente imediato prejuízo de difícil ou impossível reparação, como ocorre na espécie. A decisão agravada, ao rejeitar o conhecimento da exceção de usucapião, obstou a apreciação de tese defensiva que, no entendimento do agravante, teria o potencial de fulminar a pretensão autoral, impactando diretamente o mérito da causa e a amplitude do direito de defesa. Assim, revela-se cabível o agravo de instrumento, não apenas pela aplicação do inciso II do art. 1.015 do CPC (decisões sobre o mérito), mas também em razão da interpretação conferida pelo STJ ao Tema 988, que admite o manejo do recurso em hipóteses excepcionais para evitar a preclusão e assegurar a efetividade da tutela jurisdicional. No mérito, a insurgência recursal não deve prosperar. A controvérsia trazida ao exame reside na possibilidade de conhecimento da exceção de usucapião como defesa na presente demanda de anulação de matrícula imobiliária. Neste tear, convém inicialmente delimitar com precisão a natureza da ação originária, a partir da causa de pedir e dos pedidos formulados na petição inicial. Conforme se extrai dos autos do processo originário número 1001212-47.2023.8.11.0100, a ação proposta pela agravada visa à anulação da matrícula n.º 6.019 do CRI de Brasnorte/MT, sob alegação de que tal matrícula foi aberta com base em documentação inverídica, inclusive escritura lavrada em cartório cujo tabelião foi afastado judicialmente, além de indícios de fraude na formação da cadeia dominial e deslocamento irregular de origem registral de outro município, com sobreposição à matrícula n.º 30.019 da autora. O pedido imediato consiste no bloqueio liminar e na declaração de nulidade da matrícula em questão, com o objetivo de restaurar a integridade do fólio real e resguardar os princípios da continuidade e da unicidade do registro. Não há qualquer pleito possessório ou petitório, tampouco se formula pedido relacionado à reintegração, manutenção de posse ou reivindicação de domínio em sentido material. Trata-se, portanto, de ação nitidamente registral, voltada ao controle da legalidade do ato de registro e à proteção da ordem pública registral, com reflexo indireto sobre a propriedade. Com efeito, conquanto certo que a Súmula 237 do STF dispõe que “o usucapião pode ser arguido em defesa”, a exegese sistemática do enunciado sumular e a sua aplicação prática pela jurisprudência indicam que a exceção de usucapião se presta ao deslinde de ações em que a controvérsia versa diretamente sobre a posse ou o domínio — vale dizer, ações petitórias ou possessórias, nas quais o direito das coisas se encontra no centro da lide —, mormente porque, em tais hipóteses, o reconhecimento da prescrição aquisitiva tem o condão de fulminar a pretensão do autor, resolvendo a lide de forma direta e definitiva. No caso em exame, como já salientado, a demanda originária tem natureza registral. O pedido principal cinge-se à anulação de matrícula e ao controle da legalidade do ato de registro, por suposto vício formal e substancial, com o objetivo de proteger a ordem pública registral e os princípios do sistema imobiliário, de modo que o juízo de primeiro grau agiu corretamente ao concluir que a alegação de usucapião, em tal contexto, não se mostra pertinente como defesa hábil a obstar o exame da regularidade do ato registral. Ademais, urge destacar que a nulidade de ato registral eivado de vício grave constitui matéria de interesse público, não se sujeitando à preclusão ou convalidação por alegações defensivas de natureza possessória ou dominial, especialmente porque o exame do vício registral, por seu caráter público e protetivo da segurança jurídica do fólio real, não pode ser afastado pela invocação da usucapião, que, embora relevante no campo do direito das coisas, não elide o dever do Estado-juiz de apreciar a regularidade do registro. Nesta toada, o argumento do agravante, no sentido de que a negativa de conhecimento da exceção viola a ampla defesa e a economia processual, não se sustenta, na medida em que a alegação de usucapião, em hipótese como a dos autos, poderá ser veiculada em ação própria, destinada à obtenção de provimento declaratório específico sobre a aquisição originária da propriedade. Admitir a exceção neste feito importaria desvirtuar o objeto da demanda, desviando a controvérsia do controle da legalidade registral para o exame da posse e da prescrição aquisitiva, com claro prejuízo à celeridade e à delimitação do tema decisório. Portanto, a decisão agravada está em harmonia com a melhor interpretação do direito aplicável e com o interesse público subjacente ao controle da legalidade registral. De outra feita, cumpre assinalar que, embora a exceção de usucapião não se mostre cabível como matéria de defesa na presente ação de natureza exclusivamente registral, o juízo de origem, ao apreciar o mérito da demanda e eventual pedido de decretação da nulidade do registro, deverá atentar para o disposto no § 5º do art. 214 da Lei de Registros Públicos, dispositivo que impõe ao magistrado o dever de ponderar, à luz das provas dos autos, se o cancelamento do registro atingiria terceiro de boa-fé que já tivesse preenchido as condições legais para o reconhecimento da usucapião, hipótese em que a nulidade não poderá ser declarada. Veja-se: “Art. 214 - As nulidades de pleno direito do registro, uma vez provadas, invalidam-no, independentemente de ação direta. (Renumerado do art. 215 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975). § 1o A nulidade será decretada depois de ouvidos os atingidos. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004) § 2o Da decisão tomada no caso do § 1o caberá apelação ou agravo conforme o caso. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004) § 3o Se o juiz entender que a superveniência de novos registros poderá causar danos de difícil reparação poderá determinar de ofício, a qualquer momento, ainda que sem oitiva das partes, o bloqueio da matrícula do imóvel. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004) § 4o Bloqueada a matrícula, o oficial não poderá mais nela praticar qualquer ato, salvo com autorização judicial, permitindo-se, todavia, aos interessados a prenotação de seus títulos, que ficarão com o prazo prorrogado até a solução do bloqueio. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004) § 5o A nulidade não será decretada se atingir TERCEIRO DE BOA-FÉ que já tiver PREENCHIDO AS CONDIÇÕES DE USUCAPIÃO DO IMÓVEL.” Tal exame, no entanto, não transforma a exceção de usucapião em defesa processualmente cabível de forma isolada na presente ação, mas sim consagra um limite material à eficácia do provimento jurisdicional anulatório, em respeito à segurança jurídica e ao direito adquirido do possuidor de boa-fé. Ou seja, o legislador buscou harmonizar a ordem pública registral com o direito adquirido do possuidor de boa-fé, evitando que o cancelamento do registro atinja aquele que, além da boa-fé, já preencheu os requisitos objetivos e subjetivos da usucapião. Em outras palavras, o § 5º do art. 214 não altera o descabimento processual da exceção de usucapião em ação de nulidade de registro, na medida em que o que o dispositivo faz é impor ao juiz, no momento da análise do mérito da anulação do registro, o dever de verificar se o cancelamento atingiria terceiro de boa-fé já beneficiado pela usucapião, estabelecendo com isto um limite material à eficácia da sentença anulando o registro, não criando uma nova modalidade de defesa processualmente cabível na ação anulatória. Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo incólume a decisão agravada que deixou de conhecer da exceção de usucapião, por ausência de pertinência em ação de natureza exclusivamente registral. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/07/2025

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Processo nº 1019161-25.2025.8.11.0000

ID: 324803165

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1019161-25.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

SPERAFICO AGROINDUSTRIAL LTDA.

Acórdão

Advogados:

ARIANE VETTORELLO SPERAFICO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1019161-25.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Aquisição, Bloqueio de Matrícula] Relat… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1019161-25.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Aquisição, Bloqueio de Matrícula] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [SILVIO CESAR DOS SANTOS - CPF: 218.817.072-53 (ADVOGADO), GILBERTO MARCELO BAZZAN - CPF: 966.893.581-00 (AGRAVANTE), SPERAFICO AGROINDUSTRIAL LTDA. - CNPJ: 75.215.756/0001-57 (AGRAVADO), EZEQUIAS VICENTE DA SILVA - OFICIAL/REGISTRADOR DO ( 1.OFICIO) DE REGISTRO DE IMOVEIS,TITULOS E DOCUMENTOS. - CNPJ: 07.386.713/0001-84 (TERCEIRO INTERESSADO), ANTONIO DA SILVA - CPF: 089.974.039-15 (TERCEIRO INTERESSADO), MARIA HELENA DA SILVA (TERCEIRO INTERESSADO), ARIANE VETTORELLO SPERAFICO - CPF: 214.833.208-20 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. EMENTA AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO ORDINÁRIA DE ANULAÇÃO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO C/C PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA ANTECEDENTE PARA BLOQUEIO DE MATRÍCULA – EXCEÇÃO DE USUCAPIÃO ALEGADA EM CONTESTAÇÃO – INADEQUAÇÃO NA DEMANDA DE NATUREZA EXCLUSIVAMENTE REGISTRAL – AUSÊNCIA DE DISCUSSÃO SOBRE DOMÍNIO OU POSSE – DEMANDA QUE VISA AO CONTROLE DA LEGALIDADE DO ATO DE REGISTRO E À PROTEÇÃO DA ORDEM PÚBLICA REGISTRAL – SÚMULA 237 DO STF – CABIMENTO RESTRITO A AÇÕES POSSESSÓRIAS OU PETITÓRIAS – IRRELEVÂNCIA DA ALEGAÇÃO DE USUCAPIÃO COMO DEFESA PARA OBSTAR O EXAME DE NULIDADE REGISTRAL – POSSIBILIDADE DE VEICULAÇÃO EM AÇÃO PRÓPRIA – ART. 214, § 5º, DA LEI DE REGISTROS PÚBLICOS – LIMITE MATERIAL À EFICÁCIA DA NULIDADE QUANDO COMPROVADO O PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DA USUCAPIÃO POR TERCEIRO DE BOA-FÉ – DECISÃO AGRAVADA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. A ação originária tem natureza eminentemente registral, voltada à anulação de matrícula imobiliária supostamente aberta com base em documentação inverídica e formação fraudulenta da cadeia dominial, visando ao controle da legalidade do ato registral e à preservação dos princípios da continuidade e unicidade do registro, sem qualquer pedido possessório ou petitório. A exceção de usucapião, embora admitida em defesa conforme a Súmula 237 do STF, destina-se ao deslinde de ações em que se controverte diretamente sobre posse ou domínio, não se prestando a afastar o exame da regularidade de ato registral eivado de nulidade em ação de natureza estritamente registral. A alegação de usucapião poderá ser deduzida em ação própria, não sendo cabível transformar o feito anulatório registral em instrumento de reconhecimento da prescrição aquisitiva, sob pena de desvirtuamento do objeto da demanda e prejuízo à celeridade processual. O art. 214, § 5º, da Lei de Registros Públicos impõe ao magistrado o dever de ponderar, no julgamento do mérito, se a nulidade atingiria terceiro de boa-fé que já tiver preenchido as condições legais da usucapião, o que constitui limite material à eficácia do provimento anulatório, mas não torna a exceção de usucapião defesa processualmente cabível na presente ação. Recurso desprovido. Decisão agravada mantida. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1019161-25.2025.8.11.0000 AGRAVANTE: GILBERTO MARCELO BAZZAN AGRAVADO: SPERAFICO AGROINDUSTRIAL LTDA. RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de agravo de instrumento interposto por GILBERTO MARCELO BAZZAN, contra decisão interlocutória proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Brasnorte, Juiz Substituto Romeu da Cunha Gomes, o qual, nos autos da ação ordinária de anulação de registro imobiliário c/c pedido de tutela antecipada antecedente para bloqueio de matrícula, processo nº. 1001212-47.2023.8.11.0100, movida por Sperafico Agroindustrial Ltda., o qual rejeitou o conhecimento da exceção de usucapião arguida pelo agravante na contestação, ao fundamento de que a demanda em exame versa sobre direito registral, e não sobre domínio ou posse, motivo pelo qual entendeu inaplicável a Súmula 237 do STF. Em suas razões recursais, o agravante sustenta, em síntese, que: a decisão agravada errou ao não conhecer da exceção de usucapião suscitada na contestação; a Súmula 237 do STF autoriza expressamente a arguição de usucapião como matéria de defesa, sem restringir o cabimento a ações possessórias ou petitórias; o entendimento do juízo de origem, ao limitar a aplicabilidade da súmula a tais ações, revela uma leitura restritiva, formalista e dissociada da realidade do direito material debatido; embora o pedido imediato da ação seja a anulação de registro imobiliário por suposta fraude, o cerne da controvérsia está relacionado ao direito de propriedade sobre o imóvel; a exceção de usucapião seria cabível porque visa demonstrar a aquisição originária da propriedade pelo réu, de modo que eventual nulidade da matrícula atacada perderia relevância, já que o domínio do bem estaria consolidado por outro título (a usucapião); a usucapião é modo originário de aquisição da propriedade, purgando eventuais vícios e irregularidades de registros anteriores e tornando inútil a discussão sobre a cadeia dominial antecedente; a negativa de conhecimento da exceção afronta os princípios da ampla defesa, da economia processual e da celeridade, forçando o réu a ajuizar ação própria para discutir direito que já poderia ser analisado na presente demanda; o risco de decisões conflitantes e a desnecessária multiplicação de processos; a decisão interlocutória que impede o exame da exceção de usucapião, além de gerar prejuízo imediato, tem caráter de mérito sobre o direito de defesa, razão pela qual cabível o agravo de instrumento (art. 1.015, II, CPC), sendo adequada a interpretação extensiva do rol do referido artigo, à luz do julgamento do Tema 988 do STJ. Pede o provimento do agravo para que o juízo de origem conheça e processe a exceção de usucapião, com a admissão da produção das provas especificadas na contestação (documental suplementar, testemunhal, pericial e depoimento pessoal). Custas de preparo recolhidas (Id. 292963878). Sem pedido de tutela recursal. A agravada, em suas contrarrazões Id. 295638861, sustenta que: a decisão agravada está correta ao não conhecer da exceção de usucapião, porque a presente ação é de natureza registral, destinada à anulação de matrícula supostamente fraudulenta, visando resguardar o sistema registral público, e não discutir posse ou domínio propriamente ditos; a Súmula 237 do STF autoriza a alegação de usucapião como matéria de defesa apenas nas ações possessórias e petitórias, em que se controverte diretamente sobre o direito das coisas, o que não ocorre no presente caso; a discussão posta nos autos refere-se a vícios formais e substanciais na constituição da matrícula n.º 6.019, de interesse público, pois afeta os princípios da continuidade e da unicidade do registro imobiliário; a alegação de usucapião como defesa, neste contexto, seria inadequada e inócua, porque não elimina a necessidade de cancelamento de matrícula obtida mediante suposta fraude; a exceção de usucapião constitui verdadeira tentativa de desviar o foco da controvérsia principal, que é a preservação do fólio real, e que sua admissão transformaria indevidamente a ação de nulidade registral em ação petitória; o reconhecimento da usucapião não pode impedir o exame da higidez dos atos registrais atacados, pois o cancelamento de registro viciado decorre do interesse público e não se submete à alegação de domínio por usucapião como defesa; a decisão agravada deve ser mantida, sob pena de comprometimento da segurança jurídica, do sistema registral e da credibilidade do serviço público de registro imobiliário. Formula pedido de não conhecimento ou, subsidiariamente, improvimento do recurso, mantendo-se a decisão agravada pelos seus próprios fundamentos. É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Conforme relatado, trata-se de agravo de instrumento interposto por Gilberto Marcelo Bazzan contra decisão proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Brasnorte/MT, nos autos da ação ordinária de anulação de registro imobiliário c/c pedido de tutela antecipada antecedente para bloqueio de matrícula, ajuizada por Sperafico Agroindustrial Ltda. A decisão agravada rejeitou o conhecimento da exceção de usucapião suscitada pelo agravante na contestação, ao fundamento de que a demanda não versa sobre direito das coisas, mas sim sobre direito registral e interesse público na higidez do sistema registral imobiliário. Eis o teor da decisão recorrida no ponto que interessa a análise do recurso: “(...) II.2 – Da exceção de usucapião Sustenta o requerido que é cabível a formulação de exceção de usucapião em ação anulatória. Melhor sorte não lhe assiste. A Súmula 237/STF dispõe que a usucapião pode ser arguida como matéria de defesa, contudo, quando a discussão se refere ao direito das coisas. Isso porque a posse é um direito tutelado no ordenamento jurídico pátrio, de modo que é evidente que em ação petitória ou ação possessória a usucapião pode ser alegada em contestação, porque tanto a posse do autor quanto do réu podem ser objeto de análise. No presente caso, não há discussão sobre domínio, nem sobre posse, mas sobre a suposta nulidade da matrícula nº 6.019, do CRI de Brasnorte, em razão de ter sido originada de deslocamento de área, gerando sobreposição à matrícula nº 30.019, do CRI de Diamantino. A discussão aqui travada não é, portanto, de direito das coisas, mas de direito registral e o deslinde da controvérsia é, inclusive, de interesse público, porque obrigatória a observância dos princípios da continuidade e unicidade de registro. Desse modo, DEIXO DE CONHECER da exceção de usucapião. (...)” Pois bem. Quanto ao cabimento do presente agravo de instrumento, salienta-se que, embora o rol do artigo 1.015 do Código de Processo Civil seja, em regra, taxativo, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema 988, firmou orientação no sentido de que é admissível a interposição do recurso em hipóteses em que a decisão interlocutória cause ao recorrente imediato prejuízo de difícil ou impossível reparação, como ocorre na espécie. A decisão agravada, ao rejeitar o conhecimento da exceção de usucapião, obstou a apreciação de tese defensiva que, no entendimento do agravante, teria o potencial de fulminar a pretensão autoral, impactando diretamente o mérito da causa e a amplitude do direito de defesa. Assim, revela-se cabível o agravo de instrumento, não apenas pela aplicação do inciso II do art. 1.015 do CPC (decisões sobre o mérito), mas também em razão da interpretação conferida pelo STJ ao Tema 988, que admite o manejo do recurso em hipóteses excepcionais para evitar a preclusão e assegurar a efetividade da tutela jurisdicional. No mérito, a insurgência recursal não deve prosperar. A controvérsia trazida ao exame reside na possibilidade de conhecimento da exceção de usucapião como defesa na presente demanda de anulação de matrícula imobiliária. Neste tear, convém inicialmente delimitar com precisão a natureza da ação originária, a partir da causa de pedir e dos pedidos formulados na petição inicial. Conforme se extrai dos autos do processo originário número 1001212-47.2023.8.11.0100, a ação proposta pela agravada visa à anulação da matrícula n.º 6.019 do CRI de Brasnorte/MT, sob alegação de que tal matrícula foi aberta com base em documentação inverídica, inclusive escritura lavrada em cartório cujo tabelião foi afastado judicialmente, além de indícios de fraude na formação da cadeia dominial e deslocamento irregular de origem registral de outro município, com sobreposição à matrícula n.º 30.019 da autora. O pedido imediato consiste no bloqueio liminar e na declaração de nulidade da matrícula em questão, com o objetivo de restaurar a integridade do fólio real e resguardar os princípios da continuidade e da unicidade do registro. Não há qualquer pleito possessório ou petitório, tampouco se formula pedido relacionado à reintegração, manutenção de posse ou reivindicação de domínio em sentido material. Trata-se, portanto, de ação nitidamente registral, voltada ao controle da legalidade do ato de registro e à proteção da ordem pública registral, com reflexo indireto sobre a propriedade. Com efeito, conquanto certo que a Súmula 237 do STF dispõe que “o usucapião pode ser arguido em defesa”, a exegese sistemática do enunciado sumular e a sua aplicação prática pela jurisprudência indicam que a exceção de usucapião se presta ao deslinde de ações em que a controvérsia versa diretamente sobre a posse ou o domínio — vale dizer, ações petitórias ou possessórias, nas quais o direito das coisas se encontra no centro da lide —, mormente porque, em tais hipóteses, o reconhecimento da prescrição aquisitiva tem o condão de fulminar a pretensão do autor, resolvendo a lide de forma direta e definitiva. No caso em exame, como já salientado, a demanda originária tem natureza registral. O pedido principal cinge-se à anulação de matrícula e ao controle da legalidade do ato de registro, por suposto vício formal e substancial, com o objetivo de proteger a ordem pública registral e os princípios do sistema imobiliário, de modo que o juízo de primeiro grau agiu corretamente ao concluir que a alegação de usucapião, em tal contexto, não se mostra pertinente como defesa hábil a obstar o exame da regularidade do ato registral. Ademais, urge destacar que a nulidade de ato registral eivado de vício grave constitui matéria de interesse público, não se sujeitando à preclusão ou convalidação por alegações defensivas de natureza possessória ou dominial, especialmente porque o exame do vício registral, por seu caráter público e protetivo da segurança jurídica do fólio real, não pode ser afastado pela invocação da usucapião, que, embora relevante no campo do direito das coisas, não elide o dever do Estado-juiz de apreciar a regularidade do registro. Nesta toada, o argumento do agravante, no sentido de que a negativa de conhecimento da exceção viola a ampla defesa e a economia processual, não se sustenta, na medida em que a alegação de usucapião, em hipótese como a dos autos, poderá ser veiculada em ação própria, destinada à obtenção de provimento declaratório específico sobre a aquisição originária da propriedade. Admitir a exceção neste feito importaria desvirtuar o objeto da demanda, desviando a controvérsia do controle da legalidade registral para o exame da posse e da prescrição aquisitiva, com claro prejuízo à celeridade e à delimitação do tema decisório. Portanto, a decisão agravada está em harmonia com a melhor interpretação do direito aplicável e com o interesse público subjacente ao controle da legalidade registral. De outra feita, cumpre assinalar que, embora a exceção de usucapião não se mostre cabível como matéria de defesa na presente ação de natureza exclusivamente registral, o juízo de origem, ao apreciar o mérito da demanda e eventual pedido de decretação da nulidade do registro, deverá atentar para o disposto no § 5º do art. 214 da Lei de Registros Públicos, dispositivo que impõe ao magistrado o dever de ponderar, à luz das provas dos autos, se o cancelamento do registro atingiria terceiro de boa-fé que já tivesse preenchido as condições legais para o reconhecimento da usucapião, hipótese em que a nulidade não poderá ser declarada. Veja-se: “Art. 214 - As nulidades de pleno direito do registro, uma vez provadas, invalidam-no, independentemente de ação direta. (Renumerado do art. 215 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975). § 1o A nulidade será decretada depois de ouvidos os atingidos. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004) § 2o Da decisão tomada no caso do § 1o caberá apelação ou agravo conforme o caso. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004) § 3o Se o juiz entender que a superveniência de novos registros poderá causar danos de difícil reparação poderá determinar de ofício, a qualquer momento, ainda que sem oitiva das partes, o bloqueio da matrícula do imóvel. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004) § 4o Bloqueada a matrícula, o oficial não poderá mais nela praticar qualquer ato, salvo com autorização judicial, permitindo-se, todavia, aos interessados a prenotação de seus títulos, que ficarão com o prazo prorrogado até a solução do bloqueio. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004) § 5o A nulidade não será decretada se atingir TERCEIRO DE BOA-FÉ que já tiver PREENCHIDO AS CONDIÇÕES DE USUCAPIÃO DO IMÓVEL.” Tal exame, no entanto, não transforma a exceção de usucapião em defesa processualmente cabível de forma isolada na presente ação, mas sim consagra um limite material à eficácia do provimento jurisdicional anulatório, em respeito à segurança jurídica e ao direito adquirido do possuidor de boa-fé. Ou seja, o legislador buscou harmonizar a ordem pública registral com o direito adquirido do possuidor de boa-fé, evitando que o cancelamento do registro atinja aquele que, além da boa-fé, já preencheu os requisitos objetivos e subjetivos da usucapião. Em outras palavras, o § 5º do art. 214 não altera o descabimento processual da exceção de usucapião em ação de nulidade de registro, na medida em que o que o dispositivo faz é impor ao juiz, no momento da análise do mérito da anulação do registro, o dever de verificar se o cancelamento atingiria terceiro de boa-fé já beneficiado pela usucapião, estabelecendo com isto um limite material à eficácia da sentença anulando o registro, não criando uma nova modalidade de defesa processualmente cabível na ação anulatória. Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo incólume a decisão agravada que deixou de conhecer da exceção de usucapião, por ausência de pertinência em ação de natureza exclusivamente registral. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/07/2025

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Bruna Reindel Dias 03883268160 x Cooperativa De Crédito Poupança E Investimento Vale Do Cerrado - Sicredi Vale Do Cerrado

ID: 308875863

Tribunal: TJMT Órgão: 2ª VARA DE PARANATINGA Classe: EMBARGOS à EXECUçãO Nº Processo: 1001253-51.2024.8.11.0044

Data de Disponibilização: 26/06/2025

Polo Ativo:

BRUNA REINDEL DIAS 03883268160

Polo Passivo:

COOPERATIVA DE CRÉDITO POUPANÇA E INVESTIMENTO VALE DO CERRADO - SICREDI VALE DO CERRADO

Sentença

Advogados:

LORENA PONTES IZEQUIEL LEAL

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ARIANE TANARA BASTOS DE LIMA

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ADRIANO SANTOS DE ALMEIDA

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EUDER OLIVEIRA RIBEIRO

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JOAO OLIVEIRA DE LIMA

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DARLEY DA SILVA CAMARGO

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BRUNO MEDEIROS DURAO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA DE PARANATINGA SENTENÇA Processo: 1001253-51.2024.8.11.0044 EMBARGANTE: BRUNA REINDEL DIAS 03883268160 EMBARGADO: COOPERATIVA DE CRÉDITO POUPANÇA E INVE… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 2ª VARA DE PARANATINGA SENTENÇA Processo: 1001253-51.2024.8.11.0044 EMBARGANTE: BRUNA REINDEL DIAS 03883268160 EMBARGADO: COOPERATIVA DE CRÉDITO POUPANÇA E INVESTIMENTO VALE DO CERRADO - SICREDI VALE DO CERRADO I – Relatório Vistos e examinados. Trata-se de Embargos à Execução ajuizada por BRUNA REINDEL DIAS em face de COOPERATIVA DE CRÉDITO POUPANÇA E INVESTIMENTO VALE DO CERRADO, no bojo da Ação de Execução nº 1001212-84.2024.8.11.0044. A embargante, pessoa jurídica de direito privado, alega, em síntese, a iliquidez do título executivo extrajudicial que fundamenta a execução (duas Cédulas de Crédito Bancário), a ocorrência de excesso de execução e a presença de cláusulas abusivas nos contratos firmados, apontando práticas como anatocismo, cobrança cumulativa de encargos e aplicação de juros supostamente superiores aos limites legais. Defende a aplicação do Código de Defesa do Consumidor à relação jurídica e pleiteia a revogação da execução, com a extinção do feito executivo, além da concessão do benefício da justiça gratuita. Requereu ainda a concessão de efeito suspensivo aos embargos, alegando risco de dano irreparável em razão da continuidade da execução. Decisão de ID. 167507229 indeferiu o efeito suspensivo aos embargos. A parte embargada apresentou impugnação (ID. 169999534), defendendo, preliminarmente, o indeferimento do pedido de justiça gratuita, sob o argumento de ausência de comprovação da hipossuficiência econômica da empresa, ressaltando tratar-se de pessoa jurídica ativa, com ônus probatório mais rigoroso para concessão do benefício. No mérito, refutou os argumentos da embargante, sustentando que os títulos executivos preenchem os requisitos legais de certeza, liquidez e exigibilidade, que não há qualquer abusividade ou anatocismo, tampouco excesso nos valores cobrados, os quais decorreriam do inadimplemento contratual e estariam expressamente previstos nas Cédulas de Crédito Bancário. Requereu, por fim, a total improcedência dos embargos. Réplica à impugnação (ID. 170922431). Intimadas a especificarem provas (ID. 183281159), a parte embargada/exequente requereu o julgamento antecipado, enquanto a parte embargante/executada, requereu a produção de prova pericial. É, em síntese, o relatório. Decido. II – Fundamentação II.1 – Questões Preliminares a) Prova pericial O magistrado, como destinatário da prova, pode indeferir aquelas que entender inúteis ou meramente protelatórias, nos termos do que autoriza a norma contida no art. 370 do CPC, vejamos: Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito. Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias. A prova pericial pretendida pela parte embargante é o exame contábil do contrato firmado, com a finalidade de comprovar a existência de abusividades. A finalidade pretendida com a referida prova, dispensa a perícia, uma vez que tal aferição pode ser feita pelo próprio magistrado, bastando a detida análise do contrato firmado pelas partes. Verificando o magistrado que houve a cobrança de encargos ilegais e abusivos, passará, na sentença, ao decote, sendo que os cálculos de eventual saldo serão realizados em outra fase processual, a liquidação de sentença, na qual será necessária a realização da perícia de acordo com os parâmetros fixados na sentença. O parágrafo único do art. 420 do CPC estatui os casos em que o juiz poderá indeferir a perícia, com destaque para o inciso II, vejamos: Art. 420. A prova pericial consiste em exame, vistoria ou avaliação. Parágrafo único. O juiz indeferirá a perícia quando: I - a prova do fato não depender do conhecimento especial de técnico; II - for desnecessária em vista de outras provas produzidas; III - a verificação for impraticável. Diante disso, indefiro a produção de prova pericial. b) Inversão do ônus da prova No que diz respeito à inversão do ônus da prova, tenho que, este é um importante instrumento de defesa do consumidor, que visa promover o equilíbrio da relação processual, reduzindo vulnerabilidade daquele. Assim determina o art. 6º, do Código de Defesa do Consumidor: Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) VII - o acesso aos órgãos judiciários e administrativos com vistas à prevenção ou reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos ou difusos, assegurada a proteção Jurídica, administrativa e técnica aos necessitados. A hipossuficiência de que trata o dispositivo legal é de natureza técnica e processual e se perfaz na dificuldade de o consumidor determinar as provas que devem ser por ele produzidas com vistas à defesa de seu direito. Ora, certo é que a verificação da legalidade de cláusulas contratuais consiste em matéria meramente de direito, razão pela qual a distribuição do ônus da prova se torna, até mesmo, irrelevante para o julgamento da demanda. Nesse viés, a instrução do feito já permite a aferição das alegações da parte autora, não havendo que se falar em hipossuficiência técnica de sua parte capaz de justificar a inversão do ônus probatório. Não evidenciada a hipossuficiência técnica do embargante em produzir a prova, especialmente por demandar a hipótese dos autos exame de prova documental, de rigor é o indeferimento do pedido de inversão do ônus da prova. c) Gratuidade à parte embargante A parte embargada apresentou impugnação ao pedido de gratuidade judiciária formulado pela parte embargante, ainda pendente de análise. Contudo, entendo que não lhe assiste razão. Isso porque não se extrai dos autos qualquer elemento concreto que demonstre que a embargante possui condições de arcar com as custas processuais e honorários advocatícios sem prejuízo de seu próprio sustento. Ressalto que incumbia à parte embargada o ônus de comprovar a capacidade financeira da embargante, ônus esse que não foi devidamente cumprido. Ademais, ainda que se trate formalmente de pessoa jurídica, trata-se de empresa individual, hipótese em que há confusão patrimonial entre a pessoa física e a jurídica, o que autoriza o exame da situação financeira da titular. Diante do exposto, defiro o pedido de gratuidade da justiça à parte embargante, com fundamento no art. 98 e seguintes do Código de Processo Civil, e rejeito a impugnação apresentada pela parte embargada. II.2 – Julgamento Antecipado Consoante a vigência do CPC, a necessidade de fixação dos pontos controvertidos e eventual instrução probatória ficou condicionada ao arbítrio do magistrado que, após a apresentação de contestação e, se for o caso, impugnação, passará a adotar as providências preliminares (art. 347 CPC) e, verificando a desnecessidade de produção de provas, julgará antecipadamente o feito, conforme art. 355, inciso I, do CPC. Desta feita, tratando-se a matéria de fulcro revisional, necessária a verificação apenas da legalidade ou não dos termos do contrato avençado entre as partes, tem cunho essencial de direito, estando o feito apto a julgamento. Verifica-se que as questões processuais foram sanadas e que não há nulidades reconhecíveis de ofício, assim, passo à análise do mérito. II.3– Mérito Trata-se, em síntese, de embargos à execução com discussão revisional. Incide no presente caso o regime jurídico previsto no Código Civil (CC), uma vez que o crédito contratado é utilizado para fomentar a atividade da empresa e não para consumo final, de forma que fica afastada a aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Ademais, são fatos incontroversos nos autos a relação entre as partes e a contratação das cédulas de crédito. Desse modo, cinge-se a controvérsia na resolução da questão envolvendo a existência ou não de abusividades no contrato, o que ensejaria a sua revisão. Inicialmente, verifica-se que foi firmado entre as partes os seguintes contratos de cédula de crédito: a) nº. C20631296-9, no valor de R$65.000,00 e b) nº. C20631361-2, no valor de R$ R$110.250,00. A parte embargante sustenta que os títulos que embasam a execução — Cédulas de Crédito Bancário — não preenchem o requisito da liquidez, na medida em que, segundo alega, a apuração do valor devido dependeria de cálculos complexos, o que afastaria a possibilidade de execução direta, requerendo, por consequência, a extinção do feito executivo sem resolução do mérito, com fundamento no art. 803, I, do CPC. Sem razão. Nos termos do art. 783 do CPC, a execução deve se fundar em título que contenha obrigação certa, líquida e exigível. O art. 784, inciso XII, do mesmo diploma legal, reconhece expressamente como título executivo extrajudicial a Cédula de Crédito Bancário, com a seguinte redação: “Art. 784. São títulos executivos extrajudiciais: [...] XII – todos os demais títulos aos quais, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva.” No caso, a Lei nº 10.931/2004, em seu art. 28, dispõe que: “Art. 28. A Cédula de Crédito Bancário é título executivo extrajudicial e representa dívida em dinheiro, certa, líquida e exigível, seja pela soma nela indicada, seja pelo saldo devedor demonstrado em planilha de cálculo [...]” No caso concreto, verifica-se que a exequente instruiu a petição inicial da execução com as cédulas de crédito bancário regularmente firmadas e com as respectivas memórias de cálculo, contendo a evolução da dívida e a aplicação dos encargos pactuados. Tais documentos são suficientes para demonstrar a liquidez da obrigação, nos termos da legislação aplicável. Ademais, é pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que a necessidade de cálculo para apurar o saldo devedor não retira a liquidez do título, desde que possível sua verificação por simples operação aritmética, com base em cláusulas contratuais expressas, o que é o caso dos autos. Portanto, não há que se falar em iliquidez do título ou em nulidade da execução. Rejeito, assim, a alegação de iliquidez do título executivo, indeferindo o pedido de extinção do feito executivo com base no art. 803, I, do CPC. Em prosseguimento, a parte embargante sustenta que a parte embargada teria cobrado juros superiores a 10,75% ao ano; aplicado correção monetária cumulada com comissão de permanência; realizado venda casada de seguro e tarifas; capitalização de juros; utilização da Tabela Price; e, por fim, exigido multa moratória superior a 2%. Ressalto que a análise do caso concreto limitar-se-á aos pontos especificamente apontados como abusivos na fundamentação da petição inicial, nos termos da Súmula 381 do Superior Tribunal de Justiça, que dispõe: “Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas.” Feitos esses esclarecimentos, passo à análise das matérias suscitadas pela parte embargante. a) Juros Remuneratórios Quanto aos juros remuneratórios, já é pacificado na jurisprudência, especialmente com a edição da súmula nº 596 do STF e súmula vinculante nº 07, que as instituições financeiras, públicas ou privadas, não se sujeitam à limitação de juros remuneratórios em 12% (doze por cento) ao ano, imposta pelo Decreto nº 22.626 de 1933, eis que tal limitação estava condicionada à edição de lei complementar, que não sobreveio, sendo legítima a prática de taxas que se inserem na média de mercado. Insta salientar que a adequação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado não significa que devam obrigatoriamente estar inferiores à taxa constante na planilha do Banco Central do Brasil, pois se isso ocorresse, descaracterizaria o conceito de média, passando-se a exigir um valor fixo. Logo, para que reste caracterizada a abusividade da cobrança, impondo-se a redução do percentual contratado a esse título, necessário se faz que a taxa prevista no contrato seja superior, no mínimo, a uma vez e meia da média. Este é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça. Sobre esse tema, transcrevo parte do voto da Ministra Nancy Andrighi, proferido no REsp 1.061.530/RS, apreciado sob o rito dos repetitivos, julgado em 22/10/2008: "Como média, não se pode exigir que todos os empréstimos sejam feitos segundo essa taxa. Se isto ocorresse, a taxa média deixaria de ser o que é, para ser um valor fixo. Há, portanto, que se admitir uma faixa razoável para a variação dos juros. A jurisprudência, conforme registrado anteriormente, tem considerado abusivas taxas superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min. Ari Pargendler no REsp 271.214/RS, Rel. p. Acórdão Min. Menezes Direito, DJ de 04.08.2003), ao dobro (Resp 1.036.818, Terceira Turma, minha relatoria, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min. Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média. Todavia, esta perquirição acerca da abusividade não é estanque, o que impossibilita a adoção de critérios genéricos e universais. A taxa média de mercado, divulgada pelo Banco Central, constitui um valioso referencial, mas cabe somente ao juiz, no exame das peculiaridades do caso concreto, avaliar se os juros contratados foram ou não abusivos". Analisando os contratos firmados entre as partes, tenho que os juros foram pactuados em: a) Cédula nº. C20631296-9: 29,840671% ao ano e 2,20% ao mês; b) Cédula nº. C20631361-2: 5,032476% ao ano e 0,41% ao mês. Enquanto que, analisando a Tabela do Banco Central, (disponível em < https://www3.bcb.gov.br/sgspub/consultarvalores/consultarValoresSeries.do?method=consultarValores >), constata-se que: a) Em relação a Cédula nº. C20631296-9 a taxa média de mercado em operações de crédito com recursos livres – pessoa jurídica – total com taxas de mercado, na época do contrato (20/05/2022), era de 1,66% ao mês e 21,84% ao ano; b) Em relação a Cédula nº. C20631361-2 a taxa média de mercado em operações de crédito com recursos livres – pessoa jurídica – total com taxas de mercado, na época do contrato (27/05/2022), era de 1,66% ao mês e 21,84% ao ano. No caso, percebe-se que não há abusividade dos juros firmados pelo Banco, posto que no último contratos os juros estão abaixo do praticado no mercado, bem como, em relação ao primeiro contrato, consta que foi estipulado em 2,20% ao mês e 29,840671% ao ano, enquanto a taxa média de mercado apurada pelo BACEN em operações da mesma espécie, no mesmo período, era de 1,66% mensais e 21,84% anuais, sendo que, após a multiplicação por uma vez e meia de seu valor, tem-se o valor de 2,49% ao mês e 32,76% ao ano. Com isso, verifica-se que os juros remuneratórios fixados não se mostram abusivos. b) Capitalização de Juros No que se refere ao encargo da capitalização de juros, fixo que, em relação contratual como a descrita não encontro mais espaço para qualquer debate. É possível a capitalização de juros, desde que expressamente pactuada e prevista em contrato. A matéria foi examinada pelo colendo Superior Tribunal de Justiça, estando o posicionamento daquela Corte cristalizado na decisão proferida por ocasião do julgamento do Recurso Especial nº 973.827-RS, no sentido da legalidade da cobrança de juros capitalizados com periodicidade inferior a um ano, em contratos celebrados após 31/03/2000, data da publicação da Medida Provisória nº 1963-17/2000, hoje em vigor como MP nº 2.170-36/2001, quando devidamente pactuada, como no contrato em comento, não é abusiva. O STJ assim entendeu: “RECURSO REPETITIVO. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO. PACTUAÇÃO. CONTRATO BANCÁRIO. Trata-se de REsp sob o regime do art. 543-C do CPC e Res. n. 8/2008-STJ no qual a Seção, ratificando a sua jurisprudência, entendeu que é permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31 de março de 2000, data da publicação da MP 1.963-17/2000, em vigor como MP 2.170-36/2001, desde que expressamente pactuada, bem como, por maioria, decidiu que a previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada. A Min. Maria Isabel Gallotti, em seu voto-vista, esclareceu que, na prática, isso significa que os bancos não precisam incluir nos contratos cláusula com redação que expresse o termo “capitalização de juros” para cobrar a taxa efetiva contratada, bastando explicitar com clareza as taxas cobradas. A cláusula com o termo "capitalização de juros" será necessária apenas para que, após vencida a prestação sem o devido pagamento, o valor dos juros não pagos seja incorporado ao capital para o efeito de incidência de novos juros. Destacando que cabe ao Judiciário analisar a cobrança de taxas abusivas que consistem no excesso de taxa de juros em relação ao cobrado no mercado financeiro". (REsp 973.827-RS, Rel. originário Min. Luis Felipe Salomão, Rel. para o acórdão Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 27/6/2012) Neste sentido, tem-se que é possível a capitalização dos juros com periodicidade inferior a um ano, nos contratos celebrados após 31/03/2000, desde que prevista de forma expressa, bem como que, por pactuação expressa, entende-se a simples incidência de taxa efetiva anual superior a 12 vezes a taxa mensal No caso dos autos, observando o contrato juntado, vê-se de pronto que houve o ajuste de sua incidência, constando forma expressa no item “encargos”. Ademais disso, constata-se que a taxa anual indicada (29,840671% a.a. e 5,032476% a.a.) é superior a 12 vezes a mensal (12 x 2,20% = 26,4% e 12 x 0,41% = 4,92%), de modo que, mesmo que não constasse expressamente a aplicação da capitalização, esta se afiguraria a pactuação de forma expressa, não havendo assim o que revisar neste tocante. c) Comissão de permanência No que se refere à cobrança cumulada da comissão de permanência com outros encargos moratórios, sabe-se que tal encargo, quando cobrado, constitui encargo moratório insuscetível de cumulação, cujo limite reconhecido pelo STJ é a soma dos juros remuneratórios do contrato, juros moratórios de 1% ao mês e multa contratual. Contudo, a tese merece pronta rejeição, eis que diverge diametralmente do conteúdo do contrato celebrado entre as partes, uma vez que não há previsão da incidência de comissão de permanência nos contratos, restando prejudicada a discussão a respeito. d) Venda Casada – Seguro e Tarifas A parte embargante também sustenta, de forma genérica, a ocorrência de venda casada, mencionando que teria sido compelida à contratação de seguro e tarifas no momento da formalização das Cédulas de Crédito Bancário. Contudo, não especifica qual seguro teria sido contratado, tampouco identifica quais tarifas seriam abusivas ou indevidas, nem apresenta qualquer comprovação de que a contratação foi imposta como condição para liberação do crédito. Tal alegação, destituída de indicação mínima dos encargos questionados ou prova de sua imposição compulsória, não permite o exame judicial da suposta abusividade, impondo-se, portanto, o seu afastamento. A jurisprudência é firme no sentido de que a configuração de venda casada exige a demonstração de que a contratação de produto ou serviço acessório foi imposta como condição para a efetivação do contrato principal, o que não se extrai dos autos. Nesse contexto, inviável o acolhimento da tese de venda casada, diante da absoluta ausência de individualização dos supostos encargos indevidos e da inexistência de prova de sua exigência como requisito para o financiamento, prova esta que incumbia a parte autora como prova mínima de seu direito. e) Utilização Tabela Price e Multa moratória superior a 2% Quanto a alegação da parte embargante de utilização da Tabela Price e cobrança de multa moratória superior a 2%, razão não lhe assiste, uma vez que não se retira dos contratos firmados ou das planilhas de cálculo apresentadas a sua incidência, de forma que fica afastada a análise de qualquer abusividade nesse sentido. f) Descaracterização da mora Não há que se falar em descaracterização da mora, uma vez que o seu afastamento depende da constatação de encargos abusivos no período de normalidade (juros remuneratórios abusivos e capitalização de juros ilegal) e, no presente caso, não foi constatada referida abusividade, de modo que fica afastada a descaracterização da mora. g) Excesso execução A parte embargante sustenta a existência de excesso na execução, alegando, de forma genérica, que os valores cobrados seriam indevidos em razão da aplicação de encargos supostamente abusivos, como juros excessivos, capitalização indevida e práticas vedadas pelo ordenamento jurídico. Contudo, não se constatou qualquer cláusula abusiva ou cobrança indevida nos contratos firmados. As Cédulas de Crédito Bancário foram devidamente acompanhadas das memórias de cálculo e, como títulos executivos extrajudiciais, gozam de presunção de liquidez e exigibilidade. Assim, não havendo demonstração concreta de encargos indevidos ou de distorções nos valores executados, e diante da ausência de prova da alegada abusividade contratual, rejeito a alegação de excesso de execução. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, REJEITO os embargos à execução, com fulcro no art. 487, I, do CPC e, por conseguinte, DETERMINO o regular prosseguimento da execução em apenso (Processo n. 1001212-84.2024.8.11.0044). CONDENO o embargante ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como de honorários de sucumbência em favor do procurador da parte embargada, os quais, atento ao disposto no art. 85, §2º, do CPC, fixo em 10% sobre o valor da causa, devidamente atualizado. Todavia, fica suspensa a cobrança, visto que lhe foi deferida a gratuidade judiciária. Oportunamente, arquivem-se os autos, observando-se as disposições do art. 242 da CNGC (Provimento CGJ n. 39, de 16 de dezembro de 2020). P.I.C. Às providências. Paranatinga, data constante na certificação digital. Assinado Digitalmente LEONARDO LUCIO SANTOS Juiz de Direito Substituto

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Armando Martins Da Silva Neto x Wagner Plaza Machado Junior

ID: 277817118

Tribunal: TJMT Órgão: Presidência da Segunda Turma Recursal Classe: RECURSO INOMINADO CíVEL Nº Processo: 1001212-10.2022.8.11.0059

Data de Disponibilização: 23/05/2025

Polo Ativo:

ARMANDO MARTINS DA SILVA NETO

Polo Passivo:

WAGNER PLAZA MACHADO JUNIOR

Decisão

Advogados:

FABIO HENRIQUE MACEDO BAZOTTI

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ARMANDO MARTINS DA SILVA NETO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA PRESIDÊNCIA DA SEGUNDA TURMA RECURSAL Recurso Extraordinário N° 1001212-10.2022.8.11.0059 Origem: Núcleo de Justiça Digital dos Juizados Esp… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA PRESIDÊNCIA DA SEGUNDA TURMA RECURSAL Recurso Extraordinário N° 1001212-10.2022.8.11.0059 Origem: Núcleo de Justiça Digital dos Juizados Especiais Recorrente (s): Armando Martins da Silva Neto Recorrido (s): Wagner Plaza Machado Junior Relator (a): Suzana Guimarães Ribeiro – Gabinete 3 da 2ª Turma Recursal Presidente da Segunda Turma Recursal: João Alberto Menna Barreto Duarte EMENTA – DECISÃO MONOCRÁTICA RECURSO EXTRAORDINÁRIO EM RECURSO INOMINADO – DECISÃO COLEGIADA QUE NEGOU PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO INTERPOSTO PELA PARTE PROMOVENTE – INSURGÊNCIA DA PARTE RECLAMANTE – VERIFICAÇÃO DOS PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE – AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL – SEM OFENSA DIRETA E FRONTAL A CARTA MAGNA – VEDAÇÃO AO REEXAME DE FATOS E PROVAS – SÚMULA 279/STF – SÚMULA 636/STF – NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS ESPECÍFICOS – MERA IRRESIGNAÇÃO DA PARTE RECORRENTE – RECURSO A QUE SE NEGA SEGUIMENTO. Cuida-se de Recurso Extraordinário interposto pela parte promovida, com fulcro no art. 102, inciso III, alínea “a” da Constituição Federal, contra decisão colegiada, vinculada ao id. 271302353, a qual negou provimento ao agravo interno manejado pela parte reclamada, mantendo incólume a decisão monocrática que negou seguimento ao recurso inominado de id. 229521667. Infere-se das razões recursais da parte promovida que a sua pretensão é a reforma decisão colegiada vinculada ao id. 271302353, sob fundamento de que referida decisão viola aos princípios da inafastabilidade da jurisdição, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. É certo que existindo interposição de recurso é necessário que este seja submetido, primeiramente, ao juízo de admissibilidade a fim de se verificar se o instrumento recursal preenche todos os requisitos legais para a sua admissão. Os requisitos de admissibilidade são classificados em (i) intrínsecos, referentes à existência do direito de recorrer (cabimento, legitimidade, interesse e inexistência de fato impeditivo ou extintivo); (ii) extrínsecos, que são relativos ao regular exercício do direito de recorrer (tempestividade, regularidade formal e preparo). Ainda, há os requisitos específicos para interposição de recurso extraordinário, os quais são: (a) não discussão de matéria de fato ou provas; (b) prévio esgotamento das vias ordinárias; (c) decisão em única ou última instância; (d) prequestionamento da causa; e (e) presença de repercussão geral. A ausência de um dos pressupostos elencados acima – intrínseco, extrínseco e específico – enseja a inadmissibilidade do recurso. Com essas considerações, passa-se à análise dos pressupostos de admissibilidade do recurso extraordinário interposto. Da análise dos autos, observa-se que o recurso foi interposto tempestivamente, conforme certidão vinculada ao id. 272312891. No tocante ao recolhimento do preparo recursal, verifica-se que, sendo revogada/indeferida a justiça gratuita, incumbe a parte recorrente efetuar o recolhimento do preparo ou requerer a concessão das benesses da assistência gratuita no ato da interposição do recurso extraordinário, o que não fez, carecendo já de um dos pressupostos necessários para o conhecimento do recurso. No que tange aos pressupostos específicos para interposição do recurso extraordinário, tem-se que é ausente dos requisitos que lhe são necessários para o seu conhecimento, passa-se a explicar. O Código de Processo Civil é cristalino ao estabelecer em seu art. 1.035, caput, as hipóteses de (não) conhecimento do recurso extraordinário, a teor: Art. 1.035. O Supremo Tribunal Federal, em decisão irrecorrível, não conhecerá do recurso extraordinário quando a questão constitucional nele versada não tiver repercussão geral, nos termos deste artigo. § 1o Para efeito de repercussão geral, será considerada a existência ou não de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo. § 2o O recorrente deverá demonstrar a existência de repercussão geral para apreciação exclusiva pelo Supremo Tribunal Federal. § 3o Haverá repercussão geral sempre que o recurso impugnar acórdão que: I - contrarie súmula ou jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal; II (Revogado pela Lei nº 13.256, de 2016) III - tenha reconhecido a inconstitucionalidade de tratado ou de lei federal, nos termos do art. 97 da Constituição Federal. § 4o O relator poderá admitir, na análise da repercussão geral, a manifestação de terceiros, subscrita por procurador habilitado, nos termos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. § 5o Reconhecida a repercussão geral, o relator no Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional. § 6o O interessado pode requerer, ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal de origem, que exclua da decisão de sobrestamento e inadmita o recurso extraordinário que tenha sido interposto intempestivamente, tendo o recorrente o prazo de 5 (cinco) dias para manifestar-se sobre esse requerimento. § 7º Da decisão que indeferir o requerimento referido no § 6º ou que aplicar entendimento firmado em regime de repercussão geral ou em julgamento de recursos repetitivos caberá agravo interno. (Redação dada pela Lei nº 13.256, de 2016) § 8o Negada a repercussão geral, o presidente ou o vice-presidente do tribunal de origem negará seguimento aos recursos extraordinários sobrestados na origem que versem sobre matéria idêntica. § 9o O recurso que tiver a repercussão geral reconhecida deverá ser julgado no prazo de 1 (um) ano e terá preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus. § 10. (Revogado dada pela Lei nº 13.256, de 2016) § 11. A súmula da decisão sobre a repercussão geral constará de ata, que será publicada no diário oficial e valerá como acórdão. (grifo nosso) A norma supracitada, em seu §1°, destaca que para o reconhecimento da repercussão geral é necessária a existência de questões relevantes sistema no econômico, político, social ou jurídico, as quais ultrapassem os interesses subjetivos ou disponíveis. Ainda, referida norma, em seu §2º, é clara ao incumbir ao recorrente o ônus de demonstrar a existência de repercussão para apreciação exclusiva do STF. No caso em comento, a recorrente não se desincumbiu do ônus de demonstrar a existência de repercussão geral, vez que, da análise detida dos autos, não se vislumbra as questões relevantes que ultrapassem os interesses subjetivos das partes, restando incontroverso que a interposição do presente instrumento recursal é a expressão da irresignação da parte recorrente com o que restou consignado na decisão invectivada. Importante consignar que, embora a Carta Magna não estabeleça tal regramento, o Supremo Tribunal de Justiça consolidou entendimento no sentido de que o recebimento do recurso extraordinário deve ser pautado na contrariedade direta e frontal à Constituição Federal. Em outras palavras, significa que caso a ofensa à Constituição Federal seja reflexa (indireta), através de outra norma infraconstitucional, não é cabível o recurso extraordinário, a teor: “A violação indireta ou reflexa das regras constitucionais não enseja recurso extraordinário. Precedentes: AI n. 738.145 - AgR, Rel. Min. CELSO DE MELLO, 2ª Turma, DJ 25.02.11; AI n. 482.317-AgR, Rel. Min. ELLEN GRACIE, 2ª Turma DJ 15.03.11; AI n. 646.103-AgR, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, 1ª Turma, DJ 18.03.11. ” No tocante a pretensão recursal da recorrente, vale destacar que é vedado o reexame fático-probatório nesta seara recursal ante o disposto no verbete sumular n.º 279 do STF, in verbis: “Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário”. A propósito: O aresto impugnado, com fundamento na legislação ordinária e no substrato fático constante dos autos, negou provimento ao recurso defensivo para manter a condenação do recorrente pela prática das condutas descritas nos artigos 158, 171 e 288, todos do Código Penal, matéria situada no contexto normativo infraconstitucional. Inviável, ademais, o reexame das provas em sede de recurso extraordinário, conforme Súmula 279 [ARE 1.154.586, rel. min. Alexandre de Moraes, 1º T, j. 6-11-2018, DJE 242 de 16-11-2018. ] (grifo nosso) Com essas considerações, é incontestável que a mera irresignação da parte recorrente com o teor da decisão, por ser contrária aos seus interesses, não possui o condão para preencher os requisitos específicos para o conhecimento do recurso extraordinário. Por fim, colaciona-se decisões em recursos repetitivos, as quais originaram Temas em que o Supremo Tribunal de Justiça decidiu pela inexistência de repercussão geral: TEMA 181 – RE 598365– Inexistência de Repercussão Geral “A questão do preenchimento dos pressupostos de admissibilidade de recursos da competência de outros Tribunais tem natureza infraconstitucional e a ela são atribuídos os efeitos da ausência de repercussão geral, nos termos do precedente fixado no RE n. 584.608, rel. a Ministra Ellen Gracie, DJe 13/03/2009. ” (grifo nosso) TEMA 660 – ARE 748371 – Inexistência de Repercussão Geral “A questão da ofensa aos princípios do contraditório, da ampla defesa, do devido processo legal e dos limites à coisa julgada, tem natureza infraconstitucional, e a ela se atribuem os efeitos da ausência de repercussão geral, nos termos do precedente fixado no RE n. 584.608, rel. a Ministra Ellen Gracie, DJe 13/03/2009. ” (grifo nosso) TEMA 797 – ARE 836819 – Inexistência de Repercussão Geral “A admissão de recurso extraordinário interposto em causa processada nos Juizados Especiais Cíveis da Lei 9.099/1995 exige o preenchimento, por parte do recorrente, de dois requisitos adicionais: (a) demonstração específica e objetiva do prequestionamento, mediante a indicação clara da parte do acórdão recorrido em que tangenciada a matéria constitucional, e (b) fundamentação acerca da relevância calcada em dados concretos que revertam a presunção de inexistência de repercussão geral das lides processadas nesses Juizados. Obs.: unificação da tese para os Temas 797, 798 e 800. ” (grifo nosso) TEMA 890 – ARE 950787 – Inexistência de Repercussão Geral “A questão da ofensa aos princípios da dignidade da pessoa humana, da legalidade, da propriedade e sua função social, do devido processo legal e do acesso à Justiça, quando decorrente de relação contratual, tem natureza infraconstitucional, e a ela se atribuem os efeitos da ausência de repercussão geral, nos termos do precedente fixado no RE n. 584.608, rel. a Ministra Ellen Gracie, DJe 13/03/2009” (grifo nosso) TEMA 895 – ARE 956302 – Inexistência de Repercussão Geral “A questão da ofensa ao princípio da inafastabilidade de jurisdição, quando há óbice processual intransponível ao exame de mérito, ofensa indireta à Constituição ou análise de matéria fática, tem natureza infraconstitucional, e a ela se atribuem os efeitos da ausência de repercussão geral, nos termos do precedente fixado no RE n. 584.608, rel. a Ministra Ellen Gracie, DJe 13/03/2009.” (grifo nosso) TEMA 1146 – ARE 1320407 – Inexistência de Repercussão Geral “É infraconstitucional, a ela se aplicando os efeitos da ausência de repercussão geral, a controvérsia relativa à ofensa ao princípio da inafastabilidade de jurisdição quando a instância ordinária, com base na legislação aplicável e no conjunto fático-probatório constante dos autos, julgar, ainda que antecipadamente, o mérito da causa, por decisão fundamentada e garantidos os meios recursais cabíveis. ” (grifo nosso) Cândido Rangel Dinamarco diz que “recurso inadmissível são os casos de não conhecimento” (A reforma do código de Processo civil, 2ª., Malheiros Editores, 1995, p. 118.), registrando que, no caso de não conhecimento, está a se negar o seguimento ao recurso inadmissível pelo fato deste não preencher os requisitos de admissibilidade recursal, no caso em tela, resta incontroverso que o recurso extraordinário carece de repercussão geral, da ofensa direta e frontal à Carta Magna, do esgotamento das vias ordinárias e, também, busca o reexame fático-probatório. Nesse mesmo sentido é a redação do art. 1.030, inciso I, alínea “a”, do Código de Processo Civil: Art. 1.030. Recebida a petição do recurso pela secretaria do tribunal, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, findo o qual os autos serão conclusos ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, que deverá: (Redação dada pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência) I – negar seguimento: (Incluído pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência) a) a recurso extraordinário que discuta questão constitucional à qual o Supremo Tribunal Federal não tenha reconhecido a existência de repercussão geral ou a recurso extraordinário interposto contra acórdão que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal exarado no regime de repercussão geral; (Incluída pela Lei nº 13.256, de 2016) (Vigência) (grifo nosso) Ante o exposto, ausente o preenchimento dos pressupostos específicos, NEGO SEGUIMENTO ao recurso extraordinário interposto, nos termos dos arts. 1.029, 1.030, 1.035, todos do CPC c/c Súmulas 279/STF e 281/STF, forte, também, nos Temas 111, 660, 797, 890, 895 e 1146, todos dos STF. Intimem-se. Cumpra-se. Preclusa a via recursal, certifique-se o trânsito em julgado e devolva-se os autos ao juízo de origem. Juiz João Alberto Menna Barreto Duarte Presidente da Segunda Turma Recursal

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Processo nº 1001212-18.2023.8.11.0045

ID: 316733099

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: EMBARGOS DE DECLARAçãO CíVEL Nº Processo: 1001212-18.2023.8.11.0045

Data de Disponibilização: 04/07/2025

Polo Ativo:

NEW TRADE FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO PADRONIZADO MULTISSETORIAL

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

FERNANDO YOSHIO IRITANI

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001212-18.2023.8.11.0045 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Recuperação judicial e Falência… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001212-18.2023.8.11.0045 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Recuperação judicial e Falência] Relator: Des(a). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). TATIANE COLOMBO] Parte(s): [NEW TRADE FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO PADRONIZADO MULTISSETORIAL - CNPJ: 13.842.701/0001-10 (EMBARGANTE), FERNANDO YOSHIO IRITANI - CPF: 298.274.908-42 (ADVOGADO), ON SOY AGRONEGOCIO LTDA - CNPJ: 29.315.559/0001-92 (EMBARGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, REJEITOU OS EMBARGOS. E M E N T A DIREITO EMPRESARIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PEDIDO DE FALÊNCIA. IMPONTUALIDADE INJUSTIFICADA. PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA. OMISSÃO INEXISTENTE. EMBARGOS REJEITADOS. I. Caso em exame: 1. Embargos de declaração opostos contra acórdão que negou provimento a apelação e manteve sentença de extinção sem resolução de mérito de pedido de falência ajuizado com base na impontualidade injustificada, por ausência de interesse de agir. II. Questão em discussão: 2. A questão consiste em saber se houve omissão no acórdão embargado por não ter analisado expressamente se a decretação da falência com fundamento no artigo 94, inciso I, da Lei nº 11.101/2005, exige a demonstração prévia da insolvência do devedor ou o ajuizamento de execução. III. Razões de decidir: 3. O acórdão enfrentou de forma clara a questão central do recurso, assentando que a simples impontualidade no pagamento não justifica, por si só, a decretação da falência, especialmente na ausência de indícios concretos de insolvência e quando não esgotados meios menos gravosos de cobrança. 4. A decisão embargada aplicou corretamente o princípio da preservação da empresa, previsto no art. 47 da Lei nº 11.101/2005, e a jurisprudência consolidada do Tribunal, que vedam o uso do pedido de falência como instrumento coercitivo de cobrança. 5. Não há omissão a ser suprida, pois a matéria foi decidida de forma fundamentada, e a ausência de análise pormenorizada de cada argumento ou dispositivo legal invocado não configura omissão, conforme entendimento pacífico do STJ. 6. Embargos de declaração não são via adequada para rediscutir o mérito do julgado, tampouco para inovar a lide, sendo incabíveis no caso. IV. Dispositivo e tese: 7. Embargos de declaração rejeitados. Tese de julgamento: “A decretação da falência com base no artigo 94, inciso I, da Lei nº 11.101/2005, pressupõe demonstração concreta do estado de insolvência e não pode ser utilizada como instrumento coercitivo de cobrança, devendo-se observar o princípio da preservação da empresa.” Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 1.022; Lei nº 11.101/2005, arts. 47 e 94, I. Jurisprudência relevante citada: STF, AI 466.622 AgR-ED-ED-ED-ED/SP, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 28/11/2012; STJ, EDcl no REsp 1435687/MG, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 30/06/2015; STJ, EDcl no AgInt no REsp 1877995/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 25/02/2022. R E L A T Ó R I O Trata-se de embargos de declaração interpostos por NEW TRADE FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NÃO PADRONIZADOS MULTISSETORIAL, contra acórdão proferido por esta Primeira Câmara de Direito Privado, que negou provimento ao recurso de apelação, mantendo sentença que julgou extinto, sem resolução de mérito, o pedido de falência ajuizado em face de ON SOY AGRONEGÓCIO LTDA. A parte embargante alega existência de omissão no acórdão embargado, sustentando que esta Câmara teria deixado de enfrentar expressamente que a decretação da falência fundada no artigo 94, inciso I, da Lei nº 11.101/2005, não exige prévio ajuizamento de execução ou prova da insolvência da devedora, requerendo o suprimento da alegada omissão para viabilizar insurgência recursal perante o Superior Tribunal de Justiça. É o relatório. V O T O R E L A T O R Conforme relatado, trata-se de Embargos de Declaração em que a parte embargante alega existência de omissão no acórdão embargado quanto ao enfrentamento dos requisitos específicos do artigo 94, inciso I, da Lei nº 11.101/2005. Foi lançada a seguinte ementa no acórdão embargado: APELAÇÃO CÍVEL – PEDIDO DE FALÊNCIA – IMPONTUALIDADE INJUSTIFICADA – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE ESTADO FALIMENTAR – UTILIZAÇÃO DA FALÊNCIA COMO SUCEDÂNEO DE EXECUÇÃO – PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA – EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO – AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESROVIDO. O pedido de falência, embora seja um direito do credor, não pode ser utilizado como mero instrumento de cobrança de dívida, devendo estar vinculado à finalidade própria do instituto falimentar, que é a execução coletiva do patrimônio do devedor insolvente. A simples impontualidade no pagamento de obrigação líquida e protestada, isoladamente considerada, não é suficiente para a decretação da falência, quando não há elementos concretos que evidenciem o estado de insolvência da empresa devedora. A sentença que extinguiu o feito sem resolução de mérito, por ausência de interesse de agir, encontra amparo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que veda a utilização do pedido de falência como meio coercitivo de cobrança. O princípio da preservação da empresa, previsto no artigo 47 da Lei n.º 11.101/2005, visa a manutenção da atividade econômica e dos empregos, devendo ser ponderado na análise de pedidos falimentares quando não demonstrada a real inviabilidade da empresa devedora. Recurso de apelação não provido. Sentença mantida. Pois bem. Como se sabe, os embargos de declaração somente devem ser acolhidos quando presentes, na decisão embargada, quaisquer dos requisitos elencados no artigo 1.022 do Código de Processo Civil, quais sejam: Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II - suprir omissão de ponto ou questão sobre a qual devia pronunciar-se o juiz ou tribunal; III - corrigir erro material. Analisando detidamente a alegação de omissão suscitada pela parte embargante, verifica-se que não assiste razão ao embargante. Em verdade, se afigura nítido o intuito do embargante de ver reexaminada a controvérsia. Assim sendo, "revelam-se incabíveis os embargos de declaração, quando inexistentes os vícios que caracterizam os pressupostos legais de embargabilidade (CPC, art. 535) tal recurso, com desvio de sua específica função jurídico-processual, vem a ser utilizado com a finalidade de instaurar, indevidamente, uma nova discussão sobre a controvérsia jurídica já apreciada pelo Tribunal" (STF, AI 466.622 AgR-ED-ED-ED-ED/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 28/11/2012). O acórdão embargado enfrentou adequadamente a questão central do recurso, qual seja, se o pedido de falência fundamentado exclusivamente na impontualidade injustificada autoriza, por si só, a decretação da quebra, mesmo quando ausentes elementos concretos que demonstrem o estado de insolvência da devedora e quando não buscada previamente a satisfação do crédito por meios menos gravosos. Contrariamente ao alegado pela parte embargante, o acórdão embargado não inseriu requisito inexistente na norma legal, mas sim aplicou adequadamente os princípios norteadores da Lei nº 11.101/2005, especialmente o princípio da preservação da empresa previsto em seu artigo 47, considerando que o pedido de falência não pode ser utilizado como mero sucedâneo de cobrança quando o credor possui outros meios menos gravosos para satisfação de seu crédito. A jurisprudência deste Tribunal de Justiça é pacífica neste sentido, conforme se verifica nos seguintes precedentes: "RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – PEDIDO DE FALÊNCIA – EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO – UTILIZAÇÃO COMO SUCEDANEO DE COBRANÇA DE TÍTULO EXECUTIVO – LEI DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL E FALÊNCIA – PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA - EXISTÊNCIA DE MEIO MENOS GRAVOSO - SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. O pedido falimentar não pode ser utilizado como substituto da execução ou da ação de cobrança, a fim de coagir a demandada ao pagamento do crédito a que faz jus o autor, especialmente em face das graves consequências que acarreta para a empresa devedora, além contrariar a própria Lei de Recuperação Judicial, que preza pelo “princípio da preservação da empresa”. Ademais, não é cabível a utilização de pedido de falência como sucedâneo de cobrança de título executivo, se o único objetivo da parte credora é obter seu crédito e se possui outros meios menos gravosos e adequados para tanto.- (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1003372-65 .2022.8.11.0040, Relator.: MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Data de Julgamento: 17/04/2024, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 24/04/2024)" "APELAÇÃO CÍVEL – PEDIDO DE FALÊNCIA – NÃO VERIFICAÇÃO – DESVIRTUAMENTO DO INSTITUTO FALIMENTAR – AÇÃO MANEJADA COMO SUBSTITUTO DE COBRANÇA VISANDO A COAÇÃO DA DEVEDORA – IMPOSSIBILIDADE – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. “Em respeito ao princípio da preservação da empresa, o pedido de falência possui como pressuposto o estado de insolvência que não pode ser confundido com a impontualidade. Além dos requisitos formais previstos no art. 94, inc . I, da Lei nº 11.101/2005, o magistrado deve verificar se o instituto não se mostra desvirtuado como instrumento de coação, para ter os créditos inadimplidos satisfeitos, uma vez que a ação não pode ser utilizada como mero substitutivo de cobrança.” (N.U 0010251-81 .2006.8.11.0003, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 03/12/2014, Publicado no DJE 10/12/2014) (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1005066-44 .2023.8.11.0037, Relator.: DIRCEU DOS SANTOS, Data de Julgamento: 08/05/2024, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 09/05/2024)" Diga-se que o recurso de embargos de declaração serve ao esclarecimento/aclaramento de questões postas na decisão, não se prestando à reanálise ou rediscussão da matéria já decidida, de forma que o mero inconformismo da parte não tem o condão de gerar a reconsideração da decisão, razão pela qual "não são cabíveis os embargos de declaração cujo objetivo é ver reexaminada a controvérsia" (EDcl no REsp 1435687/MG, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, Segunda Turma, julgado em 23/06/2015, DJe 30/06/2015). Ademais, não há qualquer razão no argumento da embargante de que o acórdão deveria discorrer sobre todos os aspectos da legislação falimentar de forma detalhada. Conforme já bem decidido pelo STJ, o magistrado não está obrigado a rebater todos os argumentos trazidos pelas partes um a um, devendo enfrentar a demanda com observância das questões relevantes e imprescindíveis à resolução da lide (STJ - EDcl no AgInt no REsp: 1877995 DF 2020/0133761-9, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 21/02/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/02/2022). Em outras palavras, os "embargos de declaração não se coadunam com o propósito de rejulgamento da matéria posta nos autos, na medida em que sua finalidade se restringe à complementação da decisão, quando omissa a respeito de ponto fundamental, à eliminação de contradição verificada entre os próprios termos do decisum, ou de obscuridade nas razões desenvolvidas pelo juízo, ou ainda, quando houver no julgado erro material. Excepcionalmente, poderão ter efeitos infringentes quando a modificação do julgado decorrer de alguma das irregularidades elencadas pela legislação de regência" (STJ, EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 1320114/MT, 4ª Turma, Rel. Min. Marco Buzzi, julgamento em 03/05/2016, DJe de 12/05/2016). A decisão embargada, enfrentando a matéria de maneira clara e suficientemente fundamentada, não está "obrigada a emitir juízo de valor expresso a respeito de todas as teses e dispositivos legais invocados pelas partes", valendo rememorar também que "o simples descontentamento como o decisum não tem o condão de tornar cabíveis os embargos de declaração, que servem ao aprimoramento da decisão, mas não à sua modificação, que só muito excepcionalmente é admitida" (STJ, EDcl no AgRg no AREsp 663955/AL, 1ª Turma, Rel. Min. Olindo Menezes, Desembargador convocado do TRF 1ª Região, julgamento em 04/08/2015, DJe 13/08/2015). Destarte, não se vislumbra no acórdão embargado qualquer das hipóteses que autorizam o acolhimento dos embargos de declaração. O julgado enfrentou adequadamente a controvérsia, aplicando corretamente os princípios da Lei de Recuperação Judicial e Falência, em especial o princípio da preservação da empresa, bem como a jurisprudência consolidada deste Tribunal no sentido de vedar a utilização do pedido de falência como mero instrumento coercitivo de cobrança quando ausentes elementos concretos que evidenciem o estado de insolvência da empresa devedora. Desta feita, não há falar, no caso, na presença de qualquer das hipóteses previstas no artigo 1.022, do Código de Processo Civil, e nem de erro material no acórdão, o que mostra a total impertinência do recurso aviado, razão pela qual, os embargos, mesmo quando para efeito de prequestionamento, devem ser rejeitados. Ante todo o exposto, REJEITO os Embargos de Declaração. Por fim, reputo prequestionados todos os dispositivos legais invocados, observado o pacífico entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, "tratando-se de prequestionamento, é desnecessária a citação numérica dos dispositivos legais, bastando que a questão posta tenha sido decidida". (EDcl no RMS 18.205/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 18/04/2006, DJ 08/05/2006, p. 240) (destaquei). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025

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Processo nº 1001212-18.2023.8.11.0045

ID: 316733107

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: EMBARGOS DE DECLARAçãO CíVEL Nº Processo: 1001212-18.2023.8.11.0045

Data de Disponibilização: 04/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ON SOY AGRONEGOCIO LTDA

Acórdão

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001212-18.2023.8.11.0045 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Recuperação judicial e Falência… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1001212-18.2023.8.11.0045 Classe: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO CÍVEL (1689) Assunto: [Recuperação judicial e Falência] Relator: Des(a). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). TATIANE COLOMBO] Parte(s): [NEW TRADE FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITORIOS NAO PADRONIZADO MULTISSETORIAL - CNPJ: 13.842.701/0001-10 (EMBARGANTE), FERNANDO YOSHIO IRITANI - CPF: 298.274.908-42 (ADVOGADO), ON SOY AGRONEGOCIO LTDA - CNPJ: 29.315.559/0001-92 (EMBARGADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, REJEITOU OS EMBARGOS. E M E N T A DIREITO EMPRESARIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. PEDIDO DE FALÊNCIA. IMPONTUALIDADE INJUSTIFICADA. PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA. OMISSÃO INEXISTENTE. EMBARGOS REJEITADOS. I. Caso em exame: 1. Embargos de declaração opostos contra acórdão que negou provimento a apelação e manteve sentença de extinção sem resolução de mérito de pedido de falência ajuizado com base na impontualidade injustificada, por ausência de interesse de agir. II. Questão em discussão: 2. A questão consiste em saber se houve omissão no acórdão embargado por não ter analisado expressamente se a decretação da falência com fundamento no artigo 94, inciso I, da Lei nº 11.101/2005, exige a demonstração prévia da insolvência do devedor ou o ajuizamento de execução. III. Razões de decidir: 3. O acórdão enfrentou de forma clara a questão central do recurso, assentando que a simples impontualidade no pagamento não justifica, por si só, a decretação da falência, especialmente na ausência de indícios concretos de insolvência e quando não esgotados meios menos gravosos de cobrança. 4. A decisão embargada aplicou corretamente o princípio da preservação da empresa, previsto no art. 47 da Lei nº 11.101/2005, e a jurisprudência consolidada do Tribunal, que vedam o uso do pedido de falência como instrumento coercitivo de cobrança. 5. Não há omissão a ser suprida, pois a matéria foi decidida de forma fundamentada, e a ausência de análise pormenorizada de cada argumento ou dispositivo legal invocado não configura omissão, conforme entendimento pacífico do STJ. 6. Embargos de declaração não são via adequada para rediscutir o mérito do julgado, tampouco para inovar a lide, sendo incabíveis no caso. IV. Dispositivo e tese: 7. Embargos de declaração rejeitados. Tese de julgamento: “A decretação da falência com base no artigo 94, inciso I, da Lei nº 11.101/2005, pressupõe demonstração concreta do estado de insolvência e não pode ser utilizada como instrumento coercitivo de cobrança, devendo-se observar o princípio da preservação da empresa.” Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 1.022; Lei nº 11.101/2005, arts. 47 e 94, I. Jurisprudência relevante citada: STF, AI 466.622 AgR-ED-ED-ED-ED/SP, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 28/11/2012; STJ, EDcl no REsp 1435687/MG, Rel. Min. Humberto Martins, DJe 30/06/2015; STJ, EDcl no AgInt no REsp 1877995/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJe 25/02/2022. R E L A T Ó R I O Trata-se de embargos de declaração interpostos por NEW TRADE FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NÃO PADRONIZADOS MULTISSETORIAL, contra acórdão proferido por esta Primeira Câmara de Direito Privado, que negou provimento ao recurso de apelação, mantendo sentença que julgou extinto, sem resolução de mérito, o pedido de falência ajuizado em face de ON SOY AGRONEGÓCIO LTDA. A parte embargante alega existência de omissão no acórdão embargado, sustentando que esta Câmara teria deixado de enfrentar expressamente que a decretação da falência fundada no artigo 94, inciso I, da Lei nº 11.101/2005, não exige prévio ajuizamento de execução ou prova da insolvência da devedora, requerendo o suprimento da alegada omissão para viabilizar insurgência recursal perante o Superior Tribunal de Justiça. É o relatório. V O T O R E L A T O R Conforme relatado, trata-se de Embargos de Declaração em que a parte embargante alega existência de omissão no acórdão embargado quanto ao enfrentamento dos requisitos específicos do artigo 94, inciso I, da Lei nº 11.101/2005. Foi lançada a seguinte ementa no acórdão embargado: APELAÇÃO CÍVEL – PEDIDO DE FALÊNCIA – IMPONTUALIDADE INJUSTIFICADA – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE ESTADO FALIMENTAR – UTILIZAÇÃO DA FALÊNCIA COMO SUCEDÂNEO DE EXECUÇÃO – PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA – EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO – AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESROVIDO. O pedido de falência, embora seja um direito do credor, não pode ser utilizado como mero instrumento de cobrança de dívida, devendo estar vinculado à finalidade própria do instituto falimentar, que é a execução coletiva do patrimônio do devedor insolvente. A simples impontualidade no pagamento de obrigação líquida e protestada, isoladamente considerada, não é suficiente para a decretação da falência, quando não há elementos concretos que evidenciem o estado de insolvência da empresa devedora. A sentença que extinguiu o feito sem resolução de mérito, por ausência de interesse de agir, encontra amparo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que veda a utilização do pedido de falência como meio coercitivo de cobrança. O princípio da preservação da empresa, previsto no artigo 47 da Lei n.º 11.101/2005, visa a manutenção da atividade econômica e dos empregos, devendo ser ponderado na análise de pedidos falimentares quando não demonstrada a real inviabilidade da empresa devedora. Recurso de apelação não provido. Sentença mantida. Pois bem. Como se sabe, os embargos de declaração somente devem ser acolhidos quando presentes, na decisão embargada, quaisquer dos requisitos elencados no artigo 1.022 do Código de Processo Civil, quais sejam: Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para: I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição; II - suprir omissão de ponto ou questão sobre a qual devia pronunciar-se o juiz ou tribunal; III - corrigir erro material. Analisando detidamente a alegação de omissão suscitada pela parte embargante, verifica-se que não assiste razão ao embargante. Em verdade, se afigura nítido o intuito do embargante de ver reexaminada a controvérsia. Assim sendo, "revelam-se incabíveis os embargos de declaração, quando inexistentes os vícios que caracterizam os pressupostos legais de embargabilidade (CPC, art. 535) tal recurso, com desvio de sua específica função jurídico-processual, vem a ser utilizado com a finalidade de instaurar, indevidamente, uma nova discussão sobre a controvérsia jurídica já apreciada pelo Tribunal" (STF, AI 466.622 AgR-ED-ED-ED-ED/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Celso de Mello, DJe 28/11/2012). O acórdão embargado enfrentou adequadamente a questão central do recurso, qual seja, se o pedido de falência fundamentado exclusivamente na impontualidade injustificada autoriza, por si só, a decretação da quebra, mesmo quando ausentes elementos concretos que demonstrem o estado de insolvência da devedora e quando não buscada previamente a satisfação do crédito por meios menos gravosos. Contrariamente ao alegado pela parte embargante, o acórdão embargado não inseriu requisito inexistente na norma legal, mas sim aplicou adequadamente os princípios norteadores da Lei nº 11.101/2005, especialmente o princípio da preservação da empresa previsto em seu artigo 47, considerando que o pedido de falência não pode ser utilizado como mero sucedâneo de cobrança quando o credor possui outros meios menos gravosos para satisfação de seu crédito. A jurisprudência deste Tribunal de Justiça é pacífica neste sentido, conforme se verifica nos seguintes precedentes: "RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – PEDIDO DE FALÊNCIA – EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO – UTILIZAÇÃO COMO SUCEDANEO DE COBRANÇA DE TÍTULO EXECUTIVO – LEI DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL E FALÊNCIA – PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA - EXISTÊNCIA DE MEIO MENOS GRAVOSO - SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. O pedido falimentar não pode ser utilizado como substituto da execução ou da ação de cobrança, a fim de coagir a demandada ao pagamento do crédito a que faz jus o autor, especialmente em face das graves consequências que acarreta para a empresa devedora, além contrariar a própria Lei de Recuperação Judicial, que preza pelo “princípio da preservação da empresa”. Ademais, não é cabível a utilização de pedido de falência como sucedâneo de cobrança de título executivo, se o único objetivo da parte credora é obter seu crédito e se possui outros meios menos gravosos e adequados para tanto.- (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1003372-65 .2022.8.11.0040, Relator.: MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Data de Julgamento: 17/04/2024, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 24/04/2024)" "APELAÇÃO CÍVEL – PEDIDO DE FALÊNCIA – NÃO VERIFICAÇÃO – DESVIRTUAMENTO DO INSTITUTO FALIMENTAR – AÇÃO MANEJADA COMO SUBSTITUTO DE COBRANÇA VISANDO A COAÇÃO DA DEVEDORA – IMPOSSIBILIDADE – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. “Em respeito ao princípio da preservação da empresa, o pedido de falência possui como pressuposto o estado de insolvência que não pode ser confundido com a impontualidade. Além dos requisitos formais previstos no art. 94, inc . I, da Lei nº 11.101/2005, o magistrado deve verificar se o instituto não se mostra desvirtuado como instrumento de coação, para ter os créditos inadimplidos satisfeitos, uma vez que a ação não pode ser utilizada como mero substitutivo de cobrança.” (N.U 0010251-81 .2006.8.11.0003, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, Julgado em 03/12/2014, Publicado no DJE 10/12/2014) (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1005066-44 .2023.8.11.0037, Relator.: DIRCEU DOS SANTOS, Data de Julgamento: 08/05/2024, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 09/05/2024)" Diga-se que o recurso de embargos de declaração serve ao esclarecimento/aclaramento de questões postas na decisão, não se prestando à reanálise ou rediscussão da matéria já decidida, de forma que o mero inconformismo da parte não tem o condão de gerar a reconsideração da decisão, razão pela qual "não são cabíveis os embargos de declaração cujo objetivo é ver reexaminada a controvérsia" (EDcl no REsp 1435687/MG, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, Segunda Turma, julgado em 23/06/2015, DJe 30/06/2015). Ademais, não há qualquer razão no argumento da embargante de que o acórdão deveria discorrer sobre todos os aspectos da legislação falimentar de forma detalhada. Conforme já bem decidido pelo STJ, o magistrado não está obrigado a rebater todos os argumentos trazidos pelas partes um a um, devendo enfrentar a demanda com observância das questões relevantes e imprescindíveis à resolução da lide (STJ - EDcl no AgInt no REsp: 1877995 DF 2020/0133761-9, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 21/02/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 25/02/2022). Em outras palavras, os "embargos de declaração não se coadunam com o propósito de rejulgamento da matéria posta nos autos, na medida em que sua finalidade se restringe à complementação da decisão, quando omissa a respeito de ponto fundamental, à eliminação de contradição verificada entre os próprios termos do decisum, ou de obscuridade nas razões desenvolvidas pelo juízo, ou ainda, quando houver no julgado erro material. Excepcionalmente, poderão ter efeitos infringentes quando a modificação do julgado decorrer de alguma das irregularidades elencadas pela legislação de regência" (STJ, EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 1320114/MT, 4ª Turma, Rel. Min. Marco Buzzi, julgamento em 03/05/2016, DJe de 12/05/2016). A decisão embargada, enfrentando a matéria de maneira clara e suficientemente fundamentada, não está "obrigada a emitir juízo de valor expresso a respeito de todas as teses e dispositivos legais invocados pelas partes", valendo rememorar também que "o simples descontentamento como o decisum não tem o condão de tornar cabíveis os embargos de declaração, que servem ao aprimoramento da decisão, mas não à sua modificação, que só muito excepcionalmente é admitida" (STJ, EDcl no AgRg no AREsp 663955/AL, 1ª Turma, Rel. Min. Olindo Menezes, Desembargador convocado do TRF 1ª Região, julgamento em 04/08/2015, DJe 13/08/2015). Destarte, não se vislumbra no acórdão embargado qualquer das hipóteses que autorizam o acolhimento dos embargos de declaração. O julgado enfrentou adequadamente a controvérsia, aplicando corretamente os princípios da Lei de Recuperação Judicial e Falência, em especial o princípio da preservação da empresa, bem como a jurisprudência consolidada deste Tribunal no sentido de vedar a utilização do pedido de falência como mero instrumento coercitivo de cobrança quando ausentes elementos concretos que evidenciem o estado de insolvência da empresa devedora. Desta feita, não há falar, no caso, na presença de qualquer das hipóteses previstas no artigo 1.022, do Código de Processo Civil, e nem de erro material no acórdão, o que mostra a total impertinência do recurso aviado, razão pela qual, os embargos, mesmo quando para efeito de prequestionamento, devem ser rejeitados. Ante todo o exposto, REJEITO os Embargos de Declaração. Por fim, reputo prequestionados todos os dispositivos legais invocados, observado o pacífico entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, "tratando-se de prequestionamento, é desnecessária a citação numérica dos dispositivos legais, bastando que a questão posta tenha sido decidida". (EDcl no RMS 18.205/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 18/04/2006, DJ 08/05/2006, p. 240) (destaquei). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025

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Sperafico Agroindustrial Ltda. x Ezequias Vicente Da Silva - Oficial/Registrador Do ( 1.Oficio) De Registro De Imoveis,Titulos E Documentos. e outros

ID: 292949052

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ÚNICA DE BRASNORTE Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1001212-47.2023.8.11.0100

Data de Disponibilização: 09/06/2025

Polo Ativo:

SPERAFICO AGROINDUSTRIAL LTDA.

Polo Passivo:

EZEQUIAS VICENTE DA SILVA - OFICIAL/REGISTRADOR DO ( 1.OFICIO) DE REGISTRO DE IMOVEIS,TITULOS E DOCUMENTOS. GILBERTO MARCELO BAZZAN

Decisão

Advogados:

BRUNO DEVESA CINTRA

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ELLEN ADRIANA RODRIGUES CONTI

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SILVIO CESAR DOS SANTOS

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TATISA MAIARA DE AZEVEDO REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO TATISA MAIARA DE AZEVEDO

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ARIANE VETTORELLO SPERAFICO

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE BRASNORTE DECISÃO Processo: 1001212-47.2023.8.11.0100 AUTOR(A): SPERAFICO AGROINDUSTRIAL LTDA. REQUERIDO: GILBERTO MARCELO BAZZAN e outros (3) I –… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE BRASNORTE DECISÃO Processo: 1001212-47.2023.8.11.0100 AUTOR(A): SPERAFICO AGROINDUSTRIAL LTDA. REQUERIDO: GILBERTO MARCELO BAZZAN e outros (3) I – RELATÓRIO Trata-se de ação ordinária de anulação de registro imobiliário c/c pedido de tutela antecipada antecedente para bloqueio de matrícula ajuizada por SPERAFICO AGROINDUSTRIAL LTDA. em face de GILBERTO MARCELO BAZZAN, ANTÔNIO DA SILVA, MARIA HELENA DA SILVA e EZEQUIAS VICENTE DA SILVA – OFICIAL/REGISTRADOR DO 1º OFÍCIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS, TÍTULOS E DOCUMENTOS DE BRASNORTE/MT, devidamente qualificados. Em sua peça inaugural, narra a parte autora que é legítima proprietária da matrícula n.º 30.019, referente à Fazenda São Rafael, com área de 500 hectares, situada no município de Brasnorte/MT, adquirida por escritura pública de compra e venda em 23 de maio de 1996. Alega que, em razão de sua recuperação judicial, procedeu à verificação da viabilidade de venda do referido imóvel, momento em que descobriu a existência de outra matrícula – n.º 6.019, em nome do requerido Gilberto Marcelo Bazzan – sobre a mesma área, com o imóvel sendo indevidamente ofertado à venda. Sustenta que houve remonte fraudulento de matrícula, tendo em vista que a matrícula n.º 6.019 teve origem em registros do município de Juara/MT, sendo irregularmente transportada para Brasnorte/MT, exatamente sobre as coordenadas da matrícula da autora. Aduz que a matrícula n.º 6.019 foi aberta com base em escritura lavrada de forma criminosa no cartório de Santo Afonso/MT, o qual teve seu tabelião afastado por ordem judicial, além de conter registros de proprietários com CPF suspenso e idade superior a 100 anos, o que indica possíveis falsidades. Assevera que o oficial do cartório de Brasnorte, ao proceder à abertura da matrícula n.º 6.019, agiu com negligência, deixando de analisar a cadeia dominial com a devida cautela, o que acarreta sua legitimidade passiva. Defende que as cadeias dominiais das matrículas n.º 6.019 e n.º 30.019 são conflitantes, sendo esta última a legítima, tendo em vista a origem clara e continuidade registral. Afirma que as coordenadas geográficas das duas matrículas coincidem integralmente, o que evidencia sobreposição e potencial fraude registral, devendo ser anulada a matrícula indevidamente aberta. Requer, então, o deferimento de tutela antecipada para o imediato bloqueio da matrícula n.º 6.019, bem como, ao final, a declaração de nulidade da referida matrícula. Distribuídos os autos, determinou-se a correção do valor da causa e complementação das custas iniciais (id. 131464815). Cumpridas as diligências, recebeu-se a inicial e deferiu-se o pedido de bloqueio das matrículas 6.019, 859 e 868 (id. 134593030). A tentativa de conciliação restou infrutífera (id. 142508975). GILBERTO MARCELO BAZZAN apresentou contestação (id. 143904479), alegando, inicialmente, que adquiriu a área discutida por meio de posse mansa e pacífica desde 1999, tendo formalizado a aquisição por escritura pública em 2006. Diz que o imóvel encontra-se registrado em seu nome com base em título público dotado de fé pública, reconhecido inclusive em ação de improbidade administrativa transitada em julgado, na qual foi penalizado pelo acréscimo do imóvel ao seu patrimônio. Alega que a cadeia dominial da autora é frágil e, em parte, advém de terras devolutas, carecendo de georreferenciamento e de reconhecimento pelos confrontantes, o que comprometeria a validade e eficácia de sua matrícula. Sustenta que seu título atende aos princípios do registro de imóveis, especialmente o da especialidade, da unitariedade, da fé pública e da causalidade, ao passo que o título da autora seria incompatível com a localização e confrontações da área. Aduz, ainda, que há clara sobreposição de matrículas, devendo prevalecer o título mais idôneo, no caso, o seu. Assevera a possibilidade de arguição de usucapião como matéria de defesa, com base na Súmula 237 do STF, e reforça que exerce posse contínua, pacífica e com animus domini há mais de 25 anos, conforme documentos, notas fiscais, inscrição estadual e provas testemunhais. Defende que a prescrição aquisitiva se operou desde 2014, tendo sua posse sido molestada apenas em 2024, o que consolidaria seu direito à propriedade pelo usucapião extraordinário. Afirma que a autora nunca exerceu qualquer ato de posse sobre a área e que a pretensão de anulação da matrícula do réu viola a segurança jurídica e os efeitos de atos jurídicos perfeitos. Pede, assim, a improcedência dos pedidos formulados na inicial, o reconhecimento da validade e legitimidade da matrícula registrada em nome do requerido e, alternativamente, o acolhimento da exceção de usucapião, com o reconhecimento da aquisição da propriedade pela prescrição aquisitiva. O CARTÓRIO – 1º OFÍCIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE TÍTULOS E DOCUMENTOS DA COMARCA DE BRASNORTE – MT apresentou contestação (id. 147731946), alegando ausência de legitimidade para figurar no polo passivo da demanda, por não possuir personalidade jurídica, sendo a responsabilidade pelos atos cartorários atribuída exclusivamente ao titular da serventia à época dos fatos. Diz que os atos cartorários questionados foram devidamente cumpridos conforme determinação judicial e que, caso haja irregularidades, estas devem ser imputadas ao tabelião responsável à época, não ao atual gestor da serventia. Alega que a petição inicial é inepta, pois carece de causa de pedir em relação à serventia, não havendo qualquer pedido direcionado especificamente ao cartório, tampouco fundamentação que justifique sua permanência no polo passivo da ação. Sustenta que os pedidos formulados na inicial têm como causa de pedir suposta falsificação documental por terceiros, sendo o cancelamento registral mera consequência da procedência da demanda contra os demais requeridos, não havendo qualquer imputação de responsabilidade civil ao cartório. Aduz que a jurisprudência pacífica reconhece a ausência de legitimidade dos cartórios para responder judicialmente, sendo atribuição pessoal do tabelião responsável pelos atos notariais e registrais. Assevera que o titular da serventia à época dos fatos era Ezequias Vicente da Silva, conforme documentos anexados, não podendo o atual oficial responder por eventuais danos. Defende que os serviços notariais são prestados em caráter privado por delegação do poder público, sendo os titulares civilmente responsáveis por danos causados por culpa ou dolo, nos termos do art. 22 da Lei 8.935/94, com redação dada pela Lei 13.286/2016. Afirma que não há interesse processual nem interesse jurídico que justifique a permanência da serventia na lide, devendo ser reconhecida a ausência de legitimidade passiva. Pede, assim, o reconhecimento da ilegitimidade passiva do Cartório – 1º Ofício de Registro de Imóveis de Brasnorte-MT. Intimada, a parte autora apresentou impugnação à contestação (id. 148909772). Deferiu-se o pedido de citação por edital de ANTONIO DA SILVA e MARIA HELENA DA SILVA (id. 155854353). A Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso, na qualidade de Curadora Especial, apresentou contestação por negativa geral (id. 171927758). Intimadas as partes para especificarem as provas que pretendem produzir, o autor pediu o depoimento pessoal de Gilberto Marcelo Bazzan e a produção de provas testemunhal, pericial e documental (id. 174000179); o requerido Gilberto Marcelo Bazzan pediu o depoimento pessoal do autor e a produção de provas testemunhal, documental e pericial (id. 174437917); os requeridos Antonio da Silva e Maria Helena da Silva disseram não ter interesse na produção de outras provas (id. 178848718). É o relatório. Passo a fundamentar e decidir. II – DO SANEAMENTO II.1 – Da ilegitimidade passiva do cartório Em sede de contestação, o CARTÓRIO – 1º OFÍCIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE TÍTULOS E DOCUMENTOS DA COMARCA DE BRASNORTE – MT alega não ter legitimidade para figurar no polo passivo da demanda. Acerca da legitimidade, ensina a doutrina especializada que: Parte, em sentido processual, é um dos sujeitos da relação processual contrapostos diante do órgão judicial, isto é, aquele que pede a tutela jurisdicional (autor) e aquele em face de quem se pretende fazer atuar dita tutela (réu). Mas, para que o provimento de mérito seja alcançado, para que a lide seja efetivamente solucionada, não basta existir um sujeito ativo e um sujeito passivo. É preciso que os sujeitos sejam, de acordo com a lei, partes legítimas, pois se tal não ocorrer o processo se extinguirá sem resolução do mérito (art. 485, VI). Entende Arruda Alvim que “estará legitimado o autor quando for o possível titular do direito pretendido, ao passo que a legitimidade do réu decorre do fato de ser ele a pessoa indicada, em sendo procedente a ação, a suportar os efeitos oriundos da sentença” (THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil, volume I. 64. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2023 p. 196). Para fins de averiguação da legitimidade das partes, não é necessário, pois, a existência de convencimento aprofundado acerca do titular do direito e daquele contra qual tal direito pode ser exercido, bastando que haja indícios de que o réu seja aquele que deva suportar os efeitos da sentença. Por certo que o Serviço Registral não tem é legítimo para figurar no polo passivo da demanda, porque não possui sequer personalidade jurídica, já que é um órgão do Poder Judiciário. Nesse sentido: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO JURÍDICO, CUMULADA COM CANCELAMENTO DE MATRÍCULA - SOBREPOSIÇÃO DE ÁREA - ALEGADO EQUÍVOCO DO CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS - ILEGITIMIDADE DO CARTORÁRIO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO NÃO PROVIDO. O Delegado Registrador do Cartório de Registro de Imóveis não detém legitimidade para figurar no pólo passivo da demanda contenciosa, ajuizada com objetivo de anular registro imobiliário, por lhe faltar interesse e condições para se opor ao resultado do litígio (TJ-SC - AC: 45565 SC 2004.004556-5, Relator.: Wilson Augusto do Nascimento, Data de Julgamento: 08/08/2005, Terceira Câmara de Direito Civil, Data de Publicação: Apelação cível n . 2004.004556-5, de São Francisco do Sul.). AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE CANCELAMENTO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO – DECISÃO QUE RECONHECEU A ILEGITIMIDADE PASSIVA DO SERVIÇO REGISTRAL E DO TABELIÃO RESPONSÁVEL PELO ATO REGISTRAL – AÇÃO QUE VISA À OBTENÇÃO DE PROVIMENTO JURISDICIONAL QUE DECLARE A NULIDADE DE TITULAÇÃO COINCIDENTEMENTE EMITIDA SOBRE O MESMO IMÓVEL, E QUE, NA SEQUÊNCIA, MAS COMO MERO CUMPRIMENTO OPERACIONAL DO POSSÍVEL DEFERIMENTO DESSE PLEITO, QUE ORDENE À SERVENTIA QUE FAÇA OS CANCELAMENTOS NECESSÁRIOS – INCIDÊNCIA DO ART. 216 DA LRP – ILEGITIMIDADE MANTIDA – NECESSÁRIA CONVOCAÇÃO À LIDE DO ÓRGÃO EMISSOR DA TITULAÇÃO REPUTADA IRREGULAR, BEM COMO DAQUELES QUE FORAM POR ELA BENEFICIADOS, INCLUSIVE OS POSSÍVEIS HERDEIROS – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Se a demanda visa à obtenção de provimento jurisdicional que declare a nulidade de títulos emitidos coincidentemente sobre a mesma área, cuidando-se, portanto, de jurisdição contenciosa (art. 216 da LRP), o Serviço Registral não tem legitimidade para figurar no polo passivo, e nem a pessoa física do registrador, porque, no primeiro caso, não há personalidade jurídica, e, no segundo, só se justifica a convocação do notário/registrador em caso de franca e intencional prática de ato irregular, devendo ser convocado o Ente estatal emissor da titulação irregular, bem como aqueles que dela se beneficiaram (TJ-MT 10251456320208110000 MT, Relator.: JOAO FERREIRA FILHO, Data de Julgamento: 16/11/2021, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 26/11/2021). Assim, ACOLHO a preliminar suscitada e JULGO EXTINTO O FEITO, sem resolução do mérito, com relação a CARTÓRIO – 1º OFÍCIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE TÍTULOS E DOCUMENTOS DA COMARCA DE BRASNORTE – MT, nos termos do art. 485, VI, do CPC, ante a manifesta ilegitimidade passiva “ad causam”. CONDENO o autor ao pagamento de honorários advocatícios em favor do(a) advogado(a) do Cartório, os quais, com fulcro no art. 85, §§ 2º e 8º, do CPC, fixo em R$ 2.000,00 (dois mil reais), tendo em vista que é inestimável o proveito econômico obtido com o acolhimento da preliminar de ilegitimidade. II.2 – Da exceção de usucapião Sustenta o requerido que é cabível a formulação de exceção de usucapião em ação anulatória. Melhor sorte não lhe assiste. A Súmula 237/STF dispõe que a usucapião pode ser arguida como matéria de defesa, contudo, quando a discussão se refere ao direito das coisas. Isso porque a posse é um direito tutelado no ordenamento jurídico pátrio, de modo que é evidente que em ação petitória ou ação possessória a usucapião pode ser alegada em contestação, porque tanto a posse do autor quanto do réu podem ser objeto de análise. No presente caso, não há discussão sobre domínio, nem sobre posse, mas sobre a suposta nulidade da matrícula nº 6.019, do CRI de Brasnorte, em razão de ter sido originada de deslocamento de área, gerando sobreposição à matrícula nº 30.019, do CRI de Diamantino. A discussão aqui travada não é, portanto, de direito das coisas, mas de direito registral e o deslinde da controvérsia é, inclusive, de interesse público, porque obrigatória a observância dos princípios da continuidade e unicidade de registro. Desse modo, DEIXO DE CONHECER da exceção de usucapião. Não havendo questões processuais pendentes, DECLARO saneado o feito. III – INSTRUÇÃO III.1 – Dos pontos controvertidos Fixo como pontos controvertidos: a) a existência de sobreposição entre as matrículas 30.019 do CRI de Brasnorte e 6.019 do CRI de Diamantino; b) a violação, ou não, aos princípios do direito registral com relação à matrícula nº 6.019; c) a (in)validade da escritura pública lavrada no Tabelionato de Santo Afonso/MT. III.2 – Do ônus da prova Quanto ao ônus da prova, fica mantido na forma como prevista no art. 373, do CPC, ficando a parte autora incumbida de comprovar os fatos constitutivos de seu direito e a requerida, dos impeditivos, modificativos e extintivos do direito da autora. III.3 – Das provas III.3.1 – Da prova pericial DEFIRO o pedido de produção de prova pericial e, com base nos artigos 465 e 466, ambos do CPC, e item 2.18.10, do Provimento nº 02/2009/CGJ, nomeio perito a ser indicado pela empresa NOCTUA PERITAS, endereço profissional Rua comandante Costa, n° 1649-A, Bairro Centro Sul, Cuiabá/MT, 78.020-400, (65) 99996-1578, e-mail: contato@noctuaperitas.com.br, que servirá com zelo e cuidado, independentemente de compromisso. INTIME-SE o autor para que, no prazo de 15 (quinze) dias, apresente os quesitos que pretende serem respondidos pelo Expert. Em seguida, INTIME-SE a empresa NOCTUA PERITAS para que, no prazo de 15 (quinze) dias, indique o perito adequado ao caso, bem como forneça proposta de honorários. INTIMEM-SE, então, as partes para que, no prazo comum de 5 (cinco) dias, manifestem-se acerca da proposta. Ficará a cargo de ambas as partes a responsabilidade pelo adiantamento da remuneração do perito, nos termos do art. 95 do CPC, tendo em vista que ambas requereram o meio de prova. III.3.2 – Da prova documental DEFIRO o pedido de juntada de documentos novos, o que será avaliado de acordo com o disposto no art. 435, caput e parágrafo único, do CPC, posto que o momento de produção da prova documento é, para o autor, a petição inicial e, para o réu, a contestação. III.3.3 – Da prova testemunhal DEFIRO o pedido de produção de prova testemunhal e de depoimento pessoal das partes, pelo que DESIGNO audiência de instrução para o dia 28 de agosto de 2025, às 16h00, ser realizada preferencialmente na modalidade presencial, conforme determina o art. 3° da Resolução CNJ n° 354/2020 (alterada pela Resolução CNJ n° 481/2022), ficando consignado, desde já, que caso as partes manifestem interesse pela realização por videoconferência, pelo sistema TEAMS, fica o pedido deferido desde logo, podendo a sala ser acessada pelo link: (CLIQUE AQUI PARA INGRESSAR NA SALA VIRTUAL). Intimem-se as partes para apresentarem rol de testemunhas no prazo de 15 (quinze) dias, se já não tenham feito (CPC, art. 357, § 4º). Registro, ainda que cabe ao(a) advogado(a) da parte informar ou intimar as testemunhas por ele(a) arrolada do dia, da hora e do local da audiência designada, nos termos do artigo 455 e seguintes do CPC. IV - PARTICIPAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO INTIME-SE o Ministério Público para dizer se tem interesse no feito (CPC, art. 178, I) e para que, em caso afirmativo, indique se tem provas a produzir. CUMPRA-SE, expedindo o necessário, servindo a presente como mandado, ofício ou carta. Brasnorte/MT, documento assinado e datado eletronicamente. ROMEU DA CUNHA GOMES Juiz Substituto

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Daniele Quadros Radmann x Banco Bmg S.A. e outros

ID: 337404111

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ÚNICA DE ALTO GARÇAS Classe: Procedimento de Repactuação de Dívidas (Superendividamento) Nº Processo: 1001212-48.2023.8.11.0035

Data de Disponibilização: 29/07/2025

Polo Ativo:

DANIELE QUADROS RADMANN

Polo Passivo:

BANCO BMG S.A. BANCO DO BRASIL S.A. CONFEDERAÇÃO INTERESTADUAL DAS COOPERATIVAS LIGADAS AO SICREDI NU PAGAMENTOS S.A.

Intimação

Advogados:

DIEGO ROBERTO DA CRUZ

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LEONARDO FIALHO PINTO

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RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

EDUARDO ALVES MARÇAL

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GUSTAVO HENRIQUE DOS SANTOS VISEU

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MILENA PIRAGINE

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE ALTO GARÇAS SENTENÇA Processo: 1001212-48.2023.8.11.0035. REQUERENTE: DANIELE QUADROS RADMANN REQUERIDO: BANCO DO BRASIL S.A., NU PAGAMENTOS S.A.,… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE ALTO GARÇAS SENTENÇA Processo: 1001212-48.2023.8.11.0035. REQUERENTE: DANIELE QUADROS RADMANN REQUERIDO: BANCO DO BRASIL S.A., NU PAGAMENTOS S.A., BANCO BMG S.A., CONFEDERAÇÃO INTERESTADUAL DAS COOPERATIVAS LIGADAS AO SICREDI Vistos. Trata-se de AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS PREVISTA NO ARTIGO 104-A DO CDC (INTRODUZIDO PELA LEI 14.181/21 – SUPERENDIVIDAMENTO), ajuizada por DANIELE QUADROS RADMANN, em desfavor de BANCO DO BRASIL S.A., NU PAGAMENTOS S.A., BANCO BMG S.A. e CONFEDERAÇÃO INTERESTADUAL DAS COOPERATIVAS LIGADAS AO SICREDI. A parte autora alega, em resumo, que é servidora pública estadual e se encontra em situação de superendividamento devido aos múltiplos empréstimos consignados e pessoais, dívidas de cartão de crédito e despesas básicas de subsistência. Afirma que seus rendimentos líquidos, após descontos obrigatórios, totalizam R$ 5.153,17 (cinco mil e cento e cinquenta e três reais e dezessete centavos). Destaca que, aproximadamente 64% (sessenta e quatro por cento) de sua renda líquida é comprometida com parcelas de empréstimos consignados e pessoais. Informa que possui dívidas, nos seguintes moldes: empréstimos consignados com Banco BMG S.A. e Sicredi S.A., somando o valor mensal de R$ 2.387,89 (dois mil e trezentos e oitenta e sete reais e oitenta e nove centavos); um empréstimo pessoal com Banco do Brasil S.A. no valor de R$ 917,34 (novecentos e dezessete reais) mensais; duas antecipações de 13º salário com Banco do Brasil S.A., totalizando o valor de R$ 1.822,46 (um mil e oitocentos e vinte e dois reais e quarenta e seis centavos). Ainda, afirma que possui dívidas expressivas de cartão de crédito com Banco BMG S.A., no valor de R$ 10.555,93 (dez mil e quinhentos e cinquenta e cinco reais e noventa e três centavos)) e Nubank S.A, no importe de R$ 5.365,28 (cinco mil e trezentos e sessenta e cinco reais e vinte e oito centavos), somando o valor de R$ 15.921,21 (quinze mil e novecentos e vinte e um reais e vinte e um centavos). Sustenta que, após a dedução dos empréstimos consignados e pessoais, restam-lhe apenas R$ 1.847,94 (um mil e oitocentos e quarenta e sete reais e noventa e quatro centavos) de sua remuneração mensal. Afirma que tem outras despesas essenciais, como faculdade, telefone, plano de saúde e financiamento de imóvel, que totalizam o importe R$ 2.027,86 (dois mil e vinte e sete reais e oitenta e cinco centavos), superando o valor que lhe resta e prejudicando sua capacidade de viver dignamente. Requer, em sede de antecipação de tutela, com a conseguinte confirmação ao final: a) a limitação de todos os descontos e cobranças referentes a empréstimos consignados e pessoais a 30% (trinta por cento) de seus rendimentos líquidos; b) a suspensão da incidência de encargos sobre as demais dívidas; c) a abstenção de inclusão de seu nome em cadastros de restrição ao crédito. Requer, ainda, que os réus apresentem todos os contratos das operações realizadas e a realização de uma audiência de conciliação para apresentação de um plano de pagamento. Por outro lado, em caso de insucesso, requer a instauração do procedimento de superendividamento para revisão e integração dos contratos, com a elaboração de um plano judicial compulsório. No ID 137195479, a inicial foi recebida, os benefícios da gratuidade foram concedidos à autora e, foi postergada a análise da tutela antecipada para pós audiência de conciliação. A requerente sobrepôs nos autos o plano de pagamento (ID 141610030/141610031). O Banco do Brasil S/A contestou a ação no ID 142712667, oportunidade em que arguiu preliminares de ilegitimidade passiva, falta de interesse processual, impugnação ao valor da causa e impugnação à gratuidade judiciária. No mérito, defende a ausência de responsabilidade e a inexistência de defeito na prestação do serviço, alegando que a autora não trouxe provas de suas alegações. Afirma que os empréstimos consignados são limitados pela margem consignável, enquanto os empréstimos que não são consignados são livremente pactuados, e que a cobrança segue o previsto contratualmente e legalmente. Invoca a culpa exclusiva da autora ou de terceiro e o exercício regular de direito. Opõe-se à inversão do ônus da prova. Argumenta que, se a limitação de descontos for concedida, a autora deve manter saldo suficiente para pagamentos e que a Lei do Superendividamento não se aplica a verbas como 13º salário e restituição de IR. Enfatiza que a dívida remanescente pode ser cobrada por outros meios e que a concessão de crédito responsável é uma obrigação do cliente. Questiona a aplicação do CDC a operações financeiras. Por fim, requer o acolhimento das preliminares e a extinção do processo sem resolução do mérito ou, caso não seja o entendimento, improcedência dos pedidos iniciais. O Banco BMG S/A contestou no ID 144072392. Arguiu preliminar de impugnação à gratuidade judiciária e inépcia da inicial, por não atendimento dos requisitos do CDC, quanto ao rito das ações de superendividamento, como a não apresentação de plano de pagamento, indicação de mínimo existencial e ausência de quantificação do valor incontroverso. No mérito, esclarece as características do "BMG Card" como cartão de crédito consignado, com desconto de 5% da margem consignável. Afirma que a autora utilizou o cartão conscientemente e que a Lei 14.181/2021 não pode retroagir para modificar contratos anteriores. Alega que a autora agiu de má-fé ao se endividar conscientemente e agora tentar se eximir das obrigações, e que o banco está agindo no exercício regular de seu direito. Opõe-se à proibição de atos de cobrança e inclusão do nome da autora em cadastros restritivos. Por fim, requer o acolhimento das preliminares e a extinção do processo sem resolução do mérito ou, caso não seja o entendimento, improcedência dos pedidos iniciais. Nu Pagamentos S.A. contestou a ação (ID 141780464) e não arguiu preliminares ou prejudicais de mérito. No mérito, defende que a autora possui dívida em aberto e parcelas em atraso com a instituição, com juros e encargos devidamente previstos e informados nos contratos e faturas. Opõe-se à inversão do ônus da prova, alegando ausência de verossimilhança nas alegações da autora e de comprovação de sua hipossuficiência. Argumenta que a autora se endividou deliberadamente e possui rendimentos suficientes para honrar suas dívidas, não se enquadrando na categoria de superendividada, e que os descontos não comprometem seu mínimo existencial. Invoca a má-fé da autora e a existência de canais administrativos para negociação que não foram utilizados. Afirma que o banco não pode ser compelido a negociar em juízo, pois isso seria uma afronta à autonomia da vontade e ao direito do credor de não receber prestação diversa da devida. Por fim, requer a improcedência dos pedidos iniciais. CONFEDERAÇÃO INTERESTADUAL DAS COOPERATIVAS LIGADAS AO SICREDI contestou a ação (ID 144049590). Arguiu preliminar de inépcia da inicial pela ausência de apresentação de um plano de pagamento. No mérito, alega que a autora não comprovou despesas adicionais alegadas, como financiamento imobiliário e outras básicas. Sustenta a falta de provas mínimas da impossibilidade financeira da autora, como declarações de imposto de renda ou outras fontes de renda. Contesta a alegação de superendividamento, citando o mínimo existencial de R$ 600,00 (Decreto nº 11.567/2023) e que as operações de crédito consignado são excluídas do cálculo do mínimo existencial pelo Decreto n. 11.150/2022. Alega que o endividamento da autora é voluntário e que ela agiu de má-fé ao contrair empréstimos mesmo após a vigência da Lei 14.871/2021, sem propósito de pagamento. Invoca o princípio do pacta sunt servanda. Opõe-se à tutela de urgência e à inversão do ônus da prova, afirmando que a autora possui rendimentos suficientes e não preenche os requisitos da Lei 14.181/2021. Por fim, requer o acolhimento das preliminares e a extinção do processo sem resolução do mérito ou, caso não seja o entendimento, improcedência dos pedidos iniciais. Impugnação às contestações ao ID 157456305. Foram realizadas duas audiências de conciliação (ID 141990398/176829415) e todas as partes compareceram, entretanto, não foi possível a autocomposição. A parte foi intimada para se manifestar sobre o interesse de remeter o processo ao CEJUSC especializado de superendividamento (ID 170659783/171976806), todavia, nada manifestou. Banco do Brasil, Nu pagamentos, Cooperativa manifestaram pelo julgamento antecipado (ID 178042286, 178251613, 178527887). E, Banco BMG manifestou pela produção de prova oral (ID 178695560). A parte requerente pugnou pela conversão do rito para que a ação prossiga com: a) a revisão de práticas e cláusulas contratuais, com o conseguinte afastamento de eventuais abusividades ou redução ou desconto de encargos; b) o estabelecimento de plano judicial compulsório, com previsão de liquidação total da dívida após a quitação do plano consensual, em no máximo 05 (cinco) anos (ID 178695560). É o relatório do necessário, passo a decidir. Antes de adentrar à análise do feito, propriamente dito, necessários breves esclarecimentos acerca do procedimento das ações de superendividamento. Pois bem. Inicialmente, nos termos do art. 104-A do Código de Defesa do Consumidor e ss, necessária que o feito passe pela fase de estímulo à autocomposição. A dita primeira fase se inicia logo após a propositura da ação, de modo que todas as partes devem empreender esforços na construção de um plano de pagamento das dívidas da requerente perante as requeridas. Para tanto, a lei exige que tanto o mínimo existencial seja respeitado à requerente, quanto sejam preservados os pactos, visando, realmente, o adimplemento de todas as dívidas. Caso não aprovado o plano de pagamento, inicia-se, a pedido da parte autora, a segunda fase do procedimento, agora, processual, por impulso do magistrado. Dito isso, começo a análise do feito. I. 1ª FASE, DE AUTOCOMPOSIÇÃO Dos autos verifico que foram realizadas duas audiências de conciliação, em que o plano de pagamento não foi consolidado pelas partes, sendo inexitosa. Todas as partes compareceram nas duas audiências designadas, razão pela qual não se aplica o §2º do artigo 104-A, do CDC ao caso. II. 2ª FASE, INSTAURAÇÃO DO PROCESSO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS DA PESSOA NATURAL II.I. PRELIMINARES DE MÉRITO Quanto à preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelo Banco do Brasil, a preliminar se confunde com o próprio mérito, uma vez que se funda na ausência de responsabilidade. Portanto, DEIXO de apreciá-la. Quanto à preliminar de ausência de interesse processual arguida pelo Banco do Brasil, consiste na demonstração, pelo menos em tese, de que a providência jurisdicional é realmente útil e necessária, ainda que o direito vindicado possa não ser reconhecido à parte, ao final. Não há dúvida de que, na hipótese, o acionamento do Judiciário é útil e necessário para que a parte autora veja a satisfação de sua pretensão, no sentido de receber os valores que lhe são devidos. Desta feita, não há falar em carência de ação por falta de interesse de agir. Destarte, REJEITO a preliminar. Em relação às preliminares de inépcia da inicial arguidas pelo Banco BMG e Cooperativa, ao revés do alegado, a ação foi proposta com todos os documentos necessários e, o plano de pagamento foi acostado no feito ao ID 141610031. Além disso, a petição preenche os requisitos específicos da Lei 14.181/2021 e do artigo 330, parágrafo 1º, do CPC. As demais matérias alegadas são objeto do mérito. Sendo assim, REJEITO a preliminar. Quanto à preliminar de impugnação à concessão da gratuidade arguidas pelo Banco do Brasil e BMG, não merecem prosperar, vez que subsistem os requisitos da concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita e, conforme demonstrado, a parte autora possui inúmeros empréstimos consignados e pessoais, além de dívidas de cartão de crédito, o que justifica a concessão. Assim, REJEITO a preliminar. No que se refere à preliminar de impugnação ao valor da causa arguida pelo Banco do Brasil, não deve ser acolhida. Isso porque, dos elementos informativos e provas constantes dos autos, vislumbra-se que o valor da causa corresponde à pretensão econômica do feito. Sendo assim, REJEITO a preliminar. Ademais, estão presentes as condições da ação e o feito está em ordem. II.II. QUESTÕES PENDENTES II.II.I. PROVAS Analisando os autos precisamente, verifico que o Banco BMG requereu a produção de prova oral, ao passo que a parte requerida pugnou pela prova pericial. Cediço que, com base no que estatui o Código de Processo Civil, em seu capítulo XII, que esmiúça as disposições acerca de provas no Processo civil, o juiz é o destinatário das provas, para o qual as partes devem contribuir na formação do convencimento. Nesse sentido, as provas deverão ser requeridas, quanto oportunizadas, objetivando o saneamento do processo ou, se for o caso, o julgamento antecipado da lide, oportunidade em que, já convencido a respeito da prestação jurisdicional que o caso em apreço merece, o magistrado profere seu julgamento. Leia-se o teor doas artigos 369, 370 e 371 do CPC: Art. 369. As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz. Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito. Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou meramente protelatórias. Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento. Sendo assim, caso entenda que a narrativa dos autos e a documentação aportada nos autos sejam suficientes para a formação de seu convencimento, não há falar em cerceamento de defesa, mas, sim, na primazia do julgamento de mérito, celeridade e economia processual, desde que não cause prejuízo às partes. Nesse ponto, frise-se que o conceito de lide é o de que uma das partes será a vencedora, e a outra sucumbirá, arcando com as consequências processuais ditadas na legislação processual civil e nas inovações jurisprudenciais. Assim, revela-se desnecessária a realização de outras provas, uma vez que pode ser constatada pela análise do contrato entabulado entre as partes e realização de simples cálculos aritméticos. Neste sentido, colho entendimento dos E. TJMT: APELAÇÃO CÍVEL Nº 1006002-62.2020.8.11.0041 APELANTE: MARYANA COSTANESKI APELADO: COOPERATIVA DE CRÉDITO, POUPANÇA E INVESTIMENTO DO OURO VERDE DOMATO GROSSO - SICREDI OURO VERDE EMENTA RECURSO DE APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO MONITÓRIA – IMPROCEDÊNCIA DOS EMBARGOS MONITÓRIOS – PRELIMINAR DE NULIDADE POR CERCEAMENTO DE DEFESA – REJEIÇÃO –ABERTURA DE CONTA DE DEPÓSITO E ADESÃO A PRODUTOS E SERVIÇOS (CARTÃO DE CRÉDITO) –CAPITALIZAÇÃO DE JUROS – CONTRATO CELEBRADO APÓS A EDIÇÃO DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.963-17/00 – PACTUAÇÃO EXPRESSA – POSSIBILIDADE – RECURSO DESPROVIDO. Se o magistrado, a quem a prova é dirigida, entendeu que os elementos constantes dos autos são suficientes à formação do seu convencimento, não há óbice ao julgamento da lide independentemente da produção de outras provas, evitando-se, assim, retardar a prestação jurisdicional, sobretudo na hipótese em que constam todos os índices e encargos incidentes na dívida cobrada. Resta pacificada na jurisprudência do STJ a admissibilidade da pactuação da capitalização de juros nos contratos celebrados após a MP nº 1.963-17/2000, desde que avençada expressamente, sendo suficiente para demonstrar a pactuação a previsão de taxas de juros anual superior ao duodécuplo da mensal, segundo entendimento firmado em sede de recurso repetitivo (STJ – 2.ª S. – REsp 973827/RS). (TJ-MT - AC: 10060026220208110041, Relator: MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Data de Julgamento: 19/04/2023, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 26/04/2023) (grifei) Assim, não vislumbro a necessidade de produção de provas, para dilação probatória no feito, na medida em que a documentação carreada na exordial, a narrativa vestibular, os pontos rebatidos nas contestações e impugnação às contestações, com toda a documentação já acostada, são sobejamente capazes de fornecer a este juízo o necessário para o julgamento que a causa requer. Forte no teor do art. 370, parágrafo único, do CPC, anteriormente citado, REPUTO DESNECESSÁRIA a produção de outras provas. Sendo assim, tratando-se de matéria de direito, passo ao julgamento antecipado da lide, nos termos do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, uma vez que os dados trazidos aos autos são bastante para conhecimento da questão posta, não havendo necessidade de produzir outras provas, circunstância que vem a dar azo ao princípio da razoável duração do processo (art. 5°, inciso LXXVIII, da Constituição Federal de 1988 e art. 139, inciso II, do CPC). III. MÉRITO PROPRIAMENTE DITO Analisando detidamente os autos, verifico que a parte autora pretende a repactuação de dívidas com base na Lei do Superendividamento (Lei nº 14.181/21), que acarretou a modificação e acréscimos de dispositivos no Código de Defesa do Consumidor, notadamente quanto à repactuação de dívidas (arts. 104-A e 104-B): Art. 104-A. A requerimento do consumidor superendividado pessoa natural, o juiz poderá instaurar processo de repactuação de dívidas, com vistas à realização de audiência conciliatória, presidida por ele ou por conciliador credenciado no juízo, com a presença de todos os credores de dívidas previstas no art. 54-A deste Código, na qual o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) § 1º Excluem-se do processo de repactuação as dívidas, ainda que decorrentes de relações de consumo, oriundas de contratos celebrados dolosamente sem o propósito de realizar pagamento, bem como as dívidas provenientes de contratos de crédito com garantia real, de financiamentos imobiliários e de crédito rural. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) § 2º O não comparecimento injustificado de qualquer credor, ou de seu procurador com poderes especiais e plenos para transigir, à audiência de conciliação de que trata o caput deste artigo acarretará a suspensão da exigibilidade do débito e a interrupção dos encargos da mora, bem como a sujeição compulsória ao plano de pagamento da dívida se o montante devido ao credor ausente for certo e conhecido pelo consumidor, devendo o pagamento a esse credor ser estipulado para ocorrer apenas após o pagamento aos credores presentes à audiência conciliatória. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) § 3º No caso de conciliação, com qualquer credor, a sentença judicial que homologar o acordo descreverá o plano de pagamento da dívida e terá eficácia de título executivo e força de coisa julgada. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) § 4º Constarão do plano de pagamento referido no § 3º deste artigo: (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) I - medidas de dilação dos prazos de pagamento e de redução dos encargos da dívida ou da remuneração do fornecedor, entre outras destinadas a facilitar o pagamento da dívida; (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) II - referência à suspensão ou à extinção das ações judiciais em curso; (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) III - data a partir da qual será providenciada a exclusão do consumidor de bancos de dados e de cadastros de inadimplentes; (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) IV - condicionamento de seus efeitos à abstenção, pelo consumidor, de condutas que importem no agravamento de sua situação de superendividamento. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) § 5º O pedido do consumidor a que se refere o caput deste artigo não importará em declaração de insolvência civil e poderá ser repetido somente após decorrido o prazo de 2 (dois) anos, contado da liquidação das obrigações previstas no plano de pagamento homologado, sem prejuízo de eventual repactuação. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) Art. 104-B. Se não houver êxito na conciliação em relação a quaisquer credores, o juiz, a pedido do consumidor, instaurará processo por superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial compulsório e procederá à citação de todos os credores cujos créditos não tenham integrado o acordo porventura celebrado. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) § 1º Serão considerados no processo por superendividamento, se for o caso, os documentos e as informações prestadas em audiência. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) § 2º No prazo de 15 (quinze) dias, os credores citados juntarão documentos e as razões da negativa de aceder ao plano voluntário ou de renegociar. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) § 3º O juiz poderá nomear administrador, desde que isso não onere as partes, o qual, no prazo de até 30 (trinta) dias, após cumpridas as diligências eventualmente necessárias, apresentará plano de pagamento que contemple medidas de temporização ou de atenuação dos encargos. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) § 4º O plano judicial compulsório assegurará aos credores, no mínimo, o valor do principal devido, corrigido monetariamente por índices oficiais de preço, e preverá a liquidação total da dívida, após a quitação do plano de pagamento consensual previsto no art. 104-A deste Código, em, no máximo, 5 (cinco) anos, sendo que a primeira parcela será devida no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, contado de sua homologação judicial, e o restante do saldo será devido em parcelas mensais iguais e sucessivas. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) Diante disso, é possível aferir que o procedimento comporta duas fases. Na primeira fase, é instaurado processo de repactuação de dívidas, sendo realizada audiência de conciliação, na qual a parte autora apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 anos, preservados o mínimo existencial, as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas. Na segunda fase, que pode ser iniciada se inexitosa a fase de conciliação em relação a quaisquer credores, é instaurado o processo por superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial compulsório. No caso dos autos, verifico que não houve êxito na conciliação, de modo que nesta fase é necessário analisar o pedido de instauração do processo por superendividamento. Contudo, este magistrado compactua do entendimento de que a instauração não é automática, tendo em vista que é necessário verificar o preenchimento dos requisitos previstos no art. 54-A, do CDC: Art. 54-A. Este Capítulo dispõe sobre a prevenção do superendividamento da pessoa natural, sobre o crédito responsável e sobre a educação financeira do consumidor. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) § 1º Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) § 2º As dívidas referidas no § 1º deste artigo englobam quaisquer compromissos financeiros assumidos decorrentes de relação de consumo, inclusive operações de crédito, compras a prazo e serviços de prestação continuada. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) § 3º O disposto neste Capítulo não se aplica ao consumidor cujas dívidas tenham sido contraídas mediante fraude ou má-fé, sejam oriundas de contratos celebrados dolosamente com o propósito de não realizar o pagamento ou decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor. (Incluído pela Lei nº 14.181, de 2021) Especificamente quanto ao mínimo existencial, o Decreto nº 11.150, de 26/07/2022, ao regulamentar a Lei nº 14.181/2021, em particular o art. 3º, com redação dada pelo Decreto nº 11.567/2023, estabeleceu o mínimo existencial o valor de R$ 600,00: Art. 3º No âmbito da prevenção, do tratamento e da conciliação administrativa ou judicial das situações de superendividamento, considera-se mínimo existencial a renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a R$ 600,00 (seiscentos reais). No caso em apreço, verifico que não restou preenchido o requisito acima referido para a instauração do processo por superendividamento, uma vez que o valor mensal líquido que a parte autora recebe (R$2.765,28 - ID 136915640), já descontado o pagamento das parcelas dos empréstimos, é muito superior ao mínimo existencial de R$ 600,00. Nesse extado sentido, decidiu o E. TJMT: EMENTA: RECURSO DE APELAÇÃO – AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDA – LEI DO SUPERENDIVIDAMENTO – AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS – COMPROMETIMENTO DO MÍNIMO EXISTENCIAL – NÃO COMPROVAÇÃO – AUSÊNCIA DE EVIDÊNCIAS DA CONDIÇÃO DE “SUPERENDIVIDADO” PELO REQUERENTE – RENDIMENTOS LÍQUIDOS QUE PERMANECEM O VALOR APROXIMADO DE R$ 3.760,82 (TRÊS MIL, SETECENTOS E SESSENTA REAIS E OITENTA E DOIS CENTAVOS) MUITO ALÉM DO MÍNIMO EXISTENCIAL DE R$600,00 (SEISCENTOS REAIS) – ART. 3º DO DECRETO N. 11 .150/22 – CONSTA ENTRE OS DÉBITOS DÍVIDAS DECORRENTES DE EMPRÉSTIMOS E CRÉDITO CONSIGNADO – DÍVIDAS EXCLUÍDAS DO MÍNIMO EXISTÊNCIAL – ART 4º DO DECRETO N. 11.150/22 – PRELIMINARES REJEITADAS – SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. 1. É cediço que, para fins de adequação do caso concreto à Lei do Superendividamento, fica caracterizado o superendividamento quando, em virtude das dívidas contraídas pelo consumidor, imbuído de boa-fé, encontrar-se ele impossibilitado de quitá-las sem comprometer seu próprio sustento, possibilitando o ordenamento jurídico o procedimento judicial para a repactuação dos débitos, é o que consta na redação do § 1º do artigo 54-A, no Código de Defesa do Consumidor. 2. Anote-se, ainda, que o Decreto n.º 11 .150/2022, que "regulamenta a preservação e o não comprometimento do mínimo existencial para fins de prevenção, tratamento e conciliação de situações de superendividamento em dívidas de consumo, nos termos do disposto na Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 - Código de Defesa do Consumidor", estabelece um valor mínimo a ser resguardado de R$ 600,00 (seiscentos reais), conforme consta no caput do art. 3º do mencionado decreto. Já o art . 4º do Decreto n.º 11.150/2022 estabelece que se exclui da aferição do mínimo existencial as dívidas decorrentes de empréstimos e aquelas decorrentes de crédito consignado regido por lei específica, dentre outras modalidades de dívidas. 3. No presente caso, restou comprovado nos autos que o Requerente não preencheu requisito essencial para instauração do procedimento específico, mormente porque as dívidas de consumo por ele contraídas não comprometem o mínimo existencial, nos termos do Decreto nº 11.150/22; mesmo porque dentre as dívidas elencadas constam dívidas decorrentes de empréstimos e crédito consignado. 4. Em suma, muito embora o Requerente demonstre que está em dificuldade financeira para quitar suas dívidas, não logrou êxito em comprovar, minimamente, que as dívidas de consumo comprometem a sua subsistência, afetando o mínimo existencial, razão pela qual a sentença de improcedência deve ser mantida. 5. Sentença mantida, recurso desprovido. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 10000174020238110031, Relator.: MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, Data de Julgamento: 07/08/2024, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 13/08/2024) (g.n.) Para corroborar referido entendimento, colaciono o seguinte julgado: Ação de repactuação de dívidas. Lei de superendividamento. Ausência de elementos, com a petição inicial, de que as prestações cobradas pelos réus, somadas, prejudiquem o mínimo existencial da autora. Contexto dos autos que leva à improcedência da pretensão inicial. Sentença mantida. Recurso improvido”. (TJ-SP - Apelação Cível: 1002392-96.2023.8.26.0483 Presidente Venceslau, Relator: Luis Carlos de Barros, Data de Julgamento: 25/03/2024, 20ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/03/2024) “APELAÇÃO. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. MÍNIMO EXISTENCIAL. ARTS. 3º E 4º DO DECRETO N. 11.150/22. NÃO COMPROMETIMENTO. SUPERENDIVIDAMENTO. NÃO CONFIGURADO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença que, nos autos da ação de conhecimento sob o rito dos arts. 104-A e 104-B, do Código de Defesa do Consumidor, julgou improcedente o pedido da parte autora. 2. A caracterização da situação de superendividamento apta a atrair a aplicação dos mecanismos legais previstos no art. 104-A, § 4º, do CDC, introduzido pela Lei n. 14.181/2021 (Lei do Superendividamento), pressupõe o comprometimento do mínimo existencial, definido pelo art. 3º do Decreto n. 11.150/22, com redação dada pelo Decreto n. 11.567/2023, como a renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a R$600,00 (seiscentos reais). 3. A recorrente, servidora militar vinculada ao Exército Brasileiro, obtém renda bruta de R$15.986,41 (quinze mil novecentos e oitenta e seis reais e quarenta e um centavos) e líquida, após os descontos compulsórios de imposto de renda e previdência social, de R$11.444,21 (onze mil quatrocentos e quarenta e quatro reais e vinte e um centavos). Por sua vez, os descontos em conta corrente decorrentes de empréstimos comuns alcançam o valor de R$1.318,61 (um mil trezentos e dezoito reais e sessenta e um centavos). Assim, após os descontos compulsórios e os descontos decorrentes das operações de crédito debitados em conta corrente, sobra à agravante renda de R$10.125,60 (dez mil cento e vinte e cinco reais e sessenta centavos), o que corresponde a mais de 16 (dezesseis) vezes o limite definido como mínimo existencial pelo Decreto n. 11.150/2022. 4. Ainda que fossem considerados os descontos em folha decorrentes de empréstimos consignados regidos por lei especial da servidora militar - que são expressamente excluídos da apuração da situação de superendividamento pelo art. 4º, parágrafo único, alínea ?h?, do Decreto n. 11.150/2022 -, a conclusão não se alteraria. Isso porque, na hipótese, esses descontos somam a importância de R$4.792,88 (quatro mil setecentos e noventa e dois reais e oitenta e oito centavos), de modo que ao fim e ao cabo, a apelante tem renda disponível de 5.332,72 (cinco mil trezentos e trinta e dois reais e setenta e dois centavos), montante corresponde a aproximadamente 9 (nove) vezes o limite definido como mínimo existencial pelo Decreto n. 11.150/2022. 5. Ante o não comprometimento do mínimo existencial e, por conseguinte, o não enquadramento da apelante na condição de superendividada para os fins legais, mostra-se escorreita a sentença recorrida ao julgar improcedente o pedido de repactuação de dívidas. Recurso conhecido e desprovido”. (TJ-DF 07362609420228070001 1748743, Relator: SANDRA REVES, Data de Julgamento: 23/08/2023, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 01/09/2023) (Original sem grifo) Por conta disso, considerando que o procedimento do superendividamento possui como escopo principal a renegociação de todas as dívidas, preservando o mínimo existencial, que como acima exposto se encontra resguardado, é do meu convencimento que o pedido de limitação dos descontos das parcelas dos mútuos bancários, sejam eles consignados ou empréstimos bancários comuns descontados em conta corrente, no montante correspondente a 30% dos rendimentos mensais, não pode ser analisado neste procedimento de rito específico. Nesse sentido, o julgado ora colacionado: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. INÉPCIA DA INICIAL NÃO VERIFICADA. EMPRÉSTIMOS CONSIGNADO EM FOLHA DE PAGAMENTO E DÉBITO DA PARCELA EM CONTA CORRENTE. ALEGAÇÃO DE SUPERENDIVIDAMENTO E NECESSIDADE DE READEQUAÇÃO DOS DÉBITOS. NOVIDADE DA LEI Nº 14.181/21. REQUISITOS NÃO OBSERVADO. MERA PRETENSÃO DE LIMITAÇÃO DE DESCONTOS A 30% DA REMUNERAÇÃO OU SALÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. A petição inicial que declina claramente a causa de pedir e o pedido, acompanhada do respectivo conjunto probatório, não é inepta. 2. A partir da Lei no. 14.181/2021, abriram-se novos caminhos ou alternativas para resolver o chamado superendividamento, tudo de modo assegurar o cumprimento da obrigação pelo devedor, mas preservando-lhe a dignidade e sua inclusão social através da conservação do mínimo existencial. 3. O procedimento do superendividamento pressupõe chamar todos os credores de dívidas periódicas ou de trato sucessivo e não somente as instituições financeiras junto às quais possui contrato de mútuo. 4. Nesse passo, não se admite valer-se do rito específico do superendividamento para obter a limitação das parcelas consignadas em folha de pagamento ou débito em conta corrente a 30% (trinta por cento) da remuneração ou salário percebido pelo devedor, porque isso fugiria ao escopo principal do instrumento, qual seja, o equacionamento de todas as dívidas, suas renegociações, impedir a contratação de novas obrigações, sem prejuízo da preservação do mínimo existencial. 5. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO”. (TJ-DF 07358723120218070001 1685080, Relator: LUÍS GUSTAVO B. DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 12/04/2023, 3ª Turma Cível, Data de Publicação: 13/04/2023) (g.n.) Ademais, consoante entendimento jurisprudencial, não se aplica, por analogia, a limitação das parcelas dos contratos de empréstimo consignado, nos contratos de empréstimo bancário com desconto em conta corrente: “AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS (SUPERENDIVIDAMENTO) - ANTECIPAÇÃO DE TUTELA DEFERIDA - SUSPENSÃO DOS DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO - EMPRÉSTIMOS COM DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO E EM CONTA CORRENTE - LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS A 30% DOS RENDIMENTOS LÍQUIDOS - IMPOSSIBILIDADE DE LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS REALIZADOS EM CONTA CORRENTE - TEMA 1.085/STJ - DECISÃO REFORMADA EM PARTE - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Consoante entendimento firmado pelo STJ: “Tese Repetitiva: São lícitos os descontos de parcelas de empréstimos bancários comuns em conta-corrente, ainda que utilizada para recebimento de salários, desde que previamente autorizados pelo mutuário e enquanto esta autorização perdurar, não sendo aplicável, por analogia, a limitação prevista no § 1º do art. 1º da Lei n. 10.820/2003, que disciplina os empréstimos consignados em folha de pagamento” (Tema 1.085/STJ). A concessão da tutela antecipada demanda provas que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, bem como é necessário que não haja risco de irreversibilidade da medida, nos moldes determinados pelo artigo 300 do CPC”. (TJ-MT - AI: 10079921220238110000, Relator: GUIOMAR TEODORO BORGES, Data de Julgamento: 31/05/2023, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 31/05/2023) (g.n.) Portanto, a parte autora não se enquadra na condição de superendividada, de modo que a improcedência dos pedidos é medida que se impõe. Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos iniciais e EXTINGO O PROCESSO COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil. Considerando a improcedência dos pedidos iniciais, o pedido de tutela antecipada perdeu o objeto, motivo pelo qual deixei de apreciá-lo. A título de sucumbência, CONDENO a parte autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios, estes últimos fixados em R$500,00 (quinhentos reais) em favor de cada parte requerida, com fundamento no art. 85, parágrafo 8º, do Código de Processo Civil, ficando esta condenação com a exigibilidade SUSPENSA, vez que a parte goza do benefício da assistência judiciária gratuita. Em caso de interposição de recurso, independentemente de conclusão, DÊ-SE vista à parte contrária para contrarrazões e, após, remetam-se os autos ao TJMT, com as homenagens de estilo. Com o TRÂNSITO EM JULGADO, cumpridas as diligências, com as cautelas de praxe, ARQUIVE-SE com a devida baixa. PUBLIQUE-SE. REGISTRE-SE. INTIMEM-SE. CUMPRA-SE. Às providências. Alto Garças/MT, data da assinatura digital. Luiz Antônio Muniz Rocha Juiz de Direito

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