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Mayara Barbara Martins x Azul Linhas Aéreas Brasileiras S.A.

ID: 310475007

Tribunal: TJMT Órgão: 4ª VARA CÍVEL DE LUCAS DO RIO VERDE Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1000123-86.2025.8.11.0045

Data de Disponibilização: 30/06/2025

Polo Ativo:

MAYARA BARBARA MARTINS

Polo Passivo:

AZUL LINHAS AÉREAS BRASILEIRAS S.A.

Sentença

Advogados:

FLAVIO IGEL

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JOSIANE CARLA MAZUTTI MARQUES MORAES

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4ª VARA CÍVEL DE LUCAS DO RIO VERDE SENTENÇA Processo: 1000123-86.2025.8.11.0045. AUTOR(A): MAYARA BARBARA MARTINS REU: AZUL LINHAS AÉREAS BRASILEIRAS S.A. Vist… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 4ª VARA CÍVEL DE LUCAS DO RIO VERDE SENTENÇA Processo: 1000123-86.2025.8.11.0045. AUTOR(A): MAYARA BARBARA MARTINS REU: AZUL LINHAS AÉREAS BRASILEIRAS S.A. Vistos etc. I – Relatório: Trata-se de ação de indenização por danos materiais e morais proposta por MAYARA BARBARA MARTINS em face de AZUL LINHAS AÉREAS BRASILEIRAS S/A, ambos devidamente qualificados nos autos. A parte autora narra que, no dia 23 de dezembro de 2024, embarcou no voo nº 4053, partindo de Sorriso/MT com destino a Belo Horizonte/MG, conforme bilhete de passagem constante no Id. 180241296. Ocorre que, ao chegar ao destino, foi surpreendida com o extravio de sua bagagem despachada e da bagagem de mão de sua filha, a qual também havia sido despachada a pedido da companhia aérea. Afirma que, em razão do extravio, precisou arcar com despesas emergenciais e destaca, ainda, que os itens extraviados incluíam objetos de valor pessoal, como roupas, presentes de Natal e medicamentos de uso contínuo para tratamento de transtorno de ansiedade, os quais agravaram sua condição de saúde e comprometeram emocionalmente o período festivo. Requereu, ao final, a condenação da parte ré ao pagamento de R$ 2.645,70 por danos materiais e R$ 30.000,00 por danos morais. Foi concedida a gratuidade da justiça por decisão de Id. 180996049 e designada audiência de conciliação perante o CEJUSC. A parte ré foi devidamente citada (Id. 183042630) e apresentou contestação no Id. 189428043, na qual impugnou a justiça gratuita concedida a autora e no mérito, sustentou a inexistência de falha na prestação do serviço. Termo de audiência constando que a tentativa de composição amigável restou infrutífera (Id. 189445872). A autora apresentou impugnação à contestação no Id. 191261794. As partes foram intimadas para se manifestarem sobre eventuais provas a serem produzidas, mantendo-se inertes. Intimadas as partes a especificarem as provas pretendidas, ambas se manifestaram pelo julgamento antecipado. É o relato do essencial. Fundamento e decido. II – Fundamentação: 2. O feito comporta julgamento antecipado do mérito, notadamente porque se trata de matéria unicamente de direito, não havendo, portanto, necessidade de dilação probatória (CPC, art. 355, I). 2.1 Das preliminares a) Impugnação a Justiça Gratuita A requerida, em sede de contestação, impugnou o deferimento da gratuidade da justiça à parte autora, sustentando a ausência de comprovação da alegada hipossuficiência econômica. Sem razão. No caso em apreço, a parte autora apresentou declaração de hipossuficiência econômica devidamente assinada (Id. 180238847), além de requerer expressamente os benefícios da justiça gratuita na petição inicial (Id. 180234234). A ré, por sua vez, não trouxe nenhum elemento concreto e objetivo capaz de infirmar a presunção de veracidade da declaração da autora, limitando-se a alegações genéricas, dissociadas da realidade econômica individualizada da parte. Assim, inexistindo prova contundente em sentido contrário, impõe-se a manutenção da gratuidade deferida por este Juízo no Id. 180996049. Rejeito, portanto, a preliminar de impugnação à justiça gratuita. b) Da Aplicação do Código de Defesa do Consumidor Não prospera a alegação da requerida de que o Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA) afastaria a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) nas relações decorrentes de transporte aéreo. Trata-se de relação de consumo típica, em que a autora figura como destinatária final do serviço, conforme arts. 2º e 17 do CDC. Superadas essas questões, passa-se a análise meritória. 2.2 Do mérito Trata-se de ação de indenização por danos morais e materiais fundada na frustração dos autores diante da falha na prestação de serviços adquiridos junto à requerida, porque tiveram suas bagagens extraviadas, as quais lhes foram entregues 7 (sete) dias após a realização da viagem. Pois bem. A responsabilidade civil do transportador aéreo é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC e art. 734 do Código Civil. Assim, verificada a falha na prestação do serviço, qual seja, o extravio de bagagem durante transporte aéreo, é patente o dever de indenizar. Ao sustentar que adotou todas as providências exigidas pela Resolução nº 400 da ANAC, a requerida incorre em tentativa indevida de restringir a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, sob o pretexto de cumprimento de norma administrativa. Todavia, é pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de que normas infralegais não têm o condão de limitar ou afastar direitos assegurados em lei federal, especialmente no que tange à responsabilidade civil decorrente de falha na prestação do serviço. As resoluções da ANAC, por sua natureza regulamentar, devem ser interpretadas em harmonia com os preceitos do CDC, jamais podendo ser invocadas para afastar a reparação integral dos danos suportados pelo consumidor. O cumprimento das regras da agência reguladora não exime o fornecedor da obrigação de indenizar, tampouco impede a análise judicial da suficiência das medidas adotadas, à luz dos princípios da boa-fé, da vulnerabilidade do consumidor e da reparação integral do dano. Portanto, a invocação da Resolução nº 400 da ANAC não afasta a incidência das normas protetivas do CDC, tampouco elide o dever de indenizar pelos prejuízos suportados pela autora. Ressalte-se que o ordenamento jurídico pátrio é contumaz em estabelecer diretrizes para salvaguardar os direitos daqueles que são lesados nas relações intersubjetivas, seja de cunho civil, seja no âmbito das relações de consumo. A requerida praticou ato ilícito, devendo responder por danos morais, na esteira da Constituição Federal, Lei Civil e Lei Consumerista. Tal responsabilidade pode ser afastada apenas quando comprovada que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste, ou, a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (art. 14, § 3º, inc. I e II, do CDC). Nesse diapasão, recorda-se que o artigo 14, do Código de Defesa do Consumidor, dispõe: “Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. § 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I - o modo de seu fornecimento; II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III - a época em que foi fornecido. § 2º O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas. § 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. § 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.” No entanto, não tendo a prestadora do serviço se desincumbido do ônus da prova que lhe cabia, deve responder objetivamente pelos danos causados aos autores em razão da falha na prestação de seu serviço. Os artigos 186 e 927 ambos do Código Civil Brasileiro, prelecionam que: “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” “Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.” Com isso, não há que se falar em inocorrência de danos morais à autora, isso porque a bagagem foi extraviada, causando-lhes transtorno, frustração e desconforto, ante a deficiente prestação de serviço. Nesse sentido, é o entendimento do E. Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso: “RECURSO INOMINADO – RELAÇÃO DE CONSUMO – EXTRAVIO DE BAGAGEM – BAGAGEM RESTITUÍDA SOMENTE NO DIA SEGUINTE – INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA (ART. 6º, VIII, CDC)– RESPONSABILIDADE OBJETIVA (ART. 14, CAPUT, CDC)– DEVER DE INDENIZAR – DANO MORAL DEVIDO – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. Constatado extravio de bagagem do Autor, resta configurada a falha na prestação do serviço, o que tipifica o ato ilícito e enseja o dever de indenizar, nos moldes dos artigos 186 e 927, do Código Civil, bem como artigo 14, do CDC. O extravio de bagagem traz, em si, a presunção da lesão moral causada ao passageiro, atraindo o dever de indenizar (Resp. 686.384/RS e TJMT, 4ª CC, Processo nº. 0022280-12.2005.8.11.0000 – 22280/2005, Des. José Silvério Gomes). Sentença reformada. Recurso conhecido e parcialmente provido.” (TJ-MT 10032284820218110001 MT, Relator: MARCELO SEBASTIAO PRADO DE MORAES, Data de Julgamento: 24/02/2022, Turma Recursal Única, Data de Publicação: 25/02/2022) (sem grifos no original) Em relação ao quantum indenizatório, vale ressaltar que a ausência de parâmetros legais para se fixar o valor do dano moral conduz o magistrado a agir com extrema acuidade e prudência no exercício de tal mister, para que, em última análise, não se opere um (indevido) enriquecimento ilícito ao beneficiário. É sabido, doutra banda, que a doutrina e a orientação jurisprudencial têm estabelecido algumas balizas, requisitos, estes, que se referem, nomeadamente, ao grau de culpa, à extensão do dano, às condições pessoais da vítima e à capacidade socioeconômica dos litigantes. No tocante à condição social e financeira das partes, a requerida é empresa de grande porte e muito bem sucedida e prestou os serviços sem precauções assumindo os riscos de sua atividade, visando ampliar sem precedentes seus fins lucrativos, o que demonstra sua capacidade econômica e a necessidade de arcar com indenização razoável, como sanção pecuniária de caráter punitivo, para mais responsavelmente se preocupar com suas ações. É cediço que esta indenização não pode se tornar demasiadamente pesada para a ré ou desprezível pela sua condição financeira, mas trazendo uma compensação satisfatória para os autores. O valor pleiteado na inicial se mostra elevado, não se coadunando com a situação do caso concreto, analisadas a razoabilidade e proporcionalidade. Tendo em conta essas balizas e, notadamente, os princípios constitucionais implícitos da razoabilidade e da proporcionalidade e o quanto estabelecido pelo artigo 944, do Código Civil, concluo que a reparação extrapatrimonial deve ser arbitrada em R$ 4.000,00 (quatro mil reais), acrescidos juros de mora pela taxa SELIC, a contar da citação, e de correção monetária pelo IPCA/IBGE, a partir da prolação desta sentença. No que tange aos danos materiais alegadamente suportados pela autora, impõe-se reconhecer que nem todos os valores apresentados guardam nexo de causalidade direto e imediato com o extravio da bagagem, o que impede seu integral acolhimento. É cediço que a responsabilização civil, ainda que objetiva – como no caso das relações de consumo regidas pelo art. 14 do CDC – exige, além do dano e da conduta lesiva, a presença de relação causal direta entre o ato ilícito e o prejuízo experimentado. A teoria do nexo causal impõe ao julgador o exame rigoroso da pertinência lógica entre o fato lesivo e a consequência danosa, sob pena de se admitir a reparação de danos reflexos ou indiretos, o que não se coaduna com os princípios da razoabilidade e da reparação integral, mas dentro de limites jurídicos. Nesse contexto, verifica-se que os valores despendidos com o aluguel de veículo não podem ser imputados à conduta da ré, porquanto não evidenciado que tal despesa decorreu direta e necessariamente do extravio da bagagem. A autora alega que perdeu o veículo previamente reservado em virtude da necessidade de registrar o extravio, porém não comprova que essa perda da reserva tenha sido provocada, exclusiva ou necessariamente, pela conduta omissiva da companhia aérea. Trata-se de alegação genérica, dissociada de prova técnica e de cronograma que comprove a incompatibilidade de horários entre a tentativa de resolver o extravio e o cumprimento da reserva veicular. De igual forma, os gastos com refeição não configuram dano emergente indenizável. Trata-se de despesa corriqueira, presumivelmente necessária em qualquer deslocamento, com ou sem extravio de bagagem. Não há demonstração de que o evento danoso tenha imposto, de maneira extraordinária ou adicional, a realização dessa despesa específica, a qual, por sua natureza, integra o custo ordinário de qualquer viagem. Logo, ausente a comprovação do nexo causal direto, imediato e necessário, tais valores não podem ser incluídos no montante reparável a título de danos materiais, sob pena de se alargar indevidamente a responsabilidade da requerida e desvirtuar o caráter compensatório da indenização, conferindo-lhe natureza meramente assistencial. Assim, a autora faz jus a devolução apenas dos valores que despendeu com itens pessoais, conforme comprovantes de Id. 180241303 - Pág. 1 (R$ 315,30), Id. 180241297 - Pág. 1 (R$ 469,96), Id. 180244045 - Pág. 1 (R$ 350,00), Id. 180244047 - Pág. 1 (R$ 227,00), valores que devem ser acrescidos de correção monetária pelo IPCA/IBGE (art. 389, parágrafo único, CC) e juros de mora pela taxa SELIC (art. 406, § 1º, CC), a partir do efetivo pagamento. III – Dispositivo: 3. Ante o exposto, com fundamento no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos para: a) condenar a empresa ré a indenizar, a título de indenização por danos morais, no valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), acrescidos juros de mora pela taxa SELIC, a contar da citação, e de correção monetária pelo IPCA/IBGE, a partir da prolação desta sentença. b) Condenar a empresa ré a indenizar, a título de indenização por danos materiais, os valores constantes dos comprovantes de Id. 180241303 - Pág. 1 (R$ 315,30), Id. 180241297 - Pág. 1 (R$ 469,96), Id. 180244045 - Pág. 1 (R$ 350,00), Id. 180244047 - Pág. 1 (R$ 227,00), valores que devem ser acrescidos de correção monetária pelo IPCA/IBGE e juros de mora pela taxa SELIC , a partir do efetivo pagamento. Condeno o(a) requerido(a) ao pagamento das custas, despesas processuais e verba honorária de 10% (dez por cento) do valor da condenação (CPC, art. 86, parágrafo único). Preclusa a via recursal, certifique-se o trânsito em julgado e em seguida arquivem-se os autos, com as anotações e baixas de estilo. Publicada com a inserção no Sistema PJE/MT. Dispensado o registro. Intimem-se. Cumpra-se. Lucas do Rio Verde, datado e assinado digitalmente. Luis Felipe Lara de Souza, Juiz de Direito.

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I. K. S. e outros x Gol Linhas Aéreas S.A.

ID: 319847549

Tribunal: TJMT Órgão: 2ª VARA DE CAMPO NOVO DOS PARECIS Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1000016-27.2025.8.11.0050

Data de Disponibilização: 08/07/2025

Polo Ativo:

I. K. S. JOSCEMAR SAVARIS

Polo Passivo:

GOL LINHAS AÉREAS S.A.

Sentença

Advogados:

ELISA FERNANDA RAMOS SALVADOR REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO ELISA FERNANDA RAMOS SALVADOR

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DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA

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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MATO GROSSO COMARCA DE CAMPO NOVO DO PARECIS 2ª VARA DE CAMPO NOVO DOS PARECIS - PJe SENTENÇA NÚMERO DO PROCESSO: 1000016-27.2025.8.11.0050 VALOR DA CAUSA: R$ 15.000,00 … PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MATO GROSSO COMARCA DE CAMPO NOVO DO PARECIS 2ª VARA DE CAMPO NOVO DOS PARECIS - PJe SENTENÇA NÚMERO DO PROCESSO: 1000016-27.2025.8.11.0050 VALOR DA CAUSA: R$ 15.000,00 ESPÉCIE: [Atraso de vôo, Cancelamento de vôo, Indenização por Dano Moral]->PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Vistos. Trata-se de Ação Indenizatória por Danos Morais ajuizada por LIVIA MARIA KOPPENHAGEN SAVARIS, menor impúbere, representada por seu genitorJOSCEMAR SAVARIS, em face de GOL LINHAS AÉREAS S.A., objetivando a condenação da requerida ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 15.000,00 (quinze mil reais). Aduz a parte autora, em síntese, que adquiriu bilhete aéreo junto à requerida para o trecho Cuiabá/MT - Jericoacoara/CE, com escala em São Paulo/SP, com os seguintes horários: saída de Cuiabá/MT às 04h25min, chegada em São Paulo/SP às 07h55min e chegada em Jericoacoara/CE às 13h20min. Entretanto, alega que o voo originário foi cancelado pela requerida sem qualquer justificativa razoável ou aviso prévio, ocasionando graves transtornos. Afirma que, em decorrência do cancelamento, foi reacomodada em voo de outra companhia aérea, com chegada ao destino final apenas às 11h40min do dia 25/12/2024, totalizando um atraso de aproximadamente 24 (vinte e quatro) horas. Sustenta a autora que, durante o longo período de espera, a requerida não prestou assistência material adequada, como previsto em legislação específica, deixando-a desamparada e causando extremo desgaste emocional e físico, haja vista que passaram a ceia de Natal no saguão do aeroporto. Invoca a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e da Resolução nº 400 da ANAC, requerendo a condenação da requerida ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00 (quinze mil reais). Recebida a inicial e designada audiência de conciliação, esta restou infrutífera (ID 192802907). Devidamente citada, a requerida apresentou contestação (ID 184534392), na qual arguiu preliminarmente: (i) impugnação ao pedido de justiça gratuita; (ii) necessidade de aplicação do Código Brasileiro de Aeronáutica; (iii) necessidade de retificação do polo passivo para que conste como requerida a GOL LINHAS AÉREAS S.A., CNPJ nº 07.575.651/0001-59, em substituição à GOL LINHAS AÉREAS INTELIGENTES S.A.; (iv) inépcia da inicial por ausência de documento essencial para propositura da ação, especificamente procuração irregular; (v) conexão com outros processos; e (vi) impossibilidade de inversão do ônus da prova. No mérito, a requerida sustentou que o atraso do voo decorreu de manutenção não programada na aeronave, configurando caso fortuito que excluiria sua responsabilidade. Alegou que prestou a devida assistência material à autora e que a situação narrada não configura dano moral, tratando-se de mero dissabor cotidiano. Subsidiariamente, pugnou pela moderação de eventual indenização. A autora apresentou impugnação à contestação (ID 196023030), rechaçando todas as preliminares arguidas pela requerida e reiterando os argumentos expostos na inicial quanto ao mérito, com ênfase no descumprimento da Resolução 400 da ANAC pela requerida, na diferença excessiva de horário na chegada ao destino final e na caracterização do dano moral. Instadas a especificarem as provas que pretendiam produzir, a requerida manifestou-se no ID 198596964. É o relatório. Fundamento e decido. O feito comporta julgamento no estado em que se encontra, nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, haja vista que a questão controvertida é unicamente de direito e os fatos estão suficientemente demonstrados pelos documentos carreados aos autos, sendo desnecessária a produção de outras provas, conforme manifestação das próprias partes. Da impugnação à gratuidade da justiça A requerida impugna a concessão dos benefícios da justiça gratuita à autora, sob o fundamento de que esta não faria jus ao benefício por ter condições de arcar com as despesas processuais, haja vista que conseguiu adquirir passagem aérea, o que, segundo a requerida, seria incompatível com o estado de hipossuficiência alegado. Entretanto, a impugnação não merece prosperar. Primeiramente, porque o genitor da autora comprovou, por meio da documentação acostada aos autos, não possuir vínculo empregatício formal, o que constitui indício de hipossuficiência financeira. Em segundo lugar, a aquisição de bilhetes aéreos, por si só, não descaracteriza a hipossuficiência econômica, uma vez que pode representar um esforço financeiro pontual para uma viagem programada. Assim, rejeito a preliminar de impugnação à gratuidade da justiça. Da aplicação do Código Brasileiro de Aeronáutica A requerida sustenta a necessidade de aplicação preponderante do Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei nº 7.565/1986) ao presente caso, em detrimento do Código de Defesa do Consumidor, por se tratar de norma específica que regula o contrato de transporte aéreo. Tal preliminar não merece acolhimento. A relação jurídica estabelecida entre as partes é inequivocamente de consumo, enquadrando-se nos conceitos de consumidor e fornecedor previstos nos artigos 2º e 3º do CDC. O Superior Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento de que, nas relações de consumo envolvendo transporte aéreo doméstico, aplica-se o Código de Defesa do Consumidor, e não o Código Brasileiro de Aeronáutica ou a Convenção de Varsóvia, por se tratar de legislação especial posterior que conferiu maior proteção ao consumidor. Não obstante, o Código Brasileiro de Aeronáutica pode ser aplicado de forma complementar, naquilo que não contrariar as normas protetivas do Código de Defesa do Consumidor, em uma interpretação sistemática e teleológica do ordenamento jurídico pátrio. Destarte, rejeito a preliminar e determino a aplicação preponderante do Código de Defesa do Consumidor como norma reguladora da relação entre as partes, sem prejuízo da aplicação complementar do Código Brasileiro de Aeronáutica naquilo que não contrariar as normas protetivas consumeristas. Da retificação do polo passivo A requerida alega a necessidade de retificação do polo passivo para que conste como requerida a GOL LINHAS AÉREAS S.A., CNPJ nº 07.575.651/0001-59, em substituição à GOL LINHAS AÉREAS INTELIGENTES S.A., por ser aquela a empresa responsável pelo transporte aéreo e não a holding do grupo. Assiste razão à requerida quanto a este ponto. Verifica-se que a empresa responsável pelo transporte aéreo é a GOL LINHAS AÉREAS S.A., inscrita no CNPJ sob o nº 07.575.651/0001-59, conforme documentação acostada aos autos, sendo esta a legitimada para figurar no polo passivo da presente demanda. Portanto, acolho a preliminar para determinar a retificação do polo passivo, devendo constar como requerida a GOL LINHAS AÉREAS S.A., inscrita no CNPJ sob o nº 07.575.651/0001-59. Da inépcia da inicial A requerida alega inépcia da inicial por ausência de documento essencial para propositura da ação, especificamente procuração irregular, sustentando que o instrumento procuratório juntado aos autos não possui assinatura válida. A preliminar não merece prosperar. Da análise dos autos, verifica-se que a procuração foi devidamente juntada e encontra-se em conformidade com os requisitos legais. Assim, rejeito a preliminar de inépcia da inicial. Da conexão A requerida sustenta a existência de conexão entre o presente processo e outros feitos (nº 1000016-27.2025.8.11.0050, nº 1000015-42.2025.8.11.0050, nº 1000125-91.2025.8.11.0001 e nº 1000123-24.2025.8.11.0001), sob o fundamento de que abordariam a mesma causa de pedir. A preliminar não merece acolhimento. O instituto da conexão, previsto no artigo 55 do Código de Processo Civil, ocorre quando duas ou mais ações possuem em comum o pedido ou a causa de pedir, impondo-se a reunião dos processos para julgamento conjunto, a fim de evitar decisões contraditórias. No caso em tela, embora a requerida alegue a existência de conexão, não demonstrou de forma inequívoca que os processos mencionados possuem as mesmas partes, pedidos ou causa de pedir. Conforme destacado pela autora em sua impugnação à contestação, os processos mencionados possuem partes diferentes, cada qual com seu bilhete individual, não se vislumbrando, portanto, o risco de decisões conflitantes que justifique a reunião dos feitos. Portanto, rejeito a preliminar de conexão. Do mérito A controvérsia dos autos cinge-se essencialmente à responsabilidade civil da requerida pelo cancelamento do voo contratado pela autora e pelos transtornos daí decorrentes, bem como à existência de danos morais indenizáveis. Conforme já estabelecido na análise das preliminares, a relação jurídica existente entre as partes é inequivocamente de consumo, submetendo-se, portanto, às normas do Código de Defesa do Consumidor. Nos termos do artigo 14 do CDC, o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Trata-se, pois, de responsabilidade objetiva, que prescinde da comprovação de culpa, bastando a demonstração do defeito na prestação do serviço, do dano e do nexo de causalidade entre ambos. O fornecedor somente se exime da responsabilidade se provar a inexistência do defeito ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (artigo 14, §3º, do CDC). No caso em tela, é incontroverso o cancelamento do voo contratado pela autora e o significativo atraso na chegada ao destino final, aproximadamente 24 (vinte e quatro) horas após o horário originalmente previsto. A própria requerida admite tais fatos em sua contestação, limitando-se a alegar que o cancelamento decorreu de manutenção não programada na aeronave, o que configuraria caso fortuito apto a excluir sua responsabilidade. Entretanto, tal argumento não merece acolhimento. A jurisprudência dominante tem se posicionado no sentido de que problemas mecânicos ou de manutenção da aeronave constituem fortuito interno, inerente à atividade empresarial desenvolvida pela companhia aérea, não configurando excludente de responsabilidade. Trata-se de risco do empreendimento, que não pode ser transferido ao consumidor. Ademais, a requerida não comprovou de forma inequívoca a ocorrência da alegada manutenção não programada na aeronave, ônus que lhe incumbia nos termos do artigo 373, II, do Código de Processo Civil, especialmente considerando a inversão do ônus da prova deferida em favor da autora. Também não restou demonstrada a prestação de assistência material adequada à autora durante o período de espera, conforme exigido pelos artigos 26 e 27 da Resolução nº 400/2016 da ANAC. A requerida limitou-se a alegar genericamente que prestou a devida assistência, sem, contudo, apresentar provas concretas desse fato, como vouchers de alimentação, comprovantes de hospedagem ou qualquer outro documento que evidenciasse o cumprimento de suas obrigações legais. Por outro lado, a autora afirmou categoricamente que foi deixada desamparada, tendo inclusive passado a ceia de Natal no saguão do aeroporto, o que configura descaso com o consumidor e evidencia a falha na prestação do serviço. Destarte, resta configurada a responsabilidade civil da requerida pelos transtornos causados à autora em decorrência do cancelamento do voo e do atraso significativo na chegada ao destino final. O dano moral consiste na lesão aos direitos da personalidade, capazes de acarretar sofrimento psíquico, constrangimento, dor, angústia, abalo à honra e perturbação do bem-estar, impondo-se sua reparação como forma de compensar a vítima pelos transtornos experimentados. No caso do transporte aéreo, a jurisprudência tem se firmado no sentido de que o cancelamento de voo com significativo atraso na chegada ao destino final ultrapassa o mero aborrecimento cotidiano, configurando dano moral indenizável, especialmente quando não prestada a devida assistência material ao passageiro durante o período de espera. Na hipótese dos autos, restou demonstrado que a autora sofreu transtornos consideráveis em decorrência do cancelamento do voo contratado e do atraso de aproximadamente 24 (vinte e quatro) horas na chegada ao destino final. A situação foi agravada pela ausência de assistência material adequada por parte da requerida, bem como pelo fato de a autora ter sido obrigada a passar a ceia de Natal no saguão do aeroporto, ocasião que deveria ser celebrada em família. Tais circunstâncias indubitavelmente ultrapassam o mero dissabor cotidiano, configurando verdadeira ofensa aos direitos da personalidade da autora, notadamente sua dignidade como pessoa humana, ensejando, portanto, a reparação por danos morais. Quanto ao valor da indenização, deve-se levar em consideração a gravidade do dano, a capacidade econômica das partes, o caráter pedagógico-punitivo da condenação e os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, evitando-se, por um lado, a fixação de indenização irrisória, que não atenda à finalidade compensatória e preventiva da medida, e, por outro, o enriquecimento sem causa da vítima. No caso em tela, considerando todas as circunstâncias narradas nos autos, em especial o significativo atraso na chegada ao destino final (aproximadamente 24 horas), a falta de assistência material adequada e o fato de a autora ter sido obrigada a passar a ceia de Natal no saguão do aeroporto, entendo como razoável e proporcional a fixação da indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Tal valor atende à finalidade compensatória e pedagógica da medida, sem implicar enriquecimento sem causa da autora ou oneração excessiva da requerida, adequando-se, ademais, aos parâmetros adotados pela jurisprudência em casos análogos. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, para CONDENAR a requerida GOL LINHAS AÉREAS S.A. ao pagamento de indenização por danos morais em favor da autora LIVIA MARIA KOPPENHAGEN SAVARIS, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), corrigidos monetariamente pelo INPC a partir da data da publicação desta sentença (Súmula 362 do STJ) e acrescidos de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação (artigo 405 do Código Civil), por se tratar de responsabilidade contratual. Em consonância com o princípio da causalidade, condeno a requerida ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação. Publique-se. Intime-se. Cumpra-se, expedindo-se o necessário e com as cautelas de estilo. Após, remetam-se os autos ao arquivo, com as cautelas e anotações necessárias. Campo Novo do Parecis/MT, datado e assinado eletronicamente. Cláudia Anffe Nunes da Cunha Juíza de Direito

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Mitsui Sumitomo Seguros S.A. x Energisa Mato Grosso - Distribuidora De Energia S.A.

ID: 320888230

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ÚNICA DE VILA BELA DA SANTÍSSIMA TRINDADE Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1000123-24.2024.8.11.0077

Data de Disponibilização: 09/07/2025

Polo Ativo:

MITSUI SUMITOMO SEGUROS S.A.

Polo Passivo:

ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A.

Sentença

Advogados:

DENNER DE BARROS E MASCARENHAS BARBOSA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

JOSE CARLOS VAN CLEEF DE ALMEIDA SANTOS

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE VILA BELA DA SANTÍSSIMA TRINDADE SENTENÇA Processo: 1000123-24.2024.8.11.0077. AUTOR(A): MITSUI SUMITOMO SEGUROS S.A. REU: ENERGISA MATO GROSSO - … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE VILA BELA DA SANTÍSSIMA TRINDADE SENTENÇA Processo: 1000123-24.2024.8.11.0077. AUTOR(A): MITSUI SUMITOMO SEGUROS S.A. REU: ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. Trata-se de Ação Regressiva de Ressarcimento de Danos ajuizada por MITSUI SUMITOMO SEGUROS S.A. em desfavor de ENERGISA MATO GROSSO - DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A., objetivando o ressarcimento da quantia paga ao segurado em virtude de sinistro decorrente de oscilação na rede elétrica. Alega a autora que mantinha contrato de seguro com o Sr. CARLOS ALBERTO PIOTTO, mediante Apólice de Seguros nº 01140352882, que cobria, dentre outras coberturas, danos elétricos. Afirma que em 12 de outubro de 2022, a unidade consumidora do segurado foi atingida por oscilações na rede de energia elétrica, fornecida pela ré, o que causou danos a um refrigerador. Informa que o segurado abriu sinistro nº 011400020519, sendo realizada avaliação técnica que constatou que os danos ao equipamento foram causados por oscilações de energia oriundas de descargas elétricas. Relata que, após regular processo de regulação de sinistro, realizou o pagamento de indenização ao segurado no valor de R$ 4.472,01 (quatro mil, quatrocentos e setenta e dois reais e um centavo), já deduzida a franquia correspondente ao seguro contratado, em 13/03/2023. Em razão disso, sub-rogou-se nos direitos do segurado, conforme previsto no art. 786 do Código Civil e Súmula 188 do STF, pleiteando o ressarcimento deste valor junto à ré. Afirma que enviou notificação extrajudicial à ré comunicando o sinistro, porém a tentativa de composição restou infrutífera. Sustenta que os distúrbios de tensão ocorreram em razão de falha na prestação do serviço pela concessionária, que não forneceu energia elétrica dentro dos padrões de qualidade estabelecidos pela ANEEL. Juntou documentos. A ré apresentou contestação alegando, preliminarmente: (i) necessidade de prévio esgotamento da via administrativa; (ii) inépcia da inicial por ausência de documentos essenciais; e (iii) não aplicabilidade da inversão do ônus da prova. No mérito, sustentou a inexistência de nexo causal entre sua conduta e os danos alegados, aduzindo que os laudos apresentados pela autora foram produzidos unilateralmente, sem a devida qualificação técnica. Arguiu ainda a ocorrência de caso fortuito ou força maior como excludentes de responsabilidade, bem como culpa exclusiva do usuário por possíveis falhas na instalação interna da unidade consumidora. Requereu a produção de prova pericial e juntou prova emprestada relativa a caso semelhante, além de documentos de seu sistema interno. A autora apresentou réplica impugnando os argumentos da ré e os documentos por ela juntados, reafirmando o direito à inversão do ônus da prova e apontando que os laudos técnicos apresentados estão de acordo com o Módulo 9 do PRODIST/ANEEL, sendo suficientes para demonstrar o nexo causal. Na fase de especificação de provas, a ré requereu a produção de prova pericial técnica para verificação dos equipamentos danificados, enquanto a autora requereu a produção de prova documental, com a determinação para que a ré apresentasse os cinco relatórios previstos no Módulo 9 do PRODIST/ANEEL. É o relatório do necessário. DECIDO. PRELIMINARES 1.1 Da desnecessidade de prévio esgotamento da via administrativa A preliminar de falta de interesse de agir pela ausência de prévia reclamação administrativa não merece acolhimento. O ordenamento jurídico brasileiro consagra o princípio da inafastabilidade da jurisdição, insculpido no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, que assegura a todos o direito de acesso ao Poder Judiciário independentemente de prévio esgotamento das vias administrativas. Ademais, conforme se depreende dos autos, a autora enviou notificação extrajudicial à ré comunicando o sinistro e tentando composição amigável, o que já seria suficiente para caracterizar a pretensão resistida, ainda que tal procedimento não fosse necessário. O fato de existir regulamentação da ANEEL sobre procedimento administrativo para ressarcimento de danos elétricos não impede o exercício do direito de ação, sendo certo que resolução administrativa não pode se sobrepor a garantia constitucional. Rejeito, portanto, a preliminar. 1.2 Da alegação de inépcia da inicial por ausência de documentos essenciais A preliminar de inépcia da inicial por ausência de documentos indispensáveis também não merece prosperar. Da análise dos autos, verifica-se que a petição inicial veio instruída com a apólice de seguro, laudo técnico elaborado por empresa especializada atestando a origem elétrica do dano, comprovante de pagamento da indenização ao segurado, além dos demais documentos que comprovam a relação jurídica estabelecida entre as partes. A petição inicial preenche todos os requisitos do art. 319 do CPC, estando a narração lógica e coerente com o pedido formulado, além de estar instruída com os documentos indispensáveis à propositura da ação, conforme exige o art. 320 do mesmo diploma legal. Os laudos técnicos juntados pela autora, embora questionados pela ré quanto à sua idoneidade, são documentos hábeis para demonstrar, ao menos em tese, o nexo causal entre a conduta da ré e os danos alegados, questão que se confunde com o mérito e com ele será analisada. Rejeito, pois, a preliminar de inépcia da inicial. 1.3 Da alegação de não aplicabilidade da inversão do ônus da prova Quanto à alegação de não aplicabilidade da inversão do ônus da prova, consigno que tal questão será analisada no tópico relativo à distribuição do ônus probatório, não configurando propriamente uma preliminar, mas sim matéria afeta à instrução processual e à valoração da prova. Do julgamento antecipado da lide O caso comporta julgamento no estado em que se encontra, na forma do art. 355, I, do Código de Processo Civil, sendo desnecessária a produção de outras provas além daquelas já constantes dos autos, que se mostram suficientes para o deslinde da controvérsia. Embora a ré tenha requerido a produção de prova pericial, entendo que tal medida é desnecessária no caso concreto. Isso porque já consta dos autos laudo técnico elaborado por profissional da área, que atesta a origem elétrica do dano ocorrido no equipamento do segurado da autora. Tal laudo, produzido em conformidade com as normas da ANEEL (Módulo 9 do PRODIST), é documento hábil para comprovar o nexo causal entre a oscilação na rede elétrica e os danos verificados. A Resolução Normativa da ANEEL nº 1.000/2021 e o Módulo 9 do PRODIST estabelecem que o laudo de oficina é documento suficiente para atestar a origem elétrica do dano, não havendo necessidade de outras provas quando este já se encontra nos autos. Ademais, dada a natureza dos equipamentos danificados, que são de uso cotidiano e cuja substituição se fez necessária de imediato, bem como considerando o tempo decorrido desde o evento danoso, a realização de perícia técnica se mostra inviável e não traria elementos novos capazes de alterar o convencimento do juízo. Quanto à prova documental requerida pela autora, consistente na apresentação pela ré dos cinco relatórios previstos no Módulo 9 do PRODIST/ANEEL, verifico que tal pretensão está preclusa, uma vez que a ré teve oportunidade de juntar tais documentos, não o tendo feito adequadamente. Aplica-se, portanto, a presunção de veracidade quanto a este ponto específico. Assim, presentes nos autos elementos suficientes para o julgamento da lide, indefiro os pedidos de produção de provas formulados pelas partes e passo à análise do mérito. Mérito A presente ação regressiva encontra fundamento no art. 786 do Código Civil, que estabelece: "Paga a indenização, o segurador sub-roga-se, nos limites do valor respectivo, nos direitos e ações que competirem ao segurado contra o autor do dano". No mesmo sentido, a Súmula 188 do STF dispõe que "o segurador tem ação regressiva contra o causador do dano, pelo que efetivamente pagou, até ao limite previsto no contrato de seguro". Trata-se de hipótese de sub-rogação legal, em que a seguradora, ao pagar a indenização ao segurado, adquire o direito de buscar o ressarcimento perante o causador do dano, nos limites do valor pago. No caso dos autos, a autora comprovou: (i) a existência de contrato de seguro com o Sr. Carlos Alberto Piotto, cobrindo danos elétricos; (ii) a ocorrência de oscilação na rede elétrica no dia 12 de outubro de 2022; (iii) os danos causados ao refrigerador do segurado, com nexo causal atestado por laudo técnico; e (iv) o pagamento da indenização ao segurado no valor de R$ 4.472,01, já deduzida a franquia correspondente ao seguro contratado. Por sua vez, a ré não logrou êxito em comprovar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da autora. Apesar de alegar caso fortuito ou força maior e culpa exclusiva do usuário, não apresentou elementos concretos que pudessem sustentar tais alegações. Quanto ao nexo causal, verifico que o laudo técnico apresentado pela autora atesta de forma clara que os danos ao refrigerador do segurado foram causados por oscilação na rede elétrica. Tal documento, elaborado por empresa especializada, está em conformidade com as normas da ANEEL (Módulo 9 do PRODIST) e é suficiente para demonstrar o nexo causal entre a falha na prestação do serviço pela ré e os danos verificados. A concessionária de serviço público responde objetivamente pelos danos causados aos usuários, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal. Isso significa que, comprovados o dano e o nexo causal, surge o dever de indenizar, independentemente de culpa. As únicas hipóteses que poderiam afastar tal responsabilidade seriam a culpa exclusiva da vítima, o caso fortuito ou a força maior, nenhuma das quais restou demonstrada nos autos. No caso em tela, a ré, na qualidade de concessionária de serviço público, tem a obrigação de fornecer energia elétrica de qualidade, dentro dos padrões estabelecidos pela ANEEL. As oscilações na rede elétrica que causaram danos aos equipamentos do segurado configuram falha na prestação do serviço, sendo a concessionária responsável pelos prejuízos decorrentes. A jurisprudência dos tribunais pátrios é pacífica no sentido de que a responsabilidade das concessionárias de energia elétrica por danos decorrentes de oscilações na rede é objetiva, cabendo a elas demonstrar que tomaram todas as medidas necessárias para evitar tais eventos, o que não ocorreu no presente caso. Vejamos: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REGRESSIVA DE RESSARCIMENTO DE DANOS – SEGURADORA CONTRA CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA ELÉTRICA – DESCARGA ELÉTRICA, OSCILAÇÃO E CURTO-CIRCUITO – FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO EVIDENCIADA – APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – RESPONSABILIDADE OBJETIVA – PAGAMENTO REFERENTE A PERDA DE EQUIPAMENTOS ELETRÔNICOS – COMPROVAÇÃO POR LAUDO TÉCNICO E NOTAS FISCAIS – SUB-ROGAÇÃO – POSSIBILIDADE – DESNECESSIDADE DE ABERTURA DE PROCEDIMENTO NA ESFERA ADMINISTRATIVA – OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR EVIDENCIADA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. A responsabilidade das concessionárias de energia elétrica é objetiva, ou seja, independe de culpa, bastando a comprovação do prejuízo e do nexo de causalidade entre a ação (comissiva ou omissiva) e o dano. Aplica-se o CDC nos casos em que a seguradora é considerada consumidora por sub-rogação, exercendo direitos, privilégios e garantias do seu segurado/consumidor. A seguradora tem o direito de buscar os valores que desembolsou, via ação regressiva contra o causador do ato ilícito, nos limites da sub-rogação. O exaurimento da via administrativa é prescindível para o ajuizamento de ação regressiva contra a concessionária de energia, uma vez que não há embasamento jurídico que obrigue a seguradora ao prévio pedido na esfera administrativa para, somente depois, ingressar com a ação judicial, conforme inteligência do princípio constitucional do livre acesso ao Poder Judiciário, insculpido no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal. (N.U 1013492-33.2023.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 16/06/2025, Publicado no DJE 16/06/2025) APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REGRESSIVA DE RESSARCIMENTO DE DANOS – SEGURADORA SUB-ROGADA – PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA REJEITADA – MÉRITO – OSCILAÇÃO DE ENERGIA – QUEIMA DE EQUIPAMENTO ELETRÔNICO – NEXO CAUSAL DEMONSTRADO – DEVER DE INDENIZAR – RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA DE ENERGIA – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. Demonstrado o nexo de causalidade entre a atividade da concessionária de energia elétrica e os danos ocorridos nos equipamentos dos segurados, em razão de defeito no fornecimento de energia elétrica, surge o dever de ressarcimento da seguradora pelos valores desembolsados ao segurado. Vencida a apelada, a inversão do ônus sucumbencial em seu desfavor é medida que se impõe, com adequação de sua base de cálculo. Incabível a majoração dos honorários na fase recursal em caso de provimento do apelo. (N.U 1015427-28.2023.8.11.0003, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 15/06/2025, Publicado no DJE 15/06/2025) Ademais, as telas de sistema interno apresentadas pela ré não são suficientes para afastar o nexo causal, logo, não se desincumbiu de seu ônus probatório, a teor do que dispõe o artigo 373, II, do CPC. Logo, cabível a condenação da ré ao ressarcimento dos prejuízos sofridos pelo consumidor, sendo certo que a autora sub-rogou-se nos direitos deste. Por fim, verifica-se dos documentos juntados na inicial o pagamento pela requerente aos segurados, totalizando o valor de R$ 4.472,01 (quatro mil, quatrocentos e setenta e dois reais e um centavo), fazendo jus, portanto, ao ressarcimento da quantia paga. Dispositivo Posto isto, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil JULGO PROCEDENTE esta ação regressiva de ressarcimento proposta por MAPFRE SEGUROS GERAIS S.A., contra ENERGISA MATO GROSSO – DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. ao pagamento da quantia de R$ 4.472,01 (quatro mil, quatrocentos e setenta e dois reais e um centavo) Destaco que a correção monetária e os juros de mora devem ser calculados pela Taxa SELIC até a vigência da Lei n. 14.905/2024, quando então será aplicado o IPCA para correção e SELIC para juros, abatido desta o valor do IPCA Para fins de correção, deve ser considerada como data do evento danoso aquela em que a seguradora efetuou o desembolso da quantia para reparo dos prejuízos. Custas processuais deverão ser suportadas pela ré, assim como honorários advocatícios de sucumbência, que fixo em 10% (dez por cento) do valor da condenação (artigos 82, §2º e 85, §2º, CPC). Transitado em julgado, ARQUIVEM-SE os autos, com as baixas necessárias. Publique-se. Registre-se. Intime-se. CUMPRA-SE, providenciando e expedindo o necessário. PIERRO DE FARIA MENDES Juiz de Direito designado para o NAE PORTARIAN. 133/2025- GAB-CGJ, de 27 de junho de 2025

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Processo nº 1002226-17.2024.8.11.0105

ID: 330143036

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ÚNICA DE COLNIZA Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1002226-17.2024.8.11.0105

Data de Disponibilização: 21/07/2025

Polo Ativo:

SERGIO BASTOS DOS SANTOS

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

INAITA GOMES RIBEIRO SOARES CARVALHO

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ROGER RODRIGUES FARIA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA | COLNIZA/MT SENTENÇA PROCESSO Nº: 1002226-17.2024.8.11.0105 1. RELATÓRIO Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C OBRIGAÇÃO DE FA… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA | COLNIZA/MT SENTENÇA PROCESSO Nº: 1002226-17.2024.8.11.0105 1. RELATÓRIO Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER E PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, proposta por SERGIO BASTOS DOS SANTOS em face de ENERGISA MATO GROSSO – DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. A parte autora sustenta ser titular da unidade consumidora de energia elétrica nº 6/3776121-0, localizada em área rural, e que a partir de janeiro de 2024 experimentou elevação desproporcional nas faturas de energia elétrica. Segundo consta da inicial, o valor da fatura passou de R$ 275,75 referente a dezembro de 2023 para R$ 2.644,64 em janeiro de 2024, configurando aumento de aproximadamente 959% sem justificativa técnica adequada. O demandante argumenta que tal variação não corresponde aos hábitos de consumo praticados na propriedade rural e que a concessionária falhou na prestação do serviço ao não observar os procedimentos regulamentares aplicáveis. Aduz ainda que procurou solucionar a questão administrativamente, sem êxito, e que permanece sob ameaça de suspensão do fornecimento de energia elétrica. Em seus pedidos, requer a declaração de nulidade das faturas contestadas dos meses de janeiro a setembro de 2024, a realização de vistoria nos equipamentos de medição, a abstenção de corte no fornecimento de energia elétrica, bem como condenação da requerida ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (ID. 174809804). A requerida ofereceu contestação sustentando a regularidade da cobrança, alegando que o consumo faturado corresponde exatamente ao registrado pelo medidor instalado na unidade consumidora. Esclarece que se trata de unidade localizada em zona rural, sujeita ao regime de leitura plurimensal conforme estabelecido na Resolução ANEEL nº 1.000/2021. Argumenta que o aumento verificado decorreu do acúmulo de energia não computado nos meses anteriores, quando o faturamento ocorreu pela média de consumo, prática autorizada pela regulamentação setorial (ID. 184924645). A demandada sustenta ainda a inexistência de ato ilícito, uma vez que agiu em conformidade com a legislação vigente, e impugna o pedido de indenização por danos morais, argumentando que não houve suspensão do serviço nem inscrição do nome da autora em órgãos de proteção ao crédito. A parte autora apresentou impugnação à contestação, reiterando seus argumentos iniciais e sustentando que a requerida não comprovou ter observado os requisitos estabelecidos nos artigos 272 e 273 da Resolução ANEEL nº 1.000/2021, especificamente quanto à comunicação prévia sobre o sistema de leitura plurimensal e disponibilização de meios para autoleitura (ID. 187545978). Intimadas para especificação de provas, a requerida manifestou não pretender produzir outras além daquelas já constantes dos autos (ID. 191451795), enquanto a autora requereu a produção de depoimento pessoal e prova documental (ID. 193533953). 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. Da Desnecessidade de Produção de Outras Provas Preliminarmente, cumpre decidir sobre a produção das provas requeridas pela parte autora. O depoimento pessoal pleiteado revela-se desnecessário para o deslinde da controvérsia, considerando que a matéria controvertida é eminentemente técnica e documental, envolvendo análise de registros de consumo, histórico de faturamento e aplicação de normas regulamentares específicas do setor elétrico. Os elementos probatórios já constantes dos autos, incluindo o histórico de consumo da unidade consumidora, as faturas de energia elétrica questionadas e os documentos técnicos apresentados pela concessionária, são suficientes para a formação do convencimento judicial e adequada resolução da lide. Dessa forma, INDEFIRO a produção da prova oral requerida pela parte autora e DECLARO ENCERRADA a fase instrutória, nos termos do artigo 370, parágrafo único, do Código de Processo Civil. 2.2. Do Mérito Ressalto, inicialmente, que no presente caso incide as regras do Código de Defesa do Consumidor, pelo fato de que a Concessionária é prestadora de serviço e deve, portanto, assumir os riscos inerentes à sua própria atividade quando estes ocasionarem danos a terceiros. Deste modo, se sujeita ao que se aplicam os art. 6, X e 14 do CDC: "Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral." "Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos." No caso dos autos, verifica-se que o imóvel do autor está, de fato, localizado em zona rural, e, nesses casos, a Resolução nº 1.000/2021 da ANEEL dispõe que: “Seção IV Da Leitura Plurimensal Art. 271. A distribuidora pode realizar a leitura em intervalos de até 12 ciclos consecutivos em unidade consumidora do grupo B localizada em zona rural. Parágrafo único. O consumidor pode realizar a autoleitura nos ciclos em que não houver leitura realizada pela distribuidora. Art. 272. A distribuidora que adotar a leitura plurimensal deve comunicar essa medida ao consumidor envolvido, dando conhecimento do processo utilizado, dos objetivos pretendidos e das instruções para realização da autoleitura. Art. 273. Para a realização da autoleitura, a distribuidora deve disponibilizar meios para o consumidor controlar e enviar as informações, tais como calendário impresso, agência de atendimento, central de teleatendimento, terminal de autoatendimento, página na Internet, aplicativo de celular ou outros canais de relacionamento com o consumidor. Art. 274. A distribuidora deve estabelecer e informar ao consumidor o calendário para o envio da autoleitura, contendo pelo menos 7 dias consecutivos para o consumidor enviar a informação. Art. 275. Caso o consumidor não envie a autoleitura de acordo com o calendário previamente estabelecido, o faturamento deve ser realizado conforme disposto no art. 288. Art. 276. A distribuidora deve realizar a leitura no ciclo subsequente sempre que o consumidor não enviar a autoleitura por 2 ciclos consecutivos.” Embora a ré tenha refutado os fatos alegados na inicial, não se desincumbiu de apresentar prova robusta de que o autor consumiu de fato os valores cobrados, nem demonstrou o cumprimento das determinações dos artigos 272 e 273 da referida resolução. Aliás, não apresentou sequer os detalhes das cobranças (faturas discriminadas), cujo ônus lhe competia, conforme o artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil. Examinando detidamente o histórico de consumo da unidade consumidora em questão, constata-se variação desproporcional e tecnicamente injustificada entre os períodos de dezembro de 2023 e janeiro de 2024. Conforme demonstrado no histórico apresentado pela própria requerida, o consumo passou de 283,67 kWh em dezembro de 2023 para 2.335 kWh em janeiro de 2024, representando aumento de aproximadamente 723% e, assim, seguiu até o mês de setembro de 2024. A requerida justifica tal elevação alegando tratar-se de "acúmulo de energia não registrado nos meses imediatamente anteriores" quando o faturamento ocorreu pela média de consumo. Contudo, tal explicação não encontra respaldo técnico adequado quando confrontada com o histórico de consumo da unidade, que demonstra padrão relativamente estável nos meses precedentes. Mais relevante ainda é a constatação de que a requerida não logrou demonstrar ter cumprido os requisitos estabelecidos nos artigos 272 e 273 da Resolução ANEEL nº 1.000/2021. Não há nos autos qualquer comprovação de que tenha sido comunicado ao consumidor sobre a implementação do sistema de leitura plurimensal, tampouco evidência de que tenham sido disponibilizados meios adequados para realização da autoleitura. Ademais, instadas as partes a produzirem provas, não houve pedido de produção de prova pericial pela parte requerida, que, por sua vez, pleiteou pelo julgamento antecipado da lide. Portanto, inexistindo nos autos provas que justifiquem as faturas cobradas, a declaração de sua inexigibilidade é medida de rigor. Esse é o entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso: "DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. ENERGIA ELÉTRICA. COBRANÇA ABUSIVA. CONSUMO EXORBITANTE DESTOANTE DA MÉDIA HISTÓRICA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. REVISÃO DE FATURAS. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME: Apelação Cível interposta contra sentença proferida nos autos da Ação de Revisão de Contrato de Consumo c/c Dano Moral, a qual julgou parcialmente procedente os pedidos para: (i) determinar a revisão das faturas de energia elétrica referentes aos meses de janeiro a abril de 2020, com base na média mensal de 203,54 kWh; (ii) ordenar a compensação de valores depositados judicialmente; e (iii) condenar a concessionária ao pagamento de R$ 8.000,00 a título de danos morais. A concessionária apelante sustentou a regularidade da medição, a inexistência de ilicitude e requereu a improcedência dos pedidos ou, subsidiariamente, a redução do valor da indenização. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: Há três questões em discussão: (i) verificar se a cobrança das faturas de energia elétrica relativas ao período de janeiro a abril de 2020 foi abusiva; (ii) avaliar se a suspensão do fornecimento de energia e a negativação do nome da consumidora caracterizam dano moral indenizável; e (iii) determinar se o valor arbitrado a título de reparação moral deve ser reduzido. III. RAZÕES DE DECIDIR: O Código de Defesa do Consumidor se aplica à relação jurídica em questão, impondo à concessionária o ônus de demonstrar a regularidade das cobranças, nos termos do art. 6º, VIII, da Lei 8.078/90. A concessionária não comprovou, nos autos, a regularidade das cobranças realizadas, limitando-se a apresentar alegações genéricas e documentos unilaterais, sem demonstrar a efetiva ocorrência de consumo nos valores registrados. Laudo pericial emprestado de autos conexos apontou média mensal de consumo da unidade consumidora de 203,54 kWh, significativamente inferior aos valores cobrados nas faturas impugnadas (até 679 kWh), evidenciando desproporção injustificada. Diante da ausência de justificativa plausível para o aumento abrupto no consumo e da falha em demonstrar a veracidade da medição, impõe-se a revisão das faturas para refletir a média histórica de consumo, afastando-se encargos adicionais como juros, multa e correção monetária. A interrupção do fornecimento de energia elétrica, serviço essencial, bem como a negativação indevida do nome da consumidora, caracteriza dano moral in re ipsa, nos termos dos arts. 6º, VI, e 14 do CDC, e arts. 186 e 927 do CC. O valor de R$ 8.000,00 fixado a título de danos morais observa os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, sendo adequado à extensão do dano, à natureza do serviço e ao efeito pedagógico da condenação. IV. DISPOSITIVO E TESE: Recurso desprovido. Tese de julgamento: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor às relações entre concessionária de energia elétrica e consumidor, autorizando a inversão do ônus da prova em favor da parte hipossuficiente. A cobrança de faturas com valores significativamente superiores à média histórica de consumo, sem comprovação da efetiva leitura e da regularidade do medidor, caracteriza abuso e enseja revisão. A interrupção indevida do fornecimento de energia elétrica, serviço essencial, e a consequente negativação do nome do consumidor configuram dano moral presumido e indenizável. O valor da indenização por danos morais deve observar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, levando em conta a gravidade da conduta, o abalo causado e o caráter pedagógico da medida. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X e XXXII; CC, arts. 186, 389, parágrafo único, 406, §1º, e 927; CDC, arts. 2º, 3º, 6º, VI e VIII, e 14; CPC, arts. 373, II, 374 e 487, I. Jurisprudência relevante citada: TJMT, Apelação Cível n.º 1000113-31.2023.8.11.0039, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, Terceira Câmara de Direito Privado, j. 29.01.2025, DJE 31.01.2025. TJMT, Apelação Cível n.º 1003672-45.2021.8.11.0013, Rel. Des. Sebastião Barbosa Farias, Primeira Câmara de Direito Privado, j. 24.01.2023, DJE 30.01.2023. TJMT, Apelação Cível n.º 0001014-06.2018.8.11.0002, Rel. Des. Guiomar Teodoro Borges, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 10.03.2021, DJE 15.03.2021." (N.U 1006489-32.2020.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 02/07/2025, Publicado no DJE 02/07/2025) No que concerne ao pedido de indenização por danos morais, embora tenha havido falha na prestação do serviço, não se verifica ofensa aos atributos da personalidade da parte autora que justifique reparação extrapatrimonial. A situação narrada nos autos, conquanto configure aborrecimento legítimo, não extrapola o mero dissabor inerente às relações de consumo. Para a configuração do dano moral indenizável, é necessário que o ato lesivo transcenda o simples inadimplemento contratual ou falha na prestação do serviço, atingindo efetivamente a dignidade, honra ou integridade psicológica do consumidor. No presente caso, não houve suspensão do fornecimento de energia elétrica nem inscrição do nome da autora em órgãos de proteção ao crédito, circunstâncias que poderiam caracterizar dano extrapatrimonial. A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso tem entendimento firme no sentido de que " No que tange ao pedido de danos morais, não se verifica interrupção do fornecimento de energia elétrica, tampouco ofensa ao direito de personalidade da parte autora que justifique a reparação pleiteada. Assim, o pleito não pode prosperar neste ponto" (N.U 1000123-33.2023.8.11.0053). 3. DISPOSITIVO Ante o exposto, analisando os fatos, o direito aplicável e considerando as provas constantes dos autos, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial para: a) DECLARAR a nulidade das cobranças de energia elétrica da unidade consumidora nº 6/3776121-0 referentes aos meses de janeiro a setembro de 2024; b) DETERMINAR que a requerida proceda ao refaturamento das contas do período mencionado, no prazo de 60 (sessenta) dias, utilizando como parâmetro os últimos 12 ciclos; c) DETERMINAR que a requerida se abstenha definitivamente de suspender o fornecimento de energia elétrica da unidade consumidora em razão dos débitos ora declarados nulos, bem como de incluir o nome da parte autora em cadastros de inadimplentes relativamente a tais valores; d) JULGAR IMPROCEDENTE o pedido de indenização por danos morais, pelos fundamentos acima expostos. Em razão da sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios em 50%, nos termos do artigo 86 do CPC. Fixo os honorários em 10% do valor atualizado da causa, nos termos do artigo 85, § 2º, do CPC. PUBLIQUE-SE. REGISTRE-SE. INTIMEM-SE. Certificado o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com as cautelas de praxe. Cumpram-se, no que forem aplicáveis, as disposições do Código de Normas da Egrégia Corregedoria de Justiça do TJMT. Colniza/MT, datado e assinado digitalmente. GUILHERME LEITE RORIZ Juiz de Direito Substituto

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Bassani Comercio De Combustiveis Ltda - Epp x Cielo S.A.

ID: 307992462

Tribunal: TJMT Órgão: 2ª VARA DE CAMPO NOVO DOS PARECIS Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1000123-71.2025.8.11.0050

Data de Disponibilização: 26/06/2025

Polo Ativo:

BASSANI COMERCIO DE COMBUSTIVEIS LTDA - EPP

Polo Passivo:

CIELO S.A.

Sentença

Advogados:

LUCAS MOSSI DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MATO GROSSO COMARCA DE CAMPO NOVO DO PARECIS 2ª VARA DE CAMPO NOVO DOS PARECIS - PJe SENTENÇA NÚMERO DO PROCESSO: 1000123-71.2025.8.11.0050 VALOR DA CAUSA: R$ 36.557,86 … PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE MATO GROSSO COMARCA DE CAMPO NOVO DO PARECIS 2ª VARA DE CAMPO NOVO DOS PARECIS - PJe SENTENÇA NÚMERO DO PROCESSO: 1000123-71.2025.8.11.0050 VALOR DA CAUSA: R$ 36.557,86 ESPÉCIE: [Prestação de Serviços, Indenização por Dano Material]->PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Vistos. Trata-se de ação indenizatória por danos materiais emergentes ajuizada por BASSANI COMÉRCIO DE COMBUSTÍVEIS LTDA - EPP em face de CIELO S.A., ambos qualificados nos autos. Em síntese, alega a parte autora que celebrou contrato com a empresa ré para a prestação de serviços de captura, roteamento, transmissão e processamento das vendas efetuadas com cartões de crédito e débito em seu estabelecimento. Afirma que a ré cobrou percentuais superiores aos contratados nas transações realizadas no período de 05/11/2019 até 26/10/2024, gerando-lhe prejuízos no valor de R$ 36.557,86 (trinta e seis mil, quinhentos e cinquenta e sete reais e oitenta e seis centavos). Sustenta que realizou análise minuciosa das operações e constatou divergências entre o que foi contratado e o que efetivamente foi aplicado pela requerida em cada transação. Anexou à inicial planilhas detalhadas das inconsistências identificadas. A petição inicial foi instruída com os documentos pertinentes, incluindo relatórios de inconsistências e extratos das operações. Citada, a requerida apresentou contestação (ID 191423743), arguindo preliminarmente: a) ausência de pretensão resistida; b) ausência de comprovante de residência; c) vício de representação; d) ausência de procuração válida; e) lapso temporal da documentação; f) inépcia da inicial; g) prescrição; e h) decadência. No mérito, defende a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor, a regularidade dos repasses efetuados conforme contrato e a ausência de comprovação dos danos alegados. Audiência de conciliação infrutífera, conforme termo de ID 192092084. A parte autora apresentou impugnação à contestação (ID 192531639), refutando as preliminares e reafirmando os argumentos da inicial, destacando que a requerida não impugnou especificamente as inconsistências apontadas. As partes foram intimadas para especificarem provas, tendo a parte autora manifestado pelo julgamento antecipado da lide (ID 193321693). A parte autora apresentou memoriais finais (ID 195296193). É o relatório. Fundamento e decido. DAS PRELIMINARES Da ausência de pretensão resistida Sustenta a ré a ausência de interesse processual da autora, sob o fundamento de que esta não teria buscado a solução da controvérsia pela via administrativa. A preliminar não merece acolhimento. O ordenamento jurídico pátrio consagra o princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5º, XXXV, CF), não sendo exigível o esgotamento da via administrativa como condição para o acesso à tutela jurisdicional, salvo hipóteses expressamente previstas em lei, o que não é o caso dos autos. Além disso, verifica-se que a própria ré reconhece, em sua contestação, que a autora teria solicitado informações relativas às taxas aplicadas, o que evidencia a resistência à pretensão. Rejeito, portanto, a preliminar de falta de interesse processual. Da ausência de comprovante de residência Igualmente rejeito a preliminar de ausência de comprovante de residência, pois o contrato social da empresa autora contém seu endereço completo, sendo suficiente para identificação do domicílio e verificação da competência territorial. Do vício de representação e ausência de procuração válida Quanto às preliminares de vício de representação e ausência de procuração válida, verifico que a procuração juntada aos autos (ID 181041579) foi devidamente outorgada e contém poderes suficientes para propositura da presente ação, não havendo que se falar em defeito de representação processual. Do lapso temporal da documentação e inépcia da inicial Rejeito as preliminares de lapso temporal da documentação e inépcia da inicial, uma vez que a petição inicial atende aos requisitos do art. 319 do CPC, contendo causa de pedir e pedido determinados, além de vir instruída com documentação suficiente à compreensão da controvérsia. Da prescrição e decadência No tocante à prescrição e decadência, verifico que não assiste razão à parte requerida. A jurisprudência tem se consolidado no sentido de que a pretensão de ressarcimento por cobranças indevidas decorrentes de relação contratual submete-se ao prazo prescricional de 10 (dez) anos, previsto no art. 205 do Código Civil. Neste sentido: APELAÇÕES CÍVEIS - AMBAS AS PARTES - AÇÃO REVISONAL CONTRATUAL CUMULADA COM REPETIÇÃO DO INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – PREJUDICIAL DE MÉRITO – DECADÊNCIA – OBRIGAÇÃO DE TRATO SUCESSIVO – REJEITADA - COBRANÇA INDEVIDA - CONTRATAÇÃO NÃO COMPROVADA - INEXISTÊNCIA DA RELAÇÃO JURÍDICA - RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES DOS VALORES DESCONTADOS INDEVIDAMENTE - DANOS MORAIS CONFIGURADOS – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA – READEQUAÇÃO – FIXAÇÃO COM BASE NO PROVEITO ECONÔMICO - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO DA AUTORA PROVIDO - RECURSO DO REQUERIDO PARCIALMENTE PROVIDO. Não configurada a decadência/prescrição, porquanto o caso é de obrigação de trato sucessivo, já que há renovação automática do pacto ao longo do tempo, por meio dos descontos realizados mensalmente. “(...). 1. A jurisprudência do STJ entende que a pretensão de repetição de valores pagos indevidamente em função de contrato bancário está sujeita ao prazo prescricional vintenário na vigência do CC/1916 e ao decenal na vigência do CC/2002, contado da efetiva lesão, ou seja, do pagamento. (...)” (AgInt no AREsp 1234635/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 01/03/2021, DJe 03/03/2021). Configura falha na prestação do serviço a conduta da instituição financeira que realiza descontos na conta corrente do consumidor, relativos a contrato de empréstimo, cuja contratação não foi comprovada. Se ausente comprovação da origem da dívida questionada, é caso de declarar a inexistência da relação jurídica, bem como resta configurada situação geradora de danos morais. No arbitramento do valor dos danos morais, há que levar em conta as circunstâncias do caso concreto, é dizer, as condições das partes, o comportamento da parte e, principalmente, a finalidade da reparação do dano moral, que é, de um lado, compensar o dano ocorrido, e, de outro desestimular a conduta abusiva. A devolução em dobro tem por pressuposto a má-fé daquele que indevidamente recebeu e não se visualizam elementos capazes de assegurar tenha a Instituição Financeira agido com propósito maldoso, a ponto de justificar a devolução com essa pesada punição. Conforme decidido pelo STJ e por esta Corte de Justiça, o artigo 85 do CPC estabelece uma ordem de preferência quanto ao parâmetro a ser utilizado para fixação dos honorários advocatícios de sucumbência: em primeiro lugar, deve ser utilizado o valor da condenação; em segundo, o critério será o do proveito econômico alcançado com a ação e em terceiro, quando não for possível mensurar o proveito econômico, deve ser considerado o valor atualizado da causa como balizador dos honorários. (N.U 1026718-42.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, GUIOMAR TEODORO BORGES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 08/12/2023, Publicado no DJE 08/12/2023) Ademais, a cláusula 23ª do contrato, que estabelece prazo de 30 dias para questionamento sobre repasses, caracteriza-se como abusiva no contexto da relação jurídica em análise, não podendo limitar o direito da parte autora de buscar a reparação pelos prejuízos sofridos. Portanto, considerando que a ação foi proposta para questionar cobranças realizadas no período de 05/11/2019 até 26/10/2024, não há que se falar em prescrição ou decadência. DO MÉRITO O primeiro ponto controvertido a ser analisado diz respeito à aplicabilidade ou não do Código de Defesa do Consumidor à relação jurídica estabelecida entre as partes. A parte ré sustenta a inaplicabilidade do CDC, alegando que a autora não seria destinatária final dos serviços prestados, por utilizá-los como insumo de sua atividade empresarial. Contudo, o entendimento jurisprudencial contemporâneo, inclusive do Superior Tribunal de Justiça, tem mitigado a aplicação da teoria finalista, admitindo a incidência do CDC mesmo quando a pessoa jurídica não é destinatária final do produto ou serviço, desde que se encontre em situação de vulnerabilidade técnica, jurídica ou econômica frente ao fornecedor. Trata-se da chamada "teoria finalista mitigada", aplicável precisamente a casos como o dos autos, em que a parte autora, embora utilize os serviços de máquina de cartão como meio de viabilizar sua atividade comercial, encontra-se em evidente situação de vulnerabilidade técnica e jurídica perante a ré, não possuindo conhecimentos específicos sobre o sistema de captura e processamento de pagamentos com cartões, tampouco poder de negociação das cláusulas contratuais. Nesse sentido, é o entendimento jurisprudencial: DIREITO CIVIL E DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALORES C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. MÁQUINA DE CARTÃO. RETENÇÃO INDEVIDA DE VALORES. APLICAÇÃO DO CDC. ÔNUS DA PROVA. RESTITUIÇÃO SIMPLES. AUSÊNCIA DE CARACTERIZAÇÃO DE MÁ-FÉ. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta por Cielo S.A. contra sentença da 6ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, que julgou parcialmente procedente ação de restituição de valores cumulada com repetição de indébito, proposta por XP1 Racing Serviços Automotivos Ltda. – ME, condenando a ré à devolução, em dobro, de R$ 21.172,92, por cobrança indevida decorrente de serviço de antecipação de recebíveis não contratado. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: saber se é aplicável o Código de Defesa do Consumidor à relação entre as partes; saber se a cobrança de antecipação de valores se deu de forma lícita e se houve efetivo repasse dos valores à autora; (iii) saber se é cabível a restituição em dobro dos valores cobrados indevidamente ou se deve ocorrer na forma simples. III. RAZÕES DE DECIDIR Ainda que a parte autora seja pessoa jurídica, reconhece-se sua vulnerabilidade diante da complexidade dos serviços prestados, impondo-se a aplicação do CDC. A ausência de prova pela requerida quanto à regularidade da contratação e ao efetivo repasse dos valores recebidos pela empresa autora atrai o reconhecimento da falha na prestação do serviço, nos termos do art. 373, II, do CPC. A devolução em dobro, prevista no art. 42, p.u., do CDC, exige demonstração de má-fé, o que não restou configurado nos autos. Deve, portanto, ser limitada à restituição simples dos valores cobrados indevidamente. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso parcialmente provido, para determinar que a devolução do valor de R$ 21.172,92 se dê de forma simples. Tese de julgamento: “1. A aplicação do Código de Defesa do Consumidor é admissível quando demonstrada a vulnerabilidade técnica da pessoa jurídica contratante. 2. Cabe à empresa prestadora do serviço o ônus de provar a legalidade da cobrança e o efetivo repasse de valores. 3. A restituição em dobro exige comprovação de má-fé, sendo incabível quando esta não se verifica.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CDC, arts. 2º, 6º, VIII e 42, p.u.; CPC, art. 373, II. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1505226/BA, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j. 29.10.2019, DJe 05.11.2019; TJMT, Apelação Cível nº 1013785-93.2018.8.11.0003, Rel. Des. Serly Marcondes Alves, j. 04.02.2023; TJMT, Apelação Cível nº 0021214-19.2015.8.11.0041, Rel. Des. Antonia Siqueira Gonçalves, j. 15.12.2023. (N.U 1018819-90.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 18/06/2025, Publicado no DJE 18/06/2025) Ademais, aplica-se ao caso a Súmula 297 do STJ, segundo a qual "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras", categoria na qual se enquadram as administradoras de cartão de crédito, como a ré. Portanto, reconheço a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor à relação jurídica estabelecida entre as partes. A controvérsia principal dos autos consiste em verificar se a ré efetivamente aplicou taxas de desconto em percentuais superiores aos contratados, nas operações realizadas pela autora com cartões de crédito e débito. A autora sustenta que a ré cobrou taxas superiores às pactuadas, juntando aos autos relatório de inconsistências que demonstra, de forma individualizada, cada transação em que teria ocorrido a aplicação de percentuais acima do contratado, apontando inclusive a diferença entre o valor efetivamente recebido e aquele que deveria ter sido creditado caso aplicada a taxa correta. Por sua vez, a ré limitou-se a alegar genericamente que as taxas são variáveis, conforme a bandeira e a modalidade de pagamento, bem como que teria autonomia para modificá-las ao longo da execução contratual. Todavia, não impugnou especificamente os cálculos apresentados pela autora, tampouco trouxe aos autos documentos que comprovassem a regularidade das taxas aplicadas ou a autorização da autora para a alteração dos percentuais inicialmente pactuados. Cumpre ressaltar que, sendo aplicável ao caso o CDC, é dever da ré prestar informações claras e adequadas sobre os serviços prestados e respectivos preços, nos termos do art. 6º, III, do referido diploma legal. Assim, qualquer alteração nas taxas inicialmente contratadas deveria ter sido prévia e expressamente comunicada à autora, o que não foi demonstrado nos autos. Além disso, o contrato de adesão deve ser interpretado da maneira mais favorável ao consumidor, nos termos do art. 47 do CDC. Assim, eventuais cláusulas que permitam à ré alterar unilateralmente as taxas cobradas, sem prévia comunicação e concordância do consumidor, são nulas de pleno direito, conforme art. 51, X, do CDC. Nesse contexto, considerando que a ré não se desincumbiu do ônus de comprovar a regularidade das taxas aplicadas, e que os documentos juntados pela autora evidenciam a cobrança de percentuais superiores aos inicialmente pactuados, deve ser reconhecida a procedência do pedido de ressarcimento dos valores cobrados a maior. Reconhecida a cobrança indevida de valores a título de taxa de administração em percentual superior ao pactuado, resta analisar se é cabível a repetição do indébito na forma dobrada, conforme previsto no art. 42, parágrafo único, do CDC. O dispositivo legal estabelece que "o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável". Assim, para que se aplique o dispositivo legal anteriormente citado, é imprescindível a demonstração de má-fé por parte do demandado na cobrança dos valores controvertidos. Nesse contexto, embora tenha havido falha na prestação dos serviços pela instituição financeira, não se evidencia, no caso concreto, a prática de conduta dolosa ou de má-fé. Diante disso, entendo que a devolução dos valores descontados indevidamente ocorra de forma simples. Diante de todo o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a presente ação, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC para condenar a Requerida a restituir a Requerente o montante de R$ 36.557,86 (trinta e seis mil, quinhentos e cinquenta e sete reais e oitenta e seis centavos), na forma simples, com correção monetária a partir do efetivo prejuízo, e juros de 1% ao mês a partir da citação (art. 405 do CC). Em razão da sucumbência, condeno a parte Requerida ao pagamento de honorários advocatícios no percentual de 10% (dez por cento) para os patronos da Requerente, sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85, § 2 do Código de Processo Civil. Por fim, na hipótese de interposição de recurso de apelação ou apelação adesiva, por não haver mais juízo de admissibilidade a ser exercido pelo Juízo “a quo” (art. 1.010, CPC), sem nova conclusão, processe-se conforme §§1º e 3º do art.1.010 do CPC, intimando-se a parte contrária para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias. Após, remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, para apreciação do recurso, com as homenagens de estilo. Publique-se. Intime-se Cumpra-se, expedindo o necessário com as cautelas de estilo. Campo Novo do Parecis, datado e assinado eletronicamente. Cláudia Anffe Nunes da Cunha Juíza de Direito

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Processo nº 1002163-89.2024.8.11.0105

ID: 311219614

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ÚNICA DE COLNIZA Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 1002163-89.2024.8.11.0105

Data de Disponibilização: 30/06/2025

Polo Ativo:

ERICK HENRIQUE MOREIRA MELLO

Polo Passivo:

Intimação

Advogados:

ROGER RODRIGUES FARIA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

INAITA GOMES RIBEIRO SOARES CARVALHO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA | COLNIZA/MT SENTENÇA PROCESSO Nº: 1002163-89.2024.8.11.0105 1. RELATÓRIO Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C OBRIGAÇÃO DE FA… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA | COLNIZA/MT SENTENÇA PROCESSO Nº: 1002163-89.2024.8.11.0105 1. RELATÓRIO Trata-se de AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER E PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, proposta por ERICK HENRIQUE MOREIRA MELLO em face de ENERGISA MATO GROSSO – DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A. A parte autora sustenta ser titular da unidade consumidora de energia elétrica nº 6/2987771-9, localizada em área rural, e que a partir de janeiro de 2024 experimentou elevação desproporcional nas faturas de energia elétrica. Segundo consta da inicial, o valor da fatura passou de aproximadamente R$ 3.797,78 referente a dezembro de 2023 para R$ 24.146,31 em janeiro de 2024, configurando aumento de aproximadamente 536% sem justificativa técnica adequada. O demandante argumenta que tal variação não corresponde aos hábitos de consumo praticados na propriedade rural e que a concessionária falhou na prestação do serviço ao não observar os procedimentos regulamentares aplicáveis. Aduz ainda que procurou solucionar a questão administrativamente, sem êxito, e que permanece sob ameaça de suspensão do fornecimento de energia elétrica. Em seus pedidos, requer a declaração de nulidade das faturas contestadas dos meses de janeiro a setembro de 2024, a realização de vistoria nos equipamentos de medição, a abstenção de corte no fornecimento de energia elétrica, bem como condenação da requerida ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (ID. 173866165). A requerida ofereceu contestação sustentando a regularidade da cobrança, alegando que o consumo faturado corresponde exatamente ao registrado pelo medidor instalado na unidade consumidora. Esclarece que se trata de unidade localizada em zona rural, sujeita ao regime de leitura plurimensal conforme estabelecido na Resolução ANEEL nº 1.000/2021. Argumenta que o aumento verificado decorreu do acúmulo de energia não computado nos meses anteriores, quando o faturamento ocorreu pela média de consumo, prática autorizada pela regulamentação setorial (ID. 183286398). A demandada sustenta ainda a inexistência de ato ilícito, uma vez que agiu em conformidade com a legislação vigente, e impugna o pedido de indenização por danos morais, argumentando que não houve suspensão do serviço nem inscrição do nome do autor em órgãos de proteção ao crédito. A parte autora apresentou impugnação à contestação, reiterando seus argumentos iniciais e sustentando que a requerida não comprovou ter observado os requisitos estabelecidos nos artigos 272 e 273 da Resolução ANEEL nº 1.000/2021, especificamente quanto à comunicação prévia sobre o sistema de leitura plurimensal e disponibilização de meios para autoleitura (ID. 186902317). Intimadas para especificação de provas, a requerida manifestou pretender produzir depoimento pessoal do autor, prova pericial técnica e prova testemunhal (ID. 191184031), enquanto o autor requereu a produção de depoimento pessoal e prova documental (ID. 193533951). 2. FUNDAMENTAÇÃO 2.1. Da Desnecessidade de Produção de Outras Provas Preliminarmente, cumpre decidir sobre a produção das provas requeridas pelas partes. O depoimento pessoal pleiteado pelo autor e pela ré revela-se desnecessário para o deslinde da controvérsia, considerando que a matéria controvertida é eminentemente técnica e documental, envolvendo análise de registros de consumo, histórico de faturamento e aplicação de normas regulamentares específicas do setor elétrico. A prova documental requerida pelo autor também se mostra desnecessária, uma vez que os documentos relevantes para o julgamento da causa já foram devidamente juntados aos autos durante o contraditório, não havendo indicação específica de quais novos documentos seriam produzidos ou sua pertinência para a solução da lide. Da mesma forma, a prova pericial e testemunhal pleiteadas pela requerida são dispensáveis, posto que os elementos probatórios já constantes dos autos, incluindo o histórico de consumo da unidade consumidora apresentado pela própria ré, as faturas de energia elétrica questionadas e os documentos técnicos, são suficientes para a formação do convencimento judicial e adequada resolução da lide. Dessa forma, INDEFIRO a produção das provas requeridas pelas partes e DECLARO ENCERRADA a fase instrutória, nos termos do artigo 370, parágrafo único, do Código de Processo Civil. 2.2. Do Mérito Ressalto, inicialmente, que no presente caso incide as regras do Código de Defesa do Consumidor, pelo fato de que a Concessionária é prestadora de serviço e deve, portanto, assumir os riscos inerentes à sua própria atividade quando estes ocasionarem danos a terceiros. Deste modo, se sujeita ao que se aplicam os art. 6, X e 14 do CDC: "Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...). X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral; Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos." No caso dos autos, verifica-se que o imóvel do autor está, de fato, localizado em zona rural, e, nesses casos, a Resolução nº 1.000/2021 da ANEEL dispõe que: “Seção IV Da Leitura Plurimensal Art. 271. A distribuidora pode realizar a leitura em intervalos de até 12 ciclos consecutivos em unidade consumidora do grupo B localizada em zona rural. Parágrafo único. O consumidor pode realizar a autoleitura nos ciclos em que não houver leitura realizada pela distribuidora. Art. 272. A distribuidora que adotar a leitura plurimensal deve comunicar essa medida ao consumidor envolvido, dando conhecimento do processo utilizado, dos objetivos pretendidos e das instruções para realização da autoleitura. Art. 273. Para a realização da autoleitura, a distribuidora deve disponibilizar meios para o consumidor controlar e enviar as informações, tais como calendário impresso, agência de atendimento, central de teleatendimento, terminal de autoatendimento, página na Internet, aplicativo de celular ou outros canais de relacionamento com o consumidor. Art. 274. A distribuidora deve estabelecer e informar ao consumidor o calendário para o envio da autoleitura, contendo pelo menos 7 dias consecutivos para o consumidor enviar a informação. Art. 275. Caso o consumidor não envie a autoleitura de acordo com o calendário previamente estabelecido, o faturamento deve ser realizado conforme disposto no art. 288. Art. 276. A distribuidora deve realizar a leitura no ciclo subsequente sempre que o consumidor não enviar a autoleitura por 2 ciclos consecutivos.” Embora a ré tenha refutado os fatos alegados na inicial, não se desincumbiu de apresentar prova robusta de que observou adequadamente os procedimentos estabelecidos na citada resolução, nem demonstrou o cumprimento das determinações dos artigos 272 e 273. Pelo contrário, não apresentou sequer evidência de que tenha comunicado previamente ao consumidor sobre a implementação do sistema de leitura plurimensal ou disponibilizado meios adequados para autoleitura. Examinando detidamente o histórico de consumo da unidade consumidora em questão, constata-se variação desproporcional e tecnicamente injustificada entre os períodos de dezembro de 2023 e janeiro de 2024, sendo que os demais períodos encontram-se na média dos gastos realizados. Conforme demonstrado no histórico apresentado pela própria requerida, o consumo passou de 1.116,58 kWh em dezembro de 2023 para 21.072 kWh em janeiro de 2024, representando aumento de aproximadamente 1.787% (ID. 183286402). Nesse sentido: "RECURSO AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO – TUTELA ANTECIPADA PARA RESTABELECIMENTO DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA, VEDAÇÃO À NEGATIVAÇÃO DO CONSUMIDOR E TROCA DO MEDIDOR/RELÓGIO/PADRÃO – DEFERIMENTO CONDICIONADO À CONSIGNAÇÃO JUDICIAL DO VALOR DAS FATURAS EM DISCUSSÃO –DESNECESSIDADE – ELEVAÇÃO ABRUPTA E DESMOTIVADA DO CONSUMO – VEROSSIMILHANÇA DAS ALEGAÇÕES – AUTORA BENEFICIÁRIA DA JUSTIÇA GRATUITA – AUSÊNCIA DE CONDIÇÕES FINANCEIRAS PARA O DEPÓSITO JUDICIAL – RECURSO PROVIDO. Demonstrada a plausibilidade do direito ante o aumento abrupto, atípico e desarrazoado no valor da conta de energia da referida unidade consumidora, sem que a concessionária apresente uma causa plausível para tamanha variação no preço da fatura, o que inclusive levou o julgador singular a deferir da tutela antecipada para o restabelecimento o fornecimento de energia elétrica, vedação à negativação do consumidor e troca do medidor/relógio/padrão, tais medidas devem ser cumpridas independentemente da consignação judicial do valor das faturas quando as circunstâncias dos autos indicam que a titular da unidade (beneficiária justiça gratuita) não tem condições financeiras de efetuá-las." (N.U 1003326-07.2019.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 30/07/2019, Publicado no DJE 30/07/2019) (grifo nosso) "DIREITO DO CONSUMIDOR. RECURSO INOMINADO. ENERGIA ELÉTRICA. FATURAMENTO EXCESSIVO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA REGULARIDADE DA COBRANÇA. DANO MORAL CONFIGURADO. REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Recurso Inominado interposto contra decisão monocrática que julgou parcialmente procedente o pedido inicial, condenando a reclamada ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de danos morais, corrigido monetariamente pelo INPC e acrescido de juros de mora de 1% ao mês, bem como determinou o refaturamento da conta de energia elétrica de novembro de 2023 para a média de consumo dos 12 meses anteriores. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: (i) definir se houve cobrança indevida de consumo de energia elétrica; (ii) determinar a existência de danos morais e sua quantificação; (iii) estabelecer os critérios corretos para a atualização monetária e juros de mora. III. RAZÕES DE DECIDIR Tratando-se de relação de consumo, aplica-se a inversão do ônus da prova em favor do consumidor, nos termos do artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, cabendo à concessionária demonstrar a regularidade da cobrança impugnada. A jurisprudência consolida o entendimento de que a elevação do consumo de energia, sem justificativa plausível e incompatível com a média de consumo usual, enseja a revisão dos valores cobrados e caracteriza falha na prestação do serviço. O dano moral está configurado quando a cobrança indevida, aliada à ausência de solução administrativa, impõe ao consumidor transtornos que extrapolam o mero dissabor, conforme jurisprudência da 1ª Turma Recursal do Estado de Mato Grosso (Conclusão nº 1). A indenização fixada em R$ 5.000,00 mostra-se desproporcional, devendo ser reduzida para R$ 3.000,00, observando-se os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, bem como a orientação do método bifásico estabelecido pelo STJ. Os critérios para a correção monetária e juros de mora devem observar o IPCA como índice de correção e a taxa Selic como juros legais, conforme disposto no art. 406, § 1º, do Código Civil, com redação dada pela Lei nº 14.905/2024. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: O aumento abrupto e desproporcional no consumo de energia elétrica, sem justificativa plausível, caracteriza falha na prestação do serviço e enseja a revisão da fatura. A cobrança indevida, somada à falta de solução administrativa, configura dano moral indenizável. A fixação da indenização por danos morais deve observar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, aplicando-se o método bifásico para quantificação. A correção monetária deve ser calculada com base no IPCA e os juros de mora pela taxa Selic, nos termos do Código Civil. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXII; CDC, art. 6º, VIII e art. 14, § 3º, I e II; CPC, art. 373, II; CC, art. 406, § 1º; Lei nº 9.099/95, art. 46 e art. 55. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1.152.541, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Dje 21/09/2011; STJ, AgInt nos EDcl no AREsp nº 2.088.555/MS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Dje 31/03/2023; TJMT, N.U 1001995-13.2021.8.11.0002, julgado em 28/06/2022; TJRS, Recurso Cível nº 71007693799, julgado em 25/10/2018." (N.U 1001433-87.2024.8.11.0005, TURMA RECURSAL CÍVEL, GONCALO ANTUNES DE BARROS NETO, Primeira Turma Recursal, Julgado em 28/03/2025, Publicado no DJE 28/03/2025) (grifo nosso) A requerida justifica tal elevação alegando tratar-se de "acúmulo de energia não registrado nos meses imediatamente anteriores" quando o faturamento ocorreu pela média de consumo. Contudo, tal explicação não encontra respaldo técnico adequado quando confrontada com o histórico de consumo da unidade, que demonstrava padrão relativamente estável nos meses precedentes. Mais relevante ainda é a constatação de que a requerida não logrou demonstrar ter cumprido os requisitos estabelecidos nos artigos 272 e 273 da Resolução ANEEL nº 1.000/2021. Não há nos autos qualquer comprovação de que tenha sido comunicado ao consumidor sobre a implementação do sistema de leitura plurimensal, tampouco evidência de que tenham sido disponibilizados meios adequados para realização da autoleitura. Destarte, seja pela hipossuficiência perante o fornecedor, seja pela responsabilidade objetiva da prestadora de serviço, era ônus exclusivo da parte requerida a prova da legitimidade do crédito cuja inadimplência ensejaria a suspensão do serviço. Desta feita, a parte requerida, pretensa credora, é que deveria demonstrar de forma inequívoca o consumo efetuado pelo autor e a observância dos procedimentos regulamentares, o que não logrou fazer satisfatoriamente. No que concerne ao pedido de indenização por danos morais, embora tenha havido falha na prestação do serviço, não se verifica ofensa aos atributos da personalidade da parte autora que justifique reparação extrapatrimonial. A situação narrada nos autos, conquanto configure aborrecimento legítimo, não extrapola o mero dissabor inerente às relações de consumo. Para a configuração do dano moral indenizável, é necessário que o ato lesivo transcenda o simples inadimplemento contratual ou falha na prestação do serviço, atingindo efetivamente a dignidade, honra ou integridade psicológica do consumidor. No presente caso, não houve suspensão do fornecimento de energia elétrica nem inscrição do nome do autor em órgãos de proteção ao crédito, circunstâncias que poderiam caracterizar dano extrapatrimonial. A jurisprudência do Tribunal de Justiça de Mato Grosso tem entendimento firme no sentido de que "No que tange ao pedido de danos morais, não se verifica interrupção do fornecimento de energia elétrica, tampouco ofensa ao direito de personalidade da parte autora que justifique a reparação pleiteada. Assim, o pleito não pode prosperar neste ponto" (N.U 1000123-33.2023.8.11.0053). 3. DISPOSITIVO Ante o exposto, analisando os fatos, o direito aplicável e considerando as provas constantes dos autos, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial para: a) DECLARAR a nulidade da cobrança de energia elétrica da unidade consumidora nº 6/2987771-9 referentes ao mês de janeiro de 2024 que excedeu a média histórica de consumo, devendo ser calculada com base nos doze meses anteriores, excluindo-se valores manifestamente discrepantes; b) DETERMINAR que a requerida proceda ao refaturamento da conta do período mencionado no prazo de 60 (sessenta) dias, utilizando como parâmetro a média de consumo histórica acima referida; c) DETERMINAR que a requerida se abstenha definitivamente de suspender o fornecimento de energia elétrica da unidade consumidora em razão do débito ora declarado nulo, bem como de incluir o nome da parte autora em cadastros de inadimplentes relativamente a tal valor; d) JULGAR IMPROCEDENTE o pedido de indenização por danos morais, pelos fundamentos acima expostos. Em razão da sucumbência recíproca, e, nos termos do artigo 86 do CPP, cada parte arcará com 50% das custas processuais e com os honorários advocatícios, que fixo em 10% do proveito econômico obtido, conforme preconiza o artigo 85, § 2º, do CPC. PUBLIQUE-SE. REGISTRE-SE. INTIMEM-SE. Certificado o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com as cautelas de praxe. Cumpram-se, no que forem aplicáveis, as disposições do Código de Normas da Egrégia Corregedoria de Justiça do TJMT. Colniza/MT, datado e assinado digitalmente. GUILHERME LEITE RORIZ Juiz de Direito Substituto

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Processo nº 1000123-07.2018.8.11.0086

ID: 256090871

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Turma Recursal Classe: RECURSO INOMINADO CíVEL Nº Processo: 1000123-07.2018.8.11.0086

Data de Disponibilização: 14/04/2025

Polo Ativo:

ANILCIO VIDAL

Polo Passivo:

Decisão

Advogados:

DANIEL LUIS NASCIMENTO MOURA

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THIAGO PERTILE BORDA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS Recurso Inominado: 1000123-07.2018.8.11.0086 Classe CNJ: 460 Origem: Núcleo de Justiça Digital dos Juizados Espec… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS Recurso Inominado: 1000123-07.2018.8.11.0086 Classe CNJ: 460 Origem: Núcleo de Justiça Digital dos Juizados Especiais/MT Recorrente(s): Anilcio Vidal Recorrido(s): Estado de Mato Grosso Juiz Relator: Valmir Alaércio dos Santos EMENTA – DECISÃO MONOCRÁTICA RECURSO INOMINADO. FAZENDA PÚBLICA. COBRANÇA DE ICMS SOBRE VALORES DEVIDOS A TÍTULO DE TARIFA DE USO DO SISTEMA DE TRANSMISSÃO (TUST) OU DISTRIBUIÇÃO (TUSD). INCIDÊNCIA. BASE DE CÁLCULO. TEMA REPETITIVO 986 DO STJ. TESE JURÍDICA FIXADA EM SEDE DE RECURSO REPETITIVO EFICÁCIA IMEDIATA. REGULAR INCIDÊNCIA DO ICMS. HIPÓTESES DE MODULAÇÃO QUE NÃO SE APLICAM AO CASO EM ANÁLISE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. DECISÃO MONOCRÁTICA ART. 932, IV, “a” DO CPC. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO. “A Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e/ou a Tarifa de Uso de Distribuição (TUSD), quando lançada na fatura de energia elétrica, como encargo a ser suportado diretamente pelo consumidor final (seja ele livre ou cativo), integra, para os fins do art. 13, § 1º, II, 'a', da LC 87/1996, a base de cálculo do ICMS”. (tese jurídica fixada pelo STJ no julgamento do Tema Repetitivo 986) É desnecessário aguardar o trânsito em julgado do acórdão proferido em recurso especial representativo de controvérsia para que se possa aplicar a tese jurídica firmada em sede de recursos repetitivos, cuja eficácia é imediata, aos demais recursos que tratem de casos semelhantes. Se a parte autora não se enquadra nas hipóteses de modulação definidas no Tema Repetitivo, deve ser mantida a sentença que reconheceu a legalidade da cobrança. Decisão monocrática em face ao disposto no art. 932, IV, “a”, do Código de Processo Civil e na Súmula 01 da Turma Recursal Única de Mato Grosso. Em caso de interposição de agravo interno infundado, será aplicada a multa do artigo 1.021, § 4º do NCPC. Recurso a que se nega o provimento. DECISÃO MONOCRÁTICA Vistos etc. Dispensado o relatório em face ao disposto no art. nº 46 da Lei nº 9.099 de 26 de setembro de 1995. Inicialmente retiro da pauta de julgamento de 05 a 08/05/2025 (Plenário Virtual). Trata-se de RECURSO INOMINADO intentado contra a sentença que julgou improcedente o pedido autoral. Trata-se de Ação Declaratória c/c Repetição de Indébito com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, ajuizada pela parte Autora em desfavor do Estado de Mato Grosso, na qual visa que seja declarada a inexistência de relação jurídico-tributária entre a Autora e o Réu quanto ao recolhimento do ICMS incidente sobre os encargos de transmissão e conexão na entrada de energia elétrica, especialmente as Tarifas de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) ou Distribuição (TUSD), definindo-se a base de cálculo do referido tributo, em tais operações, como sendo, unicamente, o montante relativo à energia elétrica efetivamente consumida. Em suas razões recursais, pugna pela reforma da sentença para que seja anulada e que seja determinado o sobrestamento dos autos até que haja o trânsito em julgado do Tema 986 do STJ, para em seguida que haja a procedência da ação ajuizada , em caso de modificação do julgado no Tema 986, do STJ, por não ter, ainda, transitado em julgado, caso haja alteração benéfica o contribuinte, permitindo a exordial ser parcial ou totalmente procedente, segundo ulterior decisão no citado tema repetitivo quando, enfim, fizer coisa julgada formal e material; ou subsidiariamente, em sendo confirmada a liminar na ADI nº. 7195/STF, nos damos por ciente do resultado da ação, em detrimento do julgado no Tema 986/STJ, por força da lei, e pedimos que o caso seja arquivado sem ônus a parte. O Estado de Mato Grosso Recorrido, em suas contrarrazões, defende a legalidade da cobrança do ICMS sobre as Tarifas de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) ou Distribuição (TUSD), por isso, pugna pela manutenção da sentença recorrida, pelo seus próprios fundamentos. Ante ao teor do Oficio de nº 86/2017 – CPC/NFDTIPI, como o caso em análise não se trata de interesse público que envolve matéria de saúde ou de partes incapazes, não foi colhida manifestação do Ministério Público. A respeito da matéria objeto destes autos, a “Inclusão da Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão de Energia Elétrica (TUST) e da Tarifa de Uso do Sistema de Distribuição de Energia Elétrica (TUSD) na base de cálculo do ICMS”, a Primeira Seção do colendo Superior Tribunal de Justiça, Relator Ministro Herman Benjamin, em 13/03/2024, ao julgar o Tema Repetitivo 986, fixou a seguinte tese: “A Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e/ou a Tarifa de Uso de Distribuição (TUSD), quando lançada na fatura de energia elétrica, como encargo a ser suportado diretamente pelo consumidor final (seja ele livre ou cativo), integra, para os fins do art. 13, § 1º, II, 'a', da LC 87/1996, a base de cálculo do ICMS”. Nos termos da tese fixada pelo colendo Superior Tribunal de Justiça acima transcrita, a tarifa de uso do sistema de transmissão (TUST) e/ou a tarifa de uso de distribuição (TUSD), quando lançadas na fatura de energia elétrica como encargo a ser suportado diretamente pelo consumidor final integra a base de cálculo do ICMS. Contudo, o colendo Superior Tribunal de Justiça definiu a seguinte modulação dos efeitos: TESE REPETITIVA 37. Adota-se, por todo o exposto, a tese repetitiva: "A Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e/ou a Tarifa de Uso de Distribuição (TUSD), quando lançadas na fatura de energia elétrica, como encargo a ser suportado diretamente pelo consumidor final (seja ele livre ou cativo), integra, para os fins do art. 13, § 1º, II, 'a', da LC 87/1996, a base de cálculo do ICMS.". MODULAÇÃO DOS EFEITOS. SUPERAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA QUE PERDUROU POR RAZOÁVEL PRAZO DE TEMPO. APLICABILIDADE NA SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO. MODULAÇÃO DOS EFEITOS 38. Considerando que até o julgamento do REsp 1.163.020/RS - que promoveu mudança na jurisprudência da Primeira Turma - a orientação das Turmas que compõem a Seção de Direito Público do STJ era, s.m.j., toda favorável ao contribuinte do ICMS nas operações de energia elétrica, proponho, com base no art. 927, § 3º, do CPC, a modulação dos efeitos, a incidir exclusivamente em favor dos consumidores que, até 27.3.2017 - data de publicação do acórdão proferido julgamento do REsp 1.163.020/RS -, tenham sido beneficiados por decisões que tenham deferido a antecipação de tutela, desde que elas (as decisões provisórias) se encontrem ainda vigentes, para, independente de depósito judicial, autorizar o recolhimento do ICMS sem a inclusão da TUST/TUSD na base de cálculo. Note-se que mesmo estes contribuintes submetem-se ao pagamento do ICMS, observando na base de cálculo a inclusão da TUST e TUSD, a partir da publicação do presente acórdão - aplicável, quanto aos contribuintes com decisões favoráveis transitadas em julgado, o disposto adiante, ao final. 39. A modulação aqui proposta, portanto, não beneficia contribuintes nas seguintes condições: a) sem ajuizamento de demanda judicial; b) com ajuizamento de demanda judicial, mas na qual inexista Tutela de Urgência ou de Evidência (ou cuja tutela outrora concedida não mais se encontre vigente, por ter sido cassada ou reformada); c) com ajuizamento de demanda judicial, na qual a Tutela de Urgência ou Evidência tenha sido condicionada à realização de depósito judicial; e d) com ajuizamento de demanda judicial, na qual a Tutela de Urgência ou Evidência tenha sido concedida após 27.3.2017. 40. Em relação às demandas transitadas em julgado com decisão favorável ao contribuinte, eventual modificação está sujeita à análise individual (caso a caso), mediante utilização, quando possível, da via processual adequada. De forma resumida, a solução das demandas relativas ao Tema 986/STJ comporta três caminhos distintos: I) Incidência da Tese firmada apenas a partir da publicação do acórdão que julgou o Tema 986; “a modulação dos efeitos, a incidir exclusivamente em favor dos consumidores que, até 27.3.2017 - data de publicação do acórdão proferido julgamento do REsp 1.163.020/RS -, tenham sido beneficiados por decisões que tenham deferido a antecipação de tutela, desde que elas (as decisões provisórias) se encontrem ainda vigentes, para, independente de depósito judicial, autorizar o recolhimento do ICMS sem a inclusão da TUST/TUSD na base de cálculo”. II) Incidência imediata da tese firmada para: a) sem ajuizamento de demanda judicial; b) com ajuizamento de demanda judicial, mas na qual inexista Tutela de Urgência ou de Evidência (ou cuja tutela outrora concedida não mais se encontre vigente, por ter sido cassada ou reformada); c) com ajuizamento de demanda judicial, na qual a Tutela de Urgência ou Evidência tenha sido condicionada à realização de depósito judicial; e d) com ajuizamento de demanda judicial, na qual a Tutela de Urgência ou Evidência tenha sido concedida após 27.3.2017. III) Incidência da tese condicionada a eventual modificação de coisa julgada: Em relação às demandas transitadas em julgado com decisão favorável ao contribuinte, eventual modificação está sujeita à análise individual (caso a caso), mediante utilização, quando possível, da via processual adequada. Deve ser ressaltado que é desnecessário aguardar o trânsito em julgado do acórdão proferido em recurso especial representativo de controvérsia para que se possa aplicar a tese jurídica firmada em sede de recursos repetitivos, cuja eficácia é imediata, aos demais recursos que tratem de casos semelhantes, nos termos do disposto no artigo 1.040 do CPC. Logo, considerando a Tese firmada no julgamento do Tema Repetitivo 986, aliado ao fato de que a parte autora não se beneficia da modulação determinada no Tema, à manutenção da sentença é medida que se impõe. Nesse sentido é o entendimento jurisprudencial, in verbis: ICMS. TUSD. TUST. "A Tarifa de Uso do Sistema de Transmissão (TUST) e/ou a Tarifa de Uso de Distribuição (TUSD), quando lançada na fatura de energia elétrica, como encargo a ser suportado diretamente pelo consumidor final (seja ele livre ou cativo), integra, para os fins do art. 13, § 1º, II, 'a', da LC 87/1996, a base de cálculo do ICMS". Entendimento do STJ, em recurso repetitivo (REsp 1.699.851, 1.692.023, 1.734.902 e 1.734.946 – Tema 986). Contribuinte não beneficiado pela modulação de efeitos da decisão. Pedido improcedente. RECURSO DESPROVIDO. (TJ-SP - Apelação Cível: 10125568720178260562 Santos, Relator: Alves Braga Junior, Data de Julgamento: 30/06/2024, 6ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 30/06/2024) RECURSO INOMINADO – AÇÃO DECLARATÓRIA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA JURISDICIONAL – ENERGIA ELÉTRICA – AS TARIFAS TUSD E TUST INTEGRAM A BASE DE CÁLCULO DO ICMS – TEMA Nº 986 DO STJ – REPETITIVOS – RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. Cuiabá (MT), 20 de maio de 2024. Juiz GONÇALO ANTUNES DE BARROS NETO Relator (N.U 8012652-59.2016.8.11.0004, TURMA RECURSAL CÍVEL, GONCALO ANTUNES DE BARROS NETO, Primeira Turma Recursal, Julgado em 03/06/2024, Publicado no DJE 07/06/2024) APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. AÇÃO ORDINÁRIA. ICMS. ENERGIA ELÉTRICA. BASE DE CÁLCULO. TUST E TUSD. TEMA 986 DO STJ. O ICMS incidente sobre a operação de fornecimento de energia elétrica (art. 155, inciso II e § 3º, da CF) compreende a transmissão e distribuição da energia, de modo que, seja pela regra do art. 34, § 9º, dos ADCT, seja pela complementação feita no art. 13 da LC 87/96, sua base de cálculo efetivamente engloba tais rubricas.A questão foi recentemente definida no julgamento do Tema 986 do Superior Tribunal de Justiça, no qual a Corte Cidadã, oportunidade em que assentou que "no contexto do sistema enérgico as etapas de produção e fornecimento de energia constituem um sistema interdependente, bastando-se cogitar a supressão de uma de suas fases (geração, transmissão ou distribuição) para concluir que não haverá a possibilidade de efetivação do consumo de energia".Dessa forma, a Corte Superior estabeleceu "que o ICMS incide sobre todo o processo de fornecimento de energia elétrica, tendo em vista a relação indissociável de suas fases, de forma que o custo de cada uma dessas etapas – incluindo-se a TUSD e a TUST – compõe o preço final da operação e, consequentemente, a base de cálculo do ICMS, nos termos do artigo 13, inciso I, da LC 87/1996.".Inaplicabilidade da modulação dos efeitos, uma vez que, no caso, o contribuinte não tinha medida liminar determinando a retirada das rubricas discutidas da base cálculo do ICMS.RECURSO DESPROVIDO. (TJ-RS - Apelação Cível: 5004568-05.2020.8.21.0004 OUTRA, Relator: Eliane Garcia Nogueira, Data de Julgamento: 26/03/2024, Primeira Câmara Cível, Data de Publicação: 26/03/2024) O relator pode, monocraticamente, negar provimento a recurso que esteja em desacordo com a jurisprudência dominante do respectivo Tribunal, é o que dispõe o art. 932, inciso IV, alínea “a” do Código de Processo Civil, podendo ser aplicada multa, caso haja interposição de agravo inadmissível ou infundado, in verbis: Art. 932. Incumbe ao relator: (...) IV - negar provimento a recurso que for contrário a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; Em consonância com o texto legal, esta Turma Recursal editou a Súmula nº 01, com a seguinte redação: “O Relator, em decisão monocrática, poderá negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificadamente os fundamentos da decisão recorrida ou, negar provimento a recurso que esteja dentro dos ditames do artigo 932, IV, "a", "b" e "c" do Novo CPC, cabendo recurso de agravo interno, no prazo de 15 (quinze) dias, para a decisão colegiada da Turma Recursal”. Ante o exposto, conheço o recurso inominado, e como a sentença recorrida está de acordo com a tese jurídica firmada no julgamento do Tema 986/STJ, em face ao disposto no art. 932, inciso IV, “a” do Código de Processo Civil e na Súmula nº 01 desta Turma Recursal, monocraticamente, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO. Condeno a parte Recorrente ao pagamento de honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atribuído à causa, suspensa a sua execução em face ao disposto no art. 98, §3o do Código de Processo Civil. Registro ainda que, em caso de agravo interno infundado, será aplicada a multa do artigo 1.021, § 4º do CPC. Intimem-se. Cumpra-se. Valmir Alaércio dos Santos Juiz de Direito - Relator

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Processo nº 1016747-54.2025.8.11.0000

ID: 298332694

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara Criminal Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL Nº Processo: 1016747-54.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 13/06/2025

Polo Ativo:

ROBSON DA SILVA ROSA MARIA SILVA LOPES TALLITA ROSA CRUZ DE ALMEIDA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

TALLITA ROSA CRUZ DE ALMEIDA

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ROBSON DA SILVA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1016747-54.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Roubo Majorado, Quadrilha ou Bando, Prisão Preve… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1016747-54.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Roubo Majorado, Quadrilha ou Bando, Prisão Preventiva] Relator: Des(a). LUIZ FERREIRA DA SILVA Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA, DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). JUANITA CRUZ DA SILVA CLAIT DUARTE] Parte(s): [ROBSON DA SILVA - CPF: 707.370.371-72 (ADVOGADO), ROSA MARIA SILVA LOPES - CPF: 445.705.899-87 (PACIENTE), JUÍZO DA QUINTA VARA CRIMINAL DE SINOP (IMPETRADO), TALLITA ROSA CRUZ DE ALMEIDA - CPF: 011.879.541-44 (IMPETRANTE), TALLITA ROSA CRUZ DE ALMEIDA - CPF: 011.879.541-44 (ADVOGADO), ROBSON DA SILVA - CPF: 707.370.371-72 (IMPETRANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (TERCEIRO INTERESSADO), EDUARDO VINICIUS SOUZA SILVA - CPF: 062.342.501-73 (TERCEIRO INTERESSADO), GUIRI DE OLIVEIRA ALBUQUERQUE MUNHOZ - CPF: 678.140.262-53 (TERCEIRO INTERESSADO), CAMILLY VITORIA CANICA DE ALMEIDA - CPF: 094.760.441-36 (TERCEIRO INTERESSADO), KLEBBER LIMA FERREIRA - CPF: 036.942.871-40 (TERCEIRO INTERESSADO), RAFAEL AUGUSTO DA SILVA - CPF: 038.000.611-12 (TERCEIRO INTERESSADO), WEVERTON CARDOSO DA SILVA - CPF: 089.591.581-27 (TERCEIRO INTERESSADO), JANAINA SILVA LOPES FERREIRA - CPF: 031.384.521-24 (TERCEIRO INTERESSADO), MARCOS COELHO DOS SANTOS - CPF: 892.248.251-68 (VÍTIMA), JUÍZO DA 5ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE SINOP (IMPETRADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). LUIZ FERREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DENEGOU A ORDEM. E M E N T A Ementa. Direito processual penal. Habeas corpus. Prisão preventiva. Fundamentação idônea. Ré foragida. Indeferimento de participação em audiência. Ordem denegada. I. Caso em exame 1. Habeas corpus impetrado contra decisão do Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT, que decretou a prisão preventiva da paciente pela suposta prática dos crimes de organização criminosa, roubo majorado e sequestro e cárcere privado, indeferindo sua participação na audiência de instrução e julgamento em razão de sua condição de foragida. II. Questões em discussão 2. Há duas questões em discussão: (i) verificar se a prisão preventiva da paciente foi fundamentada de forma idônea, conforme os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal; e (ii) apurar se a ausência de intimação ou negativa de participação da paciente, por estar foragida, configura nulidade da audiência de instrução e julgamento. III. Razões de decidir 3. A prisão preventiva está devidamente fundamentada com base na gravidade concreta dos crimes imputados, na periculosidade evidenciada pelo modus operandi e na existência de risco de reiteração delitiva, demonstrando o periculum libertatis e atendendo ao art. 312 do CPP. 4. A jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça considera legítima a negativa de participação do réu foragido em audiência de instrução, inclusive por videoconferência, não configurando cerceamento de defesa. IV. Dispositivo e teses 5. Ordem denegada. Teses de julgamento: “1. A prisão preventiva é legítima quando baseada na gravidade concreta do crime e no risco de reiteração delitiva. 2. O estado de foragido do réu justifica a negativa de sua participação na audiência de instrução, não configurando cerceamento de defesa.” _____________ Dispositivos relevantes citados: CPP, arts. 220 e 312. Jurisprudências relevantes citadas: STJ, HC n. 976.451/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, j. 09/04/2025; STJ, AgRg no RHC n. 203.120/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, j. 26/02/2025; STJ, AgRg no RHC n. 179.386/RN, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 15/05/2023; STJ, AgRg no RHC 145.065/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. 13/04/2021; TJMT, N.U 1033028-22.2024.8.11.0000, Rel. Des. Rui Ramos Ribeiro, Segunda Câmara Criminal, J. 10/12/2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. LUIZ FERREIRA DA SILVA: Ilustres membros da Terceira Câmara Criminal: Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado pelos advogados Robson da Silva e Tallita Rosa Cruz de Almeida em favor de Rosa Maria Silva Lopes, apontando como autoridade coatora o Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT. Depreende-se desta impetração que a paciente teve sua prisão preventiva decretada no dia 4 de abril de 2025, em razão da decisão prolatada nos autos da Ação Penal n. 1000123-25.2024.8.11.0109, pela suposta prática dos crimes de integrar organização criminosa (art. 2º, § 2º, da Lei n. 12.850/13), roubo majorado (art. 157 §2º, II e V, §2º-A, I, do Código Penal) e sequestro e cárcere privado (art. 148 do Código Penal), todavia, mesmo após a expedição de mandado de prisão, a referida decisão não foi cumprida em razão da condição de foragida da paciente. Sustentam, os impetrantes, que juízo de primeiro grau negou o pedido de participação da paciente na audiência de instrução e julgamento, justificando a negativa pela condição de foragida dela, defendendo que a decisão do magistrado deve ser declarada nula, eis que “não há previsão legal, para que o Magistrado negue à Paciente o direito de participar da audiência, para poder esclarecer os fatos que estão sendo-lhe imputados e exercer seu direito de autodefesa”. Alegam que a autoridade acoimada de coatora ordenou a prisão preventiva da paciente em decisão desfundamentada, eis que não apontou elementos idôneos; acrescentando, outrossim, que, na espécie, não estão presentes os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal, mormente ante a ausência de demonstração do periculum libertatis. Forte nas razões acima consignadas, liminarmente, postulam a revogação da prisão preventiva da paciente, com a expedição do alvará de soltura em seu favor e que seja anulada a decisão que negou a ela o direito de participar da audiência de instrução e julgamento. E, no mérito, a convolação da medida de urgência, porventura deferida, em definitiva. O pedido de urgência foi indeferido por intermédio das razões encontradiças no ID 289864864, tendo sido dispensadas as informações do juízo de primeiro grau. Nesta instância revisora, a Procuradoria-Geral de Justiça, com fulcro no parecer juntado no ID 290842378, opinou pela denegação da ordem. É o relatório. V O T O R E L A T O R No que se refere à alegada inexistência dos requisitos autorizadores da decretação da prisão preventiva da paciente, elencados no art. 312 do Código de Processo Penal, vê-se que essa tese não se sustenta, eis que o juízo de primeiro grau considerou corretamente como elemento capaz de autorizar à prolação do édito judicial invectivado: a garantia da ordem pública, tendo em vista o meio de execução e o profissionalismo com o qual os delitos foram praticados, revelando a periculosidade dos agentes envolvidos. Nesse tocante, imperioso se faz transcrever os argumentos do magistrado de primeira instância ao converter a prisão em flagrante da paciente em preventiva: [...] Embora seja certo que a gravidade dos delitos, por si só, não basta para a decretação da custódia, a forma de execução, a conduta do agente, antes e depois do ilícito, e outras circunstâncias podem abalar a ordem pública, impondo-se a medida como garantia do próprio prestígio e segurança da atividade jurisdicional. Anote-se que a gravidade concreta dos crimes demonstra a necessidade da prisão cautelar dos investigados, mormente porque os elementos colhidos até o momento revelam que os representados agiram com extrema frieza, mediante grave ameaça contra a vítima. Impende salientar a forma que os representados executaram a pratica dos delitos demonstrando extremo profissionalismo, restringindo a liberdade da vítima até que o veículo fosse transportado até o local de destino. Não bastassem todos esses elementos a apontar a gravidade concreta, concluo que o modo de execução dos delitos demonstra a periculosidade dos representados, reforçando a ideia de que a prisão preventiva é medida a resguardar a ordem pública. Em virtude dessas considerações, há forte receio de que os representados, em liberdade, continuem a colocar em risco o meio social, encorajando-os a continuar na prática de novos crimes. (...) Em razão dessa circunstância que, alinhadas à gravidade concreta dos crimes de roubo majorado com emprego da arma de fogo e restrição da liberdade da vítima, organização criminal, seqüestro e cárcere privado (recalcitrância criminosa), corrobora para a decretação da prisão preventiva como meio de garantir a ordem pública e evitar a renitência delitiva, se não vejamos: “O risco de reiteração delitiva, fator concreto que justifica a manutenção da custódia cautelar para a garantia da ordem pública, pode ser deduzido da existência de inquéritos policiais e de ações penais por infrações dolosas em curso, sem qualquer afronta ao princípio da presunção de inocência.” – Enunciado n. 06 TJ/MT. Assim, entendo que a gravidade concreta dos delitos, a sua repercussão na sociedade e a recalcitrância criminosa dos representados evidenciam a insegurança gerada no meio social. Anote-se por importante que a garantia da ordem pública é o fundamento disposto no artigo 312 do CPP, cuja presença autoriza a segregação cautelar ora representada, vez que o contrário colocaria em xeque à ordem social. [...] Destacamos Depreende-se, pois, que o decisum vergastado está suficientemente fundamentado, uma vez que seu prolator indicou os motivos de seu convencimento para decretar a custódia cautelar da paciente, demonstrando os requisitos exigidos pelo art. 312 do Código de Processo Penal, destacando a gravidade concreta que envolve roubo majorado com emprego da arma de fogo e restrição da liberdade da vítima, organização criminal, sequestro e cárcere privado, consubstanciada no modus operandi audaz e gravoso supostamente empregado pelos réus. Ademais, embora não tenha sido demonstrada a conduta pormenorizada de cada um dos acusados quando da decretação da prisão preventiva, de modo que os impetrantes alegam, inclusive, que a paciente não tinha conhecimento de que seu veículo seria utilizado para a prática criminosa, não se exige [nem se poderia exigir], nesse momento processual, que o magistrado tenha convicção plena dos fatos ocorridos, sendo suficiente que demonstre presentes o fummus comissi delict e o periculum libertatis, como se deu na espécie, sendo certo que a via estreita do habeas corpus não é adequada para discussão acerca da autoria delitiva como pretendem os impetrantes. A propósito, acerca do tema, esta é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ROUBO MAJORADO. PRISÃO. FUNDAMENTAÇÃO. CRIME PRATICADO MEDIANTE EMPREGO DE VIOLÊNCIA REAL (SOCOS CONTRA A VÍTIMA) E EM CONCURSO DE PESSOAS. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. ART. 312 DO CPP. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Para a decretação da prisão preventiva, é indispensável a demonstração da existência da prova da materialidade do crime e a presença de indícios suficientes da autoria. Exige-se, mesmo que a decisão esteja pautada em lastro probatório, que se ajuste às hipóteses excepcionais da norma em abstrato (art. 312 do CPP), demonstrada, ainda, a imprescindibilidade da medida. Precedentes do STF e STJ. 2. A gravidade concreta do crime como fundamento para a decretação ou manutenção da prisão preventiva deve ser aferida, como no caso, a partir de dados colhidos da conduta delituosa praticada pelo agente, que revelem uma periculosidade acentuada a ensejar uma atuação do Estado cerceando sua liberdade para garantia da ordem pública, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal. 3. Com efeito, a segregação cautelar foi decretada pelo Juízo processante e mantida pelo Tribunal estadual com esteio em circunstâncias concretas do caso, ressaltando a periculosidade do ora recorrente, evidenciada pelo modus operandi, uma vez que o acusado, em concurso com outro agente, teria praticado o roubo contra a vítima, no qualos objetos (celular e carregador portátil) foramsubtraídos mediante violência real, consistente em agressões físicas (socos). Evidente, portanto, a gravidade concreta da conduta, apta a justificar a custódia preventiva. 4. Registre-se, ainda, que as condições subjetivas favoráveis ao recorrente, tais como primariedade, bons antecedentes, residência fixa e trabalho lícito, por si sós, não obstam a segregação cautelar, quando presentes os requisitos legais para a decretação da prisão preventiva. 5. Agravo regimental desprovido. (STJ, AgRg no RHC 145.065/MG, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 13/04/2021, DJe 19/04/2021). Destacamos Nesse particular, não se pode olvidar que, o Superior Tribunal de Justiça decidiu, ainda, que “A propósito, este Superior Tribunal de Justiça possui jurisprudência consolidada no sentido de que "a gravidade concreta da conduta, reveladora do potencial elevado grau de periculosidade do Agente e consubstanciada na alta reprovabilidade do modus operandi empregado na empreitada delitiva, é fundamento idôneo a lastrear a prisão preventiva, com o intuito de preservar a ordem pública" (AgRg no HC n. 687.840/MS, Relatora Ministra LAURITA VAZ, Sexta Turma, julgado em 13/12/2022, DJe de 19/12/2022).” (AgRg no RHC n. 179.386/RN, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 9/5/2023, DJe de 15/5/2023.) Destacamos Daí por que, não é demais repetir que agiu corretamente o juízo de primeiro grau, porque, em se tratando de custódia cautelar, a regra disposta no art. 312 do Código de Processo Penal, estabelece os seguintes requisitos para sua decretação: Art. 312: A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. Destacamos Diante disso, embora não se possa esquecer que o ordenamento jurídico pátrio reconheça a liberdade como regra, tem-se que o carcer ad cautelam imposto à paciente deve ser mantido, por estarem configurados, na hipótese, tanto o fumus comissi delicti, externado pela existência da materialidade e pelos indícios suficientes da autoria delitiva quanto periculum libertatis, decorrente da necessidade da medida extrema para garantir a ordem pública. Noutra vertente, em que pese as alegações dos impetrantes no sentido que há nulidade na decisão que negou a participação da paciente na audiência de instrução, ao argumento de que se encontrava foragida, tal tese não merece prosperar. Com efeito, a decisão do magistrado de primeiro grau se mostra harmonizada com a atual jurisprudência atual do Superior Tribunal de Justiça, que, por sua vez, possui o entendimento de que o estado de foragido do réu constitui, de fato, fundamento suficiente para a negativa de sua participação na audiência de instrução, conforme se observa dos julgados abaixo ementados: DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIOS QUALIFICADOS TENTADO E CONSUMADO. INTERROGATÓRIO VIRTUAL DE RÉU FORAGIDO. ORDEM DENEGADA. I. Caso em exame 1. Habeas corpus visando à nulidade da decisão de pronúncia, em razão do indeferimento da oitiva virtual do paciente em audiência de instrução. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se houve cerceamento de defesa com o indeferimento do interrogatório por videoconferência do paciente, considerando sua condição de foragido. III. Razões de decidir 3. O paciente não foi interrogado em audiência instrutória devido à existência de mandado de prisão preventiva em seu desfavor, estando foragido. 4. A jurisprudência deste Superior Tribunal é firme no sentido da inexistência de nulidade pela não realização de interrogatório de réu foragido, que possui advogado constituído nos autos, não podendo se beneficiar de sua condição para ser interrogado por videoconferência. IV. Dispositivo e tese 5. Ordem denegada. Tese de julgamento: "1. Não há cerceamento de defesa em razão do indeferimento virtual do interrogatório de réu foragido. 2. O princípio da lealdade processual impede que o réu se beneficie de sua condição de foragido para participar de audiências por videoconferência." Dispositivos relevantes citados: CPP, art. 220.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no HC n. 825.382/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 22/9/2023; e STJ, HC n. 640.770/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe 21/6/2021. (HC n. 976.451/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 9/4/2025, DJEN de 15/4/2025.) Destacamos AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRISÃO PREVENTIVA. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA DE PRONÚNCIA. MANUTENÇÃO DA CUSTÓDIA. PLEITO DE REVOGAÇÃO PARA COMPARECIMENTO À AUDIÊNCIA PARA INTERROGATÓRIO. PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA. AUTODEFESA. DIREITO À AUDIÊNCIA E DE PRESENÇA. DIREITO DISPONÍVEL. PRESENCIAL OU POR VIDEOCONFERÊNCIA. RÉU FORAGIDO. IMPOSSIBILIDADE. PARECER ACOLHIDO. INEVIDÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. 1. A garantia fundamental da ampla defesa se desdobra no direito à defesa técnica, de caráter indisponível, e no direito à autodefesa, nas vertentes do direito de audiência e no direito de presença, ambos disponíveis. Com efeito, o direito de presença do réu é desdobramento do princípio da ampla defesa, em sua vertente autodefesa, franqueando-se ao réu a possibilidade de presenciar e participar da instrução processual, auxiliando seu advogado, se for o caso, na condução, direcionamento dos questionamentos e diligências. Nada obstante, não se trata de direito absoluto, sendo pacífico nos Tribunais Superiores que a presença do réu na audiência de instrução, embora conveniente, não é indispensável para a validade do ato, e, consubstanciando-se em nulidade relativa, necessita para a sua decretação da comprovação de efetivo prejuízo para a defesa, o que não ficou demonstrado no caso dos autos (AgRg no HC n. 411.033/PE, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 20/10/2017). 2. Estando o réu solto, cabe ao Estado-acusador, a fim de garantir ao réu o exercício do seu direito, cientificá-lo da prática do ato para que o réu exerça ou não seu direito à autodefesa. 3. Constitui fundamento suficiente para negar participação telepresencial em audiência marcada presencialmente o fato de o réu estar foragido. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg no RHC n. 203.120/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 26/2/2025, DJEN de 10/3/2025.) Destacamos Por sua vez, este Tribunal de Justiça, seguindo a mesma linha intelectiva, deixou assentado: HABEAS CORPUS – TRIBUNAL DO JÚRI – PRETENSÃO – AUTORIZAÇÃO PARA PARTICIPAÇÃO EM AUDIÊNCIA DE INTERROGATÓRIO POR VIDEOCONFERÊNCIA – PEDIDO NEGADO PELO JUIZO DE ORIGEM – RÉ FORAGIDA – AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL – DEVER DE PRESERVAÇÃO DA BOA-FÉ OBJETIVA NO ÂMBITO PROCESSUAL – INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL - ORDEM DENEGADA. A negativa da participação na sessão de julgamento do Tribunal do Júri designada se amparou na constrição da liberdade decretada e não cumprida, harmonizando com as recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça [HC n. 835.620, Min. Og Fernandes, DJe de 05/07/2023] e do Supremo Tribunal Federal [HC n. 229.517 Min. Cármen Lúcia, DJe de 27/06/2023] no sentido de que, o fato de estar a ré foragida, revela motivo idôneo para a custódia cautelar e negativa de participação do julgamento por videoconferência. (N.U 1033028-22.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RUI RAMOS RIBEIRO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 10/12/2024, Publicado no DJE 13/12/2024) Destacamos Posto isso, em sintonia com o parecer ministerial, julgo improcedentes os pedidos deduzidos em favor de Rosa Maria Silva Lopes; por consequência, denego a ordem de habeas corpus almejada. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/06/2025

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Processo nº 1016747-54.2025.8.11.0000

ID: 298332701

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara Criminal Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL Nº Processo: 1016747-54.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 13/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

JUÍZO DA 5ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE SINOP

Acórdão

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1016747-54.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Roubo Majorado, Quadrilha ou Bando, Prisão Preve… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1016747-54.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Roubo Majorado, Quadrilha ou Bando, Prisão Preventiva] Relator: Des(a). LUIZ FERREIRA DA SILVA Turma Julgadora: [DES(A). LUIZ FERREIRA DA SILVA, DES(A). GILBERTO GIRALDELLI, DES(A). JUANITA CRUZ DA SILVA CLAIT DUARTE] Parte(s): [ROBSON DA SILVA - CPF: 707.370.371-72 (ADVOGADO), ROSA MARIA SILVA LOPES - CPF: 445.705.899-87 (PACIENTE), JUÍZO DA QUINTA VARA CRIMINAL DE SINOP (IMPETRADO), TALLITA ROSA CRUZ DE ALMEIDA - CPF: 011.879.541-44 (IMPETRANTE), TALLITA ROSA CRUZ DE ALMEIDA - CPF: 011.879.541-44 (ADVOGADO), ROBSON DA SILVA - CPF: 707.370.371-72 (IMPETRANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (TERCEIRO INTERESSADO), EDUARDO VINICIUS SOUZA SILVA - CPF: 062.342.501-73 (TERCEIRO INTERESSADO), GUIRI DE OLIVEIRA ALBUQUERQUE MUNHOZ - CPF: 678.140.262-53 (TERCEIRO INTERESSADO), CAMILLY VITORIA CANICA DE ALMEIDA - CPF: 094.760.441-36 (TERCEIRO INTERESSADO), KLEBBER LIMA FERREIRA - CPF: 036.942.871-40 (TERCEIRO INTERESSADO), RAFAEL AUGUSTO DA SILVA - CPF: 038.000.611-12 (TERCEIRO INTERESSADO), WEVERTON CARDOSO DA SILVA - CPF: 089.591.581-27 (TERCEIRO INTERESSADO), JANAINA SILVA LOPES FERREIRA - CPF: 031.384.521-24 (TERCEIRO INTERESSADO), MARCOS COELHO DOS SANTOS - CPF: 892.248.251-68 (VÍTIMA), JUÍZO DA 5ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE SINOP (IMPETRADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). LUIZ FERREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DENEGOU A ORDEM. E M E N T A Ementa. Direito processual penal. Habeas corpus. Prisão preventiva. Fundamentação idônea. Ré foragida. Indeferimento de participação em audiência. Ordem denegada. I. Caso em exame 1. Habeas corpus impetrado contra decisão do Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT, que decretou a prisão preventiva da paciente pela suposta prática dos crimes de organização criminosa, roubo majorado e sequestro e cárcere privado, indeferindo sua participação na audiência de instrução e julgamento em razão de sua condição de foragida. II. Questões em discussão 2. Há duas questões em discussão: (i) verificar se a prisão preventiva da paciente foi fundamentada de forma idônea, conforme os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal; e (ii) apurar se a ausência de intimação ou negativa de participação da paciente, por estar foragida, configura nulidade da audiência de instrução e julgamento. III. Razões de decidir 3. A prisão preventiva está devidamente fundamentada com base na gravidade concreta dos crimes imputados, na periculosidade evidenciada pelo modus operandi e na existência de risco de reiteração delitiva, demonstrando o periculum libertatis e atendendo ao art. 312 do CPP. 4. A jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça considera legítima a negativa de participação do réu foragido em audiência de instrução, inclusive por videoconferência, não configurando cerceamento de defesa. IV. Dispositivo e teses 5. Ordem denegada. Teses de julgamento: “1. A prisão preventiva é legítima quando baseada na gravidade concreta do crime e no risco de reiteração delitiva. 2. O estado de foragido do réu justifica a negativa de sua participação na audiência de instrução, não configurando cerceamento de defesa.” _____________ Dispositivos relevantes citados: CPP, arts. 220 e 312. Jurisprudências relevantes citadas: STJ, HC n. 976.451/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, j. 09/04/2025; STJ, AgRg no RHC n. 203.120/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, j. 26/02/2025; STJ, AgRg no RHC n. 179.386/RN, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 15/05/2023; STJ, AgRg no RHC 145.065/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. 13/04/2021; TJMT, N.U 1033028-22.2024.8.11.0000, Rel. Des. Rui Ramos Ribeiro, Segunda Câmara Criminal, J. 10/12/2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. LUIZ FERREIRA DA SILVA: Ilustres membros da Terceira Câmara Criminal: Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado pelos advogados Robson da Silva e Tallita Rosa Cruz de Almeida em favor de Rosa Maria Silva Lopes, apontando como autoridade coatora o Juízo da 5ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT. Depreende-se desta impetração que a paciente teve sua prisão preventiva decretada no dia 4 de abril de 2025, em razão da decisão prolatada nos autos da Ação Penal n. 1000123-25.2024.8.11.0109, pela suposta prática dos crimes de integrar organização criminosa (art. 2º, § 2º, da Lei n. 12.850/13), roubo majorado (art. 157 §2º, II e V, §2º-A, I, do Código Penal) e sequestro e cárcere privado (art. 148 do Código Penal), todavia, mesmo após a expedição de mandado de prisão, a referida decisão não foi cumprida em razão da condição de foragida da paciente. Sustentam, os impetrantes, que juízo de primeiro grau negou o pedido de participação da paciente na audiência de instrução e julgamento, justificando a negativa pela condição de foragida dela, defendendo que a decisão do magistrado deve ser declarada nula, eis que “não há previsão legal, para que o Magistrado negue à Paciente o direito de participar da audiência, para poder esclarecer os fatos que estão sendo-lhe imputados e exercer seu direito de autodefesa”. Alegam que a autoridade acoimada de coatora ordenou a prisão preventiva da paciente em decisão desfundamentada, eis que não apontou elementos idôneos; acrescentando, outrossim, que, na espécie, não estão presentes os requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal, mormente ante a ausência de demonstração do periculum libertatis. Forte nas razões acima consignadas, liminarmente, postulam a revogação da prisão preventiva da paciente, com a expedição do alvará de soltura em seu favor e que seja anulada a decisão que negou a ela o direito de participar da audiência de instrução e julgamento. E, no mérito, a convolação da medida de urgência, porventura deferida, em definitiva. O pedido de urgência foi indeferido por intermédio das razões encontradiças no ID 289864864, tendo sido dispensadas as informações do juízo de primeiro grau. Nesta instância revisora, a Procuradoria-Geral de Justiça, com fulcro no parecer juntado no ID 290842378, opinou pela denegação da ordem. É o relatório. V O T O R E L A T O R No que se refere à alegada inexistência dos requisitos autorizadores da decretação da prisão preventiva da paciente, elencados no art. 312 do Código de Processo Penal, vê-se que essa tese não se sustenta, eis que o juízo de primeiro grau considerou corretamente como elemento capaz de autorizar à prolação do édito judicial invectivado: a garantia da ordem pública, tendo em vista o meio de execução e o profissionalismo com o qual os delitos foram praticados, revelando a periculosidade dos agentes envolvidos. Nesse tocante, imperioso se faz transcrever os argumentos do magistrado de primeira instância ao converter a prisão em flagrante da paciente em preventiva: [...] Embora seja certo que a gravidade dos delitos, por si só, não basta para a decretação da custódia, a forma de execução, a conduta do agente, antes e depois do ilícito, e outras circunstâncias podem abalar a ordem pública, impondo-se a medida como garantia do próprio prestígio e segurança da atividade jurisdicional. Anote-se que a gravidade concreta dos crimes demonstra a necessidade da prisão cautelar dos investigados, mormente porque os elementos colhidos até o momento revelam que os representados agiram com extrema frieza, mediante grave ameaça contra a vítima. Impende salientar a forma que os representados executaram a pratica dos delitos demonstrando extremo profissionalismo, restringindo a liberdade da vítima até que o veículo fosse transportado até o local de destino. Não bastassem todos esses elementos a apontar a gravidade concreta, concluo que o modo de execução dos delitos demonstra a periculosidade dos representados, reforçando a ideia de que a prisão preventiva é medida a resguardar a ordem pública. Em virtude dessas considerações, há forte receio de que os representados, em liberdade, continuem a colocar em risco o meio social, encorajando-os a continuar na prática de novos crimes. (...) Em razão dessa circunstância que, alinhadas à gravidade concreta dos crimes de roubo majorado com emprego da arma de fogo e restrição da liberdade da vítima, organização criminal, seqüestro e cárcere privado (recalcitrância criminosa), corrobora para a decretação da prisão preventiva como meio de garantir a ordem pública e evitar a renitência delitiva, se não vejamos: “O risco de reiteração delitiva, fator concreto que justifica a manutenção da custódia cautelar para a garantia da ordem pública, pode ser deduzido da existência de inquéritos policiais e de ações penais por infrações dolosas em curso, sem qualquer afronta ao princípio da presunção de inocência.” – Enunciado n. 06 TJ/MT. Assim, entendo que a gravidade concreta dos delitos, a sua repercussão na sociedade e a recalcitrância criminosa dos representados evidenciam a insegurança gerada no meio social. Anote-se por importante que a garantia da ordem pública é o fundamento disposto no artigo 312 do CPP, cuja presença autoriza a segregação cautelar ora representada, vez que o contrário colocaria em xeque à ordem social. [...] Destacamos Depreende-se, pois, que o decisum vergastado está suficientemente fundamentado, uma vez que seu prolator indicou os motivos de seu convencimento para decretar a custódia cautelar da paciente, demonstrando os requisitos exigidos pelo art. 312 do Código de Processo Penal, destacando a gravidade concreta que envolve roubo majorado com emprego da arma de fogo e restrição da liberdade da vítima, organização criminal, sequestro e cárcere privado, consubstanciada no modus operandi audaz e gravoso supostamente empregado pelos réus. Ademais, embora não tenha sido demonstrada a conduta pormenorizada de cada um dos acusados quando da decretação da prisão preventiva, de modo que os impetrantes alegam, inclusive, que a paciente não tinha conhecimento de que seu veículo seria utilizado para a prática criminosa, não se exige [nem se poderia exigir], nesse momento processual, que o magistrado tenha convicção plena dos fatos ocorridos, sendo suficiente que demonstre presentes o fummus comissi delict e o periculum libertatis, como se deu na espécie, sendo certo que a via estreita do habeas corpus não é adequada para discussão acerca da autoria delitiva como pretendem os impetrantes. A propósito, acerca do tema, esta é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. ROUBO MAJORADO. PRISÃO. FUNDAMENTAÇÃO. CRIME PRATICADO MEDIANTE EMPREGO DE VIOLÊNCIA REAL (SOCOS CONTRA A VÍTIMA) E EM CONCURSO DE PESSOAS. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. ART. 312 DO CPP. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Para a decretação da prisão preventiva, é indispensável a demonstração da existência da prova da materialidade do crime e a presença de indícios suficientes da autoria. Exige-se, mesmo que a decisão esteja pautada em lastro probatório, que se ajuste às hipóteses excepcionais da norma em abstrato (art. 312 do CPP), demonstrada, ainda, a imprescindibilidade da medida. Precedentes do STF e STJ. 2. A gravidade concreta do crime como fundamento para a decretação ou manutenção da prisão preventiva deve ser aferida, como no caso, a partir de dados colhidos da conduta delituosa praticada pelo agente, que revelem uma periculosidade acentuada a ensejar uma atuação do Estado cerceando sua liberdade para garantia da ordem pública, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal. 3. Com efeito, a segregação cautelar foi decretada pelo Juízo processante e mantida pelo Tribunal estadual com esteio em circunstâncias concretas do caso, ressaltando a periculosidade do ora recorrente, evidenciada pelo modus operandi, uma vez que o acusado, em concurso com outro agente, teria praticado o roubo contra a vítima, no qualos objetos (celular e carregador portátil) foramsubtraídos mediante violência real, consistente em agressões físicas (socos). Evidente, portanto, a gravidade concreta da conduta, apta a justificar a custódia preventiva. 4. Registre-se, ainda, que as condições subjetivas favoráveis ao recorrente, tais como primariedade, bons antecedentes, residência fixa e trabalho lícito, por si sós, não obstam a segregação cautelar, quando presentes os requisitos legais para a decretação da prisão preventiva. 5. Agravo regimental desprovido. (STJ, AgRg no RHC 145.065/MG, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 13/04/2021, DJe 19/04/2021). Destacamos Nesse particular, não se pode olvidar que, o Superior Tribunal de Justiça decidiu, ainda, que “A propósito, este Superior Tribunal de Justiça possui jurisprudência consolidada no sentido de que "a gravidade concreta da conduta, reveladora do potencial elevado grau de periculosidade do Agente e consubstanciada na alta reprovabilidade do modus operandi empregado na empreitada delitiva, é fundamento idôneo a lastrear a prisão preventiva, com o intuito de preservar a ordem pública" (AgRg no HC n. 687.840/MS, Relatora Ministra LAURITA VAZ, Sexta Turma, julgado em 13/12/2022, DJe de 19/12/2022).” (AgRg no RHC n. 179.386/RN, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 9/5/2023, DJe de 15/5/2023.) Destacamos Daí por que, não é demais repetir que agiu corretamente o juízo de primeiro grau, porque, em se tratando de custódia cautelar, a regra disposta no art. 312 do Código de Processo Penal, estabelece os seguintes requisitos para sua decretação: Art. 312: A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. Destacamos Diante disso, embora não se possa esquecer que o ordenamento jurídico pátrio reconheça a liberdade como regra, tem-se que o carcer ad cautelam imposto à paciente deve ser mantido, por estarem configurados, na hipótese, tanto o fumus comissi delicti, externado pela existência da materialidade e pelos indícios suficientes da autoria delitiva quanto periculum libertatis, decorrente da necessidade da medida extrema para garantir a ordem pública. Noutra vertente, em que pese as alegações dos impetrantes no sentido que há nulidade na decisão que negou a participação da paciente na audiência de instrução, ao argumento de que se encontrava foragida, tal tese não merece prosperar. Com efeito, a decisão do magistrado de primeiro grau se mostra harmonizada com a atual jurisprudência atual do Superior Tribunal de Justiça, que, por sua vez, possui o entendimento de que o estado de foragido do réu constitui, de fato, fundamento suficiente para a negativa de sua participação na audiência de instrução, conforme se observa dos julgados abaixo ementados: DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIOS QUALIFICADOS TENTADO E CONSUMADO. INTERROGATÓRIO VIRTUAL DE RÉU FORAGIDO. ORDEM DENEGADA. I. Caso em exame 1. Habeas corpus visando à nulidade da decisão de pronúncia, em razão do indeferimento da oitiva virtual do paciente em audiência de instrução. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se houve cerceamento de defesa com o indeferimento do interrogatório por videoconferência do paciente, considerando sua condição de foragido. III. Razões de decidir 3. O paciente não foi interrogado em audiência instrutória devido à existência de mandado de prisão preventiva em seu desfavor, estando foragido. 4. A jurisprudência deste Superior Tribunal é firme no sentido da inexistência de nulidade pela não realização de interrogatório de réu foragido, que possui advogado constituído nos autos, não podendo se beneficiar de sua condição para ser interrogado por videoconferência. IV. Dispositivo e tese 5. Ordem denegada. Tese de julgamento: "1. Não há cerceamento de defesa em razão do indeferimento virtual do interrogatório de réu foragido. 2. O princípio da lealdade processual impede que o réu se beneficie de sua condição de foragido para participar de audiências por videoconferência." Dispositivos relevantes citados: CPP, art. 220.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no HC n. 825.382/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 22/9/2023; e STJ, HC n. 640.770/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, DJe 21/6/2021. (HC n. 976.451/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 9/4/2025, DJEN de 15/4/2025.) Destacamos AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRISÃO PREVENTIVA. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA DE PRONÚNCIA. MANUTENÇÃO DA CUSTÓDIA. PLEITO DE REVOGAÇÃO PARA COMPARECIMENTO À AUDIÊNCIA PARA INTERROGATÓRIO. PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA. AUTODEFESA. DIREITO À AUDIÊNCIA E DE PRESENÇA. DIREITO DISPONÍVEL. PRESENCIAL OU POR VIDEOCONFERÊNCIA. RÉU FORAGIDO. IMPOSSIBILIDADE. PARECER ACOLHIDO. INEVIDÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. 1. A garantia fundamental da ampla defesa se desdobra no direito à defesa técnica, de caráter indisponível, e no direito à autodefesa, nas vertentes do direito de audiência e no direito de presença, ambos disponíveis. Com efeito, o direito de presença do réu é desdobramento do princípio da ampla defesa, em sua vertente autodefesa, franqueando-se ao réu a possibilidade de presenciar e participar da instrução processual, auxiliando seu advogado, se for o caso, na condução, direcionamento dos questionamentos e diligências. Nada obstante, não se trata de direito absoluto, sendo pacífico nos Tribunais Superiores que a presença do réu na audiência de instrução, embora conveniente, não é indispensável para a validade do ato, e, consubstanciando-se em nulidade relativa, necessita para a sua decretação da comprovação de efetivo prejuízo para a defesa, o que não ficou demonstrado no caso dos autos (AgRg no HC n. 411.033/PE, Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe 20/10/2017). 2. Estando o réu solto, cabe ao Estado-acusador, a fim de garantir ao réu o exercício do seu direito, cientificá-lo da prática do ato para que o réu exerça ou não seu direito à autodefesa. 3. Constitui fundamento suficiente para negar participação telepresencial em audiência marcada presencialmente o fato de o réu estar foragido. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg no RHC n. 203.120/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 26/2/2025, DJEN de 10/3/2025.) Destacamos Por sua vez, este Tribunal de Justiça, seguindo a mesma linha intelectiva, deixou assentado: HABEAS CORPUS – TRIBUNAL DO JÚRI – PRETENSÃO – AUTORIZAÇÃO PARA PARTICIPAÇÃO EM AUDIÊNCIA DE INTERROGATÓRIO POR VIDEOCONFERÊNCIA – PEDIDO NEGADO PELO JUIZO DE ORIGEM – RÉ FORAGIDA – AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL – DEVER DE PRESERVAÇÃO DA BOA-FÉ OBJETIVA NO ÂMBITO PROCESSUAL – INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL - ORDEM DENEGADA. A negativa da participação na sessão de julgamento do Tribunal do Júri designada se amparou na constrição da liberdade decretada e não cumprida, harmonizando com as recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça [HC n. 835.620, Min. Og Fernandes, DJe de 05/07/2023] e do Supremo Tribunal Federal [HC n. 229.517 Min. Cármen Lúcia, DJe de 27/06/2023] no sentido de que, o fato de estar a ré foragida, revela motivo idôneo para a custódia cautelar e negativa de participação do julgamento por videoconferência. (N.U 1033028-22.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RUI RAMOS RIBEIRO, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 10/12/2024, Publicado no DJE 13/12/2024) Destacamos Posto isso, em sintonia com o parecer ministerial, julgo improcedentes os pedidos deduzidos em favor de Rosa Maria Silva Lopes; por consequência, denego a ordem de habeas corpus almejada. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/06/2025

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