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Processo nº 0800508-41.2023.8.14.0130

ID: 258678441

Tribunal: TJPA Órgão: Vara Única de Ulianópolis Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0800508-41.2023.8.14.0130

Data de Disponibilização: 21/04/2025

Polo Ativo:

MARIA DAGIUSA DA SILVA

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

WAIRES TALMON COSTA JUNIOR

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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE ULIANÓPOLIS-PA Processo nº. 0800508-41.2023.8.14.0130 AUTOR: MARIA DAGIUSA DA SILVA REU: BANCO BRADESCO S.A SENTENÇA I … PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE ULIANÓPOLIS-PA Processo nº. 0800508-41.2023.8.14.0130 AUTOR: MARIA DAGIUSA DA SILVA REU: BANCO BRADESCO S.A SENTENÇA I - RELATÓRIO Trata-se de Ação Declaratória de Contrato Inexistente e/ou Nulo c/c Obrigação de Fazer c/c Indenização por Danos Materiais e Morais com pedido de tutela de urgência ajuizada por MARIA DAGIUSA DA SILVA em face de BANCO BRADESCO S.A. Alega a parte autora, em síntese, que, ao se aposentar, procurou a agência do banco réu para abertura de conta na qual receberia seu provento mensal. Sustenta que o banco réu, mesmo ciente da obrigação de fornecer a opção de conta benefício, suprimiu tal informação e procedeu com a abertura de conta corrente na Ag. 6153, sob o número 4537-3, onerando a autora desnecessariamente com diversas tarifas bancárias. Requereu a declaração de inexistência e/ou nulidade do Contrato de Abertura de Conta Corrente, a conversão da conta corrente para a modalidade benefício, a devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente, e a condenação do réu ao pagamento de indenização a título de danos morais. Decisão no id 122421286 recebeu a petição inicial, reiterou o deferimento da justiça gratuita, deferiu a inversão do ônus da prova, indeferiu o pedido liminar e determinou a citação do requerido. O requerido compareceu aos autos e apresentou contestação no id. 128319371, suscitando preliminarmente: prescrição trienal; impugnação à justiça gratuita; falta de interesse de agir; conexão com outros processos; inépcia da petição inicial por irregularidade na procuração, falta de comprovante de endereço e ausência de documentos essenciais. No mérito, sustentou que a contratação do pacote de serviços foi regular. Argumentou que a autora utilizou regularmente os serviços disponibilizados, o que configuraria aceitação tácita da contratação. Adicionalmente, o banco réu formulou pedido contraposto, requerendo a condenação da autora ao pagamento das tarifas individuais de cada operação financeira realizada nos últimos 5 anos. Requereu, ao final, a improcedência dos pedidos autorais. Réplica no id 133166302. Vieram os autos conclusos É o relatório. Decido. II - FUNDAMENTAÇÃO De início, verifico que o banco réu suscita inicialmente a necessidade de comparecimento pessoal da parte autora para esclarecimentos. Todavia, tal pleito não merece acolhimento. O ônus da prova quanto à contratação da cesta de serviços recai sobre o réu, nos termos do art. 373, II, do CPC, não sendo razoável impor à autora o ônus de comparecer pessoalmente para negar a existência de um contrato. Ademais, o depoimento pessoal só se justifica quando necessário ao esclarecimento de fatos controvertidos relevantes, o que não é o caso, pois a controvérsia pode ser solucionada com base na simples juntada de documentação. Há preliminares, as quais passo a examinar. Da prescrição trienal O banco réu suscita preliminarmente a ocorrência de prescrição trienal, com base no art. 206, § 3º, V, do Código Civil, alegando que o caso trata de vício e não de fato do produto ou serviço. A preliminar não merece acolhimento. A relação jurídica estabelecida entre as partes é indubitavelmente de consumo, estando submetida às normas do Código de Defesa do Consumidor, conforme pacificado na Súmula 297 do STJ: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." No caso em análise, aplica-se o prazo prescricional previsto no art. 27 do CDC, isto é, a prescrição quinquenal e a contagem do prazo de prescrição deve se iniciar a partir do último desconto na conta de titularidade da autora, conforme entendimento do STJ: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS. PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL. ART. 27 DO CDC. PRECEDENTES. TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO. DATA DO ÚLTIMO DESCONTO. ACÓRDÃO EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA N. 83/STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. 1. A jurisprudência sedimentada nesta Corte Superior é no sentido de que, fundando-se o pedido na ausência de contratação de empréstimo com instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo quinquenal previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor. 2. Em relação ao termo inicial, insta esclarecer que a jurisprudência desta Casa é firme no sentido de que o prazo prescricional para o exercício da referida pretensão flui a partir da data do último desconto no benefício previdenciário. 3. Agravo interno improvido.” ( AgInt no AREsp n. 1.728.230/MS, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe de 15/3/2021.) Considerando que a presente ação foi ajuizada em maio de 2023 e que os descontos questionados ocorreram entre e 15/01/2019 e 14/05/2021, não há que se falar em prescrição, pois não transcorreu o prazo quinquenal previsto na legislação aplicável ao caso. Rejeito, portanto, a preliminar de prescrição. Da impugnação à gratuidade da justiça O réu impugnou a concessão da gratuidade da justiça à parte autora. Contudo, a declaração de hipossuficiência goza de presunção relativa de veracidade, nos termos do art. 99, §3º, do CPC. No caso, a autora apresentou extrato bancário que demonstra renda mensal líquida de R$ 660,00 (seiscentos e sessenta reais), id 93707327, pág. 5, valor que se mostra evidentemente insuficiente para custear as despesas processuais sem prejuízo de seu sustento. A documentação trazida aos autos é, portanto, suficiente para comprovar a situação de hipossuficiência econômica da parte autora, mantendo-se o benefício da gratuidade de justiça. Do interesse de agir O réu suscita preliminar de falta de interesse de agir, sob o argumento de que a autora não teria tentado solucionar a questão administrativamente. Tal alegação não merece prosperar. O acesso à justiça é garantia constitucional prevista no art. 5º, XXXV, da CF/88, não se exigindo o prévio esgotamento da via administrativa para a propositura de ação judicial. Ademais, conforme documentado nos autos (id 94350489), houve tentativa de composição extrajudicial por parte da autora, que não obteve resposta. Assim, presente o interesse de agir, rejeito a preliminar suscitada. Da conexão entre as demandas O réu alega conexão do presente processo com outras ações ajuizadas ( processos 00063498920198140130 e 00064710520198140130) pela parte autora. Contudo, para a configuração da conexão, é necessária a identidade de causa de pedir ou pedido, conforme o art. 55 do CPC. No caso em análise, as demandas possuem objetos e causas de pedir distintas, não havendo identidade que justifique o reconhecimento da conexão. A simples identidade de partes não é suficiente para caracterizar a conexão. Além disso, os processos mencionados pelo réu como supostamente conexos já foram inclusive sentenciados, não sendo possível a reunião de processos em fases processuais distintas, especialmente quando já houve julgamento de mérito em alguns deles. Rejeito, portanto, a preliminar de conexão. Inépcia da inicial - procuração com assinatura digital O requerido alega invalidade da assinatura na procuração por ter sido realizada em plataforma eletrônica. Tal tese, no entanto, não merece prosperar, uma vez que a jurisprudência já entendeu ser dispensável inclusive a assinatura ICP, de forma que outras assinaturas digitais gozam da mesma validade. Vejamos: Ação declaratória c.c obrigação de fazer e reparação de danos materiais e morais – Contratação de empréstimo consignado não reconhecido pela autora– Improcedência – Inaplicabilidade da inversão do ônus da prova, por ausência de verossimilhança das alegações da autora – Conjunto probatório demonstrou a contratação do empréstimo, exibindo contrato assinado por meio eletrônico, acompanhado de documento de identificação da autora e foto selfie'– Desnecessidade de que a assinatura digital seja certificada pelo ICP-Brasil– Crédito do valor mutuado creditado na conta corrente da autora – Débito das prestações avençadas em benefício da autora realizado em exercício regular de direito do credor – Sentença mantida – Recurso negado.(TJSP; Apelação Cível 1075022-72.2022.8.26.0100; Relator (a): Francisco Giaquinto; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível-40ª Vara Cível; Data do Julgamento: 20/02/2024; Data de Registro:20/02/2024) Afasto, portanto, a preliminar. Inépcia da inicial - Da ausência de comprovante de endereço em nome da parte autora. A requerida também alega que a autora juntou aos autos comprovante de residência inválido, pois a pertencente a terceiro. Ocorre que o artigo 319, inciso II, do CPC exige apenas a indicação do domicílio e da residência do autor e do réu, sem determinação específica quanto à juntada de comprovante de endereço. Verifico que a parte autora indicou seu endereço na petição inicial, cumprindo o disposto na legislação processual. Rejeito, portanto, a preliminar. Da inépcia da petição inicial - ausência de tabela discriminatória de valores O réu alega inépcia da petição inicial com fundamento na ausência de tabela discriminatória de valores, argumentando que a parte autora não teria apresentado os detalhes dos descontos e datas em que ocorreram. Tal preliminar não merece acolhimento. A petição inicial atende plenamente aos requisitos do art. 319 do CPC, apresentando causa de pedir clara e determinada, bem como pedido certo quanto ao montante pleiteado a título de repetição de indébito (R$ 2.346,40), correspondente ao dobro dos valores descontados indevidamente entre 15/01/2019 e 14/05/2021 (R$ 1.173,20). Ademais, o réu não demonstrou qualquer prejuízo à sua defesa em razão da ausência da referida tabela, tendo apresentado contestação abrangente e específica sobre todos os pontos da demanda. Por fim, em atenção ao princípio da instrumentalidade das formas (art. 277 do CPC) e da primazia do julgamento de mérito (art. 4º do CPC), eventuais defeitos formais que não prejudiquem a compreensão da demanda e a ampla defesa do réu não devem conduzir à extinção do processo. Rejeito, portanto, a preliminar de inépcia da petição inicial por ausência de tabela discriminatória de valores. Superadas as preliminares, passo, agora, ao julgamento antecipado do mérito, nos termos do art. 355, I, do Código de Processo Civil, por entender que não há necessidade de produção de outras provas além daquelas já constantes dos autos. A controvérsia central da presente demanda consiste em verificar se houve falha na prestação de serviço do banco réu ao proceder com a abertura de conta corrente em nome da autora, com cobrança de tarifas, ao invés de conta benefício para recebimento do benefício previdenciário, sem ônus. Primeiramente, cabe destacar que a relação jurídica estabelecida entre as partes é tipicamente de consumo, estando submetida às regras do Código de Defesa do Consumidor, conforme entendimento já pacificado pelo STJ (Súmula 297). Na condição de fornecedor de serviços, o banco réu responde objetivamente pelos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, nos termos do art. 14 do CDC, independentemente da existência de culpa. No caso em tela, observa-se que o banco réu não demonstrou que ofereceu à autora a opção de abertura de conta benefício, sem cobrança de tarifas, para recebimento de sua aposentadoria, nem comprovou que a autora optou conscientemente pela abertura de conta corrente com cobrança de tarifas. De fato, o banco réu não juntou aos autos nenhum contrato ou documento que demonstre a manifestação de vontade inequívoca da autora em optar pela conta corrente em detrimento da conta benefício, ônus que lhe incumbia, nos termos do art. 373, II, do CPC, sobretudo considerando a inversão do ônus da prova em favor da consumidora. O réu tampouco comprovou a efetiva contratação da cesta de serviços pela autora. Vale ressaltar que a autora é pessoa idosa, com baixa escolaridade e desconhecimento de assuntos bancários, conforme alegado na inicial e não refutado pelo réu, circunstância que impunha ao banco o dever de prestar informações claras e adequadas sobre os serviços oferecidos, em respeito ao princípio da transparência e ao dever de informação, consagrados nos arts. 6º, III, e 46 do CDC. O princípio da transparência, aliado ao dever de informação, impõe ao fornecedor a obrigação de prestar ao consumidor todas as informações acerca do produto e do serviço, suas características, qualidades, riscos, preços, etc., de maneira clara e precisa, não se admitindo falhas ou omissões. Ao não comprovar que prestou à autora informações claras sobre as opções de conta disponíveis, especialmente quanto à possibilidade de abertura de conta benefício sem cobrança de tarifas, o banco réu incorreu em falha na prestação do serviço. Não merece acolhimento a alegação do banco réu de que a utilização dos serviços bancários pela autora por extenso lapso temporal, sem qualquer reclamação, evidenciaria sua concordância com a contratação. Isso porque o desconhecimento da autora quanto ao seu direito de possuir uma conta benefício sem cobrança de tarifas não pode ser interpretado como aceitação tácita da contratação, especialmente considerando sua condição de vulnerabilidade. Quanto à aplicação dos princípios do venire contra factum proprium, invocado pelo réu, também não prospera. O comportamento contraditório pressupõe que a parte tenha agido anteriormente de modo a criar uma legítima expectativa na outra parte. No caso, não ficou demonstrado que a autora tenha manifestado, em momento anterior, concordância expressa com a cobrança de tarifas bancárias. Ao contrário, a própria condição de vulnerabilidade da autora, pessoa idosa com baixa escolaridade, evidencia que ela provavelmente sequer tinha conhecimento da ilegalidade das cobranças. Quanto ao duty to mitigate the loss, também não se aplica ao caso, pois não se pode exigir da autora, consumidora hipossuficiente e vulnerável, que adotasse medidas para mitigar os próprios prejuízos, quando sequer tinha conhecimento de seus direitos e da existência de opção menos onerosa para recebimento de seu benefício previdenciário. Diante, portanto, da ausência de apresentação de contrato assinado pelo consumidor, contendo informações sobre os referidos descontos, bem como seus respectivos valores, julgo que houve violação ao direito de informação, direito básico do consumidor, previsto no inciso III do art. 6.º do CDC, sendo, portanto, indevida a cobrança do consumidor acerca de disposições contratuais das quais não obteve prévio conhecimento, conforme dispõe o artigo 46 do Código de Defesa do Consumidor. Assim, o cancelamento dos referidos serviços, bem como o ressarcimento pelos danos materiais é a medida que se impõe, devendo ser realizada a devolução em dobro. Isso porque a legislação consumerista garante ao consumidor lesado pelo credor que cobre débito indevido o direito à sua repetição. Entendo que a instituição financeira não comprovou que o erro ocorrido no caso concreto é justificável, eis que é responsável por promover a segurança da relação entre as partes. Ressalto, por oportuno, que a constatação de má-fé do banco não é critério decisivo para constituir o direito a repetição do indébito, como também já se posicionou o STJ: EMENTA RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONTRARIEDADE AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO, DA AMPLA DEFESA, DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E DA SEGURANÇA JURÍDICA. TEMA 660/STF. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. SEGUIMENTO NEGADO. DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. OFENSA REFLEXA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. RECURSO NÃO ADMITIDO. (...) 5. Exigir a má-fé do fornecedor de produto ou de serviço equivale a impor a ocorrência de ação dolosa de prejudicar o consumidor como requisito da devolução em dobro, o que não se coaduna com o preceito legal. Nesse ponto, a construção realizada pela Segunda Seção em seus precedentes, ao invocar a má-fé do fornecedor como fundamento para a afastar a duplicação da repetição do indébito, não me convence, pois atribui requisito não previsto em lei. 6. A tese da exclusividade do dolo inviabiliza, por exemplo, a devolução em dobro de pacotes de serviços, no caso de telefonia, jamais solicitados pelo consumidor e sobre o qual o fornecedor do serviço invoque qualquer "justificativa do seu engano". Isso porque o requisito subjetivo da má-fé é prova substancialmente difícil de produzir. Exigir que o consumidor prove dolo ou má-fé do fornecedor é imputar- lhe prova diabólica, padrão probatório que vai de encontro. às próprias filosofias e ratio do CDC. 7. Não vislumbro distinção para os casos em que o indébito provém de contratos que não envolvam fornecimento de serviços públicos, de forma que também deve prevalecer para todas as hipóteses a tese, que defendi acima, de que tanto a conduta dolosa quanto culposa do fornecedor de serviços dá azo à devolução em dobro do indébito, de acordo com o art. 42 do CDC. Nessas modalidades contratuais, também deve prevalecer o critério dúplice do dolo/culpa. Assim, tanto a conduta dolosa quanto a culposa do fornecedor de serviços dão substrato à devolução em dobro do indébito, à luz do art. 42 do CDC.” (STJ. RE nos EDcl nos EAREsp 676608 RS 2015/0049776-9, Relator Ministro Jorge Mussi, DJ 22/11/2021) Destaco que, embora o Superior Tribunal de Justiça tenha flexibilizado a necessidade de comprovação de má-fé para a devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente, exigindo apenas a demonstração da conduta contrária à boa-fé objetiva, é importante destacar que, no presente caso, há elementos que evidenciam claramente a má-fé do réu. O réu, apesar de insistir na regularidade da contratação da cesta de serviços, não trouxe aos autos qualquer documento que comprovasse a anuência expressa da autora, como termo de adesão, contrato específico ou gravação de atendimento telefônico em que houvesse manifestação inequívoca de vontade. Esta omissão, por si só, já evidencia a má-fé do réu, pois, sendo uma das maiores instituições financeiras do país, tem pleno conhecimento da necessidade de documentar adequadamente as contratações realizadas por seus clientes. Assim, aplico o disposto no art. 42, parágrafo único, do CDC, que prevê a devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente, entre 15/01/2019 e 14/05/2021, acrescidos de juros legais e correção monetária. Quanto ao dano moral, é pacífico o entendimento jurisprudencial de que a realização de descontos indevidos em verba de natureza alimentar configura dano moral in re ipsa, ou seja, independe da comprovação do efetivo prejuízo. Isso porque, em tese, apesar do módico valor, a privação injusta de valores de caráter alimentar a quem percebe apenas um salário mínimo gera evidente transtorno. Embora no caso dos autos os descontos não tenham sido realizados diretamente no beneficio previdenciário, foram descontados indiretamente, posto que as cobranças foram realizadas em conta corrente utilizada especificamente para crédito do beneficio do autor, atingindo, desse modo, verba de natureza alimentar. Tal entendimento há muito está consolidado na Jurisprudência do STJ, para quem: “O desconto indevido em aposentadoria de consumidor, gera o dever de indenizar, independentemente da comprovação do dano, por ser in re ipsa”. (STJ - AgInt no AREsp: 2035509 MS 2021/0399512-6, Relator: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Publicação: DJ 03/05/2022) . Também nessa senda de entendimento: REPETIÇÃO DE INDÉBITO, C.C. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E OBRIGAÇÃO DE FAZER. ASSOCIAÇÃO DE APOSENTADOS MUTUALISTA PARA BENEFÍCIOS COLETIVOS . Parcial procedência. Inconformismo da autora. Existência de relação contratual entre os litigantes não comprovada. Indevidos os descontos efetuados no benefício previdenciário do requerente . Evidenciada a má-fé da recorrida. Caracterizado o dano moral 'in re ipsa'. Indenização proporcional à gravidade da conduta lesiva e suas consequências. Valor arbitrado que se majora para R$ 10 .000,00, o qual se mostra apto a desencorajar o réu a reiterar o procedimento inadequado, sem implicar em enriquecimento sem causa do autor. Sentença reformada. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJ-SP - Apelação Cível: 1001495-54 .2023.8.26.0326, Relator.: Moreira Viegas, Data de Julgamento: 28/02/2024, 5ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 28/02/2024) No caso dos autos, considerando as particularidades da demanda, a extensão do prejuízo e os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, fixo a indenização por danos morais em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), valor esse adequado para atender à finalidade compensatória e pedagógica da indenização (Teoria Pedagógica Mitigada). Atinente ao pedido contraposto formulado pelo banco réu, requerendo a condenação da autora ao pagamento das tarifas individuais de cada operação financeira realizada nos últimos 5 anos, não merece acolhimento. O pedido não encontra amparo legal no caso concreto, uma vez que já foi reconhecida a nulidade do contrato de abertura de conta corrente, bem como a falha na prestação do serviço pelo banco réu, que deixou de informar à autora sobre a possibilidade de abertura de conta benefício sem cobrança de tarifas. Não se pode admitir que o consumidor seja penalizado por uma conduta que é, na verdade, decorrente da própria falha na prestação do serviço pelo fornecedor. Seria contrário aos princípios da boa-fé objetiva e da equidade permitir que o banco réu se beneficie de sua própria torpeza, cobrando tarifas individuais por operações financeiras que poderiam ter sido realizadas sem ônus, caso tivesse cumprido seu dever de informação e disponibilizado à autora a opção de conta benefício. Permitir a cobrança de tarifas individuais nesse contexto seria validar a conduta ilegal do banco e perpetuar o desequilíbrio na relação de consumo, contrariando os princípios que regem o Código de Defesa do Consumidor, especialmente o princípio da vulnerabilidade do consumidor (art. 4º, I, do CDC). Portanto, improcede o pedido contraposto formulado pelo banco réu. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados pelo autor, para: 1. DECLARAR a nulidade do Contrato de Abertura de Conta Corrente entre as partes; 2. DETERMINAR a conversão da conta corrente da autora (Ag. 6153, conta nº 4537-3) para a MODALIDADE BENEFÍCIO, para o exclusivo recebimento dos seus proventos, no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de multa diária de R$ 400,00 (quatrocentos reais), limitada a R$ 12.000,00 (doze mil reais); 3. CONDENAR o réu à devolução em dobro dos valores descontados a título de tarifas bancárias entre 15/01/2019 e 14/05/2021, com correção monetária a partir de cada desconto (Súmula 43 do STJ) e juros de mora de 1% ao mês a partir da citação (art. 405 do Código Civil), uma vez que se trata de responsabilidade contratual; 4. CONDENAR o requerido ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com correção monetária pelo INPC a partir do arbitramento (Súmula 362 do STJ) e juros de mora de 1% ao mês a partir da citação (art. 405, CC), uma vez que se trata de responsabilidade contratual. 5. JULGAR IMPROCEDENTE o pedido contraposto formulado pelo banco réu. Condeno o Requerido ao pagamento das custas processuais. Por fim, da mesma forma, condeno o Requerido ao pagamento de honorários advocatícios, que ora fixo em 10% sobre o valor da condenação. Após o trânsito em julgado, não havendo qualquer requerimento ou interposição de recurso, arquive-se os autos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Servirá a presente, por cópia digitada, como mandado, ofício, notificação e carta precatória para as comunicações necessárias (Provimento nº 003/2009CJRMB-TJPA). Ulianópolis, datado e assinado digitalmente. RODRIGO TAVARES Juiz de Direito Substituto (respondendo pela vara Única de Ulianópolis)

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Processo nº 0800508-41.2023.8.14.0130

ID: 258678442

Tribunal: TJPA Órgão: Vara Única de Ulianópolis Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0800508-41.2023.8.14.0130

Data de Disponibilização: 21/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BANCO BRADESCO S.A

Sentença

Advogados:

NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE ULIANÓPOLIS-PA Processo nº. 0800508-41.2023.8.14.0130 AUTOR: MARIA DAGIUSA DA SILVA REU: BANCO BRADESCO S.A SENTENÇA I … PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ VARA ÚNICA DA COMARCA DE ULIANÓPOLIS-PA Processo nº. 0800508-41.2023.8.14.0130 AUTOR: MARIA DAGIUSA DA SILVA REU: BANCO BRADESCO S.A SENTENÇA I - RELATÓRIO Trata-se de Ação Declaratória de Contrato Inexistente e/ou Nulo c/c Obrigação de Fazer c/c Indenização por Danos Materiais e Morais com pedido de tutela de urgência ajuizada por MARIA DAGIUSA DA SILVA em face de BANCO BRADESCO S.A. Alega a parte autora, em síntese, que, ao se aposentar, procurou a agência do banco réu para abertura de conta na qual receberia seu provento mensal. Sustenta que o banco réu, mesmo ciente da obrigação de fornecer a opção de conta benefício, suprimiu tal informação e procedeu com a abertura de conta corrente na Ag. 6153, sob o número 4537-3, onerando a autora desnecessariamente com diversas tarifas bancárias. Requereu a declaração de inexistência e/ou nulidade do Contrato de Abertura de Conta Corrente, a conversão da conta corrente para a modalidade benefício, a devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente, e a condenação do réu ao pagamento de indenização a título de danos morais. Decisão no id 122421286 recebeu a petição inicial, reiterou o deferimento da justiça gratuita, deferiu a inversão do ônus da prova, indeferiu o pedido liminar e determinou a citação do requerido. O requerido compareceu aos autos e apresentou contestação no id. 128319371, suscitando preliminarmente: prescrição trienal; impugnação à justiça gratuita; falta de interesse de agir; conexão com outros processos; inépcia da petição inicial por irregularidade na procuração, falta de comprovante de endereço e ausência de documentos essenciais. No mérito, sustentou que a contratação do pacote de serviços foi regular. Argumentou que a autora utilizou regularmente os serviços disponibilizados, o que configuraria aceitação tácita da contratação. Adicionalmente, o banco réu formulou pedido contraposto, requerendo a condenação da autora ao pagamento das tarifas individuais de cada operação financeira realizada nos últimos 5 anos. Requereu, ao final, a improcedência dos pedidos autorais. Réplica no id 133166302. Vieram os autos conclusos É o relatório. Decido. II - FUNDAMENTAÇÃO De início, verifico que o banco réu suscita inicialmente a necessidade de comparecimento pessoal da parte autora para esclarecimentos. Todavia, tal pleito não merece acolhimento. O ônus da prova quanto à contratação da cesta de serviços recai sobre o réu, nos termos do art. 373, II, do CPC, não sendo razoável impor à autora o ônus de comparecer pessoalmente para negar a existência de um contrato. Ademais, o depoimento pessoal só se justifica quando necessário ao esclarecimento de fatos controvertidos relevantes, o que não é o caso, pois a controvérsia pode ser solucionada com base na simples juntada de documentação. Há preliminares, as quais passo a examinar. Da prescrição trienal O banco réu suscita preliminarmente a ocorrência de prescrição trienal, com base no art. 206, § 3º, V, do Código Civil, alegando que o caso trata de vício e não de fato do produto ou serviço. A preliminar não merece acolhimento. A relação jurídica estabelecida entre as partes é indubitavelmente de consumo, estando submetida às normas do Código de Defesa do Consumidor, conforme pacificado na Súmula 297 do STJ: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras." No caso em análise, aplica-se o prazo prescricional previsto no art. 27 do CDC, isto é, a prescrição quinquenal e a contagem do prazo de prescrição deve se iniciar a partir do último desconto na conta de titularidade da autora, conforme entendimento do STJ: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS. PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL. ART. 27 DO CDC. PRECEDENTES. TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO. DATA DO ÚLTIMO DESCONTO. ACÓRDÃO EM HARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. SÚMULA N. 83/STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. 1. A jurisprudência sedimentada nesta Corte Superior é no sentido de que, fundando-se o pedido na ausência de contratação de empréstimo com instituição financeira, ou seja, em decorrência de defeito do serviço bancário, aplica-se o prazo quinquenal previsto no art. 27 do Código de Defesa do Consumidor. 2. Em relação ao termo inicial, insta esclarecer que a jurisprudência desta Casa é firme no sentido de que o prazo prescricional para o exercício da referida pretensão flui a partir da data do último desconto no benefício previdenciário. 3. Agravo interno improvido.” ( AgInt no AREsp n. 1.728.230/MS, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, DJe de 15/3/2021.) Considerando que a presente ação foi ajuizada em maio de 2023 e que os descontos questionados ocorreram entre e 15/01/2019 e 14/05/2021, não há que se falar em prescrição, pois não transcorreu o prazo quinquenal previsto na legislação aplicável ao caso. Rejeito, portanto, a preliminar de prescrição. Da impugnação à gratuidade da justiça O réu impugnou a concessão da gratuidade da justiça à parte autora. Contudo, a declaração de hipossuficiência goza de presunção relativa de veracidade, nos termos do art. 99, §3º, do CPC. No caso, a autora apresentou extrato bancário que demonstra renda mensal líquida de R$ 660,00 (seiscentos e sessenta reais), id 93707327, pág. 5, valor que se mostra evidentemente insuficiente para custear as despesas processuais sem prejuízo de seu sustento. A documentação trazida aos autos é, portanto, suficiente para comprovar a situação de hipossuficiência econômica da parte autora, mantendo-se o benefício da gratuidade de justiça. Do interesse de agir O réu suscita preliminar de falta de interesse de agir, sob o argumento de que a autora não teria tentado solucionar a questão administrativamente. Tal alegação não merece prosperar. O acesso à justiça é garantia constitucional prevista no art. 5º, XXXV, da CF/88, não se exigindo o prévio esgotamento da via administrativa para a propositura de ação judicial. Ademais, conforme documentado nos autos (id 94350489), houve tentativa de composição extrajudicial por parte da autora, que não obteve resposta. Assim, presente o interesse de agir, rejeito a preliminar suscitada. Da conexão entre as demandas O réu alega conexão do presente processo com outras ações ajuizadas ( processos 00063498920198140130 e 00064710520198140130) pela parte autora. Contudo, para a configuração da conexão, é necessária a identidade de causa de pedir ou pedido, conforme o art. 55 do CPC. No caso em análise, as demandas possuem objetos e causas de pedir distintas, não havendo identidade que justifique o reconhecimento da conexão. A simples identidade de partes não é suficiente para caracterizar a conexão. Além disso, os processos mencionados pelo réu como supostamente conexos já foram inclusive sentenciados, não sendo possível a reunião de processos em fases processuais distintas, especialmente quando já houve julgamento de mérito em alguns deles. Rejeito, portanto, a preliminar de conexão. Inépcia da inicial - procuração com assinatura digital O requerido alega invalidade da assinatura na procuração por ter sido realizada em plataforma eletrônica. Tal tese, no entanto, não merece prosperar, uma vez que a jurisprudência já entendeu ser dispensável inclusive a assinatura ICP, de forma que outras assinaturas digitais gozam da mesma validade. Vejamos: Ação declaratória c.c obrigação de fazer e reparação de danos materiais e morais – Contratação de empréstimo consignado não reconhecido pela autora– Improcedência – Inaplicabilidade da inversão do ônus da prova, por ausência de verossimilhança das alegações da autora – Conjunto probatório demonstrou a contratação do empréstimo, exibindo contrato assinado por meio eletrônico, acompanhado de documento de identificação da autora e foto selfie'– Desnecessidade de que a assinatura digital seja certificada pelo ICP-Brasil– Crédito do valor mutuado creditado na conta corrente da autora – Débito das prestações avençadas em benefício da autora realizado em exercício regular de direito do credor – Sentença mantida – Recurso negado.(TJSP; Apelação Cível 1075022-72.2022.8.26.0100; Relator (a): Francisco Giaquinto; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível-40ª Vara Cível; Data do Julgamento: 20/02/2024; Data de Registro:20/02/2024) Afasto, portanto, a preliminar. Inépcia da inicial - Da ausência de comprovante de endereço em nome da parte autora. A requerida também alega que a autora juntou aos autos comprovante de residência inválido, pois a pertencente a terceiro. Ocorre que o artigo 319, inciso II, do CPC exige apenas a indicação do domicílio e da residência do autor e do réu, sem determinação específica quanto à juntada de comprovante de endereço. Verifico que a parte autora indicou seu endereço na petição inicial, cumprindo o disposto na legislação processual. Rejeito, portanto, a preliminar. Da inépcia da petição inicial - ausência de tabela discriminatória de valores O réu alega inépcia da petição inicial com fundamento na ausência de tabela discriminatória de valores, argumentando que a parte autora não teria apresentado os detalhes dos descontos e datas em que ocorreram. Tal preliminar não merece acolhimento. A petição inicial atende plenamente aos requisitos do art. 319 do CPC, apresentando causa de pedir clara e determinada, bem como pedido certo quanto ao montante pleiteado a título de repetição de indébito (R$ 2.346,40), correspondente ao dobro dos valores descontados indevidamente entre 15/01/2019 e 14/05/2021 (R$ 1.173,20). Ademais, o réu não demonstrou qualquer prejuízo à sua defesa em razão da ausência da referida tabela, tendo apresentado contestação abrangente e específica sobre todos os pontos da demanda. Por fim, em atenção ao princípio da instrumentalidade das formas (art. 277 do CPC) e da primazia do julgamento de mérito (art. 4º do CPC), eventuais defeitos formais que não prejudiquem a compreensão da demanda e a ampla defesa do réu não devem conduzir à extinção do processo. Rejeito, portanto, a preliminar de inépcia da petição inicial por ausência de tabela discriminatória de valores. Superadas as preliminares, passo, agora, ao julgamento antecipado do mérito, nos termos do art. 355, I, do Código de Processo Civil, por entender que não há necessidade de produção de outras provas além daquelas já constantes dos autos. A controvérsia central da presente demanda consiste em verificar se houve falha na prestação de serviço do banco réu ao proceder com a abertura de conta corrente em nome da autora, com cobrança de tarifas, ao invés de conta benefício para recebimento do benefício previdenciário, sem ônus. Primeiramente, cabe destacar que a relação jurídica estabelecida entre as partes é tipicamente de consumo, estando submetida às regras do Código de Defesa do Consumidor, conforme entendimento já pacificado pelo STJ (Súmula 297). Na condição de fornecedor de serviços, o banco réu responde objetivamente pelos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, nos termos do art. 14 do CDC, independentemente da existência de culpa. No caso em tela, observa-se que o banco réu não demonstrou que ofereceu à autora a opção de abertura de conta benefício, sem cobrança de tarifas, para recebimento de sua aposentadoria, nem comprovou que a autora optou conscientemente pela abertura de conta corrente com cobrança de tarifas. De fato, o banco réu não juntou aos autos nenhum contrato ou documento que demonstre a manifestação de vontade inequívoca da autora em optar pela conta corrente em detrimento da conta benefício, ônus que lhe incumbia, nos termos do art. 373, II, do CPC, sobretudo considerando a inversão do ônus da prova em favor da consumidora. O réu tampouco comprovou a efetiva contratação da cesta de serviços pela autora. Vale ressaltar que a autora é pessoa idosa, com baixa escolaridade e desconhecimento de assuntos bancários, conforme alegado na inicial e não refutado pelo réu, circunstância que impunha ao banco o dever de prestar informações claras e adequadas sobre os serviços oferecidos, em respeito ao princípio da transparência e ao dever de informação, consagrados nos arts. 6º, III, e 46 do CDC. O princípio da transparência, aliado ao dever de informação, impõe ao fornecedor a obrigação de prestar ao consumidor todas as informações acerca do produto e do serviço, suas características, qualidades, riscos, preços, etc., de maneira clara e precisa, não se admitindo falhas ou omissões. Ao não comprovar que prestou à autora informações claras sobre as opções de conta disponíveis, especialmente quanto à possibilidade de abertura de conta benefício sem cobrança de tarifas, o banco réu incorreu em falha na prestação do serviço. Não merece acolhimento a alegação do banco réu de que a utilização dos serviços bancários pela autora por extenso lapso temporal, sem qualquer reclamação, evidenciaria sua concordância com a contratação. Isso porque o desconhecimento da autora quanto ao seu direito de possuir uma conta benefício sem cobrança de tarifas não pode ser interpretado como aceitação tácita da contratação, especialmente considerando sua condição de vulnerabilidade. Quanto à aplicação dos princípios do venire contra factum proprium, invocado pelo réu, também não prospera. O comportamento contraditório pressupõe que a parte tenha agido anteriormente de modo a criar uma legítima expectativa na outra parte. No caso, não ficou demonstrado que a autora tenha manifestado, em momento anterior, concordância expressa com a cobrança de tarifas bancárias. Ao contrário, a própria condição de vulnerabilidade da autora, pessoa idosa com baixa escolaridade, evidencia que ela provavelmente sequer tinha conhecimento da ilegalidade das cobranças. Quanto ao duty to mitigate the loss, também não se aplica ao caso, pois não se pode exigir da autora, consumidora hipossuficiente e vulnerável, que adotasse medidas para mitigar os próprios prejuízos, quando sequer tinha conhecimento de seus direitos e da existência de opção menos onerosa para recebimento de seu benefício previdenciário. Diante, portanto, da ausência de apresentação de contrato assinado pelo consumidor, contendo informações sobre os referidos descontos, bem como seus respectivos valores, julgo que houve violação ao direito de informação, direito básico do consumidor, previsto no inciso III do art. 6.º do CDC, sendo, portanto, indevida a cobrança do consumidor acerca de disposições contratuais das quais não obteve prévio conhecimento, conforme dispõe o artigo 46 do Código de Defesa do Consumidor. Assim, o cancelamento dos referidos serviços, bem como o ressarcimento pelos danos materiais é a medida que se impõe, devendo ser realizada a devolução em dobro. Isso porque a legislação consumerista garante ao consumidor lesado pelo credor que cobre débito indevido o direito à sua repetição. Entendo que a instituição financeira não comprovou que o erro ocorrido no caso concreto é justificável, eis que é responsável por promover a segurança da relação entre as partes. Ressalto, por oportuno, que a constatação de má-fé do banco não é critério decisivo para constituir o direito a repetição do indébito, como também já se posicionou o STJ: EMENTA RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONTRARIEDADE AOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO, DA AMPLA DEFESA, DO DEVIDO PROCESSO LEGAL E DA SEGURANÇA JURÍDICA. TEMA 660/STF. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. SEGUIMENTO NEGADO. DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. OFENSA REFLEXA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL. RECURSO NÃO ADMITIDO. (...) 5. Exigir a má-fé do fornecedor de produto ou de serviço equivale a impor a ocorrência de ação dolosa de prejudicar o consumidor como requisito da devolução em dobro, o que não se coaduna com o preceito legal. Nesse ponto, a construção realizada pela Segunda Seção em seus precedentes, ao invocar a má-fé do fornecedor como fundamento para a afastar a duplicação da repetição do indébito, não me convence, pois atribui requisito não previsto em lei. 6. A tese da exclusividade do dolo inviabiliza, por exemplo, a devolução em dobro de pacotes de serviços, no caso de telefonia, jamais solicitados pelo consumidor e sobre o qual o fornecedor do serviço invoque qualquer "justificativa do seu engano". Isso porque o requisito subjetivo da má-fé é prova substancialmente difícil de produzir. Exigir que o consumidor prove dolo ou má-fé do fornecedor é imputar- lhe prova diabólica, padrão probatório que vai de encontro. às próprias filosofias e ratio do CDC. 7. Não vislumbro distinção para os casos em que o indébito provém de contratos que não envolvam fornecimento de serviços públicos, de forma que também deve prevalecer para todas as hipóteses a tese, que defendi acima, de que tanto a conduta dolosa quanto culposa do fornecedor de serviços dá azo à devolução em dobro do indébito, de acordo com o art. 42 do CDC. Nessas modalidades contratuais, também deve prevalecer o critério dúplice do dolo/culpa. Assim, tanto a conduta dolosa quanto a culposa do fornecedor de serviços dão substrato à devolução em dobro do indébito, à luz do art. 42 do CDC.” (STJ. RE nos EDcl nos EAREsp 676608 RS 2015/0049776-9, Relator Ministro Jorge Mussi, DJ 22/11/2021) Destaco que, embora o Superior Tribunal de Justiça tenha flexibilizado a necessidade de comprovação de má-fé para a devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente, exigindo apenas a demonstração da conduta contrária à boa-fé objetiva, é importante destacar que, no presente caso, há elementos que evidenciam claramente a má-fé do réu. O réu, apesar de insistir na regularidade da contratação da cesta de serviços, não trouxe aos autos qualquer documento que comprovasse a anuência expressa da autora, como termo de adesão, contrato específico ou gravação de atendimento telefônico em que houvesse manifestação inequívoca de vontade. Esta omissão, por si só, já evidencia a má-fé do réu, pois, sendo uma das maiores instituições financeiras do país, tem pleno conhecimento da necessidade de documentar adequadamente as contratações realizadas por seus clientes. Assim, aplico o disposto no art. 42, parágrafo único, do CDC, que prevê a devolução em dobro dos valores cobrados indevidamente, entre 15/01/2019 e 14/05/2021, acrescidos de juros legais e correção monetária. Quanto ao dano moral, é pacífico o entendimento jurisprudencial de que a realização de descontos indevidos em verba de natureza alimentar configura dano moral in re ipsa, ou seja, independe da comprovação do efetivo prejuízo. Isso porque, em tese, apesar do módico valor, a privação injusta de valores de caráter alimentar a quem percebe apenas um salário mínimo gera evidente transtorno. Embora no caso dos autos os descontos não tenham sido realizados diretamente no beneficio previdenciário, foram descontados indiretamente, posto que as cobranças foram realizadas em conta corrente utilizada especificamente para crédito do beneficio do autor, atingindo, desse modo, verba de natureza alimentar. Tal entendimento há muito está consolidado na Jurisprudência do STJ, para quem: “O desconto indevido em aposentadoria de consumidor, gera o dever de indenizar, independentemente da comprovação do dano, por ser in re ipsa”. (STJ - AgInt no AREsp: 2035509 MS 2021/0399512-6, Relator: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Publicação: DJ 03/05/2022) . Também nessa senda de entendimento: REPETIÇÃO DE INDÉBITO, C.C. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E OBRIGAÇÃO DE FAZER. ASSOCIAÇÃO DE APOSENTADOS MUTUALISTA PARA BENEFÍCIOS COLETIVOS . Parcial procedência. Inconformismo da autora. Existência de relação contratual entre os litigantes não comprovada. Indevidos os descontos efetuados no benefício previdenciário do requerente . Evidenciada a má-fé da recorrida. Caracterizado o dano moral 'in re ipsa'. Indenização proporcional à gravidade da conduta lesiva e suas consequências. Valor arbitrado que se majora para R$ 10 .000,00, o qual se mostra apto a desencorajar o réu a reiterar o procedimento inadequado, sem implicar em enriquecimento sem causa do autor. Sentença reformada. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJ-SP - Apelação Cível: 1001495-54 .2023.8.26.0326, Relator.: Moreira Viegas, Data de Julgamento: 28/02/2024, 5ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 28/02/2024) No caso dos autos, considerando as particularidades da demanda, a extensão do prejuízo e os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, fixo a indenização por danos morais em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), valor esse adequado para atender à finalidade compensatória e pedagógica da indenização (Teoria Pedagógica Mitigada). Atinente ao pedido contraposto formulado pelo banco réu, requerendo a condenação da autora ao pagamento das tarifas individuais de cada operação financeira realizada nos últimos 5 anos, não merece acolhimento. O pedido não encontra amparo legal no caso concreto, uma vez que já foi reconhecida a nulidade do contrato de abertura de conta corrente, bem como a falha na prestação do serviço pelo banco réu, que deixou de informar à autora sobre a possibilidade de abertura de conta benefício sem cobrança de tarifas. Não se pode admitir que o consumidor seja penalizado por uma conduta que é, na verdade, decorrente da própria falha na prestação do serviço pelo fornecedor. Seria contrário aos princípios da boa-fé objetiva e da equidade permitir que o banco réu se beneficie de sua própria torpeza, cobrando tarifas individuais por operações financeiras que poderiam ter sido realizadas sem ônus, caso tivesse cumprido seu dever de informação e disponibilizado à autora a opção de conta benefício. Permitir a cobrança de tarifas individuais nesse contexto seria validar a conduta ilegal do banco e perpetuar o desequilíbrio na relação de consumo, contrariando os princípios que regem o Código de Defesa do Consumidor, especialmente o princípio da vulnerabilidade do consumidor (art. 4º, I, do CDC). Portanto, improcede o pedido contraposto formulado pelo banco réu. III - DISPOSITIVO Ante o exposto, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados pelo autor, para: 1. DECLARAR a nulidade do Contrato de Abertura de Conta Corrente entre as partes; 2. DETERMINAR a conversão da conta corrente da autora (Ag. 6153, conta nº 4537-3) para a MODALIDADE BENEFÍCIO, para o exclusivo recebimento dos seus proventos, no prazo de 30 (trinta) dias, sob pena de multa diária de R$ 400,00 (quatrocentos reais), limitada a R$ 12.000,00 (doze mil reais); 3. CONDENAR o réu à devolução em dobro dos valores descontados a título de tarifas bancárias entre 15/01/2019 e 14/05/2021, com correção monetária a partir de cada desconto (Súmula 43 do STJ) e juros de mora de 1% ao mês a partir da citação (art. 405 do Código Civil), uma vez que se trata de responsabilidade contratual; 4. CONDENAR o requerido ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com correção monetária pelo INPC a partir do arbitramento (Súmula 362 do STJ) e juros de mora de 1% ao mês a partir da citação (art. 405, CC), uma vez que se trata de responsabilidade contratual. 5. JULGAR IMPROCEDENTE o pedido contraposto formulado pelo banco réu. Condeno o Requerido ao pagamento das custas processuais. Por fim, da mesma forma, condeno o Requerido ao pagamento de honorários advocatícios, que ora fixo em 10% sobre o valor da condenação. Após o trânsito em julgado, não havendo qualquer requerimento ou interposição de recurso, arquive-se os autos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Servirá a presente, por cópia digitada, como mandado, ofício, notificação e carta precatória para as comunicações necessárias (Provimento nº 003/2009CJRMB-TJPA). Ulianópolis, datado e assinado digitalmente. RODRIGO TAVARES Juiz de Direito Substituto (respondendo pela vara Única de Ulianópolis)

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