Processo nº 0806634-25.2025.8.15.2001
ID: 295170780
Tribunal: TJPB
Órgão: 9ª Vara Cível da Capital
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 0806634-25.2025.8.15.2001
Data de Disponibilização:
11/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
THIAGO RODRIGUES BIONE DE ARAUJO
OAB/PB XXXXXX
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9A VARA CÍVEL DE JOÃO PESSOA PROCESSO:0806634-25.2025.8.15.2001. SENTENÇA DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO.PRELIMINARES DE INÉPCIA DA INICIAL - CARÊNCIA DE REPRESENTAÇÃO E DA IRREGULARID…
9A VARA CÍVEL DE JOÃO PESSOA PROCESSO:0806634-25.2025.8.15.2001. SENTENÇA DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO.PRELIMINARES DE INÉPCIA DA INICIAL - CARÊNCIA DE REPRESENTAÇÃO E DA IRREGULARIDADE DO COMPROVANTE DE RESIDÊNCIA . REJEITADAS. DESCONTO INDEVIDO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. INEXISTÊNCIA DE CONTRATAÇÃO. ASSINATURA POR BIOMETRIA FACIAL. DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS VALORES DESCONTADOS. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PROCEDÊNCIA PARCIAL. EXTINÇÃO DO FEITO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. Vistos, etc. Trata-se de Ação Declaratória de Inexistência de Negócio Jurídico c/c Repetição do Indébito e Indenização por Danos Morais e Pedido de Tutela Antecipada ajuizada por CARLOS ANTONIO DA SILVA em desfavor da FACTA FINANCEIRA S/A, pelos fatos delineados na exordial. Em breve síntese, narra o autor que foi arguida pela ré sob argumento de que teria celebrado dois contratos, quando na verdade o autor celebrou com o réu o primeiro e único contrato em 12/04/2022, nº 004959855. Relata que após a contratação foi inserido um novo contrato nº 0051939917, com a denominação refinanciamento, com parcela mensal de R$ 63,15, ocasião em foram descontados o montante de R$ 2.083,95, cujo descontos tiveram início em setembro de 2022. Ocorre que trata-se de um empréstimo fraudulento, o qual nunca contratou. Pelas razões expostas, requer a declaração da nulidade do contrato e, consequentemente, da autorização para desconto na aposentadoria por invalidez da parte autora, uma vez declarada a nulidade, que seja declarada a não exigibilidade deste contrato e autorização, devendo o polo passivo se abster de proceder com a cobrança relacionada tal contrato eivado de nulidade, ou de incluir o nome da autora no cadastro de maus pagadores, sob pena de multa diária e sanções civis e penais por desacato da determinação judicial; repetição do indébito em dobro e a condenação da ré a pagar uma indenização por danos morais no valor de R$ 12.000,00. Juntou documentos. Justiça gratuita deferida (ID 107496780). Devidamente citada, a promovida apresentou contestação (id. 108847259) suscitando preliminarmente inépcia da inicial; impugnação a justiça gratuita e da irregularidade no comprovante de residência, e no mérito defendeu a validade da contratação e inexistência do dever de indenizar, bem como de repetição de indébito. O autor apresentou réplica (ID 110397370). As partes foram intimadas para informar as provas que pretendiam produzir, onde ambas informaram não ter mais provas a produzir Então, vieram-me conclusos os autos para julgamento. É o relatório. Decido. FUNDAMENTAÇÃO Passo ao julgamento antecipado do mérito por entender que as provas presentes nos autos são suficientes para o julgamento da matéria, sendo desnecessária a dilação probatória com escopo no art. 355, inciso I do Código de Processo Civil. DA PRELIMINARES - DA INÉPCIA DA INICIAL- CARÊNCIA DE REPRESENTAÇÃO E DA IRREGULARIDADE DO COMPROVANTE DE RESIDÊNCIA Suscita a parte demandada que a parte autora não juntou comprovante de residência atualizado e nem tampouco o ingressar com a demanda, documento este indispensável à propositura da ação. Sobre o caso cito jurisprudência abaixo: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL - AUSÊNCIA DE COMPROVANTE DE RESIDÊNCIA EM NOME PRÓPRIO - DESNECESSIDADE. Não se caracteriza como inepta a petição inicial que apresenta em seu bojo todas as informações legais necessárias à propositura da demanda, mas deixa de trazer consigo comprovante de endereço que contenho o nome da parte autora. (TJ-MG - AC: 10000200396364001 MG, Relator: Fernando Caldeira Brant, Data de Julgamento: 11/05/0020, Data de Publicação: 14/05/2020) EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO INDENIZATÓRIA - PROCURAÇÃO E COMPROVANTE DE RESIDÊNCIA DESATUALIZADOS - PRESCINDIBILIDADE DA ATUALIZAÇÃO - NÃO ENQUADRAMENTO DOS DOCUMENTOS ATUALIZADOS COMO DOCUMENTOS INDISPENSÁVEIS À PROPOSITURA DA AÇÃO - INSUBSISTÊNCIA DA SENTENÇA TERMINATIVA PROFERIDA - A lei processual, que requer a juntada da procuração como um dos documentos indispensáveis à propositura da ação, não exige, contudo, que haja coincidência ou proximidade entre a data da procuração e o momento da propositura da demanda - Dissipadas as dúvidas sobre a autenticidade da procuração juntada aos autos, formalmente hígida, e inexistindo qualquer indício de causa extintiva do mandato judicial (artigo 16 do Código de Ética da OAB e artigo 682 do Código Civil), não se justifica a extinção do processo sem exame de mérito pela falta de procuração atualizada - O comprovante de residência não figura entre os documentos que, por exigência legal, devem acompanhar a petição inicial, razão pela qual a inércia do autor em atualizar o referido comprovante não cria óbice ao regular prosseguimento do feito.(TJ-MG - AC: 10000205420714001 MG, Relator.: Fernando Lins, Data de Julgamento: 02/06/2021, Câmaras Cíveis / 20ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 07/06/2021) Desse modo, rejeito as preliminares suscitadas. - DA IMPUGNAÇÃO A JUSTIÇA GRATUITA A demandada requereu a revogação do deferimento da assistência judiciária gratuita concedida ao demandante e não colacionou aos autos os documentos que atestem a capacidade financeira do autor para arcar com as custas e ônus decorrentes de possível sucumbência. Sabe-se que o Código de Processo Civil de 2015 em seu art. 99, § 3º presumiu como verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural. Cabe à parte impugnante a prova em contrário, o que não restou patente nos autos, uma vez que não trouxe documentos aptos a demonstrar que as promoventes teriam condições de pagar as despesas processuais e os honorários advocatícios, sem prejuízo de seu sustento e de sua família. Ademais, o novo Código de Processo Civil previu em seu art. 98, §3º que a suspensão da exigibilidade abrange custas, despesas e honorários advocatícios do beneficiário da justiça gratuita, uma vez que todos os referidos ônus são decorrentes da sucumbência, veja-se: § 3º Vencido o beneficiário, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário. Assim, rejeito a impugnação, mantendo a concessão do benefício da assistência judiciária gratuita ao autor. DA APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR Nitidamente a hipótese dos autos se submete à tutela do Código de Defesa do Consumidor, vez que o autor se enquadra no conceito de consumidor e a ré no de fornecedora, nos termos dos artigos 2º e 3º, do Código de Defesa do consumidor: Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. [...] Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. (...) § 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. Logo, não há como deixar de reconhecer que a relação contratual estabelecida entre o cliente com a instituição financeira é uma relação de consumo. Portanto não remanescem dúvidas quanto à aplicação do microssistema normativo do CDC ao caso concreto, tendo em vista se tratar de norma jurídica de caráter cogente. DO MÉRITO A pretensão do demandante se revela para declarar a inexistência de um segundo contrato de empréstimo consignado nº 0051939917, condenar em obrigação de não fazer os indigitados descontos consignados, obrigação de pagar a repetição do indébito em dobro e obrigação de pagar compensação pelos danos morais decorrentes dos descontos indevidos em seu benefício previdenciário. A demandada apresentou contestação defendendo a validade da contratação que se deu por meio eletrônico através de captura de foto do requerente juntando a documentação que entendia pertinente. O autor em réplica rechaçou a contratação por meio digital afirmando ser meio inidôneo para atestar a veracidade da vontade de contratar o referido empréstimo, afirmando que tal modalidade é ilegal e exige a assinatura presencial do contratante. Com efeito, os avanços tecnológicos e a inclusão digital provocaram diversas mudanças no mundo dos negócios, trazendo facilidades e rapidez para as contratações, sendo reconhecida sua validade quando demonstrada a adoção pela instituição financeira de meios de segurança que possibilitem afastar a alegação de fraude ou erro bancário. Por outro lado, não se olvida que a relação jurídica estabelecida entre as partes se caracteriza como uma relação de consumo, consoante pacífica jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça: “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras” (Súmula nº 297). Assim, inverte-se o ônus probatório impondo-se à instituição financeira a comprovação da validade da contratação e da consequente licitude dos descontos efetuados no benefício previdenciário do consumidor. No caso, o banco promovido alega que o contrato impugnado pelo autor versa sobre refinanciamento de empréstimo consignado anterior, de modo que caberia à instituição financeira a comprovação da existência dos contratos originais, indicando o valor contratado, a quantidade de prestações, o início e o término do contrato, além de informar junto a qual banco os empréstimos primitivos foram tomados, nos termos da Instrução Normativa INSS/PREV nº 28/2008, contudo não o fez. A omissão do banco quanto aos contratos que deram origem aos alegados refinanciamentos permite concluir que houve irregularidades e eventual fraude na contratação do empréstimo impugnado, ainda que tenham sido pactuados por meio de plataforma digital e com assinatura mediante fotografia supostamente tirada no momento da contratação. É certo que o banco trouxe cópia do contrato de refinanciamento acompanhado da fotografia do demandante e da cópia do respectivo documento de identidade, inexistindo alegação de que a pessoa retratada não seja a pessoa do demandante. Entretanto, tal procedimento não é suficiente para comprovar a expressa manifestação de vontade do requerente no caso em apreço, pois, ainda que a assinatura eletrônica por meio de biometria facial seja autorizada pelo artigo 10, §2º, da Medida Provisória nº 2.200/2001, não há como se desconsiderar a parte final do referido dispositivo legal que é claro ao condicionar tal reconhecimento com a expressão “desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento”. A parte autora, no caso, vem justamente afirmar não ter realizado a operação e, nessas condições forçoso é o reconhecimento de que a própria validade e aceitação integram os pontos controvertidos na presente demanda. Acrescente-se o fato que o autor é pessoa idosa e as regras de experiência demonstram que os idosos usualmente necessitam de auxílio em tais operações, notadamente pela falta de experiência com o manejo de aparelhos eletrônicos. Nesse sentido, colaciono jurisprudência: Tribunal de Justiça do Estado da Bahia PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA TURMA RECURSAL - PROJUDI PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460 PROCESSO Nº 0001997-20.2021.8.05.0211. RECORRENTE: MARINEI VIRGEM CARNEIRO LIMA. RECORRIDA: BANCO PAN S A. RELATOR: Juiz Marcelo Silva Britto. EMENTA RECURSO INOMINADO. CONDIÇÕES DE ADMISSIBILIDADE PREENCHIDAS. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO BANCÁRIO NÃO SOLICITADO PELA PARTE AUTORA. DISPONIBILIZAÇÃO DO VALOR EM CONTA BANCÁRIA DE TITULARIDADE DA CONSUMIDORA QUE COMUNICOU O FATO AO BANCO E DEPOSITOU O VALOR EM JUÍZO. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO JUNTADO AOS AUTOS (EVENTO 21), COM ASSINATURA VIRTUAL. RECONHECIMENTO FACIAL QUE NÃO PREENCHE OS REQUISITOS DA INSTRUÇÃO NORMATIVA DO INSS 28/2008. FOTOGRAFIA QUE NÃO SE ENQUADRA NO CONCEITO DE AUTORRETRATO (SELFIE), PORTANTO, ILEGÍTIMA PARA COMPROVAR A VERACIDADE DA CONTRATAÇÃO, POR INVIABILIZAR A PROVA DE VIDA E SEMELHANÇA COM O DOCUMENTO DE IDENTIDADE. DOCUMENTO DE IDENTIDADE JUNTADO PELA RÉ QUE INDICA SE TRATAR DO MESMO APRESENTADO PELA AUTORA (EVENTO 01), ATRAVÉS DE SCANNER. HIPERVULNERABILIDADE DA CONSUMIDORA. ELEMENTOS SUFICIENTES QUE DENOTAM A IRREGULARIDADE DA CONTRATAÇÃO. SUPOSTA CONTRATAÇÃO REALIZADA ATRAVÉS DO ORIGINADOR (FONTES PROMOTORA EIR). CONTRATOS BANCÁRIOS QUE GARANTEM O RECEBIMENTO DE COMISSÃO PELOS CORRESPONDENTES BANCÁRIOS. INDÍCIO DE FRAUDE. SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTES OS PEDIDOS. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA PARA DECLARAR A INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA FIRMADA ENTRE AS PARTES, A RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO VALOR COMPROVADAMENTE DESCONTADO, A DEVOLUÇÃO DO VALOR DEPOSITADO E CONDENAR A RÉ AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS NO VALOR DE R$ 5.000,00 (CINCO MIL REAIS), COM BASE NOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos acima indicados. Realizado o julgamento, a Terceira Turma Recursal do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, decidiu, por unanimidade, CONHECER E DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO, para reformar a sentença impugnada, nos termos do voto do relator, adiante lavrado, que passa a integrar este acórdão. Sala das Sessões, data certificada pelo sistema. Marcelo Silva Britto Juiz Presidente/Relator PROCESSO Nº 0001997-20.2021.8.05.0211. RECORRENTE: MARINEI VIRGEM CARNEIRO LIMA. RECORRIDA: BANCO PAN S A. RELATOR: Juiz Marcelo Silva Britto. VOTO Dispensado o relatório e com fundamentação concisa, nos termos do art. 46 da Lei nº. 9.099/95. Presentes os pressupostos extrínsecos e intrínsecos de sua admissibilidade, conheço dos recursos. No mérito, depois de minucioso exame dos autos, estou persuadido de que a irresignação manifestada pela autora recorrente merece parcial acolhimento. Constata-se dos autos a hipossuficiência da parte autora e a verossimilhança das suas alegações, devendo o caso ser analisado à luz da inversão do ônus da prova, conforme disposto no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor. Aduz a parte autora que foi surpreendida com um depósito em sua conta corrente no valor de R$13.758,12 (treze mil setecentos e cinquenta e oito reais e doze centavos), referente a uma contratação de empréstimo bancário consignado que não reconhece. Narra, ainda, que efetuou o depósito judicial do valor indevidamente creditado em sua conta bancária. Requer o cancelamento do contrato, a suspensão dos descontos e o pagamento de indenização por danos morais. A parte acionada, por outro lado, sustenta a legalidade da contratação, afirmando que a mesma ocorreu de modo virtual, juntando no evento 21 dos autos o contrato supostamente firmado entre as partes, com reconhecimento facial, acompanhado do documento de identidade da Autora. Pugna pela improcedência total da ação. A ilustre magistrada a quo julgou improcedentes os pedidos. Com efeito, analisando detidamente os autos, verifica-se que os documentos apresentados pela parte acionada na fase instrutória (evento 21), não são aptos a comprovar que a parte autora efetivamente celebrou o contrato que ensejou os descontos impugnados na exordial, posto que, tratando-se de empréstimo via conta digital, com validação de assinatura eletrônica através de reconhecimento facial, caberia a parte ré se certificar dos cuidados inerentes ao tipo de contratação, conforme previsto na Instrução Normativa do INSS 28/2008. Nesse contexto, constata-se que o contrato colacionado pela Ré contém fotografia pessoal da Autora em ambiente, posicionamento e imagem absolutamente contrária aos critérios necessários para certificação da biometria facial, que utiliza o autorretrato (selfie) para comparação com imagens do banco de dados, fazendo uma prova de vida, levando em consideração o contexto da foto e o seu fundo. Assim, o contrato de empréstimo consignado que foi juntado aos autos no evento 21, com assinatura virtual, apresenta reconhecimento facial que não preenche os requisitos da instrução normativa do INSS 28/2008, pois não se enquadra no conceito de autorretrato (selfie), portanto, documento ilegítimo para comprovar a veracidade da contratação, por inviabilizar a prova de vida e semelhança com o documento de identidade. Ademais, por se tratar de alegação autoral que recai sobre fato negativo, no sentido de que não houve a contratação de empréstimo, desloca-se para o fornecedor de serviços bancários o ônus de comprovar a regularidade da cobrança, sobretudo pelo fato de que o contrato juntado informa que a contratação teria sido realizada através de correspondente bancário, o que gera repasse de comissão por cada contratação realizada. A plataforma eletrônica em que se deu a operação financeira contestada, diante da singularidade e complexidade do ambiente virtual (manifestação de vontade por meio de biometria facial), mormente para consumidores que têm uma vulnerabilidade informacional, leva a crer, em princípio, que não houve por parte da autora um consentimento informado. Ao contrário, todos esses fatos, na verdade, evidenciam que a parte autora foi vítima de uma fraude corriqueira nos dias atuais Nesse contexto, diante de alegação de ausência de vínculo jurídico com a Ré, cabia à instituição financeira comprovar a referida contratação, ônus que não se desincumbiu. Tal fato, por si só, é suficiente para justificar o pleito indenizatório, posto que, em se tratando de indenização decorrente de má prestação do serviço, a prova do dano moral se satisfaz com a demonstração da sua existência, independentemente da prova objetiva do abalo na honra e na reputação, facilmente presumíveis. A jurisprudência mais atual tem reconhecido que todo dano moral causado por conduta ilícita é indenizável como direito subjetivo da própria pessoa ofendida. Também é assente que a moral, absorvida como dado ético pelo direito, que não pode se dissociar dessa postura, impõe sejam as ofensas causadas por alguém a outrem devidamente reparada pelo autor da ofensa. No caso, enquadra-se perfeitamente a referência feita a Savatier pelo insigne Caio Mário da Silva Pereira, que diz: O fundamento da reparabilidade pelo dano moral está em que, a par do patrimônio em sentido técnico, o indivíduo é titular de direitos integrantes de sua personalidade, não podendo conformar-se a ordem jurídica em que sejam impunemente atingidos. Colocando a questão em termos de maior amplitude, Savatier oferece uma definição de dano moral como ¿qualquer sofrimento humano que não é causado por uma perda pecuniária¿, e abrange todo atentado à reputação da vítima, à sua autoridade legítima, ao seu pudor, à sua segurança e tranquilidade, ao seu amor próprio estético, à integridade de sua inteligência, a suas afeições etc. (Traité de La Resposabilité Civile, vol. II, nº 525 .). Na fixação do quantum referente à indenização por dano moral, não se encontrando no sistema normativo brasileiro método prático e objetivo, o juiz deve considerar as condições pessoais do ofendido; o seu ramo de atividade; perspectivas de avanço e desenvolvimento na atividade que exercia, ou em outra que pudesse vir a exercer; o grau de suportabilidade do encargo pelo ofensor e outros requisitos, caso a caso. Requisitos que há de valorar com critério de justiça, com predomínio do bom senso, da razoabilidade e da exequibilidade do encargo a ser suportado pelo devedor. Com base nessas premissas, considerando-se a circunstância de que a indenização deve ter, sim, caráter punitivo, penalizando a conduta imprópria, desleixada e negligente, como a adotada pela Ré, desestimulando a prática de novos atos ilícitos, é de se entender que a indenização deve ser estipulada em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), segundo os critérios de razoabilidade, atento às peculiaridades do caso concreto e de modo a evitar que a reparação se constitua enriquecimento indevido da pessoa prejudicada, mas também considerando o grau de culpa e porte econômico da empresa causadora do dano, que deve ser desestimulada a repetir o ato ilícito. Por essa razão, ao meu sentir, o decisum merece parcial reforma. Em vista de tais razões, com a devida vênia, voto no sentido de CONHECER E DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO, para reformar a sentença impugnada e declarar a nulidade do contrato de que trata os autos, condenada à Ré a devolução, em dobro, do valor referente ao que foi descontado indevidamente no benefício da autora, mediante a devolução do valor creditados na conta corrente da consumidora, bem como condenar a Ré ao pagamento do valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a título de indenização pelos danos morais causados à parte recorrente, com juros legais a partir da citação, nos termos do art. 405 do Código Civil, e correção monetária a partir desta data (Súmula 362 do STJ). Sem condenação ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, consoante o disposto no art. 55 da Lei nº 9.099/95. Sala das Sessões, data certificada pelo sistema. Marcelo Silva Britto Juiz Relator. (TJ-BA - RI: 00019972020218050211, Relator: MARCELO SILVA BRITTO, TERCEIRA TURMA RECURSAL, Data de Publicação: 04/05/2022) Grifei. Do mesmo modo, o TJ-SP: EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS – Ação declaratória de inexistência de relação jurídica c.c. repetição de indébito e danos morais julgada improcedente, com condenação do autor por litigância de má-fé – Inconformismo do autor – Refinanciamentos de empréstimos consignados por meio de assinatura digital (biometria facial) – Falta de comprovação da existência dos contratos primitivos que deram origem aos refinanciamentos – Fotografia selfie que não é suficiente para reconhecimento da validade da assinatura digital por biometria facial, diante das circunstâncias do caso concreto – Indícios de fraude na contratação – Valores descontados do benefício previdenciário do recorrente que lhe devem ser restituídos pelo banco recorrido, na forma simples – Dano moral configurado – Descabimento da condenação por litigância de má-fé – Sentença reformada – RECURSO PROVIDO.(TJ-SP - RI: 10084409620218260077 SP 1008440-96.2021.8.26.0077, Relator: Camila Paiva Portero, Data de Julgamento: 20/05/2022, 1ª Turma Cível, Data de Publicação: 20/05/2022). Grifei. Por último, o TJ-PR: EMENTA: RECURSO INOMINADO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO CONTRATUAL C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. BANCÁRIO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. REFINANCIAMENTOS NÃO CONTRATADOS. ASSINATURA DIGITAL POR MEIO DE BIOMETRIA FACIAL. PROVA INSUFICIENTE. CONTRATOS IRREGULARES. DANO MORAL CONFIGURADO. INDENIZAÇÃO MAJORADA PARA R$ 4.000,00. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. Recurso da parte autora conhecido e provido. Recurso da parte ré provido e desconhecido. (TJPR - 1ª Turma Recursal - 0001931-05.2020.8.16.0038 - Fazenda Rio Grande - Rel.: JUÍZA DE DIREITO DA TURMA RECURSAL DOS JUÍZAADOS ESPECIAIS MELISSA DE AZEVEDO OLIVAS - J. 28.06.2021)(TJ-PR - RI: 00019310520208160038 Fazenda Rio Grande 0001931-05.2020.8.16.0038 (Acórdão), Relator: Melissa de Azevedo Olivas, Data de Julgamento: 28/06/2021, 1ª Turma Recursal, Data de Publicação: 28/06/2021) Grifei. De rigor, pois, a procedência do pedido consistente na declaração de inexistência de negócio jurídico, já que o contrato não reúne os elementos necessários a sua formação. Quanto ao pedido de repetição do indébito na forma dobrada, entendo que não merece prosperar. Em que pese o autor alegar que não recebeu os valores contratados, observo que foi creditado valor idêntico ao numerário liberado pelo banco promovido na conta do autor, vejamos: Desse modo, impõe-se a restituição de valores indevidamente descontados do benefício do demandante, autorizada a possibilidade de compensação do valor creditado com os valores debitados. Entretanto, a restituição deve se dar na forma simples e não em dobro, pois não evidenciada má-fé da instituição bancária. Cabe mencionar que a jurisprudência do Eg. Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que "a devolução em dobro dos valores pagos pelo consumidor somente é possível quando demonstrada a má-fé do credor" (AgInt no AREsp 1124791/MG, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, j. 12/12/2017, DJe 18/12/2017). Evidente, pois, a falha na prestação dos serviços pela instituição bancária requerida, pois ficou demonstrado que a contratação não foi efetiva pela parte autora, o que configura a responsabilidade objetiva do réu pelos danos sofridos pela cliente. Neste sentido é a Súmula 479 do STJ: "As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias". Aliás, "do ponto de vista do dever de indenizar, a responsabilidade civil do Banco é oriunda do risco integral de sua atividade econômica" (cf. Luiz Antonio Rizzatto Nunes, em Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, Saraiva, 1a ed., 2000, p. 153, comentário ao artigo 12). E, sobre a teoria do risco profissional, aplicável o julgado assim ementado: "Os bancos respondem pelo risco profissional assumido, só elidindo tal responsabilidade a prova, pela instituição financeira, de culpa grave do cliente ou de caso fortuito ou força maior" (1º TACSP 7a C. Ap. Rel. Luiz de Azevedo j. 22.11.1983 RT 589/143, apud Tratado de Responsabilidade Civil, Ruy Stoco, RT, 2002, pág. 489)"(TJSP, Apelação Cível nº 1015267-90.2017.8.26.0004, 20a Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Álvaro Torres Júnior, j. 12.08.2019). No presente caso, verifica-se a ocorrência de abalo moral indenizável, pois, apesar de não ter havido negativação do nome do demandante, releva mencionar que sua condição financeira não é abastada, uma vez que sobrevive dos proventos oriundos de seu benefício previdenciário, de modo que os descontos efetuados pelo requerido ainda que reduzidos interferem na sua subsistência. Para aferição do valor a ser indenizado, é mister ter em conta o disposto no artigo 944, do Código Civil e a teoria do desestímulo em relação ao autor do dano, mas, por outro lado, a vedação ao enriquecimento sem causa, quanto à pessoa lesionada. Desse modo e ainda levando em conta a extensão do dano efetivamente demonstrado, entendo necessário e suficiente o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para indenizar os prejuízos morais sofridos. DISPOSITIVO ANTE O EXPOSTO, com base em tudo o mais que dos autos consta, com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO FORMULADO NA INICIAL para: 1. Declarar inexistente o empréstimo consignado nº 0051939917, determinando a imediata suspensão das cobranças efetuadas pelo banco requerido; 2. Condenar o requerido a restituir, na forma simples, os valores debitados oriundos do contrato que ora se declara inexistente, autorizada a compensação com o valor creditado ao autor, acrescido de juros de mora atualizados pela taxa selic (art. 406, CC) e correção monetária pelo IPCA-E, desde o evento danoso, a fim de se garantir uma indenização integral. 3. CONDENAR o Demandado a pagar R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização por danos morais, com juros atualizados pela taxa Selic (art. 406, CC) e correção monetária pelo IPCA-E, ambos contados a partir da data do arbitramento (362, STJ). CONDENO o requerido nas custas, e honorários advocatícios, esses arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação. P.R.I. Após o trânsito em julgado, conforme disposição do art. 526 do CPC, determino a intimação do réu para que diga do interesse em comparecer em juízo e oferecer em pagamento o valor que entender devido em razão da sentença, apresentando memória discriminada do cálculo. Prazo de 10 dias. Atendida a intimação, independentemente de nova conclusão, EXPEÇA-SE o competente alvará, e em ato contínuo, INTIME-SE o demandante para proceder ao seu levantamento e, na mesma ocasião, informar se algo tem a requerer, sob pena de ser declarada satisfeita a obrigação da parte vencida e arquivado os autos. Por outro lado, caso seja interposto recurso voluntário, intime-se a parte contrária para contrarrazoar, caso tenha integrado a lide, e após remetam-se os autos ao E. TJPB, independente de nova conclusão. JOÃO PESSOA, datado pelo sistema. Juiz(a) de Direito
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