Ministério Público Do Estado Do Paraná x Rodrigo Moises Pereira
ID: 282083007
Tribunal: TJPR
Órgão: 2ª Vara Criminal de Curitiba
Classe: PROCEDIMENTO ESPECIAL DA LEI ANTITóXICOS
Nº Processo: 0000867-97.2022.8.16.0196
Data de Disponibilização:
28/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
LAYS ALESSANDRA KORBER TEIXEIRA DE MELO
OAB/PR XXXXXX
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Vistos e examinados estes autos sob n° 0000867- 97.2022.8.16.0196 em que é autor MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ e réu RODRIGO MOISES PEREIRA, brasileiro, natural de Curitiba/PR, nascido em 22…
Vistos e examinados estes autos sob n° 0000867- 97.2022.8.16.0196 em que é autor MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ e réu RODRIGO MOISES PEREIRA, brasileiro, natural de Curitiba/PR, nascido em 22 de novembro de 1985, com 36 anos de idade à época dos fatos, filho de Enidete Pereira, portador do RG nº 9.118.488-5-PR, residente na Rua Natal, nº 30, Cajuru, Curitiba/PR. SENTENÇA I. RELATÓRIO O Ministério Público do Estado do Paraná ofereceu denúncia (evento 67.1) em desfavor do réu Rodrigo Moises Pereira, dando-o como incurso nas sanções do artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06, pela prática do seguinte fato delituoso: “ No dia 08 de março de 2022, por volta das 10h36min, no endereço da Rua Natal, 30, Cajuru, Curitiba, PR, o denunciado RODRIGO MOISÉS PEREIRA, com vontade e consciência, sem autorização e emdesacordo com determinação legal ou regulamentar, com fins de comercialização e para consumo de terceiros, guardava, no fundo de uma caixa de som, a quantidade de 11 buchas de tamanho médio contendo, em todas elas, a droga Cannabis sativa L., popularmente conhecida como ‘maconha’, pesando aproximadamente, no total, 288g (duzentos e oitenta e oito gramas), substância estas que determinam dependência física e/ou psíquica, proscrita em todo o território nacional, consoante regulamentação da Portaria SVS/MS n.º 344/98 (cf. auto de exibição e apreensão de seq. 1.5, laudo de mov. 45.2). No dia em questão, policiais lotados na Delegacia da Mulher, compareceram no endereço supramencionado, munidos de competente mandado de busca e apreensão para localização de arma de fogo e em desfavor do denunciado e, na diligência, acabaram por localizar a droga, no interior de uma caixa de som. No momento da diligência o denunciado teria chegado ao local e confirmado a posse de referida droga” . No dia 15 de janeiro de 2024 foi determinada a notificação do denunciado (evento 75.1).As diligências para a notificação pessoal do denunciado foram infrutíferas (evento 85.1), mas o mesmo compareceu espontaneamente em juízo e constituiu Defensor (evento 88.2). Apresentou defesa prévia (evento 100.1). Não verificadas causas de absolvição sumária, a denúncia foi recebida em 01 de março de 2024 (evento 103.1), designando-se a data de 27 de junho de 2024 para a realização da audiência de instrução e julgamento (evento 110.0). A audiência de instrução foi redesignada para o dia 28 de agosto de 2024 (eventos 150.1 e 159.1). Em audiência de instrução e julgamento foram ouvidas duas testemunhas arroladas pela acusação (eventos 179.1 e 179.2). Diante da justificativa apresentada pela ausência do réu à audiência (evento 183.1), foi designada nova data para a realização do interrogatório do acusado (eventos 189.1 e 190.0). Em 13 de março de 2025, realizou-se o interrogatório do réu (evento 209.1). Em alegações finais, o Ministério Público sustentou a condenação do réu nos termos da denúncia (evento 219.1).Por sua vez, a Defesa do réu, em seus memoriais, sustentou a desclassificação do crime de tráfico para o de porte de droga para uso pessoal (evento 226.1). É, em síntese, o relatório. Decido. II. FUNDAMENTOS Da análise detida dos presentes autos, verifica-se que não há nulidades a serem declaradas, e que tampouco existem preliminares ou questões prejudiciais de mérito a serem analisadas, podendo passar-se ao mérito da presente causa penal. Trata-se de ação penal de natureza pública incondicionada, na qual se imputa ao réu Rodrigo Moises Pereira a prática do crime previsto no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06. II.I. DO INTERROGATÓRIO: Em interrogatório judicial, o réu RODRIGO MOISES PEREIRA negou a prática do crime de tráfico. Alegou que as drogas apreendidas se destinavam exclusivamente ao seu consumo pessoal. Justificou que estavam divididas em porções menores porque pretendia utilizá-las de forma fracionada ao longo dos dias. Afirmou que a quantidade apreendida seria suficiente para aproximadamente cinco meses de uso, pois tinha o hábito de adquirir a substância em grande volume e consumi-la gradualmente. Relatou que a droga foi encontrada dentro de uma caixa de som,localizada na sala de sua residência. Mencionou que sua ex-esposa havia solicitado uma medida protetiva contra ele e, por esse motivo, a polícia foi até sua casa para conversar com o interrogando. Alegou que os policiais não possuíam mandado de busca e apreensão e que, até onde se lembra, nenhum documento foi apresentado. Destacou que apenas drogas foram encontradas no local, não havendo apreensão de armas. Esclareceu que, no momento da abordagem, não estava em casa, pois se encontrava no trabalho, e que foi informado sobre a apreensão por sua sobrinha, que lhe telefonou. Acrescentou que sua mãe foi quem atendeu os policiais na residência. Declarou ainda que, após o ocorrido, deixou de fazer uso de entorpecentes. Ressaltou que nunca teve problemas anteriores com a Justiça e que não conhecia os policiais responsáveis pela diligência. Por fim, afirmou não se recordar do valor pago pelas porções de maconha adquiridas (evento 209.1). II.II. DA PROVA ORAL: A testemunha arrolada pela acusação, a Policial Civil MARIANA ONOFRE, relatou em juízo, em síntese, que ela e sua equipe estavam em operação para cumprir diversos mandados. Especificou que o mandado em questão era de busca e apreensão, relacionado a um delito previsto na Lei Maria da Penha, com o objetivo de localizar armas. Informou que foi realizada uma busca minuciosa em toda a residência do acusado. Ao chegarem no endereço, constataram que se tratava de um terreno com uma casa nos fundos, onde residiam alguns parentes do acusado, além delepróprio e de sua mãe. Ressaltou que o acusado não se encontrava no local no momento da abordagem, mas que sua mãe autorizou a entrada da equipe no imóvel. Durante a vistoria, foi localizada uma quantidade de droga escondida dentro de uma caixa de som. A policial mencionou que a mãe do acusado demonstrou nervosismo e entrou em contato com ele, que afirmou que iria até o local. Pouco tempo depois, a própria vítima do delito relacionado à Lei Maria da Penha chegou ao endereço de bicicleta, sendo seguida pelo acusado. Destacou que a autoridade policial presente deu voz de prisão ao acusado pelo crime de tráfico de drogas. Acrescentou que, ao chegar ao local, o acusado confessou que a droga lhe pertencia. Por fim, mencionou acreditar que uma balança de precisão foi apreendida, embora não se recorde do local exato onde foi encontrada (evento 179.1). A testemunha arrolada pela acusação, o Policial Civil SERGIO FERNANDO FERREIRA DE LIMA, relatou em juízo, em síntese, que o cumprimento do mandado ocorreu no contexto de uma operação voltada à execução de diversos mandados de busca e apreensão, cujo objetivo principal era localizar armas de fogo. Explicou que, em casos de denúncias relacionadas à violência doméstica, é comum haver indícios de que os autores possuam armamentos. Informou que a equipe se dirigiu à residência do acusado, onde ele morava com a mãe ou a avó. No momento da diligência, o acusado não se encontrava no local. A busca foi iniciada no quarto do investigado e, posteriormente, estendida ao restante da casa. Na sala, os policiais localizaram uma caixa de som e, aoabri-la, encontraram drogas em seu interior. Relatou que a mulher presente na residência demonstrou grande nervosismo diante da situação e afirmou não saber o paradeiro do acusado. Esclareceu que o terreno possuía duas casas e que, na residência dos fundos, vivia uma parente do investigado, a qual conseguiu entrar em contato com ele. Cerca de 20 minutos depois, o acusado compareceu ao local e assumiu a posse da droga. O depoente afirmou não se recordar exatamente onde foi encontrada a balança de precisão apreendida, mas ressaltou que não havia vestígios visíveis de droga sobre o equipamento. Declarou, ainda, que não conhecia o acusado anteriormente e que não foram localizados apetrechos destinados ao consumo de entorpecentes (evento 179.2). II.III. DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS (ARTIGO 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/06) De acordo com a denúncia de evento 67.1, no dia 08 de março de 2022, por volta das 10h36min, na Rua Natal, nº 30, Cajuru, no Município de Curitiba/PR, o denunciado RODRIGO MOISÉS PEREIRA guardava, para fins de comercialização, a quantidade de 11 buchas de tamanho médio, com o peso total de 288 g (duzentos e oitenta e oito gramas) de maconha. Parte das substâncias apreendidas foi remetida ao Instituto de Criminalística do Paraná para perícia (conforme ofício sob nº 946/2022, contido no evento 1.15).A requisição expedida pela autoridade policial deu ensejo ao laudo pericial sob nº 24.217/2022 (evento 215.1), segundo o qual as amostras periciadas apresentaram identificação positiva para maconha. Assim, não existem dúvidas de que as substâncias em questão estão presentes na Portaria SVS/MS nº 344/98, ou seja, tratam-se de drogas para fins legais. Superada esta prévia análise acerca da materialidade, passo à análise do feito sob a perspectiva da autoria delitiva. A autoria é certa e recai, inquestionavelmente, sobre o denunciado, conclusão extraída, primeiramente, da narrativa apresentada pelos Policiais Civis. Os Policiais Civis MARIANA ONOFRE e SERGIO FERNANDO FERRREIRA DE LIMA, durante a instrução processual, afirmaram que durante o cumprimento de um mandado de busca e apreensão relacionado a um caso da Lei Maria da Penha, realizaram uma vistoria na residência do acusado, localizada em um terreno com duas casas. O acusado não estava presente no momento da abordagem, mas a genitora autorizou a entrada da equipe. Durante a busca, foi localizada em uma sala uma quantidade de droga escondida dentro de uma caixa de som. A mulher presente demonstrou nervosismo e entrou em contato com o acusado, o qual compareceu ao local cerca de 20minutos depois. Ao chegar, ele (acusado) assumiu a posse da droga. As testemunhas também mencionaram a apreensão de uma balança de precisão, embora não se recordem do local exato onde foi encontrada. Não foram encontrados apetrechos para consumo do entorpecente. Sobre a relevância da palavra dos agentes públicos (tais como Policiais Civis e Militares e Guardas Municipais), colaciono os seguintes julgados: “APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. ART. 33 DA LEI 11.343/2006. RECURSO DO RÉU. PLEITO ABSOLUTÓRIO. INVIABILIDADE. MATERIALIDADE E AUTORIA SUFICIENTEMENTE COMPROVADAS. AVENTADA VIOLAÇÃO AO ART. 155 DO CPP. REJEITADA. DEPOIMENTO DO POLICIAL MILITAR CORROBORADO PELOS DEMAIS ELEMENTOS DE INFORMAÇÃO. LEGALIDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO. PALAVRA DOS POLICIAIS MILITARES CARREGADA DE RELEVANTE VALOR PROBANTE. FÉ DE OFÍCIO. TRÁFICO MINORADO. DESCABIMENTO. RÉU REINCIDENTE E PORTADOR DE MAUS ANTECEDENTES. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. As provas produzidas em juízo, harmonizadas com os elementos informativos colhidos em sede inquisitorial e com a prova emprestada, não violam o artigo 155 do Código de Processo Penal. 2. A palavra dos policiais militares, corroboradacom as demais provas produzidas nas fases inquisitiva e judicial, possui acentuada eficácia probatória. 3. Não incide o tráfico privilegiado quando o agente é reincidente e de maus antecedentes, ante o desacordo com o artigo 33, §4º, da Lei de Drogas.4. Recurso conhecido e desprovido. (TJPR - 3ª Câmara Criminal - 0005216- 17.2022.8.16.0044 - Apucarana - Rel.: SUBSTITUTO OSVALDO CANELA JUNIOR - J. 20.04.2024 - destaquei) APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS (LEI N. 11.343/06, ART. 33, CAPUT). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PEDIDO DE CONCESSÃO DA JUSTIÇA GRATUITA. NÃO CONHECIMENTO. MATÉRIA AFETA AO JUÍZO DE EXECUÇÃO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA OU DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CONSUMO PRÓPRIO (LEI N. 11.343/06, ART. 28, CAPUT). NÃO PROVIMENTO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. PALAVRA DOS POLICIAIS CORROBORADAS PELAS DEMAIS PROVAS COLHIDAS DURANTE O INQUÉRITO E O PROCESSAMENTO. CONFISSÃO EXTRAJUDICIAL. INDICADORES OBJETIVOS QUE APONTAM FIRMEMENTE PARA O TRÁFICO. INEXISTÊNCIA DO ESPECIAL FIM DE AGIR INERENTE AO CONSUMO.DOSIMETRIA. APLICAÇÃO DA PENA BASILAR NO MÍNIMO LEGAL. PROCEDENTE. AFASTAMENTO DA EXASPERAÇÃO DA QUANTIDADE E NATUREZA DA DROGA. VETORIAIS QUE DEVEM SER SOPESADAS EM CONJUNTO. ÍNFIMA QUANTIDADE DE ENTORPECENTE QUE NÃO JUSTIFICA O AUMENTO DA PENA. ARBITRAMENTO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS À DEFESA DATIVA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, PROVIDO. (TJPR - 4ª Câmara Criminal - 0001912-90.2023.8.16.0103 - Lapa - Rel.: MARIA LUCIA DE PAULA ESPINDOLA - J. 22.04.2024 - destaquei) PROCESSO PENAL. CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. ARTIGO 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/2006. SENTENÇA CONDENATÓRIA. 1) - PRETENSÃO DESCLASSIFICATÓRIA. POSSE DE DROGAS PARA CONSUMO PESSOAL. TESE AFASTADA. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVAS SOBEJAMENTE DEMONSTRADAS. PALAVRA DOS POLICIAIS DOTADA DE FÉ PÚBLICA E EM HARMONIA COM OS DEMAIS ELEMENTOS DE CONVICÇÃO. PRECEDENTES. CONDENAÇÃO MANTIDA. 2) - PENA. PEDIDO DE RECONHECIMENTO DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA. DESCABIMENTO. CONFISSÃO DA PROPRIEDADE DA DROGA PARA CONSUMO PRÓPRIO. ATENUANTE NÃOCARACTERIZADA. SÚMULA 630 DO STJ.RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR - 4ª Câmara Criminal - 0031079- 31.2023.8.16.0014 - Londrina - Rel.: SUBSTITUTO PEDRO LUIS SANSON CORAT - J. 22.04.2024 - destaquei) Por outro lado, no exercício de sua autodefesa, o acusado negou a autoria delitiva, sustentando que guardava o entorpecente em sua residência apenas para consumo próprio. É forçoso reconhecer, contudo, que a negativa de autoria sustentada pelo acusado está em absoluta desconformidade com o relato firme e insuspeito dos agentes públicos. Preponderam sobre a palavra do denunciado, assim, as palavras dos Policiais Civis, que não foram colocadas sob suspeição no decorrer da instrução probatória, excetuada, por óbvio, a alegação defensiva, no exercício da ampla defesa, que justifica a tentativa de desconstituir a versão apresentada pela acusação. Em suma: a negativa de autoria apresentada pelo acusado RODRIGO não se mostra suficiente para desconstituir a versão firme trazida aos autos pelas testemunhas de acusação, cujo possível interesse na “injusta” responsabilização do réu não restou minimamente comprovado. Durante a instrução processual oportuniza-se ao acusado a apresentação de sua versão acerca dosfatos e a ampla produção de provas de suas alegações. Finda a produção probatória, cabe ao Magistrado sopesar todos os argumentos levantados pelas partes e avaliar, cuidadosamente, todas as provas produzidas, para verificar se existem, objetivamente, elementos de convicção que corroborem a imputação inicial e se, eventualmente, há indicativos que enfraqueçam ou coloquem sob suspeita as provas que fundamentaram a denúncia. No exercício dessa atribuição, este Juízo verificou que não há indicativo que coloque sob suspeição a narrativa coerente trazida aos autos pelos Policiais Civis. Conclui-se, assim, que deve preponderar a versão trazida pelos Policiais Civis, com a atribuição de responsabilidade ao réu RODRIGO pelos entorpecentes apreendidos, ou seja, os 288 g (duzentos e oitenta e oito gramas) de maconha, além de uma balança de precisão, que era utilizada para pesar o entorpecente (identificação positiva para maconha), conforme a conclusão da perícia no objeto sob nº 24.219/2022 (evento 45.2). Por outro lado, vislumbra-se que o caso não se enquadra na figura típica do artigo 28 da Lei de Drogas, porquanto tenho a convicção de que, em face às circunstâncias do flagrante, a droga apreendida em poder do réu RODRIGO não tinha outro destino senão o seu comércio.Não obstante, por cautela, passo a sopesar os critérios estabelecidos no artigo 28, §2º, da Lei nº 11.343/06 1 para diferenciar a conduta de guardar drogas para exclusivo consumo pessoal do tráfico propriamente dito, observando especialmente a significativa quantidade de droga apreendida (288 gramas de maconha), a conduta do agente e as condições em que se desenvolveu a ação (cumprimento de mandado de busca para localização de armas de fogo em decorrência de violência doméstica), conjugada com a apreensão de uma balança de precisão e a subdivisão do entorpecente em onze embalagens menores, o que nos permite concluir, com segurança, que a finalidade da posse das drogas não era o mero consumo pessoal do denunciado, mas sim o repasse a terceiros. Como bem ressaltado pelo representante do Ministério Público: “Ainda, importa ressaltar que a droga apreendida estava fracionada em diversas porções menores, o que indica que era destinada à comercialização, e não apenas ao consumo pessoal, conforme tenta alegar o acusado em seu interrogatório (mov. 209.1). O fracionamento da substância é um forte 1 Art. 28, §2º - Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade de substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente.indício de tráfico, pois tal prática é comum para facilitar a venda a usuários. Outro elemento determinante para a caracterização do tráfico é a apreensão de uma balança de precisão, acessório comumente utilizado para a pesagem e fracionamento de drogas antes da comercialização. A posse de tal instrumento reforça a destinação mercantil da substância apreendida e desconstitui a versão defensiva do acusado. Ademais, não foram encontrados no local quaisquer apetrechos utilizados para o consumo pessoal de drogas, como cachimbos, seda ou outros instrumentos, o que desabona a tese de que o entorpecente seria exclusivamente para uso próprio. A quantidade significativa da substância apreendida, somada à forma como estava acondicionada e à presença da balança de precisão, indicam de maneira clara a prática do tráfico de drogas” (trecho das alegações finais – evento 219.1). Convém destacar, por fim, que a alegada condição de usuário de drogas não afasta, por si só, a responsabilidade pelo cometimento do delito de tráfico de drogas.Outrossim, sabe-se que não raras vezes o usuário de drogas pratica a traficância para sustentar o vício, conforme destaca a jurisprudência: “APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS PRIVILEGIADO (LEI N. 11.343/06, ART. 33, CAPUT E § 4º). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. NÃO ACOLHIMENTO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. APELANTE ABORDADO, EM ENDEREÇO AFAMADO PELA MERCANCIA DE DROGAS, TRAZENDO CONSIGO DIVERSIDADE DE ESTUPEFACIENTES (CRACK, COCAÍNA E MACONHA). DESCLASSIFICAÇÃO PARA POSSE DE DROGAS DESTINADAS AO USO PESSOAL. IMPOSSIBILIDADE. SITUAÇÃO DE USUÁRIO NÃO AFASTA, POR SI SÓ, A NARCOTRAFICÂNCIA. DOSIMETRIA DA PENA. PEDIDO DE APLICAÇÃO DA FRAÇÃO DO TRÁFICO PRIVILEGIADO NO PATAMAR MÁXIMO. VARIEDADE E NATUREZA DA DROGA REPRESENTAM MAIOR DESVALOR DA CONDUTA E JUSTIFICAM A FRAÇÃO EM 1/2. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (TJPR - 4ª Câmara Criminal - 0003791- 93.2023.8.16.0019 - Ponta Grossa - Rel.: MARIA LUCIA DE PAULA ESPINDOLA - J. 15.04.2024 - destaquei)APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DEFENSIVO. (...) PEDIDO DE DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS PARA A CONDUTA DE POSSE DE ENTORPECENTES PARA USO PRÓPRIO INSCULPIDA NO ART. 28 DA LEI 11.343/06. NÃO ACOLHIMENTO. CONJUNTO PROBATÓRIO SÓLIDO E ROBUSTO A DEMONSTRAR A AUTORIA E MATERIALIDADE DO NARCOTRÁFICO PRATICADO PELO SENTENCIADO. (...) VI - A condição de usuário, por si só, não é suficiente para descaracterizar a prática do crime de tráfico de drogas, porquanto não é incompatível com a narcotraficância. (...) (TJPR - 4ª Câmara Criminal - 0020654-27.2023.8.16.0019 - Ponta Grossa - Rel.: DESEMBARGADOR CELSO JAIR MAINARDI - J. 15.04.2024 - destaquei) PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. ART. 33, CAPUT, LEI Nº 11.343/06. PRETENSÃO RECURSAL DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA USO PRÓPRIO. ART. 28 DA MESMA LEI. INVIABILIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO. MAUS ANTECEDENTES. PRÁTICA PRETÉRITA DE TRÁFICO. INTELIGÊNCIA DO § 2º DO MESMO ARTIGO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.1. Adesclassificação do crime de tráfico de drogas para o previsto no art. 28 da Lei nº 11.343/06 pressupõe a efetiva comprovação do elemento subjetivo específico do consumo pessoal. 2. Recurso conhecido e desprovido. (TJPR - 3ª Câmara Criminal - 0001133- 13.2021.8.16.0134 - Pinhão - Rel.: SUBSTITUTO OSVALDO CANELA JUNIOR - J. 20.04.2024 – destaquei). Portanto, não restam dúvidas de que a conduta do réu encontra subsunção no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06, sendo impositiva, assim, a sua condenação, mormente porque não ficou comprovada nenhuma das hipóteses de absolvição referidas no artigo 386 do Código de Processo Penal, e não é o caso de promover a desclassificação para a infração penal expressa no artigo 28 da Lei nº 11.343/06. Logo, presentes provas suficientes de autoria e materialidade, impõe-se a condenação do acusado pela prática do crime de tráfico de drogas, nos exatos termos da denúncia de evento 67.1. III. DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal, a fim de CONDENAR o acusado RODRIGO MOISES PEREIRA, qualificado no preâmbulo desta, pela prática do crime previsto no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/06.IV. DOSIMETRIA IV.I. DA PENA DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS (ARTIGO 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/06) Passo a dosar a pena, observando o critério trifásico expresso no artigo 68 do Código Penal 2 , iniciando pela pena-base. O artigo 42 da Lei nº 11.343/06 prescreve que “o juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente”. Natureza da droga: Conforme consta do laudo pericial, os materiais apreendidos apresentaram resultados positivos para a droga popularmente conhecida como “maconha” e não pode ser considerada como circunstância negativa. Quantidade da droga: Consta que o denunciado mantinha em depósito cerca de 288 gramas de maconha, não podendo ser considerada como circunstância negativa. Culpabilidade: Rogério Sanches Cunha ensina que “a circunstância judicial da “culpabilidade” 2 Artigo 68 – A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento.nada tem a ver com a “culpabilidade” terceiro substrato do crime. Cuida-se, na verdade, do maior ou menor grau de reprovabilidade da conduta do agente”. 3 Deve ser considerada normal do tipo. Antecedentes: O réu não possui antecedentes criminais. Conduta social e personalidade: Não há nos autos elementos ou dados suficientes para uma segura avaliação. Motivos do crime: Não foram esclarecidos. Circunstâncias do crime: Nessa particularidade, entende-se os fatores de tempo, lugar e modo de execução. Nas palavras de Nucci, “são os elementos acidentais não participantes da estrutura do tipo, embora envolvendo o delito” (NUCCI, Guilherme de Souza; Código Penal Comentado, 7ª Edição, 2007, Revista dos Tribunais, p. 370). No caso, foram normais à espécie. Consequências: Não justificam o recrudescimento da pena-base. Comportamento da vítima: As vítimas, no presente caso, são o Estado e a sociedade – que não contribuíram para o crime. 3 CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal: parte geral (arts. 1º ao 120). 4. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: JusPODIVM, 2016. p. 415.Analisados os elementos diretivos do artigo 59 do Código Penal e do artigo 42 da Lei nº 11.343/06, considerando que nenhuma circunstância judicial foi valorada negativamente, fixo a pena-base no mínimo legal, ou seja, em 05 (cinco) anos de reclusão, além de 500 (quinhentos) dias-multa. Não há circunstâncias agravantes e atenuantes. Inexistem causas especiais de aumento de pena a serem consideradas. Presente, por outro lado, a causa especial de diminuição de pena prevista no artigo 33, §4º, da Lei nº 11.343/06, cujo reconhecimento depende do concomitante preenchimento dos seguintes requisitos: primariedade, bons antecedentes, ausência de prova de dedicação a atividades criminosas ou de integração em organização criminosa. Logo, inexistindo fundamentação para que a redução da pena se dê em patamar diverso, reduzo a pena em 2/3 (dois terços), fixando-a em 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão, além de 166 (cento e sessenta e seis) dias-multa. Assim, ante a ausência de outras causas de modificação de pena, a condenação se torna definitiva pelo crime de tráfico de drogas em 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão, além de 166 (cento e sessenta e seis) dias-multa.O valor do dia-multa deverá ser calculado à base de um trigésimo (1/30) do salário mínimo vigente na época do fato, devendo ser corrigido monetariamente, na forma da lei, desde a data da infração (artigo 49, §§ 1° e 2° e artigo 60, ambos do CP). IV.II. DO REGIME INICIAL Na forma do que dispõe o art. 33, §2º, “c”, do Código Penal, estabeleço o REGIME ABERTO como regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade. Condições do Regime Aberto A pena privativa de liberdade deverá ser cumprida em regime aberto (art. 33, parágrafo 2º, letra “c” e art. 36, parágrafo 1º, ambos do Código Penal), sendo que o réu deverá, sem vigilância, trabalhar, e manter seu endereço sempre atualizado. Atento ao disposto no artigo 115 da Lei 7.210/84, estabeleço, desde já, as seguintes condições: 1. Não mudar de residência e não se ausentar da cidade por mais de 07 (sete) dias sem prévia autorização judicial. 2. Comparecer em Juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades, bem como manter atualizado seu endereço.Outrossim, as medidas acima têm caráter de advertência ao acusado, na profilaxia de delitos de igual natureza. Vislumbrando estarem presentes todos os requisitos previstos no artigo 44 do Código Penal, notadamente a quantidade de pena aplicada e a análise das circunstâncias judiciais, substituo a pena privativa de liberdade acima fixada por duas penas restritivas de direito, nos termos do artigo 44, §2°, do Código Penal, consistentes em: Prestação de serviços à comunidade, junto a uma entidade a ser definida pelo Juízo da Execução, por ocasião da fase executória, pelo mesmo tempo da pena substituída (artigo 55 do Código Penal), ou seja, 01 (um) ano e 08 (oito) meses, sendo facultado cumpri-la em menor tempo, mas nunca inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada (artigo 46, §4°, do Código Penal). As tarefas, que serão gratuitas, deverão ser atribuídas conforme as aptidões do réu, devendo ser cumpridas à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho (artigo 46, §3°, do Código Penal). Ainda, deverá cumprir a título de pena restritiva de direito, uma prestação pecuniária (artigo 45, §1°, do Código Penal) consistente no pagamento do valor de 01(um) salário mínimo vigente no País à época do cumprimento daquela, em favor de entidade pública ou privada com destinação social a ser definida em audiência admonitória. Tal pagamento poderá ser parcelado se houver interesse do acusado e for de acordo com sua disponibilidade financeira. Em caso de descumprimento das penas restritivas de direitos, as mesmas serão convertidas em pena privativa de liberdade, a ser cumprida em regime aberto. Nos termos do artigo 387, §1º, do Código de Processo Penal, concedo ao sentenciado o direito de recorrer em liberdade. CONSIDERAÇÕES GERAIS: 1. Condeno o réu ao pagamento das custas e despesas processuais, com fundamento no artigo 804 do Código de Processo Penal. Saliento que eventual pedido de isenção das custas processuais deverá ser oportunamente formulado, após o trânsito em julgado da presente condenação, perante o Juízo da Execução, que detém competência para apreciação da matéria, consoante o atual entendimento jurisprudencial. 2. Do valor mínimo para a reparação do dano:Deixo de fixar valor mínimo para reparação dos danos (artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal), já que o crime de tráfico de drogas não possui vítima certa e determinada, atingindo toda a coletividade, indistintamente. 3. Procedam-se as intimações nos moldes estatuídos pelo CNFJ (art. 810 e seguintes). Após o trânsito em julgado da presente sentença: a) Tratando-se de sentença que aplicou pena privativa de liberdade em regime aberto, sendo substituída por penas restritivas de direito, expeça-se a respectiva guia, independentemente da expedição de mandado de prisão (art. 833 do CNFJ), promovendo-se a sua autuação junto ao SEEU. b) Comunique-se o Instituto de Identificação do Paraná (art. 824, incisos VIII e IX do CNFJ). c) Remetam-se os autos à Contadoria para o cálculo das custas processuais e da pena de multa, nos termos do artigo 875 do CNFJ. d) Intime-se o sentenciado para, no prazo de até 10 (dez) dias, comparecer à Secretaria para retirada do boleto ou guia para pagamento ou solicitar, por qualquer meio eletrônico, o encaminhamento dos boletos (art. 877 do CNFJ).e) Tratando-se de sentença condenatória, comunique-se o Juízo Eleitoral, tendo em vista o contido no artigo 15, inciso III, da Constituição Federal. f) Oficie-se à Delegacia de Polícia de origem para que proceda a destruição das substâncias apreendidas. g) Promova-se a destruição, nos termos do procedimento próprio, da balança de precisão apreendida nos autos. h) Cumpram-se as demais disposições pertinentes do Código de Normas da Corregedoria- Geral da Justiça do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. A audiência admonitória será futuramente designada pelo Juízo da Execução. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se os presentes autos de conhecimento. Curitiba, data da assinatura digital. Peterson Cantergiani Santos Juiz de Direito
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