Ministério Público Do Estado Do Paraná x Josiane Aparecida Amarante
ID: 322720261
Tribunal: TJPR
Órgão: 2ª Vara Criminal de Londrina
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0008843-85.2023.8.16.0014
Data de Disponibilização:
11/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MYLENA PAULA DE OLIVEIRA LIMA
OAB/PR XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE LONDRINA - FORO CENTRAL DE LONDRINA 2ª VARA CRIMINAL DE LONDRINA - PROJUDI Av. Tiradentes, 1575 - Fórum Criminal - Jardim Veral…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE LONDRINA - FORO CENTRAL DE LONDRINA 2ª VARA CRIMINAL DE LONDRINA - PROJUDI Av. Tiradentes, 1575 - Fórum Criminal - Jardim Veraliz - Londrina/PR - CEP: 86.070-545 - Fone: (43)3572-3202 - E-mail: lon-12vj-e@tjpr.jus.br Processo: 0008843-85.2023.8.16.0014 Classe Processual: Ação Penal - Procedimento Ordinário Assunto Principal: Grave Data da Infração: 30/09/2020 Autor(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Vítima(s): ESTADO DO PARANÁ FABIO BARBOSA DE FRANÇA Réu(s): JOSIANE APARECIDA AMARANTE Vistos e examinados. I. RELATÓRIO. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ ofereceu denúncia contra JOSIANE APARECIDA AMARANTE, devidamente qualificada nos autos, imputando-lhe a conduta descrita e tipificada como crime no artigo 129, § 1º, inciso II, do Código Penal, em razão dos fatos assim descritos na peça acusatória: “No dia 30 de setembro de 2020, no período noturno, na Rua Procópio Severino da Silva, nº 175, Centro, na cidade de Tamarana/PR, Comarca de Londrina/PR, JOSIANE APARECIDA AMARANTE, dolosamente, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, ofendeu a integridade corporal da vítima Fábio Barbosa de França, causando-lhe perigo de vida, após golpeá-lo com uma faca em seu dorso, conforme Boletim de Ocorrência (sequência 1.2), Prontuário do Hospital Evangélico (sequência 15.3) e Laudo de Lesões Corporais Indireto (sequência 16.1). De acordo com o noticiado no Boletim de Ocorrência nº 2020/1002719, na data dos fatos, estava o ofendido no bar denominado “Bar da Cidinha”, localizado no endereço supracitado, junto de sua amásia de nome Bruna, consumindo bebida alcoólica, quando começou a discutir verbalmente com esta. Em sequência, JOSIANE se incomodou com a situação e deu um empurrão em Fábio, sendo que este revidou o contato. Diante disso, a denunciada localizou uma faca na cozinha do bar, desferindo um golpe com a arma branca nas costas da vítima, momento em que o cabo da faca quebrou, ficando a lâmina presa no dorso do ofendido, o qual fora encaminhado para o Hospital de Tamarana. Em vista da complexidade da situação, Fábio foi encaminhado para o Hospital Evangélico de Londrina, em situação de risco muito grave (Conf. seq. 15.3, fls 9.), sendo retirada a lâmina da faca e realizada drenagem de tórax esquerdo por acometimento de parênquima pulmonar esquerdo, em vista da lesão sofrida, a qual causou perigo de vida, confirmado pelo Prontuário de Atendimento de sequência 15.3 e Laudo Pericial de sequência 16.1”. A denúncia foi recebida em 11/09/2023 (seq. 31.1). A acusada foi pessoalmente citada (seq. 86), apresentando resposta à acusação por intermédio de defensor nomeado, no seq. 94. Afastada a absolvição sumária (seq. 100.1), realizou-se audiência de instrução e julgamento, oportunidade em que as testemunhas arroladas foram inquiridas e a ré interrogada (seqs. 138, 166 e 181). Alegações finais do Ministério Público na seq. 195.1. Em síntese, pugna a condenação da acusada nos termos da exordial acusatória, por entender que a materialidade e a autoria do delito restaram devidamente comprovada. Alegações finais da acusada na seq. 199.1. Em síntese, requereu a absolvição ante a existência de causa de excludente de ilicitude da legítima defesa. Em caso de condenação, requereu o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea, a causa de diminuição de pena prevista no art. 129, § 4º, do CP, bem como a substituição da pena privativa de liberdade por multa e o regime de cumprimento de pena mais favorável à ré. É o relatório. Fundamento e decido. II. FUNDAMENTAÇÃO. Não há nulidades a declarar, irregularidades a sanar, de modo que, estando o feito em ordem, passo de pronto à análise do mérito. A materialidade dos fatos está provada pela Portaria (seq. 1.1), Boletim de Ocorrência (seq. 1.2), Prontuários Médicos (seqs. 12.1, 15.2 e 15.13), Imagem (seq.15.4) Laudo Pericial (seq. 16.1), declarações colhidas em ambas as fases da persecução penal, tudo a confirmar a prática do delito descrito na denúncia. A autoria, por sua vez, igualmente, restou provada e recai sobre a acusada. De acordo com as provas colhidas nas duas fases da persecução penal, na data de 30/09/2020, a vítima, Fábio Barbosa de França, foi atingida por um golpe de faca na região dorsal. Consta dos autos que o ofendido se encontrava no estabelecimento denominado “Bar da Cidinha”, acompanhado de sua companheira, Bruna Maria da Conceição, quando se iniciou uma discussão entre ambos. Durante o desentendimento, a denunciada, sentindo-se incomodada com a situação, empurrou Fábio, que reagiu ao contato. Na sequência, a acusada dirigiu-se até a cozinha do bar, onde localizou uma faca e desferiu um golpe nas costas da vítima, ocasião em que o cabo do instrumento se rompeu, permanecendo a lâmina cravada no dorso do ofendido. Após receber os primeiros atendimentos em Tamarana, a vítima foi encaminhada ao Hospital Evangélico de Londrina. Com efeito, a vítima FÁBIO BARBOSA FRANÇA, relatou que houve desentendimento com sua esposa, motivado pelo consumo de bebida alcoólica por ambos. Informou que a acusada interveio na discussão e, em razão disso, foi por ele agredida com um tapa. Em sequência, ao se voltar novamente para sua esposa, a acusada lhe desferiu um golpe de faca nas costas. Afirmou ter sido socorrido por seu irmão e sua esposa, sendo inicialmente encaminhado ao hospital da cidade de Tamarana e, posteriormente, transferido para o Hospital Universitário de Londrina, onde permaneceu internado por apenas uma noite. Asseverou que não houve sequelas da lesão sofrida. Declarou que mantém relação pacífica com a acusada, não nutrindo qualquer sentimento de mágoa em relação a ela. Informou ter chegado ao bar após as 19h, aproximadamente às 20h, sendo que o golpe foi desferido por volta das 21h. Reiterou que havia consumido bebida alcoólica. Por fim, disse acreditar que a acusada tenha agido em defesa de sua esposa, Bruna. Ressaltou, ainda, que possui pouco contato com a acusada, a qual é avó de seu filho, mas que não mantém qualquer desavença com ela. Perante a autoridade policial, a vítima declarou que se encontrava, na companhia de sua esposa, Bruna, no estabelecimento denominado "Bar da Cidinha", localizado na cidade de Tamarana/PR. Informou que, em determinado momento, iniciou-se uma discussão verbal entre ele e sua esposa. Acrescentou que, no mesmo local, também estava presente JOSIANE, identificada como sua ex-sogra, além da dona do bar, Cidinha, sua atual sogra. Relatou que Josiane se incomodou com a discussão e, em razão disso, empurrou-o com força, tendo ele revidado com outro empurrão de igual intensidade. Após esse episódio, afirmou que retornou à discussão com sua esposa, quando, repentinamente, sentiu um golpe nas costas. Segundo relatado, Josiane lhe desferiu uma facada, sendo que o cabo da arma branca se quebrou em suas mãos e a lâmina permaneceu cravada em seu corpo, sendo posteriormente retirada nas dependências do Hospital Universitário de Londrina. Esclareceu que possui um filho com Darlene, filha de Josiane, e que, em razão de desavenças familiares, esta última nutriria sentimento de animosidade em relação a ele. A informante, BRUNA MARIA DA CONCEIÇÃO, esposa da vítima, relatou que na data dos fatos, estavam todos em um bar, fazendo o uso de bebidas alcoólicas e que começou a discutir com Fábio, perto do balcão do bar. Disse que Fábio lhe deu um tapa e ela revidou com outro tapa, em seguida, começou uma confusão entre os dois. Em dado momento, percebeu que Fábio estava ferido com a facada e que as agressões mútuas cessaram. Acredita que a ré deu a facada em Fábio para defender a depoente de alguma outra agressão mais grave, pois ambos estavam alterados pelo consumo de bebidas. Informou que Fábio precisou ser encaminhado ao Hospital. Ao ser indagada acerca das declarações prestadas na fase extrajudicial, reiterou que trocara tapas e que Fábio partiu para cima dela, em razão disso, sua mãe e Josiane intervieram. Não viu o momento em que a acusada deu a facada em Fábio, apenas viu o marido com a faca nas costas. Disse que a ré chegou a se esconder de Fábio temendo que ele a agredisse. Perante a autoridade policial, Bruna declarou que, por volta das 22h00, encontrava-se no bar de sua genitora, Maria Aparecida Conceição, acompanhada de seu marido, Fábio. Informou que ambos ingeriam bebida alcoólica e se encontravam em estado de embriaguez. Relatou que, durante uma discussão entre o casal, Fábio empurrou-a, tendo ela revidado com um empurrão. Nesse ínterim, JOSIANE teria se aproximado e desferido um golpe de faca nas costas de Fábio. A depoente afirmou não se recordar de qualquer discussão anterior entre Fábio e Josiane no local. Informou que Fábio foi inicialmente encaminhado ao hospital da cidade de Tamarana e, posteriormente, transferido para o Hospital Universitário de Londrina, onde a lâmina foi retirada de suas costas. Acrescentou que Fábio e Josiane já haviam se desentendido em ocasiões anteriores, em razão de ele ter sido genro dela. Por fim, afirmou acreditar que o golpe tenha sido desferido por Josiane em sua defesa. Ressaltou, contudo, que, em razão do estado de embriaguez geral, não é possível afirmar se poderiam ter ocorrido outras agressões entre os envolvidos. A testemunha MARIA APARECIDA DA CONCEIÇÃO, em ambas as fases da persecução penal, a testemunha MARIA APARECIDA declarou ser proprietária do estabelecimento denominado “Bar da Cidinha”, situado na cidade de Tamarana/PR. Afirmou que seu genro, sua filha e JOSIANE estavam presentes, consumindo bebidas alcoólicas. Ressaltou, no entanto, que se encontrava sóbria. Relatou que, em dado momento, Fábio e sua esposa, Bruna, iniciaram uma discussão, que evoluiu para agressões físicas, com tapas e empurrões. Ao tentar intervir, foi empurrada por Fábio. Informou que, diante da situação, sua amiga Josiane interveio em defesa da depoente e de Bruna, dirigindo-se a Fábio. Este, então, empurrou Josiane e voltou a discutir com sua esposa. Na sequência, Josiane teria se dirigido até a cozinha, onde encontrou uma faca, com a qual desferiu um golpe nas costas de Fábio, o qual permaneceu em pé querendo agredir a ré e que ela saiu do local. Reiterou que Josiane interferiu na briga para proteger tanto a depoente quanto Bruna. A depoente afirmou que Fábio se encontrava visivelmente embriagado e, naquela ocasião, poderia intensificar as agressões contra ela e sua filha. A vítima foi socorrida e encaminhada ao hospital da cidade de Tamarana. Informou que a ré pedia para Fábio parar. Disse que a vítima ficou apenas um dia internado e não ficou com sequelas. Contou que Fábio e sua filha se separaram. Declarou que Fábio tem fama de agressor. A ré JOSIANE APARECIDA AMARANTE, relatou que Fábio era seu genro. Relatou que, na data dos fatos, ambos se encontravam no estabelecimento conhecido como “Bar da Cidinha”, embora não estivessem juntos. Informou que, ao se dirigir até o balcão para pegar uma cerveja, deparou-se com uma discussão entre Fábio e Bruna, ocasião em que presenciou Fábio desferir um tapa em Bruna. Na sequência, a mãe de Bruna tentou intervir em defesa da filha, sendo então empurrada por Fábio. A ré afirmou que, estando próxima ao balcão, acabou esbarrando em Fábio e tentou contê-lo, momento em que foi agredida por ele com um soco no olho, vindo a cair ao solo, ocasião em que recebeu ainda um chute. Disse que, ao se levantar, avistou uma faca sobre o balcão, a qual tomou e com a qual desferiu um golpe contra Fábio. Informou que, após o ocorrido, também foi socorrida e encaminhada ao hospital da cidade de Tamarana, sendo posteriormente atendida por médico oftalmologista na cidade de Londrina. Por fim, relatou que, após o golpe, Fábio foi contido por terceiros que se encontravam no bar. Perante a autoridade policial, a ré declarou que estavam bebendo cerveja no Bar da Cidinha, sogra de Fábio. Afirmou que Fábio discutia com sua companheira em outra mesa. Em dado momento, ao se dirigir até o balcão para apanhar uma cerveja, acabou, de forma acidental, esbarrando em Fábio, o qual, de imediato, reagiu com agressão física, lhe desferindo um soco no olho. Relatou que, diante da agressão, utilizou uma faca que se encontrava sobre o balcão — normalmente utilizada por frequentadores para preparar caipirinha — para atingir Fábio com um golpe. Disse, ainda, que acionou a polícia, embora não tenha registrado boletim de ocorrência. Informou ser ex-sogra de Fábio, porquanto sua filha foi casada com ele. Acrescentou que, no dia dos fatos, Fábio se encontrava na companhia de outra mulher. Acredita que as agressões tenham ocorrido em virtude do estado emocional alterado de Fábio, aliado ao consumo de bebida alcoólica, posto que, até então, mantinham convivência pacífica. As provas produzidas nas duas fases da persecução confirmam que a ré JOSIANE APARECIDA AMARANTE golpeou com uma faca o dorso do ofendido, sendo necessária a drenagem de tórax esquerdo por acometimento de parênquima pulmonar esquerdo, resultando em perigo de vida. Com efeito, as declarações prestadas pela vítima, pela informante, pela testemunha e pela própria ré, em ambas as fases da persecução penal, são harmônicas e claras acerca do delito de lesão corporal, além de terem sido corroboradas pelo Laudo Pericial (seq. 16.1) e Prontuários Médicos (seqs. 12.1, 15.2 e 15.13), restando plenamente demonstrada a prática da lesão corporal, conforme imputado à ré na denúncia. Com efeito, as declarações prestadas pela vítima Fábio Barbosa de França, sua esposa Bruna Maria da Conceição e por Maria Aparecida Conceição, dona do estabelecimento comercial onde ocorreram os fatos são harmônicas e seguras quanto aos fatos e sua autoria, restando plenamente comprovado que a ré JOSIANE, ao interferir em uma discussão entre Fábio e Bruna, após também ser agredida por este, o golpeou com uma faca, cujo cabo quebrou, ficando a lâmina presa no dorso do ofendido. É cediço que em crimes dessa natureza, a palavra da vítima assume relevante valor probatório, sobretudo porque não é outra a intenção do ofendido senão apontar o real culpado pela prática delituosa. A propósito: “Apelação criminal. Artigos 129 e 147, ambos do Código Penal. Crime de lesão corporal leve. Crime de ameaça. Autoria e materialidade comprovadas. Laudo de lesões corporais. Relatos coerentes com o fato ocorrido. Inexistência de argumentos que desabonem o relato da vítima e da testemunha ouvida em juízo. Palavra do ofendido de especial relevância probatória. Provas suficientes para a condenação. Vontade dirigida ao fato. Dolo evidenciado. Subsunção do fato à norma. Tipicidade da conduta. Dosimetria aplicada de forma correta. Condenação mantida por seus próprios fundamentos. Recurso conhecido e desprovido. (TJPR - 4ª Turma Recursal - 0001378-48.2018.8.16.0063). Portanto, não há qualquer dúvida de que JOSIANE agrediu a integridade física de Fábio Barbosa de França, causando-lhe perigo de vida, após golpeá-lo com uma faca em seu dorso. A lesão ocasionada pela agressão restou comprovada pelo Boletim atendimento do SAMU de seq.15.2, o qual indica que a vítima apresentava “vítima de ferimento por arma branca em região dorsal a esquerda peri-vertebral (tórax) - agressão pela sogra. Chegou deambulando, dor local, lâmina encravada nas costas”. Ainda, conforme prontuário médico acostado na seq. 15.13, a lesão está classificada como “S212 - Ferimento da Parede Posterior do Tórax (CID - 10) – seq.15.13, página eletrônica 07. Destarte, ficou igualmente demonstrado que a lesão sofrida pela vítima resultou em perigo de vida, conforme Laudo Pericial de seq. 16.1, caracterizando o crime de lesão corporal grave previsto no art. 129, §1º, II do Código Penal. Enfim, restou suficientemente comprovado que a denunciada JOSIANE APARECIDA AMARANTE, dolosamente ofendeu a integridade física e corporal de Fábio Barbosa de França, causando-lhe lesão corporal que resultou em perigo de vida. No que tange à alegação de legítima defesa, a partir do que restou demonstrado nos autos, é inequívoco que não há que se falar na incidência da excludente de ilicitude correspondente. Verifica-se que a conduta da ré extrapolou os limites do necessário à caracterização da legítima defesa. Isso porque JOSIANE, ao tentar defender Bruna e, posteriormente, a si própria, excedeu-se na reação contra Fábio, lhe desferindo um golpe com faca que lhe causou perigo de vida. Preceitua o art. 25, do Código Penal: “Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”. No caso, ainda que a ré tenha sido agredida pela vítima com soco e chute, é certo que o revide se deu de forma exagerada e excessiva, a rechaçar de forma categórica a legítima defesa, pois para sua configuração se exige o emprego de forma moderada dos meios tidos a disposição, circunstância não verificada nos autos. Com efeito, além de o golpe de faca ter sido desferido nas costas da vítima, verifica-se, a partir dos relatos constantes dos autos, que o referido golpe foi aplicado de forma inesperada, porquanto nenhum dos envolvidos — Bruna, Maria ou a própria vítima — presenciou o momento em que a ré desferiu o golpe, tendo apenas percebido o ocorrido após a vítima relatar que havia sido atingida. Nesse contexto, é absolutamente inegável a desproporcionalidade da reação defensiva, haja vista que a ré, de forma imoderada, utilizando instrumento cortante de elevado potencial lesivo, causou ferimento na parede posterior do tórax do ofendido, expondo-o a evidente risco de vida. Trata-se, pois, de conduta que revela intenção de causar lesão e não meramente de se defender. Importante também destacar que nada há de concreto nos autos a indicar o agravamento da contenda, inclusive, a própria ré afirmou que ofendido foi contido por outros rapazes no bar. Dessa forma, inexiste justificativa plausível para a utilização de faca como meio de defesa, concluindo-se pela ausência de moderação e de utilização dos meios estritamente necessários. Ademais, a ré poderia ter adotado outras medidas para resguardar-se da agressão, inclusive acionando a autoridade policial. Optou, contudo, por revide desproporcional, de modo que, ainda que se admita que tenha sido inicialmente agredida, verifica-se a ocorrência, ao menos, de excesso doloso na reação defensiva. Diante disso, revela-se inviável o reconhecimento da excludente de ilicitude da legítima defesa, uma vez que a ré se excedeu na utilização dos meios necessários à repulsa da agressão. Nesse sentido: APELAÇÃO CRIMINAL - RÉU CONDENADO POR LESÃO CORPORAL GRAVE (ART. 129, §1º, INC. II DO CP) MEDIANTE USO DE ARMA BRANCA – INSURGÊNCIA DA DEFESA - ABSOLVIÇÃO – EXCLUDENTE DA ILICITUDE - LEGÍTIMA DEFESA - NÃO VERIFICADA -RÉU QUE AGIU COM O CLARO ANIMUS LAEDENDI – DESPROPORCIONALIDADE DA MEDIDA - LAUDO TÉCNICO QUE ATESTOU A LESÕES CORPORAIS – FERIMENTO CAUSADO EM REGIÃO VITAL – EXCESSO DOLOSO CARACTERIZADO – PRECEDENTES - CONDENAÇÃO MANTIDA.RECURSO DE APELAÇÃO NÃO PROVIDO. (TJPR - 1ª Câmara Criminal - 0001122-55.2021.8.16.0175 - Uraí - Rel.: DESEMBARGADOR GAMALIEL SEME SCAFF - J. 29.07.2023) – grifei- (I) APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE LESÃO CORPORAL DE NATUREZA GRAVE. CONDENAÇÃO. (II) PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO ANTE O RECONHECIMENTO DE CAUSA EXCLUDENTE DA ILICITUDE, CONSISTENTE NA ATUAÇÃO EM LEGÍTIMA DEFESA. INJUSTA AGRESSÃO, ATUAL OU IMINENTE, NÃO COMPROVADA. EVIDENCIADA, ALÉM DISSO, A DESPROPORCIONALIDADE DOS MEIOS EMPREGADOS. EXCLUDENTE DA ILICITUDE NÃO RECONHECIDA. POSTULADO AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA DO ART. 129, §1º, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL. INCAPACIDADE DA VÍTIMA PARA AS OCUPAÇÕES HABITUAIS POR MAIS DE 30 DIAS, ALÉM DE COMPROVADA EM LAUDO PERICIAL, CONFIRMADA PELA VÍTIMA E PELAS TESTEMUNHAS EM JUÍZO. CONDENAÇÃO MANTIDA. (III) DOSIMETRIA PENAL. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE QUE TENHA O RÉU AGIDO SOB DOMÍNIO DE VIOLENTA EMOÇÃO, LOGO APÓS INJUSTA PROVOCAÇÃO DA VÍTIMA. REPRIMENDA MANTIDA. (IV) RECURSO NÃO PROVIDO. (TJPR - 1ª Câmara Criminal - 0022149-66.2019.8.16.0013 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR ADALBERTO JORGE XISTO PEREIRA - J. 04.03.2023) -grifei- APELAÇÃO CRIMINAL. LESÃO CORPORAL DE NATUREZA GRAVE PRATICADACONTRA PESSOA IDOSA. (ART. 129, §1º, C/C ART. 61, INCISO II, ALÍNEA “H”, AMBOS DO CÓDIGOPENAL). SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PLEITO DE ABSOLVIÇÃO EM RAZÃO DA EXCLUDENTE DE ILICITUDE DE LEGÍTIMA DEFESA. NÃO ACOLHIMENTO. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS PREVISTOS NO ART. 25 DO CÓDIGO PENAL PARA RECONHECIMENTO DA EXCLUDENTE DE ILICITUDE INVOCADA. AUSÊNCIA DE UMA RELAÇÃO DE MODERAÇÃO, PROPORCIONALIDADE E NECESSIDADE A LIGAR A CONDUTA DO ACUSADO À AGRESSÃO ATUAL OU IMINENTE. SENTENÇA ESCORREITA. CONDENAÇÃO MANTIDA. RECURSO NÃO PROVIDO” (TJPR, ApCrim nº 0013181-90.2019.8.16.0031, Rel. Des. Nilson Mizuta, j. em 25.10.2021) -grifei- Em relação ao pedido de reconhecimento da causa de diminuição de pena prevista no art. 129, § 4º, do CP (impelido por motivo de relevante valor social ou moral ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima), tem-se que é ônus da defesa de comprovar a injusta provocação da vítima, o que não se observou nos autos. Consoante as declarações prestadas pelas pessoas envolvidas, restou demonstrado que, inicialmente, Fábio e sua esposa, Bruna, iniciaram uma discussão que evoluiu para agressões físicas, com tapas e empurrões. Na sequência, a mãe de Bruna tentou intervir em defesa da filha, sendo, então, empurrada por Fábio. A ré, que se encontrava próxima ao balcão, acabou esbarrando em Fábio e tentou contê-lo, momento em que foi agredida e empurrada por ele, ocasião em que o ofendido retornou à discussão com sua esposa. Em seguida, a ré, ao se levantar, apanhou uma faca e desferiu um golpe pelas costas da vítima. Segundo se extrai dos autos, não há qualquer prova no sentido de que tenha havido discussão entre a ré e a vítima dentro do estabelecimento comercial antes das agressões, sendo certo que a discussão se deu exclusivamente entre a vítima e sua esposa. Inexistiu, portanto, qualquer provocação por parte de Fábio que pudesse justificar a conduta adotada pela ré. Ressalte-se que a simples alegação de que a ré teria agido sob violenta emoção não é suficiente para ensejar a incidência da diminuição de pena prevista no artigo 129, §4º do Código Penal. Não tendo a defesa se desincumbido do ônus de comprovar a existência de provocação injusta, apta a gerar no acusado estado de violenta emoção — e não meramente a influenciá-lo ou dominá-lo emocionalmente, conceitos que não se confundem —, descabe o reconhecimento da referida diminuição de pena, ainda que ambos tenham se envolvido na confusão. O privilégio previsto no artigo 129, §4º, do Código Penal apenas pode ser aplicado quando estiver patente a presença de motivo relevante de valor social ou moral ou se o agente estiver imbuído do domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, circunstâncias não retratadas nos autos. Estão presentes os elementos caracterizadores do injusto penal. Os fatos são típicos, formal e materialmente, estão subsumidos com precisão ao preceito primário da norma penal incriminadora do artigo 129, §1º do Código Penal, e mostram-se penalmente relevante, ante a significante lesão que produziram nos bens jurídicos tutelados pela norma. São antijurídicos (ou ilícitos), pois ausente causa legal de justificação das condutas (excludentes de ilicitude). Presente, também, a culpabilidade, pois o agente é penalmente imputável; conhecia ou tinha condições de conhecer a ilicitude da conduta e dele era exigível, nas circunstâncias concretas dos fatos, comportamento diverso e consonante com o ordenamento jurídico. III. DISPOSITIVO. Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão condenatória Estatal, para CONDENAR a ré JOSIANE APARECIDA AMARANTE, qualificada nos autos, pela prática do crime previsto no artigo 129, §1º, inciso II, do Código Penal, sujeitando-a às penas previstas no preceito secundário daquela norma penal incriminadora, bem assim ao pagamento das custas e despesas processuais. Passo a calcular as penas em estrita observância ao disposto nos artigos 59 e 68 do Código Penal. IV. APLICAÇÃO DA PENA. Na primeira fase, referente às circunstâncias previstas no art. 59 do Código Penal, tenho que a culpabilidade, que é o grau de reprovabilidade da conduta da ré, deve ser tida como normal, posto que perpetrada dentro da normalidade prevista pelo legislador no tipo penal; quanto aos antecedentes, a ré é primária e não possui maus antecedentes, considerando a Súmula 444 do STJ, conforme Certidão de Antecedentes Criminais (seq. 192.1); sobre a conduta social e a personalidade da ré, nada há a ser considerada; os motivos do crime são normais à espécie e nada há a ser considerado no tocante às circunstâncias do fato e consequências do crime. Não há comportamento da vítima a ser considerado. Assim, inexistindo circunstância judicial desfavorável à condenada, fixo a pena-base no mínimo legal de 01 (um) ano de reclusão. Na segunda fase, não há circunstância agravante a ser reconhecida. Incide, porém, a circunstância atenuante de pena referente à confissão, prevista no artigo 65, inciso III, ‘d’, do Código Penal. No entanto, em atenção ao que preceitua a súmula 231 do c. STJ (“A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal”), mantenho a pena intermediária de 01 (um) ano de reclusão. Na terceira fase, ausente causa de diminuição ou de aumento de pena. Ausentes outras causas modificadoras a considerar, condeno a ré à pena privativa de liberdade de 01 (um) ano de reclusão pela prática do crime de lesão corporal de natureza grave. Tratando-se de ré primária, condenada à pena privativa de liberdade inferior a 4 anos e com circunstâncias judiciais favoráveis, fixo o REGIME ABERTO para início do cumprimento da pena, nos termos do art. 33, §2°, alínea ‘c’ e §3º do Código Penal. Fixado o regime inicial aberto, despicienda a análise da detração penal (CPP - art. 387, §2º) para fins de determinação de regime. Fixo as seguintes condições para cumprimento da pena no regime aberto, observando-se, principalmente, o estabelecido no artigo 115 da Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/1984): (a) não se ausentar da Comarca de sua residência, por mais de 7 (sete) dias, sem autorização judicial; (b) comparecer mensalmente em Juízo, a fim de informar e justificar as suas atividades; (c) comprovar, em 30 (trinta) dias, o exercício profissional lícito. Incabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, tendo em vista que o crime foi praticado com violência contra a pessoa. Por outro lado, deixo de conceder à ré a suspensão condicional da pena (art. 77, CP), uma vez que as condições do regime aberto são mais benéficas do que aquelas previstas nos artigos 78, § 1º e 79, ambos do Código Penal. V. PRISÃO PREVENTIVA. Tendo respondido ao processo em liberdade e inexistindo fato novo que justifique a sua prisão cautelar, MANTENHO A CONDENADA EM LIBERDADE até o trânsito em julgado desta sentença penal condenatória, salvo motivo superveniente. VI. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DO(A) DEFENSOR(A) DATIVO(A). Ainda, ante a necessidade de nomeação de defensor dativo aos necessitados à falta de Defensor Público atuante neste juízo, ARBITRO HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS em favor do(a) advogado(a) DRA. MYLENA PAULA DE OLIVEIRA LIMA - OAB/PR 91.796 que atuou no processo como DEFENSOR(A) DATIVO(A) do(à) acusado(a), no valor de R$2.000,00 (dois mil reais), nos termos do item 1.2 da Tabela de Honorários Advocatícios aprovada pela RESOLUÇÃO CONJUNTA Nº 06/2024 PGE/SEFA e considerando os parâmetros do art. 85, §2º do Código de Processo Civil, especialmente o grau de zelo e o trabalho realizado pelo(a) defensor(s) - apresentação de resposta à acusação, comparecimento em audiência e memoriais -, e a baixa complexidade da ação penal. Os honorários deverão ser pagos pelo Estado do Paraná, na forma do artigo 22, § 1°, da Lei federal n.° 8.906, de 04.07.94 (Estatuto da Advocacia) e Lei Estadual 18.664/2015. VII. DISPOSIÇÕES FINAIS. CONDENO a ré ao pagamento das CUSTAS PROCESSUAIS, nos termos do artigo 804 do Código de Processo Penal. DEIXO DE FIXAR o valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração, como prevê o artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, pois não houve requerimento condenatório dessa natureza. Após o trânsito em julgado: (a) certifique-se nos autos o trânsito em julgado desta sentença condenatória; (b) expeça-se a competente guia para execução das penas impostas, encaminhando à vara de execuções penais, em conformidade com o Código de Normas da Corregedoria Geral da Justiça; (c) quanto às custas processuais, cumpram-se as determinações da Instrução Normativa 65/2021 da e. CGJ/PR. (d) oficie-se, em atenção ao estabelecido no artigo 15, inciso III, da Constituição da República, à Justiça Eleitoral, comunicando-se a presente condenação; (e) comunique-se a presente decisão à vítima, nos termos do artigo 201, § 2º, do Código de Processo Penal. (f) comuniquem-se o Distribuidor e o Instituto de Identificação do Estado do Paraná, de acordo com os artigos 822 a 830, do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado (g) cumpram-se as demais disposições pertinentes do Código de Normas da e. Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Paraná. Publicada e registrada via PROJUDI. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se. Londrina/PR, datado e assinado eletronicamente. Tatiane Garcia Silvério de Oliveira Claudino Juíza de Direito
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