Pedro Olivio Almeida Goes x Jorge Pasiecznik e outros
ID: 323786339
Tribunal: TJPR
Órgão: Vara Cível de Piraí do Sul
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 0000962-19.2022.8.16.0135
Data de Disponibilização:
14/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ALLAN MARCEL PAISANI
OAB/PR XXXXXX
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RESHAD TAWFEIQ
OAB/PR XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE PIRAÍ DO SUL VARA CÍVEL DE PIRAÍ DO SUL - PROJUDI Travessa Jorge Vargas, 116 - CENTRO - Piraí do Sul/PR - CEP: 84.240-000 - Fone: (42) 3237-1288 Autos …
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE PIRAÍ DO SUL VARA CÍVEL DE PIRAÍ DO SUL - PROJUDI Travessa Jorge Vargas, 116 - CENTRO - Piraí do Sul/PR - CEP: 84.240-000 - Fone: (42) 3237-1288 Autos nº. 0000962-19.2022.8.16.0135 Processo: 0000962-19.2022.8.16.0135 Classe Processual: Procedimento Comum Cível Assunto Principal: Reivindicação Valor da Causa: R$100.000,00 Autor(s): PEDRO OLIVIO ALMEIDA GOES Réu(s): JORGE PASIECZNIK RITA DE CASSIA LUIZ PASIECZNIK SENTENÇA Vistos e examinados. 1. RELATÓRIOS 1.1 PROCESSO Nº 0001556-58.2018.8.16.0135 – AÇÃO DE USUCAPIÃO Trata-se de ação de usucapião extraordinário movida por JORGE PASIECZNIK e RITA DE CASSIA LUIZ PASIECZNIK, na qual alegam, em síntese, que: a) exercem posse mansa, pacífica, contínua, ininterrupta e com animus domini sobre parte de imóvel rural situado à Rodovia PR-151, KM 251, Bairro Roseta, em Piraí do Sul/PR, correspondente a 4.732,87 m² da matrícula nº 343 do Registro de Imóveis local, desde 24/03/1998; b) estabeleceram moradia habitual no local e ali edificaram, com recursos próprios, estrutura para funcionamento da borracharia do primeiro autor, bem como construíram casa de madeira e outras benfeitorias, incluindo pátio, piso, galinheiro, chiqueiro e depósito; c) o imóvel foi inicialmente cedido verbalmente pelo então proprietário do posto de combustível vizinho, para que o autor Jorge prestasse serviços de borracharia aos caminhoneiros; d) ao longo dos anos, ampliaram e melhoraram as instalações, transformando a borracharia em construção de alvenaria e implantando atividades produtivas, como criação de animais e cultivo de árvores frutíferas; e) a posse se deu de forma direta e como se proprietários fossem, sem qualquer oposição, sendo preenchidos os requisitos do artigo 1.238 do Código Civil para a configuração da usucapião extraordinária; f) defendem que exercem função social da propriedade, conforme preceitos constitucionais e legais, o que lhes garante o reconhecimento da propriedade pela via originária da usucapião; g) fundamentam seu pedido também em jurisprudência do Tribunal de Justiça do Paraná, que reconhece a usucapião extraordinária qualificada pela posse-trabalho e posse-moradia. Ao final, requereram a intimação da Fazenda Pública, do Ministério Público e dos confrontantes, bem como o julgamento procedente da ação para concessão do título de propriedade. Em conjunto com a petição inicial, os autores apresentaram o seguinte rol de documentos (movs. 1.9/1.40): Fatura de cartão de crédito endereçada à autora RITA no endereço Bairro da Roseta S/N CX Postal 83 PR 151 KM 251 8424-000, Piraí do Sul/PR, postada em 09/005/2018 (mov. 1.9); Certidão de casamento dos autores JORGE e RITA (mov. 1.10); Planta de imóvel rural do imóvel a ser usucapido (mov. 1.11); Memorial descritivo do imóvel a ser usucapido (mov. 1.12); Planta do imóvel em sua integralidade, incluindo o trecho supostamente pertencente exclusivamente ao Sr. PEDRO OLIVO DE ALMEIDA GOES (mov. 1.13); Memorial descritivo em sua integralidade, incluindo o trecho supostamente pertencente exclusivamente ao Sr. PEDRO OLIVO DE ALMEIDA GOES (mov. 1.14); Matrícula nº 343 do SRI de Piraí do Sul/PR em que figuram como proprietários registrais os Srs. JAQUELINA APARECIDA GOES, PATRICIA ADELAIDE GOES e PEDRO OLIVIO ALMEIDA GOES (R. 19-343 do mov. 1.15); Nota fiscal datada em 18/01/1999 atinente à inscrição municipal nº 069.001.3528-Y em favor do autor JORGE (mov. 1.16/1.20); Talão nº 19460 datado em 07/01/1999 atinente ao pagamento de “taxa de expediente” e “alvará de licença” em favor da Prefeitura Municipal de Piraí do Sul (mov. 1.17); Alvará de licença nº 3.528 para localização e funcionamento em nome do autor JORGE no endereço RODOVIA PR-151 KM-188, para a atividade de “prestação de serviços de borracharia datada em 05/01/1999 (mov. 1.18/1.19); Requerimento de concessão de alvará de localização e funcionamento com atividade de serviços de borracharia para veículos automotores datado em 03/01/2014 (mov. 1.21, p. 01); Certificado da Condição de Microempreendedor Individual datado em 26/01/2013 em que a autora RITA DE CASSIA figura como microempreendedora individual, indicando o seguinte endereço comercial: RODOVIA PR 151 KM 251 S/A, BAIRRO DA ROSETA, PIRAÍ DO SUL/PR, indicando a data de 26/11/2013 como o início da atividade de serviços de borracharia para veículos automotores (mov. 1.21, p. 03); Nota fiscal datada em 03/05/2010 em que o autor JORGE indica o endereço VIA BR 151 S/A KM 251 ROSETA PIRAÍ DO SUL como sua residência (mov. 1.22/1.24); Nota fiscal datada em 16/05/2011 em que o autor JORGE indica o endereço VIA BR 151 S/A KM 251 ROSETA PIRAÍ DO SUL como sua residência (mov. 1.25/1.27); Nota fiscal datada em 03/07/2013 em que a autora RITA DE CASSIA indica o endereço VIA BR 151 S/A KM 188 ROSETA PIRAÍ DO SUL como sua residência (mov. 1.28); Nota fiscal datada em 03/04/2017 em que a autora RITA DE CASSIA indica o endereço VIA BR 151 S/A KM 251 ROSETA PIRAÍ DO SUL como sua residência (mov. 1.29); Nota fiscal datada em 27/01/2014 em que o autor JORGE indica o endereço VIA BR 151 S/A KM 251 ROSETA PIRAÍ DO SUL como sua residência (mov. 1.30); Declarações firmadas sem reconhecimento de firma por pessoas que se identificam como conhecedores de que os autores residem no imóvel em discussão desde o ano de 1998 (mov. 1.31); e Fotografias (movs. 1.32/1.40). O despacho de mov. 14 determinou a emenda à inicial. Os autores promoveram a emenda da inicial, para o fim de incluir no polo passivo os proprietários registrais JAQUELINA APARECIDA GOES, PATRICIA ADELAIDE GOES e PEDRO OLIVIO ALMEIDA GOES, para o fim de trazer documentação complementar e para formular pedido de concessão de tutela de urgência, consistente da decretação da manutenção dos autores na posse do imóvel em discussão (mov. 19). Ainda, os autores trouxeram à baila os seguintes documentos: ART assinado por engenheiro florestal (mov. 19.2); Certidão negativa de ação possessória (mov. 19.3); e Notificação extrajudicial datada em 23/07/2018 encaminhada por PEDRO OLÍVIO ALMEIDA GOES a fim de por fim ao comodato e estabelecer prazo para a desocupação do imóvel (mov. 19.4). A decisão de mov. 22.1 deferiu o pedido de tutela de urgência para o fim de determinar a expedição de mandado de manutenção de posse, devendo a parte ré ser advertida que eventual descumprimento caracteriza o delito de desobediência. Foi expedido edital para a citação dos terceiros desconhecidos (mov. 26.1). Foi lavrado auto de manutenção de posse (mov. 40). A UNIÃO indicou ausência de interesse na lide (mov. 42.1). Os confrontantes LAURO DE JESUS BUTURE e SILVIO SUTIL DE OLIVEIRA foram citados (mov. 46.1). O MUNICÍPIO DE PIRAÍ DO SUL indicou ausência de interesse na lide (mov. 49.3). Os requeridos PEDRO OLÍVIO ALMEIRA e MARCIA CRISTINE BIANCHI GOES foram citados (mov. 55.1). O ESTADO DO PARANÁ indicou ter interesse no feito e pugnou pela apresentação de novo memorial e planta nos quais deverá constar a rodovia PR-151, no trecho SER 2017 151O0176EPR, de INÍCIO DA OBRA DE DUPLICAÇÃO para INÍCIO DA PISTA DUPLA (MURETA), e sua relação com a área objeto deste Usucapião (mov. 69.1). Os requeridos PEDRO OLÍVIO ALMEIRA GOES, MÁRCIA CRISTINE BIACHI GOES, JAQUELINE APARECIDA GOES e PATRÍCIA ADELAIDE GOES PETKOWICZ apresentaram contestação (mov. 75.1), oportunidade em que pontuaram, em suma, que: a) os autores ocuparam o imóvel com base em comodato, por mera autorização dos proprietários, sem que houvesse posse com ânimo de dono; b) o autor Jorge foi empregado da empresa dos réus entre 2004 e 2014, e a autora prestava serviços eventuais até 2015, circunstâncias que demonstram relação de confiança e dependência; c) a permissão de uso da área da borracharia teve finalidade específica de interesse empresarial dos réus e não se configura como doação da propriedade; d) a alegação de doação verbal é juridicamente inválida, pois o negócio jurídico exige forma escrita, nos termos dos artigos 538 e 541 do Código Civil; e) a situação dos autores caracteriza mera detenção, sendo a posse exercida precária, sem os requisitos exigidos para usucapião; f) mesmo com melhorias e benfeitorias feitas no imóvel, não houve qualquer rompimento da natureza precária da posse; g) os autores nunca exerceram a posse de forma clandestina, violenta ou com animus domini, tendo a ocupação sido sempre tolerada pelos réus; h) decisões do Tribunal de Justiça do Paraná confirmam que a posse precária oriunda de comodato não se convalida em posse ad usucapionem; i) os documentos apresentados pelos autores, como notas fiscais, alvarás e declarações, não comprovam o exercício de posse com ânimo de dono; j) as benfeitorias, plantações e criações alegadas não alteram a natureza do vínculo jurídico e os autores se mantinham no imóvel com autorização dos réus; k) a tutela provisória de manutenção de posse foi indevidamente concedida, uma vez que não estão presentes os requisitos legais para sua concessão, especialmente por ausência de posse legítima e perigo de dano real. Em conjunto com a contestação, os requeridos apresentaram o seguinte rol de documentos (movs. 75.3/75.12): Contrato de locação celebrado entre AUTO POSTO ESTRELA DA AMIZADE e JOSÉ MARIA BATISTA referente à borracharia situada na PR 151 KM 188, pelo prazo de 12 (doze) meses, datado em 01/05/1997 (mov. 75.3); Solicitação para resgate total do seguro oriundo da proposta 183960/183961, em que o autor JORGE PASIECZNIK figura como cliente e funcionário da empresa AUTO POSTO ESTRELA DA AMIZADE LTDA datada em 17/07/2016 (mov. 75.4); Notificação extrajudicial datada em 23/07/2018 encaminhada por PEDRO OLÍVIO ALMEIDA GOES a fim de pôr fim ao comodato e estabelecer prazo para a desocupação do imóvel (mov. 75.5). Ficha de empregado em que o autor JORGE PASIECZNIK figura como empregado na função de frentista admitido em 01/01/1993 (mov. 75.6/75.8); Ficha de empregado em que o Sr. RICARDO FOAY PADILHA figura como empregado na função de frentista admitido em 01/04/1998 (mov. 75.9); Cópia da petição inicial de reclamação trabalhista movida por RITA DE CÁSSIA LUIZ PASIEZNIK em face de AUTO POSTO ESTRELA DA AMIZADE LTDA e F. GOÉS DA SILVA BOMBONIERE ESTRELA (mov. 75.11); e Cópia do agravo de instrumento interposto em face da decisão de mov. 22 (mov. 75.12). Os autores apresentaram réplica à contestação (ato seq. 99.1), na qual alegam, em síntese: a) a contestação não apresenta fundamentos capazes de descaracterizar o animus domini exercido pelos autores por mais de 20 anos sobre o imóvel usucapiendo; b) a alegação de comodato verbal carece de prova, inexistindo qualquer documento que comprove a existência de contrato ou relação jurídica dessa natureza; c) a posse exercida sempre se deu com exclusividade, autonomia e aparência de domínio, sendo comprovada por documentos como alvarás de licença, declarações, comprovantes de residência e fotos de benfeitorias realizadas no local; d) o reconhecimento judicial do animus domini em sede de decisão liminar reforça a caracterização da posse como ad usucapionem; e) as alegações de que a posse era exercida apenas nos dias de folga ou por autorização da ré são refutadas pelo exercício contínuo de atividade econômica, com licenciamento regular e moradia fixa no local; f) a função social da posse foi cumprida pelos autores, que transformaram o imóvel em espaço produtivo e de sustento familiar; g) os documentos apresentados pela ré não infirmam os elementos probatórios da inicial, sendo contraditórios ou desprovidos de relevância para afastar o direito à usucapião; h) não há provas de oposição anterior ou interrupção da posse, tampouco de que o imóvel teria sido ocupado por terceiro após 1998, data na qual já havia alvará em nome do autor; i) os requisitos da usucapião extraordinária estão plenamente preenchidos, conforme jurisprudência colacionada, sendo inaplicável a tese de posse precária pela ausência de demonstração de qualquer vínculo jurídico autorizador. Sobreveio informação de que a decisão liminar de manutenção de posse foi revogada em sede recursal (mov. 135). A confrontante MARIA REINE DE OLIVEIRA PACENKO foi citada (mov. 187.1). O DER e o ESTADO DO PARANÁ indicou na possuir interesse na lide (mov. 203.1). A decisão de mov. 214 saneou o feito, oportunidade em que foram fixados os pontos controvertidos e designada data para a realização de audiência de instrução. Sobreveio a informação do óbito da requerida MARCIA CRISTINE BIACHI GOES (mov. 246.1). Os autores apresentaram nova planta e memorial (mov. 252.2). A decisão de mov. 271 determinou a citação do herdeiro PEDRO HENRIQUE BIANCHI GOÉS. Sobreveio decisão proferida no bojo do processo nº 962-19.2022 reconhecendo a conexão entre os feitos e, com fulcro no artigo 55, caput e §1º do Código de Processo Civil, determinando o apensamento dos processos (0001156- 58.2018.8.16.0135 e 0000962-19.2022.8.16.0135) (ato seq. 326). A representação do ESPÓLIO DE MARCIA CRISTINE BIACHI GOES foi regularizada (mov. 327). Foi determinada a suspensão do processo até o saneamento do processo nº 962-19.2022 (mov. 336). Sobreveio cópia da decisão saneadora do processo 962-19.2022 (mov. 339.1) que designou data para a realização de audiência de instrução e julgamento conjunta dos processos nº 0001156- 58.2018.8.16.0135 e 0000962-19.2022.8.16.0135. Foi realizada audiência de instrução (mov. 368). Os requeridos apresentaram alegações finais (mov. 373), ocasião em que pontuaram que: a) os autores não comprovaram o preenchimento dos requisitos legais para a usucapião extraordinária, pois sempre exerceram mera detenção do imóvel, decorrente de tolerância e relação de trabalho com o réu Pedro; b) os próprios depoimentos dos autores confirmam que a moradia no imóvel decorreu da atividade laboral prestada ao réu e que a casa foi construída a mando deste, com materiais fornecidos por ele; c) não houve exercício da posse com ânimo de dono, sendo que os autores jamais pagaram tributos ou contas referentes ao imóvel, tendo apenas em 2018 solicitado ligação de energia elétrica em nome próprio; d) o ajuizamento da ação de usucapião decorreu do rompimento da relação trabalhista e da existência de pendência de acerto de verbas, sendo a ação utilizada como forma indevida de compensação; e) os depoimentos das testemunhas ouvidas corroboram a versão de que a ocupação se deu por permissão, inexistindo qualquer cessão ou doação por parte do réu Pedro; f) os documentos acostados à petição inicial não comprovam o animus domini, sendo genéricos e uniformes, o que compromete sua credibilidade; g) as residências existentes no local sempre serviram de apoio a funcionários, conforme demonstrado nos depoimentos prestados pelas testemunhas da defesa; h) os autores não se desincumbiram do ônus da prova, nos termos do artigo 373, I, do CPC; i) em razão da ausência de impugnação específica na ação reivindicatória, requer-se sua procedência integral, com fundamento nos artigos 336, 341 e 374, III, do CPC. Por fim, reiteram-se os termos da contestação e da petição inicial da ação reivindicatória. Os requerentes apresentaram alegações finais (mov. 374), indicando que: a) exercem posse mansa, pacífica, contínua e com animus domini sobre o imóvel desde 1998, com base em ocupação legítima e consolidada pelo tempo, mediante moradia e atividade econômica desenvolvida no local; b) realizaram inúmeras benfeitorias com recursos próprios, incluindo construção e reforma da casa e da borracharia, melhorias no piso, instalação de cercas, pátio e estrutura de atendimento, além de cultivos e criação de animais; c) a posse sempre foi pública e notória, reconhecida inclusive por vizinhos e testemunhas, sem qualquer oposição até a notificação extrajudicial em 2018, quando a ação de usucapião já havia sido ajuizada; d) as alegações de comodato verbal carecem de prova, sendo refutadas pelas declarações do próprio Pedro Olivio e pelas testemunhas, que confirmam inexistência de contrato e autonomia dos autores; e) mesmo quando Jorge possuía vínculo formal com o posto de combustíveis, manteve posse e gestão da borracharia, tendo inclusive registrado microempresa em nome próprio; f) a desocupação do posto por seus proprietários e posterior venda à empresa Pro Tork demonstra abandono da posse pelos titulares registrais, o que reforça a posse exclusiva e qualificada exercida pelos autores; g) a posse dos autores preenche todos os requisitos previstos no artigo 1.238 do Código Civil, sendo legítima, contínua, pacífica, pública e com intenção inequívoca de domínio; h) a ausência de qualquer vínculo jurídico contratual ou relação de subordinação torna insustentável a tese de posse precária ou mera detenção, sendo evidente a autonomia da posse exercida; i) o pedido de usucapião deve ser acolhido, com reconhecimento da aquisição da propriedade e improcedência da ação de reintegração de posse cumulativamente proposta pelos réus. Vieram-me os autos conclusos para julgamento. 1.2 PROCESSO Nº 0000962-19.2022.8.16.0135 – AÇÃO REIVINDICATÓRIA Trata-se de ação reivindicatória movida por PEDRO OLÍVIO ALMEIRA GOES em face de JORGE PASIECZNIK e RITA DE CASSIA LUIZ PASIECZNIK, em que o autor aduz, em síntese: a) que é o legítimo proprietário do imóvel objeto da matrícula nº 343 do Registro de Imóveis de Piraí do Sul/PR, sendo que em parte deste imóvel funciona a empresa “Posto Estrela da Amizade”, de propriedade do Autor, e uma borracharia; b) que o autor e os requeridos se conhecem há muito tempo; c) que o requerido era empregado da empresa “Posto Estrela da Amizade” e trabalhou vários anos na matriz, em Ponta Grossa, e muitos anos na filial de Piraí do Sul, onde está localizado e funcionando o posto de combustíveis e a borracharia; c) que esse último período do contrato de trabalho na filial iniciou-se em 05/01/2004 e se encerrou em 25/01/2014; d) que a requerida, por sua vez, é esposa do requerido e, em razão da proximidade do imóvel utilizado para exploração com a borracharia, também prestava serviços eventuais para a mesma pessoa jurídica do Autor até setembro de 2015; e) que em razão dessa proximidade e confiança que o Autor, sempre presente, autorizou, permitiu o uso da área da borracharia do imóvel pelos Réus, em comodato, porque lhes interessava tal permissão e, de alguma forma, ainda, auxiliavam os Réus a ter uma atividade econômica em paralelo com o vínculo empregatício; f) que os requeridos, mediante comodato, obtiveram autorização do proprietário do imóvel e sócio proprietário da empresa para ocuparem a parte do imóvel com edificação e área de serviços de borracharia para, nas horas de folga (pelo menos até 2014), prestarem serviços de borracharia para clientes do posto de combustível; g) que anteriormente, a área da borracharia encontrava-se locada para outra pessoa, JOSÉ MARIA BATISTA, durante o ano de 1998 até início do ano de 2004, quando o locatário entregou o imóvel e mudou-se para outra localidade.; h) que a partir de então, em razão da antiga relação pessoal que mantinham, para ajudar os Réus e para atender clientes do posto de combustível, o Autor lhes outorgou em comodato o uso do imóvel da área da borracharia; i) que buscando a rescisão do contrato de comodato e a desocupação do imóvel, o Autor procedeu então à notificação extrajudicial dos Réus no ano de 2018; j) que os Réus não desocuparam o imóvel e, ao invés disto, propuseram ação de usucapião, autuada sob o nº 0001156- 58.2018.8.16.0135, em trâmite na Vara Cível de Piraí do Sul/PR; k) que na referida ação, alegaram os Réus que mantém posse mansa, pacífica e contínua, com animus domini, desde 24/03/1998, sobre uma parcela de 0,4732ha do terreno rural situado na Rodovia PR-151, km 251, localizado no bairro Roseta, na Comarca de Piraí do Sul/PR, objeto da matrícula nº 343 do Registro de Imóveis daquela Comarca, de propriedade do Autor, porque este teria outorgado a eles a propriedade; l) que não é difícil concluir, de acordo com os fatos e com o direito, que os Réus nunca possuíram o imóvel com ânimo de donos. Só receberam autorização para ocuparem o imóvel para explorarem a atividade econômica que era do interesse do Autor na área onde funcionava a borracharia, fato confessado na inicial do processo nº 0001156-58.2018.8.16.0135. Ao final, o autor pugnou pelo julgamento procedente da lide, a fim de que seja determinada a imissão do autor na posse do imóvel objeto de discussão, com a consequente determinação de desocupação pelos requeridos, sob pena de multa diária. Em conjunto com a peça exordial, foi apresentado o seguinte rol documental (mov. 1.4/1.14): Matrícula nº 343 do SRI de Piraí do Sul/PR em que figuram como proprietários registrais os Srs. JAQUELINA APARECIDA GOES, PATRICIA ADELAIDE GOES e PEDRO OLIVIO ALMEIDA GOES (R. 19-343 do mov. 1.4); Ficha de empregado em que o autor JORGE PASIECZNIK figura como empregado na função de frentista admitido em 01/01/1993 (mov. 1.5); Cópia da petição inicial de reclamação trabalhista movida por RITA DE CÁSSIA LUIZ PASIEZNIK em face de AUTO POSTO ESTRELA DA AMIZADE LTDA e F. GOÉS DA SILVA BOMBONIERE ESTRELA (mov. 1.6); Cópia da contestação apresentada no bojo de reclamação trabalhista movida por RITA DE CÁSSIA LUIZ PASIEZNIK em face de AUTO POSTO ESTRELA DA AMIZADE LTDA e F. GOÉS DA SILVA BOMBONIERE ESTRELA (mov. 1.7); Ata da audiência realizada no bojo de reclamação trabalhista movida por RITA DE CÁSSIA LUIZ PASIEZNIK em face de AUTO POSTO ESTRELA DA AMIZADE LTDA e F. GOÉS DA SILVA BOMBONIERE ESTRELA (mov. 1.8); Contrato de locação celebrado entre AUTO POSTO ESTRELA DA AMIZADE e JOSÉ MARIA BATISTA referente à borracharia situada na PR 151 KM 188, pelo prazo de 12 (doze) meses, datado em 01/05/1997 (mov. 1.9); Notificação extrajudicial datada em 23/07/2018 encaminhada por PEDRO OLÍVIO ALMEIDA GOES a fim de pôr fim ao comodato e estabelecer prazo para a desocupação do imóvel (mov. 1.10). Planta e memorial descritivo da área em discussão (movs. 1.11/1.12); e Planta e memorial descritivo de todo o imóvel (movs. 1.13/1.14). A decisão de mov. 14 indeferiu o pedido de tutela provisória e determinou a citação dos requeridos. A decisão de mov. 55 determinou a realização de audiência de conciliação do presente feito em conjunto com a audiência de instrução do processo nº 1156-58.2018 (ação de usucapião). O autor informou que tomou conhecimento de que os requeridos estão promovendo obras no imóvel e pugnou pela determinação de suspensão da obra (mov. 78). A decisão de mov. 82 deferiu o pedido formulado para o fim de proibir que os requeridos inovem no cenário fático e determinar a suspensão de qualquer alteração na área em litígio – ressalvadas, apenas, as obras que se revelarem absolutamente indispensáveis para a incolumidade das construções já erigidas e/ou as que foram requeridas pela autoridade pública. A decisão de mov. 82 foi suspensa em sede recursal (processo nº 0100185- 25.2023.8.16.0000). A decisão de mov. 102 chamou o feito à ordem, oportunidade em que reconheceu a conexão entre os efeitos e determinou o apensamento dos processos nº 0001156- 58.2018.8.16.0135 e 0000962-19.2022.8.16.0135. Os requeridos apresentaram contestação (ato seq. 121), oportunidade em que pontuaram: a) que a extinção do presente feito sem resolução de mérito é necessária, em razão da ação de usucapião tratar do mesmo objeto da presente demanda, aplicando litigância de má-fé em face da Requerente; b) que o Requerido encontra-se na posse do imóvel desde 24/03/1998, portanto há 26 longos anos, tempo necessário, para o reconhecimento da usucapião na ação supracitada; c) que a posse exercida pelos Réus sobre o imóvel desde 1998, caracterizada por sua natureza mansa, pacífica e ininterrupta, aliada ao evidente animus domini demonstrado ao longo de 26 anos constitui fundamento sólido para o reconhecimento da usucapião extraordinária, em especial pela clara demonstração de que os Réus edificaram e reformaram o imóvel de moradia onde residem com a família, não havendo qualquer elemento capaz de sustentar a alegação de que havia contrato de comodato; d) que a confissão inequívoca do próprio autor quanto à posse contínua e pacífica dos Réus desde o início do período alegado reforça de maneira contundente a legitimidade da reivindicação dos Réus à aquisição da propriedade por usucapião. Ao final, pugnaram pelo julgamento improcedente da lide. O autor apresentou impugnação à contestação (mov. 124). O autor pugnou pela produção de prova oral (mov. 127) e os requeridos pugnaram pela produção de prova oral (mov. 128). A decisão de mov. 131.1 saneou o feito, oportunidade em que rejeitou a preliminar de ausência de interesse processual, fixou os pontos controvertidos e designou data para a realização de audiência de instrução conjunta dos processos nº 0001156- 58.2018.8.16.0135 e 0000962-19.2022.8.16.0135. Foi realizada audiência de instrução (mov. 181). As partes apresentaram alegações finais (mov. 186/187). Vieram-me os autos conclusos para julgamento. 2. FUNDAMENTAÇÃO Os autos tratam de ações conexas que versam sobre o mesmo imóvel: de um lado, ação de usucapião extraordinária proposta por Jorge Pasiecznik e Rita de Cássia Luiz Pasiecznik, que afirmam exercer posse com animus domini desde 1998, e de outro, ação reivindicatória movida por Pedro Olívio Almeida Goes, proprietário registral do imóvel, que sustenta que os requeridos ocuparam o bem a título precário, mediante comodato verbal. O ponto central da controversa reside em determinar a natureza da posse exercida pelos réus: se se trata de posse ad usucapionem, com o intuito de exercer domínio, ou de detenção precária, decorrente de relação de confiança e vínculo laboral, o que afastaria a possibilidade de usucapião e, por conseguinte, ensejaria a procedência da ação reivindicatória. Nos termos do artigo 1.238 do Código Civil: Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis. Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo. A usucapião extraordinária exige, portanto, posse contínua, mansa, pacífica e com animus domini, pelo prazo legal. No caso concreto, a prova testemunhal e documental produzida evidencia que os réus efetivamente residem e exercem atividade econômica no imóvel desde 1998, o que evidencia a continuidade e a publicidade da ocupação. Todavia, a posse ad usucapionem não se presume pelo decurso do tempo. É imprescindível que a ocupação do bem seja acompanhada de inequívoco ânimo de dono, o que não restou comprovado nos autos. Com efeito, tanto os depoimentos pessoais dos requerentes da usucapião quanto das testemunhas revelam que a ocupação do imóvel teve origem em autorização do proprietário, em razão da relação empregatícia mantida por Jorge com o posto de combustíveis, então de propriedade de Pedro Olívio. A própria residência foi erguida com materiais fornecidos pelo proprietário e construída por iniciativa conjunta, com o objetivo de abrigar funcionário vinculado à empresa. Neste sentido extrai-se dos depoimentos colhidos em sede de audiência de instrução, senão vejamos: Rita de Cássia Luiz Pasiecznik prestou depoimento pessoal em que afirmou não se recordar da área exata objeto do pedido de usucapião, esclarecendo, contudo, que o imóvel compreende duas casas situadas atrás de um posto. Relatou que, ao se mudar para Piraí do Sul, no ano de 1998, já havia uma borracharia no local, mas a casa onde reside atualmente foi construída por seu marido, com auxílio do senhor Ricardo, que na época trabalhava para o senhor Pedro. Afirmou que a construção foi realizada a mando do próprio senhor Pedro. Indagada sobre eventual contrato, verbal ou escrito, firmado com o senhor Pedro para ocupação do imóvel, declarou que não houve qualquer contrato, inclusive negando sua participação em qualquer tipo de acordo nesse sentido. Disse não ter conhecimento de que a borracharia estivesse locada ao senhor José Maria Batista, embora o conheça, mas não se recorda até que ano ele teria trabalhado no local. Confirmou que, em 2018, ela e seu marido receberam uma notificação extrajudicial para desocupação do imóvel, mas não esclareceu os motivos pelos quais não atenderam à notificação. Reconheceu conhecer a senhora Ivete, que trabalhava no restaurante do posto, e confirmou que esta também recebeu notificação extrajudicial na mesma época, tendo cumprido a ordem e desocupado o imóvel. (Depoimento pessoal de RITA DE CASSIA LUIZ PASIECZNIK) Jorge Pasiecznik prestou depoimento pessoal afirmando que reside no imóvel em questão há 27 anos, especificamente desde 24 de março de 1998. Declarou que o imóvel, composto por uma borracharia e uma casa onde vive com seu filho, está situado nos fundos de um posto de gasolina, do qual não faz parte do pedido de usucapião. Informou que o espaço ocupado corresponde a uma área de aproximadamente 50 metros por 50 metros, onde mantém, além da residência e da borracharia, uma horta, um pomar e pequenas criações, comparando-o a um sítio. Relatou que passou a residir no local após acordo verbal com o senhor Pedro OLívia Góes, então proprietário do posto e de outros imóveis na região. Inicialmente, teria sido convidado a tocar a borracharia e, diante da inexistência de moradia disponível, construiu a casa com madeiras provenientes de uma residência antiga desmanchada no posto de Ponta Grossa, também de propriedade do senhor Pedro. Afirmou ter executado a obra por conta própria, com ajuda pontual do senhor Ricardo Padilha. Indicou que essa ordem de desmanchar a propriedade em Ponta Grossa e construir a residência nova com essa madeira foi proveniente de ordem do Sr. Pedro. Confirmou que trabalhou para o senhor Pedro, com registro formal entre 2004 e 2014, mas exercia atividades no local desde 1998. Apontou, ainda, eu antes do ano de 1998 trabalhou por cerca de 05 (cinco) anos na matriz do posto de combustível na cidade de Ponta Grossa. Indagado acerca da natureza do acordo verbal que lhe trouxe ao imóvel em discussão, apontou que foi chamado para tocar a borracharia e como não tinha local de moradia, construiu essa casa e foi trabalhar. Indicou que continuou trabalhando e foi registrado no posto. Apontou que continuou morando nessa casa até o ano retrasado, quando então fez uma reforma nela (que ainda precisa ser finalizada). Apontou que não foi feita nenhuma documentação acerca dessa casa e que “morava ali porque trabalhava para ele”. Esclareceu que, além da borracharia e do trabalho no posto, prestava diversos serviços extras, inclusive em propriedades rurais do empregador, como manutenção de pneus de tratores e caminhões, sem, contudo, jamais ter pago aluguel pela moradia ou utilização da área. Indicou que possuía relação de confiança e convivência com o Sr. Pedro, sendo que a mãe de Pedro foi sua madrinha de casamento, possuindo uma convivência muito boa. Disse conhecer José Maria Batista, que anteriormente atuava como borracheiro no local com seu irmão Eldir, mas afirmou que estes já haviam deixado o imóvel antes de sua chegada. Em relação às despesas, declarou que não pagava contas de água ou impostos, utilizando água do poço comum e, posteriormente, energia em ponto próprio. Informou que, desde 2018, a unidade consumidora de energia elétrica da casa está em seu nome. Quanto à água, disse que inicialmente utilizava um poço tipo cacimba, que abastecia também outras estruturas do posto. Posteriormente, a empresa que assumiu o posto teria instalado um poço artesiano. Quanto à origem da posse, explicou que, além do acordo verbal com o proprietário, havia pendências trabalhistas e financeiras com o senhor Pedro, razão pela qual, ao receber notificação extrajudicial em 2018, não desocupou o imóvel. Alegou que, diante da negativa de acerto por parte do empregador, decidiu buscar seus direitos judicialmente por meio da ação de usucapião. Por fim, confirmou que conhecia a senhora Ivete, que trabalhava no restaurante anexo ao posto, e que ela também recebeu notificação semelhante, tendo desocupado o local em virtude de possuir contrato. (Depoimento pessoal de JORGE PASIECZNIK) Pedro Olivio Almeida Goes prestou depoimento pessoal, afirmando que o posto de combustíveis situado em Piraí do Sul pertence a ele e a suas irmãs, tendo sido adquirido pela família por volta dos anos de 1996 ou 1997. Relatou que, à época da aquisição, já havia funcionários atuando no local, tendo convidado posteriormente Jorge Pachetti para trabalhar no posto, considerando tratar-se de pessoa conhecida, já que seu irmão havia trabalhado anteriormente em outro posto da família, localizado em Ponta Grossa. Explicou que Jorge iniciou suas atividades como frentista e, após a saída de um antigo borracheiro, foi-lhe proposto que assumisse também os serviços da borracharia, mantendo seu salário de frentista e dividindo os lucros da borracharia com o empregador. Informou que os equipamentos da borracharia – como compressores, chaves e macacos – pertenciam ao posto. Relatou que, diante de dificuldades financeiras, Jorge propôs um acerto para continuar residindo no imóvel e tocando a borracharia de forma autônoma, tendo sido autorizado verbalmente, embora nenhum contrato formal tenha sido celebrado. Posteriormente, Jorge teria aberto sua própria empresa e seguido operando no local, ainda sem formalização de locação. Quanto à casa ocupada por Jorge e sua família, afirmou que foi construída com materiais de outra residência desmanchada em Ponta Grossa, pertencente também à família, e que a autorização para moradia foi concedida por ele, considerando que Jorge trabalhava no posto e havia se deslocado de outra cidade. Referiu que havia também outra casa no mesmo terreno, onde residia outro funcionário, Adenilson. Destacou que sempre houve uma relação de confiança entre as partes, razão pela qual não foram firmados contratos escritos. Confirmou que, quando decidiu encerrar as atividades do posto e entregá-lo à distribuidora em razão de dívidas, solicitou a desocupação dos imóveis a todos os ocupantes, inclusive Jorge. Disse que, enquanto Ivete e Paulo, responsáveis pela lanchonete, desocuparam o local, Jorge permaneceu e, pouco depois, ingressou com a ação de usucapião. Informou que, posteriormente, vendeu o posto à empresa Protorque, a qual condicionou o pagamento do preço à desocupação integral do imóvel, o que não ocorreu até o momento. Afirmou conhecer a família de Jorge desde a infância, tendo, contudo, relação de conhecimento, e não de amizade íntima. Declarou que não houve pagamento de verbas rescisórias a Jorge quando cessou o vínculo de trabalho e que a borracharia permaneceu sob responsabilidade dele após a desativação do posto. Disse ainda que o local ficou fechado por cerca de um ano e meio, sendo que, nesse período, Jorge permaneceu na residência e continuou utilizando a borracharia. Reconheceu que Jorge realizou ampliações no imóvel e que houve tentativas de solução extrajudicial antes da propositura da ação reivindicatória. (Depoimento pessoal de PEDRO OLIVIO ALMEIDA GOES) Ivete de Almeida Jubat prestou depoimento como testemunha, relatando que exerceu atividades no imóvel anexo ao posto de combustíveis em Piraí do Sul por aproximadamente 21 anos, administrando uma conveniência e restaurante, desde 1998 até 2018. Esclareceu que não possuía vínculo de amizade com Pedro Olívio Góis, tampouco com Jorge Pachetti e Rita, mantendo apenas convivência durante o período em que compartilhavam o espaço de trabalho. Informou que, durante os 16 anos em que residiu em imóvel cedido no mesmo terreno, Jorge e Rita também ali moravam, estando presentes desde antes de sua chegada. Esclareceu que a casa ocupada por Jorge foi construída por ele, com suas próprias mãos, utilizando madeiras reaproveitadas, e que a estrutura da borracharia já existia, embora ele tenha realizado melhorias ao longo do tempo. Declarou que, no período em que esteve no local, Jorge inicialmente trabalhava como funcionário do posto, mas acumulava as funções de frentista e atendimento na borracharia. Informou ainda que não teve conhecimento direto de eventual ordem para que Jorge e Rita deixassem o imóvel, mas que, considerando que ela mesma recebeu notificação de desocupação, presume que o mesmo tenha ocorrido com os demais ocupantes. Relatou que, no exercício de suas funções no restaurante, jamais celebrou contrato escrito com o proprietário do posto, tendo atuado por meio de uma relação informal de parceria. Acrescentou que recebeu notificação extrajudicial de despejo por volta de um ano após ter sido apresentado contrato no âmbito de uma ação trabalhista movida por ex-funcionária, tendo desocupado o imóvel após pedido de prazo para saída. Disse não saber se as melhorias realizadas na residência de Jorge foram feitas por ordem de Pedro ou por iniciativa própria, mas acredita que tenham sido espontâneas, diante da prática comum no local de cada um executar as benfeitorias necessárias. Por fim, afirmou não se recordar de Ricardo Padilha, mas declarou conhecer José Maria Batista, que, segundo ela, atuava como diarista no posto, sem, contudo, associá-lo à função de borracheiro. (Depoimento pessoal da testemunhar IVETE DE ALMEIDA JUBAT) Aramis Alves de França prestou depoimento como testemunha, afirmando conhecer tanto Jorge Pachetti quanto Rita desde a chegada do casal à vizinhança, por volta do ano de 1998. Declarou residir nas proximidades e, por esse motivo, acompanhar a ocupação do imóvel desde o início. Informou que, à época da chegada de Jorge e Rita, a borracharia já existia, enquanto a casa encontrava-se em condições precárias, com estrutura antiga. Esclareceu que Jorge inicialmente trabalhou no posto de combustíveis, não sabendo precisar se desde o início também atuava na borracharia. Afirmou que, desde que o casal passou a residir no local, a área permaneceu continuamente ocupada, não tendo conhecimento de que a casa ou a borracharia tenham ficado desocupadas em algum momento. Disse desconhecer a existência de qualquer contrato de locação ou prestação de serviços entre Jorge e os proprietários do posto. Relatou ter conhecimento de que a residência foi reformada por iniciativa de Jorge, com recursos próprios, tendo inclusive auxiliado pessoalmente em alguns momentos da obra, a título de vizinhança. Afirmou, com convicção, que as reformas não decorreram de ordens do senhor Pedro ou de qualquer outro responsável pelo posto. Disse ter ouvido comentários vagos sobre eventual contestação da posse, mas sem presenciar qualquer fato concreto. Informou ainda que, conforme seu conhecimento, o posto foi posteriormente vendido, sendo atualmente administrado pela empresa Protorque. Por fim, declarou não se recordar de quem ocupava a antiga casa antes da chegada de Jorge e Rita. Afirmou conhecer José Maria Batista, apontando-o como possível borracheiro em época anterior, residente nas imediações, e disse não conhecer Ricardo Padilha. Também não soube indicar se outros funcionários do posto residiram nas casas anexas. (Depoimento da testemunha ARAMIS ALVES DE FRANÇA) João Rabes Rechetgki prestou depoimento como testemunha, informando conhecer tanto Jorge Pachetti e Rita quanto Pedro Olívio Góis, sem, contudo, manter relação de amizade íntima com quaisquer das partes, tratando-se de conhecimento comum da cidade. Afirmou que Jorge trabalhava com o senhor Pedro, tendo inicialmente vínculo empregatício no posto de combustíveis. Disse que, posteriormente, Jorge passou a tocar a borracharia, exercendo as atividades por conta própria. Declarou não ter conhecimento de que o proprietário do posto tenha, em algum momento, tentado impedir Jorge e Rita de residirem ou de exercerem suas atividades no imóvel anexo ao posto. Também não soube afirmar se houve cessão formal do terreno onde se situam a residência e a borracharia. Relatou que conhece o local objeto da ação e que observou reformas realizadas na casa, as quais, segundo seu conhecimento, foram custeadas pelo próprio Jorge. Informou não saber ao certo quando tais reformas ocorreram, mas acredita que tenham sido realizadas há poucos anos. Disse não ter conhecimento de que outros funcionários do senhor Pedro tenham residido nas casas existentes no terreno do posto. Declarou conhecer apenas superficialmente Ricardo Padilha, e que, conforme seu saber, este não residiu no local. Também afirmou conhecer José Maria Batista, conhecido como “alemão”, mas desconhece se este chegou a morar na área. Por fim, negou conhecer pessoa de nome Adenilson que tenha residido no imóvel ou trabalhado no posto. (Depoimento da testemunha JOÃO RABES RECHETGKI) Paulo Roberto Maior prestou depoimento como testemunha, informando que trabalhou para Pedro Olívio Almeida Góis por aproximadamente 30 anos no posto de combustíveis localizado em Piraí do Sul. Declarou que, durante esse período, conviveu profissionalmente com Jorge Pachetti, afirmando que ambos trabalharam juntos no local. Relatou que Jorge e Rita se mudaram para Piraí do Sul por volta de 1997, após Pedro adquirir o posto. Inicialmente, Jorge era empregado do posto, mas posteriormente passou a atuar na borracharia após realizar um acerto com o empregador. Esclareceu que a casa onde passaram a morar já existia no local, tendo sido construída anteriormente para outro funcionário, o senhor Ricardo Padilha, que viera de Cascavel e não permaneceu por muito tempo na função. Afirmou que a casa era destinada aos funcionários do posto e que a construção teria sido feita por determinação de Pedro, utilizando mão de obra de trabalhadores da própria empresa. Informou que havia outra residência no terreno, ocupada, à época, por outro funcionário de nome Alexandre, que também atuava no posto. Confirmou que Jorge e Rita passaram a ocupar a casa após a saída de Ricardo e que Jorge assumiu a borracharia após aprender o ofício com o antigo borracheiro, senhor José Maria Batista, que, segundo relatou, trabalhou por longo período no local, embora não tenha conhecimento de contrato ou pagamento de aluguel por parte dele. Referiu que o imóvel dispunha de um poço antigo, situado próximo à residência de Jorge, embora não soubesse indicar a quem exatamente servia o abastecimento de água, tampouco tenha presenciado qualquer disputa relacionada ao uso do poço. Sobre eventuais reformas na residência ou na borracharia, afirmou não ter conhecimento detalhado, mas acredita que tenham sido feitas melhorias no local durante o período em que ainda trabalhava na empresa. Declarou não saber quem arcava com as despesas relacionadas à residência ou à borracharia e disse desconhecer a existência de contrato de aluguel ou outra formalização entre Jorge e Pedro. Por fim, afirmou não ter presenciado desentendimentos entre Jorge e Pedro acerca da posse do imóvel, tampouco soube informar se havia qualquer contrato escrito entre eles. (Depoimento da testemunha PAULO ROBERTO MAIOR) Valmir Alves Guimarães prestou depoimento como testemunha, informando que trabalhou no posto de combustíveis de propriedade de Pedro Olívio Almeida Góis, em Piraí do Sul, entre os anos de 1997 e 2016. Declarou que Jorge Pachetti e Rita chegaram ao município entre 1997 e 1998, vindos de Ponta Grossa, para trabalhar no mesmo posto. Relatou que Jorge iniciou suas atividades como funcionário do posto e, posteriormente, passou a atuar na borracharia, após deixar suas funções formais. Esclareceu que Jorge passou a residir na casa existente no terreno do posto, que fora inicialmente construída para Ricardo Padilha, também vindo de Ponta Grossa, mas que permaneceu no local por apenas breve período. Informou que a construção da casa foi determinada por Pedro, com fornecimento do terreno e da madeira, e que a obra foi executada por Jorge e por Padilha. Mencionou ainda que havia outra residência no fundo do terreno, na qual residiu o funcionário Adenilson, também com autorização de Pedro. Disse que a borracharia era operada por Jorge após seu desligamento do posto, sendo que este já executava serviços eventuais no local mesmo durante seu contrato de trabalho como frentista. Acrescentou que Jorge havia aprendido o ofício com o borracheiro anterior, José Maria Batista, o qual trabalhou no local por cerca de quatro ou cinco anos. Quanto ao fornecimento de água, informou que havia um poço localizado próximo à residência de Jorge, utilizado por todos que trabalhavam ou frequentavam o posto, inclusive sem registro de qualquer reclamação por parte de Jorge ou de Rita quanto ao seu uso. Disse que Ivete, responsável por restaurante anexo ao posto, desocupou o imóvel de forma amigável quando solicitada, e que não presenciou qualquer desentendimento entre Jorge e Pedro relacionado à posse do imóvel. Também afirmou que, no período em que o posto permaneceu fechado, a borracharia continuou funcionando normalmente. Declarou desconhecer qualquer contrato de locação firmado entre Jorge e Pedro, afirmando que Jorge não pagava aluguel pela moradia ou pela utilização da borracharia. Quanto às reformas realizadas na residência ou na borracharia, disse não ter certeza sobre quem arcou com os custos. Por fim, confirmou que o posto foi vendido à empresa Protorque, embora não soubesse detalhes do contrato de venda. Declarou ainda que nunca presenciou disputas ou reivindicações formais quanto à posse do imóvel objeto da presente ação. (Depoimento da testemunha VALMIR ALVES GUIMARÃES) Fernando Barbosa da Silva prestou depoimento como testemunha, afirmando conhecer tanto Pedro Olívio Almeida Góis quanto Jorge Pachetti e Rita, mantendo com todos relação de conhecimento, sem vínculo de amizade ou inimizade. Declarou que nunca trabalhou no posto, sendo apenas cliente do local, bem como da borracharia operada por Jorge, a quem contratou para execução de serviços em determinado momento. Informou que tem conhecimento da existência de uma residência localizada no pátio do posto, onde moram Jorge e Rita, mas não soube afirmar se há outras casas na área, tampouco se recorda de terem residido ali pessoas como Adenilson ou Ricardo Padilha. Disse lembrar vagamente de José Maria Batista, apontando-o como antigo borracheiro do local. Acrescentou que, desde que passou a frequentar a região, via Jorge no posto e, mais tarde, atuando na borracharia. Confirmou ter observado reformas e melhorias tanto na casa quanto na borracharia, afirmando que essas modificações ocorreram ao longo do tempo, sendo a mais recente há aproximadamente dois a três anos. Ressaltou, contudo, não saber quem custeou ou executou essas obras. Disse não ter presenciado disputas ou desentendimentos relacionados à posse da área em que Jorge reside e atua. Declarou também não ter conhecimento sobre eventual pagamento de aluguel ou qualquer outra forma de contraprestação pelo uso da casa ou da borracharia. (Depoimento da testemunha Fernando Barbosa da Silva) A jurisprudência é pacífica no sentido de que a posse exercida por empregado ou por detentor a título de comodato ou liberalidade não configura posse com animus domini, salvo se comprovada alteração do título possessório, o que não ocorreu no caso em apreço: DIREITO CIVIL E PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. USUCAPIÃO EXTRAORDINÁRIA. IMPROCEDÊNCIA. COMODATO. CESSÃO DO IMÓVEL EM DECORRÊNCIA DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO COM A EX-ESPOSA DO AUTOR. AUSÊNCIA DE “ANIMUS DOMINI”. MERA PERMISSSÃO (ART. 1.208 /CC). AUSÊNCIA DE REQUISITOS LEGAIS (ART. 1 .238/CC (. SENTENÇA MANTIDA. HONORÁRIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. 1. A posse direta exercida por força de comodato concedido à ex-cônjuge do autor, em decorrência de vínculo empregatício mantido com a empresa do proprietário, com intuito de melhor acomodação, por situar-se em local mais próximo do local do trabalho, revela a ausência de “animus domini”, a justificar o reconhecimento da prescrição aquisitiva do imóvel (art. 1 .208 /CC). 2. Apelação Cível à que se nega provimento, majorando-se os honorários de sucumbência (§ 11, art. 85 /CPC/15). (TJ-PR 0003674-68.2013.8.16 .0079 Dois Vizinhos, Relator.: Francisco Carlos Jorge, Data de Julgamento: 01/04/2024, 17ª Câmara Cível, Data de Publicação: 01/04/2024) DIREITO CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. INSURGÊNCIA DA RÉ. EXCEÇÃO DE USUCAPIÃO. COMODATO VERBAL. POSSE PRECÁRIA. AUSÊNCIA DE ANIMUS DOMINI. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou procedente o pedido de reintegração de posse de imóvel urbano. A autora alegou ser meeira/usufrutuária do imóvel e que a requerida, após o término de união estável com seu filho, permaneceu no imóvel sem autorização. A sentença de primeiro grau concedeu a reintegração de posse à autora. 2. A questão em discussão consiste em saber se a posse exercida pela requerida preenche os requisitos da exceção de usucapião. 3. A posse exercida pela apelante é precária, obtida a título de comodato verbal, sem animus domini, impedindo a aquisição da propriedade por exceção de usucapião.3.1. A prova documental e testemunhal demonstrou que a parte apelada e suas filhas mantinham a posse indireta do imóvel. 4. Recurso não provido. Tese de julgamento: "1. A posse exercida a título de comodato verbal é precária e não induz animus domini, impedindo a aquisição da propriedade por usucapião”. Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 561; CC, art. 1.238. Jurisprudência relevante citada: TJSC, Apelação n. 5006476-82.2022.8 .24.0024, Rel.ª Des.ª Rosane Portella Wolff, Segunda Câmara de Direito Civil, j. em 23.1.2025. (TJSC, Apelação n. 0309891-45.2018.8.24 .0018, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel. Erica Lourenco de Lima Ferreira, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 20-02-2025). APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REINTEGRAÇÃO DE POSSE. SENTENÇA DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. REQUISITOS DO ART. 561, DO CPC. ÔNUS DA PROVA QUE INCUMBE AO AUTOR. POSSE ANTERIOR E COMODATO VERBAL E ESBULHO DEMONSTRADOS. REQUERIDA QUE NÃO COMPROVOU A TESE DE QUE RECEBERA O IMÓVEL EM DOAÇÃO AO CASAR-SE COM O FILHO DO AUTOR. ATO DE MERA TOLERÂNCIA QUE NÃO INDUZ A POSSE E AFASTA PRETENSÃO DE INDENIZAÇÃO POR BENFEITORIAS SUPOSTAMENTE REALIZADAS NO IMÓVEL. SENTENÇA MANTIDA. - Depoimento pessoal de ambas as partes que demonstra que o autor não realizou “doação” do imóvel no sentido de transmitir a posse por ele adquirida para o filho e nora, mas tão somente o “deu para morarem”, ou seja, permitiu o uso para moradia daquele novo núcleo familiar, restando configurado o comodato verbal.- No tocante o valor almejado pela indenização por benfeitorias, este deve ser satisfatoriamente identificado pela parte pretendente e comprovada sua vinculação à efetiva destinação na construção ou melhoramento do imóvel, ônus do qual não se desincumbiu a recorrente . Outrossim, tendo a parte mera detenção e não posse é manifesta, de qualquer forma, a impossibilidade de que lhe seja reconhecido direito à retenção ou à indenização. Recurso de apelação não provido. (TJPR - 18ª Câmara Cível - 0007489-31.2019 .8.16.0025 - Araucária - Rel.: DESEMBARGADOR PERICLES BELLUSCI DE BATISTA PEREIRA - J. 19.09.2022) Também convém destacar que o Superior Tribunal de Justiça é firme ao se posicionar no sentido de que a detenção oriunda da mera permissão/tolerância não configura o preenchimento do requisito do animus domini, senão vejamos: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - APELAÇÃO - AÇÃO DE USUCAPIÃO - POSSE PRECÁRIA DO BEM - ANIMUS DOMINI NÃO COMPROVADO - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. 1) O pedido de usucapião, que consiste em forma originária de aquisição de propriedade, deve vir acompanhado dos requisitos legais ensejadores, nos termos previstos no artigo 1.238, do Código Civil, dentre os quais a posse mansa e pacífica; 2) Considerando que o imóvel objeto da ação de usucapião foi cedido pela companhia ré para que o autor, na condição de empregado, ocupasse o bem, e, posteriormente, quando de sua aposentadoria, ele ali permaneceu por ato de mera permissão/tolerância da proprietária, não se configura a posse, mas mera detenção, nos termos do arts. 1.198 e 1.208, do Código Civil, mostrando-se acertada a sentença que concluiu pela improcedência da demanda [...]. (STJ - AREsp: 2012149, Relator.: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Publicação: Data da Publicação DJ 03/03/2022) No presente caso, embora JORGE PASIECZNIK e RITA DE CASSIA LUIZ PASIECZNIK tenham permanecido por longo período no imóvel e realizado benfeitorias, tais circunstâncias não afastam a origem precária da posse. A continuidade da ocupação após o término da relação de trabalho tampouco é suficiente para alterar sua natureza, sobretudo quando inexistem elementos que evidenciem oposição ao domínio dos proprietários ou ruptura explícita do vínculo de dependência. A simples tolerância dos proprietários, aliada à ausência de exigência de desocupação por longo período, não autoriza o reconhecimento da posse ad usucapionem, especialmente quando, como no caso, os próprios interessados admitem que “moravam ali porque trabalhavam para ele [Pedro]”, conforme expressamente afirmado por Jorge em seu depoimento. De igual modo, Jorge afirmou veemente que a construção da residência se deu com materiais fornecidos pelo Sr. Pedro e às suas ordens. Ainda, convém destacar que Jorge afirmou em sede de audiência de instrução de que nunca chegou a pagar qualquer tributo do imóvel (ex. IPTU e Taxa de Lixo). De outro lado, não se vislumbra nos autos qualquer ato inequívoco dos interessados no sentindo de demonstrar animus domini sobre a coisa. Ademais, era ônus probatório destes, nos termos do artigo 373, inciso II do Código de Processo Civil, provar a existência da modificação da posição de mero detentor para posição de possuidor com ânimo de domínio. Desse modo, a pretensão consubstanciada na aquisição da propriedade por meio de usucapião deve ser afastada. De outro lado, no que diz respeito à ação reivindicatória cumpre tecer breves comentários. A reivindicatória é ação real erga omnes para o proprietário fundado no domínio buscar a coisa onde e com quem se encontrar como ensina Arnaldo Rizzardo: “(…) esta é uma ação real, exercitável erga omnes, que objetiva a retomada da coisa de quem quer que injustamente a detenha. (...)”. Segundo é proclamado, “trata-se de ação do proprietário sem posse contra o possuidor não proprietário, ficando a cargo do primeiro a prova do seu domínio e a posse injusta do segundo”. Decorre ela da parte final do art. 1.228 do Código, que assegura ao proprietário o direito de reaver os seus bens de quem injustamente os possua. Funda-se no direito de sequela, armando o titular do domínio de meios para buscar o bem em mãos alheias, retomá-lo do possuidor e recuperá-lo do detentor. Visa o proprietário a restituição da coisa, seja imóvel ou móvel, eis que perdido se encontra o jus possessionis, pedindo que se apanhe e retire a mesma, que se encontra no poder ou na posse de outrem, sem um amparo jurídico. Os requisitos à tutela possessória pela reivindicatória são, portanto, a adequada individualização da coisa, a prova do domínio e da posse injusta pela parte demandada. No caso em tela, a propriedade do imóvel está comprovada pela juntada da matrícula do imóvel nº 343 do CRI Piraí do Sul/PR, onde PEDRO OLIVIO ALMEIDA GOES consta como proprietário do bem. Ademais, restando afastado o animus domini e reconhecida a origem precária da posse, fica evidenciado o esbulho possessório a partir da notificação extrajudicial de 2018, o que justifica o acolhimento da ação reivindicatória, com base no artigo 1.228 do Código Civil: Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. Desse modo, a pretensão dos autores da ação de usucapião deve, portanto, ser julgada improcedente, diante da ausência de animus domini, e a ação reivindicatória deve ser julgada procedente, com a consequente determinação de desocupação do imóvel pelos atuais ocupantes. 2.1 DO ÔNUS SUCUMBENCIAL 2.1.1 PROCESSO Nº 0001556-58.2018.8.16.0135 – AÇÃO DE USUCAPIÃO Condeno os requerentes JORGE PASIECZNIK e RITA DE CÁSSIA LUIZ PASIECZNIK ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios no valor correspondente a 10% (dez por cento) do montante atualizado atribuído à causa, nos termos do art. 85, §2º, do Código de Processo Civil, as quais estão dispensadas ante a concessão do benefício de assistência judiciária. 2.1.2 PROCESSO Nº 0000962-19.2022.8.16.0135 – AÇÃO REIVINDICATÓRIA Condeno os requeridos JORGE PASIECZNIK e RITA DE CÁSSIA LUIZ PASIECZNIK ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios no valor correspondente a 10% (dez por cento) do montante atualizado atribuído à causa, nos termos do art. 85, §2º, do Código de Processo Civil, as quais estão dispensadas ante a concessão do benefício de assistência judiciária. Destaco que, em virtude dos requeridos serem beneficiários de assistência judiciária gratuita em processo conexo e apenso (usucapião), os efeitos se estendem ao processo reivindicatório. Neste sentido: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSOESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. BENEFÍCIO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA CONCEDIDO NA AÇÃO DE CONHECIMENTO. EXTENSÃO. DESERÇÃO AFASTADA. PRECEDENTES DO STJ. 1. Nos termos da jurisprudência deste Superior Tribunal, o benefício da assistência judiciária concedido no processo de conhecimento, nos termos do art. 1.º da Lei n.º 1.060/50, persistirá nos processos de liquidação e de execução, inclusive nos embargos à execução, salvo se revogado expressamente. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ. AgRg no REsp 1427963/ES, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 26/05/2015, DJe 09/06/2015) 3. DISPOSITIVO Diante do exposto, com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado na ação de usucapião extraordinária (autos nº 0001556-58.2018.8.16.0135), por ausência de animus domini, e, por consequência, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na ação reivindicatória (autos nº 0000962-19.2022.8.16.0135), para: a) reconhecer o direito de propriedade de PEDRO OLÍVIO ALMEIDA GOES sobre o imóvel descrito na matrícula nº 343 do Registro de Imóveis de Piraí do Sul/PR; e b) determinar a imissão do autor na posse direta do imóvel e a consequente desocupação voluntária pelos requeridos JORGE PASIECZNIK e RITA DE CÁSSIA LUIZ PASIECZNIK, no prazo de 90 (noventa) dias, contados da intimação pessoal desta sentença, sob pena de execução forçada da ordem judicial, inclusive com requisição de força policial. Custas e honorários sucumbenciais conforme fixado no item anterior. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, certifique-se o trânsito em julgado, façam-se as baixas, anotações e comunicações necessárias e após, arquivem-se. Diligências necessárias. Piraí do Sul/PR (Datado e assinado digitalmente) Sidnei Dal Moro Juiz de Direito
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