Julia Zumerkorn Sadka x Bradesco Saude S A
ID: 257740144
Tribunal: TJRJ
Órgão: 14ª Vara Cível da Comarca da Capital
Classe: AçãO DE EXIGIR CONTAS
Nº Processo: 0904687-50.2024.8.19.0001
Data de Disponibilização:
16/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
REINALDO KLASS
OAB/SP XXXXXX
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GABRIEL GAYOSO E ALMENDRA PRISCO PARAISO
OAB/RJ XXXXXX
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Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Comarca da Capital 14ª Vara Cível da Comarca da Capital Palácio da Justiça, Avenida Erasmo Braga 115, Centro, RIO DE JANEIRO - RJ - CEP: 20020-903 SENTENÇ…
Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Comarca da Capital 14ª Vara Cível da Comarca da Capital Palácio da Justiça, Avenida Erasmo Braga 115, Centro, RIO DE JANEIRO - RJ - CEP: 20020-903 SENTENÇA Processo: 0904687-50.2024.8.19.0001 Classe: AÇÃO DE EXIGIR CONTAS (45) AUTOR: JULIA ZUMERKORN SADKA RÉU: BRADESCO SAUDE S A JULIA ZUMERKORN SADKA propôs Ação de Obrigação de Fazer c/c Pedido de Antecipação de Tutela em face de BRADESCO SEGUROS, nos termos da petição inicial de ID 136575321, que veio acompanhada dos documentos de ID 136581514/136581549. Através da decisão de Id 147255698, foi deferida a antecipação dos efeitos da tutela pleiteada. Citada a parte ré apresentou sua contestação no ID 151673724, instruída pelos documentos de ID 151673730/151673731. RELATADOS. DECIDO. Através da presente ação pretende a parte autora alcançar a indenização pelos danos que lhe foram causados por força de comportamento indevido perpetrado pela parte ré. Segundo exposto na inicial, a autora é usuária do plano de saúde administrado pela empresa ré e sempre honrou com o cumprimento de suas obrigações. Destacou ter sido diagnosticada como portadora de DERMATITE ATÓPICA GRAVE realizando, à época, o tratamento que lhe foi prescrito. Entretanto, diante da tentativa com medicamentos mais comuns optou o médico que a atende pelo tratamento injetável subcutâneo com o medicamento denominado DUPIXENT, sendo inicialmente duas seringas de 300 mg e mais 300 mg a cada duas semanas pelo período de 01 ano. Contudo, para a sua surpresa, a parte ré aprovou o tratamento e realizou reembolso até determinado momento, apenas suspendendo os reembolsos sob o pretexto de demasiada onerosidade em virtude do alto custo do tratamento. Ressaltou, que, após reiterados telefonemas para a ré, inconclusivos aliás, no dia 23 de julho de 2024 a autora, por sua genitora, enviou um email à ré concedendo o prazo de 48 horas para que, em virtude da negativa de reembolso para a clínica que realizava o atendimento, ela indicasse a clínica onde havia a cobertura para a aplicação do medicamento e continuidade do tratamento, mas a ré não respondeu restando interrompido o tratamento. A parte ré, por sua vez, asseverou a ausência de qualquer comportamento indevido, tendo, na realidade, agido respaldada no regular exercício de seu direito. Neste momento, insta tecer certas considerações acerca da responsabilidade civil. Analisando minuciosamente a delicada situação trazida à baila, verifica-se que a mesma representa uma nítida relação de consumo, eis que tanto a parte autora, como a parte ré se caracterizam, respectivamente, como consumidora e fornecedora de serviços, nos termos dos artigos 2º e 3º, parágrafos 1º e 2º, do Código de Defesa do Consumidor, in verbis: “Art. 2º: Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”. “Art. 3º: (...) Parágrafo primeiro–Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial. Parágrafo segundo- Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”. Assim, diante da relação jurídica firmada entre as partes, pode-se afirmar que o réu colocou os seus serviços à disposição da Sociedade, razão pelo qual não pode se colocar à margem do Direito do Consumidor, aplicando-se, em sua plenitude, os ditames de ordem pública consagrados no referido diploma legal. Igualmente importante destacar o teor da Súmula 608, do Colendo Superior Tribunal de Justiça, que assim dispõe: “Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão”. Outra observação a ser efetuada é que se sobressai o fato de que os serviços da parte ré estão no mercado de consumo, encontrando-se regido pelo Código de Defesa do Consumidor, respondendo pelos danos que tais serviços possam ter causado, nos termos do artigo 6º, VI, do referido diploma legal, in verbis: “Art. 6º. São direitos básicos do consumidor: (...) VI- a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos”. Também não se pode deixar de mencionar que se aplica à parte ré a Teoria do Risco do Empreendimento. Assim, todo aquele que se dispõe a exercer alguma atividade no campo de fornecimento de bens e serviços tem o dever de responder pelos fatos e vícios resultantes do empreendimento, independentemente da existência da culpa. Segundo expõe o ilustre Desembargador Sérgio Cavalieri Filho, em sua obra “Programa de Responsabilidade Civil”, 1aEdição – 2aTiragem, Malheiros Editores, “(...) este dever é imanente ao dever de obediência às normas técnicas e de segurança, bem como aos critérios de lealdade, quer perante os bens e serviços ofertados, quer perante os destinatários dessas ofertas. A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar a atividade de (...) executar determinados serviços” (p. 318). Por derradeiro, a parte ré, na qualidade de prestadora de serviços, se obriga a prestá-los de forma adequada e eficiente, de sorte a não causar nenhum tipo de dano ao consumidor, sob pena de ser responsabilizada por eventuais prejuízos causados ao mesmo. Ainda incidem no vertente caso os ditames do artigo 14, do Código de Defesa do Consumidor, impondo à parte ré a responsabilidade de natureza objetiva, onde não se discute a culpa. Por via de consequência, a sua responsabilidade somente pode ser afastada diante de hipóteses que excluam o nexo causal, hipóteses estas que se encontram disciplinadas no parágrafo terceiro do mesmo dispositivo legal citado. Desta forma, para que surja tal responsabilidade da parte ré, basta que se demonstre, de forma cabal e induvidosa, a existência do dano, bem como o nexo causal. O primeiro elemento acima identificado, qual seja, o dano, pode ser conceituado como sendo a subtração ou diminuição de um bem jurídico tutelado, qualquer que seja a sua natureza, quer se trate de um bem patrimonial ou integrante da própria personalidade da vítima. Sem tal elemento não há de se falar em indenização ou ressarcimento. Daí se conclui que o dano é o elemento preponderante da responsabilidade civil. O último elemento, também importante para gerar a responsabilidade civil, é o nexo causal, vale dizer, a relação de causa e efeito entre o comportamento culposo e o dano. Assim, chega-se à inarredável conclusão de que o dano deve ser consequência direta e imediata do ato culposo que lhe deu causa. O intuito do legislador, ao consagrar a responsabilidade objetiva se deu diante da notória hipossuficiência do consumidor, parte mais fraca na relação de consumo e diante do fato de que, dentre seus direitos fundamentais, consagrados no Código Protetivo, se encontra o de facilitar o seu acesso aos meios de defesa. Também há de se destacar a aplicação, ao vertente caso, das normas contidas nos artigos 47 e 54, parágrafos terceiro e quarto, do diploma legal acima mencionado, in verbis: “Art. 47 – As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor”. “Art. 54(...). Parágrafo 3o– Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, de modo a facilitar a sua compreensão pelo consumidor. Parágrafo 4o– As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão”. Justifica-se tal preocupação, pois, conforme é de sabença trivial, o contrato de adesão se caracteriza como sendo um contrato-padrão, já impresso, onde as suas cláusulas são estipuladas unilateralmente, vale dizer, por uma das partes contratantes, e submetidas à aceitação da outra parte que, tendo necessidade de contratar, firma o pacto sem dispensar maiores atenções para as disposições contratuais. Ao mesmo tempo, o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 54, caput, definiu o contrato de adesão como sendo “(...) aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente o seu conteúdo”. Comentando o dispositivo legal em foco, a respeitável Ada Pellegrini Grinover, em sua obra “Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do Anteprojeto”, expõe a sua preocupação no que tange aos contratos de adesão, esclarecendo que “(...) o Código consagrou o princípio da legalidade das cláusulas contratuais. O dispositivo visa a permitir que o consumidor possa tomar conhecimento do conteúdo do contrato pela simples leitura, sem prejuízo do dever de esclarecimento por parte do fornecedor. (...) A redação em caracteres legíveis possibilita diminuir o âmbito de controle das cláusulas contratuais gerais, qualitativa e quantitativamente, além de consistir em instrumento de segurança das seguranças jurídicas e de liberdade contratual (...)” (p. 553). Ao citar comentários acerca do disposto no artigo 54, parágrafo quarto, a ilustre Ada Pellegrini Grinover expõe que “(...) toda estipulação que implicar qualquer limitação de direito do consumidor, bem como a que indicar desvantagem ao aderente, deverá vir simplesmente exposta, do ponto de vista físico, no contrato de adesão. (...) Deverá chamar a atenção do consumidor para as estipulações desvantajosas para ele, em nome da boa-fé que deve presidir as relações de consumo (...)” (p. 554). Pode-se, portanto, afirmar que a empresa ré está obrigada ao cumprimento de uma boa-fé qualificada, ou seja, uma boa-fé que pressupõe os deveres de informação, cooperação e cuidado com o consumidor. Levando-se, ainda, em conta a finalidade do contrato em foco, que visa, precipuamente, assegurar ao consumidor e seus dependentes contra os riscos relacionados com a saúde e a manutenção da vida, conclui-se que a sua característica principal é o fato de envolver serviços (de prestação médica ou de seguro) de trato sucessivo, ou seja, contratos de fazer, de longa duração, e que possuem uma grande importância social e individual. Trata-se, portanto, de serviços que prometem segurança e qualidade, serviços cuja prestação se protrai no tempo, de trato sucessivo, com uma fase de execução contratual longa e descontínua, de fazer e não fazer, de informar e não prejudicar, de prometer e cumprir, de manter sempre o vínculo contratual e o usuário cativo. Voltando ao caso concreto, constata-se, através da documentação que instruiu a inicial, que a parte autora é usuária do plano de saúde administrado pela empresa ré, inexistindo qualquer débito pendente. Igualmente constatado, através do laudo médico (ID 136581543), ser a autora portadora de DERMATITE ATÓPICA GRAVE, prescrevendo o tratamento, em caráter de urgência, com DUPIXENT. É certo que a parte ré, quando de sua contestação, asseverou que a recusa restou legítima, tendo, na realidade, agido respaldada no regular exercício de seu direito. Valendo-se de suas exatas palavras, vertidas quando de sua contestação (ID 151673724), “(...) a apólice em questão é anterior à Lei 9.656/98 e não foi adaptada às suas disposições, não estando, portanto, vinculada ao Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS, o qual inclui, como cobertura obrigatória pelas operadoras/seguradoras de saúde, a terapia medicamentosa oral domiciliar para pacientes com diagnóstico de câncer e a terapia imunobiológica, conforme as Diretrizes de Utilização. (...)”. Entretanto, esta magistrada não compactua com tal entendimento, notadamente se for levado em consideração que não cabe ao réu imiscuir-se nesta seara (principalmente se for levada em consideração a ampla cobertura do plano de saúde em questão e o cumprimento, por parte da autora, de suas obrigações contratuais). Inclusive, aplica-se ao vertente caso o teor da súmula 211, do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que assim determina: “Havendo divergência entre o seguro saúde contratado e o profissional responsável pelo procedimento cirúrgico, quanto à técnica e ao material a serem empregados, a escolha cabe ao médico incumbido de sua realização”. Note-se que, não obstante a justificativa da solicitação e a necessidade do uso do medicamento em questão, a parte ré não forneceu a almejada autorização. Tanto que a parte autora necessitou ajuizar a presente ação para fazer valer o seu direito. Assim, pelo que se depreende do conjunto probatório carreado aos autos, restou evidenciada e comprovada a falha em que incorreu a parte ré, deixando o consumidor ao desamparo quando mais necessitou do plano de saúde por ele contratado e num delicado momento de sua vida. Inclusive, no entender desta julgadora, prever a cobertura de uma determinada moléstia e não garantir os exames necessários e o tratamento indispensável ao seu controle ou à melhoria de vida do paciente significa, na verdade, não fornecê-lo. Isto porque, todos os procedimentos, exames, terapias e medicamentos necessários ao êxito do tratamento devem ser disponibilizados ao contratante, sem qualquer restrição, sob pena de se frustrar o objeto do contrato. Ademais, conforme já ressaltado, o direito à vida e a manutenção da saúde são absolutos, que devem prevalecer sobre estipulações contratuais que limitam a sua abrangência, tornando-se abusivas as cláusulas contratuais, ainda que inseridas com destaque no contrato, que causem manifesta desvantagem ao usuário. Importante trazer a lume o teor da Súmula 340, do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, in verbis: “Ainda que admitida a possibilidade de o contrato de plano de saúde conter cláusulas limitativas dos direitos do consumidor, revela-se abusiva a que exclui o custeio dos meios e materiais necessários ao melhor desempenho do tratamento da doença coberta pelo plano”. Há de se destacar que, mesmo que o medicamento indicado não esteja arrolado no rol das diretrizes de utilização estabelecido pela ANS, não se justifica a conduta perpetrada pela empresa ré. Não se pode deixar de repetir que o direito à vida e a manutenção da saúde são absolutos, devendo prevalecer sobre estipulações contratuais que limitam a sua abrangência, tornando-se abusivas as cláusulas contratuais, ainda que inseridas com destaque no contrato, que causem manifesta desvantagem ao usuário, notadamente diante da gravidade do estado de saúde do autor e a necessidade da utilização do medicamento em questão muito bem destacada pelo próprio médico responsável pelo seu tratamento. Neste diapasão, aplicando-se os princípios citados no início deste trabalho, não se justifica, e tampouco encontra amparo legal, o comportamento do réu. Conferindo legalidade ao seu comportamento, estar-se-ia admitindo que a parte autora permanecesse ao desamparo, no momento em que, efetivamente, necessitou da prestação dos serviços que buscou contratar. Em situações bastante semelhantes à ora estudada, assim já se manifestou a jurisprudência pátria: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZATÓRIA. PLANO DE AUTOGESTÃO DE SAÚDE. CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASIL. RECUSA DA OPERADORA RÉ EM FORNECER A MEDICAÇÃO PRESCRITA PELO MÉDICO ASSISTENTE (ABRAXANE). SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA RÉ. DEMANDANTE DIAGNOSTICADO COM CÂNCER NO PÂNCREAS. LAUDO MÉDICO DEMONSTRANDO A NECESSIDADE DO AUTOR SE SUBMETER AO TRATAMENTO INDICADO COM USO DO MEDICAMENTO PRESCRITO. RECUSA QUE SE REVELA INDEVIDA. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO FIXADO EM R$ 10.000,00 (DEZ MIL REAIS) QUE SE MANTÉM, EIS QUE OBSERVADOS OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO” (TJRJ, Apelação Cível n. 0806027-55.2023.8.19.000, Décima Quarta Câmara de Direito Privado, Relator: Desembargador LUIZ EDUARDO CAVALCANTI CANABARRO). “APELAÇÃO. PLANO DE SAÚDE. PRELIMINAR. ILEGITIMIDADE PASSIVA. REJEIÇÃO. DIREITO PATRIMONIAL TRANSMISSÍVEL. MÉRITO. RECUSA NA AUTORIZAÇÃO DE TRATAMENTO. MEDICAMENTO ANTINEOPLÁSICO ORAL. ABUSIVIDADE CONFIGURADA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DANO MORAL. QUANTUM DEBEATUR. MANUTENÇÃO. 1. Inicialmente, rejeita-se a preliminar de ilegitimidade ativa da herdeira, lastreada na tese de que, em razão do falecimento da autora originária, “não tem legitimidade para buscar a reparação moral, haja vista, seu caráter subjetivo e que nunca poderia ser transferido ativamente a terceiros”. 2. Isso porque há muito se encontra sedimentado pelo Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que há legitimidade dos herdeiros para prosseguir na ação indenizatória por danos morais e materiais no caso de óbito do autor, considerando-se tratar-se de direito patrimonial, transmissível a estes. 3. É dizer, não obstante o caráter personalíssimo do fornecimento do medicamento pleiteado, tendo o óbito da paciente ocorrido durante o curso do processo, o conteúdo econômico da compensação indenizatória transmite-se aos seus sucessores 4. Ultrapassado este ponto, a relação travada entre as partes é de consumo, de maneira que as normas entabuladas no Código de Defesa do Consumidor lhes são aplicadas. Nessa linha, é direito do consumidor a adequada e efetiva prestação de serviços pelo fornecedor, com observância, principalmente, dos postulados da boa-fé objetiva e seus deveres anexos. 5. O dever de informação, nesse contexto, deve ser respeitado pelo fornecedor ao prestar seus serviços. No caso em tela, afirmou a autora originária ter sido portadora de adenocarcinoma pulmonar, com múltiplas comorbidades, sendo-lhe prescrito tratamento com o medicamento SOTORASIBE 960mg. 6. A pretensão da paciente encontra suporte nos princípios da dignidade da pessoa humana e boa-fé objetiva. E assim o é porque o princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1º, inciso, III, da Constituição da República, além de trazer o ser humano para o centro das relações jurídicas, irradia seus efeitos para todo ordenamento jurídico, inclusive para que se interpretem as diferentes relações contratuais, sendo que ao ponderarem-se os direitos existenciais da autora e os patrimoniais da ré, a proteção dos primeiros deve prevalecer. 7. Não se pode negar ao usuário do Plano de Saúde o direito de realizar o tratamento necessário ao restabelecimento de sua saúde da melhor maneira possível, sob pena de violação aos princípios da boa-fé objetiva e da função social que devem nortear as relações contratuais. 8. Neste caso são fatos incontroversos a recusa da ré em fornecer o medicamento prescrito pelo médico assistente e a necessidade e urgência diante do quadro clínico apontado. 9. Não se olvide que o rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde atém-se a estipular patamar mínimo de cobertura, não cabendo à seguradora ré impor aos usuários dos serviços contratados limitações dos serviços necessários ao restabelecimento ou até mesmo à preservação da saúde, não se havendo sequer de falar em desequilíbrio financeiro e contratual. Precedentes. 10. A interpretação contratual em análise, feita em consonância com os dispositivos legais aplicáveis, encontra respaldo na observância da finalidade da avença de plano ou seguro saúde, assentada no binômio do efetivo atendimento às necessidades da paciente e preservação de sua saúde e vida com a gestão equilibrada dos custos incorridos, e no respeito aos princípios de boa-fé objetiva e probidade na formação e execução dos contratos, dentro da legítima expectativa refletida ao consumidor ao celebrar o ajuste. 11. Nada obstante, foi recentemente sancionada pela Presidência da República a Lei n.º 14.454/22, que estabelece critérios para permitir a cobertura de exames ou tratamentos de saúde não incluídos no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). 12. Assim sendo, de lege lata há permissivo legal para que se excepcione o rol da Agência Nacional de Saúde sempre que comprovada cientificamente a eficácia do tratamento prescrito, tal como corrente na hipótese sub examine, ante ao já articulado acerca do benefício do medicamento indicado para a saúde da paciente e ao teor do laudo médico aportado, com câncer de pulmão em grau avançado. 13. Além disso, a operadora não produziu qualquer prova destinada a demonstrar a ineficácia do fármaco, que possui registro na ANVISA, como comprovado no ID 40378330, nem indicou alternativa terapêutica para o quadro da paciente. 14. Em complemento, ressalte-se que o Tribunal da Cidadania possui firme entendimento no sentido de ser abusiva a negativa de cobertura, por parte da operadora, de antineoplásicos orais. Precedente. 15. Em suma, assiste à paciente associada o direito potestativo (e subjetivo) à cobertura dos tratamentos quando presente manifestação de médico especialista que lhe assiste, expressando a necessidade de tratamento indicado, o que não pode ser afastado em razão de o fármaco solicitado não estar de acordo com as diretrizes de utilização da ANS, até mesmo porque a agência reguladora instituiu essa lista de medicamentos por força de uma norma editada por ela mesma, mas nenhuma norma de um órgão de caráter administrativo pode limitar ou ampliar o alcance de uma lei. 16. Dano moral in re ipsa. Quantum debeatur mantido em R$ 10.000,00 (dez mil reais) em observância ao princípio da razoabilidade e as circunstâncias do caso concreto que deve ser mantido. 17. Por fim, o art. 85, § 11, do Código de Processo Civil, dispõe que o Tribunal, ao julgar o recurso interposto, majorará os honorários fixados anteriormente. 18. Recurso não provido (TJRJ, Apelação Cível n. 0873621-23.2022.8.19.0001, Décima Segunda Câmara de Direito Privado, Relator: Desembargador JOSÉ CARLOS PAES). “DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. SAÚDE SUPLEMENTAR. PLANO DE SAÚDE. AUTORA DIAGNOSTICADA COM ADENOCARCINOMA DE PULMÃO, NECESSITANDO DE APLICAÇÃO DO MEDICAMENTO EPREX (ALFAEPOETINA) 40.000U SC, UMA VEZ POR SEMANA, ANTES DO INÍCIO DA QUIMIOTERAPIA. RECUSA DA RÉ. PRETENSÃO CONDENATÓRIA EM OBRIGAÇÃO DE FAZER, CUMULADA COM COMPENSATÓRIA POR DANOS MORAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. APELAÇÃO CÍVEL INTERPOSTA PELA PARTE RÉ, VISANDO À REFORMA INTEGRAL DO JULGADO. 1) DEMANDA DEVOLVIDA A JULGAMENTO 1.1) Parte Autora que afirma necessitar fazer uso do medicamento EPREX (Alfaepoetina) 40.000U SC, uma vez por semana, por 04 semanas inicialmente, em virtude de ter sido diagnosticada com adenocarcinoma de pulmão, sendo a droga indispensável para o início do tratamento de quimioterapia. 1.2) Cinge-se a controvérsia em identificar se fora legítima a recusa administrativa da Ré em fornecer o medicamento requerido, em razão de não restarem atendidas as diretrizes de utilização previstas no rol de procedimentos e eventos em saúde da ANS. 2) APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR Hipótese subsumida ao campo de incidência principiológiconormativo do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, vez que presentes os elementos da relação jurídica de consumo. 3) DIREITO À SAÚDE 3.1) Vida, saúde e segurança são bens jurídicos inalienáveis e indissociáveis do princípio universal maior da intangibilidade da dignidade da pessoa humana, não se desconhecendo tratar-se o direito à saúde de um direito fundamental (Declaração Universal dos Direitos Humanos/ONU 1948 –art. 25 e Constituição da República, artigo 6º). 3.2) Acrescente-se a isso o fato de que quem contrata um plano de assistência à saúde paga determinados valores por sua tranquilidade e garantia. A operadora de planos de saúde assume, desse modo, as consequências econômicas de sinistros contratualmente previstos, ou cuja cobertura seja imposta por lei. 4) FORNECIMENTO DE ANTINEOPLÁSICOS ORAIS E CORRELACIONADOS 3.1) E. Superior Tribunal de Justiça que possui jurisprudência pacífica no sentido de que as operadoras de plano de saúde possuem o dever de cobertura de fármacos antineoplásicos orais, bem assim de medicamentos correlacionados, para tratamento domiciliar. 3.2) Discussão acerca da natureza taxativa ou exemplicativa do rol que se mostra irrelevante, ante a obrigatoriedade de custeio de medicamentos para o tratamento de câncer, em relação aos quais há apenas uma diretriz na resolução da ANS. Precedente. 4) CASO CONCRETO 4.1) Laudo médico de indexador 48898266 por meio do qual resta demonstrado o diagnóstico de neoplasia maligna dos brônquios e dos pulmões (CID C34), bem assim a prescrição, realizada pelo médico assistente da Autora, do tratamento com o medicamento EPREX (alfaepoetina) 40.000U SC, uma vez por semana, por 04 semanas, inicialmente. 4.2) Recusa da Ré no fornecimento, incontroversa, que se mostra abusiva, eis que o medicamento EPREX (Alfaepoetina), com registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA, sob o nº 112363337, se consubstancia em espécie de droga indicada no tratamento de anemia associada ao câncer não mieloide, devendo ser obrigatoriamente fornecido pelas operadoras de planos de saúde, eis que se trata de fármaco correlacionado a antineoplásico. 5. DANO MORAL 5.1) Inegável o abalo à integridade psíquica da Autora, porquanto é evidente o dano moral sofrido por aquele que, em momento delicado de necessidade, tem o atendimento recusado pelo plano de saúde. Inteligência do verbete da Súmula nº 339, desta e. Corte. 5.2) Verba compensatória dos danos morais (R$ 10.000,00), adequada aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, levando-se em conta as particularidades do caso concreto, sem olvidar a natureza punitivo-pedagógica da condenação. Precedentes. Incidência do verbete sumular nº 343, da súmula deste e. Tribunal de Justiça. 6. Pequena reforma merece a r. sentença, de ofício, tão somente, para retificar os honorários advocatícios, que passam a ser arbitrados em 10% sobre o valor da condenação. Inteligência do artigo 85, § 2º, do CPC. 7. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO, na forma do art 932, IV, “a”, do CPC” (TJRJ, Apelação Cível n. 0005247-98.2021.8.19.0202, Décima Nona Câmara de Direito Privado, Relator: Desembargador WERSON RÊGO). Portanto, conforme exposto linhas atrás, cumpre ao médico que assiste o paciente avaliar a necessidade da realização de determinado tratamento, ponderando o mais adequado e sua eficácia, não sendo tarefa das operadoras de planos de saúde ou ao Poder Judiciário desaconselhar a especificação da prescrição. Desta feita, a negativa de autorização de medicamento necessário à evolução clínica e saúde da autora caracteriza-se a um só tempo conduta ilícita e contrária à boa-fé contratual, na medida em que resta descumprido o objeto essencial do contrato, diante da inequívoca necessidade para a qualidade da vida da autora que padece de doença crônica. De se ressaltar que o contrato deve se ajustar aos avanços da medicina, cabendo ao profissional da área, a indicação do tratamento adequado ao seu paciente, não se admitindo interferência da seguradora para este fim, sob pena de violar o próprio objeto contratado, qual seja, a proteção da vida e da saúde do beneficiário. Ora, se o contrato não exclui a cobertura da moléstia que acometeu a autora, sendo de rigor a cobertura do tratamento indicado, não se reputa plausível a negativa, sob pena de torná-lo ineficaz ao seu objetivo. Repita-se que cabe ao médico prescrever o tratamento mais adequado a cada paciente, tomando em consideração a maior ou menor extensão da doença, bem como a gravidade ou não do quadro clínico apresentado e as demais circunstâncias capazes de influenciar na recuperação da saúde. Por conseguinte, a operadora de plano de saúde não pode se imiscuir na esfera de atuação, que é própria do médico que assiste o doente, pois é ele quem conhece sua patologia e a real necessidade de realizar o tratamento. Portanto, repita-se: aalegação da parte ré de que a negativa foi válida porque o medicamento prescrito não está explicitado no rol das Diretrizes da ANS, não merece prosperar. Há de se acrescentar que o rol da ANS se constitui em mero parâmetro de análise, vez que sempre é atualizado com o escopo de acompanhar os avanços da Medicina e as recentes modalidades de tratamento. Inclusive, a questão foi apreciada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, no âmbito dos EResp nº. 1.886.929/SP e EResp nº. 1.889.704/SP, no sentido de rol da ANS ser de taxatividade mitigada, conforme a seguir exposto: “1 - o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar é, em regra, taxativo; 2 - a operadora de plano ou seguro de saúde não é obrigada a arcar com tratamento não constante do Rol da ANS se existe, para a cura do paciente, outro procedimento eficaz, efetivo e seguro já incorporado ao Rol; 3 - é possível a contratação de cobertura ampliada ou a negociação de aditivo contratual para a cobertura de procedimento extra Rol; 4 - não havendo substituto terapêutico ou esgotados os procedimentos do Rol da ANS, pode haver, a título excepcional, a cobertura do tratamento indicado pelo médico ou odontólogo assistente, desde que (i) não tenha sido indeferido expressamente, pela ANS, a incorporação do procedimento ao Rol da Saúde Suplementar; (ii) haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências; (iii) haja recomendações de órgãos técnicos de renome nacionais (como CONITEC e NATJUS) e estrangeiros; e (iv) seja realizado, quando possível, o diálogo interinstitucional do magistrado com entes ou pessoas com expertise técnica na área da saúde, incluída a Comissão de Atualização do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar, sem deslocamento da competência do julgamento do feito para a Justiça Federal, ante a ilegitimidade passiva ad causam da ANS”. Assentou o Colendo Superior Tribunal de Justiça que o rol da ANS é, via de regra, taxativo, podendo, todavia, ser determinada a cobertura obrigatória de tratamento não incorporado se superadas todas as alternativas constantes do rol, sem sucesso, desde que a medida não tenha sido expressamente excluída pela ANS e com comprovação científica de eficácia comprovada. Ademais, foi editada a Lei nº. 14.454/2022, que alterou a Lei nº. 9.656/98 exatamente para enfrentar a discussão do rol taxativo da ANS, sendo determinada a obrigação de cobertura de medida não prevista no rol desde que prescrita pelo médico assistente, e que exista comprovação de eficácia ou recomendação de órgão de renome internacional. Eis o teor do art. 10, parágrafo décimo terceiro, da Lei nº. 9.656/98, com redação dada pela Lei nº. 14.454/2022: “Art. 10: (...) Parágrafo décimo terceiro: Em caso de tratamento ou procedimento prescrito por médico ou odontólogo assistente que não estejam previstos no rol referido no § 12 deste artigo, a cobertura deverá ser autorizada pela operadora de planos de assistência à saúde, desde que: I- exista comprovação da eficácia, à luz das ciências da saúde, baseada em evidências científicas e plano terapêutico; ou II- existam recomendações pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (Conitec), ou exista recomendação de, no mínimo, 1 (um) órgão de avaliação de tecnologias em saúde que tenha renome internacional, desde que sejam aprovadas também para seus nacionais”. Na hipótese em tela, conforme mencionado ao longo deste trabalho, o laudo médico (ID 13658143) bem demonstrou ser a autora portadora de DERMATITE ATÓPICA GRAVE, apresentando-se imprescindível o medicamento DUPIXENT para o controle da doença e prevenir a sua evolução, notadamente diante da ineficácia dos tratamentos antes realizados. Portanto, não se justifica a conduta perpetrada pela empresa ré. Imperioso concluir que há dever de cobertura pela ré para o tratamento da autora com o medicamento DUPIXENT, a uma, porque a doença não está excluída no contrato; a duas, porque o tratamento foi prescrito por seu médico assistente; a três, porque se trata de medicamento indicado para o tratamento de dermatite atópica grave. Em situações semelhantes à ora estudada, vale a pena trazer à lume os seguintes julgados: “APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA – INSURGÊNCIA DAS PARTES REQUERIDAS. CONTRARRAZÕES – PRELIMINAR DE MÉRITO – OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – NÃO OCORRÊNCIA – RECURSOS VOLTADOS CONTRA OS FUNDAMENTOS COLIGIDOS NA SENTENÇA – PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO CÍVEL 1 – INSURGÊNCIA DA RÉ UNIMEDO-RIO COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO LTDA. PRELIMINAR DE MÉRITO – IMPROCEDÊNCIA LIMINAR DO PEDIDO INICIAL – ALEGAÇÃO NO SENTIDO DE QUE O MEDICAMENTO DENOMINADO BELIMUMABE - BENLYSTA NÃO CONSTA NO ROL DA AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR (ANS) – ROL DA ANS QUE TEM CARÁTER EXEMPLIFICATIVO – PRELIMINAR REJEITADA. PRELIMINAR DE MÉRITO – REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA – ALEGAÇÃO NO SENTIDO DE QUE A PARTE AUTORA NÃO DEMONSTROU A INSUFICIÊNCIA DE RECURSOS FINANCEIROS E CONTRATOU PLANO DE SAÚDE PARTICULAR – INSUFICIÊNCIA DE RECURSOS EVIDENCIADA – CONTRATAÇÃO DE PLANO DE SAÚDE PARTICULAR QUE, DE PER SE, NÃO IMPEDE A CONCESSÃO DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA – PRELIMINAR REJEITADA. OBRIGAÇÃO DE FAZER – FORNECIMENTO DO MEDICAMENTO DENOMINADO BELIMUMABE - BENLYSTA – PEDIDO NO SENTIDO DE QUE SEJA AFASTADA A CONDENAÇÃO EM OBRIGAÇÃO DE FAZER – NÃO ACOLHIMENTO – MEDICAMENTO QUE DEVE SER ADMINISTRADO POR PROFISSIONAL HABILITADO – ROL DA ANS QUE TEM CARÁTER MERAMENTE EXEMPLIFICATIVO – LIMITAÇÃO DO RISCO QUE FERE O PRINCÍPIO DA BOA-FÉ, EQUIDADE E RAZOABILIDADE – DETERMINAÇÃO, EX OFFICIO, PARA QUE SEJAM APRESENTADOS RELATÓRIOS MÉDICOS SEMESTRAIS, OS QUAIS DEMONSTREM A NECESSIDADE DE CONTINUIDADE DO TRATAMENTO – ENUNCIADO Nº 2 DA JORNADA DE DIREITO DA SAÚDE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA – OBRIGAÇÃO DE FAZER MANTIDA. DANOS MORAIS – INDENIZAÇÃO FIXADA EM R$ 10.000,00 – PEDIDO NO SENTIDO DE QUE SEJA AFASTADA A CONDENAÇÃO – ACOLHIMENTO – RECUSA ADMINISTRATIVA DA OPERADORA INSUFICIENTE PARA GERAR ABALO PSICOLÓGICO – PRECEDENTES DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA E DESTA CORTE – BENEFICIÁRIA DE PLANO DE SAÚDE QUE NÃO COMPROVA O AGRAVAMENTO DO SEU ESTADO DE SAÚDE, OU OUTRA CONSEQUÊNCIA – DEVER DE INDENIZAR NÃO RECONHECIDO. RECURSO DE APELAÇÃO 1 CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. APELAÇÃO CÍVEL 2 – INSURGÊNCIA DA RÉ UNIMED CURITIBA - SOCIEDADE COOPERATIVA DE MÉDICOS. PRELIMINAR DE MÉRITO – ILEGITIMIDADE PASSIVA – ALEGAÇÃO NO SENTIDO DE QUE A AUTORA É BENEFICIÁRIA DA OPERADORA UNIMED-RIO E DE QUE AS OPERADORAS DESIGNADAS PELA UNIMED NÃO TÊM RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE SI – OPERADORAS PERTENCENTES AO MESMO GRUPO ECONÔMICO – OBSERVÂNCIA DA TEORIA DA APARÊNCIA – PRELIMINAR REJEITADA. MÉRITO – PEDIDO DE AFASTAMENTO DA CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – QUESTÃO APRECIADA NO RECURSO DE APELAÇÃO 1, INTERPOSTO PELA UNIMED-RIO COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO LTDA. – ANÁLISE PREJUDICADA – NÃO CONHECIMENTO.RECURSO DE APELAÇÃO 2 CONHECIDO EM PARTE E, NA PARTE CONHECIDA, NÃO PROVIDO. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA – CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS AFASTADA – REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS SUCUMBNECIAL EM RAZÃO DA SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA ENTRE AS PARTES” (TJPR, Apelação Cível n. 0002079- 73.2020.8.16.0019, Nona Câmara Cível, Relator: Desembargador GIL FRANCISCO DE PAULA XAVIER FERNANDES GUERRA). “AGRAVO DE INSTRUMENTO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. Decisão que deferiu antecipação de tutela para compelir a operadora de saúde a fornecer o medicamento Belimumabe 400mg para tratamento de Lúpus Eritematoso Sistêmico. Insurgência da requerida. Direito à saúde assegurado pela Constituição Federal. Aplicação ao caso da legislação consumerista. Inteligência da Súmula nº 608 do E. STJ. Agravada em tratamento de doença autoimune, degenerativa, em franco progresso, não combatida com uso dos medicamentos convencionais, conforme relatório acostado aos autos originários. Inteligência das Súmulas n° 102 e 95 deste Egrégio TJSP, bem como do art. 35-F da Lei nº 9.656/98. Perigo da demora configurado ante o iminente risco de agravamento do quadro da paciente. Preenchidos os requisitos previstos no art. 300 do CPC. Precedentes. Decisão mantida. RECURSO DESPROVIDO” (TJSP, Agravo de Instrumento n. 2004106-97.2025.8.26.0000, Décima Câmara de Direito Privado, Relator: Desembargador COELHO MENDES). “Apelação. Ação de obrigação de fazer c.c. indenização por danos morais. Pretensão de fornecimento de medicamento “belimumabe” para tratamento de “Lupus Eritematoso Sistêmico”. Sentença de parcial procedência. Recurso da requerida. Negativa baseada na alegação de que o tratamento não se encontra previsto nas diretrizes do rol da ANS. Abusividade à luz da legislação consumerista reconhecida. Existência de indicação expressa e fundamentada do médico. Medicamento registrado na Anvisa. Inteligência da Súmula 102 deste Tribunal. Uso domiciliar que não afasta a obrigatoriedade do fornecimento do medicamento, uma vez que sua utilização é feita sob orientação médica que, necessariamente, receitará e acompanhará os resultados do tratamento, sendo que tal procedimento apresenta um custo menor para a seguradora, que não dispenderá gastos com a internação. Precedentes desta Câmara. Manutenção da condenação da ré no pagamento de indenização por morais, uma vez que, conforme já decidido pelo C. STJ, a negativa ilegítima e abusiva de procedimento médico por parte da operadora de plano de saúde causa dano moral ao segurado, pois lesionao no direito da personalidade, relacionado à integridade psíquica, extrapolando o plano do chamado “mero dissabor”. Quantum indenizatório fixado com razoabilidade. Recurso não provido” (TJSP, Apelação Cível n. 1007617-78.2023.8.26.0554, Quinta Câmara de Direito Privado, Relator: Desembargador EMERSON SUMARIVA JÚNIOR). Não se pode deixar de repetir que o direito à vida e a manutenção da saúde são absolutos, devendo prevalecer sobre estipulações contratuais que limitam a sua abrangência, tornando-se abusivas as cláusulas contratuais, ainda que inseridas com destaque no contrato, que causem manifesta desvantagem ao usuário, notadamente diante da gravidade do estado de saúde do autor e a necessidade da utilização do medicamento em questão muito bem destacada pelo próprio médico responsável pelo seu tratamento. Neste diapasão, aplicando-se os princípios citados no início deste trabalho, não se justifica, e tampouco encontra amparo legal, o comportamento do réu. Conferindo legalidade ao seu comportamento, estar-se-ia admitindo que a parte autora permanecesse ao desamparo, quando, efetivamente, necessitou da prestação dos serviços que buscou contratar. A exclusão de tratamento essencial à saúde, seja por cláusula limitativa ou não, nada mais representa do que uma velada forma de incumprimento contratual, tendo restado evidente o abalo à dignidade da autora, uma vez que a conduta da parte ré impôs angústia, desamparo e ansiedade, gerando o dano moral indenizável. Valendo-se das sábias lições do ilustre e culto Desembargador Sérgio Cavalieri Filho, em sua obra “Programa de Responsabilidade Civil”, 1aEdição – 2aTiragem, Editora Malheiros, “(...) só pode ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar (...)” (p. 76). Ora, de acordo com a narrativa da parte autora, somada à prova carreada aos autos, salta aos olhos o abalo psicológico ao qual o ilustre Desembargador fez menção em sua notável obra, abalo este, conforme já mencionado ao longo deste trabalho, se presume diante da própria situação descrita. É certo que a jurisprudência vem se filiando no sentido de que o simples inadimplemento contratual não dá ensejo a indenização por danos morais; contudo, abre-se uma exceção para o caso em que o referido inadimplemento resultar violação ou agravamento da interferência indevida na esfera da intimidade, da honra, da vida privada e da imagem da vítima. Realmente, é desesperador quando, no momento em que mais se precisa de um plano de saúde, o qual se filiou depositando confiança e esperando segurança, seja, o consumidor, frustrado em tal expectativa por uma situação que lhe é estranha. Torna-se imperioso ressaltar que o dano moral, em situações como a do caso em tela se presume, de modo que, à parte autora, basta a alegação, ficando à cargo da outra parte a produção de provas em contrário, o que, no vertente caso, não ocorreu. Neste particular, o ilustre Rui Stoco, em sua obra “Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial”, 4aEdição – 2aTiragem, Editora Revista dos Tribunais, esclarece que “(...) a causação de dano moral independe de prova, ou melhor, comprovada a ofensa moral o direito à indenização desta decorre, sendo dela presumido. (...) Significa, em resumo, que o dever de reparar é corolário da verificação do evento danoso, dispensável ou mesmo incogitável, a prova do prejuízo (...)” (p. 722). Também não se pode deixar de trazer à baila a lição esposada pela ilustre e respeitável Maria Helena Diniz, em sua obra intitulada “Curso de Direito Civil Brasileiro”, 7º volume, 9ª Edição, Editora Saraiva, ao tratar do dano moral, ressalva que a reparação tem sua dupla função, a penal “(...) constituindo uma sanção imposta ao ofensor, visando a diminuição de seu patrimônio, pela indenização paga ao ofendido, visto que o bem jurídico da pessoa (integridade física, moral e intelectual) não poderá ser violado impunemente (...)”, e a função satisfatória ou compensatória, pois “(...) como o dano moral constitui um menoscabo a interesses jurídicos extrapatrimoniais, provocando sentimentos que não têm preço, a reparação pecuniária visa a proporcionar ao prejudicado uma satisfação que atenue a ofensa causada (...)”. Impõe-se, por conseguinte, o reconhecimento do dano moral, decorrente da própria situação descrita na inicial, surgindo, portanto, para a parte ré, a obrigação de compensar, a parte autora, pelo inegável abalo sofrido. Inclusive, não se pode deixar de trazer a lume o teor da Súmula n. 339, do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que assim dispõe: “A recusa indevida ou injustificada, pela operadora de plano de saúde, de autorizar a cobertura financeira de tratamento médico enseja reparação a título de dano moral”. Com efeito, a indenização, por possuir caráter dúplice - compensatório e repressivo – deve ser fixada levando-se em consideração o sofrimento da vítima e capacidade econômica das partes, a fim de não se constituir fonte de enriquecimento indevido. Impõe-se, ainda, ao réu a obrigação de reembolsar a parte autora pelo montante por ela comprovadamente despendido. Neste diapasão, impõe-se a acolhida da pretensão autoral por ser a expressão da mais límpida e cristalina justiça. Isto posto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO, tornando definitiva a tutela antecipada concedida (ID 147255698). Condeno a parte ré ao ressarcimento do valor comprovadamente despendido no tratamento da autora, perfazendo o montante de R$ 5.523,29 (cinco mil, quinhentos e vinte e três reais e vinte e nove centavos), conforme planilha acostada no ID 136581549, acrescido dos juros legais e correção monetária, ambos contados da data da efetiva citação. Condeno a parte ré ao pagamento, em favor da parte autora, da indenização a título de danos morais, na importância de R$ 8.000,00 (oito mil reais), acrescida dos juros legais desde a efetiva citação e monetariamente corrigida a partir da presente data. Condeno a parte ré, como decorrência da sucumbência, ao pagamento das custas processuais, devidas por força de lei, bem como dos honorários advocatícios, aos quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação. P.R.I. RIO DE JANEIRO, 15 de abril de 2025. FLAVIA GONCALVES MORAES BRUNO Juiz Titular
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