Processo nº 5023428-03.2023.8.24.0930
ID: 305403289
Tribunal: TJSC
Órgão: Diretoria de Recursos e Incidentes
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5023428-03.2023.8.24.0930
Data de Disponibilização:
23/06/2025
Polo Passivo:
Advogados:
MILTON LUIZ CLEVE KUSTER
OAB/SC XXXXXX
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ALVINO GABRIEL DE NOVAES MENDES
OAB/SC XXXXXX
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Apelação Nº 5023428-03.2023.8.24.0930/SC
APELANTE
: EDEMAR DE OLIVEIRA (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: ALVINO GABRIEL DE NOVAES MENDES (OAB SC051633)
APELANTE
: CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO…
Apelação Nº 5023428-03.2023.8.24.0930/SC
APELANTE
: EDEMAR DE OLIVEIRA (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: ALVINO GABRIEL DE NOVAES MENDES (OAB SC051633)
APELANTE
: CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS (RÉU)
ADVOGADO(A)
: MILTON LUIZ CLEVE KUSTER (OAB SC017605)
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de apelações cíveis interpostas por
EDEMAR DE OLIVEIRA
e CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, contra sentença prolatada na "AÇÃO DE REVISÃO DE TAXA ANUAL DE JUROS c/c RESTITUIÇÃO DE VALORES e PEDIDO INCIDENTAL DE EXIBI/ÇÃO DE DOCUMENTOS", a qual julgou procedentes os pleitos inaugurais, nos seguintes termos:
[...] ANTE O EXPOSTO, julgo procedentes em parte os pedidos para:
a) revisar a taxa de juros remuneratórios nos contratos objetos da lide, que passarão a observar a taxa média de juros divulgada pelo Banco Central para o período de cada contratação, com o acréscimo de 50%, conforme tabela constante na fundamentação; e
b) determinar a repetição simples de eventual indébito, corrigido monetariamente pelo INPC desde a data do pagamento, com juros simples de 1% ao mês a contar da citação, ambos até 30.8.2024. A partir dessa data, o índice de correção monetária e o percentual de juros devem observar o que determina a Lei 14.905/2024.
Os valores apurados deverão ser compensados/descontados de eventual saldo devedor em aberto e, caso quitado o contrato, restituídos em parcela única.
Diante da sucumbência recíproca, arbitro os honorários em 15% do valor atualizado da condenação, cabendo à parte autora o adimplemento de 30% e à parte ré o pagamento de 70% dessa verba (art. 86 do CPC).
As custas devem ser rateadas entre as partes na proporção supramencionada.
A condenação em custas e honorários da parte autora ficará suspensa por força da Justiça Gratuita.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se. (Evento 33).
Opostos embargos declaratórios (Evento 40), estes foram rejeitados (Evento 42).
Nas razões de insurgência, o consumidor pretende sejam os
juros "fixados no patamar da taxa média divulgada pelo BACEN" e o reconhecimento da descaracterização da mora. Diz, ainda, haver omissão quanto ao exame dos contratos não exibidos pela casa bancária: "30600008975; 30600008219; 30600007722; 30600008660; 30600007928; 30600007020; 30600006808; 30600005798; 30600006180; 30600005003; 30600004685; 30600004376; 30600004072; 30600002886; 30600002055; 30600001280; 30600000636; 30600000215; 5836750". Ainda, pede a revisão dos contratos 30600009666, 30600027011 e 30600029043 acostados ao feito, mas não analisados. Requer a condenaão da acionada na integralidade dos ônus sucumbenciais (Evento 38).
Por outro lado, a instituição financeira aventa o cerceamento de defesa em virtude do julgamento antecipado da lide; a nulidade do julgado por ausência de fundamentação e a prescrição nos termos do art. 27 da Lei 8.078/1990. No mérito, postula pela manutenção dos juros remuneratórios convencionados. Aduz a inexistência de valores a restituir. Assevera a desproporcionalidade dos estipêndios patronais arbitrados e pleiteia a minoração, sugerindo que não ultrapasse o valor de R$ 1.000,00 (Evento 54).
Foram apresentadas as contrarrazões (Eventos 52 e 58).
É o necessário relatório.
Inicialmente, consigna-se que os recursos comportam julgamento monocrático, e, por isso, não há necessidade de submetê-los ao Órgão Colegiado.
Cerceamento de defesa (preliminar da instituição financeira)
A irresignante ventila o cerceamento de defesa em virtude do julgamento antecipado da lide, porquanto prolatada sem prévio saneamento do processo e da realização de dilação probatória, sobretudo diante dos indicativos de advocacia predatória.
No sistema de persuasão racional adotado pelos arts. 370 e 371 da Lei Processual Civil, cabe ao magistrado determinar a conveniência e a necessidade da produção probatória.
Nesse viés, como presidente da instrução processual, não há obrigação de o juiz coletar prova requerida pela parte quando configurada a inutilidade de sua produção para o deslinde da "quaestio", sendo lícito ao togado decidir antecipadamente a lide.
A respeito da temática, colhe-se do Superior Tribunal de Justiça:
[...] É lícito ao magistrado formar a sua convicção com base em qualquer elemento de prova disponível nos autos bastando para tanto que indique na decisão os motivos que lhe formaram o convencimento, de forma que a intervenção desta Corte quanto a tal valoração encontra óbice na Súmula nº 7/STJ. 3. Não configura cerceamento de defesa a sentença que julga antecipadamente a lide, de maneira fundamentada, resolvendo a causa sem a produção de outras provas em razão da suficiência probatória. Precedentes. [...] (AgInt no REsp 1459039/SP, rel. Ministro Ricardo Villas Boas Cueva, publ. em 25/6/2018)
No caso dos autos, o magistrado "a quo" entendeu prescindível a dilação probatória, considerando que a abusividade dos encargos pactuados consubstancia-se em matéria essencialmente de direito, passível de análise somente com base nos documentos acostados.
Este tem sido o posicionamento desta Corte de Justiça:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO PESSOAL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INCONFORMISMO DE AMBAS AS PARTES.
INSURGÊNCIA COMUM
VENTILADO CERCEAMENTO DE DEFESA POR CONTA DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. PROVAS NECESSÁRIAS À FORMAÇÃO DO CONVENCIMENTO DO ESTADO-JUIZ QUE SE ENCONTRAM CARREADAS AO FEITO. DESNECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. POSSIBILIDADE DE DEBUXE DO PROCESSO NO ESTADO EM QUE SE ENCONTRAVA. INTELIGÊNCIA DO ART. 355, INCISO I, DO CÓDIGO FUX. PROEMIAL REPELIDA.
RECURSO DO AUTOR
INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA E APLICAÇÃO DO CDC. MAGISTRADO DE PRIMEIRO GRAU QUE JÁ RECONHECEU A INCIDÊNCIA DO PERGAMINHO CONSUMERISTA. INVERSÃO DO ONUS PROBANDI QUE SE AFIGURA COMO DESPICIENDA E ATÉ MESMO INÓCUA NESSE MOMENTO PROCESSUAL. PEDIDO DE JUNTADA DOS EXTRATOS E PLANILHAS QUE EM NADA CONTRIBUIRIA PARA O DESATE DO FEITO. BANCO QUE JÁ AMEALHOU O CONTRATO SUB JUDICE, INDICANDO OS ENCARGOS COBRADOS. DOCUMENTOS HÁBEIS À DESLINDE DO FEITO QUE ESTÃO NO PROCESSO.
AVENTADA OFENSA AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA EM RAZÃO DA NÃO APRECIAÇÃO DE TODOS OS CONTRATOS REFERENTES À RELAÇÃO JURÍDICA ENTRE OS LITIGANTES. TESE GENÉRICA. ÓBICE DE ENFOQUE.
RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA
SUSTENTADA NULIDADE DA SENTENÇA POR CARÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. REJEIÇÃO. MAGISTRADO DE ORIGEM QUE DEMONSTROU PONTUALMENTE AS RAZÕES DE SEU CONVENCIMENTO, INCLUSIVE ACERCA DOS JUROS REMUNERATÓRIOS.
JUROS REMUNERATÓRIOS. ADMISSÃO DO RECURSO ESPECIAL N. 1.061.530/RS, DE QUE TRATA A MULTIPLICIDADE DE RECURSOS COM FUNDAMENTO IDÊNTICO À QUESTÃO DE DIREITO, COMO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. JULGAMENTO, SOB A RELATORIA DA MINISTRA NANCY ANDRIGHI, QUE ESTIPULOU: (1) A AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE NA ESTIPULAÇÃO DE JUROS REMUNERATÓRIOS SUPERIORES A 12% AO ANO; (2) A POSSIBILIDADE DE REVISÃO DAS TAXAS DE JUROS REMUNERATÓRIOS QUANDO CARACTERIZADA A RELAÇÃO DE CONSUMO E A ABUSIVIDADE RESTAR CABALMENTE DEMONSTRADA, ANTE AS PECULIARIDADES DO JULGAMENTO EM CONCRETO. ANÁLISE CONFORME OS PARÂMETROS DITADOS NO RESP REPETITIVO N. 1.061.530/RS E RESP N. 2.009.614/SC. CASO VERTENTE EM QUE: I) RESTOU CONFIGURADA A RELAÇÃO DE CONSUMO; II) O AUTOR FOI EXPOSTO A TAXAS DE JUROS ASTRONÔMICAS (558,01% A.A.); E III) A FINANCEIRA NÃO VERTEU SEQUER JUSTIFICATIVA ACERCA DA ENORME DISCREPÂNCIA DA TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS QUANDO O ÔNUS ERA SEU, POR SE TRATAR DE RELAÇÃO DE CONSUMO. CUSTO DE INVESTIMENTOS, SPREAD DA OPERAÇÃO E RISCO OFERECIDO PELO TOMADOR DO MÚTUO NÃO POSITIVADOS PELA REQUERIDA. ONEROSIDADE EXCESSIVA EVIDENCIADA. SENTENÇA MANTIDA.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO. PAGAMENTO DE JUROS REMUNERATÓRIOS ABUSIVOS. PRESCINDIBILIDADE DE PRODUÇÃO DA PROVA DO VÍCIO. INTELIGÊNCIA DO ART. 42 DO CDC. APLICAÇÃO DO VERBETE N. 322 DO STJ. PERMISSIBILIDADE NA FORMA SIMPLES. COMANDO JUDICIAL PRESERVADO. RECURSO DO AUTOR CONHECIDO EM PARTE E IMPROVIDO E APELO DA RÉ DESPROVIDO. (Apelação n. 5077204-49.2022.8.24.0930, Rel. Des. José Carlos Carstens Kohler, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. em 17/12/2024) (sem grifos no original).
APELAÇÃO. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA.
RECURSOS DE AMBAS AS PARTES.
PRELIMINARES SUSCITADAS PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. OBJEÇÃO AO JULGAMENTO VIRTUAL. INDEFERIMENTO. JULGAMENTO POR MEIO ELETRÔNICO EXPRESSAMENTE ADMITIDO PELO ORDENAMENTO JURÍDICO. AUSÊNCIA DE DIREITO SUBJETIVO DA PARTE À SESSÃO PRESENCIAL. PRECEDENTES DO STJ. NULIDADE NÃO CONFIGURADA.
CERCEAMENTO DE DEFESA. INEXISTÊNCIA. PROVAS DOCUMENTAIS ACOSTADAS AOS AUTOS SUFICIENTES PARA A FORMAÇÃO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO DO MAGISTRADO. DESNECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. MATÉRIA DE DIREITO DEVIDAMENTE APRECIADA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE ADEQUADO.
ALEGADA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA. NÃO CONFIGURAÇÃO. DECISÃO QUE ANALISA AS QUESTÕES CENTRAIS DA LIDE, COM FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE PARA SOLUÇÃO DA CONTROVÉRSIA. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO PELOS TRIBUNAIS SUPERIORES.
MÉRITO. PRETENDIDA A REFORMA DA SENTENÇA QUE RECONHECEU A ABUSIVIDADE DOS JUROS PACTUADOS. NÃO ACOLHIMENTO. EXCESSIVIDADE VERIFICADA NÃO APENAS PELO COTEJO COM A TAXA MÉDIA DIVULGADA PELO BANCO CENTRAL, MAS PELA AUSÊNCIA DE PROVAS DE SITUAÇÃO EXCEPCIONAL QUE JUSTIFIQUE A COBRANÇA EM PATAMAR SUPERIOR AO PRATICADO PELO MERCADO. JUROS REMUNERATÓRIOS ABUSIVOS. NECESSIDADE DE APLICAÇÃO DA TAXA MÉDIA DO BACEN. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.
REPETIÇÃO DE INDÉBITO. POSSIBILIDADE. RESTITUIÇÃO DEVIDA NA FORMA SIMPLES, APÓS COMPENSAÇÃO PREVISTA NO ART. 368 DO CÓDIGO CIVIL.
CORREÇÃO MONETÁRIA. PRETENSÃO DA AUTORA DE ADOÇÃO DO IGPM. AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL. MANUTENÇÃO DO INPC COMO ÍNDICE APLICÁVEL, CONFORME PROVIMENTO N. 13/1995 DA CORREGEDORIA-GERAL DA JUSTIÇA DE SANTA CATARINA.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PLEITOS DE MINORAÇÃO E MAJORAÇÃO PELAS PARTES. DEMANDA DE BAIXA COMPLEXIDADE. VERBA FIXADA EM R$ 2.000,00 NA ORIGEM. ADEQUAÇÃO AO TRABALHO DESENVOLVIDO E AO GRAU DE ZELO PROFISSIONAL. VALOR MANTIDO.
HONORÁRIOS RECURSAIS. MAJORAÇÃO EM FAVOR DA PARTE AUTORA.
RECURSOS CONHECIDOS E DESPROVIDOS. (Apelação n. 5040842-77.2024.8.24.0930, Rel. Des. Getúlio Corrêa, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. em 17/12/2024) (sem grifos no original).
Desse modo, tratando-se de matéria exclusivamente de direito e convencido o Togado singular acerca da solução jurídica pelas provas carreadas aos autos, mostra-se factível decidir antecipadamente a lide, por já se encontrar a controvérsia em condições de julgamento.
Em vista disso, a preliminar aventada é rechaçada.
Nulidade da sentença por ausência de fundamentação
(prefacial arguida pelo banco)
Aventa a recorrente a nulidade do julgado diante da ausência de fundamentação "
e sem análise pormenorizada do caso, conforme entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recursos Especiais n.º 1.061.530/RS (repetitivo) e 1.821.182/RS
".
Entretanto, da leitura do pronunciamento judicial apelado é possível constatar os motivos pelos quais o Togado singular formou seu convencimento a respeito das matérias postas nos autos, estando de acordo com o disposto no art. 489 do Código de Processo Civil e o estabelecido pelo art. 93, inc. IX, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
Além disso, é consabido que não se faz necessária "
a manifestação expressa sobre todos os argumentos apresentados pelos litigantes
" e, tampouco, a "
menção expressa dos dispositivos infraconstitucionais tidos como violados
". (Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial n. 1.394.986/RS, Segunda Turma, rel. Ministro Mauro Campbell Marques, j. em 7/5/2019).
Destarte, não vislumbrada a carência de fundamentação a ensejar a alegada nulidade da decisão, a proemial é rejeitada.
Prescrição (prejudicial de mérito ventilada pela demandada)
A acionada
argui a prescrição, nos termos do art. 27 da Lei 8.078/1990, notadamente porque o autor pretende "
a revisão de contrato(s) firmado(s) há mais de 5 (cinco) anos e até há mais de 10 (dez) anos
".
Porém, é consabido que, tratando-se de revisão de contrato bancário, o prazo prescricional é de 10 (dez) anos, com fulcro no art. 205 do Código Civil, e deve ser contado da data do vencimento da última parcela:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. EMPRÉSTIMO PESSOAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSOS DOS LITIGANTES. PREJUDICIAL DE MÉRITO. PRESCRIÇÃO. ALEGAÇÃO FUNDADA EM RELAÇÃO AO PEDIDO DE REVISÃO DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS. AUSÊNCIA DE PLEITO REFERENTE AO VÍCIO DO PRODUTO OU SERVIÇO. AÇÃO DE CUNHO PESSOAL. INCIDÊNCIA DO PRAZO DECENÁRIO. ARTIGO 205 DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. PRESTAÇÕES CONTINUADAS. TERMO INICIAL COM O VENCIMENTO DA ÚLTIMA PARCELA. PREJUDICIAL REJEITADA. PRELIMINARES. [...] RECURSOS NÃO PROVIDOS. (TJSC, Apelação n. 5020261-41.2024.8.24.0930, rel. Guilherme Nunes Born, Segunda Câmara de Direito Comercial, j. 06-05-2025)
Na hipótese, o magistrado consignou ser "
evidente que não se operou a prescrição, no instante em que
descontos são verificados há menos de dez anos do ajuizamento da demanda
" (Evento 33, SENT1).
Porém, as razões recurais não atacam especificamente os fundamentos da sentença (art. 1.010, II e III, do Código de Processo Civil), uma vez que apenas consignam de maneira genérica que "
a prescrição para ação revisional é quinquenal, considerando-se o início da contagem do prazo a data da contratação
" (Evento 54, APELAÇÃO1), tese que sequer tem amparo.
Logo, deixa-se de acolher a proemial.
Juros remuneratórios (postulação de ambos os litigantes)
O autor pretende a limitação do encargo à taxa média de mercado; afirma que a sentença deixou de apreciar alguns contratos; ainda, "
nos contratos que não são objeto de refinanciamento, e para os contratos oriundos de renegociação de dívida, requer sejam adequados à taxa média de mercado prevista pelo BACEN na modalidade Crédito pessoal não consignado vinculado à composição de dívidas (através da série 20743)
". De outra banda, a financeira postula pela manutenção do juros remuneratórios convencionados.
A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do Recurso Especial n. 1.061.530/RS, sob o rito do recurso repetitivo, consolidou a seguinte orientação:
ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS
a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;
b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;
c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário a s disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;
d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. (REsp n. 1.061.530/RS, relatora Ministra Nancy Andrighi,
Segunda Seção
, julgado em 22/10/2008, DJe de 10/3/2009)
Por outro lado, a jurisprudência da Corte Superior orienta-se pela adoção da chamada "taxa média de mercado", divulgada pelo Banco Central, como referencial para averiguação da abusividade dos juros remuneratórios, que haverá de ser demonstrada de acordo om as peculiaridades de cada caso concreto, levando-se em consideração circunstâncias como: se há relação de consumo; a presença de desvantagem exagerada em detrimento do consumidor; a situação da economia na época da contratação; o custo da captação dos recursos e o spread bancário; o risco da operação; as garantias ofertadas e; o relacionamento mantido entre o tomador do crédito e a instituição financeira.
É nesse sentido que restou delimitado no Recurso Especial n. 1.821.182/RS, de relatoria da relatora Ministra Maria Isabel Gallotti:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO COLETIVA DE CONSUMO. CONTRATO BANCÁRIO. ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS ARTS. 11, 489 E 1.022 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. NÃO OCORRÊNCIA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. CARÊNCIA DE AÇÃO. SENTENÇA COLETIVA. LIMITAÇÃO DO JUROS REMUNERATÓRIOS À TAXA MÉDIA DE MERCADO, ACRESCIDA DE UM QUINTO. NÃO CABIMENTO. ORIENTAÇÃO FIRMADA NO RESP N. 1.061.530/RS. ABUSIVIDADE. AFERIÇÃO EM CADA CASO CONCRETO.
1. O acórdão recorrido analisou todas as questões necessárias ao deslinde da controvérsia, não se configurando omissão, contradição ou negativa de prestação jurisdicional.
2. De acordo com a orientação adotada no julgamento do REsp.1.061.530/RS, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, "é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1°, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto."
3. Prevaleceu o entendimento de que a taxa média de mercado apurada pelo Banco Central para cada segmento de crédito é referencial útil para o controle da abusividade, mas o simples fato de a taxa efetiva cobrada no contrato estar acima da taxa média de mercado não significa, por si só, abuso. Ao contrário, a média de mercado não pode ser considerada o limite, justamente porque é média; incorpora as menores e maiores taxas praticadas pelo mercado, em operações de diferentes níveis de risco. Foi expressamente rejeitada a possibilidade de o Poder Judiciário estabelecer aprioristicamente um teto para taxa de juros, adotando como parâmetro máximo o dobro ou qualquer outro percentual em relação à taxa média.
4. O caráter abusivo da taxa de juros contratada haverá de ser demonstrado de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto, levando-se em consideração circunstâncias como o custo da captação dos recursos no local e época do contrato; o valor e o prazo do financiamento; as fontes de renda do cliente; as garantias ofertadas; a existência de prévio relacionamento do cliente com a instituição financeira; análise do perfil de risco de crédito do tomador; a forma de pagamento da operação, entre outros aspectos.
5. Inexistência de interesse individual homogêneo a ser tutelado por meio de ação coletiva, o que conduz à extinção do processo sem exame do mérito por inadequação da via eleita.
6. Recurso especial provido (STJ, REsp n. 1.821.182/RS, de relatoria da relatora Ministra Maria Isabel Gallotti,
Quarta Turma
, julgado em 23/6/2022, DJe de 29/6/2022)
Igualmente, a Terceira Turma do STJ elencou requisitos para a revisão das taxas de juros remuneratórios no julgamento do Recurso Especial n. 2.009.614/SC, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi:
RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE MÚTUO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS. REVISÃO. CARÁTER ABUSIVO. REQUISITOS. NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA.
1- Recurso especial interposto em 19/4/2022 e concluso ao gabinete em 4/7/2022.
2- O propósito recursal consiste em dizer se: a) a menção genérica às "circunstâncias da causa" não descritas na decisão, acompanhada ou não do simples cotejo entre a taxa de juros prevista no contrato e a média praticada no mercado, é suficiente para a revisão das taxas de juros remuneratórios pactuadas em contratos de mútuo bancário; e b) qual o incide a ser aplicado, na espécie, aos juros de mora.
3- A Segunda Seção, no julgamento REsp n. 1.061.530/RS, submetido ao rito dos recursos especiais repetitivos, fixou o entendimento de que "é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1°, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto."
4- Deve-se observar os seguintes requisitos para a revisão das taxas de juros remuneratórios: a) a caracterização de relação de consumo; b) a presença de abusividade capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada; e c) a demonstração cabal, com menção expressa às peculiaridades da hipótese concreta, da abusividade verificada, levando-se em consideração, entre outros fatores, a situação da economia na época da contratação, o custo da captação dos recursos, o risco envolvido na operação, o relacionamento mantido com o banco e as garantias ofertadas.
5- São insuficientes para fundamentar o caráter abusivo dos juros remuneratórios: a) a menção genérica às "circunstâncias da causa" - ou outra expressão equivalente; b) o simples cotejo entre a taxa de juros prevista no contrato e a média de mercado divulgada pelo BACEN e c) a aplicação de algum limite adotado, aprioristicamente, pelo próprio Tribunal estadual.
6- Na espécie, não se extrai do acórdão impugnado qualquer consideração acerca das peculiaridades da hipótese concreta, limitando-se a cotejar as taxas de juros pactuadas com as correspondentes taxas médias de mercado divulgadas pelo BACEN e a aplicar parâmetro abstrato para aferição do caráter abusivo dos juros, impondo-se, desse modo, o retorno dos autos às instâncias ordinárias para que aplique o direito à espécie a partir dos parâmetros delineados pela jurisprudência desta Corte Superior.
7- Recurso especial parcialmente provido. (REsp n. 2.009.614/SC, de relatoria da relatora Ministra Nancy Andrighi,
Terceira Turma
, julgado em 27/9/2022, DJe de 30/9/2022)
Importa consignar que, a despeito de a sentença vergastada não ter apreciado a totalidade dos ajustes convencionados e colacionados aos autos, possível o exame nesta Instância Revisora, nos termos do art. 1.013, § 1º, do Código de Processo Civil e em observância ao princípio da celeridade processual.
A par dessas orientações, volvendo à hipótese telada, verifica-se terem as partes convencionado os seguintes contratos:
Contrato
Data
Taxa de juros mensal
Taxa Bacen mensal
010420007624 - Empréstimo pessoal
13/01/2021
13,00%
5,25% (Série 25464)
030600028453- Empréstimo pessoal
17/11/2017
15,00%
7,03% (Série 25464)
030600043024- Empréstimo pessoal
20/04/2020
22,00%
5,32% (Série 25464)
030600046212 - Refinanciamento
11/11/2021
18,67%
3,52% (Série 25465)
030600046538 - Empréstimo pessoal
17/01/2022
22,00%
5,01% (Série 25464)
030600047194 - Refinanciamento
16/05/2022
19,90%
3,38% (Série 25465)
030600047195 - Refinanciamento
16/05/2022
19,92%
3,38% (Série 25465)
033400014074 - Empréstimo pessoal
10/09/2018
18,50%
6,88% (Série 25464)
033400015191 - Empréstimo pessoal
24/04/2019
20,50%
7,07% (Série 25464)
033400015921 - Empréstimo pessoal
23/10/2019
22,00%
5,88% (Série 25464)
033400022690 - Refinanciamento
21/12/2022
19,84%
2,71% (Série 25465)
033400022694 - Refinanciamento
21/12/2022
19,84%
2,71% (Série 25465)
030600029043 - Empréstimo pessoal
08/02/2018
17,00%
7,02% (Série 25464)
030600027011 - Empréstimo pessoal
27/06/2017
22,00%
6,99% (Série 25464)
030600009666 - Empréstimo pessoal
08/04/2013
14,50%
4,41% (Série 25464)
No caso, denota-se que, em todos os referidos contratos, os juros remuneratórios restaram pactuados em patamar superior à taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil (Série 25464 - Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado; e, Série 25465 - Taxa média mensal de juros das operações de crédito com recursos livres - Pessoas físicas - Crédito pessoal não consignado vinculado à composição de dívidas), inclusive, suplantando a margem de tolerância de 10% adotada por Sodalício, o que revela abusividade na cobrança.
Quando das pactuações, ajustou-se que a quitação das prestações ocorreria mediante débito em conta, de forma a se revelar diminuto o risco da contratação.
Além disso, vislumbra-se as sucessivas operações de empréstimo pessoal realizadas entre os litigantes, de sorte que não é crível falar em risco da pactuação a justificar a incidência da rubrica em patamares elevados.
No mais, carece, o processado, de outros elementos aptos a demonstrarem os custos da negociação, a situação da economia naquela oportunidade, o perfil da contratante ou até mesmo a existência de anterior relacionamento entre os contendores.
Logo, não há comprovação de que existência fator de risco ou outra circunstância a amparar a exigência de encargo superior à taxa média de mercado divulgada pelo Bacen.
Nessa toada, constata-se não ter a casa bancária se desincumbido do ônus probatório que lhe cabia, no sentido de comprovar a análise de crédito promovida a fim de justificar a taxa aplicada à avença discutida.
Assim, embora o patamar médio de mercado apresente-se somente como mero referencial, diante das circunstâncias acima ponderadas, inviável afastar a existência de abusividade dos juros remuneratórios contratados, devendo incidir, à contratualidade, a taxa divulgada pelo Banco Central do Brasil.
A propósito:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. CONTRATOS DE CAPITAL DE GIRO. RETORNO DOS AUTOS DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DETERMINAÇÃO DE NOVO JULGAMENTO À LUZ DA JURISPRUDÊNCIA DAQUELA CORTE EM RELAÇÃO AOS JUROS REMUNERATÓRIOS.
UTILIZAÇÃO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BACEN, TÃO SOMENTE, COMO REFERENCIAL PARA A CONSTATAÇÃO DA ABUSIVIDADE. ONEROSIDADE DO ALUDIDO ENCARGO QUE DEVE SER APURADA DE ACORDO COM AS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. AUSÊNCIA, IN CASU, DE JUSTIFICATIVA PLAUSÍVEL POR PARTE DA RÉ PARA PRESERVAÇÃO DAS ELEVADAS TAXAS PACTUADAS ENTRE AS PARTES, COMO, POR EXEMPLO, A DEMONSTRAÇÃO DE ALGUM FATOR DE RISCO OU DE OUTRA CIRCUNSTÂNCIA QUE SEJA CAPAZ DE JUSTIFICAR A COBRANÇA DE JUROS SUBSTANCIALMENTE SUPERIORES À TAXA MÉDIA DE MERCADO. ACÓRDÃO ADEQUADO AO ENTENDIMENTO EXPRESSO PELA CORTE SUPERIOR. CONCLUSÃO ANTERIORMENTE ADOTADA MANTIDA.
RECURSO DESPROVIDO. (Apelação Cível n. 0302534-71.2016.8.24.0054, Rela. Desa. Soraya Nunes Lins, j. em 06/06/2024) (sem grifos no original)
E:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DA AÇÃ PARA CONSOLIDAR A PROPRIEDADE E A POSSE PLENA E EXCLUSIVA DO BEM DESCRITO NA INICIAL NO PATRIMÔNIO DA PARTE AUTORA, BEM COMO DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DA RECONVENÇÃO PARA DECLARAR A ABUSIVIDADE DA TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS PRATICADA, LIMITANDO-A À MÉDIA DE MERCADO DO BACEN E DETERMINAR A REPETIÇÃO DO INDÉBITO DE FORMA SIMPLES. INSURGÊNCIA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA AUTORA. PEDIDO DE AFASTAMENTO DA ABUSIVIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS DECLARADA NA SENTENÇA. UTILIZAÇÃO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BACEN, TÃO SOMENTE, COMO REFERENCIAL PARA A CONSTATAÇÃO DA ABUSIVIDADE. OBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS ESTIPULADOS NO RESP N. 1.821.182/RS. ONEROSIDADE DO ALUDIDO ENCARGO QUE DEVE SER APURADA DE ACORDO COM AS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA ÀS PARTICULARIDADES DO CASO (SITUAÇÃO DA ECONOMIA À ÉPOCA, GARANTIAS OFERECIDAS, PERFIL DO CONTRATANTE E RISCOS DA OPERAÇÃO). RECENTE ENTENDIMENTO FIRMADO PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUANDO DO JULGAMENTO DO RESP N. 2.009.614/SC, DE RELATORIA DA MINISTRA NANCY ANDRIGHI.
TAXA MÉDIA DIVULGADA PELO BACEN QUE INDICA TÃO SOMENTE UM PARÂMETRO DE AFERIÇÃO CONSIDERANDO AS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO. AUSÊNCIA, IN CASU, DE JUSTIFICATIVA PLAUSÍVEL POR PARTE DA RÉ PARA PRESERVAÇÃO DA TAXAS PACTUADAS ENTRE AS PARTES. JUROS SUPERIOR À MÉDIA DE MERCADO QUE, APESAR DE NÃO SER UM LIMITADOR, SERVE COMO REFERENCIAL. PRECEDENTES. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS DE DEMONSTRAR O RESULTADO DA ANÁLISE DE PERFIL DO MUTUÁRIO CAPAZ DE JUSTIFICAR A ADOÇÃO DA TAXA PRATICADA. ABUSIVIDADE EXISTENTE.
PLEITO DE AFASTAMENTO DA REPETIÇÃO DE INDÉBITO. INSUBSISTÊNCIA. CONSEQUÊNCIA LÓGICA DA ABUSIVIDADE CONTRATUAL. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO ILÍCITO. HONORÁRIOS RECURSAIS. CABIMENTO. DESPROVIMENTO DO RECURSO. CRITÉRIOS CUMULATIVOS FIXADOS PELO STJ PREENCHIDOS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (Apelação Cível n. 5030924-29.2021.8.24.0033, Rel. Des. Silvio Franco, j. em 13/06/2024) (sem grifos no original)
Desse modo, verificada a existência de abusividade nos juros remuneratórios contratados nos quinze ajustes suso mencionados, necessária a limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado divulgada pelo BACEN, afastando-se, por corolário, o acréscimo indevido de 50% (cinquenta por cento) sobre o percentual apurado.
No mais, observa-se que, conquanto intimada sob as penas do art. 400 do Código Fux, a instituição financeira deixou de apresentar os contratos ns. 30600008975; 30600008219; 30600007722; 30600008660; 30600007928; 30600007020; 30600006808; 30600005798; 30600006180; 30600005003; 30600004685; 30600004376; 30600004072; 30600002886; 30600002055; 30600001280; 30600000636; 30600000215; 5836750, sendo impossível perquirir, deste modo, se as taxas utilizadas quando da contratação são ou não abusivas.
Dessa forma, impossibilitado o exame das taxas de juros remuneratórios efetivamente pactuadas em tais instrumentos, impõe-se o acolhimento do apelo do autor a fim de que seja aplicada a taxa média de mercado divulgada pelo Bacen para operações de mesma espécie às datas das respectivas contratações ou períodos de incidência, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o devedor, confome Súmula 530 do Superior Tribunal de Justiça: "
Nos contratos bancários, na impossibilidade de comprovar a taxa de juros efetivamente contratada - por ausência de pactuação ou pela falta de juntada do instrumento aos autos -, aplica-se a taxa média de mercado, divulgada pelo Bacen, praticada nas operações da mesma espécie, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o devedor
".
Portanto, o apelo da instituição financeira merece desprovimento e a irresignação do autor parcial acolhimento.
Mora (irresignação do autor)
O apelante pretende seja aafatada a mora.
Esta Corte de Justiça manifestava-se no sentido de que, para a descaracterização da mora, mostra-se necessário o reconhecimento da cobrança de encargos abusivos no período de normalidade contratual, bem como do depósito da parcela incontroversa ou a prestação de caução idônea.
Incluive, sobre o tema, o Grupo de Câmaras de Direito Comercial deste Sodalício editou a Súmula 66: "
A cobrança abusiva de encargos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) não basta para a descaracterização da mora quando não efetuado o depósito da parte incontroversa do débito
".
Ocorre que o referido entendimento sumular restou revogado, na data de 14/02/2024, justamente em virtude da superveniência do julgamento do Tema 28 pelo Superior Tribunal de Justiça:
SÚMULA 66 (Revogada)
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA
GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO COMERCIAL (Cancelamento da Súmula n. 66/TJ)
"A cobrança abusiva de encargos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) não basta para a descaracterização da mora quando não efetuado o depósito da parte incontroversa do débito". Desse modo, revogada a Súmula 66, cujo verbete foi suprimido pelo entendimento sedimentado no Tema 28 do Superior Tribunal de Justiça: "o reconhecimento da abusividade nos encargos exigidos no período da normalidade contratual (juros remuneratórios e capitalização) descaracteriza a mora." (DJe n. 4191, de 23/2/2024)
Sob essa ótica, na hipótese concreta, reconhecida a abusividade de encargo exigido no período da normalidade (juros remuneratórios), revela-se imperioso o afastamento da mora, nos moldes assentados pelo Superior Tribunal de Justiça.
Em situações idênticas, vem decidindo este Areópago:
JUÍZO DE RETRATAÇÃO EM RECURSO ESPECIAL. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. IRRESIGNAÇÃO DO APELANTE. TEMA 28 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. ACOLHIMENTO. ILEGALIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS RECONHECIDA. SÚMULA 66 DESTA CORTE REVOGADA. APLICABILIDADE DO TEMA 28 DO STJ. MORA DESCARACTERIZADA. APELAÇÃO CÍVEL PROVIDA. APLICABILIDADE DO ART. 85, § 11, DO CPC, AFASTADA. RETRATAÇÃO POSITIVA. (Apelação Cível n. 0307119-76.2017.8.24.0008, rel. Des. Newton Varella Junior, j. em 6/6/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. REEXAME DO JULGADO. ARTS. 1.030, II, E 1.040, II, AMBOS DO CPC/15. AÇÃO REVISIONAL. TEMA 28. CONSTATADA ABUSIVIDADE NO PERÍODO DA NORMALIDADE. DESCARACTERIZAÇÃO DA MORA. APELO QUE RESULTA PARCIALMENTE PROVIDO. HONORÁRIOS RECURSAIS FIXADOS EM SEU DESFAVOR AFASTADOS. JUÍZO DE RETRATAÇÃO POSITIVO. (Apelação Cível n. 0300829-73.2017.8.24.0031, rel. Des. Jaime Machado Junior, j. em 16/5/2024)
Nesse contexto, o apelo do acionante merece provimento para que seja reconhecida a descaracterização da mora.
Repetição do indébito (irresignação da demandada)
A instituição financeira afirma a inexistência de valores a restituir.
Constatada a cobrança de valores indevidos pela casa bancária (juros remuneratórios), cabível é a aplicação do art. 876 do Código Civil, que estabelece: "
Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir; obrigação que incumbe àquele que recebe dívida condicional antes de cumprida a condição
".
Não se olvida da sujeição da repetição, nos pagamentos efetuados voluntariamente, à prova da exigência do erro em que incidiu o adimplente. (CC/2002, art. 877).
Entretanto, reputa-se inviável a subsunção absoluta do comando preconizado, devendo sua exegese refletir necessariamente a atual realidade econômica brasileira, em que a autonomia das partes, para estabelecer os conteúdos contratuais, erige-se relativizada, precipuamente em face da massificação (despersonificação) dos contratos bancários, cujas cláusulas, além de predispostas unilateralmente por meio da elaboração de esquemas uniformes, suprimem as negociações prévias, cabendo ao aderente aceitar ou recusar em bloco o regulamento contratual que lhe é apresentado.
Havendo o expurgo de encargos indevidos, restitui-se ao mutuário os valores cobrados a maior, independentemente de prova de vício, de acordo com o disposto na Súmula n. 322 do Superior Tribunal de Justiça, in verbis: "
Para a repetição de indébito, nos contratos de abertura de crédito em conta-corrente, não se exige a prova do erro
".
De outro vértice, preconiza o parágrafo único do art. 42 do Código Consumerista que o consumidor lesado tem direito a restituição em dobro: "
O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável
".
Todavia, o pleito de restituição em dobro só encontra sustentáculo desde que a instituição financeira tenha agido de má-fé na retenção de tais valores.
Melhor explicita a matéria o art. 940 do Código Civil, ao definir que "
aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição
".
Da mesma forma que se permite a restituição do indébito a fim de evitar o enriquecimento ilícito da casa bancária, a devolução de quantia em dobro ao consumidor, se não comprovada a má-fé, implicaria, por outro lado, no locupletamento deste.
Nesse viés, apurada a existência de crédito em favor do consumidor, em sede de liquidação de sentença, é cabível a restituição de valores somente na forma simples, facultada a compensação com eventual saldo devedor (art. 368 do CC).
Dito isso, entende-se viável a restituição e/ou compensação de valores pagos a maior pela parte autora na modalidade simples.
Importa consignar que haverá recálculo da dívida, em conformidade com os parâmetros delineados neste julgamento unipessoal a fim de constatar o "quantum debeatur".
Portanto, o apelo é desprovido na espécie.
Ônus sucumbenciais
Levando em conta a alteração substancial da sentença por este juízo "ad quem", deve a casa bancária ser responsabilizada pelo pagamento das custas processuais e do honorários advocatícios na integralidade.
Por outro lado, os honorários advocatícios devem ser arbitrados em observância às regras explícitas no art. 85, § 2°, do Código de Processo Civil, aqui colacionado:
Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. [...]
§ 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:
I - o grau de zelo do profissional;
II - o lugar de prestação do serviço;
III - a natureza e a importância da causa;
IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
No caso concreto, não há condenação líquida, tampouco é possível aferir, de plano, o valor do proveito econômico, o que inviabiliza a adoção dos critérios previstos nos incisos I e II do § 2º do art. 85 do Código de Processo Civil.
Dessa forma, considerando que os valores dos contratos envolvem empréstimos pessoal e renegociação de dívida e, tendo em vista que houve reconhecimento da abusividade dos juros remuneratórios sobre referida quantia, tem-se que a fixação do estipêndio no percentual entre 10% (dez por cento) e 20% (vinte por cento) sobre o valor atualizado da causa (R$ 33.974,16), conforme previsto no inciso III do § 2º do art. 85 o mencionado regramento, mostra-se adequado.
E, uma vez que a demanda não apresenta alto grau de complexidade, consideradas as particularidades do caso concreto e as manifestações dos patronos das partes durante o trâmite processual por lapso temporal de dois anos (propositura em março/2023), arbitra-se a verba patronal em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa.
Honorários recursais
Revisado o parâmetro da verba patronal nesta segunda instância, não há viabilidade de majoração de honorários sucumbenciais, conforme entendimento externado pelo Superior Tribunal de Justiça nos Embargos de Declaração no Agravo Interno no Recurso Especial de n. 1.573.573/RJ, de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellizze, cujo julgamento se deu em 04-04-2017.
Dispositivo
Por todo o exposto, nega-se provimento ao apelo da instituição financeira; dá-se parcial provimento ao apelo do autor, nos termos da fundamentação.
Intimem-se.
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