Processo nº 5022042-55.2023.8.24.0018
ID: 291388186
Tribunal: TJSC
Órgão: Diretoria de Recursos e Incidentes
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5022042-55.2023.8.24.0018
Data de Disponibilização:
06/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RODRIGO SCOPEL
OAB/SC XXXXXX
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MARCOS CRISTIANO ALBERTI
OAB/SC XXXXXX
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Apelação Nº 5022042-55.2023.8.24.0018/SC
APELANTE
: IVO DA LUZ (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: MARCOS CRISTIANO ALBERTI (OAB SC056621)
APELANTE
: BANCO VOTORANTIM S.A. (RÉU)
ADVOGADO(A)
: RODRIGO SCOPEL (OAB …
Apelação Nº 5022042-55.2023.8.24.0018/SC
APELANTE
: IVO DA LUZ (AUTOR)
ADVOGADO(A)
: MARCOS CRISTIANO ALBERTI (OAB SC056621)
APELANTE
: BANCO VOTORANTIM S.A. (RÉU)
ADVOGADO(A)
: RODRIGO SCOPEL (OAB SC021899)
DESPACHO/DECISÃO
Acolho o relatório da sentença (evento 35 dos autos de primeiro grau), de lavra da Juíza de Direito Andreia Regis Vaz, por contemplar precisamente o conteúdo dos presentes autos,
ipsis litteris
:
Cuida-se de ação movida por
IVO DA LUZ
em face de
BANCO VOTORANTIM S.A.
.
Alegou que contratou a concessão de crédito para aquisição de veículo com garantia em alienação fiduciária com a parte ré. Defendeu que o contrato contém algumas cláusulas abusivas, dentre elas as que dispõem sobre: (a) os juros remuneratórios; (b) as tarifas; (c) o seguro. Pugnou pela procedência dos pedidos, com a restituição do indébito e a indenização por dano moral.
Citada, a instituição requerida apresentou contestação, em que sustentou, preliminarmente, a impugnação ao pedido de Gratuidade de Justiça, a ilegitimidade quanto ao seguro. No mérito, defendeu que o contrato observou a legislação de regência e a vontade das partes (Ev. 26).
Houve réplica (Ev. 31).
A Magistrada julgou parcialmente procedentes os pedidos exordiais, nos seguintes termos:
ANTE O EXPOSTO
, julgo procedentes em parte os pedidos para:
- Afastar a cobrança de Tarifa de Avaliação do Bem;
- Afastar a cobrança de seguro;
- Determinar a repetição simples de eventual indébito, corrigido monetariamente pelo INPC desde a data do pagamento, com juros simples de 1% ao mês a contar da citação, ambos até 30.8.2024. A partir dessa data, o índice de correção monetária e o percentual de juros devem observar o que determina a Lei 14.905/2024.
Os valores apurados deverão ser compensados/descontados do saldo devedor em aberto e, caso quitado o contrato, restituídos pela instituição financeira em parcela única.
Diante da sucumbência recíproca, arbitro os honorários: a) em 10% do valor da condenação em favor do procurador do autor; b) em R$ 1.000,00 (um mil reais) em favor do procurador do réu, ante a impossibilidade de aferição concreta do proveito econômico obtido.
As custas devem ser rateadas entre as partes na proporção de 70% ao autor e 30% ao réu.
A condenação em custas e honorários da parte autora ficará suspensa por força da Justiça Gratuita.
Irresignado com a prestação jurisdicional entregue, o Banco réu interpôs apelação, por meio da qual alega que: a) o seguro auto foi livremente pactuado pelo autor e não há abusividade na sua contratação; b) o título de capitalização não é ilegal, pois o autor assinou a proposta de adesão de livre e espontânea vontade; c) há comprovação da prestação do serviço de avaliação de bem; d) os consectários legais devem ser atualizados única e exclusivamente pela taxa Selic, nos termos do artigo 406 do CCB; e) houve sucumbência mínima de sua parte, de modo que os encargos devem ser integralmente suportados pela parte requerente; e f) os honorários advocatícios devem ser reduzidos na hipótese de manutenção da sucumbência fixada. Ao final, clama o provimento integral do recurso (evento 42/1º grau).
Também inconformado com parte do
decisum
, o autor apelou, com o intuito de: a) reconhecer a abusividade do encargo remuneratório; b) defender a ilegalidade da cobrança da tarifa de cadastro e da tarifa de registro de contrato; c) postular a repetição do indébito na forma dobrada; e d) defender a ocorrência de danos morais indenizáveis. Por fim, busca o provimento integral do recurso (evento 46/1º grau).
Contrarrazões nos eventos 52 e 54 do feito
a quo
.
É o relatório.
Decido.
Os recursos preenchem os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, motivo pelo qual devem ser conhecidos.
De plano, assinalo a possibilidade de julgamento monocrático do feito, em conformidade com o art. 932, IV, do Código de Processo Civil, e art. 132, XV, do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça.
1 RECURSO DO BANCO
1.1 Seguro Auto RCF e Seguro Proteção financeira
O Banco autor defende a legalidade da cobrança de R$ 1.057,22 referente à contratação de Seguro Auto RCF e Seguro de proteção financeira.
Razão, contudo, não lhe assiste.
Com efeito, destaca-se a tese fixada pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento realizado sob o rito dos recursos repetitivos,
in verbis
:
Tema 972. 1 - Abusividade da cláusula que prevê o ressarcimento pelo consumidor da despesa com o registro do pré-gravame, em contratos celebrados a partir de 25/02/2011, data de entrada em vigor da Res.-CMN 3.954/2011, sendo válida a cláusula pactuada no período anterior a essa resolução, ressalvado o controle da onerosidade excessiva. 2 -
Nos contratos bancários em geral, o consumidor não pode ser compelido a contratar seguro com a instituição financeira ou com seguradora por ela indicada
. 3 - A abusividade de encargos acessórios do contrato não descaracteriza a mora. (grifou-se)
Ademais, a exigência de seguro configura prática abusiva também em relação à seguradora integrante do mesmo grupo econômico da instituição financeira, diante da ausência de efetiva liberdade de escolha da parte consumidora quanto à contratação de empresa diversa daquela previamente estipulada no instrumento contratual, em afronta aos princípios da boa-fé objetiva e da livre concorrência, bem como às disposições do Código de Defesa do Consumidor.
No caso em apreço, verifica-se a presença de abusividade na cobrança do encargo, uma vez que os seguros aparentam terem sido contratados diretamente com a instituição bancária, como parte de um pacote de serviços previamente formatado, tanto é que a logotipo do Banco BV consta nos documentos dos referidos ajustes (evento 26, DOC16, págs. 5-7/1º grau).
Tal conclusão é corroborada pelo fato de o valor correspondente ao seguro estar embutido no montante financiado, o que evidencia a ausência de liberdade de escolha por parte do consumidor - circunstância que afronta o disposto no art. 39, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor.
Nesse rumo:
APELAÇÃO CÍVEL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO - FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DA CASA BANCÁRIA. [...] COBRANÇA A TÍTULO DE "SEGURO AUTO RCF" E "SEGURO DE PROTEÇÃO FINANCEIRA" QUE É VEDADA, TENDO EM VISTA A AUSÊNCIA DE LIBERDADE DO CONSUMIDOR NA CONTRATAÇÃO. ORIENTAÇÃO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO RECURSO ESPECIAL REPETITIVO N. 1.639.320/SP (TEMA 972). RECLAMO DESPROVIDO. [...] RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5000378-41.2021.8.24.0081, rel. Soraya Nunes Lins, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 31-8-2023).
Assim sendo, diante da configuração de prática abusiva decorrente da limitação indevida à autonomia do consumidor na escolha da seguradora, impõe-se a manutenção da sentença recorrida.
1.2 Tarifa de avaliação do bem
Defende o banco requerido o reconhecimento da legalidade da cobrança da tarifa de avaliação de bem.
Sobre o tema, é de se observar que o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial n. 1.578.553/SP, realizado sob a sistemática dos recursos repetitivos (Tema 958), resolveu a discussão acerca da validade da cobrança, em contratos bancários, de despesas com serviços prestados por terceiros, registro do contrato e/ou avaliação do bem, estabelecendo as seguintes teses:
[...] 2.1. Abusividade da cláusula que prevê a cobrança de ressarcimento de serviços prestados por terceiros, sem a especificação do serviço a ser efetivamente prestado; 2.2. Abusividade da cláusula que prevê o ressarcimento pelo consumidor da comissão do correspondente bancário, em contratos celebrados a partir de 25/02/2011, data de entrada em vigor da Res.-CMN 3.954/2011, sendo válida a cláusula no período anterior a essa resolução, ressalvado o controle da onerosidade excessiva; 2.3. Validade da tarifa de avaliação do bem dado em garantia, bem como da cláusula que prevê o ressarcimento de despesa com o registro do contrato, ressalvadas a: 2.3.1. abusividade da cobrança por serviço não efetivamente prestado; e a 2.3.2. possibilidade de controle da onerosidade excessiva, em cada caso concreto [...] (rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Segunda Seção, j. 28-11-2018). (grifou-se)
Como se vê, no que diz respeito à tarifa de avaliação de bem, assim como o fez com relação à tarifa de registro de contrato, a Corte da Cidadania consignou expressamente a necessidade de comprovação da efetiva prestação do serviço pela instituição financeira e, mesmo nos casos em que houver a demonstração da referida prestação, é indispensável a análise individualizada do caso concreto a fim de aquilatar se existe ou não onerosidade excessiva em desfavor do consumidor contratante.
No caso concreto, observa-se que a tarifa em comento envolveu a cobrança de avaliação do bem no valor de R$ 250,00.
A parte ré colacionou o seguinte documento para comprovar a prestação do serviço (evento 26, DOC16, pág. 8/1º grau):
Contudo, tal documento não corresponde ao termo de avaliação formalmente exigido, de modo que afigura-se correta a decisão de primeira instância que determinou o afastamento da referida cobrança.
Nessa direção:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. FINANCIAMENTO DE VEÍCULO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DA AÇÃO PRINCIPAL E IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS RECONVENCIONAIS. INSURGÊNCIA DO REQUERIDO. [...]
TARIFA DE AVALIAÇÃO DE BEM. CONTEXTO PROBATÓRIO NÃO REVELA A EFETIVA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. ILEGALIDADE DA COBRANÇA EVIDENCIADA. APELO ACOLHIDO NO PONTO. [...]
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5001590-81.2020.8.24.0033, rel. Soraya Nunes Lins, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 15-8-2024).
APELAÇAO CÍVEL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. SENTENÇA QUE EXTINGIU O PROCESSO. PEDIDOS RECONVENCIONAIS JULGADOS PARCIALMENTE PROCEDENTES. RECURSO DE AMBAS AS PARTES. [...]
PLEITO DE DECLARAÇÃO DE LEGALIDADE DA TARIFA DE AVALIAÇÃO DO BEM. OBSERVÂNCIA DO RESP 1.578.553/SP (TEMA 958). COBRANÇAS PREVISTAS. AUSÊNCIA, CONTUDO, DE EFETIVA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. ABUSIVIDADE CONSTATADA. SENTENÇA MANTIDA. [...]
RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA CONHECIDO EM PARTE E, NESTA, PARCIALMENTE PROVIDO. APELO DA PARTE RÉ CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5078357-20.2022.8.24.0930, rel. Silvio Franco, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 27-6-2024).
Logo, nega-se provimento ao recurso do demandado no ponto.
1.3 Taxa Selic
O apelante defende que, "na remota hipótese de ser a parte requerida condenada nesta demanda, os consectários legais sejam atualizados única e exclusivamente pela Taxa Selic, nos termos do artigo 406 do CCB" (pág. 16 do apelo).
Contudo, razão não lhe assiste.
Sobre o tema, colhe-se a atual redação do Código Civil:
Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros, atualização monetária e honorários de advogado. (Redação dada pela Lei nº 14.905, de 2024)
Parágrafo único. Na hipótese de o índice de atualização monetária não ter sido convencionado ou não estar previsto em lei específica, será aplicada a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurado e divulgado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou do índice que vier a substituí-lo. (Incluído pela Lei nº 14.905, de 2024)
[...].
Art. 406. Quando não forem convencionados, ou quando o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, os juros serão fixados de acordo com a taxa legal. (Redação dada pela Lei nº 14.905, de 2024)
§ 1º A taxa legal corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), deduzido o índice de atualização monetária de que trata o parágrafo único do art. 389 deste Código. (Incluído pela Lei nº 14.905, de 2024)
§ 2º A metodologia de cálculo da taxa legal e sua forma de aplicação serão definidas pelo Conselho Monetário Nacional e divulgadas pelo Banco Central do Brasil. (Incluído pela Lei nº 14.905, de 2024)
§ 3º Caso a taxa legal apresente resultado negativo, este será considerado igual a 0 (zero) para efeito de cálculo dos juros no período de referência. (Incluído pela Lei nº 14.905, de 2024)
No entanto, essa novel redação somente tem incidência a partir da vigência da alteração legislativa, ocorrida em 30-8-2024, ao passo que o contrato com valores a repetir pode ter gerado desembolsos em anos anteriores (dada a contratação em 2021).
Anteriormente à referida alteração legislativa, este Tribunal de Justiça adotava o índice de correção monetária informado pelo Provimento n. 13 de 24-11-1995 da Corregedoria-Geral de Justiça (INPC), além dos juros legais de 1% ao mês.
Os índices do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - Selic antes não era adotados conforme a crítica doutrinária de Judith Martins Costa:
[...] o art. 406 reenvia os juros legais "a taxa que estiver em vigor para a mora dos pagamentos de imposto devidos a Fazenda Nacional", discutindo-se, em consequência, da legalidade, ou não, do emprego da taxa SELIC, que e a taxa básica de juros financeiros, fixada e periodicamente atualizada pelo Comitê de Politica Monetária do Banco Central - o COPOM.
Efetivamente, a taxa SELIC "é a taxa apurada no SELIC", fixada por ato unilateral do Poder Executivo através do COPOM, e calculada sobre os juros cobrados nas operações de venda de titulo negociável, em operação financeira com cláusula de recompra. Sua finalidade consiste em estimular a atividade econômica e disciplinar a inflação; a SELIC é uma taxa que reflete a remuneração dos investidores pela compra e venda de títulos públicos. [...] Portanto, é uma "taxa flutuante", determinada exclusivamente pela relação entre o mercado ("investidores") e o Governo, servindo para mensurar a remuneração de títulos públicos.
O fato de a taxa SELIC ser uma taxa flutuante, sujeita a variações conjunturais, leva a considerar a sua legalidade, ou não, como critério de mensuração da taxa de juros nos contratos regidos pelo Código Civil. [...].
O problema está em utilizar a taxa SELIC para os fins propostos no art. 406 do Código Civil, atinentes a mora, uma vez que a taxa não apenas abarca projeção inflacionária, mas, fundamentalmente, está atada a conjuntura econômica de um modo por vezes incompatível com a finalidade perseguida pelos juros moratórios, gerando dificuldades para garantir o equilíbrio prestacional: por vezes será benéfica ao credor, por outras ao devedor, mas em varias conjunturas não observara o equilíbrio necessário as relações civis. (Comentários ao novo código civil, vol. V, tomo II, 2ª ed. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2008, p. 593-596).
Desse modo, conforme a sentença, mantém-se "a repetição simples de eventual indébito, corrigido monetariamente pelo INPC desde a data do pagamento, com juros simples de 1% ao mês a contar da citação, ambos até 30.8.2024. A partir dessa data, o índice de correção monetária e o percentual de juros devem observar o que determina a Lei 14.905/2024".
Nesse sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO - CDC VEÍCULO. JULGAMENTO DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO INAUGURAL. INCONFORMISMO DO RÉU. [...]. ALEGAÇÃO DE QUE OS CONSECTÁRIOS LEGAIS DEVEM SER ATUALIZADOS ÚNICA E EXCLUSIVAMENTE PELA TAXA SELIC, NOS TERMOS DO ART. 406 DO CÓDIGO CIVIL. SUPERVENIÊNCIA DA LEI N. 14.905, DE 28 DE JUNHO DE 2024, QUE IMPÕE A ALTERAÇÃO DO ENTENDIMENTO ATÉ ENTÃO ADOTADO POR ESTE ÓRGÃO FRACIONÁRIO. REDAÇÃO CONFERIDA AO ART. 406, § 1º, DO CÓDIGO CIVIL, QUE PASSOU A PREVER EXPRESSAMENTE QUE A TAXA DOS JUROS LEGAIS CORRESPONDE AO SISTEMA ESPECIAL DE LIQUIDAÇÃO E DE CUSTÓDIA (SELIC). VACATIO LEGIS DE 60 (SESSENTA DIAS), PREVISTA NO ART. 5º, II, DA LEI N. 14.905/2024, QUE CULMINA NA APLICAÇÃO DA TAXA SELIC SOBRE O QUANTUM DEBEATUR SOMENTE A PARTIR DE 30-8-24. MANUTENÇÃO, POR OUTRO LADO, DO PERCENTUAL DE 1% A.M. PARA OS JUROS DE MORA E DA CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC ATÉ 29-08-24. CRITÉRIO ESCORREITAMENTE ADOTADO PELO JUÍZO DE ORIGEM. DECISÃO IRRETOCÁVEL. RECURSO DESPROVIDO (TJSC, Apelação n. 5106345-79.2023.8.24.0930, rel. José Carlos Carstens Kohler, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 18-3-2025).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DO RÉU. [...]. PLEITO DE ATUALIZAÇÃO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS EXCLUSIVAMENTE PELA TAXA SELIC AFASTADO. MANUTENÇÃO DOS TERMOS DEFINIDOS EM SENTENÇA QUE SE IMPÕE. [...] (TJSC, Apelação n. 5011230-51.2023.8.24.0018, rel. Soraya Nunes Lins, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 13-3-2025).
Logo, o recurso do réu não merece acolhimento neste aspecto.
1.4 Encargos sucumbenciais
O Banco defende que houve sucumbência mínima de sua parte, de modo que os encargos devem ser integralmente suportados pela parte requerente. Subsidiariamente, postula a redução dos honorários advocatícios.
Razão, contudo, não lhe assiste em nenhum dos aspectos.
A questão foi assim definida na sentença:
Diante da sucumbência recíproca, arbitro os honorários: a) em 10% do valor da condenação em favor do procurador do autor; b) em R$ 1.000,00 (um mil reais) em favor do procurador do réu, ante a impossibilidade de aferição concreta do proveito econômico obtido.
As custas devem ser rateadas entre as partes na proporção de 70% ao autor e 30% ao réu.
A condenação em custas e honorários da parte autora ficará suspensa por força da Justiça Gratuita.
Quanto à distribuição dos ônus sucumbenciais, colhe-se da doutrina:
Adotou o Código, assim, o princípio da sucumbência, que consiste em atribuir à parte vencida na causa a responsabilidade por todos os gastos do processo.
Assenta-se ele na ideia fundamental de que o processo não deve redundar em prejuízo da parte que tenha razão. Por isso mesmo, a responsabilidade financeira decorrente da sucumbência é objetiva e prescinde de qualquer culpa do litigante derrotado no pleito judiciário. Para sua incidência basta, portanto, o resultado negativo da solução da causa, em relação à parte. (in Curso de Direito Processual Civil. Humberto Theodoro Júnior. Volume I. 37ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2001., p. 80)
Conforme a jurisprudência pacificada do Superior Tribunal de Justiça, a repartição dos encargos decorrentes da sucumbência "deve ser pautada pelo exame do número de pedidos formulados e da proporcionalidade do decaimento das partes em relação a esses pleitos" (REsp 1.255.315/SP, Terceira Turma, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 27-9-2011).
E mais, "a caracterização da sucumbência mínima não decorre da verificação de valores (
quantum debeatur
), mas do cotejamento do número de pedidos deferidos e indeferidos na pretensão proposta" (STJ, AgRg no AREsp 532029/SP, Rel. Min. Olindo Menezes - Des. Convocado do TRF 1ª Região, Primeira Turma, DJe de 11-12-2015).
Nesse andar, considerando que o critério norteador para a distribuição da sucumbência é o número de pedidos formulados e atendidos e também que
in casu
o pleito revisional foi em parte acolhido (cobrança indevida de seguro e tarifa de avaliação de bem), justifica-se a caracterização da hipótese de sucumbência recíproca, nos termos do art. 86,
caput,
do Código de Processo Civil, nos moldes estabelecidos na sentença (na proporção de 70% para autor e 30% para o réu).
No que diz respeito ao valor dos honorários sucumbenciais, o Código de Processo Civil estabelece:
Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. [...] § 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos: I - o grau de zelo do profissional; II - o lugar de prestação do serviço; III - a natureza e a importância da causa; IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
Com efeito, no presente caso, o percentual de 10% do valor da condenação, arbitrado na sentença, não se mostrou desarrazoado em face dos elementos retirados do processo, até mesmo porque configura percentual mínimo para fixação dos honorários advocatícios levando-se em conta os critério elencados no art. 85, § 2º do CPC.
Assim, o apelo merece ser desprovido no ponto.
2 APELO DO AUTOR
2.1 Juros remuneratórios
Alega a parte recorrente que os juros remuneratórios são abusivos porque superam a média de mercado do Bacen para a espécie da contratação.
Sobre essa temática, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, assim decidiu:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO
[...].
I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE.
ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS
a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF;
b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade;
c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02;
d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto.
[...] (REsp n. 1.061.530/RS, relatora Ministra Nancy Andrighi, Segunda Seção, j. 22-10-2008).
Colhe-se do inteiro teor do precedente paradigma o seguinte excerto sobre a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil:
A taxa média apresenta vantagens porque é calculada segundo as informações prestadas por diversas instituições financeiras e, por isso, representa as forças do mercado. Ademais, traz embutida em si o custo médio das instituições financeiras e seu lucro médio, ou seja, um 'spread' médio. É certo, ainda, que o cálculo da taxa média não é completo, na medida em que não abrange todas as modalidades de concessão de crédito, mas, sem dúvida, presta-se como parâmetro de tendência das taxas de juros. Assim, dentro do universo regulatório atual, a taxa média constitui o melhor parâmetro para a elaboração de um juízo sobre abusividade.
Em idêntico sentido, o Grupo de Câmaras de Direito Comercial desta Corte lançou enunciados acerca do assunto:
Enunciado I - Nos contratos bancários, com exceção das cédulas e notas de crédito rural, comercial e industrial, não é abusiva a taxa de juros remuneratórios superior a 12% (doze por cento) ao ano, desde que não ultrapassada a taxa média de mercado à época do pacto, divulgada pelo Banco Central do Brasil.
Enunciado IV - Na aplicação da taxa média de mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, serão observados os princípios da menor onerosidade ao consumidor, da razoabilidade e da proporcionalidade.
Em junho de 2022, o Superior Tribunal de Justiça revisitou o tema e firmou orientação no sentido de que "a taxa média de mercado apurada pelo Banco Central para cada segmento de crédito é referencial útil para o controle da abusividade, mas o simples fato de a taxa efetiva cobrada no contrato estar acima da taxa média de mercado não significa, por si só, abuso. Ao contrário, a média de mercado não pode ser considerada o limite, justamente porque é média; incorpora as menores e maiores taxas praticadas pelo mercado, em operações de diferentes níveis de risco. Foi expressamente rejeitada a possibilidade de o Poder Judiciário estabelecer aprioristicamente um teto para taxa de juros, adotando como parâmetro máximo o dobro ou qualquer outro percentual em relação à taxa média. O caráter abusivo da taxa de juros contratada haverá de ser demonstrado de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto, levando-se em consideração circunstâncias como o custo da captação dos recursos no local e época do contrato; o valor e o prazo do financiamento; as fontes de renda do cliente; as garantias ofertadas; a existência de prévio relacionamento do cliente com a instituição financeira; análise do perfil de risco de crédito do tomador; a forma de pagamento da operação, entre outros aspectos" (STJ, REsp n. 1.821.182/RS, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma).
E, na sequência, ainda complementou:
RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE MÚTUO BANCÁRIO. JUROS REMUNERATÓRIOS. REVISÃO. CARÁTER ABUSIVO. REQUISITOS. NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA.
1- Recurso especial interposto em 19/4/2022 e concluso ao gabinete em 4/7/2022.
2- O propósito recursal consiste em dizer se: a) a menção genérica às "circunstâncias da causa" não descritas na decisão, acompanhada ou não do simples cotejo entre a taxa de juros prevista no contrato e a média praticada no mercado, é suficiente para a revisão das taxas de juros remuneratórios pactuadas em contratos de mútuo bancário; e b) qual o incide a ser aplicado, na espécie, aos juros de mora.
3- A Segunda Seção, no julgamento REsp n. 1.061.530/RS, submetido ao rito dos recursos especiais repetitivos, fixou o entendimento de que "é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1°, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto."
4- Deve-se observar os seguintes requisitos para a revisão das taxas de juros remuneratórios: a) a caracterização de relação de consumo; b) a presença de abusividade capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada; e c) a demonstração cabal, com menção expressa às peculiaridades da hipótese concreta, da abusividade verificada, levando-se em consideração, entre outros fatores, a situação da economia na época da contratação, o custo da captação dos recursos, o risco envolvido na operação, o relacionamento mantido com o banco e as garantias ofertadas.
5- São insuficientes para fundamentar o caráter abusivo dos juros remuneratórios: a) a menção genérica às "circunstâncias da causa" - ou outra expressão equivalente; b) o simples cotejo entre a taxa de juros prevista no contrato e a média de mercado divulgada pelo BACEN e c) a aplicação de algum limite adotado, aprioristicamente, pelo próprio Tribunal estadual.
6- Na espécie, não se extrai do acórdão impugnado qualquer consideração acerca das peculiaridades da hipótese concreta, limitando-se a cotejar as taxas de juros pactuadas com as correspondentes taxas médias de mercado divulgadas pelo BACEN e a aplicar parâmetro abstrato para aferição do caráter abusivo dos juros, impondo-se, desse modo, o retorno dos autos às instâncias ordinárias para que aplique o direito à espécie a partir dos parâmetros delineados pela jurisprudência desta Corte Superior.
7- Recurso especial parcialmente provido (REsp n. 2.009.614/SC, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 27-9-2022).
Com efeito, a partir da firme orientação jurisprudencial referenciada, conclui-se que a mera verificação comparativa entre a taxa média de juros apurada pelo Banco Central do Brasil e aquela prevista no contrato questionado, a princípio, não é suficiente para avaliar a abusividade do encargo. Para tanto, faz-se necessário analisar cada caso concreto e as peculiaridades da contratação.
Verifica-se que na cédula de crédito bancário de
n. 410481881
os efetivos juros remuneratórios foram pactuados em 1,91% ao mês e 25,56% ao ano (item 16 do evento 26/1º grau).
Em consulta ao sítio eletrônico do Banco Central do Brasil (https://www.bcb.gov.br/ > Sistema Gerenciador de Séries Temporais > Estatísticas de crédito > Taxas de juros), observa-se que a taxa média de juros das operações de crédito com recursos livres (pessoas físicas - aquisição de veículo) ao tempo da contratação (20-1-2021) era de 1,55% ao mês (série n. 25471) e 20,21% ao ano (série n. 20749).
Embora o percentual pactuado esteja um pouco acima da taxa média, isoladamente, não se enquadra como abusivo, pois indispensável, sob a novel perspectiva jurisprudencial acima citada, a demonstração do prejuízo efetivo decorrente dessa prática, afastando-se do mero cotejo entre a taxa praticada e a média divulgada pelo Bacen.
Consta-se, ainda, que não há nos autos elementos probatórios suficientes a comprovar abusividade capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada (art. 51, §1º, do CDC), o que seria imprescindível para a modificação da negociação judicialmente.
A esse respeito, este Tribunal tem orientação majoritária de que a fixação do encargo ligeiramente acima da taxa média não configura abusividade, consoante se extrai dos seguintes precedentes:
APELAÇÃO. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA.
JUROS REMUNERATÓRIOS. UTILIZAÇÃO DA TAXA MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BACEN COMO REFERENCIAL PARA A CONSTATAÇÃO DA ABUSIVIDADE. SÚMULA 296 E RESP REPETITIVO Nº 1.061.530/RS, AMBOS DO STJ. ENUNCIADOS I E IV DO GRUPO DE CÂMARAS DE DIREITO COMERCIAL DESTE E. TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PERCENTUAL PACTUADO LIGEIRAMENTE ACIMA DA MÉDIA DE MERCADO. DISCREPÂNCIA, TODAVIA, NÃO SIGNIFICATIVA. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. MANUTENÇÃO DA TAXA PACTUADA.
[...].
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO (Apelação n. 5055229-68.2022.8.24.0930, rel. Soraya Nunes Lins, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 25-7-2024).
APELAÇÃO CÍVEL. BUSCA E APREENSÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTES OS PEDIDOS FORMULADOS NA EXORDIAL E ACOLHEU PARCIALMENTE AS PRETENSÕES DA RECONVENÇÃO/CONTESTAÇÃO. INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA.
[...].
APELO. RECONVENÇÃO. PLEITO DE AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS. NECESSIDADE DE AFERIÇÃO BASEADA NA OBSERVÂNCIA DAS PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO (SITUAÇÃO DA ECONOMIA À ÉPOCA, GARANTIAS OFERECIDAS, PERFIL DO CONTRATANTE E RISCOS DA OPERAÇÃO). TAXA MÉDIA DITADA PELO BANCO CENTRAL (BACEN) QUE INDICA, TÃO SOMENTE, UM CRITÉRIO ÚTIL DE AFERIÇÃO CONSIDERANDO AS PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO. TAXA PRATICADA MIMIMAMENTE SUPERIOR À MÉDIA DE MERCADO. HIPÓTESE DOS AUTOS NA QUAL NÃO RESTARAM PREENCHIDOS OS REQUISITOS. TAXAS DE JUROS POUCO ACIMA DA MÉDIA QUE NÃO IMPORTAM ABUSIVIDADE. PRECEDENTES DESTA CORTE E DO STJ. RÉU QUE, ADEMAIS, DEIXOU DE FAZER PROVA MÍNIMA ACERCA DA ALEGADA ABUSIVIDADE. SENTENÇA REVISTA NO PONTO.
[...] (Apelação n. 5001704-03.2021.8.24.0092, rel. Silvio Franco, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 4-7-2024).
Assim, preserva-se a conclusão do Juízo
a quo
no ponto.
2.2 Tarifa de Cadastro
O recorrente/autor considera abusiva a Tarifa de Cadastro no valor de R$ 789,00.
Razão não lhe assiste.
Com efeito, é de se observar que o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial n. 1.251.331/RS, admitido como representativo da controvérsia (Temas 618, 619, 620 e 621), resolveu a discussão acerca da legalidade da tarifa de cadastro, nos seguintes termos:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. DIVERGÊNCIA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. JUROS COMPOSTOS. MEDIDA PROVISÓRIA 2.170-36/2001. RECURSOS REPETITIVOS. CPC, ART. 543-C. TARIFAS ADMINISTRATIVAS PARA ABERTURA DE CRÉDITO (TAC), E EMISSÃO DE CARNÊ (TEC). EXPRESSA PREVISÃO CONTRATUAL. COBRANÇA. LEGITIMIDADE. PRECEDENTES. MÚTUO ACESSÓRIO PARA PAGAMENTO PARCELADO DO IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES FINANCEIRAS (IOF). POSSIBILIDADE. [...] 7. Permanece legítima a estipulação da Tarifa de Cadastro, a qual remunera o serviço de "realização de pesquisa em serviços de proteção ao crédito, base de dados e informações cadastrais, e tratamento de dados e informações necessários ao inicio de relacionamento decorrente da abertura de conta de depósito à vista ou de poupança ou contratação de operação de crédito ou de arrendamento mercantil, não podendo ser cobrada cumulativamente" (Tabela anexa à vigente Resolução CMN 3.919/2010, com a redação dada pela Resolução 4.021/2011).[...] (REsp 1.251.331/RS, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, j. em 28-8-2013, grifo acrescido).
Quanto à exigibilidade da Tarifa de Cadastro, cumpre destacar que o Superior Tribunal de Justiça editou ainda a Súmula 566, dispondo que, "nos contratos bancários posteriores ao início da vigência da Resolução-CMN n. 3.518/2007, em 30/4/2008, pode ser cobrada a tarifa de cadastro no início do relacionamento entre o consumidor e a instituição financeira".
No caso em apreço, a cédula de crédito bancário, emitida pela requerente em 20-1-2021, previu a cobrança da Tarifa de Cadastro no valor de R$ 789,00.
Em consulta ao sítio eletrônico do Banco Central do Brasil (https://www.bcb.gov.br/ > Estabilidade Financeira > Sistema Financeiro Nacional > Tarifas Bancárias > Dados sobre tarifas bancárias > Valores mínimos, máximos e médios por tarifa bancária por segmento), observa-se que o valor médio cobrado por bancos privados para "confecção de cadastro para início do relacionamento" com pessoa física ao tempo da contratação era de R$ 621,40.
Denota-se, portanto, que a tarifa de cadastro cobrada pelo banco não se mostra muito superior ao valor médio utilizado por outras instituições financeiras. Além disso, alcança 3,4% do valor do contrato (R$ 46.277,00).
Desse modo, o referido montante não se enquadra como abusivo, pois indispensável, sob a nova perspectiva jurisprudencial, a demonstração do prejuízo efetivo decorrente dessa prática.
A esse respeito, essa Corte de Justiça tem entendido que a fixação do encargo ligeiramente acima da taxa média não configura abusividade, consoante se extrai do seguinte precedente:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. FINANCIAMENTO DE VEÍCULO COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DA AUTORA. [...]
TARIFA DE CADASTRO. OBSERVÂNCIA DA SÚMULA 566 E DO RESP N. 1.251.331/RS, AMBOS DO STJ. LEGITIMIDADE PORQUE PREVISTA NO CONTRATO E EXIGIDA NO INÍCIO DO RELACIONAMENTO ENTRE A CONSUMIDORA E A INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. ADEMAIS,
ENCARGO PACTUADO EM VALOR LIGEIRAMENTE ACIMA DA MÉDIA DE MERCADO PRATICADA PELAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS DO MESMO SEGMENTO. DISCREPÂNCIA NÃO SIGNIFICATIVA. ABUSIVIDADE NÃO EVIDENCIADA.
MANUTENÇÃO DA SENTENÇA NESSE ASPECTO. [...]
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5001278-28.2023.8.24.0930, rel. Soraya Nunes Lins, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 25-7-2024). (grifou-se)
Logo, nega-se provimento ao reclamo nesse aspecto.
2.3 Tarifa de Registro de Bem
O apelante alega a abusividade da tarifa de registro do contrato.
Razão não lhe socorre no ponto.
Como antes mencionado, a Corte Superior condicionou a validade da cobrança à demonstração da prestação do serviço (Tema 958 do STJ).
No caso concreto, observa-se que a tarifa em comento envolveu o registro do contrato no órgão de trânsito (Res. 320 Contran), tendo sido apontado o montante de R$ 219,78 no item "B9" da cédula de crédito bancário anexada no item 6 do evento 1/1º grau.
Além de efetivamente contratada, há nos autos prova da efetiva prestação do referido serviço, já que o documento apresentado na defesa revela que o gravame foi registrado no órgão de trânsito, passando a constar no documento/histórico do veículo, o que se mostra suficiente para a cobrança em questão. Veja-se:
Não há, ademais, prova de excesso no valor cobrado, o qual representa 0,95% do valor total financiado.
Nessa direção:
APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE EMPRÉSTIMO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSOS DE AMBAS AS PARTES. [...] DEFENDIDA A ILEGALIDADE DA TARIFA DE REGISTRO DE CONTRATO. TAXA DEVIDAMENTE CONTRATADA. SERVIÇO PRESTADO EM VALOR NÃO EXCESSIVO. VALIDADE. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO PELO STJ EM JULGAMENTO DE RECURSO REPETITIVO (RESP N. 1.578.553/SP). [...] RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA CONHECIDO E PROVIDO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA CONHECIDA E DESPROVIDA (TJSC, Apelação n. 5053309-25.2023.8.24.0930, rel. Silvio Franco, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 16-5-2024).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. INSURGÊNCIA DE AMBAS AS PARTES. [...]. TARIFA DE REGISTRO DO CONTRATO. OBSERVÂNCIA DO RESP 1.578.553/SP (TEMA 958). PACTUAÇÃO DO ENCARGO. PRESTAÇÃO DO SERVIÇO EVIDENCIADA. LEGALIDADE DA COBRANÇA MANIFESTA. APELO DO RÉU PROVIDO NESSE PONTO. [...]. APELO DO RÉU CONHECIDO E ACOLHIDO EM PARTE (TJSC, Apelação n. 5004348-46.2021.8.24.0082, rel. Soraya Nunes Lins, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 14-12-2023).
Logo, a sentença deve ser preservada no ponto.
2.4 Repetição de indébito na forma dobrada
Postula a parte consumidora a condenação da instituição financeira à restituição do indébito no valor igual ao dobro do que pagou em excesso.
A sentença decidiu o tema nesses termos:
Da repetição de indébito.
O valor indevidamente recebido pela instituição financeira deve ser repetido à parte adversa, com juros e correção monetária, sob pena de enriquecimento indevido, admitida a sua compensação com eventual saldo devedor.
A repetição deve ser feita de forma simples, e não em dobro, por se tratar de cobrança calcada em erro justificável, decorrente da interpretação do que se reputava contratualmente correto.
Em complemento, pontua-se que o art. 42, parágrafo único, do CDC, dispõe que "o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável".
Não ignoro o seguinte precedente do Superior Tribunal de Justiça (não submetido a julgamento pelo rito dos recursos repetitivos):
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. TELEFONIA FIXA. COBRANÇA INDEVIDA. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO DE TARIFAS. 1) RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO (PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 42 DO CDC). DESINFLUÊNCIA DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO DO FORNECEDOR QUE REALIZOU A COBRANÇA INDEVIDA. DOBRA CABÍVEL QUANDO A REFERIDA COBRANÇA CONSUBSTANCIAR CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA. 2) APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL DO CÓDIGO CIVIL (ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL). APLICAÇÃO ANALÓGICA DA SÚMULA 412/STJ. 3) MODULAÇÃO PARCIAL DOS EFEITOS DA DECISÃO. CONHECIMENTO E PROVIMENTO INTEGRAL DO RECURSO.
[...]
13. Fixação das seguintes teses. Primeira tese: A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida, revelando-se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva. Segunda tese: A ação de repetição de indébito por cobrança de valores referentes a serviços não contratados promovida por empresa de telefonia deve seguir a norma geral do prazo prescricional decenal, consoante previsto no artigo 205 do Código Civil, a exemplo do que decidido e sumulado no que diz respeito ao lapso prescricional para repetição de tarifas de água e esgoto (Súmula 412/STJ). Modulação dos efeitos:
Modulam-se os efeitos da presente decisão - somente com relação à primeira tese - para que o entendimento aqui fixado quanto à restituição em dobro do indébito seja aplicado apenas a partir da publicação do presente acórdão. A modulação incide unicamente em relação às cobranças indevidas em contratos de consumo que não envolvam prestação de serviços públicos pelo Estado ou por concessionárias, as quais apenas serão atingidas pelo novo entendimento quando pagas após a data da publicação do acórdão (EAREsp n. 676.608/RS, relator Ministro Og Fernandes, Corte Especial, j. 21-10-2020).
Não obstante, consoante compreensão majoritária desta Corte, "o instituto tem por fundamento vedar o enriquecimento sem causa, de maneira que aquele que cobrado em quantia indevida possui direito à repetição dos valores pagos a maior. Assim, caso apurado eventual pagamento indevido, será dever da instituição financeira promover a devolução de valores eventualmente cobrados a maior, na forma simples, ou sua compensação, uma vez que não restou demonstrada a má-fé ou o dolo por parte daquela, não sendo necessário, ainda, a comprovação de erro" (Apelação n. 0318255-70.2017.8.24.0008, rel. Cláudio Barreto Dutra, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 18-8-2022).
A orientação supra inclusive foi reafirmada recentemente pelo Grupo de Câmaras de Direito Comercial deste Tribunal de Justiça (Ação Rescisória (Grupo Civil/Comercial) n. 5018581-66.2022.8.24.0000, rel. Roberto Lepper, Grupo de Câmaras de Direito Comercial, j. 10-4-2024).
E ainda:
APELAÇÕES. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. INSURGÊNCIA DE AMBAS AS PARTES.
RECURSO DA CASA BANCÁRIA
[...].
REPETIÇÃO DO INDÉBITO. CABIMENTO. EXISTÊNCIA DE ENCARGOS ABUSIVOS. DEVER DE PROMOVER A DEVOLUÇÃO DOS VALORES COBRADOS INDEVIDAMENTE, NA FORMA SIMPLES, ATUALIZADO COM BASE NOS ÍNDICES OFICIAIS, DIANTE DA AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. VEDAÇÃO DO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. MANUTENÇÃO DO DECISUM NO PONTO.
[...] (TJSC, Apelação n. 5053817-05.2022.8.24.0930, rel. Soraya Nunes Lins, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 27-6-2024).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. IRRESIGNAÇÃO DO DEMANDANTE. AVENTADA COBRANÇA DE JUROS REMUNERATÓRIOS ALHEIOS AOS PACTUADOS. INACOLHIMENTO. COMPROVAÇÃO QUE DEVE SER FEITA PELA PARTE AUTORA. LAUDO CONTÁBIL PARTICULAR QUE NÃO CORROBORA COM AS TESES SUSCITADAS. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS MÍNIMOS CONSTITUTIVOS DE DIREITO. EX VI DO ART. 373, I, DO CÓDIGO DE RITOS. SEGURO PRESTAMISTA E TARIFA DE AVALIAÇÃO DO BEM. AFASTAMENTO DOS ENCARGOS PELO JUÍZO SINGULAR. AUSÊNCIA DO INTERESSE PROCESSUAL. RECURSO NÃO CONHECIDO NO PONTO. TARIFA DE REGISTRO DO CONTRATO. EXEGESE DA RESP N. 1.578.553/SP DA CORTE DA CIDADANIA, AFETO AO RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS. EFETIVA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO E AUSENTE ONEROSIDADE EXCESSIVA. MANUTENÇÃO DA COBRANÇA.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA MÁ-FÉ DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. DEVOLUÇÃO DOS VALORES INDEVIDOS A SE DAR NA FORMA SIMPLES. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA EXTENSÃO, DESPROVIDO (TJSC, Apelação n. 5005743-79.2021.8.24.0080, rel. Rocha Cardoso, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 19-10-2023, grifo acrescido).
Portanto, à consideração de que não ficou plenamente comprovado que a instituição financeira agiu com má-fé no caso concreto, notadamente por apenas exigir encargos com suporte contratual, a sentença deve ser mantida quanto à restituição na forma simples.
2.5 Danos morais
O demandante postula a condenação do Banco ao pagamento de indenização por danos morais com base na função reparatória e pedagógica da responsabilidade civil, diante da exigência de encargos indevidos.
A questão foi assim analisada pelo Togado de origem:
Para que se configure a responsabilidade civil e o dever de indenizar, não basta a simples existência de conduta que viole o direito, sendo indispensável que a ação ou omissão do agente tenha causado efetivo dano a outrem.
Isso porque os danos morais nascem em decorrência da prática de uma conduta injusta que cause sentimento negativo, tal como aflição, dor íntima, vexame, constrangimento ou humilhação perante terceiros.
Contudo, não é qualquer ofensa aos bens jurídicos que gera o dever de indenizar, sendo imprescindível que o dano apresente certo grau de magnitude, de modo a não configurar mero dissabor ou aborrecimento.
Como já decidiu o Tribunal de Justiça em caso semelhante, o desconforto gerado pelos fatos
"não causou maiores aborrecimentos do que aqueles a que todos estão sujeitos nas relações interpessoais provenientes da vida em sociedade, e por isso não caracterizam o reconhecimento de abalo moral" (TJSC, Apelação Cível n. 0061896-15.2012.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Janice Goulart Garcia Ubialli, Quarta Câmara de Direito Comercial, j. 25-04-2017).
Acerca do assunto, discorre Cavalieri Filho:
[...]
Nessa perspectiva, a existência de abusividade na pactuação não provoca violação a seus direitos da personalidade, não tendo causado mais que mero aborrecimento, o qual não é indenizável. Assim, não é cabível a pretendida indenização por danos morais.
A propósito, colhe-se da jurisprudência do egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina:
[...]
Desse modo, não comprovado o efetivo abalo psíquico, não restou caracterizado o dano moral.
A decisão não merece reforma neste particular.
De plano, sabe-se que o dano moral tem assento constitucional, nos termos do art. 5º, V e X, da Carta da República, do qual derivam as previsões infraconstitucionais delineadas nos arts. 186, 187 e 927, todos do Código Civil brasileiro.
No âmbito doutrinário, no que diz respeito ao abalo hábil a configurar o dano moral, colhe-se da lição de Sérgio Cavalieri Filho:
Nessa linha de princípio, só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio no seu bem-estar (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil, 10. ed. São Paulo: Atlas, p. 78).
No plano jurisprudencial, o Superior Tribunal de Justiça tem expressado que "sobrevindo, em razão de ato ilícito, perturbação nas relações psíquicas, na tranquilidade, nos entendimentos e nos afetos de uma pessoa, configura-se o dano moral, passível de indenização" (REsp 8.768/SP, rel. Min. Barros Monteiro, Quarta Turma, j. 18-2-1992).
Sob o viés normativo, tratando-se de relação consumerista, a responsabilidade incidente é objetiva, fundamentada pela teoria do risco (art. 927, parágrafo único, do Código Civil e arts. 12, 14 e 17, todos do Código de Defesa do Consumidor). Nessa modalidade, não se faz necessária a comprovação de culpa do agente, bastando a constatação da ocorrência do ato ilícito, do dano e do nexo de causalidade entre eles.
Contudo, ainda que se trate de responsabilidade objetiva, é dever da parte autora comprovar minimamente que houve lesão a sua honra e dignidade. Lembra-se que a Súmula 55 desta Corte de Justiça consigna: "A inversão do ônus da prova não exime o consumidor de trazer aos autos indícios mínimos do direito alegado na inicial quando a prova lhe diga respeito".
Em análise ao caderno processual, observa-se que o autor busca a reparação extrapatrimonial, sobretudo pelo fato de a ré ter exigido encargos financeiros indevidos (seguro e tarifa de avaliação de bem), o que teria lhe causado prejuízos financeiros.
Todavia, a existência desses encargos, por si só, não justifica o pedido de reparação por danos morais. Incumbia a parte autora ter demonstrado de que forma esse fato extrapolou os aborrecimentos cotidianos a que qualquer pessoa está sujeita, o que não se constata na hipótese. Sua imagem, o bom nome, a reputação, o decoro, a honra ou o crédito não foram atingidos pela conduta ilícita do banco réu.
Nesse viés, ressalta-se que todos os dias as pessoas passam por inúmeros desconfortos emocionais, os mais variados, decorrentes da vida em sociedade. São aborrecimentos que afetam, em menor ou maior grau, a esfera moral do ser humano. Mas nem todos configuram danos morais. É preciso aferir o potencial de repercussão dos fatos no âmbito psíquico de cada vítima, para distinguir entre os que devem e os que não devem ser tutelados.
Em síntese, invocando a lição de Yussef Said Cahali, quando cita Carlos Alberto Bittar, qualificam-se como danos morais (passíveis de compensação pecuniária) os que atingem os aspectos mais íntimos da personalidade humana (o da intimidade e da consideração pessoal), ou o da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração social) (Dano Moral. 2. ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998. p. 20).
E no que tange ao aspecto mais íntimo do dano moral (revolta, angústia, indignação, tristeza), não há como justificar (análise que deve partir do padrão de sensibilidade do "homem médio") a ocorrência de sério desequilíbrio na normalidade psíquica do autor.
Em verdade, somente se reconhece a existência de dano moral passível de reparação em face da ocorrência de fatos ou desdobramentos extraordinários na vida social, ou ainda, ofensas anormais à personalidade do ofendido, os quais, por sua natureza e gravidade, reflitam na esfera da dignidade da vítima.
Não é a hipótese dos autos, contudo.
Nesse sentido, mantém-se o
decisum
que rejeitou o pedido de condenação do banco ao pagamento de indenização por danos morais.
3 HONORÁRIOS RECURSAIS
Por fim, necessária se faz a fixação dos honorários recursais, em consonância com o disposto no art. 85, § 11, do Código de Processo Civil,
in verbis
:
Art. 85. [...]
§ 11. O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento.
Desse modo, observados os parâmetros acima referidos, majoro a verba honorária sucumbencial: a) pelo autor em favor do procurador do réu, de R$ 1.000,00 para R$ 1.500,00, suspensa a exigibilidade por força da justiça gratuita concedida na origem; e b) pelo réu em favor do procurador do requerente, de 10% para 11% do valor da condenação.
4 CONCLUSÃO
Ante o exposto, com base no art. 932, IV, do Código de Processo Civil, e art. 132, XV, do Regimento Interno deste Tribunal de Justiça conheço dos recursos e nego-lhes provimento, e, em consonância com o art. 85, § 11, do Código de Processo Civil, majoro a verba honorária sucumbencial: a) pelo autor em favor do procurador do réu, de R$ 1.000,00 para R$ 1.500,00, suspensa a exigibilidade por força da justiça gratuita concedida na origem; e b) pelo réu em favor do procurador do requerente, de 10% para 11% do valor da condenação.
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