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Processo nº 1003040-91.2022.4.01.3506

ID: 326411714

Tribunal: TRF1 Órgão: Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Formosa-GO Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 1003040-91.2022.4.01.3506

Data de Disponibilização: 16/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

JOSE PEREIRA DAS VIRGENS PAULO PEREIRA DOS SANTOS

Sentença Tipo D

Advogados:

AECIO FLAVIO VIEIRA NETO

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Formosa-GO Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Formosa-GO SENTENÇA TIPO "D" PROCESSO: 1003040-91.2022.4.01.3506 CLASSE: AÇÃO PENAL - PROCED… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Subseção Judiciária de Formosa-GO Vara Federal Cível e Criminal da SSJ de Formosa-GO SENTENÇA TIPO "D" PROCESSO: 1003040-91.2022.4.01.3506 CLASSE: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria) POLO PASSIVO: JOSE PEREIRA DAS VIRGENS e outros REPRESENTANTES POLO PASSIVO: AECIO FLAVIO VIEIRA NETO - GO47186 SENTENÇA I - RELATÓRIO Trata-se de ação penal pública incondicionada ajuizada pelo Ministério Público Federal em desfavor de Paulo Pereira dos Santos e José Pereira das Virgens, imputando-lhes a prática, em tese, dos crimes previstos no art. 55 da Lei n. 9.605/98 e art. 2º, caput e §1º, da Lei n. 8.176/91, na forma do art. 70 do Código Penal (concurso formal). A investigação teve início a partir de denúncia formulada por Jorge Moreira de Oliveira, presidente da Associação Quilombo Kalunga, que relatou atividade de extração ilegal de areia na localidade conhecida como Fazenda Ribeirão, situada no interior do Território Quilombola Kalunga, no município de Teresina de Goiás/GO. Durante diligência realizada em 03 de abril de 2022, técnicos da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável de Goiás (SEMAD/GO) constataram atividade de lavra mineral não autorizada, situada nas proximidades do Ribeirão dos Bois, nas coordenadas geográficas -13º37'20"S; -47º13'02"W. No local, foram identificadas marcas de carregamento de areia por caminhões e movimentação recente. Foi instaurado o Inquérito Policial nº 2022.0078402 (ID 1466703380), no qual se colheu o depoimento de testemunhas, além do interrogatório do investigado Paulo Pereira dos Santos. Segundo ele, realizava a retirada da areia para “ajudar a comunidade Kalunga”, alegando que a disponibilizava gratuitamente para os moradores, e que pagava aos posseiros da região R$ 150,00 por cada carreta retirada. Confirmou não possuir qualquer licença ambiental ou autorização da Agência Nacional de Mineração (ANM). O Laudo Pericial da Polícia Federal (ID 1739099076, fls. 10/25) atestou que houve extração de areia em quantidade relevante, sem controle técnico ou ambiental, e que tal atividade causava alterações no solo e risco de assoreamento ao curso d’água próximo. Concluído o inquérito, o MPF ofereceu denúncia (IDs 2126712027 e 2126712028), imputando aos réus a prática conjunta e previamente ajustada de exploração de bem da União sem autorização legal e atividade potencialmente poluidora sem licença ambiental, entre os dias 15 de março e 03 de abril de 2022. O réu Paulo Pereira dos Santos foi citado em 27/07/2024, e o réu José Pereira das Virgens em 12/09/2024. Diante da ausência de defensores constituídos, foi nomeado defensor dativo, o advogado Dr. Aécio Flávio Vieira Neto. Durante a audiência de instrução e julgamento, realizada em 01/04/2025, compareceram a representante do MPF Dra. Nádia Simas Souza, o réu Paulo Pereira dos Santos, o defensor Dr. Aécio Flávio Vieira Neto e as testemunhas Robson Disarz, Juliano Ferreira de Souza e Jorge Moreira de Oliveira. O réu José Pereira das Virgens não compareceu, sendo-lhe decretada a revelia (art. 367, CPP). Robson Disarz, servidor da SEMAD/GO, relatou que, ao realizar diligência fiscalizatória na localidade, constatou atividade de extração irregular de areia, sem apresentação de qualquer autorização ambiental. Informou que a área estava inserida em território quilombola e que o local da extração estava nas imediações do Ribeirão dos Bois. Juliano Ferreira de Souza, servidor da mesma equipe, confirmou o teor da vistoria. Relatou que conversaram com um homem identificado como Paulo, que admitiu estar realizando a retirada da areia, mencionando que a utilizava para "ajudar a comunidade". Juliano ressaltou que nenhum documento de licença ou autorização foi apresentado no local. Jorge Moreira de Oliveira, presidente da Associação Quilombo Kalunga, afirmou que foi quem formalizou a denúncia junto à SEMAD, ao perceber movimentação suspeita na área. Informou que a região explorada pertencia ao Território Quilombola e que não havia qualquer autorização comunitária para a atividade. Afirmou, ainda, que ao questionar Paulo sobre a extração de areia, este informou que desconhecia a necessidade de autorização e perguntou se o presidente da Associação poderia lhe fornecer a autorização, pois essa atividade seria seu único meio de sobrevivência, ocasião em que foi informado que ele não poderia fornecer nenhuma autorização. Em seu interrogatório judicial, Paulo Pereira dos Santos confirmou os fatos, alegando boa-fé, motivação social e ausência de conhecimento técnico sobre a necessidade de autorização. Relatou que extraiu aproximadamente oito caminhões de areia, dos quais quatro foram doados à comunidade Kalunga e os demais vendidos. Informou, ainda, que José era o proprietário da área e recebia valores por caminhão extraído, mas acreditava que o Sr. José Pereira das Virgens, por ser um homem muito simples, "antigo", não fazia ideia da necessidade de autorização para extração de areia (ID 2179983071). Encerrada a instrução, o MPF, em alegações finais, sustentou a condenação de ambos os réus, destacando a presença de prova documental, testemunhal e a confissão parcial de Paulo como elementos suficientes à responsabilização criminal (ID 2181525339). A defesa, por sua vez, pugnou pela absolvição com base no art. 386, VII, do CPP, invocando o princípio do in dubio pro reo. Alegou que não há prova suficiente de autoria e materialidade, sustentando que cabe à parte acusadora afastar a presunção de não culpabilidade, provando, além de uma dúvida razoável, que o acusado praticou a conduta delituosa que lhe é atribuída; o que não restou comprovado nos autos (ID 2192070972). É o relatório. Decido. II - FUNDAMENTAÇÃO O feito tramitou regularmente, observados o contraditório, a ampla defesa e o devido processo legal. Ausentes preliminares ou prejudiciais, passo à análise do mérito. A materialidade delitiva encontra-se devidamente comprovada por meio do Relatório de Fiscalização Ambiental da SEMAD/GO (ID 1354349780, fls. 20/24), que descreve a atividade de extração irregular de areia na Fazenda Ribeirão, área localizada no interior do Território Quilombola Kalunga, sem o devido licenciamento ambiental. Tal constatação foi formalizada no Auto de Infração Ambiental nº 0044 (ID 1354349780, fl. 15), que relata a prática da lavra ilegal de recurso mineral em área de preservação. Confirma-se também a materialidade pelo Laudo Pericial nº 415/2023 – SETEC/SR/PF/DF (ID 1739099076, fls. 10/25), o qual atesta a efetiva retirada de material arenoso, com impactos ambientais localizados, mas sem prejuízo permanente ao curso hídrico ou à cobertura vegetal adjacente. Além disso, corroboram a prática ilícita os depoimentos das testemunhas Robson Disarz, Juliano Ferreira de Souza e Jorge Moreira de Oliveira, prestados em juízo, os quais foram coerentes e convergentes ao apontarem que a extração estava em andamento no momento da fiscalização e ocorria sem qualquer autorização dos órgãos competentes. Por fim, houve ainda a confissão judicial do réu Paulo Pereira dos Santos, que admitiu ter realizado a extração e pagado valores aos posseiros da área, entre eles o corréu José Pereira das Virgens. Quanto à autoria delitiva, restou claro nos autos que o réu Paulo Pereira dos Santos foi o responsável direto pela execução da lavra. Em juízo, confessou que conduzia os caminhões para retirada da areia, sem qualquer autorização da Agência Nacional de Mineração ou da autoridade ambiental estadual. Declarou, ainda, que parte do material era disponibilizado gratuitamente à comunidade Kalunga, e que a atividade tinha como objetivo colaborar com a população local. O próprio réu relatou que interrompeu imediatamente a atividade assim que foi questionado pelos representantes da associação quilombola. Por sua vez, o réu José Pereira das Virgens contribuiu para o fato ao permitir a extração do material em área sob sua posse, bem como ao receber contraprestação pecuniária no valor de R$ 150,00 por caminhão de areia retirado. Embora não tenha comparecido à audiência de instrução, as declarações de Paulo Pereira e das testemunhas foram consistentes ao apontarem que José tinha ciência da atividade e auferia lucro com ela. Sua conduta, portanto, configura coautoria no evento narrado na denúncia. Entretanto, no que tange à tipicidade material da conduta, entendo que não restou caracterizada. É certo que houve tipicidade formal, pois os fatos se enquadram nos moldes dos arts. 55 da Lei 9.605/98 e 2º da Lei 8.176/91. No entanto, a análise do caso sob a ótica do princípio da insignificância penal (ou bagatela própria) conduz à conclusão de que a intervenção penal se mostra desnecessária e desproporcional. A prova dos autos demonstra que foram retirados apenas cerca de oito caminhões pequenos de areia, cuja maior parte foi destinada ao uso da própria comunidade Kalunga, não havendo indícios de exploração comercial sistemática ou em escala relevante. Além disso, os réus cessaram imediatamente a atividade após serem advertidos informalmente pelo presidente da Associação Quilombo Kalunga, e não houve qualquer reiteração da conduta delitiva. Ademais, o Direito Penal deve ser a ultima ratio, incidindo apenas quando outros ramos do direito não forem suficientes para tutelar o bem jurídico em questão. No caso em tela, verifica-se que a simples interpelação do presidente da Associação Quilombo Kalunga foi suficiente para fazer cessar o ilícito ambiental. No mesmo sentido, a incidência do Direito Administrativo resultou em uma multa no valor de R$ 30.500,00, sanção esta que, a meu ver, foi suficiente para tutelar os bens jurídicos em questão (o meio ambiente e o patrimônio da União), afastando a necessidade da incidência do Direito Penal. Cabe ressaltar que se encontram presentes os requisitos caracterizadores do princípio da insignificância, estabelecidos pela jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça: (i) mínima ofensividade da conduta, neste caso demonstrada pelo baixo potencial lesivo, já que o próprio Laudo Pericial aponta que a área atingida denota sinais de regeneração natural da vegetação, sem indícios de atividade de extração mineral recente (ID 1739099076, fl. 20); (ii) ausência de periculosidade social da ação, ou seja, a conduta dos réus não gerou perigo à sociedade; ao contrário, os réus chegaram a ajudar os moradores da própria comunidade; (iii) reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento, uma vez que não houve a intenção de causar graves danos ou mesmo desprezo pelas normas; (iv) inexpressividade da lesão jurídica provocada, pois a pequena quantidade de areia extraída (cerca de oito caminhões pequenos) não lesou de maneira relevante o meio ambiente ou o patrimônio da União. Nesse sentido, colaciono o julgado da Corte Suprema: EMENTA AGRAVO INTERNO EM HABEAS CORPUS. PESCA EM LOCAL PROIBIDO. AUSÊNCIA DE APREENSÃO DE PEIXES OU PETRECHOS DE PESCA PROIBIDOS. PRIMARIEDADE DO PACIENTE. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. HABEAS CORPUS DEFERIDO. 1. No sistema penal brasileiro, o princípio da insignificância é aplicável desde que atendidos, cumulativamente, os requisitos da mínima ofensividade da conduta do agente, da ausência de periculosidade social da ação, do reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e da inexpressividade da lesão jurídica provocada. 2. O princípio da insignificância, se pertinente, incidirá para afastar, no plano material, a própria tipicidade da conduta diante da ausência de lesão ou perigo de lesão ao bem jurídico tutelado. 3. As circunstâncias do delito, na medida em que “não houve a apreensão de nenhum peixe pelos agentes de fiscalização e nem de petrechos de pesca proibidos”, e a primariedade do paciente têm o condão de atrair a caracterização dos requisitos necessários ao reconhecimento da atipicidade da conduta, à aplicação do princípio da insignificância e, em consequência, ao acolhimento do pleito absolutório. 4. Agravo interno desprovido. (HC 186476 AgR, Relator(a): NUNES MARQUES, Segunda Turma, julgado em 14-11-2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 09-01-2023 PUBLIC 10-01-2023). Com efeito, em que pese a defesa técnica ter sustentado a absolvição com base na insuficiência de provas para a condenação (art. 386, VII, do CPP), entendo que o ilícito praticado se deu nas esferas administrativa e cível, ou seja, os elementos do caso concreto revelam a desnecessidade da tutela penal para a proteção do bem jurídico afetado. Portanto, presente a causa supralegal de exclusão da tipicidade material, não se justifica a imposição de sanção criminal em desfavor dos acusados. III - DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a pretensão punitiva estatal e, com fundamento no art. 386, inciso III, do Código de Processo Penal, ABSOLVO os réus PAULO PEREIRA DOS SANTOS e JOSÉ PEREIRA DAS VIRGENS da imputação da prática dos crimes previstos nos artigos 55 da Lei nº 9.605/98 e 2º, caput e §1º, da Lei nº 8.176/91, c/c o art. 70 do Código Penal. Sem condenação de custas. Fixo os honorários do defensor dativo dos réus, Dr. Aécio Flávio Vieira Neto (OAB/GO 47.186), em R$ 536,83. Comunicações de estilo, autorizados os meios eletrônicos. Interposta a apelação, intime-se a parte contrária para apresentar contrarrazões no prazo legal. Em seguida, remetam-se os autos ao TRF 1, para apreciação da admissibilidade do recurso, em observância ao art. 601, do CPP. Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Formosa/GO, data da assinatura eletrônica. Juiz Federal

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Resultados para o tribunal: TRF1

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Processo nº 1003040-91.2022.4.01.3506