Processo nº 5001680-76.2024.4.03.6109
ID: 298787149
Tribunal: TRF3
Órgão: Gab. 12 - DES. FED. WILSON ZAUHY
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 5001680-76.2024.4.03.6109
Data de Disponibilização:
16/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ANDERSON CRYSTIANO DE ARAUJO ROCHA
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 4ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001680-76.2024.4.03.6109 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. WILSON ZAUHY APELANTE: CAIO FELIPE DE LUCENA Advogado d…
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 4ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001680-76.2024.4.03.6109 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. WILSON ZAUHY APELANTE: CAIO FELIPE DE LUCENA Advogado do(a) APELANTE: ANDERSON CRYSTIANO DE ARAUJO ROCHA - SP182116-A APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 4ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001680-76.2024.4.03.6109 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. WILSON ZAUHY APELANTE: CAIO FELIPE DE LUCENA Advogado do(a) APELANTE: ANDERSON CRYSTIANO DE ARAUJO ROCHA - SP182116-A APELADO: DELEGADO DE POLÍCIA FEDERAL DA DELEGACIA DA POLÍCIA FEDERAL DE PIRACICABA/SP, RESPONSÁVEL PELO SISTEMA NACIONAL DE ARMAS - SINARM, UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY (Relator): Trata-se de apelação interposta por CAIO FELIPE DE LUCENA contra a sentença proferida em 8.10.2024 e mantida após a oposição de embargos de declaração, pelo Juízo da 2º Vara Federal da Subseção Judiciária de Piracicaba, SP, que, nos autos do mandado de segurança impetrado na origem em face do DELEGADO DE POLÍCIA FEDERAL DA DELEGACIA DE POLÍCIA FEDERAL DE PIRACICABA/SP, denegou a segurança formulada nos seguintes termos: “DOS PEDIDOS Diante de todo o exposto, requer o impetrante (...) d) Seja, ao final, julgado totalmente procedente o presente mandamus, para: i. Confirmar a medida liminar e conceder definitivamente a ordem judicial para que a autoridade coatora se abstenha de negar a autorização para aquisição de arma de fogo de calibre permitido, mantendo-se a expedição, a validade e a vigência de tal autorização nos termos legais, mediante o cumprimento de todos os requisitos legais, exceto a “comprovação de efetiva necessidade”, eis que esta foi devidamente declarada à autoridade impetrada e a lei não exige sua “comprovação”. ii. Declarar a ilegalidade dos Arts. 2º, XXXV, e 15, III, § 2º e §3º, do Decreto nº 11.615/2024, nas partes em que este equipara os requisitos exigidos para a posse de arma de fogo aos requisitos exigidos para o porte de arma de fogo, afirmando que a posse de arma exige “comprovação” de efetiva necessidade, coisa que o Estatuto do Desarmamento claramente distingue, citando “declaração” e “comprovação” de efetiva necessidade em situações distintas, posse e porte, diferenciando-as. (...)” A parte apelante, em suas razões recursais, narra que, em 22.4.2024, requereu administrativamente autorização para compra de arma de fogo para defesa pessoal e residencial. Relata que o referido requerimento foi indeferido ante a falta de comprovação do requisito denominado “efetiva necessidade” com decisão mantida em sede recursal administrativa. Anota a diferença entre os conceitos de “posse de arma”, “porte de arma” e “arma de atirador desportivo”. Alega, em síntese, que, por obrigação legal, deve manter a segurança do acervo de armas de tiro desportivo de sua propriedade, o que impõe a necessidade de aquisição de arma curta, de calibre permitido, para fins de defesa pessoal e residencial, uma vez que não lhe é permitido manter arma daquele acervo (destinado exclusivamente para a prática do desporto) fora do local de guarda, municiada e pronta para uso em caso de ameaça de roubo. Sustenta que a lei determina expressamente que a “efetiva necessidade” deve ser meramente declarada, manifestada, anunciada, pelo interessado na aquisição e posse de arma de fogo para defesa pessoal em sua residência, nos termos do artigo 4º, “caput”, do Estatuto de Desarmamento. Reforça que, diante da proibição de utilizar armas de tiro desportivo para defesa pessoal e patrimonial, exsurge a necessidade de aquisição e posse de arma de fogo registrada no SINARM da Polícia Federal, porquanto apenas esta pode ser instrumento de defesa pessoal e patrimonial. Defende, de um lado, que a condição de CAC, notadamente de atirador desportivo, constitui exercício de atividade de risco, nos termos do artigo 6º, inciso IX, do Estatuto do Desarmamento, e que, de outro lado, há incongruência legislativa quanto à obrigação do CAC proteger o seu acervo ao mesmo tempo em que àquela legislação proíbe o uso das armas do acervo de tiro desportivo para tal fim. Ao final, pede a reforma da sentença objurgada. Intimada, a UNIÃO apresentou contrarrazões: Id 317838867. Intimado, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL se manifestou pelo regular prosseguimento do feito: Id 319260319. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 4ª Turma APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001680-76.2024.4.03.6109 RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. WILSON ZAUHY APELANTE: CAIO FELIPE DE LUCENA Advogado do(a) APELANTE: ANDERSON CRYSTIANO DE ARAUJO ROCHA - SP182116-A APELADO: DELEGADO DE POLÍCIA FEDERAL DA DELEGACIA DA POLÍCIA FEDERAL DE PIRACICABA/SP, RESPONSÁVEL PELO SISTEMA NACIONAL DE ARMAS - SINARM, UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY (Relator): A controvérsia instalada nos autos se refere ao pedido de aquisição e posse de arma de fogo de uso permitido, formulado no bojo de mandado de segurança, pelo impetrante que exerce atividade de atirador desportivo (CAC), para fins de defesa pessoal e patrimonial. Ao compulsar de forma acurada os autos, verifico que não assiste razão à parte apelante. De início, colaciono os fundamentos da sentença (Id 317838853) impugnada: “(...) Segundo preceitua o artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal, trata-se o mandado de segurança de ação colocada à disposição do indivíduo para a salvaguarda de direito líquido e certo coibido por ilegalidade ou abuso de poder, levados a efeito por autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público. Sua concessão requer não apenas que haja o direito alegado, em verdade o que se exige é a precisão e a comprovação, no momento da impetração da ação, dos fatos e situações que ensejam o exercício do direito que se alega ter, ou seja, prova pré-constituída. Na hipótese a controvérsia reside na negativa da autoridade impetrada em conceder autorização para compra de arma de fogo sob a alegação de ausência de demonstração de efetiva necessidade, nestes termos motivada pelo requerente (id 329475833): “[...] Quanto à minha condição de Atirador Desportivo e IAT – Instrutor de Armamento e Tiro, e da imposição legal de proteger o acervo de atirador guardado em minha residência Informo que sou Atirador Desportivo desde 08/08/2022, registrado no Exército Brasileiro com Certificado de Registro nº 842.875-19. Possuo, apostiladas em meu acervo de atirador, dois exemplares de armas para participação em competições e treinamentos (CRAFs nos anexos desta petição).Também sou Instrutor de Armamento e Tiro formado pelo Delta Star Centro de Formação e Treinamento de Segurança Ltda – CNPJ nº 06.271.596/0001-40, Certificado de Registro nº 84489, e Clube de Tiro Red Delta - CNPJ nº 29.319.507/0001-94, Certificado de Registro nº 239008, comercialmente denominados “PROJETO IAT”, entidade reconhecida pelo Exército e pela Polícia Federal (certificado nos anexos desta petição), pelo que tenho que transitar com armas de fogo desmuniciadas em meu veículo para aplicação das instruções de tiro em diferentes clubes da região. Esta atividade me coloca muito exposto à criminalidade, como adiante será relatado com maiores detalhes. [...] Como será demonstrado adiante, a área onde resido é local ermo e isolado, e vem sofrendo crescente aumento de criminalidade, inclusive com invasão de casas, ora por furtadores, ora por ladrões armados, quando não se trata de violência envolvendo pessoas drogadas ou brigas, que podem acabar com a “invasão não planejada” da residência de algum morador." Por sua vez, a autoridade impetrada inferiu o requerimento motivando-o na falta de demonstração de efetiva necessidade conforme previsto no Decreto 11.615/2023, como risco potencial à vida ou incolumidade ou integridade física própria ou de terceiros, ponderando que o fato de ser CAC e empresário não lhe confere qualquer presunção de necessidade, tampouco as alegações genéricas de aumento da criminalidade (id 329475829). Acerca da pretensão há que considerar que a Lei nº 10.826/2003 dispõe sobre a aquisição de arma de fogo que: Art. 4o Para adquirir arma de fogo de uso permitido o interessado deverá, além de declarar a efetiva necessidade, atender aos seguintes requisitos: I – comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal; I - comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal, que poderão ser fornecidas por meios eletrônicos; (Redação dada pela Lei nº 11.706, de 2008) II – apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita e de residência certa; III – comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, atestadas na forma disposta no regulamento desta Lei. § 1o O Sinarm expedirá autorização de compra de arma de fogo após atendidos os requisitos anteriormente estabelecidos, em nome do requerente e para a arma indicada, sendo intransferível esta autorização. Nesse diapasão, conquanto a efetiva necessidade encerre um conceito indeterminado, há de se reconhecer que esta não pode ser presumida com base na declaração do interessado, cabendo nesse ponto à autoridade administrativa o poder/dever de avaliar se há elementos concretos a evidenciar risco à vida ou integridade física do requerente, até porque as regras estabelecidas no Estatuto do Desarmamento tem por objetivo, conforme denota o nome do diploma legal, o controle estatal mais eficiente sobre as aquisições, registro, posse, porte e o comércio de armas de fogo, o que pressupõe interpretação restritiva. APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. AQUISIÇÃO DE ARMA DE FOGO. 1. Para adquirir arma de fogo, o postulante deve atender a certos requisitos, entre os quais declarar a efetiva necessidade (art. 4º, caput, da Lei n. 10.826/2003 e art. 12 do Decreto n. 5.123/2004), devendo a declaração explicitar os fatos e circunstâncias justificadoras do pedido, que serão examinadas pela Polícia Federal (§1º, do art. 12 do Decreto n. 5.123/2004). 2. A autorização para compra de armas de fogo ato discricionário, o controle judicial deve se limitar à aferição do atendimento aos requisitos legalmente exigidos para a sua concessão, cabendo à autoridade policial, de outro lado, avaliar a conveniência e a oportunidade do seu deferimento. 3. O impetrante não logrou comprovar o requisito efetiva necessidade para a aquisição pretendida, uma vez que já possui outra arma de fogo no mesmo local, para segurança pessoal e patrimonial. (TRF4, AC 5003959-51.2015.4.04.7005, TERCEIRA TURMA, Relatora MARGA INGE BARTH TESSLER, juntado aos autos em 20/04/2016) Ademais, quanto ao controle de legitimidade do ato administrativo discricionário, é cediço que ao Poder Judiciário compete tão somente verificar a sua legalidade estrita, sob pena de ofensa ao princípio da separação dos poderes. ADMINISTRATIVO - AUTORIZAÇÃO PARA PORTE DE ARMA DE FOGO - LEI Nº 10.826/03 - ATO DISCRICIONÁRIO - IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIR A VONTADE DO ADMINISTRADOR - CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE QUE NÃO PODEM SER OBJETO DE ANÁLISE PELO PODER JUDICIÁRIO. 1. Rejeitada alegação de nulidade da decisão administrativa que indeferiu pedido de autorização de porte de arma. Decisão sucinta não equivale a decisão desprovida de fundamentação (REsp n 763.983/RJ, relatora Ministra Nancy Andrighi, DJ: 28/11/2005 e REsp n 734.135/RS, relator Ministro Fernando Gonçalves, DJ: 03/03/2008). 2. O artigo 6º da Lei 10.826/2003, em regra, veda o porte de arma de fogo em todo o território nacional, excetuando-se casos específicos como o de alguns agentes públicos, tais como os integrantes das Forças Armada, das polícias, das guardas municipais, dos guardas prisionais e dos responsáveis pelo transporte de presos, e em outros casos em que há efetiva necessidade de portar o referido instrumento, como os empregados das empresas de segurança privada e de transporte de valores e dos integrantes das entidades de desporto (praticante de tiro esportivo) 3. Ainda em caráter excepcional, admite a lei que outros cidadãos portem armas de fogo de uso permitido, mediante autorização da Polícia Federal, desde que atendidos os requisitos previstos no artigo 10 da referida legislação. 4. A autoridade impetrada indeferiu o pedido de autorização de porte de arma por entender não preencher o impetrante os requisitos previstos no inciso I do artigo 10 do Estatuto do Desarmamento. 5. Não sendo comprovada a necessidade de portar arma de fogo, em decorrência da atividade profissional exercida pelo impetrante, assim como a ameaça à sua integridade física, nada a reparar na sentença denegatória proferida em ação mandamental. 6. Não obstante, assinale-se ser o porte de arma de fogo concedido mediante autorização, ato administrativo discricionário cujo controle pelo Poder Judiciário, se limita ao aspecto da legalidade, sem qualquer incursão sobre a conveniência e oportunidade (mérito). 7. Não há violação à liberdade de escolha do cidadão, pois apesar de, em última análise, ser sua a opção de comprar ou não uma arma de fogo, não está imune às regras, condições e limitações impostas pelo Estado. (grifo nosso) (TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv 0009260-08.2006.4.03.6100 e-DJF3 Judicial 1 DATA:09/06/2011 PÁGINA:1122) ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. AQUISIÇÃO DE ARMA DE FOGO. REQUISITOS. ESTATUTO DO DESARMAMENTO. EFETIVA NECESSIDADE NÃO DEMONSTRADA. DISCRICIONARIEDADE DO ATO. INDEFERIMENTO DA AUTORIDADE POLICIAL. LEGALIDADE. INAPLICABILIDADE DA TEORIA DO FATO CONSUMADO. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL PROVIDAS. SEGURANÇA DENEGADA. - Preliminar de preclusão lógica suscitada em contrarrazões rejeitada, na medida em que a expedição de autorização decorreu do provimento jurisdicional, passível de confirmação ou reforma pelo órgão colegiado, razão pela qual o recurso deve ser conhecido. - O impetrante requereu autorização para compra de arma de fogo de calibre permitido (Carabina cal. 22) no SINARM - Departamento da Polícia Federal de Araçatuba/SP, ao argumento de que precisava adquirir mais uma arma de fogo por ser morador de área rural da cidade, na qual se verifica constante ameaça de roubo e de furto, já ocorrido na chácara em que reside, conforme boletim de ocorrência colacionado, mas teve seu pedido indeferido pela autoridade policial em razão da não constatação de efetiva necessidade. - A “efetiva necessidade” para fins de aquisição de uma arma de fogo é um conceito indeterminado cuja caracterização cabe à administração pública avaliar discricionariamente. Destarte, ao fundamentar a sentença na interpretação literal do artigo 4º da Lei nº 10.826/03, o juízo de origem, na verdade, considerou presumida a “efetiva necessidade” declarada, de forma a retirar da autoridade policial competente o poder/dever de aferir a razoabilidade dos motivos apresentados pelos requerentes, o que não se coaduna com o dever estatal de proteção da coletividade. Precedente do TRF da 2ª Região. - Ao analisar o requerimento, a autoridade competente concluiu que o impetrante já se encontrava munido dos meios adequados para a defesa pessoal e de seu patrimônio, porquanto já tinha uma arma em seu poder, de modo que deixou de preencher o requisito legal da efetiva necessidade (art. 4º, caput, da Lei n. 10.826/2003 e art. 12 do Decreto n. 5.123/2004). À vista de que a autorização para compra de armas de fogo configura ato discricionário, o controle judicial não pode imiscuir-se em seu mérito. Ausente ilegalidade, de rigor a reforma da sentença que concedeu a segurança. - A teoria do fato consumado afigura-se inaplicável ao caso, à vista do reconhecimento da ausência do direito pleiteado, inobstante se reconheça que a expedição da autorização pleiteada já se concretizou por força da sentença concessiva da segurança. Precedente do STJ. - Preliminar suscitada em contrarrazões rejeitada. Apelação e remessa oficial providas para reformar a sentença e denegar a segurança. (TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5000365-29.2018.4.03.6107, Rel. Desembargador Federal SILVIO LUIS FERREIRA DA ROCHA, julgado em 17/02/2021, Intimação via sistema DATA: 01/03/2021) Nesse contexto, não entrevejo qualquer ilegalidade ou abuso por parte da autoridade impetrada em sua atividade discricionária, uma vez que a condição de CAC não autoriza o porte de arma, e a alegação genérica de aumento da criminalidade não denota situação excepcional em relação a qualquer outro cidadão. (...)” Anoto, ainda, que o pleito administrativo foi deduzido já na vigência do Decreto 11.615, de 2023, e sob essa disciplina infralegal é que deverá ser analisado o pedido deduzido no “mandamus”. Quanto ao tema de fundo, a jurisprudência já consolidou o entendimento de que a expedição de autorização para aquisição e posse de arma de fogo de uso permitido necessita do preenchimento de determinados requisitos que, à época em que deduzido o requerimento pelo impetrante (abril de 2024), são os mencionados no Decreto 11.615, de 21 de julho de 2023, como já referido. De tal sorte, sob o comando estrito desta disciplina infralegal, competia à autoridade policial a análise dos requisitos postos por ela, dentre eles a comprovada necessidade de aquisição e posse de arma de fogo. E sob esse enfoque não restou demonstrado, à época, segundo juízo da autoridade coatora, a efetiva necessidade de posse de arma de fogo em comento. Não obstante pretenda o impetrante invocar questões de fato para a concessão da ordem, em particular o fato de ser atirador esportivo (CAC), tal circunstância foi apreciada e fundamentadamente rechaçada pela autoridade policial, dentro de seu juízo de conveniência e oportunidade, não sindicada, sob esse enfoque, pelo Poder Judiciário. Nessa linha de entendimento já se posicionou essa Egrégia 4ª Turma: “ADMINISTRATIVO. PORTE DE ARMA. RENOVAÇÃO DE CERTIFICADO E REGISTRO FEDERAL DE ARMA DE FOGO. LEI 10.826/2003. REGULARIZAÇÃO. POSSIBILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.REDUÇÃO. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Em regra é vedado o porte de arma de fogo em todo território nacional, excetuando-se casos específicos, como o de agentes públicos, tais como os integrantes das Forças Armadas e dos responsáveis por transporte de presos e, em outros casos, em que se identifica a efetiva necessidade de portá-la, como os empregados de empresas de segurança privada e integrantes das entidades de desporto. 2. Em caráter excepcional, a lei admite que outros cidadãos portem arma de fogo de uso permitido, mediante autorização da Polícia Federal, desde que atendidos os requisitos previstos no artigo 10 do Estatuto do Desarmamento. 3. Com efeito, a autorização de concessão de porte de arma de fogo constitui ato discricionário da Administração Pública e é ato sujeito ao preenchimento de requisitos legais e ao juízo favorável de conveniência e oportunidade da Administração Pública. 4. Por se tratar de ato discricionário da Administração Pública, a autorização de concessão de porte de arma, o Poder Judiciário não tem o poder de fazer o controle sobre o mérito do ato administrativo, cabendo-lhe apenas analisar os aspectos relacionados à legalidade do ato, sem qualquer incursão sobre a conveniência e oportunidade (mérito). 5. In casu, de rigor observar que a arma cuja entrega é exigida, qual seja, Carabina Rossi calibre .38 tem como série o nº 2035000, que não corresponde a carabina de propriedade da apelada, qual seja, B099312. Ademais, o número 2035000 é o número de série do revólver Taurus, calibre .38, de propriedade da apelada. 6. Destarte, é bem de ver que a autoridade administrativa exige a entrega de uma Carabina cujos dados não conferem com a de propriedade da apelada. 7. No que tange a Pistola Imbel, calibre .45, série nº 100737, restou comprovado que a apelada requereu sua inclusão ao General Comandante da 2ª Região Militar em 1997, reiterando seu pedido em sucessivos requerimentos administrativos. 8. Impõe-se o direito da apelada de proceder a regularização das armas de sua propriedade, todavia, não há que se falar em inclusão imediata das referidas armas no Sistema de Gerenciamento Militar de Armas - SIGMA. 9. Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, a teor do disposto no art. 20, §4°, do CPC/1973. 10. Apelação e remessa oficial parcialmente providas” (destaquei). (TRF da 3ª Região, Apelação/Remessa Necessária nº 0001554-81.2014.4.03.6103, Rel. Desembargador Federal Marcelo Saraiva, Quarta Turma, DJEN: 06/08/2024). No mesmo sentido: “APELAÇÃO CÍVEL. ADMINISTRATIVO. LEI Nº 10.826/2003. AUTORIZAÇÃO PARA PORTE DE ARMA DE FOGO. PODER DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO. 1. A questão tratada nestes autos é regida pela Lei nº 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento), que dispõe sobre o registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição. 2. Nos termos do art. 10, § 1º, I, da Lei nº 10.826/2003, para a obtenção da autorização do porte de arma de fogo o requerente deve demonstrar a sua efetiva necessidade, em razão do exercício de atividade profissional de risco ou de ameaça à integridade física do postulante. 3. Nos casos envolvendo o preenchimento dos requisitos necessários para a concessão de autorização para porte de arma de fogo, há que se respeitar a discricionariedade da Administração, cabendo ao Poder Judiciário intervir apenas em casos em que restarem comprovadas ilegalidades na atuação administrativa. 4. Conforme se verifica do procedimento administrativo juntado aos autos, houve análise das alegações e documentos fornecidos pelo Apelante, não restando caracterizada eventual ofensa às normas legais aplicáveis à matéria. 5. O impetrante juntou aos autos a Certidão Negativa de Antecedentes Criminais da Polícia Civil e a Certidão Negativa da Justiça Federal, cumprindo o requisito do art. 4º, I c/c art. 10, § 1º, II, ambos da Lei nº 10.826/2003. 6. As alegações trazidas pelo impetrante não se mostraram suficientes para a alteração da decisão administrativa. 7. Apelação do impetrante improvida” (destaquei). (TRF da 3ª Região, Apelação Cível nº 5005468-96.2022.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal Wilson Zauhy, Quarta Turma, julgamento em 18/04/2024, intimação via sistema em 23/04/2024). As referidas alegações foram devidamente apreciadas em sede administrativa, conforme Id 317838723: “(...) 2. Não obstante o preenchimento dos requisitos objetivos, no caso em concreto, o requerente não conseguiu comprovar o requisito subjetivo. Isso porque, a legislação em vigor (Dec. 11.615/23) exige que o requerente demonstre fatos e as circunstâncias CONCRETAS justificadoras do pedido, como as atividades exercidas e os critérios pessoais, especialmente os que demonstrem INDÍCIOS DE RISCOS POTENCIAIS à vida, incolumidade ou integridade física, própria ou de terceiros. O fato de ser C.A.C. e empresário não lhe confere, por si só, qualquer presunção de que preenhce (SIC) o requisito de efetiva necessidade, vez que a lei não traz qualquer regra nesse sentido. A despeito das alegações genéricas de criminalidade crescente em sua cidade, não trouxe nenhum elemento concreto relacionado à sua pessoa que pudesse comprovar o requisito subjetivo. (...)” Em sede de informações prestadas (Id 317838851), a autoridade coatora esclareceu que: “(...) DAS INFORMAÇÕES O Estatuto do Desarmamento estabelece que: Art. 4o Para adquirir arma de fogo de uso permitido o interessado deverá, além de declarar a efetiva necessidade, atender aos seguintes requisitos: I - comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal, que poderão ser fornecidas por meios eletrônicos; II – apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita e de residência certa; III – comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, atestadas na forma disposta no regulamento desta Lei. Os requisitos previstos nos incisos I, II e III do referido dispositivo legal são considerados de ordem objetiva, restando devidamente comprovados com a juntada da documentação correlata. No caso em concreto, inclusive, o impetrante conseguiu comprovar todos esses requisitos no curso do processo administrativo para aquisição de arma de fogo. Contudo, verifica-se que no "caput" do mesmo dispositivo legal existe um requisito de ordem subjetiva (efetiva necessidade), que deve ser comprovado de forma cabal e concreta pelo seu interessado. Analisando-se o processo administrativo 202404221829386515, e conforme bem destacado pelo impetrante, os requisitos objetivos foram devidamente preenchidos. De outro vértice, contudo, o impetrante não comprovou o requisito subjetivo. Como para o deferimento do pedido de aquisição de posse (e porte) de arma de fogo é imprescindível que o interessado preencha TODOS os requisitos, não sendo suficiente o preenchimento apenas dos requisitos de ordem objetiva; ausente um requisito, não resta outra alternativa ao administrador público a não ser o indeferimento do pedido, como ocorreu no caso em concreto. Impende destacar que o administrador público, quando da apreciação de um pedido que lhe é formulado, deve se ater a toda a legislação pátria em vigor, não podendo aplicar uma e desconsiderar outra (p.ex.), ao argumento de que essa seja ilegal ou inconstitucional. Estando em vigor as normas possuem eficácia, devendo ser aplicadas de forma harmônica. Quando se trata de aquisição (e outros assuntos correlatos) de armas de fogo o administrador público deverá, neste momento, aplicar as regras contidas no Estatuto do Desarmamento e seu Decreto regulamentador (no caso, o Dec. 11.615/23); além disso, no âmbito do SINARM a Polícia Federal está vinculada também à IN n.º 201/2021-DG/PF (essa será aplicada naquilo em que houver compatibilidade com o Dec. 11.615/23!). O § 3.º do art. 15 do Dec. 11.615/2023 estabelece que para a comprovação da efetiva necessidade o interessado deverá demonstrar os fatos e as circunstâncias concretas justificadoras do Ofício 241 (36559341) SEI 08212.001323/2024-12 / pg. 2 pedido, como as atividades exercidas e os critérios pessoais, especialmente os que demonstrem indícios de riscos potenciais à vida, à incolumidade ou à integridade física, própria ou de terceiros. Veja-se que o legislador exige que haja a comprovação de indícios que demonstrem riscos potenciais, não sendo possível a supressão dessa intenção com a mera existência de riscos abstratos. Inclusive, como o ordenamento jurídico pátrio deve ser interpretado de uma forma harmônica, bem como considerando os princípios que norteiam toda a Administração Pública, não podemos nos afastar dos preceitos estabelecidos quando do julgamento da ADI n.º 6119 que, de maneira geral, fixou a orientação hermenêutica de que a posse de armas de fogo só pode ser autorizada às pessoas que demonstrarem concretamente, por razões profissionais ou pessoais, possuírem efetiva necessidade. Entretanto, no caso em concreto o impetrante não conseguiu demonstrar, de forma concreta, os indícios de riscos potenciais à sua vida, incolumidade ou integridade física, própria ou de terceiros, trazendo apenas riscos abstratos. Basicamente, usou como fundamentos de sua declaração o fato de ser advogado criminalista e jornalista, além de ser possuidor de outras armas de fogo (registradas junto ao SIGMA). Destaque-se que o fato de ser empresário (independentemente do ramo de atuação) e IAT não traz, em princípio, qualquer diferenciação de tratamento em relação aos demais interessados em adquirir uma arma de fogo, sendo imprescindível a comprovação de riscos concretos para o preenchimento do requisito objetivo. Raciocínio diverso, em tese, poderia afrontar o princípio constitucional da isonomia. E mais: caso o legislador tivesse a intenção de dar tratamento diferenciado aos empresários e IATs ele o teria feito de forma expressa , assim como ocorre com outras categorias profissionais em que há dispensa do cumprimento de alguns requisitos legais para a aquisição (renovação e porte) de arma de fogo. Imprescindível que o requisito subjetivo da efetiva necessidade esteja lastreado em indícios mínimos de veracidade e plausibilidade, não bastando declarações abstratas, como se deu no caso em concreto no âmbito administrativo. Decidir pelo deferimento pautado em declarações abstratas, faria com que o administrador fugisse à observância da legislação pátria vigente, violando o princípio constitucional da legalidade. Mesmo em se tratando de ato discricionário (como ocorre quando da apreciação do requisito subjetivo) o administrador não pode se afastar dos critérios da lei (em sentido amplo), sob pena de violar referido princípio constitucional. Nesse sentido, Esse princípio impõe ao administrador público a obrigação de atuar nos estritos limites impostos pela lei (latu sensu), não sendo possível que aquele pratique condutas que considere devidas, sem que haja o devido embasamento legal específico. Inexistindo previsão legal, o administrador público está proibido de atuar, sob pena de incorrer em ilegalidade. Em razão disso, parte da Doutrina afirma que a Administração Pública está adstrita ao princípio da subordinação à lei. (NARDI, Rodrigo Perin. Carreiras Policiais - Direito Constitucional. 2.ª ed., rev., atual. e ampl. São Paulo: Juspodivm, 2023. p. 476). Voltando ao caso em concreto, verifica-se que o impetrante, em momento algum, conseguiu comprovar concretamente a efetiva necessidade para a aquisição de arma de fogo, razão pela qual teve seu pedido indeferido. Impende ressaltar, também, que a despeito do raciocínio mantido pelo impetrante nos últimos parágrafos da página 9 da exordial, mesmo se fosse deferido o pedido para aquisição de arma de fogo para fins de defesa pessoal, essa arma também deverá ficar desmuniciada, conforme preceitua o inciso VIII do art. 15 do Dec. 11.615/23: VIII - apresentar declaração de que a sua residência possui cofre ou lugar seguro, com tranca, para armazenamento das armas de fogo desmuniciadas de que seja proprietário (...). Sublinhe-se, ainda, que a despeito do impetrante alegar que preencheu os requisitos exigidos pela legislação, denota-se que não conseguiu comprovar o requisito de ordem subjetiva, mas apenas os de natureza objetiva. Embora o indeferimento seja pela não comprovação da efetiva necessidade, na exordial o foco principal gira em torno dos requisitos objetivos (os quais foram, conforme já ditos, preenchidos). (...)" De rigor, portanto, a conservação da sentença objurgada. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação, nos termos da fundamentação. É como voto. E M E N T A APELAÇÃO.. MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO ADMINISTRATIVO. REQUERIMENTO DE AQUISIÇÃO E POSSE DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. ATIRADOR DESPORTIVO. CAC. DECRETO Nº 11.615/2023.. REQUERIMENTO INDEFERIDO. PODER DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. 1. A controvérsia instalada nos autos se refere ao pedido de aquisição e posse de arma de fogo de uso permitido, formulado no bojo de mandado de segurança, pelo impetrante que exerce atividade de atirador desportivo (CAC), para fins de defesa pessoal e patrimonial. 2. Quanto ao tema de fundo, a jurisprudência já consolidou o entendimento de que a expedição de autorização para aquisição e posse de arma de fogo de uso permitido necessita do preenchimento de determinados requisitos que, à época em que deduzido o requerimento pelo impetrante (abril de 2024), são os mencionados no Decreto 11.615, de 21 de julho de 2023, como já referido. 3. De tal sorte, sob o comando estrito desta disciplina infralegal, competia à autoridade policial a análise dos requisitos postos por ela, dentre eles a comprovada necessidade de aquisição e posse de arma de fogo. E sob esse enfoque não restou demonstrado, à época, segundo juízo da autoridade coatora, a efetiva necessidade de posse de arma de fogo em comento. 4. Não obstante pretenda o impetrante invocar questões de fato para a concessão da ordem, em particular o fato de ser atirador esportivo (CAC), tal circunstância foi apreciada e fundamentadamente rechaçada pela autoridade policial, dentro de seu juízo de conveniência e oportunidade, não sindicada, sob esse enfoque, pelo Poder Judiciário. Nessa linha de entendimento já se posicionou essa Egrégia 4ª Turma: (TRF da 3ª Região, Apelação/Remessa Necessária nº 0001554-81.2014.4.03.6103, Rel. Desembargador Federal Marcelo Saraiva, Quarta Turma, DJEN: 06/08/2024). No mesmo sentido: (TRF da 3ª Região, Apelação Cível nº 5005468-96.2022.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal Wilson Zauhy, Quarta Turma, julgamento em 18/04/2024, intimação via sistema em 23/04/2024). 5. Apelação não provida. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO ao recurso de apelação, nos termos do voto do Des. Fed. WILSON ZAUHY (Relator), com quem votaram a Des. Fed. LEILA PAIVA e o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. WILSON ZAUHY Desembargador Federal
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