Processo nº 5009183-24.2025.4.04.7003
ID: 321720563
Tribunal: TRF4
Órgão: 2ª Vara Federal de Maringá
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 5009183-24.2025.4.04.7003
Data de Disponibilização:
10/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VICTOR HUGO HANGAI
OAB/PR XXXXXX
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PROCEDIMENTO COMUM Nº 5009183-24.2025.4.04.7003/PR
AUTOR
: IVONE LEMES KRAQUER
ADVOGADO(A)
: VICTOR HUGO HANGAI (OAB PR076919)
AUTOR
: PEDRO KRAQUER
ADVOGADO(A)
: VICTOR HUGO HANGAI (OAB PR076919)
D…
PROCEDIMENTO COMUM Nº 5009183-24.2025.4.04.7003/PR
AUTOR
: IVONE LEMES KRAQUER
ADVOGADO(A)
: VICTOR HUGO HANGAI (OAB PR076919)
AUTOR
: PEDRO KRAQUER
ADVOGADO(A)
: VICTOR HUGO HANGAI (OAB PR076919)
DESPACHO/DECISÃO
Trata-se de ação ajuizada por
IVONE LEMES KRAQUER
e
PEDRO KRAQUER
em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, na qual pretendem:
"
(...)
b)
Seja
deferido o pedido de tutela de urgência de natureza antecipada, com o intuito de que a parte Requerida deixe de promover o prosseguimento dos atos expropriatórios extrajudiciais
, com efeitos EX TUNC, suspendendo a realização dos leilões públicos envolvendo o imóvel que é objeto do contrato sub judice, ante o preenchimento dos requisitos previstos no artigo 300 do Código de Processo Civil, nos termos da fundamentação;
c)
Seja
reconhecido o direito da parte Autora de purgar a mora mesmo após o registro da consolidação da propriedade, levando em conta que este pagamento se faz possível até antes da expedição de auto de arrematação
, por interpretação do Decreto-Lei 70/66 e Lei 9.514/97 (vigentes quando as partes assinaram o contrato), em atenção a caracterização de ato jurídico perfeito, bem como,
em atenção ao posicionamento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça e demais Cortes deste país
, nos termos da fundamentação; (...)
h)
Não havendo composição amigável entre as partes em audiência conciliatória, seja mantida a suspensão de qualquer ato extrajudicial para com o bem imóvel e, em sentença, seja garantida a parte Autora a reabertura contratual, a possibilidade de promover a purgação da mora, considerando a tese apresentada (reabertura contratual, tempus regit actum);
j)
Eventualmente, em caso de arrematação extrajudicial do bem imóvel, seja a requerida condenada a promover a realização de depósito judicial vinculado aos autos, considerando a importância a sobejar, e;
k)
Seja dada a total procedência dos pedidos acima expostos."
Relatam e alegam, em síntese, que:
(i)
em 20 de maio de 2015, firmaram “contrato de venda e compra de terreno e mútuo para construção de unidade habitacional, alienação fiduciária em garantia e outras obrigações - Programa Minha Casa, Minha Vida”;
(ii)
em razão de dificuldades financeiras, não conseguiram honrar com o pagamento de parcelas do contrato de financiamento;
(iii)
pelo mesmo motivo, não procederam à purgação da mora;
(iv)
possuem interesse em resguardar a moradia, permanecendo na posse do imóvel em que residem, efetuando a purgação da mora - possível enquanto não expedido o auto de arrematação.
Juntam documentos.
Requerem a concessão da gratuidade da justiça e a incidência das normas do Código de Defesa do Consumidor, inclusive a inversão do ônus da prova.
Manifestam interesse na audiência de conciliação.
Dão à causa o valor de R$ 82.500,00 (oitenta e dois mil e quinhentos reais).
DECIDO.
1.
Defiro os benefícios da justiça gratuita.
2.
Considerando-se o valor atribuído à causa, altere-se a classe processual para "Procedimento do Juizado Especial Cível".
3.
Intime-se a parte autora para, em 15 (quinze) dias, juntar a cópia integral do procedimento junto ao Serviço Registral Imobiliário - 1º Ofício - Jandaia do Sul/PR (
matrícula nº 12.742
), no qual deverão constar inclusive as certidões relativas a
todas
as intimações/tentativas de intimação do(s) devedore(s) para pugarem a mora, e requerimento(s) apresentados pelo credor financeiro.
4. Tutela provisória
A concessão da tutela provisória fundamentada na urgência deve atender aos requisitos de probabilidade do direito e perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (art. 300,
caput
,
do CPC).
No caso, não restou demonstrada a probabilidade do direito.
Os autores firmaram com a Caixa, em 20 de maio de 2015, contrato de financiamento garantido por alienação fiduciária do imóvel.
A Lei nº 9.514/97, ao instituir a alienação fiduciária de coisa imóvel no âmbito do Sistema de Financiamento Imobiliário, assim dispôs:
Art. 26. Vencida e não paga a dívida, no todo ou em parte, e constituídos em mora o devedor e, se for o caso, o terceiro fiduciante, será consolidada, nos termos deste artigo, a propriedade do imóvel em nome do fiduciário.
(Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 1º Para fins do disposto neste artigo, o devedor e, se for o caso, o terceiro fiduciante serão intimados, a requerimento do fiduciário, pelo oficial do registro de imóveis competente, a satisfazer, no prazo de 15 (quinze) dias, a prestação vencida e aquelas que vencerem até a data do pagamento, os juros convencionais, as penalidades e os demais encargos contratuais, os encargos legais, inclusive os tributos, as contribuições condominiais imputáveis ao imóvel e as despesas de cobrança e de intimação.
(Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 1º-A Na hipótese de haver imóveis localizados em mais de uma circunscrição imobiliária em garantia da mesma dívida, a intimação para purgação da mora poderá ser requerida a qualquer um dos registradores competentes e, uma vez realizada, importa em cumprimento do requisito de intimação em todos os procedimentos de excussão, desde que informe a totalidade da dívida e dos imóveis passíveis de consolidação de propriedade.
(Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 2º O contrato poderá estabelecer o prazo de carência, após o qual será expedida a intimação.
(Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 2º-A Quando não for estabelecido o prazo de carência no contrato de que trata o § 2º deste artigo, este será de 15 (quinze) dias.
(Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 3º A intimação será feita pessoalmente ao devedor e, se for o caso, ao terceiro fiduciante, que por esse ato serão cientificados de que, se a mora não for purgada no prazo legal, a propriedade será consolidada no patrimônio do credor e o imóvel será levado a leilão nos termos dos arts. 26-A, 27 e 27-A desta Lei, conforme o caso, hipótese em que a intimação poderá ser promovida por solicitação do oficial do registro de imóveis, por oficial de registro de títulos e documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva recebê-la, ou pelo correio, com aviso de recebimento, situação em que se aplica, no que couber, o disposto no
art. 160 da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973
(Lei de Registros Públicos).
(Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 3
o
-A. Quando, por duas vezes, o oficial de registro de imóveis ou de registro de títulos e documentos ou o serventuário por eles credenciado houver procurado o intimando em seu domicílio ou residência sem o encontrar, deverá, havendo suspeita motivada de ocultação, intimar qualquer pessoa da família ou, em sua falta, qualquer vizinho de que, no dia útil imediato, retornará ao imóvel, a fim de efetuar a intimação, na hora que designar, aplicando-se subsidiariamente o disposto nos arts. 252, 253 e 254 da Lei n
o
13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).
(Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)
§ 3
o
-B. Nos condomínios edilícios ou outras espécies de conjuntos imobiliários com controle de acesso, a intimação de que trata o § 3
o
-A poderá ser feita ao funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência.
(Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)
§ 4º Quando o devedor ou, se for o caso, o terceiro fiduciante, o cessionário, o representante legal ou o procurador regularmente constituído encontrar-se em local ignorado, incerto ou inacessível, o fato será certificado pelo serventuário encarregado da diligência e informado ao oficial de registro de imóveis, que, à vista da certidão, promoverá a intimação por edital publicado pelo período mínimo de 3 (três) dias em jornal de maior circulação local ou em jornal de comarca de fácil acesso, se o local não dispuser de imprensa diária, contado o prazo para purgação da mora da data da última publicação do edital.
(Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 4º-A É responsabilidade do devedor e, se for o caso, do terceiro fiduciante informar ao credor fiduciário sobre a alteração de seu domicílio.
(Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 4º-B Presume-se que o devedor e, se for o caso, o terceiro fiduciante encontram-se em lugar ignorado quando não forem encontrados no local do imóvel dado em garantia nem no endereço que tenham fornecido por último, observado que, na hipótese de o devedor ter fornecido contato eletrônico no contrato, é imprescindível o envio da intimação por essa via com, no mínimo, 15 (quinze) dias de antecedência da realização de intimação edilícia.
(Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 4º-C Para fins do disposto no § 4º deste artigo, considera-se lugar inacessível:
(Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023)
I - aquele em que o funcionário responsável pelo recebimento de correspondência se recuse a atender a pessoa encarregada pela intimação; ou
(Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023)
II - aquele em que não haja funcionário responsável pelo recebimento de correspondência para atender a pessoa encarregada pela intimação.
(Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 5º Purgada a mora no Registro de Imóveis, convalescerá o contrato de alienação fiduciária.
§ 6º O oficial do Registro de Imóveis, nos três dias seguintes à purgação da mora, entregará ao fiduciário as importâncias recebidas, deduzidas as despesas de cobrança e de intimação.
§ 7º Decorrido o prazo de que trata o § 1º sem a purgação da mora, o oficial do competente Registro de Imóveis, certificando esse fato, promoverá a averbação, na matrícula do imóvel, da consolidação da propriedade em nome do fiduciário, à vista da prova do pagamento por este, do imposto de transmissão inter vivos e, se for o caso, do laudêmio.
(Redação dada pela Lei nº 10.931, de 2004)
§ 8
o
O fiduciante pode, com a anuência do fiduciário, dar seu direito eventual ao imóvel em pagamento da dívida, dispensados os procedimentos previstos no art. 27.
(Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)
Art. 26-A. Os procedimentos de cobrança, purgação de mora, consolidação da propriedade fiduciária e leilão decorrentes de financiamentos para aquisição ou construção de imóvel residencial do devedor, exceto as operações do sistema de consórcio de que trata a
Lei nº 11.795, de 8 de outubro de 2008
, estão sujeitos às normas especiais estabelecidas neste artigo.
(Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 1
o
A consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário será averbada no registro de imóveis trinta dias após a expiração do prazo para purgação da mora de que trata o § 1
o
do art. 26 desta Lei.
(Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)
§ 2º Até a data da averbação da consolidação da propriedade fiduciária, é assegurado ao devedor e, se for o caso, ao terceiro fiduciante pagar as parcelas da dívida vencidas e as despesas de que trata o inciso II do § 3º do art. 27 desta Lei, hipótese em que convalescerá o contrato de alienação fiduciária.
(Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 3º No segundo leilão, será aceito o maior lance oferecido desde que seja igual ou superior ao valor integral da dívida garantida pela alienação fiduciária mais antiga vigente sobre o bem, das despesas, inclusive emolumentos cartorários, dos prêmios de seguro, dos encargos legais, inclusive tributos, e das contribuições condominiais.
(Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 4º Se no segundo leilão não houver lance que atenda ao referencial mínimo para arrematação estabelecido no § 3º deste artigo, a dívida será considerada extinta, com recíproca quitação, hipótese em que o credor ficará investido da livre disponibilidade.
(Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 5º A extinção da dívida no excedente ao referencial mínimo para arrematação configura condição resolutiva inerente à dívida e, por isso, estende-se às hipóteses em que o credor tenha preferido o uso da via judicial para executar a dívida.
(Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023)
Art. 27. Consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário promoverá leilão público para a alienação do imóvel, no prazo de 60 (sessenta) dias, contado da data do registro de que trata o § 7º do art. 26 desta Lei.
(Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 1
o
Se no primeiro leilão público o maior lance oferecido for inferior ao valor do imóvel, estipulado na forma do inciso VI e do parágrafo único do art. 24 desta Lei, será realizado o segundo leilão nos quinze dias seguintes.
(Redação dada pela Lei nº 13.465, de 2017)
§ 2º No segundo leilão, será aceito o maior lance oferecido, desde que seja igual ou superior ao valor integral da dívida garantida pela alienação fiduciária, das despesas, inclusive emolumentos cartorários, dos prêmios de seguro, dos encargos legais, inclusive tributos, e das contribuições condominiais, podendo, caso não haja lance que alcance referido valor, ser aceito pelo credor fiduciário, a seu exclusivo critério, lance que corresponda a, pelo menos, metade do valor de avaliação do bem.
(Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 2
o
-A. Para os fins do disposto nos §§ 1
o
e 2
o
deste artigo, as datas, horários e locais dos leilões serão comunicados ao devedor mediante correspondência dirigida aos endereços constantes do contrato, inclusive ao endereço eletrônico.
(Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017)
§ 2º-A Para fins do disposto nos §§ 1º e 2º deste artigo, as datas, os horários e os locais dos leilões serão comunicados ao devedor e, se for o caso, ao terceiro fiduciante, por meio de correspondência dirigida aos endereços constantes do contrato, inclusive ao endereço eletrônico.
(Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 2º-B Após a averbação da consolidação da propriedade fiduciária no patrimônio do credor fiduciário e até a data da realização do segundo leilão, é assegurado ao fiduciante o direito de preferência para adquirir o imóvel por preço correspondente ao valor da dívida, somado às despesas, aos prêmios de seguro, aos encargos legais, às contribuições condominiais, aos tributos, inclusive os valores correspondentes ao imposto sobre transmissão inter vivos e ao laudêmio, se for o caso, pagos para efeito de consolidação da propriedade fiduciária no patrimônio do credor fiduciário, e às despesas inerentes aos procedimentos de cobrança e leilão, hipótese em que incumbirá também ao fiduciante o pagamento dos encargos tributários e das despesas exigíveis para a nova aquisição do imóvel, inclusive das custas e dos emolumentos.
(Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023)
§ 3º Para os fins do disposto neste artigo, entende-se por:
I - dívida: o saldo devedor da operação de alienação fiduciária, na data do leilão, nele incluídos os juros convencionais, as penalidades e os demais encargos contratuais;
II - despesas: a soma das importâncias correspondentes aos encargos e às custas de intimação e daquelas necessárias à realização do leilão público, compreendidas as relativas aos anúncios e à comissão do leiloeiro; e
(Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023)
III - encargos do imóvel: os prêmios de seguro e os encargos legais, inclusive tributos e contribuições condominiais.
(Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023)
(...)
Os autores reconhecem a inadimplência das prestações do contrato de mútuo habitacional, o que teria ocorrido por dificuldades financeiras.
O contrato é manifestação da autonomia da vontade. Em regra, desde que a vontade seja exteriorizada sem vícios (dolo, coação, vício redibitório etc.), o instrumento vincula as partes, obrigando-as ao cumprimento das cláusulas avençadas, o que aparentemente é a situação dos autos.
Mesmo em se tratando de inadimplemento motivado por causa alheia à vontade do contratante (como desemprego e dificuldades financeiras) não configura motivo justificável, nem sob a ótica da teoria da imprevisão, para justificar a mora da parte devedora e relativizar as normas legais e contratuais.
Isto porque a alteração da situação econômico-financeira do mutuário representa questão subjetiva e não global. E,
diante de um contrato de tão longa duração, a perda financeira alardeada
não pode ser considerada um acontecimento extraordinário e imprevisível
, tampouco implica desvantagem exagerada de uma das partes em detrimento da outra, sendo incapaz de autorizar a subsunção almejada.
A propósito, confira-se o seguinte precedente:
ADMINISTRATIVO. SFH. INADIMPLÊNCIA. DIFICULDADES FINANCEIRAS EM RAZÃO DA PANDEMIA. TEORIA DA IMPREVISÃO. INCABÍVEL. A mera alegação de dificuldades financeiras não tem o condão de elidir a inadimplência em que a ré incorreu, tendo em vista que a simples inobservância das cláusulas contratuais já enseja a consolidação da propriedade em nome do fiduciário. Embora a situação de emergência de saúde pública, decorrente da pandemia do vírus Covid-19, legitime a implementação de providências excepcionais, é indispensável cautela na flexibilização do cumprimento de contratos e da própria legislação vigente, não cabendo ao Judiciário - que não dispõe de todos os elementos necessários para aquilatar os efeitos deletérios da suspensão do pagamento das dívidas dos que enfrentam dificuldades financeiras - intervir nessa seara. A simples alegação de redução de renda não é motivo hábil e suficiente para invocação da teoria da imprevisão (art. 478 do Código Civil), justamente ante a ausência do requisito "extrema vantagem para a outra". (TRF4, AC 5004911-36.2020.4.04.7108, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 27/05/2021)
Conforme se verifica na matrícula anexada ao evento 1 - MATRIMÓVEL, a consolidação da propriedade do imóvel foi averbada em dezembro de 2024 (AV-04/12.742), com a informação de que os mutuários foram regularmente intimados para purgação da mora e deixaram transcorrer o prazo para tanto. Tal informação é dotada de fé pública.
Os autores têm acesso, junto ao Registro de Imóveis, ao procedimento extrajudicial que resultou na consolidação da propriedade, mas nada juntaram aos autos para afastar a presunção de que houve a notificação para purgar a mora.
Segundo o art. 27 da Lei nº 9.514/97, uma vez consolidada a propriedade, o credor fiduciário promoverá o público leilão para a alienação do imóvel.
No que tange à alegada possibilidade de o mutuário purgar a mora até a assinatura do auto de arrematação, tal medida era reconhecida pela jurisprudência face à possibilidade de aplicação do art. 34 do Decreto-lei nº 70/66 ao procedimento expropriatório de imóvel gravado com alienação fiduciária em garantia.
Contudo, a alteração da Lei nº 9.514/97, operada pela Lei nº 13.465/2017, afastou definitivamente tal faculdade em 11/07/2017, com a incrementação do artigo 26-A, §2º, que permitiu a purgação da mora somente até data da averbação da consolidação da propriedade do imóvel em nome do banco, e revogação do art. 39, II, da mesma lei (i.e. o art. 34 do Decreto-lei nº 70/66 não mais se aplica ao procedimento expropriatório da Lei nº 9.514/97).
Seguem abaixo os referidos dispositivos legais:
Art. 26-A. Os procedimentos de cobrança, purgação de mora e consolidação da propriedade fiduciária relativos às operações de financiamento habitacional, inclusive as operações do Programa Minha Casa, Minha Vida, instituído pela Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009, com recursos advindos da integralização de cotas no Fundo de Arrendamento Residencial (FAR), sujeitam-se às normas especiais estabelecidas neste artigo.
(...)
§ 2º Até a data da averbação da consolidação da propriedade fiduciária, é assegurado ao devedor fiduciante pagar as parcelas da dívida vencidas e as despesas de que trata o inciso II do § 3o do art. 27, hipótese em que convalescerá o contrato de alienação fiduciária.
Art. 39. Às operações de crédito compreendidas no sistema de financiamento imobiliário, a que se refere esta Lei:
(...)
II - aplicam-se as disposições dos arts. 29 a 41 do Decreto-Lei nº 70, de 21 de novembro de 1966, exclusivamente aos procedimentos de execução de créditos garantidos por hipoteca.
Assim, como o registro da consolidação da propriedade na matrícula do imóvel se deu após a entrada em vigor das regras implantadas pela Lei nº 13.465/17, não há que se falar em possibilidade de purgação da mora no presente caso, independente do contrato ter sido celebrado antes da referida lei. Acrescente-se que a Lei nº 14.711/23, que deu nova redação ao artigo 26-A, §2º, da Lei nº 9.514/97, manteve essa impossibilidade de purgação da mora após a averbação da consolidação da propriedade.
Nesse sentido a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e do Superior Tribunal de Justiça:
ADMINISTRATIVO. CONTRATOS BANCÁRIOS. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. PROCEDIMENTOS EXPROPRIATÓRIOS. REVISÃO CONTRATUAL. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE. PRAZO. LEI 13.465/2017 A jurisprudência deste TRF da 4ª Região já vinha reconhecendo possibilidade de purga da mora mesmo após a consolidação da propriedade em favor da fiduciária mediante o pagamento de todo o débito, inclusive as despesas de transmissão e registro, e não somente dos valores em aberto. (TRF4. Apelação cível nº 2007.71.08.008964-0/RS. Relator: Des. Federal Marga Inge Barth Tessler. J. em 01.12.2010), aplicando supletivamente o artigo 34 do Decreto-Lei 70/66, por força do que dispunha o inciso II do art. 39 da Lei 9.514/97.
2. A partir da vigência da Lei nº 13.465/2017, não é mais possível purgar a mora até a data de assinatura do termo de arrematação, mas apenas até a data da averbação da
consolidação
da
propriedade
fiduciária, sendo que esta alteração legislativa aplica-se a todos os contratos cuja
consolidação
da
propriedade
ocorreu após a sua vigência ou seja, a partir de 11/07/2017.
3. No âmbito da alienação fiduciária de imóveis em garantia, o contrato não se extingue por força da consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário, mas, sim, pela alienação em leilão público do bem objeto da alienação fiduciária, após a lavratura do auto de arrematação. (TRF4, AC 5019275-17.2018.4.04.7000, QUARTA TURMA, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, juntado aos autos em 20/10/2021). - destaquei
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO JURÍDICO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL. PURGAÇÃO DA MORA APÓS A CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE EM NOME DO CREDOR FIDUCIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA LEI Nº 13.465/2017. DIREITO DE PREFERÊNCIA.
1. Ação anulatória de ato jurídico ajuizada em 19/02/2020, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 28/03/2022 e atribuído ao gabinete em 04/07/2022.
2. O propósito recursal consiste em decidir acerca da possibilidade de o mutuário efetuar a purgação da mora, em contrato garantido por alienação fiduciária de bem imóvel, após a consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário.
3. De acordo com a jurisprudência do STJ, antes da edição da Lei nº 16.465/2017, a purgação da mora era admitida no prazo de 15 (quinze) dias após a intimação prevista no art. 26, § 1º, da Lei nº 9.514/1997 ou, a qualquer tempo, até a assinatura do auto de arrematação do imóvel, com base no art. 34 do Decreto-Lei nº 70/1966, aplicado subsidiariamente às operações de financiamento imobiliário relativas à Lei nº 9.514/1997. Precedentes.
4. Após a edição da Lei nº 13.465, de 11/7/2017, que incluiu o § 2º-B no art. 27 da Lei nº 9.514/1997, assegurando o direito de preferência ao devedor fiduciante na aquisição do imóvel objeto de garantia fiduciária, a ser exercido após a consolidação da propriedade e até a data em que realizado o segundo leilão, a Terceira Turma do STJ, no julgamento do REsp 1.649.595/RS, em 13/10/2020, se posicionou no sentido de que, "com a entrada em vigor da nova lei, não mais se admite a purgação da mora após a consolidação da propriedade em favor do fiduciário", mas sim o exercício do direito de preferência para adquirir o imóvel objeto da propriedade fiduciária, previsto no mencionado art. 27, § 2º-B, da Lei nº 9.514/1997.
5. Na oportunidade, ficou assentada a aplicação da Lei nº 13.465/2017 aos contratos anteriores à sua edição, considerando, ao invés da data da contratação, a data da consolidação da propriedade e da purga da mora como elementos condicionantes, nos seguintes termos: "i) antes da entrada em vigor da Lei n. 13.465/2017, nas situações em que já consolidada a propriedade e purgada a mora nos termos do art. 34 do Decreto-Lei n. 70/1966 (ato jurídico perfeito), impõe-se o desfazimento do ato de consolidação, com a consequente retomada do contrato de financiamento imobiliário; ii) a partir da entrada em vigor da lei nova, nas situações em que consolidada a propriedade, mas não purgada a mora, é assegurado ao devedor fiduciante tão somente o exercício do direito de preferência previsto no § 2º-B do art. 27 da Lei n. 9.514/1997" (REsp 1.649.595/RS, Terceira Turma, julgado em 13/10/2020, DJe de 16/10/2020).
6. Hipótese dos autos em que a consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário ocorreu após a entrada em vigor da Lei nº 13.465/2017, razão pela qual não há que falar em possibilidade de o devedor purgar a mora até a assinatura do auto de arrematação, ficando assegurado apenas o exercício do direito de preferência para adquirir o imóvel objeto da propriedade fiduciária.
7. Recurso especial conhecido e não provido.
(STJ, REsp n. 2.007.941/MG, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 14/2/2023, DJe de 16/2/2023.) - destaquei
Portanto, nas situações em que já legalmente consolidada a propriedade é assegurado ao devedor fiduciante tão somente o exercício do direito de preferência previsto no art. 27, §2º-B, da Lei nº 9.514/1997, e não mais o direito de purgar a mora.
A Lei nº 9.514/97, em seu art. 27, com as alterações promovidas pela Lei nº 13.465/2017, e depois pela Lei nº 14.711/2023, não apontou como requisito de validade para a realização dos leilões a notificação pessoal do mutuário.
Nesse sentido é pacífica a jurisprudência do TRF da 4ª Região:
CIVIL. PROCESSUAL. ADMINISTRATIVO. CONTRATO DE MÚTUO BANCÁRIO. ATOS EXPROPRIATÓRIOS. SUSPENSÃO. IMPOSSIBILIDADE. 1.
A legislação de regência (Lei nº 9.514/1997) não exige a notificação
pessoal
do mutuário para que sejam realizados os
leilões
do imóvel retomado. Basta, para tanto, o envio de correspondência ao endereço do bem financiado, nos termos do art. 27, § 2º-A, do indigitado Diploma Legal.
No caso, o ajuizamento da presente ação, com juntada do edital, em momento anterior à realização do
leilão, tem o condão de suprir eventual omissão na notificação. 2. . Quanto à possibilidade de proceder à acordo extrajudicial sobre as parcelas inadimplidas, ainda que a agravante tenha vontade de restabelecer o contrato firmado com a CEF, destaco que tal possibilidade é prerrogativa exclusiva da instituição bancária, não cabendo a judiciário interferir na esfera administrativa e determinar a assinatura de novo contrato, ou mesmo o restabelecimento daquele que venceu antecipadamente em face do inadimplemento. (TRF4, AC 5000879-92.2023.4.04.7201, TERCEIRA TURMA, Relator ROGERIO FAVRETO, juntado aos autos em 16/11/2023)
ADMINISTRATIVO. SFH. AÇÃO ANULATÓRIA. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. NOTIFICAÇÃO PARA PURGAR A MORA. INTIMAÇÃO DOS LEILÕES. PRAZO SUPERIOR A 30 DIAS DA CONSOLIDAÇÃO DA PRORIEDADE E A REALIZAÇÃO DE LEILÃO. . Certificadas pelo oficial do Cartório de Registro de Títulos e Documentos que após três tentativas, obteve êxito na notificação pessoal, para purgar a mora, não há irregularidade a ser sanada. .
Não existe na legislação previsão expressa da intimação
pessoal
dos mutuários acerca da data da realização dos
leilões
como requisito para a regularidade da execução extrajudicial.
A única notificação a ser efetuada de forma
pessoal
é aquela destinada à purgação da mora; . O fato de exceder o prazo de 30 (trinta) dias, previsto no art. 27 da Lei 9.514/1997, entre a consolidação da propriedade fiduciária e a realização de leilão extrajudicial, por si só, não enseja invalidade da consolidação, quando não demonstrado qualquer prejuízo ao devedor (TRF4, AC 5004039-63.2016.4.04.7010, QUARTA TURMA, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, juntado aos autos em 27/09/2018)
Diante desse contexto, não há razão para impedir que o agente financeiro venda o imóvel e recupere o valor emprestado.
Ante o exposto,
indefiro o requerimento de tutela provisória de urgência.
Intimem-se os autores.
5. CITE-SE
a parte ré para integrar a relação processual e apresentar contestação, no prazo legal. Na mesma oportunidade, intime-se a ré acerca do indeferimento acima e para:
(i)
apresentar a documentação de que disponha para o esclarecimento da causa;
(ii)
informar se o imóvel foi vendido nos leilões designados;
(iii)
informar, de maneira expressa, se tem interesse na realização de audiência de conciliação, ficando ciente de que tal interesse já foi manifestado pelo autor, na petição inicial.
6.
Em seguida, intime-se o autor para manifestação, no prazo de 15 (quinze) dias (arts. 350 e 351 do CPC).
7.
Não havendo interesse da Caixa na realização de audiência de conciliação, registre-se o processo para sentença.
Caso contrário, havendo interesse, remetam-se os autos ao CEJUSCON (Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania) para a realização de audiência de conciliação.
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