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Processo nº 1044373-90.2023.8.11.0041

ID: 325104369

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1044373-90.2023.8.11.0041

Data de Disponibilização: 15/07/2025

Polo Ativo:

ALEANDRO PEREIRA DALAN

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

KELVIN DE MATOS MILIONI

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1044373-90.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária, Contratos Bancários, Bus… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1044373-90.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária, Contratos Bancários, Busca e Apreensão, Liminar] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [ALEANDRO PEREIRA DALAN - CPF: 691.037.121-68 (APELANTE), KELVIN DE MATOS MILIONI - CPF: 127.151.966-60 (ADVOGADO), AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 07.707.650/0001-10 (APELADO), RAPHAEL NEVES COSTA - CPF: 279.112.988-07 (ADVOGADO), FLAVIO NEVES COSTA - CPF: 170.446.138-37 (ADVOGADO), CHRISTIANE DE CARVALHO BURITY - CPF: 630.902.521-04 (ADVOGADO), RICARDO NEVES COSTA - CPF: 137.285.858-07 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – CAPITALIZAÇÃO DE JUROS – LEGALIDADE – CONSTITUIÇÃO EM MORA – REGULARIDADE – NOTIFICAÇÃO COM CONTRATO DIVERSO – DIVERGÊNCIA IRRELEVANTE – REGULARIDADE COMPROVADA – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. A cláusula de capitalização mensal de juros é válida quando pactuada de forma expressa, mesmo sem indicação da taxa diária. A constituição em mora é regular quando a notificação é enviada ao endereço indicado no contrato, independentemente da comprovação do recebimento. Divergência entre número de contrato da proposta e do instrumento definitivo não invalida a notificação extrajudicial, quando mantidos os elementos essenciais da operação. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 1044373-90.2023.8.11.0041 APELANTE: ALEANDRO PEREIRA DALAN APELADO: AYMORE CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S/A RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por ALEANDRO PEREIRA DALAN contra sentença proferida pelo MMº Juiz Alex Nunes de Figueiredo, da 3ª Vara Especializada em Direito Bancário da Comarca de Cuiabá/MT, lançada nos autos da Ação de Busca e Apreensão nº. 1044373-90.2023.8.11.0041, ajuizada por AYMORÉ CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S/A, que julgou procedente o pedido inicial, consolidando nas mãos da parte autora o domínio e posse plenos e exclusivos do veículo apreendido, tornando definitiva a liminar anteriormente concedida, bem como condenou o requerido ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa. A controvérsia originou-se de contrato de financiamento garantido por alienação fiduciária celebrado em 29/12/2022, tendo como objeto o veículo FIAT CRONOS PRECISION 1.8 16V FLEX AUT., ano 2018/2019, placa QCM5I83. Após a constatação da inadimplência contratual por parte do réu, a parte autora promoveu a presente ação visando à retomada do bem dado em garantia. O apelante, em suas razões recursais, sustenta, em síntese, a abusividade de cláusulas contratuais, com destaque para a previsão de capitalização diária de juros sem a correspondente indicação da taxa diária, o que violaria os princípios da boa-fé objetiva e do dever de informação, em afronta ao disposto no art. 6º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor, bem como à orientação consolidada pelo Superior Tribunal de Justiça, especialmente no REsp 1.826.463/SC. Segundo a apelante ausência da taxa diária implica violação ao dever de informação e transparência, comprometendo a formação da vontade do consumidor; impossibilidade de controle prévio e consciente dos encargos contratuais; potencial desequilíbrio contratual e, por consequência, a descaracterização da mora, conforme diretrizes fixadas no julgamento do REsp 1.061.530. Por outro lado, invoca a ausência de regular constituição em mora, elemento indispensável à procedência da ação de busca e apreensão, nos termos do art. 2º, §2º, do Decreto-Lei nº. 911/69 e da Súmula 72 do STJ. Sustenta-se que a notificação extrajudicial, alegadamente enviada pela instituição financeira, apresenta duas irregularidades graves: a) falta de comprovação da entrega efetiva, pois a notificação retornou com o carimbo de “ausente”, sem assinatura de qualquer pessoa; e b) divergência entre o contrato notificado e o contrato discutido, uma vez que a notificação encaminhada se refere ao contrato nº. “20037425608”, ao passo que o contrato objeto da ação é o de nº. “576779741”. Defende que essa deficiência enseja a aplicação da Teoria do Papel em Branco, segundo a qual uma notificação genérica ou imprecisa equivale à ausência de notificação, por não possibilitar o pleno exercício da defesa contratual pelo consumidor. Invoca precedentes dos Tribunais Estaduais (TJ-MS, TJ-DF, TJ-RS), que reconhecem a ineficácia da notificação que contenha número de contrato diverso daquele celebrado entre as partes. Por fim, menciona que a forma como a instituição financeira conduziu a cobrança e a demanda judicial viola os princípios da boa-fé objetiva, da função social do contrato e da cooperação, especialmente por não ter diligenciado no sentido de enviar nova notificação quando a primeira resultou frustrada; ter optado por não exercer o protesto do título; e ter indicado outro contrato na notificação extrajudicial. Forte nesses argumentos, pugna pela reforma da sentença para julgar improcedência da ação de busca e apreensão, diante da ausência de constituição válida da mora; o reconhecimento da abusividade da cláusula de capitalização diária de juros e consequente afastamento da mora, com determinação de restituição do bem apreendido, sob pena de multa diária; o reconhecimento da irregularidade da notificação extrajudicial, igualmente com afastamento da mora e restituição do bem; subsidiariamente, caso a restituição do bem não seja possível, requer: a indenização no valor de mercado do veículo (tabela FIPE); e a aplicação da multa de 50% sobre o valor financiado, conforme previsão do art. 3º, § 6º, do Decreto-Lei nº. 911/69 (id. 280554947). Em contrarrazões, a parte apelada defende que a ação foi devidamente instruída com os documentos essenciais, que a mora foi comprovada nos moldes do art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei nº. 911/69, e que a notificação enviada ao endereço constante no contrato se mostra suficiente, ainda que não tenha havido o efetivo recebimento. Invoca, ainda, a regularidade do contrato firmado, a ausência de vícios que justifiquem sua revisão e a validade da cláusula de capitalização, asseverando que não houve demonstração concreta da alegada abusividade. Aduz que a alegada incongruência entre o número do contrato indicado na inicial e o constante da notificação não afasta a identificação da dívida, posto que o conteúdo da relação contratual permaneceu íntegro e inalterado. Refuta a alegação de abusividade da capitalização diária dos juros, sob o argumento de que a taxa mensal e anual constam expressamente do contrato, e que não há ilegalidade na previsão contratual de capitalização diária, desde que pactuada. Afirma que o contrato é expresso quanto à forma de capitalização e que a ausência de menção à taxa diária não descaracteriza a legalidade da cláusula, sobretudo diante da jurisprudência do STJ, que não reconhece a abusividade da capitalização apenas com base nessa omissão. Esclarece que o contrato nº. 576779741 refere-se à proposta inicial, e que, após análise e aprovação da operação, foi formalizado o contrato definitivo sob o nº. 20037425608 – o qual conserva idênticos dados de objeto, valor, parcelas, vencimento e veículo alienado. No mais, a apelada sustenta que não prospera o pedido de imposição de multa de 50% do valor financiado, tendo em vista que adotou todos os procedimentos legais previstos para o exercício regular do direito de crédito, em conformidade com o que estabelece o Decreto-Lei nº. 911/69 e a legislação civil. Eventualmente, ainda, defende que eventual indenização sobre o valor do veículo não deve ser pautada na tabela FIPE, mas sim conforme o valor da nota de venda do veículo. Sustenta, por fim, a manutenção da sentença em todos os seus termos (Id. 280555350). O preparo foi recolhido em dobro (Id. 286836384). É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Ao apreciar os argumentos deduzidos no recurso, cumpre destacar, inicialmente, que a insurgência do apelante centra-se na alegada abusividade contratual decorrente da capitalização diária de juros sem indicação da taxa diária; na ausência de constituição regular da mora; na divergência entre o número do contrato notificado e o constante da petição inicial; bem como na violação de princípios contratuais, a ensejar, segundo sustenta, a descaracterização da mora e, por conseguinte, a improcedência da demanda. Em contraposição, a instituição financeira defende a regularidade formal e substancial da constituição da mora, a legalidade da cláusula de capitalização de juros e a inexistência de violação a qualquer princípio contratual, ressaltando que a divergência numérica entre os instrumentos decorre da conversão da proposta inicial em contrato definitivo, mantendo-se inalterados o objeto, o valor financiado, as parcelas e o veículo alienado. De início, afasta-se a alegação de abusividade da cláusula de capitalização de juros com fundamento na ausência de informação da taxa diária. Com efeito, conforme cláusula contratual constante do instrumento celebrado entre as partes (Id. 280554899), o financiamento foi contratado à taxa de juros de 1,98% ao mês e 26,56% ao ano. Estes percentuais encontram-se expressamente pactuados no contrato de financiamento registrado, não havendo omissão que comprometa a clareza das obrigações assumidas. Conforme jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, a possibilidade de capitalização de juros, em periodicidade inferior à anual, restou admitida por ocasião do julgamento do REsp nº. 973.827/RS, desde que obedeça a dois requisitos, quais sejam: “a) A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada; b) É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada.” Estas duas premissas, oriundas do julgamento do recurso especial acima referido, deram origem às Súmulas 539 e 541 do STJ, que assim dispõem: “Súmula 539. É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada.” “Súmula 541. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada.” Cabe consignar que a c. Corte Superior adotou o entendimento no sentido de estar pactuada a capitalização mensal dos juros, quando a taxa de juros anual for superior ao duodécuplo da mensal descrita no contrato, vejamos: “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. BANCÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. JUROS REMUNERATÓRIOS. SÚMULA N. 382/STJ. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS. PACTUAÇÃO EXPRESSA. TAXA ANUAL SUPERIOR AO DUODÉCUPLO DA TAXA MENSAL. DECISÃO MANTIDA. 1. "A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade" (Súmula n. 382/STJ). Ademais, no caso concreto, as taxas contratadas não foram consideradas abusivas. Aplicação da Súmula n. 7/STJ. 2. "A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada" (REsp n. 973827/RS, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC/1973, relatora para o acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 8/8/2012, DJe 24/9/2012). 3. No caso, o acórdão recorrido concluiu que o tomador do empréstimo teve ciência inequívoca da capitalização de juros. Alterar tal conclusão demandaria reexame de matéria fática, inviável em recurso especial (Súmulas n. 5 e 7 do STJ). 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg no AREsp 304633/DF – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2013/0054156-0, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA (1146), QUARTA TURMA, julgado em 19/10/2017, DJe 30/10/2017) Neste sentido, também já se posicionou esta e. Câmara, in litteris: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL – CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO – PRELIMINAR DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE REJEITADA – JUROS REMUNERATÓRIOS DE ACORDO COM A MÉDIA DE MERCADO – AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE – CAPITALIZAÇÃO DE JUROS - EXPRESSA PACTUAÇÃO – JUROS MORATÓRIOS – LIMITAÇÃO A 1% AO MÊS – POSSIBILIDADE – EXEGESE DA SÚMULA 379 DO STJ – RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. O recurso não viola o princípio da dialeticidade quando suas razões se insurgem contra a matéria posta na sentença. Não constatada discrepância entre a taxa contratada e aquela divulgada pelo BACEN, não há que se falar em limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado. A rigor da Súmula 539 do STJ, é permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n . 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada. Nos contratos bancários não regidos por legislação específica, os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês. (Súmula 379/STJ) A cobrança de encargos indevidos gera o direito à restituição simples do indébito.” (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1012441-24.2022.8.11.0040, Relator.: JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, Data de Julgamento: 14/05/2024, Quinta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 17/05/2024) “APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO – CÉDULA DE CRÉDITO RURAL – DESPACHO SANEADOR – DESNECESSIDADE – JULGAMENTO ANTECIPADO – PRELIMINAR REJEITADA – MÉRITO - CAPITALIZAÇÃO DE JUROS – POSSIBILIDADE, DESDE QUE PACTUADA – TEMA 654 DO STJ – CONTRATAÇÃO NÃO EVIDENCIADA DE FORMA CLARA – OFENSA AO ART. 47 DO CDC – PRORROGAÇÃO DO DÉBITO RURAL – DIREITO SUBJETIVO – NÃO ATENDIMENTO DOS REQUISITOS – AUSÊNCIA DE PEDIDO PRÉVIO - RECURSO DESPROVIDO. A ausência de despacho saneador não configura cerceamento de defesa quando não verificado qualquer vício no processo e que a lide pode ser julgada antecipadamente, sem a necessidade de dilação probatória. No Recurso Especial 1333977/MT, julgado sob o rito dos repetitivos, ficou estabelecido que é permitida a capitalização em período inferior ao semestral nas cédulas rurais, desde que convencionada (Tema 654 do STJ. O contrato de crédito rural tem disciplina no Decreto-Lei 167/67, art. 5º, parágrafo único, que autoriza cobrança de juros e multa no caso de inadimplemento, vedada a taxa de comissão de permanência. O produtor rural tem direito à prorrogação do débito desde que preenchidos os requisitos legais, o que não ocorre na hipótese.” (TJ-MT - AC: 10003394320228110048, Relator: RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Data de Julgamento: 28/06/2023, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 30/06/2023) Desse modo, uma vez que o contrato pactuado informa a taxa de juros mensal (1,98%) e a anual (26,56%), restou prevista de forma expressa e clara a capitalização mensal dos juros, sendo, portanto, legal a sua cobrança. Sob outro enfoque, também não subsiste a alegação de irregularidade na constituição da mora. Consoante dispõe o art. 2º, §2º, do Decreto-Lei nº. 911/1969, “a mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento”, podendo ser comprovada por notificação extrajudicial enviada ao endereço do devedor. No presente caso, verifica-se nos autos (Id. 280554895) a juntada de aviso de recebimento da correspondência encaminhada ao endereço contratual constante do contrato celebrado entre as partes, sendo certo que o seu retorno com a indicação “ausente” não afasta a presunção de recebimento regular. Nesse sentido, enuncia a Súmula nº. 72 do Superior Tribunal de Justiça que “A comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente”. De acordo com a redação, até então vigente, do art. 2º, § 2º, do Decreto-lei nº. 911/69, que disciplina a matéria, a constituição do devedor em mora poderia se dar por meio de: carta registrada expedida por intermédio do Cartório de Títulos e Documentos e entregue no endereço do devedor ou pelo protesto do título. Com o advento, em 14 de novembro de 2014, da Lei nº. 13.043/14, que, dentre outras alterações, modificou a redação do referido dispositivo, tornou-se possível a comprovação da mora “por carta registrada com aviso de recebimento, não se exigindo que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário”. Aliás, em agosto de 2023 a 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, julgou o tema em recursos repetitivos (TEMA 1.132) fixando, por maioria, a tese: "Para a comprovação da mora nos contratos garantidos por alienação fiduciária, é suficiente o envio de notificação extrajudicial ao devedor no endereço indicado no instrumento contratual, dispensando-se a prova do recebimento, quer seja pelo próprio destinatário, quer por terceiro." Da leitura dos autos que tramita na origem, verifica-se que a parte devedora agravante, ao realizar o contrato de financiamento, informou seu endereço como sendo na “RUA FORTUNATO ILARIO DE CARVALHO, Nº 311, CIDADE ALTA, CUIABÁ-MT, CEP: 78.030-380” (Id. 280554899, na origem). E a notificação extrajudicial foi expedida para o endereço indicado no contrato, retornando com a informação de “ausente”, ocorrendo, ao contrário do defendido pela parte recorrente, a devida e regular constituição em mora da parte devedora, nos termos do art. 2º, §2º, do Decreto-lei nº. 911/69. Tendo em vista que para comprovar a mora, na ação de busca e apreensão, é suficiente a notificação por carta com aviso de recebimento entregue no endereço do devedor, como ocorreu na espécie, conferiu regularidade à constituição da mora, uma vez que cumpriu o regramento do art. 2º, § 2º, do Decreto-lei nº. 911/69. Nesta linha de intelecção, colhe-se julgado oriundo deste e. Tribunal de Justiça: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. BUSCA E APREENSÃO. CONSTITUIÇÃO EM MORA. ENVIO DE NOTIFICAÇÃO AO ENDEREÇO CONTRATUAL. DESNECESSIDADE DE PROVA DE RECEBIMENTO. APLICAÇÃO DO TEMA 1.132/STJ. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame. Agravo de instrumento interposto contra decisão que considerou válida a constituição em mora do devedor em contrato de alienação fiduciária, mediante envio de notificação extrajudicial ao endereço indicado no contrato, mesmo sem comprovação de recebimento. II. Questão em discussão. A questão em discussão consiste em saber se é exigida a prova de recebimento da notificação extrajudicial pelo devedor para a constituição em mora em contratos garantidos por alienação fiduciária. III. Razões de decidir. O acórdão embargado aplicou corretamente o entendimento firmado pelo STJ no Tema 1.132, que estabelece ser suficiente o envio da notificação ao endereço constante do contrato, dispensando a prova do recebimento. A jurisprudência do STJ é pacífica em afirmar que problemas relacionados à entrega da notificação — como devolução por “ausente” ou “não existe o número indicado” — não afastam a constituição em mora quando a notificação é enviada ao endereço contratual. O devedor tem o dever de informar corretamente o endereço no ato da contratação, não podendo imputar ao credor a falha na entrega. IV. Dispositivo e tese. Recurso conhecido e desprovido. Tese de julgamento: “Para a constituição em mora nos contratos garantidos por alienação fiduciária, basta o envio da notificação ao endereço indicado no contrato, sem necessidade de prova de recebimento pelo devedor”. Dispositivos relevantes citados: Decreto-Lei nº 911/1969, art. 2º, § 2º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp nº 1.125.547/RS; Tema 1.132/STJ.” (N.U 1028880-65.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/11/2024, Publicado no DJE 29/11/2024) No que se refere à suposta divergência entre os contratos, verifica-se que o contrato mencionado na notificação extrajudicial nº 20037425608 corresponde à formalização definitiva da operação inicialmente proposta sob o nº 576779741. Conforme narrado e documentado, ambos os instrumentos possuem o mesmo objeto — financiamento para aquisição do veículo Fiat Cronos Precision 1.8 Flex Aut., placa QCM5I83 —, idêntico valor financiado, prazo e parcelas. A argumentação do apelante baseia-se na chamada “teoria do papel em branco”, cuja aplicação pressupõe indeterminação do objeto contratual, o que não se verifica no caso concreto, pois os documentos colacionados permitem clara identificação do débito e do bem objeto da garantia. Logo, não há que se falar em nulidade da notificação ou impedimento ao exercício da ampla defesa. A propósito: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL ENVIADA POR MEIO DE CARTA REGISTRADA PARA O ENDEREÇO DO CONTRATO – DIVERGÊNCIA ENTRE O NÚMERO DO CONTRATO COM O CONTIDO NA NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL – IRRELEVÂNCIA – HIGIDEZ DOS DEMAIS DADOS CONTRATUAIS – MORA COMPROVADA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. É assente no STJ que "A mora decorre do simples vencimento, devendo, por formalidade legal, para o ajuizamento da ação de busca e apreensão, ser apenas comprovada pelo credor mediante envio de notificação, por via postal, com aviso de recebimento, no endereço do devedor indicado no contrato" (REsp 1592422/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/05/2016, DJe 22/06/2016) In casu, a notificação extrajudicial fora recepcionada no endereço indicado no contrato, de modo que a simples divergência entre o número constante do contrato e àquele aposto na notificação, não é suficiente para afastar a mora em relação à contratação entabulada entre as partes, mormente se o desiderato da aludida notificação extrajudicial se resume unicamente em dar ao devedor a ciência da sua mora.” (TJ-MT - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 1002968-66.2024.8.11.0000, Relator.: DIRCEU DOS SANTOS, Data de Julgamento: 08/05/2024, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 13/05/2024) Ademais, não se constata, no modo de condução da cobrança e da ação judicial, qualquer violação aos princípios da boa-fé objetiva, função social do contrato ou cooperação. A credora agiu de forma diligente ao enviar a notificação ao endereço informado no contrato, tendo adotado os procedimentos legais para a constituição da mora e retomada do bem. A ausência de protesto ou de reiteração da notificação, por si só, não caracteriza má-fé, tampouco afronta à cooperação, especialmente quando a mora se mostra caracterizada nos moldes legais e contratuais. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo a sentença proferida pelo magistrado de primeiro grau. Em razão do trabalho adicional na fase recursal, majoro a verba honorária de 10 para 15% sobre o valor atualizado da causa, com fulcro no art. 85, §11, do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/07/2025

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Processo nº 1044373-90.2023.8.11.0041

ID: 325104375

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1044373-90.2023.8.11.0041

Data de Disponibilização: 15/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A.

Acórdão

Advogados:

RAPHAEL NEVES COSTA

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FLAVIO NEVES COSTA

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RICARDO NEVES COSTA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1044373-90.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária, Contratos Bancários, Bus… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1044373-90.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Alienação Fiduciária, Contratos Bancários, Busca e Apreensão, Liminar] Relator: Des(a). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES Turma Julgadora: [DES(A). ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, DES(A). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, DES(A). DIRCEU DOS SANTOS] Parte(s): [ALEANDRO PEREIRA DALAN - CPF: 691.037.121-68 (APELANTE), KELVIN DE MATOS MILIONI - CPF: 127.151.966-60 (ADVOGADO), AYMORE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A. - CNPJ: 07.707.650/0001-10 (APELADO), RAPHAEL NEVES COSTA - CPF: 279.112.988-07 (ADVOGADO), FLAVIO NEVES COSTA - CPF: 170.446.138-37 (ADVOGADO), CHRISTIANE DE CARVALHO BURITY - CPF: 630.902.521-04 (ADVOGADO), RICARDO NEVES COSTA - CPF: 137.285.858-07 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – CAPITALIZAÇÃO DE JUROS – LEGALIDADE – CONSTITUIÇÃO EM MORA – REGULARIDADE – NOTIFICAÇÃO COM CONTRATO DIVERSO – DIVERGÊNCIA IRRELEVANTE – REGULARIDADE COMPROVADA – SENTENÇA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. A cláusula de capitalização mensal de juros é válida quando pactuada de forma expressa, mesmo sem indicação da taxa diária. A constituição em mora é regular quando a notificação é enviada ao endereço indicado no contrato, independentemente da comprovação do recebimento. Divergência entre número de contrato da proposta e do instrumento definitivo não invalida a notificação extrajudicial, quando mantidos os elementos essenciais da operação. TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL Nº 1044373-90.2023.8.11.0041 APELANTE: ALEANDRO PEREIRA DALAN APELADO: AYMORE CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S/A RELATÓRIO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Trata-se de recurso de apelação interposto por ALEANDRO PEREIRA DALAN contra sentença proferida pelo MMº Juiz Alex Nunes de Figueiredo, da 3ª Vara Especializada em Direito Bancário da Comarca de Cuiabá/MT, lançada nos autos da Ação de Busca e Apreensão nº. 1044373-90.2023.8.11.0041, ajuizada por AYMORÉ CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S/A, que julgou procedente o pedido inicial, consolidando nas mãos da parte autora o domínio e posse plenos e exclusivos do veículo apreendido, tornando definitiva a liminar anteriormente concedida, bem como condenou o requerido ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa. A controvérsia originou-se de contrato de financiamento garantido por alienação fiduciária celebrado em 29/12/2022, tendo como objeto o veículo FIAT CRONOS PRECISION 1.8 16V FLEX AUT., ano 2018/2019, placa QCM5I83. Após a constatação da inadimplência contratual por parte do réu, a parte autora promoveu a presente ação visando à retomada do bem dado em garantia. O apelante, em suas razões recursais, sustenta, em síntese, a abusividade de cláusulas contratuais, com destaque para a previsão de capitalização diária de juros sem a correspondente indicação da taxa diária, o que violaria os princípios da boa-fé objetiva e do dever de informação, em afronta ao disposto no art. 6º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor, bem como à orientação consolidada pelo Superior Tribunal de Justiça, especialmente no REsp 1.826.463/SC. Segundo a apelante ausência da taxa diária implica violação ao dever de informação e transparência, comprometendo a formação da vontade do consumidor; impossibilidade de controle prévio e consciente dos encargos contratuais; potencial desequilíbrio contratual e, por consequência, a descaracterização da mora, conforme diretrizes fixadas no julgamento do REsp 1.061.530. Por outro lado, invoca a ausência de regular constituição em mora, elemento indispensável à procedência da ação de busca e apreensão, nos termos do art. 2º, §2º, do Decreto-Lei nº. 911/69 e da Súmula 72 do STJ. Sustenta-se que a notificação extrajudicial, alegadamente enviada pela instituição financeira, apresenta duas irregularidades graves: a) falta de comprovação da entrega efetiva, pois a notificação retornou com o carimbo de “ausente”, sem assinatura de qualquer pessoa; e b) divergência entre o contrato notificado e o contrato discutido, uma vez que a notificação encaminhada se refere ao contrato nº. “20037425608”, ao passo que o contrato objeto da ação é o de nº. “576779741”. Defende que essa deficiência enseja a aplicação da Teoria do Papel em Branco, segundo a qual uma notificação genérica ou imprecisa equivale à ausência de notificação, por não possibilitar o pleno exercício da defesa contratual pelo consumidor. Invoca precedentes dos Tribunais Estaduais (TJ-MS, TJ-DF, TJ-RS), que reconhecem a ineficácia da notificação que contenha número de contrato diverso daquele celebrado entre as partes. Por fim, menciona que a forma como a instituição financeira conduziu a cobrança e a demanda judicial viola os princípios da boa-fé objetiva, da função social do contrato e da cooperação, especialmente por não ter diligenciado no sentido de enviar nova notificação quando a primeira resultou frustrada; ter optado por não exercer o protesto do título; e ter indicado outro contrato na notificação extrajudicial. Forte nesses argumentos, pugna pela reforma da sentença para julgar improcedência da ação de busca e apreensão, diante da ausência de constituição válida da mora; o reconhecimento da abusividade da cláusula de capitalização diária de juros e consequente afastamento da mora, com determinação de restituição do bem apreendido, sob pena de multa diária; o reconhecimento da irregularidade da notificação extrajudicial, igualmente com afastamento da mora e restituição do bem; subsidiariamente, caso a restituição do bem não seja possível, requer: a indenização no valor de mercado do veículo (tabela FIPE); e a aplicação da multa de 50% sobre o valor financiado, conforme previsão do art. 3º, § 6º, do Decreto-Lei nº. 911/69 (id. 280554947). Em contrarrazões, a parte apelada defende que a ação foi devidamente instruída com os documentos essenciais, que a mora foi comprovada nos moldes do art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei nº. 911/69, e que a notificação enviada ao endereço constante no contrato se mostra suficiente, ainda que não tenha havido o efetivo recebimento. Invoca, ainda, a regularidade do contrato firmado, a ausência de vícios que justifiquem sua revisão e a validade da cláusula de capitalização, asseverando que não houve demonstração concreta da alegada abusividade. Aduz que a alegada incongruência entre o número do contrato indicado na inicial e o constante da notificação não afasta a identificação da dívida, posto que o conteúdo da relação contratual permaneceu íntegro e inalterado. Refuta a alegação de abusividade da capitalização diária dos juros, sob o argumento de que a taxa mensal e anual constam expressamente do contrato, e que não há ilegalidade na previsão contratual de capitalização diária, desde que pactuada. Afirma que o contrato é expresso quanto à forma de capitalização e que a ausência de menção à taxa diária não descaracteriza a legalidade da cláusula, sobretudo diante da jurisprudência do STJ, que não reconhece a abusividade da capitalização apenas com base nessa omissão. Esclarece que o contrato nº. 576779741 refere-se à proposta inicial, e que, após análise e aprovação da operação, foi formalizado o contrato definitivo sob o nº. 20037425608 – o qual conserva idênticos dados de objeto, valor, parcelas, vencimento e veículo alienado. No mais, a apelada sustenta que não prospera o pedido de imposição de multa de 50% do valor financiado, tendo em vista que adotou todos os procedimentos legais previstos para o exercício regular do direito de crédito, em conformidade com o que estabelece o Decreto-Lei nº. 911/69 e a legislação civil. Eventualmente, ainda, defende que eventual indenização sobre o valor do veículo não deve ser pautada na tabela FIPE, mas sim conforme o valor da nota de venda do veículo. Sustenta, por fim, a manutenção da sentença em todos os seus termos (Id. 280555350). O preparo foi recolhido em dobro (Id. 286836384). É o relatório. VOTO EXMA. SRA. DESA. ANTÔNIA SIQUEIRA GONÇALVES (RELATORA) Egrégia Câmara: Ao apreciar os argumentos deduzidos no recurso, cumpre destacar, inicialmente, que a insurgência do apelante centra-se na alegada abusividade contratual decorrente da capitalização diária de juros sem indicação da taxa diária; na ausência de constituição regular da mora; na divergência entre o número do contrato notificado e o constante da petição inicial; bem como na violação de princípios contratuais, a ensejar, segundo sustenta, a descaracterização da mora e, por conseguinte, a improcedência da demanda. Em contraposição, a instituição financeira defende a regularidade formal e substancial da constituição da mora, a legalidade da cláusula de capitalização de juros e a inexistência de violação a qualquer princípio contratual, ressaltando que a divergência numérica entre os instrumentos decorre da conversão da proposta inicial em contrato definitivo, mantendo-se inalterados o objeto, o valor financiado, as parcelas e o veículo alienado. De início, afasta-se a alegação de abusividade da cláusula de capitalização de juros com fundamento na ausência de informação da taxa diária. Com efeito, conforme cláusula contratual constante do instrumento celebrado entre as partes (Id. 280554899), o financiamento foi contratado à taxa de juros de 1,98% ao mês e 26,56% ao ano. Estes percentuais encontram-se expressamente pactuados no contrato de financiamento registrado, não havendo omissão que comprometa a clareza das obrigações assumidas. Conforme jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, a possibilidade de capitalização de juros, em periodicidade inferior à anual, restou admitida por ocasião do julgamento do REsp nº. 973.827/RS, desde que obedeça a dois requisitos, quais sejam: “a) A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada; b) É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada.” Estas duas premissas, oriundas do julgamento do recurso especial acima referido, deram origem às Súmulas 539 e 541 do STJ, que assim dispõem: “Súmula 539. É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada.” “Súmula 541. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada.” Cabe consignar que a c. Corte Superior adotou o entendimento no sentido de estar pactuada a capitalização mensal dos juros, quando a taxa de juros anual for superior ao duodécuplo da mensal descrita no contrato, vejamos: “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. BANCÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. JUROS REMUNERATÓRIOS. SÚMULA N. 382/STJ. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DOS JUROS. PACTUAÇÃO EXPRESSA. TAXA ANUAL SUPERIOR AO DUODÉCUPLO DA TAXA MENSAL. DECISÃO MANTIDA. 1. "A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade" (Súmula n. 382/STJ). Ademais, no caso concreto, as taxas contratadas não foram consideradas abusivas. Aplicação da Súmula n. 7/STJ. 2. "A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada" (REsp n. 973827/RS, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC/1973, relatora para o acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 8/8/2012, DJe 24/9/2012). 3. No caso, o acórdão recorrido concluiu que o tomador do empréstimo teve ciência inequívoca da capitalização de juros. Alterar tal conclusão demandaria reexame de matéria fática, inviável em recurso especial (Súmulas n. 5 e 7 do STJ). 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg no AREsp 304633/DF – AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2013/0054156-0, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA (1146), QUARTA TURMA, julgado em 19/10/2017, DJe 30/10/2017) Neste sentido, também já se posicionou esta e. Câmara, in litteris: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO REVISIONAL – CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO – PRELIMINAR DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE REJEITADA – JUROS REMUNERATÓRIOS DE ACORDO COM A MÉDIA DE MERCADO – AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE – CAPITALIZAÇÃO DE JUROS - EXPRESSA PACTUAÇÃO – JUROS MORATÓRIOS – LIMITAÇÃO A 1% AO MÊS – POSSIBILIDADE – EXEGESE DA SÚMULA 379 DO STJ – RESTITUIÇÃO NA FORMA SIMPLES – SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. O recurso não viola o princípio da dialeticidade quando suas razões se insurgem contra a matéria posta na sentença. Não constatada discrepância entre a taxa contratada e aquela divulgada pelo BACEN, não há que se falar em limitação dos juros remuneratórios à taxa média de mercado. A rigor da Súmula 539 do STJ, é permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n . 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada. Nos contratos bancários não regidos por legislação específica, os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês. (Súmula 379/STJ) A cobrança de encargos indevidos gera o direito à restituição simples do indébito.” (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 1012441-24.2022.8.11.0040, Relator.: JOSE ZUQUIM NOGUEIRA, Data de Julgamento: 14/05/2024, Quinta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 17/05/2024) “APELAÇÃO CÍVEL – EMBARGOS À EXECUÇÃO – CÉDULA DE CRÉDITO RURAL – DESPACHO SANEADOR – DESNECESSIDADE – JULGAMENTO ANTECIPADO – PRELIMINAR REJEITADA – MÉRITO - CAPITALIZAÇÃO DE JUROS – POSSIBILIDADE, DESDE QUE PACTUADA – TEMA 654 DO STJ – CONTRATAÇÃO NÃO EVIDENCIADA DE FORMA CLARA – OFENSA AO ART. 47 DO CDC – PRORROGAÇÃO DO DÉBITO RURAL – DIREITO SUBJETIVO – NÃO ATENDIMENTO DOS REQUISITOS – AUSÊNCIA DE PEDIDO PRÉVIO - RECURSO DESPROVIDO. A ausência de despacho saneador não configura cerceamento de defesa quando não verificado qualquer vício no processo e que a lide pode ser julgada antecipadamente, sem a necessidade de dilação probatória. No Recurso Especial 1333977/MT, julgado sob o rito dos repetitivos, ficou estabelecido que é permitida a capitalização em período inferior ao semestral nas cédulas rurais, desde que convencionada (Tema 654 do STJ. O contrato de crédito rural tem disciplina no Decreto-Lei 167/67, art. 5º, parágrafo único, que autoriza cobrança de juros e multa no caso de inadimplemento, vedada a taxa de comissão de permanência. O produtor rural tem direito à prorrogação do débito desde que preenchidos os requisitos legais, o que não ocorre na hipótese.” (TJ-MT - AC: 10003394320228110048, Relator: RUBENS DE OLIVEIRA SANTOS FILHO, Data de Julgamento: 28/06/2023, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 30/06/2023) Desse modo, uma vez que o contrato pactuado informa a taxa de juros mensal (1,98%) e a anual (26,56%), restou prevista de forma expressa e clara a capitalização mensal dos juros, sendo, portanto, legal a sua cobrança. Sob outro enfoque, também não subsiste a alegação de irregularidade na constituição da mora. Consoante dispõe o art. 2º, §2º, do Decreto-Lei nº. 911/1969, “a mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento”, podendo ser comprovada por notificação extrajudicial enviada ao endereço do devedor. No presente caso, verifica-se nos autos (Id. 280554895) a juntada de aviso de recebimento da correspondência encaminhada ao endereço contratual constante do contrato celebrado entre as partes, sendo certo que o seu retorno com a indicação “ausente” não afasta a presunção de recebimento regular. Nesse sentido, enuncia a Súmula nº. 72 do Superior Tribunal de Justiça que “A comprovação da mora é imprescindível à busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente”. De acordo com a redação, até então vigente, do art. 2º, § 2º, do Decreto-lei nº. 911/69, que disciplina a matéria, a constituição do devedor em mora poderia se dar por meio de: carta registrada expedida por intermédio do Cartório de Títulos e Documentos e entregue no endereço do devedor ou pelo protesto do título. Com o advento, em 14 de novembro de 2014, da Lei nº. 13.043/14, que, dentre outras alterações, modificou a redação do referido dispositivo, tornou-se possível a comprovação da mora “por carta registrada com aviso de recebimento, não se exigindo que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário”. Aliás, em agosto de 2023 a 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, julgou o tema em recursos repetitivos (TEMA 1.132) fixando, por maioria, a tese: "Para a comprovação da mora nos contratos garantidos por alienação fiduciária, é suficiente o envio de notificação extrajudicial ao devedor no endereço indicado no instrumento contratual, dispensando-se a prova do recebimento, quer seja pelo próprio destinatário, quer por terceiro." Da leitura dos autos que tramita na origem, verifica-se que a parte devedora agravante, ao realizar o contrato de financiamento, informou seu endereço como sendo na “RUA FORTUNATO ILARIO DE CARVALHO, Nº 311, CIDADE ALTA, CUIABÁ-MT, CEP: 78.030-380” (Id. 280554899, na origem). E a notificação extrajudicial foi expedida para o endereço indicado no contrato, retornando com a informação de “ausente”, ocorrendo, ao contrário do defendido pela parte recorrente, a devida e regular constituição em mora da parte devedora, nos termos do art. 2º, §2º, do Decreto-lei nº. 911/69. Tendo em vista que para comprovar a mora, na ação de busca e apreensão, é suficiente a notificação por carta com aviso de recebimento entregue no endereço do devedor, como ocorreu na espécie, conferiu regularidade à constituição da mora, uma vez que cumpriu o regramento do art. 2º, § 2º, do Decreto-lei nº. 911/69. Nesta linha de intelecção, colhe-se julgado oriundo deste e. Tribunal de Justiça: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. BUSCA E APREENSÃO. CONSTITUIÇÃO EM MORA. ENVIO DE NOTIFICAÇÃO AO ENDEREÇO CONTRATUAL. DESNECESSIDADE DE PROVA DE RECEBIMENTO. APLICAÇÃO DO TEMA 1.132/STJ. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame. Agravo de instrumento interposto contra decisão que considerou válida a constituição em mora do devedor em contrato de alienação fiduciária, mediante envio de notificação extrajudicial ao endereço indicado no contrato, mesmo sem comprovação de recebimento. II. Questão em discussão. A questão em discussão consiste em saber se é exigida a prova de recebimento da notificação extrajudicial pelo devedor para a constituição em mora em contratos garantidos por alienação fiduciária. III. Razões de decidir. O acórdão embargado aplicou corretamente o entendimento firmado pelo STJ no Tema 1.132, que estabelece ser suficiente o envio da notificação ao endereço constante do contrato, dispensando a prova do recebimento. A jurisprudência do STJ é pacífica em afirmar que problemas relacionados à entrega da notificação — como devolução por “ausente” ou “não existe o número indicado” — não afastam a constituição em mora quando a notificação é enviada ao endereço contratual. O devedor tem o dever de informar corretamente o endereço no ato da contratação, não podendo imputar ao credor a falha na entrega. IV. Dispositivo e tese. Recurso conhecido e desprovido. Tese de julgamento: “Para a constituição em mora nos contratos garantidos por alienação fiduciária, basta o envio da notificação ao endereço indicado no contrato, sem necessidade de prova de recebimento pelo devedor”. Dispositivos relevantes citados: Decreto-Lei nº 911/1969, art. 2º, § 2º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp nº 1.125.547/RS; Tema 1.132/STJ.” (N.U 1028880-65.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 27/11/2024, Publicado no DJE 29/11/2024) No que se refere à suposta divergência entre os contratos, verifica-se que o contrato mencionado na notificação extrajudicial nº 20037425608 corresponde à formalização definitiva da operação inicialmente proposta sob o nº 576779741. Conforme narrado e documentado, ambos os instrumentos possuem o mesmo objeto — financiamento para aquisição do veículo Fiat Cronos Precision 1.8 Flex Aut., placa QCM5I83 —, idêntico valor financiado, prazo e parcelas. A argumentação do apelante baseia-se na chamada “teoria do papel em branco”, cuja aplicação pressupõe indeterminação do objeto contratual, o que não se verifica no caso concreto, pois os documentos colacionados permitem clara identificação do débito e do bem objeto da garantia. Logo, não há que se falar em nulidade da notificação ou impedimento ao exercício da ampla defesa. A propósito: “AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL ENVIADA POR MEIO DE CARTA REGISTRADA PARA O ENDEREÇO DO CONTRATO – DIVERGÊNCIA ENTRE O NÚMERO DO CONTRATO COM O CONTIDO NA NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL – IRRELEVÂNCIA – HIGIDEZ DOS DEMAIS DADOS CONTRATUAIS – MORA COMPROVADA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. É assente no STJ que "A mora decorre do simples vencimento, devendo, por formalidade legal, para o ajuizamento da ação de busca e apreensão, ser apenas comprovada pelo credor mediante envio de notificação, por via postal, com aviso de recebimento, no endereço do devedor indicado no contrato" (REsp 1592422/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/05/2016, DJe 22/06/2016) In casu, a notificação extrajudicial fora recepcionada no endereço indicado no contrato, de modo que a simples divergência entre o número constante do contrato e àquele aposto na notificação, não é suficiente para afastar a mora em relação à contratação entabulada entre as partes, mormente se o desiderato da aludida notificação extrajudicial se resume unicamente em dar ao devedor a ciência da sua mora.” (TJ-MT - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 1002968-66.2024.8.11.0000, Relator.: DIRCEU DOS SANTOS, Data de Julgamento: 08/05/2024, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 13/05/2024) Ademais, não se constata, no modo de condução da cobrança e da ação judicial, qualquer violação aos princípios da boa-fé objetiva, função social do contrato ou cooperação. A credora agiu de forma diligente ao enviar a notificação ao endereço informado no contrato, tendo adotado os procedimentos legais para a constituição da mora e retomada do bem. A ausência de protesto ou de reiteração da notificação, por si só, não caracteriza má-fé, tampouco afronta à cooperação, especialmente quando a mora se mostra caracterizada nos moldes legais e contratuais. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo a sentença proferida pelo magistrado de primeiro grau. Em razão do trabalho adicional na fase recursal, majoro a verba honorária de 10 para 15% sobre o valor atualizado da causa, com fulcro no art. 85, §11, do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 09/07/2025

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Agro Industrial São Luiz Ltda. x Eagle Shipping International (Usa) Llc

ID: 313679417

Tribunal: TJPR Órgão: 1ª Vara Cível de Paranaguá Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0008056-02.2023.8.16.0129

Data de Disponibilização: 02/07/2025

Polo Ativo:

AGRO INDUSTRIAL SãO LUIZ LTDA.

Polo Passivo:

EAGLE SHIPPING INTERNATIONAL (USA) LLC

Conclusão

Advogados:

PAULO HENRIQUE REIS DE OLIVEIRA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ADRIANO DUTRA EMERICK

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE PARANAGUÁ 1ª VARA CÍVEL DE PARANAGUÁ - PROJUDI Rua Comendador Correa Junior, 662 - Forum - João Gualberto - Paranaguá/PR - CEP: 83.203-560 - Fone: (41)… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE PARANAGUÁ 1ª VARA CÍVEL DE PARANAGUÁ - PROJUDI Rua Comendador Correa Junior, 662 - Forum - João Gualberto - Paranaguá/PR - CEP: 83.203-560 - Fone: (41)3263-6063 - E-mail: par-1vj-s@tjpr.jus.br Autos nº. 0008056-02.2023.8.16.0129 Processo: 0008056-02.2023.8.16.0129 Classe Processual: Procedimento Comum Cível Assunto Principal: Indenização por Dano Material Valor da Causa: R$83.014,13 Autor(s): AGRO INDUSTRIAL SÃO LUIZ LTDA. Réu(s): EAGLE SHIPPING INTERNATIONAL (USA) LLC representado(a) por ORION OPERACOES PORTUARIAS LTDA SENTENÇA 1. Trata-se de Ação Indenizatória ajuizada por AgroIndustrial São Luiz Ltda em face de Eagle Shipping International (USA) LLC, representada por sua agência Orion Operações Portuárias LTDA, qualificados nos autos. Consta da inicial, em síntese, o seguinte: a) a autora adquiriu 2.625 toneladas métricas de superfosfato simples granulado, ao preço de USD 530,00/MT, cujo embarque ocorreu no Porto de Damietta, Egito, em 05/07/2022, com destino ao Porto de Paranaguá/PR, conforme fatura comercial e conhecimento de embarque; b) a ré figurou como responsável pelo transporte marítimo da carga, nos termos do CE-Mercante, documento obrigatório perante a Receita Federal que comprova o recebimento e a obrigação de entrega da mercadoria no destino, caracterizando a empresa como transportadora; c) após o desembarque, constatou a quebra de 30,774 toneladas da carga (1,17% do total contratado), tendo recebido apenas 2.594,226 toneladas, conforme demonstrado no documento denominado Statement of Facts do navio Santos Eagle; d) tal diferença gerou prejuízo financeiro no valor de R$ 83.014,13, calculado com base no valor unitário contratado e na cotação do dólar vigente à época (R$ 5,0897), resultando em responsabilidade civil da ré pelo inadimplemento parcial do contrato de transporte; e) a ré é legítima para figurar no polo passivo, pois, além de constar como empresa de navegação no CE-Mercante, está devidamente representada no Brasil pela agência marítima Orion; f) a responsabilidade da parte ré é objetiva, sendo vedada cláusula de exclusão de responsabilidade por força maior ou quebra natural, e que o transportador assume a obrigação de resultado, respondendo por perdas e danos em caso de não entrega integral da carga; g) invocou doutrina e jurisprudência para reforçar que o transportador não pode se eximir da responsabilidade, salvo prova inequívoca de excludente legal, o que não ocorreu no caso concreto, sendo presumida a culpa em razão do inadimplemento contratual e da ausência de ressalva no embarque quanto ao peso declarado; h) como a parte autora obteve as autorizações de importação, realizou o pagamento integral da carga e do frete, e não houve qualquer prova de vício de origem, caso fortuito ou força maior, encontra-se caracterizado o nexo causal entre a conduta da ré e o dano experimentado. Ao final, a parte autora requereu a condenação da parte ré ao pagamento de R$ 83.014,13, com correção monetária e juros desde o desembarque. Juntou documentos (seqs. 1.2/13). A inicial foi recebida, sendo determinada a citação da parte ré (seq. 16.1). A parte ré foi citada (seq. 28.1). Realizada audiência, não houve conciliação entre as partes (seqs. 29.1/2). A parte ré apresentou contestação (seq. 32.1). Em preliminar, consta o seguinte: i) tese de nulidade da citação, tendo em vista que foi direcionada à empresa Orion Operações Portuárias Ltda., que não possui poderes para representar a parte ré Eagle Shipping International (USA) LLC, limitando-se a atuar como agente portuário no desembarque da carga; sustentou-se que não há entre as empresas vínculo de representação, mandato ou grupo econômico, razão pela qual a Orion não detém legitimidade para receber citação judicial em nome da parte ré; ii) tese de ilegitimidade passiva da parte ré Eagle Shipping International (USA) LLC, sob o argumento de que não foi a responsável pelo transporte marítimo da carga, tampouco figura como transportadora contratada, tendo atuado unicamente como NVOCC (Non Vessel Operating Common Carrier), ou seja, intermediária na contratação do frete internacional, sem possuir, operar ou tripular a embarcação; sustentou-se que a responsabilidade pelo transporte e por eventuais perdas seria exclusiva da empresa armadora proprietária do navio Santos Eagle, sendo esta quem efetivamente realizou o transporte; defendeu-se que o simples registro da parte ré no CE-Mercante tem finalidade meramente fiscal e não a vincula juridicamente como transportadora responsável pela entrega da carga; por fim, requereu-se o reconhecimento da ilegitimidade passiva e a consequente extinção do processo sem resolução do mérito; iii) tese de ausência de jurisdição do Poder Judiciário brasileiro para processar e julgar a demanda, em razão da existência de cláusula de eleição de foro arbitral estrangeiro inserida no conhecimento de embarque que rege a relação entre as partes; sustentou-se que tal cláusula estabelece a obrigatoriedade de resolução de controvérsias por meio de arbitragem internacional administrada por instituição estrangeira, o que afastaria a jurisdição estatal brasileira; argumentou-se que a cláusula arbitral é válida, vinculante e eficaz, sendo incompatível com a tramitação da presente ação no Judiciário nacional; destacou-se que a parte autora aderiu expressamente ao contrato de transporte, não podendo alegar desconhecimento ou nulidade da cláusula, e que, nos termos da jurisprudência pátria, a existência de convenção de arbitragem impede a apreciação judicial da causa; ao final, requereu-se a extinção do feito, sem resolução do mérito; iv) tese de decadência do direito alegado pela parte autora, com fundamento no art. 754 do Código Civil, que prevê o prazo decadencial de 10 dias para reclamação contra perda ou avaria em transporte marítimo, contado da data de recebimento da carga; sustentou-se que a descarga da mercadoria ocorreu em 02/08/2022, conforme indicado nos documentos juntados aos autos, e que a presente demanda somente foi ajuizada em 21/12/2022, fora, portanto, do prazo legal; argumentou-se que o prazo previsto no art. 754 é de natureza decadencial, improrrogável e aplicável às relações comerciais e civis, inclusive no transporte internacional, sendo irrelevante a discussão sobre responsabilidade objetiva ou subjetiva; ressaltou-se que a parte autora permaneceu inerte por mais de quatro meses após o recebimento da carga, operando-se a decadência do direito de pleitear indenização; ao final, requereu-se o reconhecimento da decadência e a extinção do processo. No mérito, consta, em suma, o seguinte: a) argumentou que o CE-Mercante mencionado pela parte autora tem finalidade exclusivamente fiscal e aduaneira, não possuindo valor para caracterizar a parte ré como transportadora responsável pela entrega da carga, tampouco implicando responsabilização por eventual avaria ou quebra; b) afirmou que o conhecimento de embarque juntado aos autos (seq. 1.4) evidencia que a parte ré apenas atuou como expedidora da carga (Shipper), sem deter a posse ou controle sobre a mercadoria durante o transporte; c) destacou que a responsabilidade por avarias no transporte marítimo é do armador, nos termos das Regras de Haia-Visby incorporadas ao direito brasileiro, as quais excluem o NVOCC da cadeia de responsabilidade, salvo se demonstrada culpa direta, o que não ocorreu no caso concreto; d) defendeu que, na eventualidade de se entender pela responsabilidade da parte ré, deve ser observada a cláusula de limitação de responsabilidade constante do conhecimento de embarque, que fixa o limite de USD 500,00 por unidade de carga ou pacote; e) aduziu que não houve demonstração de nexo de causalidade entre a conduta da parte ré e o alegado dano, tampouco prova de que a quebra da carga tenha ocorrido sob sua custódia ou por sua atuação; f) sustentou que o pedido de indenização formulado pela parte autora baseia-se exclusivamente em suposições, sem prova de entrega a menor ou de prejuízo efetivo, sendo inaplicável a responsabilidade objetiva no caso dos autos; g) afirmou que a contratação se deu sob cláusula FOB (Free on Board), segundo a qual os riscos são transferidos ao comprador no momento da entrega da carga a bordo do navio, eximindo o vendedor e o NVOCC de responsabilidade por perdas posteriores; h) impugnou os documentos juntados pela parte autora, por não comprovarem a quantidade efetivamente embarcada, tampouco o valor da suposta perda, sendo indispensável perícia técnica para aferição dos fatos. A parte autora apresentou impugnação à contestação (seq. 36.1). Em fase de especificação de provas, a parte autora pugnou pelo julgamento antecipado (seq. 41.1), ao passo que a parte ré pugnou pela expedição de ofícios (seq. 42.1). Vieram-me os autos conclusos. É o relatório. Decido. 2.1. Preliminares e prejudiciais de mérito 2.1.1. Preliminar de nulidade da citação (art. 337, inciso I, do CPC) A parte ré arguiu tese de nulidade da citação, a qual, todavia, não merece acolhida. Nos termos do art. 239, §1º, do Código de Processo Civil, a ausência ou invalidade da citação acarreta a nulidade dos atos processuais subsequentes, salvo quando houver comparecimento espontâneo da parte ré aos autos, o que se verifica no presente caso, em razão da apresentação de contestação regularmente protocolada, com ampla defesa de mérito e arguição de preliminares, o que supre eventual vício e convalida o ato citatório. Ademais, ainda que se entenda pela necessidade de representação formal para o recebimento da citação, observa-se que a empresa Orion Operações Portuárias Ltda. consta no CE-Mercante como agente da parte ré Eagle Shipping International (USA) LLC, evidenciando a existência de relação operacional vinculada à embarcação e ao transporte marítimo da carga objeto da lide. Embora a parte ré alegue inexistência de vínculo jurídico, a identificação de seu nome no referido documento fiscal aduaneiro demonstra, ao menos em sede de cognição sumária, a presença de atuação no território nacional, suficiente para justificar o recebimento da citação por seu agente marítimo. Além disso, não se verifica qualquer prejuízo à parte ré, a quem foi oportunizado amplo exercício do contraditório e da ampla defesa, não sendo a simples alegação de irregularidade formal, desacompanhada de demonstração de dano processual, suficiente para ensejar a nulidade, conforme entendimento consolidado pelo princípio pas de nullité sans grief. Portanto, rejeito a preliminar arguida. 2.1.2. Preliminar de ilegitimidade passiva (art. 337, inciso XI, do CPC) A parte ré arguiu tese de ilegitimidade passiva ad causam que, todavia, não merece acolhida. De acordo com a teoria da asserção, adotada pela STJ (Resp n° 1.561.498/RJ), as condições da ação devem ser analisadas de forma abstrata, tomando os fatos trazidos na exordial como corretos, ou seja, devem ser analisados in status assertionis, já que o exame mais esmerado ocorrerá posteriormente na fase probatória. Há legitimidade, portanto, quando houver pertinência subjetiva com a lide, isto é, quando em razão das alegações deduzidas na petição inicial for possível concluir que as partes têm relação com o direito material objeto do processo. Por conseguinte, entende-se que o interesse de agir, a legitimidade ad causam, e a agora extinta possibilidade jurídica do pedido, devem ser avaliadas apenas com base nas circunstâncias materiais da relação discutida em juízo, em abstrato e à míngua da produção de qualquer outra prova. Dessa forma, tendo a parte autora demonstrado, ainda que minimamente, a possibilidade do direito pleiteado e da existência da relação jurídica material com a parte ré, por intermédio da prova documental juntada com a inicial (seqs. 1.2/13) a preliminar não deve ser acolhida. Ademais, a questão discutida se confunde com o mérito, revelando-se, assim, prematura a decisão que procede a análise neste momento, uma vez que se fazem necessárias maiores provas para, com maior certeza, demonstrar ou não a responsabilidade da parte ré que, por sua vez, caso não fique evidente ensejará na improcedência dos pedidos formulados na inicial. Portanto, rejeito a preliminar arguida. 2.1.3. Preliminar de descumprimento de cláusula arbitral (art. 337, X, do CPC) Preliminarmente, a parte ré alegou descumprimento de cláusula arbitral pela parte autora, uma vez que o contrato de afretamento possui cláusula de arbitragem internacional, a qual foi incorporada ao conhecimento de embarque. Assim, a tutela pleiteada pela parte autora não pode ser pleiteada perante o Poder Judiciário brasileiro, pois se sujeita a procedimento arbitral. Todavia, sem razão. Compulsando detidamente os autos, verifica-se que a cláusula compromissória internacional constou do conhecimento de transporte e do contrato de transporte, conforme tradução juramentada carreada ao feito. Ocorre que tal contrato de transporte tem natureza de contrato de adesão. É oportuno lembrar que a padronização de cláusulas, sem a possibilidade de discussão pelo contratante aderente, é justamente uma das características dos contratos de adesão. Verificada a natureza jurídica de contrato de adesão, cabe ao juízo estatal analisar a eficácia da cláusula compromissória, à luz do art. 4º, §2º, da Lei nº 9.307/1996, para fins de afastamento de eventual cláusula patológica (STJ. AgInt no REsp 1773599/PE, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª Turma, j. 26/10/2020; AgInt no AgInt no REsp 1431391/SP, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, 4ª Turma, j. 20/04/2020). Com efeito, “com a promulgação da Lei de Arbitragem, passaram a conviver, em harmonia, três regramentos de diferentes graus de especificidade: (i) a regra geral, que obriga a observância da arbitragem quando pactuada pelas partes; (ii) a regra específica, aplicável a contratos de adesão genéricos, que restringe a eficácia da cláusula compromissória; e (iii) a regra ainda mais específica, incidente sobre contratos sujeitos ao CDC, sejam eles de adesão ou não, impondo a nulidade de cláusula que determine a utilização compulsória da arbitragem, ainda que satisfeitos os requisitos do art. 4º, §2º, da Lei nº 9.307/96” (trecho do voto da Exma. Relª. Minª. Nancy Andrighi, proferido no REsp 1785783/GO, 3ª Turma, j. 05/11/2019). Nesta senda, o presente caso se enquadra na “regra específica” a que aludiu o Superior Tribunal de Justiça, que corresponde à formalidade estabelecida no art. 4º, §2º, da Lei nº 9.307/1996: “Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula”. De fato, a formalidade essencial prevista na Lei de Arbitragem se aplica a contratos não consumeristas, visando a possibilitar ao aderente realizar uma escolha informada pela convenção de arbitragem (REsp 1803752/SP, Relª. Minª. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 04/02/2020). Por se tratar de formalidade essencial, trata-se de requisito de validade (art. 104, III, do Código Civil), sendo irrelevante a análise acerca da eventual hipossuficiência das partes; ressalvando-se que, no caso da cláusula compromissória, o vício de forma incide no plano da eficácia, pois se faculta ao aderente instaurar a arbitragem, como prevê o art. 4º, §2º, da Lei nº 9.307/1996. Estabelecidas tais premissas, nota-se que, na hipótese, a cláusula compromissória constante do contrato de transporte não está grafada em negrito. Ademais, não há, pela contratante do serviço de transporte, ora parte autora, “assinatura ou visto especialmente para essa cláusula”, o que é exigido pelo art. 4º, §2º, da Lei nº 9.307/1996, como mencionado acima. Logo, a convenção de arbitragem é ineficaz perante a parte autora. Na senda do exposto, cito o seguinte precedente: APELAÇÃO – CONTRARRAZÕES – PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA – ARBITRAGEM - PACTUAÇÃO DE CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA INTERNACIONAL – Rejeição – Hipótese em que a cláusula compromissória internacional foi pactuada em contrato de adesão – Inobservância às formalidades essenciais previstas na Lei nº 9.307/1996, art. 4º, §2º - Cabimento de controle estatal imediato sobre cláusulas patológicas – Exigência de assinatura específica que é válida inclusive para contratos não consumeristas – Precedentes do STJ – Irrelevância da análise quanto à suposta hipossuficiência das partes, dada a essencialidade da forma (CC, art. 104, inciso III), ressalvando-se que, no caso da cláusula compromissória, o vício afeta o plano da eficácia do negócio jurídico – Ineficácia da cláusula compromissória ante a empresa segurada – Consequente ineficácia da convenção de arbitragem em face da seguradora – PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO - CONTRARRAZÕES - PRELIMINAR – ILEGITIMIDADE ATIVA – Rejeição - Hipótese em que a seguradora comprovou o pagamento da indenização securitária – Existência, em tese, de direito de regresso em face da transportadora ré, apontada como causadora do dano - Legitimidade ativa configurada – PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO – AÇÃO DE COBRANÇA EM REGRESSO – TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL DE CARGA – SUB-ROGAÇÃO – ALOCAÇÃO DE RISCO – PROVA DO PREJUÍZO – Pretensão de reforma da r.sentença de improcedência – Descabimento – Hipótese em que foram pactuadas as Incoterms FOB e CIF, com alocação do risco pelo perecimento da carga em desfavor da compradora – Apólice de seguro que tinha, como única segurada a empresa vendedora – Ausência de prova do prejuízo à empresa vendedora (segurada) – Consequente falta de prova de que a empresa vendedora (segurada) teria direito ou ação contra a transportadora ré, apontada como causadora do dano – Pagamento da indenização securitária que não operou a sub-rogação prevista no art. 786 do CC, dado que não ficou comprovado nos autos do processo que a empresa segurada teria direito ou ação contra a transportadora ré, pretensa causadora do dano – RECURSO DESPROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 1002968-79.2020.8.26.0100; Relator (a): Ana de Lourdes Coutinho Silva da Fonseca; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 17ª Vara Cível; Data do Julgamento: 12/05/2021; Data de Registro: 12/05/2021) (grifo nosso). Portanto, a cláusula compromissória não pode ser invocada pela parte ré. Assim, rejeito a preliminar arguida. 2.1.4. Prejudicial de mérito de decadência (art. 487, inciso II, do CPC) A parte ré arguiu prejudicial de decadência com fundamento no art. 754 do Código Civil, que prevê o prazo de 10 (dez) dias para reclamação por perda ou avaria em transporte marítimo, contados a partir do recebimento da carga. Sustentou que, tendo o desembarque ocorrido em 02/08/2022, e a ação sido proposta apenas em 21/12/2022, estaria configurada a decadência do direito da parte autora. A tese, todavia, não merece acolhida. O prazo decadencial previsto no art. 754 do Código Civil aplica-se às hipóteses de perda ou avaria da carga, ou seja, quando há recebimento da mercadoria em desacordo com o estado esperado. No caso dos autos, contudo, a parte autora não alegou avaria ou deterioração, mas sim o inadimplemento contratual decorrente da entrega parcial da carga adquirida, fato que configura descumprimento da obrigação de resultado assumida pela parte ré. Em situações de inadimplemento contratual, incide o prazo prescricional previsto no art. 205 do Código Civil, de 10 (dez) anos, não se cogitando de decadência. Isso porque o que se discute não é vício na carga entregue, mas sim a não entrega da totalidade do produto contratado, sendo o direito da parte autora de natureza patrimonial e pessoal. Portanto, rejeito a prejudicial arguida. 2.2. Julgamento antecipado Possível o julgamento antecipado do mérito, nos termos artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, uma vez que as matérias a serem analisadas são unicamente de direito, não dependendo, essa análise, da produção de provas. 2.3. Controvérsia e mérito Cinge-se a controvérsia no presente caso, em resumo, em perquirir sobre a (in)existência dos danos materiais suscitados pela parte autora, tendo em vista a (in)ocorrência de ato ilícito passível de indenização pela parte ré. 2.4. Indenização por danos materiais Com relação aos danos materiais, a parte autora alegou que adquiriu 2.625 toneladas métricas de superfosfato simples granulado. Sucedeu que, após todas as operações realizadas no Porto de Paranaguá, recebeu a quantidade de 2.594,226 toneladas métricas da mercadoria, isto é, houve a perda de 30,774 toneladas métricas, o que representa um percentual de 1,17% de quebra. Assim, requereu a condenação da parte ré ao pagamento da quantia de R$ 83.014,13, a título de danos materiais. Os danos patrimoniais ou materiais constituem prejuízos ou perdas que atingem diretamente o patrimônio corpóreo de alguém, os quais podem ser subclassificados em danos emergentes e lucros cessantes (art. 402, CC: salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar). Os danos emergentes dizem respeito ao que efetivamente se perdeu, ao passo em que os lucros cessantes ao que razoavelmente se deixou de lucrar com a prática do ato ilícito (TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. São Paulo: Método, 2014. p. 555). Nesse sentido, a reparação na esfera patrimonial deve ocorrer após a verificação do preenchimento dos pressupostos para a responsabilização no âmbito cível. Os arts. 186 e 927, ambos do Código Civil, identificam os requisitos para tal, estes compreendidos como ação ou omissão, dano e nexo de causalidade. Segundo o art. 186 do Código Civil, “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Na mesma esteira, a regra prevista no art. 927 do Código Civil é clara ao dispor: “aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. Logo, para que a ação de indenização obtenha êxito é imprescindível à parte demonstrar, extreme de dúvidas, a ação dolosa ou culposa do agente, o nexo de causalidade e o dano propriamente sofrido, consoante dispõe os artigos acima citados (arts. 186 e 927 do Código Civil). A esse respeito, de acordo com Sérgio Cavalieri Filho, são três os elementos ou pressupostos do dever de indenizar: a) conduta culposa do agente; b) nexo causal, e c) dano. (In: Programa de responsabilidade civil. 12. ed., rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2015). Traçadas essas premissas, passo à análise do mérito. Como se sabe, a responsabilidade do transportador, nos termos das leis civis e comerciais vigentes, é objetiva, respondendo pela incolumidade dos produtos desde o momento do recebimento até a entrega (artigo 750 do Código Civil), cabendo-lhe conduzi-la ao destino, tomando todas as cautelas necessárias para mantê-la em bom estado e entregá-la no prazo ajustado (artigo 749 do Código Civil), facultada a recusa, caso a embalagem apresentar forma inadequada (artigo 746 do Código Civil). No entanto, o caso dos autos revela peculiaridade cuja observância é imprescindível ao deslinde da causa. Conforme se observa, a diferença apurada no valor do peso da carga, após a chegada do produto ao Porto de Paranaguá, não superou 5% do valor total transportado (seqs. 1.6 e 1.11). Com efeito, houve perda de 30,774 toneladas métricas, o que representa um percentual de 1,17% de quebra da mercadoria - conforme, inclusive, salientou a própria parte autora na petição inicial. O transporte marítimo de mercadorias a granel, em razão da natureza da carga e do seu elevado volume, compreende logística complexa, composta por várias etapas encadeadas, nas quais estão envolvidos diversos prestadores de serviço responsáveis pelos procedimentos de estufagem e desestufagem, embarque, desembarque e armazenagem das mercadorias. Ademais, as mercadorias estão sujeitas às intempéries que podem, em última análise, traduzir-se em reflexo no valor total da mercadoria. Nesse contexto, é da própria natureza do transporte de mercadorias a granel a perda de parcela ínfima de seu percentual original ao longo da cadeia logística de transporte. Tanto é assim, que o art. 169, §7º, I, do Decreto-Lei n° 37/66, com redação dada pela Lei n° 6.562/1978, prevê que não constitui infração administrativa ao controle das importações a diferença, para mais ou para menos, não superior a 5% quanto à quantidade ou ao peso da mercadoria. Nesse contexto, há firme entendimento jurisprudencial no sentido de reconhecer como toleráveis as perdas ou quebras de produtos transportados a granel que não ultrapassem o percentual de 5%. Nesse sentido: Responsabilidade Civil. Ação regressiva. Transporte marítimo de carga a granel. Perda parcial de mercadoria inferior a 2%. Percentual ínfimo que é considerado quebra natural devido às características do produto (a granel) e do transporte marítimo internacional. Indenização. Inadmissibilidade. Jurisprudência dominante do STJ e desta Corte neste sentido. Pedido inicial julgado improcedente. Sentença mantida. Recurso desprovido. Dispositivo: negaram provimento ao recurso. (TJ-SP - Apelação Cível: 1011065-35.2023.8.26.0562 Santos, Relator: João Camillo de Almeida Prado Costa, Data de Julgamento: 11/04/2024, 19ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 11/04/2024) (grifo nosso). APELAÇÃO - AÇÃO REGRESSIVA SEGURO TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL. Pretensão de reforma da r. sentença de improcedência da demanda Descabimento - Hipótese em que não ficou comprovada a responsabilidade da transportadora ré pelo perecimento da carga Perda de mercadoria inferior a 2% do total transportado Precedentes jurisprudenciais no sentido de tolerância, por se tratar de produto a granel RECURSO DESPROVIDO.(TJSP; Apelação Cível 1020099-73.2019.8.26.0562; Relator (a): Ana de Lourdes Coutinho Silva da Fonseca; Órgão Julgador: 13ªCâmara de Direito Privado; Foro de Santos - 12ª Vara Cível; Data do Julgamento: 04/02/2022; Data de Registro:04/02/2022) (grifo nosso). No caso, a parte autora alegou que a carga transportada perfazia o total de 2.625 toneladas métricas, enquanto foi dada a falta de 30,774 toneladas do produto. Ou seja, pouco mais que 1% de perda. Logo, diante dos precedentes acima, de rigor o reconhecimento de ausência de responsabilidade da parte ré. Portanto, improcedente o pedido de danos materiais. 3. Ante o exposto, por sentença, resolvendo o mérito da demanda, na forma do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgo improcedente o pedido contido na inicial, nos termos da fundamentação. 3.1. Considerada a sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, observada a natureza da lide, o grau de zelo do profissional, o local da prestação do serviço e o tempo despendido na demanda, nos termos do artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil, os quais deverão ser corrigidos monetariamente pela média dos índices INPC/IGPD-I, a partir da data do ajuizamento da ação (súmula 14 do STJ) e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, a partir do trânsito em julgado (art. 85, §16, do CPC), observada eventual concessão do benefício da gratuidade da justiça. 4. Interposto recurso de apelação, intime-se a parte recorrida para apresentar contrarrazões no prazo legal de 15 (quinze) dias, conforme artigo 1.010, §1º, do CPC. 4.1. Se apresentada apelação adesiva pela parte recorrida (artigo 997, §§, do CPC), intime-se a parte contrária para contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, conforme o artigo 1.010, §2º, do CPC. 4.2. Caso as contrarrazões do recurso principal ou do adesivo ventilem matérias elencadas no artigo 1.009, §1º, do CPC, intime-se o recorrente para se manifestar sobre elas no prazo de 15 (quinze) dias, conforme o artigo 1.009, §2º, do CPC. 4.3. Após as formalidades acima, encaminhem-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (artigo 1.010, §3º, do CPC), com as homenagens de estilo, ressaltando que o juízo de admissibilidade do(s) recurso(s) será efetuado direta e integralmente pelo Juízo ad quem (artigo 932 do CPC). 5. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. 6. Cumpra-se o Código de Normas do Foro Judicial da CGJ-TJPR no que for pertinente. 7. Intimações e diligências necessárias, servindo a presente como mandado/ofício. Paranaguá, data e horário de inserção no sistema. (assinado digitalmente) Paulo Henrique Dias Drummond Juiz de Direito

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Processo nº 1021481-47.2022.8.11.0002

ID: 310179865

Tribunal: TJMT Órgão: Quarta Câmara Criminal Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 1021481-47.2022.8.11.0002

Data de Disponibilização: 27/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

CLAUDIO HENRIQUE SOUZA NEVES

Acórdão

Advogados:

MICHELLE ALVES DONEGA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1021481-47.2022.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins] Relator: Des(a). HE… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1021481-47.2022.8.11.0002 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins] Relator: Des(a). HELIO NISHIYAMA Turma Julgadora: [DES(A). HELIO NISHIYAMA, DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, DES(A). LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO] Parte(s): [MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELANTE), CLAUDIO HENRIQUE SOUZA NEVES - CPF: 062.483.991-58 (APELADO), MICHELLE ALVES DONEGA - CPF: 264.309.468-94 (ADVOGADO), CLEYSSON RAFAEL MARQUES (APELADO), YTTALO DE SOUZA SANTOS - CPF: 096.588.751-06 (APELADO), CLEYSSON RAFAEL MARQUES - CPF: 117.896.531-77 (APELADO), ANDRE LUIZ MARCONDES NUNES - CPF: 892.727.901-82 (TERCEIRO INTERESSADO), CARLOS ANTONIO ALVES CARVALHO - CPF: 021.178.211-46 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE DEU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. EMENTA DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. NULIDADE DAS PROVAS RECONHECIDA PELO JUÍZO A QUO. PRETENDIDA A CONDENAÇÃO. POSSIBILIDADE. ABORDAGEM POLICIAL VÁLIDA. BUSCA DOMICILIAR REGULAR. FUNDADA SUSPEITA PARA O ATO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS EM RELAÇÃO AO SEGUNDO APELADO. MANTIDA A DESCLASSIFICAÇÃO DOS DEMAIS APELADOS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação criminal interposta pelo Ministério Público contra sentença que desclassificou a conduta dos apelados de tráfico de drogas (Lei 11.343/06, art. 33, caput) para posse de droga para consumo pessoal (Lei 11.343/06, art. 28), ao reconhecer a ilicitude das provas obtidas em busca domiciliar. 2. Fatos relevantes: (i) abordagem policial motivada por tentativa de fuga dos suspeitos; (ii) apreensão de porções de drogas durante busca pessoal; (iii) confissão do segundo réu sobre a existência de drogas em sua residência; (iv) entrada nas residências com consentimento dos moradores; (v) apreensão de drogas e apetrechos relacionados ao tráfico; (vi) quantidade expressiva de droga apreendida com o segundo réu; (vii) provas suficientes do tráfico de drogas pelo segundo apelado; (viii) inexistência de provas em relação aos demais apelados; (ix) requisitos do tráfico privilegiado preenchidos; (x) fração redutora fixada em ½ (metade), em razão da quantidade e circunstâncias da apreensão. 3. Requerimentos do recurso: (i) reconhecimento da legalidade da busca domiciliar; (ii) condenação dos apelados pela prática do crime de tráfico de drogas. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 4. As questões em discussão consistem em: (i) verificar a legalidade da busca domiciliar sem mandado judicial; e (ii) examinar a suficiência das provas para condenação dos réus pelo crime de tráfico de drogas. III. RAZÕES DE DECIDIR 5. Não caracteriza busca domiciliar ilegal quando o contexto fático anterior autorizava a medida, em especial a tentativa de fuga do agente, associada à apreensão de drogas, em local público, próximo ao imóvel revistado. 6. A palavra dos agentes policiais é dotada de presunção de veracidade, sobretudo quando harmônica com as demais provas dos autos e ausentes elementos que indiquem abuso ou má-fé dos servidores públicos. 7. A condenação exige prova robusta sobre a destinação mercantil da droga apreendida. Na ausência de elementos concretos, como a apreensão de instrumentos relacionados ao tráfico e/ou investigações específicas, deve ser preservada a desclassificação operada pelo juízo singular. 8. Impõe-se a condenação pelo crime de tráfico de drogas nas hipóteses em que há apreensão de expressiva quantidade de entorpecente fracionado, no mesmo contexto em que se encontram instrumentos de pesagem e embalagem, comumente utilizados para a prática criminosa. 9. A aplicação da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06 exige que o agente seja primário, tenha bons antecedentes, não se dedique a atividade criminosa e não integre organização criminosa. IV. DISPOSITIVO 10. Recurso parcialmente provido ___________________ Dispositivos relevantes citados: CF, art. 5º, XI; CP, arts. 33, § 2º, “c”, 44, § 2º e 65, I; CPP, art. 244; Lei 11.343/06, arts. 28 e 33, caput e § 4º. Jurisprudências relevantes citadas: STF, RE n. 603.616/RO, ARE n. 1.476.558, RE n. 1.472.570; STJ, HC n. 847.848/GO, AREsp n. 2.287.985/SP. RELATÓRIO EXMO. SR. DES. HÉLIO NISHIYAMA Egrégia Câmara Criminal: Trata-se de apelação criminal interposta pelo Ministério Público de Mato Grosso contra sentença proferida pelo Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Várzea Grande, nos autos n. 1021481-47.2022.8.11.0002, que declarou ilícitas as provas obtidas na busca domiciliar e desclassificou a imputação do crime de tráfico de drogas (Lei 11.343/06, art. 33, caput) aos réus Cláudio Henrique Souza Neves, Yttalo de Souza Santos e Cleysson Rafael Marques para a conduta de posse de droga para consumo pessoal (Lei 11.343/06, art. 28), determinando a remessa dos autos ao Juizado Especial Criminal. Nas razões recursais, o Ministério Público almeja a declaração da legalidade das provas obtidas durante a busca domiciliar, alegando que havia fundadas razões para a ação policial. Em consequência, requer a condenação dos apelados pela prática do delito de tráfico de drogas (id. 269576374). Em contrarrazões, os apelados pleiteiam o desprovimento do recurso (id. 269576378 e 276555883). A Procuradoria-Geral de Justiça opina pelo provimento do recurso, a fim de que os apelados sejam condenados pela prática do crime de tráfico de drogas (Lei 11.343/06, art. 33, caput) (id. 273367352). É a síntese do necessário. Devidamente relatados, os autos foram encaminhados à revisão. VOTO EXMO. SR. DES. HÉLIO NISHIYAMA (RELATOR) Egrégia Câmara Criminal: Extrai-se dos autos que os apelados Cláudio Henrique, Yttalo de Souza e Cleysson Rafael foram denunciados pela prática do crime de tráfico de drogas (Lei 11.343/06, art. 33, caput), com base no seguinte contexto fático: “(...) 1) Consta do caderno informativo em anexo (nº 1021481-47.2022.8.11.0002, 3º Vara Criminal), que no dia 02 de abril de 2022, por volta das 15h00min, na Rua Ipê Roxo, s/n, bairro Vila São João em Várzea Grande/MT, os denunciados CLÁUDIO HENRIQUE SOUZA NEVES, CLEYSSON RAFAEL MARQUES e YTTALO DE SOUZA SANTOS, traziam consigo e mantinham em depósito droga, para posterior venda a consumo sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. 2) Extrai-se dos autos, que policiais militares realizavam patrulhamento no local supracitado, ocasião em que ao perceberem a aproximação da equipe de polícia, os denunciados tentaram fugir em direções opostas. Em ato contínuo, a guarnição logrou êxito em abordá-los, e em busca pessoal, encontraram com CLAÚDIO 13 (treze) porções de pasta base de Cocaína e com CLEYSSON, 08 (oito) porções de Maconha. Durante entrevista informal, o denunciado YTTALO, informou que na sua residência haveriam mais drogas. 3) Diante disso, a equipe da polícia diligenciou até o endereço na Rua Árvore da Fortuna, onde foi franqueada a entrada da guarnição. Durante as buscas, foram encontrados ½ (meio) tablete e 10 (dez) porções de Maconha, 01 (uma) balança de precisão, 01 (um) rolo de papel filme e R$ 20,00 (vinte reais) em espécie. 4) Ressai dos autos, que a guarnição ainda diligenciou até o endereço de CLÁUDIO, uma vez que ele afirmou que em sua casa haviam mais drogas. Entretanto, no local encontraram apenas 1 (um) pote contendo bicarbonato de sódio. 5) Diante dos fatos, os denunciados foram encaminhados para a Delegacia de Polícia, e perante a autoridade policial, os denunciados CLÁUDIO e YTTALO, exerceram o direito constitucional de permanecerem em silêncio. O denunciado CLEYSSON, negou a prática do crime (IDS 88739383, 88739386 e 88739390). 6) Posteriormente, foi expedida a Ordem de Serviço nº 2022.9.8316 a fim de apurar o envolvimento dos denunciados com o tráfico de drogas. Desse modo, o relatório elaborado pela equipe de investigadores concluiu que ‘CLÁUDIO, CLEYSSON e YTTALO são amigos, usuários de drogas e já foram vistos vendendo pequenas porções de entorpecentes no bairro e região’ (SIC ID 88739565). A materialidade do crime restou provada pelo Boletim de Ocorrência ID 88739375, pelo Termo de Apreensão ID 88739380, pelo Laudo Pericial de nº º 3.14.2022.84731-01 (ID 88739382), o qual concluiu que as substâncias apreendidas apresentaram resultado positivo para COCA-ÍNA e MACONHA, pesando, respectivamente, 9,95 g (nove gramas e noventa e cinco centigramas) e 307,59 g (trezentos e sete gramas e cinquenta e nove centigramas). (...)” (sic, id. 269576281). Encerrada a fase instrutória dos autos, o magistrado singular declarou ilícitas as provas obtidas a partir da busca domiciliar e, norteado exclusivamente pelas drogas apreendidas durante a revista pessoal, desclassificou a conduta narrada na inicial acusatória para a infração de posse de droga para consumo pessoal (Lei 11.343/06, art. 28), determinando a remessa do feito ao Juizado Especial Criminal. 1. PEDIDO CONDENATÓRIO 1.1. Provas de autoria e materialidade O Ministério Público sustenta a legalidade da busca domiciliar, aduzindo que havia fundadas razões da prática delitiva e que o crime de tráfico de drogas, por sua natureza permanente, não exige mandado judicial para busca e apreensão. Com a declaração da licitude da abordagem policial, almeja a condenação dos apelados nos exatos termos da inicial acusatória. O pleito merece parcial acolhimento. Conforme prevê a Constituição Federal, “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial” (art. 5º, XI). O direito fundamental à inviolabilidade domiciliar apenas está sujeito a limitações nas hipóteses em que há interesse da própria segurança individual (caso de delito), necessidade de prestação de socorro (desastre ou socorro) ou em benefício da Justiça (determinação judicial) para busca e apreensão de criminosos ou objeto de crime (SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 45. ed. São Paulo: JusPODIVM/Coedição Malheiros, 2024, p. 443). Sobre o tema, o Supremo Tribunal Federal consolidou, em sede de repercussão geral, o entendimento de que o ingresso forçado em domicílio sem mandado judicial só é lícito, mesmo em período noturno, quando amparado em fundadas razões, devidamente justificadas pelas circunstâncias do caso concreto, que indiquem que no interior da residência esteja ocorrendo situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade penal, cível e disciplinar do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados, devendo ser observado o controle judicial diferido ou a posteriori (RE n. 603.616/RO, Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, DJe 10.5.2016, Tema 280 de Repercussão Geral). Dessa forma, os agentes estatais devem nortear suas ações motivadamente e com base em elementos probatórios mínimos que indiquem a ocorrência de situação flagrante, uma vez que o conceito de justa causa não exige a certeza da ocorrência de crime, mas fundadas razões para a ação (STF, ARE n. 1.476.558,DJe02/05/2024). No tocante à justa causa, a Suprema Corte, em recente decisão, entendeu que a prévia apreensão de entorpecentes na posse do agente e a indicação do endereço onde haveria mais drogas armazenadas autoriza o ingresso forçado no domicílio para fins de busca, conforme decidido no Recurso Extraordinário n. 1.472.570: “8. O fato de o réu afirmar que guardava mais entorpecentes em sua casa evidencia a existência de justa causa para o ingresso domiciliar, que resultou na apreensão ‘290 (duzentos e noventa) porções de maconha, pesando 340,8g, 45 (quarenta e cinco) porções de cocaína, com peso líquido de 15,8g, e 25 (vinte e cinco) pedras de ‘crack’, totalizando 7,9g.’ 9. Em se tratando de delito de tráfico de drogas praticado, em tese, nas modalidades ‘guardar’ ou ‘ter em depósito’ a consumação se prolonga no tempo e, enquanto configurada essa situação, a flagrância permite a busca domiciliar, independentemente da expedição de mandado judicial, desde que presentes fundadas razões de que em seu interior ocorre a prática de crime, como consignado no indigitado RE 603.616, portador do Tema 280 da sistemática da Repercussão Geral do STF. (...)” (STF, RE 1.472.570 AgR-segundo-EDv, Relator Min. Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, julgado em 24/02/2025). No caso em análise, o magistrado de origem declarou a ilegalidade da busca domiciliar e, consequentemente, das provas angariadas por meio dela, salientando que inexistiam fundadas razões para que os policiais adentrassem nas residências dos apelados, pois não havia qualquer informação de que nas casas dos acusados ocorria o crime de tráfico. Reconheceu como lícita apenas a busca pessoal, porque justificada pela fuga dos réus ao avistarem os policiais militares e, por fim, desclassificou o delito de tráfico de drogas (Lei 11.343/06, art. 33) para a conduta administrativa de posse de droga para uso pessoal (Lei 11.343/06, art. 28). Em que pese a fundamentação lançada pelo Juízo a quo, a sentença merece reparos, uma vez que o contexto probatório revela que os policiais miliares possuíam fundadas razões para realizar a busca domiciliar, extraídas da prévia apreensão, durante a busca pessoal, de entorpecentes com os apelados. Os policiais militares André Luiz Marcondes Nunes e Carlos Antônio Alves Carvalho relataram, perante a autoridade policial, que durante patrulhamento de rotina, viram três indivíduos em frente a uma residência que, ao avistar a viatura, tentaram fugir do local em direção oposta. Quando abordados, fizeram busca pessoal e localizaram com o apelado Cláudio 13 (treze) porções de substância análoga a pasta base e com Cleysson, oito porções de substância análoga a maconha. Explicaram que, durante a entrevista policial, o apelado Yttalo relatou que em sua residência havia mais drogas. Descreveram ter recebido a anuência da convivente e da sogra de Yttalo para ingressarem no local, onde encontraram meio tablete de maconha, aparelhos celulares, uma balança de precisão, um rolo de papel filme, 10 (dez) porções de maconha e R$ 20,00 (vinte reais) em dinheiro. Detalharam que, em seguida, foram até a residência de Cláudio e com o consentimento prévio do genitor desse apelado, fizeram buscas e localizaram um pote contendo substância esbranquiçada, posteriormente identificada como bicarbonato de sódio (id. 269574873 e 269574874). Em juízo, o PM André Luiz confirmou a versão inicial, esclarecendo que a abordagem se deu em razão da tentativa de fuga dos apelados ao avistarem a viatura policial. Explicou que, após a apreensão das porções de drogas durante a busca pessoal, os próprios réus confessaram possuir mais entorpecentes em suas respectivas residências. Narrou que se deslocaram até os locais indicados, com anuência dos moradores, apreendendo na residência de Yttalo meio tablete de maconha, uma balança de precisão, um rolo de papel filme, 10 porções de maconha e R$ 20,00 em dinheiro: “(...) visualizaram os acusados ao redor de uma motocicleta e denotaram que ao ver a guarnição policial, eles se afastaram, tendo cada um corrido para um lado. Informou que executaram uma abordagem, na qual encontraram entorpecentes. Logo após, os réus informaram que dispunham de mais drogas em seus domicílios. Sendo assim, de acordo com o apurado, fizeram uma diligência nas residências e localizaram mais substâncias ilícitas nos locais. Aduziu que os acusados eram conhecidos de outras equipes, bem como atuavam em comércio de entorpecentes em várias áreas, vendendo nos bairros São João, Ouro Branco e Ouro Verde, todos nesta urbe. (...)” (sic, sentença id. 269576365). Também sob o crivo do contraditório, o policial militar Carlos Antônio ratificou a descrição de que os três indivíduos correram ao avistar a guarnição policial. Confirmou a apreensão de entorpecentes durante a busca pessoal e que Yttalo e Cleysson informaram haver mais drogas em suas residências, razão pela qual se deslocaram até os locais e os revistaram, com anuência dos moradores. Por outro lado, os apelados apresentaram versões contraditórias e isoladas de outros elementos probatórios. O apelado Cleysson, em juízo, negou a autoria delitiva, alegando que apenas Yttalo portava aproximadamente 10g de maconha e que as demais drogas teriam sido “plantadas” pelos policiais. Por sua vez, o apelado Cláudio negou ter corrido ao avistar a viatura e alegou que nenhuma droga foi apreendida em sua posse. O apelado Yttalo também negou os fatos, sustentando que apenas possuía cerca de 10g de droga para uso pessoal. Diante desse contexto, é nítido que a entrada no domicílio particular foi precedida por circunstâncias concretas e relevantes, evidenciadas pela tentativa de fuga ao avistar a viatura policial, pela apreensão de entorpecentes fracionados durante a busca pessoal e pela admissão de Yttalo e Cleysson sobre a existência de mais drogas nas respectivas residências. Ademais, não há motivos para duvidar da palavra dos policiais militares, que mantiveram suas versões na fase inquisitorial e em juízo, sobretudo quando nada de concreto foi produzido para demonstrar qualquer má-fé ou ilicitude nas ações dos agentes estatais. Nesse panorama, a prova dos autos revela que a ação policial se deu diante de relevante contexto fático, consubstanciado na exibição de comportamento suspeito e tentativa de fuga dos agentes ao notarem a presença da guarnição policial. Ademais, a busca domiciliar foi pautada na apreensão de entorpecentes em via pública, associada à declaração de que havia outros entorpecentes nos imóveis e precedida de autorização dos demais moradores. Convém mencionar que, ao analisar situação fática similar, o Superior Tribunal de Justiça tem reconhecido a validade da busca domiciliar, conforme se extrai do seguinte julgado: “(...) No caso, os policiais, ao receberem denúncia anônima de que o paciente estaria envolvido com armas, o avistaram em via pública, próximo à sua residência, e realizaram a abordagem pessoal, ocasião em que foi encontrada maconha (90g) com o paciente. Tal circunstância configurou flagrante de crime permanente, justificando a busca domiciliar subsequente. 5. A busca domiciliar foi validada pelo fato de que o paciente admitiu a existência de mais drogas em sua residência, sendo encontradas, no local, outras porções de maconha (totalizando 2, 370kg), uma balança de precisão, munições e um kit Glock. 6. O entendimento do Tribunal de origem está em consonância com a jurisprudência desta Corte, segundo a qual a apreensão de drogas no curso de um flagrante de delito permanente, como o tráfico de drogas, autoriza a busca domiciliar sem a necessidade de mandado judicial. 7. Alterar as conclusões do Tribunal demandaria o reexame de fatos e provas, o que é inviável em sede de habeas corpus. (...)” (STJ, HC n. 847.848/GO, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 15/10/2024). Assim, ao contrário do alegado pela defesa, as medidas adotadas pelos agentes policiais não caracterizam ilegalidades, no que diz respeito à suposta violação da intimidade, liberdade e/ou privacidade dos apelados, notadamente porque praticadas sob fundadas suspeitas. Nessas circunstâncias, impõe-se reconhecer a legalidade da abordagem e busca domiciliar e, em consequência, das provas obtidas durante a diligência. Superada os questionamentos quanto à legalidade da abordagem, também não há dúvidas acerca da materialidade, evidenciada pelo auto de prisão em flagrante, boletim de ocorrência n. 2022.88199, termos de apreensão, relatório policial e laudo pericial n. 3.14.2022.84731-01. No entanto, a autoria e a tipicidade encontram-se amplamente comprovadas apenas com relação ao apelado Ytallo. É sabido que o crime de tráfico de drogas e a conduta de porte para uso, previstos nos artigos 33 e 28 da Lei 11.343/06, compartilham verbos nucleares semelhantes, de modo que a diferença essencial entre as condutas está na finalidade específica atribuída pelo agente à substância. No caso de Yttalo, a destinação mercantil da droga apreendida é evidenciada por um conjunto robusto de circunstâncias que, analisadas em conjunto, afastam inequivocamente a tese de posse para consumo próprio. Na abordagem pessoal, o apelado portava 29,78g de maconha, divididos em 10 (dez) porções, enquanto na residência os agentes encontraram meio tablete de maconha, com massa total de 266,45g, resultando na apreensão total de 296,23g de maconha em posse de Yttalo, quantidade muito superior à média de consumo diário estabelecida em estudos técnicos. Conforme estudo elaborado pela Polícia Federal, um cigarro de maconha pode conter uma massa média de 0,5 a 1,5 gramas, equivalente de 1 (um) a 5 (cinco) cigarros ao dia, conforme variação de peso apresentada pela quantidade de folhas, sementes, galhos e comprimento (Informação Técnica n. 023/2013 do SETEC/SR/DPF/RS). Isso significa que a porção de maconha apreendida com o apelado era capaz de produzir, a depender do referencial utilizado, entre 197 (cento e noventa e sete) e 592 (quinhentos e noventa e dois) cigarros, quantidade incompatível com a figura da posse para consumo próprio. Importante consignar que essa mesma compreensão foi adotada por este Tribunal de Justiça, conforme se extrai da ApCrim 1011389-61.2023.8.11.0006, Primeira Câmara Criminal, julgada em 28/01/2025 e da ApCrim 1002968-03.2024.8.11.0021, Quarta Câmara Criminal, julgada em 04/04/2025. Outrossim, é fácil identificar o modus operandi do apelado, que armazenava a maior quantidade da droga em sua residência e permanecia em via pública com porções menores, fracionadas e preparadas para a venda e entrega imediata. Não suficiente, as substâncias entorpecentes foram apreendidas no mesmo contexto em que encontrado balança de precisão, rolo de papel filme e dinheiro em notas de pequeno valor, instrumentos comumente utilizados para pesar, embalar e comercializar drogas. Ademais, o fato de o agente ser usuário de drogas não obsta a compreensão de que poderia, em concomitância com a satisfação da dependência química, traficar entorpecentes, inclusive para manter o vício (Enunciado Orientativo n. 03 da TCCR/TJMT). Nesse contexto, restam amplamente comprovadas a autoria e a destinação mercantil do material ilícito apreendido com o apelado Yttalo de Souza Santos, o que impõe sua condenação pelo crime de tráfico de drogas (Lei 11.343/06, art. 33, caput). Todavia, o mesmo não pode ser dito quanto aos apelados Cláudio e Cleysson, sobretudo porque o cenário probatório se apresenta precário e insuficiente para reconhecer a destinação mercantil das substâncias encontradas. O Superior Tribunal de Justiça tem firme orientação de que, em casos de dúvida quanto à destinação da droga, deve-se aplicar o princípio do in dubio pro reo, desclassificando a conduta para o delito de posse para consumo próprio: “(...) A jurisprudência pacífica desta Corte reconhece que, em casos de dúvida quanto à destinação da droga, deve-se aplicar o princípio do in dubio pro reo, desclassificando a conduta para o delito de posse para consumo próprio, previsto no art. 28 da Lei de Drogas. (...)” (STJ, AREsp n. 2.287.985/SP, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 03/12/2024). No tocante ao apelado Cláudio, embora tenham sido apreendidas 13 (treze) porções de pasta base em sua posse, com peso total de 9,95g, não há outros elementos probatórios que evidenciem a destinação mercantil. De igual modo, com o apelado Cleysson foram apreendias apenas 8 (oito) porções de maconha, totalizando 11,36g, quantidade que, nas circunstâncias do caso em análise, revela-se compatível com uso pessoal. Diferentemente do apelado Yttalo, não há informações de que tenham sido apreendidos outros materiais ilícitos nas residências dos apelados Cláudio e Cleysson. Ou seja, além da droga em quantidade relativamente pequena, não há outros elementos probatórios independentes, no sentido de que os agentes comercializavam o material. Apesar de o PM André Luiz alegar que houve a apreensão de ácido bórico no imóvel de Cláudio, o laudo pericial atestou que o material era, na realidade, bicarbonato de sódio (id. 269574879). Associado a isso, apesar de terem apresentado versões contraditórias sobre alguns detalhes da abordagem policial, ambos os apelados sustentaram, de forma consistente, que eram usuários de drogas e que as substâncias encontradas se destinavam ao consumo próprio. Importante considerar, também, que a quantidade apreendida nos autos não é suficiente para caracterizar, por si só, a traficância, especialmente quando isolada de outros elementos probatórios, como apreensão de apetrechos, caderno de anotações, balança de precisão, embalagens picotadas ou descrição concreta de envolvimento com a comercialização de substâncias entorpecentes. Anota-se, ainda, que não foram realizadas outras investigações específicas sobre Cláudio e Cleysson que pudessem comprovar envolvimento anterior com o tráfico de drogas. O relatório policial de id. 269576262, elaborado pelos investigadores, informa somente que colaboradores não identificados narraram que “os suspeitos são amigos e sempre são vistos juntos pelo bairro e região” (sic, id. 269576262). No entanto, a descrição é genérica, unilateral e indireta, pois não há identificação dos supostos informantes ou circunstâncias em que recebidas, o que dificulta sobremaneira o exercício do contraditório e da ampla defesa, impedindo que os apelados possam impugnar adequadamente as alegações contra eles formuladas. Sobre o tema, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que “o testemunho indireto (também conhecido como testemunho de 'ouvir dizer' ou hearsay testimony) não é apto para comprovar a ocorrência de nenhum elemento do crime e, por conseguinte, não serve para fundamentar a condenação do réu” (STJ, AREsp n. 1.940.381/AL, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 14/12/2021). Ademais, ainda que se presuma verdadeiro o vínculo de amizade entre os apelados, esse elemento, por si só, não é suficiente para comprovar a existência de prévia comunhão de vontades para a prática do tráfico de drogas. A simples amizade ou convivência entre pessoas não pode gerar presunção de participação conjunta em atividades criminosas, uma vez que é necessária a demonstração concreta de elementos que evidenciem a participação ativa na venda de drogas, seja em concurso de pessoas ou de forma organizada e estável, para configurar o crime de associação para o tráfico, situação não verificada nestes autos. Nesse cenário, diferente do que entendido pela Procuradoria-Geral de Justiça, a acusação não se desincumbiu do ônus de comprovar, além de dúvida razoável, que Cláudio e Cleysson praticavam tráfico de drogas. A mera apreensão de entorpecentes em quantidades não exorbitantes, sem outros elementos que evidenciem inequivocamente a destinação comercial, não autoriza condenação por tráfico. Assim, em observância ao princípio da presunção de inocência e ao in dubio pro reo, impõe-se preservar a desclassificação da conduta de Cláudio Henrique Souza Neves e Cleysson Rafael Marques para o delito previsto no art. 28 da Lei 11.343/06, conforme realizada pelo juízo singular. 2. DOSIMETRIA DA PENA 2.1. Pena-base Diante da condenação apenas do apelado Yttalo, passo à individualização da pena. O crime de tráfico de drogas prevê pena abstrata de 05 (cinco) a 15 (quinze) anos de reclusão e multa de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. A culpabilidade é normal e não extrapola o tipo penal. O apelado é primário e não existem elementos para aferir sua personalidade. Os motivos e circunstâncias são normais à espécie. As consequências do delito também não extrapolam o ordinário. Assim, fixa-se a pena-base em 05 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. 2.2. Pena provisória Na segunda fase, presente a atenuante da menoridade relativa (CP, art. 65, I), pois o réu contava com menos de 21 anos na data dos fatos (nascido em 27/setembro/2003). No entanto, em observância à Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça, a pena mantém-se inalterada em 05 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. 2.3. Pena definitiva Na terceira fase, é devida a análise da minorante do tráfico privilegiado, prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06, que deve ser aplicada sempre que o agente seja primário, tenha bons antecedentes, não se dedique à atividade criminosa e não integre organização criminosa, sendo esses critérios cumulativos. No caso em análise, o apelado Yttalo faz jus à minorante, notadamente porque é primário, possui bons antecedentes e não há indicativos concretos de dedicação às atividades criminosas ou envolvimento com crime organizado. Embora o legislador não tenha delimitado parâmetros para a redução da pena pela causa de diminuição prevista na Lei 11.343/06, o Superior Tribunal de Justiça tem compreendido que a natureza e quantidade da substância ilícita apreendida podem ser usadas para modular a fração de diminuição, desde que não avaliadas na primeira fase da dosimetria: “(...) A Terceira Seção, nos autos do HC n. 725.534/SP, Relator Ministro Ribeiro Dantas, julgado em 27/4/2022, DJe 1º/6/2022, reafirmou seu posicionamento anterior, conforme estabelecido no ARE 666.334/AM, sobre a possibilidade de valoração da quantidade e da natureza da droga apreendida, tanto para a fixação da pena-base quanto para a modulação da causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006, neste último caso ainda que sejam os únicos elementos aferidos, desde que não tenham sido considerados na primeira fase do cálculo da pena. (...)” (STJ, AgRg no HC n. 812.253/RJ, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 12/06/2023). No caso dos autos, considerando a quantidade expressiva de droga apreendida (296,23g de maconha), associada à forma de acondicionamento (diversas embalagens e porções prontas para a venda), além da apreensão de balança de precisão, plástico filme, a fração redutora deve ser de 1/2 (metade). Portanto, aplicado o percentual de 1/2 (metade), torno definitiva a pena de 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 250 (duzentos e cinquenta) dias-multa, à razão unitária mínima, para o apelado Yttalo. 2.4. Regime prisional Fixa-se regime inicial aberto, nos termos do art. 33, §2º, alínea “c”, do Código Penal. 2.5. Substituição da pena privativa de liberdade Presentes os requisitos legais e em conformidade com o art. 44, § 2º, do Código Penal, cabível a substituição da pena privativa por duas restritivas de direito, a serem especificadas pelo juízo da execução penal. 3. DISPOSITIVO Pelo exposto, em parcial consonância com o parecer ministerial, dou parcial provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público para reconhecer a validade da busca domiciliar e, por consequência, condenar o apelado Yttalo de Souza Santos pela prática do crime de tráfico de drogas privilegiado (Lei nº 11.343/06, art. 33, § 4º), à pena de 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão, em regime inicial aberto, substituída por duas restritivas de direito, e 250 (duzentos e cinquenta) dias-multa, à razão unitária mínima, preservando, por outro lado, a desclassificação da conduta dos apelados Cláudio Henrique Souza Neves e Cleysson Rafael Marques para o delito previsto no art. 28 da Lei 11.343/06. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 24/06/2025

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Brfértil S.A. x Hong Kong Ming Wah Shipping Ltd

ID: 319142889

Tribunal: TJPR Órgão: 1ª Vara Cível de Paranaguá Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0005515-30.2022.8.16.0129

Data de Disponibilização: 08/07/2025

Polo Ativo:

BRFéRTIL S.A.

Polo Passivo:

HONG KONG MING WAH SHIPPING LTD

Conclusão

Advogados:

MARCELO DE LUCENA SAMMARCO

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

ADRIANO DUTRA EMERICK

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE PARANAGUÁ 1ª VARA CÍVEL DE PARANAGUÁ - PROJUDI Rua Comendador Correa Junior, 662 - Forum - João Gualberto - Paranaguá/PR - CEP: 83.203-560 - Fone: (41)… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE PARANAGUÁ 1ª VARA CÍVEL DE PARANAGUÁ - PROJUDI Rua Comendador Correa Junior, 662 - Forum - João Gualberto - Paranaguá/PR - CEP: 83.203-560 - Fone: (41)3263-6063 - E-mail: par-1vj-s@tjpr.jus.br Autos nº. 0005515-30.2022.8.16.0129 Processo: 0005515-30.2022.8.16.0129 Classe Processual: Procedimento Comum Cível Assunto Principal: Indenização por Dano Material Valor da Causa: R$154.113,59 Autor(s): BRFértil S.A. Réu(s): HONG KONG MING WAH SHIPPING LTD representado(a) por WORLD SHIPPING PARANA AGENCIAMENTOS LTDA SENTENÇA 1. Trata-se de Ação Indenizatória ajuizada por BRFértil S.A. em face de Hong Kong Ming Wah Shipping Ltd., representada por sua agência World Shipping Paraná Agenciamentos Ltda, qualificados nos autos. Consta da inicial, em síntese, o seguinte: a) a parte autora alegou ter adquirido e importado fertilizante mineral complexo (NPS 9-46 + 8S), em quatro lotes, totalizando 8.600 toneladas métricas, com embarque realizado no porto de Fangcheng, China, em 11/06/2021, a bordo do navio MV Pacific Valor, com destino aos portos de Paranaguá/PR e Santos/SP, conforme faturas comerciais e conhecimentos de embarque; b) sustentou que a carga foi transportada sob responsabilidade da parte ré, conforme registros no sistema CE-Mercante da Receita Federal, em que consta como empresa de navegação, circunstância que comprovaria sua responsabilidade pelo transporte marítimo; c) afirmou que, após o desembarque, constatou a entrega de apenas 8.555,145 toneladas métricas, o que corresponde a uma quebra de 44,855 toneladas (0,52159% da carga), resultando em prejuízo no valor atualizado de R$ 154.113,59; d) apontou que a ausência da mercadoria ficou comprovada por documentos de rateio e tabelas anexadas, tendo invocado a responsabilidade objetiva da transportadora, nos termos do Código Civil, Código Comercial e tratados internacionais aplicáveis, considerando que o transportador assume obrigação de resultado; e) defendeu a legitimidade passiva da parte ré com base nos dados do CE-Mercante e na obrigação legal de entrega da mercadoria no destino ajustado. Ao final, a parte autora requereu a condenação da parte ré ao pagamento de R$ 154.113,59, com correção monetária e juros legais, a título de indenização pela quebra da carga. A inicial foi recebida, sendo determinada a citação da parte ré (seq. 14.1). A parte ré foi citada (seq. 35.1). A parte ré apresentou contestação (seq. 43.1). Em preliminar, consta o seguinte: i) arguiu a nulidade da citação por ausência de comprovação do recebimento da carta registrada, diante da inexistência de aviso de recebimento assinado pela parte ré, o que comprometeria o contraditório e a ampla defesa; ii) alegou nulidade da citação por ter sido enviada a endereço incompleto, sem número ou complemento necessário à identificação precisa do destinatário, dificultando o recebimento e tornando o ato ineficaz; iii) sustentou a decadência do direito de ação, ao argumento de que o prazo para pleitear indenização por perda ou avaria da coisa transportada é de um ano, contado da data da entrega da carga ou da data em que deveria ter sido entregue, prazo esse que teria se esgotado em 11/06/2022, enquanto a ação foi ajuizada apenas em 17/06/2022; iv) invocou a existência de cláusula compromissória arbitral prevista no conhecimento de embarque n.º MWPS21013, firmado entre a parte autora e a real transportadora (Cosco Shipping Specialized Carriers Co., Ltd.), estabelecendo que qualquer controvérsia decorrente do contrato de transporte seria resolvida por arbitragem sediada em Londres, sob as regras da London Maritime Arbitrators Association (LMAA), afastando a jurisdição estatal; v) alegou a incompetência da justiça brasileira, diante da convenção de arbitragem válida e da inexistência de qualquer elemento de conexão com o território nacional que justificasse a jurisdição brasileira para julgamento da lide. No mérito, consta, em suma, o seguinte: a) sustentou que não integrou a cadeia de transporte marítimo da carga mencionada na inicial, não sendo parte no contrato de transporte internacional e tampouco tendo qualquer ingerência sobre o navio MV Pacific Valor ou sobre a operação de carga e descarga; b) afirmou que a responsabilidade pelo transporte caberia exclusivamente à armadora Cosco Shipping Specialized Carriers Co., Ltd., sendo a parte ré apenas agência marítima local contratada para representar os interesses operacionais do navio no porto de Paranaguá/PR; c) alegou que o registro de seu nome no sistema CE-Mercante da Receita Federal decorreu de equívoco administrativo, por parte do despachante da parte autora ou da própria Receita, sendo o referido sistema meramente fiscal e incapaz de comprovar relação jurídica entre as partes; d) sustentou que, ainda que se entendesse existente alguma obrigação, a suposta quebra de 0,52% da carga estaria dentro do limite de tolerância admitido nas operações de transporte a granel, sendo variação previsível e não indenizável, especialmente diante da natureza volátil do produto transportado (fertilizante mineral); e) destacou que a parte autora não comprovou ter efetivamente embarcado a quantidade total alegada, nem demonstrou nexo causal entre a conduta da parte ré e o prejuízo. Juntou documentos (seqs. 43.2/10). A parte autora apresentou impugnação à contestação (seq. 49.1). Anunciado o julgamento antecipado (seq. 57.1). Vieram-me os autos conclusos. É o relatório. Decido. 2.1. Preliminares e prejudiciais de mérito 2.1.1. Preliminares de nulidade da citação (art. 337, inciso I, do CPC) A parte ré arguiu duas teses de nulidade da citação. Primeiro, arguiu a nulidade da citação por ausência de comprovação do recebimento da carta registrada, diante da inexistência de aviso de recebimento assinado pela parte ré, o que comprometeria o contraditório e a ampla defesa. Segundo, alegou nulidade da citação por ter sido enviada a endereço incompleto, sem número ou complemento necessário à identificação precisa do destinatário, dificultando o recebimento e tornando o ato ineficaz Todavia, nenhuma delas merece acolhimento. Com efeito, o art. 239, §1°, do Código de Processo Civil, estabelece que o comparecimento espontâneo do réu ou do executado supre a falta ou a nulidade da citação, fluindo a partir desta data o prazo para apresentação de contestação ou de embargos à execução. Em complemento à referida disposição legal, de acordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: “o comparecimento espontâneo do réu ou do executado, por mera petição nos autos, deve estar acompanhada de procuração com poderes para receber citação.” (STJ - RHC: 168440 MT 2022/0230566-2, Data de Julgamento: 16/08/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 23/08/2022) (grifo nosso). No caso, ainda que por meio da procuração de seq. 44.2 a parte ré não tenha outorgado, diretamente, poderes para que o(a) advogado(a) pudesse receber citação (art. 105, caput, do CPC), há entendimento jurisprudencial segundo o qual a indicação de dados específicos sobre o processo em que ocorrerá a representação processual é suficiente para fins de reconhecimento do comparecimento espontâneo. Nesse sentido, cito o seguinte precedente lavrado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná: AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DESPEJO POR FALTA DE PAGAMENTO C.C COBRANÇA E PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA. DECISÃO QUE CONSIDEROU PREJUDICADA A ALEGAÇÃO DE NULIDADE DA CITAÇÃO PORQUE O COMPARECIMENTO ESPONTÂNEO SUPRE EVENTUAL VÍCIO, MANTENDO A REVELIA ANTES RECONHECIDA.1. NULIDADE DA CITAÇÃO. RECONHECIMENTO. PROVA DOS AUTOS QUE REVELA QUE A AGRAVANTE, LOCATÁRIA, NÃO RESIDE NO IMÓVEL LOCADO. ART. 248, §4º, DO CPC AFASTADO. - De acordo com o art. 239 do CPC para a validade do processo, como regra, é indispensável a citação da parte. E, em caso de nulidade da citação, ou na falta dela, o §1º do mesmo dispositivo prevê que o comparecimento espontâneo da parte ré supre o vício, fluindo a partir desta data o prazo para apresentação de contestação. - A prova dos autos revela que a agravante reside no litoral, informação de fácil acesso ao locador, o que afasta a presunção de citação no endereço do imóvel locado, prevista no §4º do art. 284 do CPC. 2. COMPARECIMENTO ESPONTÂNEO. PROCURAÇÃO SEM PODERES ESPECIAIS PARA RECEBER CITAÇÃO, MAS QUE INDICA EXPRESSAMENTE O NÚMERO DO PROCESSO JUDICIAL. ADVOGADO QUE, SEM NECESSIDADE DE HABILITAÇÃO E PRÉVIO ACESSO AOS AUTOS, JÁ ALEGOU A NULIDADE DA CITAÇÃO E FORMULOU TESE DE DEFESA DE MÉRITO, JUNTADO INÚMEROS DOCUMENTOS. CIÊNCIA INEQUÍVOCA DA DEMANDA. PRECEDENTES. - “O comparecimento espontâneo, como ato que supre a citação da parte (art. 214, § 1º, do CPC/1973), também ocorre nos casos em que a procuração outorgada confere poderes gerais e contém dados específicos sobre o processo em que se dará a atuação.” (AgInt no REsp n. 2.061.878/SP, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 4/12/2023, DJe de 7/12/2023). 3. REVELIA. DECRETAÇÃO AFASTADA. PETIÇÃO QUE DEVE SER RECEBIDA COMO CONTESTAÇÃO. PARTE QUE JÁ TRAZ SUA VERSÃO DOS FATOS, FORMULA TESES DE DEFESA E JUNTA INÚMEROS DOCUMENTOS.- O CPC, em seu art. 239, §1º, prevê expressamente que o prazo de contestação flui a partir do comparecimento espontâneo, assim, não merece a tese da recorrente no sentido de ser necessária intimação para apresentação de defesa (conduta que era prevista no art. 214, §2º, do CPC de 1973).- Entretanto, se verifica que a agravante já trouxe aos autos sua versão dos fatos e juntos inúmeros documentos para amparar a defesa. Desse modo, diante dos princípios da instrumentalidade das formas, da boa-fé e da cooperação entre todos os sujeitos do processo, resta afastada a revelia, sendo recebida sua petição como contestação. Agravo de Instrumento parcialmente provido. (TJPR - 18ª Câmara Cível - 0129196-65.2024.8.16.0000 - São José dos Pinhais - Rel.: DESEMBARGADOR PERICLES BELLUSCI DE BATISTA PEREIRA - J. 07.04.2025). É o que ocorre in casu, uma vez que, consoante indicado no instrumento de mandato, a parte ré conferiu poderes “para defender os interesses do outorgante nos autos de ação de indenização n° 0005515-30.2022.8.16.0129 em trâmite na 1ª Vara Cível de Paranaguá/PR” (seq. 44.2). Destarte, dou por citada a parte ré, com fundamento no art. 239, §1°, do CPC. Por conseguinte, rejeito as preliminares arguidas. 2.1.2. Prejudicial de mérito de decadência (art. 487, inciso II, do CPC) A parte ré arguiu prejudicial de decadência com fundamento no art. 754 do Código Civil, que estabelece o prazo de 1 (um) ano para propositura de ação de indenização por perda ou avaria de mercadoria transportada. Sustentou que o desembarque final da carga ocorreu em 11/06/2021, e que, como a presente ação foi ajuizada apenas em 17/06/2022, o prazo decadencial teria expirado. A tese, todavia, não merece acolhimento. O prazo decadencial previsto no art. 754 do Código Civil aplica-se especificamente às hipóteses de perda ou avaria da carga, ou seja, quando a mercadoria é entregue em desconformidade com as condições contratadas (danificada, estragada ou inutilizável). No caso dos autos, entretanto, a controvérsia não diz respeito à deterioração ou avaria da mercadoria entregue, mas sim à alegada entrega incompleta da carga, o que caracteriza inadimplemento contratual. Trata-se, portanto, de obrigação de resultado, e a não entrega da totalidade do produto contratado configura descumprimento contratual, situação que atrai a incidência do prazo prescricional, e não decadencial. Em hipóteses como essa, deve-se aplicar o art. 205 do Código Civil, que prevê prazo de 10 (dez) anos para as ações pessoais. No que tange à contagem do prazo prescricional, observa-se que a descarga final da mercadoria ocorreu em 02/08/2022. Contudo, a parte autora alegou que, após o desembarque, realizou tentativas extrajudiciais de solução do impasse, tendo buscado esclarecimentos sobre a diferença de peso na carga e submetido a documentação pertinente para apuração dos valores retidos. Referiu, ainda, que em 16/12/2022 a parte ré apresentou proposta de acordo, que não foi aceita. A petição inicial foi protocolada em 21/12/2022. Nesse intervalo, não transcorreu lapso superior ao prazo prescricional de 10 (dez) anos previsto no art. 205 do Código Civil. Importante destacar, ainda, que a contagem do prazo deve observar a suspensão dos prazos judiciais no recesso forense e os feriados definidos no âmbito do Tribunal de Justiça do Paraná (Decreto Judiciário nº 717/2021). No ano de 2022, houve suspensão de expediente em 28/02, 14/04, 22/04, 17/06, 09/09, 01/11, 14/11 e 19/12, além de feriados nacionais e locais, os quais interferem na contagem dos prazos. Dessa forma, considerando a natureza da obrigação inadimplida, o prazo aplicável, e a tempestividade da propositura da demanda, rejeito a prejudicial de decadência arguida. Portanto, rejeito a prejudicial arguida. 2.1.3. Preliminar de descumprimento de cláusula arbitral (art. 337, X, do CPC) Preliminarmente, a parte ré alegou descumprimento de cláusula arbitral pela parte autora, uma vez que o contrato de afretamento possui cláusula de arbitragem internacional, a qual foi incorporada ao conhecimento de embarque. Assim, a tutela pleiteada pela parte autora não pode ser pleiteada perante o Poder Judiciário brasileiro, pois se sujeita a procedimento arbitral. Todavia, sem razão. Compulsando detidamente os autos, verifica-se que a cláusula compromissória internacional constou do conhecimento de transporte e do contrato de transporte, conforme tradução juramentada carreada ao feito. Ocorre que tal contrato de transporte tem natureza de contrato de adesão. É oportuno lembrar que a padronização de cláusulas, sem a possibilidade de discussão pelo contratante aderente, é justamente uma das características dos contratos de adesão. Verificada a natureza jurídica de contrato de adesão, cabe ao juízo estatal analisar a eficácia da cláusula compromissória, à luz do art. 4º, §2º, da Lei nº 9.307/1996, para fins de afastamento de eventual cláusula patológica (STJ. AgInt no REsp 1773599/PE, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª Turma, j. 26/10/2020; AgInt no AgInt no REsp 1431391/SP, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, 4ª Turma, j. 20/04/2020). Com efeito, “com a promulgação da Lei de Arbitragem, passaram a conviver, em harmonia, três regramentos de diferentes graus de especificidade: (i) a regra geral, que obriga a observância da arbitragem quando pactuada pelas partes; (ii) a regra específica, aplicável a contratos de adesão genéricos, que restringe a eficácia da cláusula compromissória; e (iii) a regra ainda mais específica, incidente sobre contratos sujeitos ao CDC, sejam eles de adesão ou não, impondo a nulidade de cláusula que determine a utilização compulsória da arbitragem, ainda que satisfeitos os requisitos do art. 4º, §2º, da Lei nº 9.307/96” (trecho do voto da Exma. Relª. Minª. Nancy Andrighi, proferido no REsp 1785783/GO, 3ª Turma, j. 05/11/2019). Nesta senda, o presente caso se enquadra na “regra específica” a que aludiu o Superior Tribunal de Justiça, que corresponde à formalidade estabelecida no art. 4º, §2º, da Lei nº 9.307/1996: “Nos contratos de adesão, a cláusula compromissória só terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar, expressamente, com a sua instituição, desde que por escrito em documento anexo ou em negrito, com a assinatura ou visto especialmente para essa cláusula”. De fato, a formalidade essencial prevista na Lei de Arbitragem se aplica a contratos não consumeristas, visando a possibilitar ao aderente realizar uma escolha informada pela convenção de arbitragem (REsp 1803752/SP, Relª. Minª. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 04/02/2020). Por se tratar de formalidade essencial, trata-se de requisito de validade (art. 104, III, do Código Civil), sendo irrelevante a análise acerca da eventual hipossuficiência das partes; ressalvando-se que, no caso da cláusula compromissória, o vício de forma incide no plano da eficácia, pois se faculta ao aderente instaurar a arbitragem, como prevê o art. 4º, §2º, da Lei nº 9.307/1996. Estabelecidas tais premissas, nota-se que, na hipótese, a cláusula compromissória constante do contrato de transporte não está grafada em negrito. Ademais, não há, pela contratante do serviço de transporte, ora parte autora, “assinatura ou visto especialmente para essa cláusula”, o que é exigido pelo art. 4º, §2º, da Lei nº 9.307/1996, como mencionado acima. Logo, a convenção de arbitragem é ineficaz perante a parte autora. Na senda do exposto, cito o seguinte precedente: APELAÇÃO – CONTRARRAZÕES – PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA – ARBITRAGEM - PACTUAÇÃO DE CLÁUSULA COMPROMISSÓRIA INTERNACIONAL – Rejeição – Hipótese em que a cláusula compromissória internacional foi pactuada em contrato de adesão – Inobservância às formalidades essenciais previstas na Lei nº 9.307/1996, art. 4º, §2º - Cabimento de controle estatal imediato sobre cláusulas patológicas – Exigência de assinatura específica que é válida inclusive para contratos não consumeristas – Precedentes do STJ – Irrelevância da análise quanto à suposta hipossuficiência das partes, dada a essencialidade da forma (CC, art. 104, inciso III), ressalvando-se que, no caso da cláusula compromissória, o vício afeta o plano da eficácia do negócio jurídico – Ineficácia da cláusula compromissória ante a empresa segurada – Consequente ineficácia da convenção de arbitragem em face da seguradora – PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO - CONTRARRAZÕES - PRELIMINAR – ILEGITIMIDADE ATIVA – Rejeição - Hipótese em que a seguradora comprovou o pagamento da indenização securitária – Existência, em tese, de direito de regresso em face da transportadora ré, apontada como causadora do dano - Legitimidade ativa configurada – PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO – AÇÃO DE COBRANÇA EM REGRESSO – TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL DE CARGA – SUB-ROGAÇÃO – ALOCAÇÃO DE RISCO – PROVA DO PREJUÍZO – Pretensão de reforma da r.sentença de improcedência – Descabimento – Hipótese em que foram pactuadas as Incoterms FOB e CIF, com alocação do risco pelo perecimento da carga em desfavor da compradora – Apólice de seguro que tinha, como única segurada a empresa vendedora – Ausência de prova do prejuízo à empresa vendedora (segurada) – Consequente falta de prova de que a empresa vendedora (segurada) teria direito ou ação contra a transportadora ré, apontada como causadora do dano – Pagamento da indenização securitária que não operou a sub-rogação prevista no art. 786 do CC, dado que não ficou comprovado nos autos do processo que a empresa segurada teria direito ou ação contra a transportadora ré, pretensa causadora do dano – RECURSO DESPROVIDO. (TJSP; Apelação Cível 1002968-79.2020.8.26.0100; Relator (a): Ana de Lourdes Coutinho Silva da Fonseca; Órgão Julgador: 13ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível - 17ª Vara Cível; Data do Julgamento: 12/05/2021; Data de Registro: 12/05/2021) (grifo nosso). Portanto, a cláusula compromissória não pode ser invocada pela parte ré. Assim, rejeito a preliminar arguida. 2.1.4. Preliminar de incompetência da justiça brasileira A parte ré alegou a incompetência da justiça brasileira, diante da convenção de arbitragem válida e da inexistência de qualquer elemento de conexão com o território nacional que justificasse a jurisdição brasileira para julgamento da lide. Todavia, a preliminar não merece acolhimento. Conforme já fundamentado quando da análise da cláusula arbitral, a convenção de arbitragem constante do contrato de transporte é ineficaz, uma vez que este se apresenta como contrato de adesão. Nos termos do art. 4º, §2º, da Lei nº 9.307/1996, a cláusula compromissória inserida em contratos dessa natureza somente terá eficácia se o aderente tomar a iniciativa de instituir a arbitragem ou concordar expressamente com sua instituição, por escrito, em documento anexo ou em negrito, com assinatura ou visto especialmente para essa cláusula. No caso, observa-se que a cláusula compromissória não foi redigida em negrito, tampouco há prova de que a parte autora tenha aposto assinatura ou visto específico para ela. Trata-se, portanto, de cláusula que não atende aos requisitos formais exigidos pela legislação de regência, o que compromete sua eficácia jurídica. Importante destacar que, em hipóteses como esta, a análise da validade e da eficácia da cláusula compromissória compete ao Poder Judiciário, especialmente diante da ausência de manifestação expressa e qualificada de vontade da parte aderente quanto à adoção do juízo arbitral. Assim, afastada a eficácia da cláusula compromissória, não subsiste fundamento para afastar a jurisdição estatal. Ademais, sendo o local de descarga da mercadoria situado em território brasileiro, a Justiça brasileira é plenamente competente para processar e julgar a presente ação, nos termos do art. 21, incisos I e II, do Código de Processo Civil. Portanto, rejeito a prejudicial arguida. 2.2. Julgamento antecipado Possível o julgamento antecipado do mérito, nos termos artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, uma vez que as matérias a serem analisadas são unicamente de direito, não dependendo, essa análise, da produção de provas. 2.3. Controvérsia e mérito Cinge-se a controvérsia no presente caso, em resumo, em perquirir sobre a (in)existência dos danos materiais suscitados pela parte autora, tendo em vista a (in)ocorrência de ato ilícito passível de indenização pela parte ré. 2.4. Indenização por danos materiais Com relação aos danos materiais, a parte autora alegou que adquiriu 8.600 toneladas métricas de fertilizante mineral complexo (NPS 9-46 + 8S). Sucedeu que, após todas as operações realizadas no Porto de Paranaguá, recebeu a quantidade de 8.555,145 toneladas métricas da mercadoria, isto é, houve a perda de 44,855 toneladas métricas, o que representa um percentual de 0,52159% de quebra. Assim, requereu a condenação da parte ré ao pagamento da quantia de R$ 154.113,59, a título de danos materiais. Os danos patrimoniais ou materiais constituem prejuízos ou perdas que atingem diretamente o patrimônio corpóreo de alguém, os quais podem ser subclassificados em danos emergentes e lucros cessantes (art. 402, CC: salvo as exceções expressamente previstas em lei, as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar). Os danos emergentes dizem respeito ao que efetivamente se perdeu, ao passo em que os lucros cessantes ao que razoavelmente se deixou de lucrar com a prática do ato ilícito (TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. São Paulo: Método, 2014. p. 555). Nesse sentido, a reparação na esfera patrimonial deve ocorrer após a verificação do preenchimento dos pressupostos para a responsabilização no âmbito cível. Os arts. 186 e 927, ambos do Código Civil, identificam os requisitos para tal, estes compreendidos como ação ou omissão, dano e nexo de causalidade. Segundo o art. 186 do Código Civil, “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Na mesma esteira, a regra prevista no art. 927 do Código Civil é clara ao dispor: “aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”. Logo, para que a ação de indenização obtenha êxito é imprescindível à parte demonstrar, extreme de dúvidas, a ação dolosa ou culposa do agente, o nexo de causalidade e o dano propriamente sofrido, consoante dispõe os artigos acima citados (arts. 186 e 927 do Código Civil). A esse respeito, de acordo com Sérgio Cavalieri Filho, são três os elementos ou pressupostos do dever de indenizar: a) conduta culposa do agente; b) nexo causal, e c) dano. (In: Programa de responsabilidade civil. 12. ed., rev. e ampl. São Paulo: Atlas, 2015). Traçadas essas premissas, passo à análise do mérito. Como se sabe, a responsabilidade do transportador, nos termos das leis civis e comerciais vigentes, é objetiva, respondendo pela incolumidade dos produtos desde o momento do recebimento até a entrega (artigo 750 do Código Civil), cabendo-lhe conduzi-la ao destino, tomando todas as cautelas necessárias para mantê-la em bom estado e entregá-la no prazo ajustado (artigo 749 do Código Civil), facultada a recusa, caso a embalagem apresentar forma inadequada (artigo 746 do Código Civil). No entanto, o caso dos autos revela peculiaridade cuja observância é imprescindível ao deslinde da causa. Conforme se observa, a diferença apurada no valor do peso da carga, após a chegada do produto ao Porto de Paranaguá, não superou 5% do valor total transportado (seq. 1.31). Com efeito, houve perda de 44,855 toneladas métricas, o que representa um percentual de 0,52159% de quebra da mercadoria - conforme, inclusive, salientou a própria parte autora na petição inicial. O transporte marítimo de mercadorias a granel, em razão da natureza da carga e do seu elevado volume, compreende logística complexa, composta por várias etapas encadeadas, nas quais estão envolvidos diversos prestadores de serviço responsáveis pelos procedimentos de estufagem e desestufagem, embarque, desembarque e armazenagem das mercadorias. Ademais, as mercadorias estão sujeitas às intempéries que podem, em última análise, traduzir-se em reflexo no valor total da mercadoria. Nesse contexto, é da própria natureza do transporte de mercadorias a granel a perda de parcela ínfima de seu percentual original ao longo da cadeia logística de transporte. Tanto é assim, que o art. 169, §7º, I, do Decreto-Lei n° 37/66, com redação dada pela Lei n° 6.562/1978, prevê que não constitui infração administrativa ao controle das importações a diferença, para mais ou para menos, não superior a 5% quanto à quantidade ou ao peso da mercadoria. Nesse contexto, há firme entendimento jurisprudencial no sentido de reconhecer como toleráveis as perdas ou quebras de produtos transportados a granel que não ultrapassem o percentual de 5%. Nesse sentido: Responsabilidade Civil. Ação regressiva. Transporte marítimo de carga a granel. Perda parcial de mercadoria inferior a 2%. Percentual ínfimo que é considerado quebra natural devido às características do produto (a granel) e do transporte marítimo internacional. Indenização. Inadmissibilidade. Jurisprudência dominante do STJ e desta Corte neste sentido. Pedido inicial julgado improcedente. Sentença mantida. Recurso desprovido. Dispositivo: negaram provimento ao recurso. (TJ-SP - Apelação Cível: 1011065-35.2023.8.26.0562 Santos, Relator: João Camillo de Almeida Prado Costa, Data de Julgamento: 11/04/2024, 19ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 11/04/2024) (grifo nosso). APELAÇÃO - AÇÃO REGRESSIVA SEGURO TRANSPORTE MARÍTIMO INTERNACIONAL. Pretensão de reforma da r. sentença de improcedência da demanda Descabimento - Hipótese em que não ficou comprovada a responsabilidade da transportadora ré pelo perecimento da carga Perda de mercadoria inferior a 2% do total transportado Precedentes jurisprudenciais no sentido de tolerância, por se tratar de produto a granel RECURSO DESPROVIDO.(TJSP; Apelação Cível 1020099-73.2019.8.26.0562; Relator (a): Ana de Lourdes Coutinho Silva da Fonseca; Órgão Julgador: 13ªCâmara de Direito Privado; Foro de Santos - 12ª Vara Cível; Data do Julgamento: 04/02/2022; Data de Registro:04/02/2022) (grifo nosso). No caso, a parte autora alegou que a carga transportada perfazia o total de 8.600 toneladas métricas, enquanto foi dada a falta de 44,855 toneladas do produto. Ou seja, aproximadamente 0,5% de perda. Logo, diante dos precedentes acima, de rigor o reconhecimento de ausência de responsabilidade da parte ré. Portanto, improcedente o pedido de danos materiais. 3. Ante o exposto, por sentença, resolvendo o mérito da demanda, na forma do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, julgo improcedente o pedido contido na inicial, nos termos da fundamentação. 3.1. Considerada a sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, observada a natureza da lide, o grau de zelo do profissional, o local da prestação do serviço e o tempo despendido na demanda, nos termos do artigo 85, §2º, do Código de Processo Civil, os quais deverão ser corrigidos monetariamente pela média dos índices INPC/IGPD-I, a partir da data do ajuizamento da ação (súmula 14 do STJ) e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, a partir do trânsito em julgado (art. 85, §16, do CPC), observada eventual concessão do benefício da gratuidade da justiça. 4. Interposto recurso de apelação, intime-se a parte recorrida para apresentar contrarrazões no prazo legal de 15 (quinze) dias, conforme artigo 1.010, §1º, do CPC. 4.1. Se apresentada apelação adesiva pela parte recorrida (artigo 997, §§, do CPC), intime-se a parte contrária para contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias, conforme o artigo 1.010, §2º, do CPC. 4.2. Caso as contrarrazões do recurso principal ou do adesivo ventilem matérias elencadas no artigo 1.009, §1º, do CPC, intime-se o recorrente para se manifestar sobre elas no prazo de 15 (quinze) dias, conforme o artigo 1.009, §2º, do CPC. 4.3. Após as formalidades acima, encaminhem-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (artigo 1.010, §3º, do CPC), com as homenagens de estilo, ressaltando que o juízo de admissibilidade do(s) recurso(s) será efetuado direta e integralmente pelo Juízo ad quem (artigo 932 do CPC). 5. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. 6. Cumpra-se o Código de Normas do Foro Judicial da CGJ-TJPR no que for pertinente. 7. Intimações e diligências necessárias, servindo a presente como mandado/ofício. Paranaguá, data e horário de inserção no sistema. (assinado digitalmente) Paulo Henrique Dias Drummond Juiz de Direito

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Banco Bradesco S.A. e outros x Banco Bradesco S.A. e outros

ID: 306441233

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1039790-62.2023.8.11.0041

Data de Disponibilização: 24/06/2025

Polo Ativo:

BANCO BRADESCO S.A. GALERA MARI E ADVOGADOS ASSOCIADOS

Polo Passivo:

BANCO BRADESCO S.A. GALERA MARI E ADVOGADOS ASSOCIADOS

Acórdão

Advogados:

LEONARDO BORGES STABILE RIBEIRO

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CLAUDIO STABILE RIBEIRO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

LUIS FELIPE SAMPAIO WERNER

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1039790-62.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Prestação de Serviços, Serviços Profissionais, H… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1039790-62.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Prestação de Serviços, Serviços Profissionais, Honorários Advocatícios] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [GALERA MARI E ADVOGADOS ASSOCIADOS - CNPJ: 00.290.572/0001-52 (APELANTE), LUIS FELIPE SAMPAIO WERNER - CPF: 032.220.871-80 (ADVOGADO), LEONARDO BORGES STABILE RIBEIRO - CPF: 054.525.141-98 (ADVOGADO), BANCO BRADESCO S.A. - CNPJ: 60.746.948/0001-12 (APELANTE), RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA - CPF: 444.850.181-72 (ADVOGADO), BANCO BRADESCO S.A. - CNPJ: 60.746.948/0001-12 (APELADO), RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA - CPF: 444.850.181-72 (ADVOGADO), GALERA MARI E ADVOGADOS ASSOCIADOS - CNPJ: 00.290.572/0001-52 (APELADO), LUIS FELIPE SAMPAIO WERNER - CPF: 032.220.871-80 (ADVOGADO), LEONARDO BORGES STABILE RIBEIRO - CPF: 054.525.141-98 (ADVOGADO), CLAUDIO STABILE RIBEIRO - CPF: 365.942.709-82 (ADVOGADO), CLAUDIO STABILE RIBEIRO - CPF: 365.942.709-82 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO DO BANCO BRADESCO S.A. E PROVEU PARCIALMENTE O APELO DE GALERA MARI E ADVOGADOS ASSOCIADOS. E M E N T A DIREITO CIVIL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. RESCISÃO UNILATERAL DE CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. INEXISTÊNCIA DE ACORDO QUANTO À REMUNERAÇÃO PELA RESCISÃO. VIA ADEQUADA. ARBITRAMENTO EQUITATIVO. DOCUMENTOS DE QUITAÇÃO INIDÔNEOS. MAJORAÇÃO PARCIAL DO VALOR FIXADO. RECURSO DO BANCO DESPROVIDO. RECURSO DO ESCRITÓRIO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame 1. Recursos de apelação interpostos contra sentença que, em sede de ação de arbitramento de honorários advocatícios, condenou instituição financeira ao pagamento de R$ 18.000,00 por serviços prestados em cinco processos, além de honorários sucumbenciais. O Escritório de Advocacia pleiteia majoração do valor. O Banco Bradesco, por sua vez, requer a improcedência da demanda ou, subsidiariamente, a redução da condenação. II. Questão em discussão 2. Há quatro questões em discussão: (i) saber se a via eleita é adequada na hipótese de rescisão unilateral de contrato com previsão de remuneração “ad exitum”; (ii) saber se os documentos de quitação apresentados pelo Banco são aptos a comprovar a quitação integral dos serviços; (iii) saber se é possível o arbitramento com base nos percentuais previstos no art. 85, §2º, do CPC; e (iv) saber se os honorários fixados devem ser majorados ou reduzidos diante do trabalho efetivamente prestado. III. Razões de decidir 3. A ação de arbitramento é via adequada ante a ausência de cláusula contratual específica sobre a remuneração em caso de rescisão unilateral. 4. Os documentos apresentados como termos de quitação são genéricos e não indicam a que serviços ou processos se referem, não sendo aptos a comprovar a quitação dos honorários. 5. A jurisprudência é pacífica no sentido de que, na ausência de proveito econômico mensurável, o arbitramento deve ocorrer por apreciação equitativa, observando os critérios do art. 85, §2º, do CPC. 6. Considerando o grau de complexidade e o tempo de tramitação dos processos, o valor arbitrado deve ser majorado para R$ 34.000,00, sendo R$ 10.000,00 para um dos processos e R$ 6.000,00 para cada um dos demais. 7. Os honorários sucumbenciais fixados em 10% são compatíveis com a complexidade da causa, merecendo majoração para 15% na forma do art. 85, §11, do CPC. 8. Os consectários legais devem observar os parâmetros legais vigentes até a vigência da L. 14.905/2024, incidindo juros de mora de 1% ao mês e correção monetária pelo INPC, devendo a novel legislação ser observada a partir de sua vigência. IV. Dispositivo e tese 9. Recurso do Banco Bradesco desprovido. Recurso de Galera Mari e Advogados Associados parcialmente provido para majorar os honorários para R$ 34.000,00. Tese de julgamento: “1. É cabível ação de arbitramento de honorários advocatícios quando o contrato é rescindido unilateralmente sem previsão de remuneração para essa hipótese. 2. Documentos genéricos de quitação não são hábeis a demonstrar o adimplemento integral dos serviços advocatícios. 3. O arbitramento judicial deve observar apreciação equitativa quando ausente proveito econômico mensurável, nos termos do art. 85, §8º, do CPC.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 5º, XIII, 170, caput; CC, arts. 320, 389, parágrafo único, 406 e §§; CPC, arts. 85, §§2º, 8º e 20; CTN, art. 161, §1º; L. 8.906/1994, art. 22, §2º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 2.073.253/MT, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 15.08.2022; STJ, AgInt no AREsp 2.348.277/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 23.10.2023; TJMT, N.U 1030983-87.2022.8.11.0041, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, j. 26.06.2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Tratam-se de recursos de apelação interpostos por GALERA MARI E ADVOGADOS ASSOCIADOS e pelo BANCO BRADESCO S/A contra sentença proferida pelo Dr. Ana Cristina Silva Mendes, Juíza de Direito da 4ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá, nos autos da Ação de Arbitramento de Honorários Advocatícios n. 1039790-62.2023.8.11.0041, que julgou procedente a pretensão deduzida na inicial, condenando a Instituição Financeira ré ao pagamento de R$ 18.000,00 em razão da atuação nos processos n. 0019339-92.2007.8.11.0041, 0000374-47.2015.8.11.0086, 7044588-20.2019.8.22.0001, 0609599-64.2016.8.04.0001 e 0061368-28.2014.8.14.0301, além de honorários de sucumbência de 10% sobre o valor da condenação (ID. 289524881). A sentença objurgada foi mantida inalterada após a rejeição dos embargos de declaração do BANCO BRADESCO (ID. 289524888). Em suas razões recursais (ID. 289524890), o primeiro apelante GALERA MARI ADVOGADOS ASSOCIADOS alega, em síntese, que a Constituição Federal garante que a toda prestação de serviço corresponderá uma justa remuneração, com base na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa (art. 170, CF), tendo demonstrado nos autos que o Apelado obteve benefício econômico sobre o seu trabalho, fato que não teria sido considerado na sentença recorrida. Por tais razões, pretende o provimento do recurso para “majorar os honorários advocatícios, arbitrando-os em remuneração compatível com o trabalho e o valor econômico da questão (art. 22, § 2º, da Lei nº 8.906/1994), bem como com o grau de zelo do profissional, o lugar da prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço (art. 85, § 2º, do CPC)”. O Banco Apelado apresentou suas contrarrazões em ID. 289524907, reiterando que não há base para majoração da verba fixada, já que os serviços prestados não resultaram em recuperação efetiva dos créditos e se limitaram a diligências ordinárias, como tentativas frustradas de localização de bens, alegando que os pagamentos já realizados contemplaram os serviços efetivamente executados e que qualquer expectativa de remuneração atrelada ao êxito é insubsistente. O BANCO BRADESCO também interpôs seu recurso de apelação no ID. 289524896, levantando como preliminar a nulidade da sentença, uma vez que configuraria decisão extra petita, pois entendeu pelo arbitramento de honorários para o recebimento proporcional dos serviços prestados durante a relação contratual, mesmo reconhecendo a existência de expressa previsão contratual quanto à forma de remuneração, além de pagamentos outros já realizados. No mérito, alega que a relação entre as partes se sustentava por um contrato de prestação de serviços advocatícios, que previa diversas formas de remuneração em diferentes momentos do processo, conforme a etapa concluída, dentre as quais: distribuição de ação (adiantamento), garantia no processo, recuperação final (êxito) ou a irrecuperabilidade declarada do crédito; sendo que consta dos autos declaração de quitação com renúncia expressa a qualquer reclamação ou cobrança a título de honorários advocatícios pela prestação de serviços jurídicos com fato gerador anterior a 31/12/2019, que teria sido inadequadamente valorada pelo Juízo a quo. Suscita, ainda, a necessidade de reforma da sentença, por inadequação da via eleita, uma vez que o arbitramento judicial seria cabível somente “na ausência total de ajuste entre as partes”; bem como que seria indevida qualquer outra remuneração, diante da quitação das obrigações entre as partes; além da ausência de proveito econômico nos serviços efetivamente prestados, de fundamentação genérica no arbitramento dos honorários e de inadequação do ônus sucumbencial. Por fim, prequestiona a matéria, para fins de acesso aos Tribunais Superiores, pugnando pelo provimento do recurso para cassar a sentença de mérito, determinando seja proferida outra em seu lugar, ou, seja pretensão julgada totalmente improcedente, caso se entenda estar a causa madura para tanto. Subsidiariamente, caso se entenda pela manutenção da procedência do pedido, requer seja substancialmente reduzido o valor da condenação referente ao arbitramento de honorários, de forma proporcional e equitativa, tomando por base o tempo de atuação, os atos realizados e a ausência de êxito verificado no feito que originou a presente demanda. O escritório GALERA MARI contrarrazoou o apelo em ID. 289524903, rebatendo os argumentos do Banco apelante, pugnando pelo desprovimento do recurso e majoração dos honorários recursais. Os recursos são tempestivos, estando o preparo do BANCO comprovado por meio do comprovante em ID. 290333393, enquanto que o apelo de GALERA MARI está isento de preparo (ID. 132490719). Desnecessário o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, uma vez que ausente interesse público ou social que justifique a intervenção ministerial. É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: De início, verifico que a preliminar de decisão extra petita aventada pelo BANCO BRADESCO se confunde com o mérito do recurso, e como tal será oportunamente analisada no decorrer deste voto. Antes de adentrar ao mérito, porém, é importante destacar que os fatos em questão já foram objeto de debate em inúmeros recursos trazidos a julgamento por essas mesmas partes, uma vez que o Escritório GALERA MARI busca o arbitramento judicial de honorários em todos os feitos que conduzia até a rescisão unilateral do contrato de prestação de serviços advocatícios pelo BANCO BRADESCO, tendo distribuído várias ações reunindo de três a cinco processos em cada demanda, de modo que a matéria conta com entendimento consolidado em farta jurisprudência neste Sodalício, como se verá a seguir. Dito isso, colhe-se dos autos que o escritório GALERA MARI E ADVOGADOS ASSOCIADOS busca o arbitramento de honorários nos processos n. 0019339-92.2007.8.11.0041, 0000374-47.2015.8.11.0086, 7044588-20.2019.8.22.0001, 0609599-64.2016.8.04.0001 e 0061368-28.2014.8.14.0301, tendo em vista a rescisão unilateral do contrato de prestação de serviços advocatícios por parte do BANCO BRADESCO ocorrida em 19/11/2020, com fulcro no art. 22, §2º, da Lei n. 8.906/1994 c/c art. 85, §20, do CPC. Conforme relatado, o escritório GALERA MARI pretende a modificação da sentença apenas para majorar os honorários arbitrados pelo Juízo a quo, de forma que sejam arbitrados entre 10% e 20% do valor atualizado das causas trabalhadas, com fulcro no art. 22, §2º, da Lei n. 8.906/1994 e art. 85, §20, do CPC, enquanto o BANCO BRADESCO S.A. pretende a reforma para julgar improcedente a pretensão deduzida na inicial, ou, alternativamente, sejam reduzidos os honorários arbitrados. Do cotejo dos autos vê-se que a pretensão do Escritório de Advocacia apelante restou assim delimitada na inicial: “(...) 4) Julgar TOTALMENTE PROCEDENTES os pedidos da petição inicial para condenar o banco réu ao pagamento dos honorários advocatícios devidos ao autor, referente ao trabalho realizado nos processos nsº 0019339-92.2007.8.11.0041, 0000374-47.2015.8.11.0086, 7044588-20.2019.8.22.0001, 0609599-64.2016.8.04.0001 e 0061368-28.2014.8.14.0301, arbitrando-os em valor compatível com o trabalho realizado e com o valor econômico da questão, nos termos do art. 22, § 2º, do EOAB, sendo que o valor da condenação deverá ser atualizado monetariamente a partir do arbitramento e acrescido de juros de mora a partir da data da citação. (...)” (ID. 289523931, p. 45). Por sua vez, constou da sentença recorrida, no que pertine: “(...) GALERA MARI ADVOGADOS ASSOCIADOS propôs AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS em desfavor do BANCO BRADESCO S/A, ambos devidamente qualificados e representados nos autos. O autor narra que por mais de 31 anos, de forma ininterrupta e em caráter quase que exclusivo, prestou serviços jurídicos ao réu e, durante esse período, ocorreram inúmeras alterações contratuais. Relata que no dia 19/11/2020 foi notificado pelo Banco réu acerca da intenção da rescisão do contrato, com a revogação das procurações que lhes foram outorgadas. Informa que prestou as contas dos serviços prestados e que estavam pendentes de pagamento e os respectivos valores, no formato exigido pelo réu, tendo-o notificado para que efetuasse o pagamento ou que se compusessem, mas o banco ignorou todas as tentativas de negociação. Requer a condenação do réu ao pagamento dos honorários advocatícios relativo aos serviços prestados nos processos nº 0019339-92.2007.8.11.0041, 0000374-47.2015.8.11.0086, 7044588-20.2019.8.22.0001, 0609599-64.2016.8.04.0001, 0061368- 28.2014.8.14.0301, arbitrando-os de acordo com o art. 22, § 2º, do EOAB, bem como nas custas processuais e honorários. (...) É o relatório. Decido. Trata-se de AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS proposta por GALERA MARI ADVOGADOS ASSOCIADOS em face do BANCO BRADESCO S/A. Considerando que as partes não requereram a produção de provas, promovo o julgamento antecipado da lide, na forma do artigo 355, I, do CPC. PRELIMINARES Passo à análise das preliminares na ordem imposta pelo art. 337 do CPC. A) Da Inépcia da Petição Inicial A petição inicial é inepta quando lhe faltar pedido ou causa de pedir; da narração dos fatos não decorre logicamente a conclusão; o pedido for juridicamente impossível; e/ou contiver pedidos incompatíveis entre si (art. 330, do CPC). O rol de casos de inépcia é taxativo, de modo que se determinada situação não se subsumir a nenhuma das hipóteses previstas no art. 330 do CPC, não se pode extinguir o processo por esse fundamento. O réu alegou inépcia da inicial, sustentando a inexistência de congruência entre a causa de pedir e o pedido. Contudo, a narrativa da petição inicial é clara e atende aos requisitos legais, demonstrando a relação jurídica entre as partes, o objeto da prestação dos serviços advocatícios e os fundamentos do pedido. A inicial não apresenta nenhuma das hipóteses de inépcia previstas no art. 330, § 1º, do CPC. Por oportuno, registro que os fatos foram bem expostos pelo autor, de forma lógica, havendo pedido certo e determinado, pedido este que não é vedado pelo ordenamento jurídico. Dito isto, REJEITO a preliminar de inépcia da petição inicial. B) Conexão O banco requerido suscitou a conexão entre a presente ação e a ação n. 1002968-11.2022.8.11.0041, que tramita perante a 03ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT. Trata-se de demanda autônoma, externa exclusivamente ao arbitramento de honorários relativos aos processos indicados na inicial. Não há identidade entre os objetos das ações, sendo inaplicável o disposto no art. 55 do CPC. Assim, REJEITO a arguição de conexão. C) Da Ilegitimidade Passiva A preliminar de ilegitimidade passiva não merece acolhida, eis que o autor não está pleiteando honorários de sucumbência, mas o arbitramento de honorários advocatícios pela rescisão unilateral do contrato firmado entre as partes. Acerca do tema: (...) (TJMT; APL 54291/2017; Primavera do Leste; Relª Desª Nilza Maria Pôssas de Carvalho; Julg. 18/07/2017; DJMT 27/07/2017; Pág. 26). Deste modo, REJEITO a preliminar de ilegitimidade passiva. D) Da Falta do Interesse de Agir por Inadequação da Via Eleita O réu arguiu a preliminar de falta do interesse de agir por inadequação da via eleita. No entanto, o que se vê da narrativa da exordial é que o autor pretende o recebimento de honorários que faz jus em razão do trabalho efetivamente prestado nos autos 0019339- 92.2007.8.11.0041, 0000374-47.2015.8.11.0086, 7044588-20.2019.8.22.0001, 0609599- 64.2016.8.04.0001, 0061368-28.2014.8.14.0301 e que deixou de receber em razão da rescisão antecipada do contrato de prestação de serviços. Logo, o autor não está pleiteando honorários de sucumbência. Diante disso, REJEITO a preliminar de falta do interesse de agir por inadequação da via eleita. E) Da Falta do Interesse de Agir por Ausência de Necessidade Utilidade na Exigência de Honorários contratuais por Êxito Essa preliminar se confunde com o próprio mérito da ação de arbitramento e será analisado oportunamente. F) Da Impugnação a Justiça Gratuita O requerido impugnou os benefícios da justiça gratuita concedido ao autor. No caso dos autos, o autor alegou que sua receita foi significativamente reduzida após a rescisão contratual unilateral promovida pelo requerido, tendo sido instruída a inicial com documentos que corroboram suas observações. Além disso, o requerido não trouxe aos autos elementos robustos que contrarie a situação financeira declarada pelo autor. Em uma breve consulta no PJE é notório que o autor ajuizou diversas ações contra o banco requerido, buscando o arbitramento de honorários advocatícios, o que indica que sua receita depende de ganhos de valores não pagos. Desta forma, não tendo provas de que desconstituam os fundamentos apresentados na concessão do benefício, a manutenção da justiça gratuita ao autor é medida que se impõe. Diante disso, REJEITO a impugnação à concessão da justiça gratuita ao autor. Não havendo outras preliminares, tampouco questões processuais pendentes, verifico que as partes estão regularmente representadas e são legítimas. Presentes todos os demais pressupostos processuais e condições da ação, passo à análise do mérito. Mérito É incontroversa a relação jurídica existente entre as partes, o que é demonstrado tanto pelo contrato de prestação de serviços jurídicos (Id. 132285844), como também pelos serviços prestados no processo n. 0019339- 92.2007.8.11.0041, 0000374-47.2015.8.11.0086, 7044588-20.2019.8.22.0001, 0609599- 64.2016.8.04.0001, 0061368-28.2014.8.14.0301. É certo também o fato de que o réu dispensou os serviços do autor de forma unilateral, como demonstra a notificação de comunicação de rescisão contratual acostada no Id. 132285851. Sobre a rescisão, o contrato firmado entre as partes prevê: “17.1 O presente ‘contrato’ poderá ser rescindido a qualquer momento, por qualquer das partes, observadas as disposições adiante estipuladas, mediante denúncia escrita com antecedência de 30 (trinta) dias contados a partir de seu recebimento pela outra parte. [...] 17.6 Ocorrendo a rescisão o Contratante pagará à Contratada a importância a que eventualmente fizer jus, recebendo os valores em relação aos serviços das etapas já concluídas e que estejam, ainda, pendentes de pagamento, perecendo o direito a qualquer pagamento pelos serviços que não tenham sido concluídos. 17.6.1 O pagamento da importância supracitada somente será realizado mediante assinatura de termo de distrato e quitação.” No que se refere aos pagamentos dos honorários, a cláusula 6 e seus subitens, prevê: “6. Por todos os serviços prestados objeto deste ‘contrato’, as partes ajustam que o Contratante pagará a Contratada exclusivamente os valores estipulados nesta cláusula e em conformidade com a modalidade dos serviços ou fases adiante previstas. 6.1 (i) Para habilitar-se ao recebimento dos honorários avençados neste ‘contrato’, a Contratada deverá apresentar mensalmente ao Contratante, entre os dias 1 (um) e 5 (cinco) do mês subsequente à prestação dos serviços um relatório descritivo dos serviços que estão sendo remunerados, indicando individualmente os dados dos casos acompanhados, para validação pelo Contratante, que após autorizará a Contratada a emitir a nota fiscal, cujo pagamento ocorrerá até o último dia do mês em que a nota fiscal e os respectivos documentos forem apresentados, caso não haja necessidade de correção da nota fiscal apresentada. [...] 6.20(i) Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem à Contratada e em razão do ‘Beneficio Financeiro’ que rege este contrato, sua cobrança não impedirá ou reduzirá os esforços da Contratada para a realização de acordo e recebimento do credito pelo Contratante. [...] 6.22 (i) Ao término de cada ano civil, a Contratada deverá adotar as medidas cabíveis, o mais urgente possível, para que todos os honorários devidos em decorrência deste ‘contrato’ sejam objeto de solicitação de pagamento ao Contratante para que este possa efetivá-lo e, assim, as partes estarem mutuamente quitadas relativas ao referido exercício;” Verifica-se que, além das cláusulas citadas, as partes firmaram outras que beneficiam financeiramente o autor. Especificam, inclusive, valores por tipo de ação, assim como por volumes/demandas, estabelecendo também um teto remuneratório por processo, vejamos: “6.6 TETO HONORÁRIOS (i) Pelos serviços prestados a Contratada fará jus aos valores adiante mencionados, entretanto sempre limitados (Teto) ao valor de R$ 98.817,00 (noventa e oito mil, oitocentos e dezessete reais) por processo ou, caso não esteja ajuizado, por acordo extrajudicial, respeitadas as exceções e regras previstas neste ‘Contrato’; 6.7 VOLUMETRIA (i) A Contratada fará jus, a título de adiantamento, ao recebimento dos honorários de R$ 541,00 (quinhentos e quarenta e um reais), nos seguintes casos: (a) por execução extrajudicial, monitória, ordinária de cobrança, busca e apreensão, reintegração de posse, visando a recuperação de créditos, devidamente distribuídas em no máximo até 30 (trinta) dias da recepção dos ‘Documentos de Crédito’ enviados pelo Contratante; (b) na remessa de ações revisionais, prestação de contas, embargos de terceiro, indenizatórias, reparação de danos e planos econômicos, necessárias para a defesa do Contratante e (c) na adoção de procedimentos previstos na Lei n. 9.514/97, cujo valor poderá ser alterado em razão da aplicação da ‘Curva de Volumetria’, conforme subitens abaixo; Há ainda cláusula em que, não tendo como calcular os honorários, estes serão definidos conforme o beneficio financeiro revertido em favor do Contratante, ora réu: “6.3 PRINCIPIO DO BENEFÍCIO FINANCEIRO (i) O presente Contrato obedecerá ao principio do benefício financeiro, assim entendido, todo e qualquer recebimento de ativos, financeiros ou patrimoniais, cujo benefício tenha sido efetivamente obtido e revertido em favor do Contratante, em decorrência dos trabalhos desenvolvidos pela Contratada (Beneficio Financeiro); [...] (ii) Em caso de dúvida quanto à interpretação de cláusula ou condição deste ‘contrato’, tal principio deverá ser aplicado para o cálculo de qualquer verba que seja devida a Contratada, respeitando os percentuais aqui previstos; (iii) Se a base de cálculo de honorários não estiver ou não puder ser definida em quantia determinada, considerar-se-á como ‘Benefício Financeiro’ o valor líquido recebido pelo Contratante, oriundo de ativos financeiros ou outro ativo consistente em bens móveis ou imóveis;” As alterações realizadas nos aditivos (Ids. 132285845/ 132285850) tratam sobre valores de honorários, tratamento de dados, não ocorrendo alterações substanciais ao contrato primitivo. As cláusulas contratuais demonstram que o autor recebia pequenos valores, de acordo com peças processuais ajuizadas, protocoladas, assim como limitados aos volumes impostos pelo contrato, não podendo estes substituir a remuneração ao final de cada demanda, conforme a recuperação final do crédito em favor do réu. Resta, portanto, demonstrado que é assegurado ao autor, ao final de cada demanda, o recebimento de honorários de recuperação final de crédito em favor do réu, ou seja, decorrente do proveito econômico experimentado pelo banco. Ocorre que, com a rescisão contratual unilateral e antecipada, o autor se viu impossibilitado em continuar com a prestação dos serviços e de buscar um melhor e satisfatório resultado ao banco, visando o recebimento de honorários ao final das causas patrocinadas. Em nosso ordenamento jurídico, a prestação de serviços está regulamentada pelos artigos 593 a 609 do Código Civil, sendo que o seu 594 dispõe: “Toda a espécie de serviço ou trabalho lícito, material ou imaterial, pode ser contratada mediante retribuição.” (grifo nosso) Sobre o dispositivo supra, Arnaldo Rizzardo, comenta: “Concebe-se a prestação de serviços como o contrato sinalagmático através do qual uma das partes contratantes, designada prestadora (no Código de 1916 ‘locadora’), se compromete a prestar serviços ou mão de obra, que a outra, denominada beneficiaria ou recebedora (no Código de 1916 ‘locatária’), se compromete a remunerar. [...].” (In Contratos, Editora Forense. Rio de janeiro, 2015, p. 602). Maria Helena Diniz anota: “A prestação de serviço é um contrato pelo qual uma das partes (prestador) se obriga para com a outra (tomador) a prestar-lhe uma atividade lícita, material ou imaterial, mediante remuneração [...]. O objeto da prestação de serviço é uma obrigação de fazer, ou seja, a prestação de uma atividade lícita, não vedada pela lei e pelos bons costumes, oriunda da energia humana aproveitada por outrem, e que pode ser material (limpeza, jardinagem, conserto de TV, digitação, etc.) ou imaterial (p. ex., tratamento médico ou odontológico, consultoria jurídica, etc.).” (in Código civil anotado. 13ª edição, Saraiva. São Paulo, 2008, p. 454/455). E o Ministro Cezar Peluso: “[...] contrato de prestação de serviços é uma atividade humana, manual ou intelectual, doméstica ou externa, cujos exemplos têm o condão de falar por si: a prestação de serviços médicos, odontológicos, arquitetônicos ou advocatícios, além dos serviços comumente contratados de diarista e pintores.” (Código civil comentado : Coordenador Min. Cezar Peluso. 8ª edição, Manole. São Paulo, 2014, p. 600). Como se infere das lições supra, a remuneração é inerente ao contrato de prestação de serviço. E, tratando especialmente da prestação de serviços advocatícios, o Estatuto da Advocacia disciplina em seu art. 22, o qual foi recentemente alterado: “Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência. § 1º O advogado, quando indicado para patrocinar causa de juridicamente necessitado, no caso de impossibilidade da Defensoria Pública no local da prestação de serviço, tem direito aos honorários fixados pelo juiz, segundo tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB, e pagos pelo Estado. § 2º Na falta de estipulação ou de acordo, os honorários são fixados por arbitramento judicial, em remuneração compatível com o trabalho e o valor econômico da questão, observado obrigatoriamente o disposto nos §§ 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 6º-A, 8º, 8º-A, 9º e 10 do art. 85 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil). (Redação dada pela Lei nº 14.365, de 2022).” De igual maneira, o art. 14 do Código de Ética da Advocacia dispõe: “Art. 14. A revogação do mandato judicial por vontade do cliente não o desobriga do pagamento das verbas honorárias contratadas, bem como não retira o direito do advogado de receber o quanto lhe seja devido em eventual verba honorária de sucumbência, calculada proporcionalmente, em face do serviço efetivamente prestado”. O requerido traz aos autos termos de quitação no intuito de comprovar que nada deve ao autor. Entretanto, o termo de quitação de honorários, datado de 31/05/2016, anexado no Id. 134557941, se refere à quitação dos honorários e despesas referente aos fatos geradores anteriores a 31/12/2015: “Pelo presente e por ser expressão da verdade, o escritório Galera Mari e Advogados Associados S/S, [...], neste ato devidamente representados por seus sócios administradores nos termos do seu Contrato Social, dá ao Banco Bradesco S/A e todas suas empresas integrantes do seu conglomerado econômico, coligadas e afins, a mais ampla, total, geral e irrevogável quitação, para nada mais reclamar, seja a que título for, quer no presente ou futuro, renunciando assim ao direito de qualquer reclamação e/ou cobrança de valores de honorários advocatícios e demais despesas devidas em decorrência da prestação de serviços jurídicos com fato gerador até 31 de dezembro de 2015, nos termos da Cláusula 16.2 do instrumento contratual firmado entre as partes.” A cláusula 16.2, prevê: “16.2 Quaisquer pagamentos que forem devidos pelo Contratante em decorrência de atos praticados antes da vigência deste ‘contrato’ deverão ser objetos de solicitação de pagamento pela Contratada em até 60 (sessenta) dias da data deste ‘contrato’, para que todos os honorários e/ou despesas pendentes sejam pagos pelo Contratante e, assim, as partes estejam mutuamente quitadas. Em consonância com o acima disposto, em até 90 (noventa) dias da data deste contrato, a Contratada deverá apresentar ao Contratante uma declaração de quitação de honorários relativo a outros contratos de prestação de serviços anteriormente firmados, outorgando ao Contratante a mais plena, geral, irrevogável e irretratável quitação e renunciando a Contratada ao direito de qualquer discussão futura.” Ou seja, os honorários que eram devidos antes dessa data (31/12/2015), foram todos quitados, nada mais sendo devido pelo réu. Os demais termos, datados de 31/03/2017, 23/04/2018 e 10/03/2020, se referem a fatos geradores de 2016, 2017 a 2019, e todos fazem referencia à cláusula “da quitação de honorários” (cláusula 6.22). Referida quitação anual, prevista na clausula 6.22, não se refere aos honorários decorrentes do beneficio financeiro a serem pagos com a extinção do processo em que o escritório autor atuou, mas aos que foram antecipados anualmente durante a tramitação do processo, em especial os contidos na cláusula volumetria “6.7”. Portanto, verifica-se que o autor foi parcialmente remunerado pelos serviços prestados, em forma de adiantamento. Todavia, é certo também que o contrato prevê que o Contratado receberia honorários ao final de cada demanda, de acordo com a recuperação final do crédito revertido em favor do Contratante, assim como os de sucumbência. Logo, como a rescisão do contrato de prestação de serviços advocatícios ocorreu antecipadamente, o autor ficou impedido de receber tais honorários. Para a hipótese de rescisão contratual antecipada, tem-se admitido a relativização da regra contratual de honorários, a fim de evitar o locupletamento indevido. Se prevalecer a regra originariamente pactuada, haverá afronta aos princípios da boa-fé objetiva, função social do contrato e locupletamento ilícito. Afinal, o contrato foi rescindido unilateralmente pelo réu, impedindo o autor de atuar no feito, de modo a alcançar os melhores resultados, assim como receber efetivamente em decorrência de créditos revertidos em favor do réu. O arbitramento dos honorários aqui não fere o pactuado, haja vista que a rescisão de forma unilateral impediu o autor de participar e receber honorários na recuperação final do crédito pelo réu. Impediu também de atuar para o implemento das condições favoráveis ao bom deslinde das cobranças/execuções, devendo neste caso o cliente assumir o ônus de remunerar o advogado, sob pena de enriquecimento ilícito do contratante. O Superior Tribunal de Justiça possui o entendimento pacífico de que o rompimento do contrato de prestação de serviços pelo cliente, impedindo o advogado de patrocinar a causa até o fim, autoriza o arbitramento de honorários, na proporção dos serviços prestados. Nesse sentido: (...) (STJ, AgInt nos EDcl no REsp n. 1.840.754/SP, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 3/5/2022, DJe de 6/5/2022.). (...) (STJ, AgInt no AREsp n. 703.889/RS, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 19/10/2020, DJe de 26/10/2020.). O mesmo posicionamento tem o Tribunal de Justiça de Mato Grosso, conforme ementas que transcrevo: (...) (N.U 1045939-11.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 07/08/2024, Publicado no DJE 12/08/2024). (...) (N.U 1047702-47.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 07/08/2024, Publicado no DJE 13/08/2024) (...) (N.U 1008685-04.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 06/08/2024, Publicado no DJE 09/08/2024). Demonstrada a possibilidade de arbitramento de honorários advocatícios ao caso em apreço, passo a análise do valor a ser arbitrado. O autor pede que os honorários advocatícios sejam arbitrados de acordo com a redação do art. 22, § 2º do Estatuto da OAB, verbis: “Art. 22. (...) No entanto, o contrato firmado entre as partes estipula um limite na cláusula “6.6 Teto Honorários”, que em seu aditivo prevê o montante máximo de R$ 98.817,00 (noventa e oito mil, oitocentos e dezessete reais) de honorários a serem pagos ao final. Logo, não há como este juízo fixar os honorários entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o proveito econômico, como disciplina o art. 85, §2º do CPC, eis que ultrapassaria o teto contratualmente previsto. A par disso, o valor deve ser fixado por apreciação equitativa, como impõe o § 8º do art 85 do CPC, e considerando o tempo, o grau de zelo e os serviços prestados, bem como os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Por oportuno, registro os seguintes julgados: (...) (TJMT, N.U 1027794-77.2017.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 10/08/2022, Publicado no DJE 15/08/2022). (...) (RESP nº 767.783/PE, relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, 3ª Turma, DJe 03/02/2010).” (TJMG; APCV 5003360-03.2016.8.13.0245; Vigésima Câmara Cível; Rel. Des. Fernando Lins; Julg. 24/05/2023; DJEMG 25/05/2023). (...) (TJMG; APCV 5014538-88.2021.8.13.0433; Vigésima Câmara Cível; Rel. Des. Vicente de Oliveira Silva; Julg. 01/03/2023; DJEMG 02/03/2023). (...) (TJSC; APL 0500025-87.2010.8.24.0057; Primeira Câmara de Direito Civil; Rel. Des. Silvio Dagoberto Orsatto; Julg. 09/06/2022). Pois bem. A) PROCESSO DE EXECUÇÃO Nº 0019339-92.2007.8.11.0041. COMARCA DE CUIABÁ/MT – Ajuizada no dia 24/09/2007, AÇÃO DE EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL em desfavor de EDEM FILIPALDI FILHO, NELIO FERNANDES e SÃO BENEDITO LOCAÇÃO DE MÁQUINAS EQUIPAMENTOS LTDA - ME, pretendendo o recebimento de R$ 23.166,43 (vinte e três mil, cento e sessenta e seis reais e quarenta e três centavos), ante o inadimplemento dos executados no cumprimento das obrigações contratadas por meio da Cédula de Crédito Bancário Conta Garantida – Renovação Automática Aval nº 001.936.287, celebrada em 22/03/2007. Citados, os devedores permaneceram inertes após a intimação, o r. Juízo determinou que fosse expedido novo mandado de intimação para que os executados informem a localização do bem penhorado. Mandado esse que seria cumprido pelo oficial de justiça no endereço declinado na procuração outorgada pelos devedores, bem como em endereço obtido por meio de consulta ao sistema eletrônico INFOJUD. B) PROCESSO Nº 0000374-47.2015.8.11.0086. COMARCA DE NOVA MUTUM/MT. O autor em 08/01/2015, o ajuizamento da AÇÃO MONITÓRIA contra COMERCIAL DE ALIMENTOS JJ LTDA - ME, pretendendo o recebimento de R$ 59.065,76 (cinquenta e nove mil, sessenta e cinco reais e setenta e seis centavos), ante o inadimplemento do réu no pagamento das parcelas do empréstimo contratado na data de 20/12/2012 por meio de documento escrito sem eficácia de título executivo, qual seja o Contrato de Liberação de Empréstimo Limite Rotativo Flex – PJ nº 722/6471370. Após o trânsito em julgado da sentença, o banco credor deu início à fase de execução, apresentando o cálculo de atualização do débito e requerendo que fosse procedida tentativa de bloqueio de ativos financeiros do devedor, via BACENJUD. C) PROCESSO Nº 7044588-20.2019.8.22.0001. COMARCA DE PORTO VELHO/RO. O autor com seu costumeiro zelo e dedicação também atuou na defesa dos interesses do Banco ora requerido ao promover, em 08/10/2019, o ajuizamento de AÇÃO DE EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL contra STARWALKER COMERCIO DE VESTUARIO LTDA – ME e RODRIGO GIL SOUZA GALINDO, pugnando pelo pagamento de R$ 124.820,70 (cento e vinte e quatro mil, oitocentos e vinte reais e setenta centavos), ante o inadimplemento dos executados no cumprimento das obrigações contratadas na data de 24/02/2017 por meio da Cédula de Crédito Bancário Empréstimo - Capital de Giro nº 351/729873. O autor empreendeu várias diligências visando a citação e localização de bens para garantia da execução, que resultaram infrutíferas e motivaram a suspensão da CNH do devedor pessoa física e na inclusão dos dados dos executados no SERASAJUD, o exequente requereu a suspensão da tramitação do feito pelo período de um ano, com fulcro no art. 921, §1º do CPC. Pedido esse que foi deferido pelo r. Juízo. D) PROCESSO Nº 0609599-64.2016.8.04.0001. COMARCA DE MANAUS/AM. O autor atuou em 18/09/2019, passou a representar os interesses do requerido nos autos da AÇÃO DE EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL, promovida em desfavor de ZILDA MARIA TAVARES DA SILVA XAVIER EIRELI ME, ZILDA MARIA TAVARES DA SILVA XAVIER e ODÍLIO MIRANDA XAVIER, em que se pleiteava o pagamento de R$ 85.769,27 (oitenta e cinco mil, setecentos e sessenta e nove reais e vinte e sete centavos). A referida ação foi ajuizada na data de 23/03/2016 por outro escritório de advocatícia em razão do inadimplemento dos executados no pagamento das parcelas do empréstimo contratado por meio da Cédula de Crédito Bancário – Empréstimo - Capital de Giro n° 008.397.038, celebrada no dia 02/09/2014. Após várias diligências, o juízo acolheu os pedidos do exequente para determinar a suspensão da tramitação do feito pelo prazo de um ano, com o arquivamento provisório dos autos, além da inclusão dos dados dos devedores no SPC e SERASA. E) PROCESSO Nº 0061368-28.2014.8.14.0301. COMARCA DE BELÉM/PA. O autor, do mesmo modo, atuou com costumeiro zelo e dedicação, ao promover, em 24/01/2019, o ajuizamento de AÇÃO DE EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL em desfavor de LEANDRO BATISTA ALVES e EDILANA FIALHO LAMBURGUINI, que pugnando pelo pagamento do valor de R$ 133.172,96 (cento e trinta e três mil, cento e setenta e dois reais e noventa e seis centavos). Após várias diligências visando a citação e localização de bens, o banco credor requereu que fossem remetidas cartas registradas de citação com aviso de recebimento, via correios, para os demais endereços obtidos por meio da pesquisa judicial. Destarte, é cediço que em casos como este em análise, deve o magistrado fixar os honorários respeitando o grau de zelo do profissional; o lugar da prestação do serviço; a natureza e importância da causa; o trabalho realizado pelo advogado, bem como o tempo exigido para o seu serviço, de forma que, no caso em voga, a verba honorária deve fixada no montante de R$ 18.000,00 (dezoito mil reais), estando em total consonância com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO a presente AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS proposta por GALERA MARI ADVOGADOS ASSOCIADOS em face do BANCO BRADESCO S/A, para CONDENAR este último, ao pagamento de R$ 18.000,00 (dezoito mil reais), acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação, corrigido monetariamente pelo índice INPC a partir da data deste julgamento, ao autor. Condeno o banco requerido nas custas e despesas processuais, bem como nos honorários advocatícios em 10% do valor da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º do CPC. (...)” (ID. 289524881) (g.n.) Pois bem. Como visto, não se verifica a ocorrência de decisão extra petita na sentença objurgada, uma vez que a pretensão inicial sempre foi a de arbitramento dos honorários advocatícios com base no art. 22, §2º, da Lei n. 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB), que prevê expressamente a obrigatoriedade de observância dos parágrafos 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 6º-A, 8º, 8º-A, 9º e 10, todos do art. 85 do CPC, já que a sentença se limitou a analisar o pedido constante na inicial, dentro da causa de pedir e pedido ali delimitados, ou seja, “não há que se falar em julgamento extra petita quando o provimento jurisdicional é decorrência lógica do pedido, compreendido como corolário da interpretação lógico-sistemática das alegações constantes da petição inicial” (STJ. REsp n. 2.000.701/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 30/08/2022, DJe 01/09/2022). Em outras palavras, a pretensão recursal do Escritório GALERA MARI também está abarcada pelos pedidos constantes na exordial (item 4) - art. 22, §2º, da Lei n. 8.906/1994 c/c art. 85, § 20, do CPC), não constituindo, portanto, a abordagem de matéria inédita em sede de apelação, sendo possível postular, ao menos em tese, a modificação dos honorários fixados pelo Juízo a quo, para que sejam majorados conforme requerido na inicial, demonstrando o interesse recursal do Apelante. Isso porque é assente na jurisprudência do STJ que “o fato de haver contrato escrito, com previsão de pagamento de parte dos honorários antecipadamente e parte em percentual sobre o êxito da ação, não retira o interesse na ação de arbitramento de honorários, quando a avença é rescindida antecipadamente pelo contratante.” (STJ - Terceira Turma - AgInt no AREsp n. 2.073.253/MT, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 15/08/2022). Nessa esteira, também entendo como adequada a via eleita pelo Escritório GALERA MARI, uma vez que restou incontroverso nos autos a inexistência de “estipulação ou de acordo” expresso entre as partes na hipótese de rescisão unilateral do contrato de prestação de serviços advocatícios, de modo que foi necessário o ajuizamento da presente ação para arbitramento judicial dessa verba, nos termos do no art. 22, §2º, da Lei n. 8.906/1994, in verbis: “Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência. (...) §2º. Na falta de estipulação ou de acordo, os honorários são fixados por arbitramento judicial, em remuneração compatível com o trabalho e o valor econômico da questão, observado obrigatoriamente o disposto nos §§ 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 6º-A, 8º, 8º-A, 9º e 10 do art. 85 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil)”. (g.n.) No mesmo sentido: “(...) Tendo sido rescindido o contrato por iniciativa do mandante antes do término da prestação de serviço, ao advogado assiste o direito de ajuizar ação de arbitramento para postular honorários proporcionais à sua atuação. Precedentes. (...)” (STJ. AgInt no AREsp n. 2.348.277/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 23/10/2023, DJe 25/10/2023) (g.n.) Ocorre que, conforme delineado na sentença, a causa de pedir deduzida na inicial é a rescisão unilateral e imotivada do contrato havida entre as partes, de modo que, constato que o escritório de advocacia visa o arbitramento de honorários justamente em razão da rescisão antecipada do contrato. Nesse ponto, é importante assentar a existência de remuneração contratualmente ajustada durante a vigência do contrato de honorários advocatícios não tem o condão de afastar o direito do escritório ao arbitramento de honorários na hipótese de resilição unilateral e antecipada pelo contratante, na medida em que não há, no contrato, disposição específica estabelecendo a remuneração a que faria jus o advogado nesta hipótese. A propósito, observe-se que a instituição financeira não logrou êxito em demonstrar que o contrato de honorários celebrado com o escritório de advocacia contivesse disposição específica quanto à forma de remuneração a que o contratado faria jus em caso de rescisão do contrato promovida pelo contratante. A análise das disposições contratuais permite concluir que se trata de uma situação de “falta de estipulação ou acordo”, nos exatos termos do art. 22, §2º do EOAB, na medida em que não havia previsão contratual sobre qual seria a remuneração devida ao advogado em caso de rescisão imotivada por iniciativa do contratante. O fato de o contrato conter a previsão da possibilidade de resilição não tem o condão de afastar o direito do advogado de postular a remuneração pelos serviços prestados até o momento da revogação do mandato, sendo tal pretensão amparada por lei, doutrina e jurisprudência pátrias. Nessa ordem de pensar, tenho que, não obstante constar a assinatura do representante do escritório GALERA MARI nos Termos de Quitação juntados pelo BANCO BRADESCO (ID. 289524872), tais documentos são inservíveis para eximir a Instituição Financeira contratante de remunerar o Escritório contratado pelos serviços prestados até a rescisão unilateral, como alegado pelo BANCO, pois não indicam a que processos ou serviços se referem, e, portanto, não podem ser considerados documentos hábeis a comprovar a quitação dos honorários buscados nestes autos. A propósito, em caso análogo já decidiu este Sodalício: “APELAÇÃO - AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - PARCIAL PROCEDÊNCIA - FIXAÇÃO COM BASE NA TABELA DA OAB - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS NA ESFERA ADMINISTRATIVA E JUDICIAL - COMPROVADA - AUSÊNCIA DE PROVA DE QUE O VALOR PAGO QUITARIA OS SERVIÇOS PRESTADOS NAS DUAS ESFERAS - SENTENÇA MANTIDA - HONORÁRIOS RECURSAIS - MAJORAÇÃO - ART. 85, § 11, CPC - RECURSO DESPROVIDO. É incontroversa a relação jurídica entre as partes, o trabalho realizado pelo autor, tanto na esfera administrativa quanto na judicial, e a ausência de contrato escrito convencionando os respectivos honorários. A empresa requerida não demonstrou, por sua via, que o valor pago quitaria a prestação do serviço nas fases administrativa e judicial, ônus do qual não se desincumbiu.” (TJMT. N.U 1014538-28.2021.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, Guiomar Teodoro Borges, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 08/03/2023, DJe 10/03/2023) (g.n.) De mais a mais, é cediço que, para produzir efeitos jurídicos, a quitação deve observar estritamente o comando normativo previsto no Código Civil, em seu art. 320, segundo o qual a quitação, que sempre poderá ser dada por instrumento particular, designará o valor e a espécie da dívida quitada, o nome do devedor, ou quem por este pagou, o tempo e o lugar do pagamento, com a assinatura do credor, ou do seu representante. Na espécie, entretanto, verifico que as cartas de quitação acostadas aos autos são genéricas e desprovidas de especificações, pelo que não atendem aos requisitos dispostos no mencionado artigo. Além disso, em nenhum momento a quitação se referiu aos honorários pelos serviços prestados nos autos dos processos que são objeto desta ação, tampouco aos valores a eles pertinentes. Para, além disso, a quitação diria respeito aos valores adiantados ao escritório em conformidade com a cláusula 6.22 do contrato e não aos honorários devidos ao final de cada demanda, conforme recuperação final do crédito então pleiteado pelo contratante. Neste prisma, é insubsistente a tese da quitação suscitada pela Instituição Financeira, de modo que, considerando que a rescisão contratual se deu por sua iniciativa, sem que o Escritório tenha contribuído de qualquer modo para tanto, é imperativo que ele seja remunerado pelos serviços prestados em prol do ex-cliente até o momento da revogação do mandato, sob pena de enriquecimento sem causa da instituição financeira. Outrossim, não prospera o argumento do Banco no sentido de que não seria devida qualquer remuneração ao escritório em razão da inexistência de proveito econômico advindo de sua atuação nos processos em que houve a destituição. Além de o Código de Ética da Advocacia estabelecer que a revogação do mandado judicial por vontade do cliente não o desobriga do pagamento das verbas honorárias contratados, é certo que eventual insucesso da demanda não pode ser oposto ao advogado como motivo para frustrar sua remuneração, pois é assente o entendimento de que o mesmo não pode ser responsabilizado pelo resultado do processo, já que sua obrigação é de meio e não de resultado. Ademais, conforme amplamente fundamentado na petição inicial e comprovado mediante farta documentação, os benefícios auferidos pelo BANCO em decorrência da contratação dos serviços do escritório GALERA MARI extrapolam a mera recuperação do crédito nos autos das ações ajuizadas. Isso porque, o ajuizamento das cobranças judiciais confere à Instituição Financeira o direito à dedução fiscal de valores, a título de perdas, para fins de apuração da base de cálculo do IRPJ, o que representa vantagem econômica expressiva resultante do serviço advocatício prestado, ainda que a demanda venha a ser extinta sem êxito ao final. Superadas essas questões, resta a análise do quantum dos honorários arbitrados pelo Juízo a quo na sentença objurgada, matéria que foi objeto de irresignação de ambos os recursos. Malgrado os argumentos expendidos pelas partes em suas razões, em análise minudente da questão, entendo que tão somente ao apelo manejado pelo escritório GALERA MARI comporta parcial provimento, no tocante a sua pretensão subsidiária de majoração dos honorários arbitrados. Vejamos. Na espécie, resta incontroverso que o arbitramento judicial é medida que se impõe, uma vez que a referida avença não previa expressamente a remuneração na hipótese de rescisão unilateral, como ocorreu no caso sub judice, restando apenas analisar se o montante arbitrado pelo Juízo a quo atende aos critérios legais previstos no Código de Processo Civil e no Estatuto da OAB. É importante destacar que, embora o Escritório Apelante já tenha recebido parte dos honorários pelas etapas até então concluída nos processos, ainda faz jus ao recebimento dos honorários advocatícios pleiteados nestes autos, uma vez que o contrato firmado entre as partes era essencialmente “ad exitum”, ou seja, a maior parte da remuneração pelos serviços advocatícios prestados seria recebida com base nas verbas sucumbenciais, auferida após a apuração do benefício econômico obtido pelo Banco. Assim, justifica-se o arbitramento judicial da verba honorária pelo trabalho exercido até o momento do encerramento do contrato, já que, repise-se, não foram pactuados honorários em caso de rescisão unilateral. Nesse sentido: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS. CLÁUSULA DE ÊXITO. REVOGAÇÃO DO MANDATO POR INICIATIVA DO CONSTITUINTE (MANDANTE). AÇÃO DE ARBITRAMENTO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Quando a revogação do mandato ocorre por iniciativa do constituinte (mandante), é facultado ao advogado mandatário propor ação de arbitramento judicial dos honorários advocatícios contratuais, ainda que avençados sob a cláusula ad exitum. (...)” (STJ. AgInt no AREsp n. 2.382.957/SC, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 16/10/2023, DJe 18/10/2023) (g.n.) Pois bem. De acordo com o art. 85 do CPC: “Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. §1º. São devidos honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente. §2º. Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos: I - o grau de zelo do profissional; II - o lugar de prestação do serviço; III - a natureza e a importância da causa; IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. (...) §6º. Os limites e critérios previstos nos §§ 2º e 3º aplicam-se independentemente de qual seja o conteúdo da decisão, inclusive aos casos de improcedência ou de sentença sem resolução de mérito. § 6º-A. Quando o valor da condenação ou do proveito econômico obtido ou o valor atualizado da causa for líquido ou liquidável, para fins de fixação dos honorários advocatícios, nos termos dos §§ 2º e 3º, é proibida a apreciação equitativa, salvo nas hipóteses expressamente previstas no § 8º deste artigo. (Incluído pela Lei nº 14.365, de 2022) (...) §8º. Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do §2º. §8º-A. Na hipótese do §8º deste artigo, para fins de fixação equitativa de honorários sucumbenciais, o juiz deverá observar os valores recomendados pelo Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil a título de honorários advocatícios ou o limite mínimo de 10% (dez por cento) estabelecido no §2º deste artigo, aplicando-se o que for maior. (Incluído pela Lei nº 14.365, de 2022) (...) §11. O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento. § 12. Os honorários referidos no §11 são cumuláveis com multas e outras sanções processuais, inclusive as previstas no art. 77 . (...) §16. Quando os honorários forem fixados em quantia certa, os juros moratórios incidirão a partir da data do trânsito em julgado da decisão. (...) §20. O disposto nos §§ 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 6º-A, 8º, 8º-A, 9º e 10 deste artigo aplica-se aos honorários fixados por arbitramento judicial. (Incluído pela Lei nº 14.365, de 2022)” (g.n.) No caso destes autos, contudo, entendo que não é possível fixar os honorários com base nos percentuais previstos no §2º do art. 85 do CPC, uma vez que o contrato de prestação de serviços foi interrompido antes de proferida a sentença nos processos em questão. Portanto, não há condenação ou proveito econômico mensurável, além do que o arbitramento judicial não deve ser confundido com os honorários sucumbenciais, visto que não possui natureza processual e independe do resultado da demanda, devendo ser fixado por apreciação equitativa (§8º do mesmo artigo). Nessa linha de intelecção, verifica-se que a Magistrada sentenciante tratou de esmiuçar os desdobramentos processuais de cada processo em que o Escritório apelante busca o arbitramento de honorários, fazendo constar que: “A) PROCESSO DE EXECUÇÃO Nº 0019339-92.2007.8.11.0041. COMARCA DE CUIABÁ/MT – Ajuizada no dia 24/09/2007, AÇÃO DE EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL em desfavor de EDEM FILIPALDI FILHO, NELIO FERNANDES e SÃO BENEDITO LOCAÇÃO DE MÁQUINAS EQUIPAMENTOS LTDA - ME, pretendendo o recebimento de R$ 23.166,43 (vinte e três mil, cento e sessenta e seis reais e quarenta e três centavos), ante o inadimplemento dos executados no cumprimento das obrigações contratadas por meio da Cédula de Crédito Bancário Conta Garantida – Renovação Automática Aval nº 001.936.287, celebrada em 22/03/2007. Citados, os devedores permaneceram inertes após a intimação, o r. Juízo determinou que fosse expedido novo mandado de intimação para que os executados informem a localização do bem penhorado. Mandado esse que seria cumprido pelo oficial de justiça no endereço declinado na procuração outorgada pelos devedores, bem como em endereço obtido por meio de consulta ao sistema eletrônico INFOJUD. B) PROCESSO Nº 0000374-47.2015.8.11.0086. COMARCA DE NOVA MUTUM/MT. O autor em 08/01/2015, o ajuizamento da AÇÃO MONITÓRIA contra COMERCIAL DE ALIMENTOS JJ LTDA - ME, pretendendo o recebimento de R$ 59.065,76 (cinquenta e nove mil, sessenta e cinco reais e setenta e seis centavos), ante o inadimplemento do réu no pagamento das parcelas do empréstimo contratado na data de 20/12/2012 por meio de documento escrito sem eficácia de título executivo, qual seja o Contrato de Liberação de Empréstimo Limite Rotativo Flex – PJ nº 722/6471370. Após o trânsito em julgado da sentença, o banco credor deu início à fase de execução, apresentando o cálculo de atualização do débito e requerendo que fosse procedida tentativa de bloqueio de ativos financeiros do devedor, via BACENJUD. C) PROCESSO Nº 7044588-20.2019.8.22.0001. COMARCA DE PORTO VELHO/RO. O autor com seu costumeiro zelo e dedicação também atuou na defesa dos interesses do Banco ora requerido ao promover, em 08/10/2019, o ajuizamento de AÇÃO DE EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL contra STARWALKER COMERCIO DE VESTUARIO LTDA – ME e RODRIGO GIL SOUZA GALINDO, pugnando pelo pagamento de R$ 124.820,70 (cento e vinte e quatro mil, oitocentos e vinte reais e setenta centavos), ante o inadimplemento dos executados no cumprimento das obrigações contratadas na data de 24/02/2017 por meio da Cédula de Crédito Bancário Empréstimo - Capital de Giro nº 351/729873. O autor empreendeu várias diligências visando a citação e localização de bens para garantia da execução, que resultaram infrutíferas e motivaram a suspensão da CNH do devedor pessoa física e na inclusão dos dados dos executados no SERASAJUD, o exequente requereu a suspensão da tramitação do feito pelo período de um ano, com fulcro no art. 921, §1º do CPC. Pedido esse que foi deferido pelo r. Juízo. D) PROCESSO Nº 0609599-64.2016.8.04.0001. COMARCA DE MANAUS/AM. O autor atuou em 18/09/2019, passou a representar os interesses do requerido nos autos da AÇÃO DE EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL, promovida em desfavor de ZILDA MARIA TAVARES DA SILVA XAVIER EIRELI ME, ZILDA MARIA TAVARES DA SILVA XAVIER e ODÍLIO MIRANDA XAVIER, em que se pleiteava o pagamento de R$ 85.769,27 (oitenta e cinco mil, setecentos e sessenta e nove reais e vinte e sete centavos). A referida ação foi ajuizada na data de 23/03/2016 por outro escritório de advocatícia em razão do inadimplemento dos executados no pagamento das parcelas do empréstimo contratado por meio da Cédula de Crédito Bancário – Empréstimo - Capital de Giro n° 008.397.038, celebrada no dia 02/09/2014. Após várias diligências, o juízo acolheu os pedidos do exequente para determinar a suspensão da tramitação do feito pelo prazo de um ano, com o arquivamento provisório dos autos, além da inclusão dos dados dos devedores no SPC e SERASA. E) PROCESSO Nº 0061368-28.2014.8.14.0301. COMARCA DE BELÉM/PA. O autor, do mesmo modo, atuou com costumeiro zelo e dedicação, ao promover, em 24/01/2019, o ajuizamento de AÇÃO DE EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL em desfavor de LEANDRO BATISTA ALVES e EDILANA FIALHO LAMBURGUINI, que pugnando pelo pagamento do valor de R$ 133.172,96 (cento e trinta e três mil, cento e setenta e dois reais e noventa e seis centavos). Após várias diligências visando a citação e localização de bens, o banco credor requereu que fossem remetidas cartas registradas de citação com aviso de recebimento, via correios, para os demais endereços obtidos por meio da pesquisa judicial.” (ID. 289524881). De fato, dos documentos coligidos à peça inaugural pelo Escritório de Advocacia para comprovar o trabalho por ele desempenhado nos processos em questão, denota-se que: I) na Execução de Título Extrajudicial n. 0019339-92.2007.8.11.0041, da 1ª Vara Especializada em Direito Bancário da Comarca de Cuiabá/MT, em que se buscava crédito no valor de R$ 23.166,43 (R$ 224.856,46 segundo cálculos de atualização do Escritório), ajuizada em 24/09/2007, foram elaboradas cerca de 15 (quinze) petições, todavia, sem qualquer complexidade, tendo deixado o feito enquanto se aguardava a localização do bem penhorado para sua avaliação (ID. 289524854 e ID. 289524855); II) na Ação Monitória n. 0000374-47.2015.8.11.0086, da 1ª Vara de Nova Mutum/MT, em que se buscava crédito no valor de R$ 59.065,76 (R$ 262.217,85 segundo cálculos de atualização do Escritório), ajuizada em 08/01/2015, foram elaboradas cerca de 06 (seis) petições, igualmente sem qualquer complexidade, tendo deixado o feito quando se aguardava o bloqueio de ativos em nome do executado via BacenJud (ID. 289524857); III) na Execução de Título Extrajudicial n. 7044588-20.2019.8.22.0001, da 1ª Vara Cível Porto Velho/RO, em que se buscava crédito no valor de R$ 124.820,70 (R$ 249.218,76 segundo cálculos de atualização do Escritório), ajuizada em 08/10/2019, foram elaboradas cerca de 09 (nove) petições, todavia, sem qualquer complexidade, tendo deixado o feito quando se postulava a implementação de medidas atípicas para a localização de bens da parte devedora (ID. 289524859); IV) na Execução por Quantia Certa n. 0609599-64.2016.8.04.0001, da 14ª Vara Cível e de Acidentes de Trabalho da Comarca de Manaus/AM, em que se buscava crédito no valor de R$ 85.769,27 (R$ 238.411,07 segundo cálculos de atualização do Escritório), ajuizada em 23/02/2016, o Escritório adentrou ao feito somente em 09/01/2020, ocasião em que juntou apenas 03 (três) petições, sem qualquer complexidade, tendo deixado o feito quando se postulava a implementação de medidas atípicas para a localização de bens da parte devedora (ID. 289524861); e na V) Execução de Título Extrajudicial n. 0061368-28.2014.8.14.0301, da 7ª Vara Cível e Empresarial de Belém/PA, em que se buscava crédito no valor de R$ 70.322,52 (R$ 242.238,96 segundo cálculos de atualização do Escritório), ajuizada em 27/11/2014, o Escritório adentrou ao feito somente em 13/01/2017, ocasião em que juntou apenas 07 (sete) petições, sem qualquer complexidade, tendo deixado o feito quando ainda se buscava outros endereços para a citação da parte devedora (ID. 289524863). Diante disso, em observância dos critérios previstos nos incisos I a IV do §2º do art. 85 do CPC acima transcritos, entendo que o montante deve ser majorado para R$ 34.000,00 (trinta e quatro mil reais), sendo R$ 10.000,00 (dez mil reais) para a Execução de Título Extrajudicial n. 0019339-92.2007.8.11.0041 e R$ 6.000,00 (seis mil reais) pelos trabalhos exercidos nos demais feitos, por entender que esse montante reflete o grau de complexidade dos casos, o conteúdo do trabalho jurídico apresentado até a rescisão do contrato e a presteza do trabalho do escritório de advocacia. O valor leva em conta as peculiaridades de cada caso, notadamente quanto ao tempo de tramitação e a ausência de atos excessivamente complexos, de modo que o quantum fixado está adequado aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, considerando ainda o lugar da prestação do serviço, a natureza e a importância dos direitos envolvidos, se mostrando compatível com o trabalho desenvolvido pelo Escritório de advocacia no patrocínio de tais demandas. Em casos análogos, envolvendo idênticas partes, já decidiu este Sodalício: “AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO - FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL - INÉPCIA DA INICIAL - JULGAMENTO EXTRA PETITA - PRELIMINARES REJEITADAS - RESCISÃO SEM JUSTA CAUSA - PREVISÃO DE REMUNERAÇÃO POR ÊXITO - MANUTENÇÃO DO VALOR FIXADO DE ACORDO COM O TRABALHO DESEMPENHADO PELO CAUSÍDICO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSOS DESPROVIDOS. Tendo o condutor do feito analisado todas as questões trazidas à baila quando do julgamento da demanda, fundamentando de forma objetiva sua decisão de julgar parcialmente procedente o pedido inicial, utilizando dispositivos legais relacionados a matéria invocada e jurisprudência emanada dos Tribunais Pátrios, não há que se falar em ausência de fundamentação. Este Tribunal tem entendimento pacífico no sentido de que o interesse processual nasce no momento em que a parte tem necessidade de ir a juízo para atingir a tutela pretendida e, ainda, quando esta tutela jurisdicional lhe traz alguma utilidade do ponto de vista prático. Na espécie, a exordial permitiu a avaliação do pedido e possibilitou a defesa e o contraditório, não devendo ser considerada inepta. In casu, o pedido é certo e determinado, qual seja, o arbitramento dos honorários pelo trabalho desenvolvido, decorrente da rescisão antecipada do contrato de prestação de serviços com previsão de remuneração por êxito, inexistindo na inicial pedido de honorários de sucumbência, tendo a r. sentença se limitado a analisar o pedido constante na inicial. É plenamente possível o arbitramento de honorários advocatícios, sob o fundamento dos princípios da razoabilidade, boa-fé contratual, função social do contrato e da vedação do locupletamento sem causa, em razão do trabalho desempenhado pelo causídico, até o momento de sua destituição, nos casos em que o contrato de remuneração por êxito é rescindido unilateralmente sem justa causa pelo contratante. Nas hipóteses de ação de arbitramento de honorários não se aplica a regra de percentual sobre o valor da causa ou condenação disposta no §2º, do art. 85, do CPC, devendo o magistrado se ater aos critérios qualitativos do causídico durante a sua participação no feito, a fim de arbitrar os honorários de forma justa, razoável e proporcional, conforme se observou na espécie, razão pela qual a sua manutenção é medida que se impõe.” (TJMT. N.U 1030983-87.2022.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, Terceira Câmara de Direito Privado, j. 26/06/2024, DJe 30/06/2024) (g.n.) “APELAÇÕES CÍVEIS - ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - PRELIMINARES DE NULIDADE POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO, INCOMPETÊNCIA RELATIVA DO JUIZO A QUO, AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL E REVOGAÇÃO DA JUSTIÇA GRATUITA - REJEITADAS - RESCISÃO UNILATERAL PELO CONTRATANTE - DIREITO À CONTRAPRESTAÇÃO PECUNIÁRIA - REDUÇÃO DA VERBA HONORÁRIA - VALOR INJUSTO E INADEQUADO - RECURSO DO AUTOR DESPROVIDO - RECURSO DA REQUERIDA PARCIALMENTE PROVIDO. Fundamentação sucinta não se equivale a sua ausência. Apesar da existência de cláusula de eleição de foro no instrumento contratual, esta cede lugar diante da norma de ordem pública (artigo 53, inciso III, CPC), devendo ser observado o foro do lugar em que a obrigação deve ser satisfeita. (N.U 0021705-42.2019.8.11.0055, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/03/2021, Publicado no DJE 30/03/2021) “Segundo os ensinamentos de Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, “Existe interesse processual quando a parte tem necessidade de ir a juízo para alcançar a tutela pretendida e, ainda, quando essa tutela jurisdicional pode trazer-lhe alguma utilidade do ponto de vista prático” (Código de Processo Civil Comentado, 4a ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 729/730). Não evidenciada a alteração das condições econômico-financeiras que justificaram o deferimento da justiça gratuita ao apelado, não há que se falar em revogação do benefício. “Ocorrendo a rescisão contratual unilateral e imotivada, é direito do advogado receber pelos serviços prestados.”. “O juiz deve agir com moderação e razoabilidade ao atender à qualidade e à quantidade do trabalho, bem como o proveito da parte, a fim de não onerar o vencido em demasia nem desqualificar o trabalho do advogado (STJ AgRg no REsp 1.194.995/SP)” (TJMT. N.U 1023311-28.2022.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, Rel. Des. José Zuquim Nogueira, Quinta Câmara de Direito Privado, j. 25/06/2024, DJe 25/06/2024) (g.n.) “APELAÇÃO CÍVEL - ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS - RESCISÃO UNILATERAL DE CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS - IMPOSSIBILIDADE DE CUMPRIMENTO DAS CLÁUSULAS PARA RECEBIMENTO DE HONORÁRIOS - ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS PELO JUDICIÁRIO - POSSIBILIDADE - INTERESSE EVIDENCIADO - VIA ADEQUADA - ANÁLISE DO TRABALHO DESEMPENHADO PELO ADVOGADO NO CURSO DO PROCESSO - HONORÁRIOS DEVIDOS - ARBITRAMENTO DE FORMA EQUITATIVA - HONORÁRIOS MAJORADOS - SENTENÇA MANTIDA - AMBOS OS RECURSOS DESPROVIDOS. Nos casos em que há rescisão unilateral do contrato, faz-se imperioso deferir o pleito de arbitramento dos honorários com base no trabalho desempenhado até a revogação do mandado, independentemente da implementação das condições contratuais então vigentes, que se tornou de impossível cumprimento, pois a negativa do direito viola o art. 22, §2º, do Estatuto da OAB, sob pena de autorizar o contratante a se locupletar ilicitamente com o trabalho de seu advogado, mesmo que minimamente exercido. Os honorários devem ser arbitrados de acordo com o “trabalho exercido pelo advogado até o momento da rescisão contratual" (AgInt no AREsp 1.560.257/PB, AgInt no REsp n. 1.554.329/MS).” (TJMT. N.U 1004299-91.2023.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, Rel. Desa. Nilza Maria Possas de Carvalho, Primeira Câmara de Direito Privado, j. 25/06/2024, DJe 26/06/2024) (g.n.) Em relação aos honorários sucumbenciais fixados em “10% do valor da condenação”, considero que são adequados, uma vez que o percentual é compatível com a complexidade da demanda e com o trabalho desenvolvido pelo causídico, na forma do art. 85, §2º, I a IV, do CPC, estando ainda em conformidade com o Tema n. 1.076 do STJ. Por derradeiro, no que tange aos consectários legais, cabe lembrar também que a Lei n. 14.905/2024 modificou significativamente alguns dispositivos do Código Civil, especificamente aqueles que disciplinam a correção monetária e os juros moratórios incidentes nas relações cíveis (arts. 389 e 406), estabelecendo os índices a serem aplicados nas hipóteses em que não houver pactuação ou previsão legal específica, fixando o IPCA como índice de atualização monetária e a Taxa SELIC (deduzindo-se a correção monetária aplicável), como base de cálculo dos juros de mora, sendo que tais modificações só passarão a ter efeito 60 dias após a publicação (art. 5º, II), ocorrida em 1º/07/2024. Assim sendo, observada a vacatio legis da Lei n. 14.905/2024, entendo que o percentual dos juros de mora deve ser fixado em 1% (um por cento) ao mês, com fulcro no art. 406 do CC c/c art. 161, §1º, do CTN (Enunciado n. 20 da 1ª Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal), até que a novel legislação passe a produzir efeitos, após o que o cálculo da correção monetária e dos juros de mora deverá observar as modificações implementadas ao Código Civil, passando a incidir o índice do IPCA para a correção monetária e a Taxa Selic para os juros de mora, nos termos dos arts. 389, parágrafo único e 406 e §§ do CPC (incluídos pela Lei n. 14.905/2024). Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao apelo do BANCO BRADESCO S/A e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto por GALERA MARI E ADVOGADOS ASSOCIADOS, apenas para MAJORAR o valor da condenação, arbitrando os honorários em R$ 34.000,00 (trinta e quatro mil reais), que deverão ser acrescidos de correção monetária pelo INPC, a partir do arbitramento e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação, calculados até que a Lei n. 14.905/2024 passe a produzir efeitos, após o que o cálculo da correção monetária e dos juros de mora deverá observar os índices dos arts. 389, parágrafo único, 406 e §§ do CC, restando mantidos os demais termos da sentença, por estes e por seus próprios fundamentos. Por corolário lógico, majoro a condenação em honorários advocatícios sucumbenciais em face do BANCO BRADESCO 10% para 15% (quinze por cento), nos termos do art. 85, §11, do CPC. Sem honorários recursais em relação ao apelante GALERA MARI, tendo em vista o entendimento consolidado no STJ no sentido de que são incabíveis “no recurso interposto pela parte vencedora para ampliar a condenação, pela própria redação do art. 85, § 11, do CPC/2015” (EAREsp n. 1.847.842/PR). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 17/06/2025

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Banco Bradesco S.A. e outros x Banco Bradesco S.A. e outros

ID: 306441241

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1039790-62.2023.8.11.0041

Data de Disponibilização: 24/06/2025

Polo Ativo:

BANCO BRADESCO S.A. GALERA MARI E ADVOGADOS ASSOCIADOS

Polo Passivo:

BANCO BRADESCO S.A. GALERA MARI E ADVOGADOS ASSOCIADOS

Acórdão

Advogados:

LEONARDO BORGES STABILE RIBEIRO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

CLAUDIO STABILE RIBEIRO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

LUIS FELIPE SAMPAIO WERNER

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1039790-62.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Prestação de Serviços, Serviços Profissionais, H… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1039790-62.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Prestação de Serviços, Serviços Profissionais, Honorários Advocatícios] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [GALERA MARI E ADVOGADOS ASSOCIADOS - CNPJ: 00.290.572/0001-52 (APELANTE), LUIS FELIPE SAMPAIO WERNER - CPF: 032.220.871-80 (ADVOGADO), LEONARDO BORGES STABILE RIBEIRO - CPF: 054.525.141-98 (ADVOGADO), BANCO BRADESCO S.A. - CNPJ: 60.746.948/0001-12 (APELANTE), RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA - CPF: 444.850.181-72 (ADVOGADO), BANCO BRADESCO S.A. - CNPJ: 60.746.948/0001-12 (APELADO), RENATO CHAGAS CORREA DA SILVA - CPF: 444.850.181-72 (ADVOGADO), GALERA MARI E ADVOGADOS ASSOCIADOS - CNPJ: 00.290.572/0001-52 (APELADO), LUIS FELIPE SAMPAIO WERNER - CPF: 032.220.871-80 (ADVOGADO), LEONARDO BORGES STABILE RIBEIRO - CPF: 054.525.141-98 (ADVOGADO), CLAUDIO STABILE RIBEIRO - CPF: 365.942.709-82 (ADVOGADO), CLAUDIO STABILE RIBEIRO - CPF: 365.942.709-82 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO DO BANCO BRADESCO S.A. E PROVEU PARCIALMENTE O APELO DE GALERA MARI E ADVOGADOS ASSOCIADOS. E M E N T A DIREITO CIVIL E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. RESCISÃO UNILATERAL DE CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. INEXISTÊNCIA DE ACORDO QUANTO À REMUNERAÇÃO PELA RESCISÃO. VIA ADEQUADA. ARBITRAMENTO EQUITATIVO. DOCUMENTOS DE QUITAÇÃO INIDÔNEOS. MAJORAÇÃO PARCIAL DO VALOR FIXADO. RECURSO DO BANCO DESPROVIDO. RECURSO DO ESCRITÓRIO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame 1. Recursos de apelação interpostos contra sentença que, em sede de ação de arbitramento de honorários advocatícios, condenou instituição financeira ao pagamento de R$ 18.000,00 por serviços prestados em cinco processos, além de honorários sucumbenciais. O Escritório de Advocacia pleiteia majoração do valor. O Banco Bradesco, por sua vez, requer a improcedência da demanda ou, subsidiariamente, a redução da condenação. II. Questão em discussão 2. Há quatro questões em discussão: (i) saber se a via eleita é adequada na hipótese de rescisão unilateral de contrato com previsão de remuneração “ad exitum”; (ii) saber se os documentos de quitação apresentados pelo Banco são aptos a comprovar a quitação integral dos serviços; (iii) saber se é possível o arbitramento com base nos percentuais previstos no art. 85, §2º, do CPC; e (iv) saber se os honorários fixados devem ser majorados ou reduzidos diante do trabalho efetivamente prestado. III. Razões de decidir 3. A ação de arbitramento é via adequada ante a ausência de cláusula contratual específica sobre a remuneração em caso de rescisão unilateral. 4. Os documentos apresentados como termos de quitação são genéricos e não indicam a que serviços ou processos se referem, não sendo aptos a comprovar a quitação dos honorários. 5. A jurisprudência é pacífica no sentido de que, na ausência de proveito econômico mensurável, o arbitramento deve ocorrer por apreciação equitativa, observando os critérios do art. 85, §2º, do CPC. 6. Considerando o grau de complexidade e o tempo de tramitação dos processos, o valor arbitrado deve ser majorado para R$ 34.000,00, sendo R$ 10.000,00 para um dos processos e R$ 6.000,00 para cada um dos demais. 7. Os honorários sucumbenciais fixados em 10% são compatíveis com a complexidade da causa, merecendo majoração para 15% na forma do art. 85, §11, do CPC. 8. Os consectários legais devem observar os parâmetros legais vigentes até a vigência da L. 14.905/2024, incidindo juros de mora de 1% ao mês e correção monetária pelo INPC, devendo a novel legislação ser observada a partir de sua vigência. IV. Dispositivo e tese 9. Recurso do Banco Bradesco desprovido. Recurso de Galera Mari e Advogados Associados parcialmente provido para majorar os honorários para R$ 34.000,00. Tese de julgamento: “1. É cabível ação de arbitramento de honorários advocatícios quando o contrato é rescindido unilateralmente sem previsão de remuneração para essa hipótese. 2. Documentos genéricos de quitação não são hábeis a demonstrar o adimplemento integral dos serviços advocatícios. 3. O arbitramento judicial deve observar apreciação equitativa quando ausente proveito econômico mensurável, nos termos do art. 85, §8º, do CPC.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 5º, XIII, 170, caput; CC, arts. 320, 389, parágrafo único, 406 e §§; CPC, arts. 85, §§2º, 8º e 20; CTN, art. 161, §1º; L. 8.906/1994, art. 22, §2º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 2.073.253/MT, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 15.08.2022; STJ, AgInt no AREsp 2.348.277/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 23.10.2023; TJMT, N.U 1030983-87.2022.8.11.0041, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, j. 26.06.2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: Tratam-se de recursos de apelação interpostos por GALERA MARI E ADVOGADOS ASSOCIADOS e pelo BANCO BRADESCO S/A contra sentença proferida pelo Dr. Ana Cristina Silva Mendes, Juíza de Direito da 4ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá, nos autos da Ação de Arbitramento de Honorários Advocatícios n. 1039790-62.2023.8.11.0041, que julgou procedente a pretensão deduzida na inicial, condenando a Instituição Financeira ré ao pagamento de R$ 18.000,00 em razão da atuação nos processos n. 0019339-92.2007.8.11.0041, 0000374-47.2015.8.11.0086, 7044588-20.2019.8.22.0001, 0609599-64.2016.8.04.0001 e 0061368-28.2014.8.14.0301, além de honorários de sucumbência de 10% sobre o valor da condenação (ID. 289524881). A sentença objurgada foi mantida inalterada após a rejeição dos embargos de declaração do BANCO BRADESCO (ID. 289524888). Em suas razões recursais (ID. 289524890), o primeiro apelante GALERA MARI ADVOGADOS ASSOCIADOS alega, em síntese, que a Constituição Federal garante que a toda prestação de serviço corresponderá uma justa remuneração, com base na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa (art. 170, CF), tendo demonstrado nos autos que o Apelado obteve benefício econômico sobre o seu trabalho, fato que não teria sido considerado na sentença recorrida. Por tais razões, pretende o provimento do recurso para “majorar os honorários advocatícios, arbitrando-os em remuneração compatível com o trabalho e o valor econômico da questão (art. 22, § 2º, da Lei nº 8.906/1994), bem como com o grau de zelo do profissional, o lugar da prestação do serviço, a natureza e a importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço (art. 85, § 2º, do CPC)”. O Banco Apelado apresentou suas contrarrazões em ID. 289524907, reiterando que não há base para majoração da verba fixada, já que os serviços prestados não resultaram em recuperação efetiva dos créditos e se limitaram a diligências ordinárias, como tentativas frustradas de localização de bens, alegando que os pagamentos já realizados contemplaram os serviços efetivamente executados e que qualquer expectativa de remuneração atrelada ao êxito é insubsistente. O BANCO BRADESCO também interpôs seu recurso de apelação no ID. 289524896, levantando como preliminar a nulidade da sentença, uma vez que configuraria decisão extra petita, pois entendeu pelo arbitramento de honorários para o recebimento proporcional dos serviços prestados durante a relação contratual, mesmo reconhecendo a existência de expressa previsão contratual quanto à forma de remuneração, além de pagamentos outros já realizados. No mérito, alega que a relação entre as partes se sustentava por um contrato de prestação de serviços advocatícios, que previa diversas formas de remuneração em diferentes momentos do processo, conforme a etapa concluída, dentre as quais: distribuição de ação (adiantamento), garantia no processo, recuperação final (êxito) ou a irrecuperabilidade declarada do crédito; sendo que consta dos autos declaração de quitação com renúncia expressa a qualquer reclamação ou cobrança a título de honorários advocatícios pela prestação de serviços jurídicos com fato gerador anterior a 31/12/2019, que teria sido inadequadamente valorada pelo Juízo a quo. Suscita, ainda, a necessidade de reforma da sentença, por inadequação da via eleita, uma vez que o arbitramento judicial seria cabível somente “na ausência total de ajuste entre as partes”; bem como que seria indevida qualquer outra remuneração, diante da quitação das obrigações entre as partes; além da ausência de proveito econômico nos serviços efetivamente prestados, de fundamentação genérica no arbitramento dos honorários e de inadequação do ônus sucumbencial. Por fim, prequestiona a matéria, para fins de acesso aos Tribunais Superiores, pugnando pelo provimento do recurso para cassar a sentença de mérito, determinando seja proferida outra em seu lugar, ou, seja pretensão julgada totalmente improcedente, caso se entenda estar a causa madura para tanto. Subsidiariamente, caso se entenda pela manutenção da procedência do pedido, requer seja substancialmente reduzido o valor da condenação referente ao arbitramento de honorários, de forma proporcional e equitativa, tomando por base o tempo de atuação, os atos realizados e a ausência de êxito verificado no feito que originou a presente demanda. O escritório GALERA MARI contrarrazoou o apelo em ID. 289524903, rebatendo os argumentos do Banco apelante, pugnando pelo desprovimento do recurso e majoração dos honorários recursais. Os recursos são tempestivos, estando o preparo do BANCO comprovado por meio do comprovante em ID. 290333393, enquanto que o apelo de GALERA MARI está isento de preparo (ID. 132490719). Desnecessário o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça, uma vez que ausente interesse público ou social que justifique a intervenção ministerial. É o relatório. Inclua-se em pauta. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Egrégia Câmara: De início, verifico que a preliminar de decisão extra petita aventada pelo BANCO BRADESCO se confunde com o mérito do recurso, e como tal será oportunamente analisada no decorrer deste voto. Antes de adentrar ao mérito, porém, é importante destacar que os fatos em questão já foram objeto de debate em inúmeros recursos trazidos a julgamento por essas mesmas partes, uma vez que o Escritório GALERA MARI busca o arbitramento judicial de honorários em todos os feitos que conduzia até a rescisão unilateral do contrato de prestação de serviços advocatícios pelo BANCO BRADESCO, tendo distribuído várias ações reunindo de três a cinco processos em cada demanda, de modo que a matéria conta com entendimento consolidado em farta jurisprudência neste Sodalício, como se verá a seguir. Dito isso, colhe-se dos autos que o escritório GALERA MARI E ADVOGADOS ASSOCIADOS busca o arbitramento de honorários nos processos n. 0019339-92.2007.8.11.0041, 0000374-47.2015.8.11.0086, 7044588-20.2019.8.22.0001, 0609599-64.2016.8.04.0001 e 0061368-28.2014.8.14.0301, tendo em vista a rescisão unilateral do contrato de prestação de serviços advocatícios por parte do BANCO BRADESCO ocorrida em 19/11/2020, com fulcro no art. 22, §2º, da Lei n. 8.906/1994 c/c art. 85, §20, do CPC. Conforme relatado, o escritório GALERA MARI pretende a modificação da sentença apenas para majorar os honorários arbitrados pelo Juízo a quo, de forma que sejam arbitrados entre 10% e 20% do valor atualizado das causas trabalhadas, com fulcro no art. 22, §2º, da Lei n. 8.906/1994 e art. 85, §20, do CPC, enquanto o BANCO BRADESCO S.A. pretende a reforma para julgar improcedente a pretensão deduzida na inicial, ou, alternativamente, sejam reduzidos os honorários arbitrados. Do cotejo dos autos vê-se que a pretensão do Escritório de Advocacia apelante restou assim delimitada na inicial: “(...) 4) Julgar TOTALMENTE PROCEDENTES os pedidos da petição inicial para condenar o banco réu ao pagamento dos honorários advocatícios devidos ao autor, referente ao trabalho realizado nos processos nsº 0019339-92.2007.8.11.0041, 0000374-47.2015.8.11.0086, 7044588-20.2019.8.22.0001, 0609599-64.2016.8.04.0001 e 0061368-28.2014.8.14.0301, arbitrando-os em valor compatível com o trabalho realizado e com o valor econômico da questão, nos termos do art. 22, § 2º, do EOAB, sendo que o valor da condenação deverá ser atualizado monetariamente a partir do arbitramento e acrescido de juros de mora a partir da data da citação. (...)” (ID. 289523931, p. 45). Por sua vez, constou da sentença recorrida, no que pertine: “(...) GALERA MARI ADVOGADOS ASSOCIADOS propôs AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS em desfavor do BANCO BRADESCO S/A, ambos devidamente qualificados e representados nos autos. O autor narra que por mais de 31 anos, de forma ininterrupta e em caráter quase que exclusivo, prestou serviços jurídicos ao réu e, durante esse período, ocorreram inúmeras alterações contratuais. Relata que no dia 19/11/2020 foi notificado pelo Banco réu acerca da intenção da rescisão do contrato, com a revogação das procurações que lhes foram outorgadas. Informa que prestou as contas dos serviços prestados e que estavam pendentes de pagamento e os respectivos valores, no formato exigido pelo réu, tendo-o notificado para que efetuasse o pagamento ou que se compusessem, mas o banco ignorou todas as tentativas de negociação. Requer a condenação do réu ao pagamento dos honorários advocatícios relativo aos serviços prestados nos processos nº 0019339-92.2007.8.11.0041, 0000374-47.2015.8.11.0086, 7044588-20.2019.8.22.0001, 0609599-64.2016.8.04.0001, 0061368- 28.2014.8.14.0301, arbitrando-os de acordo com o art. 22, § 2º, do EOAB, bem como nas custas processuais e honorários. (...) É o relatório. Decido. Trata-se de AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS proposta por GALERA MARI ADVOGADOS ASSOCIADOS em face do BANCO BRADESCO S/A. Considerando que as partes não requereram a produção de provas, promovo o julgamento antecipado da lide, na forma do artigo 355, I, do CPC. PRELIMINARES Passo à análise das preliminares na ordem imposta pelo art. 337 do CPC. A) Da Inépcia da Petição Inicial A petição inicial é inepta quando lhe faltar pedido ou causa de pedir; da narração dos fatos não decorre logicamente a conclusão; o pedido for juridicamente impossível; e/ou contiver pedidos incompatíveis entre si (art. 330, do CPC). O rol de casos de inépcia é taxativo, de modo que se determinada situação não se subsumir a nenhuma das hipóteses previstas no art. 330 do CPC, não se pode extinguir o processo por esse fundamento. O réu alegou inépcia da inicial, sustentando a inexistência de congruência entre a causa de pedir e o pedido. Contudo, a narrativa da petição inicial é clara e atende aos requisitos legais, demonstrando a relação jurídica entre as partes, o objeto da prestação dos serviços advocatícios e os fundamentos do pedido. A inicial não apresenta nenhuma das hipóteses de inépcia previstas no art. 330, § 1º, do CPC. Por oportuno, registro que os fatos foram bem expostos pelo autor, de forma lógica, havendo pedido certo e determinado, pedido este que não é vedado pelo ordenamento jurídico. Dito isto, REJEITO a preliminar de inépcia da petição inicial. B) Conexão O banco requerido suscitou a conexão entre a presente ação e a ação n. 1002968-11.2022.8.11.0041, que tramita perante a 03ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT. Trata-se de demanda autônoma, externa exclusivamente ao arbitramento de honorários relativos aos processos indicados na inicial. Não há identidade entre os objetos das ações, sendo inaplicável o disposto no art. 55 do CPC. Assim, REJEITO a arguição de conexão. C) Da Ilegitimidade Passiva A preliminar de ilegitimidade passiva não merece acolhida, eis que o autor não está pleiteando honorários de sucumbência, mas o arbitramento de honorários advocatícios pela rescisão unilateral do contrato firmado entre as partes. Acerca do tema: (...) (TJMT; APL 54291/2017; Primavera do Leste; Relª Desª Nilza Maria Pôssas de Carvalho; Julg. 18/07/2017; DJMT 27/07/2017; Pág. 26). Deste modo, REJEITO a preliminar de ilegitimidade passiva. D) Da Falta do Interesse de Agir por Inadequação da Via Eleita O réu arguiu a preliminar de falta do interesse de agir por inadequação da via eleita. No entanto, o que se vê da narrativa da exordial é que o autor pretende o recebimento de honorários que faz jus em razão do trabalho efetivamente prestado nos autos 0019339- 92.2007.8.11.0041, 0000374-47.2015.8.11.0086, 7044588-20.2019.8.22.0001, 0609599- 64.2016.8.04.0001, 0061368-28.2014.8.14.0301 e que deixou de receber em razão da rescisão antecipada do contrato de prestação de serviços. Logo, o autor não está pleiteando honorários de sucumbência. Diante disso, REJEITO a preliminar de falta do interesse de agir por inadequação da via eleita. E) Da Falta do Interesse de Agir por Ausência de Necessidade Utilidade na Exigência de Honorários contratuais por Êxito Essa preliminar se confunde com o próprio mérito da ação de arbitramento e será analisado oportunamente. F) Da Impugnação a Justiça Gratuita O requerido impugnou os benefícios da justiça gratuita concedido ao autor. No caso dos autos, o autor alegou que sua receita foi significativamente reduzida após a rescisão contratual unilateral promovida pelo requerido, tendo sido instruída a inicial com documentos que corroboram suas observações. Além disso, o requerido não trouxe aos autos elementos robustos que contrarie a situação financeira declarada pelo autor. Em uma breve consulta no PJE é notório que o autor ajuizou diversas ações contra o banco requerido, buscando o arbitramento de honorários advocatícios, o que indica que sua receita depende de ganhos de valores não pagos. Desta forma, não tendo provas de que desconstituam os fundamentos apresentados na concessão do benefício, a manutenção da justiça gratuita ao autor é medida que se impõe. Diante disso, REJEITO a impugnação à concessão da justiça gratuita ao autor. Não havendo outras preliminares, tampouco questões processuais pendentes, verifico que as partes estão regularmente representadas e são legítimas. Presentes todos os demais pressupostos processuais e condições da ação, passo à análise do mérito. Mérito É incontroversa a relação jurídica existente entre as partes, o que é demonstrado tanto pelo contrato de prestação de serviços jurídicos (Id. 132285844), como também pelos serviços prestados no processo n. 0019339- 92.2007.8.11.0041, 0000374-47.2015.8.11.0086, 7044588-20.2019.8.22.0001, 0609599- 64.2016.8.04.0001, 0061368-28.2014.8.14.0301. É certo também o fato de que o réu dispensou os serviços do autor de forma unilateral, como demonstra a notificação de comunicação de rescisão contratual acostada no Id. 132285851. Sobre a rescisão, o contrato firmado entre as partes prevê: “17.1 O presente ‘contrato’ poderá ser rescindido a qualquer momento, por qualquer das partes, observadas as disposições adiante estipuladas, mediante denúncia escrita com antecedência de 30 (trinta) dias contados a partir de seu recebimento pela outra parte. [...] 17.6 Ocorrendo a rescisão o Contratante pagará à Contratada a importância a que eventualmente fizer jus, recebendo os valores em relação aos serviços das etapas já concluídas e que estejam, ainda, pendentes de pagamento, perecendo o direito a qualquer pagamento pelos serviços que não tenham sido concluídos. 17.6.1 O pagamento da importância supracitada somente será realizado mediante assinatura de termo de distrato e quitação.” No que se refere aos pagamentos dos honorários, a cláusula 6 e seus subitens, prevê: “6. Por todos os serviços prestados objeto deste ‘contrato’, as partes ajustam que o Contratante pagará a Contratada exclusivamente os valores estipulados nesta cláusula e em conformidade com a modalidade dos serviços ou fases adiante previstas. 6.1 (i) Para habilitar-se ao recebimento dos honorários avençados neste ‘contrato’, a Contratada deverá apresentar mensalmente ao Contratante, entre os dias 1 (um) e 5 (cinco) do mês subsequente à prestação dos serviços um relatório descritivo dos serviços que estão sendo remunerados, indicando individualmente os dados dos casos acompanhados, para validação pelo Contratante, que após autorizará a Contratada a emitir a nota fiscal, cujo pagamento ocorrerá até o último dia do mês em que a nota fiscal e os respectivos documentos forem apresentados, caso não haja necessidade de correção da nota fiscal apresentada. [...] 6.20(i) Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem à Contratada e em razão do ‘Beneficio Financeiro’ que rege este contrato, sua cobrança não impedirá ou reduzirá os esforços da Contratada para a realização de acordo e recebimento do credito pelo Contratante. [...] 6.22 (i) Ao término de cada ano civil, a Contratada deverá adotar as medidas cabíveis, o mais urgente possível, para que todos os honorários devidos em decorrência deste ‘contrato’ sejam objeto de solicitação de pagamento ao Contratante para que este possa efetivá-lo e, assim, as partes estarem mutuamente quitadas relativas ao referido exercício;” Verifica-se que, além das cláusulas citadas, as partes firmaram outras que beneficiam financeiramente o autor. Especificam, inclusive, valores por tipo de ação, assim como por volumes/demandas, estabelecendo também um teto remuneratório por processo, vejamos: “6.6 TETO HONORÁRIOS (i) Pelos serviços prestados a Contratada fará jus aos valores adiante mencionados, entretanto sempre limitados (Teto) ao valor de R$ 98.817,00 (noventa e oito mil, oitocentos e dezessete reais) por processo ou, caso não esteja ajuizado, por acordo extrajudicial, respeitadas as exceções e regras previstas neste ‘Contrato’; 6.7 VOLUMETRIA (i) A Contratada fará jus, a título de adiantamento, ao recebimento dos honorários de R$ 541,00 (quinhentos e quarenta e um reais), nos seguintes casos: (a) por execução extrajudicial, monitória, ordinária de cobrança, busca e apreensão, reintegração de posse, visando a recuperação de créditos, devidamente distribuídas em no máximo até 30 (trinta) dias da recepção dos ‘Documentos de Crédito’ enviados pelo Contratante; (b) na remessa de ações revisionais, prestação de contas, embargos de terceiro, indenizatórias, reparação de danos e planos econômicos, necessárias para a defesa do Contratante e (c) na adoção de procedimentos previstos na Lei n. 9.514/97, cujo valor poderá ser alterado em razão da aplicação da ‘Curva de Volumetria’, conforme subitens abaixo; Há ainda cláusula em que, não tendo como calcular os honorários, estes serão definidos conforme o beneficio financeiro revertido em favor do Contratante, ora réu: “6.3 PRINCIPIO DO BENEFÍCIO FINANCEIRO (i) O presente Contrato obedecerá ao principio do benefício financeiro, assim entendido, todo e qualquer recebimento de ativos, financeiros ou patrimoniais, cujo benefício tenha sido efetivamente obtido e revertido em favor do Contratante, em decorrência dos trabalhos desenvolvidos pela Contratada (Beneficio Financeiro); [...] (ii) Em caso de dúvida quanto à interpretação de cláusula ou condição deste ‘contrato’, tal principio deverá ser aplicado para o cálculo de qualquer verba que seja devida a Contratada, respeitando os percentuais aqui previstos; (iii) Se a base de cálculo de honorários não estiver ou não puder ser definida em quantia determinada, considerar-se-á como ‘Benefício Financeiro’ o valor líquido recebido pelo Contratante, oriundo de ativos financeiros ou outro ativo consistente em bens móveis ou imóveis;” As alterações realizadas nos aditivos (Ids. 132285845/ 132285850) tratam sobre valores de honorários, tratamento de dados, não ocorrendo alterações substanciais ao contrato primitivo. As cláusulas contratuais demonstram que o autor recebia pequenos valores, de acordo com peças processuais ajuizadas, protocoladas, assim como limitados aos volumes impostos pelo contrato, não podendo estes substituir a remuneração ao final de cada demanda, conforme a recuperação final do crédito em favor do réu. Resta, portanto, demonstrado que é assegurado ao autor, ao final de cada demanda, o recebimento de honorários de recuperação final de crédito em favor do réu, ou seja, decorrente do proveito econômico experimentado pelo banco. Ocorre que, com a rescisão contratual unilateral e antecipada, o autor se viu impossibilitado em continuar com a prestação dos serviços e de buscar um melhor e satisfatório resultado ao banco, visando o recebimento de honorários ao final das causas patrocinadas. Em nosso ordenamento jurídico, a prestação de serviços está regulamentada pelos artigos 593 a 609 do Código Civil, sendo que o seu 594 dispõe: “Toda a espécie de serviço ou trabalho lícito, material ou imaterial, pode ser contratada mediante retribuição.” (grifo nosso) Sobre o dispositivo supra, Arnaldo Rizzardo, comenta: “Concebe-se a prestação de serviços como o contrato sinalagmático através do qual uma das partes contratantes, designada prestadora (no Código de 1916 ‘locadora’), se compromete a prestar serviços ou mão de obra, que a outra, denominada beneficiaria ou recebedora (no Código de 1916 ‘locatária’), se compromete a remunerar. [...].” (In Contratos, Editora Forense. Rio de janeiro, 2015, p. 602). Maria Helena Diniz anota: “A prestação de serviço é um contrato pelo qual uma das partes (prestador) se obriga para com a outra (tomador) a prestar-lhe uma atividade lícita, material ou imaterial, mediante remuneração [...]. O objeto da prestação de serviço é uma obrigação de fazer, ou seja, a prestação de uma atividade lícita, não vedada pela lei e pelos bons costumes, oriunda da energia humana aproveitada por outrem, e que pode ser material (limpeza, jardinagem, conserto de TV, digitação, etc.) ou imaterial (p. ex., tratamento médico ou odontológico, consultoria jurídica, etc.).” (in Código civil anotado. 13ª edição, Saraiva. São Paulo, 2008, p. 454/455). E o Ministro Cezar Peluso: “[...] contrato de prestação de serviços é uma atividade humana, manual ou intelectual, doméstica ou externa, cujos exemplos têm o condão de falar por si: a prestação de serviços médicos, odontológicos, arquitetônicos ou advocatícios, além dos serviços comumente contratados de diarista e pintores.” (Código civil comentado : Coordenador Min. Cezar Peluso. 8ª edição, Manole. São Paulo, 2014, p. 600). Como se infere das lições supra, a remuneração é inerente ao contrato de prestação de serviço. E, tratando especialmente da prestação de serviços advocatícios, o Estatuto da Advocacia disciplina em seu art. 22, o qual foi recentemente alterado: “Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência. § 1º O advogado, quando indicado para patrocinar causa de juridicamente necessitado, no caso de impossibilidade da Defensoria Pública no local da prestação de serviço, tem direito aos honorários fixados pelo juiz, segundo tabela organizada pelo Conselho Seccional da OAB, e pagos pelo Estado. § 2º Na falta de estipulação ou de acordo, os honorários são fixados por arbitramento judicial, em remuneração compatível com o trabalho e o valor econômico da questão, observado obrigatoriamente o disposto nos §§ 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 6º-A, 8º, 8º-A, 9º e 10 do art. 85 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil). (Redação dada pela Lei nº 14.365, de 2022).” De igual maneira, o art. 14 do Código de Ética da Advocacia dispõe: “Art. 14. A revogação do mandato judicial por vontade do cliente não o desobriga do pagamento das verbas honorárias contratadas, bem como não retira o direito do advogado de receber o quanto lhe seja devido em eventual verba honorária de sucumbência, calculada proporcionalmente, em face do serviço efetivamente prestado”. O requerido traz aos autos termos de quitação no intuito de comprovar que nada deve ao autor. Entretanto, o termo de quitação de honorários, datado de 31/05/2016, anexado no Id. 134557941, se refere à quitação dos honorários e despesas referente aos fatos geradores anteriores a 31/12/2015: “Pelo presente e por ser expressão da verdade, o escritório Galera Mari e Advogados Associados S/S, [...], neste ato devidamente representados por seus sócios administradores nos termos do seu Contrato Social, dá ao Banco Bradesco S/A e todas suas empresas integrantes do seu conglomerado econômico, coligadas e afins, a mais ampla, total, geral e irrevogável quitação, para nada mais reclamar, seja a que título for, quer no presente ou futuro, renunciando assim ao direito de qualquer reclamação e/ou cobrança de valores de honorários advocatícios e demais despesas devidas em decorrência da prestação de serviços jurídicos com fato gerador até 31 de dezembro de 2015, nos termos da Cláusula 16.2 do instrumento contratual firmado entre as partes.” A cláusula 16.2, prevê: “16.2 Quaisquer pagamentos que forem devidos pelo Contratante em decorrência de atos praticados antes da vigência deste ‘contrato’ deverão ser objetos de solicitação de pagamento pela Contratada em até 60 (sessenta) dias da data deste ‘contrato’, para que todos os honorários e/ou despesas pendentes sejam pagos pelo Contratante e, assim, as partes estejam mutuamente quitadas. Em consonância com o acima disposto, em até 90 (noventa) dias da data deste contrato, a Contratada deverá apresentar ao Contratante uma declaração de quitação de honorários relativo a outros contratos de prestação de serviços anteriormente firmados, outorgando ao Contratante a mais plena, geral, irrevogável e irretratável quitação e renunciando a Contratada ao direito de qualquer discussão futura.” Ou seja, os honorários que eram devidos antes dessa data (31/12/2015), foram todos quitados, nada mais sendo devido pelo réu. Os demais termos, datados de 31/03/2017, 23/04/2018 e 10/03/2020, se referem a fatos geradores de 2016, 2017 a 2019, e todos fazem referencia à cláusula “da quitação de honorários” (cláusula 6.22). Referida quitação anual, prevista na clausula 6.22, não se refere aos honorários decorrentes do beneficio financeiro a serem pagos com a extinção do processo em que o escritório autor atuou, mas aos que foram antecipados anualmente durante a tramitação do processo, em especial os contidos na cláusula volumetria “6.7”. Portanto, verifica-se que o autor foi parcialmente remunerado pelos serviços prestados, em forma de adiantamento. Todavia, é certo também que o contrato prevê que o Contratado receberia honorários ao final de cada demanda, de acordo com a recuperação final do crédito revertido em favor do Contratante, assim como os de sucumbência. Logo, como a rescisão do contrato de prestação de serviços advocatícios ocorreu antecipadamente, o autor ficou impedido de receber tais honorários. Para a hipótese de rescisão contratual antecipada, tem-se admitido a relativização da regra contratual de honorários, a fim de evitar o locupletamento indevido. Se prevalecer a regra originariamente pactuada, haverá afronta aos princípios da boa-fé objetiva, função social do contrato e locupletamento ilícito. Afinal, o contrato foi rescindido unilateralmente pelo réu, impedindo o autor de atuar no feito, de modo a alcançar os melhores resultados, assim como receber efetivamente em decorrência de créditos revertidos em favor do réu. O arbitramento dos honorários aqui não fere o pactuado, haja vista que a rescisão de forma unilateral impediu o autor de participar e receber honorários na recuperação final do crédito pelo réu. Impediu também de atuar para o implemento das condições favoráveis ao bom deslinde das cobranças/execuções, devendo neste caso o cliente assumir o ônus de remunerar o advogado, sob pena de enriquecimento ilícito do contratante. O Superior Tribunal de Justiça possui o entendimento pacífico de que o rompimento do contrato de prestação de serviços pelo cliente, impedindo o advogado de patrocinar a causa até o fim, autoriza o arbitramento de honorários, na proporção dos serviços prestados. Nesse sentido: (...) (STJ, AgInt nos EDcl no REsp n. 1.840.754/SP, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 3/5/2022, DJe de 6/5/2022.). (...) (STJ, AgInt no AREsp n. 703.889/RS, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 19/10/2020, DJe de 26/10/2020.). O mesmo posicionamento tem o Tribunal de Justiça de Mato Grosso, conforme ementas que transcrevo: (...) (N.U 1045939-11.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 07/08/2024, Publicado no DJE 12/08/2024). (...) (N.U 1047702-47.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARIA HELENA GARGAGLIONE POVOAS, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 07/08/2024, Publicado no DJE 13/08/2024) (...) (N.U 1008685-04.2022.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, Quinta Câmara de Direito Privado, Julgado em 06/08/2024, Publicado no DJE 09/08/2024). Demonstrada a possibilidade de arbitramento de honorários advocatícios ao caso em apreço, passo a análise do valor a ser arbitrado. O autor pede que os honorários advocatícios sejam arbitrados de acordo com a redação do art. 22, § 2º do Estatuto da OAB, verbis: “Art. 22. (...) No entanto, o contrato firmado entre as partes estipula um limite na cláusula “6.6 Teto Honorários”, que em seu aditivo prevê o montante máximo de R$ 98.817,00 (noventa e oito mil, oitocentos e dezessete reais) de honorários a serem pagos ao final. Logo, não há como este juízo fixar os honorários entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o proveito econômico, como disciplina o art. 85, §2º do CPC, eis que ultrapassaria o teto contratualmente previsto. A par disso, o valor deve ser fixado por apreciação equitativa, como impõe o § 8º do art 85 do CPC, e considerando o tempo, o grau de zelo e os serviços prestados, bem como os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Por oportuno, registro os seguintes julgados: (...) (TJMT, N.U 1027794-77.2017.8.11.0041, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, DIRCEU DOS SANTOS, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 10/08/2022, Publicado no DJE 15/08/2022). (...) (RESP nº 767.783/PE, relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, 3ª Turma, DJe 03/02/2010).” (TJMG; APCV 5003360-03.2016.8.13.0245; Vigésima Câmara Cível; Rel. Des. Fernando Lins; Julg. 24/05/2023; DJEMG 25/05/2023). (...) (TJMG; APCV 5014538-88.2021.8.13.0433; Vigésima Câmara Cível; Rel. Des. Vicente de Oliveira Silva; Julg. 01/03/2023; DJEMG 02/03/2023). (...) (TJSC; APL 0500025-87.2010.8.24.0057; Primeira Câmara de Direito Civil; Rel. Des. Silvio Dagoberto Orsatto; Julg. 09/06/2022). Pois bem. A) PROCESSO DE EXECUÇÃO Nº 0019339-92.2007.8.11.0041. COMARCA DE CUIABÁ/MT – Ajuizada no dia 24/09/2007, AÇÃO DE EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL em desfavor de EDEM FILIPALDI FILHO, NELIO FERNANDES e SÃO BENEDITO LOCAÇÃO DE MÁQUINAS EQUIPAMENTOS LTDA - ME, pretendendo o recebimento de R$ 23.166,43 (vinte e três mil, cento e sessenta e seis reais e quarenta e três centavos), ante o inadimplemento dos executados no cumprimento das obrigações contratadas por meio da Cédula de Crédito Bancário Conta Garantida – Renovação Automática Aval nº 001.936.287, celebrada em 22/03/2007. Citados, os devedores permaneceram inertes após a intimação, o r. Juízo determinou que fosse expedido novo mandado de intimação para que os executados informem a localização do bem penhorado. Mandado esse que seria cumprido pelo oficial de justiça no endereço declinado na procuração outorgada pelos devedores, bem como em endereço obtido por meio de consulta ao sistema eletrônico INFOJUD. B) PROCESSO Nº 0000374-47.2015.8.11.0086. COMARCA DE NOVA MUTUM/MT. O autor em 08/01/2015, o ajuizamento da AÇÃO MONITÓRIA contra COMERCIAL DE ALIMENTOS JJ LTDA - ME, pretendendo o recebimento de R$ 59.065,76 (cinquenta e nove mil, sessenta e cinco reais e setenta e seis centavos), ante o inadimplemento do réu no pagamento das parcelas do empréstimo contratado na data de 20/12/2012 por meio de documento escrito sem eficácia de título executivo, qual seja o Contrato de Liberação de Empréstimo Limite Rotativo Flex – PJ nº 722/6471370. Após o trânsito em julgado da sentença, o banco credor deu início à fase de execução, apresentando o cálculo de atualização do débito e requerendo que fosse procedida tentativa de bloqueio de ativos financeiros do devedor, via BACENJUD. C) PROCESSO Nº 7044588-20.2019.8.22.0001. COMARCA DE PORTO VELHO/RO. O autor com seu costumeiro zelo e dedicação também atuou na defesa dos interesses do Banco ora requerido ao promover, em 08/10/2019, o ajuizamento de AÇÃO DE EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL contra STARWALKER COMERCIO DE VESTUARIO LTDA – ME e RODRIGO GIL SOUZA GALINDO, pugnando pelo pagamento de R$ 124.820,70 (cento e vinte e quatro mil, oitocentos e vinte reais e setenta centavos), ante o inadimplemento dos executados no cumprimento das obrigações contratadas na data de 24/02/2017 por meio da Cédula de Crédito Bancário Empréstimo - Capital de Giro nº 351/729873. O autor empreendeu várias diligências visando a citação e localização de bens para garantia da execução, que resultaram infrutíferas e motivaram a suspensão da CNH do devedor pessoa física e na inclusão dos dados dos executados no SERASAJUD, o exequente requereu a suspensão da tramitação do feito pelo período de um ano, com fulcro no art. 921, §1º do CPC. Pedido esse que foi deferido pelo r. Juízo. D) PROCESSO Nº 0609599-64.2016.8.04.0001. COMARCA DE MANAUS/AM. O autor atuou em 18/09/2019, passou a representar os interesses do requerido nos autos da AÇÃO DE EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL, promovida em desfavor de ZILDA MARIA TAVARES DA SILVA XAVIER EIRELI ME, ZILDA MARIA TAVARES DA SILVA XAVIER e ODÍLIO MIRANDA XAVIER, em que se pleiteava o pagamento de R$ 85.769,27 (oitenta e cinco mil, setecentos e sessenta e nove reais e vinte e sete centavos). A referida ação foi ajuizada na data de 23/03/2016 por outro escritório de advocatícia em razão do inadimplemento dos executados no pagamento das parcelas do empréstimo contratado por meio da Cédula de Crédito Bancário – Empréstimo - Capital de Giro n° 008.397.038, celebrada no dia 02/09/2014. Após várias diligências, o juízo acolheu os pedidos do exequente para determinar a suspensão da tramitação do feito pelo prazo de um ano, com o arquivamento provisório dos autos, além da inclusão dos dados dos devedores no SPC e SERASA. E) PROCESSO Nº 0061368-28.2014.8.14.0301. COMARCA DE BELÉM/PA. O autor, do mesmo modo, atuou com costumeiro zelo e dedicação, ao promover, em 24/01/2019, o ajuizamento de AÇÃO DE EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL em desfavor de LEANDRO BATISTA ALVES e EDILANA FIALHO LAMBURGUINI, que pugnando pelo pagamento do valor de R$ 133.172,96 (cento e trinta e três mil, cento e setenta e dois reais e noventa e seis centavos). Após várias diligências visando a citação e localização de bens, o banco credor requereu que fossem remetidas cartas registradas de citação com aviso de recebimento, via correios, para os demais endereços obtidos por meio da pesquisa judicial. Destarte, é cediço que em casos como este em análise, deve o magistrado fixar os honorários respeitando o grau de zelo do profissional; o lugar da prestação do serviço; a natureza e importância da causa; o trabalho realizado pelo advogado, bem como o tempo exigido para o seu serviço, de forma que, no caso em voga, a verba honorária deve fixada no montante de R$ 18.000,00 (dezoito mil reais), estando em total consonância com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Ante o exposto, com fundamento no art. 487, I do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO a presente AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS proposta por GALERA MARI ADVOGADOS ASSOCIADOS em face do BANCO BRADESCO S/A, para CONDENAR este último, ao pagamento de R$ 18.000,00 (dezoito mil reais), acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação, corrigido monetariamente pelo índice INPC a partir da data deste julgamento, ao autor. Condeno o banco requerido nas custas e despesas processuais, bem como nos honorários advocatícios em 10% do valor da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º do CPC. (...)” (ID. 289524881) (g.n.) Pois bem. Como visto, não se verifica a ocorrência de decisão extra petita na sentença objurgada, uma vez que a pretensão inicial sempre foi a de arbitramento dos honorários advocatícios com base no art. 22, §2º, da Lei n. 8.906/1994 (Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB), que prevê expressamente a obrigatoriedade de observância dos parágrafos 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 6º-A, 8º, 8º-A, 9º e 10, todos do art. 85 do CPC, já que a sentença se limitou a analisar o pedido constante na inicial, dentro da causa de pedir e pedido ali delimitados, ou seja, “não há que se falar em julgamento extra petita quando o provimento jurisdicional é decorrência lógica do pedido, compreendido como corolário da interpretação lógico-sistemática das alegações constantes da petição inicial” (STJ. REsp n. 2.000.701/PR, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 30/08/2022, DJe 01/09/2022). Em outras palavras, a pretensão recursal do Escritório GALERA MARI também está abarcada pelos pedidos constantes na exordial (item 4) - art. 22, §2º, da Lei n. 8.906/1994 c/c art. 85, § 20, do CPC), não constituindo, portanto, a abordagem de matéria inédita em sede de apelação, sendo possível postular, ao menos em tese, a modificação dos honorários fixados pelo Juízo a quo, para que sejam majorados conforme requerido na inicial, demonstrando o interesse recursal do Apelante. Isso porque é assente na jurisprudência do STJ que “o fato de haver contrato escrito, com previsão de pagamento de parte dos honorários antecipadamente e parte em percentual sobre o êxito da ação, não retira o interesse na ação de arbitramento de honorários, quando a avença é rescindida antecipadamente pelo contratante.” (STJ - Terceira Turma - AgInt no AREsp n. 2.073.253/MT, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 15/08/2022). Nessa esteira, também entendo como adequada a via eleita pelo Escritório GALERA MARI, uma vez que restou incontroverso nos autos a inexistência de “estipulação ou de acordo” expresso entre as partes na hipótese de rescisão unilateral do contrato de prestação de serviços advocatícios, de modo que foi necessário o ajuizamento da presente ação para arbitramento judicial dessa verba, nos termos do no art. 22, §2º, da Lei n. 8.906/1994, in verbis: “Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência. (...) §2º. Na falta de estipulação ou de acordo, os honorários são fixados por arbitramento judicial, em remuneração compatível com o trabalho e o valor econômico da questão, observado obrigatoriamente o disposto nos §§ 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 6º-A, 8º, 8º-A, 9º e 10 do art. 85 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil)”. (g.n.) No mesmo sentido: “(...) Tendo sido rescindido o contrato por iniciativa do mandante antes do término da prestação de serviço, ao advogado assiste o direito de ajuizar ação de arbitramento para postular honorários proporcionais à sua atuação. Precedentes. (...)” (STJ. AgInt no AREsp n. 2.348.277/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 23/10/2023, DJe 25/10/2023) (g.n.) Ocorre que, conforme delineado na sentença, a causa de pedir deduzida na inicial é a rescisão unilateral e imotivada do contrato havida entre as partes, de modo que, constato que o escritório de advocacia visa o arbitramento de honorários justamente em razão da rescisão antecipada do contrato. Nesse ponto, é importante assentar a existência de remuneração contratualmente ajustada durante a vigência do contrato de honorários advocatícios não tem o condão de afastar o direito do escritório ao arbitramento de honorários na hipótese de resilição unilateral e antecipada pelo contratante, na medida em que não há, no contrato, disposição específica estabelecendo a remuneração a que faria jus o advogado nesta hipótese. A propósito, observe-se que a instituição financeira não logrou êxito em demonstrar que o contrato de honorários celebrado com o escritório de advocacia contivesse disposição específica quanto à forma de remuneração a que o contratado faria jus em caso de rescisão do contrato promovida pelo contratante. A análise das disposições contratuais permite concluir que se trata de uma situação de “falta de estipulação ou acordo”, nos exatos termos do art. 22, §2º do EOAB, na medida em que não havia previsão contratual sobre qual seria a remuneração devida ao advogado em caso de rescisão imotivada por iniciativa do contratante. O fato de o contrato conter a previsão da possibilidade de resilição não tem o condão de afastar o direito do advogado de postular a remuneração pelos serviços prestados até o momento da revogação do mandato, sendo tal pretensão amparada por lei, doutrina e jurisprudência pátrias. Nessa ordem de pensar, tenho que, não obstante constar a assinatura do representante do escritório GALERA MARI nos Termos de Quitação juntados pelo BANCO BRADESCO (ID. 289524872), tais documentos são inservíveis para eximir a Instituição Financeira contratante de remunerar o Escritório contratado pelos serviços prestados até a rescisão unilateral, como alegado pelo BANCO, pois não indicam a que processos ou serviços se referem, e, portanto, não podem ser considerados documentos hábeis a comprovar a quitação dos honorários buscados nestes autos. A propósito, em caso análogo já decidiu este Sodalício: “APELAÇÃO - AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - PARCIAL PROCEDÊNCIA - FIXAÇÃO COM BASE NA TABELA DA OAB - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS NA ESFERA ADMINISTRATIVA E JUDICIAL - COMPROVADA - AUSÊNCIA DE PROVA DE QUE O VALOR PAGO QUITARIA OS SERVIÇOS PRESTADOS NAS DUAS ESFERAS - SENTENÇA MANTIDA - HONORÁRIOS RECURSAIS - MAJORAÇÃO - ART. 85, § 11, CPC - RECURSO DESPROVIDO. É incontroversa a relação jurídica entre as partes, o trabalho realizado pelo autor, tanto na esfera administrativa quanto na judicial, e a ausência de contrato escrito convencionando os respectivos honorários. A empresa requerida não demonstrou, por sua via, que o valor pago quitaria a prestação do serviço nas fases administrativa e judicial, ônus do qual não se desincumbiu.” (TJMT. N.U 1014538-28.2021.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, Guiomar Teodoro Borges, Quarta Câmara de Direito Privado, j. 08/03/2023, DJe 10/03/2023) (g.n.) De mais a mais, é cediço que, para produzir efeitos jurídicos, a quitação deve observar estritamente o comando normativo previsto no Código Civil, em seu art. 320, segundo o qual a quitação, que sempre poderá ser dada por instrumento particular, designará o valor e a espécie da dívida quitada, o nome do devedor, ou quem por este pagou, o tempo e o lugar do pagamento, com a assinatura do credor, ou do seu representante. Na espécie, entretanto, verifico que as cartas de quitação acostadas aos autos são genéricas e desprovidas de especificações, pelo que não atendem aos requisitos dispostos no mencionado artigo. Além disso, em nenhum momento a quitação se referiu aos honorários pelos serviços prestados nos autos dos processos que são objeto desta ação, tampouco aos valores a eles pertinentes. Para, além disso, a quitação diria respeito aos valores adiantados ao escritório em conformidade com a cláusula 6.22 do contrato e não aos honorários devidos ao final de cada demanda, conforme recuperação final do crédito então pleiteado pelo contratante. Neste prisma, é insubsistente a tese da quitação suscitada pela Instituição Financeira, de modo que, considerando que a rescisão contratual se deu por sua iniciativa, sem que o Escritório tenha contribuído de qualquer modo para tanto, é imperativo que ele seja remunerado pelos serviços prestados em prol do ex-cliente até o momento da revogação do mandato, sob pena de enriquecimento sem causa da instituição financeira. Outrossim, não prospera o argumento do Banco no sentido de que não seria devida qualquer remuneração ao escritório em razão da inexistência de proveito econômico advindo de sua atuação nos processos em que houve a destituição. Além de o Código de Ética da Advocacia estabelecer que a revogação do mandado judicial por vontade do cliente não o desobriga do pagamento das verbas honorárias contratados, é certo que eventual insucesso da demanda não pode ser oposto ao advogado como motivo para frustrar sua remuneração, pois é assente o entendimento de que o mesmo não pode ser responsabilizado pelo resultado do processo, já que sua obrigação é de meio e não de resultado. Ademais, conforme amplamente fundamentado na petição inicial e comprovado mediante farta documentação, os benefícios auferidos pelo BANCO em decorrência da contratação dos serviços do escritório GALERA MARI extrapolam a mera recuperação do crédito nos autos das ações ajuizadas. Isso porque, o ajuizamento das cobranças judiciais confere à Instituição Financeira o direito à dedução fiscal de valores, a título de perdas, para fins de apuração da base de cálculo do IRPJ, o que representa vantagem econômica expressiva resultante do serviço advocatício prestado, ainda que a demanda venha a ser extinta sem êxito ao final. Superadas essas questões, resta a análise do quantum dos honorários arbitrados pelo Juízo a quo na sentença objurgada, matéria que foi objeto de irresignação de ambos os recursos. Malgrado os argumentos expendidos pelas partes em suas razões, em análise minudente da questão, entendo que tão somente ao apelo manejado pelo escritório GALERA MARI comporta parcial provimento, no tocante a sua pretensão subsidiária de majoração dos honorários arbitrados. Vejamos. Na espécie, resta incontroverso que o arbitramento judicial é medida que se impõe, uma vez que a referida avença não previa expressamente a remuneração na hipótese de rescisão unilateral, como ocorreu no caso sub judice, restando apenas analisar se o montante arbitrado pelo Juízo a quo atende aos critérios legais previstos no Código de Processo Civil e no Estatuto da OAB. É importante destacar que, embora o Escritório Apelante já tenha recebido parte dos honorários pelas etapas até então concluída nos processos, ainda faz jus ao recebimento dos honorários advocatícios pleiteados nestes autos, uma vez que o contrato firmado entre as partes era essencialmente “ad exitum”, ou seja, a maior parte da remuneração pelos serviços advocatícios prestados seria recebida com base nas verbas sucumbenciais, auferida após a apuração do benefício econômico obtido pelo Banco. Assim, justifica-se o arbitramento judicial da verba honorária pelo trabalho exercido até o momento do encerramento do contrato, já que, repise-se, não foram pactuados honorários em caso de rescisão unilateral. Nesse sentido: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS. CLÁUSULA DE ÊXITO. REVOGAÇÃO DO MANDATO POR INICIATIVA DO CONSTITUINTE (MANDANTE). AÇÃO DE ARBITRAMENTO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Quando a revogação do mandato ocorre por iniciativa do constituinte (mandante), é facultado ao advogado mandatário propor ação de arbitramento judicial dos honorários advocatícios contratuais, ainda que avençados sob a cláusula ad exitum. (...)” (STJ. AgInt no AREsp n. 2.382.957/SC, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, 3ª Turma, j. 16/10/2023, DJe 18/10/2023) (g.n.) Pois bem. De acordo com o art. 85 do CPC: “Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. §1º. São devidos honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente. §2º. Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos: I - o grau de zelo do profissional; II - o lugar de prestação do serviço; III - a natureza e a importância da causa; IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. (...) §6º. Os limites e critérios previstos nos §§ 2º e 3º aplicam-se independentemente de qual seja o conteúdo da decisão, inclusive aos casos de improcedência ou de sentença sem resolução de mérito. § 6º-A. Quando o valor da condenação ou do proveito econômico obtido ou o valor atualizado da causa for líquido ou liquidável, para fins de fixação dos honorários advocatícios, nos termos dos §§ 2º e 3º, é proibida a apreciação equitativa, salvo nas hipóteses expressamente previstas no § 8º deste artigo. (Incluído pela Lei nº 14.365, de 2022) (...) §8º. Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do §2º. §8º-A. Na hipótese do §8º deste artigo, para fins de fixação equitativa de honorários sucumbenciais, o juiz deverá observar os valores recomendados pelo Conselho Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil a título de honorários advocatícios ou o limite mínimo de 10% (dez por cento) estabelecido no §2º deste artigo, aplicando-se o que for maior. (Incluído pela Lei nº 14.365, de 2022) (...) §11. O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento. § 12. Os honorários referidos no §11 são cumuláveis com multas e outras sanções processuais, inclusive as previstas no art. 77 . (...) §16. Quando os honorários forem fixados em quantia certa, os juros moratórios incidirão a partir da data do trânsito em julgado da decisão. (...) §20. O disposto nos §§ 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 6º-A, 8º, 8º-A, 9º e 10 deste artigo aplica-se aos honorários fixados por arbitramento judicial. (Incluído pela Lei nº 14.365, de 2022)” (g.n.) No caso destes autos, contudo, entendo que não é possível fixar os honorários com base nos percentuais previstos no §2º do art. 85 do CPC, uma vez que o contrato de prestação de serviços foi interrompido antes de proferida a sentença nos processos em questão. Portanto, não há condenação ou proveito econômico mensurável, além do que o arbitramento judicial não deve ser confundido com os honorários sucumbenciais, visto que não possui natureza processual e independe do resultado da demanda, devendo ser fixado por apreciação equitativa (§8º do mesmo artigo). Nessa linha de intelecção, verifica-se que a Magistrada sentenciante tratou de esmiuçar os desdobramentos processuais de cada processo em que o Escritório apelante busca o arbitramento de honorários, fazendo constar que: “A) PROCESSO DE EXECUÇÃO Nº 0019339-92.2007.8.11.0041. COMARCA DE CUIABÁ/MT – Ajuizada no dia 24/09/2007, AÇÃO DE EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL em desfavor de EDEM FILIPALDI FILHO, NELIO FERNANDES e SÃO BENEDITO LOCAÇÃO DE MÁQUINAS EQUIPAMENTOS LTDA - ME, pretendendo o recebimento de R$ 23.166,43 (vinte e três mil, cento e sessenta e seis reais e quarenta e três centavos), ante o inadimplemento dos executados no cumprimento das obrigações contratadas por meio da Cédula de Crédito Bancário Conta Garantida – Renovação Automática Aval nº 001.936.287, celebrada em 22/03/2007. Citados, os devedores permaneceram inertes após a intimação, o r. Juízo determinou que fosse expedido novo mandado de intimação para que os executados informem a localização do bem penhorado. Mandado esse que seria cumprido pelo oficial de justiça no endereço declinado na procuração outorgada pelos devedores, bem como em endereço obtido por meio de consulta ao sistema eletrônico INFOJUD. B) PROCESSO Nº 0000374-47.2015.8.11.0086. COMARCA DE NOVA MUTUM/MT. O autor em 08/01/2015, o ajuizamento da AÇÃO MONITÓRIA contra COMERCIAL DE ALIMENTOS JJ LTDA - ME, pretendendo o recebimento de R$ 59.065,76 (cinquenta e nove mil, sessenta e cinco reais e setenta e seis centavos), ante o inadimplemento do réu no pagamento das parcelas do empréstimo contratado na data de 20/12/2012 por meio de documento escrito sem eficácia de título executivo, qual seja o Contrato de Liberação de Empréstimo Limite Rotativo Flex – PJ nº 722/6471370. Após o trânsito em julgado da sentença, o banco credor deu início à fase de execução, apresentando o cálculo de atualização do débito e requerendo que fosse procedida tentativa de bloqueio de ativos financeiros do devedor, via BACENJUD. C) PROCESSO Nº 7044588-20.2019.8.22.0001. COMARCA DE PORTO VELHO/RO. O autor com seu costumeiro zelo e dedicação também atuou na defesa dos interesses do Banco ora requerido ao promover, em 08/10/2019, o ajuizamento de AÇÃO DE EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL contra STARWALKER COMERCIO DE VESTUARIO LTDA – ME e RODRIGO GIL SOUZA GALINDO, pugnando pelo pagamento de R$ 124.820,70 (cento e vinte e quatro mil, oitocentos e vinte reais e setenta centavos), ante o inadimplemento dos executados no cumprimento das obrigações contratadas na data de 24/02/2017 por meio da Cédula de Crédito Bancário Empréstimo - Capital de Giro nº 351/729873. O autor empreendeu várias diligências visando a citação e localização de bens para garantia da execução, que resultaram infrutíferas e motivaram a suspensão da CNH do devedor pessoa física e na inclusão dos dados dos executados no SERASAJUD, o exequente requereu a suspensão da tramitação do feito pelo período de um ano, com fulcro no art. 921, §1º do CPC. Pedido esse que foi deferido pelo r. Juízo. D) PROCESSO Nº 0609599-64.2016.8.04.0001. COMARCA DE MANAUS/AM. O autor atuou em 18/09/2019, passou a representar os interesses do requerido nos autos da AÇÃO DE EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL, promovida em desfavor de ZILDA MARIA TAVARES DA SILVA XAVIER EIRELI ME, ZILDA MARIA TAVARES DA SILVA XAVIER e ODÍLIO MIRANDA XAVIER, em que se pleiteava o pagamento de R$ 85.769,27 (oitenta e cinco mil, setecentos e sessenta e nove reais e vinte e sete centavos). A referida ação foi ajuizada na data de 23/03/2016 por outro escritório de advocatícia em razão do inadimplemento dos executados no pagamento das parcelas do empréstimo contratado por meio da Cédula de Crédito Bancário – Empréstimo - Capital de Giro n° 008.397.038, celebrada no dia 02/09/2014. Após várias diligências, o juízo acolheu os pedidos do exequente para determinar a suspensão da tramitação do feito pelo prazo de um ano, com o arquivamento provisório dos autos, além da inclusão dos dados dos devedores no SPC e SERASA. E) PROCESSO Nº 0061368-28.2014.8.14.0301. COMARCA DE BELÉM/PA. O autor, do mesmo modo, atuou com costumeiro zelo e dedicação, ao promover, em 24/01/2019, o ajuizamento de AÇÃO DE EXECUÇÃO POR TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL em desfavor de LEANDRO BATISTA ALVES e EDILANA FIALHO LAMBURGUINI, que pugnando pelo pagamento do valor de R$ 133.172,96 (cento e trinta e três mil, cento e setenta e dois reais e noventa e seis centavos). Após várias diligências visando a citação e localização de bens, o banco credor requereu que fossem remetidas cartas registradas de citação com aviso de recebimento, via correios, para os demais endereços obtidos por meio da pesquisa judicial.” (ID. 289524881). De fato, dos documentos coligidos à peça inaugural pelo Escritório de Advocacia para comprovar o trabalho por ele desempenhado nos processos em questão, denota-se que: I) na Execução de Título Extrajudicial n. 0019339-92.2007.8.11.0041, da 1ª Vara Especializada em Direito Bancário da Comarca de Cuiabá/MT, em que se buscava crédito no valor de R$ 23.166,43 (R$ 224.856,46 segundo cálculos de atualização do Escritório), ajuizada em 24/09/2007, foram elaboradas cerca de 15 (quinze) petições, todavia, sem qualquer complexidade, tendo deixado o feito enquanto se aguardava a localização do bem penhorado para sua avaliação (ID. 289524854 e ID. 289524855); II) na Ação Monitória n. 0000374-47.2015.8.11.0086, da 1ª Vara de Nova Mutum/MT, em que se buscava crédito no valor de R$ 59.065,76 (R$ 262.217,85 segundo cálculos de atualização do Escritório), ajuizada em 08/01/2015, foram elaboradas cerca de 06 (seis) petições, igualmente sem qualquer complexidade, tendo deixado o feito quando se aguardava o bloqueio de ativos em nome do executado via BacenJud (ID. 289524857); III) na Execução de Título Extrajudicial n. 7044588-20.2019.8.22.0001, da 1ª Vara Cível Porto Velho/RO, em que se buscava crédito no valor de R$ 124.820,70 (R$ 249.218,76 segundo cálculos de atualização do Escritório), ajuizada em 08/10/2019, foram elaboradas cerca de 09 (nove) petições, todavia, sem qualquer complexidade, tendo deixado o feito quando se postulava a implementação de medidas atípicas para a localização de bens da parte devedora (ID. 289524859); IV) na Execução por Quantia Certa n. 0609599-64.2016.8.04.0001, da 14ª Vara Cível e de Acidentes de Trabalho da Comarca de Manaus/AM, em que se buscava crédito no valor de R$ 85.769,27 (R$ 238.411,07 segundo cálculos de atualização do Escritório), ajuizada em 23/02/2016, o Escritório adentrou ao feito somente em 09/01/2020, ocasião em que juntou apenas 03 (três) petições, sem qualquer complexidade, tendo deixado o feito quando se postulava a implementação de medidas atípicas para a localização de bens da parte devedora (ID. 289524861); e na V) Execução de Título Extrajudicial n. 0061368-28.2014.8.14.0301, da 7ª Vara Cível e Empresarial de Belém/PA, em que se buscava crédito no valor de R$ 70.322,52 (R$ 242.238,96 segundo cálculos de atualização do Escritório), ajuizada em 27/11/2014, o Escritório adentrou ao feito somente em 13/01/2017, ocasião em que juntou apenas 07 (sete) petições, sem qualquer complexidade, tendo deixado o feito quando ainda se buscava outros endereços para a citação da parte devedora (ID. 289524863). Diante disso, em observância dos critérios previstos nos incisos I a IV do §2º do art. 85 do CPC acima transcritos, entendo que o montante deve ser majorado para R$ 34.000,00 (trinta e quatro mil reais), sendo R$ 10.000,00 (dez mil reais) para a Execução de Título Extrajudicial n. 0019339-92.2007.8.11.0041 e R$ 6.000,00 (seis mil reais) pelos trabalhos exercidos nos demais feitos, por entender que esse montante reflete o grau de complexidade dos casos, o conteúdo do trabalho jurídico apresentado até a rescisão do contrato e a presteza do trabalho do escritório de advocacia. O valor leva em conta as peculiaridades de cada caso, notadamente quanto ao tempo de tramitação e a ausência de atos excessivamente complexos, de modo que o quantum fixado está adequado aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, considerando ainda o lugar da prestação do serviço, a natureza e a importância dos direitos envolvidos, se mostrando compatível com o trabalho desenvolvido pelo Escritório de advocacia no patrocínio de tais demandas. Em casos análogos, envolvendo idênticas partes, já decidiu este Sodalício: “AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO - FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL - INÉPCIA DA INICIAL - JULGAMENTO EXTRA PETITA - PRELIMINARES REJEITADAS - RESCISÃO SEM JUSTA CAUSA - PREVISÃO DE REMUNERAÇÃO POR ÊXITO - MANUTENÇÃO DO VALOR FIXADO DE ACORDO COM O TRABALHO DESEMPENHADO PELO CAUSÍDICO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSOS DESPROVIDOS. Tendo o condutor do feito analisado todas as questões trazidas à baila quando do julgamento da demanda, fundamentando de forma objetiva sua decisão de julgar parcialmente procedente o pedido inicial, utilizando dispositivos legais relacionados a matéria invocada e jurisprudência emanada dos Tribunais Pátrios, não há que se falar em ausência de fundamentação. Este Tribunal tem entendimento pacífico no sentido de que o interesse processual nasce no momento em que a parte tem necessidade de ir a juízo para atingir a tutela pretendida e, ainda, quando esta tutela jurisdicional lhe traz alguma utilidade do ponto de vista prático. Na espécie, a exordial permitiu a avaliação do pedido e possibilitou a defesa e o contraditório, não devendo ser considerada inepta. In casu, o pedido é certo e determinado, qual seja, o arbitramento dos honorários pelo trabalho desenvolvido, decorrente da rescisão antecipada do contrato de prestação de serviços com previsão de remuneração por êxito, inexistindo na inicial pedido de honorários de sucumbência, tendo a r. sentença se limitado a analisar o pedido constante na inicial. É plenamente possível o arbitramento de honorários advocatícios, sob o fundamento dos princípios da razoabilidade, boa-fé contratual, função social do contrato e da vedação do locupletamento sem causa, em razão do trabalho desempenhado pelo causídico, até o momento de sua destituição, nos casos em que o contrato de remuneração por êxito é rescindido unilateralmente sem justa causa pelo contratante. Nas hipóteses de ação de arbitramento de honorários não se aplica a regra de percentual sobre o valor da causa ou condenação disposta no §2º, do art. 85, do CPC, devendo o magistrado se ater aos critérios qualitativos do causídico durante a sua participação no feito, a fim de arbitrar os honorários de forma justa, razoável e proporcional, conforme se observou na espécie, razão pela qual a sua manutenção é medida que se impõe.” (TJMT. N.U 1030983-87.2022.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, Rel. Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, Terceira Câmara de Direito Privado, j. 26/06/2024, DJe 30/06/2024) (g.n.) “APELAÇÕES CÍVEIS - ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - PRELIMINARES DE NULIDADE POR AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO, INCOMPETÊNCIA RELATIVA DO JUIZO A QUO, AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL E REVOGAÇÃO DA JUSTIÇA GRATUITA - REJEITADAS - RESCISÃO UNILATERAL PELO CONTRATANTE - DIREITO À CONTRAPRESTAÇÃO PECUNIÁRIA - REDUÇÃO DA VERBA HONORÁRIA - VALOR INJUSTO E INADEQUADO - RECURSO DO AUTOR DESPROVIDO - RECURSO DA REQUERIDA PARCIALMENTE PROVIDO. Fundamentação sucinta não se equivale a sua ausência. Apesar da existência de cláusula de eleição de foro no instrumento contratual, esta cede lugar diante da norma de ordem pública (artigo 53, inciso III, CPC), devendo ser observado o foro do lugar em que a obrigação deve ser satisfeita. (N.U 0021705-42.2019.8.11.0055, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 24/03/2021, Publicado no DJE 30/03/2021) “Segundo os ensinamentos de Nelson Nery Junior e Rosa Maria Andrade Nery, “Existe interesse processual quando a parte tem necessidade de ir a juízo para alcançar a tutela pretendida e, ainda, quando essa tutela jurisdicional pode trazer-lhe alguma utilidade do ponto de vista prático” (Código de Processo Civil Comentado, 4a ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 729/730). Não evidenciada a alteração das condições econômico-financeiras que justificaram o deferimento da justiça gratuita ao apelado, não há que se falar em revogação do benefício. “Ocorrendo a rescisão contratual unilateral e imotivada, é direito do advogado receber pelos serviços prestados.”. “O juiz deve agir com moderação e razoabilidade ao atender à qualidade e à quantidade do trabalho, bem como o proveito da parte, a fim de não onerar o vencido em demasia nem desqualificar o trabalho do advogado (STJ AgRg no REsp 1.194.995/SP)” (TJMT. N.U 1023311-28.2022.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, Rel. Des. José Zuquim Nogueira, Quinta Câmara de Direito Privado, j. 25/06/2024, DJe 25/06/2024) (g.n.) “APELAÇÃO CÍVEL - ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS - RESCISÃO UNILATERAL DE CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ADVOCATÍCIOS - IMPOSSIBILIDADE DE CUMPRIMENTO DAS CLÁUSULAS PARA RECEBIMENTO DE HONORÁRIOS - ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS PELO JUDICIÁRIO - POSSIBILIDADE - INTERESSE EVIDENCIADO - VIA ADEQUADA - ANÁLISE DO TRABALHO DESEMPENHADO PELO ADVOGADO NO CURSO DO PROCESSO - HONORÁRIOS DEVIDOS - ARBITRAMENTO DE FORMA EQUITATIVA - HONORÁRIOS MAJORADOS - SENTENÇA MANTIDA - AMBOS OS RECURSOS DESPROVIDOS. Nos casos em que há rescisão unilateral do contrato, faz-se imperioso deferir o pleito de arbitramento dos honorários com base no trabalho desempenhado até a revogação do mandado, independentemente da implementação das condições contratuais então vigentes, que se tornou de impossível cumprimento, pois a negativa do direito viola o art. 22, §2º, do Estatuto da OAB, sob pena de autorizar o contratante a se locupletar ilicitamente com o trabalho de seu advogado, mesmo que minimamente exercido. Os honorários devem ser arbitrados de acordo com o “trabalho exercido pelo advogado até o momento da rescisão contratual" (AgInt no AREsp 1.560.257/PB, AgInt no REsp n. 1.554.329/MS).” (TJMT. N.U 1004299-91.2023.8.11.0041, Câmaras Isoladas Cíveis de Direito Privado, Rel. Desa. Nilza Maria Possas de Carvalho, Primeira Câmara de Direito Privado, j. 25/06/2024, DJe 26/06/2024) (g.n.) Em relação aos honorários sucumbenciais fixados em “10% do valor da condenação”, considero que são adequados, uma vez que o percentual é compatível com a complexidade da demanda e com o trabalho desenvolvido pelo causídico, na forma do art. 85, §2º, I a IV, do CPC, estando ainda em conformidade com o Tema n. 1.076 do STJ. Por derradeiro, no que tange aos consectários legais, cabe lembrar também que a Lei n. 14.905/2024 modificou significativamente alguns dispositivos do Código Civil, especificamente aqueles que disciplinam a correção monetária e os juros moratórios incidentes nas relações cíveis (arts. 389 e 406), estabelecendo os índices a serem aplicados nas hipóteses em que não houver pactuação ou previsão legal específica, fixando o IPCA como índice de atualização monetária e a Taxa SELIC (deduzindo-se a correção monetária aplicável), como base de cálculo dos juros de mora, sendo que tais modificações só passarão a ter efeito 60 dias após a publicação (art. 5º, II), ocorrida em 1º/07/2024. Assim sendo, observada a vacatio legis da Lei n. 14.905/2024, entendo que o percentual dos juros de mora deve ser fixado em 1% (um por cento) ao mês, com fulcro no art. 406 do CC c/c art. 161, §1º, do CTN (Enunciado n. 20 da 1ª Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal), até que a novel legislação passe a produzir efeitos, após o que o cálculo da correção monetária e dos juros de mora deverá observar as modificações implementadas ao Código Civil, passando a incidir o índice do IPCA para a correção monetária e a Taxa Selic para os juros de mora, nos termos dos arts. 389, parágrafo único e 406 e §§ do CPC (incluídos pela Lei n. 14.905/2024). Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO ao apelo do BANCO BRADESCO S/A e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação interposto por GALERA MARI E ADVOGADOS ASSOCIADOS, apenas para MAJORAR o valor da condenação, arbitrando os honorários em R$ 34.000,00 (trinta e quatro mil reais), que deverão ser acrescidos de correção monetária pelo INPC, a partir do arbitramento e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação, calculados até que a Lei n. 14.905/2024 passe a produzir efeitos, após o que o cálculo da correção monetária e dos juros de mora deverá observar os índices dos arts. 389, parágrafo único, 406 e §§ do CC, restando mantidos os demais termos da sentença, por estes e por seus próprios fundamentos. Por corolário lógico, majoro a condenação em honorários advocatícios sucumbenciais em face do BANCO BRADESCO 10% para 15% (quinze por cento), nos termos do art. 85, §11, do CPC. Sem honorários recursais em relação ao apelante GALERA MARI, tendo em vista o entendimento consolidado no STJ no sentido de que são incabíveis “no recurso interposto pela parte vencedora para ampliar a condenação, pela própria redação do art. 85, § 11, do CPC/2015” (EAREsp n. 1.847.842/PR). É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 17/06/2025

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