Processo nº 5000446-19.2020.4.03.6006
ID: 283215610
Tribunal: TRF3
Órgão: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 5000446-19.2020.4.03.6006
Data de Disponibilização:
29/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
PAULO CESAR MARTINS
OAB/MS XXXXXX
Desbloquear
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000446-19.2020.4.03.6006 RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS APELANTE: JADSON FERNANDO DA FONS…
PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000446-19.2020.4.03.6006 RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS APELANTE: JADSON FERNANDO DA FONSECA Advogado do(a) APELANTE: PAULO CESAR MARTINS - MS14622-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000446-19.2020.4.03.6006 RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS APELANTE: JADSON FERNANDO DA FONSECA Advogado do(a) APELANTE: PAULO CESAR MARTINS - MS14622-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS: Trata-se de Apelação Criminal interposta por JADSON FERNANDO DA FONSECA, brasileiro e nascido em 19.07.1988, em face da r. sentença (ID 309021968), proferida pelo Exmo. Juiz Federal Hugo Daniel Lazarin (1ª Vara Federal de Naviraí/MS), a qual julgou PARCIALMENTE PROCEDENTE a pretensão penal para CONDENAR o Apelante pela prática do crime previsto no artigo 334-A, §1º, IV, do Código Penal, à pena privativa de liberdade de 03 (três) anos de reclusão, a ser cumprida em regime inicial SEMIABERTO. A pena privativa de liberdade não foi substituída por penas restritivas de direitos, em virtude da reincidência do réu, da quantidade de pena aplicada e do regime inicial de pena decretado. Foi aplicada a pena acessória de inabilitação para dirigir veículo automotor pelo tempo da pena corporal imposta, com fundamento no artigo 92, III, do Código Penal. O réu foi ABSOLVIDO da prática do delito de moeda falsa (artigo 289 do Código Penal), com fulcro no artigo 386, V, do Código de Processo Penal. O Parquet Federal apresentou manifestação (ID 309021695) na qual declinou as razões pelas quais não ofertou o Acordo de Não Persecução Penal em relação ao réu, de modo que resta preenchida a determinação exarada no HC 185913/DF, julgado pelo Plenário do C. Supremo Tribunal Federal. O Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face de JADSON FERNANDO DA FONSECA, na forma seguinte (ID 309021695): “No dia 18/06/2020, por volta das 14h30min, no município de Naviraí/MS, JADSON FERNANDO DA FONSECA, dolosamente, manteve em depósito e utilizou, em proveito próprio e alheio, no exercício de atividade comercial, mercadoria proibida pela lei brasileira, consistente em, aproximadamente, 11.700 (onze mil e setecentos mil) maços de cigarros de origem estrangeira, das marcas "Eight", "Palermo", "San Marino" e "Mill", cuja importação e comercialização são proibidas no Brasil. Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, JADSON FERNANDO DA FONSECA, de forma consciente e voluntária, guardou moeda falsa - consistente em 01 (uma) nota falsa de R$ 20,00 (vinte reais). Na data dos fatos, uma equipe de policiais rodoviários federais recebeu a informação de que um veículo Fiat Palio, de cor branca, placas aparentes NRW-5284, estaria transportando cigarros contrabandeados, de Itaquiraí/MS para Naviraí/MS. Diante dessa informação, foram realizadas diligências na Avenida Amélia Fukuda, no município de Naviraí/MS e, por volta das 14h30min, os policiais avistaram um veículo com as características informadas, trafegando em alta velocidade e vidros cobertos por película escura para dificultar a visualização de seu interior. A equipe realizou acompanhamento tático até a residência situada na Rua Bromélia, nº 383, no bairro Portal Residence, em Naviraí/MS. No local, os policiais observaram que um indivíduo descarregava pacotes de cigarros. Ao notar a chegada dos policiais, esse indivíduo adentrou a residência. No momento dos fatos, também chegou ao local Cesar Alves Rocha Souza que, ao ser questionado pelos policiais, informou que estava ali para adquirir alguns cigarros de JADSON FERNANDO DA FONSECA. Diante da situação de flagrância, os policiais adentraram a residência; contudo, seu ocupante pulou o muro dos fundos do imóvel e evadiu-se sem que a equipe conseguisse capturá-lo. No interior da casa, os policiais encontraram fotografias do evadido; 1 (um) revólver calibre .38 da marca Taurus, municiado com 6 (seis) cartuchos; 4 (quatro) munições; cigarros de origem paraguaia; R$ 5.645,00 (cinco mil, seiscentos e quarenta e cinco reais) em espécie; 11 (onze) CRLVs - Certificados de Registro e Licenciamento de Veículo; e uma carteira contendo os documentos pessoais de JADSON FERNANDO DA FONSECA e Vanessa Sampaio de Araújo. Por meio dos documentos e das fotografias, foi possível identificar que JADSON é o indivíduo que se evadiu da residência. (...) Perante a autoridade policial, JADSON FERNANDO DA FONSECA confirmou residir na Rua Bromélia, nº 383, no bairro Portal Residence e que era proprietário dos cigarros, das armas e das munições apreendidas”. Diante disso, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ofereceu denúncia em face de JADSON FERNANDO DA FONSECA, como incurso nas penas dos artigos 334-A, §1º, IV, c.c artigo 289, ambos do Código Penal, em concurso material. A denúncia foi recebida em 18 de julho de 2022 (ID 309021700). A r. sentença foi prolatada em 30 de agosto de 2024 (ID 309021968). A i. defesa interpôs recurso de Apelação (ID 309021970). O recurso foi recebido (ID 309021971). A i. defesa apresentou as razões do recurso de apelação (ID 309021973), nas quais, preliminarmente, alegou a nulidade do feito em razão da ilicitude da prova obtida por meio de busca domiciliar realizada sem a devida autorização judicial. Argumentou-se, ademais, que a fase investigativa fundamentou-se exclusivamente no Boletim de Ocorrência, sem que houvesse qualquer aprofundamento investigativo, considerando-se que, embora seis policiais rodoviários federais tenham participado da apreensão, nenhum deles foi ouvido na fase inquisitorial. A i. defesa também ressaltou que o ingresso dos agentes na residência ocorreu com base unicamente em denúncia anônima acerca do transporte de cigarros contrabandeados em determinado veículo, sem qualquer averiguação prévia sobre a pessoa do acusado ou a respeito do imóvel em questão, configurando, assim, a ausência de fundadas razões para a medida. Além disso, sustentou-se que, ainda que o crime de contrabando se configure como delito permanente e seu estado de flagrância se prolongue no tempo, tal circunstância não é, por si só, suficiente para justificar a busca domiciliar nos moldes em que foi conduzida. A i. defesa pontuou, ainda, que, em sede judicial, foram ouvidos dois policiais rodoviários federais, cujos depoimentos corroboraram a informação de que a ação se deu com base em denúncia anônima, mas apresentaram incongruências e omissões, o que compromete sua credibilidade, especialmente diante do interesse direto dos agentes em justificar suas ações. Observou-se, também, que a denúncia anônima fazia referência ao veículo, e não à residência, sendo que os policiais limitaram-se a acompanhar o automóvel de forma tática até o imóvel do réu, sem qualquer abordagem prévia, circunstâncias que não configuram fundada suspeita apta a embasar a busca e apreensão domiciliar. Dessa forma, a situação de flagrância constatada posteriormente decorreu exclusivamente do ingresso ilícito na residência de JADSON, em violação ao direito fundamental à inviolabilidade domiciliar. Subsidiariamente, requereu-se o redimensionamento da pena, com base nos seguintes fundamentos: (i) a condenação anterior que ensejou a valoração negativa do vetor "maus antecedentes" decorre da prática do delito previsto no artigo 310 do Código Penal, c.c o artigo 34 da Lei de Contravenções Penais, cuja pena privativa de liberdade foi de apenas 15 (quinze) dias de detenção, substituída por multa, razão pela qual não configura reincidência, tratando-se de pena de prisão simples. Além disso, transcorreram mais de cinco anos desde o cumprimento da pena, sendo certo que JADSON, atualmente, ostenta a condição de réu primário; (ii) a fundamentação que resultou na valoração negativa do vetor "circunstâncias do crime" deve ser afastada, pois a conduta de manter em depósito os cigarros é inerente ao delito de contrabando, não havendo justificativa para a majoração da pena com base nesse critério. Ademais, considerando-se a expressiva quantidade de 11.700 (onze mil e setecentos) maços de cigarros transportados, era natural que a logística do delito demandasse a utilização de um veículo, sendo a capacidade do automóvel ou do local de armazenamento um fator circunstancial e inerente à própria prática delitiva; (iii) a aplicação das frações de exasperação da pena-base deve obedecer ao critério de 1/8 para cada circunstância judicial negativa, em observância ao princípio da proporcionalidade e ao senso de justiça. No que tange ao regime inicial de cumprimento da pena, pugnou-se por sua fixação no regime aberto, tendo em vista que o réu é primário, a pena imposta não supera quatro anos de reclusão e a maioria das circunstâncias judiciais lhe são favoráveis. Em relação à quantia apreendida, a i. defesa sustentou que os R$ 5.625,00 (cinco mil, seiscentos e vinte e cinco reais) encontrados na residência do réu e posteriormente declarados perdidos em favor da União foram obtidos mediante violação da inviolabilidade domiciliar, sem a devida justa causa. Adicionalmente, alegou-se que, em 20 de fevereiro de 2023, JADSON foi diagnosticado com Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (HIV), necessitando, desde então, submeter-se a diversos procedimentos médicos. Diante disso, requereu-se a devolução do montante, uma vez que o valor pertencia ao réu e à sua esposa, sendo utilizado para o custeio de despesas familiares e tratamentos de saúde. Com a apresentação das contrarrazões pela acusação (ID 309021977), subiram os autos a esta E. Corte. Nesta instância, a douta Procuradoria Regional da República apresentou parecer (ID 309288774), no qual manifestou-se pelo desprovimento do recurso defensivo. É o relatório. À revisão, nos termos regimentais. PODER JUDICIÁRIO Tribunal Regional Federal da 3ª Região 11ª Turma APELAÇÃO CRIMINAL (417) Nº 5000446-19.2020.4.03.6006 RELATOR: Gab. 38 - DES. FED. FAUSTO DE SANCTIS APELANTE: JADSON FERNANDO DA FONSECA Advogado do(a) APELANTE: PAULO CESAR MARTINS - MS14622-A APELADO: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL NO ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS: O réu JADSON FERNANDO DA FONSECA foi condenado em primeiro grau pela prática do crime previsto no artigo 334-A, §1º, IV, do Código Penal, in verbis: Contrabando Art. 334-A. Importar ou exportar mercadoria proibida: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos. § 1º Incorre na mesma pena quem: IV - vende, expõe à venda, mantém em depósito ou, de qualquer forma, utiliza em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria proibida pela lei brasileira; Após a devida instrução probatória, sobreveio a r. sentença condenatória, contra a qual se insurge a i. defesa, aduzindo, em síntese, que: (i) a busca domiciliar foi realizada sem a existência de fundada suspeita, razão pela qual as provas obtidas em decorrência dessa diligência são nulas por derivação; (ii) subsidiariamente, a pena-base não poderia ter sido exasperada sob o argumento de "antecedentes", tendo em vista que o réu é primário, além de que os fundamentos utilizados para valorar negativamente as "circunstâncias do crime" carecem de idoneidade; (iii) as frações de aumento aplicadas na respeitável decisão violam o princípio da proporcionalidade e o senso de justiça; (iv) o regime inicial de cumprimento da pena deve ser o aberto, uma vez que a maioria das circunstâncias judiciais é favorável ao réu, que é primário, além de a pena imposta ser inferior a quatro anos; e, por fim, (v) o valor declarado perdido em favor da União deve ser restituído ao acusado, uma vez que sua origem é lícita e que os recursos eram utilizados para o custeio de despesas domésticas e para tratamentos de saúde, especialmente em razão de o réu ser portador do vírus HIV. DA INEXISTÊNCIA DE NULIDADE DA BUSCA DOMICILIAR O Boletim de Ocorrência relata que, em 18 de junho de 2020, uma equipe da Polícia Rodoviária Federal recebeu uma denúncia anônima, por meio do telefone 191, informando que um veículo Fiat/Palio de cor branca, com placas não especificadas, deslocava-se de Itaquiraí/MS com destino a Naviraí/MS, transportando cigarros contrabandeados do Paraguai. Diante da denúncia, foram iniciadas diligências na região da Avenida Amélia Fukuda, via de acesso à Rodovia BR-163, que conduz a Itaquiraí/MS. Por volta das 14h30min, os agentes avistaram o automóvel mencionado, que trafegava em alta velocidade e possuía vidros cobertos por película escura. A equipe da PRF, utilizando uma viatura descaracterizada, passou a acompanhar o veículo e observou o momento em que este adentrou a garagem de uma residência situada na Rua Bromélia, número 383, no bairro Portal Residence, em Naviraí/MS. Pouco depois, os policiais procederam à abordagem e, ao se aproximarem da residência do suspeito, notaram um indivíduo descarregando pacotes que aparentavam conter cigarros. Ao perceber a presença da equipe policial, o homem identificado como JADSON imediatamente ingressou na residência. O veículo, que permanecia estacionado defronte ao imóvel, encontrava-se carregado com cigarros, o que motivou os agentes a ingressarem na casa. No momento em que os policiais entraram no local, JADSON empreendeu fuga, pulando o muro dos fundos da propriedade. Concomitantemente à chegada dos agentes, aproximou-se do local Cesar Alves Rocha Souza, o qual, ao ser questionado, declarou estar ali para adquirir cigarros de JADSON, os quais revendia em seu estabelecimento comercial. No interior da residência, os policiais localizaram documentos pertencentes a JADSON, corroborando a suspeita de que ele era o morador, além da quantia de R$ 5.645,00 (cinco mil, seiscentos e quarenta e cinco reais) em espécie, uma arma de fogo da marca Taurus, calibre .38, municiada com seis cartuchos, além de outros quatro cartuchos intactos, e um volume adicional de cigarros de origem estrangeira. Ademais, em frente à casa, foi identificado outro veículo, um Fiat/Uno de cor azul, com placas DWR-6487, o qual se encontrava destravado. Em seu interior, havia diversas pedras dispostas no bagageiro, um método frequentemente utilizado por criminosos para modificar a suspensão do automóvel e evitar suspeitas. No total, foram apreendidas 20 (vinte) caixas de cigarros. Diante do cenário apresentado, verifica-se que o réu transportou itens contrabandeados, os quais mantinha em depósito a fim de comercializá-los. A conduta consistente na prática de contrabando na modalidade “ter em depósito” evidencia permanência e sua consumação se protrai no tempo, de modo que se entende o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência (inteligência do artigo 303 do CPP). Nessa ordem de ideias, não há que se falar em afronta à inviolabilidade domiciliar, posto que o próprio texto constitucional alberga a possibilidade de relativização da garantia em casos de flagrante delito (“XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial)”. A propósito: “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. INVIOLABILIDADE DE DOMICÍLIO: INC. XI DO ART. 5º DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. BUSCA E APREENSÃO DOMICILIAR SEM MANDADO JUDICIAL EM CASO DE CRIME PERMANENTE. POSSIBILIDADE. TEMA 280 DA REPERCUSSÃO GERAL. AFRONTA À INVIOLABILIDADE DE DOMICÍLIO NÃO EVIDENCIADA. PRECEDENTES. RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO”. (STF, RE 1448725 AgR/RN, Rel. Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma, j. em 09.10.2023, DJe 11.10.2023 - grifo nosso). “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. DESRESPEITO DA INVIOLABILIDADE DE DOMICÍLIO: INOCORRÊNCIA. FLAGRANTE: FUNDADAS RAZÕES PARA INGRESSO DOS POLICIAIS. 1. Demonstradas fundadas razões a indicar a ocorrência de situação de flagrante em domicílio, não surge desrespeitada a inviolabilidade domiciliar. 2. O crime de tráfico de drogas, na modalidade “ter em depósito”, possui natureza permanente, prolongando-se no tempo o estado flagrancial. 3. A urgência é ínsita ao estado flagrancial, situação que autoriza a invasão domiciliar, em qualquer horário e sem autorização judicial — CFRB, art. 5º, inc. XI. 4. Agravo regimental a que se nega provimento”. (STF, RHC 213142 AgR/PR, Rel. Min. André Mendonça, Segunda Turma, j. em 05.12.2022, DJe 10.01.2023 - grifo nosso). "AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. RAZÕES PARA INGRESSO EM DOMICÍLIO. CRIME DE NATUREZA PERMANENTE. NECESSIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO PROBATÓRIO. VIA INADEQUADA. I. CASO EM EXAME 1. Paciente condenado a (a) 5 anos de reclusão, em regime fechado, pela prática do crime de tráfico de drogas (art. 33 da Lei 11.343/2006); e (b) 1 mês de detenção, em regime semiaberto, pelo cometimento do delito de posse irregular de arma de fogo (art. 12 da Lei 10.826/03). II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Alega-se ilicitude da prova, em razão da inviolabilidade domiciliar. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A CONSTITUIÇÃO FEDERAL dispõe que a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, ainda, durante o dia, por determinação judicial. Estabelece, portanto, hipóteses possíveis de violabilidade domiciliar, para que a “casa” não se transforme em garantia de impunidade de crimes, que em seu interior se pratiquem ou se pretendam ocultar. 4. Em se tratando de delito de tráfico de drogas praticado, em tese, na modalidade "ter em depósito", a consumação se prolonga no tempo e, enquanto configurada essa situação, a flagrância permite a busca domiciliar, independentemente da expedição de mandado judicial, desde que presentes fundadas razões de que em seu interior ocorre a prática de crime, como ocorreu na hipótese (RE 603616, Rel. Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, DJe de 10/5/2016). A justa causa, nesse contexto, não exige a certeza da ocorrência de delito, mas, sim, fundadas razões a respeito (HC 169788, Relator(a): EDSON FACHIN, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, DJe de 6/5/2024). 5. Qualquer conclusão desta SUPREMA CORTE em sentido contrário, notadamente no que concerne à alegada ausência de fundadas razões para proceder à busca domiciliar, demandaria minuciosa reanálise das questões fáticas suscitadas pela defesa, providência incompatível por esta via processual. IV. DISPOSITIVO 6. Agravo Regimental a que se nega provimento”. (STF, HC 248731 AgR/SP, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Primeira Turma, j. em 16.12.2024, DJe 19.12.2024 - grifo nosso). Diante dos elementos apresentados, resta evidente a inexistência de nulidade na busca domiciliar realizada no endereço indicado. A conduta investigada diz respeito ao crime de contrabando, na modalidade "ter em depósito", cuja natureza é permanente, de modo que o estado de flagrância perdura enquanto a situação ilícita se mantiver. Conforme entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal, a inviolabilidade do domicílio prevista no artigo 5º, inciso XI, da Constituição Federal pode ser relativizada em situações de flagrante delito, especialmente em crimes de caráter permanente. No caso concreto, as diligências policiais foram motivadas por fundadas razões, derivadas de atitude suspeita empreendida pelo acusado, consistente no tráfego, em alta velocidade, com os vidros escuros, o qual deu vazão ao acompanhamento tático pelos policiais rodoviários federais, que, por sua vez, culminou na constatação de que o veículo estava abarrotado de cigarros de procedência estrangeira, bem como de que JADSON comercializava os itens, uma vez que foi possível verificar a chegada de uma testemunha afirmando que comprava cigarros no local para posterior revenda em seu comércio. Os precedentes do STF reforçam a legalidade da medida adotada, destacando que, em crimes na modalidade "ter em depósito", a flagrância justifica o ingresso na residência sem mandado judicial. No presente caso, a apreensão de grande quantidade de cigarros contrabandeados dentro do imóvel e do veículo estacionado em frente à residência do acusado confirmam a existência da prática delitiva em curso, legitimando a atuação policial. Portanto, não há que se falar em nulidade da busca domiciliar, pois a diligência foi amparada em justa causa e em conformidade com os ditames constitucionais e jurisprudenciais. O entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal corrobora a legalidade da atuação policial, afastando qualquer violação à garantia da inviolabilidade do domicílio, já que o crime permanente autoriza a excepcionalidade prevista na Constituição. Os argumentos que questionam a credibilidade dos depoimentos prestados pelos policiais, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, alegando contradições e a tentativa de justificar suas ações, não merecem acolhimento. Os atos praticados pelos policiais rodoviários federais, enquanto agentes públicos no exercício de suas funções, possuem como atributos a presunção de veracidade (fé pública) e de legitimidade (conformidade com a lei). Embora tal presunção seja relativa, não foi afastada pela ilustre defesa ao longo da instrução processual. Cumpre ressaltar, ainda, que as testemunhas, antes de prestarem suas declarações em Juízo, são devidamente advertidas, nos termos dos artigos 203 e 210 do Código de Processo Penal, acerca do compromisso de dizer a verdade, sob pena de incorrerem no crime de falso testemunho. Assim, salvo se a ilustre defesa apresentar nos autos provas concretas que evidenciem a prática desse delito por parte dos policiais, seus depoimentos devem ser considerados verídicos. Em vista do exposto, não há que se falar na nulidade das provas obtidas em tal diligência. DA AUTORIA E MATERIALIDADE Ressalte-se que não houve impugnação quanto à materialidade e autoria do aludido delito praticado por JADSON FERNANDO DA FONSECA, pelo que incontroversas. Não se verifica, tampouco, a existência de qualquer ilegalidade a ser corrigida de ofício por este E. Tribunal Regional Federal. DA DOSIMETRIA DA PENA Procede-se à análise das teses aventadas pela i. defesa, bem como, de ofício, à revisão da dosimetria da pena, a fim de verificar-se a existência de quaisquer ilegalidades a serem corrigidas de ofício por este E. Tribunal Regional Federal. Da primeira fase Nesta etapa do processo dosimétrico, o r. juízo apreciou as circunstâncias judiciais do seguinte modo na r. sentença: “Na primeira fase de aplicação da pena, da análise das circunstâncias judiciais previstas no art. 59, caput, do Código Penal, infere-se que: a) quanto à culpabilidade, o grau de reprovabilidade e o dolo apresentam-se normais à espécie; b) quanto à circunstância maus antecedentes, observa-se que o réu ostenta contra si condenação nos autos 0005826-27.2011.8.12.0029, transitada em julgado em 19.09.2011 pela prática do crime previsto no artigo 310 do Código Penal (ID 259928060), de sorte que essa vetorial deve ser valorada negativamente; c) não há elementos que permitam analisar a conduta social e a personalidade do réu; d) os motivos do crime foram o lucro fácil, o que é ínsito ao tipo penal em análise; e) as circunstâncias do crime extrapolam as comuns à espécie, pois o acusado, guardou em depósito com finalidade comercial, o montante expressivo de 11.700 (onze mil e setecentos) maços de cigarros contrabandeados; f) as consequências do crime não foram consideráveis, em razão da apreensão da mercadoria; g) nada a ponderar a respeito do comportamento da vítima. Diante desse quadro, para a necessária e suficiente reprovação e prevenção do crime, sopesando negativamente as vetoriais maus antecedentes e circunstâncias do crime (quantidade de cigarros apreendidos), fixo a pena-base acima do mínimo legal, vale dizer, em 3 (três) anos de reclusão”. Do excerto acima colacionado, denota-se que o r. juízo valorou negativamente o vetor “antecedentes”, considerando que o réu possui contra si condenação transitada em julgado em 19.09.2011 pela prática do delito previsto no artigo 310 do Código Penal. Tal proceder é albergado pela jurisprudência, uma vez que o vetor dos antecedentes é o que se refere única e exclusivamente ao histórico criminal do agente. Com efeito, “o conceito de maus antecedentes, por ser mais amplo do que o da reincidência, abrange as condenações definitivas, por fato anterior ao delito, transitadas em julgado no curso da ação penal e as atingidas pelo período depurador, ressalvada casuística constatação de grande período de tempo ou pequena gravidade do fato prévio" (STJ, AgRg no AREsp 924.174/DF, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 06.12.2016, DJe 16.12.2016 - grifo nosso). A propósito, o Supremo Tribunal Federal, no bojo do julgamento do RE 593818/SC, de relatoria do Min. Roberto Barroso, fixou tese no sentido de que “não se aplica para o reconhecimento dos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição da reincidência, previsto no art. 64, I, do Código Penal” (Tema 150 da Repercussão Geral). Assim, “apesar de desaparecer a condição de reincidente, o agente não readquire a condição de primário, que é como um estado de virgem, que, violado, não se refaz. A reincidência é como o pecado original: desaparece, mas deixa sua mancha, servindo, por exemplo, como antecedente criminal (art. 59, caput)” (BITENCOURT, Cezar Roberto. Código Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 238). Assim, não há que se falar em qualquer mácula no procedimento adotado pelo r. juízo a esse respeito. Adiante, constata-se a negativação do vetor “circunstâncias do crime”, sob o fundamento de que a quantidade de cigarros era expressiva (11.700 maços de cigarros). Igualmente, não há que se falar na reforma do r. decisum quanto a este ponto, considerando-se que a introdução irregular de cigarros de origem estrangeira no mercado interno, tem o condão de gerar malefícios conhecidos à saúde, ostentando um elevado potencial de disseminação no comércio popular, apto a atingir um número indeterminado de consumidores, em sua grande maioria de baixa renda e sem acesso à informação a respeito da origem e prejudicialidade da mercadoria que consomem. Nesta linha intelectiva, a quantidade de cigarros, por se tratar de aspecto acidental que não constitui elemento normativo do tipo, é fator que pode – e deve – influenciar no processo dosimétrico. A propósito: “APELAÇÃO CRIMINAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CONTRABANDO DE CIGARROS. UTILIZAÇÃO DE RÁDIOS TRANSCEPTORES. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. RECURSO PARCIALMENTE PREJUDICADO. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE FAVORECIMENTO REAL OU DESCAMINHO. IMPOSSIBILIDADE. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO INCONTROVERSOS. DOSIMETRIA. VALORAÇÃO NEGATIVA DAS CIRCUNSTÂNCIAS E CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. CONFISSÃO ESPONTÂNEA DE ALGUNS RÉUS. REGIME ABERTO. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. REDUÇÃO DA PENA DE PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA. APELAÇÕES DEFESIVAS PARCIALMENTE PROVIDAS. (...) 7. Na primeira fase da dosimetria de todos os réus, resta mantida a valoração negativa das circunstâncias e consequências do crime. O caso dos autos deveras configura situação que justifica a valoração negativa das circunstâncias do crime, uma vez que vários agentes concorreram para a prática delitiva, atuando com divisão de tarefas, auxílio de batedor, e valendo-se de rádios transceptores para realizar a comunicação entre eles, além de haver planejamento acerca dos itinerários e da forma de distribuição da carga entre os veículos utilizados. Soma-se a isto que a excessiva quantidade de cigarros apreendidos constitui fator apto a elevar a pena-base. (...)”. (TRF3, Apelação Criminal nº 0001967-98.2017.4.03.6003, Des. Fed. Rel. José Marcos Lunardelli, j. em 07.06.2024, DJEN 12.06.2024 - grifo nosso). “PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CONTRABANDO. FATO ASSIMILADO. TRANSPORTE DE CIGARROS ESTRANGEIROS. DECRETO-LEI 399/68. DESENVOLVIMENTO DE ATIVIDADE CLANDESTINA DE TELECOMUNICAÇÃO. RÁDIO COMUNICADOR. RESISTÊNCIA. MATERIALIDADE. AUTORIA. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. CONCURSO MATERIAL.(...) 5. A quantidade cigarros apreendida justifica a exasperação da pena-base. Precedentes. (...)”. (TRF 3ª Região, Apelação Criminal nº 0000860-19.2017.4.03.6003, Rel. Desembargador Federal Nino Oliveira Toldo, 11ª Turma, julgado em 12.11.2021, Intimação via sistema DATA: 18.11.2021 - grifo nosso). “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CONTRABANDO. DOSIMETRIA. PENA-BASE. CIRCUNSTÂNCIAS DO DELITO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Nos termos da orientação jurisprudencial desta Corte, "na análise das circunstâncias do crime, é imperioso ao julgador apreciar, com base em fatos concretos, o lugar do crime, o tempo de sua duração, a atitude assumida pelo agente no decorrer da consumação da infração penal, a mecânica delitiva empregada, entre outros elementos indicativos de uma maior censurabilidade da conduta" (HC n. 751.984/RJ, relator Ministro Antônio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 22/11/2022, DJe de 29/11/2022). 2. No caso, o modus operandi do delito - "a preparação do veículo, conforme registrado no Laudo de Perícia Criminal Federal (Veículos) [...] foram retirados os bancos intermediário e traseiros, as forrações do assoalho e laterais da parte traseira, incluindo das portas, bem como as chapas de aço internas das portas traseiras, de modo a aumentar consideravelmente a capacidade de carga" -, pode ser considerada para o agravamento da pena-base, pois não constitui circunstância inerente ao tipo penal de contrabando. 3. Do mesmo modo, "válida para os crimes de contrabando, a valoração negativa das circunstâncias [...] com apoio na quantidade de cigarros contrabandeado, sendo o desvalor das consequências alicerçado no significativo valor dos tributos elididos" (AgRg no AgRg no AREsp n. 2.283.166/PR, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 6/6/2023, DJe de 15/6/2023.). 4. Agravo regimental desprovido”. (STJ, AgRg no AREsp 2580778/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. em 04.06.2024, DJe 10.06.2024 - grifo nosso). “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. CONTRABANDO. DOSIMETRIA. PENA-BASE FIXADA COM BASE NAS CIRCUNSTÂNCIAS CONCRETAS DO DELITO. QUANTIDADE DE CIGARROS APREENDIDOS. TEMPO DE SUSPENSÃO DO DIREITO DE DIRIGIR. ADEQUAÇÃO ÀS PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A pena-base restou exasperada com fundamento na quantidade de cigarros apreendidos no crime de contrabando. Tal posicionamento está em consonância com a jurisprudência desta Corte. 2. Quanto à suspensão do direito de dirigir, destaca-se que "[...] a norma não estabelece os critérios a fim de fixar o lapso com objetivo de suspender a habilitação para dirigir, devendo o juiz estabelecer o prazo de duração da medida considerando as peculiaridades do caso concreto" (AgRg no AREsp n. 1.709.618/DF, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe de 16/11/2020). No caso, tendo sido utilizado veículo automotor para a prática do delito, não se mostra desproporcional o estabelecimento da suspenção do direito de dirigir pelo mesmo período da pena privativa de liberdade como efeito da condenação. 3. Agravo regimental desprovido”. (STJ, AgRg no HC 773990/SP, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, j. em 26.06.2023, DJe 29.06.2023 - grifo nosso). Dando-se seguimento à análise das razões recursais, apesar de respeitável a tese aventada pela douta defesa do corréu, não lhe assiste razão, uma vez que a fração de aumento da pena-base não está vinculada a limites fixos (1/6 ou 1/8), sendo suficiente a motivação concreta, conforme jurisprudência consolidada do STJ. “DIREITO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. DOSIMETRIA DA PENA. QUANTIDADE E NATUREZA DA DROGA. FUNDAMENTO VÁLIDO. AGRAVO DESPROVIDO. I. Caso em exame1. Agravo regimental interposto contra decisão que não conheceu do habeas corpus, no qual se questiona o aumento da pena-base em 3 anos de reclusão acima do mínimo legal, em razão da quantidade e natureza da droga apreendida. II. Questão em discussão2. A questão em discussão consiste em saber se a quantidade e a natureza da droga apreendida justificam o aumento da pena-base em 3 anos acima do mínimo legal, conforme estabelecido pelo Tribunal de origem. III. Razões de decidir3. A individualização da pena é vinculada a parâmetros legais, permitindo ao julgador discricionariedade na escolha da sanção penal, desde que motivada e proporcional. 4. A quantidade e a natureza da droga são circunstâncias preponderantes na dosimetria da pena, conforme o art. 42 da Lei de Drogas, justificando a fixação da pena-base acima do mínimo legal. 5. A jurisprudência admite a utilização de frações de aumento, como 1/8 ou 1/6, mas não as torna obrigatórias, desde que o critério utilizado seja proporcional e fundamentado. IV. Dispositivo e tese6. Agravo regimental desprovido. Tese de julgamento: "1. A quantidade e a natureza da droga apreendida são circunstâncias preponderantes que justificam a fixação da pena-base acima do mínimo legal. 2. A dosimetria da pena deve ser proporcional e fundamentada, sem obrigatoriedade de frações específicas de aumento” (STJ, AgRg no HC 954020/RS, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, j. em 19.02.2025, DJe 25.02.2025 - grifo nosso). “DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. DOSIMETRIA. PENA-BASE FIXADA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CULPABILIDADE E GRANDE QUANTIDADE DE DROGA (282,9KG DE COCAÍNA). FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. PLEITO DE APLICAÇÃO DA MINORANTE DO TRÁFICO PRIVILEGIADO. IMPOSSIBILIDADE. REINCIDÊNCIA. VEDAÇÃO LEGAL. PENA DE MULTA. PROPORCIONALIDADE OBSERVADA. ILEGALIDADE INEXISTENTE. PRETENDIDO ABRANDAMENTO DO REGIME PRISIONAL. IMPOSSIBILIDADE. PENA SUPERIOR A 8 ANOS, RÉU REINCIDENTE, PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Recurso especial interposto por FÁBIO JÚNIOR CORREIA DE SOUZA contra acórdão que negou provimento à apelação defensiva, mantendo a condenação por tráfico de drogas, a pena-base fixada acima do mínimo legal, a negativa da minorante do tráfico privilegiado, o regime inicial fechado e a pena de multa proporcional à condenação. Sustenta violação dos arts. 59 e 60 do Código Penal e 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, além de dissídio jurisprudencial. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há três questões em discussão: (i) a legalidade da exasperação da pena-base pela culpabilidade e pela expressiva quantidade e natureza da droga apreendida no patamar de 5 anos; (ii) o afastamento da minorante do tráfico privilegiado em razão da reincidência do réu; e (iii) a proporcionalidade na fixação da pena de multa e do regime inicial de cumprimento de pena. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A pena-base foi exasperada em 5 anos, com fundamento na culpabilidade e na natureza altamente nociva (cocaína) e na quantidade expressiva da droga apreendida (282,9kg), em conformidade com o art. 42 da Lei n. 11.343/2006, que atribui preponderância a esses fatores. A fundamentação apresentada pelo juízo de origem é idônea e está em consonância com a jurisprudência do STJ, que admite a majoração em maior grau da pena-base em casos de grande quantidade de entorpecentes. 4. A fração de aumento da pena-base não está vinculada a limites fixos (1/6 ou 1/8), sendo suficiente a motivação concreta, conforme jurisprudência consolidada do STJ. 5. O afastamento da minorante do tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006) foi devidamente fundamentado, em razão da reincidência do réu, diante da vedação legal da aplicação do benefício a réus reincidentes. 6. A pena de multa foi fixada no patamar mínimo legal (1/30 do salário mínimo vigente à época), proporcional à pena privativa de liberdade, com observância das condições econômicas do réu e da metodologia bifásica para sua aplicação. Não há desproporcionalidade. 7. Mantida a pena definitiva superior a 8 anos, é inviável o abrandamento do regime inicial de cumprimento de pena (regime fechado), nos termos dos arts. 33, § 2º, "a", e 59 do CP, inclusive por se tratar de réu reincidente, cuja pena-base foi fixada acima do mínimo legal. IV. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO” (STJ, REsp 2040506/MT, Rel. Min. Daniela Teixeira, Quinta Turma, j. em 18.02.2025, DJe 25.02.2025 - grifo nosso). “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ROUBO MAJORADO. PRECLUSÃO DOS CAPÍTULOS DA DECISÃO MONOCRÁTICA NÃO IMPUGNADOS. PENA-BASE. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. CONCURSO DE AGENTES. FUNDAMENTAÇÃO VÁLIDA. FRAÇÃO DE AUMENTO PROPORCIONAL. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A impugnação, no regimental, de apenas alguns capítulos da decisão agravada, induz à preclusão das demais matérias decididas pelo relator, não refutadas pela parte. 2. Admite-se o deslocamento da causa de aumento relativa ao concurso de agentes para ser sopesada na primeira fase da dosimetria, como na espécie. Precedentes. 3. A discricionariedade judicial motivada na dosimetria da pena é reconhecida por esta Corte. Não existe direito subjetivo a critério rígido ou puramente matemático para a exasperação da pena-base. Em regra, afasta-se a tese de desproporcionalidade em casos de aplicação de frações de 1/6 sobre a pena mínima ou de 1/8 sobre o intervalo entre os limites mínimo e máximo do tipo, admitido outro critério mais severo, desde que devidamente justificado. Precedentes. 4. A instância antecedente atuou dentro da sua discricionariedade e adotou, fundamentadamente, fração que entendeu proporcional e adequada para o aumento da pena-base - 1/8 sobre a pena mínima, em virtude do concurso de agentes, enquadrado nas circunstâncias do crime. 5. Agravo regimental não provido” (STJ, AgRg no AREsp 2799599/RO, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, j. em 11.02.2025, DJe 21.02.2025 - grifo nosso). Com efeito, a discricionariedade judicial motivada na dosimetria da pena é reconhecida pelo C. Superior Tribunal de Justiça. Não existe direito subjetivo a critério rígido ou puramente matemático para a exasperação da pena-base. Em regra, afasta-se a tese de desproporcionalidade em casos de aplicação de frações de 1/6 sobre a pena mínima ou de 1/8 sobre o intervalo entre os limites mínimo e máximo do tipo, admitido outro critério mais severo, desde que devidamente justificado. No presente caso, reconhece-se a pertinência da fundamentação apresentada pelo eminente juízo, tendo em vista que a pena-base do réu foi fixada em três anos de reclusão, em razão da valoração negativa de duas circunstâncias judiciais. Dessa forma, a r. sentença revela-se irretocável também nesse aspecto, não havendo justificativa para sua reforma. Da segunda fase Nesta etapa, o r. juízo reconheceu a circunstância agravante da reincidência (artigo 61, I, do Código Penal) e, em seguida, fez incidir a circunstância atenuante da confissão (artigo 65, III, d, do Código Penal), adequadamente compensando-as por serem igualmente preponderantes, de maneira que a pena-intermediária permaneceu estipulada em 03 (três) anos de reclusão. Da terceira fase À míngua de causas de aumento ou de diminuição, a pena privativa de liberdade restou definitivamente estabelecida no patamar de 03 (três) anos de reclusão. DO REGIME INICIAL O r. juízo fixou o regime inicial de cumprimento de pena no semiaberto, sob o argumento de que o réu e reincidente. Em face disto, insurge-se a i. defesa argumentando que o réu é primário; que a pena não supera 04 (quatro) anos de reclusão, bem como que a maioria das circunstâncias judiciais militam a favor do réu. Procede-se à análise das razões recursais. O tema afeto à fixação do regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade encontra-se disciplinado pelo art. 33 do Código Penal, que possui a seguinte redação: Art. 33. A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado. § 1º. Considera-se: a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média; b) regime semi-aberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar; c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado. § 2º. As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado; b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto; c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto. § 3º. A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código. § 4º. O condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais. Sem prejuízo da disciplina legal anteriormente retratada, nossos C. Tribunais Superiores tiveram a oportunidade de se debruçar sobre o tema. Nesse diapasão, o C. Superior Tribunal de Justiça editou o Enunciado nº 269 no sentido de ser lícita a imposição de regime inicial SEMIABERTO ao acusado reincidente condenado a pena igual ou inferior a 04 anos ainda que favoráveis as circunstâncias do art. 59 do Código Penal (É admissível a adoção do regime prisional semi-aberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a quatro anos se favoráveis as circunstâncias judiciais). Assim, acaso não houvesse o aludido enunciado jurisprudencial, seria o caso de aplicar-se, de acordo com o Código Penal, o início do resgate prisional no regime fechado (artigo 33, §2º, alínea b e c, do Código Penal). Nessa linha, percebe-se a adequação da argumentação apresentada pelo magistrado para que prevaleça o entendimento consolidado na Súmula 269 do STJ. Isso porque o réu foi condenado a uma pena de 3 (três) anos de reclusão, o que, em tese, permitiria o início do cumprimento da pena em regime aberto. No entanto, há nos autos comprovação de sua reincidência, o que indica que o regime adequado é o SEMIABERTO, uma vez que a situação do caso se enquadra exatamente no entendimento firmado pela súmula mencionada. DA SUBSTITUIÇÃO DA PENA A reprimenda corporal não foi substituída por penas restritivas de direitos, sob o fundamento de que JADSON é reincidente em crime doloso (artigo 44, II, do Código Penal). DA IMPOSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES APREENDIDOS O r. juízo decretou o perdimento, em favor da União, do montante de R$ 5.625,00 (cinco mil, seiscentos e vinte e cinco reais), sob o fundamento de que não restou comprovado, nos autos, a origem lícita de tais valores, sendo certo que o acervo probatório indicaria a origem espúria da quantia, dada a comercialização de cigarros contrabandeados pelo acusado. A i. defesa pontua que, em 20 de fevereiro de 2023, JADSON foi diagnosticado com Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (HIV), necessitando, desde então, submeter-se a diversos procedimentos médicos. Diante disso, requereu-se a devolução do montante, uma vez que o valor pertencia ao réu e à sua esposa, sendo utilizado para o custeio de despesas familiares e tratamentos de saúde. Prossegue-se com a análise das razões recursais. Embora os argumentos apresentados pela ilustre defesa sejam respeitáveis, não lhes assiste razão, conforme se expõe a seguir. O perdimento de valores provenientes do crime está expressamente previsto no artigo 91, inciso II, b, do Código Penal. Assim, esse efeito da condenação somente poderá ser afastado mediante comprovação da origem lícita dos valores apreendidos, nos termos do artigo 91-A, §2º, do mesmo diploma legal. No entanto, em nenhum momento houve a efetiva demonstração da licitude do montante apreendido. Pelo contrário, as circunstâncias da apreensão indicam tratar-se de proveito do crime, em especial da comercialização de cigarros contrabandeados pelo réu em sua residência. Ademais, a alegação de que o réu possui enfermidade grave e de que os valores seriam destinados ao seu tratamento não é suficiente para afastar a aplicação do efeito da condenação previsto na legislação. Admitir tal exceção geraria insegurança jurídica e representaria indevida interferência do Poder Judiciário na esfera de atuação do Poder Legislativo. Dessa forma, não há fundamento para a reforma da respeitável sentença também nesse ponto. DISPOSITIVO Ante o exposto, vota-se para NEGAR PROVIMENTO ao recurso de Apelação interposto por JADSON FERNANDO DA FONSECA, mantida, a r. sentença, nos termos da fundamentação. É o voto. Comunique-se o E. Juízo das Execuções Penais. E M E N T A PENAL E PROCESSO PENAL. ARTIGO 334-A, §1º, IV, DO CÓDIGO PENAL. PRELIMINAR DE NULIDADE DA BUSCA DOMICILIAR AFASTADA. PRÁTICA DE FATO ASSIMILADO À CONTRABANDO NA MODALIDADE "TER EM DEPÓSITO". PERMANÊNCIA E CONSUMAÇÃO QUE SE PROTRAI NO TEMPO. AGENTE QUE, POR DICÇÃO LEGAL, SE ENCONTRA EM FLAGRANTE DELITO ENQUANTO NÃO CESSAR A PERMANÊNCIA. POSSIBILIDADE DE INGRESSO NO DOMICÍLIO SEM O RESPECTIVO MANDADO JUDICIAL. ATITUDE SUSPEITA DECORRENTE DO TRÁFEGO DO VEÍCULO EM ALTA VELOCIDADE, COM OS VIDROS ESCUROS, QUE DEU VAZÃO AO ACOMPANHAMENTO TÁTICO PELOS POLICIAIS, A CULMINAR NA CONSTATAÇÃO DE QUE O VEÍCULO ESTAVA ABARROTADO DE CIGARROS DE PROCEDÊNCIA ESTRANGEIRA IRREGULARMENTE INTERNALIZADOS EM TERRITÓRIO NACIONAL. COMERCIALIZAÇÃO DOS FUMÍGENOS. TERCEIRO QUE, NO MOMENTO DA ABORDAGEM, SE ENCONTRAVA NA RESIDÊNCIA DO ACUSADO PARA COMPRAR CIGARROS CONTRABANDEADOS. FUNDADAS RAZÕES DEMONSTRADAS. DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS PRESTADOS SOB O CRIVO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. PRESUNÇÃO DE LEGITIMIDADE E VERACIDADE DOS ATOS PRATICADOS POR AGENTES PÚBLICOS NO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO PÚBLICA. ADVERTÊNCIA DO COMPROMISSO DE DIZER A VERDADE, SOB PENA DE FALSO TESTEMUNHO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO, PELA DEFESA, DE PROVAS CONCRETAS QUE EVIDENCIAM A PRÁTICA DE FALSO TESTEMUNHO PELOS POLICIAIS. PRELIMINAR AFASTADA. AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVAS INCONTROVERSAS. DOSIMETRIA DA PENA. PRIMEIRA FASE. NEGATIVAÇÃO DOS "ANTECEDENTES" DO RÉU. POSSIBILIDADE. CONCEITO QUE ABRANGE AS CONDENAÇÕES DEFINITIVAS POR FATO ANTERIOR AO DELITO, TRANSITADAS EM JULGADO NO CURSO DA AÇÃO PENAL E AS ATINGIDAS PELO PERÍODO DEPURADOR. PRECEDENTES. MANUTENÇÃO DA VALORAÇÃO NEGATIVA DAS "CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME". EXPRESSIVA QUANTIDADE DE CIGARROS APREENDIDA. A INTRODUÇÃO IRREGULAR DE CIGARROS DE ORIGEM ESTRANGEIRA NO MERCADO INTERNO TEM O CONDÃO DE GERAR MALEFÍCIOS CONHECIDOS À SAÚDE. ELEVADO POTENCIAL DE DISSEMINAÇÃO NO COMÉRCIO POPULAR APTO A ATINGIR NÚMERO INDETERMINADO DE CONSUMIDORES. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO DA FRAÇÃO DE AUMENTO A LIMITES FIXOS. MOTIVAÇÃO CONCRETA. DISCRICIONARIEDADE JUDICIAL MOTIVADA. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DA PENA. MANUTENÇÃO DO INÍCIO DO RESGATE PRISIONAL NO REGIME SEMIABERTO. RÉU REINCIDENTE. MAIORIA DAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS POSITIVAS. INTELIGÊNCIA DO ENUNCIADO DE SÚMULA Nº 269 DO C. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES APREENDIDOS. PERDIMENTOS DE VALORES PROVENIENTES DO CRIME. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA ORIGEM LÍCITA. CIRCUNSTÂNCIAS DA APREENSÃO QUE INDICAM TRATAR-SE DE PROVEITO DO CRIME. A ALEGAÇÃO DE QUE O RÉU FOI DIAGNOSTICADO COM SÍNDROME DA IMUNODEFICIÊNCIA ADQUIRIDA E QUE PRECISA DE TAIS VALORES PARA O SEU TRATAMENTO NÃO TÊM O CONDÃO DE AFASTAR A APLICAÇÃO DO REFERIDO EFEITO DA CONDENAÇÃO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. INSEGURANÇA JURÍDICA. INDEVIDA INTERFERÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO NA ESFERA DE ATUAÇÃO DO PODER LEGISLATIVO. APELO DO RÉU IMPROVIDO. - Da inexistência de nulidade da busca domiciliar. A conduta consistente na prática de contrabando na modalidade “ter em depósito” evidencia permanência e sua consumação se protrai no tempo, de modo que se entende o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência (inteligência do artigo 303 do CPP). Nessa ordem de ideias, não há que se falar em afronta à inviolabilidade domiciliar, posto que o próprio texto constitucional alberga a possibilidade de relativização da garantia em casos de flagrante delito. Conforme entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal, a inviolabilidade do domicílio prevista no artigo 5º, inciso XI, da Constituição Federal pode ser relativizada em situações de flagrante delito, especialmente em crimes de caráter permanente. No caso concreto, as diligências policiais foram motivadas por fundadas razões, derivadas de atitude suspeita empreendida pelo acusado, consistente no tráfego, em alta velocidade, com os vidros escuros, o qual deu vazão ao acompanhamento tático pelos policiais rodoviários federais, que, por sua vez, culminou na constatação de que o veículo estava abarrotado de cigarros de procedência estrangeira, bem como de que o réu comercializava os itens, uma vez que foi possível verificar a chegada de uma testemunha afirmando que comprava cigarros no local para posterior revenda em seu comércio. Os argumentos que questionam a credibilidade dos depoimentos prestados pelos policiais, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, alegando contradições e a tentativa de justificar suas ações, não merecem acolhimento. Os atos praticados pelos policiais rodoviários federais, enquanto agentes públicos no exercício de suas funções, possuem como atributos a presunção de veracidade (fé pública) e de legitimidade (conformidade com a lei). Embora tal presunção seja relativa, não foi afastada pela ilustre defesa ao longo da instrução processual. Cumpre ressaltar, ainda, que as testemunhas, antes de prestarem suas declarações em Juízo, são devidamente advertidas, nos termos dos artigos 203 e 210 do Código de Processo Penal, acerca do compromisso de dizer a verdade, sob pena de incorrerem no crime de falso testemunho. Assim, salvo se a ilustre defesa apresentar nos autos provas concretas que evidenciem a prática desse delito por parte dos policiais, seus depoimentos devem ser considerados verídicos. - Da autoria e materialidade. Não houve impugnação quanto à materialidade e autoria do aludido delito praticado pelo réu, pelo que incontroversas. Não se verifica, tampouco, a existência de qualquer ilegalidade a ser corrigida de ofício por este E. Tribunal Regional Federal. - Da dosimetria da pena. Antecedentes. O r. juízo valorou negativamente o vetor “antecedentes”, considerando que o réu possui contra si condenação transitada em julgado em 19.09.2011 pela prática do delito previsto no artigo 310 do Código Penal. Tal proceder é albergado pela jurisprudência, uma vez que o vetor dos antecedentes é o que se refere única e exclusivamente ao histórico criminal do agente. Com efeito, “o conceito de maus antecedentes, por ser mais amplo do que o da reincidência, abrange as condenações definitivas, por fato anterior ao delito, transitadas em julgado no curso da ação penal e as atingidas pelo período depurador, ressalvada casuística constatação de grande período de tempo ou pequena gravidade do fato prévio" (STJ, AgRg no AREsp 924.174/DF, Rel. Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 06.12.2016, DJe 16.12.2016). A propósito, o Supremo Tribunal Federal, no bojo do julgamento do RE 593818/SC, de relatoria do Min. Roberto Barroso, fixou tese no sentido de que “não se aplica para o reconhecimento dos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição da reincidência, previsto no art. 64, I, do Código Penal” (Tema 150 da Repercussão Geral). Assim, “apesar de desaparecer a condição de reincidente, o agente não readquire a condição de primário, que é como um estado de virgem, que, violado, não se refaz. A reincidência é como o pecado original: desaparece, mas deixa sua mancha, servindo, por exemplo, como antecedente criminal (art. 59, caput)” (BITENCOURT, Cezar Roberto. Código Penal Comentado. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 238). - Da dosimetria da pena. Circunstâncias do crime. Igualmente, não há que se falar na reforma do r. decisum quanto a este ponto, considerando-se que a introdução irregular de cigarros de origem estrangeira no mercado interno, tem o condão de gerar malefícios conhecidos à saúde, ostentando um elevado potencial de disseminação no comércio popular, apto a atingir um número indeterminado de consumidores, em sua grande maioria de baixa renda e sem acesso à informação a respeito da origem e prejudicialidade da mercadoria que consomem. Nesta linha intelectiva, a quantidade de cigarros, por se tratar de aspecto acidental que não constitui elemento normativo do tipo, é fator que pode – e deve – influenciar no processo dosimétrico. - Da dosimetria da pena. Primeira fase. Critérios de aumento. Apesar de respeitável a tese aventada pela douta defesa do corréu, não lhe assiste razão, uma vez que a fração de aumento da pena-base não está vinculada a limites fixos (1/6 ou 1/8), sendo suficiente a motivação concreta, conforme jurisprudência consolidada do STJ. Com efeito, a discricionariedade judicial motivada na dosimetria da pena é reconhecida pelo C. Superior Tribunal de Justiça. Não existe direito subjetivo a critério rígido ou puramente matemático para a exasperação da pena-base. Em regra, afasta-se a tese de desproporcionalidade em casos de aplicação de frações de 1/6 sobre a pena mínima ou de 1/8 sobre o intervalo entre os limites mínimo e máximo do tipo, admitido outro critério mais severo, desde que devidamente justificado. - Do regime inicial de cumprimento da pena. Nessa linha, percebe-se a adequação da argumentação apresentada pelo magistrado para que prevaleça o entendimento consolidado na Súmula 269 do STJ. Isso porque o réu foi condenado a uma pena de 03 (três) anos de reclusão, o que, em tese, permitiria o início do cumprimento da pena em regime aberto. No entanto, há nos autos comprovação de sua reincidência, o que indica que o regime adequado é o SEMIABERTO, uma vez que a situação do caso se enquadra exatamente no entendimento firmado pela súmula mencionada. - Da impossibilidade de restituição dos valores apreendidos. O perdimento de valores provenientes do crime está expressamente previsto no artigo 91, inciso II, b, do Código Penal. Assim, esse efeito da condenação somente poderá ser afastado mediante comprovação da origem lícita dos valores apreendidos, nos termos do artigo 91-A, §2º, do mesmo diploma legal. No entanto, em nenhum momento houve a efetiva demonstração da licitude do montante apreendido. Pelo contrário, as circunstâncias da apreensão indicam tratar-se de proveito do crime, em especial da comercialização de cigarros contrabandeados pelo réu em sua residência. Ademais, a alegação de que o réu possui enfermidade grave e de que os valores seriam destinados ao seu tratamento não é suficiente para afastar a aplicação do efeito da condenação previsto na legislação. Admitir tal exceção geraria insegurança jurídica e representaria indevida interferência do Poder Judiciário na esfera de atuação do Poder Legislativo. - Apelo do réu improvido. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Primeira Turma, por unanimidade, decidiu NEGAR PROVIMENTO ao recurso de Apelação interposto por JADSON FERNANDO DA FONSECA, mantida, a r. sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. FAUSTO DE SANCTIS Desembargador Federal
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear