Procuradoria Geral De Justica e outros x Francisco Antonio Almeida Bezerra e outros
ID: 256597679
Tribunal: TJCE
Órgão: 3º Gabinete da 2ª Câmara de Direito Privado
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0203008-53.2023.8.06.0001
Data de Disponibilização:
15/04/2025
Advogados:
PAULO BEZERRA NUNES
OAB/CE XXXXXX
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DAVID SOMBRA PEIXOTO
OAB/CE XXXXXX
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ESTADO DO CEARÁPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇAGABINETE DESEMBARGADORA MARIA DE FÁTIMA DE MELO LOUREIRO PROCESSO: 0203008-53.2023.8.06.0001 APELANTE: UNIMED DE FORTALEZA COOPERATIVA DE TRABALHO ME…
ESTADO DO CEARÁPODER JUDICIÁRIOTRIBUNAL DE JUSTIÇAGABINETE DESEMBARGADORA MARIA DE FÁTIMA DE MELO LOUREIRO PROCESSO: 0203008-53.2023.8.06.0001 APELANTE: UNIMED DE FORTALEZA COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO LTDA APELADO: RITA DE CASSIA MAIA BEZERRA e outros EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. PLANO DE SAÚDE. PACIENTE ACOMETIDA DE ASTROCITOMA ANAPLÁSICO IDH MUTADO, GRAU 3 (NEOPLASIA MALIGNA). FALECIMENTO DA AUTORA NO CURSO DA DEMANDA. DIREITO À INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TRANSMISSIBILIDADE AOS HERDEIROS. NATUREZA PATRIMONIAL. NEGATIVA DE COBERTURA DE MEDICAMENTO ANTINEOPLÁSICO. USO OFF LABEL. POSSIBILIDADE. LAUDO MÉDICO ATESTANDO A NECESSIDADE DO TRATAMENTO. RELAÇÃO DE CONSUMO. CLÁUSULA RESTRITIVA ABUSIVA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. DECISÃO DE PRIMEIRA INSTÂNCIA MANTIDA. 1. Cinge-se a controvérsia ao exame da obrigatoriedade do Plano de Saúde UNIMED de fornecer à segurada, falecida no decorrer do processo e sendo substituída por seus familiares, o medicamento auxiliar para o tratamento do Astrocitoma Anaplásico IDH mutado Grau 3 da OMS, massa tumoral de grande volume, localizada no encéfalo e sistema nervoso central, com infiltração em áreas nobres do cérebro, denominado AVASTIN (BEVACIZUMABE) associada à LOMUSTINA. 2. Inicialmente, ressalta-se que a autora no decorrer do feito veio óbito, razão pela qual a pretensão autoral referir-se parcialmente à prestação personalíssima, qual seja de fornecimento de medicamento indispensável para o seu tratamento médico, mas há também a pretensão pela reparação por danos morais em virtude da negativa de cobertura. Nesse contexto, eventual direito à indenização, ou seja, o ganho patrimonial da violação do direito alegado é perfeitamente transmissível aos herdeiros. 3. Em se tratando de contratos de planos de saúde, e em não sendo a apelante entidade de autogestão, incidem os princípios e normas estabelecidas no Código de Defesa do Consumidor, destacando-se, a presunção de boa-fé, a função social do contrato e a interpretação mais favorável ao consumidor. A boa-fé contratual deve nortear a interpretação dos contratos, especialmente os de adesão, garantindo que o consumidor receba atendimento adequado. Assim, as cláusulas devem ser analisadas com base na boa-fé objetiva, evitando impor desvantagens excessivas à parte hipossuficiente, conforme os arts. 47 e 51 do Código de Defesa do Consumidor. 4. In casu, o plano de saúde suplicado, em sua peça de inconformação, sustenta a legalidade de sua conduta, argumentando não haver previsão legal para o fornecimento de medicamento off-label. Aduz, ainda, a inexistência de comprovação científica quanto à eficácia do fármaco pleiteado, bem como, que sendo a operadora de plano de saúde vinculada ao rol de procedimentos da ANS, o qual considera taxativo e representativo da cobertura mínima obrigatória, inexiste qualquer ato ilícito ou dano passível de reparação. 5. Da analise detida dos autos, injustificável é a negativa de cobertura em apreço. Mesmo que o presente caso se trate de uso off label do medicamento, conforme alegado pela recorrente, é cediço que cabe ao médico assistente do paciente a indicação do tratamento que melhor se adapta ao caso, não podendo um fármaco ser negado em razão de sua utilização não estar padronizada para o caso ou prevista na bula. Desse modo, não obstante se tratar de uso off label, havendo indicação médica específica de tratamento a ser realizado ao paciente e registro na ANVISA, mostra-se indevida a recusa do tratamento pela operadora. 6. In casu, considerando que o caso em concreto trata diretamente dos bens jurídicos vida e saúde, depreendidos do princípio da dignidade da pessoa humana, assim como que a atividade econômica que tem por finalidade a saúde deve ser prestada com a máxima cautela, sob pena de prejudicar a parte hipossuficiente da relação jurídica, que consiste no consumidor beneficiário, entende-se que a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais), fixada pelo juízo de primeiro grau para os filhos em substituição à autora, cumpre o objetivo de reparar o dano moral suportado, restando razoável e proporcional à ofensa sofrida, além de deter caráter punitivo e pedagógico ao ofensor. 7. Apelação cível conhecida e desprovida. Sentença a quo preservada. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 2ª Câmara Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer do recurso, para NEGAR-LHE PROVIMENTO, em conformidade com o voto da e. Relatora RELATÓRIO Os presentes autos referem-se a recurso de apelação interposto pela UNIMED Fortaleza - Sociedade Cooperativa Médica LTDA, conforme documento ID.16553546, tendo por objetivo a modificação da sentença proferida pelo Juízo da 21ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza/CE, nos autos da Ação de Obrigação de Fazer cumulada com Pedido de Indenização por Danos Morais e Tutela de Urgência, movida por Carolina Maia Almeida Bezerra, substituída por RITA DE CASSIA MAIA BEZERRA e outros, em face da ora apelante, sendo esta última resultado da apreciação de Embargos de Declaração que alteraram parcialmente a decisão anterior. Na petição inicial, a autora relata ter sido diagnosticada com Astrocitoma Anaplásico IDH mutado, Grau 3 segundo a classificação da OMS, com infiltração em regiões sensíveis do cérebro. Diante desse diagnóstico, foi submetida a um tratamento combinado de radioterapia e quimioterapia por 28 dias. Após esse período, iniciou-se uma nova fase apenas com o uso do quimioterápico TEMODAL. Contudo, após o terceiro ciclo do tratamento, a paciente voltou a apresentar crises convulsivas. Exames de imagem emergenciais indicaram crescimento considerável do tumor. Em razão disso, o médico responsável prescreveu duas medicações (Avastin (bevacizumabe) e Lomustina), com potencial para conter a progressão da enfermidade, com o intuito também de evitar o uso prolongado de corticoides. Contudo, apesar das fundamentações médicas apresentadas, a UNIMED recusou, por duas vezes, o fornecimento do medicamento Avastin, o que levou ao ajuizamento da presente demanda, na qual também foi pleiteada indenização por danos morais. Posteriormente, no ID.16553485, foi apresentada petição por Rita de Cássia Maia Bezerra e Francisco Antônio Almeida Bezerra, comunicando o falecimento da autora Carolina Maia Almeida Bezerra, ocorrido em 01/04/2023, requerendo sua substituição no polo ativo da ação. Na sentença proferida (ID.16553541), o juízo julgou procedente o pedido, condenando a parte ré ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), bem como ao pagamento de danos materiais no montante de R$ 10.116,66 (dez mil, cento e dezesseis reais e sessenta e seis centavos). Ainda, no ID.16553531, o magistrado apreciou o pedido relacionado à obrigação de fazer - consistente no fornecimento dos medicamentos -, decidindo pela extinção sem análise do mérito, com fundamento no art. 485, IX, do CPC. No recurso de apelação (ID.16553546), a UNIMED Fortaleza argumenta, em síntese, que não há obrigação legal ou contratual de fornecer a medicação solicitada, tratando-se de uso "off-label". Sustenta a necessidade de observância ao Rol da ANS e nega a existência de qualquer conduta ilícita que justifique indenização, requerendo, por conseguinte, o provimento do recurso e a improcedência da ação. Ressalta-se, por fim, que não foram apresentadas contrarrazões ao recurso. Oficiando nos autos, a d. Procuradoria-Geral de Justiça, proferiu parecer em ID nº 18481314, pelo conhecimento do apelo, para negar-lhe provimento. É o relatório. VOTO Atendidos os pressupostos processuais de admissibilidade, conheço dos presentes recursos. O cerne da questão cinge-se a analisar a correção ou não da sentença proferida pelo Juízo da 21ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza/CE, que julgou procedentes os pedidos autorais para condenar a ré ao pagamento de indenização por danos morais no montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais) A situação fática demonstra que a autora foi diagnosticada com Astrocitoma Anaplásico IDH mutado Grau 3 da OMS, massa tumoral de grande volume, localizada no encéfalo e sistema nervoso central, com infiltração em áreas nobres do cérebro, conforme relatório de patologia cirúrgica (págs. 45-46), tendo iniciado tratamento quimioterápico. Contudo, em razão do avanço da doença, foi prescrito pelo médico assistente o tratamento com uso denominado AVASTIN (BEVACIZUMABE) associada à LOMUSTINA, o que foi solicitado à ré, a qual negou o fornecimento, por ser de caráter off label. Em suas razões recursais, a UNIMED sustenta a legalidade de sua conduta, argumentando não haver previsão legal para o fornecimento de medicamento off-label. Aduz, ainda, a inexistência de comprovação científica quanto à eficácia do fármaco pleiteado. Assevera, por fim, que sendo a operadora de plano de saúde vinculada ao rol de procedimentos da ANS, o qual considera taxativo e representativo da cobertura mínima obrigatória, inexiste qualquer ato ilícito ou dano passível de reparação, motivo pelo qual pugna pela improcedência dos pedidos formulados, requerendo, assim, o provimento do apelo, para fins de reformar a sentença, julgando-se improcedente a ação. Inicialmente, ressalta-se que a autora no decorrer do feito veio óbito, razão pela qual a pretensão autoral referir-se parcialmente à prestação personalíssima, qual seja de fornecimento de medicamento indispensável para o seu tratamento médico, mas há também a pretensão pela reparação por danos morais em virtude da negativa de cobertura. Nesse contexto, eventual direito à indenização, ou seja, o ganho patrimonial da violação do direito alegado é perfeitamente transmissível aos herdeiros. Dessa forma, já decidiu esta Corte de Justiça: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE SAÚDE DOMICILIAR COM CUMULAÇÃO DE PEDIDO INDENIZATÓRIO POR DANOS MORAIS. SUPERVENIÊNCIA DE ÓBITO DA AUTORA NO CURSO DA DEMANDA RECURSAL. ANÁLISE DA TRANSMISSIBILIDADE DOS DIREITOS EM LITÍGIO. PEDIDO DE HOME CARE CARACTERIZADO COMO DIREITO PERSONALÍSSIMO. PRETENSÃO INDENIZATÓRIA DE NATUREZA PATRIMONIAL. [...]. I. Caso em exame Trata-se de ação ordinária de obrigação de fazer cumulada com pedido de indenização por danos morais ajuizada por beneficiária de plano de saúde, portadora da doença de Alzheimer, em face da UNIMED, objetivando a prestação de serviços de assistência domiciliar (Home Care) e compensação pelos danos morais experimentados em razão da negativa de cobertura. O juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedentes os pedidos, determinando o fornecimento do tratamento domiciliar e fixando indenização no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). A operadora de saúde interpôs recurso de apelação visando exclusivamente a reforma da sentença quanto à condenação por danos morais. No curso do procedimento recursal, sobreveio o falecimento da autora, conforme certidão de óbito acostada aos autos, sem que houvesse habilitação dos sucessores após regular intimação. II. Questões em discussão 2. O caso apresenta complexa análise quanto à: (i) verificação da natureza jurídica dos direitos em litígio e seus efeitos em relação à transmissibilidade; (ii) necessidade de distinção entre o tratamento das pretensões de natureza personalíssima e patrimonial; (iii) análise dos requisitos processuais para o prosseguimento do feito após o falecimento da parte autora; (iv) consequências da ausência de habilitação dos sucessores no prazo legal. III. Razões de decidir 3. A prestação de serviços de saúde na modalidade Home Care configura direito personalíssimo, intrinsecamente vinculado à pessoa de seu titular, não comportando transmissão aos sucessores. O falecimento da beneficiária acarreta a perda superveniente do objeto quanto a este pedido, ante a impossibilidade material de sua execução. A pretensão indenizatória decorrente dos danos morais possui natureza patrimonial e, nos termos do art. 943 do Código Civil, transmite-se aos herdeiros. Contudo, o prosseguimento do feito quanto a este capítulo demanda a regularização do polo ativo mediante habilitação dos sucessores. O art. 313, §2º, II do Código de Processo Civil estabelece que, falecido o autor e sendo transmissível o direito em litígio, o juiz determinará a intimação de seu espólio ou sucessores para manifestarem interesse na sucessão processual, sob pena de extinção do processo sem resolução do mérito. A ausência de habilitação dos sucessores no prazo legal, após regular intimação, impõe a extinção do processo sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, IV do CPC, inclusive quanto à pretensão indenizatória, não obstante sua natureza patrimonial e transmissível. IV. Dispositivo e tese 7. Processo extinto sem resolução do mérito. Recurso prejudicado. Teses de julgamento: "1. O direito à prestação de serviços de saúde na modalidade Home Care possui natureza personalíssima, extinguindo-se com o óbito do beneficiário, acarretando a perda superveniente do objeto quanto a este pedido." "2. A pretensão indenizatória por danos morais, embora de natureza patrimonial e transmissível aos sucessores (CC, art. 943), não prescinde da regular habilitação destes no processo, sob pena de extinção sem resolução do mérito (CPC, art. 485, IV)." "3. A ausência de habilitação dos sucessores no prazo legal, após regular intimação nos termos do art. 313, §2º, II do CPC, impõe a extinção do processo sem resolução do mérito, inclusive quanto aos pedidos de natureza patrimonial." Dispositivos relevantes citados: Código Civil: art. 943 Código de Processo Civil: arts. 110, 313, §2º, II, 485, IV, 689 CDC: art. 51, §1º, II Jurisprudência relevante citada: TJCE, Apelação Cível 0228972-53.2020.8.06.0001, Rel. Des. Marcos William Leite de Oliveira, 3ª Câmara Direito Privado STJ, REsp 1.722.666/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva STJ, REsp 1376871/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi Doutrina relevante citada: CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de responsabilidade civil. 8ª ed., São Paulo: Ed. Atlas, 2008, n. 19.4, p. 83. (Apelação Cível - 0018330-78.2016.8.06.0119, Rel. Desembargador(a) DJALMA TEIXEIRA BENEVIDES, 4ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 25/02/2025, data da publicação: 25/02/2025) Quanto ao mérito, tem-se que, em se tratando de contratos de planos de saúde, e em não sendo a apelante entidade de autogestão, incidem os princípios e normas estabelecidas no Código de Defesa do Consumidor, destacando-se, a presunção de boa-fé, a função social do contrato e a interpretação mais favorável ao consumidor. A boa-fé contratual deve nortear a interpretação dos contratos, especialmente os de adesão, garantindo que o consumidor receba atendimento adequado. Assim, as cláusulas devem ser analisadas com base na boa-fé objetiva, evitando impor desvantagens excessivas à parte hipossuficiente, conforme os arts. 47 e 51 do Código de Defesa do Consumidor. Da analise detida dos autos, injustificável é a negativa de cobertura em apreço, pois, se há nos autos indicação médica detalhada acerca da necessidade do tratamento, mediante o uso do medicamento solicitado, a negativa da operadora de saúde recorrente não se mostra adequada, pois, com diagnóstico de Astrocitoma Anaplásico IDH mutado Grau 3 da OMS, o fármaco prescrito, a meu sentir, tem indicação de urgência, já que o tratamento perseguido fora recomendado com vista a evitar um dano maior. Ademais, em pesquisa junto ao Superior Tribunal de Justiça, constata-se que a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu, por unanimidade, que uma operadora de plano de saúde deve custear tratamento com medicamento prescrito pelo médico para uso off-label (ou seja, fora das previsões da bula) (STJ - EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RESP Nº 1.886.929 - SP (2020/0191677-6) RELATOR: MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO - Data de julgamento: 08 de junho de 2022). De acordo com o colegiado, se o medicamento tem registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a recusa da operadora é abusiva, mesmo que ele tenha sido indicado pelo médico para uso off-label ou para tratamento em caráter experimental. Observa-se, ainda, que, pouco depois desse julgamento, a Lei 14.454/2022, ao alterar a Lei dos Planos de Saúde para dispor sobre a possibilidade de cobertura de tratamentos não contemplados no rol da ANS, definiu que essa lista constitui apenas uma referência básica para os planos. Nesse cenário, conclui-se que tanto a jurisprudência do STJ quanto a nova redação da Lei dos Planos de Saúde admitem a cobertura, de forma excepcional, de procedimentos ou medicamentos não previstos no rol da ANS, desde que amparada em critérios técnicos, cuja necessidade deve ser analisada caso a caso, em especial, nos casos em que trazem vantagens em sobrevida. No que se refere ao posicionamento da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, sabe-se que a ANVISA admite o uso experimental de uma medicação, considerando, é claro, as constantes pesquisas e descobertas na área da medicina. Desta feita, não há vedação de administração off-label ou à realização de novos tratamentos, logo, não cabe a operadora de saúde discutir a pertinência, ou não, do fármaco recomendado pelo médico que assiste o tratamento da parte autora, que conhece suas necessidades, a gravidade do seu caso e os cuidados que reclama. Além disso, ao contrário do que afirma a recorrente, ressalte-se que o medicamento prescrito para o tratamento, possui registro válido na Agência Nacional de Vigilância Sanitária - ANVISA, conforme se constata no sítio eletrônico da referida Agência - https://https://consultas.anvisa.gov.br/#/medicamentos/25351255514200483/?nomeProduto=avastin - Acessado em 08/04/2025, às 08h:07min. No tocante a alegativa de necessidade de ser observar a taxavidade do rol da ANS, tem-se que, embora o Superior Tribunal de Justiça, na seção do dia 08/06/2022 (EREsp 1.886.929-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão), tenha firmado entendimento no sentido que o Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar é, em regra, taxativo, o posicionamento citado admite algumas exceções à regra. Dentre elas, cito: " [...] "4 - não havendo substituto terapêutico ou esgotados os procedimentos do Rol da ANS, pode haver, a título excepcional, a cobertura do tratamento indicado pelo médico ou odontólogo assistente, desde que (i) não tenha sido indeferido expressamente, pela ANS, a incorporação do procedimento ao Rol da Saúde Suplementar; (ii) haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências; (iii) haja recomendações de órgãos técnicos de renome nacionais (como CONITEC e NATJUS) e estrangeiros (Tese 4). Ora, não é esperado que as indicações da ANS, que são precedidas de burocráticos trâmites administrativos, acompanhem a rápida evolução técnica e científica da medicina sem uma defasagem de tempo. De igual sorte, é evidente que não pode a paciente, com tratamento indicado por médico especializado, ficar descoberta por conta da alegada ausência de indicação do procedimento por órgãos oficiais. Nessa vertente, restou firmado o entendimento que o especialista é quem direciona o tratamento do paciente e o fator decisivo na escolha é o diagnóstico histológico da doença. E sob esse aspecto, o mesmo não pode ser impedido de escolher a alternativa que melhor promove o restabelecimento da paciente. Nesse sentido, vejamos os seguintes julgados, in verbis: Ementa: DIREITO DO CONSUMIDOR E DA SAÚDE. PLANO DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS PARA TRATAMENTO ONCOLÓGICO. RECUSA INDEVIDA. ABUSIVIDADE. DANO MORAL CONFIGURADO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. I. CASO EM EXAME Apelação interposta por operadora de plano de saúde contra sentença que determinou o fornecimento dos medicamentos Avastin e Lonsurf ao beneficiário, portador de adenocarcinoma de cólon metastático para fígado e peritônio, conforme prescrição médica. A operadora negou a cobertura sob a justificativa de que a combinação medicamentosa não consta no Rol de Procedimentos da ANS, sendo considerada "off-label" e experimental. A sentença reconheceu a abusividade da negativa e condenou a operadora ao pagamento de indenização por danos morais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) se a negativa de cobertura dos medicamentos prescritos pelo médico assistente, com base na ausência no rol da ANS, é legítima; e (ii) se a recusa configura dano moral passível de indenização. III. RAZÕES DE DECIDIR O Código de Defesa do Consumidor (CDC) se aplica aos contratos de plano de saúde, impondo a interpretação mais favorável ao consumidor e vedando cláusulas abusivas que restrinjam direitos fundamentais à vida e à saúde (Súmula 608 do STJ; CDC, arts. 47 e 51). O rol de procedimentos da ANS é, em regra, taxativo, mas admite exceções, como nos casos em que não há substituto terapêutico eficaz ou quando há comprovação científica da eficácia do tratamento, conforme entendimento do STJ (EREsp 1.889.704/SP e 1.886.929/SP). O medicamento Lonsurf possui registro na ANVISA e tem recomendação científica favorável para o tratamento do câncer colorretal metastático, conforme notas técnicas recentes e literatura médica. O medicamento Avastin, embora a combinação prescrita não conste no rol da ANS, possui evidências científicas que indicam benefício ao paciente, conforme diretrizes da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica e estudos internacionais, tornando a negativa de cobertura indevida. O princípio da função social do contrato e a boa-fé objetiva limitam a força obrigatória dos contratos (CC, arts. 421 e 423), impedindo que planos de saúde recusem tratamentos essenciais à sobrevivência do segurado. A recusa indevida da cobertura do tratamento causa angústia e sofrimento ao paciente, configurando dano moral in re ipsa, nos termos da jurisprudência do STJ (AgInt no REsp 2.035.493/PR). [...]IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: A negativa de cobertura de medicamento registrado na ANVISA e prescrito pelo médico assistente, sob a justificativa de ausência no rol da ANS, é abusiva quando há comprovação científica da eficácia e inexistência de alternativa terapêutica eficaz. A recusa indevida ao tratamento prescrito configura dano moral in re ipsa, passível de indenização. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 1º, III; 5º, caput; 6º e 197. CDC, arts. 47 e 51. CC, arts. 421 e 423. Lei nº 9.656/1998, art. 10, §§ 12 e 13. Jurisprudência relevante citada: STJ, EREsp 1.889.704/SP e 1.886.929/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, DJe 03.08.2022; STJ, AgInt no REsp 2.035.493/PR, Rel. Min. Moura Ribeiro, Terceira Turma, DJe 10.03.2023; TJCE, Apelação Cível 0203179-78.2021.8.06.0001, Rel. Des. Inácio de Alencar Cortez Neto, 2ª Câmara Direito Privado, j. 19.07.2023. (Apelação Cível - 0207168-87.2024.8.06.0001, Rel. Desembargador(a) FRANCISCO BEZERRA CAVALCANTE, 4ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 18/03/2025, data da publicação: 18/03/2025) RECURSO DE APELAÇÃO. DIREITO À SAÚDE. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO DE USO OFF LABEL. GRAVIDADE DA SITUAÇÃO CLÍNICA DA AUTORA. COBERTURA DEVIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. HONORÁRIOS MAJORADOS. 01. Cuida-se de Recurso de Apelação que visa a reforma da sentença que entendeu pela procedência da AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA DE URGÊNCIA, "determinando que a parte ré custeie o tratamento da autora com o fármaco AVASTIN OU bevacizumabe, mediante prescrição por médico especialista (oncologista) com periodicidade anual", em razão do aparecimento de radionecrose de áreas do cérebro da autora em decorrência de ter sido submetida a tratamento intenso de radioterapia e eventual intervenção cirúrgica no atual momento colocaria em risco a sua vida. Em suas razões de apelo, refere a inexistência de cobertura contratual ao medicamento pleiteado, tendo em vista tratar-se de medicamento off label, bem como refere a taxatividade do Rol de procedimentos da ANS e a ausência de abusividade na negativa do tratamento pleiteado. Por fim, alega a necessidade de prestação periódica de relatórios médicos para avaliar a necessidade de continuidade do tratamento. 02. A relação contratual entre as operadoras de planos de saúde e os segurados, tem natureza de relação consumerista (Súmula 608, do STJ). 03. Os documentos colacionados aos autos comprovam que a autora vem há mais de 15 anos lutando contra um câncer (LINFOMA DIFUSO DE GRANDES CÉLULAS B -LDGCB - CID10¿C83), doença agressiva que acometeu diversas partes do corpo da autora, incluindo o seu cérebro. Como consequência do tratamento realizado à época do diagnóstico da doença, em 2008, a autora foi diagnosticada com radionecrose cefaleia frontal de 6,6x4,9cm, tendo sido submetida a delicada cirurgia em novembro de 2017 e, atualmente, encontra-se com duas lesões na região cerebral, em rápido crescimento com sério risco de convulsões e grande chance de a autora entrar em estado de coma, com risco de morte. A gravidade do caso não permite a realização de uma nova cirurgia para correção das lesões, entendendo a equipe médica que acompanha a autora a necessidade de tratamento por meio do uso do medicamento AVASTIN BEVACIZUMAB 5MG IV a cada 15 dias por 4 a 6 ciclos. 04. O caso da apelada se encaixa em procedimento de emergência, devendo ser aplicada a disposição constante no art. 35-C, da Lei dos Planos de Saúde, a despeito de inexistir prescrição para o tratamento necessário à autora na bula do medicamento. 05. Existem estudos que colocam efetivamente a Bevacizumab (Avastin®) como tratamento indicado em caso de radionecrose. 06. Não merece guarida a irresignação apresentada pela recorrente quanto a taxatividade do Rol da ANS, o que impediria o fornecimento do fármaco em questão, tendo em vista que ¿o plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura, mas não o tipo de terapêutica indicada por profissional habilitado na busca da cura e que é abusiva a cláusula contratual que exclui tratamento, procedimento ou material imprescindível, prescrito para garantir a saúde ou a vida do beneficiário¿. (STJ - REsp: 2037434 CE 2022/0353875-6, Relator: Ministro MOURA RIBEIRO, Data de Publicação: DJ 24/11/2022). 07. Recurso de Apelação conhecido e desprovido. Honorários majorados para 15% do valor atualizado da causa (art. 85, §11, do CPC). (Apelação Cível - 0260101-42.2021.8.06.0001, Rel. Desembargador(a) MARCOS WILLIAM LEITE DE OLIVEIRA, 3ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 03/07/2024, data da publicação: 04/07/2024) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER, COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA, C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. PLANO DE SAÚDE. NEOPLASIA MALIGNA DO ENCÉFALO. MEDICAMENTO BEVACIZUMABE. 1. NECESSIDADE DE PERÍCIA. NÃO CONFIGURAÇÃO. ATUAÇÃO JUDICIAL DEVIDAMENTE LASTREADA NO PRIMADO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. ART. 370, DO CPC. COMPLEXO PROBATÓRIO SUFICIENTE. 2. MÉRITO. RECUSA DE FORNECIMENTO. ILICITUDE. DEVER DE CUSTEIO DE MEDICAMENTOS/PROCEDIMENTOS PARA O TRATAMENTO DE CÂNCER. EXCEPCIONAL MITIGAÇÃO DO ROL DE COBERTURA MÍNIMA DA ANS. PRECEDENTES DO STJ. CARÁTER EXPERIMENTAL (USO OFF LABEL). IRRELEVÂNCIA. MEDICAMENTO REGISTRADO NA ANVISA. DANO MORAL CARACTERIZADO. MANUTENÇÃO DO VALOR IMPOSTO NA SENTENÇA. 3. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS. REVISÃO EX OFFICIO. POSSIBILIDADE. BASE DE CÁLCULO. AMBIGUIDADE DO JULGADO. ACLARAMENTO IMPERIOSO. ENCARGO QUE DEVE INCIDIR SOBRE A CONDENAÇÃO RELATIVA À OBRIGAÇÃO DE FAZER E À INDENIZAÇÃO MORAL. PRECEDENTES DO STJ. MAJORAÇÃO. IMPRESCINDIBILIDADE. ART. 85, § 11, DO CPC. Recurso conhecido e improvido. Retificação ex officio da base de cálculo dos honorários sucumbenciais e majoração do percentual de incidência. 1. A controvérsia ventilada na presente demanda recursal cinge-se à obrigatoriedade de custeio do medicamento Bevacizumabe 10 mg/ Kg, pela Operadora do Plano de Saúde, em favor da Autora, acometida de neoplasia maligna do encéfalo (CID C71). 2. Preliminar de cerceamento de defesa. Da necessidade de avaliação pericial. De acordo com o disposto no art. 370, do CPC, o juiz é o destinatário das provas, cabendo a ele decidir pela necessidade de sua produção. No caso vertente, as partes juntaram complexo probatório composto de vasta documentação, observando-se que o diagnóstico e a validade da prescrição médica não consubstanciaram objeto de divergência entre as partes, mormente pela Operadora, que, em sede contestatória, bem como no curso da marcha processual, limitou-se a defender a tese de não obrigatoriedade de custeio de medicação off label, notadamente ante a ausência de eficácia comprovada, de previsão contratual e de resolução normativa da ANS. Cumpre, outrossim, destacar que a indicação da terapêutica compete ao médico assistente, e não à Operadora, de sorte que não cumpre a esta agir em substituição ao profissional eleito pela beneficiária, especialmente quando a justificativa apontada para tal medida repousa apenas no custo elevado da medicação, em nenhum momento levantando-se dúvidas quanto à capacidade técnica daquele. Aliás, de acordo com o disposto no art. 3º, II, da Resolução Normativa nº 424, 2017, da ANS, não cabe a realização de junta médica para avaliação da conduta do médico assistente na hipótese em tablado. Diante dessa moldura fático-processual, em confluência com o art. 464, II, do CPC. o magistrado sentenciante entendeu pela prescindibilidade da avaliação pericial, não se vislumbrando, a par do conjunto de provas reunidos durante o trâmite originário, a existência de prejuízo idôneo a justificar eventual reconhecimento de nulidade por cerceamento de defesa. 3. Do dever de fornecimento da medicação. Nada obstante consabido que o rol de cobertura mínima da ANS detém natureza taxativa, podendo ser mitigado, em regra, apenas segundo os ditames do art. 10, § 13, da Lei nº 9.656/1998, com redação conferida pela Lei nº 14.454/2022, não menos certo que são iterativos os julgados do STJ adotando a tese de que, em se tratando de câncer, o rol da ANS traduz mera "diretriz" a ser observada, devendo prevalecer, contudo a prescrição do médico assistente. A propósito do tema, a jurisprudência deste Sodalício é remansosa no sentido de que o custeio da medicação BEVACIZUMABE (AVASTIN), ainda que mediante prescrição off label, traduz obrigatoriedade da Operadora do Plano de Saúde em caso de neoplasia maligna. Dessarte, ausente reproche a ser realizado na sentença vergastada quanto a esse ponto. 4. Do dano moral. A postura da Prestadora, quanto à recusa injustificada do tratamento necessário e adequado à beneficiária, no momento em que acometida de doença grave, causa dor e angústia, agravando a situação de fragilidade já instalada em virtude da enfermidade, moldura fática que torna devida a indenização a título de danos morais, a teor do disposto nos arts. 186 e 927, do CC, bem como no art. 14, do CDC. 5. [...] 7. Recurso conhecido e desprovido. Retificação ex officio da base de cálculo dos honorários sucumbenciais e majoração do percentual de incidência. (Apelação Cível - 0219597-57.2022.8.06.0001, Rel. Desembargador(a) FRANCISCO JAIME MEDEIROS NETO, 4ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 21/05/2024, data da publicação: 21/05/2024) De mais a mais, a operadora do plano não indicou tratamento alternativo eficaz e que não esbarre nas limitações apontadas pela médica da autora. A requisição médica está fundamentada e os documentos carreados emprestarem verossimilhança aos fatos alegados pelo autor, sendo indevido à operadora definir o método de tratamento. Seguindo com a análise das razões recursais, sustenta a operadora de saúde a ausência de danos morais, haja vista que a negativa de tratamento não teria ocasionado abalo significativo, mais apenas mero dessabor à autora. Não obstante haja entendimento de que o mero inadimplemento contratual não enseja dano moral, no caso em análise a negativa de cobertura provocou danos além do mero dissabor. Observa-se que a negativa da parte ré em fornecer medicamento para o tratamento de doença grave, de forma a garantir a manutenção de sua vida, causou sofrimento psicológico e aflição a autora. Nesse caso, a operadora de plano de saúde deve arcar com os danos morais decorrentes das dores psíquicas e fragilidade, causadas, sendo estes danos presumidos e sem necessidade de sua comprovação. Além disso, seria até desnecessária a qualificação do sofrimento suportado pela paciente, aqui apelada, que se vê diante da recusa de autorização para fazer jus ao tratamento médico urgente, sendo que, nesses casos, o dano é presumido, caracterizando-se na modalidade in re ipsa. Portanto, deve a demandada/apelante arcar com os danos morais. Sabe-se que em relação a fixação do quantum debeatuer a título de danos morais, além do caráter punitivo, compensatório, da extensão e intensidade do dano, também a equidade é fator preponderante, sendo que este elemento é de suma importância, ante a ausência de critério legal para tanto. E a equidade da indenização que deve ser obtida com o encontro de um valor que não seja irrisório, e ao mesmo tempo não implique exagero ou especulação. Neste sentido, saliento que a autora foi diagnosticada com doença grave, tumor cerebral sem possibilidade de cirurgia, e havia se submetido a tratamento com outros medicamentos, sem sucesso. Assim, detinha a fundada expectativa de que o medicamento solicitado poderia ser a chance de sua cura, o que foi frustrada diante da negativa injusta de cobertura pela ré, causando-lhe imenso abalo moral Nesse contexto, e considerando que o caso em concreto trata diretamente dos bens jurídicos vida e saúde, depreendidos do princípio da dignidade da pessoa humana, expresso na Carta Magna de 1988 como fundamento de nossa República Federativa, assim como que a atividade econômica que tem por finalidade a saúde deve ser prestada com a máxima cautela, sob pena de prejudicar a parte hipossuficiente da relação jurídica, que consiste no consumidor beneficiário, entendo que a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais), fixada pelo juízo de primeiro grau para os filhos em substituição à autora, cumpre o objetivo de reparar o dano moral suportado, restando razoável e proporcional à ofensa sofrida, além de deter caráter punitivo e pedagógico ao ofensor. Nesse sentido, vejamos os seguintes precedentes, in verbis: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. IRRESIGNAÇÃO SUBMETIDA AO NCPC. TRATAMENTO MÉDICO EXPERIMENTAL. RECUSA DE COBERTURA. DOENÇA COBERTA. IMPOSSIBILIDADE. DANO MORAL CONFIGURADA. INDENIZAÇÃO FIXADA COM RAZOABILIDADE. DECISÃO MANTIDA. 1. As disposições do NCPC, no que se refere aos requisitos de admissibilidade dos recursos, são aplicáveis ao caso concreto ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016. 2. Os planos de saúde podem, por expressa disposição contratual, restringir as enfermidades cobertas, sendo-lhes vedado, no entanto, limitar os tratamentos a serem realizados, inclusive os experimentais. Precedentes. 3. A recusa indevida pela operadora do plano de saúde em autorizar a cobertura de tratamento, mesmo nessas hipóteses, é suficiente para gerar dano moral. 4. Admite-se como razoável, no caso concreto, o montante reparatório fixado em R$ 10.000,00 (dez mil reais) 5. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no AREsp: 1558074 RJ 2019/0229346-6, Relator: Ministro MOURA RIBEIRO, Data de Julgamento: 15/06/2020, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/06/2020) DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. FALECIMENTO DO AUTOR NO CURSO DA DEMANDA. TRANSMISSIBILIDADE AOS HERDEIROS DA PRETENSÃO DE NATUREZA PATRIMONIAL. PLANO DE SAÚDE. PACIENTE ACOMETIDO DE NEOPLASIA MALIGNA. METÁSTASE. FALECIMENTO DO AUTOR NO CURSO DA DEMANDA. DIREITO À INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TRANSMISSIBILIDADE AOS HERDEIROS. NATUREZA PATRIMONIAL. NEGATIVA DE COBERTURA DE MEDICAMENTO ANTINEOPLÁSICO. USO OFF LABEL. POSSIBILIDADE. LAUDO MÉDICO ATESTANDO A NECESSIDADE DO TRATAMENTO. RELAÇÃO DE CONSUMO. CLÁUSULA RESTRITIVA ABUSIVA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou parcialmente procedente ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais, condenando a operadora de plano de saúde a indenizar os danos morais causados em razão de negativa de medicamento antineoplásico. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. As questões em discussão são as seguintes: (i) verificar se o direito à indenização por danos morais é transmitido aos herdeiros após o falecimento do autor; (ii) analisar se há legitimidade da negativa da operadora de saúde quanto à cobertura do medicamento Pembrolizumabe; (iii) analisar se o dano moral foi configurado em razão da recusa indevida de tratamento e se o montante indenizatório é razoável e proporcional. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Preliminar de extinção do feito sem resolução do mérito pelo falecimento do autor: eventual direito à indenização, ou seja, o ganho patrimonial da violação do direito alegado é perfeitamente transmissível aos herdeiros. Preliminar rejeitada. 4. Em se tratando de contratos de planos de saúde, e em não sendo a apelante entidade de autogestão, incidem os princípios e normas estabelecidas no Código de Defesa do Consumidor, destacando-se, a presunção de boa-fé, a função social do contrato e a interpretação mais favorável ao consumidor. 5. A boa-fé contratual deve nortear a interpretação dos contratos, especialmente os de adesão, garantindo que o consumidor receba atendimento adequado. Assim, as cláusulas devem ser analisadas com base na boa-fé objetiva, evitando impor desvantagens excessivas à parte hipossuficiente, conforme os arts. 47 e 51 do Código de Defesa do Consumidor. 6. Mesmo que o presente caso se trate de uso off label do medicamento, conforme alegado pela empresa recorrente, é cediço que cabe ao médico assistente do paciente a indicação do tratamento que melhor se adapta ao caso, não podendo um fármaco ser negado em razão de sua utilização não estar padronizada para o caso ou prevista na bula. Desse modo, não obstante se tratar de uso off label, havendo indicação médica específica de tratamento a ser realizado ao paciente e registro na ANVISA, mostra-se indevida a recusa do tratamento pela operadora. 7. O dano moral decorre do sofrimento e angústia suportados pelo autor diante da recusa indevida de cobertura para tratamento essencial à sua saúde, justificando a fixação da indenização no montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais). IV. DISPOSITIVO 8. Apelação cível conhecida e desprovida. ____________ […] (Apelação Cível - 0245005-21.2020.8.06.0001, Rel. Desembargador(a) RAIMUNDO NONATO SILVA SANTOS, 3ª Câmara Direito Privado, data do julgamento: 02/04/2025, data da publicação: 02/04/2025) PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA MÉDICO-HOSPITALAR. TRATAMENTO ONCOLÓGICO. LEI Nº 9.656/98. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. DANO MORAL RECONHECIDO IN RE IPSA. VALOR QUE DEVE SER ARBITRADO COM RAZOABILIDADE. RECURSO PROVIDO. Plano de saúde. Negativa de cobertura médico-hospitalar. Tratamento oncológico. Ofensa à Lei nº 9.656/98. Ofensa ao Código de Defesa do Consumidor. Procedência do pedido. Dano moral reconhecido in re ipsa. Indenização que deve ser fixada com proporcionalidade e razoabilidade (R$ 15.000,00). Recurso provido. (TJ-SP - APL: 10018743220168260587 SP 1001874-32.2016.8.26.0587, Relator: J.B. Paula Lima, Data de Julgamento: 15/01/2019, 10ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 15/01/2019) Com efeito, tendo em vista a linha argumentativa apresentada pela parte recorrente, não merece acolhimento o pleito de ausência de dano moral, bem como o pedido de redução do quantum fixado. DO DISPOSITIVO DIANTE DO EXPOSTO, conheço do recurso, mas para NEGAR-LHE PROVIMENTO, mantendo inalterada a decisão do Juízo primevo, por seus próprios e jurídicos fundamentos. Por derradeiro, com fulcro no artigo 85, 11º, do CPC, majoro o valor dos honorários advocatícios para R$ 3.000,00 (três mil reais). É como voto. Fortaleza, 9 de abril de 2025. DESEMBARGADORA MARIA DE FÁTIMA DE MELO LOUREIRO Relatora
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