Processo nº 0011601-45.2012.4.03.6181
ID: 308821323
Tribunal: TRF3
Órgão: 2ª Vara Criminal Federal de São Paulo
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0011601-45.2012.4.03.6181
Data de Disponibilização:
26/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CLAUDIA VARA SAN JUAN ARAUJO
OAB/SP XXXXXX
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GUILHERME SAN JUAN ARAUJO
OAB/SP XXXXXX
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VITOR ALEXANDRE DE OLIVEIRA E MORAES
OAB/SP XXXXXX
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LORENA OTERO
OAB/SP XXXXXX
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ALINE ABRANTES AMORESANO
OAB/SP XXXXXX
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CAMILLA CABREIRA UNGARI
OAB/SP XXXXXX
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RICARDO NACARINI
OAB/SP XXXXXX
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DANIELA TRUFFI ALVES DE ALMEIDA
OAB/SP XXXXXX
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EDUARDO MEDALJON ZYNGER
OAB/SP XXXXXX
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MARIA ELIZABETH QUEIJO
OAB/SP XXXXXX
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AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Nº 0011601-45.2012.4.03.6181 / 2ª Vara Criminal Federal de São Paulo AUTOR: M. P. F. -. P. REU: C. E. S., P. H. S. ACUSADO - PUNIBILIDADE EXTINTA: R. T. S., …
AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Nº 0011601-45.2012.4.03.6181 / 2ª Vara Criminal Federal de São Paulo AUTOR: M. P. F. -. P. REU: C. E. S., P. H. S. ACUSADO - PUNIBILIDADE EXTINTA: R. T. S., M. T. S., S. T. S., M. A. M. C. Advogados do(a) ACUSADO - PUNIBILIDADE EXTINTA: CLAUDIA VARA SAN JUAN ARAUJO - SP298126, GUILHERME SAN JUAN ARAUJO - SP243232, VITOR ALEXANDRE DE OLIVEIRA E MORAES - SP368781 Advogados do(a) REU: ALINE ABRANTES AMORESANO - SP318279, MARIA ELIZABETH QUEIJO - SP114166 Advogados do(a) REU: ALINE ABRANTES AMORESANO - SP318279, EDUARDO MEDALJON ZYNGER - SP157274, MARIA ELIZABETH QUEIJO - SP114166, RICARDO NACARINI - SP343426 Advogados do(a) ACUSADO - PUNIBILIDADE EXTINTA: DANIELA TRUFFI ALVES DE ALMEIDA - SP261302, EDUARDO MEDALJON ZYNGER - SP157274 Advogados do(a) ACUSADO - PUNIBILIDADE EXTINTA: ALINE ABRANTES AMORESANO - SP318279, CAMILLA CABREIRA UNGARI - SP369038, DANIELA TRUFFI ALVES DE ALMEIDA - SP261302, EDUARDO MEDALJON ZYNGER - SP157274, RICARDO NACARINI - SP343426 TERCEIRO INTERESSADO: D. E. F. S. D. A. ADVOGADO do(a) TERCEIRO INTERESSADO: HENRIQUE RODRIGUES FORSSELL - SP226961 ADVOGADO do(a) TERCEIRO INTERESSADO: FELIPE SILVA VIEIRA - SP350317 ADVOGADO do(a) TERCEIRO INTERESSADO: OCTAVIANO BAZILIO DUARTE FILHO - SP173448 S E N T E N Ç A Cuida-se de ação penal movida pelo Ministério Público Federal inicialmente em desfavor de C. E. S., P. H. S., R. T. S., M. T. S., S. T. S., MARIA ÂNGELA MORA CABRAL, RÉGIS MOREIRA BORGES, M. D. L. S. E O. O. D. F. J., em razão da suposta prática dos crimes previstos nos artigos 4º, caput e parágrafo único, 5º, 6º, 10 e 17, todos da Lei nº 7.492/86 e no artigo 288 do Código Penal. Narra a exordial (ID 35662574, pp. 3/52), em apertada síntese, que, entre os anos de 2008 e 2010, os denunciados C. E. S., P. H. S., R. T. S., M. T. S., SALIM TAUFLIC SCHAHIN e MARIA ÂNGELA MORA CABRAL teriam gerido de modo hipoteticamente fraudulento o Banco Schahin S/A (CNPJ nº 50.585.090/0001-06), mediante elevação, em tese, artificial dos resultados da instituição, bem como de operações simuladas, registros de ativos insubsistentes e demonstrações contábeis supostamente inverídicas. Além disso, teriam participado, também, da concessão de empréstimos vedados, abstendo-se, ainda, da adoção de providências de interesse da instituição financeira. Em razão disso, o Banco Central instaurou processo administrativo e comunicou o Ministério Público Federal a respeito dos fatos em questão, o que deu ensejo à posterior instauração de inquérito policial e, a seguir, da apresentação da peça acusatória. A denúncia foi recebida por este Juízo em 28 de junho de 2017 (ID 35662574, pp. 60/61). Em sede de resposta à acusação, a i. defesa de R. M. B. (ID 35662575, pp. 19/40) alegou a inépcia da denúncia, uma vez que as acusações teriam sido imputadas de modo genérico, sem a descrição das condutas que se amoldariam aos delitos imputados a REGIS. Ademais, pugnou pelo reconhecimento da falta de justa causa para a ação penal, uma vez que os autos do procedimento administrativo e os elementos colhidos no inquérito policial não indicariam a participação do acusado nos crimes apurados. De igual modo, aduziu excesso de acusação em razão da imputação do delito de associação criminosa supostamente inexistente. No mérito, aduziu que REGIS não geria e não tomava decisões vinculadas ao Banco Schahin, e que não haveria indicativos de unidade de desígnios ou habitualidade com o fim de praticar crimes aptos a configurar o ilícito de associação criminosa – requerendo, assim, sua absolvição. Em igual sentido, a i. defesa de M. D. L. S. (ID 35662576, pp. 3/51) e de ORLANDO OCTÁVIO DE FREITAS JUNIOR (ID 35662577, pp. 8/56) alegou, em síntese, a inépcia da denúncia por suposta ausência de individualização e descrição dos fatos que lhes foram imputados. Além disso, pugnou pela absolvição sumária em razão de suposta atipicidade das condutas. Em 4 de setembro de 2019, este Juízo acolheu o pedido formulado pela i. defesa de M. D. L. S. e ORLANDO OCTÁVIO DE FREITAS JUNIOR para determinar a suspensão do processo, estendendo os efeitos aos demais acusados, até o julgamento do Recurso Extraordinário nº 1.055.941 pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal (ID 35661749, pp. 57/58). A seguir, em 29 de janeiro de 2020, foi determinada a retomada do trâmite regular do feito, em virtude da r. decisão proferida pela Suprema Corte nos autos do sobredito Recurso Extraordinário (ID 35661749, p. 63). Os autos foram virtualizados e, após, em 30/07/2021, este Juízo declarou extinta a punibilidade de R. T. S., M. T. S., S. T. S. e MARIA ÂNGELA MORA CABRAL em razão da prescrição da pretensão punitiva (ID 58734715). A seguir, C. E. S. foi citado em 10/12/2021 (ID 182738993), tendo apresentado resposta em 07/01/2022 (ID 238965787). Afirmou, preliminarmente, que a exordial acusatória seria inepta, ante a suposta ausência de descrição individualizada das condutas cometidas, em tese, por CARLOS EDUARDO, e que haveria excesso de acusação em razão da imputação do delito de associação criminosa. No mérito, requereu a absolvição, ao argumento de que não haveria indícios da prática de crimes financeiros e do delito previsto no artigo 288 do Código Penal. Considerando a sua não localização, P. H. S. foi citado por edital (ID 261463168), havendo, a seguir, o desmembramento do feito no que diz respeito aos fatos a ele imputados, formando-se os autos de nº 5007303-70.2022.4.03.6181 (ID 263829356). Desse modo, a ação penal prosseguiu, nestes autos, em relação a C. E. S., R. M. B., M. D. L. S. e O. O. D. F. J.. Posteriormente, considerando que P. H. S. apresentou resposta à acusação nos autos de nº 5007303-70.2022.4.03.6181 e, também, neste processo (ID 263836855), e que as duas ações penais se encontravam na mesma fase processual, este Juízo determinou a reunião dos feitos para análise conjunta das peças defensivas e tramitação única nos autos de nº 0011601-45.2012.4.03.6181 (ID 275885315; ID 274923260 dos autos nº 5007303-70.2022.4.03.6181). Analisadas as respostas à acusação apresentadas, rejeitou-se a denúncia em relação aos réus R. M. B., M. D. L. S. e O. O. D. F. J., pela inépcia da peça acusatória, com fundamento no art. 395, I, do Código de Processo Penal (ID 274855558). De outro lado, inexistindo hipóteses de absolvição sumária em relação a CARLOS SCHAHIN e PEDRO SCHAHIN, foi determinado o prosseguimento da ação penal e designadas audiências de instrução e julgamento (ID 274855558). Em 04/12/2023, foi aberta audiência de instrução e julgamento em que foram ouvidas as testemunhas de acusação Cláudio Jaloretto, Sidney Correa Marques e Cyro José Telles dos Santos (ID 309055324). Em 06/12/2023, foi ouvida a testemunha de defesa Renato Maurício Porto Reis. Foram homologados os pedidos de desistência das oitivas das demais testemunhas e, assim, foram realizados os interrogatórios (ID 309410561). Na fase do art. 402 do CPP, o MPF nada requereu. A Defesa dos réus, por sua vez, solicitou prazo para apresentação de documentos. Assim, foi concedido prazo de 5 (cinco) dias para a juntada de tais documentos, estabelecendo-se desde logo que, decorrido o prazo, seria dada vista ao MPF para apresentação de alegações finais em 5 (cinco) dias, nos termos do art. 403, § 3º, do CPP e, sucessivamente, seria aberta vista à Defesa para o mesmo fim e no mesmo prazo. A i. Defesa dos réus juntou cópia da inicial da Ação Anulatória de Penalidade Administrativa nº 0001972-23.2017.4.03.6100, em trâmite perante a 4ª Vara Cível Federal de São Paulo, promovida pelos requerentes, entre outros, em face da União Federal e do Banco Central do Brasil, e que tem por objeto o Processo Administrativo nº 1201543644 que sancionou os requerentes com penas de inabilitação e multa, na condição de ex-Diretores do Banco Schahin (IDs 309719523 a 309719535). O Ministério Público Federal (MPF) apresentou alegações finais, em forma de memoriais, pleiteando a rejeição das preliminares arguidas pela Defesa. No mérito, sustentou que: i) o Procedimento PT nº 12001547024 informou a gestão fraudulenta na administração do Banco Schahin S/A, entre os anos de 2008 e 2010, e que os diretores do Banco Schahin S/A elevaram os resultados do banco, mediante operações simuladas; registro de ativo insubsistente; e demonstrações contábeis-financeiras não fidedignas; ii) C. E. S., PEDRO SCHAHIN e Maria Ângela Mora Cabral eram diretores do Banco Schahin S/A à época dos fatos; iii) foram inseridos elementos falsos em demonstrativos financeiros do Banco Schahin S/A, de modo a induzir em erro investidores e o órgão fiscalizador. Para tanto, foram realizadas manobras para a elevação artificial dos resultados da instituição financeira, a exemplo de vendas e cessões de operações de crédito, ou de certificados a ela correspondentes, de forma simulada e o fracionamento/cessão parcial de operações de crédito em atraso, evitando o provisionamento das parcelas vencidas; iv) o Banco Schahin S/A concedeu empréstimo vedado à empresa ligada à HHS Participações, mediante interposição do Banco Lemon e do FIDC Multisetorial Empresarial LP; v) por ordem de seus dirigentes, o Banco Schahin S/A não publicou as suas demonstrações financeiras semestrais e anuais, referentes às datas-base de 31.12.2010 e 30.6.2011, o que constituiria ato de gestão temerária, deixando clientes, investidores e demais instituições do Sistema Financeiro Nacional privados do acesso a informações relevantes sobre a situação patrimonial do Banco dentro do prazo previsto em norma; vi) os dirigentes do Banco Schahin S/A omitiram-se no envio ao órgão fiscalizador das informações financeiras trimestrais, atuando de forma desidiosa e irregular com relação ao mercado financeiro e investidores privando-os da obtenção de informações, ocultando sua verdadeira situação deficitária, o que, também, constituiria ato de gestão temerária; (vii) em relação à autoria delitiva, o MPF sustentou que C. E. S., ex-Diretor Presidente (30.4.2008 – 18.8.2011), ex-Diretor de gerenciamento de risco operacional (13.7.2007 – 18.8.2011), ex-Diretor responsável pelo risco cambial (13.7.2007 – 18.8.2011) e ex-Diretor responsável pelas operações de câmbio (18.6.2008 a 18.8.2011), assinou o contrato de cessão de crédito cruzado com o Banco Panamericano de 30.10.2009 e o contrato de cessão entre o Banco Schahin e a Schahin Securitizadora de 28.12.2009; (viii) P. H. S., ex-Diretor responsável pela carteira comercial (13.7.2007 a 18.8.2011), ex-Diretor responsável pelo SCR (18.6.2008 a 18.8.2011), ex-Diretor responsável pela área contábil (18.6.2008 a 18.8.2011) e ex-Diretor responsável pelo gerenciamento de risco de crédito (30.10.2009 a 18.8.2011), assinou contratos com a Continental Securitizadora e autorizou instruções da Cifra CFI referentes ao provimento de recursos à Continental Securitizadora; (ix) CARLOS EDUARDO e PEDRO SCHAHIN devem ser responsabilizados pela concessão do empréstimo vedado; o primeiro porque tinha, como Diretor Presidente e responsável pelo gerenciamento do risco operacional, o dever de fiscalizar as operações realizadas pelo Banco Schahin S/A, e o segundo por ter assinado o termo de subscrição de cotas do Fundo Multissetorial Empresarial; (x) CARLOS EDUARDO e PEDRO SCHAHIN devem ser responsabilizados pelos atos de gestão temerária, notadamente à vista da posição por eles ocupada no Banco Schahin S/A; (xi) CARLOS EDUARDO teve, em suas contas, créditos oriundos do Banco Schahin S/A, no valor total de R$ 950.000,00 no ano de 2009, não declarado em seu IRPF referente a este ano-calendário, apropriando-se, assim, de valores da instituição financeira. Afirmou, também, que, nas contas deste réu, aportaram valores oriundos da HHS Participações S.A., MTS Participações Ltda. e Satash Participações, totalizando R$ 9.889.000,00, muito superiores aos valores por ele declarados em Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF); (xi) PEDRO SCHAHIN recebeu R$ 135.000,00, oriundos do Banco Schahin S/A, não declarados em seu IRPF do ano-exercício de 2010, apropriando-se indevidamente de valores pertencentes à instituição financeira; (xi) os ex-administradores do Banco Schahin S/A, atuando para a gestão fraudulenta, criaram artifícios para encobrir, mediante demonstrativos financeiros forjados, a real e deficitária situação econômico-financeira da instituição, realizaram empréstimo vedado e deixaram de adotar procedimentos indispensáveis à sua diligente condução. Tais indivíduos teriam conhecimento e, também, teriam sido coniventes com os fatos apurados, o que se poderia visualizar nas cópias das atas das assembleias do Banco Schahin S/A (fls. 1199/1214 e 847/1884 dos autos principais); (xii) houve comunhão de esforços e desígnios, compondo os ex-administradores, contadores e auditores uma associação criminosa; (xiii) os réus foram condenados na ação penal nº 0011107-20.2011.4.03.6181 que, embora não digam respeito aos mesmos fatos, demonstra condenação pretérita pela prática do crime do art. 17 da Lei 7.492/86; (xiii) na dosimetria das penas, deve ser considerada que a conduta social e a personalidade dos réus, as quais seriam voltadas ao cometimento de crimes do colarinho branco; a culpabilidade deve ser valorada negativamente, assim como as circunstâncias e as consequências do crime; (xiv) na segunda fase, estaria presente a agravante do art. 62, I, do CP; (xv) há de se reconhecer a reincidência dos réus, dada a condenação nos autos nº 0011107-20.2011.4.03.6181; (xvi) os crimes devem ser considerados em concursos material; (xvi) os réus devem ser condenados como incursos nas penas para os crimes do art. 4º, parágrafo único, 6º, 10 e 17 da Lei 7.492/86, e para os crimes do art. 168 e 288 do Código Penal, todos em concurso material (art. 69 do CP) (ID 311679240). A Defesa de C. E. S. apresentou alegações finais, em forma de memoriais, sustentando, preliminarmente, a inépcia da denúncia, ao argumento de que, na denúncia, não houve narrativa de conduta praticada pelo réu que se amoldaria aos delitos contra o sistema financeiro nacional e de associação criminosa e que, também, não houve apontamento de vínculo entre o cargo por ele ocupado no Banco Schahin S/A e o resultado ilícito. No mérito, sustentou que: (i) o réu foi incluído na denúncia somente por ter exercido cargo de Diretor do Banco Schahin no período dos fatos; (ii) o fato de um Diretor ter assinado um documento não significa que tenha efetivamente participado da respectiva operação e de sua aprovação; (iii) é comum Diretores serem nomeados para figurarem como responsáveis por determinada área perante o BACEN sem que, de fato, atuem no dia a dia dela; (iv) havia um colegiado, composto por Diretores e Executivos, que se reúne habitualmente para tomar decisões acerca das operações do Banco, não sendo possível afirmar que CARLOS EDUARDO, por ser o Diretor do Banco Schahin à época, fosse o autor ou tivesse participação em ilicitudes; (v) CARLOS EDUARDO apenas tomou conhecimento dos fatos objeto da presente ação penal a partir do relatório do Banco Central; (vi) ao fim da instrução processual, não foi descortinada qualquer conduta, comissiva ou omissiva, que configurasse os alegados crimes que lhe foram imputados; (vii) não houve elevação artificial de resultados, sendo as cessões de crédito e os contratos firmados, com ou sem obrigação, em estrita observância às normas do BACEN e à Circular nº 3.213/2003; (viii) o Banco Schahin, efetivamente, realizou as operações equivocadamente entendidas como “simuladas” pelo órgão ministerial”; (ix) em 2010, o BACEN optou por questionar a contabilização vigente à época, passando a exigir a adoção de novo procedimento previsto na Resolução 3533/2008, que teve seu início postergado para o ano de 2012; (x) O Banco Central aplicou indevidamente norma posterior (Res. 3533/2008), quando a vigente à época (Circ. 3213/2003), corretamente observada pelo Banco Schahin, autorizava o reconhecimento imediato do resultado, levando a uma equivocada imputação de lucro artificial; (xi) houve Parecer Técnico de Natureza Contábil, que elucidou este ponto (ID 238966361, pp. 3/6); (xi) as operações de cessões de crédito e contratos efetuadas pelo Banco Schahin são plenamente legítimas e regulares; (xii) na operação de subscrição de quotas do FIDC Multisetorial Ajax LP pelo Banco Schahin S/A, não houve simulação, o que, também, foi esclarecido pelo Parecer Técnico de Natureza Contábil (pp. 10/11 do ID 238966361), ratificado, em Juízo, pela testemunha Renato Maurício Porto Reis; (xiii) não houve simulação no tocante à cessão de crédito para a empresa Continental Securitizadora S.A., que se deu forma absolutamente regular, nem se cogita de simulação nas chamadas cessões de crédito “cruzadas” envolvendo o Banco Semear S.A., o Banco Panamericano e o Banco Ficsa S.A; (xiv) no que se refere ao tratamento contábil dispensado para a recompra dos Certificados de Crédito Bancário com classificação “A” a “C” pelo Banco Schahin, o Parecer Técnico de Natureza Contábil o elucida (pp. 16/217 do ID 238966361), sendo o documento ratificado, também, pela testemunha Renato Maurício Porto Reis; (xiv) em relação à cessão de crédito com coobrigação ao Banco ABC Brasil, ocorrida em maio de 2010, igualmente não há que se falar em simulação (p. 17/18 do ID 238966361); (xv) não ficou demonstrada a alegada elevação artificial do resultado do Banco, ao contabilizar, como receita, valores recebidos por liquidação antecipada de operações cedidas com coobrigação; (xvi) a alegação de manutenção de ativo insubsistente, também, não se sustenta; (xvii) Em razão da crise de 2008, o Banco Schahin tentou resgatar suas aplicações no Clariden Bank (US$ 89.730.000,00), entre 31/10/2006 e 10/4/2007), e foi surpreendido com a informação de que suas aplicações estariam vinculadas a um contrato de empréstimo de US$ 70 milhões, supostamente firmado em 2007, mas que, na verdade, foi falsificado; (xviii) o Banco Schahin foi vendido ao BMG, que não deu sequência nas tratativas iniciadas por CARLOS EDUARDO, no sentido de recuperação dos valores; (xix) referido ativo, tido como insubsistente, só poderia ser baixado da contabilidade na data do vencimento, e transformado em caixa caso houvesse o resgate do valor conforme contratado, ou feita qualquer provisão para alguma possível perda caso houvesse inadimplência naquele momento do vencimento, de modo que a informação contábil do Banco Schahin na época dos fatos encontrava- se plenamente regular; (xx) não houve concessão de empréstimo vedado e o fato de as operações terem sido na mesma data, em valor semelhante, nem de longe evidencia a sua ocorrência; (xxi) o tipo penal do art. 17 da Lei 7.492/86, que classifica o delito de concessão de empréstimo vedado, passou a ser norma penal em branco cujo complemento normativo é integrado pelo disposto no art. 34 da Lei nº 4.595/64, da chamada Lei Bancária; (xxii) Mencionado artigo 34, que também foi alterado pela Lei nº 13.506/2017, dispõe que, para a configuração do delito do delito em questão, além do empréstimo ser tomado pelas pessoas relacionadas no art. 25 da Lei do Colarinho Branco, necessário que a operação seja incompatível com as condições de mercado. Do contrário, não será considerado crime; (xxiii) Por se tratar de alteração mais benéfica ao réu, referida alteração deve retroagir a casos pretéritos, como o dos autos, para reconhecimento de abolitio criminis dos casos que se enquadram na exceção contida na norma penal integradora do tipo penal, em decorrência do princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica ao réu previsto na Constituição Federal; (xxiv) as operações são plenamente regulares e foram realizadas em condições compatíveis com as do mercado à época dos fatos, de modo que não houve delito de concessão de empréstimo vedado na espécie; (xxv) quanto à gestão temerária, o Banco Schahin entregou as informações contábeis ao Banco Central, conforme se comprovou em petição protocolizada em 29 de setembro de 2015 (ID 238966358); (xxvi) pela petição, comprova-se que foram prestadas as informações relativas a dezembro de 2010, sem qualquer atraso, o que somente ocorreu com relação às informações referentes a junho de 2011, já sob a gestão do BMG, que adquiriu o Banco Schahin naquele período; (xxvii) as demonstrações financeiras estavam disponíveis para consulta pelo mercado no site do Banco Central, não havendo que se falar em ocultar “do mercado e do Banco Central sua verdadeira situação”, como erroneamente infere a acusação.; (xxviii) a não publicação das demonstrações financeiras se deu por conta da falta de parecer técnico dos auditores independentes (BDO Auditores, posteriormente adquirida pela KPMG), que divergiam acerca do tratamento contábil a ser dado a um crédito tributário nas aludidas demonstrações. Na decisão de nº 1708/2012, o BACEN afasta a responsabilidade de C. E. S. pela não publicação das demonstrações financeiras da data base 30.6.2011; (xxix) quanto à apropriação de recursos financeiros, o Parecer Técnico Crítico aos Laudos de Perícia Criminal elucidou que CARLOS era apenas um dos muitos procuradores com poderes parciais para representação das empresas que eram reais titulares das contas bancárias consideradas como de sua titularidade; (xxx) “não haveria como vincular os valores apontados a título de ‘incompatibilidade’ no trabalho realizado pela Polícia Científica, que conteria erros grosseiros inteiramente encampados pela acusação, com a materialidade das irregularidades objeto da presente ação penal”; (xxxi) dada a ausência de dolo, fraude e perigo concreto de dano, não há que se falar em delito de gestão fraudulenta; (xxxii) as diversas condutas imputadas a C. E. S. caracterizariam, caso retratassem a realidade dos fatos, um único delito de gestão fraudulenta, absorvendo os delitos de inserção de elementos falsos em demonstrativos financeiros, indução em erro dos investidores, concessão de empréstimo vedado, apropriação indébita financeira e gestão temerária; (xxxiii) os fatos tipificados como associação criminosa não têm autonomia em relação às imputações de crimes financeiros. Ao contrário, a narrativa acusatória quanto à associação criminosa coincide com aquelas articuladas para os demais delitos, que se baseiam no concurso de pessoas; (xxxiv) os réus se reuniram para o exercício de atividades em instituição financeira, não para formar associação criminosa. Assim, a Defesa considerou cabível, preliminarmente, a decretação da nulidade do feito, ab initio, em razão da inépcia da denúncia ou, subsidiariamente, a absolvição de CARLOS EDUARDO, com fundamento no art. 386, III, do CPP (ID 312968008). A Defesa de PEDRO SCHAHIN apresentou alegações finais, em forma de memoriais, sustentando, preliminarmente a inépcia da denúncia, ao argumento, em síntese, de que a denúncia não narra de que modo o acusado teria realizado, ordenado ou participado das operações tidas por irregulares, nem descreve adequadamente a associação criminosa. No mérito, sustentou que: (i) o réu foi denunciado, tão somente, por ter exercido o cargo de Diretor do Banco Schahin no período dos fatos, o que se repetiu nos memoriais da acusação; (ii) o réu atuava na área comercial do Banco Schahin, de modo que questões relacionadas a cessões de crédito, empréstimo, ativos do banco, publicação e remessa de demonstrações financeiras não passavam por ele, nem a título de consulta; (iii) o fato de ter assinado um documento não significa que tenha efetivamente participado da operação ou de sua aprovação; (iv) é comum Diretores serem nomeados para figurarem como responsáveis por determinada área perante o BACEN sem que, de fato, atuem no dia a dia dela; (v) havia um colegiado, composto por Diretores e Executivos, que se reunia habitualmente para tomar decisões acerca das operações do Banco, não sendo possível afirmar que PEDRO SCHAHIN, por ser Diretor do Banco Schahin à época, fosse o autor ou tivesse participação em ilicitudes; (vi) PEDRO SCHAHIN apenas tomou conhecimento dos fatos objeto da presente ação penal a partir do relatório do Banco Central; (vii) ao fim da instrução processual, não foi descortinada qualquer conduta, comissiva ou omissiva, que configurasse os alegados crimes que lhe foram imputados; (viii) não houve elevação artificial de resultados, sendo as cessões de crédito e os contratos firmados, com ou sem obrigação, em estrita observância às normas do BACEN e à Circular nº 3.213/2003; (ix) o Banco Schahin, efetivamente, realizou as operações equivocadamente entendidas como “simuladas” pelo órgão ministerial; (x) em 2010, o BACEN optou por questionar a contabilização vigente à época, passando a exigir a adoção de novo procedimento previsto na Resolução 3533/2008, que teve seu início postergado para o ano de 2012; (xi) O Banco Central aplicou indevidamente norma posterior (Res. 3533/2008), quando a vigente à época (Circ. 3213/2003), corretamente observada pelo Banco Schahin, autorizava o reconhecimento imediato do resultado, levando a uma equivocada imputação de lucro artificial; (xii) houve Parecer Técnico de Natureza Contábil, que elucidou este ponto (ID 238966361, pp. 3/6); (xiii) as operações de cessões de crédito e contratos efetuadas pelo Banco Schahin são plenamente legítimas e regulares; (xiv) na operação de subscrição de quotas do FIDC Multisetorial Ajax LP pelo Banco Schahin S/A, não houve simulação, o que, também, foi esclarecido pelo Parecer Técnico de Natureza Contábil (pp. 10/11 do ID 238966361), ratificado, em Juízo, pela testemunha Renato Maurício Porto Reis; (xv) não houve simulação no tocante à cessão de crédito para a empresa Continental Securitizadora S.A., que se deu forma absolutamente regular, nem se cogita de simulação nas chamadas cessões de crédito “cruzadas” com o Banco Semear S.A., o Banco Panamericano e o Banco Ficsa S.A; (xvi) no que se refere ao tratamento contábil dispensado para a recompra dos Certificados de Crédito Bancário com classificação “A” a “C” pelo Banco Schahin, o Parecer Técnico de Natureza Contábil o elucida (pp. 16/217 do ID 238966361), tendo sido o documento ratificado, também, pela testemunha Renato Maurício Porto Reis; (xvii) em relação à cessão de crédito com coobrigação ao Banco ABC Brasil, ocorrida em maio de 2010, igualmente não há que se falar em simulação (p. 17/18 do ID 238966361); (xviii) não ficou demonstrada a alegada elevação artificial do resultado do Banco, ao contabilizar, como receita, valores recebidos por liquidação antecipada de operações cedidas com coobrigação; (xix) a alegação de manutenção de ativo insubsistente, também, não se sustenta; (xx) Em razão da crise de 2008, o Banco Schahin tentou resgatar suas aplicações no Clariden Bank (US$ 89.730.000,00, entre 31/10/2006 e 10/4/2007) e foi surpreendido com a informação de que suas aplicações estariam vinculadas a um contrato de empréstimo de US$ 70 milhões, supostamente firmado em 2007, mas que, na verdade, foi falsificado; (xxi) o Banco Schahin foi vendido ao BMG, que não deu sequência nas tratativas iniciadas pela gestão anterior, no sentido de recuperação dos valores; (xxii) referido ativo, tido como insubsistente, só poderia ser baixado da contabilidade na data do vencimento, e transformado em caixa, caso houvesse o resgate do valor conforme contratado, de modo que a informação contábil do Banco Schahin na época dos fatos encontrava-se plenamente regular; (xxiii) não houve concessão de empréstimo vedado e o fato de as operações terem sido na mesma data, em valor semelhante, nem de longe evidencia a sua ocorrência; (xiv) o tipo penal do art. 17 da Lei 7.492/86, que classifica o delito de concessão de empréstimo vedado, passou a ser norma penal em branco cujo complemento normativo é integrado pelo disposto no art. 34 da Lei nº 4.595/64 (denominada Lei Bancária); (xv) mencionado artigo 34, que também foi alterado pela Lei nº 13.506/2017, dispõe que, para a configuração do delito do delito em questão, além do empréstimo ser tomado pelas pessoas relacionadas no art. 25 da Lei do Colarinho Branco, necessário que a operação seja incompatível com as condições de mercado. Do contrário, não será considerado crime; (xvi) Por se tratar de alteração mais benéfica ao réu, referida alteração deve retroagir a casos pretéritos, como o dos autos, para reconhecimento de abolitio criminis dos casos que se enquadram na exceção contida na norma penal integradora do tipo penal, em decorrência do princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica ao réu previsto na Constituição Federal; (xvii) as operações são plenamente regulares e foram realizadas em condições compatíveis com as do mercado à época dos fatos, de modo que não houve delito de concessão de empréstimo vedado na espécie; (xxviii) quanto à gestão temerária, o Banco Schahin entregou as informações contábeis ao Banco Central, conforme se comprovou em petição protocolizada em 29 de setembro de 2015 (ID 238966358); (xxix) pela petição, comprova-se que foram prestadas as informações para dezembro de 2010, sem qualquer atraso, o que somente ocorreu com relação às informações referentes a junho de 2011, já sob a gestão do BMG, que adquiriu o Banco Schahin naquele período; (xxx) as demonstrações financeiras estavam disponíveis para consulta pelo mercado no site do Banco Central, não havendo que se falar em ocultar “do mercado e do Banco Central sua verdadeira situação”, como erroneamente infere a acusação; (xxxi) a não publicação das demonstrações financeiras se deu por conta da falta de parecer técnico dos auditores independentes (BDO Auditores, posteriormente adquirida pela KPMG), que divergiam acerca do tratamento contábil a ser dado a um crédito tributário nas aludidas demonstrações. Na decisão de nº 1708/2012, o BACEN afasta a responsabilidade de todos os Diretores pela não publicação das demonstrações financeiras da data base 30.6.2011; (xxxii) quanto à apropriação de recursos financeiros, o Parecer Técnico Crítico aos Laudos de Perícia Criminal elucidou que valor apontado pela acusação como sendo superior ao declarado no IR não tem expressividade quando comparado com o patrimônio do acusado à época, não havendo “como vincular os valores apontados a título de ‘incompatibilidade’ no trabalho realizado pela Polícia Científica com a materialidade das irregularidades objeto da presente ação penal”; (xxxiii) dada a ausência de dolo, fraude e perigo concreto de dano, não há que se falar em delito de gestão fraudulenta; (xxxiv) as diversas condutas imputadas a PEDRO SCHAHIN caracterizariam, caso retratassem a realidade dos fatos, um único delito de gestão fraudulenta, absorvendo os delitos de inserção de elementos falsos em demonstrativos financeiros, indução em erro dos investidores, concessão de empréstimo vedado, apropriação indébita financeira e gestão temerária; (xxxv) os fatos tipificados como associação criminosa não têm autonomia em relação às imputações de crimes financeiros. Ao contrário, a narrativa acusatória quanto à associação criminosa coincide com aquelas articuladas para os demais delitos, que se baseiam no concurso de pessoas; (xxxvi) os réus se reuniram para o exercício de atividades em instituição financeira, não para formar associação criminosa. Assim, a Defesa considerou cabível, preliminarmente, a decretação da nulidade do feito, ab initio, em razão da inépcia da denúncia ou, subsidiariamente, a absolvição de P. H. S., com fundamento no art. 386, III, do CPP. Vieram os autos à conclusão. É o relatório. Decido. 1) Da emendatio libelli Na hipótese dos autos, o Ministério Público Federal (MPF), além de imputar aos réus a conduta de gestão fraudulenta (artigo 4º, caput, da Lei 7.492/86), imputa também a prática dos crimes de induzimento e manutenção de sócio, investidor ou repartição pública competente em erro (art. 6º da Lei 7.492/86); falsidade em demonstrativos contábeis (art. 10 da Lei 7.492/86); e concessão de empréstimo ou adiantamento ilegal (art. 17 da Lei 7.492/86). A narrativa da denúncia, entretanto, evidencia que as condutas enquadradas pelo órgão ministerial nos tipos do artigo 6º, 10 e 17, inserem-se no próprio contexto da gestão fraudulenta supostamente engendrada no âmbito do Banco Schahin S/A. Não se trata de condutas praticadas de forma autônoma, mas de atos diretamente ligados ao modo de administração implementado na instituição, que teria por objetivo simular situação contábil perante o mercado e o órgão regulador ou abastecer, com empréstimo vedado e por via de fraude, empresa controlada pelos diretores do Banco Schahin (HHS Participações). Assim, as condutas acima enumeradas devem ser compreendidas como fragmentos de um enredo maior relacionado ao crime do art. 4º, caput, da Lei 7.492/86. Cabe dizer que, em geral, verifica-se a prática dos crimes do art. 6º, 10 e 17, todos da Lei 7.492/86 em situações pontuais, em que tais delitos se concretizam de forma independente, desassociados de eventual gestão fraudulenta da instituição financeira. Pertinentes se fazem as lições de BITENCOURT a respeito do tema (In: Tratado de direito penal econômico, v. 1. Rio de Janeiro: Saraiva Jur, 2016. E-book. P.254.): “(...) quando o legislador desejou punir determinado ato fraudulento, isoladamente, independentemente do exercício da atividade de gestão, o fez de forma individual e de maneira expressa, como, por exemplo, nos arts. 6º (sonegar informação ou prestá-la falsamente); 7º (emissão irregular de títulos ou valores mobiliários)); 9º (falsidade ideológica financeira) e 10º (falsidade de demonstrativos contábeis). Em todas essas infrações, o crime consuma-se com a prática de um único ato fraudulento, ao contrário da previsão do art. 4º, que demanda um conjunto de atos fraudulentos que constituem a gestão irregular de uma instituição financeira”. Ou seja, as condutas interpretadas pelo Ministério Público Federal como subsumíveis aos artigos 6º, 10 e 17, todos da Lei 7.492/86, enquadram-se, à luz do conjunto probatório, de forma mais adequada na tipificação do delito de gestão fraudulenta. Sendo assim, considerando que os réus se defendem dos fatos narrados na denúncia, e não da sua qualificação jurídica, procedo à emendatio libelli, na forma do artigo 383 do Código de Processo Penal – CPP, para reenquadrar as condutas, em tese, criminosas tipificadas pelo órgão acusatório nos artigos 6º, 10 e 17, todos da Lei 7.492/86, na moldura típica do artigo 4º, caput, da mesma Lei. Feita essa consideração inaugural, prossigo. 2) Da preliminar de inépcia da denúncia Ao contrário do que se notou em relação aos outros acusados na fase de análise das respostas à acusação, a denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal faz a devida descrição dos fatos e de suas circunstâncias no que diz respeito a CARLOS EDUARDO e PEDRO SCHAHIN, apontando satisfatoriamente o grau de suas participações no enredo criminoso e a individualização de suas respectivas condutas, não havendo qualquer dificuldade imposta aos corréus capaz de afetar o entendimento daquilo que lhes foi imputado. Ou seja, a exordial acusatória preenche, de fato, os requisitos do Artigo 41 do Código de Processo Penal, descrevendo, de forma clara e suficiente, os fatos criminosos imputados. Vale notar que a aptidão da peça acusatória já foi analisada tanto por ocasião do recebimento da denúncia, quanto durante a análise das respostas à acusação. Em ambas as oportunidades, reconheceu-se que a denúncia expunha com clareza os elementos essenciais à instauração válida do processo penal, não se verificando qualquer prejuízo ao exercício da ampla defesa. A pretensão de rediscutir a suficiência formal da inicial acusatória, neste momento processual, revela-se, portanto, incabível e superada, não havendo razão jurídica para o acolhimento da preliminar de inépcia. 3) Do Mérito A. Do enquadramento típico e da materialidade - Gestão Fraudulenta: O artigo 4º, caput, da Lei 7.492/86 assim dispõe: Art. 4º Gerir fraudulentamente instituição financeira: Pena - Reclusão, de 3 (três) a 12 (doze) anos, e multa. O crime em questão é próprio, somente podendo ser praticado por uma das pessoas relacionadas no art. 25 da Lei 7.492/86: Art. 25. São penalmente responsáveis, nos termos desta lei, o controlador e os administradores de instituição financeira, assim considerados os diretores, gerentes (Vetado). § 1º Equiparam-se aos administradores de instituição financeira (Vetado) o interventor, o liqüidante ou o síndico. O bem jurídico tutelado “[...] É o funcionamento do SFN (TRF1, AC 19990100010905-4, Ribeiro, 4º T., u, 18.7.06), no particular aspecto da credibilidade pública (STJ, REsp 585770, Dipp, 5ª T., u., 7.10.04) no mercado, assim como a saúde financeira da instituição (STF, HC 95515, Ellen, 2ª T., u., 30.9.08) e a proteção do investidor e não a boa-fé dos sócios acionistas e credores (TRF3, HC 200603000979272, Stefanini, 1ª T, u. 24.4.07)”[1]. Em termos de tipicidade objetiva, a gestão fraudulenta de instituição financeira se caracteriza por uma administração empresarial eivada de má-fé, de forma dirigida ao engano de terceiros, valendo-se o administrador de sua posição à frente da instituição financeira para perpetrar atos em desacordo com as suas finalidades e objeto social, do que decorre, ao cabo, a lesão à confiança do mercado financeiro nos atos de direção da pessoa jurídica e à sua credibilidade pública. No caso, a denúncia narra uma série de atos praticados pela alta administração do Banco Schahin S/A, a exemplo de atos de maquiagem de balanços e prestação de falsas informações ao Banco Central que tinham por objetivo simular um falso cenário sobre a situação econômica da instituição financeira. Além disso, houve a exposição na inicial, também, de um ato de concessão de empréstimo legalmente vedado, concedido pelo Banco Schahin S/A, de maneira indireta e por interposta pessoa jurídica, a outra pessoa jurídica controlada por Milton Schahin e Salim Schahin (HHS Participações), que também eram dirigentes da instituição financeira, de modo a burlar a vedação do art. 34, V, d, da Lei nº 4.595/64. A materialidade delitiva encontra-se, em parte, suficientemente provada nos autos. Vejamos. I. - Da inserção de elementos falsos nos demonstrativos financeiros da instituição e da indução em erro nos investidores e do órgão fiscalizador Segundo o Ministério Público Federal (MPF), entre os exercícios de 2009 e 2010, foram empregados artifícios com o propósito de promover a elevação artificial dos resultados financeiros do Banco Schahin, mediante realização de vendas e cessões de operações de crédito ou certificados a elas correspondentes, de forma simulada, e o fracionamento e cessão parcial de operações de crédito em atraso, evitando o provisionamento das parcelas vencidas. Tal elevação inserida nas demonstrações contábeis da instituição financeira foi comunicada ao Banco Central que, conforme o MPF, recebia assim informações não condizentes com a real situação econômico-financeira da instituição. Consta na denúncia, também, que a aludida elevação artificial de resultados alcançou a casa dos R$ 280.000.000,00, registrados nas demonstrações financeiras de dezembro de 2009 e julho de 2010, e que os ex-administradores do Banco Schahin pretendiam se beneficiar da reversão de provisão das operações cedidas sobre o resultado, fato este que, ao final de 2010, comprometeu 200% do patrimônio líquido da instituição (R$ 229.175.000,00). Foram elencadas na denúncia diversas modalidades pelas quais teria sido praticada a referida conduta, as quais passo a analisar de maneira individualizada, a fim de apurar o respectivo enquadramento, ou não, da ação na moldura típica do art. 4º, caput, da Lei 7.492/86. a) Venda de certificados de Cédula de Crédito Bancário para o Banco Lemon S/A De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), o Banco Schahin promoveu a venda de Cédulas de Crédito Bancário (“CCBs”) com coobrigação para o Banco Lemon S/A nos dias 27/12/2010, 28/12/2010 e 29/12/2010, por R$ 82.792.000,00, apurando um lucro contábil de R$ 27.360.000,00. Nas mesmas datas, tais “CCBs” foram transferidas para o Fundo Ajax que, neste mesmo contexto, emitiu 85 (oitenta e cinco) cotas mezanino. Ato contínuo, segundo o MPF, o próprio Banco Schahin subscreveu as referidas cotas mezanino emitidas pelo Fundo Ajax, liquidando-as através de transferências eletrônicas (TEDs) que totalizaram o montante de R$ 85.060.000,00. Desse modo, segundo a Acusação, o Banco Schahin permaneceu, ainda que indiretamente, vinculado à titularidade dos “CCBs”. Afirma-se que o único resultado da operação, para a instituição financeira, foi viabilizar a antecipação da receita futura da carteira utilizada na operação, bem como a geração de um lucro artificial que foi registrado sob essa rubrica em balanços contábeis. Pois bem. Foram juntados a este feito os instrumentos contratuais relacionados às 16 (dezesseis) cessões de crédito envolvendo o Banco Schahin S/A e o Banco Lemon S/A, concretizadas entre os dias 27 e 29/12/2010, intitulados “Nota de Negociação de Ativo Financeiro – Termo de Endosso Com Coobrigação de Certificado de Cédula de Crédito Bancário” (ID 35662812, pp. 56/87). Tais negociações podem ser sintetizadas no quadro esquemático abaixo: Entre 27 e 29/12/2010, as “CCBs” foram novamente transferidas pelo Banco Lemon S/A ao Fundo de Investimento em Direitos Creditórios Multisetorial Ajax LP (Fundo Ajax). A este respeito, consoante apurado pelo Banco Central do Brasil (BACEN): “(...) O Banco Schahin efetuou a venda de 16 Certificados de Cédula de Crédito Bancário em 27, 28 e 29.12.2020 para o Banco Lemon S/A (atual Banco Bracce S.a.), pelo valor de R$ 82.792 mil, apurando um lucro contábil de R$ 27.360 mil. Nas mesmas datas, os certificados foram transferidos para o fundo Ajax, que emitiu 85 cotas mezanino, subscritas pelo Banco Schahin, pelo valor de R$ 85.070 mil e liquidadas por meio de TEDs” (ID 35662811, p. 85). Além destes documentos, houve a juntada nos autos de boletins de subscrição idôneos a demonstrar que o Banco Schahin S/A promoveu aportes milionários no aludido Fundo de Investimento em Direitos Creditórios Multisetorial Ajax LP (Fundo Ajax), por intermédio da aquisição de “cotas subordinadas mezanino” por este emitidas, no mesmo período de alienação dos supracitados “CCBs” (27, 28 e 29 de dezembro de 2010). Nesse sentido, segundo o boletim de subscrição nº 01, houve a subscrição de 2 (duas) cotas pelo Banco Schahin S/A, ao custo total de R$ 2.000.000,00, em documento subscrito por Pedro H. Schahin e Maria Angela M. Cabral (ID 35662812, p. 88). Ademais, conforme o boletim de subscrição nº 02, em 28 de dezembro de 2010, o Banco Schahin S/A subscreveu mais 40 (quarenta) cotas, transferindo, para tanto, a quantia de R$ 40.019.123,01 ao Fundo Ajax, em documento, também, subscrito por PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35662812, p. 90). Por último, consoante o boletim de subscrição nº 03, em 29 de dezembro de 2010, o Banco Schahin S/A subscreveu mais 43 (quarenta e três) cotas, transferindo, para tanto, a quantia de R$ 43.041.124,01 ao Fundo Ajax, em documento, também, subscrito por PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35662812, p. 92). A demonstrar os pagamentos realizados por intermédio de transferência eletrônica (TEDs), constam nos autos os documentos de ID 35662812, pp. 94/108, relacionados aos aportes de recursos realizados pelo Banco Schahin S/A entre os dias 27/12/2010 e 29/12/2020. Tais dados devem ser organizados, de modo a permitir a perfeita compreensão da dinâmica do ato fraudulento. Com a venda das 16 Cédulas de Crédito Bancário (CCBs) ao Banco Lemon S/A, o Banco Schahin S/A pôde, em suas demonstrações contábeis, registrar um lucro imediato de quase R$ 27.360.000,00, sob a rubrica “lucro na cessão Banco Lemon” (livro razão acostado ao ID 35380649, p. 206). Ocorre que os elementos trazidos aos autos demonstram, de maneira nítida, que a alienação dos Direitos Creditórios era mera peça de ficção. Ora, as “CCBs” foram transferidas pelo Banco Lemon S/A para o “Fundo Ajax”, nas mesmas datas das aquisições originárias (27 a 29 de dezembro de 2010). Este Fundo Ajax, também entre 27 e 29 de dezembro de 2010, emitiu 85 cotas mezanino subscritas pelo Banco Schahin S/A pelo valor de R$ 85.060.000,00 (ID 35662812, p. 12), o qual foi transferido pela instituição financeira àquele fundo de investimento por transferência eletrônica (TEDs). Destaque-se que o Banco Schahin S/A, com esta operação, adquiriu cotas que perfaziam o montante de 98,96% do patrimônio líquido do Fundo Ajax (ID 35662811, p. 85). Deste cenário decorre a convicção de que o “Fundo Ajax”, em uma operação circular, adquiriu as “CCBs” com recursos financeiros provenientes do próprio Banco Schahin S/A. Sem a transferência substancial de qualquer dos riscos do ativo e da própria titularidade, as cessões de “CCBs” praticadas pelo Banco Schahin S/A não poderia ser computada como receita financeira real, muito menos a ponto de repercutir na produção de um lucro nos balanços da ordem de R$ 27.360.000,00. Nesse sentido, segundo o Banco Central do Brasil (BACEN): “(...) Assim, além do fato da venda ao Banco Lemon ter sido efetuada com coobrigação do Banco Schahin S/A, em 31.12.2010, as cotas de sua propriedade representavam 98,96% do patrimônio líquido do fundo, denotando que os créditos permaneceram sob sua titularidade mesmo após transitarem pelo Banco Lemon, descaracterizando, desta forma, o objetivo intrínseco à sua venda com coobrigação, que seria a captação de recursos, e-ficando evidenciado que o único resultado da operação, para o Banco Schahin S/A, foi viabilizar a antecipação da receita futura da carteira utilizada na operação, por meio do reconhecimento da receita com a cessão, em 29.12.2010, no valor de R$27.360 mil.” Em verdade, houve a simulação de uma venda regular de “CCBs”, para a finalidade de produzir um registro de receitas materialmente inexistente, que foram descritos em documentos contábeis. Com este engenho, as “CCBs”, indiretamente, permaneceram vinculadas ao Banco Schahin S/A, inexistindo concretamente o lucro contábil de R$ 27.359.883,02 registrado nos balanços financeiros daquela Instituição Financeira. É incontroverso que, em operações financeiras lícitas e transparentes envolvendo Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs), a aquisição de cotas pode ocorrer sem que o investidor tenha conhecimento prévio e detalhado sobre os ativos específicos que comporão a carteira do fundo. Inclusive, a essência de um FIDC reside na pulverização dos investimentos e na gestão especializada, cabendo ao gestor a prerrogativa de selecionar os direitos creditórios mais adequados aos objetivos e à política do fundo. Contudo, a defesa, pautando-se em parecer técnico que desconsiderou as peculiaridades do caso concreto (ID 238966360), tenta se utilizar desse modelo teórico de atuação de um FIDC para justificar uma operação manifestamente fraudulenta. No caso dos autos, a proximidade temporal e a quase identidade entre os valores de venda dos Certificados de Crédito Bancário (CCBs) do Banco Schahin ao Banco Lemon (aproximadamente R$ 82.792.000,00) e o valor da subscrição das cotas do Fundo Ajax pelo Banco Schahin (aproximadamente R$ 85.070.000,00), que culminou na titularidade de quase 100% das cotas do Fundo pelo Banco, descredibiliza por completo a tese de uma operação de mercado regular. Tal arranjo, longe de ser uma mera coincidência, revela uma engenharia financeira cuidadosamente orquestrada com o propósito de manipular resultados e elevar artificialmente o lucro da instituição financeira, uma vez que, por interposta pessoa (FIDC Ajax), o Banco Schahin S/A permaneceu indiretamente vinculado aos mesmos Certificados de Crédito Bancário (CCBs) que havia ficticiamente alienado ao Banco Lemon, inexistindo, portanto, o lucro apurado com as operações sob exame. Ou seja, o conjunto probatório dos autos demonstra a inquestionável intenção por trás da engenharia financeira: a elevação artificial do lucro do Banco Schahin S/A. Resta claro, por todo o exposto, que o Banco Schahin S/A apresentou ao Banco Central (BACEN), em suas demonstrações contábeis, dados incorretos, refletindo uma realidade econômica distorcida e artificial, devidamente constatada pela autarquia fiscalizadora no bojo do Procedimento PT 12001547024, tratando-se de ato apto a configurar o delito do artigo 4º, caput, da Lei 7.492/86. Assim, comprovada a materialidade do delito de gestão fraudulenta no ponto. b) Realização de cessões de crédito simuladas para elevação artificial de resultados, envolvendo a Continental Securitizadora Em 29/09/2010 e 06/12/2010, o Banco Schahin S/A celebrou 2 (dois) contratos de cessão de direitos creditórios sem coobrigação com a Continental Securitizadora, nos valores de R$ 30.000.000,00 e R$ 142.000.000,00, respectivamente, a serem pagos a prazo. Tais contratos foram acostados aos autos (ID 35662812, pp. 144/150 e ID 35662812, pp. 152/158), sendo ambos subscritos por PEDRO SCHAHIN e Maria Ângela M. Cabral, na qualidade de representantes do Banco Schahin S/A. Em sede de apurações, constatou o Banco Central do Brasil (BACEN) que, na data dos vencimentos das parcelas, a Continental Securitizadora recebia, por intermédio de transferências eletrônicas (TEDs), valores próximos, senão exatamente iguais, àqueles pactuados para quitação do contrato de cessão de direitos creditórios, remetidos pela “Cifra S.A. Crédito, Financiamento e Investimento” ("Cifra"), à época, também, dirigida por P. H. S. (ID 35380649, pp. 190/191). Conforme a documentação que se acostou ao feito, tais valores destinados pela Cifra S.A à Continental Securitizadora, utilizados para a quitação periódica de parcelas dos contratos supracitados, originava-se de empresas componentes do próprio "Grupo Schahin", a demonstrar que houve mera simulação de transações para gerar a inflação artificial de resultados da instituição financeira. Vejamos. Segundo a apuração realizada pelo Banco Central do Brasil (BACEN), a HHS Participações — uma das holdings pertencentes ao Grupo Schahin — possuía valores aportados na “Schahin Securitizadora”, a título de AFACs (Adiantamentos para Futuros Aumentos de Capital), ainda não convertidos formalmente em participação societária. Na hipótese dos autos, a HHS Participações autorizou a “Schahin Securitizadora” a creditar os valores dos AFACs (Adiantamentos para Futuros Aumentos de Capital) diretamente à “Continental Securitizadora” (ex: ID 35661522, p. 53): Foram acostados aos autos os documentos através dos quais a HHS Participações concedeu à “Schahin Securitizadora” as aludidas – e múltiplas – autorizações para o crédito de valores em benefício da “Continental Securitizadora”, nas datas descritas na denúncia (ID 35661522, pp. 53/73), entre 4.10.2010 e 14.3.2011, autorizações estas subscritas por Fernando Schahin e Antonio M. Castilho. Para atender a esta determinação, a “Schahin Securitizadora” instruiu a Cifra S.A. a transferir parte dos valores da cobrança de créditos a que teria direito (em decorrência de contratos de cessão de crédito celebrados com empresas financeiras do “Grupo Schahin”) para a Continental Securitizadora: Foram juntados aos autos tais documentos através dos quais a “Schahin Securitizadora” determinava à “Cifra” a transferência de valores de sua titularidade, decorrentes da cobrança de créditos por aquela adquiridos, para a “Continental Securitizadora S/A” nas datas descritas na denúncia (ID 35661522, pp. 75/95), entre 25.11.2010 e 24.02.2011. A “Cifra”, acolhendo estas determinações, solicitava ao “Banco Schahin S/A”, mediante carta, a transferência eletrônica (TED) de valores de sua conta bancária para a da “Continental Securitizadora”, sendo tais documentos subscritos por P. H. S. e Mariangela M. Cabral: Todos os documentos relacionados aos pedidos de transferência de valores da “Cifra” para a conta bancária da “Continental Securitizadora” foram acostados aos autos (IDs 35662812 e 35661522), podendo as transferências serem assim esquematizadas: Data/Valor da TED da Cifra à Continental Securitizadora Data/valor do pagamento da Continental ao Banco Schahin (pagamento das parcelas do contrato de 29.9.2010) 04/10/2010 - R$ 3.500.000,00 ID 35662812, p. 162 05/10/2010 R$ 3.000.000,00 ID 35662812, p. 168 28/10/2010 R$ 3.375.000,00 ID 35662812, p. 172 29/10/2010 R$ 3.375.000,00 ID 35662812, p. 180 30/11/2010 R$ 3.375.000,00 ID 35662812, p. 194 01/12/2010 R$ 3.375.000,00 ID 35662812, p. 200 28/12/2010 R$ 3.375.000,00 ID 35662812, p. 214 30/12/2010 R$ 3.375.000,00 ID 35662812, p. 22 28/01/2011 R$ 3.375.000,00 ID 35662812, p. 234 31/01/2011 R$ 3.375.000,00 ID 35661522, p. 15 25/02/2011 R$ 3.375.000,00 ID 35661522, p. 31 28/02/2011 R$ 3.375.000,00 ID 35661522, p. 37 14/03/2011 R$ 4.400.000,00 ID 35661522, p. 45 31/03/2011 R$ 3.375.000,00 ID 35661522, p. 51 Data/Valor da TED da Cifra à Continental Securitizadora Data/valor do pagamento da Continental ao Banco Schahin (pagamento das parcelas do contrato de 06.12.2010) 25/11/2010 R$ 4.840.000,00 ID 35662812, p. 184 06/12/2010 R$ 2.000.000,00 ID 35662812, p. 190 27/12/2010 R$ 2.000.000,00 ID 35662812, p. 204 29/12/2010 R$ 2.000.000,00 ID 35662812, p. 210 27/01/2011 R$ 2.000.000,00 ID 35662812, p. 224 31/01/2011 R$ 2.000.000,00 ID 35662812, p. 230 24/02/2011 R$ 2.000.000,00 ID 35661522, p. 19 25/02/2011 R$ 2.000.000,00 ID 35661522, p. 27 14/03/2011 R$ 4.440.000,00 ID 35661522, p. 45 31/03/2011 R$ 2.000.000,00 ID 35661522, p. 41 Os fatos podem, então, assim ser resumidos: O Banco Schahin S/A celebrou com a Continental Securitizadora 2 (dois) contratos de cessão de diretos creditórios, com pagamento a prazo. Entretanto, o pagamento das parcelas não se dava com recursos próprios da Continental Securitizadora. Diferentemente disso, a Cifra S.A, dirigida por P. H. S. (diretor do Banco Schahin S/A), realizava transferências de valores à Continental Securitizadora em datas próximas às datas de vencimento das parcelas, a fim de garantir sua quitação pontual. O valor transferido pela Cifra S.A tinha origem ainda mais remota, derivando de uma verdadeira operação estruturada e voltada à fraude, arquitetada dentro do Grupo Schahin. Veja-se que a HHS Participações detinha capital aportado na Schahin Securitizadora. Em vez de solicitar a conversão do aporte em participação societária (AFAC) ou mesmo a devolução dos valores, caso retratável a operação, a primeira autorizou a segunda a creditar tal aporte em benefício da Continental Securitizadora. Ademais, não consta dos autos qualquer fundamento jurídico para tal aporte de valores pela HHS na Continental Securitizadora. A Schahin Securitizadora, credora de valores junto à Cifra S.A., em razão de contratos de cessão de crédito, para atender à determinação da HHS Participações, determinou à Cifra S.A. que transferisse periodicamente recursos à Continental Securitizadora, deduzindo-os de seu crédito, conforme acima exposto. Ou seja, a Cifra S.A., sob ordens da Schahin Securitizadora, transferiu valores a que esta fazia jus à Continental Securitizadora. Tais valores, que pertenciam originariamente à holding HHS Participações, foram então utilizados para a quitação de parcelas relacionadas aos 2 (dois) contratos de cessão de direitos creditórios. A tese defensiva, neste particular, é no sentido de que a Continental Securitizadora recebeu os recursos dos créditos adquiridos e cobrados pelo mandatário da cobrança, que seria no caso a Cifra ou o próprio Banco Schahin. Em outras palavras, o Banco Schahin e a Cifra teriam efetuado a cobrança dos créditos cedidos à Continental e repassado a esta os valores devidos; a Continental, por sua vez, teria utilizado tais montantes para efetuar o pagamentos das próprias parcelas de aquisição dos créditos. Nada obstante, as provas acima colacionadas não deixam dúvidas de que tal situação não ocorreu. Primeiro, porque fartamente demonstrado que os recursos recebidos pela Continental e utilizados para pagamento das parcelas dos contratos ao Banco Schahin se originaram de recursos da HHS Participações, aportados na Schahin Securitizadora, que nada se relacionam com a cobrança dos créditos cedidos. Segundo, porque absolutamente inverossímil a tese de que os valores mensalmente devidos à Continental a título de repasse pela cobrança dos créditos a ela cedidos fossem os mesmos devidos pela Continental para quitação das parcelas dos contratos. Como se pode observar à luz do quadro exposto, o engenho fraudulento buscava ocultar o fato de que a operação de cessão de direitos creditórios não passava de ficção, uma vez que os créditos não foram de fatos adquiridos pela Continental. Os recursos utilizados por esta para a quitação dos 2 (dois) contratos pertencia a empresa ligada ao Banco Schahin, no caso à HHS Participações, a qual repassou os recursos à Continental Securitizadora por meio da interposição de diversas pessoas jurídicas. Tal dinâmica evidenciou a existência de um arranjo artificial, estruturado internamente nas empresas ligadas ao Grupo Schahin, com o objetivo de se apropriar do resultado contábil das operações, alterando a situação patrimonial do Banco Schahin S/A e constituindo, assim, ato típico de gestão fraudulenta. Comprovada, portanto, a materialidade do crime do artigo 4º, caput, da Lei 7.492/86, no ponto. c) Realização de cessões de crédito cruzadas com o Banco Semear S.A, o Banco Panamericano S.A, o Banco Mercantil do Brasil S.A. e o Banco Ficsa S.A com a finalidade de criar receitas de forma simulada, resultando em lucro artificial de R$ 85.626.000,00. Conforme a prova colhida nos autos, de fato, as instituições financeiras Banco Semear S.A, o Banco Panamericano S.A, o Banco Mercantil do Brasil S.A. e o Banco Ficsa S.A promoveram recíprocas operações de cessão de suas carteiras de direitos creditórios. Nesse sentido, foram acostados aos autos: i) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 107/09, firmado entre o Banco Semear (cedente) e o Banco Schahin S.A (cessionária), envolvendo a transferência de carteira de direitos creditórios que totalizavam R$ 18.251.110,72, datado de 26/05/2009 (ID 35661522, pp. 231/237); ii) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 108/09, firmado entre o Banco Schahin S/A (cedente) e o Banco Semear (cessionário), envolvendo a transferência de carteira de direitos creditórios que totalizavam R$ 17.419.332,55, datado de 27/05/2009, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 241/249); iii) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 001-06/09, firmado entre o Banco Schahin S/A (cedente) e o Banco Panamericano S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam R$ 47.951.365,70, datado de 02/06/2009, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 253/261). iv) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 119/09, firmado entre o Banco Panamericano S/A (cedente) e o Banco Schahin S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam R$ 47.552.036,07, datado de 02/06/2009, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 263/275). v) o contrato de cessão de créditos com coobrigação nº 230609, firmado entre o Banco Mercantil do Brasil Financeira S/A (cedente) e o Banco Schahin (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam R$ 17.497.470,34, datado de 23/06/09, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 289/293). vi) o contrato de cessão de créditos com coobrigação nº 090624, firmado entre o Banco Mercantil do Brasil Financeira S/A (cessionário) e o Banco Schahin (cedente), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam R$ 17.437.834,80, datado de 24/06/2009, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 279/285) vii) o contrato de cessão de direitos sem coobrigação, firmado entre o Banco Ficsa S/A (cedente) e o Banco Schahin S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios pelo preço de R$ 21.273.791,92, datado de 30/06/2009, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 301/303); viii) o contrato de cessão de direitos sem coobrigação do cedente nº 153/09, firmado entre o Banco Schahin S/A (cedente) e o Banco Ficsa S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam R$ 21.460.948,66, datado de 30/06/2009, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 305/309). ix) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 003-09/09, firmado entre o Banco Panamericano S/A (cedente) e o Banco Schahin S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam o montante de R$ 60.182.592,57, datado de 30/10/09, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 313/321). x) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 003-09/09, firmado entre o Banco Schahin S/A (cedente) e o Banco Panamericano S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam o montante de R$ 60.007.842,07, datado de 30/10/09, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 323/331). xi) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 024/10, firmado entre o Banco Schahin S/A (cedente) e o Banco Panamericano S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam o montante de R$ 116.507.885,69, datado de 31/03/10, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661521, pp. 9/17). xii) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 004-03/10, firmado entre o Banco Panamericano S/A (cedente) e o Banco Schahin S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam o montante de R$ 117.593.884,62, datado de 31/03/10, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661521, pp. 19/27). xiii) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 1013, firmado entre o Banco Panamericano S/A (cedente) e o Banco Schahin S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam o montante de R$ 126.403.692,01, datado de 26/05/2010, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661521, pp. 29/37). xiv) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 041/10, firmado entre o Banco Schahin S/A (cedente) e o Banco Panamericano S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam o montante de R$ 122.105.857,60, datado de 26/05/2010, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661521, pp. 39/47). Em linhas gerais, na cessão de direitos creditórios com coobrigação, a intenção do cedente é a antecipação de receitas, permanecendo ele investido na condição de mandatário para a cobrança dos créditos e, também, como garantidor do pagamento, assumindo os riscos em caso de inadimplemento. Todavia, quando, de forma simultânea à cessão, o cedente adquire outros direitos creditórios de valor equivalente da mesma instituição financeira — que, antes cessionária, passa a figurar como cedente —, não se configura uma efetiva antecipação de receitas. Nessa circunstância, não há ingresso de recursos no patrimônio do cedente, mas apenas um deslocamento contábil, com entradas e saídas de valores equivalentes, o que neutraliza qualquer acréscimo patrimonial real. É precisamente esse o cenário delineado nos autos. No caso, o mecanismo adotado de cessões cruzadas, simultâneas e em valores praticamente idênticos entre o Banco Schahin S/A e as demais instituições financeiras citadas, praticamente todas com coobrigação integral, demonstra que o intuito das alienações das carteiras de direitos creditórios acima destacadas era meramente o registro contábil das operações e o registro fictício de receitas. Isto é, visava-se, com as operações, a imediata inserção de receitas fictícias em documentos contábeis do Banco Schahin S/A, neles sendo declinado o resultado de diversas operações de venda de direitos creditórios que, contudo, consistiam em negócios meramente simulados. A simulação das cessões de direitos creditórios é bastante clara, em especial porque as operações ocorreram em curtíssimo intervalo de tempo, envolvendo partes e contrapartes coincidentes, que apenas alternaram suas posições de cedente e cessionário (ID 35383637 - Pág. 151). A despeito disso, o Banco Schahin S/A promoveu o registro, em seus documentos contábeis, entre 2009 e maio de 2010, de um lucro decorrente das operações supracitadas da ordem de R$ 85.626.353,96 (cf. ID 35383637, p. 151 e ID 35661521, pp. 49/61). Consoante apurado pelo Banco Central do Brasil (BACEN), posicionando-se como cedente nas operações supracitadas, o Banco Schahin S/A antecipou a receita de R$ 343.625.850,83. Porém, na posição de cessionário, desembolsou a quantia de R$ 345.261.291,52, ou seja, não houve apuração de diferenças reais a título de lucro (ID 35383637, p. 151). Nesse quadro, a autarquia supervisora concluiu que: “(...) o fato de ter cedido créditos e adquirido outros créditos da mesma instituição, em um curto prazo e com valores muito próximos, demonstra que tais operações tiveram como objetivo a contabilização de receita futura de maneira artificial” (ID 35383637, p. 151). De tal forma, demonstrada a realização de cessões de crédito simuladas com o objetivo de elevação artificial da receita da instituição financeira, resta comprovada a materialidade do delito de gestão fraudulenta no ponto. d) Recompra de créditos anteriormente cedidos sem o reconhecimento imediato da despesa de R$ 29.466.000,00 decorrente dessa operação, que foi diferida indevidamente, utilizando critério contábil diverso do aplicado nas cessões iniciais, quando foi reconhecida, antecipadamente, a receita futura da carteira de crédito cedida Conforme a prova colhida nos autos, o Banco Schahin S/A cedeu carteiras de direitos creditórios à Schahin Securitizadora, por meio de contratos de cessão sem coobrigação, os quais totalizavam o montante de R$ 416.463.150,21 (ID 35661521, pp. 69/103). Tais carteiras de direitos creditórios foram, subsequentemente, repassadas ao fundo “Sirius Fundo de Investimentos em Direitos Creditórios Multisegmentos” (“Sirius”), por meio de diversos instrumentos particulares de cessão de direitos creditórios (ex: ID 35661521, pp. 105/137). Segundo registrado no Processo Administrativo do BACEN PT 1201551398, o Banco Schahin S/A subscreveu 300 (trezentas) cotas subordinadas do fundo “Sirius” e, assim, em 30/06/2010, figurava como detentor de aproximadamente 98% do patrimônio líquido do referido fundo (ID 35380415, p. 38). Ainda de acordo com o mencionado processo administrativo, os direitos creditórios cedidos ao fundo “Sirius” sofreram, à época, uma significativa deterioração, o que resultou na perda substancial da qualidade desses ativos. Sendo o Banco Schahin S/A detentor de aproximadamente 98% das cotas subordinadas do aludido fundo, em caso de prejuízo, caberia a ele absorver a maior parte de eventuais perdas financeiras. À vista disso, o Banco Central (BACEN) determinou ao Banco Schahin S/A a adequação do valor contábil da rubrica de cotas de fundo de direitos creditórios (“Cotas de Fundos de Investimentos”), em seus registros, por meio da constituição de provisão no montante de R$ 48.195.331,68. Contudo, houve por bem o Banco Schahin S/A promover movimento diverso. Vejamos. A Schahin Securitizadora S/A recomprou a totalidade das carteiras de direitos creditórios cedidas ao fundo “Sirius”, desmembrando-as em uma carteira de créditos com rating de “A” a “C”, cedida ao Banco Schahin S/A, e outra de rating “D” a “H”, que permaneceu na carteira da Securitizadora (ID 35661521, p. 233). Foi acostado aos autos o instrumento contratual de recompra, por parte do Banco Schahin S/A, dos créditos com rating de “A” a “C”, firmado em 30/12/2010, pelo valor de R$ 160.700.010,05, assinando, como representantes do Banco Schahin S/A, PEDRO H. SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661521, pp. 63/67). Como resultado da operação, o Banco Schahin S/A, em demonstrativo contábil, colheu o prejuízo de R$ 29.466.000,00, relativo à diferença entre o valor pago à Schahin Securitizadora S/A (R$ 160.700.010,05) e o valor dos créditos na data da recompra (R$ 131.234.000,00). Neste ponto, é importante notar que o Banco Central do Brasil (BACEN) advertiu expressamente o Banco Schahin S/A, em documento, inclusive, subscrito por seus representantes P. H. S. e Maria Ângela M. Cabral, de que o valor de R$ 29.466.000,00 deveria ser reconhecido como despesa para a data-base de dezembro/2010 (ID 35661524, p. 93): “(...) Considerando que, no período correspondente às cessões do Banco Schahin S.A. para a Securitizadora, houve o reconhecimento imediato de receitas, essa instituição financeira, à luz do contido no Plano Contábil das Instituições do Sistema Financeiro Nacional – Cosif – item 1.2.5-a, deverá reconhecer como despesa, para a data-base de dezembro/2010, o valor correspondente aos R$ 29.466 mil, no sentido de que, a par das disposições legais e das exigências regulamentares específicas atinentes à escrituração, sejam observados, ainda, os princípios fundamentais de contabilidade, cabendo a essa entidade adotar métodos e critérios uniformes no tempo.” Todavia, ao invés de registrar contabilmente o valor de R$ 29.466.000,00 imediatamente como despesa da recompra, o Banco Schahin S/A o registrou como um ativo diferido na conta “Rendas – Cessão de Crédito a Diferir”, com o histórico “Prejuízo na recompra de oper de cred Schahin Securit”, em prática utilizada para postergar o reconhecimento da perda, resultando no adiamento de sua contabilização como perda real e na distorção do resultado contábil ao final do exercício, o que mascarou a realidade da saúde financeira da instituição (ID 35661521, p. 253). A defesa, neste ponto, limita-se a aludir ao parecer técnico contábil, elaborado pelo contador e administrador Renato Maurício Porto Reis e seu depoimento em Juízo, ratificando o documento. Segundo o parecerista, o registro diferido dos créditos recomprados estaria de acordo com o artigo 3º da Circular BCB 2.568/1995, vigente à época dos fatos (ID 238966361, p. 16), o qual assim dispunha: Art. 3º As operações de crédito e de arrendamento mercantil objeto de cessão dos respectivos direitos, com ou sem coobrigação, devem ser registradas na cessionária conforme a modalidade da operação original, observada a atividade predominante do tomador do crédito ou do arrendatário. Ocorre que, conforme visto, a aludida norma dizia respeito à usual aquisição de créditos por meio de cessão de crédito pela instituição financeira, não tratando especificamente do caso dos autos, qual seja, a recompra de créditos anteriormente cedidos; nesta hipótese, conforme concluiu o BACEN, o tratamento deveria ser diverso justamente porque a anterior cessão desses mesmos créditos pelo Banco Schahin já havia gerado a contabilização imediata da receita, conforme normativa da época, de modo que a recompra com deságio deveria ser registrada como prejuízo. Nesse cenário, considerando que a instituição financeira foi expressamente advertida pela entidade reguladora sobre tal peculiaridade e, ainda assim, optou por registrar de forma diferida o prejuízo, de modo a elevar artificialmente seu resultado, resta cabalmente comprovada a materialidade do ato de gestão fraudulenta no ponto. e) realização de cessão simulada de crédito com o Banco ABC Brasil S/A, com a finalidade de antecipar o reconhecimento de receitas, resultando em lucro artificial de R$ 13.882.000,00 Preliminarmente, cumpre registrar que a denúncia faz referência a contrato de cessão de crédito com coobrigação celebrado entre o Banco Schahin S/A e o Banco do Brasil (termo de transferência de créditos nº 846110). Contudo, ao se analisar as folhas indicadas na peça acusatória, verifica-se que o referido contrato foi, na realidade, firmado entre o Banco Schahin S/A e a instituição financeira Banco ABC Brasil. Ressalte-se, entretanto, que tal erro material não compromete a compreensão do conteúdo essencial da imputação, uma vez que os documentos mencionados pelo Ministério Público Federal (MPF) demonstram que a operação em questão envolveu, de fato, o Banco Schahin S/A e o Banco ABC Brasil. Dito isso, prossigo. Conforme o termo de transferência de créditos com coobrigação nº 846110, o Banco Schahin S/A, em 05/05/2010, cedeu ao Banco ABC BRASIL S/A créditos oriundos de Cédulas de Crédito Bancário (“CCBs”), que totalizavam o montante de R$ 64.034.900,60, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO H. SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661521, pp. 255/261). Segundo apontado pelo BACEN (ID 35383637, p. 153), o valor pactuado pela alienação de tais “CCBs” foi de R$ 50.933.141,98 (ID 35661521, pp. 255) e, no denominado anexo “C” do termo negocial respectivo, encontravam-se registradas as datas de vencimento dos créditos cedidos, sendo, conforme exposto na denúncia, um total de 987 parcelas com vencimentos praticamente diários de 06/05/2010 a 30/04/2014 (ID 35661521, pp. 279/307). Ocorre que, ao se examinar os documentos apresentados pelo Banco Schahin S/A ao Banco Central do Brasil (BACEN), constata-se que, em 04/05/2010, um dia antes da celebração da cessão dos supracitados “CCBs”, aquela instituição financeira aplicou no Banco ABC Brasil S/A, a quantia de R$ 50.956.600,00, dividida em 48 (quarenta e oito) depósitos interfinanceiros (CDI), com vencimentos aprazados e escalonados entre 31/05/2010 e 30/04/2014 (cf. ID 35380633, pp. 43/295, ID 35380634, pp. 1/41, e tabelas de ID 35383637, pp. 153/155). De maneira similar às hipóteses acima tratadas, o Banco Schahin S/A, apesar de ter cedido direitos creditórios ao Banco ABC Brasil, simultaneamente, remeteu a ele também altos valores, a título de aplicações em CDIs, proporcionais ao valor de alienação dos “CCBs” pactuado pelo termo de transferência de créditos com coobrigação nº 846110. Não há dúvidas, diante deste quadro, de que as operações se compensavam, sem que houvesse a antecipação real de qualquer receita pelo Banco Schahin; a operação era absolutamente irrelevante do ponto de vista financeiro ao Banco ABC Brasil, o qual não assumiu qualquer risco, em decorrência da coobrigação aliada à posse dos valores aplicados pelo Banco Schahin nas CDIs. Em outras palavras, se por um lado o Banco ABC Brasil transferiu valores ao Banco Schahin pela aquisição dos créditos, simultaneamente recebeu o mesmo montante do Banco Schahin mediante aplicações em CDIs que só poderiam ser resgatadas à medida que os créditos fossem quitados pelo Banco Schahin. Tudo não passava, portanto, de mera simulação negocial. O que se buscava com a operação era seu efeito contábil, não a efetiva antecipação de receitas por meio de cessão de créditos com coobrigação; mediante a alienação simulada dos “CCBs”, o Banco Schahin S/A lograva antecipar o reconhecimento de receitas, do que resultou o registro de um lucro artificial da ordem de R$ 13.882.014,19 no documento contábil denominado “Razão – Cessão de Crédito” (ID 35380816, p. 15 e ID 35662811, p. 41). Assim, demonstrado mais uma vez típico engenho adotado no Banco Schahin S/A para falsear os demonstrativos contábeis por intermédio de negociações simuladas de direitos creditórios, resta comprovada a materialidade de crime de gestão fraudulenta, no ponto. f) Utilização de cessões parciais de operações de créditos para fracionamento de operações de crédito em curso anormal, dissociando as parcelas a vencer e as parcelas em atraso, de tal forma que as parcelas vencidas deixassem de sensibilizar a classificação de risco das demais, em detrimento das prescrições da Resolução n. 2682 de 1999, acarretando o não reconhecimento de R$ 123.047.000,00 De acordo com a prova colhida nos autos, o Banco Schahin S/A promovia o fracionamento do saldo devedor vinculado a contratos de crédito concedidos, segmentando-o em blocos de parcelas. A cada um desses blocos era atribuída uma classificação de risco específica, conforme o grau de adimplência ou inadimplência observado. Esta atribuição de notas aos blocos de parcelas era feita com base nos critérios definidos pelo art. 4º, I, da Resolução nº 2682 do Banco Central do Brasil (BACEN): Art. 4º A classificação da operação nos níveis de risco de que trata o art. 1º deve ser revista, no mínimo: I - mensalmente, por ocasião dos balancetes e balanços, em função de atraso verificado no pagamento de parcela de principal ou de encargos, devendo ser observado o que segue: a) atraso entre 15 e 30 dias: risco nível B, no mínimo; b) atraso entre 31 e 60 dias: risco nível C, no mínimo; c) atraso entre 61 e 90 dias: risco nível D, no mínimo; d) atraso entre 91 e 120 dias: risco nível E, no mínimo; e) atraso entre 121 e 150 dias: risco nível F, no mínimo; f) atraso entre 151 e 180 dias: risco nível G, no mínimo; g) atraso superior a 180 dias: risco nível H. Nesse sentido, de maneira ilustrativa, um bloco de parcelas com atraso entre 15 e 30 dias seria classificado, no mínimo, com risco “B”. Já em situações de inadimplência superior a 180 dias, o respectivo bloco deveria receber o risco “H”, correspondente ao grau mais elevado de risco previsto na regulamentação. Esta prática de fragmentação de um mesmo crédito por parte do Banco Schahin S/A restou devidamente demonstrada a partir das tabelas elaboradas pelo Banco Central do Brasil no âmbito do Processo Administrativo PT 1201543644, relacionada alguns mutuários tomados pela autarquia como amostragem de uma prática maior (ID 35661730, pp. 99/102). Como é de se notar, com tal prática, evidenciou-se a burla ao disposto na Resolução nº 2.682, de 21 de dezembro de 1999, do Conselho Monetário Nacional, que estabelece os critérios acima referidos para a classificação de operações de crédito e a constituição de provisões para créditos de liquidação duvidosa. Explico. O artigo 3º da Resolução CMN nº 2.682/1999 estabelece que as operações de crédito de um mesmo cliente ou grupo econômico deve ser definida considerando aquela que apresentar maior risco. Não há qualquer autorização conferida pela referida Resolução para que se promova a divisão e classificação de partes de uma mesma operação em diferentes níveis de risco. A despeito disso, o Banco Schahin S/A adotou a prática de fragmentar operações de créditos, dividindo a mesma operação em distintos conjuntos de parcelas. Enquanto parcelas mais antigas e inadimplentes foram separadas e cedidas à Schahin Securitizadora, recebendo baixa classificação de qualidade (rating “H”), as parcelas com atrasos recentes ou em dia foram mantidas em carteira própria ou cedidas a outras instituições financeiras com coobrigação (ex: ID 35661521, pp. 181/191). De modo a ilustrar a prática em comento, o Banco Central colheu diversos exemplos, relacionados às cédulas de crédito emitida por diversos mutuários, como o cliente Anderson de Souza (CPF 379.967.428-47). Em 23/05/2008, o cliente Anderson de Sousa (CPF 379.967.428-47) pactuou com o Banco Schahin S/A a contratação de crédito voltado ao financiamento de uma motocicleta da marca Suzuki, modelo EN 125 YES, ano/mod. 2007/2008, pelo valor líquido de R$ 5700,42, a serem quitados mediante o pagamento de 48 (quarenta e oito) parcelas de R$ 231,13 (ID 35662463, p. 87/89). Conforme Relatório de Contrato Incluído (CDC/Leasing – ID 35662463), a partir da 8ª parcela do financiamento, não houve mais a quitação das parcelas do financiamento (ID 35662463, p. 95 e ss.). A instituição financeira, então, fragmentou o bloco de parcelas em atraso do contrato inadimplido em 3 (três) grupos distintos, atribuindo, a cada um, classificação de risco da operação diverso, com base nos critérios definidos pelo art. 4º, I, da Resolução nº 2682 do Banco Central do Brasil (BACEN), associados ao período respectivo de inadimplência. Desse modo, o bloco classificado sob índice “D”, relacionado a 3 (três) parcelas do contrato com menor atraso, permaneceu na carteira do Banco Schahin S/A; o bloco classificado sob índice “H”, referente a 7 (sete parcelas) e com maior período de atraso, foi cedido pelo Banco Schahin S/A à Securitizadora sem coobrigação; e um terceiro bloco de 27 (vinte e sete) parcelas, também classificado sob o índice “D”, foi cedido, com coobrigação, ao Banco Panamericano (ID 35662463, p. 113 e ID 35662463, p. 245). Essa mesma prática se repetiu em múltiplas oportunidades, como, por exemplo, nos contratos de crédito dos diversos mutuários relacionados nas tabelas de ID 35383637, pp. 156/159. Tal prática permitiu, portanto, atribuir classificações de risco mais favoráveis às parcelas mantidas em carteira própria ou cedidas a outras instituições financeiras com coobrigação, desconsiderando o histórico de inadimplência da operação de crédito como um todo. Esta conduta acabou por resultar em subavaliação do risco dos créditos indevidamente fragmentados e, consequentemente, a instituição financeira deixou de efetuar as provisões necessárias para fazer frente aos reais riscos de tais créditos. Importante se faz registrar as pertinentes considerações exaradas no âmbito do Processo Administrativo PT 1201543644 (ID 35383637 - Pág. 159): “(...) as parcelas de uma mesma operação de crédito possuíam classificações de risco distintas, dependendo da natureza da operação. Assim, o Banco Schahin agiu em desconformidade com o inciso I, art. 4º, da Resolução nº 2.682, de 1999, que dispõe que o risco atribuído a cada operação deve ser, no mínimo, correspondente ao atraso verificado no pagamento de parcela do principal, não havendo previsão para a classificação de partes de uma operação em diferentes níveis. Em virtude da irregularidade de não classificar integralmente as parcelas de uma operação no mesmo nível de risco, o Banco Schahin deixou de provisionar R$ 123.047 mil, conforme expediente do Banco Central do Brasil enviado à instituição (fls. 413-421). O banco foi comunicado da necessidade de regularizar R$ 74.852 mil em provisões relativas à carteira de crédito própria ou cedida com coobrigação, e R$ 48.195 mil relativos à rubrica cotas em direitos creditórios, visto que o fundo Sirius, cuja maior parte das cotas pertencia ao Banco Schahin, possuía em sua carteira operações na situação irregular supramencionada” O Banco Central do Brasil (BACEN), ao constatar as supracitadas irregularidades relacionadas à segmentação indevida dos créditos, levou ao conhecimento e, simultaneamente, advertiu o Banco Schahin S/A acerca da insuficiência de provisão relativas à carteira de crédito própria ou cedida com coobrigação, no valor de R$ 74.851.766,98, na data-base de 31/03/2010 (ID 35661521, p. 177 e 191): Além disso, o Banco Central (BACEN) advertiu o Banco Schahin S/A acerca da necessidade de se fazer a provisão de aproximadamente R$ 48.195.000,00 relativos à rubrica “cotas em direitos creditórios” de seus documentos contábeis, pois, como exposto na denúncia, o fundo “Sirius”, cuja maior parte das cotas pertencia ao Banco Schahin S/A, possuía em sua carteira de créditos operações cedidas por esta instituição financeira nas mesmas condições irregulares acima descritas (ID 35661521, pp. 178/179 e 193). Ao deixar de constituir provisões adequadas, o Banco Schahin S/A comprometeu a fidedignidade das suas demonstrações financeiras, enviando ao mercado e à entidade supervisora um falso retrato de saúde da instituição. Com isso, há, uma vez mais, a demonstração de um comportamento típico de gestão fraudulenta, na medida em que os gestores da instituição produziram um engenhoso artifício a fim de atenuar as provisões a que estava ela obrigada e de superestimar seus resultados financeiros, induzindo em erro, tanto a entidade fiscalizadora, quanto o próprio mercado bancário. g) Elevar artificialmente o resultado do banco Schahin, ao contabilizar, como receita, valores recebidos por liquidação antecipada de operações cedidas com coobrigação, deixando de reconhecer a devida obrigação com os cessionários, e apresentando, em consequência, demonstrações financeiras referentes ao período findo em 31/12/2010, de modo a gerar demonstrações financeiras incompatíveis com a real situação econômico-financeira Em linhas gerais, na cessão de crédito com coobrigação, o cedente transfere o direito de receber determinado crédito a um cessionário, mas mantém a responsabilidade de garantir o pagamento caso o devedor original não cumpra sua obrigação. Essa responsabilidade implica que o cedente continua exposto aos riscos associados à inadimplência dos devedores dos créditos cedidos. Nesse sentido, inclusive, dispõe o art. 3º da Resolução nº 2.686/2000 editada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN): Art. 3º No caso de cessão de créditos com coobrigação ou outra forma de retenção de risco, deve ser acrescido ao patrimônio líquido exigido da instituição cedente, calculado na forma da regulamentação em vigor, parcela equivalente ao menor dos seguintes valores: I - 100% (cem por cento) do valor atualizado da coobrigação ou de outra forma de retenção de risco pactuada; II - a diferença positiva entre o valor correspondente à coobrigação assumida e o valor contábil líquido de provisões, objeto de cessão, acrescida de 11% (onze por cento) do valor contábil do crédito cedido, líquido de provisões. Desse modo, a retenção de riscos decorrente da coobrigação exige que o cedente registre, em sua contabilidade, não apenas a receita oriunda da liquidação antecipada dos valores cedidos, mas também a correspondente obrigação perante os cessionários, refletindo de forma adequada os riscos e a sua responsabilidade em caso de inadimplemento. Do contrário, a omissão contábil acaba por resultar na produção de demonstrações financeiras irreais e incongruentes com a realidade. No caso, conforme apurado pelo Banco Central do Brasil (BACEN), o Banco Schahin S/A contabilizava como receita valores recebidos por liquidação antecipada de operações cedidas com coobrigação. Todavia, em seus demonstrativos contábeis, a Instituição Financeira não realizava o correspondente registro da obrigação com os cessionários. Nesse sentido, para a data-base 31/12/2010, houve a declaração, por parte do Banco Schahin S/A, de recebimento de R$ 47.465.567,11 relacionados à liquidação antecipada de cessões de crédito cedidas com coobrigação (ID 35661524, p. 81). Todavia, a instituição financeira registrou na conta de passivo “Transitória – Cessão a Repassar”, no período de 01/12/2010 a 31/08/2011, apenas o valor de R$ 1.969.231,20 (ID 35661524, p. 83), sob o histórico “baixa p/ liq parcelas pré liquidadas”. A diferença entre o valor de R$ 47.465.567,11 e R$ 1.969.231,20 foi computado pelo Banco Schahin S/A, em demonstrativo contábil, como receita, de modo a elevar artificialmente o resultado financeiro da instituição financeira em aproximadamente R$ 45.496.000,00 (cf. ID 35380650, p. 43), o que caracterizou uma infração de natureza grave sob a ótica do Banco Central do Brasil (ID 35662811, p. 54). A defesa sustenta, em alegações finais, que as inconsistências contábeis apontadas decorreram de limitações operacionais dos sistemas informatizados utilizados pela instituição financeira à época, os quais operavam de forma independente e sem integração entre si. Nesse sentido, argumentou que (ID 312981602, p. 35): “(...) quando havia um pagamento antecipado, o sistema não conseguia visualizar a cessão de crédito que contemplava aquela parcela paga antecipadamente. Ou seja, não era então possível contabilizar, de maneira automática, as operações de pré-pagamentos de financiamentos dentro de um portfólio cedido para múltiplos cessionários. (...) era uma situação transitória, uma vez que se ajustava periodicamente e, portanto, não se traduz como elevação artificial de resultado do Banco." Disso teria resultado a situação verificada, qual seja, conforme apurado pelo Banco Central do Brasil (BACEN), o Banco Schahin S/A registrava como receita/lucro os valores recebidos por liquidação antecipada de operações cedidas com coobrigação, sem, contudo, contabilizar em seu passivo a correspondente coobrigação com os cessionários de maneira imediata. A prova dos autos, entretanto, infirma esta tese, demonstrando que as distorções contábeis decorriam de uma estratégia consciente e deliberada da instituição financeira. Vejamos. Durante a fase de apurações administrativas, R. M. B., contador do Banco Schahin S/A, encaminhou ao Banco Central do Brasil (BACEN), por e-mail, o roteiro e os procedimentos adotados pela instituição financeira para os recebimentos antecipados de contratos cedidos (ID 35661524, pp. 85/87). No documento de ID 35661524, p. 87, afirmou o contador que: “Os recebimentos antecipados de contratos cedidos com coobrigação são contabilizados em contas transitórias juntamente com os recebimentos da carteira própria, sendo os recebimentos da carteira própria baixados da conta Cosif 1.6, e os recebimentos inerentes à carteira cedida são contabilizados em receita de crédito até a data de seu efetivo repasse ao cessionário (...) “Os repasses acima (item 4) são efetuados diariamente por nossa área de BackOffice, de acordo com o fluxo acordado com o cessionário, independentemente de recebimento por parte do cliente, sendo referido fluxo controlado através do sistema ‘Matera’ para a emissão da TED aos cessionários.” Ao contrário do que se alega, havia uma política institucional deliberada de contabilização dos valores recebidos antecipadamente como receita/lucro da instituição, mesmo em casos de cessão com coobrigação, sendo o repasse aos cessionários realizado conforme cronograma com eles pactuado, independentemente da data de efetivo pagamento. Tais declarações enfraquecem de forma definitiva a tese defensiva de que as inconsistências contábeis decorreriam de falhas técnicas e da ausência de integração entre os sistemas e que a situação de irregularidade contábil era transitória. Importante registrar, no ponto, que P. H. S. e Maria Ângela M. Cabral, na qualidade de representantes legais do Banco Schahin S/A, foram comunicados e advertidos pelo Banco Central (BACEN) a respeito de diversas irregularidades identificadas na condução da instituição financeira, apuradas na data-base de 31/12/2010, que exigiam a imediata regularização contábil. Entre tais irregularidades, mencionou-se expressamente aquela relacionada à declaração de receitas de cessões de crédito com coobrigação liquidadas antecipadamente que, contudo, não detinham a correspondente obrigação registrada no passivo do banco, a gerar uma inadequada distorção contábil (ID 35661524, p. 95). Cotejado com todos os demais fatos acima expostos, dúvida não há de que o engenho descrito serviu ao incremento artificial das receitas do Banco Schahin S/A, sendo o procedimento de contabilização de parcelas antecipadas devidas aos cessionários, objeto deste tópico da sentença, parte do repertório da própria gestão fraudulenta engendrada na instituição financeira. Não prospera a tese defensiva de que os lançamentos irregulares representavam percentual ínfimo das operações da instituição, sem impacto relevante sobre sua posição patrimonial. Tal tese não se sustenta diante dos elementos constantes dos autos, os quais revelam que a contabilização indevida resultou em incremento artificial de receita da ordem de mais de R$ 40 milhões. Ademais, conforme demonstrado na sentença, essa prática era apenas uma, entre tantas outras práticas, de gestão fraudulenta, que resultaram, segundo o BACEN, no comprometimento da situação econômico-financeira do Conglomerado Financeiro Schahin, que, após os ajustes contábeis realizados, passou a apresentar patrimônio de referência ajustado negativo de R$ 364.088.000,00. h) Manter registro de ativo insubsistente, desde novembro de 2008 - cerca de US$ 90 milhões de dólares, equivalente a R$ 163.459.799,55 na data base de 31.12.2010, valor este correspondente a 68% do patrimônio líquido da instituição (R$ 229.175.000,00). Em consequência, o banco forneceu ao Banco Central demonstrações contábeis que não refletiam a sua real situação econômico-financeira Neste ponto, sustenta o Ministério Público Federal (MPF) que o Banco Schahin S/A manteve o registro de ativo insubsistente no valor de R$ 163.459.799,55 em documento contábil com data-base de 31/12/2010 (fls. 1166), referente a valores depositados em conta do Banco Clariden Leu Ltda., na Suíça, que correspondiam a 71,32% do patrimônio líquido do Banco Schahin, de R$ 229.175.217,79 (fls. 1192). A insubsistência do ativo derivava do fato de que, ao final de 2008, a conta do Banco Schahin S/A no Banco Clariden Leu Ltda. foi debitada em US$ 91.403.952,30, a título de liquidação de operação de empréstimo. Em consequência, os recursos que o Banco Schahin S/A mantinha naquela instituição financeira da Suíça foram reduzidos a US$ 214.485,31 negativos (fls. 1015), em meados de novembro de 2008. Nada obstante, o Banco Schahin S/A persistiu registrando o valor da quantia depositada no Banco Clariden Leu Ltda. antes da aludida liquidação de operação de empréstimo (R$ 163.459.799,55) como se ativo fosse em seus registros contábeis, inclusive no documento contábil com data-base de 31/12/2010 (ID 35380649, p. 84). Pois bem. De fato, há indícios de que os contratos de empréstimos que resultaram no débito dos valores aplicados pelo Banco Schahin S/A no Banco Clariden Leu Ltda. tenham derivado de possível fraude. Nesse sentido, a perícia grafotécnica particular (ID 35661524, pp. 147/206 e ID 35661525, pp. 1/17) concluiu pela falsidade das assinaturas de M. T. S. e S. T. S. nos documentos relacionados àqueles contratos de empréstimo; a perícia da Polícia Federal (ID 35661744, pp. 72/81), por sua vez, foi inconclusiva, à vista da inexistência de elementos que permitissem vincular ou excluir a autoria dos registros a “Milton” ou a “Salim”. Em Juízo, P. H. S., sustentando que houve uma fraude que resultou no débito integral dos valores depositados na conta daquele Banco Suíço, assim discorreu: “Juíza: Em relação a esse ativo mantido junto ao Banco Clariden, que consta da denúncia que seria insubsistente, em relação a uma... porque o banco teria argumentado que haveria uma dívida. O que o senhor tem... Pedro: Então, isso é o seguinte: tinha uma posição de caixa que dava para fazer um hedge das captações em dólar com caixa, para ter menos custos. Para você ter uma dívida em dólar, se o dólar sobe, sua dívida aumenta. Você tem que ter um ativo da mesma... do mesmo valor para subir junto. Se você tem caixa, você pode fazer esse hedge aplicando em um ativo em dólar. Se você não tem caixa, você faz um swap cambial, paga um custo qualquer e está “hedgiado.” No nosso caso, como a gente tinha caixa, a gente não queria ter o custo, a gente fez uma aplicação no mesmo valor do passivo. E aí vencimento, acho que era 2012 ou 2013, não sei. Daí a gente foi pedir resgate antecipado na época do Banco Panamericano e eles falaram que não tinha mais aplicação porque tinha um empréstimo atrelado. Juíza: Aqui consta da denúncia Banco Clariden. Pedro: É, Clariden. Juíza: Clariden. Pedro: Aí fomos ver esse contrato de empréstimo, estava assinado pelos dois sócios, que não são operacionais, que é o meu pai e o pai do... do Carlos Eduardo. E era uma fraude, porque fizeram uma... um laudo de avaliação - que eles não assinavam nada no dia a dia, meu... os sócios. Então era tudo a gente. E aí viu que era uma fraude... (...) Juíza: Eles teriam poderes. Entendi. Está certo. E em relação ao... o que que aconteceu, então, quando... Pedro: A gente pediu... a gente fez uma cobrança amigável na época. E como eles falaram que não tinha vencido ainda, porque estava dois, três anos do vencimento, eles falaram que eles iam estornar. E aí foram enrolando, enrolando, enrolando, até a hora que o banco foi vendido e a gente não teve mais acesso.” Compulsando os documentos trazidos aos autos, observo que o Banco Schahin S/A, em 20/06/2011, encaminhou ao Banco Central do Brasil resposta a questionamentos, sustentando ter mantido tratativas com o Banco Clariden em busca de solução para a situação da alegada fraude e que, naquele período, não moveu as medidas formais de cobrança do débito por não contar com recursos humanos e de capital suficientes para tanto. Nesse sentido (ID 35380416 - Pág. 203): 1. Com relação aos questionamentos do Item 1 da referida correspondência, informamos que foram mantidos diversos entendimentos com o Banco Clariden Leu ("Banco Clariden") a fim de solucionar a questão do empréstimo contratado com o Clariden Leu Ltd. por meio de instrumento falso e a consequente compensação realizada pelo Banco Clariden entre os valores da tal empréstimo e os valores de aplicações em moeda estrangeira mantidas junto ao Banco Clariden pelo Banco Schahin conforme detalhadamente informado na correspondência enviada pelo Banco Schahin a esse Banco Central em 25/04/2011. 2. Em razão da situação de aperto financeiro e do momento delicado vivido pelo Banco Schahin, momento esse que contempla as negociações com o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) e o Banco BMG para aquisição do Banco Schahin, não se pode contar com recursos humanos e de capital suficientes e capazes para o ingresso de medidas formais de cobrança contra o Banco Clariden. 3. No mais, ainda em razão das constantes negociações com o FGC e o Banco BMG, a preservação do relacionamento com importantes credores do Banco Schahin se faz estrategicamente valiosa para o sucesso da transação que visa preservar a higidez não só do Banco Schahin, mas também do Sistema Financeiro Nacional como um todo. Ainda que se admitisse a alegação de que a redução patrimonial do Banco Schahin S/A decorreu da supracitada fraude praticada por terceiros, mediante a celebração de contratos de empréstimo com assinaturas supostamente falsificadas, tal circunstância não justifica a manutenção de ativo flagrantemente insubsistente nos balanços patrimoniais da instituição, em montante que, à época, representava mais de 70% de seu patrimônio líquido. É necessário destacar que a própria alegação de fraude reforça o fato de que a instituição financeira tinha conhecimento da perda dos recursos e, consequentemente, da obrigação de que sua administração procedesse, desde a constatação da ausência dos valores, aos devidos ajustes contábeis, de modo a garantir a fidedignidade de suas demonstrações financeiras. Isto, contudo, não ocorreu. Em seus memoriais, a Defesa dos réus alegou que, após a constatação da inexistência dos valores, foram realizadas tratativas com o Banco Clariden com vistas à reversão da situação e reconstituição dos valores relacionados à aplicação. Observo, entretanto, que não houve a apresentação nos autos de qualquer elemento probatório concreto que comprove a existência dessas negociações — nenhum e-mail, ofício, ata, troca de correspondência ou qualquer outro documento que demonstre minimamente a alegada tentativa de recuperação dos valores. Considerando o frequente uso de e-mails, cartas formais e registros corporativos, revela-se absolutamente inverossímil que uma tratativa internacional desse vulto pudesse ter ocorrido sem a geração de um único registro documental. Ademais, é absolutamente improvável que uma instituição do porte do Banco Schahin S/A não dispusesse dos meios mínimos para a cobrança do débito. Não era um débito módico. Era um valor exorbitante, que representava boa parte de seu patrimônio líquido, sendo absolutamente natural que fossem envidados máximos esforços para recuperação do ativo perdido, o que, à luz da prova que integra os autos, não ocorreu. Não bastasse isso, cumpre ressaltar que não houve a inclusão no documento contábil com data-base de 31/12/2010, ou em qualquer outro documento congênere, de qualquer nota explicativa ou menção à existência do gigantesco desfalque, em tese, decorrente da fraude que afetou aquele ativo aplicado no Banco Clariden da ordem de R$ 163.459.799,55. Nem mesmo o mercado ou a autarquia reguladora foram tempestivamente alertados do ocorrido. Este comportamento omissivo do Banco Schahin S/A é devidamente confirmado por CYRO JOSÉ, funcionário do Banco Central que, em Juízo, alegou que a instituição financeira se quedou inerte, não tendo buscado qualquer solução para reverter o quadro relacionado àquela inadequação contábil ou para tentar reaver os valores aplicados no Banco Clariden. Vejamos (ID 309408834): “CYRO: - Eles falaram que eles não tinham reconhecido naquele contrato a assinatura dos administradores. O Banco Central questionou: “O que vocês providenciaram com isso, porque não foi baixado do ativo aquele valor”. Eles não fizeram nada. Nem contra o banco, nem investigação policial. Só disseram que não reconheciam aquele valor”. Diante deste cenário, o que se pode ver, com suficiente segurança, é que houve uma intenção dolosa de se ocultar a verdadeira situação econômica e patrimonial da instituição financeira, de maneira a se manter artificialmente uma imagem positiva da situação patrimonial do Banco Schahin S/A perante o mercado, investidores, autoridades e o próprio Banco Central. Os motivos para este comportamento são evidentes. O reconhecimento da perda patrimonial de mais de R$ 160.000.000,00 teria provocado uma alteração brusca na realidade financeira do Banco Schahin S/A, evidenciando imediatamente ao mercado, aos órgãos reguladores e ao público investidor que mais de 70% do patrimônio líquido do banco havia simplesmente deixado de existir. Tal revelação, presumivelmente, traria consequências ao Banco Schahin S/A, afetando sua credibilidade e podendo, em última análise, inviabilizar a continuidade de suas atividades ou provocar uma significativa desvalorização em caso de eventual alienação da instituição financeira. Disso decorre a convicção de que a manutenção indevida do montante de R$ 163.459.799,55 no documento contábil com data-base de 31/12/2010, apesar do fato da alegada fraude ter ocorrido em meados de novembro de 2008, decorreu de uma escolha consciente, voltada à manipulação deliberada da realidade patrimonial do Banco Schahin S/A. Tal conduta, ao criar um cenário de saúde financeira do Banco Schahin S/A não condizente com a realidade, expôs a risco não apenas os investidores e credores do banco, mas a estabilidade e integridade do próprio sistema financeiro, que depende da confiança na veracidade das informações contábeis para operar de forma segura e eficiente. Por fim, é preciso deixar claro: a alegada fraude, se existente, deveria ter sido registrada; o que não se pode admitir, sob qualquer argumento, é a perpetuação de um ativo inexistente em documento contábil, com o claro propósito fraudulento de mascarar a real condição financeira da instituição financeira e inflar artificialmente a dimensão de seu real patrimônio. Comprovada, portanto, a materialidade do delito de gestão fraudulenta, no ponto. II – Concessão de empréstimo legalmente vedado Em 28/12/2009, o Banco Lemon celebrou contrato de empréstimo, materializado pela CCB nº 341, concedendo crédito de R$ 15.000.000,00 à “HHS Participações”, tendo se posicionado como avalistas da operação S. T. S. e M. T. S. (ID 35661525, pp. 107/119). Na mesma data (28/12/2009), o valor de R$ 14.600.000,00 foi creditado na conta da “HHS Participações” aberta no Banco Schahin S/A (ID 35380649, p. 10). Igualmente em 28/12/2009, o Banco Schahin S/A promoveu a transferência eletrônica de R$ 18.000.000,00 ao FIDC Multisetorial Empresarial LP (cf. ID 35380649, pp. 24/28, ID 35380649, p. 16 e ID 35380649, p. 20). Nesta mesma data (28/12/2009), o FIDC Multisetorial Empresarial LP adquiriu, junto ao Banco Lemon, a CCB nº 341, pelo valor de R$ 15.000.000,00 (ID 35380649, p. 14). A cessão do crédito foi realizada sem coobrigação para o Banco Lemon. De maneira esquemática: Como se pode ver, o empréstimo de R$ 15.000.000,00 concedido pelo Banco Lemon à “HHS Participações” foi, na mesma data, compensado integralmente com o valor recebido por aquela instituição financeira pela cessão da CCB nº 341 ao FIDC Multisetorial, sem coobrigação. Não houve, portanto, qualquer desembolso real de capital por parte do Banco Lemon, tampouco exposição a qualquer tipo de risco, já que o crédito foi cedido sem coobrigação. No mesmo sentido, o FIDC Multisetorial, abastecido com R$ 18.000.000,00 aplicados pelo Banco Schahin S/A, pôde adquirir a “CCB” nº 341, com recursos desta instituição financeira. Tal engenho acabou identificado pelo Banco Central. Vejamos: “(...) A simultaneidade dos pagamentos, todos em 28.12.2009, a similaridade dos valores, a origem dos recursos (o Banco Schahin), e o seu destino (a empresa HHS), evidenciam que o objetivo final do conjunto de operações foi o suprimento da HHS com recursos do Banco Schahin, com a interposição do Banco Lemon e do FIDC Multisetorial, com a intenção de descaracterizar a concessão do empréstimo à empresa ligada, o que caracteriza infração de natureza grave na condução dos interesses da Instituição Financeira” (ID 35380650, p. 45). A finalidade das aludidas operações interpostas era, nitidamente, a de evitar a identificação de que os R$ 14.600.000,00 recebidos pela “HHS Participações” a título de empréstimo derivavam, na origem, de valores pertencentes ao Banco Schahin S/A. Uma operação direta, entre o Banco Schahin S/A e a “HHS Participações” incidiria na vedação do art. 34, V, da Lei nº 4.595/64, na redação vigente à época dos fatos, que proibia às instituições financeiras realizar operação de crédito com pessoas jurídicas de cujo capital participem com mais de 10% quaisquer dos diretores ou administradores da própria instituição financeira, bem como seus cônjuges e respectivos parentes, até o 2º grau. No caso, Milton Schahin e Salim Schahin eram Diretores Estatutários do Banco Schahin S/A (ID 35380649, pp. 202 e 204). Além disso, detinham 10% do capital social da “HHS Participações” (cf. ID 35380650, p. 45). De mais a mais, a “HHS Participações” era controlada pela “MTS” e pela “Satasch”, cujos sócios majoritários eram, justamente, Milton Schahin e Salim Schahin, que detinham 99,98% de suas cotas (cf. IDs 35661525, pp. 65 e 35661525, pp. 83/101). A “MTS” e a “Satasch” controlavam a “HBF Participações”, sendo aquelas detentoras de 50%, cada uma, do capital desta. A “HBF Participações”, por seu turno, era a acionista majoritária do Banco Schahin S/A, detendo 84,29% de seu capital social (cf. ID 35380650 - Pág. 45). Ou seja, o Banco Schahin S/A e a HHS Participações eram controlados, entre outras pessoas, por Milton Schahin e Salim Schahin e, como visto, houve a adoção de estratégias para camuflar a operação de crédito entre as pessoas jurídicas em questão e para se superar o obstáculo legal, a demonstrar, uma vez mais, a prática de ato autônomo inserido dentro da gestão fraudulenta engendrada na estrutura do Banco Schahin S/A. A defesa dos réus, no ponto, sustentou a ocorrência de abolitio criminis quanto ao delito previsto no art. 17 da Lei nº 7.492/86, em razão das alterações promovidas pela Lei nº 13.506/2017. Argumenta que, a partir da nova redação do art. 34 da Lei nº 4.595/64, tornou-se requisito para a configuração do crime a demonstração de que a operação de crédito foi realizada em condições incompatíveis com as de mercado. Afirma, por fim, que as operações objeto da acusação foram realizadas em conformidade com os padrões de mercado vigentes à época, razão pela qual a conduta imputada não seria crime. Sem razão, contudo. Isso porque restou amplamente demonstrado que as operações de crédito foram estruturadas fraudulentamente de forma a ocultar sua real natureza, com o objetivo de contornar a vedação legal (art. 34, V, da Lei nº 4.595/64). Ou seja, não se tratou de operação lícita, tampouco condizente com as práticas usuais de mercado, mas sim de ato deliberado e autônomo inserido no contexto mais amplo de gestão fraudulenta da instituição financeira. Como se pôde observar houve a adoção de estratégias específicas para mascarar e dissimular o real favorecimento entre partes relacionadas. Essa conduta demonstra a deliberada intenção de burlar os mecanismos de controle do sistema financeiro e ultrapassa, em muito, o mero descumprimento formal de norma administrativa ou a realização de contrato em condições de mercado. Assim, é inaplicável à espécie o raciocínio da defesa de que se estaria diante de operação genuína e compatível com as práticas de mercado. Ao revés, as sucessivas manobras fraudulentas acima apontadas demonstram justamente o oposto: a realização de condutas deliberadamente inidôneas e artificiais para a concessão de empréstimo, sob outra roupagem jurídica, a pessoa jurídica titularizada pelos sócios do Banco Schahin. Assim, restou plenamente comprovada a materialidade delitiva do crime de gestão fraudulenta no ponto. B) Da autoria delitiva B.1.) P. H. S. A autoria delitiva restou amplamente comprovada, ao menos no que se refere aos atos de gestão fraudulenta relacionados às manobras e artifícios com o propósito de elevar artificialmente os resultados financeiros do Banco Schahin S/A. Vejamos. Nos termos do art. 9º do Estatuto Social do Banco Schahin S/A, a administração da instituição financeira era realizada por sua Diretoria (ID 35380650 – Pág. 149). A esta Diretoria competia, portanto, praticar todos os atos necessários à gestão dos negócios da companhia, em harmonia com as disposições de seu Estatuto e da Lei. Segundo o Sistema de Cadastro único de Instituições de Interesse do Banco Central (ID 35380649, pp. 190/192), PEDRO compôs a Diretoria do Banco Schahin, tendo ocupado, durante sua gestão, os seguintes cargos: A) No período de 13/07/2007 a 18/08/2011, foi Diretor responsável pela carteira comercial; pelas operações compromissadas; pelas operações de swap; pelo gerenciamento do risco mercado; pelo gerenciamento do risco de liquidez; B) No período de 13/07/2007 a 03/05/2010, exerceu a função de Diretor responsável pelas contas de depósito para investimento. C) No período de 18/06/2008 a 18/08/2011, foi Diretor responsável pela área contábil. Ademais, em interrogatório, o acusado admitiu participar da administração do banco. Não há qualquer dúvida, portanto, de que PEDRO SCHAHIN compunha a alta administração da instituição financeira. Em razão disso, ao réu cabia gerenciar áreas relevantes da atividade operacional da instituição financeira. Evidentemente, a simples posição ocupada pelo réu à frente do Banco Schahin S/A, de forma isolada, não constituiria elemento de prova suficiente para posicioná-lo como autor da gestão fraudulenta nela engendrada. Porém, além desta condição formal, há prova suficiente nos autos apta a demonstrar que, além de exercer funções de direção na instituição financeira, PEDRO SCHAHIN atuou de forma determinante para viabilizar as práticas fraudulentas que, ao final, culminaram na elevação artificial dos resultados financeiros do Banco Schahin S/A. Como já se demonstrou acima, parte das estratégias adotadas para inflar artificialmente a lucratividade do Banco Schahin S/A consistiu na celebração simulada de contratos de venda de papeis ou cessão de operações de crédito. Nesse contexto, avulta a participação do réu PEDRO, que exerceu papel de destaque na execução dessas transações, que passo a detalhar. a) Da venda de certificados de Cédula de Crédito Bancário para o Banco Lemon S/A Entre 27/12/2010 e 29/12/2010, o Banco Schahin S/A realizou 16 (dezesseis) cessões de crédito ao Banco Lemon S/A. Todos os instrumentos contratuais foram subscritos por PEDRO SCHAHIN, na qualidade de representante do Banco Schahin S/A (ID 35662812, pp. 56/87). Conforme exposto na análise da materialidade, o Banco Lemon S/A transferiu os Certificados de Cédula de Crédito Bancário para o “Fundo Ajax” que, por sua vez, nos dias 27, 28 e 29 de dezembro de 2010, emitiu 85 cotas subordinadas mezanino subscritas pelo Banco Schahin S/A pelo valor aproximado de R$ 85.060.000,00 (ID 35662811, p. 85). Os boletins de subscrição nº 01, nº 02 e nº 03 relacionados à aquisição das ações pelo Banco Schahin S/A foram assinados por PEDRO SCHAHIN, em 27, 28 e 29 de dezembro de 2010 (cf. ID 35662812, p. 88, p. 90 e p. 92). Com este engenho, o Banco Schahin S/A produziu uma simulação de venda de Certificados de Cédulas de Crédito Bancário, computando em seus balanços um lucro inexistente. Para a concretização desta manobra, o Diretor Estatutário PEDRO SCHAHIN concorreu de modo absolutamente fundamental, assinando tanto os instrumentos de cessão ao Banco Lemon quanto os boletins de subscrição para aquisição das cotas do Fundo Ajax, os quais permitiram a reaquisição dos créditos cedidos pelo Banco Schahin. b) Da realização de cessões de crédito simuladas para elevação artificial de resultados (Banco Schahin/Continental Securitizadora) PEDRO SCHAHIN, na qualidade de Diretor Estatutário do Banco Schahin S/A, subscreveu 2 (dois) contratos de cessão de créditos sem coobrigação à empresa Continental Securitizadora, nos valores de R$ 30.000.000,00 e R$ 142.000.000,00, com pagamento pactuado a prazo (ID 35662812, pp. 144/148 e 150/158). No entanto, a apuração de lucro pelo Banco Schahin S/A com base nesses contratos revelou-se ardilosa, porquanto se tratou de operação simulada, desprovida de efetiva transferência de risco e de substância econômica. Com efeito, os pagamentos realizados à Continental Securitizadora nas datas de vencimento das parcelas tinham origem em transferências bancárias promovidas pela instituição financeira “Cifra S/A CFI” (“Cifra”), da qual PEDRO também era Diretor no período correspondente, e com recursos da “Schahin Securitizadora”, empresa componente do grupo econômico Schahin (ID 35380649, pp. 190/191). A estrutura da operação era circular e intragrupo, tendo sido evidenciado seu caráter fraudulento conforme exposto na materialidade delitiva. A “Schahin Securitizadora”, empresa vinculada ao grupo econômico do Banco Schahin S/A, detinha em seu patrimônio valores aportados pela holding “HSS Participações”, a título de adiantamentos para futuro aumento de capital (AFACs), ainda não convertidos em participação societária. Em vez de solicitar a conversão em participação societária ou a devolução dos aportes, a “HSS Participações” autorizou que tais valores fossem repassados diretamente à Continental Securitizadora, sem fundamento jurídico para tanto (ID 35661522, p. 53). Para cumprir tal instrução, a “Schahin Securitizadora” determinou que a “Cifra S/A CFI” transferisse diretamente à Continental Securitizadora valores a que fazia jus em razão de contratos de cessão de crédito celebrados entre a Cifra e empresas do Grupo Schahin. Como se pode observar, as transferências foram realizadas por meio de TEDs originados da conta bancária da “Cifra” mantida junto ao próprio Banco Schahin S/A. As solicitações de transferência, registre-se, foram assinadas pelo próprio PEDRO SCHAHIN, então Diretor tanto da instituição cedente (Banco Schahin S/A) quanto da instituição ordenadora da transferência (Cifra S/A) (ID 35661522, p. 97; ID 35380649, pp. 190/191). Conforme já explanado na análise da materialidade delitiva, os recursos utilizados para adimplir os contratos de cessão não provinham de terceiro (Continental Securitizadora, na hipótese), mas sim da holding controlada pelos diretores e fundadores do Banco Schahin, HHS PARTICIPAÇÕES. Nesse cenário, considerando, ainda, todos os atos de gestão fraudulenta expostos nesta sentença, não restam dúvidas de que se tratou de operação artificiosa, que envolveu, inevitavelmente, a cúpula das pessoas jurídicas utilizadas para os negócios jurídicos simulados. Assim, para a concretização da manobra fraudulenta, a ação do Diretor Estatutário PEDRO SCHAHIN se mostrou, mais uma vez, absolutamente fundamental, por sua posição de destaque tanto na alta administração do Banco Schahin S/A, quanto à frente da Cifra S/A. c) Da realização de cessões de crédito cruzadas com o Banco Semear S.A, com o Banco Panamericano S.A, com o Banco Mercantil do Brasil S.A e com o Banco Fisca S.A, com a finalidade de criar receitas de forma simulada, resultando em lucro artificial de R$ 85.626.000,00 Conforme dito acima, as instituições financeiras Banco Semear S.A, o Banco Panamericano S.A, o Banco Mercantil do Brasil S.A. e o Banco Ficsa S.A promoveram recíprocas operações de cessão de carteiras de direitos creditórios com o Banco Schahin S.A.. Nesse sentido, foram acostados aos autos: i) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 107/09, firmado entre o Banco Semear (cedente) e o Banco Schahin S.A (cessionária), envolvendo a transferência de carteira de direitos creditórios que totalizavam R$ 18.251.110,72, datado de 26/05/2009 (ID 35661522, pp. 231/237); ii) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 108/09, firmado entre o Banco Schahin S/A (cedente) e o Banco Semear (cessionário), envolvendo a transferência de carteira de direitos creditórios que totalizavam R$ 17.419.332,55, datado de 27/05/2009, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 241/249); iii) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 001-06/09, firmado entre o Banco Schahin S/A (cedente) e o Banco Panamericano S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam R$ 47.951.365,70, datado de 02/06/2009, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 253/261). iv) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 119/09, firmado entre o Banco Panamericano S/A (cedente) e o Banco Schahin S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam R$ 47.552.036,07, datado de 02/06/2009, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 263/275). v) o contrato de cessão de créditos com coobrigação nº 230609, firmado entre o Banco Mercantil do Brasil Financeira S/A (cedente) e o Banco Schahin (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam R$ 17.497.470,34, datado de 23/06/09, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 289/297). vi) o contrato de cessão de créditos com coobrigação nº 090624, firmado entre o Banco Mercantil do Brasil Financeira S/A (cessionário) e o Banco Schahin (cedente), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam R$ 17.437.834,80, datado de 24/06/2009, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 279/285). vii) o contrato de cessão de direitos sem coobrigação, firmado entre o Banco Ficsa S/A (cedente) e o Banco Schahin S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam R$ 21.273.791,92, datado de 30/06/2009, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 301/303); viii) o contrato de cessão de direitos sem coobrigação do cedente nº 153/09, firmado entre o Banco Schahin S/A (cedente) e o Banco Ficsa S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam R$ 21.460.948,66, datado de 30/06/2009, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 305/309). ix) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 003-09/09, firmado entre o Banco Panamericano S/A (cedente) e o Banco Schahin S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam o montante de R$ 60.182.592,57, datado de 30/10/09, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 313/321). x) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 003-09/09, firmado entre o Banco Schahin S/A (cedente) e o Banco Panamericano S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam o montante de R$ 60.007.842,07, datado de 30/10/09, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661522, pp. 323/331). xi) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 024/10, firmado entre o Banco Schahin S/A (cedente) e o Banco Panamericano S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam o montante de R$ 116.507.885,69, datado de 31/03/10, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661521, pp. 9/17). xii) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 004-03/10, firmado entre o Banco Panamericano S/A (cedente) e o Banco Schahin S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam o montante de R$ 117.593.884,62, datado de 31/03/10, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661521, pp. 19/27). xiii) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 1013, firmado entre o Banco Panamericano S/A (cedente) e o Banco Schahin S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam o montante de R$ 126.403.692,01, datado de 26/05/2010, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661521, pp. 29/37). xiv) o contrato de cessão de crédito com coobrigação nº 041/10, firmado entre o Banco Schahin S/A (cedente) e o Banco Panamericano S/A (cessionário), envolvendo a transferência de direitos creditórios que totalizavam o montante de R$ 122.105.857,60, datado de 26/05/2010, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661521, pp. 39/47). Consoante apurado pelo Banco Central do Brasil (BACEN), posicionando-se como cedente nas operações supracitadas, o Banco Schahin S/A auferiu R$ 343.625.850,83. Porém, ao se posicionar como cessionário nas operações, desembolsou a quantia de R$ 345.261.291,52. Ou seja: não houve apuração de diferenças reais a título de lucro (ID 35383637, p. 151). Nesse quadro, a autarquia supervisora concluiu que: “(...) o fato de ter cedido créditos e adquirido outros créditos da mesma instituição, em um curto prazo e com valores muito próximos, demonstra que tais operações tiveram como objetivo a contabilização de receita futura de maneira artificial” (ID 35383637, p. 151). Para a concretização de tal manobra, o Diretor Estatutário PEDRO SCHAHIN concorreu diretamente, sendo sua atuação, mais uma vez, absolutamente fundamental para o êxito da empreitada criminosa, tendo ele se incumbido, na qualidade de Diretor, de assinar 13 (treze) dos 14 (catorze) contratos acima citados relacionados às simuladas operações destinadas a incrementar artificialmente as receitas do Banco Schahin S/A. d) Da recompra de créditos anteriormente cedidos sem o reconhecimento imediato da despesa de R$ 29.466,00 decorrente dessa operação, que foi diferida indevidamente, utilizando critério contábil diverso do aplicado nas cessões iniciais, quando foi reconhecida, antecipadamente, a receita futura da carteira de crédito cedida Conforme a prova colhida nos autos, PEDRO SCHAHIN assinou, como representante do Banco Schahin S/A, o instrumento contratual de recompra, por parte do Banco Schahin S/A, dos créditos com rating de “A” a “C”, firmado em 30/12/2010, pelo valor de R$ 160.700.010,05. Como resultado desta operação, o Banco Schahin S/A, em demonstrativo contábil, colheu o prejuízo de R$ 29.466.000,00, relativo à diferença entre o valor pago à Schahin Securitizadora S/A (R$ 160.700.010,05) e o valor dos créditos na data da recompra (R$ 131.234.000,00). O Banco Central do Brasil (BACEN) advertiu expressamente o Banco Schahin S/A, em termo de comparecimento, datado de 14/04/2011, inclusive subscrito por seus representantes P. H. S. e Maria Ângela M. Cabral, de que o valor de R$ 29.466.000,00 deveria ser reconhecido como despesa para a data-base de dezembro/2010 (ID 35661524, pp.. 89 e 93). Todavia, ao invés de registrar contabilmente o valor de prejuízo de R$ 29.466.000,00 imediatamente como despesa da recompra, o Banco Schahin S/A o registrou como um ativo diferido na conta “Rendas – Cessão de Crédito a Diferir”, com o histórico “Prejuízo na recompra de oper de cred Schahin Securit”, em prática utilizada para postergar o reconhecimento da perda, resultando no adiamento de sua contabilização como perda real e na distorção do resultado contábil ao final do exercício, o que mascarou a situação financeira da instituição (ID 35661521, p. 253). Como se vê, uma vez mais, PEDRO SCHAHIN concorreu diretamente para a recompra dos créditos cedidos ao assinar os respectivos instrumentos contratuais desta operação. Além disso, foi instado pelo BACEN, na qualidade de diretor, a reconhecer o valor de R$ 29.466.000,00 como perda, não tendo tomado qualquer providência para que a advertência do órgão regulador fosse observada quando da elaboração do balanço. e) Da realização de cessão simulada de crédito com o Banco ABC Brasil S/A, com a finalidade de antecipar o reconhecimento de receitas, resultando em lucro artificial de R$ 13.882.000,00 Conforme o termo de transferência de créditos com coobrigação nº 846110, o Banco Schahin S/A, em 05/05/2010, cedeu ao Banco ABC BRASIL S/A créditos oriundos de Cédulas de Crédito Bancário (“CCBs”), que totalizavam o montante de R$ 64.034.900,00, assinando pelo Banco Schahin S/A PEDRO H. SCHAHIN e Maria Angela M. Cabral (ID 35661521, pp. 255/261). Segundo já explicado quando da análise da materialidade delitiva, o Banco Schahin S/A, apesar de ter cedido direitos creditórios ao Banco ABC Brasil, simultaneamente, aplicou em depósitos interfinanceiros (CDIs) no Banco ABC Brasil o valor equivalente ao da alienação dos “CCBs”, pactuada pelo termo de transferência de créditos com coobrigação nº 846110. Tudo não passava de peça de ficção num contexto de mera simulação negocial, com o objetivo de permitir se antecipar, fraudulentamente, o reconhecimento de receitas, do que resultou o registro de um lucro artificial da ordem de R$ 13.882.014,19 no livro Razão, conta Rendas - Cessão de Crédito (ID 35380816, p. 15 e ID 35662811, p. 41). Mais uma vez, o Diretor do Banco Schahin S/A, PEDRO SCHAHIN, assinando termo de transferência de créditos com coobrigação nº 846110, concorreu diretamente para a concretização da estratégia construída para artificial elevação de lucros da instituição financeira. f) Utilização de cessões parciais de operações de créditos para fracionamento de operações de crédito em curso anormal, dissociando as parcelas a vencer e as parcelas em atraso, de tal forma que as parcelas vencidas deixassem de sensibilizar a classificação de risco das demais, em detrimento das prescrições da Resolução n. 2682 de 1999, acarretando o não reconhecimento de R$ 123.047.000,00 Conforme já explicado na análise da materialidade delitiva, restou apurado no Processo Administrativo do Banco Central do Brasil que o Banco Schahin, em relação a uma mesma operação de crédito, cedia parcelas com maior tempo de atraso à Schahin Securitizadora, enquanto as demais parcelas permaneciam em parte na sua própria carteira ou na carteira da “Cifra CFI” e, ainda, uma outra parte era cedida a outras instituições financeiras (Banco Panamericano, Banco do Estado do Espírito Santo S.A. – Banestes e Banco ABN Amro Real S.A.) – ID 35383637, p. 156. Houve, portanto, uma fragmentação de crédito irregular e sem respaldo legal ou regulamentar, com o objetivo de permitir ao Banco Schahin S/A se desfazer de “créditos podres”, mantendo em sua carteira majoritariamente ativos de melhor qualidade, a transmitir uma melhor percepção de sua situação econômica perante o mercado, credores e Banco Central. Esta mesma prática se repetiu em múltiplas oportunidades, como, por exemplo, nos contratos de crédito dos diversos mutuários relacionados nas tabelas de ID 35383637, pp. 156/159. A atuação de PEDRO SCHAHIN, relacionada à pactuação dos instrumentos de cessão de direitos creditórios “podres”, que foram separados indevidamente da operação original, é, uma vez mais, destacável. Nesse sentido, o Banco Schahin S/A cedeu à Schahin Securitizadora, por meio de diversos contratos de cessão de direitos creditórios sem coobrigação, créditos “podres”, relacionados a parcelas de operações de crédito firmadas com centenas de mutuários, com mais tempo de atraso, à Schahin Securitizadora (cf. ID 35661524, p. 9/73). Além disso, há diversos contratos acostados aos autos, relacionados à cessão, com coobrigação, de parcelas de operações de crédito, com centenas de mutuários, às instituições financeiras Banco Panamericano, Banco do Estado do Espírito Santo S.A. – Banestes e Banco ABN Amro Real S.A. (ID 35662463, pp. 213/337). Ou seja, houve a fragmentação indevida de operações de créditos, subdividindo-as em blocos distintos, com classificações de risco diversas. A depender da saúde do ativo fracionado indevidamente, o Banco Schahin decidiu ou por mantê-lo em sua própria carteira, ou por cedê-lo a outras instituições financeiras ou, no que toca àqueles com maior atraso, cedê-los à Schahin Securitizadora, empresa do mesmo grupo econômico. A manobra acabou por resultar em subavaliação do risco dos créditos indevidamente fragmentados e, consequentemente, a instituição financeira deixou de efetuar as provisões necessárias para fazer frente aos riscos a eles relacionados, conforme melhor detalhado acima no exame de materialidade do delito. Como se pode observar, PEDRO SCHAHIN assinou, como Diretor do Banco Schahin, as dezenas de contratos de cessão de créditos relacionados a parcelas das operações indevidamente fragmentadas pela instituição financeira, concorrendo, assim, de forma substancial para a manobra fraudulenta (ID 35662463, pp. 213/337). Com isso, há, uma vez mais, a demonstração de que o réu PEDRO SCHAHIN atuou para viabilizar um engenhoso artifício a fim de atenuar as provisões a que estava obrigada a instituição financeira, induzindo em erro, tanto a entidade fiscalizadora, quanto o próprio mercado bancário. g) Elevar artificialmente o resultado do banco Schahin, ao contabilizar, como receita, valores recebidos por liquidação antecipada de operações cedidas com coobrigação, deixando de reconhecer a devida obrigação com os cessionários, e apresentando, em consequência, demonstrações financeiras referentes ao período findo em 31/12/2010, de modo a gerar demonstrações financeiras incompatíveis com a real situação econômico-financeira Neste ponto, a autoria delitiva não se mostrou comprovada. A prova dos autos é suficiente para determinar a materialidade de um ato típico de gestão fraudulenta. Todavia, não há elementos suficientes que respaldem a tese de que PEDRO SCHAHIN concorreu, de qualquer modo, para o cometimento da dita irregularidade que, ao final, redundou na elevação artificial do resultado do Banco Schahin S/A. Conforme já analisado no tópico relativo à materialidade delitiva, para a data-base 31/12/2010, houve a declaração, por parte do Banco Schahin S/A, de recebimento de R$ 47.465.567,11 relacionados à liquidação antecipada de cessões de crédito cedidas com coobrigação (ID 35661524, p. 81). Todavia, a instituição financeira registrou na conta de passivo “Transitória – Cessão a Repassar”, no período de 01/12/2010 a 31/08/2011, apenas o valor de R$ 1.969.231,20 (ID 35661524, p. 83), registrado sob o histórico “baixa p/ liq parcelas pré liquidadas”. A diferença entre o valor de R$ 47.465.567,11 e R$ 1.969.231,20 foi computado pelo Banco Schahin S/A, em demonstrativo contábil, como receita, de modo a elevar artificialmente o resultado financeiro da instituição financeira em aproximadamente R$ 45.496.000,00 (cf. ID 35380650, p. 43), o que caracterizou uma infração de natureza grave sob a ótica do Banco Central do Brasil (ID 35662811, p. 54). É sabido que a gestão do Banco Schahin era exercida de forma compartilhada, não se concentrando exclusivamente nas mãos de um único diretor. A alta administração da instituição era composta por diversos diretores, incluindo PEDRO SCHAHIN, todos investidos de poderes de administração e gerência similares. Além dos diretores estatutários, a estrutura organizacional do Banco Schahin abrangia executivos com relevante grau de autonomia funcional, bem como profissionais da contabilidade diretamente responsáveis pela elaboração e consolidação dos registros contábeis. Em um ambiente corporativo com tais características, é comum que determinadas decisões — inclusive as relacionadas a lançamentos contábeis — não passem necessariamente pelo crivo pessoal de todos os membros da diretoria, sobretudo na ausência de elementos que indiquem essa atuação individualizada. No caso em análise, diferentemente das situações acima destacadas, não se identificam, nos autos, provas que indiquem que PEDRO tenha, pessoalmente, determinado, autorizado ou sequer orientado a realização da manobra contábil apontada. Não foram produzidos documentos, mensagens, ordens internas ou registros de reuniões que permitam inferir a participação de PEDRO nesta decisão institucional. Da mesma forma, inexiste prova testemunhal que sustente sua ciência ou anuência prévia ou posterior à prática do ato tido por irregular. A imputação, portanto, não se ancora em evidências objetivas de autoria, mas apenas na posição hierárquica que ocupava à época dos fatos — o que, por si só, não é bastante para fundamentar a responsabilização penal. Ademais, não se pode descartar a hipótese de que a irregularidade tenha se originado por ação ou omissão de outros indivíduos vinculados à instituição, como os demais diretores, executivos ou os próprios contadores encarregados dos lançamentos, a tornar duvidosa a tese de que PEDRO SCHAHIN concorreu de forma dolosa para a manobra fraudulenta objeto do presente tópico. h) Manter registro de ativo insubsistente, desde novembro de 2008 - cerca de US$ 90 milhões de dólares, equivalente a R$ 163.459.799,55 na data base de 31.12.2010, valor este correspondente a 68% do patrimônio líquido da instituição (R$ 229.175.000,00). Em consequência, o banco forneceu ao Banco Central demonstrações contábeis que não refletiam a sua real situação econômico-financeira A autoria do delito de gestão fraudulenta, no ponto, recai com clareza sobre P. H. S., que dirigia a área contábil do Banco Schahin S/A e foi o responsável direto pelo tratamento da situação envolvendo a perda dos recursos depositados no Banco Clariden Leu Ltda. Durante seu interrogatório, PEDRO admitiu que teve conhecimento da alegada fraude que resultou no débito integral da quantia aplicada pelo Banco Schahin S/A e alegou que tratou diretamente da questão com o próprio Banco Clariden, na busca de reversão da situação. Trata-se de declaração inequívoca de que tinha ciência da perda dos recursos aplicados no Banco Clariden e de que conduziu pessoalmente as tratativas relativas ao episódio. Nesse sentido, PEDRO assim relatou em Juízo: “PEDRO: A gente pediu... a gente fez uma cobrança amigável na época. E como eles falaram que não tinha vencido ainda [...] eles falaram que iam estornar. E aí foram enrolando, enrolando, enrolando, até a hora que o banco foi vendido e a gente não teve mais acesso.” O reconhecimento de que conduziu as tratativas com o banco Clariden desde o início evidencia que PEDRO, na qualidade de responsável pela área contábil do Banco Schahin e com pleno conhecimento da perda do ativo, deliberadamente optou por mantê-lo nos balanços patrimoniais da instituição, sem qualquer nota explicativa. Foi PEDRO, também, quem tratou com o Banco Central (BACEN) em nome do Banco Schahin S/A a respeito de toda a situação, prestando esclarecimentos à época das apurações administrativas, sendo o responsável pela interlocução institucional e pelas justificativas apresentadas à autarquia reguladora (ex: ID 35380416, pp. 63/65). O teor de tais esclarecimentos evidencia que o Banco Schahin buscou resgatar a aplicação no Banco Clariden no segundo semestre de 2008, quando teria sido informado da vinculação a contrato de empréstimo. Por dirigir, entre outras áreas, a área contábil do Banco (ID 35380649, pp. 190/192) e, ainda, ter tratado diretamente com o Banco Clariden, desde a constatação da alegada fraude, não restam dúvidas de que PEDRO concorreu para a manutenção do ativo insubsistente no balanço do Banco Schahin S/A. Tratando-se o resgate da vultosa aplicação internacional de questão atinente à cúpula da diretoria financeira do Banco Schahin, cabia a PEDRO, diretor estatutário responsável pela área contábil, informar ao contador da instituição financeira sobre a alteração na situação do aludido ativo. Essa consciente decisão teve o efeito direto de inflar artificialmente o patrimônio do Banco Schahin S/A em mais de 70%, induzindo em erro o mercado, o Banco Central e os investidores quanto à real situação financeira da instituição. A ausência de medidas para adequação dos registros contábeis ou adoção e registro de ações judiciais contra o banco suíço, evidencia intenção dolosa de ocultar a realidade patrimonial do banco. Diante disso, é possível afirmar com segurança que P. H. S. concorreu dolosamente para a manutenção de ativo sabidamente inexistente nos registros contábeis do Banco Schahin S/A. II - Concessão de empréstimo legalmente vedado Neste ponto, a autoria delitiva de P. H. S. não se mostrou comprovada. Os únicos ex-Diretores vinculados, de maneira direta, às operações relacionadas à concessão de empréstimo legalmente vedado foram Milton Schahin e Salim Schahin que, atualmente, não mais compõem o polo passivo da presente ação penal. Diferentemente de situações acima destacadas, não há qualquer menção, nem mesmo na denúncia, relacionada a eventual atuação de PEDRO SCHAHIN para viabilizar a concessão de empréstimo legalmente vedado. Além disso, não foram produzidos documentos, mensagens, ordens internas ou registros de reuniões que permitam inferir a sua participação nesta operação fraudulenta. Da mesma forma, inexiste prova testemunhal que sustente sua ciência ou anuência prévia ou posterior à prática do ato tido por irregular. A imputação, portanto, não se ancora em evidências objetivas de autoria, mas apenas na posição hierárquica que ocupava à época dos fatos — o que, por si só, não é bastante para fundamentar responsabilização penal. Conclusão Conforme visto, a autoria delitiva do corréu PEDRO no que toca ao delito de gestão fraudulenta sob análise restou amplamente comprovada. A conjugação dos atos analisados individualmente nos itens I, a, b, c, d, e, f e h, não deixa dúvidas de que foi implementada uma gestão voltada à prática de fraudes no Banco Schahin para que as suas demonstrações financeiras fossem manipuladas, de modo a contabilizar receitas e/ou lucros inexistentes. PEDRO, além de diretor estatutário pertencente ao alto escalão da administração, executou materialmente diversos atos imprescindíveis à execução desse plano criminoso, conforme já detalhado linhas acima. Essa análise global dos atos individualmente praticados por PEDRO também evidencia que, ao contrário do que alega a defesa, não se tratou de práticas isoladas de gestores de áreas nas quais o corréu não atuava diariamente; ao revés, ficou demonstrado, extreme de dúvidas, que o corréu PEDRO concorreu dolosamente para a quase totalidade dos atos de gestão fraudulenta, os quais envolveram cessões de crédito simuladas, subscrição de quotas de FIDIC com propósito ardiloso, recompra créditos anteriormente cedidos sem adequado registro no balanço e manutenção de ativo insubsistente. Em face do exposto, considerando que o dolo decorre da prática voluntária da conduta típica, e inexistentes causas excludentes da ilicitude e da culpabilidade, condeno P. H. S. pela prática do crime do art. 4º, caput, da Lei 7.492/86 (item I, a, b, c, d, e, f e h). B.2.) C. E. S. No que se refere à prática de gestão fraudulenta, no caso de CARLOS EDUARDO, a autoria delitiva não se mostrou comprovada. Segundo o Sistema de Cadastro Único de Instituições de Interesse do Banco Central (ID 35380649, p. 182), CARLOS EDUARDO compôs a Diretoria do Banco Schahin, tendo ocupado, entre outros cargos, a função de Diretor Presidente entre 30/04/2008 e 18/08/2011 (ID 35380649, p. 182). Dispunha o Estatuto Social do Banco Schahin S/A que competia ao Diretor Presidente convocar e presidir as Reuniões de Diretoria, convocar e presidir as Assembleias Gerais, supervisionar todas as operações da Sociedade e fixar as atribuições dos Diretores (art. 11, II – ID 35380649, p. 142). Não há qualquer dúvida, portanto, de que C. E. S. compunha a alta administração da instituição financeira, tendo ocupado, inclusive, seu mais alto posto entre 30/04/2008 e 18/08/2011. Somente essa condição formal, entretanto, não o posiciona, com a certeza necessária a um decreto condenatório, na qualidade de autor dos atos típicos de gestão fraudulenta cuja materialidade se verificou. Explico. A responsabilização penal, especialmente no âmbito de crimes contra o sistema financeiro nacional, exige a demonstração concreta de conduta individualizada do dirigente da instituição financeira aliada à prova segura da participação do agente nos fatos criminosos. Desse modo, o simples exercício do cargo de diretor-presidente não autoriza, por si só, a imputação de responsabilidade penal por atos supostamente ilícitos praticados no âmbito da pessoa jurídica, sob o fundamento de que ele "deveria saber" ou "tinha o dever de controle", sem qualquer elemento concreto de prova que respalde tal alegação. Admitir a responsabilização penal, pautada apenas nestas premissas genéricas, consubstancia violação ao princípio da responsabilidade subjetiva, segundo o qual ninguém pode ser punido sem que tenha agido com dolo ou culpa. Mostra-se, portanto, imprescindível a comprovação da efetiva vontade livre e consciente de praticar o fato típico e ilícito, ou a assunção deste risco, sendo incabível atribuir responsabilidade criminal com base apenas na função desempenhada, ainda que de Diretor-Presidente. Esse entendimento está em plena consonância com a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal. No julgamento do HC 83.947/AM, a Corte foi categórica ao afirmar que: “A mera invocação da condição de diretor em instituição financeira, sem a correspondente e objetiva descrição de determinado comportamento típico que o vincule ao resultado criminoso, não constitui fator suficiente apto a legitimar a formulação da acusação estatal ou a autorizar a prolação de decreto judicial condenatório. A circunstância objetiva de alguém meramente exercer cargo de direção em instituição financeira não se revela suficiente, só por si, para autorizar qualquer presunção de culpa (inexistente em nosso sistema jurídico-penal).” (HC 83.947/AM, Rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, j. 07/08/2007, DJ 01/02/2008). Registro, ainda, que o fato de incumbir ao presidente de instituição financeira de grande porte supervisionar todas as operações do banco não implica a assunção de posição de garante, com dever de impedir dano ao bem jurídico penalmente tutelado (artigo 13, §2º, b, do Código Penal). No caso dos autos, a denúncia atribui a CARLOS EDUARDO, como atos típicos de gestão fraudulenta, de maneira mais concreta, apenas “assinar o contrato de cessão de crédito cruzado com o Banco Panamericano de 30.10.2009 (fls. 326/327)” e o “o contrato de cessão entre o Banco Schahin e a Schahin Securitizadora, de 28.12.2009 (fls. 974/975)”. Ao contrário do corréu PEDRO, CARLOS EDUARDO jamais deteve, por atribuição estatutária, responsabilidade direta sobre a carteira comercial ou sobre a área contábil do Banco Schahin S/A. PEDRO, além de formalmente responsável pela carteira comercial e sobre a área contábil do Banco Schahin S/A, assinou pessoalmente dezenas de documentos ligados às cessões simuladas de direitos creditórios, atuando em praticamente todos os artifícios utilizados pelo banco para inflar artificialmente sua performance e os resultados retratados em suas demonstrações contábeis, conforme acima detalhadamente descrito. A frequência e a amplitude da participação de PEDRO SCHAHIN, aliadas ao cargo por ele ocupado, permitem uma conclusão segura de sua plena ciência e adesão ao estratagema fraudulento. CARLOS EDUARDO, ao revés disso, limitou-se a subscrever apenas os 2 (dois) contratos acima referidos, o que, no âmbito da presidência de uma instituição financeira de grande porte, pode ter acontecido sem que tivesse plena ciência dos detalhes e objetivos das operações. Quanto à concessão de empréstimo legalmente vedado, a participação de CARLOS EDUARDO também não se mostrou minimamente comprovada. Os únicos ex-Diretores vinculados, de maneira direta, às operações relacionadas à concessão de empréstimo legalmente vedado foram Milton Schahin e Salim Schahin que, atualmente, não mais compõem o polo passivo da presente ação penal. Não houve na denúncia, nem restou apurado durante a instrução criminal, eventual atuação de CARLOS EDUARDO para viabilizar a concessão de empréstimo legalmente vedado. Nesse sentido, não foram colhidos documentos, mensagens, ordens internas ou registros de reuniões que permitam inferir sua participação em tal fato criminoso. Da mesma forma, inexiste prova testemunhal que sustente sua ciência ou anuência prévia ou posterior à prática do ato tido por irregular. A imputação, portanto, não se ancora em evidências objetivas de autoria, mas apenas na posição hierárquica que ocupava à época dos fatos — o que, por si só, não é bastante para fundamentar responsabilização penal. Ainda que se possa elucubrar ser extremamente provável que, dada a sua amplitude, os atos de gestão fraudulenta tenham sido concebidos no seio da cúpula diretiva da instituição financeira, incluindo o Diretor Presidente, é sabido que, para a condenação penal, exige-se certeza. Desse modo, à vista da ausência de prova capaz de demonstrar a ciência e o envolvimento intencional do acusado nos atos caracterizadores da gestão fraudulenta, aliada à impossibilidade de responsabilizá-lo objetivamente apenas pela condição de Diretor Presidente à época dos fatos, a dúvida deve se resolver em favor do réu, pelo que reputo não comprovada a autoria delitiva. Ante o exposto, ABSOLVO o corréu C. E. S. da prática do crime do artigo 4º, caput, da Lei 7.492/86, imputado na denúncia, com fulcro no artigo 386, VII, do CPP. III – Da Gestão Temerária - Do crime do art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86 – gestão temerária A) Enquadramento típico e materialidade delitiva: Art. 4º Gerir fraudulentamente instituição financeira: Pena - Reclusão, de 3 (três) a 12 (doze) anos, e multa. Parágrafo único. Se a gestão é temerária: Pena - Reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa. O tipo penal visa a tutelar a estabilidade, a confiabilidade e a idoneidade do Sistema Financeiro Nacional, bem como o patrimônio de todos os seus investidores, somente podendo ser praticado por uma das pessoas relacionadas no art. 25 da Lei 7.492/86: Art. 25. São penalmente responsáveis, nos termos desta lei, o controlador e os administradores de instituição financeira, assim considerados os diretores, gerentes (Vetado). § 1º Equiparam-se aos administradores de instituição financeira (Vetado) o interventor, o liqüidante ou o síndico. A despeito da vagueza semântica, a jurisprudência vem reconhecendo a constitucionalidade do delito de gestão temerária, que se consuma quando o gestor pratica manobras arriscadas, não recomendáveis no mercado financeiro-bancário e que “coloquem em risco a instituição financeira.”[1] Conforme as lições de CEZAR ROBERTO BITENCOURT e JULIANO BREDA, a gestão temerária: “(...) é caracterizada pela abusiva conduta, que ultrapassa os limites da prudência, arriscando-se o agente além do permitido mesmo para um indivíduo arrojado. É o comportamento afoito, arriscado, atrevido. (...) Em termos bem esquemáticos, para que se possa aferir a gestão do administrador de instituição financeira, deve-se, necessariamente, proceder rigorosa análise do conjunto dos atos praticados por ele dentro de um razoável lapso temporal e, ademais, é necessário que sejam examinados dentro de todo um contexto mercadológico” Quanto ao elemento subjetivo do tipo, imperioso reconhecer que deve haver “vontade consciente do sujeito passivo de colocar em risco ou causar prejuízo à instituição financeira ou aos seus investidores”.[2] Conquanto haja posições doutrinárias que entendem haver necessidade da prática de vários atos para consumação dos delitos, tem prevalecido na jurisprudência entendimento de que é possível a consumação com a prática de apenas uma ação do administrador, desde que, pela natureza fraudatória (gestão fraudulenta) ou pelo elevado risco (gestão temerária) seja suficiente para causar risco à saúde financeira da instituição. Neste sentido: EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. DENÚNCIA. INÉPCIA. INOCORRÊNCIA. GESTÃO FRAUDULENTA. CRIME PRÓPRIO. CIRCUNSTÂNCIA ELEMENTAR DO CRIME. COMUNICAÇÃO. PARTÍCIPE. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. EXECUÇÃO DE UM ÚNICO ATO, ATÍPICO. IRRELEVÂNCIA. ORDEM DENEGADA. 1. A denúncia descreveu suficientemente a participação do paciente na prática, em tese, do crime de gestão fraudulenta de instituição financeira. 2. As condições de caráter pessoal, quando elementares do crime, comunicam-se aos co-autores e partícipes do crime. Artigo 30 do Código Penal. Precedentes. Irrelevância do fato de o paciente não ser gestor da instituição financeira envolvida. 3. O fato de a conduta do paciente ser, em tese, atípica - avalização de empréstimo - é irrelevante para efeitos de participação no crime. É possível que um único ato tenha relevância para consubstanciar o crime de gestão fraudulenta de instituição financeira, embora sua reiteração não configure pluralidade de delitos. Crime acidentalmente habitual. 4. Ordem denegada. STF, HC 89364/PR, Segunda Turma, Rel. Ministro JOAQUIM BARBOSA, DJe 18/04/2008. PENAL. GESTÃO TEMERÁRIA DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. CONTRATOS DE FINANCIAMENTO LASTREADOS EM GARANTIAS 00SUFICIENTES. SUPLEMENTAÇÃO DEFERIDA MEDIANTE PARECER FAVORÁVEL DO SETOR TÉCNICO DO BANCO E DE RECOMENDAÇÃO DOS GERENTES DA AGÊNCIA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS CONCRETOS QUE APONTEM PARA O DOLO. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. 1. O delito de gestão temerária de instituição financeira, previsto no parágrafo único do artigo 4º da Lei n.º 7.492/1986, é classificado como crime de perigo, nada importando, para sua configuração, a ocorrência de efetivo prejuízo. 2. Assim como não se exige, para a configuração do crime de gestão temerária de instituição financeira, a ocorrência de prejuízo, a inexistência deste também não descaracteriza o delito. 3. A concessão de empréstimos sem a exigência de garantias idôneas e suficientes, juntamente com outras circunstâncias, pode evidenciar a prática do crime de gestão temerária. Por outro lado, se a administração do banco exige garantias bastantes, não há falar em risco para o sistema financeiro. 4. Deferidos, pelo Comitê de Crédito, o financiamento e a respectiva suplementação, mediante a exigência de garantias suficientes e com base em manifestações favoráveis do setor técnico do banco e dos gerentes da agência; e não comprovada, de qualquer modo, a assunção do risco de comprometer a higidez do sistema financeiro nacional, é imperiosa a manutenção da solução absolutória proclamada em primeiro grau de jurisdição. 5. Recurso ministerial desprovido. (TRF3, ACR 43083, Segunda Turma, Rel. Desembargador Federal Nelton dos Santos, e-DJF3 23/08/2012). Como se sabe, o artigo 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, incrimina a atuação negocial arriscada e imprudente, nociva aos interesses da instituição financeira, e em manifesta contrariedade às normas e aos regulamentos vigentes, avessa à cautela e prudência mínimas normalmente exigíveis dos gestores de instituições financeiras (TRF 3ª Região, 5ª Turma, ApCrim - APELAÇÃO CRIMINAL - 0001190-30.2019.4.03.6105, Rel. Desembargador Federal ALI MAZLOUM, julgado em 08/10/2024, Intimação via sistema DATA: 10/10/2024). Trata-se de conduta criminosa geralmente praticada por gestores que buscam, por meio de decisões negociais ou operações arriscadas, produzir maiores ganhos/rentabilidade ou a recuperação de investimentos para a organização que integram, ultrapassando os limites toleráveis de prudência e gerando risco à integridade de instituição financeira, propriamente dita ou equiparada, aos investimentos de terceiros e ao próprio Sistema Financeiro Nacional. É descabido num ambiente empresarial propício a riscos variados equiparar todo e qualquer ato de má gestão de instituições, do ponto de vista administrativo-empresarial, a um ato de gestão temerária, no modelo da conduta penalmente incriminada no art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, não comportando o tipo em tela interpretação ampliativa a ponto de abarcar erros de administração inseridos dentro da órbita civil. Ou seja, a mera desordem administrativa culposa, a despeito de causar eventualmente prejuízo ao interesse de clientes de instituições financeiras ou de instituições equiparadas, como entidades seguradoras, não se enquadram na moldura típica da gestão temerária (art. 4º, parágrafo único, LCSFN), a reclamar a intervenção do Direito Penal. No caso, de acordo com a denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF), por conduta de seus representantes, o Banco Schahin S/A: i) deixou de publicar demonstrações econômico-financeiras semestrais e anuais em jornal de grande circulação, referentes aos períodos findos em 31.12.2010 e 30.6.2011; ii) deixou de remeter ao Banco Central as Informações Financeiras Trimestrais referentes ao 4ª trimestre de 2010, e aos 1º e 2º trimestres de 2011. A despeito das razões apresentadas pelo Ministério Público Federal (MPF), reputo não comprovada a materialidade delitiva. As condutas omissivas acima relatadas configuram, sem dúvida, irregularidades do ponto de vista administrativo. Tanto é assim que o Banco Central do Brasil (BACEN), no exercício de suas atribuições, identificou tais irregularidades e, aos menos pela omissão referida no item ii, decidiu por aplicar as medidas administrativas cabíveis aos ex-administradores do Banco Schahin S/A (cf. ID 35383638, pp. 32/33 e p. 36): Sob a ótica penal, entendo que essas condutas não caracterizam, propriamente, atos de gestão temerária. Não se trata de condutas que se assemelhem a comportamentos imprudentes de gestores em busca de melhores resultados ou performance por meio da adoção de manobras arriscadas. Ao contrário, a prova dos autos indica que a ausência de observância dos prazos legais das publicações e remessa de informações ao BACEN se deu justamente em razão dos problemas detectados pela auditoria externa na realização dos trabalhos. Tais condutas consubstanciam, portanto, meras irregularidades na administração de instituição financeira — ainda que potencialmente graves — que, por sua natureza, devem ser tratadas no âmbito administrativo, como de fato o foram. Até se poderia cogitar, considerando os atos de gestão fraudulenta acima demonstrados, que as condutas ora tratadas neste tópico da denúncia se encontrassem abrangidas dentro do círculo de práticas criminosas relacionadas àquela imputação, tipificando o delito único do art. 4º, caput, da Lei 7.492/86. Todavia, a ausência de publicação das demonstrações econômico-financeiras semestrais e anuais em jornal de grande circulação, bem como a omissão de envio ao Banco Central das Informações Financeiras Trimestrais referentes ao 4º trimestre de 2010 e aos 1º e 2º trimestres de 2011, em nada se assemelham às manobras artificiais e simuladas adotadas para inflar os resultados financeiros do Banco Schahin S/A. Além disso, tais atos não parecem se relacionar, ao menos consoante a narrativa acusatória, com a execução do crime de gestão fraudulenta. A este respeito, vale também destacar que SIDNEI CORREA MARQUES, Diretor do Banco Central do Brasil e responsável pela Decisão 1708/2012-DIORF (ID 35383637, pp. 170 e ID 35383638, pp. 1/17), foi questionado, em Juízo, pelo Ministério Público Federal (MPF) se as irregularidades serviram para ocultar as operações anteriores do Banco Schahin S/A acima tratadas (gestão fraudulenta). Em resposta, a testemunha afirmou desconhecer o objetivo da omissão dos dirigentes do Banco Schahin S/A, salientando o caráter de violação da obrigação de natureza normativa e a violação a um dever de transparência (ID 309403853). Ou seja, a violação à norma administrativa, ao menos pela prova colhida nos autos, não demonstrou correlação com os atos de gestão fraudulenta supracitados, nem consubstanciou ato de gestão temerária, nos moldes exigidos pelo tipo penal da Lei 7.492/86. Destarte, ABSOLVO os réus P. H. S. e C. E. S. da prática do crime do art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 7.492/86, imputada na denúncia, com fulcro no artigo 386, III, do Código de Processo Penal (CPP). III) - Do crime do art. 5º, caput, da Lei nº 7.492/86 – da apropriação indébita financeira A) Enquadramento típico e materialidade delitiva: O artigo 5º da Lei 7.492/86 assim dispõe: Art. 5º Apropriar-se, quaisquer das pessoas mencionadas no art. 25 desta lei, de dinheiro, título, valor ou qualquer outro bem móvel de que tem a posse, ou desviá-lo em proveito próprio ou alheio: Pena - Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa. Parágrafo único. Incorre na mesma pena qualquer das pessoas mencionadas no art. 25 desta lei, que negociar direito, título ou qualquer outro bem móvel ou imóvel de que tem a posse, sem autorização de quem de direito. O crime em questão é próprio, somente podendo ser praticado por uma das pessoas relacionadas no art. 25 da Lei 7.492/86: Art. 25. São penalmente responsáveis, nos termos desta lei, o controlador e os administradores de instituição financeira, assim considerados os diretores, gerentes (Vetado). § 1º Equiparam-se aos administradores de instituição financeira (Vetado) o interventor, o liqüidante ou o síndico. O bem jurídico tutelado “[...] É a confiança dos negócios praticados no SFN, além do “patrimônio dos investidores” (STJ, REsp. 585770, Dipp, 5ª T., u., 7.10.04) e da empresa (TRF1, AC 19980100096130-4, Ribeiro, 4ª T., u., 17.7.06)[1]”. Pois bem. Segundo a denúncia apresentada pelo Ministério Público Federal, C. E. S. e P. H. S., além de outros agentes que não mais integram a presente ação penal, teriam se apropriado indevidamente de recursos oriundos, direta ou indiretamente, do Banco Schahin S/A, conforme demonstrado em laudos contábeis produzidos durante a fase investigatória. Passo à análise individualizada da imputação feita em desfavor de cada um dos réus. 1) C. E. S. No caso da imputação relativa ao corréu C. E. S., a materialidade delitiva não se encontrou suficientemente provada nos autos. Vejamos. A Polícia Federal, com base nos dados obtidos no afastamento do sigilo bancário do réu C. E. S., produziu o laudo de confrontos fiscais e financeiros nº 3238/2013, constatando incompatibilidade entre os rendimentos deste réu e sua variação patrimonial nos anos de 2009 e 2011 (ID 35661727, p. 15). Neste contexto, a Polícia Federal vislumbrou que foram depositados valores em conta bancária relacionada a C. E. S., não declarados formalmente em sua DIRPF do ano de 2009, oriundos do patrimônio do Banco de Crédito e Varejo S.A. – BCV/Banco Schahin S/A (CNPJ 50.585.090/0001-06). Tais valores, segundo a denúncia, eram de: i) R$ 270.000,00, transferidos pelo Banco Schahin a CARLOS EDUARDO no dia 22/12/2009, direcionados à conta de nº 116233, ag. 912, do Banco Itaú Unibanco S/A (ID 35661727 – Pág. 18); ii) R$ 680.000,00, transferidos pelo Banco Schahin S/A a CARLOS EDUARDO no dia 09/03/2009, direcionados à conta de nº 41415, ag. 912, do Banco Itaú Unibanco S/A (ID 35661727 – Pág. 17/18). Em face desta imputação, a Defesa sustenta em seus memoriais que o laudo pericial da Polícia Federal partiu de premissa equivocada ao atribuir a C. E. S. a titularidade de contas bancárias que, na realidade, pertenciam a pessoas jurídicas das quais ele era apenas procurador, representante ou mero preposto. Com base nessa confusão entre pessoa física e jurídica, a perícia teria concluído, de forma equivocada, que C. E. S. seria o titular das contas que receberam as transferências supracitadas, desconsiderando que, em relação a elas, o acusado atuava unicamente na qualidade de procurador ou representante legal, sem deter sua titularidade efetiva. Isso, segundo a Defesa, afastaria a tese acusatória de apropriação de recursos, em proveito pessoal do réu CARLOS EDUARDO, oriundos do Banco Schahin S/A. Neste ponto, assiste razão à defesa. Foram acostados aos autos extratos do Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional (CCS), provenientes do BACEN, por meio dos quais se demonstrou a existência de vínculos dos réus com diversas instituições financeiras. Referido cadastro, cumpre salientar, indica a existência de relações bancárias mantidas por pessoas físicas ou jurídicas com instituições do sistema financeiro nacional, especificando o tipo de vínculo (como titularidade, co-titularidade, representação legal, procuração, entre outros), bem como as datas de início e encerramento do relacionamento. No que se refere à conta nº 116233, agência 912, do Banco Itaú Unibanco S/A, cumpre anotar que C. E. S. passou a figurar como seu representante, responsável ou procurador em 05/11/2009, conforme registro do Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional – CCS (ID 38563376, p. 60). Tal vinculação antecede, portanto, a transferência realizada em 22/12/2009, no valor de R$ 270.000,00, quantia esta que, segundo a narrativa acusatória, teria sido apropriada indevidamente pelo corréu no contexto da prática do crime previsto no art. 5º da Lei nº 7.492/86. Convém sublinhar, contudo, que à época da referida movimentação financeira, constavam como vinculados à mesma conta, na qualidade de representantes ou procuradores, tanto C. E. S. quanto S. T. S., conforme se verifica nos documentos de ID 38563376, pp. 60 e 141. Apesar disso, nem o laudo pericial elaborado pela Polícia Federal nem a denúncia do Ministério Público Federal dedicaram-se a identificar quem, de fato, seria o beneficiário de tal transação, limitando-se a atribui-la diretamente ao réu, sem lastro probatório específico nesse sentido; igualmente, não foi identificado o fundamento de tal transferência pelo Banco Schahin a tal conta corrente, o qual poderia ser absolutamente lícito. Evidentemente, tratando-se de valores que transitaram por conta bancária de titularidade de terceiro, da qual C. E. S. era tão somente representante ou procurador, não havia qualquer obrigação legal de que tais recursos fossem por ele declarados em sua declaração de Imposto de Renda, uma vez que não integravam seu patrimônio pessoal, nem representavam acréscimo de disponibilidade econômica em seu favor. Nesse cenário, não há, nos autos, prova cabal de um efetivo desvio de recursos, nos moldes exigidos para configuração do tipo penal do art. 5º da Lei 7.492/86. Conforme as precisas lições de CEZAR ROBERTO BITENCOURT (In: Tratado de direito penal econômico, v. 1. Rio de Janeiro: Saraiva Jur, 2016. E-book. p.293): Apropriar-se dos objetos de que tem a posse e toma-los para si, isto e, inverter a natureza da posse, passando a agir como se dono fosse dos objetos alheios de que tem posse. (...) Desviar e alterar a destinação dos bens alheios, dar-lhes outro destino, outra finalidade; e utilizar qualquer dos bens alheios mencionados no dispositivo em finalidade diversa da que normalmente lhes tenha sido prevista. Desviar o uso ou a destinação dos bens mencionados significa desvirtuar sua utilização, indevidamente, ou seja, tanto sem autorização legal como sem autorização de quem de direito. Com efeito, o verbo nuclear ‘desviar’ tem o significado, nesse dispositivo legal, de dar-lhe outro encaminhamento ou, em outros termos, o sujeito ativo da ao objeto material aplicação diversa da que lhe foi determinada em benefício próprio ou de outrem (...) O desvio poderá consistir no uso irregular do objeto material (dinheiro, titulo, valor ou qualquer outro bem móvel) (grifos nossos) Compulsando-se os autos, verifica-se que não há qualquer indicação precisa quanto à real titularidade da conta nº 116233, agência 912, do Banco Itaú Unibanco S/A. A única informação concreta constante dos registros do Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional (CCS) é a de que C. E. S. figurava como representante ou procurador vinculado à referida conta, não como seu titular. Sem a identificação segura do verdadeiro titular da conta, é impossível afirmar, com o grau de certeza exigido na esfera penal, se os recursos a ela transferidos pelo Banco Schahin S/A tinham ou não causa legítima, o que se mostraria absolutamente determinante para se concluir se houve um “desvio” de recursos da instituição financeira ou aplicação de tais recursos em finalidade diversa da que lhe era prevista. Consequência da ausência de identificação precisa do verdadeiro titular da conta é que, também, não foram colhidos elementos capazes de esclarecer minimamente a natureza da transação, que, ao menos em tese, poderia se tratar de pagamentos do Banco Schahin S/A relacionados a diversas finalidades, como quitação de obrigações, remuneração por serviço ou mera operação interna entre empresas componentes do Conglomerado Schahin. Em outras palavras, não se sabe a esta altura sequer se o pagamento era, de fato, indevido. Ou seja, a prova colhida aos autos demonstrou que C. E. S. não era o titular da conta nº 116233, agência 912, do Banco Itaú Unibanco S/A, figurando ele, ao lado de S. T. S., apenas como seu representante ou procurador. Além disso, a ausência de identificação segura do verdadeiro titular da conta e a falta de elementos sobre a destinação final dos recursos transferidos impedem qualquer conclusão, livre de dúvidas, de que houve um "desvio" ou uma "apropriação indevida" de valores, a ponto de evidenciar a prova da materialidade do delito do art. 5º da Lei 7.492/86. De outro lado, no que diz respeito à conta nº 41415, agência 912, do Banco Itaú Unibanco S/A, cumpre destacar que, conforme informações constantes do Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional (CCS), constavam como representantes, responsáveis ou procuradores vinculados à referida conta C. E. S. (ID 150002226, p. 57), S. T. S. (ID 150002226, p. 138) e M. T. S. (ID 38563376, p. 14). Contudo, observo que a transferência para a sobredita conta bancária apontada pelo laudo policial e pela denúncia, no valor de R$ 680.000,00, ocorreu em 09/03/2009, data em que C. E. S. sequer figurava, formalmente, como representante ou procurador da conta, tendo essa vinculação sido registrada apenas em 16/06/2009, conforme se extrai do documento de ID 38563376 - Pág. 57. Dessa forma, é forçoso reconhecer que, à época da movimentação mencionada, não havia qualquer autorização formal que habilitasse o acusado a operar a conta bancária, cuja representação era, então, exercida exclusivamente por S. T. S. e M. T. S., únicos detentores de poderes para movimentação em nome do titular da conta. Tal circunstância fragiliza sobremaneira a tese acusatória de apropriação do valor de R$ 680.000,00 por parte de CARLOS EDUARDO, especialmente diante da ausência de indícios seguros de que este tenha, de fato, ordenado ou se beneficiado da transferência realizada naquela data, afastando a configuração material do delito do art. 5º da Lei 7.492/86. Ainda que assim não fosse, e CARLOS EDUARDO efetivamente figurasse como procurador da conta nº 41415, agência 912, do Banco Itaú Unibanco S/A — à semelhança do que se verificou na operação relativa à conta nº 116233, da mesma agência — o fato é que não houve, também, a identificação do titular da referida conta. Sem essa informação essencial, não é possível afirmar com segurança que houve desvio de recursos do Banco Schahin S/A, permanecendo indefinida a razão da transferência do montante de R$ 680.000,00 à mencionada conta bancária. Tal quantia poderia, em tese, corresponder a pagamentos legítimos, quitação de obrigações ou mesmo a operações internas entre empresas do Conglomerado Schahin, inseridas em contextos lícitos sob a ótica penal e não, necessariamente, de desvio ou apropriação de recursos nos moldes do art. 5º da Lei 7.492/86. Em outras palavras, tanto quanto na situação acima tratada, também não se sabe a esta altura se o pagamento de R$ 680.000,00 era, de fato, indevido, sendo inviável se concluir, à vista deste cenário, pela materialidade delitiva do crime do art. 5º da Lei 7.492/86. Por último, a denúncia, apoiando-se no laudo da Polícia Federal (ID 35661727, p. 19), apontou que a HHS Participações Ltda., MTS Participações Ltda. e Satasch Participações Ltda. teriam transferido, por intermédio de diversas operações, o montante total de R$ 9.889.000,00 à conta bancária de CARLOS EDUARDO. Como se pode observar no Laudo nº 3238/2013, as transferências se destinaram às contas nº 41415, ag. 912, do Banco Itaú S/A; nº 41662, ag. 912, do Banco Itaú Unibanco S/A; e nº 87.574, Banco Itaú Unibanco S/A (ID 35661727). Pois bem. Ressalte-se que as pessoas jurídicas HHS Participações Ltda., MTS Participações Ltda. e Satasch Participações Ltda. não se enquadram na definição legal de “instituições financeiras”, nos termos do art. 1º da Lei nº 7.492/86. Por essa razão, eventuais transferências de recursos provenientes dessas sociedades para C. E. S., ainda que comprovadas, não poderiam caracterizar os crimes de “apropriação” ou “desvio” de valores tipificados no art. 5º da referida norma, uma vez que os bens envolvidos não seriam oriundos de instituição financeira. Ademais, ainda que se saiba que o Banco Schahin S/A e tais pessoas mantinham relações entre si, seus patrimônios eram autônomos e independentes. A prova colhida nos autos não evidenciou, sob qualquer ângulo, o trânsito dissimulado de valores pertencentes àquela instituição financeira por intermédio da HHS Participações Ltda., MTS Participações Ltda. e Satasch Participações Ltda., tendo como destino final as contas bancárias de CARLOS EDUARDO. Cabe registrar, também, à luz da prova colhida nos autos, que as contas nº 41415, ag. 912, do Banco Itaú S/A; nº 41662, ag. 912, do Banco Itaú Unibanco S/A; e nº 87.574, Banco Itaú Unibanco S/A, de maneira diversa ao narrado na denúncia, não pertenciam a C. E. S.. Conforme extratos do Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional (CCS), provenientes do BACEN acostados aos autos, CARLOS EDUARDO era apenas um, entre outros, procuradores/representantes das Contas Correntes mantidas junto ao Banco Itaú, de nº 41415, 41662 e 87574, da Agência 912 (cf. ID 38563376 - Págs. 57 e 59). Nesse sentido, segundo o CCS, à época das transferências realizadas para a conta de nº 41415 (30/07/2010 e 25/04/2011), eram procuradores da aludida conta C. E. S. (ID 38563376, p. 57), S. T. S. (ID 38563376, p. 138) e M. T. S. (ID 38563376, p. 14). Já com relação à conta de nº 41662, no período das transferências que para ela foram realizadas (25/03/2010, 15/04/2010, 05/01/2011 e 25/04/2011), eram seus procuradores S. T. S. (ID 38563376, p. 139) e M. T. S. (ID 38563376, p. 14). Por fim, no que se refere à conta nº 87574, no momento das transferências a ela destinadas (25/04/2011 e 09/05/2011), eram seus procuradores C. E. S. (ID 38563376, p. 59), S. T. S. (ID 38563376, p. 141) e M. T. S. (ID 38563376, p. 16). Apesar disso, nem o laudo pericial elaborado pela Polícia Federal nem a denúncia do Ministério Público Federal dedicaram-se a identificar quem, de fato, beneficiou-se da transação ou nela se envolveu de qualquer forma, limitando-se a indicar diretamente CARLOS EDUARDO como aquele que teria recebido especificamente o seu produto, sem lastro probatório específico nesse sentido. Ademais, à semelhança do que se verificou nas operações acima analisadas, fato é que não houve, também, a identificação do titular das contas nº 41415, ag. 912, do Banco Itaú S/A; nº 41662, ag. 912, do Banco Itaú Unibanco S/A; e nº 87574, Banco Itaú Unibanco S/A. Sem essa informação essencial, permanece absolutamente indefinida a transferência dos montantes às contas acima referidas, que, ao menos em tese, poderiam estar relacionadas a pagamentos legítimos, quitação de obrigações ou mesmo a operações internas entre empresas do Conglomerado Schahin, inseridas em contextos lícitos sob a ótica penal e não, necessariamente, de desvio ou apropriação de recursos nos moldes do art. 5º da Lei 7.492/86. Em suma, à luz da prova colhida, não vislumbro a prova da materialidade do delito do art. 5º da Lei 7.492/86, no que tange à imputação deste crime a CARLOS EDUARDO. 2) P. H. S. No caso de PEDRO, a materialidade delitiva encontra-se suficientemente provada nos autos. Vejamos. Como se sabe, as instituições financeiras privadas devem ser estruturadas unicamente sob a forma de sociedades anônimas (art. 25 da Lei nº 4.595/64), o que atrai, consequentemente, o dever de observância e aplicação de todo o escopo normativo definido pela Lei nº 6.404/76 (Lei das S.A.) por parte de sua administração. Ao reger a organização das sociedades anônimas, a Lei nº 6.404/76 estabelece diversos regramentos relacionados à remuneração de diretores/administradores de companhias. A exemplo disso, destaca-se o art. 152, caput, e § 1º, do aludido diploma legal, o qual dispõe que: Art. 152. A assembléia-geral fixará o montante global ou individual da remuneração dos administradores, inclusive benefícios de qualquer natureza e verbas de representação, tendo em conta suas responsabilidades, o tempo dedicado às suas funções, sua competência e reputação profissional e o valor dos seus serviços no mercado. § 1º O estatuto da companhia que fixar o dividendo obrigatório em 25% (vinte e cinco por cento) ou mais do lucro líquido, pode atribuir aos administradores participação no lucro da companhia, desde que o seu total não ultrapasse a remuneração anual dos administradores nem 0,1 (um décimo) dos lucros (artigo 190), prevalecendo o limite que for menor. Nesse sentido, conforme a Exposição de Motivos nº 196, de 24.06.1976, que apresentou o Projeto convertido na Lei 6.404/76, a previsão proposta sobre a remuneração dos administradores tinha como propósito "conciliar-se o interesse em mobilizar o bom técnico, que exige remuneração adequada, com o objetivo de evitar notórios abusos de acionistas majoritários, que se elegem para se atribuírem honorários sem proporção com os serviços prestados, e que equivalem a distribuição de lucros". Ou seja, a remuneração de diretores e administradores de instituições financeiras, além de observar os parâmetros fixados pela Assembleia Geral, deve guardar correspondência com o grau de trabalho efetivamente desempenhado, não se justificando a distribuição arbitrária de valores pertencentes à Companhia a seus dirigentes, como se pudessem deles dispor ou movimentá-los sem qualquer nível de controle. Pois bem. Durante as investigações, a Polícia Federal produziu o laudo de confrontos fiscais e financeiros nº 261/2014. Do confronto entre o histórico de movimentação das contas bancárias de PEDRO SCHAHIN e os valores declarados em seu Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) do ano de 2010, observou-se o crédito de valor não declarado oriundo do CNPJ 50.585.090/0001-06 que pertencia ao Banco de Crédito e Varejo S.A. – BCV/Banco Schahin S/A. Tal valor consubstanciou o montante de R$ 135.000,00, transferidos pelo Banco Schahin S/A a PEDRO SCHAHIN no dia 03/09/2010, direcionados à sua conta nº 93610, ag. Botafogo/RJ, do Banco BTG Pactual S/A (ID 35661730, p. 140) que, corrigidos pelo IGP-M, totalizaram o recebimento de aproximadamente R$ 379.329,83 pelo réu, sem qualquer justificativa plausível e não declarados perante a Receita Federal do Brasil (RFB). Este montante de R$ 135.000,00, recebido em uma única transferência, equivalia a aproximadamente ao dobro do valor total declarado por PEDRO SCHAHIN como recebido do Banco Schahin S/A em sua Declaração de Imposto de Renda referente ao ano-calendário de 2010 (R$ 74.520,00 – ID 35661730, p. 140). Desta forma, a operação consubstanciou evidente desvio do patrimônio da instituição financeira, em benefício de um de seus administradores. Conforme já destacado linhas acima, a instituição financeira somente poderia entregar valores a diretores, administradores ou sócios, de maneira justificada, como no caso de pagamento de distribuição de lucros e dividendos e/ou de prolabore ou, ainda, para o pagamento de salários. Todavia, não consta dos autos justificativa financeira ou contábil para tal transferência de recursos, de modo que evidenciado que valores pertencentes à pessoa jurídica foram desviados, em prejuízo da integridade patrimonial da Instituição Financeira e, indiretamente, de seus clientes, investidores e correntistas. Em suma, pode-se concluir que houve o desvio de valores pertencentes ao Banco Schahin, caracterizando a figura típica prevista no art. 5º da Lei n.º 7.492/86. Ainda que a i. Defesa alegue em sede de memoriais que o proveito do crime era irrelevante, quando comparado ao patrimônio pessoal por eles ostentado à época dos fatos, isto, obviamente, não elide a materialidade do delito. O crime do art. 5º, caput, da Lei 7.492/86 não exige, como elemento do tipo, que o agente esteja em situação de necessidade, nem que o produto do delito seja relevante perto de seu patrimônio pessoal, conformando-se com a prova do dolo de apropriação, o que restou demonstrado à vista da prova vinda aos autos da ação penal. Feitas todas as considerações, entendo comprovada a materialidade do delito do art. 5º, caput, da Lei 7.492/86. B) Da autoria delitiva B.1) P. H. S. A autoria delitiva restou amplamente comprovada. Nos termos da Lei nº 6.404/76, a sociedade anônima somente pode efetuar pagamentos a seus diretores a título de remuneração fixada pela assembleia geral (art. 152), participação nos lucros dentro dos limites legais (arts. 152, §1º), pro labore ou outras verbas previamente aprovadas pelos órgãos competentes da companhia. No caso dos autos, há prova inequívoca de que, sem justificativa legal ou estatutária, PEDRO SCHAHIN recebeu repasse de valor oriundo do patrimônio do Banco Schahin S/A. Consta do laudo de confrontos fiscais e financeiros nº 261/2014, elaborado pela Polícia Federal, que PEDRO SCHAHIN, então diretor do Banco Schahin S/A, recebeu, em 03/09/2010, o valor de R$ 135.000,00, proveniente da instituição financeira (CNPJ 50.585.090/0001-06), transferido para sua conta pessoal mantida no Banco BTG Pactual S/A. Este montante de R$ 135.000,00, recebido em uma única transferência, equivalia a aproximadamente ao dobro do valor total declarado por PEDRO SCHAHIN como recebido do Banco Schahin S/A em sua Declaração de Imposto de Renda referente ao ano-calendário de 2010 (R$ 74.520,00 – ID 35661730, p. 140). Como se pode observar, a operação em questão é manifestamente incompatível com os rendimentos declarados por PEDRO SCHAHIN à Receita Federal do Brasil naquele mesmo ano, os quais totalizavam R$ 74.520,00 a título de recebimentos do Banco Schahin S/A. Trata-se, portanto, de movimentação de recursos em benefício do réu sem respaldo em distribuição de lucros, pagamento de prolabore ou qualquer deliberação societária válida que autorizasse a transferência. Ressalte-se que a conduta descrita não configura mera irregularidade de natureza civil ou empresarial, mas sim verdadeira apropriação de recursos da instituição financeira por um dos agentes que exercia sua administração. Valendo-se de sua posição na alta cúpula do Banco Schahin S/A, PEDRO desviou valores em benefício próprio, como se lhe pertencessem e estivessem à sua livre disposição. Ainda que a i. Defesa do réu alegue em sede de memoriais que o proveito do crime era irrelevante, quando comparado ao patrimônio pessoal por ele ostentado à época dos fatos, isto, obviamente, não afasta a responsabilidade pela prática do crime. O crime do art. 5º, caput, da Lei 7.492/86 não exige, como elemento do tipo, que o agente esteja em situação de necessidade, nem que o produto do delito seja relevante perto de seu patrimônio pessoal, conformando-se com a prova do dolo de apropriação, o que restou demonstrado à vista da prova vinda aos autos da ação penal. Por fim, importante pontuar, mais uma vez, que se tratava de conta da qual PEDRO era o titular, de modo que inegável que o corréu concorreu dolosamente para o desvio de tais recursos. Em face do exposto, considerando que o dolo decorre da prática voluntária da conduta típica, e inexistentes causas excludentes da ilicitude e da culpabilidade, condeno P. H. S. pela prática do crime do art. 5º, caput, da Lei 7.492/86. IV) Do crime de associação criminosa (art. 288, caput, do CP) Em linhas gerais, como se sabe, a prática do crime previsto no art. 288 do Código Penal, por ser delito autônomo e formal, independe da efetiva prática de quaisquer outros delitos, porquanto se consuma com o simples ajuste para formação da societas celeris, bem como independe da identificação de cada um dos integrantes do grupo. Deve haver, entretanto, ânimo associativo para a prática de crimes, o que supõe vínculo estável e duradouro na quantidade mínima prevista pela lei (no caso do art. 288 do Código Penal, mais de três pessoas, na redação vigente à época dos fatos) com a finalidade de praticar crimes, conforme se extrai da sedimentada jurisprudência de nossos tribunais superiores: PENAL - ARTIGO 288 DO CÓDIGO PENAL - AUTORIA, MATERIALIDADE E DOLO COMPROVADOS - PROVIMENTO À APELAÇÃO MINISTERIAL - 1. Materialidade e autoria efetivamente comprovadas, tanto pela prova oral, quanto pelas interceptações telefônicas colhidas durante as investigações, ratificadas pelos depoimentos testemunhais colhidos em juízo. 2. Não é necessária a identificação de todos os membros de uma quadrilha, bastando a demonstração de existência de um grupo extremamente estruturado e organizado, com nítida divisão de tarefas entre os integrantes envolvidos, bem como a estabilidade e permanência desta organização criminosa, 3. Apelação ministerial provida. (TRF 3ª Região, QUINTA TURMA, ACR 0012055-93.2010.4.03.6181, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ STEFANINI, julgado em 14/10/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:23/10/2013 A esta altura, sabe-se que, a despeito das variadas imputações na denúncia, a prova colhida permitiu vislumbrar a materialidade dos crimes de apropriação de recursos financeiros e gestão fraudulenta. Nesse sentido, demonstrou-se acima que, no âmbito da administração do Banco Schahin S/A, foi implantada uma gestão voltada à fraude e ao engano, marcada pela manipulação de demonstrativos contábeis e simulação de resultados de performance destoantes da realidade, notadamente, por meio de fictícias cessões de direitos creditórios. Apesar disso, não vislumbro a presença dos pressupostos de uma associação criminosa. Vejamos. Não há indícios ou provas — sendo, ademais, absolutamente improvável — de que a constituição originária do Banco Schahin S/A tenha resultado do interesse de seus instituidores e administradores em praticar delitos, entre si associados, ou por meio da instituição financeira. Havia presumidamente, como em qualquer instituição financeira regularmente estabelecida sob os parâmetros exigidos pela legislação brasileira, um interesse inicial lícito, de mercado, voltado à obtenção de lucros e prestação de serviços de natureza bancária. Entretanto, recorreu sua alta administração a um repertório de fraudes, a fim de transmitir à entidade supervisora e ao mercado em geral uma falsa imagem de solidez, fato este que melhor se amolda ao tipo da gestão fraudulenta, não ao de associação criminosa. Não havia, à luz da prova colhida, um pacto prévio e consciente entre mais de três pessoas com a finalidade de se associar para a prática de crimes. Diferentemente disso, o animus associativo comprovado que unia tanto os réus que ainda remanescem na ação penal quanto os demais dela já excluídos era resultante de um vínculo institucional e corporativo, decorrente das posições por eles ocupadas junto à estrutura administrativa do Banco Schahin S/A. Não foram, ainda, produzidas provas pela acusação capazes de demonstrar a existência da alegada associação criminosa, não sendo possível vislumbrar no conjunto probatório dos autos elementos essenciais à tipificação do delito, como o vínculo estável e permanente entre os envolvidos e a convergência de vontades voltada à prática de crimes. O mero fato de o crime de gestão fraudulenta ser praticado em concurso de pessoas, em associação de natureza empresarial, em que desenvolvidas atividades de natureza eminentemente lícitas, não autoriza a conclusão automática de que o animus associativo se transmudou para o intuito de praticar delitos. Evidentemente, a ausência de prova de existência de associação criminosa deve se reverter em benefício dos réus. Desse modo, embora restem sobejamente comprovados os atos de gestão fraudulenta, e a apropriação de recursos por PEDRO, não restou comprovada a existência de uma associação criminosa (art. 288 do Código Penal). Com base nestas considerações, ABSOLVO os corréus P. H. S. e C. E. S. da prática do crime do art. 288, caput, do Código Penal imputado na denúncia, com fulcro no artigo 386, III, do Código de Processo Penal (CPP). Passo à dosimetria das penas. DA DOSIMETRIA DAS PENAS 1) P. H. S. a) Do crime do art. 4º, caput, da Lei 7.492/86 Na primeira fase da dosimetria, analisadas as circunstâncias do art. 59 do Código Penal, observo que o acusado não registra antecedentes criminais aptos a serem considerados como maus antecedentes, sendo que poucos elementos foram coletados a respeito da sua conduta social e personalidade, razão pela qual deixo de valorá-las; os motivos estão relatados nos autos, os quais já são punidos pela própria tipicidade e previsão do delito; não há que falar em contribuição da vítima; não se evidenciando maior grau de reprovação na conduta do acusado. Ressalto que não há que se falar em maus antecedentes, tendo em vista que os fatos objeto da Ação Penal 0011107-20.2011.4.03.6181 são concomitantes a parte dos atos de gestão fraudulenta. Todavia devem ser consideradas negativamente a culpabilidade, as circunstâncias e as consequências do delito. A culpabilidade do réu se mostra exacerbada, pois, foram múltiplos os atos característicos de gestão fraudulenta praticados pelo acusado, no período compreendido entre 2008 e meados de março de 2011, sendo o responsável pela assinatura de dezenas de contratos relacionados às manobras e artifícios necessários para alavancar artificialmente os resultados financeiros do Banco Schahin S/A. As circunstâncias do crime são desfavoráveis, diante da elevada complexidade e sofisticação do modus operandi adotado. Com o objetivo de simular a higidez da instituição perante o mercado e de produzir um cenário contábil artificial, foram empregados mecanismos estruturados e deliberadamente enganosos, tais como: (i) cessões de direitos creditórios simuladas, com a participação de diversas outras instituições financeiras; (ii) declaração falsa em demonstrativos contábeis, referente a ativo insubsistente vinculado a aplicação mantida no exterior (Banco Clariden); (iii) utilização de empresas do próprio Conglomerado Schahin (como a HHS Participações) e de empresa dirigida por PEDRO SCHAHIN (Cifra S.A.) no contexto de simulação de operações; e (iv) fracionamento indevido de operações de crédito, em burla à Resolução nº 2.682/1999 do Conselho Monetário Nacional. Tal estruturação revela uma engenharia financeira robusta e arrojada, com graus de dissimulação que destoam significativamente do padrão comumente observado em delitos da espécie. As consequências do delito, também, revelam-se extremamente gravosas, uma vez que a manipulação dolosa dos demonstrativos contábeis provocou uma distorção extrema da real situação econômico-financeira do Banco Schahin S/A, refletida na elevação de receitas em balanços que alcançou, segundo o BACEN, a cifra de R$ 280.000.000,00 (duzentos e oitenta milhões de reais), expondo a risco concreto clientes e investidores da instituição financeira. Assim, considerando que são negativas a culpabilidade, as circunstâncias e as consequências do crime, fixo a pena-base em 6 (seis) anos, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. Na segunda etapa, não verifico a presença de agravantes e atenuantes. A despeito das razões invocadas pelo MPF, mostra-se incabível, nesta fase, a incidência da agravante prevista no art. 62. I, do Código de Penal (CP). Para incidência da agravante pleiteada pelo Ministério Público Federal (MPF), é indispensável a prova concreta de que o réu orquestrou a dinâmica da empreitada criminosa, a exemplo de elementos que indicassem que ele idealizou o plano delitivo, selecionou os demais partícipes, distribuiu funções, determinou as condutas a serem adotadas pelos corréus ou detinha o controle final sobre a execução dos atos fraudulentos. Ausentes tais elementos, não é possível imputar-lhe a posição de liderança ou comando necessária à configuração da agravante prevista no art. 62, I, do Código Penal. O que a prova colhida efetivamente permite afirmar é que o réu integrava a alta administração da instituição financeira e, nessa qualidade, participou ativamente da prática de diversos atos materiais que compuseram a gestão fraudulenta, a exemplo da aposição de assinaturas em contratos simulados de cessão de direitos creditórios, fato este que, por si só, não permite inferir que tenha promovido, organizado ou dirigido a atividade dos demais agentes inseridos no contexto da gestão fraudulenta do Banco Schahin S/A, a ponto de atrair a incidência da agravante do art. 62, I, do CP. Também não há que se falar na incidência da agravante da reincidência (art. 63 do Código Penal). A reincidência configura-se quando o agente pratica novo crime após o trânsito em julgado de sentença penal condenatória anterior, proferida no Brasil ou no exterior. No caso, conforme se extrai dos autos da ação penal nº 0011107-20.2011.4.03.6181, o trânsito em julgado do Recurso Extraordinário com Agravo nº 1.367.187, interposto por P. H. S., ocorreu apenas em 03/05/2022 (ID 291745916, p. 71, dos autos 0011107-20.2011.4.03.6181). Por sua vez, os fatos imputados na presente ação penal, relacionados à prática de gestão fraudulenta, remontam ao período compreendido entre o ano de 2008 e meados de março de 2011. Diante disso, não subsiste qualquer dúvida quanto à inaplicabilidade da agravante da reincidência. Desse modo, mantenho a pena provisória em 6 (seis) anos, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. Na terceira fase, não há causas aumento e de diminuição a serem consideradas. A pena definitiva resta, então, fixada em 6 (seis) anos, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) dias de reclusão. A pena de multa deve ser fixada proporcionalmente à pena privativa de liberdade, observando os limites do artigo 49 do CP, bem como o disposto no artigo 60 do mesmo Código. Dessa forma, fixo a pena de multa em 141 dias-multa, no valor unitário de dois salários-mínimos, tendo em vista que o réu é empresário e declarou renda mensal de R$ 20.000,00 em seu interrogatório. b) Do crime do art. 5º, caput, da Lei 7.492/86 Na primeira fase da dosimetria, analisadas as circunstâncias do art. 59 do Código Penal, observo que poucos elementos foram coletados a respeito da sua conduta social e personalidade, razão pela qual deixo de valorá-las; a culpabilidade e as circunstâncias do crime não desbordam do que usualmente se verifica nessa espécie de delito; os motivos estão relatados nos autos, os quais já são punidos pela própria tipicidade e previsão do delito; não há que se falar em contribuição da vítima. As consequências do delito, por sua vez, não ultrapassam aquelas inerentes ao próprio tipo penal, motivo pelo qual também não justificam valoração negativa. Deve ser reconhecida, contudo, a existência de condenação definitiva apta a gerar maus antecedentes de PEDRO SCHAHIN. Como se sabe, a condenação definitiva por fato anterior ao crime descrito na denúncia, mas com trânsito em julgado posterior à data do ilícito penal, ainda que não configure a agravante da reincidência, pode caracterizar maus antecedentes. No caso, o réu foi condenado anteriormente nos autos da ação penal nº 0011107-20.2011.4.03.6181, cuja prática delitiva está relacionada a fatos ocorridos no ano de 2009 (ID 35646050, pp. 10/13 e ID 35648311, pp. 198/213, dos referidos autos). Esta condenação se tornou definitiva em 03/05/2022, com o trânsito em julgado do Recurso Extraordinário com Agravo nº 1.367.187 (ID 291745916, p. 71, dos autos 0011107-20.2011.4.03.6181). No que se refere à presente ação penal, a conduta de apropriação de recursos da instituição financeira ocorreu em 03/09/2010, ou seja, em momento posterior aos fatos que constituíram o objeto da ação penal nº 0011107-20.2011.4.03.6181, transitada em julgado em 03/05/2022. Nesse sentido, reconheço a existência de maus antecedentes e fixo a pena-base em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão. Na segunda etapa, não verifico a presença de agravantes e atenuantes, de modo que mantenho a pena provisória em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão. Na terceira fase, não verifico a presença de causas de aumento ou diminuição de pena, mantendo-se a pena em 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão. A pena de multa deve ser fixada proporcionalmente à pena privativa de liberdade, observando os limites do artigo 49 do CP, bem como o disposto no artigo 60 do mesmo Código. Ainda, nos termos do artigo 72 do CP, “no concurso de crimes, as penas de multa são aplicadas distinta e integralmente”. Com a aplicação da pena de 02 (dois) anos e 06 (seis) meses de reclusão, cabível a fixação da pena de multa em 53 dias-multa, no valor unitário de dois salários-mínimos, tendo em vista que o réu é empresário e declarou renda mensal de R$ 20.000,00 em seu interrogatório. - Concurso de crimes e regime de cumprimento de pena: Considerando que os delitos foram cometidos mediante mais de uma ação ou omissão (artigo 69 do CP), além de resultarem de desígnios autônomos (artigo 70 do CP), as penas devem ser aplicadas cumulativamente. Por conseguinte, PEDRO SCHAHIN resta condenado ao total de 8 anos, 10 meses e 15 dias de reclusão e 194 dias-multa, fixados no valor unitário de dois salários-mínimos. O regime de cumprimento da pena será o fechado, nos termos do artigo 33, §2º, “a”, do CP, considerando o quantum de pena aplicado, bem como que as circunstâncias judiciais do artigo 59 do CP são desfavoráveis ao acusado (artigo 33, §3º, do CP). DISPOSITIVO Diante do exposto, conferindo atribuição jurídica diversa a parte dos fatos descritos na denúncia (art. 383, caput, do CPP) nos termos da fundamentação, julgo PROCEDENTE EM PARTE a pretensão punitiva para: A) CONDENAR P. H. S. pela prática dos delitos do art. 4º, caput, e art. 5º, caput, ambos da Lei 7.492/86, na forma do art. 69 do CP, às penas de 8 anos, 10 meses e 15 dias de reclusão, em regime inicial fechado, e 194 dias-multa fixados no valor unitário de dois salários-mínimos conforme valor vigente à época dos fatos mais graves (03/2011[1]), devidamente atualizados até a data do pagamento; B) ABSOLVER C. E. S. da imputação do crime previsto no art. 4º, caput, da Lei 7.492/86, com fundamento no art. 386, VII, do Código de Processo Penal, bem como da prática do delito previsto no art. 5º, caput, da Lei 7.492/86, com fundamento art. 386, III, do Código de Processo Penal; C) ABSOLVER C. E. S. e P. H. S. da imputação do crime previsto no art. 4º, parágrafo único, da Lei 7.492/86, bem como da imputação relativa ao crime do art. 288, caput, do CP, com fundamento no art. 386, III, do Código de Processo Penal. Tratando-se de réu que respondeu ao processo desde o seu início em liberdade, e não vislumbrando presentes os requisitos autorizadores da decretação de prisão preventiva, concedo ao condenado o direito de apelar em liberdade. Não houve pedido de fixação valor para a reparação do dano, nos termos do art. 387, inc. IV, do Código de Processo Penal, nem indicação de valores e provas suficientes a sustentá-lo, de modo a proporcionar ao réu a possibilidade de se defender e produzir contraprova. Sem instrução processual específica quanto a este ponto, deixo de fixar o valor mínimo de indenização devida pelo réu (art. 387, IV, do CPP). Condeno o corréu P. H. S. ao pagamento das custas processuais. Transitado em julgado, proceda-se às anotações pertinentes da decisão definitiva junto aos sistemas processuais e ao SINIC, comunicando-se, também, a respeito, o IIRGD. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se. São Paulo, data da assinatura eletrônica. [1] (Último pagamento realizado das parcelas a prazo das cessões entre o Banco Schahin e a Continental Securitizadora, ocorrido em março de 2011 - ID 35662574, p. 11)
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