Processo nº 8000072-27.2025.8.05.0043
ID: 318732613
Tribunal: TJBA
Órgão: V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE CANAVIEIRAS
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 8000072-27.2025.8.05.0043
Data de Disponibilização:
08/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE CANAVIEIRAS Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8000072-27.2025.8.05.0043 Órgão Ju…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE CANAVIEIRAS Processo: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL n. 8000072-27.2025.8.05.0043 Órgão Julgador: V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE CANAVIEIRAS REPRESENTANTE: LIDIANE BALTAZAR DE SOUZA e outros Advogado(s): REU: ESTADO DA BAHIA e outros Advogado(s): SENTENÇA COM FORÇA DE CARTA / MANDADO / OFÍCIO Vistos, etc. Trata-se de Ação Ordinária de Obrigação de Fazer com pedido de tutela provisória de urgência, ajuizada por H. S. B., menor impúbere, neste ato representado por sua genitora, Srª. LIDIANE BALTAZAR DE SOUZA, ambos devidamente qualificados nos autos, por intermédio da Defensoria Pública do Estado da Bahia, em face do ESTADO DA BAHIA e do MUNICÍPIO DE CANAVIEIRAS, pessoas jurídicas de direito público. A parte autora alega, em síntese, que o menor foi diagnosticado com Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH - CID F90.4) e Transtorno do Espectro Autista (TEA - CID F84.1), necessitando, com urgência, de tratamento multidisciplinar contínuo, consistente em acompanhamento com Fonoaudiólogo, Psicopedagogo, Psicólogo e Terapeuta Ocupacional, conforme prescrição médica especializada (ID 478639983). Sustenta que a realização das terapias deve ocorrer na cidade de Canavieiras, pois o deslocamento para outra localidade seria prejudicial à evolução do tratamento da criança, que apresenta fácil irritabilidade e inquietação. Aduz, ainda, que a genitora possui outra filha com diagnóstico de Esquizofrenia, o que a impossibilita de se ausentar por longos períodos. Informa que buscou o tratamento na rede pública de saúde, sem sucesso. Diante da inércia administrativa, mesmo após a Defensoria Pública oficiar as Secretarias de Saúde Estadual e Municipal (IDs 478639969 e 478639968), ajuizou a presente demanda. Requereu, em sede de tutela de urgência e ao final, a condenação solidária dos réus ao fornecimento do tratamento prescrito, a ser realizado na Comarca de Canavieiras, sob pena de multa diária. Pleiteou os benefícios da justiça gratuita. A petição inicial foi instruída com documentos, incluindo laudos médicos, documentos pessoais e orçamentos (IDs 478639968 a 478639985). Em decisão inicial (ID 482618041), este Juízo declarou a tramitação do feito pelo procedimento comum ordinário, deferiu a gratuidade da justiça, determinou a inversão do ônus da prova e postergou a análise do pedido de tutela de urgência para após o contraditório. Citado, o ESTADO DA BAHIA apresentou contestação (ID 484322078), argumentando, em suma, que o SUS disponibiliza acompanhamento multidisciplinar para pacientes com TEA através da Rede de Cuidados à Pessoa com Deficiência (RCPD) e da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). Afirmou não haver comprovação de falha no serviço público e requereu, em caso de condenação, que a obrigação se restrinja à referência a "tratamento multidisciplinar para TEA", cujas especificidades seriam definidas pelo serviço especializado da rede SUS. O MUNICÍPIO DE CANAVIEIRAS, por sua vez, contestou o feito (ID 492947806), arguindo, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva, ao argumento de que o tratamento pleiteado é de média e alta complexidade, sendo de responsabilidade do Estado. Suscitou, ainda, a ausência de interesse de agir por falta de prévio requerimento administrativo. No mérito, invocou a limitação orçamentária (princípio da reserva do possível) e reiterou a tese de que sua competência se restringe à atenção básica de saúde. A parte autora apresentou réplica (ID 503665493), rechaçando as preliminares e reiterando os termos da inicial, destacando a comprovação da tentativa de resolução extrajudicial e a responsabilidade solidária dos entes públicos. O Ministério Público, em parecer (ID 504294339), opinou pela rejeição das preliminares e, no mérito, pela procedência integral dos pedidos, reconhecendo a responsabilidade solidária dos réus e a necessidade do tratamento, inclusive com a possibilidade de fixação de multa diária. É o relatório. Decido. O feito comporta julgamento antecipado do mérito, nos termos do art. 355, I, do Código de Processo Civil, porquanto a matéria controvertida é eminentemente de direito e os fatos estão suficientemente comprovados pelos documentos acostados aos autos. O Município de Canavieiras argui sua ilegitimidade para figurar no polo passivo da demanda, sob o argumento de que a responsabilidade pelo fornecimento de tratamentos de média e alta complexidade é exclusiva do Estado da Bahia. A preliminar não merece acolhida. A Constituição Federal, em seus artigos 6º e 196, consagra a saúde como direito social fundamental e dever do Estado, a ser garantido por meio de políticas que visem ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Para dar efetividade a essa norma, o Sistema Único de Saúde (SUS) foi estruturado de forma descentralizada e com responsabilidade solidária entre os entes da Federação. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o Recurso Extraordinário nº 855.178/SE (Tema 793 da Repercussão Geral), pacificou o entendimento de que "os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde". Tal solidariedade confere ao cidadão a faculdade de demandar contra qualquer um dos entes - União, Estados, Distrito Federal ou Municípios -, isolada ou conjuntamente, para a efetivação de seu direito. Embora o Tema 793 também oriente que a autoridade judicial deve direcionar o cumprimento da obrigação conforme as regras de repartição de competências, isso não afasta a legitimidade passiva do município para a causa. A repartição de competências é matéria a ser observada na fase de cumprimento da obrigação e para eventuais acertos financeiros entre os entes (ressarcimento), não servindo como óbice ao reconhecimento da legitimidade passiva solidária de todos eles. Portanto, com base na responsabilidade solidária estabelecida constitucional e jurisprudencialmente, rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva do Município de Canavieiras. O Município alega, ainda, a carência de ação por ausência de interesse de agir, em razão da não comprovação de prévio requerimento administrativo. Tal argumento também não prospera. Primeiramente, o direito de acesso à justiça, previsto no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, não é, em regra, condicionado ao prévio exaurimento da via administrativa. Ademais, no caso concreto, é de conhecimento público que tais serviços não são disponibilizados. Dessa forma, rejeito a preliminar de ausência de interesse de agir. Superadas as questões preliminares, adentro ao mérito da causa, que cinge-se à análise do dever do Poder Público de custear tratamento multidisciplinar a menor diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH). A pretensão autoral encontra amparo em um robusto arcabouço normativo e jurisprudencial que visa à proteção integral da saúde e da dignidade da pessoa humana, com especial atenção às crianças e às pessoas com deficiência. A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 196, estabelece a saúde como "direito de todos e dever do Estado", a ser garantido mediante políticas públicas que assegurem o "acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação". Esse dever estatal é uma expressão do direito fundamental à vida e do princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), núcleo axiológico do ordenamento jurídico brasileiro. De forma específica para a criança e o adolescente, o artigo 227 da Carta Magna impõe à família, à sociedade e ao Estado o dever de assegurar, com absoluta prioridade, o direito à vida e à saúde, entre outros. No plano infraconstitucional, a Lei nº 8.080/90 (Lei Orgânica da Saúde) regulamenta o SUS e reafirma a saúde como um direito fundamental. De maneira ainda mais específica, a Lei nº 12.764/2012, conhecida como Lei Berenice Piana, instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. Referida lei, em seu artigo 1º, § 2º, equipara a pessoa com TEA à pessoa com deficiência para todos os efeitos legais, e em seu artigo 3º, inciso III, assegura o direito de acesso a ações e serviços de saúde, com vistas à atenção integral às suas necessidades, incluindo o "atendimento multiprofissional". No caso dos autos, o laudo médico subscrito por neurologista (ID 478639983) é inequívoco ao diagnosticar o menor H. S. B. com TEA (CID F84.1) e TDAH (CID F90.4), prescrevendo, de forma fundamentada, a necessidade de "avaliação/acompanhamento com Fonoaudiólogo, Psicopedagogo, Psicólogo e Terapeuta Ocupacional". O profissional médico justifica a imprescindibilidade das terapias para o desenvolvimento neuropsicomotor da criança, controle de comorbidades e melhora na qualidade de vida. A jurisprudência pátria é pacífica no sentido de reconhecer o dever do Estado de fornecer tratamento multidisciplinar a pacientes com TEA, quando devidamente prescrito por profissional médico. A necessidade de uma abordagem interdisciplinar é inerente à própria condição do autismo, sendo essencial para o desenvolvimento de habilidades sociais, de comunicação e para a autonomia do indivíduo. Nesse sentido, confira-se: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO . DIREITO À SAÚDE E À EDUCAÇÃO. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA E TDAH. FORNECIMENTO DE TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR. RESPONSABILIDADE ESTATAL . REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO DO ESTADO DESPROVIDOS. APELAÇÃO DO AUTOR PARCIALMENTE PROVIDA. DECISÃO UNÂNIME. I . CASO EM EXAME Apelação cível e reexame necessário interpostos em face de sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados por menor portador de Transtorno do Espectro Autista (TEA) e TDAH, para determinar ao Estado de Pernambuco o custeio de tratamento multidisciplinar especializado, conforme plano terapêutico prescrito por profissional da rede pública, indeferindo, contudo, os pedidos de natureza educacional e de indenização por danos morais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: (i) verificar a obrigatoriedade do Estado de Pernambuco em custear integralmente tratamento multidisciplinar prescrito a criança com TEA e TDAH, incluindo terapias educacionais; (ii) determinar a possibilidade de intervenção judicial em políticas públicas de saúde e educação para assegurar direitos fundamentais; (iii) analisar a existência de dano moral indenizável decorrente da omissão estatal no fornecimento do tratamento. III . RAZÕES DE DECIDIR A obrigação do Estado em custear tratamento multidisciplinar decorre do direito à saúde e à educação, assegurados constitucionalmente, bem como das disposições da Lei nº 12.764/2012, que reconhece a pessoa com TEA como pessoa com deficiência e garante o acesso ao tratamento adequado. O acompanhamento por atendente terapêutico em ambiente escolar e as sessões de psicopedagogia especializada configuram medidas de natureza educacional que visam à inclusão e ao desenvolvimento do menor, estando amparadas nos artigos 205, 208, III e 211, § 2º, da Constituição Federal, além da Lei nº 7.853/89 . A atuação judicial no controle de políticas públicas de saúde e educação é legítima diante da omissão administrativa e da necessidade de efetivar direitos fundamentais, não havendo violação ao princípio da separação de poderes nem prevalência da cláusula da reserva do possível. A jurisprudência do STF e do TJPE admite a imposição ao Poder Público para fornecimento de terapias prescritas a pessoas com deficiência, inclusive em ambiente escolar, conforme fixado no Incidente de Assunção de Competência (IAC) nº 0018952-81.2019.8 .17.9000. A pretensão de condenação por danos morais foi corretamente indeferida, diante da ausência de comprovação de abalo psíquico ou sofrimento excepcional que exceda o mero dissabor, não havendo elementos que justifiquem reparação civil. A remessa necessária é cabível, nos termos da Súmula nº 490 do STJ, mas improcede quanto ao mérito, diante da regularidade da sentença de origem quanto à concessão do tratamento médico prescrito . IV. DISPOSITIVO E TESE Reexame necessário e apelação do Estado desprovidos. Apelação da parte autora parcialmente provida. Decisão Unânime . Tese de julgamento: O Estado tem o dever jurídico de custear tratamento multidisciplinar prescrito por profissional habilitado a menor diagnosticado com TEA e TDAH, inclusive terapias educacionais. A atuação do Judiciário é legítima para compelir o Estado ao cumprimento de políticas públicas de saúde e educação, diante da omissão administrativa. A negativa administrativa de fornecimento de tratamento, por si só, não configura dano moral indenizável, salvo prova de prejuízo psíquico ou emocional concreto. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts . 1º, III; 6º; 205; 208, III; 211, § 2º. Lei nº 7.853/89, art. 2º . Lei nº 12.764/2012, arts. 1º, § 2º, e 3º, IV. CPC/2015, art . 85, § 11. Jurisprudência relevante citada: STF, RE 1008166, Rel. Min. Luiz Fux, j . 22.09.2022. STF, ARE 860979 AgR, Rel . Min. Gilmar Mendes. STJ, Súmula nº 490. TJPE, IAC nº 0018952-81 .2019.8.17.9000, Rel . Des. Tenório dos Santos, j. 08.08 .2022. TJPE, AgInst nº 0032452-44.2024.8 .17.9000, Rel. Des. Fernando Cerqueira Noberto dos Santos, j . 06.08.2024. (TJ-PE - Apelação / Remessa Necessária: 00022454720248172021, Relator: ERIK DE SOUSA DANTAS SIMOES, Data de Julgamento: 19/06/2025, Gabinete do Des. Erik de Sousa Dantas Simões) AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER - AUTOR PORTADOR DE TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA - TERAPIA NA MODALIDADE DE ANÁLISE DO COMPORTAMENTO APLICADO - MÉTODO ABA - TRATAMENTO NECESSÁRIO - REQUISITOS OBSERVADOS - OBRIGAÇÃO DO ENTE PÚBLICO - COM O PARECER, RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. O art. 196 da Constituição Federal dispõe que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Ainda, o art . 227 da Constituição Federal estabelece que o direito à vida e à saúde das crianças devem ser assegurados com prioridade. A Lei nº 12.764/2012, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, prevê, em seus artigos 2º, III e 3º, III, b, a obrigatoriedade do fornecimento de atendimento multiprofissional ao paciente diagnosticado com autismo, alinhando-se ao Estatuto da Criança e do Adolescente, que garante o direito ao respeito da dignidade da criança, bem como a inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral. Com o parecer, recurso conhecido e provido . (TJ-MS - Apelação Cível: 08006085020238120033 Eldorado, Relator.: Des. Alexandre Raslan, Data de Julgamento: 28/04/2025, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: 29/04/2025) DIREITO À SAÚDE. APELAÇÃO CÍVEL. MENOR IMPÚBERE. TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA - TEA . TRATAMENTO MULTIDISCIPLINAR. PRESCRIÇÃO MÉDICA. OBRIGAÇÃO DO ESTADO. PROVIMENTO . I. CASO EM EXAME: 1. Apelação cível contra sentença que determinou o fornecimento de psicologia, terapia ocupacional, fonoaudiologia e psicopedagogia a menor impúbere com Transtorno do Espectro Autista, mas indeferiu o método ABA, Linguagem e Integração Sensorial e condicionou a carga horária das sessões à definição pelos profissionais da rede pública de saúde. II . QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. A questão em discussão consiste em saber se o Estado de Alagoas pode limitar ou negar tratamento específico prescrito por médico assistente a paciente diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3 . O médico que acompanha o paciente é o profissional mais qualificado para prescrever o tratamento adequado, considerando as particularidades do caso. 3.1. O parecer técnico do NATJUS tem caráter meramente opinativo, não possuindo força vinculante para restringir direitos constitucionalmente garantidos . 3.2. O direito à saúde é dever do Estado, sendo obrigação deste fornecer o tratamento necessário conforme a prescrição médica, condicionado à apresentação de laudo médico atualizado a cada 12 meses ao órgão administrativo competente. 3 .3. Manutenção da fixação dos honorários advocatícios em favor de advogado particular, conforme precedentes jurisprudenciais. IV. DISPOSITIVO E TESE: 4 . Apelação cível conhecida e provida. Dispositivos relevantes citados: CF/88, arts. 5º, XXXV, 6º, e 196; CPC/15, arts. 300, 995, parágrafo único, 1 .015, I, 1.019, I e II, 522, caput, e 932, I. Jurisprudência relevante citada: TJAL, Apelação Cível nº 0700127-62.2020 .8.02.0001, Rel. Des . Paulo Barros da Silva Lima, 1ª Câmara Cível, j. 18/10/2023, DJ 19/10/2023. (TJ-AL - Apelação Cível: 07005163220248020090 Maceió, Relator.: Des. Paulo Barros da Silva Lima, Data de Julgamento: 14/04/2025, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: 15/04/2025) CONSTITUCIONAL. MANDADO DE SEGURANÇA. ESTADO. DEVER DE PROMOVER SAÚDE . ORDEM CONCEDIDA. I. Caso em exame 1. Mandado de Segurança destinado a assegurar tratamento múltiplo a criança autista . II. Questão em discussão 2. Há três questões em discussão, a saber: (i) se há possibilidade de concessão da ordem; (ii) se há falta de prova pré-constituída e existência de direito líquido e certo; e (iii) se há violação ao princípio da separação dos poderes e omissão estatal no dever de promover saúde. III . Razões de decidir 3. O Impetrante juntou aos autos prescrição médica (prova pré-constituída) indicando a necessidade de diversas terapias (direito líquido e certo). 4. Demonstrada a indisponibilidade do Estado do Acre em atender a demanda de saúde do Impetrante, adequada a concessão da segurança visando garantir direito constitucional, sem violação ao princípio da separação dos poderes . IV. Dispositivo e tese 5. Mandado de Segurança concedido. Dispositivos relevantes citados: art . 196 da Constituição Federal; e art. 179 da Constituição do Estado do Acre. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp nº 2.120 .171/SP, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 20/5/2024, DJe de 29/5/2024. TJAC, Número do Processo: 1000979-04.2024.8 .01.0000; Relator Des. Laudivon Nogueira; Órgão julgador: Primeira Câmara Cível; Data do julgamento: 7/10/2024; Data de registro: 7/10/2024; e Número do Processo: 0600053-83.2017 .8.01.0081; Relatora Desa. Eva Evangelista; Órgão julgador: Primeira Câmara Cível; Data do julgamento: 1/8/2024; Data de registro: 1/8/2024. (TJ-AC - Mandado de Segurança Cível: 10020642520248010000 Rio Branco, Relator.: Des. Elcio Mendes, Data de Julgamento: 18/12/2024, Tribunal Pleno Jurisdicional, Data de Publicação: 20/12/2024) Os argumentos dos entes públicos não são capazes de afastar o direito do autor. A alegação de que o tratamento já é ofertado pela rede pública, de forma genérica, não se sustenta sem a comprovação de que o serviço específico, na localidade e com a presteza que o caso requer, está de fato disponível e foi oferecido ao paciente. A inversão do ônus da prova, deferida no despacho inicial, impunha aos réus o dever de demonstrar a efetiva disponibilidade do tratamento, ônus do qual não se desincumbiram. Quanto ao princípio da reserva do possível, invocado pelo Município, o Supremo Tribunal Federal já consolidou o entendimento de que tal princípio não pode ser utilizado como justificativa para o Estado se eximir do cumprimento de suas obrigações constitucionais, especialmente quando se trata de garantir o mínimo existencial, do qual o direito à saúde é um componente essencial. A ausência de recursos, para ser oponível, deve ser demonstrada de forma concreta e objetiva, evidenciando a impossibilidade material de cumprimento da obrigação, o que não ocorreu nos autos. Assim, comprovada a patologia, a necessidade do tratamento multidisciplinar por meio de laudo médico fundamentado e a omissão dos entes públicos em fornecê-lo, a procedência do pedido é medida que se impõe, a fim de garantir a efetividade dos direitos fundamentais à vida e à saúde do menor. Por fim, o pedido de condenação dos réus ao pagamento de honorários advocatícios em favor do Fundo de Assistência Jurídica da Defensoria Pública do Estado da Bahia merece acolhimento. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 1.140.005/RJ (Tema 1.002 da Repercussão Geral), fixou a tese de que "é devido o pagamento de honorários sucumbenciais à Defensoria Pública, quando representa parte vencedora em demanda ajuizada contra qualquer ente público, inclusive aquele que integra". Essa decisão superou o entendimento anterior, consubstanciado na Súmula 421 do STJ, reconhecendo a autonomia administrativa, funcional e orçamentária da Defensoria Pública, o que afasta a figura da confusão entre credor e devedor quando a instituição litiga contra o ente público ao qual está vinculada. Portanto, sendo a parte autora vencedora na demanda e estando representada pela Defensoria Pública, é devida a condenação dos entes públicos réus ao pagamento de honorários de sucumbência. Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na inicial, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para CONDENAR o ESTADO DA BAHIA e o MUNICÍPIO DE CANAVIEIRAS, de forma solidária, na obrigação de fazer consistente em fornecer ao autor, H. S. B., o tratamento multidisciplinar prescrito no laudo médico de ID 478639983, notadamente acompanhamento com Fonoaudiólogo, Psicopedagogo, Psicólogo e Terapeuta Ocupacional. O tratamento deverá ser integralmente custeado pelos réus, seja na rede pública ou, na sua indisponibilidade ou inadequação, na rede privada, preferencialmente no Município de Canavieiras, devendo ser iniciado no prazo máximo de 15 (quinze) dias, a contar da intimação pessoal dos réus para cumprimento desta sentença. Para o caso de descumprimento, será fixada multa diária (astreintes), sem prejuízo da possibilidade de sequestro de verbas públicas para assegurar o resultado prático equivalente, nos termos dos arts. 497 e 536 do CPC. Condeno os réus, solidariamente, ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, com fundamento no art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC, a serem revertidos em favor do Fundo de Assistência Jurídica da Defensoria Pública do Estado da Bahia (FAJDPE/BA), conforme tese firmada no Tema 1.002 do STF. Sentença não sujeita à remessa necessária, considerando que o valor da causa (R$ 16.560,00) é inferior aos limites estabelecidos no art. 496, § 3º, do CPC. Dê-se ciência ao Ministério Público. Após o trânsito em julgado, não havendo pendências, arquivem-se os autos com baixa. Serve a cópia desta sentença, acompanhada da assinatura eletrônica deste Magistrado, como carta, mandado, ofício e demais expedientes necessários para o seu fiel cumprimento. Sentença registrada eletronicamente. Publique-se. Intime(m)-se. Cumpra-se. Canavieiras/BA, data da assinatura eletrônica. Bruno Borges Lima Damas Juiz de Direito
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