Processo nº 6147362-79.2024.8.09.0051
ID: 258865217
Tribunal: TJGO
Órgão: Goiânia - 2ª UPJ Varas de Crimes Punidos com Reclusão e Detenção: 2ª, 4ª, 5ª , 8ª e 9ª
Classe: PROCEDIMENTO ESPECIAL DA LEI ANTITóXICOS
Nº Processo: 6147362-79.2024.8.09.0051
Data de Disponibilização:
23/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ARTHUR PAULINO DE OLIVEIRA
OAB/GO XXXXXX
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Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 1/21 Autos nº 6147362-79.2024.8.09.0051 Réu Lucas Gabriel Martins Cavalcante S E N T E N Ç A O representante do Ministério Público, em exercíci…
Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 1/21 Autos nº 6147362-79.2024.8.09.0051 Réu Lucas Gabriel Martins Cavalcante S E N T E N Ç A O representante do Ministério Público, em exercício perante o Juízo da 2ª Vara das Garantias desta Capital, no uso de suas atribuições legais, com base no incluso Inquérito Policial, ofereceu denúncia contra LUCAS GABRIEL MARTINS CAVALCANTE, já qualificado nos autos, dando-o como incurso nas sanções previstas no artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006, pela prática do seguinte fato delituoso, assim narrado, em suma, na inicial: “(…) no dia 18 de dezembro de 2024, na Rua RB 9, Qd. 07, Lt. 07, Casa 3, CEP: 74464155, Residencial 14 Bis Extensão, nesta capital, LUCAS GABRIEL MARTINS CAVALCANTE, de forma livre e consciente, trazia consigo, para difusão, sem autorização e em desacordo com as determinações legais e regulamentares pertinentes, 05 (cinco) porções de material pulverizado esbranquiçado, constituído do alcaloide ‘cocaína’, com massa bruta de 4,648g (quatro gramas e seiscentos e quarenta e oito miligramas), acondicionadas individualmente em plástico incolor ziplock. Nas mesmas circunstâncias, LUCAS GABRIEL MARTINS CAVALCANTE, de forma livre e consciente, mantinha em depósito, para difusão, sem autorização e em desacordo com as determinações legais e regulamentares pertinentes, 01 (uma) porção de material pulverizado esbranquiçado, constituído do alcaloide ‘cocaína’, com massa bruta de 1,020Kg (um quilograma e vinte gramas e vinte gramas), acondicionada em fita vermelha, 01 (uma) porção de ‘Cannabis Sativa’, planta psicotrópica de coloração castanho-esverdeada, popularmente conhecida por ‘maconha’, com massa bruta de 1,065Kg (um quilograma e sessenta e cinco gramas), acondicionada em plástico incolor, bem como 17 (dezessete) frascos de vidro incolor, contendo líquido incolor volátil, com capacidade aproximada de 100 ml Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 2/21 (cem mililitros), boca puntiforme e tampa de pressão verde e 01 (uma) balança de precisão. (...)” (mov. 34). O Inquérito Policial foi instaurado mediante Auto de Prisão em Flagrante Delito (mov. 1). Certidão e informação de antecedentes criminais (mov. 12/14, 42, 92 e 104). Em audiência de custódia, o auto de prisão em flagrante foi homologado, sendo a prisão convertida em preventiva (mov. 22). A inicial acusatória foi oferecida em 08.01.2025 (mov. 34). Notificado (mov. 56), o acusado, por intermédio de advogado constituído, apresentou defesa preliminar (mov. 53). A denúncia foi recebida em 29.01.2025, ocasião em que foi determinada a citação e intimação do acusado, além de designada audiência de instrução e Julgamento (mov. 65). Durante a instrução criminal foram ouvidas as testemunhas Guilherme Augusto Tavares Fernandes, Charles Vinícius Moreira Santos, Josarlan dos Santos Silva e Ranielle Alves Bueno, cujos depoimentos foram gravados em arquivo audiovisual (mov. 93/94). Qualificação e interrogatório – declarações registradas em arquivo audiovisual (mov. 94) Na fase diligencial, as partes nada requereram (mov. 95). Em memoriais de alegações finais, o Ministério Público, após analisar o conjunto probatório, entendeu estar devidamente demonstrada a materialidade e autoria do delito, pleiteando pela condenação do réu, nos termos da inicial acusatória (mov. 100). Por sua vez, a Defesa, preliminarmente, postulou pela nulidade processual diante da ilegalidade da busca pessoal e domiciliar por ausência de fundada suspeita, bem como pela violação ao direito ao silêncio. No mérito, em caso de condenação, postulou pela concessão do direito do acusado em recorrer em liberdade (mov. 103). Convertido o julgamento em diligência (mov. 106). Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 3/21 Laudos de Perícia Criminal – identificação de drogas e substâncias correlatas (exame definitivo) (mov. 110). As partes ratificaram os memoriais de alegações finais apresentados (mov. 114 e 121). É o breve relato. Passo a fundamentar. Trata-se de ação penal pública incondicionada, na qual imputa-se ao réu Lucas Gabriel Martins Cavalcante a prática do crime de tráfico ilícito de drogas. Prefacialmente, não verifico a existência de quaisquer vícios de forma. Demais disso, as condições da ação encontram-se presentes e o rito processual seguido é próprio à infração apurada, em consonância com entendimento exarado pelo Supremo Tribunal de Justiça (HC 127900/AM- Amazonas. Rel. Min. Dias Toffoli. Julgamento 03.03.2016. Órgão Julgador: Tribunal Pleno. Publicação Processo Eletrônico DJe-161 Divulg 02-08-2016 Public 03-08- 2016)1. 1 Confira: Habeas corpus. Penal e processual penal militar. Posse de substância entorpecente em local sujeito à administração militar (CPM, art. 290). Crime praticado por militares em situação de atividade em lugar sujeito à administração militar. Competência da Justiça Castrense configurada (CF, art. 124 c/c CPM, art. 9º, I, b). Pacientes que não integram mais as fileiras das Forças Armadas. Irrelevância para fins de fixação da competência. Interrogatório. Realização ao final da instrução (art. 400, CPP). Obrigatoriedade. Aplicação às ações penais em trâmite na Justiça Militar dessa alteração introduzida pela Lei nº 11.719/08, em detrimento do art. 302 do Decreto- Lei nº 1.002/69. Precedentes. Adequação do sistema acusatório democrático aos preceitos constitucionais da Carta de República de 1988. Máxima efetividade dos princípios do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, inciso LV). Incidência da norma inscrita no art. 400 do Código de Processo Penal comum aos processos penais militares cuja instrução não se tenha encerrado, o que não é o caso. Ordem denegada. Fixada orientação quanto a incidência da norma inscrita no art. 400 do Código de Processo Penal comum a partir da publicação da ata do presente julgamento, aos processos penais militares, aos processos penais eleitorais e a todos os procedimentos penais regidos por legislação especial, incidindo somente naquelas ações penais cuja instrução não se tenha encerrado. [...] 4. A Lei nº 11.719/08 adequou o sistema acusatório democrático, integrando-o de forma mais harmoniosa aos preceitos constitucionais da Carta de República de 1988, assegurando-se maior efetividade a seus princípios, notadamente, os do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, inciso LV). 5. Por ser mais benéfica (lex mitior) e harmoniosa com a Constituição Federal, há de preponderar, no processo penal militar (Decreto-Lei nº 1.002/69), a regra do art. 400 do Código de Processo Penal. 6. De modo a não comprometer o princípio da segurança jurídica (CF, art. 5º, XXXVI) nos feitos já sentenciados, essa orientação deve ser aplicada somente aos processos penais militares cuja instrução não se tenha encerrado, o que não é o caso dos autos, já que há sentença condenatória proferida em desfavor dos pacientes desde 29/7/14. 7. Ordem denegada, com a fixação da seguinte orientação: a norma inscrita no art. 400 do Código de Processo Penal comum aplica-se, a partir da publicação da ata do presente julgamento, aos processos penais militares, aos processos penais eleitorais e a todos os procedimentos penais regidos por legislação especial incidindo somente naquelas ações penais cuja instrução não se tenha encerrado. (ênfase acrescida). Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 4/21 A Defesa alude, preliminarmente, o reconhecimento da ilegalidade das provas produzidas a partir da busca pessoal e domiciliar realizadas. Contudo, a conduta dos policiais militares está revestida de legalidade, haja vista que legitimados a realizar a busca pessoal e domiciliar sem ordem judicial, notadamente porque fundada em suspeita de situação flagrancial de delito permanente. Como se verá mais adiante, a equipe policial recebeu informações do serviço de inteligência relatando a ocorrência de tráfico ilícito de drogas na região e as características do suposto autor. Realizado o patrulhamento no local, os policiais avistaram Lucas Gabriel Martins Cavalcante ostentando o perfil informado, ocasião em que demonstrou certo nervosismo, mudando de direção. Ao ser abordado houve a localização de 05 (cinco) porções de cocaína. Durante a entrevista, o acusado informou que haveria mais entorpecentes na residência, de modo que, durante a busca domiciliar, foram encontradas as demais substâncias apreendidas, além de uma balança de precisão. Diante de tal cenário, inexiste ilegalidade na atuação dos policiais, porquanto presente fundadas razões (justa causa) para a busca, isto é, fundada suspeita de flagrante em crime permanente, situação incompatível com a espera de um mandado, além de desnecessária sua expedição. Nesse viés, cediço que não há garantia constitucional absoluta, tendo vigência no Direito Brasileiro, no âmbito constitucional-penal, o princípio da proporcionalidade, segundo o qual as liberdades constitucionais podem ser plenamente limitadas em hipóteses excepcionais. Nesse diapasão, colaciono os seguintes julgados: AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. ALEGADA AUSÊNCIA DE FUNDADAS RAZÕES PARA BUSCA PESSOAL. NECESSIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO- PROBATÓRIO. VIA INADEQUADA. 1. A justa causa, em casos de busca pessoal, não exige a certeza da ocorrência de delito, mas, sim, fundadas razões a respeito (CPP, art. 244). E, no particular, os questionamentos suscitados foram examinados e refutados pelas instâncias antecedentes com base no contexto fático em que se deu a prisão em flagrante; circunstância, portanto, insindicável nesta via estreita. Precedentes. 2. Conforme já decidiu esta CORTE, "Se um agente do Estado não puder realizar abordagem em via pública Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 5/21 a partir de comportamentos suspeitos do alvo, tais como fuga, gesticulações e demais reações típicas, já conhecidas pela ciência aplicada à atividade policial, haverá sério comprometimento do exercício da segurança pública" (RHC 229514 AgR, Relator(a): GILMAR MENDES, Segunda Turma, DJe de 23/10/2023). 3. Agravo Regimental a que se nega provimento. (HC 238260 AgR, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 25-03-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 01- 04-2024 PUBLIC 02-04-2024) (ênfase acrescida). PENAL. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. TRÁFICO DE DROGAS. BUSCA PESSOAL. FUNDADA SUSPEITA PARA A ABORDAGEM DEVIDAMENTE COMPROVADA. ACÓRDÃO RECORRIDO EM DESCONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO REGIMENTAL A QUE NEGA PROVIMENTO. 1. É incabível ao Poder Judiciário determinar ao Poder Executivo a imposição de providências administrativas como medida obrigatória para os casos de busca pessoal, sob o argumento de serem necessárias para evitar eventuais abusos, além de suspeitas e dúvidas sobre a legalidade da diligência. 2. A existência de justa causa para a busca pessoal ocorreu após os policiais que realizavam patrulhamento em local conhecido como ponto de tráfico de drogas avistarem a agravante em atitude suspeita. Ao perceber que seria abordada, a recorrente tentou fugir, mas foi perseguida e alcançada pelos militares. Após revista pessoal, os agentes de segurança encontraram em seu poder “4 tabletes de cannabis sativa, vulgarmente conhecida por maconha, pesando 4,70 gramas, 33 pedras de cocaína, pesando aproximadamente 7,30 gramas”. 3. O entendimento adotado pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL impõe que os agentes estatais devem nortear suas ações, em tais casos, motivadamente e com base em elementos probatórios mínimos que indiquem a ocorrência de situação flagrante. A justa causa, portanto, não exige a certeza da ocorrência de delito, mas, sim, fundadas razões a respeito. Precedentes. 4. Agravo Regimental a que se nega provimento. (ARE 1476558 AgR, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 15-04-2024, PROCESSO ELETRÔNICO DJe- s/n DIVULG 30-04-2024 PUBLIC 02-05-2024) (ênfase acrescida). PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. NULIDADE. BUSCA PESSOAL. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE EVIDENCIEM ABORDAGEM PRECONCEITUOSA OU PERSEGUIÇÃO POR PARTE DOS POLICIAIS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Nos termos do art. 240, §2º do CPP, proceder-se-á à busca pessoal quando houver fundada suspeita de que alguém oculte consigo arma proibida ou para apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos; apreender instrumentos de falsificação ou de contrafação e objetos falsificados ou contrafeitos; apreender armas e munições, instrumentos utilizados na prática de crime ou destinados a fim delituoso; descobrir objetos necessários à prova de infração ou à defesa do réu; apreender cartas, abertas ou não, destinadas ao acusado ou em seu poder, quando haja Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 6/21 suspeita de que o conhecimento do seu conteúdo possa ser útil à elucidação do fato; e colher qualquer elemento de convicção. 2. Não se vislumbra qualquer ilegalidade na atuação dos policiais, amparados que estão pelo Código de Processo Penal para abordar quem quer que esteja atuando de modo suspeito ou furtivo, não havendo razão para manietar a atividade policial sem indícios de que a abordagem ocorreu por perseguição pessoal ou preconceito de raça ou classe social, motivos que, obviamente, conduziriam à nulidade da busca pessoal, o que não se verificou no caso. 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 784.256/SC, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 24/4/2023, DJe de 27/4/2023.) (ênfase acrescida). De mais a mais, não se pode olvidar da existência de certa discricionariedade policial na identificação de situações suspeitas, de modo que, diante do contexto torna-se inadmissível interpretar suas ações como se ilícitas fossem. No que diz respeito a ilicitude das provas pela inobservância de advertência dos policiais acerca do direito constitucional ao silêncio para o acusado, no momento de sua abordagem (“Aviso de Miranda”), sedimentou-se o entendimento dos Tribunais Superiores que tal situação é causa de nulidade relativa, dependente da comprovação do prejuízo e sujeita a preclusão. Além disso, a obrigação de informar quanto ao direito ao silêncio ocorre no momento do interrogatório, em sede inquisitorial e judicial, e não por ocasião do flagrante. Outro não é o entendimento jurisprudencial: PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. 1. DIREITO AO SILÊNCIO. AUSÊNCIA DE AVISO. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO. EXISTÊNCIA DE VASTO CONJUNTO PROBATÓRIO. 2. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O acórdão impugnado encontra-se em consonância com a jurisprudência desta Corte Superior, que é no sentido de que "eventual irregularidade na informação acerca do direito de permanecer em silêncio é causa de nulidade relativa, cujo reconhecimento depende da comprovação do prejuízo" (RHC 67.730/PE, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe 04/05/2016). [...] 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ - AgRg no HC: 762905 MG 2022/0248980-0, Data de Julgamento: 14/02/2023, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/02/2023) (ênfase acrescida). ROUBO MAJORADO PELO CONCURSO DE PESSOAS. PRELIMINAR. INFRINGÊNCIA AO DISPOSTO NO ART. 226 DO CPP. MERA IRREGULARIDADE. AVISO DE MIRANDA. INOBSERVÂNCIA. NÃO Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 7/21 OCORRÊNCIA. ABSOLVIÇÃO. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. IN DUBIO PRO REO. ATENUANTE DA MENORIDADE RELATIVA. RECONHECIMENTO. INVIABILIDADE. PENA DE MULTA. READEQUAÇÃO DE OFÍCIO. [...] II. Sendo o apelante advertido do direito ao silêncio tanto quando ouvido perante a autoridade policial, como em juízo, não gera nulidade a assertiva de não ter sido advertido pelos policiais que efetuaram sua prisão, primeiramente porque não comprovada, segundo porque, não há exigência legal que os policiais o façam, no momento da abordagem. [...]APELAÇÃO CONHECIDA E PARCIALMENTE PROVIDA. (TJGO, PROCESSO CRIMINAL -> Recursos -> Apelação Criminal 5205523-36.2023.8.09.0051, Rel. Des(a). DESEMBARGADORA CARMECY ROSA MARIA ALVES DE OLIVEIRA, 3ª Câmara Criminal, julgado em 20/06/2024, DJe de 20/06/2024) (ênfase acrescida). Com efeito, perante a autoridade policial e judicial, no ato do interrogatório, o acusado foi cientificado do direito de permanecer em silêncio e de suas garantias constitucionais, inexistindo qualquer prejuízo. Assim, REJEITO as preliminares aventadas e, ausentes questões prefaciais outras, suscitadas ou a serem reconhecidas de ofício, passo ao exame do mérito. Pois bem. A materialidade delitiva restou cabalmente comprovada pelo Auto de Prisão em Flagrante, especialmente pelos Laudos de Perícia Criminal - constatação de drogas (mov. 1, fls. 4/6 e 37/39), Registro de Atendimento Integrado – RAI n° 39370836 (mov. 1, fls. 12/30), Termo de Exibição e Apreensão (mov. 1, fls. 69/71) e Laudos de Perícia Criminal – identificação de drogas e substâncias correlatas (exame definitivo) (mov. 110). A autoria, de outro lado, restou indene de dúvidas, em especial pela prova oral produzida em Juízo, senão vejamos. A testemunha GUILHERME AUGUSTO TAVARES FERNANDES assegurou que através do serviço de inteligência recebeu a informação de que na região havia uma movimentação de possível tráfico, sendo repassadas as características do suposto envolvido; que então abordaram o réu e com ele havia uma pequena quantidade de substância análoga à cocaína; que o abordado declarou que possuía outra quantidade de droga na residência e que a guardava para um terceiro em troca de quantia em dinheiro; que se deslocaram até o imóvel Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 8/21 e lá foram localizados frascos de lança perfume, uma peça de skunk, um pedaço de cocaína e uma balança de precisão. Confira: “(...) que foi uma operação conjunta com o serviço de inteligência; que sempre que entram em serviço em determinada área já são repassadas as informações de possíveis questões para abordar; que receberam informação de que na região havia uma movimentação de possível tráfico, sendo repassadas as características; que abordaram o indivíduo e ele estava com uma pequena quantidade de substância análoga à cocaína consigo; que o abordado informou que era apenas usuário; que relataram ao réu que havia uma denúncia, momento em que ele declarou que possuía outra quantidade de droga na residência; que o autor narrou que não traficava, apenas guardava o material para terceira pessoa mediante o pagamento de certa quantia; que, com a autorização do morador, apreenderam o material ilícito que estava no quarto e deslocaram-se à Central de Flagrantes; que a abordagem se deu em via pública; que a droga estava fracionada e acondicionada em sacos transparentes de ziplock; que na residência foram localizados frascos de lança perfume, uma peça de skunk e outro pedaço de cocaína; que também havia balança de precisão; que todo o material encontrado foi levado para a Delegacia, onde foi lavrado o Termo de Apreensão; que não se recorda se havia mais alguém no imóvel; que as substâncias encontradas na residência estavam no quarto em uma espécie de baú; que o abordado apontou o local em que os entorpecentes estavam guadados; que acredita que a equipe da Força Tática e do setor de inteligência compareceram no local; que a abordagem foi realizada pelo depoente e seu colega; que era o comandante da viatura na data dos fatos; que as informações recebidas pelo serviço de inteligência foram repassadas de forma presencial e referiam-se às características físicas do indivíduo; que não sabe informar com detalhes quais características foram repassadas; que as informações que recebeu permitiu que identificasse como semelhantes às características do abordado, o que motivou a abordagem; que não se recorda do momento exato da abordagem; que informou ao abordado o direito de permanecer em silêncio como de praxe; que acredita que o acusado não assinou documento autorizando a entrada da equipe na residência; que nunca participou de ocorrência que envolvesse o réu; que foi encontrado skunk na casa do réu, tratando-se de maconha de qualidade melhor; que foi encontrado com Lucas durante a abordagem em via pública mais de uma porção de cocaína; que o acusado relatou que seria para consumo próprio; que foram repassadas características pessoais do suposto envolvido no tráfico, como altura e cor; que coincidentemente o acusado passava pela rua à pé e sozinho; que, se o depoente não se engana, o réu demonstrou nervosismo, mudando de direção; que não conhecia o acusado de outras ocorrências (...)” (transcrição não literal do depoimento gravado em arquivo audiovisual – mov. 93). Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 9/21 No mesmo sentido foi o depoimento do policial militar CHARLES VINÍCIUS MOREIRA SANTOS ao relatar que após o recebimento de informação sobre as características de um indivíduo supostamente envolvido no tráfico de drogas, abordaram o denunciado, sendo com ele localizadas 05 (cinco) porções de cocaína, além do restante dos entorpecentes serem encontrados na residência por aquele indicada, bem como uma balança de precisão, vidros de lança perfume e uma peça de skank, assim testificando: “(...) que se recorda muito pouco da ocorrência, pois estava passando mal na data dos fatos; que exerceu a função de motorista; que, conforme consta no RAI, receberam uma denúncia, sendo repassadas as características do indivíduo, das quais não se recorda; que o abordado tinha cinco papelotes de cocaína no bolso; que na residência do sujeito havia o restante dos entorpecentes, quais sejam, uma peça de cloridrato, uma peça de skunk, balança de precisão e vidros de lança perfume; que não conhecia o denunciado de outras ocorrências; que com o réu foram encontradas cinco porções em ziplock transparente; que não foi quem localizou as substâncias na residência do abordado, mas sim o comandante da equipe; que a equipe do depoente é composta por ele e pelo Sargento Fernantes; que contaram com o apoio da equipe da Força Tática, composta por três pessoas; que não sabe se os agentes do Tático ingressaram no imóvel junto com o Sargento Fernandes; que ficou aguardando na viatura; que as drogas apreendidas foram localizadas na casa do denunciado; que não sabe informar se havia outras pessoas no imóvel; que sabe que havia uma balança de precisão, pois leu no RAI; que exibida a imagem do acusado, confirmou se tratar da pessoa presa no dia dos fatos; que, se não se engana o depoente, o réu apresentou a versão de que estaria guardando as drogas para alguém e que receberia uma quantia para tanto; que a área 42º Batalhão possui nove quadrantes e que atuam praticamente em todos os quadrantes da região; que a região possui mais casos envolvendo furtos, mas que ‘tráfico tem em todo lugar’; que não se recorda se o acusado estava em um veículo ou à pé no momento da abordagem (...)” (transcrição não literal do depoimento gravado em arquivo audiovisual – mov. 93). O informante JOSARLAN DOS SANTOS SILVA – amigo do acusado – em nada contribuiu para a elucidação dos fatos, tecendo apenas comentários abonadores, a saber: “(...) que não tem conhecimento dos fatos; que o réu era um bom funcionário; que vendeu a marmoraria à Lucas; que o depoente regressou à empresa que trabalhava anteriormente; que empregaria o réu; que o acusado trabalhou com o depoente em 2024; que, no momento da prisão, o réu tomava conta da marmoraria; que vendeu o comércio por R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais); que abateu o Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 10/21 acerto do acusado e que este pagaria o restante do valor; que não recebeu nenhuma quantia do réu; que o negócio se deu de forma informal; que Lucas residia na rua atrás da marmoria, localizada no Residencial 14 Bis, setor Jardim Clarissa; que a mamoria se situa na Rua Emilio Rassi; que o réu residia com a esposa e a filha; que conhece o réu desde quando ele é bebê; que não sabe se Lucas é usuário de drogas (...)” (transcrição não literal do depoimento gravado em arquivo audiovisual – mov. 93). A seu turno, a informante RANIELLE ALVES BUENO – companheira do réu – aduziu que estava na residência quando os policiais chegaram no local, porém, não presenciou a apreensão dos objetos ilícitos, nesses termos: “(...) que, desde quando conhece Lucas, ele sempre trabalhou; que o acusado assumiu a filha da depoente quando ainda estava grávida; que é um bom pai e nunca deixou faltar nada para a família; que, na época da prisão, Lucas trabalhava até tarde; que estava na residência quando os policiais chegaram no local; que os agentes já chegaram invadindo e não pediram autorização para ingresso na casa; que a filha da depoente ficou assustada com a situação; que os policiais não chegaram com Lucas Gabriel; que os milicianos disseram que estavam procurando drogas; que o policial vinha perseguindo a depoente e Lucas há algum tempo; que convive com o acusado há cerca de dois a três anos; que residiam no endereço por volta de oito meses; que Lucas figurava como sócio da empresa de Josarlan na época dos fatos; que os policiais chegaram na residência quando já anoitecia; que Lucas tinha ido entregar uma pedra de mármore para uma senhora; que Lucas chegou a entregar a pedra, mas só a instalaria no dia seguinte, razão pela qual a cliente disse que o processaria; que Lucas fuma maconha; que os policiais não encontraram nada no local; que o imóvel é um sobrado e que durante a busca ficou no andar de baixo; que foi mandada embora do local; que não viu os materiais serem apreendidos (...)” (transcrição não literal do depoimento gravado em arquivo audiovisual – mov. 94). Com efeito, ao ser interrogado em Juízo, o denunciado LUCAS GABRIEL MARTINS CAVALCANTE negou veementemente a mercancia de drogas, afirmando que os entorpecentes foram forjados pelos policiais para incriminá-lo, aduzindo o seguinte: “(...) que não é verdadeira a acusação; que os policiais estão perseguindo o interrogado desde quando mataram o seu cunhado; que, certa vez, foi abordado, mas os agentes não queriam prendê-lo, e sim que o interrogado entregasse alguém; que os milicianos mandaram sua esposa embora e tentaram jogar drogas nele; que a família do interrogado chegou na hora, tendo inclusive sua avó Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 11/21 passado mal; que, por conta do ocorrido, mudou de residência; que, na data dos fatos, estava trabalhando e foi realizar uma entrega no Setor Eldorado; que na volta foi abordado, acreditando que se tratava por estar com a documentação do carro atrasada; que encostou e foi informado que tinha um mandado em aberto; que pediu para ver o nome e identificou que não era o seu; que, ao olhar para o lado, viu os agentes da Tática; que eram os mesmos policiais que invadiram a casa do interrogado e mataram o seu cunhado; que perguntaram se o interrogado tinha alguma coisa e este informou que não, dizendo que poderiam revistar seu carro; que pediu para o advogado as filmagens da avenida em que o carro foi revistado; que estava conversando com um sujeito e pedido maconha para fumar quando os milicianos pediram seu celular; que os agentes pediram que o réu entregasse o vendedor; que colocaram o interrogado na viatura e foram até a residência; que invadiram a casa, colocaram sua esposa em uma outra viatura; que encontraram no local 25g de maconha; que ameaçaram o interrogado, dizendo que, se ele não entregasse o vendedor do ilícito, ‘iam colocar droga’ nele; que os outros policiais não sabiam de nada, pois foram usados apenas para conduzí-lo até a Delegacia; que a irmã do interrogado está com um processo em andamento contra dois policiais da Tática; que os agentes da Tática desceram com dois sacos pretos e entraram para a residência; que disse que não assumiria a droga; que foi posto na viatura e conduzido até a Delegaica; que os milicianos não pegaram seu celular, pois não tinha nada relacionado ao tráfico; que não conhece os policiais que depuseram em juízo; que não sabe o nome dos militares, pois estavam sem o nome na farda; que foi abordado na BR; que estava com o seu ajudante; que tinha apenas 25g de skunk na residência e não havia fracos de líquido incolor ou cocaína; que também não havia no local balança de precisão; que não declarou que estava guardando a droga em troca de uma quantia em dinheiro (...)” (transcrição não literal das declarações registradas em arquivo audiovisual – mov. 94). Do acervo probatório, observo ser inconteste a apreensão de cocaína na posse do acusado, bem como de “maconha”, cocaína, fracos de substância incolor e balança de precisão na residência daquele. Demais disso, os policiais militares foram unânimes em ratificar em Juízo que, após a informação das características de um indivíduo que supostamente estaria comercializando drogas naquela região, deliberaram por abordar o réu por apresentar ele o perfil relatado, ocasião em que ele demonstrou certo nervosismo ao mudar de direção, localizando com ele 05 (cinco) porções de cocaína. Em seguida, o acusado declarou que havia drogas em sua residência e, em busca domiciliar, foram encontradas uma porção de cocaína, uma porção de “maconha”, frascos contendo líquido incolor volátil e uma balança de precisão. Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 12/21 Calha salientar, ainda, acerca da validade do depoimento dos policiais que participaram da diligência, uma vez que tomado sob o crivo do contraditório e mediante compromisso legal, merece inteira credibilidade, mostrando-se idôneo a embasar um decreto condenatório, mormente se harmônico com os demais elementos probatórios. Em razão disso, não havendo nos autos elementos de que os agentes tenham mentido ou que exista fundado motivo para tanto, não há que se cogitar acerca da inviabilidade de seus depoimentos. A propósito, eis o entendimento firmado pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça e Tribunal de Justiça de Goiás: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. NULIDADE. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. FUNDADA SUSPEITA. SÚMULA 7 DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. [...] 3. Os depoimentos dos policiais responsáveis pela prisão em flagrante são idôneos e suficientes para a formação do édito condenatório, quando em harmonia com as demais provas dos autos, e colhidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, como ocorreu na hipótese. [...] 5. Agravo regimental desprovido. (AgRg no AREsp n. 2.503.629/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 16/4/2024, DJe de 19/4/2024.) (ênfase acrescida). APELAÇÃO CRIMINAL. ARTIGO 157, § 2º, INCISOS I E II, DO CÓDIGO PENAL. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS E DAS VÍTIMAS. CREDIBILIDADE. 1 – Os depoimentos prestados por policiais militares são merecedores de credibilidade. São agentes públicos no exercício de suas atribuições, cujos relatos, seguros e harmônicos, constituem elemento probatório apto a dar suporte a uma sentença condenatória. [...]. APELAÇÃO CONHECIDA E DESPROVIDA. PENA REDUZIDA DE OFICIO. SENTENÇA REFORMADA. (TJGO, PROCESSO CRIMINAL -> Recursos -> Apelação Criminal 5314028- 57.2020.8.09.0074, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR JOÃO WALDECK FELIX DE SOUSA, 2ª Câmara Criminal, julgado em 30/05/2023, DJe de 30/05/2023) (ênfase acrescida). Assim, pequenas discrepâncias entre tais relatos, longe de arrefecer a pretensão de que ora se cuida, somente a reforçam, ao demonstrar a naturalidade das testemunhas e seus intuitos de colaborar com a administração da justiça. Nesse particular, não houve significativa incoerência entre os depoimentos dos milicianos a ponto de afastar a participação do denunciado da Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 13/21 empreitada delituosa, posto que as diferenças constatadas em seus depoimentos se referiram a questões periféricas. Demais disso, diante das inúmeras diligências as quais participam os policiais militares, é natural que os detalhes das ocorrências com o decorrer do tempo se dissipem. Desse modo, a Defesa não se desincumbiu do seu ônus probatório, conforme determina o artigo 156 do Código de Processo Penal e tampouco demonstrou a ocorrência de qualquer situação que desmereça ou desabone o trabalho dos policiais. Muito embora o réu tenha aduzido que o flagrante fora forjado, tendo os policiais criado a situação para incriminá-lo falsamente, haja vista que não trazia consigo e tampouco tinha em depósito as substâncias apreendidas, não se produziu qualquer prova a desconstituir a versão acusatória. Logo, não há como conferir credibilidade à versão apresentada pelo réu, mostrando-se, assim, inverossímil, fantasiosa e permeada de inconsistência lógica. Nesse diapasão, transcrevo o escólio de Eugênio Pacelli que assim diz: “E exercido que seja o direito de autodefesa ativa, ou seja, tendo optado o acusado pela manifestação em interrogatório, submetendo-se às perguntas que lhe forem dirigidas, parece-nos irrecusável a conclusão no sentido de que a versão dos fatos por ele apresentada poderá ser livremente valorada pelo juiz, no que se refere à consistência lógica e verossimilhança das alegações, do mesmíssimo modo que ocorre em relação à valoração de qualquer peça defensiva escrita. Não há, obviamente, nenhuma exigência legal de aceitação, pelo juiz, da veracidade do que é alegado pelo acusado. Não há dúvida de que os ônus da prova da ocorrência de um fato criminoso recaem todos sobre a acusação. Mas não menos verdadeira é a conclusão de que a qualidade probatória de determinado meio de prova poderá ser robustecida pela fragilidade ou inconsistência de uma alegação articulada pela defesa”. (In: Curso de Processo Penal. 16ª ed. Atlas: SP, 2012, p. 380) (grifos acrescidos). Nesse contexto, fica claro que os depoimentos dos policiais militares devem prevalecer sobre as inconvincentes explicações do denunciado. Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 14/21 Portanto, a negativa de autoria do réu restou isolada nos autos, sendo que as explicações por ele apresentadas, onde busca se eximir da responsabilidade penal, está em divergência com as demais provas coletadas, não devendo ser valorada na forma alegada, por não encontrar qualquer respaldo probatório. Outrossim, não se pode desconsiderar a quantidade, a variedade e a forma como estavam acondicionadas as substâncias apreendidas – 05 (cinco) porções de material pulverizado esbranquiçado, acondicionadas em plástico incolor, com massa bruta de 4,648g (quatro gramas e seiscentos e quarenta e oito miligramas) e 01 (uma) porção de material petrificado esbranquiçado acondicionada em fita vermelha, com massa bruta de 1,020Kg (um quilograma e vinte gramas e vinte gramas), ambos contendo cocaína; 01 (uma) porção de material vegetal, acondicionada em plástico incolor e fita preta, com massa bruta de 1,065Kg (um quilograma e sessenta e cinco gramas), contendo o princípio ativo Cannabis Sativa L., vulgarmente conhecida por “maconha”; além de 17 (dezessete) frascos de vidro incolor, contendo líquido incolor volátil, com capacidade aproximada de 100 mL (cem mililitros), boca puntiforme e tampa de pressão verde, contendo diclorometano e tricloroetileno, substância de uso humano proibido por via oral ou inalação, conforme Laudos de Perícia Criminal - constatação de drogas (mov. 1, fls. 4/6 e 37/39), Termo de Exibição e Apreensão (mov. 1, fls. 69/71) e Laudos de Perícia Criminal – identificação de drogas e substâncias correlatas (exame definitivo) (mov. 110), constituindo mais do que indícios quanto a finalidade mercantil empregada nas drogas. Somado a isso, houve a apreensão de uma balança de precisão, apetrecho este comumente utilizado para a mercancia de substância entorpecente. Torna-se ainda inviável a desclassificação para o tipo penal definido no artigo 28 da Lei 11.343/2006, posto que ficou evidenciado que o denunciado se dedicava à traficância, além do que, como dito alhures, o uso não exclui a mercancia, podendo perfeitamente coexistirem as duas condutas. Portanto, a meu ver, o contexto probatório não deixa dúvidas quanto à traficância praticada pelo réu, tornando-se inviável acolher o pleito absolutório. Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 15/21 Outrossim, para a caracterização do delito capitulado no artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006, não se exige que o agente seja colhido no ato da venda da droga, bastando que uma de suas condutas se subsuma a um dos verbos- núcleos do tipo penal 2 . Assim sendo, encontra-se o acusado incurso nas sanções previstas no artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006, sendo que restou configurado que sua conduta possui adequação típica na – 11ª figura – ter em depósito – e 13ª figura – trazer consigo –, que se revelam quando o agente mantém à sua disposição a droga, além de possui-la em seu poder (vestimentas), para fins de comercialização. A propósito, seguindo o entendimento compartilhado por alguns penalistas) 3 , à guisa de exemplo, Magalhães Noronha, guardar implica em reter a droga pertencente a terceiro, ao passo que ter em depósito equivaleria em reter a droga que lhe pertence. No entanto, diante da ausência de consenso doutrinário 4 e jurisprudencial quanto à utilização dos referidos verbos-núcleos e, ainda, sendo o artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006, tipo misto alternativo ou de conteúdo variado, certo é que o réu exercia a posse das drogas, já que não há a possibilidade de se manter algo sob tutela sem ter a posse. 2 PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. TRÁFICO DE DROGAS. ABSOLVIÇÃO. INVIABILIDADE. SÚMULA 7/STJ. (...) 4. Consoante jurisprudência desta Corte, o tráfico de drogas é crime de ação múltipla, e, como tal, a prática de um dos verbos contidos no art. 33, caput, da Lei de Drogas, já é suficiente para a consumação da infração, sendo, pois, prescindível a realização de atos de venda do entorpecente (AgRg no AREsp n. 303.213/SP, Ministro Marco Aurélio Bellizze, Quinta Turma, DJe 14/10/2013). 5. Agravo regimental improvido. (STJ, AgRg no AREsp 397.759/SC, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 04/08/2015, DJe 20/08/2015) (ênfase acrescida). 3 GONÇALVES, Victor Eduardo Rios. Crimes Hediondos,Tóxicos, Terrorismo e Tortura. 2ª ed, Saraiva, p. 32. 4 Para Guilherme de Souza Nucci, “ter em depósito” é manter em reservatório ou armazém, enquanto “guardar” significa tomar conta de algo, proteger (In: Leis Penais e Processuais Penais Comentadas, 4ª ed., RT, p. 346); Alexandre de Moraes e Giampaolo Poggio Smanio entendem que “ter em depósito” significa conservar ou reter a coisa a sua disposição e “guardar” corresponde a ter sob vigilância ou cuidado substância entorpecente, de terceira pessoa, ocultando-a (In: Legislação Penal Especial, 8ª ed. Atlas, p. 136); Já para Luiz Flávio Gomes e Rogério Sanches Cunha “ter em depósito” é a posse protegida e “guardar” é tomar conta, zelar para terceiro (In: Legislação Criminal Especial, RT, p. 196). Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 16/21 De outra parte, o artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006 é classificado como crime de ação múltipla ou de conteúdo variado, ou seja, ainda que mais de um verbo-núcleo do tipo seja praticado, desde que estejam no mesmo contexto fático ou realizados sucessivamente, haverá uma única infração penal, não se falando em concurso de crimes. Dessa maneira, não obstante a incidência das diversas condutas típicas ocorreu um só delito de tráfico, devendo a pluralidade de verbos efetivamente praticados ser considerada no momento da fixação da pena, nos termos do artigo 59 do Código Penal. Noutro vértice, o crime exige dois elementos normativos que estão contidos nas expressões, “sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar”, que por sua vez também ficaram demonstrados, haja vista que o acusado não possuía autorização emanada por autoridade competente para manter em seu poder as substâncias entorpecentes. Registre-se, outrossim, que o réu tinha plena ciência da ilicitude de seus atos, pois agiu com consciência e vontade de realizar o tipo penal, evidenciado pelo animus de obtenção de lucro fácil com a comercialização da droga. Em arremate, não havendo dúvidas quanto à tipicidade da conduta praticada pelo acusado e, ainda, inexistindo qualquer excludente de ilicitude ou culpabilidade a seu favor, deve ser ele responsabilizado criminalmente. DO DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva, para condenar o réu LUCAS GABRIEL MARTINS CAVALCANTE, devidamente qualificado, como incurso nas sanções do artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006, passando a dosar as penas a ser-lhes aplicadas nos moldes do disposto no artigo 68 do Código Penal. Pois bem. Analisadas as diretrizes do artigo 59 do Código Penal, observo que o réu agiu com desprezo frente ao bem jurídico tutelado, além do que ela poderia ter escolhido por não trilhar na senda do crime, evidenciando-se em seu Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 17/21 modo de agir, normal grau de culpabilidade; ostenta maus antecedentes, pois possui pelo menos duas condenações penais definitivas, sendo nesta fase utilizada a proveniente dos autos de ação penal nº 0043493-05.2016.8.09.0175, perante a 5ª Vara Criminal de Goiânia, com trânsito em julgado em 07.11.2017 (mov. 92) e a remanescente como agravante da reincidência 5 ; à falta de dados desabonadores, considero normal a conduta social do réu; sem elementos para aferir sua personalidade; o motivo do delito já é punido pela própria tipicidade; as circunstâncias lhes são desfavoráveis, por ter incorrido em mais de um verbo do núcleo do tipo penal, isto é, trazer consigo e manter em depósito substâncias ilícitas, bem como a apreensão de apetrechos utilizados na mercancia, como balança de precisão 6 , sendo necessário um maior desvalor das condutas perpetradas; as consequências são desconhecidas, por não se possuir parâmetros a respeito da quantidade de pessoas atingidas; não se pode cogitar acerca do comportamento da vítima. Destarte, à vista de tais circunstâncias judiciais e da valoração negativa de antecedentes e circunstâncias e, ainda, em atenção ao disposto no artigo 42, da Lei 11.343/2006, considerando a natureza, a quantidade e a variedade das substâncias apreendias (“maconha”, cocaína e lança perfume), fixo a pena- base em 06 (seis) anos e 03 (três) meses de reclusão e 620 (seiscentos e vinte) dias-multa. 5 Súmula 241 do STJ: “A reincidência penal não pode ser considerada como circunstância agravante e, simultaneamente, como circunstância judicial”. 6 Os apetrechos destinados à comercialização de entorpecentes ensejam um maior desvalor da conduta, impondo- se que a reprimenda seja elevada. Neste sentido: APELAÇAO CRIMINAL - SENTENÇA CONDENATÓRIA - IRRESIGNAÇAO DEFENSIVA - TRÁFICO DE DROGAS - DOSIMETRIA - FIXAÇAO DA PENA- BASE NO MÍNIMO LEGAL - DESCABIMENTO - PRISÃO EM FLAGRANTE - APREENSAO DE EXPRESSIVA QUANTIDADE DE DROGA E APETRECHOS - INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 42 DA LEI Nº 11.343/06 - CONFISSAO ESPONTÂNEA - RECONHECIMENTO - BENESSES DO ARTIGO 65, III, ALÍNEA D, DO CPB - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1) No caso, a natureza e a expressiva quantidade da droga apreendida em poder do apelante, bem como a apreensão de apetrechos, justificam a fixação da pena-base acima do mínimo legal, tudo com fulcro no art. 42 da Lei de Tóxicos, que elege tais circunstâncias preponderantes sobre as estatuídas no art. 59 do CPB, por traduzir risco mais acentuado à saúde e a incolumidade pública. (...) (TJ-ES - ACR: 35090153020 ES 35090153020, Relator: CATHARINA MARIA NOVAES BARCELLOS, Data de Julgamento: 29/02/2012, PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 09/03/2012) (ênfase acrescida). Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 18/21 Inexistem circunstâncias atenuantes 7 , porém milita em desfavor do acusado a agravante da reincidência (CP, art. 61, I), em face da condenação definitiva sofrida nos autos nº 0000184-60.2018.8.09.0175, perante a 5ª Vara Criminal de Goiânia, cujo trânsito em julgado ocorreu em 11.02.2019 (mov. 92), razão pela qual elevo a pena provisória para 06 (seis) anos e 09 (nove) meses de reclusão e 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa. Por sua vez, diante da reincidência do acusado, deixo de aplicar a causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, § 4º, da Lei 11.343/2006, mantendo a pena em 06 (seis) anos e 09 (nove) meses de reclusão e 680 (seiscentos e oitenta) dias-multa, tornando-a definitiva à míngua de outras causas modificadoras. A pena de multa deve ser fixada proporcionalmente à pena privativa de liberdade, submetendo-se igualmente ao critério trifásico do artigo 68 do Código Penal. Para cada dia-multa, arbitro o valor equivalente de 1/30 (um trinta avos) do salário-mínimo vigente na época do fato criminoso, determinando-se, ainda, que a importância apurada seja atualizada quando da execução, na forma do artigo 49, § 2º, do Código Penal. No tocante ao regime inicial para o cumprimento da pena, o Supremo Tribunal Federal em julgamento do Habeas Corpus nº 11.1840, no dia 27 de junho de 2012, declarou incidentalmente a inconstitucionalidade do § 1º do artigo 2º da Lei 8.072/90, passando, assim, a admitir a imposição de regime diverso do fechado para os condenados pela prática de crimes hediondos e equiparados, considerando que o máximo da pena não exceda a 08 (oito) anos, a ausência de circunstâncias judiciais desfavoráveis e a inocorrência de reincidência. 7 Confira o teor da Súmula 630 do STJ: “A incidência da atenuante da confissão espontânea no crime de tráfico ilícito de entorpecentes exige o reconhecimento da traficância pelo acusado, não bastando a mera admissão da posse ou propriedade para uso próprio” Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 19/21 Desse modo, o regime inicial para o cumprimento da pena privativa de liberdade imposta é o FECHADO, tendo em vista o quantum da pena imposta e a reincidência do réu 8 , nos termos do artigo 33, caput e § 2.º, alínea b, e § 3º, do Código Penal. Nos termos do artigo 387, § 2º, do Código de Processo Penal, não obstante o tempo de prisão provisória cumprido, a detração para o fim de determinar o regime inicial de cumprimento da pena em nada alteraria aquele já imposto. Outrossim, não estando presentes os requisitos do artigo 44 do Código Penal, deixo de proceder à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito, bem como à suspensão condicional da pena, nos termos do artigo 77 e seguintes do Código Penal. Em face do quantum de pena aplicada e o regime imposto para o cumprimento da reprimenda, nego o direito de recorrer em liberdade ao acusado, por acreditar que presentes se encontram os pressupostos da prisão preventiva, sendo necessária a restrição de sua liberdade para garantia da ordem pública, notadamente pela reiteração na prática de delitos. Ademais, declaro perdidos os objetos que não forem reclamados por terceiro de boa-fé, em favor da União, nos termos do artigo 63 da Lei 11.343/2006. Oficie-se ao Depósito Público solicitando a destruição dos bens vinculados a este processo (Termo de Depósito – fl. 387), mediante lavratura do termo próprio. Deixo de fixar valor mínimo a título de indenização (CPP, art. 387, IV), diante da ausência de apuração de prejuízo material e, ainda, por me filiar ao 8 Súmula 269STJ: “É admissível a adoção do regime prisional semiaberto aos reincidentes condenados a pena igual ou inferior a 4 (quatro) anos se favoráveis as circunstâncias judiciais”. Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 20/21 entendimento de que o dano moral coletivo não possua aplicabilidade na esfera penal 9 . Condeno, ainda, o acusado ao pagamento das custas processuais, nos termos do artigo 804, do Código de Processo Penal. Expeça-se guia de execução provisória ou definitiva, conforme o caso. Oportunamente, após o trânsito em julgado desta sentença, tomem- se as seguintes providências: a) Proceda-se ao recolhimento do valor atribuído a título de pena pecuniária, em conformidade com o disposto no artigo 50 do Código Penal e artigo 686 do Código de Processo Penal; b) Comunique-se ao Egrégio Tribunal Regional Eleitoral deste Estado acerca da condenação do réu, para cumprimento da suspensão de seus direitos políticos, nos termos do artigo 15, inciso III, da Constituição Federal; c) Encaminhem-se as substâncias entorpecentes apreendidas para o órgão competente do Ministério da Saúde ou congênere estadual a fim de que sejam destruídas, inclusive as amostras guardadas para contraprova, consoante determinação do artigo 72, da Lei 11.343/2006; d) Remeta-se ao FUNAD a relação dos bens, direitos e valores (cf. Termo de Depósito de fl. 332) declarados perdidos em favor da União, observando as demais determinações constantes do artigo 63, §§ 4º e 4ºA, da Lei 11.343/2006; e) Promovam-se as comunicações de estilo. 9 APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. (…) EXCLUSÃO DA INDENIZAÇÃO PARA REPARAÇÃO MÍNIMA DO DANO CAUSADO. VIABILIDADE. 6) O dano moral coletivo não tem aplicabilidade na esfera penal, tendo em vista a impossibilidade de se limitar os prejuízos sofridos pela vítima que, no caso, é a sociedade. O dever de indenizar, na seara penal, limita-se aos prejuízos sofridos pela vítima certa e definida, que não é o caso dos autos. APELO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO PARA EXCLUIR A INDENIZAÇÃO FIXADA. (TJGO, APELACAO CRIMINAL 303601- 79.2016.8.09.0154, Rel. DR(A). ATILA NAVES AMARAL, 1A CAMARA CRIMINAL, julgado em 23/01/2020, DJe 2927 de 10/02/2020) (ênfase acrescida). . Comarca de Goiânia 2ª Vara Criminal reclusão e detenção 21/21 Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Após o trânsito em julgado, arquivem-se com as cautelas de estilo. Cumpra-se. Goiânia, 22 de abril de 2025. (assinado digitalmente) Franciely Vicentini Herradon Juíza de Direito
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