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Processo nº 0026989-69.2014.8.11.0002

ID: 259402031

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0026989-69.2014.8.11.0002

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

MUNICÍPIO DE VÁRZEA GRANDE

Polo Passivo:

Decisão

Advogados:

KASSIA RABELO SILVA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

MAURICIO MAGALHAES FARIA NETO

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Gabinete 2 - Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo Gabinete 2 - Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo APELAÇÃO CÍVEL (198) 0… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Gabinete 2 - Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo Gabinete 2 - Terceira Câmara de Direito Público e Coletivo APELAÇÃO CÍVEL (198) 0026989-69.2014.8.11.0002 APELANTE: MUNICÍPIO DE VÁRZEA GRANDE APELADO: ADEMAR PAULO KUHN Trata-se de recurso de apelação cível interposto pela DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO e MUNICÍPIO DE VÁRZEA GRANDE contra a sentença proferida pelo juízo da 3ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Várzea Grande, na execução fiscal ajuizada em desfavor de ADEMAR PAULO KUHN, que extinguiu o processo, sem resolução do mérito, pela ausência de interesse processual, nos termos do artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil, com fundamento no Tema 1.184 fixado do STF e na Resolução nº. 547 do CNJ, em razão de débito fiscal ser inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais). Apelação da Defensoria Pública – Id. 277146888 A Defensoria Pública sustenta que, com base na autonomia conferida pelas Emendas Constitucionais nº 45/2004, nº 73/2013 e nº 80/2014, tem direito à percepção de honorários sucumbenciais, mesmo quando litiga contra o ente federativo ao qual está vinculada. Ressalta que essa prerrogativa foi reconhecida pelo STF no julgamento da AR 1937 AgR (2017) e reafirmada no Tema 1.002 de repercussão geral. Por fim, requer o provimento do recurso para condenar o Município ao pagamento de honorários advocatícios. Ausente as contrarrazões. Apelação do Município de Várzea Grande – Id. 277146890 O Município, por sua vez, argumenta que a definição de “baixo valor” deve seguir legislação municipal específica, e que o Tema 1.184 do STF não se aplica automaticamente a toda e qualquer execução fiscal. Sustenta que, na ausência de definição do que constitui “baixo valor” por parte do STF, cabe ao ente municipal estabelecer esse parâmetro, sob pena de violação de sua competência tributária. Afirma ainda que o ajuizamento, sobrestamento ou extinção da execução fiscal exige autorização do ente competente. Ao final, requer o provimento do recurso para reforma da sentença e retomada do curso da execução fiscal. A Defensoria Pública apresentou contrarrazões, pugnando pelo não provimento do recurso (Id. 277146892). Desnecessária a intervenção ministerial, nos termos da Súmula nº. 189 do STJ. É o relatório. Decido. A propositura da execução fiscal, em 12/12/2014, decorreu do não recolhimento do Imposto sobre a Propriedade Territorial e Urbana (IPTU), cujo valor, extraído da certidão de dívida ativa nº 8338/2014 (Id. 277146851), perfaz o total de R$ 2.987,96 (dois mil novecentos e oitenta e sete reais e noventa e seis centavos). Este valor é manifestamente inferior ao quantum estabelecido pelo artigo 1º, § 1º, da Resolução nº 547, de 22 de fevereiro de 2024, do Conselho Nacional de Justiça, qual seja, R$ 10.000,00 (dez mil reais), que dispõe: “Art. 1º É legítima a extinção de execução fiscal de baixo valor pela ausência de interesse de agir, tendo em vista o princípio constitucional da eficiência administrativa, respeitada a competência constitucional de cada ente federado. § 1º Deverão ser extintas as execuções fiscais de valor inferior a R$ 10.000,00 (dez mil reais) quando do ajuizamento, em que não haja movimentação útil há mais de um ano sem citação do executado ou, ainda que citado, não tenham sido localizados bens penhoráveis. [...]. Cabível, portanto, a adoção das diretrizes firmadas pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário 1355208/SC, com repercussão geral (Tema nº 1184): “1. É legítima a extinção de execução fiscal de baixo valor pela ausência de interesse de agir tendo em vista o princípio constitucional da eficiência administrativa, respeitada a competência constitucional de cada ente federado. 2. O ajuizamento da execução fiscal dependerá da prévia adoção das seguintes providências: a) tentativa de conciliação ou adoção de solução administrativa; e, b) protesto do título, salvo por motivo de eficiência administrativa, comprovando-se a inadequação da medida. 3. O trâmite de ações de execução fiscal não impede os entes federados de pedirem a suspensão do processo para a adoção das medidas previstas no item 2, devendo, nesse caso, o juiz ser comunicado do prazo para as providências cabíveis.” (STF, RE 1355208/SC – repercussão geral, relatora Ministra Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, j. 19.12.2023). [grifo nosso] Quanto à alegação de inaplicabilidade da tese às execuções já em curso, o próprio acórdão do Recurso Extraordinário esclareceu expressamente esta questão: [...] O Senhor Ministro André Mendonça: [...] Senhor Presidente, plenamente de acordo, apenas peço um esclarecimento: na leitura do item 3, seria ‘não impede’ ou ‘impede’? O Senhor Ministro Luís Roberto Barroso (Presidente): O trâmite de ações de execução fiscal não impede. A proposta da eminente Ministra Cármen é que as que já estão em curso podem sofrer a incidência do item 2. O Senhor Ministro André Mendonça: Agradeço, Senhor Presidente. [...]. (STF, trecho do acórdão do RE 1355208/SC – repercussão geral, relatora Ministra Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, j. 19.12.2023). [grifo nosso] Ainda que o apelante mencione a possibilidade de negociação prevista na Lei Municipal nº 5.200/2023, não há nos autos qualquer prova de que o contribuinte, ora apelado, tenha sido previamente notificado ou instado a quitar ou parcelar o débito antes do ajuizamento da execução fiscal. A mera existência de previsão normativa autorizadora de parcelamento, desacompanhada da efetiva demonstração de tentativa concreta de cobrança administrativa, não supre o requisito previsto no § 1º do artigo 2º da Resolução nº 547, de 22 de fevereiro de 2024, do Conselho Nacional de Justiça, tampouco atende à diretriz vinculante firmada pelo Supremo Tribunal Federal no Tema nº 1184. Além disso, nada obstante tenha mencionado que a certidão de dívida ativa nº 8338/2014, objeto da execução fiscal, foi devidamente protestada, apresentou somente um extrato intitulado como “Título”, no qual constam informações diversas da certidão de dívida ativa (Id. 277146885). O referido documento, embora registre o encaminhamento ao 2º Ofício, não comprova a efetivação do protesto extrajudicial, nos termos do artigo 1º da Lei nº 9.492, de 10 de setembro de 1997, que dispõe: “Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida.”. Cumpre destacar que, ainda que esse procedimento represente etapa preparatória, não se confunde com a lavratura formal do protesto em cartório. Nesse sentido, as Câmaras de Direito Público e Coletivo deste Tribunal já se pronunciou: AC 1011022-03.2024.8.11.0006, relatora Desembargadora Maria Erotides Kneip, 1ª Câmara de Direito Público e Coletivo, j. 22.1.2025; AC 1006541-94.2024.8.11.0006, relatora Desembargadora Anglizey Solivan de Oliveira, 2ª Câmara de Direito Público e Coletivo, j. 17.10.2024; AC 1017425-31.2023.8.11.0003, relator Desembargador Márcio Vidal, 3ª Câmara de Direito Público e Coletivo, j. 31.3.2025. Dessa forma, mostra-se correta a sentença que extinguiu o processo, sem resolução do mérito, nos termos do artigo 485, IV, do Código de Processo Civil, em razão da ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo (Id. 277146886). Assim, o recurso contraria acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal em sede de repercussão geral, o que possibilita a prolação de decisão monocrática. Quanto ao recurso da Defensoria Pública, não há razão para reforma da sentença. Embora o STF tenha firmado, no Tema 1002, o direito da Defensoria Pública à percepção de honorários quando atua em favor da parte vencedora, tal entendimento não se aplica ao caso em análise. Isso porque não houve parte vencedora: a execução fiscal foi extinta com base em tese de repercussão geral (Tema 1184), sem julgamento de mérito. Vale destacar que a atuação da Defensoria como curadora especial, embora relevante, não configura sucumbência da Fazenda Pública. Ademais, à luz do princípio da causalidade, não se pode impor ônus ao ente público que, ao propor a execução, agiu conforme os parâmetros legais então vigentes. Portanto, ausentes os pressupostos da sucumbência, revela-se incabível a fixação de honorários advocatícios. Nesse sentido: “DIREITO ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. EXTINÇÃO DE EXECUÇÃO FISCAL. HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS DA DEFENSORIA PÚBLICA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSO DESPROVIDO. (...) IV. Dispositivo e tese 5. Recurso desprovido, mantendo-se a sentença que extinguiu o processo sem resolução de mérito, sem fixação de honorários. Tese de julgamento:1. A extinção de execução fiscal de baixo valor, fundada em repercussão geral, não gera direito a honorários sucumbenciais para a Defensoria Pública em face do princípio da causalidade. 2. Inexistindo parte vencedora e sem condenação específica, afasta-se a aplicação do conceito de sucumbência.”. Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 485, VI. Resolução CNJ n.º 547/2024. Jurisprudência relevante citada: STF, Tema 1002, RE 1140005 RJ, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 26.06.2023; STF, Tema 1184.” (N.U 1013731-57.2023.8.11.0002, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, JOSE LUIZ LEITE LINDOTE, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 27/11/2024, Publicado no DJE 04/12/2024) Ante o exposto, com fundamento no artigo 932, IV, b, do Código de Processo Civil, e artigo 51, I-C, b, do Regimento Interno deste Tribunal, NEGO PROVIMENTO aos recursos pelos fundamentos acima expostos. Cuiabá/MT, data registrada no sistema. Marcos Aurélio dos Reis Ferreira Juiz de Direito em Substituição Legal

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Processo nº 1007315-53.2023.8.11.0041

ID: 316718183

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1007315-53.2023.8.11.0041

Data de Disponibilização: 04/07/2025

Polo Ativo:

ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

EDUARDO QUEIROGA ESTRELA MAIA PAIVA

OAB/PB XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1007315-53.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Da… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1007315-53.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material, Fornecimento de Energia Elétrica] Relator: Des(a). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). TATIANE COLOMBO] Parte(s): [LUCIVANIA BOMDESPACHO DE ALMEIDA ARRUDA - CPF: 016.810.831-32 (APELADO), MARIA APARECIDA DA CRUZ OLIVEIRA ARAUJO - CPF: 485.487.906-87 (ADVOGADO), RODRIGO PEREIRA DOS SANTOS - CPF: 023.842.019-13 (ADVOGADO), ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A - CNPJ: 03.467.321/0001-99 (APELANTE), EDUARDO QUEIROGA ESTRELA MAIA PAIVA - CPF: 078.165.854-38 (ADVOGADO), RODRIGO DIAS DE LIMA NOBREGA - CPF: 044.256.194-63 (ADVOGADO), JOSIELE ALVINA SCHEREDER DE SOUZA - CPF: 012.362.422-38 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A DIREITO DO CONSUMIDOR E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. COBRANÇA INDEVIDA DE CONSUMO DE ENERGIA ELÉTRICA. AUSÊNCIA DE TOI. VALORES DISTOANTES DA MÉDIA HISTÓRICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA. DANO MORAL CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Apelação cível interposta pela concessionária de energia elétrica contra sentença que reconheceu a inexigibilidade de fatura com valores excessivos e destoantes da média histórica, referente ao mês de dezembro/2022, e fixou indenização por danos morais à consumidora, diante da ausência de prova da regularidade do faturamento e da ameaça de suspensão do fornecimento. II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se a concessionária comprovou a legalidade da cobrança de faturas de energia com valores elevados e em duplicidade, sem emissão de Termo de Ocorrência e Inspeção – TOI; (ii) saber se a cobrança indevida, aliada à ameaça de interrupção do fornecimento, enseja a reparação por danos morais. III. Razões de decidir 3. A relação entre as partes é regida pelo CDC, sendo aplicável a inversão do ônus da prova em favor do consumidor. 4. A ausência de TOI e de demonstração técnica da regularidade do faturamento compromete a legitimidade da cobrança impugnada. 5. A concessionária não se desincumbiu do ônus de comprovar a correção da cobrança, limitando-se a alegações genéricas e documentos unilaterais. 6. A ameaça de interrupção do fornecimento de serviço essencial, diante de cobrança manifestamente indevida, ultrapassa o mero aborrecimento, configurando dano moral indenizável. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso desprovido. Tese de julgamento: "1. A concessionária de energia elétrica deve comprovar, mediante prova técnica idônea, a regularidade de cobrança com valores destoantes da média de consumo, especialmente na ausência de Termo de Ocorrência e Inspeção – TOI. 2. A cobrança indevida de valor elevado, com ameaça de suspensão do fornecimento, configura ato ilícito que enseja reparação por dano moral." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, § 6º; CDC, arts. 6º, VIII, e 14, § 3º; CPC, art. 373, II. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.412.433/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª Turma, j. 12.11.2014; TJMT, Apelação Cível nº 1000102-41.2018.8.11.0018, Rel. Des. Sebastião Barbosa Farias, j. 17.05.2022. R E L A T Ó R I O Recurso de APELAÇÃO CÍVEL interposto por ENERGISA MATO GROSSO – DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S/A, contra a r. sentença proferida pelo Juízo de Direito da 5ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, que nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Danos Morais, ajuizada por LUCIVANIA BOMDESPACHO DE ALMEIDA ARRUDA, JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados em inicial, para declarar inexigível a recuperação de consumo no valor de R$ 1.058,59 (id.110944815) e CONDENAR a ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), acrescidos de juros de mora de 1% ao mês e correção monetária pelo INPC a partir da sentença (Súmula 362-STJ). Condenou a ré ao pagamento das custas e despesas processuais, além de honorários advocatícios de sucumbência que fixou em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, nos termos dos artigos 82, §2º e 85, §2º, ambos do CPC. Em síntese, a apelante requer o provimento do recurso de apelação e a consequente reforma da sentença alegando que o juízo de origem cometeu um grande equívoco ao fundamentar sua decisão sob a alegação de que a cobrança da fatura objeto da demanda se trata de recuperação de consumo, aduzindo, que “conforme foi demonstrado em sede de contestação, o valor da fatura do mês de dezembro de 2022, não se trata de recuperação de consumo, não precisando da lavratura do Termo de Ocorrência e Inspeção, nos termos da Resolução da ANEEL”. Menciona que “quanto ao questionamento da fatura do mês de dezembro/2022, cumpre estabelecer que não o foi identificado qualquer erro em tal procedimento, uma vez que de acordo com o Histórico de Consumo, a leitura da medição ocorreu de forma regular”. Frisa que “em meses posteriores, verifica-se que o consumo sofre alteração es nos mesmos moldes dos meses reclamados, o que indica que há uma variação o de consumo em determinados meses”. Ressalta que no início de 2022, a Agência Nacional de Energia Elétrica – Aneel aprovou o reajuste anual da tarifa da Energisa Mato Grosso em 20,36% para clientes residenciais e 22,55% na média de todas as categorias além dos tributos cobrados na fatura de energia elétrica (PIS, COFINS, ICMS, Bandeiras tarifaria, CIP, juros, multas, correções monetárias) que impactam sensivelmente no valor final da fatura. Alega inexistência de equívoco na medição e na cobrança de modo que não há que se falar em qualquer ato ilícito praticado pela Apelante. Informa que “foi aberto ordem de serviço para realização de TESTE NO MEDIDOR na unidade consumidora da parte Apelada, e não foram evidenciados nenhuma anomalia no sistema medição, interligação e/ou fraude até o ponto de entrega, onde e de responsabilidade da distribuidora, sendo confirmado a progressão no registro do consumo no medidor, comprovando a energia consumida pela unidade em questão”. Defende a presunção de veracidade das faturas de energia elétrica enviadas e da inexistência de dano moral argumentando a inexistência de ato ilícito praticado pela Apelante, esclarecendo que “no caso em tela, não houve sequer cobrança, suspensão no fornecimento de energia ou inscrição da Apelada nos órgãos de proteção ao crédito”. Requer que o recurso seja conhecido e provido o presente recurso para que seja a demanda julgada totalmente improcedente. Contrarrazões (Num. 269358771). É o relatório. V O T O R E L A T O R O direito pleiteado por LUCIVANIA BOMDESPACHO DE ALMEIDA ARRUDA resultou do recebimento de cobrança indevida de fatura compreendendo o mês de dez/2022 com vencimento em 09/01/2023 no valor de R$ 1.058,59 e, posteriormente, ao recebimento da fatura no valor de R$ 676,36 também referente ao mês de dez/2022 com vencimento em 25/01/2023, relativos ao consumo de energia elétrica registrados na UC n.6/3897913/4 que não representam a efetiva utilização em sua residência. O juízo singular decidiu pela parcial procedência do feito (Num. 269062297). A controvérsia cinge-se à legalidade da cobrança questionada e à caracterização do dano moral, sob a alegação da concessionária de que o valor lançado não constitui “recuperação de consumo” e que, portanto, prescindiria da lavratura de Termo de Ocorrência e Inspeção – TOI. Pois bem. Prefacialmente importa destacar que a relação existente entre as partes aqui em litígio é de consumo, devendo, ao caso, ser aplicada regras dispostas no Código de Defesa do Consumidor, inclusive com a inversão do ônus da prova previsto no inciso VIII do artigo 6.º do código consumerista. Ainda, nos termos do art. 14, § 3º, do CDC, O fornecedor de serviços só não será responsabilizado por eventuais prejuízos causados ao consumidor quando provar que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste e que a culpa é exclusiva do consumidor ou de terceiros. Partindo dessa premissa, deveria a concessionária de energia ré demonstrar por meio de provas hábeis, a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, nos termos do inciso II do artigo 373 do Código de Processo Civil, o que não ocorreu no caso em tela. Nesse ponto, empresa apelante é prestadora de serviço público de energia. Nessa condição, responde de forma objetiva pelos danos causados a seus usuários decorrentes dos serviços prestados nos termos do disposto no art. 37, § 6º, da Constituição Federal: As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. Ademais, é necessário registrar que, segundo entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça no REsp nº 1.412.433/RS, submetido ao rito dos recursos repetitivos, embora a tese envolva corte do fornecimento de energia, entendeu, que, a caracterização de recuperação de consumo depende de constatação técnica e formal, com observância do contraditório, por meio do TOI, devidamente fundamentado e entregue ao consumidor; de modo que a ausência desse procedimento compromete a higidez da cobrança que extrapole o histórico de consumo da unidade. No caso concreto, conforme pontuado na sentença recorrida, não há nos autos prova da existência do TOI, tampouco da observância do devido processo administrativo para reclassificação do débito como de recuperação de consumo, de modo a garantir ao consumidor a possibilidade de impugnação. A empresa recorrente, embora alegue que a cobrança tem origem distinta, não comprovou cabalmente sua natureza ordinária. Além disso, a parte autora insurge quanto ao recebimento da fatura referente ao mês de Dezembro/2022 com vencimento em 09/01/2023 no valor de R$ 1.058,59 e, logo após, ao recebimento da fatura de outra fatura também com referência ao mês de Dezembro/2022, vencimento em 25/01/2023 no valor de R$ 676,36, razão pela qual buscou solução pela via administrativa junto a concessionária ré, conforme protocolos de atendimento informados na inicial (Protocolo nº 87872317 datado de 12/01/2023 e Protocolo nº 87441411, datado de 02/02/2023 (id. 269062261 – Pág.2), quais não restaram impugnados pela concessionária apelante. A simples afirmação de que a leitura se deu de forma regular, associada ao fato de que a cobrança se deu de maneira substancialmente superior ao histórico médio da unidade consumidora, exige que a empresa distribuidora demonstre, com provas robustas e técnicas, a correspondência do valor com o efetivo consumo. Nesse ponto, a jurisprudência deste Egrégio Tribunal é firme no sentido de que a inversão do ônus da prova, autorizada pelo CDC, impõe à fornecedora o dever de comprovar a legitimidade da cobrança impugnada, não bastando alegações genéricas. Vejamos: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO COMBINADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - VALOR DE FATURA DESTOANTE DA MÉDIA DE CONSUMO - FATURA CONTESTADA - NÃO COMPROVAÇÃO DA LEGITIMIDADE DA COBRANÇA - REFATURAMENTO - NECESSIDADE DE REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO PROVIDO. 1. Se a fatura impugnada pela consumidora possui valor exorbitante e destoante da média de consumo, e não havendo nos autos elementos hábeis a justificar a cobrança, deve o valor da fatura ser adequado à média apurada. 2. A elevação do consumo de energia elétrica, sem fator que a justifique e em valor exorbitante, enseja a revisão do valor constante da fatura discutida. 3. Apesar de a concessionária ré alegar que a cobrança é devida, não apresenta qualquer documento apto a comprovar suas alegações, se limitando a trazer documentos unilaterais oriundos do seu sistema interno. (N.U 1000102-41.2018.8.11.0018, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 17/05/2022, Publicado no DJE 18/05/2022) DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. COBRANÇA ABUSIVA DE ENERGIA ELÉTRICA. INEXISTÊNCIA DE PROVA DA REGULARIDADE DO FATURAMENTO. CORTE INDEVIDO DO FORNECIMENTO. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta contra sentença que declarou a inexigibilidade de fatura de consumo, determinando a adequação ao histórico de consumo da autora e condenando a empresa ao pagamento de indenização por dano moral, no valor de R$ 4.000,00. A autora alegou consumo médio baixo e questionou faturas de outubro e novembro de 2023, com valores significativamente superiores à sua média histórica. Requereu revisão dos valores e indenização pelo corte indevido do fornecimento. A sentença considerou que a concessionária não comprovou a regularidade do faturamento impugnado e que o corte de energia, mesmo após contestação administrativa e intervenção do Procon, configurou ato ilícito passível de indenização. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em saber se a cobrança excessiva de energia elétrica, sem comprovação de regularidade pela concessionária, e o corte indevido do fornecimento justificam a declaração de inexistência do débito e a condenação por dano moral. III. RAZÕES DE DECIDIR O histórico de consumo da unidade consumidora demonstra que os valores cobrados nas faturas impugnadas destoam significativamente da média anterior, sem justificativa plausível. A concessionária não se desincumbiu do ônus de demonstrar a regularidade das cobranças, tampouco requereu a realização de perícia técnica para comprovar a legitimidade dos valores faturados. A interrupção do fornecimento, mesmo diante da contestação do débito e da atuação do Procon, caracteriza abuso por parte da concessionária e configura ato ilícito indenizável, nos termos do CDC e do CC. O valor arbitrado a título de indenização por dano moral (R$ 4.000,00) encontra-se dentro dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando os transtornos causados à consumidora. IV. DISPOSITIVO E TESE Apelação cível conhecida e desprovida. Tese de julgamento: “A concessionária de energia elétrica deve comprovar a regularidade do faturamento questionado pelo consumidor, sob pena de revisão dos valores. O corte indevido do fornecimento de energia, sem oportunizar a resolução administrativa da controvérsia, caracteriza ato ilícito passível de indenização por dano moral.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CDC, arts. 6º, VIII, e 42; CC, art. 927; CPC, art. 373, II. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.412.705/SC, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª Turma, j. 14.10.2014; STJ, AgInt no AREsp 1.761.643/MG, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª Turma, j. 06.09.2021. (N.U 1006541-10.2023.8.11.0013, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 05/03/2025, Publicado no DJE 09/03/2025) A ordem de serviço mencionada no recurso não se mostrou suficiente para comprovar com segurança e robustez a inexistência de erro no sistema de medição ou de anomalias técnicas capazes de justificar o valor impugnado. Assim, deixando a ré de cumprir com seus ônus probatórios imposto pelo inciso II do artigo 373 do Código de Processo Civil, presume-se como verdadeiros os fatos alegados pela parte autora e consumidora, motivo pelo qual resta indevido o débito a esta imputado, eis que destoante de sua média de consumo sem qualquer justificativa plausível. No tocante ao dano moral, a jurisprudência pacífica do STJ reconhece que a cobrança indevida de valores, por si só, não configura abalo moral indenizável, salvo quando acompanhada de elementos agravantes, como interrupção do serviço, inscrição em órgãos de proteção ao crédito ou conduta vexatória. No entanto, o caso dos autos apresenta singularidade relevante, qual seja, a ameaça de suspensão do fornecimento de energia e a insegurança causada pela cobrança indevida de valor elevado e sem prévia justificativa técnica, o que, a toda evidência, ultrapassa o mero aborrecimento cotidiano. Trata-se de serviço essencial, cuja falha na prestação reverbera diretamente na dignidade da pessoa humana e no mínimo existencial, o que justifica a indenização fixada, a qual, ademais, mostra-se razoável e proporcional à extensão do dano experimentado, considerando-se a ausência de prova em sentido contrário. Diante do exposto, cotejados os elementos trazidos ao feito, nada se encontra passível de reforma. Mantida a sentença singular em todos os seus termos. Em conformidade com o art. 85, § 11º do CPC, majoro os honorários determinados pelo juízo a quo para 15% (quinze por cento). Com estas considerações DESPROVEJO o recurso. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025

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Processo nº 1007315-53.2023.8.11.0041

ID: 316718208

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1007315-53.2023.8.11.0041

Data de Disponibilização: 04/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

LUCIVANIA BOMDESPACHO DE ALMEIDA ARRUDA

Acórdão

Advogados:

MARIA APARECIDA DA CRUZ OLIVEIRA ARAUJO

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RODRIGO PEREIRA DOS SANTOS

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1007315-53.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Da… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1007315-53.2023.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material, Fornecimento de Energia Elétrica] Relator: Des(a). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS Turma Julgadora: [DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). TATIANE COLOMBO] Parte(s): [LUCIVANIA BOMDESPACHO DE ALMEIDA ARRUDA - CPF: 016.810.831-32 (APELADO), MARIA APARECIDA DA CRUZ OLIVEIRA ARAUJO - CPF: 485.487.906-87 (ADVOGADO), RODRIGO PEREIRA DOS SANTOS - CPF: 023.842.019-13 (ADVOGADO), ENERGISA MATO GROSSO DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S.A - CNPJ: 03.467.321/0001-99 (APELANTE), EDUARDO QUEIROGA ESTRELA MAIA PAIVA - CPF: 078.165.854-38 (ADVOGADO), RODRIGO DIAS DE LIMA NOBREGA - CPF: 044.256.194-63 (ADVOGADO), JOSIELE ALVINA SCHEREDER DE SOUZA - CPF: 012.362.422-38 (ADVOGADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A DIREITO DO CONSUMIDOR E DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. COBRANÇA INDEVIDA DE CONSUMO DE ENERGIA ELÉTRICA. AUSÊNCIA DE TOI. VALORES DISTOANTES DA MÉDIA HISTÓRICA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CONCESSIONÁRIA. DANO MORAL CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em exame Apelação cível interposta pela concessionária de energia elétrica contra sentença que reconheceu a inexigibilidade de fatura com valores excessivos e destoantes da média histórica, referente ao mês de dezembro/2022, e fixou indenização por danos morais à consumidora, diante da ausência de prova da regularidade do faturamento e da ameaça de suspensão do fornecimento. II. Questão em discussão 2. Há duas questões em discussão: (i) saber se a concessionária comprovou a legalidade da cobrança de faturas de energia com valores elevados e em duplicidade, sem emissão de Termo de Ocorrência e Inspeção – TOI; (ii) saber se a cobrança indevida, aliada à ameaça de interrupção do fornecimento, enseja a reparação por danos morais. III. Razões de decidir 3. A relação entre as partes é regida pelo CDC, sendo aplicável a inversão do ônus da prova em favor do consumidor. 4. A ausência de TOI e de demonstração técnica da regularidade do faturamento compromete a legitimidade da cobrança impugnada. 5. A concessionária não se desincumbiu do ônus de comprovar a correção da cobrança, limitando-se a alegações genéricas e documentos unilaterais. 6. A ameaça de interrupção do fornecimento de serviço essencial, diante de cobrança manifestamente indevida, ultrapassa o mero aborrecimento, configurando dano moral indenizável. IV. Dispositivo e tese 7. Recurso desprovido. Tese de julgamento: "1. A concessionária de energia elétrica deve comprovar, mediante prova técnica idônea, a regularidade de cobrança com valores destoantes da média de consumo, especialmente na ausência de Termo de Ocorrência e Inspeção – TOI. 2. A cobrança indevida de valor elevado, com ameaça de suspensão do fornecimento, configura ato ilícito que enseja reparação por dano moral." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, § 6º; CDC, arts. 6º, VIII, e 14, § 3º; CPC, art. 373, II. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.412.433/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª Turma, j. 12.11.2014; TJMT, Apelação Cível nº 1000102-41.2018.8.11.0018, Rel. Des. Sebastião Barbosa Farias, j. 17.05.2022. R E L A T Ó R I O Recurso de APELAÇÃO CÍVEL interposto por ENERGISA MATO GROSSO – DISTRIBUIDORA DE ENERGIA S/A, contra a r. sentença proferida pelo Juízo de Direito da 5ª Vara Cível da Comarca de Cuiabá/MT, que nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Danos Morais, ajuizada por LUCIVANIA BOMDESPACHO DE ALMEIDA ARRUDA, JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados em inicial, para declarar inexigível a recuperação de consumo no valor de R$ 1.058,59 (id.110944815) e CONDENAR a ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), acrescidos de juros de mora de 1% ao mês e correção monetária pelo INPC a partir da sentença (Súmula 362-STJ). Condenou a ré ao pagamento das custas e despesas processuais, além de honorários advocatícios de sucumbência que fixou em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, nos termos dos artigos 82, §2º e 85, §2º, ambos do CPC. Em síntese, a apelante requer o provimento do recurso de apelação e a consequente reforma da sentença alegando que o juízo de origem cometeu um grande equívoco ao fundamentar sua decisão sob a alegação de que a cobrança da fatura objeto da demanda se trata de recuperação de consumo, aduzindo, que “conforme foi demonstrado em sede de contestação, o valor da fatura do mês de dezembro de 2022, não se trata de recuperação de consumo, não precisando da lavratura do Termo de Ocorrência e Inspeção, nos termos da Resolução da ANEEL”. Menciona que “quanto ao questionamento da fatura do mês de dezembro/2022, cumpre estabelecer que não o foi identificado qualquer erro em tal procedimento, uma vez que de acordo com o Histórico de Consumo, a leitura da medição ocorreu de forma regular”. Frisa que “em meses posteriores, verifica-se que o consumo sofre alteração es nos mesmos moldes dos meses reclamados, o que indica que há uma variação o de consumo em determinados meses”. Ressalta que no início de 2022, a Agência Nacional de Energia Elétrica – Aneel aprovou o reajuste anual da tarifa da Energisa Mato Grosso em 20,36% para clientes residenciais e 22,55% na média de todas as categorias além dos tributos cobrados na fatura de energia elétrica (PIS, COFINS, ICMS, Bandeiras tarifaria, CIP, juros, multas, correções monetárias) que impactam sensivelmente no valor final da fatura. Alega inexistência de equívoco na medição e na cobrança de modo que não há que se falar em qualquer ato ilícito praticado pela Apelante. Informa que “foi aberto ordem de serviço para realização de TESTE NO MEDIDOR na unidade consumidora da parte Apelada, e não foram evidenciados nenhuma anomalia no sistema medição, interligação e/ou fraude até o ponto de entrega, onde e de responsabilidade da distribuidora, sendo confirmado a progressão no registro do consumo no medidor, comprovando a energia consumida pela unidade em questão”. Defende a presunção de veracidade das faturas de energia elétrica enviadas e da inexistência de dano moral argumentando a inexistência de ato ilícito praticado pela Apelante, esclarecendo que “no caso em tela, não houve sequer cobrança, suspensão no fornecimento de energia ou inscrição da Apelada nos órgãos de proteção ao crédito”. Requer que o recurso seja conhecido e provido o presente recurso para que seja a demanda julgada totalmente improcedente. Contrarrazões (Num. 269358771). É o relatório. V O T O R E L A T O R O direito pleiteado por LUCIVANIA BOMDESPACHO DE ALMEIDA ARRUDA resultou do recebimento de cobrança indevida de fatura compreendendo o mês de dez/2022 com vencimento em 09/01/2023 no valor de R$ 1.058,59 e, posteriormente, ao recebimento da fatura no valor de R$ 676,36 também referente ao mês de dez/2022 com vencimento em 25/01/2023, relativos ao consumo de energia elétrica registrados na UC n.6/3897913/4 que não representam a efetiva utilização em sua residência. O juízo singular decidiu pela parcial procedência do feito (Num. 269062297). A controvérsia cinge-se à legalidade da cobrança questionada e à caracterização do dano moral, sob a alegação da concessionária de que o valor lançado não constitui “recuperação de consumo” e que, portanto, prescindiria da lavratura de Termo de Ocorrência e Inspeção – TOI. Pois bem. Prefacialmente importa destacar que a relação existente entre as partes aqui em litígio é de consumo, devendo, ao caso, ser aplicada regras dispostas no Código de Defesa do Consumidor, inclusive com a inversão do ônus da prova previsto no inciso VIII do artigo 6.º do código consumerista. Ainda, nos termos do art. 14, § 3º, do CDC, O fornecedor de serviços só não será responsabilizado por eventuais prejuízos causados ao consumidor quando provar que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste e que a culpa é exclusiva do consumidor ou de terceiros. Partindo dessa premissa, deveria a concessionária de energia ré demonstrar por meio de provas hábeis, a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, nos termos do inciso II do artigo 373 do Código de Processo Civil, o que não ocorreu no caso em tela. Nesse ponto, empresa apelante é prestadora de serviço público de energia. Nessa condição, responde de forma objetiva pelos danos causados a seus usuários decorrentes dos serviços prestados nos termos do disposto no art. 37, § 6º, da Constituição Federal: As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. Ademais, é necessário registrar que, segundo entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça no REsp nº 1.412.433/RS, submetido ao rito dos recursos repetitivos, embora a tese envolva corte do fornecimento de energia, entendeu, que, a caracterização de recuperação de consumo depende de constatação técnica e formal, com observância do contraditório, por meio do TOI, devidamente fundamentado e entregue ao consumidor; de modo que a ausência desse procedimento compromete a higidez da cobrança que extrapole o histórico de consumo da unidade. No caso concreto, conforme pontuado na sentença recorrida, não há nos autos prova da existência do TOI, tampouco da observância do devido processo administrativo para reclassificação do débito como de recuperação de consumo, de modo a garantir ao consumidor a possibilidade de impugnação. A empresa recorrente, embora alegue que a cobrança tem origem distinta, não comprovou cabalmente sua natureza ordinária. Além disso, a parte autora insurge quanto ao recebimento da fatura referente ao mês de Dezembro/2022 com vencimento em 09/01/2023 no valor de R$ 1.058,59 e, logo após, ao recebimento da fatura de outra fatura também com referência ao mês de Dezembro/2022, vencimento em 25/01/2023 no valor de R$ 676,36, razão pela qual buscou solução pela via administrativa junto a concessionária ré, conforme protocolos de atendimento informados na inicial (Protocolo nº 87872317 datado de 12/01/2023 e Protocolo nº 87441411, datado de 02/02/2023 (id. 269062261 – Pág.2), quais não restaram impugnados pela concessionária apelante. A simples afirmação de que a leitura se deu de forma regular, associada ao fato de que a cobrança se deu de maneira substancialmente superior ao histórico médio da unidade consumidora, exige que a empresa distribuidora demonstre, com provas robustas e técnicas, a correspondência do valor com o efetivo consumo. Nesse ponto, a jurisprudência deste Egrégio Tribunal é firme no sentido de que a inversão do ônus da prova, autorizada pelo CDC, impõe à fornecedora o dever de comprovar a legitimidade da cobrança impugnada, não bastando alegações genéricas. Vejamos: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO COMBINADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - VALOR DE FATURA DESTOANTE DA MÉDIA DE CONSUMO - FATURA CONTESTADA - NÃO COMPROVAÇÃO DA LEGITIMIDADE DA COBRANÇA - REFATURAMENTO - NECESSIDADE DE REDISTRIBUIÇÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS - SENTENÇA REFORMADA - RECURSO PROVIDO. 1. Se a fatura impugnada pela consumidora possui valor exorbitante e destoante da média de consumo, e não havendo nos autos elementos hábeis a justificar a cobrança, deve o valor da fatura ser adequado à média apurada. 2. A elevação do consumo de energia elétrica, sem fator que a justifique e em valor exorbitante, enseja a revisão do valor constante da fatura discutida. 3. Apesar de a concessionária ré alegar que a cobrança é devida, não apresenta qualquer documento apto a comprovar suas alegações, se limitando a trazer documentos unilaterais oriundos do seu sistema interno. (N.U 1000102-41.2018.8.11.0018, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Primeira Câmara de Direito Privado, Julgado em 17/05/2022, Publicado no DJE 18/05/2022) DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. COBRANÇA ABUSIVA DE ENERGIA ELÉTRICA. INEXISTÊNCIA DE PROVA DA REGULARIDADE DO FATURAMENTO. CORTE INDEVIDO DO FORNECIMENTO. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta contra sentença que declarou a inexigibilidade de fatura de consumo, determinando a adequação ao histórico de consumo da autora e condenando a empresa ao pagamento de indenização por dano moral, no valor de R$ 4.000,00. A autora alegou consumo médio baixo e questionou faturas de outubro e novembro de 2023, com valores significativamente superiores à sua média histórica. Requereu revisão dos valores e indenização pelo corte indevido do fornecimento. A sentença considerou que a concessionária não comprovou a regularidade do faturamento impugnado e que o corte de energia, mesmo após contestação administrativa e intervenção do Procon, configurou ato ilícito passível de indenização. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em saber se a cobrança excessiva de energia elétrica, sem comprovação de regularidade pela concessionária, e o corte indevido do fornecimento justificam a declaração de inexistência do débito e a condenação por dano moral. III. RAZÕES DE DECIDIR O histórico de consumo da unidade consumidora demonstra que os valores cobrados nas faturas impugnadas destoam significativamente da média anterior, sem justificativa plausível. A concessionária não se desincumbiu do ônus de demonstrar a regularidade das cobranças, tampouco requereu a realização de perícia técnica para comprovar a legitimidade dos valores faturados. A interrupção do fornecimento, mesmo diante da contestação do débito e da atuação do Procon, caracteriza abuso por parte da concessionária e configura ato ilícito indenizável, nos termos do CDC e do CC. O valor arbitrado a título de indenização por dano moral (R$ 4.000,00) encontra-se dentro dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando os transtornos causados à consumidora. IV. DISPOSITIVO E TESE Apelação cível conhecida e desprovida. Tese de julgamento: “A concessionária de energia elétrica deve comprovar a regularidade do faturamento questionado pelo consumidor, sob pena de revisão dos valores. O corte indevido do fornecimento de energia, sem oportunizar a resolução administrativa da controvérsia, caracteriza ato ilícito passível de indenização por dano moral.” Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CDC, arts. 6º, VIII, e 42; CC, art. 927; CPC, art. 373, II. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.412.705/SC, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª Turma, j. 14.10.2014; STJ, AgInt no AREsp 1.761.643/MG, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª Turma, j. 06.09.2021. (N.U 1006541-10.2023.8.11.0013, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 05/03/2025, Publicado no DJE 09/03/2025) A ordem de serviço mencionada no recurso não se mostrou suficiente para comprovar com segurança e robustez a inexistência de erro no sistema de medição ou de anomalias técnicas capazes de justificar o valor impugnado. Assim, deixando a ré de cumprir com seus ônus probatórios imposto pelo inciso II do artigo 373 do Código de Processo Civil, presume-se como verdadeiros os fatos alegados pela parte autora e consumidora, motivo pelo qual resta indevido o débito a esta imputado, eis que destoante de sua média de consumo sem qualquer justificativa plausível. No tocante ao dano moral, a jurisprudência pacífica do STJ reconhece que a cobrança indevida de valores, por si só, não configura abalo moral indenizável, salvo quando acompanhada de elementos agravantes, como interrupção do serviço, inscrição em órgãos de proteção ao crédito ou conduta vexatória. No entanto, o caso dos autos apresenta singularidade relevante, qual seja, a ameaça de suspensão do fornecimento de energia e a insegurança causada pela cobrança indevida de valor elevado e sem prévia justificativa técnica, o que, a toda evidência, ultrapassa o mero aborrecimento cotidiano. Trata-se de serviço essencial, cuja falha na prestação reverbera diretamente na dignidade da pessoa humana e no mínimo existencial, o que justifica a indenização fixada, a qual, ademais, mostra-se razoável e proporcional à extensão do dano experimentado, considerando-se a ausência de prova em sentido contrário. Diante do exposto, cotejados os elementos trazidos ao feito, nada se encontra passível de reforma. Mantida a sentença singular em todos os seus termos. Em conformidade com o art. 85, § 11º do CPC, majoro os honorários determinados pelo juízo a quo para 15% (quinze por cento). Com estas considerações DESPROVEJO o recurso. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025

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