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Processo nº 1010211-79.2025.8.11.0015

ID: 307257850

Tribunal: TJMT Órgão: 5ª VARA CRIMINAL DE SINOP Classe: PETIçãO CRIMINAL Nº Processo: 1010211-79.2025.8.11.0015

Data de Disponibilização: 25/06/2025

Polo Ativo:

CLEVERSON ALENCAR GODOI

Polo Passivo:

Decisão

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 5ª VARA CRIMINAL DE SINOP DECISÃO Processo: 1010211-79.2025.8.11.0015. REQUERENTE: CLEVERSON ALENCAR GODOI REQUERIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSS… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO 5ª VARA CRIMINAL DE SINOP DECISÃO Processo: 1010211-79.2025.8.11.0015. REQUERENTE: CLEVERSON ALENCAR GODOI REQUERIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO Trata-se de incidente instaurado em separado para processamento do Recurso em Sentido Estrito interposto nos autos da ação penal nº 1000129- 81.2023.8.11.0007, a qual processa os delitos de tráfico ilícito de entorpecentes e associação para o tráfico imputados pelo Ministério Público em face de CLEVERSON ALENCAR GODOI e TARIANE FRANCIELE GONÇALVES NASCIMENTO. No decorrer do regular trâmite do feito principal, houve a extensão da competência territorial da 5ª Vara Criminal de Sinop/MT, atraindo à jurisdição desta vara os delitos envolvendo o art. 35 da Lei de Drogas em tramitação, dentre outras cidades, da comarca de Alta Floresta. Contudo, o recorrente CLEVERSON interpôs recurso em sentido estrito (ID 189995968 - Pág. 176) a fim de questionar o declínio de competência para processamento e julgamento do feito em prol desta Comarca, argumentando pela violação dos dispositivos de competência presentes no Código de Processo Penal e a Constituição Federal, devendo, razão pela qual deverão os autos ser remetidos à comarca de Alta Floresta/MT. O Parquet refutou tais argumentos em sede de contrarrazões de RESE (ID 194369168), alegando que a decisão de declínio do feito a esta Vara e sua sujeição tanto pelo Juízo, quanto por este subscritor, decorre de determinação do Egrégio Tribunal de Justiça que fixou através da Resolução nº 14, de 23 de novembro de 2023, que os delitos que envolvam associação ao tráfico devem ser processados pela 5ª Vara Criminal de Sinop/MT, pugnando ao final pela rejeição do mérito do recurso. Os autos vieram conclusos. É o breve relatório. Fundamento e DECIDO. O acusado aduz que a referida vara especializada é incompetente para o julgamento da presente ação. Pois bem. Ressalta-se que a Constituição Federal admite que a alteração da competência dos órgãos do Poder Judiciário por deliberação dos Tribunais, conforme dispõe o art. 96, inciso I, alínea “a”, da Constituição Federal, não havendo que se falar em violação aos princípios constitucionais da legalidade, do juiz natural e do devido processo legal, no que concerne a Resolução nº 11/2017 do Tribunal do Pleno. A título de exemplo, é constitucional lei estadual que confere poderes ao Conselho da Magistratura para atribuir aos juizados da infância e juventude competência para processar e julgar crime de natureza sexual praticados contra criança e adolescente, nos exatos limites da atribuição que a Constituição Federal confere aos tribunais. Nesse caso, não há falar em violação aos princípios constitucionais da legalidade, do juiz natural e do devido processo legal, visto que a leitura interpretativa do art. 96, I, a, da CF, admite a alteração da competência dos órgãos do Poder Judiciário por deliberação dos tribunais, sobretudo se considerarmos que a especialização de varas consiste em alteração de competência territorial em razão da matéria, e não em alteração de competência material, regida pelo art. 22, da CF (DE LIMA, Renato Brasileiro. Manual de Processo Penal. 9. ed. rev. atual. e aum. Salvador: JusPodivm, 2021. v. único). De outro norte, quanto à suposta violação ao art. 22, inciso I, da Constituição Federal, observa-se que a especialização de varas consiste em alteração de competência territorial em razão da matéria, e não alteração de competência material, regida pelo art. 22 da CF/88. Ademais, o Poder Judiciário tem competência para dispor sobre especialização de varas, porque é matéria que se insere no âmbito da organização judiciária dos Tribunais. Nesse sentido, cumpre destacar que tanto a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, quanto a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem admitido a especialização de Varas Criminais por meio de resolução, uma vez que a “Constituição Federal atribui aos tribunais o poder de dispor sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos” (STF - ADI: 4235 RJ, Relator: EDSON FACHIN, Data de Julgamento: 13/12/2022, Tribunal Pleno, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-006 DIVULG 16-01-2023 PUBLIC 17-01 2023). Registra-se, ainda, que conforme decisão proferida no AgRg no RHC 115811/ES, de Relatoria do Ministro Jorge Mussi, julgado em 15/08/2019, a Vara Especializada é competente para processar e julgar crimes ocorridos em comarcas diversas, uma vez que “por ser especializada quanto à matéria, prevalece sobre os demais”. Nesse sentido é a jurisprudência E. TJMT, vejamos, in verbis: CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO – JUÍZO DA 7ª VARA CRIMINAL DE CUIABÁ (SUSCITANTE) X JUÍZO DA 3ª VARA DE JUÍNA (SUSCITADO) – DENÚNCIA QUE APURA A PRÁTICA DE CRIMES EM CONTEXTO DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA – JUÍZO SUSCITADOVARA ESPECIALIZADA – PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ (ART. 399, § 2º, DO CPP) – O PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ NÃO SE REVESTE DE CARÁTER ABSOLUTO – AUTOORGANIZAÇÃO DOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA – SUSCITANTE QUE RECEBEU OUTRAS AÇÕES DO SUSCITADO, INCLUSIVE PROLATOU SENTENÇA EM UMA – VARA ESPECIALIZADA PARA PROCESSAR E JULGAR INFRAÇÕES ENVOLVENDO ORGANIZAÇÕES CRIMINOSAS (JUÍZO SUSCITANTE) – CONFLITO IMPROCEDENTE. Declínio de competência que se afigura regular, ainda que não suscitado pelas partes ou comprovado prejuízo, porquanto é permitido ao juiz, em qualquer fase do processo, reconhecer motivo que o torne incompetente (art. 109 do CPP). O Princípio da identidade física do juiz não se sobrepõe à auto-organização dos Tribunais de Justiça. Contexto fático que não evidencia causa de prorrogação da competência em virtude da ocorrência de "hipóteses legais de substituição do magistrado de acordo com as regras de coorganização judiciária", razão pela qual, embora tardiamente reconhecido o motivo pelo Juízo suscitado, não há se falar em ofensa ao art. 399, § 2º, do CPP. Em consulta ao sistema PJe observa-se que o Juízo suscitante recebeu do Juízo suscitado outras ações decorrentes da mesma operação policial, tendo inclusive já sentenciado uma (autos n.0004766-14.2018.8.11.0025). (N.U 1023468-27.2022.8.11.0000, CÂMARAS CRIMINAIS REUNIDAS, RUI RAMOS RIBEIRO, Turma de Câmaras Criminais Reunidas, Julgado em 02/03/2023, Publicado no DJE 08/03/2023) (Destaquei) Na mesma direção é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, conforme se pode observar quando da análise do declínio de competência do Juízo da 3ª Vara Criminal da Comarca de Rondonópolis/MT, em favor da 7ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, CORRUPÇÃO ATIVA, LAVAGEM DE DINHEIRO E FRAUDE EM LICITAÇÕES. COMPETÊNCIA. CRIAÇÃO DE VARAS ESPECIALIZADAS PELOS TRIBUNAIS DE JUSTIÇA. PREVALÊNCIA DOS JUÍZOS ESPECIAIS EM DETRIMENTO DA COMPETÊNCIA TERRITORIAL. POSSIBILIDADE. FIXAÇÃO DA COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA. AUTORIDADE COM FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO EXCLUÍDA DA INVESTIGAÇÃO. DECLÍNIO DE COMPETÊNCIA PARA A VARA ESPECIALIZADA. INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Diante da conclusão da Corte estadual pela ausência de indícios de participação de autoridade com foro por prerrogativa de função nos fatos apurados, não se verifica qualquer nulidade na determinação de que o Procedimento Investigatório Criminal tramite em vara especializada, por se tratar de competência em razão da matéria disciplinada por ato normativo específico previsto na Constituição Federal - CF, ainda que diferente da competência territorial. 2. No caso concreto, são apurados delitos de corrupção ativa, fraudes à licitação, lavagem de dinheiro e de suposta organização criminosa, que dispõe de vara especializada criada pela Resolução n. 11/2017 no âmbito do Poder Judiciário do Estado do Mato Grosso, o que, de acordo com o entendimento desta Corte Superior de Justiça é autorizado pelo art. 96, inc. I, "a", da Constituição Federal e, pelo art. 74 do Código de Processo Penal - CPP, pois trata-se de matéria que se insere no âmbito da organização judiciária dos Tribunais. 3. Não se verifica descumprimento da decisão emanada de Desembargador do Tribunal de origem, uma vez que ao declinar a competência para o Juízo da Vara Criminal da Comarca de Rondonópolis, a Corte a quo apenas concluiu pela ausência de indícios de envolvimento do Prefeito nos fatos investigados, o que afastaria a competência originária do Tribunal estadual, não havendo limitação ou impedimento para que o juízo singular concluísse pela competência de Vara Criminal especializada. 4. Agravo regimental desprovido. (AgRg no RHC n. 154.203/MT, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 20/3/2023, DJe de 24/3/2023.) (Destaquei) De longa data o Supremo Tribunal Federal também compartilha do mesmo entendimento, de que “não há que se falar em violação aos princípios constitucionais do devido processo legal, do juiz natural e da perpetuatio jurisdictionis, visto que a leitura interpretativa do art. 96, I, a, da Constituição Federal, admite que haja alteração da competência dos órgãos do Poder Judiciário por deliberação dos tribunais” (HC 94.146, 2ª Turma, Relatora a Ministra Ellen Gracie, DJe 7.11.2008). No mesmo sentido, o HC 96.104, 1ª Turma, DJe 6.8.2010 e o HC 91.253, 1ª Turma, DJe 14.11.2007, ambos de relatoria do Ministro Ricardo Lewandowski. Do mesmo modo no HC 108749, 2ª Turma, de relatoria a Ministra Cármem Lúcia, DJe 23/04/2013. A propósito, especificamente quanto à abrangência da competência em todo o território do Estado, a Constituição Federal estabelece, em seu artigo 125, que os Estados organizarão sua Justiça. No mesmo sentido, conforme já alinhavado, o artigo 96, inc. I, da Constituição Federal permite que o Tribunal disponha acerca de sua competência. Portanto, não se pode olvidar que é competência do Estado de Mato Grosso dispor acerca das regras de distribuição do foro, por meio da Lei de Organização Judiciária, de modo que lhe é concedida a possibilidade de criar, cindir, reunir comarcas, estabelecendo o âmbito territorial de abrangência, sem, contudo, implicar em usurpação da competência legislativa da União. Desse modo, não merece prosperar a alegação de que esta 5ª Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT seria incompetente para processar e julgar crimes que dizem respeito à tráfico de drogas e afins em todo Estado de Mato Grosso, bem como aqueles conexos, inexistindo, portanto, qualquer ilegalidade no processamento e julgamento da presente Ação Penal. Afinal, no mesmo sentido dos julgados supracitados, o Egrégio Tribunal de Justiça fixou, através da Resolução nº 14, de 23 de novembro de 2023, além da Resolução n.º 15 de 24 de outubro de 2024, que os delitos que envolvam associação ao tráfico devem ser processados pela 5ª Vara Criminal de Sinop/MT. Isso, porque muito embora seja competência territorial regra de organização judiciária, estabelecendo-se, via de regra, no momento da propositura da ação, conforme o princípio da “perpetuatio jurisdictionis”, previsto no artigo 43 do Código de Processo Civil e aplicável ao processo penal, subsidiariamente, nos termos do artigo 3º do Código de Processo Penal, é possível que situações excepcionais justifiquem a remessa de processos em andamento, especialmente quando há alteração normativa da competência territorial, seja por reorganização administrativa ou criação de novas unidades judiciárias, como é o caso destes autos. Portanto, uma vez que o artigo 96, inciso I, alínea “d”, da Constituição Federal dispõe que é competência dos tribunais estabelecer alterações na divisão e organização territorial da jurisdição, têm-se que a mudança de competência territorial, quando determinada por norma legal ou decisão administrativa, deve ser respeitada para garantir a aplicação uniforme da jurisdição e evitar conflitos de competência, razão pela qual rejeito, em consonância com o parecer do Ministério Público, a alegação de incompetência suscitada, negando provimento ao recurso ao recurso interposto e mantendo a competência da 5ª Vara Criminal de Sinop/MT para tramitação do feito. Considerando que o Ministério Público apresentou suas contrarrazões (ID 194369168) ao recurso em sentido estrito (189995968 - Pág. 176) interposto pela Defesa de CLEVERSON, determino a remessa dos autos ao Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, observadas as formalidades legais, nos termos do artigo 601 do Código de Processo Penal, para análise do recurso interposto, o qual deve ser remetido com seu respectivo efeito suspensivo. Às providências. Intimem-se. Sinop/MT, data inserida no movimento. Anderson Clayton Dias Batista Juiz de Direito

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Processo nº 1000129-90.2024.8.11.0025

ID: 330415471

Tribunal: TJMT Órgão: Terceira Câmara Criminal Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 1000129-90.2024.8.11.0025

Data de Disponibilização: 21/07/2025

Polo Ativo:

RONALDO PEDRO DA SILVA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

OSNI DOS SANTOS JUNIOR

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1000129-90.2024.8.11.0025 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Crimes do Sistema… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1000129-90.2024.8.11.0025 Classe: APELAÇÃO CRIMINAL (417) Assunto: [Tráfico de Drogas e Condutas Afins, Crimes do Sistema Nacional de Armas, Resistência] Relator: Des(a). MARCOS MACHADO Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS MACHADO, DES(A). CHRISTIANE DA COSTA MARQUES NEVES, DES(A). GILBERTO GIRALDELLI] Parte(s): [RONALDO PEDRO DA SILVA - CPF: 033.287.841-44 (APELANTE), OSNI DOS SANTOS JUNIOR - CPF: 061.485.601-94 (ADVOGADO), THIAGO GOMES VICENTE COSTA - CPF: 056.952.831-32 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (APELADO), VINICIUS RAMON AGUIAR - CPF: 987.889.062-72 (ASSISTENTE), MARIANA CARVALHO TROMBETA - CPF: 062.997.941-35 (ASSISTENTE), CARLOS EDUARDO VIRGILIO OLIVEIRA - CPF: 015.848.691-94 (ASSISTENTE), A INCOLUMIDADE PUBLICA (VÍTIMA), JOCINEI BALICKI DE SIQUEIRA GONCALVES - CPF: 061.074.361-97 (VÍTIMA), RIAN LUCAS RODRIGUES DOS SANTOS - CPF: 073.484.591-02 (VÍTIMA), SAÚDE PÚBLICA (VÍTIMA), BENEDITO VERISSIMO DA COSTA NETO - CPF: 712.878.841-72 (ASSISTENTE), ROBENILSON FERREIRA BARROS - CPF: 740.993.371-20 (ASSISTENTE), ALEXSANDRO SANCHEZ DA SILVA - CPF: 057.760.561-52 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). Não encontrado, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DESPROVEU O RECURSO. E M E N T A Ementa. Direito penal. Apelação criminal. Tráfico de drogas e posse ilegal de arma de fogo de uso restrito. Nulidade de prova por ausência de mandado de busca. Estado de flagrância configurado. Absolvição por insuficiência probatória. Condenações mantidas. Recursos desprovidos. I. Caso em exame Apelações criminais interpostas contra sentença condenatória que impôs, ao primeiro apelante, pena de 8 anos de reclusão, em regime semiaberto, e 510 dias-multa; e, ao segundo, pena de 11 anos, 10 meses e 7 dias de reclusão, em regime fechado, e 910 dias-multa, pela prática dos crimes de tráfico de drogas (art. 33 da Lei n. 11.343/2006) e posse ilegal de arma de fogo e munições de uso restrito (art. 16 da Lei n. 10.826/2003). II. Questões em discussão Há três questões em discussão: (i) aferir a nulidade das provas obtidas por meio de ingresso domiciliar sem mandado judicial; (ii) verificar a suficiência do acervo probatório para sustentar a condenação por tráfico de drogas e posse de arma de fogo; (iii) examinar o pedido de isenção de custas processuais em razão de hipossuficiência econômica. III. Razões de decidir 1. A entrada no domicílio dos apelantes, sem mandado judicial, fundamenta-se na configuração de estado de flagrância, decorrente de monitoramento prévio e da visualização externa de elemento suspeito no interior da residência, compatível com a prática de crimes permanentes (tráfico de drogas e posse de arma de fogo), conforme autorizam o art. 5º, XI, da CF/1988, e o art. 302, I e III, do CPP. 2. Os depoimentos firmes e convergentes dos policiais civis, aliados à confissão judicial do primeiro apelante e à apreensão de entorpecentes fracionados, balança de precisão e armas de fogo [acessíveis aos ocupantes do imóvel], evidenciam a prática do tráfico de drogas e da posse de armamento de uso restrito, condutas típicas, ilícitas e culpáveis. 3. O contexto probatório demonstra posse compartilhada das armas entre os réus, sendo desnecessário o domínio exclusivo do artefato por cada agente para configurar o tipo penal do art. 16 da Lei n. 10.826/2003, à luz da jurisprudência consolidada quanto à composição subjetiva do delito e à posse simultânea de objeto bélico. 4. A pretensão de isenção das custas processuais deve ser deduzida perante o Juízo da Execução Penal, nos termos do art. 804 do CPP, sendo incabível sua apreciação em sede recursal. IV. Dispositivo e tese Recursos parcialmente conhecidos e desprovidos. Tese de julgamento: "1. O ingresso domiciliar sem mandado judicial é lícito quando precedido de monitoramento e configurada situação de flagrância em crime permanente. 2. A posse de entorpecentes fracionados, acompanhada de instrumentos típicos do tráfico e confissão judicial, permite a condenação por tráfico de drogas. 3. A posse de arma de fogo em local de acesso comum aos agentes configura posse compartilhada, suficiente à configuração do delito do art. 16 da Lei n. 10.826/2003." Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XI e LVI; CP, arts. 29 e 107; CPP, arts. 245, § 7º, 248, 302, I e III, 593, I e 804; Lei n. 11.343/2006, art. 33; Lei n. 10.826/2003, art. 16. Jurisprudência relevante citada: STF, RE 603.616/RO, Rel. Min. Gilmar Mendes, Plenário, j. 05.11.2015; STF, HC 202040 AgR, Rel. Min. Nunes Marques, Segunda Turma, j. 22.08.2021; STJ, AgRg no HC n. 612.972/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, Quinta Turma, j. 22.06.2021; STJ, HC 198186/RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, Quinta Turma, j. 17.12.2013. R E L A T Ó R I O TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL APELAÇÃO Nº 1000129-90.2024.8.11.0025 - CLASSE CNJ - 417- COMARCA DE BRASNORTE APELANTE(S): THIAGO GOMES VICENTE COSTA RONALDO PEDRO DA SILVA APELADOS(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL R E L A T Ó R I O Apelações criminais interpostas por THIAGO GOMES VICENTE COSTA e RONALDO PEDRO DA SILVA contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Brasnorte, nos autos de ação penal (PJE nº 1000129-90.2024.8.11.0025), que os condenou por tráfico de drogas e posse ilegal de arma de fogo e munições de uso restrito, sendo o primeiro a 8 (oito) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 510 (quinhentos e dez) dias-multa, e o segundo a 11 (onze) anos, 10 (dez) meses e 7 (sete) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e 910 (novecentos e dez) dias-multa – art. 33 da Lei 11.343/2006 e art. 16, caput da Lei 10.826/03 - (ID 265554560). THIAGO GOMES VICENTE COSTA suscita ilicitude das provas decorrentes da busca e apreensão domiciliar porque teriam sido obtidas sem vigilância prévia, mediante a prática de fishing expedition e violação ao princípio da inviolabilidade de domicílio. No mérito, sustenta que: 1) as provas seriam insuficientes para comprovar seu envolvimento no tráfico de drogas e na posse da arma de fogo; 2) não dispõe de condições financeiras para arcar com as custas processuais. Pede provimento para sejam anuladas as provas decorrentes da busca e apreensão domiciliar [drogas, dinheiro, balança de precisão, armas, munições e celulares] e, por conseguinte, absolvido, também pela insuficiência de provas. Subsidiariamente, a isenção de custas processuais. Prequestiona o art. 5º, XI e LVI, CF e arts. 245, § 7º, e 248, CPP (ID 265554580). RONALDO PEDRO DA SILVA suscita nulidade da busca e apreensão domiciliar sob assertiva de que não fora precedida de mandado e/ou autorização judicial. No mérito, sustenta que: 1) não há provas suficientes para comprovar a traficância; 2) não há provas de que as armas apreendidas lhe pertenciam; 3) faz jus à isenção das custas processuais. Requer que a anulação das provas decorrentes da busca domiciliar e a absolvição dos crimes que lhe foram imputados. Em pleito subsidiário, isenção das custas processuais (ID 265554591). A PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE BRASNORTE pugna pela rejeição da preliminar e, no mérito, pelo desprovimento dos apelos (ID 265554589 e 265554594). A i. 6ª Procuradoria de Justiça Criminal opina pela rejeição da preliminar e, no mérito, pelo desprovimento dos recursos defensivos, em parecer assim sintetizado: “Sumário: APELANTES condenados pela prática dos crimes previstos no artigo 33, caput, da Lei nº 11.343/2006 e artigo 16, caput, da Lei nº 10.826/2003 – THIAGO à pena total de 08 (oito) anos de reclusão em regime inicial semiaberto e RONALDO à pena total de 11 (onze) anos, 10 (dez) meses e 7 (sete) dias de reclusão em regime inicial fechado – Irresignação das defesas: Preliminar: Nulidade do ingresso e busca realizada no domicilio de THIAGO e das provas decorrentes da referida diligência e, consequentemente, a absolvição dos APELANTES – Pela rejeição: APELANTE THIAGO, real proprietário da moradia em que os policiais civis adentraram estava sendo investigado pela prática de dois sequestros, crime permanente, isto é, a sua consumação se prolonga no tempo, de modo que a prisão em flagrante pode ser realizada a qualquer momento – APELANTES THIAGO e RONALDO e o corréu ALEXSANDRO foram presos em posse de substâncias entorpecentes e armas de fogo, crimes que também possuem natureza permanente e autorizam, devido ao estado de flagrância, o ingresso no domicílio independentemente de mandado e/ou autorização do morador – Mérito: 1) Absolvição dos APELANTES dos crimes pelos quais foram condenados por ausência de provas – 2) Subsidiariamente a isenção das custas processuais – Não procede: 1) Encontrase robustamente ilustrado o envolvimento dos APELANTES na guarda das drogas apreendidas que tinham finalidade mercantil e, na posse compartilhada das armas de fogo. Destacando os depoimentos convergentes de policiais civis, confissão nas duas fases do APELANTE THIAGO que delatou o APELANTE RONALDO. Apreensão de várias porções de maconha e cocaína embaladas prontas para a venda, apreensão de balança de precisão e de duas armas de fogo encontradas em locais de livre acesso aos que estavam na casa – Condenações que devem ser mantidas – 2) Pagamento das custas processuais é efeito da condenação (artigo 804 do CPP), eventual suspensão de pagamento é matéria afeta ao Juízo da Execução Penal – Pelo conhecimento dos apelos, rejeição da preliminar e no mérito improvimento dos recursos.” (Ana Cristina Bardusco Silva, procuradora de Justiça - ID 272020396) É o relatório. V O T O R E L A T O R V O T O (PRELIMINAR - NULIDADE DAS PROVAS - BUSCA E APREENSÃO DOMICILIAR) EXMO. SR. DES. MARCOS MACHADO (RELATOR) Egrégia Câmara: Os apelantes suscitam a ilicitude das provas decorrentes busca domiciliar sob assertiva de que não fora precedida de mandado e/ou autorização judicial, bem como que teriam sido obtidas sem vigilância prévia, mediante a prática de “pescaria probatória”. Vejamos. Extraem-se das narrativas dos policiais civis [Vinicius Ramon Aguiar, Carlos Eduardo Virgílio Oliveira e Benedito Veríssimo da Costa] que a equipe da Polícia Civil de Brasnorte realizava diligências para identificar suspeitos de crimes relacionados a sequestro, homicídio e ocultação de cadáver, supostamente praticados por membros de facção criminosa atuante na região de Juína. No curso das investigações, foi identificado o nome de THIAGO GOMES VICENTE COSTA como um dos possíveis participantes do sequestro, após Jueliton Kevin [identificado por meio de imagens de câmeras de segurança no momento em que uma das vítimas era levada] indicar sua atuação conjunta na empreitada criminosa. Diante disso, os investigadores passaram a realizar monitoramento e vigilância da residência ocupada por THIAGO GOMES VICENTE COSTA, com o intuito de confirmar sua presença e viabilizar a adoção das medidas cabíveis. Durante o monitoramento, os agentes ao visualizarem THIAGO GOMES VICENTE COSTA na área externa, em companhia de Alexsandro Sanchez da Silva e RONALDO PEDRO DA SILVA. Procedida a abordagem, perceberam, de fora da residência, um volume suspeito sobre a geladeira, visível por uma porta entreaberta. Diante da suspeita de flagrante delito, adentraram ao imóvel, ocasião em que encontraram substancial quantidade de droga, fracionada em porções típicas de comércio, balança de precisão, duas armas de fogo (revólver calibre .38 e garrucha calibre .22) e munições em local de fácil acesso. No caso, a diligência teve origem em informação específica acerca do envolvimento do apelante THIAGO GOMES VICENTE COSTA com organização criminosa, sendo precedida de monitoramento do local, ao passo que a abordagem na área externa e a constatação de elemento suspeito no interior da residência reforçaram a situação de flagrância, autorizando a entrada sem mandado. Frise-se que THIAGO GOMES VICENTE COSTA confessou, em ambas as fases processuais, que as armas lhe pertenciam, que mantinha drogas no local e que as utilizava com os corréus, revelando ciência e voluntariedade na guarda do armamento e dos entorpecentes, o que corrobora o estado de flagrante. O contexto fático e os indícios da prática de crime permanente, notadamente a posse irregular de arma de fogo, configuram flagrante impróprio e legitimam o ingresso dos agentes públicos no domicílio sem prévia autorização judicial, nos termos do art. 5º, XI, CF, c/c art. 302, I e III, CPP. Nesse sentido, seguem-se julgados do c. STF e STJ: “[...] O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral (RE 603.616/RO, ministro Gilmar Mendes – Tema n. 280), firmou entendimento no sentido de que, nos crimes de natureza permanente – posse irregular de arma de fogo –, cuja situação de flagrância se protrai no tempo, é dispensável a apresentação de mandado judicial para o ingresso forçado na residência do acusado, desde que amparado em fundadas razões [...].” (STF, HC 202040 AgR, Relator: Nunes Marques, Segunda Turma, j. 22.8.2021). “[...] O ingresso forçado em domicílio sem mandado judicial para busca e apreensão é legítimo se amparado em fundadas razões, devidamente justificadas pelas circunstâncias do caso concreto, especialmente nos crimes de natureza permanente, como são o tráfico de entorpecentes e a posse ilegal de arma de fogo [...]”. (STJ, AgRg no HC n. 612.972/SP, Relator Ministro João Otávio de Noronha, Quinta Turma, j. 22.6.2021). Nesse quadro, não se identifica a nulidade apontada. Com essas considerações, REJEITA-SE a preliminar. V O T O (MÉRITO) EXMO. SR. DES. MARCOS MACHADO (RELATOR) Egrégia Câmara: O recurso é cabível (CPP, art. 593, I), manejado por quem tem interesse (CPP, art. 577) e não se verifica hipóteses de extinção de punibilidade (CP, art. 107). Consta da denúncia que: “FATO 1 – Tráfico de drogas majorado pelo e emprego de arma de fogo (art. 33, caput, c/c art. 40, IV, ambos da Lei n. 11.343/2006) No dia 20 de dezembro de 2023, durante a tarde, na residência localizada na Rua Brasil, s/n, Bairro, em Brasnorte/MT, os denunciados, em unidade de desígnios, mantiveram em depósito/guardaram 10 (dez) porções de maconha, totalizando 139,42g (cento e trinta e nove gramas e quarenta e dois centigramas), e 4 (quatro) porções de cocaína, totalizando 110,57g (cento e dez gramas e cinquenta e sete centigramas), drogas que causam dependência física e/ou psíquica, sem autorização e/ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Após informações de que o denunciado 3) THIAGO estava envolvido em um homicídio na comarca de Juína/MT, bem como por meio de monitoração prévia, a Polícia Civil abordou os denunciados na área externa do imóvel ocasião em que os flagrou com a droga, além de uma balança de precisão e armas de fogo. Ressalta-se que, no interior do imóvel, em cima da geladeira, os denunciados mantinham 1 (um) revólver da marca Taurus de calibre .38 SPL e 5 (cinco) munições de calibre .38 SPL e, em um dos quartos, 1 (uma) garrucha de calibre .22, todos eficientes para disparo. FATO 2 – Posse ilegal de arma de fogo e de munições de uso restrito (art. 16, caput, da Lei nº 10.826/2003) Ato contínuo, nas mesmas circunstâncias de tempo e de local do fato anterior, os denunciados, em unidade de desígnios, possuíram/tinham em depósito/mantiveram sob sua guarda, de maneira compartilhada, arma de fogo e munições de uso restrito, quais sejam 1 (um) revólver, da marca Taurus, de calibre .38 SPL, 1 (uma) garrucha de calibre .22 e 5 (cinco) munições de calibre .38 SPL, em desacordo com a determinação legal ou regulamentar, todos eficientes para disparo. O denunciado 1) ALEXSANDRO foi flagrado ao lado da garrucha, enquanto os denunciados 2) RONALDO e 3) THIAGO estavam próximos à cozinha, onde o revólver foi apreendido em cima da geladeira, artefatos bélicos que eles compartilhavam para empregar no crime de tráfico de drogas. [...] Ante o exposto, o Ministério Público oferece a presente DENÚNCIA contra 1) ALEXSANDRO SANCHEZ DA SILVA, como incurso no art. 33, caput, c/c art. 40, IV, ambos da Lei n. 11.343/2006 e no art. 16, caput, da Lei nº 10.826/2003; 2) RONALDO PEDRO DA SILVA, como incurso no art. 33, caput, c/c art. 40, IV, ambos da Lei n. 11.343/2006, no art. 16, caput, da Lei nº 10.826/2003 e no art. 329, caput, do CP; e 3) THIAGO GOMES VICENTE COSTA, como incurso no art. 33, caput, c/c art. 40, IV, ambos da Lei n. 11.343/2006 e no art. 16, caput, da Lei nº 10.826/2003. (Dannilo Preti Vieira, promotor de Justiça – ID 265554342) O Juízo singular reconheceu as responsabilidades penais e dosou as penas nos seguintes termos: “[...] II.2 - DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS [...] A materialidade do crime restou demonstrada pelo Laudo Toxicológico definitivo (id. 138916519), que concluiu que o resultado da pesquisa sobre a droga apreendida foi positivo para a substância Benzoilmetilecgonina (popularmente conhecida como “cocaína”) e para a substância Delta-9-THC (Delta 9 Tetrahidrocanabinol), o que identifica o vegetal como Cannabis sativa L., vulgarmente conhecida por “Maconha”. Juntamente com isso, o auto de exibição e apreensão (id. 138916128), que descreve a quantidade de droga encontrada em poder dos acusados, o auto de prisão em flagrante (id. 138916124) e as declarações das testemunhas ouvidas em juízo, que afirmaram ter encontrado o acusado na posse das substâncias entorpecentes descritas na denúncia. A autoria dos acusados foi devidamente comprovada, vez que foram presos em flagrante delito ao armazenarem as substâncias tóxicas ilícitas (id. 138916124), fato este que foi confirmado em juízo, através das provas orais produzidas, que foram convergentes no sentido de atribuir aos réus às práticas delituosas. [...] Analisando todo o arcabouço probatório, verifica-se, incontestavelmente, o fato de que os réus armazenaram 4 (quatro) porções de cocaína, pesando aproximadamente 110 gramas, e 10 (dez) porções de maconha, pesando aproximadamente 139 gramas, conforme indicado pelo laudo de constatação de id. 138916519. Juntamente com os entorpecentes, foi encontrada uma balança de precisão, circunstância esta que denota o envolvimento dos réus na prática de traficância. [...] Noutro giro, o réu ALEXSANDRO SANCHEZ DA SILVA negou o exercício da traficância, alegando que os policiais apresentaram uma bolsa com drogas somente após serem detidos e colocados no camburão, dizendo: “olha o que achei” (transcrito), sugerindo, assim, que as substâncias foram plantadas pelos agentes. De forma semelhante, o réu RONALDO PEDRO DA SILVA refutou as alegações constantes da denúncia, declarando: “na hora que estávamos na viatura, que eles tinham 'abrido' a gaiolinha de trás, o cara chegou atrás da caminhonete com uma bolsa de droga; essa bolsa estava dentro da viatura” (transcrito). Apesar das negativas dos réus, a análise das provas colhidas revela que as drogas foram, de fato, encontradas em sua posse durante a revista. O interrogatório do réu THIAGO GOMES VICENTE COSTA foi ainda mais elucidativo ao confirmar que as drogas estavam na residência. Ele afirmou que “o Ronaldo, quando veio de Juína, veio com essas porções de cocaína; e o restante o Alexsandro veio de Brasnorte com ele [...]” (transcrito). Ainda, ao ser questionado, o acusado Thiago mencionou que embora não soubesse precisamente onde o réu Ronaldo guardou o entorpecente na residência, tinha conhecimento de que ele o trouxe consigo, assim como o acusado Alexsandro. [...] Em relação à alegação de posse para uso pessoal, observa-se que tal hipótese não é compatível com a quantidade de droga apreendida nem com as circunstâncias evidenciadas nos autos. A presença de instrumentos típicos do tráfico, como a balança de precisão e a divisão dos entorpecentes em várias embalagens, demonstram que as substâncias estavam preparadas para distribuição, afastando, assim, a tese de consumo imediato. Diante disso, a condenação se impõe como medida necessária e justa. No que se refere à causa de aumento de pena descrita no artigo 40, inciso IV, da Lei de Drogas, verifica-se que, para sua aplicação, é necessário que a arma de fogo seja efetivamente empregada na execução do crime de tráfico de drogas, circunstância que não se verifica nos autos. No presente caso, o delito de posse de arma de fogo de uso restrito, conforme descrito no artigo 16, caput, da Lei n.º 10.826/2003, é autônomo e já foi imputado separadamente aos réus. A jurisprudência reforça que, para que a majorante do artigo 40, inciso IV, seja aplicada, a arma de fogo deve ser utilizada como parte do processo de intimidação ou como meio para viabilizar o tráfico. Nesse sentido: [...] No entanto, no caso em análise, as armas de fogo foram encontradas no local, mas não há evidências de que tenham sido usadas para facilitar ou proteger a atividade de tráfico. Dessa forma, a aplicação da causa de aumento de pena com base no mero encontro de armas, sem sua utilização efetiva na execução do tráfico, implicaria em dupla punição pelo mesmo fato, o que contraria os princípios constitucionais e legais. [...] No caso em análise, a instrução processual revelou que os acusados possuem vínculo com a organização criminosa “Comando Vermelho”. Essa conclusão foi corroborada pelos depoimentos dos policiais civis e pelo interrogatório do réu Thiago, que afirmou que o réu Alexsandro ocupa a posição de “disciplina” dentro da facção, enquanto o réu Ronaldo exerce papel de comando. O próprio réu Thiago confessou que auxiliava a facção em atividades criminosas, como o armazenamento de drogas e suporte logístico, além de ter admitido sua participação em um homicídio sob ordens do réu Ronaldo. Ressalte-se ainda que o réu Ronaldo é reincidente específico, ou seja, possui condenação pretérita pelo crime de tráfico, conforme consta na execução penal n.º 0005415-48.2014.8.11.0015 (SEEU). Diante desses elementos, resta claro que os réus não preenchem os requisitos necessários para a aplicação do privilégio previsto no §4° do artigo 33, uma vez que a vinculação com organização criminosa e a dedicação a atividades ilícitas são impeditivos para a concessão da referida causa de diminuição de pena. II.3 - DO CRIME DE POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO E DE MUNIÇÕES DE USO RESTRITO [...] Por sua vez, a materialidade e autoria delitiva restaram devidamente comprovadas nos autos por meio do auto de prisão em flagrante delito (id. 138916124), boletim de ocorrência (id. 138916211), termo de exibição e apreensão (id. 138916128), laudo de deficiência das armas apreendidas (id. 138916520), além dos depoimentos prestados pelas testemunhas e interrogatório dos acusados em juízo. [...] O concurso de agentes no crime de posse de arma é aplicável quando a posse é compartilhada e os envolvidos se beneficiam da guarda em conjunto. No caso em questão, o revólver, apesar de pertencer ao réu Alexsandro, estava acessível aos outros ocupantes da residência. Diante do exposto, restam comprovadas a materialidade e a autoria do crime de posse ilegal de arma de fogo de uso restrito, sendo a condenação dos réus medida que se impõe. [...] IV – DOSIMETRIA IV.1 – DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS EM RELAÇÃO AO RÉU ALEXSANDRO SANCHEZ DA SILVA [...] Terceira fase: não concorrem, ainda, causas de aumento ou diminuição de pena, razão pela qual torno definitiva ao condenado a pena de 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. IV.2 – DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS EM RELAÇÃO AO RÉU RONALDO PEDRO DA SILVA Primeira fase: analisando o artigo 59 do Código Penal em relação ao réu, vê-se, dos elementos de prova constantes dos autos, que [...] o réu possui quatro registros de condenações definitivas, em regime de execução (PEP n.º 0005415-48.2014.8.11.0015), logo, a presença de múltiplas reincidências permite o julgador a considerar uma delas na primeira fase da dosimetria, para o aumento da pena-base, e outra na segunda fase, como circunstância agravante, de modo que valoro tal circunstancia como negativa; [...] Inexistindo circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena-base em 6 (seis) anos e 3 (três) meses de reclusão e 625 (seiscentos e vinte e cinco) dias-multa. Segunda fase: reconheço a agravante de reincidência, prevista no artigo 61, inciso I, do Código Penal, em razão da execução penal n.º 0005415-48.2014.8.11.0015, considerando a multirreincidência do réu. Não havendo circunstâncias atenuantes a serem aplicadas, fixo a pena intermediária em 7 (sete) anos e 11 (onze) meses de reclusão e 791 (setecentos e noventa e um) dias-multa. Terceira fase: não concorrem, ainda, causas de aumento ou diminuição de pena, razão pela qual torno definitiva ao condenado a pena de 7 (sete) anos e 11 (onze) meses de reclusão e 791 (setecentos e noventa e um) dias-multa. IV.3 – DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS EM RELAÇÃO AO RÉU THIAGO GOMES VICENTE COSTA [...] Inexistindo circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena-base em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. Segunda fase: não há circunstâncias agravantes a serem consideradas. Por outro lado, verifico a presença da atenuante de confissão espontânea realizada em juízo, conforme dispõe o artigo 65, inciso III, alínea “d”, do Código Penal. Todavia, em atenção à S. 231 do STJ, mantenho a pena intermediária em 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. Terceira fase: não concorrem, ainda, causas de aumento ou diminuição de pena, razão pela qual torno definitiva ao condenado a pena de 5 (cinco) anos de reclusão e 500 (quinhentos) dias-multa. IV.4 – DO CRIME POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO EM RELAÇÃO AO RÉU ALEXSANDRO SANCHEZ DA SILVA [...] Terceira fase: não concorrem, ainda, causas de aumento ou diminuição de pena, razão pela qual torno definitiva ao condenado a pena de 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa. IV.5 – DO CRIME POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO EM RELAÇÃO AO RÉU RONALDO PEDRO DA SILVA Primeira fase: analisando o artigo 59 do Código Penal em relação ao réu, vê-se, dos elementos de prova constantes dos autos, que [...] o réu possui quatro registros de condenações definitivas, em regime de execução (PEP n.º 0005415-48.2014.8.11.0015), logo, a presença de múltiplas reincidências permite o julgador a considerar uma delas na primeira fase da dosimetria, para o aumento da pena-base, e outra na segunda fase, como circunstância agravante, de modo que valoro tal circunstancia como negativa; [...] Inexistindo circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena-base em 3 (três) anos, 4 (quatro) meses e 15 (quinze) de reclusão e 53 (cinquenta e três) dias-multa. Segunda fase: reconheço a agravante de reincidência, prevista no artigo 61, inciso I, do Código Penal, em razão da execução penal n.º 0005415-48.2014.8.11.0015, considerando a multirreincidência do réu. Não havendo circunstâncias atenuantes a serem aplicadas, fixo a pena intermediária em 3 (três) anos, 11 (onze) meses e 7 (sete) dias de reclusão e 119 (cento e dezenove) dias-multa. Terceira fase: não concorrem, ainda, causas de aumento ou diminuição de pena, razão pela qual torno definitiva ao condenado a pena de 3 (três) anos, 11 (onze) meses e 7 (sete) dias de reclusão e 119 (cento e dezenove) dias-multa. IV.6 – DO CRIME POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO EM RELAÇÃO AO RÉU THIAGO GOMES VICENTE COSTA [...] Inexistindo circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena-base em 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Segunda fase: não há circunstâncias agravantes a serem consideradas. Por outro lado, verifico a presença da atenuante de confissão espontânea realizada em juízo, conforme dispõe o artigo 65, inciso III, alínea “d”, do Código Penal. Todavia, em atenção à S. 231 do STJ, mantenho a pena intermediária em 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa. Terceira fase: não concorrem, ainda, causas de aumento ou diminuição de pena, razão pela qual torno definitiva ao condenado a pena de 3 (três) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa. IV.3 – DA PENA DEFINITIVA Considerando que os delitos foram praticados em concurso material de crimes, somo as penas com a mesma natureza, mas deixo de fazê-lo em relação às penas diversas. Assim, em razão dos crimes em apreço, torno definitiva a pena em 8 (oito) anos de reclusão e 510 (quinhentos e dez) dias-multa aos réus ALEXSANDRO SANCHEZ DA SILVA e THIAGO GOMES VICENTE COSTA, e em 11 (onze) anos, 10 (dez) meses e 7 (sete) dias de reclusão e 910 (novecentos e dez) dias-multa ao réu RONALDO PEDRO DA SILVA, qualificados nestes autos, pelas infrações aos artigo 33, caput, da Lei n.º 11.343/2006 e artigo 16, caput, da Lei n.º 10.826/2003, em concurso material de crimes. Diante da ausência de maiores elementos sobre a condição financeira do réu, FIXO o valor do dia-multa em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente à época dos fatos, atualizado monetariamente quando da execução (artigo 49, §§ 1º e 2º, do Código Penal). Em face da quantidade das penas aplicadas, com fulcro no artigo 33, §2°, “a” e “b”, do Código Penal, FIXO o regime SEMIABERTO para o inicio do cumprimento da pena de reclusão aos réus ALEXSANDRO SANCHEZ DA SILVA e THIAGO GOMES VICENTE COSTA, e o regime inicial FECHADO para o cumprimento da pena de reclusão ao réu RONALDO PEDRO DA SILVA, o que é necessário e adequado aos acusados. [...] Nos termos do artigo 804 do Código de Processo Penal, CONDENO os acusados ao pagamento das custas processuais, calculadas ex lege. [...].” (Romeu da Cunha Gomes, juiz de Direito – ID 265554560) Pois bem. A materialidade do crime de tráfico está comprovada pelo: Termo de Exibição e Apreensão nº 2023.156.523827 (ID 265553846) e Laudo Pericial nº 552.3.10.9831.2023.153984-A01 (ID 265554294), Laudo pericial nº 552.2.13.9831.2023.154041-A01 (ID 265554295). Na fase policial, foram ouvidos Vinicius Ramon Aguiar e Carlos Eduardo Virgílio Oliveira, ambos investigadores de polícia (IDs 265553843 e 265553845), Mariana Carvalho Trombeta, informante (ID 265554269), Alexsandro Sanchez da Silva, corréu (ID 265554264), THIAGO GOMES VICENTE COSTA e RONALDO PEDRO DA SILVA, apelantes (IDs 265554250 e 265554257). Em Juízo, colheram-se as declarações de Vinicius Ramon Aguiar, Carlos Eduardo Virgílio Oliveira, Robenilson Ferreira Barros, Benedito Verissimo Da Costa Neto, todos investigadores de polícia, Mariana Carvalho Trombeta, informante, bem como o interrogatório dos apelantes e do corréu (Mídias - IDs 265554468 e 265554528). Dito isso, vejamos. Do tráfico de drogas: Os investigadores de Polícia que efetuaram a prisão em flagrante dos apelantes [Vinicius Ramon Aguiar, Carlos Eduardo Virgílio Oliveira e Benedito Veríssimo da Costa], relataram, em ambas as fases da persecução penal, de forma coesa e convergente, que no dia 20 de dezembro de 2024, durante monitoramento, avistaram os apelantes e Alexsandro Sanchez da Silva na área externa da residência. Ao se aproximarem, visualizaram, por meio da porta entreaberta da casa, um volume suspeito sobre a geladeira, o que motivou o ingresso imediato no imóvel. No interior da residência, localizaram uma balança de precisão, 10 porções de maconha (totalizando 139,42g), 4 porções de cocaína (totalizando 110,57g), além de um revólver calibre .38 e uma garrucha calibre .22, municiados e dispostos em locais de fácil acesso. As narrativas dos referidos agentes policiais são convergentes e revelam que: 1) a diligência foi motivada por investigação prévia acerca do envolvimento de THIAGO GOMES VICENTE COSTA com facção criminosa ligada a crimes graves como sequestro, homicídio e ocultação de cadáver; 2) durante o monitoramento, os agentes identificaram os apelantes e o corréu Alexsandro Sanchez da Silva na área externa da residência; 3) ao se aproximarem, visualizaram, através da porta entreaberta, um volume suspeito sobre a geladeira, circunstância que ensejou a entrada no imóvel; 4) no interior da casa, localizaram uma balança de precisão e substâncias entorpecentes fracionadas e embaladas [maconha e cocaína], de maneira a evidenciar a prática do tráfico de entorpecentes, bem como duas armas de fogo e munições prontamente acessíveis. Além disso, o apelante THIAGO GOMES VICENTE COSTA admitiu que as drogas estavam na residência e que foram levadas por RONALDO PEDRO DA SILVA, vindo de Juína, e por Alexsandro Sanchez da Silva, vindo de Brasnorte. Esclareceu que, embora não soubesse a localização exata do entorpecente na casa, todos possuíam conhecimento sobre os entorpecentes e as armas. Com efeito, a “confissão feita no inquérito policial, embora retratada em juízo, tem valor probatório sempre que confirmada por outros elementos de prova” (TJMT, Enunciado Criminal 11). Noutro giro, a forma de acondicionamento da maconha – 10 porções médias [139,42g] – e da pasta-base de cocaína – 4 porções [110,57g] – somada à apreensão de balança de precisão permite aferir a destinação mercantil dos entorpecentes apreendidos (TJMT, AP nº 1000305-37.2021.8.11.0005). Nesse tipo de comercialização ilícita, a movimentação financeira pode ser significativa após a fragmentação em porções individuais, pois a maconha “pode render até 500% de lucro em comparação ao preço pelo qual os traficantes adquirem a droga” (FERNANDES, Liva. A problemática da droga no telejornalismo brasileiro - uma análise da série de reportagens “O avanço da maconha” do Jornal da Band. Disponível em: portalintercom.org.brf). Frisem-se que as quantidades apreendidas [110,57g pasta-base de cocaína e 139,42g de maconha] também se mostram compatíveis com a traficância, visto que a pasta-base poderia ser diluída, sendo capaz de atingir ao menos 10 (dez) vezes o seu peso [resultando em 1.1kg de cocaína pura], enquanto a maconha permitiria a confecção de aproximadamente 140 (cento e quarenta) cigarros, considerada a quantia de 1g (um grama) por cigarro, segundo informação técnica n. 023/2013 do SETEC da Superintendência Regional da Polícia Federal no Estado do Rio Grande do Sul acerca da massa média de maconha por “baseado” (disponível em: https://site.mppr.mp.br/). Registre-se que o apelante [RONALDO PEDRO DA SILVA] possui outras duas condenações definitivas por tráfico de drogas (PJe NU 0016630-50.2016.8.11.0015, transitada em julgado em 12.3.2018, e PJe NU 0000331-70.2013.8.11.0025, transitada em julgado em 12.8.2015), a demonstrar que não se trata de fato isolado em sua vida. Em suma, as declarações coerentes dos agentes policiais responsáveis pelas investigações e flagrante, em harmonia com as demais provas [apreensão de drogas variadas, balança de precisão e armas de fogo], são suficientes para caracterizar tráfico de substâncias entorpecentes (TJMT, Enunciado Criminal 8), o qual “classifica-se como crime de ação múltipla ou misto alternativo e, portanto, consuma-se com a prática de qualquer das condutas nele descritas” (TJMT, Enunciado Criminal 7). Ademais, os depoimentos seguros e coerentes dos agentes policiais, prestados sob o crivo do contraditório, “são idôneos para sustentar a condenação criminal” (TJMT, Enunciado Criminal 8) por tráfico de drogas, o qual “classifica-se como crime de ação múltipla ou misto alternativo e, portanto, consuma-se com a prática de qualquer das condutas nele descritas” (TJMT, Enunciado Criminal 7). Da posse ilegal de arma de fogo de uso restrito: As declarações dos investigadores de polícia [Vinicius Ramon Aguiar, Carlos Eduardo Virgílio Oliveira e Benedito Veríssimo da Costa] são uniformes e precisas no sentido de que visualizaram, por meio da porta entreaberta da casa, um volume suspeito sobre a geladeira, o que motivou o ingresso imediato no imóvel, sendo que o objeto tratava-se de um revólver calibre .38 de forma visível para todos e, em buscas, foi localizada mais uma garrucha calibre .22, na bolsa de Alexsandro Sanchez da Silva, também municiada. Em seu interrogatório, Alexsandro Sanchez da Silva confessou ser o proprietário das armas apreendidas, relatando que as trouxe de Brasnorte na mala de sua companheira, sem o conhecimento dela. Afirmou ter adquirido o revólver calibre .38 por meio de troca por uma motocicleta e que a garrucha calibre .22 já estava em sua posse há alguns dias, com intenção de vendê-la. Confirmou, ainda, perante o Ministério Público, que ambas as armas eram de sua propriedade. Por sua vez, THIAGO GOMES VICENTE COSTA declarou que Alexsandro Sanchez da Silva portava a garrucha e que o revólver calibre .38 foi levado por RONALDO PEDRO DA SILVA, o qual, ao chegar, retirou a arma da cintura e a colocou sobre a geladeira. As assertivas dos apelantes no sentido de que desconheciam a origem da arma não se apresentam verossímeis ao considerar a localização do revólver calibre .38 na residência [em cima da geladeira], em local visível e de fácil acesso a todos, notadamente porque a arma estava municiada, ou seja, pronta para uso. Saliente-se que o porte ilegal de arma de fogo de uso permitido é crime de perigo abstrato e de mera conduta, consumado pelo simples fato de estar na posse ou porte de arma de fogo, munição ou acessório (STJ, AgRg no AREsp nº 1670055/SP – Relator Min. Rogério Schietti Cruz – 18.5.2021) e “não se exige qualidade especial do sujeito ativo” do crime de porte/posse ilegal de arma, de modo que se admite o concurso de agentes “não se revelando plausível o entendimento pelo qual apenas aquele que efetivamente porta a arma de fogo incorre nas penas”, logo, “ainda que apenas um dos agentes esteja portando a arma de fogo, é possível que os demais tenham concorrido de qualquer forma para a prática delituosa [...] nos termos do artigo 29 do Código Penal” (STJ, HC 198186/RJ- Relator: Min. Jorge Mussi – j.17.12.2013). Por sua vez, “o crime de posse ou porte ilegal de arma de fogo é crime de mão própria, que só pode ser cometido por um único agente, exceto quando a arma está fisicamente disponível a outros indivíduos, o que se denomina ‘composse ou posse compartilhada’ [...]” (TRF-4, ACR nº 352244620074047100 - Relator: Des. Federal Márcio Antônio Rocha – j. 22.4.2013), o que se observa no caso, pois a arma de fogo estava acessível a todos os apelantes. Noutro giro, o porte compartilhado configura-se quando o armamento estiver apto ao uso de qualquer um dos agentes e cada um deles tiver disponibilidade imediata de acesso à arma (STJ, AREsp 1267812 – Relatora Minª. Maria Thereza de Assis Moura - 10.4.2018). Aplicam-se os seguintes julgados: “[...] as circunstâncias em que a prisão dos acusados foi efetuada evidenciam que o porte da arma de fogo apreendida era compartilhado [...]” (STJ,HC nº 352523/SC - Relator: Min. Ribeiro Dantas - 20.2.2018) “Se a autoria do crime de porte irregular de arma de fogo [...] foi devidamente comprovada pelos testemunhos idôneos dos policiais, responsáveis pela prisão do réu e apreensão da arma, não merece qualquer tipo de retoque o édito condenatório ante a satisfatoriedade do contexto probatório.” (TJMT, AP nº 0015031-81.2017.8.11.0002 - Relator: Des. Paulo da Cunha – Primeira Câmara Criminal 10.8.2018) Logo, as pretensões absolutórias afiguram-se improcedentes. Enfim, a análise sobre a hipossuficiência econômica [isenção de custas] cabe ao Juízo da Execução Penal, por ser a fase processual oportuna para se aferir a real situação financeira do infrator (TJMT, AP nº 0010448-13.2018.8.11.0004 - Relator: Des. Gilberto Giraldelli – Terceira Câmara Criminal- 7.5.2025). No que tange ao prequestionamento, os seus preceitos normativos foram observados e integrados à fundamentação, muito embora seja “desnecessário que o julgador esmiúce cada um dos argumentos e dispositivos legais tidos por violados, bastando que esclareça os motivos que o levaram à determinada conclusão” (TJDFT, RESE nº 20120510091147 – Rel. Des. João Batista Teixeira - 26.11.2013). Consequentemente, não deve ser conhecida. Com essas considerações, recursos parcialmente conhecidos, mas DESPROVIDOS. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 16/07/2025

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Ipiranga Produtos De Petroleo S.A. x Ipiranga Produtos De Petroleo S.A.

ID: 316726824

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: APELAçãO / REMESSA NECESSáRIA Nº Processo: 0006895-46.2015.8.11.0041

Data de Disponibilização: 04/07/2025

Polo Ativo:

IPIRANGA PRODUTOS DE PETROLEO S.A.

Polo Passivo:

IPIRANGA PRODUTOS DE PETROLEO S.A.

Acórdão

Advogados:

MARIA LUCIA FERREIRA TEIXEIRA

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 0006895-46.2015.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (1728) Assunto: [ICMS/ Imposto … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 0006895-46.2015.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (1728) Assunto: [ICMS/ Imposto sobre Circulação de Mercadorias, Capacidade Tributária] Relator: Des(a). DEOSDETE CRUZ JUNIOR Turma Julgadora: [DES(A). DEOSDETE CRUZ JUNIOR, DES(A). MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, DES(A). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA] Parte(s): [IPIRANGA PRODUTOS DE PETROLEO S.A. - CNPJ: 33.337.122/0001-27 (APELANTE), MARIA LUCIA FERREIRA TEIXEIRA - CPF: 851.633.257-87 (ADVOGADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0001-44 (APELADO), GERSON VALERIO POUSO - CPF: 452.942.161-91 (ADVOGADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (APELADO), IPIRANGA PRODUTOS DE PETROLEO S.A. - CNPJ: 33.337.122/0001-27 (APELADO), MARIA LUCIA FERREIRA TEIXEIRA - CPF: 851.633.257-87 (ADVOGADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO E RATIFICARAM A SENTENÇA. PARTICIPARAM DO JULGAMENTO O EXCELENTÍSSIMO SR. DES. RELATOR DEOSDETE CRUZ JÚNIOR, 1º VOGAL EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA E 2ª VOGAL EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO. E M E N T A DIREITO TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. ICMS. AUTO DE INFRAÇÃO POR DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO ACESSÓRIA. DECADÊNCIA. CONVÊNIOS ICMS. MULTA SUPERIOR A 100%. REDUÇÃO PARA 80% DO TRIBUTO. CONFISCATORIEDADE. RAZOABILIDADE. RECURSOS DESPROVIDOS. I. CASO EM EXAME 1. Apelações cíveis interpostas pelo Estado de Mato Grosso e pela empresa Ipiranga Produtos de Petróleo S.A., em face de sentença que julgou parcialmente procedente pedido formulado em Ação Anulatória de Débito Fiscal, ajuizada pela empresa autora contra o ente estadual, com o objetivo de anular débito tributário decorrente de Auto de Infração n. 1227530010000652007-18, relativo ao ICMS e à multa por omissão na entrega de informações fiscais acessórias. A sentença reconheceu a legalidade do lançamento e afastou a decadência, mas reduziu a multa aplicada para o patamar de 80% do tributo exigido, com base na legislação estadual, reconhecendo a parcial procedência do pedido inicial e fixando sucumbência recíproca. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há três questões em discussão: (i) definir se houve decadência do direito de constituir o crédito tributário; (ii) estabelecer se a autuação fiscal se fundamentou indevidamente em norma inaplicável ao período autuado; (iii) determinar se a multa aplicada possui caráter confiscatório e se a redução para 80% do valor do imposto é juridicamente adequada. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A constituição do crédito tributário mediante lançamento de ofício, em decorrência do descumprimento de obrigação acessória, atrai a incidência do prazo decadencial previsto no art. 173, I, do CTN, e não o do art. 150, §4º, aplicável apenas em casos de pagamento antecipado integral e tempestivo. 4. A autuação não se baseou exclusivamente no Convênio ICMS 54/2002, mas também no Convênio ICMS 03/1999 e em dispositivos do RICMS/MT (arts. 308-A e 308-D), todos válidos e vigentes à época dos fatos, o que afasta a alegação de nulidade do lançamento. 5. A ausência de entrega dos documentos fiscais é incontroversa e configura infração formal apurável por lançamento de ofício, conforme os arts. 113, §2º, e 114 do CTN. 6. A multa originalmente superior a 100% do valor do imposto possui caráter confiscatório, conforme jurisprudência do STF e do TJMT, sendo legítima a sua redução para o patamar de 80%, nos termos do art. 45, I, “i”, da Lei Estadual n.º 7.098/98, em respeito aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. 7. A fixação da sucumbência recíproca está em conformidade com o art. 86 do CPC, diante da procedência parcial do pedido. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recursos desprovidos. Tese de julgamento: 1. O lançamento de ofício decorrente do descumprimento de obrigação acessória sujeita-se ao prazo decadencial previsto no art. 173, I, do CTN. 2. A existência de fundamento normativo diverso e válido para a exigência fiscal afasta a alegação de inaplicabilidade de convênio estadual. 3. Multa fiscal superior a 100% do tributo possui caráter confiscatório e deve ser reduzida a patamar razoável, observando-se o limite legal previsto em lei estadual. R E L A T Ó R I O Cuida-se de recursos de apelação cível interpostos, de um lado, pelo ESTADO DE MATO GROSSO e, de outro, pela empresa IPIRANGA PRODUTOS DE PETRÓLEO S.A., ambos insurgindo-se, nos pontos que lhes foram desfavoráveis, contra sentença prolatada pelo douto Juízo da 1ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá-MT, nos autos da Ação Anulatória de Débito Fiscal ajuizada pela referida empresa em face do ente estatal. Na origem, a autora, Ipiranga Produtos de Petróleo S.A., pretendeu a anulação de débito fiscal referente a ICMS e multa oriundos do Auto de Infração n. 1227530010000652007-18, relativo ao período fiscal de 2002. A autuação fundamentou-se na suposta omissão no envio de informações acessórias (Anexos III, IV e V) previstas nos Convênios ICMS 138/2001 e 54/2002, bem como em dispositivos do RICMS/MT (artigos 308-A e 308-D). Alegou, ainda, a ocorrência da decadência do direito do Fisco de constituir o crédito tributário, sustentando que o lançamento fora realizado fora do prazo quinquenal previsto no artigo 150, §4º, do CTN, bem como a inaplicabilidade do Convênio ICMS 54/02, haja vista sua vigência apenas a partir de setembro de 2002, enquanto os fatos geradores ocorreram em julho do mesmo ano. Sustentou, ainda, a inconstitucionalidade da multa aplicada, por suposto caráter confiscatório e por exceder o valor do próprio tributo devido. (Id. 282479361 fls. 07-29). O Estado de Mato Grosso, por sua vez, apresentou contestação defendendo a inexistência de decadência, sob a tese de que se trata de lançamento de ofício, hipótese em que incide a regra do artigo 173, I, do CTN, cujo prazo conta-se do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado. Defendeu, ainda, a validade da autuação, a correta aplicação das penalidades previstas no artigo 45, I, “i” da Lei Estadual nº 7.098/98, bem como a plena constitucionalidade da multa aplicada. Sobreveio sentença, em que o togado singular, em suma, afastou a tese de decadência, reconhecendo como correta a aplicação do prazo decadencial previsto no artigo 173, I, do CTN, contudo acolheu parcialmente o pedido inicial para reconhecer a ilegalidade da multa aplicada na medida em que ultrapassou o valor do imposto devido, determinando sua fixação no patamar de 80% (oitenta por cento) do imposto, com fundamento no artigo 45, I, “i” da Lei nº 7.098/98. Ratificou a tutela cautelar anteriormente concedida, mantendo a suspensão da exigibilidade do crédito tributário até a correção da penalidade. Por fim, houve o reconhecimento da sucumbência recíproca, com a condenação de ambas as partes ao pagamento proporcional das custas processuais e honorárias advocatícias. (Id. 282479389). Inconformadas, ambas as partes interpuseram apelação. A autora insiste na nulidade integral do auto de infração, defendendo que, reconhecida a inaplicabilidade do Convênio ICMS 54/02 ao período autuado, deveria ter sido anulado todo o lançamento fiscal. Reitera a tese de decadência do crédito tributário, aduzindo que a exigência decorre de tributo sujeito a lançamento por homologação, hipótese em que incide o artigo 150, §4º, do CTN, e não o artigo 173, I. Por fim, insiste na tese da inconstitucionalidade da multa aplicada, sustentando seu caráter confiscatório e desproporcional. (Id. 282479851). O Estado, por sua vez, requer a reforma da sentença quanto à redução da multa, sustentando que a penalidade aplicada observou o disposto no art. 45, I, "i", da Lei Estadual n. 7.098/98 e que sua fixação em 80% não alteraria o valor originalmente lançado. Com os autos regularmente processados, subiram a este Sodalício, por força dos recursos voluntários interpostos por ambas as partes, não havendo, na hipótese, incidência de remessa necessária, tendo em vista que o valor da causa não ultrapassa o limite previsto no artigo 496, §3º, inciso I, do CPC. Recursos tempestivos (Id. 282479856). Recurso da autora, devidamente preparado (Id. 282479853), enquanto que o recurso promovido pelo Ente Público é isento de custas em conformidade com a lei regulamentadora (Id. 2827661395). Convocada a manifestar nos autos, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer exarado nos autos, da lavra do ilustre Procurador de Justiça Marcelo Ferra Carvalho, manifestou-se pela ausência de interesse público ou social qualificado que justificasse sua intervenção, nos termos dos artigos 127 da Constituição Federal, 176 e 178 do Código de Processo Civil, abstendo-se, portanto, de emitir manifestação sobre o mérito recursal. (Id. 284261883). Após, vieram-me os autos à conclusão em observância às normas regimentais. É o relatório. Decido. V O T O R E L A T O R Como relatado, trata-se de recursos de apelação cível interpostos por IPIRANGA PRODUTOS DE PETRÓLEO S.A. e pelo ESTADO DE MATO GROSSO contra sentença proferida nos autos da ação anulatória de débito fiscal, oriunda do Juízo da 1ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá, que, em síntese, julgou parcialmente procedente o pedido para afastar, em parte, a exigibilidade da multa aplicada no Auto de Infração nº 1227530010000652007-18, mantendo, contudo, a higidez da exigência principal de ICMS, bem como parte da penalidade, nos termos ali especificados. A controvérsia gira em torno da legalidade do lançamento de crédito tributário decorrente do não cumprimento de obrigação acessória relativa à entrega de documentos fiscais no âmbito da sistemática de substituição tributária do ICMS, bem como da proporcionalidade da multa aplicada. Analiso, pois, a controvérsia submetida à nossa apreciação. De início, cumpre afastar a preliminar suscitada pela apelante IPIRANGA PRODUTOS DE PETRÓLEO S.A., relativa à decadência do crédito tributário. É incontroverso nos autos que a constituição do crédito tributário se deu por meio de lançamento de ofício, em razão da omissão da contribuinte na entrega de obrigações acessórias, o que afasta a aplicação do art. 150, §4º, do Código Tributário Nacional. A sentença corretamente rejeitou a tese de decadência, reconhecendo a incidência do art. 173, I, do Código Tributário Nacional, por se tratar de lançamento de ofício. Tal posicionamento está em consonância com a jurisprudência deste Egrégio Tribunal e também com o entendimento consolidado no Superior Tribunal de Justiça. De fato, mesmo diante de eventual pagamento parcial, a ausência de adimplemento integral e tempestivo da obrigação tributária atrai a regra do art. 173, I, do CTN. “O lançamento de ofício se submete à regra do art. 173, I, do CTN, ainda que tenha ocorrido pagamento parcial do tributo. Isso porque o pagamento antecipado, a que alude o art. 150, §4º, do CTN, deve ser integral e tempestivo” (TJMT, Apelação Cível n. 1000129-27.2021.8.11.0005, Rel. Des. Luiz Octavio Oliveira Saboia Ribeiro, j. 25/06/2024). “Na hipótese de inadimplemento do tributo sujeito ao lançamento por homologação no exercício competente, a contagem da decadência segue o art. 173, I, do CTN” (TJMT, AgRg Cível n. 1025652-44.2022.8.11.0003, Rel. Des. Anglizey Solivan de Oliveira, j. 10/04/2025). “A decadência tributária, nos casos de descumprimento de obrigação acessória com lançamento de ofício, deve observar o prazo de 5 anos contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado” (TJMT, ApC n. 1001154-27.2022.8.11.0020, Rel. Des. Luiz Octavio Oliveira Saboia Ribeiro, j. 19/11/2024). No caso concreto, o auto de infração refere-se ao período fiscal de julho de 2002, e o lançamento foi realizado em 2007, ou seja, dentro do prazo decadencial quinquenal previsto no art. 173, I, do CTN. Assim, correta a sentença ao afastar a alegação de decadência. Quanto à alegação da autora/apelante relativa à inaplicabilidade do Convênio ICMS nº 54/2002, igualmente não prospera. Embora sustente que a exigência se fundou em obrigação acessória prevista naquele convênio, cuja vigência iniciou-se apenas em 1º de setembro de 2002, verifica-se dos autos que a autuação baseou-se na Cláusula 19ª do Convênio ICMS nº 03/1999, e nos artigos 308-A e 308-D do RICMS/MT, os quais já impunham, à época, a obrigação de prestar informações relativas às operações interestaduais com destinatários localizados neste Estado. Ademais, a ausência da entrega dos documentos fiscais é fato incontroverso, tanto que a própria autora, em sua defesa, reconhece não tê-los apresentado, sob o argumento de que o prazo legal de cinco anos já estaria exaurido. Trata-se, portanto, de infração formal, cuja sanção está legitimamente prevista em lei e é passível de apuração por meio de lançamento de ofício, nos termos dos arts. 113, §2º, e 114 do CTN. A sentença também observou que a exigência do imposto decorreu da constatação de operações não declaradas, sujeitas à tributação normal pelo ICMS, independentemente da obrigação acessória eventualmente descumprida. Assim, não há nulidade a ser reconhecida no lançamento, tampouco qualquer ilegalidade na exigência do tributo. No que tange à multa aplicada, a controvérsia reside na análise da sua legalidade e constitucionalidade. O Estado sustenta que a sentença reduziu indevidamente a multa para 80%, que já corresponderia ao valor previsto no art. 45, I, “i” da Lei n.º 7.098/98. A autora, por outro lado, sustenta que a sanção possui natureza confiscatória. Nenhuma das alegações merece prosperar. A multa originalmente aplicada era superior a 100% do valor do tributo, e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é clara ao reconhecer o caráter confiscatório apenas das multas punitivas superiores a 100%: “(...) Esta Corte tem entendido que são confiscatórias aquelas que ultrapassam o percentual de 100% do valor do tributo devido (...)” (STF, Primeira Turma, ARE 905685/GO AgR segundo, rel. Min. Roberto Barroso, DJe 08/11/2018). No campo da jurisprudência deste Sodalício, Destaco: “AGRAVO REGIMENTAL – APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA – IMPOSIÇÃO DE MULTA POR DESCUMPRIMENTO DE DEVERES INSTRUMENTAIS EM VALOR SUPERIOR AO DO IMPOSTO – CARÁTER CONFISCATÓRIO CONFIGURADO – REDUÇÃO DA SANÇÃO – IMPERIOSIDADE. Evidenciado o caráter confiscatório da multa imposta por descumprimento de deveres instrumentais, impõe-se a redução em montante equivalente ao do imposto” (TJMT, AgRg Cível n. 1016533-76.2021.8.11.0041, j. 20/02/2024). Por outro lado, a redução da penalidade para 80% — valor expressamente previsto no art. 45, I, “i” da Lei Estadual n.º 7.098/98 — harmoniza-se com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, e não excede os limites constitucionais. Portanto, correta a modulação efetuada pela sentença. Por conseguinte, não se verifica qualquer vício que enseje a nulidade do lançamento, seja sob o prisma da decadência, seja sob a alegada inaplicabilidade de norma infralegal. Por fim, quanto à distribuição dos ônus sucumbenciais, verificando-se a procedência parcial dos pedidos, mostra-se adequada a fixação da sucumbência recíproca, nos termos do art. 86 do CPC, não havendo reparos a serem feitos. Diante de tais fundamentos, nego provimento a ambas às apelações, mantendo integralmente a sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 24/06/2025

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Ipiranga Produtos De Petroleo S.A. x Ipiranga Produtos De Petroleo S.A.

ID: 316726830

Tribunal: TJMT Órgão: Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo Classe: APELAçãO / REMESSA NECESSáRIA Nº Processo: 0006895-46.2015.8.11.0041

Data de Disponibilização: 04/07/2025

Polo Ativo:

IPIRANGA PRODUTOS DE PETROLEO S.A.

Polo Passivo:

IPIRANGA PRODUTOS DE PETROLEO S.A.

Acórdão

Advogados:

MARIA LUCIA FERREIRA TEIXEIRA

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 0006895-46.2015.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (1728) Assunto: [ICMS/ Imposto … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO Número Único: 0006895-46.2015.8.11.0041 Classe: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (1728) Assunto: [ICMS/ Imposto sobre Circulação de Mercadorias, Capacidade Tributária] Relator: Des(a). DEOSDETE CRUZ JUNIOR Turma Julgadora: [DES(A). DEOSDETE CRUZ JUNIOR, DES(A). MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO, DES(A). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA] Parte(s): [IPIRANGA PRODUTOS DE PETROLEO S.A. - CNPJ: 33.337.122/0001-27 (APELANTE), MARIA LUCIA FERREIRA TEIXEIRA - CPF: 851.633.257-87 (ADVOGADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0001-44 (APELADO), GERSON VALERIO POUSO - CPF: 452.942.161-91 (ADVOGADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (APELADO), IPIRANGA PRODUTOS DE PETROLEO S.A. - CNPJ: 33.337.122/0001-27 (APELADO), MARIA LUCIA FERREIRA TEIXEIRA - CPF: 851.633.257-87 (ADVOGADO), ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 03.507.415/0020-07 (APELANTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (CUSTOS LEGIS)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO E COLETIVO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). MARIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO E RATIFICARAM A SENTENÇA. PARTICIPARAM DO JULGAMENTO O EXCELENTÍSSIMO SR. DES. RELATOR DEOSDETE CRUZ JÚNIOR, 1º VOGAL EXMO. SR. DES. MÁRIO ROBERTO KONO DE OLIVEIRA E 2ª VOGAL EXMA. SRA. DESA. MARIA APARECIDA FERREIRA FAGO. E M E N T A DIREITO TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. ICMS. AUTO DE INFRAÇÃO POR DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO ACESSÓRIA. DECADÊNCIA. CONVÊNIOS ICMS. MULTA SUPERIOR A 100%. REDUÇÃO PARA 80% DO TRIBUTO. CONFISCATORIEDADE. RAZOABILIDADE. RECURSOS DESPROVIDOS. I. CASO EM EXAME 1. Apelações cíveis interpostas pelo Estado de Mato Grosso e pela empresa Ipiranga Produtos de Petróleo S.A., em face de sentença que julgou parcialmente procedente pedido formulado em Ação Anulatória de Débito Fiscal, ajuizada pela empresa autora contra o ente estadual, com o objetivo de anular débito tributário decorrente de Auto de Infração n. 1227530010000652007-18, relativo ao ICMS e à multa por omissão na entrega de informações fiscais acessórias. A sentença reconheceu a legalidade do lançamento e afastou a decadência, mas reduziu a multa aplicada para o patamar de 80% do tributo exigido, com base na legislação estadual, reconhecendo a parcial procedência do pedido inicial e fixando sucumbência recíproca. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há três questões em discussão: (i) definir se houve decadência do direito de constituir o crédito tributário; (ii) estabelecer se a autuação fiscal se fundamentou indevidamente em norma inaplicável ao período autuado; (iii) determinar se a multa aplicada possui caráter confiscatório e se a redução para 80% do valor do imposto é juridicamente adequada. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A constituição do crédito tributário mediante lançamento de ofício, em decorrência do descumprimento de obrigação acessória, atrai a incidência do prazo decadencial previsto no art. 173, I, do CTN, e não o do art. 150, §4º, aplicável apenas em casos de pagamento antecipado integral e tempestivo. 4. A autuação não se baseou exclusivamente no Convênio ICMS 54/2002, mas também no Convênio ICMS 03/1999 e em dispositivos do RICMS/MT (arts. 308-A e 308-D), todos válidos e vigentes à época dos fatos, o que afasta a alegação de nulidade do lançamento. 5. A ausência de entrega dos documentos fiscais é incontroversa e configura infração formal apurável por lançamento de ofício, conforme os arts. 113, §2º, e 114 do CTN. 6. A multa originalmente superior a 100% do valor do imposto possui caráter confiscatório, conforme jurisprudência do STF e do TJMT, sendo legítima a sua redução para o patamar de 80%, nos termos do art. 45, I, “i”, da Lei Estadual n.º 7.098/98, em respeito aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. 7. A fixação da sucumbência recíproca está em conformidade com o art. 86 do CPC, diante da procedência parcial do pedido. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recursos desprovidos. Tese de julgamento: 1. O lançamento de ofício decorrente do descumprimento de obrigação acessória sujeita-se ao prazo decadencial previsto no art. 173, I, do CTN. 2. A existência de fundamento normativo diverso e válido para a exigência fiscal afasta a alegação de inaplicabilidade de convênio estadual. 3. Multa fiscal superior a 100% do tributo possui caráter confiscatório e deve ser reduzida a patamar razoável, observando-se o limite legal previsto em lei estadual. R E L A T Ó R I O Cuida-se de recursos de apelação cível interpostos, de um lado, pelo ESTADO DE MATO GROSSO e, de outro, pela empresa IPIRANGA PRODUTOS DE PETRÓLEO S.A., ambos insurgindo-se, nos pontos que lhes foram desfavoráveis, contra sentença prolatada pelo douto Juízo da 1ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá-MT, nos autos da Ação Anulatória de Débito Fiscal ajuizada pela referida empresa em face do ente estatal. Na origem, a autora, Ipiranga Produtos de Petróleo S.A., pretendeu a anulação de débito fiscal referente a ICMS e multa oriundos do Auto de Infração n. 1227530010000652007-18, relativo ao período fiscal de 2002. A autuação fundamentou-se na suposta omissão no envio de informações acessórias (Anexos III, IV e V) previstas nos Convênios ICMS 138/2001 e 54/2002, bem como em dispositivos do RICMS/MT (artigos 308-A e 308-D). Alegou, ainda, a ocorrência da decadência do direito do Fisco de constituir o crédito tributário, sustentando que o lançamento fora realizado fora do prazo quinquenal previsto no artigo 150, §4º, do CTN, bem como a inaplicabilidade do Convênio ICMS 54/02, haja vista sua vigência apenas a partir de setembro de 2002, enquanto os fatos geradores ocorreram em julho do mesmo ano. Sustentou, ainda, a inconstitucionalidade da multa aplicada, por suposto caráter confiscatório e por exceder o valor do próprio tributo devido. (Id. 282479361 fls. 07-29). O Estado de Mato Grosso, por sua vez, apresentou contestação defendendo a inexistência de decadência, sob a tese de que se trata de lançamento de ofício, hipótese em que incide a regra do artigo 173, I, do CTN, cujo prazo conta-se do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado. Defendeu, ainda, a validade da autuação, a correta aplicação das penalidades previstas no artigo 45, I, “i” da Lei Estadual nº 7.098/98, bem como a plena constitucionalidade da multa aplicada. Sobreveio sentença, em que o togado singular, em suma, afastou a tese de decadência, reconhecendo como correta a aplicação do prazo decadencial previsto no artigo 173, I, do CTN, contudo acolheu parcialmente o pedido inicial para reconhecer a ilegalidade da multa aplicada na medida em que ultrapassou o valor do imposto devido, determinando sua fixação no patamar de 80% (oitenta por cento) do imposto, com fundamento no artigo 45, I, “i” da Lei nº 7.098/98. Ratificou a tutela cautelar anteriormente concedida, mantendo a suspensão da exigibilidade do crédito tributário até a correção da penalidade. Por fim, houve o reconhecimento da sucumbência recíproca, com a condenação de ambas as partes ao pagamento proporcional das custas processuais e honorárias advocatícias. (Id. 282479389). Inconformadas, ambas as partes interpuseram apelação. A autora insiste na nulidade integral do auto de infração, defendendo que, reconhecida a inaplicabilidade do Convênio ICMS 54/02 ao período autuado, deveria ter sido anulado todo o lançamento fiscal. Reitera a tese de decadência do crédito tributário, aduzindo que a exigência decorre de tributo sujeito a lançamento por homologação, hipótese em que incide o artigo 150, §4º, do CTN, e não o artigo 173, I. Por fim, insiste na tese da inconstitucionalidade da multa aplicada, sustentando seu caráter confiscatório e desproporcional. (Id. 282479851). O Estado, por sua vez, requer a reforma da sentença quanto à redução da multa, sustentando que a penalidade aplicada observou o disposto no art. 45, I, "i", da Lei Estadual n. 7.098/98 e que sua fixação em 80% não alteraria o valor originalmente lançado. Com os autos regularmente processados, subiram a este Sodalício, por força dos recursos voluntários interpostos por ambas as partes, não havendo, na hipótese, incidência de remessa necessária, tendo em vista que o valor da causa não ultrapassa o limite previsto no artigo 496, §3º, inciso I, do CPC. Recursos tempestivos (Id. 282479856). Recurso da autora, devidamente preparado (Id. 282479853), enquanto que o recurso promovido pelo Ente Público é isento de custas em conformidade com a lei regulamentadora (Id. 2827661395). Convocada a manifestar nos autos, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer exarado nos autos, da lavra do ilustre Procurador de Justiça Marcelo Ferra Carvalho, manifestou-se pela ausência de interesse público ou social qualificado que justificasse sua intervenção, nos termos dos artigos 127 da Constituição Federal, 176 e 178 do Código de Processo Civil, abstendo-se, portanto, de emitir manifestação sobre o mérito recursal. (Id. 284261883). Após, vieram-me os autos à conclusão em observância às normas regimentais. É o relatório. Decido. V O T O R E L A T O R Como relatado, trata-se de recursos de apelação cível interpostos por IPIRANGA PRODUTOS DE PETRÓLEO S.A. e pelo ESTADO DE MATO GROSSO contra sentença proferida nos autos da ação anulatória de débito fiscal, oriunda do Juízo da 1ª Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá, que, em síntese, julgou parcialmente procedente o pedido para afastar, em parte, a exigibilidade da multa aplicada no Auto de Infração nº 1227530010000652007-18, mantendo, contudo, a higidez da exigência principal de ICMS, bem como parte da penalidade, nos termos ali especificados. A controvérsia gira em torno da legalidade do lançamento de crédito tributário decorrente do não cumprimento de obrigação acessória relativa à entrega de documentos fiscais no âmbito da sistemática de substituição tributária do ICMS, bem como da proporcionalidade da multa aplicada. Analiso, pois, a controvérsia submetida à nossa apreciação. De início, cumpre afastar a preliminar suscitada pela apelante IPIRANGA PRODUTOS DE PETRÓLEO S.A., relativa à decadência do crédito tributário. É incontroverso nos autos que a constituição do crédito tributário se deu por meio de lançamento de ofício, em razão da omissão da contribuinte na entrega de obrigações acessórias, o que afasta a aplicação do art. 150, §4º, do Código Tributário Nacional. A sentença corretamente rejeitou a tese de decadência, reconhecendo a incidência do art. 173, I, do Código Tributário Nacional, por se tratar de lançamento de ofício. Tal posicionamento está em consonância com a jurisprudência deste Egrégio Tribunal e também com o entendimento consolidado no Superior Tribunal de Justiça. De fato, mesmo diante de eventual pagamento parcial, a ausência de adimplemento integral e tempestivo da obrigação tributária atrai a regra do art. 173, I, do CTN. “O lançamento de ofício se submete à regra do art. 173, I, do CTN, ainda que tenha ocorrido pagamento parcial do tributo. Isso porque o pagamento antecipado, a que alude o art. 150, §4º, do CTN, deve ser integral e tempestivo” (TJMT, Apelação Cível n. 1000129-27.2021.8.11.0005, Rel. Des. Luiz Octavio Oliveira Saboia Ribeiro, j. 25/06/2024). “Na hipótese de inadimplemento do tributo sujeito ao lançamento por homologação no exercício competente, a contagem da decadência segue o art. 173, I, do CTN” (TJMT, AgRg Cível n. 1025652-44.2022.8.11.0003, Rel. Des. Anglizey Solivan de Oliveira, j. 10/04/2025). “A decadência tributária, nos casos de descumprimento de obrigação acessória com lançamento de ofício, deve observar o prazo de 5 anos contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado” (TJMT, ApC n. 1001154-27.2022.8.11.0020, Rel. Des. Luiz Octavio Oliveira Saboia Ribeiro, j. 19/11/2024). No caso concreto, o auto de infração refere-se ao período fiscal de julho de 2002, e o lançamento foi realizado em 2007, ou seja, dentro do prazo decadencial quinquenal previsto no art. 173, I, do CTN. Assim, correta a sentença ao afastar a alegação de decadência. Quanto à alegação da autora/apelante relativa à inaplicabilidade do Convênio ICMS nº 54/2002, igualmente não prospera. Embora sustente que a exigência se fundou em obrigação acessória prevista naquele convênio, cuja vigência iniciou-se apenas em 1º de setembro de 2002, verifica-se dos autos que a autuação baseou-se na Cláusula 19ª do Convênio ICMS nº 03/1999, e nos artigos 308-A e 308-D do RICMS/MT, os quais já impunham, à época, a obrigação de prestar informações relativas às operações interestaduais com destinatários localizados neste Estado. Ademais, a ausência da entrega dos documentos fiscais é fato incontroverso, tanto que a própria autora, em sua defesa, reconhece não tê-los apresentado, sob o argumento de que o prazo legal de cinco anos já estaria exaurido. Trata-se, portanto, de infração formal, cuja sanção está legitimamente prevista em lei e é passível de apuração por meio de lançamento de ofício, nos termos dos arts. 113, §2º, e 114 do CTN. A sentença também observou que a exigência do imposto decorreu da constatação de operações não declaradas, sujeitas à tributação normal pelo ICMS, independentemente da obrigação acessória eventualmente descumprida. Assim, não há nulidade a ser reconhecida no lançamento, tampouco qualquer ilegalidade na exigência do tributo. No que tange à multa aplicada, a controvérsia reside na análise da sua legalidade e constitucionalidade. O Estado sustenta que a sentença reduziu indevidamente a multa para 80%, que já corresponderia ao valor previsto no art. 45, I, “i” da Lei n.º 7.098/98. A autora, por outro lado, sustenta que a sanção possui natureza confiscatória. Nenhuma das alegações merece prosperar. A multa originalmente aplicada era superior a 100% do valor do tributo, e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é clara ao reconhecer o caráter confiscatório apenas das multas punitivas superiores a 100%: “(...) Esta Corte tem entendido que são confiscatórias aquelas que ultrapassam o percentual de 100% do valor do tributo devido (...)” (STF, Primeira Turma, ARE 905685/GO AgR segundo, rel. Min. Roberto Barroso, DJe 08/11/2018). No campo da jurisprudência deste Sodalício, Destaco: “AGRAVO REGIMENTAL – APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA – IMPOSIÇÃO DE MULTA POR DESCUMPRIMENTO DE DEVERES INSTRUMENTAIS EM VALOR SUPERIOR AO DO IMPOSTO – CARÁTER CONFISCATÓRIO CONFIGURADO – REDUÇÃO DA SANÇÃO – IMPERIOSIDADE. Evidenciado o caráter confiscatório da multa imposta por descumprimento de deveres instrumentais, impõe-se a redução em montante equivalente ao do imposto” (TJMT, AgRg Cível n. 1016533-76.2021.8.11.0041, j. 20/02/2024). Por outro lado, a redução da penalidade para 80% — valor expressamente previsto no art. 45, I, “i” da Lei Estadual n.º 7.098/98 — harmoniza-se com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, e não excede os limites constitucionais. Portanto, correta a modulação efetuada pela sentença. Por conseguinte, não se verifica qualquer vício que enseje a nulidade do lançamento, seja sob o prisma da decadência, seja sob a alegada inaplicabilidade de norma infralegal. Por fim, quanto à distribuição dos ônus sucumbenciais, verificando-se a procedência parcial dos pedidos, mostra-se adequada a fixação da sucumbência recíproca, nos termos do art. 86 do CPC, não havendo reparos a serem feitos. Diante de tais fundamentos, nego provimento a ambas às apelações, mantendo integralmente a sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 24/06/2025

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Processo nº 1008872-33.2025.8.11.0000

ID: 259238940

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1008872-33.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

ITAU UNIBANCO HOLDING S.A.

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JOSE CARLOS SKRZYSZOWSKI JUNIOR

OAB/MT XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008872-33.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Alienação Fiduciária, Efeitos, Busca e … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008872-33.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Alienação Fiduciária, Efeitos, Busca e Apreensão, Liminar] Relator: Des(a). MARCIO APARECIDO GUEDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS] Parte(s): [JOSE CARLOS SKRZYSZOWSKI JUNIOR - CPF: 040.837.379-21 (ADVOGADO), LUCIA KERKHOFF - CPF: 311.354.391-68 (AGRAVADO), ITAU UNIBANCO HOLDING S.A. - CNPJ: 60.872.504/0001-23 (AGRAVANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DEU PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CONSTITUIÇÃO EM MORA. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL ENCAMINHADA PARA O ENDEREÇO CONTRATUAL. PRESCINDIBILIDADE DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL. EXIGÊNCIA LEGAL ATENDIDA. REFORMA DA DECISÃO. PROVIMENTO DO RECURSO. I. A questão controvertida nos autos refere-se à exigência de intimação para emenda da petição inicial de busca e apreensão, com a finalidade de comprovação da constituição em mora da parte demandada. II. O Decreto-Lei nº 911/1969, em seu art. 3º, estabelece que a comprovação da mora é condição para a propositura da ação de busca e apreensão, podendo ser feita nos termos do §2º do art. 2º do mesmo diploma, ou seja, mediante carta registrada com aviso de recebimento, independentemente da assinatura do próprio destinatário. III. O Superior Tribunal de Justiça consolidou entendimento no sentido de que a notificação extrajudicial enviada ao endereço constante do contrato é suficiente para comprovar a mora, não sendo necessária a notificação pessoal do devedor. IV. Considerando que a agravante comprovou o envio da notificação ao endereço do contrato, restam atendidos os requisitos legais, sendo indevida a exigência de complementação da petição inicial, razão pela qual impõe-se a reforma da decisão agravada. V. Agravo de instrumento provido para afastar a determinação de emenda da inicial e determinar o regular processamento da ação de busca e apreensão. R E L A T Ó R I O Cuida-se de Recurso de AGRAVO DE INSTRUMENTO interposto por ITAU UNIBANCO HOLDING S.A. contra a decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Chapada dos Guimarães/MT, que nos autos da ação de “Busca e Apreensão” (Proc. nº 1000129-59.2025.8.11.0024), ajuizada pelo agravante contra LUCIA KERKHOFF, determinou a intimação da autora/agravante para, “no prazo de 15 (quinze) dias, emendar a petição inicial, de forma a demonstra a constituição e mora do réu, sob pena de indeferimento da inicial” (cf. Id. nº 185557277 dos autos de origem). A agravante sustenta que a notificação enviada para o endereço contratual é suficiente para suprir a exigência do art. 3º do Decreto-Lei nº 911/1969, já que a lei especial de regência não exige a notificação pessoal para fins de constituição do devedor em mora, daí porque é descabida e desnecessária a providência imposta pela decisão agravada, pois, mesmo que não tenha sido entregue nas mãos da agravada, mas tendo sido remetido para o endereço constante do contrato, o instrumento da notificação que já instrui os autos satisfaz perfeitamente a exigência legal em comento. Pede, sob esses fundamentos, o provimento do recurso para que, reformada a decisão, seja recebida a petição inicial e deferida a medida de liminar de busca e apreensão; de imediato, pede a concessão de efeito suspensivo (cf. Id. nº 276314380). Dispensada as contrarrazões à falta de angularização do feito. É o breve relatório. Cuiabá, data registrada no sistema. MARCIO APARECIDO GUEDES Relator V O T O R E L A T O R O art. 3º do Decreto-Lei nº 911/69 prevê que “o proprietário fiduciário ou credor poderá, desde que comprovada a mora, na forma estabelecida pelo § 2º do art. 2º, ou o inadimplemento, requerer contra o devedor ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente”, enquanto que o §2º do art. 2º estabelece que “a mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá ser comprovada por carta registrada com aviso de recebimento, não se exigindo que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário”; e, mesmo antes da alteração legislativa propiciada pela Lei nº 13.043/14, que incluiu a ressalva final do §2º do art. 2º acerca da desnecessidade da assinatura do destinatário à validade da notificação da mora, a orientação da jurisprudência nacional há muito pacificara o entendimento quanto à prescindibilidade de notificação pessoal do devedor para fins de válida comprovação da mora, sendo suficiente o envio da notificação ao endereço do contrato. Nesse sentido: “EMENTA: (...) NOTIFICAÇÃO DO DEVEDOR PARA A PURGAÇÃO DA MORA. EXIGÊNCIA ATENDIDA. CONCLUSÃO FIRMADA PELO ACÓRDÃO RECORRIDO COM BASE NAS PROVAS DOS AUTOS. REVISÃO DESSA PREMISSA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO IMPROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de ser necessária a comprovação da cientificação do devedor para purgação da mora, mediante notificação extrajudicial, realizada por carta registrada enviada por Cartório de Títulos e Documentos, entregue no domicílio do devedor, sendo prescindível a notificação pessoal.” (STJ - 3ª Turma - AgInt no AREsp 1108611/RJ – Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, julgamento em 17/10/2017, DJe 26/10/2017). “EMENTA: ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. BUSCA E APREENSÃO. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA DO DEVEDOR. NECESSIDADE. (...) 2. É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que, nos contratos de alienação fiduciária, para que ocorra a busca e apreensão do bem, a mora do devedor deve ser comprovada pelo protesto do título ou pela notificação extrajudicial, sendo necessária, nesse último caso, a efetiva entrega da notificação no endereço indicado pelo devedor. 3. Agravo regimental não provido.” (STJ - 3ª Turma - AgRg no AREsp 564.262/PR – Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, julgamento em 26/04/2016, DJe 09/05/2016) “EMENTA: (...). BUSCA E APREENSÃO. MORA. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA DO DEVEDOR. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL OU POR PROTESTO DO TÍTULO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. 'A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que, na alienação fiduciária, a mora do devedor deve ser comprovada pelo protesto do título ou pela notificação extrajudicial feita por intermédio do Cartório de Títulos e Documentos, entregue no endereço do domicílio do devedor' (AgRg no AREsp 41.319/RS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 03/09/2013, DJe 11/10/2013). 2. O Tribunal estadual firmou o entendimento de que não há prova do recebimento da notificação de constituição em mora do financiado, conclusão que não pode ser apreciada nesta Corte, ante o óbice contido na Súmula 7/STJ. 3. Agravo regimental não provido,” (STJ - 4ª Turma - AgRg no AREsp 512.316/RS - Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, julgamento em 26/8/2014, DJe 1º/9/2014) “EMENTA: (...). BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. MORA. NOTIFICAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. 1.- De acordo com a jurisprudência pacífica deste Tribunal é válida, para efeito de constituição em mora do devedor, a entrega da notificação em seu endereço, não se exigindo que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário, sendo imprescindível, todavia, a comprovação do efetivo recebimento, o que não ocorreu no caso.” (STJ - 3ª Turma - AgRg no REsp 1.358.155/SP - Rel. Ministro SIDNEI BENETI, julgamento em 25/6/2013, DJe 1º/8/2013) No caso, o ITAU UNIBANCO HOLDING S.A. instruiu os autos com o instrumento da notificação enviada, via carta com AR, para o exato endereço informado pelo réu/devedor no contrato de alienação fiduciária que aparelha a ação (contrato nº 395013576), a saber, “Est Rural 97, Jangada Roncado, Chapada dos Guimaraes/MT, CEP: 78195-000” (cf. Id. nº 181653007 e 181653008 dos autos de origem, respectivamente), reputando-se, portanto, válida e eficaz a comunicação assim realizada para a satisfação do requisito exigido pelo art. 2º, §2º, do Decreto-Lei nº 911/69, sendo despicienda a ordem de emenda da petição inicial contida na decisão ora agravada, inclusive porque o endereço do devedor deve ser fornecido pelo próprio sob os auspícios da boa-fé e da veracidade, inclusive, qualquer modificação subsequente deve ser comunicada ao credor. Cuidando-se de relação negocial sinalagmática, devem ser resguardadas as expectativas legítimas de todos os envolvidos na relação contratual, e, no caso, como houve compromisso jurídico moral assumido pelo devedor/agravado de que adimpliria regularmente as parcelas pactuadas na avença e que poderia ser encontrado no endereço que ele mesmo indicou ao credor no momento da formação do pacto, as correspondências/notificações serão (sempre) consideradas como validamente recebidas, ainda que por mera presunção, quando encaminhadas para o endereço que o contratante forneceu ao seu credor, sendo, pois, prescindível a assinatura do próprio devedor. A mora decorre do simples vencimento da dívida, mas, apenas por excesso de formalismo legal, para o ajuizamento de ação de busca e apreensão exige-se do credor que faça a prova da salinidade da água do mar, quer dizer, que reforce a comprovação evidente da mora pela remessa adicional de notificação formal ao solvens inadimplente; todavia, tratando-se de mera formalidade, e para que reste configurado o legítimo interesse a respaldar a pretensão de retomada liminar do veículo financiado, basta apenas que a parte credora demonstre o envio da notificação formal, por via postal, com aviso de recebimento, para o endereço indicado no contrato, exatamente como se deu na hipótese dos autos. Nesse mesmo sentido é o entendimento desta Corte de Justiça: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – COMPROVAÇÃO DA MORA – ENVIO DE DUAS NOTIFICAÇÕES PARA O ENDEREÇO INFORMADO NO CONTRATO – DEVOLUÇÃO DO AVISO DE RECEBIMENTO COM A INFORMAÇÃO DE “CLIENTE MUDOU-SE” - OBRIGAÇÃO DO DEVEDOR FIDUCIÁRIO MANTER ATUALIZADO SEU ENDEREÇO PERANTE A INSTITUIÇÃO BANCÁRIA – NOTIFICAÇÃO VÁLIDA – MORA COMPROVADA – PRECEDENTES DO STJ - TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL – INAPLICABILIDADE – RESP Nº 1.622.555/MG, SUBMETIDO AO REGIME DOS RECURSOS REPETITIVOS – REQUISITOS PREVISTOS PELO DECRETO 911/69 PREENCHIDOS –SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. A respeito da notificação extrajudicial, a jurisprudência considera válida a notificação encaminhada ao endereço do devedor de acordo com o contrato firmado, sendo prescindível a sua notificação pessoal. É ônus do devedor informar dados válidos e também informar eventual alteração de endereço, de modo que o credor não pode ser prejudicado por obrigação a que não estava incumbido. Consoante entendimento STJ, quando o AR retorna com a informação de que o devedor mudou de endereço, reputa-se válida a notificação extrajudicial remetida àquele constante do contrato, ainda que não tenha sido efetivamente entregue. “A bem dos princípios da probidade e boa-fé objetiva, não é imputável ao credor fiduciário a desídia do devedor que deixou de informar seu endereço atualizado, ou, como in casu, indicou endereço onde não podia ser encontrado, frustrando, dessa maneira, a comunicação entre as partes contratantes. Precedentes. (STJ - RECURSO ESPECIAL Nº 1862215 - RS (2020/0036469-5) RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI. Decisão Monocrática, prolatada em 12/08/2020). (...) (TJMT – Primeira Câmara de Direito Privado – RAC nº 1022472-42.2018.8.11.0041 – Desa. NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO - Julgado em 16/11/2021, Publicado no DJE 19/11/2021). EMENTA: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – PRELIMINAR CARÊNCIA DA AÇÃO - IDONEIDADE DA COMPROVAÇÃO DA MORA – NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL - AR DEVOLVIDO “MUDOU-SE” - ENDEREÇO CONTRATUAL - OBRIGAÇÃO DE INFORMAR - PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ E DA PROBIDADE -VALIDADE - PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS – LIMINAR DEFERIDA EM GRAU RECURSAL – PROSSEGUIMENTO DO FEITO NOS ULTERIORES TERMOS DO PREVISTO O DECRETO-LEI 911/69 - CONTRATO BANCÁRIO – RELAÇÃO DE CONSUMO – APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – PACTASUNT SERVANDA – RELATIVIZAÇÃO - CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – OPERAÇÃO DE FINANCIAMENTO - CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS – LEGITIMIDADE DA COBRANÇA - RESP Nº 973.827/RS - LIMITAÇÃO DE JUROS - PACTUAÇÃO DE JUROS ABAIXO DO PERCENTUAL DE 12% A.A. – AUSÊNCIA DE CLÁUSULAS ABUSIVAS – TARIFA DE AVALIAÇÃO DO BEM – VEICULO USADO – LEGALIDADE - REGISTRO DE CONTRATO – CONTRATADA – SEGURO CONTRATADO - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Cumpridos os requisitos legais, enveredando-se no mérito do agravo, deve ser visto que, o credor fiduciário, endereçando correspondência para o endereço constante do contrato e este retorna como ‘mudou-se’, não estando obrigada a fazer outras diligências, vez que cumpriu o estabelecido no § 2º, do art. 2º, do Decreto-Lei 911/69, quanto o bastante para a constituição em mora, devendo o devedor, até que ocorra a extinção da obrigação do contrato garantido por alienação fiduciária, manter seu endereço atualizado. Precedente. 2. "A mora decorre do simples vencimento, devendo, por formalidade legal, para o ajuizamento da ação de busca e apreensão, ser apenas comprovada pelo credor mediante envio de notificação, por via postal, com aviso de recebimento, no endereço do devedor indicado no contrato" (REsp 1592422/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/05/2016, DJe 22/06/2016) (...)” (TJMT - Segunda Câmara de Direito Privado – RAC nº 1056405-35.2020.8.11.0041 – Des. SEBASTIAO DE MORAES FILHO - Julgado em 23/06/2021, Publicado no DJE 30/06/2021). EMENTA: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL ENVIADA AO ENDEREÇO DECLARADO PELO DEVEDOR. COMPROVANTE DE RECEBIMENTO COM INFORMAÇÃO DE QUE O DESTINATÁRIO “MUDOU-SE”. MORA COMPROVADA. OBRIGAÇÃO DAS PARTES DE ATUALIZAR ENDEREÇOS. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ E LEALDADE CONTRATUAL. RECURSO DESPROVIDO. O Superior Tribunal de Justiça entende que, em razão do princípio da boa-fé e lealdade contratual, devem as partes informar eventual mudança de endereço até o término do negócio jurídico, ainda que inexista cláusula expressa.” (TJMT - Terceira Câmara de Direito Privado – RAI nº 1001670-15.2019.8.11.0000 – Des. GILBERTO LOPES BUSSIKI - Julgado em 17/04/2019, Publicado no DJE 25/04/2019). EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO DE VEÍCULO – ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL ENVIADA PARA O ENDEREÇO CONSTANTE DO CONTRATO – DEVOLUÇÃO PELO MOTIVO "MUDOU-SE" – OBRIGAÇÃO DO DEVEDOR DE MANTER O CADASTRO ATUALIZADO – PRINCÍPIO DA BOA-FÉ CONTRATUAL – MORA COMPROVADA – SÚMULA 72 DO STJ – RECURSO NÃO PROVIDO. Consoante entendimento do STJ, quando a notificação extrajudicial é enviada ao endereço indicado no contrato de alienação fiduciária e devolvida em virtude de mudança do devedor, caracteriza-se cumprida a formalidade necessária ao ajuizamento da ação de busca e apreensão do bem, se o novo endereço não havia sido devidamente comunicado pelo réu. Exegese à luz do princípio da boa-fé objetiva (STJ - REsp: 1860426 RS)” (TJMT - Quarta Câmara de Direito Privado – RAI nº 1002107-51.2022.8.11.0000 – Des. GUIOMAR TEODORO BORGES –Julgado em 06/04/2022, Publicado no DJE 07/04/2022). Pelo exposto, dou provimento ao recurso, para reformar a decisão agravada, para que seja retomado processamento da busca e apreensão até seus ulteriores termos. Custas pela parte agravada. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025

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Processo nº 1008872-33.2025.8.11.0000

ID: 259238942

Tribunal: TJMT Órgão: Primeira Câmara de Direito Privado Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº Processo: 1008872-33.2025.8.11.0000

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

LUCIA KERKHOFF

Acórdão

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008872-33.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Alienação Fiduciária, Efeitos, Busca e … ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1008872-33.2025.8.11.0000 Classe: AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Assunto: [Alienação Fiduciária, Efeitos, Busca e Apreensão, Liminar] Relator: Des(a). MARCIO APARECIDO GUEDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCIO APARECIDO GUEDES, DES(A). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, DES(A). SEBASTIAO BARBOSA FARIAS] Parte(s): [JOSE CARLOS SKRZYSZOWSKI JUNIOR - CPF: 040.837.379-21 (ADVOGADO), LUCIA KERKHOFF - CPF: 311.354.391-68 (AGRAVADO), ITAU UNIBANCO HOLDING S.A. - CNPJ: 60.872.504/0001-23 (AGRAVANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). CLARICE CLAUDINO DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, DEU PROVIMENTO AO RECURSO. E M E N T A EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CONSTITUIÇÃO EM MORA. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL ENCAMINHADA PARA O ENDEREÇO CONTRATUAL. PRESCINDIBILIDADE DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL. EXIGÊNCIA LEGAL ATENDIDA. REFORMA DA DECISÃO. PROVIMENTO DO RECURSO. I. A questão controvertida nos autos refere-se à exigência de intimação para emenda da petição inicial de busca e apreensão, com a finalidade de comprovação da constituição em mora da parte demandada. II. O Decreto-Lei nº 911/1969, em seu art. 3º, estabelece que a comprovação da mora é condição para a propositura da ação de busca e apreensão, podendo ser feita nos termos do §2º do art. 2º do mesmo diploma, ou seja, mediante carta registrada com aviso de recebimento, independentemente da assinatura do próprio destinatário. III. O Superior Tribunal de Justiça consolidou entendimento no sentido de que a notificação extrajudicial enviada ao endereço constante do contrato é suficiente para comprovar a mora, não sendo necessária a notificação pessoal do devedor. IV. Considerando que a agravante comprovou o envio da notificação ao endereço do contrato, restam atendidos os requisitos legais, sendo indevida a exigência de complementação da petição inicial, razão pela qual impõe-se a reforma da decisão agravada. V. Agravo de instrumento provido para afastar a determinação de emenda da inicial e determinar o regular processamento da ação de busca e apreensão. R E L A T Ó R I O Cuida-se de Recurso de AGRAVO DE INSTRUMENTO interposto por ITAU UNIBANCO HOLDING S.A. contra a decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Chapada dos Guimarães/MT, que nos autos da ação de “Busca e Apreensão” (Proc. nº 1000129-59.2025.8.11.0024), ajuizada pelo agravante contra LUCIA KERKHOFF, determinou a intimação da autora/agravante para, “no prazo de 15 (quinze) dias, emendar a petição inicial, de forma a demonstra a constituição e mora do réu, sob pena de indeferimento da inicial” (cf. Id. nº 185557277 dos autos de origem). A agravante sustenta que a notificação enviada para o endereço contratual é suficiente para suprir a exigência do art. 3º do Decreto-Lei nº 911/1969, já que a lei especial de regência não exige a notificação pessoal para fins de constituição do devedor em mora, daí porque é descabida e desnecessária a providência imposta pela decisão agravada, pois, mesmo que não tenha sido entregue nas mãos da agravada, mas tendo sido remetido para o endereço constante do contrato, o instrumento da notificação que já instrui os autos satisfaz perfeitamente a exigência legal em comento. Pede, sob esses fundamentos, o provimento do recurso para que, reformada a decisão, seja recebida a petição inicial e deferida a medida de liminar de busca e apreensão; de imediato, pede a concessão de efeito suspensivo (cf. Id. nº 276314380). Dispensada as contrarrazões à falta de angularização do feito. É o breve relatório. Cuiabá, data registrada no sistema. MARCIO APARECIDO GUEDES Relator V O T O R E L A T O R O art. 3º do Decreto-Lei nº 911/69 prevê que “o proprietário fiduciário ou credor poderá, desde que comprovada a mora, na forma estabelecida pelo § 2º do art. 2º, ou o inadimplemento, requerer contra o devedor ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente”, enquanto que o §2º do art. 2º estabelece que “a mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento e poderá ser comprovada por carta registrada com aviso de recebimento, não se exigindo que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário”; e, mesmo antes da alteração legislativa propiciada pela Lei nº 13.043/14, que incluiu a ressalva final do §2º do art. 2º acerca da desnecessidade da assinatura do destinatário à validade da notificação da mora, a orientação da jurisprudência nacional há muito pacificara o entendimento quanto à prescindibilidade de notificação pessoal do devedor para fins de válida comprovação da mora, sendo suficiente o envio da notificação ao endereço do contrato. Nesse sentido: “EMENTA: (...) NOTIFICAÇÃO DO DEVEDOR PARA A PURGAÇÃO DA MORA. EXIGÊNCIA ATENDIDA. CONCLUSÃO FIRMADA PELO ACÓRDÃO RECORRIDO COM BASE NAS PROVAS DOS AUTOS. REVISÃO DESSA PREMISSA. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO IMPROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de ser necessária a comprovação da cientificação do devedor para purgação da mora, mediante notificação extrajudicial, realizada por carta registrada enviada por Cartório de Títulos e Documentos, entregue no domicílio do devedor, sendo prescindível a notificação pessoal.” (STJ - 3ª Turma - AgInt no AREsp 1108611/RJ – Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, julgamento em 17/10/2017, DJe 26/10/2017). “EMENTA: ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. BUSCA E APREENSÃO. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA DO DEVEDOR. NECESSIDADE. (...) 2. É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que, nos contratos de alienação fiduciária, para que ocorra a busca e apreensão do bem, a mora do devedor deve ser comprovada pelo protesto do título ou pela notificação extrajudicial, sendo necessária, nesse último caso, a efetiva entrega da notificação no endereço indicado pelo devedor. 3. Agravo regimental não provido.” (STJ - 3ª Turma - AgRg no AREsp 564.262/PR – Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, julgamento em 26/04/2016, DJe 09/05/2016) “EMENTA: (...). BUSCA E APREENSÃO. MORA. NOTIFICAÇÃO PRÉVIA DO DEVEDOR. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL OU POR PROTESTO DO TÍTULO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. 'A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que, na alienação fiduciária, a mora do devedor deve ser comprovada pelo protesto do título ou pela notificação extrajudicial feita por intermédio do Cartório de Títulos e Documentos, entregue no endereço do domicílio do devedor' (AgRg no AREsp 41.319/RS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 03/09/2013, DJe 11/10/2013). 2. O Tribunal estadual firmou o entendimento de que não há prova do recebimento da notificação de constituição em mora do financiado, conclusão que não pode ser apreciada nesta Corte, ante o óbice contido na Súmula 7/STJ. 3. Agravo regimental não provido,” (STJ - 4ª Turma - AgRg no AREsp 512.316/RS - Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, julgamento em 26/8/2014, DJe 1º/9/2014) “EMENTA: (...). BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. MORA. NOTIFICAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. 1.- De acordo com a jurisprudência pacífica deste Tribunal é válida, para efeito de constituição em mora do devedor, a entrega da notificação em seu endereço, não se exigindo que a assinatura constante do referido aviso seja a do próprio destinatário, sendo imprescindível, todavia, a comprovação do efetivo recebimento, o que não ocorreu no caso.” (STJ - 3ª Turma - AgRg no REsp 1.358.155/SP - Rel. Ministro SIDNEI BENETI, julgamento em 25/6/2013, DJe 1º/8/2013) No caso, o ITAU UNIBANCO HOLDING S.A. instruiu os autos com o instrumento da notificação enviada, via carta com AR, para o exato endereço informado pelo réu/devedor no contrato de alienação fiduciária que aparelha a ação (contrato nº 395013576), a saber, “Est Rural 97, Jangada Roncado, Chapada dos Guimaraes/MT, CEP: 78195-000” (cf. Id. nº 181653007 e 181653008 dos autos de origem, respectivamente), reputando-se, portanto, válida e eficaz a comunicação assim realizada para a satisfação do requisito exigido pelo art. 2º, §2º, do Decreto-Lei nº 911/69, sendo despicienda a ordem de emenda da petição inicial contida na decisão ora agravada, inclusive porque o endereço do devedor deve ser fornecido pelo próprio sob os auspícios da boa-fé e da veracidade, inclusive, qualquer modificação subsequente deve ser comunicada ao credor. Cuidando-se de relação negocial sinalagmática, devem ser resguardadas as expectativas legítimas de todos os envolvidos na relação contratual, e, no caso, como houve compromisso jurídico moral assumido pelo devedor/agravado de que adimpliria regularmente as parcelas pactuadas na avença e que poderia ser encontrado no endereço que ele mesmo indicou ao credor no momento da formação do pacto, as correspondências/notificações serão (sempre) consideradas como validamente recebidas, ainda que por mera presunção, quando encaminhadas para o endereço que o contratante forneceu ao seu credor, sendo, pois, prescindível a assinatura do próprio devedor. A mora decorre do simples vencimento da dívida, mas, apenas por excesso de formalismo legal, para o ajuizamento de ação de busca e apreensão exige-se do credor que faça a prova da salinidade da água do mar, quer dizer, que reforce a comprovação evidente da mora pela remessa adicional de notificação formal ao solvens inadimplente; todavia, tratando-se de mera formalidade, e para que reste configurado o legítimo interesse a respaldar a pretensão de retomada liminar do veículo financiado, basta apenas que a parte credora demonstre o envio da notificação formal, por via postal, com aviso de recebimento, para o endereço indicado no contrato, exatamente como se deu na hipótese dos autos. Nesse mesmo sentido é o entendimento desta Corte de Justiça: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – COMPROVAÇÃO DA MORA – ENVIO DE DUAS NOTIFICAÇÕES PARA O ENDEREÇO INFORMADO NO CONTRATO – DEVOLUÇÃO DO AVISO DE RECEBIMENTO COM A INFORMAÇÃO DE “CLIENTE MUDOU-SE” - OBRIGAÇÃO DO DEVEDOR FIDUCIÁRIO MANTER ATUALIZADO SEU ENDEREÇO PERANTE A INSTITUIÇÃO BANCÁRIA – NOTIFICAÇÃO VÁLIDA – MORA COMPROVADA – PRECEDENTES DO STJ - TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL – INAPLICABILIDADE – RESP Nº 1.622.555/MG, SUBMETIDO AO REGIME DOS RECURSOS REPETITIVOS – REQUISITOS PREVISTOS PELO DECRETO 911/69 PREENCHIDOS –SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. A respeito da notificação extrajudicial, a jurisprudência considera válida a notificação encaminhada ao endereço do devedor de acordo com o contrato firmado, sendo prescindível a sua notificação pessoal. É ônus do devedor informar dados válidos e também informar eventual alteração de endereço, de modo que o credor não pode ser prejudicado por obrigação a que não estava incumbido. Consoante entendimento STJ, quando o AR retorna com a informação de que o devedor mudou de endereço, reputa-se válida a notificação extrajudicial remetida àquele constante do contrato, ainda que não tenha sido efetivamente entregue. “A bem dos princípios da probidade e boa-fé objetiva, não é imputável ao credor fiduciário a desídia do devedor que deixou de informar seu endereço atualizado, ou, como in casu, indicou endereço onde não podia ser encontrado, frustrando, dessa maneira, a comunicação entre as partes contratantes. Precedentes. (STJ - RECURSO ESPECIAL Nº 1862215 - RS (2020/0036469-5) RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI. Decisão Monocrática, prolatada em 12/08/2020). (...) (TJMT – Primeira Câmara de Direito Privado – RAC nº 1022472-42.2018.8.11.0041 – Desa. NILZA MARIA POSSAS DE CARVALHO - Julgado em 16/11/2021, Publicado no DJE 19/11/2021). EMENTA: “APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO – PRELIMINAR CARÊNCIA DA AÇÃO - IDONEIDADE DA COMPROVAÇÃO DA MORA – NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL - AR DEVOLVIDO “MUDOU-SE” - ENDEREÇO CONTRATUAL - OBRIGAÇÃO DE INFORMAR - PRINCÍPIOS DA BOA-FÉ E DA PROBIDADE -VALIDADE - PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS – LIMINAR DEFERIDA EM GRAU RECURSAL – PROSSEGUIMENTO DO FEITO NOS ULTERIORES TERMOS DO PREVISTO O DECRETO-LEI 911/69 - CONTRATO BANCÁRIO – RELAÇÃO DE CONSUMO – APLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – PACTASUNT SERVANDA – RELATIVIZAÇÃO - CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – OPERAÇÃO DE FINANCIAMENTO - CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS – LEGITIMIDADE DA COBRANÇA - RESP Nº 973.827/RS - LIMITAÇÃO DE JUROS - PACTUAÇÃO DE JUROS ABAIXO DO PERCENTUAL DE 12% A.A. – AUSÊNCIA DE CLÁUSULAS ABUSIVAS – TARIFA DE AVALIAÇÃO DO BEM – VEICULO USADO – LEGALIDADE - REGISTRO DE CONTRATO – CONTRATADA – SEGURO CONTRATADO - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Cumpridos os requisitos legais, enveredando-se no mérito do agravo, deve ser visto que, o credor fiduciário, endereçando correspondência para o endereço constante do contrato e este retorna como ‘mudou-se’, não estando obrigada a fazer outras diligências, vez que cumpriu o estabelecido no § 2º, do art. 2º, do Decreto-Lei 911/69, quanto o bastante para a constituição em mora, devendo o devedor, até que ocorra a extinção da obrigação do contrato garantido por alienação fiduciária, manter seu endereço atualizado. Precedente. 2. "A mora decorre do simples vencimento, devendo, por formalidade legal, para o ajuizamento da ação de busca e apreensão, ser apenas comprovada pelo credor mediante envio de notificação, por via postal, com aviso de recebimento, no endereço do devedor indicado no contrato" (REsp 1592422/RJ, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/05/2016, DJe 22/06/2016) (...)” (TJMT - Segunda Câmara de Direito Privado – RAC nº 1056405-35.2020.8.11.0041 – Des. SEBASTIAO DE MORAES FILHO - Julgado em 23/06/2021, Publicado no DJE 30/06/2021). EMENTA: “AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL ENVIADA AO ENDEREÇO DECLARADO PELO DEVEDOR. COMPROVANTE DE RECEBIMENTO COM INFORMAÇÃO DE QUE O DESTINATÁRIO “MUDOU-SE”. MORA COMPROVADA. OBRIGAÇÃO DAS PARTES DE ATUALIZAR ENDEREÇOS. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ E LEALDADE CONTRATUAL. RECURSO DESPROVIDO. O Superior Tribunal de Justiça entende que, em razão do princípio da boa-fé e lealdade contratual, devem as partes informar eventual mudança de endereço até o término do negócio jurídico, ainda que inexista cláusula expressa.” (TJMT - Terceira Câmara de Direito Privado – RAI nº 1001670-15.2019.8.11.0000 – Des. GILBERTO LOPES BUSSIKI - Julgado em 17/04/2019, Publicado no DJE 25/04/2019). EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO DE VEÍCULO – ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA – NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL ENVIADA PARA O ENDEREÇO CONSTANTE DO CONTRATO – DEVOLUÇÃO PELO MOTIVO "MUDOU-SE" – OBRIGAÇÃO DO DEVEDOR DE MANTER O CADASTRO ATUALIZADO – PRINCÍPIO DA BOA-FÉ CONTRATUAL – MORA COMPROVADA – SÚMULA 72 DO STJ – RECURSO NÃO PROVIDO. Consoante entendimento do STJ, quando a notificação extrajudicial é enviada ao endereço indicado no contrato de alienação fiduciária e devolvida em virtude de mudança do devedor, caracteriza-se cumprida a formalidade necessária ao ajuizamento da ação de busca e apreensão do bem, se o novo endereço não havia sido devidamente comunicado pelo réu. Exegese à luz do princípio da boa-fé objetiva (STJ - REsp: 1860426 RS)” (TJMT - Quarta Câmara de Direito Privado – RAI nº 1002107-51.2022.8.11.0000 – Des. GUIOMAR TEODORO BORGES –Julgado em 06/04/2022, Publicado no DJE 07/04/2022). Pelo exposto, dou provimento ao recurso, para reformar a decisão agravada, para que seja retomado processamento da busca e apreensão até seus ulteriores termos. Custas pela parte agravada. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 15/04/2025

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