Processo nº 0858291-40.2024.8.15.2001
ID: 308879548
Tribunal: TJPB
Órgão: 9ª Vara Cível da Capital
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 0858291-40.2024.8.15.2001
Data de Disponibilização:
26/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
KARINA DE ALMEIDA BATISTUCI
OAB/SP XXXXXX
Desbloquear
ANDERSON LACERDA DO NASCIMENTO
OAB/PB XXXXXX
Desbloquear
9A VARA CÍVEL DE JOÃO PESSOA PROCESSO:0858291-40.2024.8.15.2001. SENTENÇA AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL DE EMPRÉSTIMO PESSOAL C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPETIÇÃO INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORA…
9A VARA CÍVEL DE JOÃO PESSOA PROCESSO:0858291-40.2024.8.15.2001. SENTENÇA AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL DE EMPRÉSTIMO PESSOAL C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPETIÇÃO INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONTRATOS DE EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS. CONSUMIDORA IDOSA. CONTRATAÇÕES NÃO RECONHECIDAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE DEPÓSITO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. COBRANÇA INDEVIDA. NULIDADE PARCIAL DOS CONTRATOS. LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS A 30%. REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ AFASTADA. PROCEDÊNCIA PARCIAL DOS PEDIDOS. EXTINÇÃO DO FEITO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. CONDENAÇÃO. - Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor às relações entre instituições financeiras e consumidores em contratos de empréstimo pessoal. - Incumbe à instituição financeira, diante da inversão do ônus da prova, comprovar a validade da contratação e a efetiva liberação dos valores. - A ausência de depósito dos valores contratados e de apresentação dos instrumentos contratuais implica a nulidade das contratações impugnadas. - Descontos em folha de pagamento sem respaldo contratual regular configuram prática abusiva e devem ser cessados. - Os descontos mensais em folha devem observar o limite de 30% da remuneração líquida do consumidor. - É cabível a repetição em dobro dos valores descontados indevidamente quando configurada a má prestação do serviço e ausência de engano justificável. - A cobrança indevida de valores, sem inscrição em cadastros restritivos ou abalo concreto, não gera, por si só, direito à indenização por danos morais. - A ausência de má-fé processual afasta a aplicação das penalidades previstas no art. 80 do CPC. Vistos, etc. MARIA DO SOCORRO GALDINO DE FREITAS ajuíza AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL DE EMPRÉSTIMO PESSOAL C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPETIÇÃO INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS em face de BANCO BRADESCO S.A., ambos qualificados nos autos e representados por advogados, requerendo preliminarmente a autora, os benefícios da gratuidade jurídica e aplicação do CDC. Verbera a parte autora que celebrou três contratos de empréstimo com a instituição financeira demandada: dois em fevereiro de 2019 um empréstimo no montante de R$ 4.948,63 e outro de R$ 441,18, com parcelas de R$ 113,52 e R$ 10,22, respectivamente. Afirma que ambos os contratos não foram depositados na sua conta, o que demonstraria sua inexistência ou irregularidade. Aduz que realizou uma terceira contratação no valor de R$ 4.300,00 em 05/02/2019, cujos valores foram corretamente depositados em sua conta bancária no dia 06/02/2019. Sustenta que na data da terceira contratação, foi realizado um refinanciamento dos empréstimos anteriores — cujos valores não teriam sido depositados em sua conta — resultando na unificação das dívidas em 96 parcelas de R$ 180,72 cada, totalizando R$ 17.349,12, com término previsto apenas para o ano de 2027. Relata, ainda, que episódios semelhantes de contratações não autorizadas ocorreram em abril de 2019 e nos dias 10 e 11 de dezembro de 2020, ocasião em que uma atendente do banco propôs realizar um suposto “Refin”, termo utilizado para refinanciamento de empréstimos. Assim, informa que acabou firmando duas contratações cujos valores também não foram creditados. Em 16 de agosto, ao procurar o banco para saber sobre os valores prometidos, aduz que foi novamente induzida a firmar um terceiro contrato de aproximadamente R$ 3.600,00, supostamente decorrente dos refinanciamentos anteriores, com promessa de liberação do valor no dia seguinte, o que também afirma que não ocorreu. Segue afirmando que foi novamente vítima de duas contratações irregulares, ocorridas em 03/02/2023 e 02/02/2024, nos valores de R$ 944,57 e R$ 1.177,69, respectivamente. Afirma que, embora tenha sacado os valores disponibilizados em sua conta, acreditava tratar-se de benefícios concedidos pelo próprio banco, sem compreender que se tratava de novos contratos de empréstimo. Ressalta que, além do primeiro contrato reconhecido (de 2019), apenas outras duas contratações foram efetivamente realizadas por sua vontade, nos dias 30/08/2021 (48 parcelas) e 14/03/2022 (32 parcelas). Todas as demais contratações, segundo a autora, seriam irregulares, resultando no total de 96 parcelas adicionais, com juros supostamente abusivos. Verbera também que desde setembro de 2021, vêm sendo realizados descontos mensais sob a rubrica “Banco Bradesco Cartões S/A”, com valores variando entre R$ 67,63 e R$ 108,68, totalizando mais de R$ 2.429,59 até o momento. A autora não reconhece essa cobrança, que aparece em seus contracheques como sendo de prazo 1 (um), o que lhe parece indefinido e, por vezes, até aumentado. Idosa e sem orientação técnica, tentou resolver a situação diretamente com o banco, por meio de diversos atendimentos, protocolos e pedidos de esclarecimento, sempre sem sucesso. Declara que tais descontos excessivos e indevidos vêm comprometendo sua subsistência, com prejuízos financeiros que já ultrapassam R$18 mil, com término previsto apenas para 2029. Diante disso, pleiteia judicialmente o respeito ao limite de 30% sobre sua remuneração líquida, buscando reequilíbrio financeiro e a cessação das cobranças indevidas. Instruída a exordial com documentos Deferida à gratuidade processual autoral, ID 99884397. Citada a demandada para contestar, o fez no ID 101544426, impugnando, preliminarmente, a gratuidade jurídica deferida. No mérito, alega, em suma, a validade dos contratos firmados e a ausência de ilicitude na conduta da instituição bancária, tendo inclusive juntado parte dos documentos contratuais. Sustenta, ainda, que os descontos realizados são legítimos e autorizados pela parte autora, pugnando, ao final, pela total improcedência dos pedidos iniciais, com a não inversão do ônus da prova e a condenação da autora em litigância de má-fé. Colacionados documentos. Intimada a promovente à réplica, o fez ID 103281664. Intimada as partes à produção de provas, manifesta-se o autor pela prova pericial, requerendo que o demandado junte nos autos os contratos firmados entre as partes, o demandado requer o julgamento antecipado. Intimado o demandado - ID 110131390 - para juntar os contratos requeridos, mantém-se inerte. Intimada a manifestar-se, requer a autora o julgamento antecipado da lide - ID 114811487. Assim, vieram-me os autos conclusos. É o relatório. DECIDO. FUNDAMENTAÇÃO A priori, deve-se ressaltar que o feito comporta julgamento antecipado da lide, visto que a matéria aduzida é unicamente de direito. Ressalte-se que, encontram-se nos autos documentos necessários à formação do convencimento desse juízo, não havendo questões de fato a serem discutidas, aplicando-se a regra do art. 355, I, do NCPC. PRELIMINARES - Impugnação à Gratuidade Jurídica A benesse da Justiça Gratuita não robustece a ideia de isenção de custas e despesas processuais à parte que requer o benefício, mas sim busca, sobretudo, conceder àquele que não dispõe de recurso financeiro para arcar com os dispêndios processuais sem seu prejuízo ou de sua família, o acesso integral e gratuito à Justiça. Daí porque a concessão da assistência estatal fica condicionada à comprovação de hipossuficiência financeira pelo postulante na jornada processual. Em caso de gratuidade concedida, nada obsta que a parte contrária impugne o benefício, contudo, deverá fazê-lo com documentos que evidenciem a posição equivocada do juízo, o que não é o caso dos autos, uma vez que o promovido busca impugnar a decisão, porém, não colaciona aos autos qualquer elemento que faça prova de suas alegações, de modo que fica totalmente fragilizada sua postulação. Aliás, tal aspecto já foi objeto de deliberação do magistrado em momento oportuno à luz da documentação juntada pela parte. Portanto, em função do postulante não colacionar documentos que infirme a deliberação do juízo, entende-se que não há cabimento para acolher a preliminar ventilada. Assim, inexistindo qualquer prova que descredibilize a concessão de assistência judiciária concedida ao promovente, aliado às afirmações meramente genéricas do promovido, rejeita-se a impugnação à Justiça Gratuita formulada pelo demandado. MÉRITO A controvérsia gira em torno da validade de diversos contratos de empréstimos consignados firmados entre a autora e o Banco Bradesco S.A., bem como da legalidade dos descontos realizados diretamente em seus proventos de aposentadoria. A autora impugna grande parte das contratações, sustentando não ter recebido os valores correspondentes em sua conta bancária, o que, segundo argumenta, caracteriza vício de consentimento e torna tais contratos nulos. O caso dos autos é de se aplicar o disposto no art. 3º, § 2º, do CDC, eis que a natureza da relação jurídica entre autor e réu se trata de um verdadeiro "serviço de crédito", devendo, portanto, aplicar o CDC entre as partes litigantes. Assim, indubitável a aplicação do Código Consumerista ao caso em exame, nos termos do art. 3º, § 2º, do CDC, “in verbis”: Art. 3º - Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços”. (…) § 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. Portanto, tem-se que aplicável, ao caso, as normas previstas no Código de Defesa do Consumidor, nos termos da Súmula n° 297 do eg. STJ. Por se tratar de relação consumerista, trata-se de inversão do ônus da prova, isto é, decorrente da própria lei, ope legis e que prescinde de pronunciamento judicial anterior ao julgamento para declará-la, de forma que incumbe ao fornecedor dos serviços, no curso da ação, a prova das excludentes previstas no art. 14, §3º do CDC. Seguindo esta direção, deveria a promovida no curso da ação fazer prova da existência das excludentes do §3º do art. 14 do CDC. É neste norte que, na situação em apreço, reputa-se como configurada a existência do defeito na prestação do serviço. Oportuno destacar que a facilitação da defesa dos direitos do consumidor por meio da inversão do ônus probante, na forma prevista pelo referido dispositivo legal, não implica em exoneração irrestrita do encargo probatório, a teor do art. 373, I, do CPC, isto é, ao autor caberá demonstrar, ainda que minimamente, o fundo do direito pleiteado. Inicialmente, observa-se que a autora reconhece a validade de apenas três contratos: um firmado em 05/02/2019, no valor de R$ 4.300,00, cujos valores teriam sido regularmente creditados em sua conta, e outros dois, realizados em 30/08/2021 e 14/03/2022. Todos os demais contratos foram impugnados, sob a alegação de ausência de depósito dos valores ou de induzimento ao erro, notadamente em situações descritas como “Refin”, nas quais a autora, por desconhecimento técnico e por ser pessoa idosa, teria sido levada a acreditar que se tratavam de benefícios do banco, e não de refinanciamentos. Ao longo dos autos, a parte autora trouxe farta documentação, como extratos bancários e contracheques, que indicam a ausência de depósito em sua conta em relação a vários contratos. Além disso, demonstrou que os descontos em sua folha de pagamento persistem há anos, com previsão de término apenas em 2027 ou 2029, comprometendo substancialmente sua renda mensal. Consta ainda a cobrança de valores sob a rubrica “Banco Bradesco Cartões S/A”, que se prolonga indefinidamente e não é por ela reconhecida, o que reforça os indícios de irregularidade. Ao revés, o banco réu limitou-se a alegar genericamente a legalidade dos contratos e dos descontos, juntando apenas parte da documentação contratual. Apesar de intimado, manteve-se inerte quanto à apresentação dos contratos de 30/08/2021 e 14/03/2022, os quais são centrais à controvérsia, especialmente porque a autora afirma que tais contratos foram utilizados para refinanciar operações anteriores sem liberação de novos valores. Conforme entendimento consolidado na jurisprudência, nos contratos firmados com consumidores hipossuficientes e em contexto de evidente vulnerabilidade técnica, compete à instituição financeira comprovar a regularidade da contratação e a efetiva disponibilização dos valores contratados. A ausência de prova cabal nesse sentido, sobretudo diante da inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC, implica o reconhecimento da nulidade dos contratos impugnados. Com efeito, não demonstrou o demandado, fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do Autor, como prevê a hipótese do art. 373, II do CPC. No caso, não há nos autos comprovação da disponibilização dos valores referentes aos contratos de fevereiro de 2019 (R$ 4.948,63 e R$ 441,18), nem daqueles datados de 03/02/2023 e 02/02/2024. A alegação de que a autora sacou os valores em algumas dessas ocasiões não afasta a presunção de vício na contratação, notadamente diante da informação de que ela desconhecia tratar-se de empréstimos e acreditava estar recebendo benefícios do banco. A informação de que, ao procurar esclarecimentos, era induzida a novos “refins”, reforça a caracterização de prática abusiva, nos termos do art. 39 do CDC. Dessa forma é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO. COBRANÇA EM VALORES EXCESSIVOS AO PACTUADO. RESTITUIÇÃO EM DOBRO . REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO . 1. ?A restituição em dobro do indébito ( parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida, revelando-se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva? (EAREsp 676.608/RS, Rel. Ministro OG FERNANDES, CORTE ESPECIAL, julgado em 21/10/2020, DJe 30/3/2021) . 2. Não cabe, em recurso especial, reexaminar matéria fático-probatória ( Súmula n. 7/STJ). 3 . Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt nos EDcl no REsp: 1933554 AM 2021/0115164-0, Relator.: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Julgamento: 21/03/2022, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/03/2022). PROCESSUAL CIVIL. BANCÁRIO. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO . AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA MÁ-FÉ . JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA NO ÂMBITO DA SEGUNDA SEÇÃO DESTA CORTE. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. Aplicabilidade do NCPC a este recurso ante os termos no Enunciado Administrativo nº 3 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC . 2. A jurisprudência das Turmas que compõem a Segunda Seção do STJ é firme no sentido de que a repetição em dobro do indébito, sanção prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC, pressupõe tanto a existência de pagamento indevido quanto a má-fé do credor (REsp nº 1.032 .952/SP. Rel.: Min. NANCY ANDRIGHI, Terceira Turma; DJe 26/3/2009) 3 . Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no REsp: 1449237 PR 2014/0085911-3, Relator.: Ministro MOURA RIBEIRO, Data de Julgamento: 25/04/2017, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 04/05/2017). Quanto à cobrança vinculada ao “Banco Bradesco Cartões S/A”, igualmente não houve demonstração da origem da dívida, tampouco apresentação de contrato assinado pela autora autorizando a retenção. Tratando-se de desconto em folha de pagamento de servidor inativo, a ausência de contrato regular afasta a legitimidade da cobrança e impõe sua cessação imediata. Por fim, quanto ao pedido de limitação dos descontos a 30% da renda líquida da autora, assiste-lhe razão. Conforme entendimento do STJ (REsp 1.555.421/SP), é aplicável o limite de 30% ao conjunto das parcelas de empréstimos consignados, especialmente quando constatado o comprometimento excessivo da subsistência do consumidor, o que se verifica no presente caso. Dessa forma, a demanda comporta parcial procedência para declarar a nulidade dos contratos não reconhecidos, determinar a suspensão dos descontos abusivos, impor a restituição dos valores descontados indevidamente e limitar os descontos mensais ao percentual de 30% da renda líquida da parte autora. - Da Repetição do Indébito A repetição do indébito encontra fundamento no artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, que dispõe: “O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à devolução do valor pago em excesso, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.” No caso em exame, a autora demonstrou que diversos valores foram descontados diretamente de sua folha de pagamento a título de empréstimos que não reconhece ou cujos valores não foram efetivamente depositados em sua conta bancária, o que evidencia a cobrança indevida. A instituição financeira, por sua vez, deixou de apresentar os contratos impugnados e tampouco comprovou a efetiva liberação dos valores, mesmo após expressa intimação judicial nesse sentido. A jurisprudência pátria tem admitido a restituição em dobro nos casos em que a cobrança indevida decorre de falha na prestação do serviço bancário, especialmente quando ausente justificativa plausível para a retenção dos valores. No presente feito, verifica-se não apenas a ausência de comprovação da contratação regular, como também a omissão do banco quanto à apresentação da documentação essencial, o que afasta a caracterização de engano justificável. Nesse entendimento, transcrevo o julgado abaixo do STJ: EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. TELEFONIA FIXA . COBRANÇA INDEVIDA. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO DE TARIFAS. 1) RESTITUIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO ( PARÁGRAFO ÚNICO DO ARTIGO 42 DO CDC). DESINFLUÊNCIA DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO DO FORNECEDOR QUE REALIZOU A COBRANÇA INDEVIDA . DOBRA CABÍVEL QUANDO A REFERIDA COBRANÇA CONSUBSTANCIAR CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA. 2) APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL DECENAL DO CÓDIGO CIVIL (ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL). APLICAÇÃO ANALÓGICA DA SÚMULA 412/STJ . 3) MODULAÇÃO PARCIAL DOS EFEITOS DA DECISÃO. CONHECIMENTO E PROVIMENTO INTEGRAL DO RECURSO. 1. Trata-se de embargos de divergência interpostos contra acórdão em que se discute o lapso prescricional cabível aos casos de repetição de indébito por cobrança indevida de valores referentes a serviços não contratados, promovida por empresa de telefonia . Discute-se, ainda, acerca da necessidade de comprovação da má-fé pelo consumidor para aplicação do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor. 2. Na configuração da divergência do presente caso, temos, de um lado, o acórdão embargado da Terceira Turma concluindo que a norma do art . 42 do Código de Defesa do Consumidor pressupõe a demonstração de que a cobrança indevida decorreu de má-fé do credor fornecedor do serviço, enquanto os acórdãos-paradigmas da Primeira Seção afirmam que a repetição em dobro prescinde de má-fé, bastando a culpa. Ilustrando o posicionamento da Primeira Seção: EREsp 1.155.827/SP, Rel . Min. Humberto Martins, Primeira Seção, DJe 30/6/2011. Para exemplificar o posicionamento da Segunda Seção, vide: EREsp 1.127 .721/RS, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, Rel. p/ Acórdão Min . Marco Buzzi, Segunda Seção, DJe 13/3/2013. 3. Quanto ao citado parágrafo único do art. 42 do CDC, abstrai-se que a cobrança indevida será devolvida em dobro, "salvo hipótese de engano justificável" . Em outras palavras, se não houver justificativa para a cobrança indevida, a repetição do indébito será em dobro. A divergência aqui constatada diz respeito ao caráter volitivo, a saber: se a ação que acarretou cobrança indevida deve ser voluntária (dolo/má-fé) e/ou involuntária (por culpa). 4. O próprio dispositivo legal caracteriza a conduta como engano e somente exclui a devolução em dobro se ele for justificável. Ou seja, a conduta base para a repetição de indébito é a ocorrência de engano, e a lei, rígida na imposição da boa-fé objetiva do fornecedor do produto ou do serviço, somente exclui a devolução dobrada se a conduta (engano) for justificável (não decorrente de culpa ou dolo do fornecedor). 5. Exigir a má-fé do fornecedor de produto ou de serviço equivale a impor a ocorrência de ação dolosa de prejudicar o consumidor como requisito da devolução em dobro, o que não se coaduna com o preceito legal. Nesse ponto, a construção realizada pela Segunda Seção em seus precedentes, ao invocar a má-fé do fornecedor como fundamento para a afastar a duplicação da repetição do indébito, não me convence, pois atribui requisito não previsto em lei . 6. A tese da exclusividade do dolo inviabiliza, por exemplo, a devolução em dobro de pacotes de serviços, no caso de telefonia, jamais solicitados pelo consumidor e sobre o qual o fornecedor do serviço invoque qualquer "justificativa do seu engano". Isso porque o requisito subjetivo da má-fé é prova substancialmente difícil de produzir. Exigir que o consumidor prove dolo ou má-fé do fornecedor é imputar-lhe prova diabólica, padrão probatório que vai de encontro às próprias filosofia e ratio do CDC . 7. Não vislumbro distinção para os casos em que o indébito provém de contratos que não envolvam fornecimento de serviços públicos, de forma que também deve prevalecer para todas as hipóteses a tese, que defendi acima, de que tanto a conduta dolosa quanto culposa do fornecedor de serviços dá azo à devolução em dobro do indébito, de acordo com o art. 42 do CDC. Nessas modalidades contratuais, também deve prevalecer o critério dúplice do dolo/culpa . Assim, tanto a conduta dolosa quanto a culposa do fornecedor de serviços dão substrato à devolução em dobro do indébito, à luz do art. 42 do CDC. 8. A Primeira Seção, no julgamento do REsp 1 .113.403/RJ, de relatoria do Ministro Teori Albino Zavascki (DJe 15/9/2009), submetido ao regime dos recursos repetitivos do art. 543-C do Código de Processo Civil e da Resolução STJ 8/2008, firmou o entendimento de que, ante a ausência de disposição específica acerca do prazo prescricional aplicável à prática comercial indevida de cobrança excessiva, é de rigor a incidência das normas gerais relativas à prescrição insculpidas no Código Civil na ação de repetição de indébito de tarifas de água e esgoto. Assim, tem-se prazo vintenário, na forma estabelecida no art . 177 do Código Civil de 1916, ou decenal, de acordo com o previsto no art. 205 do Código Civil de 2002. Diante da mesma conjuntura, não há razões para adotar solução diversa nos casos de repetição de indébito dos serviços de telefonia. 9 . A tese adotada no âmbito do acórdão recorrido, de que a pretensão de repetição de indébito por cobrança indevida de valores referentes a serviços não contratados, promovida por empresa de telefonia, configuraria enriquecimento sem causa e, portanto, estaria abrangida pelo prazo fixado no art. 206, § 3º, IV, do Código Civil, não parece ser a melhor. A pretensão de enriquecimento sem causa (ação in rem verso) possui como requisitos: enriquecimento de alguém; empobrecimento correspondente de outrem; relação de causalidade entre ambos; ausência de causa jurídica; inexistência de ação específica. Trata-se, portanto, de ação subsidiária que depende da inexistência de causa jurídica . A discussão acerca da cobrança indevida de valores constantes de relação contratual e eventual repetição de indébito não se enquadra na hipótese do art. 206, § 3º, IV, do Código Civil, seja porque a causa jurídica, em princípio, existe (relação contratual prévia em que se debate a legitimidade da cobrança), seja porque a ação de repetição de indébito é ação específica. Doutrina. 10 . Na hipótese aqui tratada, a jurisprudência da Segunda Seção, relativa a contratos privados, seguia compreensão que, com o presente julgamento, passa a ser superada, em consonância com a dominante da Primeira Seção, o que faz sobressair a necessidade de privilegiar os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança dos jurisdicionados. 11. Assim, proponho modular os efeitos da presente decisão para que o entendimento aqui fixado seja empregado aos indébitos de natureza contratual não pública pagos após a data da publicação do acórdão. 12 . Embargos de divergência conhecidos e providos integralmente, para impor a devolução em dobro do indébito. 13. Fixação das seguintes teses. Primeira tese: A restituição em dobro do indébito ( parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida, revelando-se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva . Segunda tese: A ação de repetição de indébito por cobrança de valores referentes a serviços não contratados promovida por empresa de telefonia deve seguir a norma geral do prazo prescricional decenal, consoante previsto no artigo 205 do Código Civil, a exemplo do que decidido e sumulado no que diz respeito ao lapso prescricional para repetição de tarifas de água e esgoto (Súmula 412/STJ). Modulação dos efeitos: Modulam-se os efeitos da presente decisão - somente com relação à primeira tese - para que o entendimento aqui fixado quanto à restituição em dobro do indébito seja aplicado apenas a partir da publicação do presente acórdão. A modulação incide unicamente em relação às cobranças indevidas em contratos de consumo que não envolvam prestação de serviços públicos pelo Estado ou por concessionárias, as quais apenas serão atingidas pelo novo entendimento quando pagas após a data da publicação do acórdão. (STJ - EAREsp: 676608 RS 2015/0049776-9, Relator.: Ministro OG FERNANDES, Data de Julgamento: 21/10/2020, CE - CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 30/03/2021). Dessa forma, impõe-se o reconhecimento do direito da autora à repetição do indébito em dobro relativamente às parcelas descontadas indevidamente, a ser apurado em liquidação de sentença, com os devidos acréscimos de correção monetária desde cada desembolso e juros moratórios a contar da citação. - Do Dano Moral A autora pleiteia indenização por danos morais, sob o argumento de que foi vítima de contratações bancárias não reconhecidas, com descontos indevidos em sua folha de pagamento, os quais teriam causado abalo à sua dignidade, especialmente por comprometerem sua renda mensal. Contudo, a análise do conjunto probatório constante nos autos não permite concluir, de forma segura, pela existência de abalo extrapatrimonial passível de indenização. Ainda que se reconheça a ocorrência de descontos questionáveis em sua folha de pagamento, nota-se que, em parte das contratações impugnadas, houve saque dos valores creditados em sua conta, fato admitido pela própria autora. Em relação às demais, embora se questione a origem ou a regularidade, não se comprova a ocorrência de situação concreta que tenha extrapolado o mero dissabor ou desconforto cotidiano do consumidor. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem firmado entendimento de que o simples inadimplemento contratual ou a cobrança indevida, por si só, não configura dano moral, sendo necessária a demonstração de repercussões relevantes na esfera íntima do indivíduo, o que não se verifica no caso em exame. Veja-se: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULAS 282 E 356/STF. COBRANÇA INDEVIDA. MERO ABORRECIMENTO. DANO MORAL INEXISTENTE . REEXAME DE PROVAS. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. 1. Consoante entendimento desta Corte Superior, não há falar em dano moral in re ipsa em virtude de cobrança indevida, quando inexistente ato restritivo de crédito ou inscrição em cadastro de inadimplentes . Precedentes. 2. Na hipótese, o Tribunal de origem reconheceu que a cobrança efetuada pela recorrida, ainda que indevida, não causou ao autor mais do que meros aborrecimentos da vida cotidiana, pois não houve inscrição indevida em cadastro de inadimplentes nem dificuldade para a celebração de outros negócios jurídicos. A modificação de tal entendimento demandaria o reexame do suporte fático-probatório dos autos, providência inviável em recurso especial, nos termos da Súmula 7/STJ . 3. Agravo interno improvido. (STJ - AgInt no AREsp: 1689624 GO 2020/0085068-5, Relator.: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 15/03/2021, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/04/2021). No mesmo sentido, é o entendimento do e. TJPB: APELAÇÃO Nº. 0800919-98.2023.8.15.0181. Origem: 5ª Vara Mista da Comarca de Guarabira. Relator: Desa. Maria das Graças Morais Guedes Apelante: Elenildo Alves dos Santos. Apelado: Administradora de Consórcio Nacional Honda LTDA. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. SEGURO. VENDA CASADA. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. APELO PARA CONDENAR O RÉU AO PAGAMENTO DE REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. NÃO CABIMENTO. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. MERO ABORRECIMENTO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO. - A mera cobrança indevida não gera dano moral passível de indenização, pois se trata apenas de mero aborrecimento e desconforto. (TJ-PB - APELAÇÃO CÍVEL: 0800919-98.2023.8.15.0181, Relator: Desa. Maria das Graças Morais Guedes, 3ª Câmara Cível). Ademais, ainda que a parte autora relate dificuldades financeiras e transtornos administrativos ao tentar solucionar a questão junto ao banco, tais fatos, por si sós, não configuram violação a direitos da personalidade nem enseja reparação civil por dano moral, mormente quando ausente prova de que tenha sido submetida a exposição vexatória, negativa de crédito, interrupção de benefício ou situação análoga de constrangimento indevido. Dessa forma, não há como conceber-se penalidade a promovida traduzida na obrigação de indenização por danos morais, eis que configurado mero dissabor. - Da litigância de má-fé Tem-se que a litigância de má-fé é característica do ato intencional da parte que altera fato incontroverso ou modifica deliberadamente sua verdade, com o objetivo de obter vantagem no processo, maculando a lealdade processual e constituindo ato atentatório à dignidade da Justiça. Noutro norte, percebe-se que deve ser oportunizada ao promovente a possibilidade de demandar em juízo para discutir pretensões as quais entende subsistir seu direito, sob a advertência que, do contrário, implicaria em violação de institutos constitucionais, na medida em que estaria excluindo da apreciação do Judiciário lesão efetiva ou potencial de direito. Ou seja, deve-se assegurar à parte o direito de ajuizar ação, desde que preencha os requisitos legais, para que o ente estatal aplique o ordenamento jurídico no caso concreto. Desse modo tem entendido a jurisprudência, veja: Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO. SEGURO DE VIDA. CANCELAMENTO INDEVIDO. INADIMPLÊNCIA. AFASTAMENTO. AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO PRÉVIA. INOVAÇÃO RECURSAL. NÃO VERIFICADA. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. NÃO VERIFICADA. ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA. IPCA. SENTENÇA ALTERADA NO PONTO. - Preliminar contrarrecursal. Ocorrência de inovação recursal, pois os argumentos tecidos em sede de contestação não fazem menção ao valor do capital segurado, de modo que acolhida a alegação realizada pela parte autora em contrarrazões de recurso. Presença de inovação recursal no que toca ao valor do capital segurado. - Mérito. O cancelamento do contrato de seguro, com base na inadimplência, só pode ser invocado se há comprovação de que a parte segurada foi notificada previamente à rescisão contratual. No caso em comento, não houve notificação prévia, mas notificação do cancelamento, de modo que irregular a conduta contratual da ré. - Litigância de má-fé. A parte autora pleiteia a aplicação da penalidade. Destaco que a caracterização das condutas previstas no art. 80 do CPC não é objetiva, porquanto, exige demonstração inequívoca da má-fé, que, in casu, não restou demonstrada. Afora isso, a parte pode não vir a ser punida por litigância de má-fé pelo simples fato de lançar mão do seu direito de ação, que é constitucionalmente assegurado pelo artigo art. 5º, XXXV da CF, sob pena de se estar chancelando um tolhimento de um direito fundamental. Penalidade não aplicada. - Correção Monetária: O IGP-M vem sendo largamente utilizado em Juízo para atualização monetária de débitos, no entanto, nos últimos meses, há grande disparidade com relação a todos os demais indicadores utilizados em nossa economia, o que justifica, portanto, a alteração do índice para cálculos judiciais, lembrando que a correção monetária é simples atualização da moeda. - O IPCA foi eleito como índice oficial, substituindo o IGP-M nos cálculos judiciais quando inexistente fixação de outro índice para fins de aplicação monetária, conforme atual redação do art. 507 da Consolidação Normativa Judicial, modificado pelo Provimento nº 014/2022 da CGJ. - Recurso provido apenas para determinar a aplicação do IPCA como fator de correção monetária incidente sobre a condenação. DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECUSO. UNÂNIME.(Apelação Cível, Nº 50213033220198210010, Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Gelson Rolim Stocker, Julgado em: 27-10-2022) EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO MONITÓRIA - CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE LIMPEZA - NOTAS FISCAIS, RELATÓRIOS DE FATURAMENTO E E-MAILS TROCADOS ENTRE AS PARTES - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS - COMPROVAÇÃO - PROVA ESCRITA DA DÍVIDA - FATO IMPEDITIVO, MODIFICATIVO OU EXTINTIVO DO DIREITO DA PARTE AUTORA - AUSÊNCIA - LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ - NÃO OCORRÊNCIA. - A ação monitória pode ser proposta por aquele que afirmar, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, ter direito de exigir do devedor capaz o pagamento de quantia em dinheiro. (CPC, art. 700, I) - O contrato de prestação de serviços, acompanhado de demonstrativo do débito, que demonstra a relação jurídica entre credor e devedor e a existência da dívida, é documento hábil para ajuizamento da ação monitória. (STJ, AgInt no AgRg. no REsp n. 1.104.239/MG) - Comprovada a prestação dos serviços e a existência da dívida cobrada na ação monitória, incumbe ao réu provar existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da parte autora. (CPC, art. 373, II) Ausente essa prova, o pedido monitório é procedente. - Não cabe condenação nas penas por litigância de má-fé, se a conduta da parte não se se enquadra nas hipóteses previstas art. 80 do Código de Processo Civil. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.21.011712-3/001, Relator(a): Des.(a) Ramom Tácio , 16ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 12/05/2021, publicação da súmula em 13/05/2021) A parte demandada alega que a autora litiga de má-fé, pleiteando a condenação desta nos termos do artigo 80 do Código de Processo Civil. Sustenta, em síntese, que a parte autora teria alterado a verdade dos fatos e formulado pretensão contrária a direito reconhecidamente existente, ao questionar a validade de contratos que, segundo o banco, foram regularmente celebrados e executados. Contudo, a análise dos autos não revela qualquer elemento apto a caracterizar a má-fé processual por parte da demandante. Pelo contrário, observa-se que a autora apresentou narrativa coerente, acompanhada de documentação relevante, como extratos bancários e contracheques, nos quais se evidencia a ocorrência de descontos persistentes e, em parte, dissociados de contratos formalmente reconhecidos. Além disso, em diversas oportunidades, a autora buscou administrativamente a solução da controvérsia junto ao banco, por meio de atendimentos e solicitações formais, sem obter resposta satisfatória. Ademais, o próprio comportamento da instituição demandada, que, mesmo intimada, deixou de juntar os contratos impugnados pela autora, reforça a plausibilidade das alegações iniciais e a boa-fé processual da demandante ao propor a presente ação. Sendo assim, no caso vertente, inexistindo prova de inequívoco comportamento doloso que caracterize a má-fé do autor, não se identifica a incidência de alguma das hipóteses previstas no art. 80 do CPC, razão pela qual se nega acolhimento da pretensão formulada pelo promovido. DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por MARIA DO SOCORRO GALDINO DE FREITAS em face do BANCO BRADESCO S.A, extinguindo o processo com resolução do mérito, na forma do art. 487, inciso I do CPC c/c 300 do CPC, para: a) Declarar a nulidade dos contratos de empréstimo consignado impugnado pela autora (excetuando-se os reconhecidos por ela como válidos, firmados em 05/02/2019, 30/08/2021 e 14/03/2022), ante a ausência de comprovação da efetiva contratação e liberação dos valores pela instituição financeira, bem como da regularidade na forma da contratação; b) Determinar a imediata cessação dos descontos em folha de pagamento da autora relacionados aos contratos declarados nulos e às cobranças sob a rubrica “Banco Bradesco Cartões S/A”, em especial aqueles que não estejam amparados por contrato devidamente assinado e juntado aos autos; c) Fixar como limite máximo de descontos a serem realizados diretamente na folha de pagamento da autora, a quantia equivalente a 30% (trinta por cento) de sua renda líquida mensal, conforme entendimento jurisprudencial consolidado; d) Condenar o demandado à repetição do indébito, em dobro do valor descontado indevidamente, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC, devidamente corrigidos monetariamente, a partir do desembolso de cada parcela, com base no INPC até 27.08.2024, depois pelo IPCA, acrescido de juros de 1% ao mês da data da citação até a data da entrada em vigor da Lei 14.905/2024, a partir de 28/08/2024, o cálculo dos juros deverão ser com base na taxa SELIC, os quais serão devidamente liquidados em fase de cumprimento de sentença. Em consonância a isso, o RECURSO ESPECIAL Nº 1.112.746 - DF estabeleceu que “O recurso deve ser provido tão somente para garantir a aplicação da taxa SELIC a partir da vigência do Novo Código Civil, em substituição ao índice de 1% por cento aplicado pela sentença e mantido pelo acórdão recorrido; JULGO IMPROCEDENTE o pedido de indenização por danos morais, por não comprovada lesão aos direitos da personalidade da parte autora, conforme fundamentos supra; Em razão da sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, a serem distribuídos na proporção de 30% para a parte autora e 70% para a parte demandada, nos termos do art. 86 do CPC, suspendendo-se, contudo, a exigibilidade da parcela atribuída à parte autora, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC, ante a gratuidade de justiça anteriormente deferida. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Transitado em julgado, ARQUIVE-SE os autos. JOÃO PESSOA, datado pelo sistema. ADRIANA BARRETO LOSSIO DE SOUZA Juíza de Direito
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear