Ministério Público Do Estado Do Paraná x Dorival Xavier Da Silva e outros
ID: 327631589
Tribunal: TJPR
Órgão: 13ª Vara Criminal de Curitiba
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0000645-27.2025.8.16.0196
Data de Disponibilização:
25/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
UHAILA CRISTINE CORDEIRO
OAB/PR XXXXXX
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RAFFY LENNON BORGES MALINOWSKI
OAB/PR XXXXXX
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LUANA NEVES ALVES
OAB/RJ XXXXXX
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JULIA FONSECA DO NASCIMENTO
OAB/PR XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA - FORO CENTRAL DE CURITIBA 13ª VARA CRIMINAL DE CURITIBA - PROJUDI Av. Anita Garibaldi, 750 - Ahú - Curitiba/PR - CEP:…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA - FORO CENTRAL DE CURITIBA 13ª VARA CRIMINAL DE CURITIBA - PROJUDI Av. Anita Garibaldi, 750 - Ahú - Curitiba/PR - CEP: 80.540-900 - Fone: (41)3309-9113 - E-mail: ctba-63vj-s@tjpr.jus.br Autos nº. 0000645-27.2025.8.16.0196 Processo: 0000645-27.2025.8.16.0196 Classe Processual: Ação Penal - Procedimento Ordinário Assunto Principal: Furto Qualificado Data da Infração: 08/02/2025 Autor(s): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Vítima(s): A ANACLETO IMOBILIÁRIA Réu(s): DORIVAL XAVIER DA SILVA LUÍS FERNANDO PAES DE PAULA Vistos e examinados estes autos de Ação Penal, em que é autor o Ministério Público e réus Dorival Xavier da Silva e Luís Fernando Paes de Paula. I - RELATÓRIO Os réus Dorival Xavier da Silva, brasileiro, convivente, profissional de reciclagem, natural de São Paulo/SP, nascido aos 04.02.1985, com 39 anos de idade na data do fato, filho de Regilaine da Silva, portador da Cédula de Identidade RG nº 15.438.673-4/PR, residente e domiciliado nesta Capital, na Av. Florianópolis, bairro Cajuru, atualmente encarcerado em cadeia pública, e Luís Fernando Paes de Paula, brasileiro, convivente, garçom, natural de Curitiba/PR, nascido aos 15.07.1988, com 36 anos na data do fato, filho de Maria Estela Paes e José Carlos de Paula, portador da Cédula de Identidade RG nº 96.932-8/PR, residente e domiciliado nesta Capital, na Rua Teófilo Otoní, nº 1265, bairro Cajuru, atualmente encarcerado em cadeia pública, foram denunciados nas sanções previstas no artigo 155, §4º, incisos I e IV, do Código Penal, pela prática do seguinte fato: “No dia 8 de fevereiro de 2025, por volta de 03h05, na Rua Niterói, nº 1.701, bairro Cajuru, neste Município e Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba/PR, os denunciados DORIVAL XAVIER DA SILVA e LUÍS FERNANDO PAES DE PAULA e o investigado Ricardo Luiz Mattos Passos (ora não denunciado em virtude da admissibilidade de ANPP), todos agindo dolosamente, vale dizer, com conhecimento (elemento intelectual, no sentido de representação psíquica) e vontade (elemento volitivo, no sentido de querer realizar – ‘decisão de agir’ – as circunstâncias do tipo legal), em conluio de vontades e concurso de agentes, previamente ajustados entre si e um aderindo à conduta ilícita do outro, plenamente cientes da reprovabilidade de suas condutas e contribuindo cada qual com uma parcela necessária para a consecução da conduta delituosa aqui descrita, subtraíram para todos, com ânimo de assenhoreamento definitivo, mediante rompimento de um cadeado, coisa alheia móvel consistente em um portão de acesso ao terreno pertencente a MARIELLEN PRADO SILVA MUNIZ, avaliado em R$ 2.000,00 (dois mil reais, cf. declaração de mov. 84.2), deixando imediatamente o local em poder da ‘res furtiva’. Uma equipe da Polícia Militar do Estado do Paraná, em patrulhamento pela região, visualizou os denunciados transportando o bem em um carrinho de mão, cuja conduta ensejou a abordagem dos imputados. Na oportunidade, esses informaram o local do crime e lá a equipe localizou utensílios utilizados para a extração do portão, motivo pela qual foi executada a prisão em flagrante delito dos denunciados.” (mov. 90.1). O aditamento à denúncia foi recebido em 18 de fevereiro de 2025, sendo determinada a citação dos denunciados para apresentar resposta escrita (mov. 93.1), as quais se encontram nos mov. 134.1 e 135.1. Foi proferido despacho saneador, designando-se audiência de instrução e julgamento (mov. 140.1). Durante a instrução processual foram ouvidas as três testemunhas arroladas na denúncia (mov. 197.1, 197.2 e 197.3), sendo, ao final, interrogados os denunciados (mov. 197.4 e 197.5). As partes apresentaram alegações finais na forma de memoriais. O Ministério Público, sustentando estarem comprovadas a autoria e a materialidade do crime de furto, pugnou pela procedência da denúncia com a condenação dos acusados Dorival Xavier da Silva e Luís Fernando Paes de Paula nas sanções do artigo 155, §4º, inciso IV do Código Penal, com afastamento da qualificadora prevista no artigo 155, §4º, inciso I, do Código Penal por não haver prova suficiente de que agiram mediante rompimento de obstáculo (mov. 207.1). A Defensora nomeada para representar os interesses de Luís Fernando Paes de Paula, discorrendo sobre a ausência de prova da prática do delito de furto qualificado, invocando o princípio in dubio pro reo, requereu sua absolvição nos termos do artigo 386, incisos III e VII, do Código de Processo Penal. Ainda, sustentando ter o réu incorrido na conduta descrita no artigo 349 do Código Penal, pugnou pela desclassificação. Em caso de condenação, pleiteou a aplicação da pena no mínimo legal, com consideração da situação familiar do acusado (mov. 212.1). O acusado Dorival Xavier da Silva, através de sua Defensora, sustentando não se ter comprovado que o delito de furto foi praticado mediante rompimento de obstáculo, pugnou pelo afastamento da qualificadora prevista no artigo 155, §4º, inciso IV, do Código Penal. Discorrendo sobre a ausência de tipicidade material na conduta, requereu a aplicação do princípio da insignificância com sua absolvição. Em caso de condenação, pleiteou a aplicação da atenuante da confissão espontânea prevista no artigo 65, inciso III, alínea ‘d’, do Código Penal, com fixação da pena no mínimo legal e regime aberto para início de cumprimento, bem como a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e concessão do benefício da assistência judiciária gratuita (mov. 213.1). Os autos vieram conclusos para sentença. Sucintamente, é o relatório. Decido. II - FUNDAMENTAÇÃO O processo está em ordem encontrando-se em condições de ser analisado nesta oportunidade. Aos réus Dorival Xavier da Silva e Luís Fernando Paes de Paula, foi imputada a prática do crime previsto no artigo 155, §4º, incisos I e IV, do Código Penal, conforme descrição fática contida no aditamento à denúncia de mov. 90.1. Está descrito no aditamento à denúncia que no dia 8 de fevereiro de 2025, por volta de 03h05, na Rua Niterói, nº 1.701, bairro Cajuru, neste Município e Foro Central da Comarca da Região Metropolitana de Curitiba/PR, os denunciados Dorival Xavier da Silva e Luís Fernando Paes de Paula e o investigado Ricardo Luiz Mattos Passos (ora não denunciado em virtude da admissibilidade de ANPP), todos agindo dolosamente, vale dizer, com conhecimento (elemento intelectual, no sentido de representação psíquica) e vontade (elemento volitivo, no sentido de querer realizar – ‘decisão de agir’ – as circunstâncias do tipo legal), em conluio de vontades e concurso de agentes, previamente ajustados entre si e um aderindo à conduta ilícita do outro, plenamente cientes da reprovabilidade de suas condutas e contribuindo cada qual com uma parcela necessária para a consecução da conduta delituosa aqui descrita, subtraíram para todos, com ânimo de assenhoreamento definitivo, mediante rompimento de um cadeado, coisa alheia móvel consistente em um portão de acesso ao terreno pertencente a Mariellen Prado Silva Muniz, avaliado em R$ 2.000,00 (dois mil reais, cf. declaração de mov. 84.2), deixando imediatamente o local em poder da ‘res furtiva’. Uma equipe da Polícia Militar do Estado do Paraná, em patrulhamento pela região, visualizou os denunciados transportando o bem em um carrinho de mão, cuja conduta ensejou a abordagem dos imputados. Na oportunidade, esses informaram o local do crime e lá a equipe localizou utensílios utilizados para a extração do portão, motivo pela qual foi executada a prisão em flagrante delito dos denunciados. O artigo 155, §4º, incisos I e IV, do Código Penal, que trata do furto qualificado, prevê: "Art. 155. Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. (...) § 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido: I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa; (...) IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.” Ensina Julio Fabbrini Mirabete: "A conduta típica é subtrair, por qualquer meio, a coisa, ou seja, tirar, apropriar-se, mesmo à vista do proprietário ou possuidor. O objeto é a coisa alheia móvel. O crime de furto exige como dolo a vontade de subtrair, acrescida do elemento subjetivo do tipo (dolo específico), finalidade expressa no tipo, que é o de ter a coisa para si ou para outrem. É o denominado animus furandi ou animus rem sibi habendi. Independe, poréum, do intuito de lucro por parte do agente (animus lucri faciendi). É necessário, poréum, que o agente tenha consciência de que se trata de bem alheio." (Código Penal Interpretado - 4ª ed., Atlas/ 2003, pg.1067 e 1075). Pelo que se vê dos mov. 1.4, 1.6/1.10, 1.18/1.25 e 1.27/1.29, inexistem nulidades formais ou substanciais no auto de prisão em flagrante, servindo este como peça de natureza coercitiva e que legitima a prisão dos acusados. Os réus foram presos e autuados em flagrante delito por, supostamente, subtrair coisa alheia móvel, e a prisão revestiu-se das formalidades legais, sendo detido em situação indicativa de que cometeu o delito, configurando, pois, a hipótese prevista no artigo 302 da lei adjetiva penal. Não foi juntado aos autos qualquer documento ou elemento que demonstre a irregularidade do flagrante, bastando aferir-se o contido no artigo 301 e seguintes do Código de Processo Penal. A atuação dos agentes públicos foi legal, tendo eles cumprido o disposto no artigo 5º, inciso XI da Constituição Federal, constatando-se que a peça inquisitória preenche os requisitos dos artigos 302 e 304 do Código de Processo Penal. A materialidade do delito contra o patrimônio encontra-se comprovada através do Auto de Prisão em Flagrante Delito (mov. 1.4, 1.6/1.10, 1.18/1.25 e 1.27/1.29), do Boletim de Ocorrência (mov. 1.5), dos Autos de Exibição e Apreensão (mov. 1.11 e 1.12), do Auto de Avaliação (mov. 1.14), das fotografias de mov. 1.15/1.17, do Laudo de Exame em Local de Furto Qualificado (mov. 47.1), dos Autos de Entrega (mov. 144.1, 184.1 e 189.1), como também pela prova oral colhida nos autos. A autoria da prática do furto, por sua vez, se encontra demonstrada apenas com relação ao réu Dorival Xavier da Silva, fazendo-se necessária maior incursão nas provas dos autos quanto a conduta de Luís Fernando Paes de Paula. Retrato o que de relevante extraio dos depoimentos colhidos em juízo. O representante legal da empresa vítima Arthur Anacleto declarou que é responsável pela negociação do terreno. O terreno não é sua propriedade, mas estava em sua responsabilidade. Quando ocorreu o fato, os Policiais lhe ligaram porque era o número que estava na placa, na frente do terreno. Inclusive, foi no 6º DP para fazer o mesmo depoimento, mas com a visão de um representante apenas. Tomou conhecimento que uma certa madrugada o portão havia sido subtraído e os assaltantes foram pegos de madrugada mesmo pela Polícia. Foi a Mariellen que restituiu o portão, foi até lá apenas para fazer o depoimento. Depois, Mariellen tomou as providências para recuperar o portão e colocar de volta no local. Provavelmente foi necessário arrombamento para retirar o portão do local porque havia um cadeado lá trancado, do qual tinha uma cópia da chave. Provavelmente foi arrombado o cadeado para abrir. O portão, é um portão de trilho, de correr. Provavelmente teve que levantar o portão e tirar do trilho para deslocar dali (mov. 197.1). O Policial Militar Carlos Henrique Kaizer Cavalcante declarou que a equipe estava em patrulhamento pelo bairro Cajuru, localidade próximo de onde é praticado o tráfico de drogas. Era por volta de 02h30min quando, ao adentrar na Rua Niterói, foi visualizado os três indivíduos carregando um portão em cima de um carrinho de reciclagem. Diante da situação e do avançado da hora, a equipe realizou a abordagem aos três indivíduos, sendo que um deles, o Dorival, se apresentou como proprietário do carrinho. Em primeiro momento Dorival disse que o portão seria de sua casa, que havia retirado e o portão não estava instalado, era um portão da residência dele que tinha retirado para vender e fazer o consumo de drogas. Deslocaram-se até o local indicado por Dorival para confirmar a situação. No caminho, visualizaram um terreno sem portão. As medidas do portão se encaixavam no terreno. Foi questionado Dorival do que se trataria. Dorival disse que o terreno era do irmão dele, que estava em São Paulo e que havia retirado o portão com consentimento do irmão. Porém, Dorival não repassou número e nenhum tipo de contato para a equipe Policial entrar em contato com o irmão dele. Foi visualizado também uma placa de uma imobiliária. Diante disso perceberam que o portão havia sido furtado do local. Diante disso fizeram algumas buscas onde o portão estava instalado e foi encontrado um cadeado arrombado e um martelo que havia sido quebrado durante a subtração. Diante dos fatos os três envolvidos foram encaminhados para a Central de Flagrantes. Junto de Dorival estava Luís Fernando e um outro indivíduo abordado. Cada um segurava uma ponta do portão e Dorival, salvo engano, empurrava o carrinho. Não se recorda se Luís Fernando disse ter ajudado a arrancar o portão. Pelo o que se recorda Luís Fernando disse que apenas estava ajudando Dorival a levar o portão. Levar no sentido de transportar. O martelo provavelmente foi usado para quebrar o cadeado e também estava com o cabo quebrado no local. O martelo foi encontrado no terreno, não em posse de Dorival. O cadeado também foi encontrado junto do martelo, sendo que estava em local próximo a onde o martelo estava, alguns centímetros. O cadeado não estava na posse dos denunciados (mov. 197.2). O Policial Militar Yuri Cezar Costa Baruzzo declarou que a equipe estava em patrulhamento por aquela área. Em toda sua área de atuação está sendo muito constante o furto de qualquer utensílio que possa ser vendido em ferro velho. Então fiação, torneira, qualquer coisa que eles possam vender em ferro velho estão subtraindo. Estavam em patrulhamento visualizaram três indivíduos empurrando um carrinho de recicláveis. Em cima desse carrinho havia um portão muito grande. A equipe efetuou a abordagem. Em conversa com um dos abordados, não se recorda qual deles, salvo engano, Dorival, ele informou que o portão era de propriedade de sua família e estava em um terreno, sendo que ele teria conversado com seu irmão que deu a ele autorização para venda do portão. A equipe conversou com ele onde seria o terreno da família e ele apontou aproximadamente. Um dos integrantes da equipe foi até o local e visualizou o terreno vazio de onde teria sido subtraído o portão. No local também foi visualizado um cadeado que foi arrombado, estava caído ao solo e foi encaminhado junto. Diante da situação, entenderam ser uma situação de furto, de onde foi arrombado o cadeado e subtraído o portão. Deram voz de prisão e encaminharam os indivíduos a Central de Flagrantes. Eram três indivíduos. Não se recorda se Dorival ou Luís Fernando informaram ter se encontrado após a subtração. Recorda-se que um terceiro elemento realmente era somente o dono do carrinho e teria sido chamado para levar o portão após a retirada porque era muito grande. Essa é a única parte que se recorda mais exatamente. Acredita que no terreno havia uma placa de imobiliária e foi assim que conseguiram o contato com o proprietário. Isso foi mencionado no Boletim e foi através da placa. Em tese, do que veem de todo modus operandi das situações que atendem, não visualizou o cadeado sendo arrombado, porém, sabiam que o portão foi retirado do local e havia o cadeado arrombado no local, ao solo, de onde o portão foi retirado. Então se entende que eles adentraram ao terreno, arrombaram o cadeado e conseguiram retirar o portão. O portão possuía uma parte em cima que o impedia de tombar. O portão é muito grande, tinha de ter essa guia, senão não parava no lugar. A guia era fixa no muro, eles estavam com o portão. Não sabe dizer se passou antes no local e viu o portão porque não tem o costume de se atentar a coisas que estão na normalidade. Os terrenos pelos quais passa todos tem portão, quando não tem portão lhes chama atenção. Então sim, aquele portão existiu ali, conforme foi informado depois pela vítima. Foi certo que o portão foi retirado (mov. 197.3). Em seu interrogatório na fase judicial, o acusado Dorival Xavier da Silva declarou que conhece Luís Fernando porque são vizinhos, sendo que moram no mesmo condomínio e tem uma amizade com ele há algum tempo. Conhece Ricardo da rua porque ele trabalha com reciclagens e vende material para sua esposa no ferro velho. Passou pelo terreno e viu o portão jogado, abandonado e pegou para vender na sucata, no ferro velho. Só que no momento não sabia que tinha proprietário. Sabe que cometeu errado, está arrependido do que fez. Se puder pagar sua punição em liberdade, não aguenta mais ficar preso. Admite que errou. O portão estava caído, ninguém rompeu o cadeado. O portão estava caído faz tempo. Apenas passou com o carrinho de reciclagem e pediu que Luís Fernando lhe ajudasse a carregar para o ferro velho. Sobre o cadeado, não foram responsáveis. Pegou o portão para levar para o ferro velho, sendo que estava lá tombado e caído. Trabalha com reciclagem e pegou para vender na sucata. Está errado, sabe que errou com o crime e tem que pagar, se arrepende do que fez. Do martelo não se recorda, não era de sua posse não. Não era seu o martelo. Os dois outros estavam na rua de baixo. Veio com o carrinho e chamou os dois para lhe ajudar. Chamou os outros para lhe ajudar porque repartiria com eles o dinheiro do ferro velho. Daria R$ 10,00 (dez reais) para cada um para lhe ajudar. Venderia na sucata, no ferro velho, que fica no Cajuru, há mais ou menos 500m ou 800m (quinhentos ou oitocentos metros) de distância de onde estavam. O ferro velho é 24h (vinte e quatro horas), fica a madrugada inteira aberto e compra todo tipo de material reciclável, menos papelão. O carrinho era seu. Trabalha com reciclagem e tem um carrinho. Os outros dois estavam a pé, na rua e os chamou. Luís Fernando é seu vizinho, tinha chamado ele antes. O outro estava passando com Luís Fernando, os chamou e os levou junto até lá. Está na rua no horário do fato porque é o melhor horário para catar material que quase não tem carrinheiro na rua. São muitos pais de família com carrinhos de madrugada, por isso sai de madrugada para catar material. Está arrependido do que fez, muito arrependido mesmo. Os três colocaram o portão em cima do carrinho. Iam vender por quilo, o que daria em torno de R$ 100,00 (cem reais), micharia. Não paga nem a mão de obra do homem para colocar de volta no lugar. Estava sob efeito de álcool também, estava errado. É usuário de álcool. Já usou muitas drogas, mas não usa mais. Estava sob efeito de álcool no momento do fato, sendo que havia tomado duas garrafas de corote e uma de Fontana. Nesse momento estava sozinho, era o único alcoolizado. Bebeu tudo isso sozinho. Estava tão viciado em álcool e agora conseguiu colocar sua cabeça no lugar. Não quer mais essa vida, não é para sua pessoa, não compensa. Não sabe se os outros dois são usuários de drogas. Não se recorda o que falou na Delegacia, sendo que estava sob efeito de álcool e drogas. Falou coisas que não era nem para ter falado, estava fora de si. Estava alcoolizado e falou coisas que não tinham nexo nenhum. É verdade que fez isso porque estava com vontade de usar drogas. As drogas seria álcool, droga, crack. É usuário de crack, mas saindo da prisão não quer saber mais de nenhuma droga em sua vida. Quer saber apenas de seus familiares. Era usuário de crack há aproximadamente três anos. Usava em torno de cinco pedras por dia. Não podia consumir mais porque tinha família, filhos, aluguel e por conta de sua esposa também, fumava escondido dela. Cinco pedras por dia dão em torno de R$ 25,00 (vinte e cinco reais). Isso fora o álcool que tomava, o corote. Conseguia dinheiro para manter o vício porque sua esposa lhe ajudava, sendo que ela trabalhava também e pagava um pouco das contas dentro de casa. Ficava daquele jeito, meio irresponsável. Por um lado, foi até bom ter sido preso, colocou a cabeça no lugar, aprendeu a lição. Os três sabiam que estavam furtando. Os três tiraram o portão do terreno. Os dois lhe ajudaram a retirar, são três com sua pessoa. O portão estava caído no chão, estava tombado. Os dois lhe ajudaram a colocar no carrinho (mov. 197.4). O acusado Luís Fernando Paes de Paula, em seu interrogatório em Juízo, declarou que estava morando há cerca de quase um mês, porque teve uma briga familiar, saído de sua casa. Foi morar em um cortiço, perto de sua casa, local onde conheceu Dorival. Há alguns meses conheceu Dorival onde foi morar, nesse cortiço. Brigou com sua esposa e saiu de casa para não ter atrito. Foi morar lá e acabou conhecendo Dorival. Como tinha problema com entorpecentes acabou recaindo no alcoolismo e na droga. O que ocorreu no dia do fato foi que Dorival lhe chamou para fazer um favor, que iria lhe dar um dinheiro. Até então não sabia, depois que foi saber que foi um advogado de sua esposa que foi lhe contar que o portão não era de Dorival. Até então Dorival lhe disse que o portão era do tio dele, de um primo dele, de algum familiar dele, e era só para ajudar a carregar o portão do local. Foi o que fez. Estava na rua quando Dorival lhe avisou. Estava na companhia de Ricardo, que inclusive estava com um carrinho de papel. Foi quando Dorival lhes abordou e lhes pediu ajuda porque ele não conseguiria carregar sozinho. Depois de ter cumprido sua pena, sem nenhuma falta, aprendeu sua lição, nunca mais tirou nada de ninguém. Não seria por um furto banal que iria se prejudicar porque estava já assinando o B.O. Se fosse para fazer algo, com o perdão da palavra, não seria sozinho e nem desse gênero. Foi mais para fazer um favor porque ele disse que já havia tirado do lugar, seria só pegar e colocar no carrinho. Nisso estava com Ricardo e ajudou. Confessa que ajudou, isso confessa. Estava na rua com Ricardo fazendo uso de drogas. Infelizmente saiu de casa porque havia brigado com a sua esposa, estava há algum tempo nesse cortiço onde conheceu Dorival. Na noite do fato estava atordoado. Estava atordoado usando muita droga. Estava catando lixo na rua, mas aprendeu a lição de que ninguém tem culpa de seus problemas que seria o uso de drogas. Estava usando crack e cachaça. Estava bebendo junto de Ricardo, na rua. Dorival havia saído e depois voltou pedindo ajuda para carregar o portão. Não teve participação nenhuma no que Dorival fez. Confessa que ajudou a carregar e pronto. Dorival provavelmente quebrou o cadeado do portão. Quando foi ajudar o portão já estava encostado, apenas ajudou a carregar. O portão estava encostado como se tivesse sido retirado de onde fechava. Estava encostado na própria estrutura que sustentava o portão, não estava no chão. Os três pegaram o portão e colocaram em cima do carrinho. O carrinho, a princípio, era de Ricardo. Não possuía carrinho. Estava trabalhando com reciclagem, mas não tinha carrinho. Teve participação, mas da maneira que disse, ajudou a carregar. Não sabia que o portão era furtado porque Dorival disse que era dele. Dorival lhe disse que era só pegar o portão e colocar em cima do carrinho. Na Delegacia disse que não conhecia Dorival e Ricardo porque estava “chapado de droga”, “muito louco de droga”. É usuário de crack há dez anos. Já fez tratamento e ficou um tempo bem. Seu problema é com suas frustrações familiares. Não ajudou a retirar o portão. Iriam levar o portão para o ferro velho por um preço banal. Dorival disse que lhe daria um dinheirinho e para Ricardo. Os três estavam bêbados e drogados, acabaria tudo em droga. Não teve participação de ter tirado o portão do lugar, mas confessa que pegou o portão e ajudou a carregar. Antes de ser chamado não estavam usando crack juntos. Estava com Ricardo, apenas com ele. Não sabe para onde Ricardo foi. Não sabe dizer quanto ganharia porque dependeria da pesagem do material. Venderiam no ferro velho mais próximo que tivesse ali, no caso, seria onde costumavam levar. Costumam pegar um carrinho para levar os materiais até o dono do carrinho de onde fazem o empréstimo. O carrinheiro não tem horário porque esse é o horário que não tem muita movimentação de carro na rua e de pessoas. O carrinheiro trabalha no horário que ele vê que está dando, principalmente para pegar lixo, que as pessoas colocam longe. Tem um pouco de vergonha e pessoalmente preferia fazer isso de madrugada para mexer nos lixos. Havia um carrinho com Ricardo, que foi o carrinho usado para colocar o portão em cima e ser levado. Não havia outro carrinho na história, apenas esse. Não sabe dizer porque Dorival disse que o carrinho era dele. Quando chegou o portão estava encostado como se tivesse recém tirado e encostado. O portão não estava no chão. Aquela hora havia reciclagem aberta, hoje há reciclagem que funciona por 24h (vinte e quatro) horas (mov. 197.5). Estas são as declarações do que mais importante foi produzido durante a instrução processual. Se, por um lado, a Defesa dos réus sustente que a prova não é suficiente para a condenação, por outro, o Ministério Público afirma que a prova produzida nos autos é apta para a condenação de ambos no crime de furto. O embate deve ser resolvido a partir da teoria da prova no processo penal, a qual dispõe de critérios racionais para valoração da prova e 'standards' probatórios ("critérios que estabelecem o grau de confirmação probatória necessário para que o julgador considere um enunciado fático como provado”, cf. BADARÓ, Gustavo H. Epistemologia judiciária e prova penal. São Paulo: RT, 2019, p. 236) a serem atendidos para legitimação da decisão judicial sobre fatos. A rigor, o 'standard' de prova necessário para uma sentença condenatória é aquele além (ou acima) da dúvida razoável. Nesse sentido, a jurisprudência, apoiada na doutrina, sustenta que para se proferir uma decisão é necessário se avaliar todo o conjunto probatório e se chegar à conclusão de que o fato apontado como verdadeiro é melhor explicado pelo conjunto além de qualquer dúvida razoável. O tema foi bem desenvolvido na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, entre outros, no HC nº. 175325, Rel.: Min. Edson Fachin, j. 21/11/2019, no Inq nº. 4657, Rel.: Min. Gilmar Mendes, j. 14/08/2018, no ARE nº. 1067392/CE, Rel.: Min. Gilmar Mendes, j. 26.3.2019, e no escólio da doutrina de Danilo Knijnik, "A prova nos juízos cível, penal e tributário". Apreciando os elementos produzidas nos autos, concluo que as provas colhidas determinam a procedência do pedido condenatório pelo crime de furto somente em relação ao acusado Dorival Xavier da Silva. De acordo com os elementos probatórios, restou comprovado que no dia 08 de fevereiro de 2025, por volta das 03:05 horas, o denunciado Dorival Xavier da Silva subtraiu para si o portão de acesso ao terreno localizado na Rua Niterói, nº 1.701, bairro Cajuru, tendo, em seguida, solicitado a ajuda do acusado Luís Fernando Paes de Paula e de Ricardo Luiz Mattos Passos para retirada do bem do local. Conforme relatos prestados pelo representante da vítima e pelos Policiais Militares, nenhuma dúvida resta de que o assaltante retirou o bem de onde estava instalado e se dirigia para local diverso a fim de vender o portão. O denunciado Dorival Xavier da Silva confessou a autoria delitiva, declarando que praticou o delito com o intuito de comprar drogas para consumo próprio. As provas produzidas em ambas as fases são insuperáveis na demonstração de que Dorival Xavier da Silva subtraiu o portão, sendo depois interpelado pela Polícia Militar que reputou suspeito o transporte de um portão às 03:05 horas em um carrinho de reciclagem. O Ministério Público se desincumbiu de seu ônus, trazendo elementos comprobatórios da autoria e a materialidade, nos termos do artigo 156 do Código de Processo Penal. Estando comprovada a materialidade e a autoria, consubstanciada no depoimento do representante da vítima e dos Policiais Militares na fase inquisitiva e na judicial, bem como na confissão do acusado Dorival Xavier da Silva, a prova é suficiente para a sua condenação. A pretensão da digna Defensora do acusado de excluir a tipicidade formal do crime pelo reconhecimento da insignificância, com o devido respeito, não há como ser agasalhado porque tal princípio é aplicado aos casos em que a lesão ao bem jurídico tutelado é irrisória e quando, efetivamente, não há um desvalor da conduta, devendo, ainda, serem analisadas todas as circunstâncias em que se deu o delito. Constitui instrumento de grande destaque para a correção de desvios existentes na legislação penal, devendo ser compreendido como critério de interpretação restritivo dos tipos penais, de forma que, conquanto certas condutas se amoldem formalmente a um tipo legal, não podem ser consideradas penalmente típicas, não implicando em ofensa significativa ao bem jurídico protegido pela norma penal. Nessa diretriz, portanto, os fatos ofensivos de restrita relevância ou de ínfima lesividade não devem receber uma sanção penal. A doutrina e jurisprudência têm reconhecido a tese da exclusão da tipicidade nos chamados delitos de bagatela, aos quais se aplica o princípio da insignificância, dado que à lei não caberia preocupar-se com infrações de pequena monta, insuscetíveis de gerar o mais diminuto dano à coletividade. Dentre os aspectos distintivos dessa espécie de criminalidade, destaca-se que consistem em infrações de escassa reprovabilidade, posto que representam ofensa a bem jurídico de menor relevância. Há autores que apontam a habitualidade com que ocorrem no ambiente social, o que, supõe-se, retira-lhes a possibilidade de sanção penal até por ofensa ao princípio da igualdade. No magistério de Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli: “A insignificância da afetação exclui a tipicidade, mas só pode ser estabelecida através da consideração conglobada da norma: toda a ordem normativa persegue uma finalidade, tem um sentido, que é a garantia jurídica para possibilitar uma coexistência que evite a guerra civil (a guerra de todos contra todos). A insignificância só pode surgir à luz da finalidade geral que dá sentido à ordem normativa, e, portanto, à norma em particular, e que nos indica que essas hipóteses estão excluídas de seu âmbito de proibição, o que não pode ser estabelecido à simples luz de sua consideração isolada.” (Manual de Direito Penal Brasileiro, RT, 2001, p. 562). Ainda, leciona Francisco de Assis Toledo: “(...) segundo o princípio da insignificância, que se revela por inteiro pela sua própria denominação, o direito penal, por sua natureza fragmentária, só vai aonde seja necessário para a proteção do bem jurídico. Não deve ocupar-se de bagatelas.” (Princípios básicos de direito penal, Ed.Saraiva, 1994, p. 133). O reconhecimento do crime de bagatela exige, portanto, em cada caso, análise aprofundada do desvalor da culpabilidade, da conduta e do dano, para apurar-se, em concreto, a irrelevância penal de cada fato, não se podendo deixar de analisar também as condições pessoais do acusado e da vítima. Conforme entendimento consolidado, para aplicar o princípio da insignificância, deve-se ter em conta a mínima ofensividade da conduta do agente, nenhuma periculosidade social da ação, o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada, a fim de se evitar a vulgarização da prática de delitos. O princípio da insignificância está diretamente relacionado com a tipicidade penal, exigindo, para a configuração de uma conduta penalmente relevante, uma ofensa de alguma gravidade aos bens jurídicos protegidos, pois nem sempre qualquer ofensa a esses bens ou interesses é suficiente para configurar o injusto penal. Em outras palavras, condutas que se amoldam a determinado tipo penal, sob o ponto de vista formal, mas não chegam a afetar o bem jurídico tutelado são penalmente insignificantes e, portanto, atípicas. A insignificância, no entanto, não se resume, em uma hipótese de delito de furto, à mera aferição do valor do bem subtraído, levando em conta a conjugação de requisitos objetivo e subjetivo. O princípio da insignificância, como derivação necessária do princípio da intervenção mínima do direito penal, busca afastar desta seara as condutas que, embora típicas, não produzam efetiva lesão ao bem jurídico protegido pela norma penal incriminadora. No caso em análise, data venia, inaplicável o princípio da insignificância, pois o objeto do delito possui valor muito superior a 10% do salário mínimo vigente (R$ 4.000,00 - auto de avaliação de mov. 1.14), havendo também elevado grau de reprovabilidade da conduta levando se em conta que o delito foi praticado durante o repouso noturno, bem como o acusado é multi-reincidente, inclusive pela prática de furto qualificado (mov. 200.1). Ao tratar da atipicidade da conduta em virtude da insignificância do bem supostamente subtraído, o Superior Tribunal de Justiça tem decidido ser inaplicável o mencionado postulado quando o valor da res é superior a 10% do salário mínimo vigente e quando há elevado grau de reprovabilidade da conduta. Sobre a matéria em análise, transcrevo a seguinte ementa de nosso E. Tribunal de Justiça: “DIREITO PENAL E DIREITO PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO QUALIFICADO PELA ESCALADA (FATO 1) E TENTATIVA DE FURTO QUALIFICADO PELA ESCALADA E ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO (FATO 2). (...) IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. PREJUÍZO EXCEDENTE A 10% DO SALÁRIO-MÍNIMO VIGENTE À ÉPOCA. HABITUALIDADE DELITIVA. (...) RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDO. (...) 5. O princípio da insignificância não se aplica ao caso, pois o prejuízo sofrido pelas vítimas ultrapassa 10% do salário-mínimo e o acusado ostenta reincidência específica, além de comportamento social reiteradamente delitivo. (...) IV. DISPOSITIVO 11. Recurso parcialmente conhecido e, nessa extensão, parcialmente provido.” (TJPR - 4ª Câmara Criminal - 0000105-84.2021.8.16.0077 - Cruzeiro do Oeste - Rel.: DESEMBARGADOR ANTONIO CARLOS RIBEIRO MARTINS - J. 07.07.2025) O Pretório Excelso, sobre o tema, proclamou: “HABEAS CORPUS - ALEGAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE LESÃO A BEM JURIDICAMENTE PROTEGIDO, EM ORDEM A JUSTIFICARA PENA FIXADA – PEDIDO DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. 1. O princípio da insignificância, vetor interpretativo do tipo penal, é de ser aplicado tendo em conta a realizada brasileira, de modo a evitar que a proteção penal se restrinja aos bens patrimoniais mais valiosos, ordinariamente pertencentes a uma pequena camada da população. 2. A aplicação criteriosa do postulado da insignificância contribui, por um lado, para impedir que a atuação estatal vá além dos limites do razoável atendimento do interesse público. De outro lado, evita que condutas atentatórias a bens juridicamente protegidos, possivelmente toleradas pelo Estado, afetem a viabilidade da vida em sociedade. 3. O parâmetro para aplicação do princípio da insignificância, de sorte a excluir a incriminação em caso de objeto material de baixo valor, não pode ser exclusivamente o patrimônio da vítima ou o valor do salário mínimo, pena se ensejar a ocorrência de situações absurdas e injustas. 4. No crime de furto, há que se distinguir entre infração de ínfimo e de pequeno valor, para efeito de aplicação da insignificância. Não se discute a incidência do princípio no tocante às infrações ínfimas, devendo-se, entretanto, aplicar-se a figura do furto privilegiado em relação às de pequeno valor. 5. Habeas corpus indeferido.” (HC 84.428-SP, rel. Min. Carlos Britto). Não se olvide que a desconsideração da prática de crimes provoca desvalor dos princípios morais inerentes ao ser humano indispensáveis para o convívio em sociedade, resultando em estímulo a prática de ilícitos cada vez mais graves. A partir das mencionadas premissas, conclui-se, inexoravelmente, que o tipo penal, devidamente caracterizado na espécie, não admite a incidência do invocado princípio da insignificância ou de bagatela. No que toca às qualificadoras previstas nos incisos I e IV do artigo 155 do Código Penal, entendo que não devem ser aplicadas porque não há prova segura nesse sentido. Embora evidente a utilização de artifícios pelo acusado, consistente no ato de subtrair para si um portão de acesso, inviável a configuração das qualificadoras de destruição ou rompimento de obstáculo e concurso de duas ou mais pessoas, uma vez que não há nos autos prova suficiente de que tenha sido o responsável pelo arrombamento do portão ou que tenha agido em concurso com o acusado Luís Fernando Paes de Paula e com Ricardo Luiz Mattos Passos. Ensina a doutrina que “O obstáculo deve corresponder, exclusivamente ou não, ao fim de proteger a propriedade; e para vencer-lhe a resistência o recurso do agente deve ser o emprego de violência para destruí-lo ou rompê-lo. Destruir é subverter ou desfazer totalmente o obstáculo (derribar uma parede, despedaçar uma porta), enquanto romper é abrir brecha, é arrombar (com ou sem ofensa à substância da coisa), arrebentar, cortar, serrar, perfurar, deslocar, forçar, de qualquer modo, o obstáculo para vencer-lhe a resistência e possibilitar ou facilitar a execução do crime.” (Nelson Hungria e Heleno Fragoso – Comentários ao Código Penal, Volume VII, Editora Forense, 4ª edição, p. 41). Outrossim, como se sabe, face ao princípio da responsabilidade solidária (art. 29 do CP), a lei não incrimina apenas os autores materiais do delito, alcançando aqueles que, mesmo no plano moral, colaboram para a ação do crime, conforme vêm decidindo nossos tribunais. O concurso de pessoas tem previsão na regra do artigo 29, caput, do Código Penal: "Art. 29. Quem, de qualquer modo, concorre para o crime, incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade." É a hipótese do crime cometido por mais de um agente, resultando na co-autoria. Segundo a melhor doutrina, os requisitos para o concurso de pessoas são: i) existência de dois ou mais agentes; ii) pluralidade de comportamentos, iii) relação de causalidade material entre as condutas desenvolvidas e o resultado; iv) vínculo subjetivo ou psicológico ligando as condutas entre si; v) reconhecimento da prática da mesma infração para todos; vi) existência de fato punível. No caso, reconheço estarem plenamente preenchidos todos os requisitos, já que o fato foi praticado pelo acusado e mais um indivíduo não identificado, nas circunstâncias anteriormente descritas. Apesar de o acusado Dorival Xavier da Silva ter declarado que todos os envolvidos tinham ciência e estavam em conluio para a subtração do portão, ao mesmo tempo afirmou que, após iniciar a subtração do bem, chamou o acusado Luís Fernando Paes de Paula e Ricardo Luiz Mattos Passos para que o ajudassem a carregar o portão até o ferro velho e que, para tanto, daria o valor de R$ 10,00 (dez reais) a cada um após a venda. Ainda que incontroverso o fato de que os acusados e Ricardo Luiz Mattos Passos estavam transportando em conjunto o portão recém furtado com o fim de realizar a venda, nada mais há que demonstre que tenham agido em conjunto para a efetiva subtração. Por tal razão, não se mostra desmesurada a versão apresentada de Luís Fernando Paes de Paula de que não participou da subtração do portão, apenas aceitou receber o valor oferecido pelo réu Dorival Xavier da Silva para transportar o bem até o local em que pretendia realizar a venda. Importante ressaltar que os acusados e Ricardo Luiz Mattos Passos foram flagrados pelos Policiais Militares em posse do portão subtraído já fora do local do delito, encima do carrinho de reciclagem, não havendo comprovação de que Dorival Xavier da Silva tenha agido em concurso com o acusado Luís Fernando Paes de Paula e nem de que tenha sido o responsável pelo rompimento do cadeado que segurava o portão. O Laudo de Exame em Local de Furto Qualificado nº 15.015/2025 atestou que “...Ao exame do local notou-se a ausência do portão que compunha a estrutura que guarnece o acesso ao interior do terreno, estando este desguarnecido. (...) PRIMEIRO QUESITO Houve destruição ou rompimento de obstáculo; escalada; emprego de chave falsa; concurso de duas ou mais pessoas? Resposta: Não. A mera remoção do portão, objeto de furto, não configura qualificação...” (mov. 47.1). Além de não ter sido possível constatar que o delito de furto tenha sido praticado mediante rompimento de obstáculo pela perícia, nenhuma outra prova se produziu a fim de confirmar que Dorival Xavier da Silva tenha sido o responsável pelo dano causado ao cadeado que prendia o portão subtraído, não tendo sido a ação presenciada por nenhuma das testemunhas ouvidas, as quais apenas expressaram a possibilidade que a conduta tenha se realizado de tal maneira. O acusado Luís Fernando Paes de Paula também informou ter chegado ao local do delito quando o portão já estava fora do local onde foi instalado, não conseguindo precisar se houve o rompimento do obstáculo pelo acusado Dorival Xavier da Silva, apenas supondo que provavelmente tal fato ocorreu. Assim, tendo em vista que o terreno de onde o portão foi retirado não estava sendo habitado, não se mostra incompatível com a realidade a possibilidade de que Dorival Xavier da Silva tenha encontrado o bem já com o cadeado rompido, não havendo prova contrária. Comparando-se a conduta do réu aos elementos do tipo penal, verifica-se não ter-se comprovado que Dorival Xavier da Silva tenha agido em conjunto com Luís Fernando Paes de Paula e Ricardo Luiz Mattos Passos para subtração do portão e nem que tenha sido responsável pelo rompimento do cadeado que proporcionou a subtração, restando inviável a configuração das qualificadoras de rompimento de obstáculo e concurso de duas ou mais pessoas. Sobre fatos semelhantes, transcrevo as seguintes ementas: "APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO QUALIFICADO (ARTIGO 155, § 4º, II, CP). SENTENÇA CONDENATÓRIA. INSURGÊNCIA DA DEFESA. (...) II) PEDIDO DE AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA RELATIVA AO ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO. POSSIBILIDADE, AINDA QUE POR MOTIVO DIVERSO. RELATO TESTEMUNHAL DE QUE O IMÓVEL JÁ TERIA SIDO ALVO DE FURTOS ANTERIORES. IMPOSSIBILIDADE DE SE AFERIR SE O ROMPIMENTO DE OBSTÁCULO FORA REALIZADO PELO APELANTE E DEMAIS COAUTORES OU SE JÁ TERIA SIDO REALIZADO PELOS AGENTES DOS FATOS PRETÉRITOS. (...) ‘In casu’, porém, em que pese as imagens da fechadura danificada juntadas aos autos, conforme relato testemunhal o imóvel já teria sido alvo de furtos anteriores, de modo que não se pode afirmar, com a certeza necessária exigida pelo processo penal, que o referido rompimento de obstáculo tenha sido perpetrado pelo recorrente e demais coautores. (...) 9. Recurso conhecido e parcialmente provido." (TJPR - 3ª Câmara Criminal - 0001939-75.2021.8.16.0028 - Curitiba - Rel.: JOSE AMERICO PENTEADO DE CARVALHO - J. 29.06.2025). "DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. FURTO QUALIFICADO POR ESCALADA. REINCIDÊNCIA. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INIMPUTABILIDADE. DESCLASSIFICAÇÃO PARA FURTO SIMPLES. AFASTAMENTO DA QUALIFICADORA DE CONCURSO DE PESSOAS. PARCIAL PROVIMENTO.I. CASO EM EXAME. Apelação criminal interposta contra sentença condenatória que julgou parcialmente procedente a denúncia, condenando o réu pela prática do crime de furto qualificado por escalada e concurso de pessoas, previsto no art. 155, § 4º, incisos II e IV do Código Penal. A defesa buscava a absolvição por erro de tipo, aplicação do princípio da insignificância, inimputabilidade decorrente de dependência química, ou desclassificação do delito para furto simples tentado, além de redução da pena ao mínimo legal. (...) A qualificadora de concurso de pessoas foi afastada, pois os elementos probatórios não confirmaram a atuação conjunta e coordenada do suposto coautor, evidenciando apenas indícios. (...) A qualificadora de concurso de pessoas requer provas robustas de atuação conjunta e coordenada entre os agentes. (...)" (TJPR - 4ª Câmara Criminal - 0005423-72.2022.8.16.0090 - Ibiporã - Rel.: JUIZ DE DIREITO SUBSTITUTO EM SEGUNDO GRAU LOURIVAL PEDRO CHEMIM - J. 31.03.2025). Assim, os elementos dos autos não se configuram suficientes a ensejar a incidência das qualificadoras por rompimento de obstáculo e concurso de duas ou mais pessoas, devendo ser afastadas. Deste modo, comprovada a materialidade do crime de furto e sendo certa a sua autoria, presentes as elementares do tipo penal e verificada a inexistência de causas excludentes da antijuridicidade ou de causas dirimentes da culpabilidade, impõe-se seja o réu Dorival Xavier da Silva condenado pela prática do crime de furto tipificado no artigo 155, caput, do Código Penal. Passo a analisar a conduta atribuída ao réu Luís Fernando Paes de Paula. Pelas provas colhidas nos autos não há dúvidas de que Luís Fernando Paes de Paula estava em posse do portão furtado na data do fato e o transportava em proveito próprio, porém, não há qualquer prova de que tenha agido em conjunto com o acusado Dorival Xavier da Silva na efetiva subtração do bem. Conforme já consignado, o acusado Dorival Xavier da Silva afirmou que, após iniciar a subtração do bem, chamou Luís Fernando Paes de Paula e Ricardo Luiz Mattos Passos para que o ajudassem a carregar o portão até o ferro velho e que, para tanto, daria o valor de R$ 10,00 (dez reais) a cada um após a venda, o que se coaduna com a versão de Luís Fernando de que foi convidado por Dorival para levar o portão até o ferro velho em troca de um valor a ser determinado após a venda. A conclusão de que Luís Fernando Paes de Paula teria praticado o crime de furto em conjunto com Dorival Xavier da Silva ocorreu porque foram flagrados em conjunto enquanto transportavam o portão, todavia, não houve qualquer testemunha apata a confirmar que a ação de ambos na efetiva subtração do bem. Guilherme de Souza Nucci, ao analisar o núcleo do tipo de furto, ensina que “...subtrair significa tirar, fazer desaparecer ou retirar e, somente em última análise, furtar (apoderar-se). É verdade que o verbo ‘furtar’ tem um alcance mais amplo do que ‘subtrair’, e justamente por isso o tipo penal preferiu identificar o crime como sendo furto e a conduta que o concretiza como subtrair, seguida, é lógico, de outros importantes elementos descritivos e normativos. Assim, o simples fato de alguém tirar coisa pertencente a outra pessoa não quer dizer, automaticamente, ter havido um furto, já que se exige, ainda, o ânimo fundamental, componente da conduta de furtar, que é assenhorear-se do que não lhe pertence” (Código Penal. São Paulo: RT, 2012, p. 763). De acordo com as provas colhidas na instrução processual, observa-se a possibilidade de que os fatos atribuídos ao acusado Luís Fernando Paes de Paula fossem mais adequadamente enquadrados como receptação, no entanto, essa conduta não foi narrada como crime autônomo na inicial acusatória, tampouco foi objeto de aditamento da denúncia nos moldes do artigo 384 do Código de Processo Penal, não sendo possível a desclassificação, uma vez que a descrição fática não encontra perfeita subsunção ao delito descrito no artigo 180 do Código Penal, que prevê: “Art. 180 - Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.” Nos termos do artigo 383 do Código de Processo Penal: “Art. 383. O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em consequência, tenha de aplicar pena mais grave.” O enquadramento em nova figura típica enseja violação ao princípio da correlação entre a inicial acusatória e a sentença, destacando-se que a denúncia descreve minuciosamente que o denunciado Luís Fernando Paes de Paula, junto do acusado Dorival Xavier da Silva e de Ricardo Luiz Mattos Passos, “agindo dolosamente, vale dizer, com conhecimento (elemento intelectual, no sentido de representação psíquica) e vontade (elemento volitivo, no sentido de querer realizar – ‘decisão de agir’ – as circunstâncias do tipo legal), em conluio de vontades e concurso de agentes, previamente ajustados entre si e um aderindo à conduta ilícita do outro, plenamente cientes da reprovabilidade de suas condutas e contribuindo cada qual com uma parcela necessária para a consecução da conduta delituosa aqui descrita, subtraíram para todos, com ânimo de assenhoreamento definitivo, mediante rompimento de um cadeado, coisa alheia móvel consistente em um portão de acesso ao terreno pertecente à pessoa jurídica A. ANACLETO IMOBILIÁRIA, avaliado em R$ 4.000,00 (quatro mil reais – mov. 1.14), deixando imediatamente o local em poder da ‘res furtiva’”. Segundo tal princípio (correlação), deve haver perfeita correspondência entre o fato descrito e imputado ao réu na denúncia e o fato reconhecido na sentença, o que não se evidencia no caso vertente em relação ao acusado Luís Fernando Paes de Paula. Sobre o assunto, Júlio Fabbrini Mirabete ensina que “deve haver uma correlação entre a sentença e o fato descrito na denúncia ou na queixa, ou seja, entre o fato imputado ao acusado e o fato pelo qual ele é condenado. Esse princípio da correlação entre a imputação e a sentença representa uma das mais relevantes garantias do direito de defesa e qualquer distorção, sem observância dos dispositivos legais cabíveis, acarreta a nulidade da decisão. Não pode o Juiz, assim, julgar o acusado por fato de que não foi acusado ou por fato mais grave, proferindo sentença que se afaste do requisitório da acusação." (MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código de Processo Penal Interpretado. 9. ed. São Paulo: Editora Atlas,2002, p.979.). Neste sentido: “APELAÇÃO CRIMINAL – CRIMES DE FURTO QUALIFICADO (ARTIGO 155, §4º, INCISOS I E IV, DO CÓDIGO PENAL) – SENTENÇA ABSOLUTÓRIA QUANTO A UM DOS ACUSADOS E DESCLASSIFICATÓRIA CONTRA A RECORRENTE, PARA O DELITO DE RECEPTAÇÃO (ARTIGO 180 DO CÓDIGO PENAL) - RECURSOS DA DEFESA E DO MINISTÉRIO PÚBLICO. (...) RECURSO DA DEFESA – PLEITO ABSOLUTÓRIO PEDIDO ATENDIDO POR MOTIVAÇÃO DIVERSA – MAGISTRADO DE PRIMEIRO GRAU QUE PROCEDEU À DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE FURTO PARA O DE RECEPTAÇÃO EM AFRONTA AO PRINCÍPIO DA CORRELAÇÃO – COMPORTAMENTO IMPUTADO À RÉ NÃO DESCRITO, NEM IMPLICITAMENTE, NA DENÚNCIA - MAGISTRADO QUE A CONDENOU POR FATO DIVERSO, NÃO DESCRITO NA EXORDIAL, SEM OPORTUNIZAR AO MINISTÉRIO PÚBLICO O ADITAMENTO DA EXORDIAL ACUSATÓRIA – VIOLAÇÃO AO DISPOSTO NO ARTIGO 384 DO CPP – (...) RECURSO DEFENSIVO CONHECIDO E PROVIDO, COM A ABSOLVIÇÃO QUANTO À PRÁTICA DO CRIME DE RECEPTAÇÃO, NOS TERMOS DO ARTIGO 386, INCISO V, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, POR FUNDAMENTAÇÃO DIVERSA, RESTANDO PREJUDICADAS AS DEMAIS QUESTÕES ARGUIDAS.” (TJPR - 5ª Câmara Criminal - 0020856-24.2020.8.16.0014 - Londrina - Rel.: DESEMBARGADOR MARCUS VINICIUS DE LACERDA COSTA - J. 07.07.2025). No caso, é possível constatar que o Ministério Público teve a oportunidade de aditar a denúncia para enquadrar os fatos sob novo tipo penal, mas não o fez dentro do prazo legal, de forma que a substituição do tipo penal na sentença, com base em fatos não imputados originalmente, violaria o princípio da correlação entre a acusação e a sentença. Ademais, a ausência de prova segura quanto ao dolo de subtrair - essencial para o tipo penal do furto tentado -,e e da falta de veracidade de participação na subtração do portão e da impossibilidade jurídica de condenação por fato diverso não descrito na denúncia, impõe-se a absolvição do acusado Luís Fernando Paes de Paula. III - DISPOSITIVO Ante ao exposto, julgo procedente em parte a denúncia para o fim de condenar o réu Dorival Xavier da Silva como incurso nas sanções do artigo 155, caput, do Código Penal, e para absolver Luís Fernando Paes de Paula das sanções do artigo 155, §4º, incisos I e IV, do Código Penal, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. Expeça-se o alvará de soltura em favor de Luís Fernando Paes de Paula, salvo se por outro motivo deva permanecer encarcerado. Sem custas processuais ao réu Luís Fernando Paes de Paula em razão de sua absolvição. Considerando as diretrizes estabelecidas no artigo 59 e 68 do Código Penal, passo à individualização da pena do réu Dorival Xavier da Silva. Quanto à culpabilidade, agiu o réu com plena consciência em busca do resultado criminoso, pois, enquanto imputável, tinha, na ocasião dos fatos, pleno conhecimento da ilicitude de seu proceder e se lhe exigia conduta diversa, sendo reprovável seu comportamento, o que no quesito em análise deve ser considerado normal, já que a sua atuação não apresenta outros aspectos negativos, mas apenas aqueles próprios do tipo penal que lhe é atribuído. De acordo com o relatório de antecedentes (mov. 200.1), o réu é reincidente (condenado pela Vara Única de Cananéia/SP nos autos nº 0001256-32.2011.8.26.0118, por receptação), mas tal circunstância será apreciada na segunda fase, no entanto, por lhe desfavorecer outras quatro condenações transitadas em julgado (condenado pela Vara Única de Cananéia/SP nos autos nº 0001102-48.2010.8.26.0118, 0000320-41.2010.8.26.0118, 118.01.2010.001526-2/2010 e 118.01.2011.001110-2/2011, por crimes contra o patrimônio), o rigor impõe que tal circunstância seja valorada como maus antecedentes, sem incorrer em bis in idem. Não há nos autos elementos para aferição segura da sua personalidade. No que tange à conduta social, é possível observar que este não é episódio acidental em sua vida, não havendo comprovação de que exercesse atividade laboral lícita, certamente dedicando-se a prática de crimes para o seu sustento, indicando claramente desajustamento de sua conduta social. No caso concreto, embora a ficha criminal do réu já tenha sido considerada quando da valoração negativa da reincidência e dos antecedentes criminais, contato, ainda, que mesmo condenado por outros crimes com trânsito em julgado, tem-se como necessária a valoração negativa por ter o crime sido cometido enquanto cumpria pena no regime aberto, consoante se depreende dos autos de execução penal nº 0003278-85.2019.8.16.0013. Nesse sentido: STJ (AgRg no AREsp 1713524/DF, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 27/10/2020, DJe 12/11/2020) e TJPR (5ª C.Criminal - 0000538-22.2021.8.16.0196 - Curitiba - Rel.: DESEMBARGADOR RENATO NAVES BARCELLOS - J. 09.10.2021). O motivo seria a busca de lucro fácil em detrimento do patrimônio alheio, normal para o fato em análise. As circunstâncias do crime merecem maior reprovabilidade, notadamente por ter sido o crime praticado durante o repouso noturno, por volta das 03h05min, merecendo, assim, maior reprovação. Deixo de valorar as consequências do crime por não haver elementos específicos que indiquem que o crime, notadamente pelos custos experimentados pela vítima para reposição do portão, tenha extrapolado os contornos próprios do tipo penal em análise. A vítima em nada contribuiu para a prática criminosa. Considerando a existência de circunstâncias judiciais desfavoráveis (antecedentes, conduta social e circunstâncias) fixo a pena-base acima no mínimo legal em 01 (um) ano e 09 (nove) meses de reclusão - 03 (três) meses a mais para cada - e em 40 (trinta) dias-multa - 10 (dez) dias-multa a mais para cada. Observando a existência da circunstância atenuante prevista no artigo 65, inciso III, ‘d’ do Código Penal - confessado espontaneamente a autoria do fato -, e a presença da circunstância agravante - reincidência (CP, art. 61, I) -, entendendo que ambas se compensam, a pena permanece inalterada. Inexistem causas de diminuição ou de aumento de pena. Ausentes outras causas modificadoras, fixo definitivamente a pena do réu Dorival Xavier da Silva em 01 (um) ano e 09 (nove) meses de reclusão e em 40 (quarenta) dias-multa, cada um no valor equivalente a um trigésimo (1/30) do salário mínimo em vigor ao tempo dos fatos, levando-se em conta a situação econômica do sentenciado, a ser atualizado por ocasião do efetivo pagamento (CP, art. 49, § 2º), que deverá ser paga no prazo de 10 (dez) dias contados do trânsito em julgado desta sentença (CP, art. 50). Atendendo-se as circunstâncias judiciais, e por ser reincidente, o réu Dorival Xavier da Silva cumprirá a pena privativa de liberdade em regime inicial semiaberto (CP, art. 33, § 1º, ‘b’, § 2º, ‘b’, § 3º, 35 e §§), por entender ser necessário e suficiente para prevenção e reprovação do grave crime cometido, inclusive mais eficaz sob o ponto de vista pedagógico - prejudicando, uma vez que incompatível à espécie, a substituição por pena restritiva de direitos (CP, art. 44, I) ou, ainda, a aplicação de sursis, isto porque a pena imposta se mostra superior a dois anos (CP, art. 77, caput, e I). Oportunamente, deverá ser computado na pena privativa de liberdade o tempo de prisão provisória, nos termos do artigo 42 do Código Penal, observando-se que não é possível a imediata progressão de regime prisional nos termos do artigo 387, §2º, do Código de Processo Penal, pelo reconhecimento da detração, tendo em vista que se encontra preso há pouco mais de cinco meses e por se tratar de réu reincidente, o que implica na unificação para o cumprimento de todas as penas. Conforme disposição do artigo 387, §1º, do Código de Processo Penal, alterado pela Lei n.º 11.716/2008, deve o Juiz, ao proferir a sentença, decidir acerca da manutenção da prisão preventiva quando se tratar de réu custodiado provisoriamente. São requisitos para a decretação da prisão preventiva, além daqueles estabelecidos no artigo 312 do Código de Processo Penal, quando inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares previstas no artigo 319 da lei processual penal. Assim, a partir da vigência da nova forma procedimental, se admite a prisão preventiva em face da prática dos delitos e nas circunstâncias elencadas no artigo 313 do Código de Processo Penal (crimes dolosos com pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos; condenação por outro crime doloso, com sentença transitada em julgado; pela prática de delitos com violência doméstica e familiar contra mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência e existência de dúvida acerca da identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la). Com isso, se observa que a nova lei traz como fim precípuo o caráter excepcional da prisão preventiva. Nos termos da legislação em vigor, a primeira exigência para a decretação da prisão preventiva é a materialidade do crime, ou seja, a existência que comprova a ocorrência do fato criminoso. De modo que, exigindo o texto legal a prova da existência do crime, não se justifica a custódia por mera suspeita ou indícios da ocorrência de um ilícito penal. Igualmente, também se exige indícios suficientes de autoria, ou seja, elementos probatórios ainda que não concludentes ou que conduzam a certeza da autoria. Está previsto no artigo 312 do Código de Processo Penal, que a prisão preventiva funda-se na garantia da ordem pública e/ou econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal. No que toca ao primeiro requisito, a cautela é exigida para o fim de evitar que o delinquente pratique novos crimes, quer porque se observe que seja propenso a prática delituosa, quer porque em liberdade poderá encontrar os mesmos estímulos relacionados a infração cometida. Conforme ensinamentos doutrinários, a simples repercussão do fato sem outras consequências, não se constitui em motivo suficiente para a decretação da custódia cautelar, mas estará justificada se o acusado apresenta periculosidade, na perseverança de ações delituosas, ou quando se constata na prática do crime perversão, malvadez, cupidez e insensibilidade moral. Referentemente a necessidade da segregação por conveniência da instrução criminal, esta decorre da efetiva necessidade de assegurar a prova processual contra a ação do criminoso que pode fazer desaparecer provas do crime, apagando vestígios, subornando, e ameaçando testemunhas, além de outras manobras ilegais. E, finalmente, o asseguramento a aplicação da lei penal decorre da possibilidade de, em liberdade, o réu fugir para local incerto e desconhecido. Dessa forma, constatando-se que o ora condenado é reincidente e possui antecedentes, em razão de que não há comprovação efetiva de que possua residência fixa e exerça atividade laboral lícita e que foi preso preventivamente, que a ação mostrou que é dotado de periculosidade, demonstrando perversão e insensibilidade moral, tendo em vista o regime conferido para o cumprimento da pena, não havendo alteração dos motivos que ensejaram sua custódia cautelar e sendo essa essencial para a garantia da ordem pública e aplicação da lei penal, mantenho sua prisão preventiva, nos termos do art. 387, §1º, do Código de Processo Penal. Renove-se o mandado de prisão, via BNMP, nos termos da determinação da Corregedoria-Geral da Justiça. Expeça-se Guia de Recolhimento Provisória, nos termos do Código de Normas da Corregedoria-Geral da Justiça. Oficie-se. Condeno o sentenciado Dorival Xavier da Silva ao pagamento das custas processuais (art. 804, CPP), ressalvando-se que a concessão do benefício da justiça gratuita deverá ser manejado no âmbito da execução penal, perante o juízo competente. Nesse sentido: “TJPR – 2ª C. Criminal – 0005189-65.2016.8.16.0037 – Campina Grande do Sul – Rel.: Desembargador Laertes Ferreira Gomes – J. 22.03.2021”, “TJPR – 4ª C. Criminal – 0000751-09.2020.8.16.0149 – Salto do Lontra – Rel.: Desembargador Celso Jair Mainardi – J. 24.08.2020”. Levando em conta que a prestação de assistência judiciária aos necessitados é dever do Estado, nos termos do artigo 5°, LXXIV, da Constituição Federal, para fins de remuneração aos serviços prestados pelos defensores nomeados, não se aplicando na presente ação penal o princípio da sucumbência, condeno o Estado do Paraná a pagar à advogada, Dra. Julia Fonseca do Nascimento (OAB-PR nº 96.254), com fundamento no artigo 22, §1º, da Lei n° 8.906/94 c/c a Resolução Conjunta nº 06/2024 – PGE/SEFA, honorários advocatícios no importe de R$2.000,00 (dois mil reais), montante a ser corrigido monetariamente pelo INPC-IBGE, a contar da data desta decisão, levando em conta o grau de zelo profissional, o lugar da prestação do serviço, a natureza, a complexidade e a importância da causa, o trabalho realizado e o tempo exigido para o seu serviço. Esta sentença serve como certidão para os fins de recebimento dos honorários junto aos órgãos competentes. Inexistindo pedido formal do Ministério Público e da ofendida para fixação de valor mínimo para reparação dos danos, e ausente qualquer discussão sobre esse tópico no transcurso da instrução processual que possibilite delinear a quantia indenizatória, não há como atender ao disposto no artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal. (“(...) é fundamental haver, durante a instrução criminal, um pedido formal para que se apure o montante civilmente devido. (...) A parte que o fizer precisa indicar valores e provas suficientes a sustentá-los. A partir daí, deve-se proporcionar ao réu a possibilidade de se defender e produzir contraprova, de modo a indicar valor diverso ou mesmo a apontar que inexistiu prejuízo material ou moral a ser reparado (...).” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2008, p. 691). Proceda-se a destruição do cadeado e do martelo apreendidos (auto de exibição e apreensão - mov. 1.11), mediante termo nos autos (CN, art. 1.006). Comunique-se a vítima, remetendo-se cópia desta decisão nos termos do artigo 201, §2º, do Código de Processo Penal, certificando-se o cumprimento. Após o trânsito em julgado desta decisão: a)Remeta-se os autos ao cartório contador para o cálculo das custas processuais e multa imposta, intimando-se o sentenciado para pagamento em 10 (dez) dias (CPP, art. 686 e CP, art. 50). b)Expeça-se guia de recolhimento para execução da(s) pena(s) (art. 674 do CPP e art. 105 da LEP), com observância do disposto nos arts. 106 e 107 da LEP, art. 676/681 do CPP e Código de Normas da Corregedoria Geral da Justiça. c)Oficie-se ao Juízo Eleitoral, comunicando-se desta decisão, nos termos do artigo 15, inciso III da Constituição Federal. Procedam-se as comunicações necessárias e cumpram-se as disposições contidas no Código de Normas da Corregedoria Geral da Justiça (CNFJ, Livro II, Título IV, Capítulo VI, Seção V). Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Curitiba, 15 de julho de 2025. Antonio Carlos Schiebel Filho Juiz de Direito
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