Resultados para o tribunal: TRT10

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W Junnyor Nepomoceno Ltda

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Cristiane Valverde De Brito x 5 Estrelas Servicos De Apoio Administrativo Ltda - Epp e outros

ID: 261353877

Tribunal: TRT10 Órgão: 3ª Turma Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0000375-36.2024.5.10.0008

Data de Disponibilização: 28/04/2025

Polo Ativo:

CRISTIANE VALVERDE DE BRITO

Polo Passivo:

5 ESTRELAS SERVICOS DE APOIO ADMINISTRATIVO LTDA - EPP CONDOMINIO CIVIL DO SHOPPING CENTER IGUATEMI BRASILIA

Acórdão

Advogados:

ELIZABETH PEREIRA DE OLIVEIRA

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

GABRIELA MICHELONE PEREIRA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

DONNE PINHEIRO MACEDO PISCO

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 3ª TURMA Relator: AUGUSTO CESAR ALVES DE SOUZA BARRETO 0000375-36.2024.5.10.0008 : CRISTIANE VALVERDE DE BRITO … PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 3ª TURMA Relator: AUGUSTO CESAR ALVES DE SOUZA BARRETO 0000375-36.2024.5.10.0008 : CRISTIANE VALVERDE DE BRITO : 5 ESTRELAS SERVICOS DE APOIO ADMINISTRATIVO LTDA - EPP E OUTROS (1) PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO PROCESSO n.º 0000375-36.2024.5.10.0008 - RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA (1009) RELATOR: DESEMBARGADOR AUGUSTO CÉSAR ALVES DE SOUZA BARRETO RECORRENTE: CRISTIANE VALVERDE DE BRITO RECORRIDO: 5 ESTRELAS SERVIÇOS DE APOIO ADMINISTRATIVO LTDA - EPP RECORRIDO: CONDOMÍNIO CIVIL DO SHOPPING CENTER IGUATEMI BRASÍLIA ACB/3 EMENTA DIREITO DO TRABALHO. RECURSO ORDINÁRIO. DESVIO DE FUNÇÃO. AGENTE DE PORTARIA. VIGILANTE. DESCARACTERIZAÇÃO DA JORNADA 12X36. DANOS MORAIS POR CONDIÇÕES DE TRABALHO. RECURSO NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1.Recurso ordinário contra sentença que, em ação trabalhista, julgou parcialmente procedentes os pedidos da reclamante referentes a desvio de função (agente de portaria para vigilante), adicional de periculosidade, danos morais pelo trabalho de vigilante, horas extras em regime de 12x36 e danos morais por condições de trabalho. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há cinco questões em discussão: (i) caracterização do desvio de função de agente de portaria para vigilante; (ii) direito ao adicional de periculosidade; (iii) direito à indenização por danos morais decorrente do exercício da função; (iv) validade da jornada 12x36 e o direito as horas extras; (v) direito à indenização por danos morais em razão das condições de trabalho (ausência de assentos e restrição ao uso de banheiro e bebedouro). III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A função de agente de portaria exercida pela reclamante não se enquadra na definição legal de vigilante, conforme a Lei nº 7.102/1983 vigente à época do contrato, pois não envolvia o porte de arma, rondas motorizadas ou abordagens diretas, conforme comprovado pelas provas testemunhais. 4. O adicional de periculosidade é indevido por ausência de prova de exposição a risco efetivo e permanente de violência física, conforme art. 193, II, da CLT. As atividades da reclamante se limitavam à comunicação de situações suspeitas, sem enfrentamento direto. 5. A indenização por danos morais, pelo exercício de atividades supostamente mais perigosas, é indevida por falta de prova de lesão concreta à honra, integridade psicológica ou dignidade da trabalhadora. 6. A jornada 12x36 é válida, mesmo com a realização de horas extras, se estas não são habituais. A análise dos registros de ponto e contracheques, confrontada com o depoimento da testemunha, demonstra a não habitualidade das horas extras. 7. A indenização por danos morais pela ausência de assentos é mantida por se considerar o valor arbitrado razoável e proporcional. O pedido de indenização por suposta restrição ao uso do banheiro e consumo de água é rejeitado pela inconclusividade da prova testemunhal. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso não provido. Tese de julgamento: 1. O desvio de função exige o efetivo desempenho de atividades incompatíveis com o contrato de trabalho, necessitando de prova robusta do exercício de tarefas de maior qualificação e remuneração. A simples semelhança parcial de atividades não configura desvio de função. 2. O adicional de periculosidade pressupõe exposição efetiva e permanente a risco de violência física, não sendo suficiente a mera comunicação de ocorrências suspeitas. 3. A indenização por danos morais exige prova de lesão concreta à honra, integridade psicológica ou dignidade da pessoa, não se configurando pela alegação de desempenho de atividades mais perigosas que as descritas em contrato. 4. O regime de compensação de jornada 12x36 somente se invalida mediante prova robusta da habitualidade na realização de horas extras que extrapolam a jornada semanal máxima. 5. O valor da indenização por danos morais deve observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, levando em consideração a extensão do dano e a capacidade econômica da empregadora. ________________________ Dispositivos relevantes citados: Art. 193, II, da CLT; Art. 59-B, parágrafo único, da CLT; Art. 199, parágrafo único, da CLT; NR-17 do MTE; Lei nº 7.102/1983; Lei nº 14.967/2024; arts. 818, I, da CLT e 373, I, do CPC; Arts. 884 e 422 do Código Civil; Art. 13 da Lei nº 6615/78; Art. 456, parágrafo único, da CLT. Jurisprudência relevante citada: RR-12359-48.2017.5.15.0129, TST, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandão, DEJT 14/03/2025; RO-0000129-37.2024.5.10.0009, TRT-10, 3ª Turma, Relator Desembargador Brasilino Santos Ramos, DEJT 20/07/2024. RELATÓRIO O Juiz Marcos Alberto dos Reis, da MM. 8ª Vara do Trabalho de Brasília-DF, por meio de sentença (ID. fc2bc0a), julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais. Irresignada, a reclamante recorreu ordinariamente (ID. 09bf091). Apresentadas contrarrazões pela reclamada (ID. 31fb091). Os autos não foram encaminhados ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 102 do RITRT. É o relatório. FUNDAMENTAÇÃO ADMISSIBILIDADE Atendidos os pressupostos de admissibilidade, conheço parcialmente do recurso ordinário da reclamante, exceto quanto à alegação relativa à Portaria nº 387/2006-DG/DPF e à suposta inveracidade dos cartões de ponto, uma vez que a sentença não tratou dessas questões e a parte não opôs embargos de declaração para suscitar eventual omissão, o que impede sua análise direta em grau recursal, sob pena de supressão de instância. MÉRITO DESVIO DE FUNÇÃO. AGENTE DE PORTARIA X VIGILANTE. DIFERENÇAS SALARIAIS, ADICIONAL DE PERICULOSIDADE E DANO MORAL. O pedido de pagamento das diferenças salariais pelo desvio de função foi indeferido pelo Magistrado de piso nos seguintes termos: "A autora conta que foi contratada pela 5 ESTRELAS Serviços de Apoio Administrativo Ltda - EPP em 01.09.202 para exercer a função de AGENTE DE PORTARIA no Shopping Iguatemi de Brasília, até ser dispensada sem justa causa em 11.02.2024, quanto auferia salário mensal de R$ 1.775,88. A autora alega que foi desviada de sua função de AGENTE DE PORTARIA, exercendo desde o início do contrato de trabalho a função de VIGILANTE, sem qualquer acréscimo salarial ou anotação da referida função não CTPS. A autora pondera que o Agente de Portaria faz o registro e fiscalização de entrada e saída de veículos e pessoas em portaria de estabelecimento. No entanto, laborava realizando as atividades de vigilante, realizando a segurança do estabelecimento, fiscalizava o local bem como a entrada e saída de pessoas, vigiava e abordava suspeitos, dentre outras atividades. Com base no alegado desvio de função, pede o pagamento das seguintes parcelas: 1) diferença salarial de 40%, acrescidos dos reflexos; 2) adicional de periculosidade pelo exercício da função de vigilante; 3) indenização pelo dano moral decorrente do exercício da função perigosa de vigilante, sem o adicional de periculosidade. Decido. O contrato de trabalho é sinalagmático, em face da reciprocidade de obrigações contratuais equivalentes. Com o propósito de evitar o enriquecimento ilícito de uma das partes, devem ser observados os princípios da boa-fé contratual e do equilíbrio entre as prestações. Assim, havendo o exercício de tarefas alheias àquelas inerentes à função do empregado, provoca-se um desequilíbrio na equivalência das obrigações, impondo-se um acréscimo salarial, a teor dos artigos 884 e 422 do Código Civil. Nesse caso, pode-se aplicar, por analogia, o art. 13 da Lei nº 6615/78, que prevê para o radialista adicional de acúmulo de funções de 10%, 20% ou 40%, conforme critérios definidos na lei. O exercício de outras atividades, contudo, não gera um acréscimo salarial, se compatíveis com as atribuições do trabalhador, pois se entende que o empregado se obrigou a todo e qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal, conforme disposto no art. 456, parágrafo único, da CLT. Cabe, portanto, em cada caso, com base no princípio da razoabilidade, avaliar a qualificação profissional e atributos na situação concreta estabelecida, a fim de decidir se houve ou não a execução de serviços que provocaram um desequilíbrio na equivalência das obrigações contratuais, que justifique um acréscimo salarial. Em suma, o desvio de função gera direito a diferenças salariais se o empregado, contratado para determinada função, passa a realizar tarefas de maior qualificação e, portanto, melhor remunerada, sob pena de ensejar o enriquecimento sem causa do empregador. Fixadas essas premissas, vejamos o caso dos autos. A autora alega que foi desviada para o exercício de Vigilante. Pois bem. A categoria profissional do Vigilante possui regulamentação própria na Lei nº 7.102/1983. O art. 15 da Lei nº 7.102/83 define Vigilante como sendo 'o empregado contratado para a execução das atividades definidas nos incisos I e II do caput e §§ 2º, 3º e 4º do art. 10. O art. 10 da Lei nº 7.102/1983 descreve as atividades do Vigilante nos seguintes termos: 'Art. 10. São considerados como segurança privada as atividades desenvolvidas em prestação de serviços com a finalidade de: I- proceder à vigilância patrimonial das instituições financeiras e de outros estabelecimentos, públicos ou privados, bem como à segurança de pessoas físicas; II - realizar o transporte de valores ou garantir o transporte de qualquer outro tipo de carga. § 1º Os serviços de vigilância e de transporte de valores poderão ser executados por uma mesma empresa. § 2º As empresas especializadas em prestação de serviços de segurança, vigilância e transporte de valores, constituídas sob a forma de empresas privadas, além das hipóteses previstas nos incisos do caput deste artigo, poderão se prestar ao exercício das atividades de segurança privada a pessoas; a estabelecimentos comerciais, industriais, de prestação de serviços e residências; a entidades sem fins lucrativos; e órgãos e empresas públicas. § 3º Serão regidas por esta lei, pelos regulamentos dela decorrentes e pelas disposições da legislação civil, comercial, trabalhista, previdenciária e penal, as empresas definidas no parágrafo anterior. § 4º As empresas que tenham objeto econômico diverso da vigilância ostensiva e do transporte de valores, que utilizem pessoal de quadro funcional próprio, para execução dessas atividades, ficam obrigadas ao cumprimento do disposto nesta lei e demais legislações pertinentes.' O art. 19 da Lei nº 7.102/83 assegura ao vigilante o porte de arma para o exercício de suas atividades, in verbis: Art. 19 - É assegurado ao vigilante: I - uniforme especial às expensas da empresa a que se vincular; II - porte de arma, quando em serviço; III - prisão especial por ato decorrente do serviço; IV - seguro de vida em grupo, feito pela empresa empregadora. Nesse cenário, conclui-se que o Vigilante Patrimonial é o agente que, portando arma, detém a obrigação de impedir ou inibir ação criminosa contra o patrimônio ou pessoa sob sua responsabilidade. A autora descreve em seu depoimento que não portava arma e nem fazia rondas motorizadas. Trabalhava nas portarias do Shopping e sua atividade consistia em monitorar qualquer pessoa suspeita acompanhando-a dentro do shopping, e caso presenciasse algum furto deveria entrar em contato com o encarregado e chamava a polícia que o meliante fosse abordado. Somente abordava pessoas caso entrassem no no shopping sem camisa, consumindo bebida alcóolica ou usando capacete. Eis o depoimento da autora: Depoimento pessoal da autora: 'trabalhou na 1ª reclamada de 01/09/2022 a 11/02/2024, exercendo a função de Recepcionista na sede da empresa e Agente de Portaria nos diversos postos de trabalho da reclamada e também como vigia, pois não trabalhava armada e também fez monitoramento de câmaras de CFTV, da casa do dono da empresa e da sede da reclamada, com jornada das 07h às 19h, sem intervalo intrajornada, na escala 12x36. Diz que era sempre convocada para cumprir plantões extras. A depoente anotava sua jornada nas folhas de ponto. A depoente registrava todos os dias trabalhados. A depoente trabalhou no SHOPPING CENTER IGUATEMI, no período de março de 2020 a outubro 2023, exercendo a função de Vigilante, embora não estivesse armada. A depoente trabalhou em vários locais no shopping, internos e externos. A depoente trabalhou como Vigilante e Agente de Portaria, no shopping e cumpriu jornada das 10h às 22h, e das 07h às 19h. Não trabalhou no plantão noturno. Trabalhavam, aproximadamente, 08 Agentes de Portaria no mesmo turno. Existiam 05 vigilantes trabalhando por turno. Os vigilantes trabalhavam na parte externa, armados. Os Agentes de Portaria não usam arma. Todos esses profissionais eram empregados da 1ª reclamada. Os vigilantes faziam as rondas motorizadas. O Agente de Portaria trabalha nas entradas do Shopping. A autora não trabalhou nas Docas, mas nos portões externos de acesso dos fornecedores. Os Agentes de Portaria que trabalhavam na parte externa usavam o mesmo uniforme dos vigilantes. O Agente de Portaria também faz ronda. Se entrasse alguma pessoa suspeita dentro do shopping, o Agente de Portaria deveria acompanhá-lo. Caso o Agente de Portaria presenciasse algum furto deveria entrar em contato com o encarregado e chamava a policia para que fosse abordado o meliante. A depoente abordava pessoas que entravam sem camisa, consumindo bebida alcóolica ou usando capacete. A empresa concedia pausas de 15 minutas, que não se confundia com intervalo intrajornada, durante o expediente, até ser cancelado em outubro/2023. Existiam um refeitório na Doca onde os vigilantes e agente de portariam almoçavam. A depoente chegou a usar esse refeitório para usufruir intervalo intrajornada. A depoente era substituída por um colega no seu posto de trabalho para que pudesse se deslocar até o refeitório. A depoente ficava uma hora no refeitório para se alimentar e descansar.' Nada mais. A testemunha KILVIA MARIA RODRIGUES DA SILVA também esclareceu que o Agente de Portaria não faz a abordagem de suspeitos: Testemunha KILVIA MARIA RODRIGUES DA SILVA.: 'trabalhou na 1ª reclamada de 01/12/2022 até agosto de 2023, exercendo a função de Agente de Portaria, no Shopping Iguatemi. Os Agentes de Portaria trabalham na parte interna e os vigilantes, na parte externa do Shopping. A depoente trabalhou na parte externa do shopping exercendo as mesmas atividades dos vigilantes, embora não estivesse armada. A depoente não fazia ronda externa, mas sim ficava em um posto fixo. Quando estava trabalhando no posto externo, sua orientação era que acompanhasse o indivíduo suspeito até o supervisor chegar e o abordá-lo. A função da depoente era impedir que o indivíduo entrasse no Shopping. A depoente usava um rádio para chamar o supervisor. A depoente fazia 4 plantões extras por mês. A empresa sempre pagava pelos plantões extras, embora demorasse um pouco. A autora também fazia esses serviços externos e plantões extras, com a mesma frequência. O Agente de Portaria deverá sempre acompanhar qualquer pessoa suspeita que entrasse no Shopping e não poderia perdê-lo de vista, mas não poderia abordá-lo. Sempre deveria aguardar o supervisor para que ele tomasse as providências. A depoente fazia guarda patrimonial do Shopping. Os Agente de Portaria eram orientados a prestar mais atenção nas lojas com mercadoria de alto valor, como joalherias e de produtos importados. Os Agentes de Portaria não poderiam sentar durante a jornada. O Agente de Portaria deve entrar em contato com a Central para que possa deixar seu posto de serviço e ir ao banheiro. O Agente de Portaria deve aguardar alguém que a lhe rendesse no Posto. Demorava 15 minutos para ser rendida e a Central não gostava que a Agente de Portaria pedisse para ser rendido. A Central sempre respondia que o AGP deveria aguardar no seu posto de serviço. A depoente também precisava pedir para a Central autorização para ir tomar água no bebedouro e não podia usar garrafa com água. Isso se aplicava a todos os AGP. Nunca presenciou a interação entre a autora e os encarregados Rubens e Ortilei. No ponto de vista da depoente os vigilantes estão mais protegidos e armados que os AGP´s, mas todos faziam a mesma coisa. Trabalhavam de 09 a 10 AGP´s por turno e de 04 a 06 vigilantes. Apenas o vigilante fazia a ronda motorizada. É preciso fazer um curso para ser vigilante.' Nada mais. O quadro delineado pela prova demonstra que a autora, na função de Agente de Portaria, não atuava de forma ostensiva na prevenção ou no combate efetivo da ação criminosa, pois nem mesmo portava qualquer tipo de arma, para que possa ser considerada Vigilante. Como autora não exercia as atividades de vigilante, indefiro os pedidos de pagamento de : 1) diferença salarial de 40%, acrescidos dos reflexos; 2) adicional de periculosidade pelo exercício da função de vigilante; 3) indenização pelo dano moral decorrente do exercício da função perigosa de vigilante, sem o adicional de periculosidade." A reclamante, em sua versão recursal, sustenta que, embora formalmente contratada como agente de portaria, desempenhava atividades inerentes à função de vigilante, ainda que desarmada, devendo ser reconhecido o direito ao enquadramento na categoria e às verbas decorrentes. Argumenta que a sentença se baseou na Lei nº 7.102/83, que foi revogada pela Lei nº 14.967/2024, a qual não exige o uso de arma de fogo para a caracterização da função de vigilante, reforçando que a nova legislação deve ser aplicada ao caso. Além disso, pleiteia o adicional de periculosidade sob a alegação de exposição a risco decorrente do exercício de segurança patrimonial, bem como indenização por dano moral, sob o argumento de que desempenhou atividades perigosas sem a devida contraprestação salarial. Examino. Como já relatado, a sentença indeferiu o pleito de desvio de função, assentando que a autora não realizava atividades típicas de vigilante, pois não trabalhava armada, não fazia rondas motorizadas e não desempenhava a função de segurança ostensiva. A prova oral colhida nos autos confirma essa conclusão. A testemunha indicada pela reclamante, Kilvia Maria Rodrigues da Silva, afirmou que os agentes de portaria exerciam atividades semelhantes às dos vigilantes, mas sem portar arma. Relatou que trabalhava na parte externa do shopping, em um posto fixo, e que, ao identificar um indivíduo suspeito, deveria acompanhá-lo até a chegada do supervisor, sem realizar abordagem direta. Acrescentou que os agentes de portaria deviam manter atenção especial às lojas de alto valor, como joalherias. No entanto, a própria testemunha reconheceu que apenas os vigilantes realizavam rondas motorizadas, reforçando que os agentes de portaria, ainda que posicionados em áreas externas, não desempenhavam funções típicas de patrulhamento ostensivo. A testemunha da reclamada, Luciano de Freitas Moreira, vigilante líder, corroborou essa distinção funcional, esclarecendo que os agentes de portaria atuavam na parte interna do shopping e em alguns postos externos de triagem de fornecedores, sem realizar rondas ou abordagens de suspeitos. Relatou que, diante de qualquer ocorrência, cabia a esses empregados apenas comunicar imediatamente à Central, que tomava as providências cabíveis. Destacou, ainda, que havia diferenciação clara entre os uniformes dos agentes de portaria e dos vigilantes, sendo estes os responsáveis exclusivos pela segurança patrimonial ostensiva do estabelecimento. Diante desse conjunto probatório, resta evidente que a reclamante não desempenhava integralmente as funções de vigilante. A mera semelhança parcial entre as atividades não configura desvio de função se não há identidade substancial de atribuições e responsabilidades. À época do contrato de trabalho, a Lei nº 7.102/83 disciplinava a profissão e estabelecia que a função de vigilante era voltada à segurança patrimonial e de pessoas, com possibilidade de uso de armamento. Embora posteriormente revogada pela Lei nº 14.967/2024, essa nova legislação não se aplica ao caso, pois, conforme o princípio do tempus regit actum, os fatos devem ser analisados sob a norma vigente à época da prestação dos serviços. Assim, o contrato da reclamante, encerrado em 11/02/2024, não pode ser regido pela nova legislação. Ainda que se cogitasse a aplicação da norma atual, os elementos dos autos não permitem o reconhecimento do desvio de função, pois não há prova de que a reclamante exercia todas as atribuições típicas de vigilante, especialmente no que se refere à vigilância ostensiva e à abordagem direta de suspeitos. No que concerne ao adicional de periculosidade, não há prova de que a função da reclamante a expunha a risco acentuado de violência física. O artigo 193, II, da CLT exige, para a caracterização da periculosidade, a exposição a risco efetivo e permanente de violência. No caso, os depoimentos demonstraram que a reclamante apenas comunicava situações suspeitas à Central, sem qualquer atividade de enfrentamento ou risco iminente. A ausência de patrulhamento ostensivo e de abordagem direta de suspeitos descaracteriza a periculosidade da função e inviabiliza o deferimento do adicional pleiteado. Por fim, não há fundamento para a indenização por dano moral. A mera alegação de que a reclamante exercia atividades supostamente mais perigosas do que aquelas descritas em sua CTPS não configura, por si só, violação a direitos fundamentais da personalidade. A indenização por dano moral exige prova de lesão concreta à honra, à integridade psicológica ou à dignidade da trabalhadora, o que não se verifica nos autos. Diante do exposto, nego provimento ao recurso ordinário, mantendo a sentença que indeferiu os pedidos de diferenças salariais por desvio de função, adicional de periculosidade e indenização por dano moral. HORAS EXTRAS. REGIME 12X36. HABITUALIDADE NA PRESTAÇÃO DE DOBRAS DE PLANTÃO NÃO COMPROVADA. VALIDADE DA JORNADA ESPECIAL MANTIDA. Sobre o tema, o Magistrado de origem se manifestou nestes termos: "A autora narra que trabalhava em escala 12x36. Contudo, ao menos uma vez por semana, em média 4 vezes por mês, lhe era exigido que fizesse 'dobra' de plantões, ou seja, três plantões seguidos de 12 horas sem o descanso de 36 horas. Diz que essa exigência de realizar dobra de plantões perdurou durante todo o contrato de trabalho. Com base nessas alegações, requer a declaração da invalidade da escala 12x36 e o pagamento das horas extras que ultrapassavam a 8ª hora diária, acrescidas dos reflexos. Decido. O art. 59-B, parágrafo único, da CLT definiu que a prestação de horas extras, mesmo habituais, não descaracteriza o acordo de compensação de jornada. Eis o seu teor: Art. 59-B. O não atendimento das exigências legais para compensação de jornada, inclusive quando estabelecida mediante acordo tácito, não implica a repetição do pagamento das horas excedentes à jornada normal diária se não ultrapassada a duração máxima semanal, sendo devido apenas o respectivo adicional. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vigência) Parágrafo único. A prestação de horas extras habituais não descaracteriza o acordo de compensação de jornada e o banco de horas. Logo, plantões extras semanais não detém a potestade de invalidar a compensação da jornada de 12 x 36. Indefiro o pedido de pagamento de horas extras". Em seu recurso ordinário, a reclamante sustenta que a sentença aplicou indevidamente o artigo 59-B da CLT, pois a norma somente autoriza a compensação de jornada quando não houver extrapolação da jornada máxima semanal de 44 horas, o que, segundo alega, não se verifica no caso concreto. Afirma que realizava dobras de plantão de maneira habitual, ao menos quatro vezes por mês, perfazendo uma jornada semanal média de 54 horas. Aduz, ainda, que os cartões de ponto não refletem a realidade do contrato de trabalho e que a prova testemunhal confirmou que era exigida a dobra de plantões em média quatro vezes ao mês, uma vez por semana. Pois bem. A controvérsia recursal exige a análise da compatibilidade do artigo 59-B, parágrafo único, da CLT com o regime 12x36, bem como a verificação da alegada habitualidade na prestação de dobras de plantão. De fato, o dispositivo legal estabelece que a prestação de horas extras habituais não descaracteriza o acordo de compensação de jornada e o banco de horas. No entanto, a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, entendimento com o qual passo a me alinhar, tem afastado sua aplicação ao regime 12x36. Esse posicionamento decorre do reconhecimento de que tal tipo de jornada não é um simples acordo de compensação, mas um regime especial, cuja validade depende do seu cumprimento estrito. Assim, a extrapolação habitual dos períodos de descanso, ainda que pactuada coletivamente, invalida o regime e torna devidas as horas extras além da oitava diária e quadragésima quarta semanal. Nesse sentido, cito recentes precedentes do TST e deste Colegiado: "AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA PARTE AUTORA. LEI Nº 13.015/2014. CPC/2015. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. LEI Nº 13.467/2017 . JORNADA DE TRABALHO. REGIME DE 12X36. INVALIDADE. LABOR HABITUAL NOS DIAS DESTINADOS A FOLGAS. HORAS EXTRAS. JURISPRUDÊNCIA PACIFICADA NESTA CORTE. Constatado equívoco na decisão agravada, dá-se provimento ao agravo para determinar o processamento do agravo de instrumento. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA PARTE AUTORA. LEI Nº 13.015/2014. CPC/2015. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. LEI Nº 13.467/2017 . JORNADA DE TRABALHO. REGIME DE 12X36. INVALIDADE. LABOR HABITUAL NOS DIAS DESTINADOS A FOLGAS. HORAS EXTRAS. JURISPRUDÊNCIA PACIFICADA NESTA CORTE. Agravo de instrumento a que se dá provimento para determinar o processamento do recurso de revista, em face de haver sido aparente má-aplicação da Súmula nº 85, IV, do TST. RECURSO DE REVISTA DA PARTE AUTORA. LEI Nº 13.015/2014. CPC/2015. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. LEI Nº 13.467/2017 . JORNADA DE TRABALHO. REGIME DE 12X36. INVALIDADE. LABOR HABITUAL NOS DIAS DESTINADOS A FOLGAS. HORAS EXTRAS. JURISPRUDÊNCIA PACIFICADA NESTA CORTE. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA CONSTATADA . Não obstante o teor da Súmula nº 444 do TST, que admite, em caráter excepcional, a adoção do regime especial de compensação 12x36, a prestação habitual de horas extras desnatura por completo a avença. O caráter excepcional desse tipo de trabalho, em razão dos prejuízos físicos, emocionais e sociais que acarreta ao empregado, exige que as exceções autorizadas pelo ordenamento jurídico sejam aplicadas com rigor. Assim, admite-se tal regime, desde que fielmente cumprido. Ultrapassados seus limites, ainda que autorizados por norma coletiva, como no caso dos autos, todo o ajuste torna-se inválido e passa a ser devida a remuneração extraordinária do trabalho prestado além da oitava hora diária e quadragésima quarta semanal, sendo inaplicável o entendimento contido na Súmula nº 85, IV, do TST. Na hipótese, a conclusão da Corte de origem, no sentido de que o labor em 05 dias destinados a folgas, por mês, não descaracteriza a jornada 12x36 dissente da jurisprudência pacificada nesta Corte . Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-12359-48.2017.5.15.0129, 7ª Turma, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandao, DEJT 14/03/2025). "JORNADA DE TRABALHO. REGIME 12X36. LABOR ELASTECIDO. HABITUALIDADE. DESCARACTERIZAÇÃO. A jurisprudência uniforme do col. TST é no sentido de que, mesmo considerado o período de labor na vigência da Lei 13.467/2017, a prestação de horas extras habituais descaracteriza o regime 12x36, não sendo aplicável a parte final do item IV da Súmula nº 85 do col. TST e, além do mais, afasta a regra prevista no art. 59-B, parágrafo único, da CLT. Portanto, a incontroversa prestação habitual de horas extras torna devido o pagamento como extra das horas laboradas após a 8ª diária e 44ª semanal ao longo de todo o pacto laboral" (TRT-10, RO-0000129-37.2024.5.10.0009, 3ª Turma, Relator Desembargador Brasilino Santos Ramos, DEJT 20/07/2024). Portanto, à luz da jurisprudência citada, a descaracterização da jornada especial exige a comprovação de que as dobras de plantão ocorriam de forma habitual, comprometendo a lógica do regime e inviabilizando seu propósito de assegurar o descanso adequado. A extrapolação reiterada da jornada, com a supressão sistemática do intervalo de 36 horas entre os turnos, constitui o elemento determinante para afastar a validade do regime 12x36. Na petição inicial, a reclamante alegou que as dobras de plantão ocorriam de maneira semanal, ao menos quatro vezes por mês, durante todo o contrato de trabalho. No entanto, a análise dos registros de ponto e contracheques revela que houve apenas um dia de labor em folga nos meses de outubro de 2022, março, abril, maio, junho, julho de 2023 e outubro de 2023. Nos meses de novembro e dezembro de 2022, assim como de fevereiro e dezembro de 2023, verificaram-se dois dias de trabalho em folga. Já nos meses de agosto, setembro e novembro de 2023, janeiro e fevereiro de 2024, não há qualquer registro de labor extraordinário. Ressalto que os cartões de ponto indicam que, em alguns dias de folga trabalhados, há o registro de falta no mesmo período semanal, o que pode sugerir compensação. Como nessas situações não houve extrapolação da jornada semanal, esses dias foram desconsiderados na análise quantitativa das dobras. O cotejo entre as alegações da inicial e a prova documental evidencia que não há habitualidade na prestação de dobras de plantão tal como sustentado pela reclamante. O exame minucioso dos documentos revela que, em diversos meses, não houve qualquer labor extraordinário, e, nos períodos em que houve extrapolação da jornada, o excesso se limitou a um ou dois dias no mês. Não se verifica um padrão de cumprimento de dobras semanais nem há indícios de que a jornada semanal tenha sido sistematicamente ultrapassada. No que se refere à prova testemunhal, a testemunha da reclamante afirmou que havia a prestação de quatro dobras mensais. No entanto, esse depoimento não pode prevalecer diante dos cartões de ponto válidos constantes nos autos, que demonstram uma realidade distinta. Além disso, a própria reclamante não pleiteia o pagamento das dobras não quitadas nem o reconhecimento de pagamentos "por fora", o que reforça a conclusão de que, sempre que houve labor em dias de folga, a correspondente remuneração foi devidamente adimplida, conforme demonstram os contracheques e folhas de ponto anexados aos autos. Logo, a extrapolação da jornada, quando ocorreu, não atingiu a constância necessária para invalidar o regime. Diante da ausência de habitualidade na prestação de horas extras, não há fundamento para a descaracterização da jornada 12x36, razão pela qual deve ser mantida a sentença de primeiro grau. Nego provimento ao recurso ordinário da reclamante. DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE ASSENTOS. RESTRIÇÃO AO USO DO BANHEIRO E AO CONSUMO DE ÁGUA. INEXISTÊNCIA DE PROVA CONCLUSIVA. MANUTENÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. A sentença de primeiro grau deferiu indenização por danos morais no valor de R$ 3.500,00 em razão da ausência de assentos adequados no posto de trabalho, reconhecendo a violação ao artigo 199, parágrafo único, da CLT e à NR-17 do TEM, e indeferiu o pedido de pagamento de danos morais em razão da suposta restrição ao uso do banheiro e ao consumo de água, por ausência de prova cabal da limitação imposta pela reclamada. Eis o teor da sentença: "DANOS MORAIS PELAS CONDIÇÕES DEGRADANTES DO AMBIENTE DE TRABALHO. A autora conta que exercia as suas atividades sem um local para se sentar, trabalhando toda a sua jornada em pé. a ré não disponibilizava assentos para usar durante as pausas, ficando por longos momentos parada e algumas vezes realizando rondas. O autor pede o pagamento de indenização por danos morais, argumentando que permanecia em pé durante toda sua jornada. A ré, em sua defesa, confirma que os agentes de portaria, a cada plantão, trabalham lotados em um posto específico no interior do shopping, onde de fato permanecem em pé. São concedidos, no entanto, 2 (duas) pausas de 15min, além do intervalo intrajornada de 1h. Decido. O art. 199, parágrafo único, da CLT dispõe sobre a obrigatoriedade de se disponibilizar assentos aos trabalhadores que executam suas atividades em pé para que possam ser utilizados nas pausas que o serviço permitir. Eis o seu teor: Art.199 - Será obrigatória a colocação de assentos que assegurem postura correta ao trabalhador, capazes de evitar posições incômodas ou forçadas, sempre que a execução da tarefa exija que trabalhe sentado. Parágrafo único - Quando o trabalho deva ser executado de pé, os empregados terão à sua disposição assentos para serem utilizados nas pausas que o serviço permitir. O item 17.3.5 da NR-17/MTE repete a obrigatoriedade de manter assentos que possam utilizados pelos trabalhados durante as pausas. Eis o seu teor: '17.3.5. Para as atividades em que os trabalhos devam ser realizados de pé, devem ser colocados assentos para descanso em locais em que possam ser utilizados por todos os trabalhadores durante as pausas.' O egrégio TRT tem reconhecido o direito do trabalhador à indenização por danos morais, pela ausência de assentos para descanso, conforme atesta o seguinte precedente: RECURSO DA RECLAMADA. 1. MULTA DE 40% SOBRE O FGTS. MULTA DO ARTIGO 477 DA CLT. REDUÇÃO DA MULTA DO FGTS PELA METADE. NORMA COLETIVA. FORÇA MAIOR. É inválida norma coletiva que impõe a redução pela metade da multa do FGTS, porquanto o objeto da transação é ilícito, nos termos do artigo 611-B, III, da CLT. Não se configura a força maior do artigo 502 da CLT quando a empresa ou o estabelecimento em que o empregado trabalhava não é extinto pelo fato apontado como força maior. Portanto, devidas as diferenças da multa do FGTS. 2. DANO MORAL. NÃO DISPONIBILIZAÇÃO DE ASSENTOS A EMPREGADA QUE TRABALHA DE PÉ. Nos termos do artigo 199 da CLT, da NR 17/MTE e da CCT da categoria, a empresa era obrigada a disponibilizar assento para a empregada descansar quando fosse possível, pois seu trabalho era feito de pé. Descumprida a obrigação pela empregadora, caracteriza-se a ofensa à dignidade da trabalhadora, impondo-se a condenação da Reclamada ao pagamento de indenização por danos morais. Recurso conhecido desprovido.'(RO- 113-15.2022.5.10.0022, 2ª Turma do TRT da 10ª Região, Redator: ALEXANDRE DE AZEVEDO SILVA Julgamento: 05/07/2023) Está incontroverso que a reclamada não disponibilizava assentos nos setores de trabalho para proporcionar o descanso natural durante as pausas. Condeno a ré ao pagamento de indenização por danos morais, no importe de R$ 3.500,00. DANO MORAL PELA RESTRIÇÃO AO USO DO BANHEIRO E CONSUMO DE ÁGUA A autora alega que precisava ficar por longas horas parada em local determinado do shopping, sem poder se ausentar para ir ao banheiro. Igualmente, não poderia se ausentar para buscar água, além de ser proibido, por determinação da 1ª reclamada, que sequer pudesse ficar com uma garrafa d'água consigo durante sua longa jornada de trabalho. Por isso, constantemente passava em torno de 8 horas seguidas de sua jornada sem poder ir ao banheiro ou sequer beber água, colocando em risco sua saúde física. Em razão da restrição ao uso do banheiro e consumo de água, pede o pagamento de indenização por danos morais. A reclamada, em sua defesa, afirma que a pausa para uso do banheiro ou o deslocamento até os bebedouros para consumo de água não sofriam qualquer limitação, exigindo apenas que o agente de portaria comunicasse o fato à central. Decido. Não identifico prova cabal de que havia qualquer restrição quanto ao uso do banheiro ou consumo de água, diante do seguinte depoimento, descrevendo a liberdade do Agente de Portaria: Testemunha LUCIANO DE FREITAS MOREIRA: 'Além do intervalo para almoço os AGP´s possuem pausas de 15 minutos a cada 2 horas de jornada para ir ao banheiro, relaxar as pernas, descansar ou comer um lanche. O AGP deve informar toda vez que precisar deixar seu posto de trabalho para beber água. O AGP não precisa aguardar que algum colega o substitua para ir beber água, mas precisa aguardar para ser rendido caso vá ao banheiro. A rendição para ir ao banheiro demora no máximo 05 minutos'. Indefiro o pedido de pagamento de indenização por danos morais." A reclamante recorre pedindo a majoração da indenização por danos morais, alegando que a sentença fixou valor irrisório (R$ 3.500,00) diante das condições degradantes de trabalho, nas quais permanecia quase toda a jornada de 12x36 em pé, sem descanso adequado, e frequentemente dobrava plantões sem o intervalo devido, em violação à NR-17. Também requer o deferimento da indenização pela restrição ao uso do banheiro e ao consumo de água, argumentando que a prova testemunhal confirmou a necessidade de autorização para ir ao banheiro e a proibição de portar garrafas d'água, configurando afronta à dignidade e saúde da empregada. A fixação da indenização por dano moral deve observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, garantindo a reparação adequada sem resultar em enriquecimento indevido ou penalidade excessiva à reclamada. No caso, ainda que se reconheça o desconforto gerado pela ausência de assentos adequados, a extensão do dano não ultrapassa aquela já considerada na sentença. O valor arbitrado está em conformidade com os parâmetros usualmente adotados para casos semelhantes, não havendo justificativa para sua majoração. Quanto ao pedido de indenização pela suposta restrição ao uso do banheiro e ao consumo de água, a prova testemunhal não permite concluir que houve imposições abusivas ou impeditivas ao atendimento das necessidades fisiológicas. A testemunha da reclamante afirmou que os agentes de portaria precisavam informar à central para se ausentarem ao banheiro, aguardando rendição, o que poderia levar até 15 minutos. Acrescentou que a empresa "não gostava" que os empregados solicitassem para sair do posto e que era necessário pedir autorização para ir ao bebedouro, sendo proibido portar garrafa d'água. Em contrapartida, a testemunha da reclamada declarou que os empregados tinham pausas programadas a cada duas horas, além do intervalo intrajornada, e que a rendição para uso do banheiro ocorria em, no máximo, cinco minutos. Também asseverou que não havia necessidade de aguardar substituição para beber água. Diante da contradição entre os depoimentos, a prova se revela inconclusiva. Cabia à reclamante o ônus de demonstrar a efetiva restrição ao uso do banheiro e ao consumo de água, conforme dispõem os artigos 818, inciso I, da CLT e 373, inciso I, do CPC, encargo do qual não se desincumbiu. Não há nos autos elementos concretos que evidenciem a existência de imposições desarrazoadas que tenham comprometido sua dignidade ou sua saúde. Ademais, a exigência de aguardar rendição para se ausentar do posto não configura, por si só, violação de direitos fundamentais, sendo uma medida organizacional inerente a funções que demandam presença contínua no local de trabalho. Diante desse cenário, mantenho o valor fixado na sentença a título de danos morais pela ausência de assentos e rejeito o pedido de indenização pela alegada restrição ao uso do banheiro e ao consumo de água. Nego provimento ao recurso ordinário da reclamante. CONCLUSÃO DO RECURSO Conheço parcialmente do recurso ordinário da reclamante e, no mérito, nego-lhe provimento. Tudo nos termos da fundamentação. É como voto. ACÓRDÃO Por tais fundamentos, ACORDAM os Desembargadores da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, em sessão turmária e conforme o contido na respectiva certidão de julgamento (ver fls. retro), aprovar o relatório, conhecer parcialmente do recurso ordinário da reclamante, para, no mérito, negar-lhe provimento, nos termos do voto do Relator. Julgamento ocorrido à unanimidade de votos, estando presentes os Desembargadores Pedro Luís Vicentin Foltran (Presidente), Maria Regina Machado Guimarães, Brasilino Santos Ramos, Cilene Ferreira Amaro Santos e Augusto César Alves de Souza Barreto. Representando o Ministério Público do Trabalho a Procuradora Regional do Trabalho Valesca de Morais do Monte. Secretária-adjunta da Turma, a Sra. Bárbara França Gontijo. Secretaria da 3ª Turma. Brasília /DF, 23 de abril de 2025. (data do julgamento). Desembargador Augusto César Alves De Souza Barreto Relator(a) DECLARAÇÃO DE VOTO BRASILIA/DF, 25 de abril de 2025. ELPIDIO HONORIO DA SILVA, Servidor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - CRISTIANE VALVERDE DE BRITO

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Cristiane Valverde De Brito x 5 Estrelas Servicos De Apoio Administrativo Ltda - Epp e outros

ID: 261353908

Tribunal: TRT10 Órgão: 3ª Turma Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0000375-36.2024.5.10.0008

Data de Disponibilização: 28/04/2025

Polo Ativo:

CRISTIANE VALVERDE DE BRITO

Polo Passivo:

5 ESTRELAS SERVICOS DE APOIO ADMINISTRATIVO LTDA - EPP CONDOMINIO CIVIL DO SHOPPING CENTER IGUATEMI BRASILIA

Acórdão

Advogados:

ELIZABETH PEREIRA DE OLIVEIRA

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

GABRIELA MICHELONE PEREIRA

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

DONNE PINHEIRO MACEDO PISCO

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 3ª TURMA Relator: AUGUSTO CESAR ALVES DE SOUZA BARRETO 0000375-36.2024.5.10.0008 : CRISTIANE VALVERDE DE BRITO … PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 3ª TURMA Relator: AUGUSTO CESAR ALVES DE SOUZA BARRETO 0000375-36.2024.5.10.0008 : CRISTIANE VALVERDE DE BRITO : 5 ESTRELAS SERVICOS DE APOIO ADMINISTRATIVO LTDA - EPP E OUTROS (1) PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO PROCESSO n.º 0000375-36.2024.5.10.0008 - RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA (1009) RELATOR: DESEMBARGADOR AUGUSTO CÉSAR ALVES DE SOUZA BARRETO RECORRENTE: CRISTIANE VALVERDE DE BRITO RECORRIDO: 5 ESTRELAS SERVIÇOS DE APOIO ADMINISTRATIVO LTDA - EPP RECORRIDO: CONDOMÍNIO CIVIL DO SHOPPING CENTER IGUATEMI BRASÍLIA ACB/3 EMENTA DIREITO DO TRABALHO. RECURSO ORDINÁRIO. DESVIO DE FUNÇÃO. AGENTE DE PORTARIA. VIGILANTE. DESCARACTERIZAÇÃO DA JORNADA 12X36. DANOS MORAIS POR CONDIÇÕES DE TRABALHO. RECURSO NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1.Recurso ordinário contra sentença que, em ação trabalhista, julgou parcialmente procedentes os pedidos da reclamante referentes a desvio de função (agente de portaria para vigilante), adicional de periculosidade, danos morais pelo trabalho de vigilante, horas extras em regime de 12x36 e danos morais por condições de trabalho. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há cinco questões em discussão: (i) caracterização do desvio de função de agente de portaria para vigilante; (ii) direito ao adicional de periculosidade; (iii) direito à indenização por danos morais decorrente do exercício da função; (iv) validade da jornada 12x36 e o direito as horas extras; (v) direito à indenização por danos morais em razão das condições de trabalho (ausência de assentos e restrição ao uso de banheiro e bebedouro). III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A função de agente de portaria exercida pela reclamante não se enquadra na definição legal de vigilante, conforme a Lei nº 7.102/1983 vigente à época do contrato, pois não envolvia o porte de arma, rondas motorizadas ou abordagens diretas, conforme comprovado pelas provas testemunhais. 4. O adicional de periculosidade é indevido por ausência de prova de exposição a risco efetivo e permanente de violência física, conforme art. 193, II, da CLT. As atividades da reclamante se limitavam à comunicação de situações suspeitas, sem enfrentamento direto. 5. A indenização por danos morais, pelo exercício de atividades supostamente mais perigosas, é indevida por falta de prova de lesão concreta à honra, integridade psicológica ou dignidade da trabalhadora. 6. A jornada 12x36 é válida, mesmo com a realização de horas extras, se estas não são habituais. A análise dos registros de ponto e contracheques, confrontada com o depoimento da testemunha, demonstra a não habitualidade das horas extras. 7. A indenização por danos morais pela ausência de assentos é mantida por se considerar o valor arbitrado razoável e proporcional. O pedido de indenização por suposta restrição ao uso do banheiro e consumo de água é rejeitado pela inconclusividade da prova testemunhal. IV. DISPOSITIVO E TESE 8. Recurso não provido. Tese de julgamento: 1. O desvio de função exige o efetivo desempenho de atividades incompatíveis com o contrato de trabalho, necessitando de prova robusta do exercício de tarefas de maior qualificação e remuneração. A simples semelhança parcial de atividades não configura desvio de função. 2. O adicional de periculosidade pressupõe exposição efetiva e permanente a risco de violência física, não sendo suficiente a mera comunicação de ocorrências suspeitas. 3. A indenização por danos morais exige prova de lesão concreta à honra, integridade psicológica ou dignidade da pessoa, não se configurando pela alegação de desempenho de atividades mais perigosas que as descritas em contrato. 4. O regime de compensação de jornada 12x36 somente se invalida mediante prova robusta da habitualidade na realização de horas extras que extrapolam a jornada semanal máxima. 5. O valor da indenização por danos morais deve observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, levando em consideração a extensão do dano e a capacidade econômica da empregadora. ________________________ Dispositivos relevantes citados: Art. 193, II, da CLT; Art. 59-B, parágrafo único, da CLT; Art. 199, parágrafo único, da CLT; NR-17 do MTE; Lei nº 7.102/1983; Lei nº 14.967/2024; arts. 818, I, da CLT e 373, I, do CPC; Arts. 884 e 422 do Código Civil; Art. 13 da Lei nº 6615/78; Art. 456, parágrafo único, da CLT. Jurisprudência relevante citada: RR-12359-48.2017.5.15.0129, TST, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandão, DEJT 14/03/2025; RO-0000129-37.2024.5.10.0009, TRT-10, 3ª Turma, Relator Desembargador Brasilino Santos Ramos, DEJT 20/07/2024. RELATÓRIO O Juiz Marcos Alberto dos Reis, da MM. 8ª Vara do Trabalho de Brasília-DF, por meio de sentença (ID. fc2bc0a), julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais. Irresignada, a reclamante recorreu ordinariamente (ID. 09bf091). Apresentadas contrarrazões pela reclamada (ID. 31fb091). Os autos não foram encaminhados ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 102 do RITRT. É o relatório. FUNDAMENTAÇÃO ADMISSIBILIDADE Atendidos os pressupostos de admissibilidade, conheço parcialmente do recurso ordinário da reclamante, exceto quanto à alegação relativa à Portaria nº 387/2006-DG/DPF e à suposta inveracidade dos cartões de ponto, uma vez que a sentença não tratou dessas questões e a parte não opôs embargos de declaração para suscitar eventual omissão, o que impede sua análise direta em grau recursal, sob pena de supressão de instância. MÉRITO DESVIO DE FUNÇÃO. AGENTE DE PORTARIA X VIGILANTE. DIFERENÇAS SALARIAIS, ADICIONAL DE PERICULOSIDADE E DANO MORAL. O pedido de pagamento das diferenças salariais pelo desvio de função foi indeferido pelo Magistrado de piso nos seguintes termos: "A autora conta que foi contratada pela 5 ESTRELAS Serviços de Apoio Administrativo Ltda - EPP em 01.09.202 para exercer a função de AGENTE DE PORTARIA no Shopping Iguatemi de Brasília, até ser dispensada sem justa causa em 11.02.2024, quanto auferia salário mensal de R$ 1.775,88. A autora alega que foi desviada de sua função de AGENTE DE PORTARIA, exercendo desde o início do contrato de trabalho a função de VIGILANTE, sem qualquer acréscimo salarial ou anotação da referida função não CTPS. A autora pondera que o Agente de Portaria faz o registro e fiscalização de entrada e saída de veículos e pessoas em portaria de estabelecimento. No entanto, laborava realizando as atividades de vigilante, realizando a segurança do estabelecimento, fiscalizava o local bem como a entrada e saída de pessoas, vigiava e abordava suspeitos, dentre outras atividades. Com base no alegado desvio de função, pede o pagamento das seguintes parcelas: 1) diferença salarial de 40%, acrescidos dos reflexos; 2) adicional de periculosidade pelo exercício da função de vigilante; 3) indenização pelo dano moral decorrente do exercício da função perigosa de vigilante, sem o adicional de periculosidade. Decido. O contrato de trabalho é sinalagmático, em face da reciprocidade de obrigações contratuais equivalentes. Com o propósito de evitar o enriquecimento ilícito de uma das partes, devem ser observados os princípios da boa-fé contratual e do equilíbrio entre as prestações. Assim, havendo o exercício de tarefas alheias àquelas inerentes à função do empregado, provoca-se um desequilíbrio na equivalência das obrigações, impondo-se um acréscimo salarial, a teor dos artigos 884 e 422 do Código Civil. Nesse caso, pode-se aplicar, por analogia, o art. 13 da Lei nº 6615/78, que prevê para o radialista adicional de acúmulo de funções de 10%, 20% ou 40%, conforme critérios definidos na lei. O exercício de outras atividades, contudo, não gera um acréscimo salarial, se compatíveis com as atribuições do trabalhador, pois se entende que o empregado se obrigou a todo e qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal, conforme disposto no art. 456, parágrafo único, da CLT. Cabe, portanto, em cada caso, com base no princípio da razoabilidade, avaliar a qualificação profissional e atributos na situação concreta estabelecida, a fim de decidir se houve ou não a execução de serviços que provocaram um desequilíbrio na equivalência das obrigações contratuais, que justifique um acréscimo salarial. Em suma, o desvio de função gera direito a diferenças salariais se o empregado, contratado para determinada função, passa a realizar tarefas de maior qualificação e, portanto, melhor remunerada, sob pena de ensejar o enriquecimento sem causa do empregador. Fixadas essas premissas, vejamos o caso dos autos. A autora alega que foi desviada para o exercício de Vigilante. Pois bem. A categoria profissional do Vigilante possui regulamentação própria na Lei nº 7.102/1983. O art. 15 da Lei nº 7.102/83 define Vigilante como sendo 'o empregado contratado para a execução das atividades definidas nos incisos I e II do caput e §§ 2º, 3º e 4º do art. 10. O art. 10 da Lei nº 7.102/1983 descreve as atividades do Vigilante nos seguintes termos: 'Art. 10. São considerados como segurança privada as atividades desenvolvidas em prestação de serviços com a finalidade de: I- proceder à vigilância patrimonial das instituições financeiras e de outros estabelecimentos, públicos ou privados, bem como à segurança de pessoas físicas; II - realizar o transporte de valores ou garantir o transporte de qualquer outro tipo de carga. § 1º Os serviços de vigilância e de transporte de valores poderão ser executados por uma mesma empresa. § 2º As empresas especializadas em prestação de serviços de segurança, vigilância e transporte de valores, constituídas sob a forma de empresas privadas, além das hipóteses previstas nos incisos do caput deste artigo, poderão se prestar ao exercício das atividades de segurança privada a pessoas; a estabelecimentos comerciais, industriais, de prestação de serviços e residências; a entidades sem fins lucrativos; e órgãos e empresas públicas. § 3º Serão regidas por esta lei, pelos regulamentos dela decorrentes e pelas disposições da legislação civil, comercial, trabalhista, previdenciária e penal, as empresas definidas no parágrafo anterior. § 4º As empresas que tenham objeto econômico diverso da vigilância ostensiva e do transporte de valores, que utilizem pessoal de quadro funcional próprio, para execução dessas atividades, ficam obrigadas ao cumprimento do disposto nesta lei e demais legislações pertinentes.' O art. 19 da Lei nº 7.102/83 assegura ao vigilante o porte de arma para o exercício de suas atividades, in verbis: Art. 19 - É assegurado ao vigilante: I - uniforme especial às expensas da empresa a que se vincular; II - porte de arma, quando em serviço; III - prisão especial por ato decorrente do serviço; IV - seguro de vida em grupo, feito pela empresa empregadora. Nesse cenário, conclui-se que o Vigilante Patrimonial é o agente que, portando arma, detém a obrigação de impedir ou inibir ação criminosa contra o patrimônio ou pessoa sob sua responsabilidade. A autora descreve em seu depoimento que não portava arma e nem fazia rondas motorizadas. Trabalhava nas portarias do Shopping e sua atividade consistia em monitorar qualquer pessoa suspeita acompanhando-a dentro do shopping, e caso presenciasse algum furto deveria entrar em contato com o encarregado e chamava a polícia que o meliante fosse abordado. Somente abordava pessoas caso entrassem no no shopping sem camisa, consumindo bebida alcóolica ou usando capacete. Eis o depoimento da autora: Depoimento pessoal da autora: 'trabalhou na 1ª reclamada de 01/09/2022 a 11/02/2024, exercendo a função de Recepcionista na sede da empresa e Agente de Portaria nos diversos postos de trabalho da reclamada e também como vigia, pois não trabalhava armada e também fez monitoramento de câmaras de CFTV, da casa do dono da empresa e da sede da reclamada, com jornada das 07h às 19h, sem intervalo intrajornada, na escala 12x36. Diz que era sempre convocada para cumprir plantões extras. A depoente anotava sua jornada nas folhas de ponto. A depoente registrava todos os dias trabalhados. A depoente trabalhou no SHOPPING CENTER IGUATEMI, no período de março de 2020 a outubro 2023, exercendo a função de Vigilante, embora não estivesse armada. A depoente trabalhou em vários locais no shopping, internos e externos. A depoente trabalhou como Vigilante e Agente de Portaria, no shopping e cumpriu jornada das 10h às 22h, e das 07h às 19h. Não trabalhou no plantão noturno. Trabalhavam, aproximadamente, 08 Agentes de Portaria no mesmo turno. Existiam 05 vigilantes trabalhando por turno. Os vigilantes trabalhavam na parte externa, armados. Os Agentes de Portaria não usam arma. Todos esses profissionais eram empregados da 1ª reclamada. Os vigilantes faziam as rondas motorizadas. O Agente de Portaria trabalha nas entradas do Shopping. A autora não trabalhou nas Docas, mas nos portões externos de acesso dos fornecedores. Os Agentes de Portaria que trabalhavam na parte externa usavam o mesmo uniforme dos vigilantes. O Agente de Portaria também faz ronda. Se entrasse alguma pessoa suspeita dentro do shopping, o Agente de Portaria deveria acompanhá-lo. Caso o Agente de Portaria presenciasse algum furto deveria entrar em contato com o encarregado e chamava a policia para que fosse abordado o meliante. A depoente abordava pessoas que entravam sem camisa, consumindo bebida alcóolica ou usando capacete. A empresa concedia pausas de 15 minutas, que não se confundia com intervalo intrajornada, durante o expediente, até ser cancelado em outubro/2023. Existiam um refeitório na Doca onde os vigilantes e agente de portariam almoçavam. A depoente chegou a usar esse refeitório para usufruir intervalo intrajornada. A depoente era substituída por um colega no seu posto de trabalho para que pudesse se deslocar até o refeitório. A depoente ficava uma hora no refeitório para se alimentar e descansar.' Nada mais. A testemunha KILVIA MARIA RODRIGUES DA SILVA também esclareceu que o Agente de Portaria não faz a abordagem de suspeitos: Testemunha KILVIA MARIA RODRIGUES DA SILVA.: 'trabalhou na 1ª reclamada de 01/12/2022 até agosto de 2023, exercendo a função de Agente de Portaria, no Shopping Iguatemi. Os Agentes de Portaria trabalham na parte interna e os vigilantes, na parte externa do Shopping. A depoente trabalhou na parte externa do shopping exercendo as mesmas atividades dos vigilantes, embora não estivesse armada. A depoente não fazia ronda externa, mas sim ficava em um posto fixo. Quando estava trabalhando no posto externo, sua orientação era que acompanhasse o indivíduo suspeito até o supervisor chegar e o abordá-lo. A função da depoente era impedir que o indivíduo entrasse no Shopping. A depoente usava um rádio para chamar o supervisor. A depoente fazia 4 plantões extras por mês. A empresa sempre pagava pelos plantões extras, embora demorasse um pouco. A autora também fazia esses serviços externos e plantões extras, com a mesma frequência. O Agente de Portaria deverá sempre acompanhar qualquer pessoa suspeita que entrasse no Shopping e não poderia perdê-lo de vista, mas não poderia abordá-lo. Sempre deveria aguardar o supervisor para que ele tomasse as providências. A depoente fazia guarda patrimonial do Shopping. Os Agente de Portaria eram orientados a prestar mais atenção nas lojas com mercadoria de alto valor, como joalherias e de produtos importados. Os Agentes de Portaria não poderiam sentar durante a jornada. O Agente de Portaria deve entrar em contato com a Central para que possa deixar seu posto de serviço e ir ao banheiro. O Agente de Portaria deve aguardar alguém que a lhe rendesse no Posto. Demorava 15 minutos para ser rendida e a Central não gostava que a Agente de Portaria pedisse para ser rendido. A Central sempre respondia que o AGP deveria aguardar no seu posto de serviço. A depoente também precisava pedir para a Central autorização para ir tomar água no bebedouro e não podia usar garrafa com água. Isso se aplicava a todos os AGP. Nunca presenciou a interação entre a autora e os encarregados Rubens e Ortilei. No ponto de vista da depoente os vigilantes estão mais protegidos e armados que os AGP´s, mas todos faziam a mesma coisa. Trabalhavam de 09 a 10 AGP´s por turno e de 04 a 06 vigilantes. Apenas o vigilante fazia a ronda motorizada. É preciso fazer um curso para ser vigilante.' Nada mais. O quadro delineado pela prova demonstra que a autora, na função de Agente de Portaria, não atuava de forma ostensiva na prevenção ou no combate efetivo da ação criminosa, pois nem mesmo portava qualquer tipo de arma, para que possa ser considerada Vigilante. Como autora não exercia as atividades de vigilante, indefiro os pedidos de pagamento de : 1) diferença salarial de 40%, acrescidos dos reflexos; 2) adicional de periculosidade pelo exercício da função de vigilante; 3) indenização pelo dano moral decorrente do exercício da função perigosa de vigilante, sem o adicional de periculosidade." A reclamante, em sua versão recursal, sustenta que, embora formalmente contratada como agente de portaria, desempenhava atividades inerentes à função de vigilante, ainda que desarmada, devendo ser reconhecido o direito ao enquadramento na categoria e às verbas decorrentes. Argumenta que a sentença se baseou na Lei nº 7.102/83, que foi revogada pela Lei nº 14.967/2024, a qual não exige o uso de arma de fogo para a caracterização da função de vigilante, reforçando que a nova legislação deve ser aplicada ao caso. Além disso, pleiteia o adicional de periculosidade sob a alegação de exposição a risco decorrente do exercício de segurança patrimonial, bem como indenização por dano moral, sob o argumento de que desempenhou atividades perigosas sem a devida contraprestação salarial. Examino. Como já relatado, a sentença indeferiu o pleito de desvio de função, assentando que a autora não realizava atividades típicas de vigilante, pois não trabalhava armada, não fazia rondas motorizadas e não desempenhava a função de segurança ostensiva. A prova oral colhida nos autos confirma essa conclusão. A testemunha indicada pela reclamante, Kilvia Maria Rodrigues da Silva, afirmou que os agentes de portaria exerciam atividades semelhantes às dos vigilantes, mas sem portar arma. Relatou que trabalhava na parte externa do shopping, em um posto fixo, e que, ao identificar um indivíduo suspeito, deveria acompanhá-lo até a chegada do supervisor, sem realizar abordagem direta. Acrescentou que os agentes de portaria deviam manter atenção especial às lojas de alto valor, como joalherias. No entanto, a própria testemunha reconheceu que apenas os vigilantes realizavam rondas motorizadas, reforçando que os agentes de portaria, ainda que posicionados em áreas externas, não desempenhavam funções típicas de patrulhamento ostensivo. A testemunha da reclamada, Luciano de Freitas Moreira, vigilante líder, corroborou essa distinção funcional, esclarecendo que os agentes de portaria atuavam na parte interna do shopping e em alguns postos externos de triagem de fornecedores, sem realizar rondas ou abordagens de suspeitos. Relatou que, diante de qualquer ocorrência, cabia a esses empregados apenas comunicar imediatamente à Central, que tomava as providências cabíveis. Destacou, ainda, que havia diferenciação clara entre os uniformes dos agentes de portaria e dos vigilantes, sendo estes os responsáveis exclusivos pela segurança patrimonial ostensiva do estabelecimento. Diante desse conjunto probatório, resta evidente que a reclamante não desempenhava integralmente as funções de vigilante. A mera semelhança parcial entre as atividades não configura desvio de função se não há identidade substancial de atribuições e responsabilidades. À época do contrato de trabalho, a Lei nº 7.102/83 disciplinava a profissão e estabelecia que a função de vigilante era voltada à segurança patrimonial e de pessoas, com possibilidade de uso de armamento. Embora posteriormente revogada pela Lei nº 14.967/2024, essa nova legislação não se aplica ao caso, pois, conforme o princípio do tempus regit actum, os fatos devem ser analisados sob a norma vigente à época da prestação dos serviços. Assim, o contrato da reclamante, encerrado em 11/02/2024, não pode ser regido pela nova legislação. Ainda que se cogitasse a aplicação da norma atual, os elementos dos autos não permitem o reconhecimento do desvio de função, pois não há prova de que a reclamante exercia todas as atribuições típicas de vigilante, especialmente no que se refere à vigilância ostensiva e à abordagem direta de suspeitos. No que concerne ao adicional de periculosidade, não há prova de que a função da reclamante a expunha a risco acentuado de violência física. O artigo 193, II, da CLT exige, para a caracterização da periculosidade, a exposição a risco efetivo e permanente de violência. No caso, os depoimentos demonstraram que a reclamante apenas comunicava situações suspeitas à Central, sem qualquer atividade de enfrentamento ou risco iminente. A ausência de patrulhamento ostensivo e de abordagem direta de suspeitos descaracteriza a periculosidade da função e inviabiliza o deferimento do adicional pleiteado. Por fim, não há fundamento para a indenização por dano moral. A mera alegação de que a reclamante exercia atividades supostamente mais perigosas do que aquelas descritas em sua CTPS não configura, por si só, violação a direitos fundamentais da personalidade. A indenização por dano moral exige prova de lesão concreta à honra, à integridade psicológica ou à dignidade da trabalhadora, o que não se verifica nos autos. Diante do exposto, nego provimento ao recurso ordinário, mantendo a sentença que indeferiu os pedidos de diferenças salariais por desvio de função, adicional de periculosidade e indenização por dano moral. HORAS EXTRAS. REGIME 12X36. HABITUALIDADE NA PRESTAÇÃO DE DOBRAS DE PLANTÃO NÃO COMPROVADA. VALIDADE DA JORNADA ESPECIAL MANTIDA. Sobre o tema, o Magistrado de origem se manifestou nestes termos: "A autora narra que trabalhava em escala 12x36. Contudo, ao menos uma vez por semana, em média 4 vezes por mês, lhe era exigido que fizesse 'dobra' de plantões, ou seja, três plantões seguidos de 12 horas sem o descanso de 36 horas. Diz que essa exigência de realizar dobra de plantões perdurou durante todo o contrato de trabalho. Com base nessas alegações, requer a declaração da invalidade da escala 12x36 e o pagamento das horas extras que ultrapassavam a 8ª hora diária, acrescidas dos reflexos. Decido. O art. 59-B, parágrafo único, da CLT definiu que a prestação de horas extras, mesmo habituais, não descaracteriza o acordo de compensação de jornada. Eis o seu teor: Art. 59-B. O não atendimento das exigências legais para compensação de jornada, inclusive quando estabelecida mediante acordo tácito, não implica a repetição do pagamento das horas excedentes à jornada normal diária se não ultrapassada a duração máxima semanal, sendo devido apenas o respectivo adicional. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) (Vigência) Parágrafo único. A prestação de horas extras habituais não descaracteriza o acordo de compensação de jornada e o banco de horas. Logo, plantões extras semanais não detém a potestade de invalidar a compensação da jornada de 12 x 36. Indefiro o pedido de pagamento de horas extras". Em seu recurso ordinário, a reclamante sustenta que a sentença aplicou indevidamente o artigo 59-B da CLT, pois a norma somente autoriza a compensação de jornada quando não houver extrapolação da jornada máxima semanal de 44 horas, o que, segundo alega, não se verifica no caso concreto. Afirma que realizava dobras de plantão de maneira habitual, ao menos quatro vezes por mês, perfazendo uma jornada semanal média de 54 horas. Aduz, ainda, que os cartões de ponto não refletem a realidade do contrato de trabalho e que a prova testemunhal confirmou que era exigida a dobra de plantões em média quatro vezes ao mês, uma vez por semana. Pois bem. A controvérsia recursal exige a análise da compatibilidade do artigo 59-B, parágrafo único, da CLT com o regime 12x36, bem como a verificação da alegada habitualidade na prestação de dobras de plantão. De fato, o dispositivo legal estabelece que a prestação de horas extras habituais não descaracteriza o acordo de compensação de jornada e o banco de horas. No entanto, a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, entendimento com o qual passo a me alinhar, tem afastado sua aplicação ao regime 12x36. Esse posicionamento decorre do reconhecimento de que tal tipo de jornada não é um simples acordo de compensação, mas um regime especial, cuja validade depende do seu cumprimento estrito. Assim, a extrapolação habitual dos períodos de descanso, ainda que pactuada coletivamente, invalida o regime e torna devidas as horas extras além da oitava diária e quadragésima quarta semanal. Nesse sentido, cito recentes precedentes do TST e deste Colegiado: "AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA PARTE AUTORA. LEI Nº 13.015/2014. CPC/2015. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. LEI Nº 13.467/2017 . JORNADA DE TRABALHO. REGIME DE 12X36. INVALIDADE. LABOR HABITUAL NOS DIAS DESTINADOS A FOLGAS. HORAS EXTRAS. JURISPRUDÊNCIA PACIFICADA NESTA CORTE. Constatado equívoco na decisão agravada, dá-se provimento ao agravo para determinar o processamento do agravo de instrumento. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA DA PARTE AUTORA. LEI Nº 13.015/2014. CPC/2015. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. LEI Nº 13.467/2017 . JORNADA DE TRABALHO. REGIME DE 12X36. INVALIDADE. LABOR HABITUAL NOS DIAS DESTINADOS A FOLGAS. HORAS EXTRAS. JURISPRUDÊNCIA PACIFICADA NESTA CORTE. Agravo de instrumento a que se dá provimento para determinar o processamento do recurso de revista, em face de haver sido aparente má-aplicação da Súmula nº 85, IV, do TST. RECURSO DE REVISTA DA PARTE AUTORA. LEI Nº 13.015/2014. CPC/2015. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST. LEI Nº 13.467/2017 . JORNADA DE TRABALHO. REGIME DE 12X36. INVALIDADE. LABOR HABITUAL NOS DIAS DESTINADOS A FOLGAS. HORAS EXTRAS. JURISPRUDÊNCIA PACIFICADA NESTA CORTE. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA CONSTATADA . Não obstante o teor da Súmula nº 444 do TST, que admite, em caráter excepcional, a adoção do regime especial de compensação 12x36, a prestação habitual de horas extras desnatura por completo a avença. O caráter excepcional desse tipo de trabalho, em razão dos prejuízos físicos, emocionais e sociais que acarreta ao empregado, exige que as exceções autorizadas pelo ordenamento jurídico sejam aplicadas com rigor. Assim, admite-se tal regime, desde que fielmente cumprido. Ultrapassados seus limites, ainda que autorizados por norma coletiva, como no caso dos autos, todo o ajuste torna-se inválido e passa a ser devida a remuneração extraordinária do trabalho prestado além da oitava hora diária e quadragésima quarta semanal, sendo inaplicável o entendimento contido na Súmula nº 85, IV, do TST. Na hipótese, a conclusão da Corte de origem, no sentido de que o labor em 05 dias destinados a folgas, por mês, não descaracteriza a jornada 12x36 dissente da jurisprudência pacificada nesta Corte . Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido" (RR-12359-48.2017.5.15.0129, 7ª Turma, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandao, DEJT 14/03/2025). "JORNADA DE TRABALHO. REGIME 12X36. LABOR ELASTECIDO. HABITUALIDADE. DESCARACTERIZAÇÃO. A jurisprudência uniforme do col. TST é no sentido de que, mesmo considerado o período de labor na vigência da Lei 13.467/2017, a prestação de horas extras habituais descaracteriza o regime 12x36, não sendo aplicável a parte final do item IV da Súmula nº 85 do col. TST e, além do mais, afasta a regra prevista no art. 59-B, parágrafo único, da CLT. Portanto, a incontroversa prestação habitual de horas extras torna devido o pagamento como extra das horas laboradas após a 8ª diária e 44ª semanal ao longo de todo o pacto laboral" (TRT-10, RO-0000129-37.2024.5.10.0009, 3ª Turma, Relator Desembargador Brasilino Santos Ramos, DEJT 20/07/2024). Portanto, à luz da jurisprudência citada, a descaracterização da jornada especial exige a comprovação de que as dobras de plantão ocorriam de forma habitual, comprometendo a lógica do regime e inviabilizando seu propósito de assegurar o descanso adequado. A extrapolação reiterada da jornada, com a supressão sistemática do intervalo de 36 horas entre os turnos, constitui o elemento determinante para afastar a validade do regime 12x36. Na petição inicial, a reclamante alegou que as dobras de plantão ocorriam de maneira semanal, ao menos quatro vezes por mês, durante todo o contrato de trabalho. No entanto, a análise dos registros de ponto e contracheques revela que houve apenas um dia de labor em folga nos meses de outubro de 2022, março, abril, maio, junho, julho de 2023 e outubro de 2023. Nos meses de novembro e dezembro de 2022, assim como de fevereiro e dezembro de 2023, verificaram-se dois dias de trabalho em folga. Já nos meses de agosto, setembro e novembro de 2023, janeiro e fevereiro de 2024, não há qualquer registro de labor extraordinário. Ressalto que os cartões de ponto indicam que, em alguns dias de folga trabalhados, há o registro de falta no mesmo período semanal, o que pode sugerir compensação. Como nessas situações não houve extrapolação da jornada semanal, esses dias foram desconsiderados na análise quantitativa das dobras. O cotejo entre as alegações da inicial e a prova documental evidencia que não há habitualidade na prestação de dobras de plantão tal como sustentado pela reclamante. O exame minucioso dos documentos revela que, em diversos meses, não houve qualquer labor extraordinário, e, nos períodos em que houve extrapolação da jornada, o excesso se limitou a um ou dois dias no mês. Não se verifica um padrão de cumprimento de dobras semanais nem há indícios de que a jornada semanal tenha sido sistematicamente ultrapassada. No que se refere à prova testemunhal, a testemunha da reclamante afirmou que havia a prestação de quatro dobras mensais. No entanto, esse depoimento não pode prevalecer diante dos cartões de ponto válidos constantes nos autos, que demonstram uma realidade distinta. Além disso, a própria reclamante não pleiteia o pagamento das dobras não quitadas nem o reconhecimento de pagamentos "por fora", o que reforça a conclusão de que, sempre que houve labor em dias de folga, a correspondente remuneração foi devidamente adimplida, conforme demonstram os contracheques e folhas de ponto anexados aos autos. Logo, a extrapolação da jornada, quando ocorreu, não atingiu a constância necessária para invalidar o regime. Diante da ausência de habitualidade na prestação de horas extras, não há fundamento para a descaracterização da jornada 12x36, razão pela qual deve ser mantida a sentença de primeiro grau. Nego provimento ao recurso ordinário da reclamante. DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE ASSENTOS. RESTRIÇÃO AO USO DO BANHEIRO E AO CONSUMO DE ÁGUA. INEXISTÊNCIA DE PROVA CONCLUSIVA. MANUTENÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. A sentença de primeiro grau deferiu indenização por danos morais no valor de R$ 3.500,00 em razão da ausência de assentos adequados no posto de trabalho, reconhecendo a violação ao artigo 199, parágrafo único, da CLT e à NR-17 do TEM, e indeferiu o pedido de pagamento de danos morais em razão da suposta restrição ao uso do banheiro e ao consumo de água, por ausência de prova cabal da limitação imposta pela reclamada. Eis o teor da sentença: "DANOS MORAIS PELAS CONDIÇÕES DEGRADANTES DO AMBIENTE DE TRABALHO. A autora conta que exercia as suas atividades sem um local para se sentar, trabalhando toda a sua jornada em pé. a ré não disponibilizava assentos para usar durante as pausas, ficando por longos momentos parada e algumas vezes realizando rondas. O autor pede o pagamento de indenização por danos morais, argumentando que permanecia em pé durante toda sua jornada. A ré, em sua defesa, confirma que os agentes de portaria, a cada plantão, trabalham lotados em um posto específico no interior do shopping, onde de fato permanecem em pé. São concedidos, no entanto, 2 (duas) pausas de 15min, além do intervalo intrajornada de 1h. Decido. O art. 199, parágrafo único, da CLT dispõe sobre a obrigatoriedade de se disponibilizar assentos aos trabalhadores que executam suas atividades em pé para que possam ser utilizados nas pausas que o serviço permitir. Eis o seu teor: Art.199 - Será obrigatória a colocação de assentos que assegurem postura correta ao trabalhador, capazes de evitar posições incômodas ou forçadas, sempre que a execução da tarefa exija que trabalhe sentado. Parágrafo único - Quando o trabalho deva ser executado de pé, os empregados terão à sua disposição assentos para serem utilizados nas pausas que o serviço permitir. O item 17.3.5 da NR-17/MTE repete a obrigatoriedade de manter assentos que possam utilizados pelos trabalhados durante as pausas. Eis o seu teor: '17.3.5. Para as atividades em que os trabalhos devam ser realizados de pé, devem ser colocados assentos para descanso em locais em que possam ser utilizados por todos os trabalhadores durante as pausas.' O egrégio TRT tem reconhecido o direito do trabalhador à indenização por danos morais, pela ausência de assentos para descanso, conforme atesta o seguinte precedente: RECURSO DA RECLAMADA. 1. MULTA DE 40% SOBRE O FGTS. MULTA DO ARTIGO 477 DA CLT. REDUÇÃO DA MULTA DO FGTS PELA METADE. NORMA COLETIVA. FORÇA MAIOR. É inválida norma coletiva que impõe a redução pela metade da multa do FGTS, porquanto o objeto da transação é ilícito, nos termos do artigo 611-B, III, da CLT. Não se configura a força maior do artigo 502 da CLT quando a empresa ou o estabelecimento em que o empregado trabalhava não é extinto pelo fato apontado como força maior. Portanto, devidas as diferenças da multa do FGTS. 2. DANO MORAL. NÃO DISPONIBILIZAÇÃO DE ASSENTOS A EMPREGADA QUE TRABALHA DE PÉ. Nos termos do artigo 199 da CLT, da NR 17/MTE e da CCT da categoria, a empresa era obrigada a disponibilizar assento para a empregada descansar quando fosse possível, pois seu trabalho era feito de pé. Descumprida a obrigação pela empregadora, caracteriza-se a ofensa à dignidade da trabalhadora, impondo-se a condenação da Reclamada ao pagamento de indenização por danos morais. Recurso conhecido desprovido.'(RO- 113-15.2022.5.10.0022, 2ª Turma do TRT da 10ª Região, Redator: ALEXANDRE DE AZEVEDO SILVA Julgamento: 05/07/2023) Está incontroverso que a reclamada não disponibilizava assentos nos setores de trabalho para proporcionar o descanso natural durante as pausas. Condeno a ré ao pagamento de indenização por danos morais, no importe de R$ 3.500,00. DANO MORAL PELA RESTRIÇÃO AO USO DO BANHEIRO E CONSUMO DE ÁGUA A autora alega que precisava ficar por longas horas parada em local determinado do shopping, sem poder se ausentar para ir ao banheiro. Igualmente, não poderia se ausentar para buscar água, além de ser proibido, por determinação da 1ª reclamada, que sequer pudesse ficar com uma garrafa d'água consigo durante sua longa jornada de trabalho. Por isso, constantemente passava em torno de 8 horas seguidas de sua jornada sem poder ir ao banheiro ou sequer beber água, colocando em risco sua saúde física. Em razão da restrição ao uso do banheiro e consumo de água, pede o pagamento de indenização por danos morais. A reclamada, em sua defesa, afirma que a pausa para uso do banheiro ou o deslocamento até os bebedouros para consumo de água não sofriam qualquer limitação, exigindo apenas que o agente de portaria comunicasse o fato à central. Decido. Não identifico prova cabal de que havia qualquer restrição quanto ao uso do banheiro ou consumo de água, diante do seguinte depoimento, descrevendo a liberdade do Agente de Portaria: Testemunha LUCIANO DE FREITAS MOREIRA: 'Além do intervalo para almoço os AGP´s possuem pausas de 15 minutos a cada 2 horas de jornada para ir ao banheiro, relaxar as pernas, descansar ou comer um lanche. O AGP deve informar toda vez que precisar deixar seu posto de trabalho para beber água. O AGP não precisa aguardar que algum colega o substitua para ir beber água, mas precisa aguardar para ser rendido caso vá ao banheiro. A rendição para ir ao banheiro demora no máximo 05 minutos'. Indefiro o pedido de pagamento de indenização por danos morais." A reclamante recorre pedindo a majoração da indenização por danos morais, alegando que a sentença fixou valor irrisório (R$ 3.500,00) diante das condições degradantes de trabalho, nas quais permanecia quase toda a jornada de 12x36 em pé, sem descanso adequado, e frequentemente dobrava plantões sem o intervalo devido, em violação à NR-17. Também requer o deferimento da indenização pela restrição ao uso do banheiro e ao consumo de água, argumentando que a prova testemunhal confirmou a necessidade de autorização para ir ao banheiro e a proibição de portar garrafas d'água, configurando afronta à dignidade e saúde da empregada. A fixação da indenização por dano moral deve observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, garantindo a reparação adequada sem resultar em enriquecimento indevido ou penalidade excessiva à reclamada. No caso, ainda que se reconheça o desconforto gerado pela ausência de assentos adequados, a extensão do dano não ultrapassa aquela já considerada na sentença. O valor arbitrado está em conformidade com os parâmetros usualmente adotados para casos semelhantes, não havendo justificativa para sua majoração. Quanto ao pedido de indenização pela suposta restrição ao uso do banheiro e ao consumo de água, a prova testemunhal não permite concluir que houve imposições abusivas ou impeditivas ao atendimento das necessidades fisiológicas. A testemunha da reclamante afirmou que os agentes de portaria precisavam informar à central para se ausentarem ao banheiro, aguardando rendição, o que poderia levar até 15 minutos. Acrescentou que a empresa "não gostava" que os empregados solicitassem para sair do posto e que era necessário pedir autorização para ir ao bebedouro, sendo proibido portar garrafa d'água. Em contrapartida, a testemunha da reclamada declarou que os empregados tinham pausas programadas a cada duas horas, além do intervalo intrajornada, e que a rendição para uso do banheiro ocorria em, no máximo, cinco minutos. Também asseverou que não havia necessidade de aguardar substituição para beber água. Diante da contradição entre os depoimentos, a prova se revela inconclusiva. Cabia à reclamante o ônus de demonstrar a efetiva restrição ao uso do banheiro e ao consumo de água, conforme dispõem os artigos 818, inciso I, da CLT e 373, inciso I, do CPC, encargo do qual não se desincumbiu. Não há nos autos elementos concretos que evidenciem a existência de imposições desarrazoadas que tenham comprometido sua dignidade ou sua saúde. Ademais, a exigência de aguardar rendição para se ausentar do posto não configura, por si só, violação de direitos fundamentais, sendo uma medida organizacional inerente a funções que demandam presença contínua no local de trabalho. Diante desse cenário, mantenho o valor fixado na sentença a título de danos morais pela ausência de assentos e rejeito o pedido de indenização pela alegada restrição ao uso do banheiro e ao consumo de água. Nego provimento ao recurso ordinário da reclamante. CONCLUSÃO DO RECURSO Conheço parcialmente do recurso ordinário da reclamante e, no mérito, nego-lhe provimento. Tudo nos termos da fundamentação. É como voto. ACÓRDÃO Por tais fundamentos, ACORDAM os Desembargadores da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, em sessão turmária e conforme o contido na respectiva certidão de julgamento (ver fls. retro), aprovar o relatório, conhecer parcialmente do recurso ordinário da reclamante, para, no mérito, negar-lhe provimento, nos termos do voto do Relator. Julgamento ocorrido à unanimidade de votos, estando presentes os Desembargadores Pedro Luís Vicentin Foltran (Presidente), Maria Regina Machado Guimarães, Brasilino Santos Ramos, Cilene Ferreira Amaro Santos e Augusto César Alves de Souza Barreto. Representando o Ministério Público do Trabalho a Procuradora Regional do Trabalho Valesca de Morais do Monte. Secretária-adjunta da Turma, a Sra. Bárbara França Gontijo. Secretaria da 3ª Turma. Brasília /DF, 23 de abril de 2025. (data do julgamento). Desembargador Augusto César Alves De Souza Barreto Relator(a) DECLARAÇÃO DE VOTO BRASILIA/DF, 25 de abril de 2025. ELPIDIO HONORIO DA SILVA, Servidor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - 5 ESTRELAS SERVICOS DE APOIO ADMINISTRATIVO LTDA - EPP

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Michele Duarte Da Silva e outros x Distrito Federal e outros

ID: 261179771

Tribunal: TRT10 Órgão: 3ª Turma Classe: RECURSO ORDINáRIO - RITO SUMARíSSIMO Nº Processo: 0000374-69.2024.5.10.0002

Data de Disponibilização: 28/04/2025

Polo Ativo:

MICHELE DUARTE DA SILVA MINISTéRIO PúBLICO DO TRABALHO

Polo Passivo:

DISTRITO FEDERAL INTERATIVA FACILITIES LTDA

Acórdão

Advogados:

ALIPIO MARIA JUNIOR

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

RAYANE RODRIGUES MOREIRA

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 3ª TURMA Relator: BRASILINO SANTOS RAMOS 0000374-69.2024.5.10.0002 : MICHELE DUARTE DA SILVA : INTERATIVA FACI… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 3ª TURMA Relator: BRASILINO SANTOS RAMOS 0000374-69.2024.5.10.0002 : MICHELE DUARTE DA SILVA : INTERATIVA FACILITIES LTDA E OUTROS (1) PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO PROCESSO n.º 0000374-69.2024.5.10.0002 - RECURSO ORDINÁRIO - RITO SUMARÍSSIMO (11886) RELATOR : DESEMBARGADOR BRASILINO SANTOS RAMOS RECORRENTE: MICHELE DUARTE DA SILVA RECORRIDOS: INTERATIVA FACILITIES LTDA, DISTRITO FEDERAL gdbsr1 EMENTA 1. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE FORMA AUTÔNOMA. DESCONFIGURAÇÃO. VÍNCULO EMPREGATÍCIO DECLARADO. A declaração de vínculo de emprego deve, necessariamente, advir da constatação da existência de fraude na relação contratual havida entre as partes, pois não se admite, no Direito do Trabalho, a prática de atos com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação das disposições previstas no Texto Consolidado (CLT, art. 9°). É pacífico que a relação de emprego emerge da conjugação de certos elementos fático-jurídicos, verdadeiros pressupostos para a caracterização do vínculo empregatício, definidos precipuamente nos arts. 2º e 3º da CLT. São eles: prestado por pessoa física, de forma pessoal, em trabalho não-eventual, sob subordinação e com onerosidade. Na hipótese vertente, embora incontroverso que a autora e a primeira reclamada firmaram relação de trabalho autônomo, vocacionado para "atuar na prestação de serviços do zoológico" e que contratada por diária, as provas produzidas nos autos demonstram que a obreira passou a exercer suas funções de maneira regular. Ressai que o que era tratado como autonomia passou a sê-lo como ajuste por tempo indeterminado. Assim, a despeito de se cogitar não haver ilegalidade na formação da avença, o desenvolvimento do contrato revelou sua nulidade. Por conseguinte, a declaração de vínculo de emprego é medida que se impõe. 2. TRATADORA DE ANIMAIS. ATIVIDADE DE RISCO. MORDIDAS CAUSADAS POR MACACOS-PREGOS. ACIDENTE DE TRABALHO. CONFIGURAÇÃO. DANO MORAL PRESUMIDO. RESPONSABILIDADE CIVIL. REPARAÇÃO DEVIDA. O Código Civil estabelece que há determinadas hipóteses em que se aplica a responsabilidade objetiva, isto é, em que é prescindível a comprovação da culpa ou dolo do agente pelo dano causado. Trata-se, porém, de modalidade excepcional de responsabilidade, sendo certo que fica excluída a figura em exame ante a presença de culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito, força maior e cláusula de não indenizar, vale dizer, as denominadas causas excludentes de responsabilidade. Na hipótese vertente, a reclamante prestava serviços de tratadora de animais, no âmbito do Zoológico de Brasília, quando, durante a jornada laboral, foi atacada por macacos-pregos, que lhe morderam mãos e coxa. Portanto, a reclamante foi vítima de acidente de trabalho típico e não se pode ignorar que se trata de atividade de risco. Ao lado dessa modalidade, as provas produzidas nos autos evidenciam a responsabilidade subjetiva patronal, na modalidade negligência, porquanto inobservadas as pertinentes normas de segurança do trabalho. A circunstância examinada nestes autos acarreta dano moral in re ipsa e, devido a isso, prescinde de comprovação de sua existência. Portanto, além da responsabilidade objetiva, configurado o dano, a culpa da recorrida e a relação de causalidade, exsurge a responsabilidade civil subjetiva da primeira reclamada. Sobre o quantum, considerados os critérios do art. 223-G da CLT, o quadro de dor, a afetação psíquica, a gravidade do evento, o grau de culpa no evento danoso, o caráter pedagógico, a extensão do dano (art. 944/CCB), a proporcionalidade e, ademais, em atenção à jurisprudência firmada no âmbito da egr. Terceira Turma, reputa-se razoável fixá-lo em R$3.000,00 (três mil reais). 3. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO DISTRITO FEDERAL. O caso não se insere como direito trabalhista típico, mas possui feição estritamente cível. Sob esse viés, todos aqueles que contribuíram para o infortúnio respondem solidariamente pela reparação (arts. 932, inc. III, 933 e 942, do Código Civil), sendo certo que o fato de terceiro não exonera de responsabilidade o ocasionador direto do dano, podendo aquele que o ressarciu reaver o que houver pago daquele por quem pagou em ação regressiva, art. 934 do mesmo Codex. Nessa perspectiva, afigurando-se que os demandados contribuíram, direta e indiretamente, para o infortúnio, mas tendo em vista o que exatamente pedido na inicial, o Distrito Federal responde de forma subsidiária no que pertine à pretensão relacionada ao acidente de trabalho. 4. Recurso ordinário conhecido e parcialmente provido. RELATÓRIO A MM. 2ª Vara do Trabalho de Brasília/DF julgou improcedentes os pedidos articulados na inicial, conforme r. sentença, a fls. 1.212/1.218, complementada em sede de embargos de declaração, a fls. 1.230/1.232. A reclamante interpõe recurso ordinário. A fls. 1.236/1.256, almeja a declaração de vínculo de emprego com a primeira reclamada (INTERATIVA FACILITIES LTDA), com sua condenação nos haveres consectários, e a responsabilidade subsidiária do DISTRITO FEDERAL, segundo acionado. Postula, também, o pagamento de reparação de dano moral decorrente de acidente de trabalho. Contrarrazões: a fls. 1.282/1.290, primeira demandada; a fls. 1.292/1.293, segundo acionado. Ministério Público do Trabalho oficia pelo conhecimento e provimento do recurso, nos termos do parecer, a fls. 1.298/1.299. É o relatório. FUNDAMENTAÇÃO 1. ADMISSIBILIDADE Preenchidos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso ordinário. 2. MÉRITO 2.1. VÍNCULO DE EMPREGO O MM. Juízo de primeiro grau julgou improcedente o pedido de declaração de vínculo de emprego entre a autora e a primeira reclamada (, ) com os seguintes fundamentos (a fls. 1.12/1.214): 1 - VÍNCULO DE EMPREGO X PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS A parte Autora alega que foi contratada pelo Réu para a função de tratadora no dia 22/01/2024, sem anotação da CTPS. Afirma que foi dispensado sem justa causa em 16/02/2024. Pints WHATSAPP FLS. 6. A Reclamada afirma que. primordialmente, cumpre esclarecer que a Reclamante JAMAIS foi empregada da Reclamada. Fato é que era prestadora de serviços do zoológico, efetuando a cobertura do empregado Tiago Benjamin de Sousa que esteve afastado das atividades profissionais. A prestação de serviços no contrato do jardim zoológico ocorre sempre por estudantes dos cursos de veterinário, zootécnica que para adquirir experiência profissional efetuam cadastro e deixam currículo para que me eventuais necessidades possam ser chamados a prestar serviços de maneira eventual. Desta forma, todos os pagamentos efetuados a Reclamante era realizados mediante a categoria da prestação de dos serviços (RPA) com a devida apuração e o recolhimento dos tributos exigidos pela legislação, conforme documentos em anexo. A Reclamante apenas prestou serviços para a Reclamada, que não precisava ser o mesmo a realizar os serviços, se caracterizando prontamente como serviço autônomo. Depoimentos e testemunhas: Depoimento da reclamante: 'Que soube da vaga para o trabalho por indicação de uma outra pessoa que trabalhava no local, porque a indicação era para o cargo de tratadora. Que a época já era formada em ciências da natureza com pós-graduação em ecologia. Que foi dispensada após sofrer o acidente do trabalho. Quando da contratação, solicitaram a apresentação de documentos pessoais e comprovação da formação acadêmica. Que não foi feito nenhum tipo de contrato e não houve solicitação de apresentação da carteira de trabalho. Que a única coisa que assinou no período em que trabalhou era a folha de ponto. (...) Depoimento do preposto: 'Que a reclamada presta serviços para o zoológico desde 2017. Que há um contrato e aditivos referentes a essa prestação de serviço. Que a empresa fornece tratadores e um supervisor de educação ambiental. Que, pelo que se recorda, a empresa possui 25 tratadores contratados com carteira assinada. Em relação à prestação de serviços pela autora, afirma que há um cadastro, onde estudantes de cursos que têm relação com a atividade, deixam seus dados para serem chamados para realizar cobertura de ausências de empregados. Atuando como diarista de forma autônoma. Foi o que ocorreu com a autora, que inicialmente foi chamada para atuar por 3 dias para cobrir um atestado médico e, posteriormente, houve prorrogação do período em razão de outras necessidades. Na época em que a autora prestou serviços, o valor da diária era de 130 reais. Que não é assinado um contrato, apenas é preenchido um formulário que solicitado, que se apresentem os documentos pessoais. Que para atividade prestada dessa forma, a empresa não possui um seguro. Que aqueles que são empregados possuem um seguro previsto na convenção coletiva, que é um seguro de vida e cobertura de despesas com funeral. (...) Testemunha da reclamada: Daniele Pessoa de Melo. Advertida e compromissada. Depoimento: 'Trabalha para a reclamada desde 2019 como encarregada. A autora foi trabalhar no local por ter apresentado um currículo para atuar como diarista quando houvesse necessidade. Que os diaristas são chamados quando há afastamento de empregados da reclamada. Que os diaristas normalmente são formados em biologia. Quando são chamados são recepcionados pelos supervisores de manejo de fauna que são empregados da reclamada, que orientam sobre o trabalho que deve ser realizado. (...) Que no dia do acidente, a depoente solicitou à empresa que efetuasse o pagamento das diárias trabalhadas; no período em que a autora ficou afastada, não houve pagamento de diárias. No momento em que a diarista chamado para atuar informada a condição de trabalho de diarista, o valor da diária, e é solicitado que apresente manifestação de que se concorda com as condições. Manifestando concordância e havendo a necessidade à escala para o trabalho. Ao exame: Os diálogos por meio de aplicativo de mensagens reproduzidos às fls. 36/65, ocorridos entre a Autora e a Encarregada da primeira Reclamada confirmam que o chamado para a prestação de serviços foi ajustada, desde o início, para atuação sob demanda com pagamento de diárias por dia trabalhado. A Autora tanto anuiu com a forma de contratação que, mesmo após o acidente, manteve a disposição de retornar à prestação de serviços. Ou seja, não se trata de ajuste para contrato de trabalho com vínculo empregatício. Trata-se de prestação de serviço eventual. Não há falar em vínculo de emprego ou pagamento de verbas contratuais e rescisórias. Improcedente. A reclamante diz que é hipossuficiente e que sua admissão não ocorreu por ser estudante de curso veterinário, nem porque estava regularmente matriculada em algum outro que justificasse ser considerada autônoma. Pontua que não foi apresentado registro ou cadastro, em qualquer plataforma utilizada pela reclamada, que se referisse a trabalho voluntário. Ressalta que foi contratada e despedida por meio de mensagens de WhatsApp, enviadas por pessoas que se identificaram como encarregados ou supervisores. Destaca, ainda, que o trabalho que desempenhou estava diretamente relacionado à atividade econômica da empregadora e que tinha a feição indeterminada. Insiste na declaração de vínculo de emprego com a primeira acionada, porque presentes os requisitos previstos no art. 3º Consolidado, o que restou violado. Pede, por decorrência, a condenação da primeira acionada nas obrigações consectárias previstas em lei. O art. 442-B, incluído pela Lei nº 13.467/2017, estabelece que "A contratação do autônomo, cumpridas por este todas as formalidades legais, com ou sem exclusividade, de forma contínua ou não, afasta a qualidade de empregado prevista no art. 3º desta Consolidação". Depreende-se que o dispositivo não afasta a relação de emprego de forma irrefutável, mas apenas reafirma o entendimento, já pacificado nesta Especializada quanto ao cumprimento dos requisitos para a configuração da relação de emprego. Portanto, vale consignar que a declaração de vínculo de emprego deve, necessariamente, advir da constatação da existência de fraude na relação contratual havida entre as partes, pois não se admite, no Direito do Trabalho, a prática de atos com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação das disposições previstas no Texto Consolidado (CLT, art. 9°). É pacífico o entendimento de que a relação de emprego emerge da conjugação de certos elementos fático-jurídicos, verdadeiros pressupostos para a caracterização do vínculo empregatício, definidos precipuamente nos arts. 2º e 3º da CLT. São eles: prestado por pessoa física, de forma pessoal, em trabalho não-eventual, sob subordinação e com onerosidade. A pessoalidade deve ser considerada pelo enfoque do impedimento de ser o obreiro substituído na prestação de seus serviços (intransmissibilidade do contrato individual), eis que o contrato de trabalho é intransmissível. O requisito da não-eventualidade é traduzido pela exigência de que os serviços sejam necessários ao funcionamento normal do empregador. Em sentido contrário, eventual há de ser o trabalho acidental, fortuito, ocasional, de acontecimento incerto. A onerosidade relaciona a contraprestação pecuniária aos serviços prestados. A subordinação jurídica - inerente à dependência hierárquica do empregado quanto à forma de realização dos serviços - é considerada o principal elemento apto a diferenciar a relação de emprego das demais formas de prestação de serviços, mormente aquelas realizadas de maneira autônoma. Cediço que ela é considerada como elemento principal a diferenciar a relação de emprego das demais formas de prestação de serviços, mormente aquelas realizadas de maneira autônoma. Nesse sentido, a subordinação deve ser vista, não sobre a pessoa do trabalhador, mas sobre o modo de realização dos serviços, ou seja, a forma pela qual os serviços são prestados. Mister acrescentar que esse critério tradicional tem sido insuficiente para diferençar o trabalhador empregado de outras formas de vínculo mantido, sobretudo referente ao prestado sob forma autônoma. Sobre o tema, leciona Maurício Godinho Delgado: [...] A prestação de serviços pode ser pactuada com ou sem pessoalidade no que tange à figura do prestador laboral. [...] Pactuado sem pessoalidade, o contrato de locação de serviços distanciar-se-á bastante do pacto empregatício por acrescentar um segundo elemento essencial de diferenciação em contraponto ao tipo legal do art. 3º, caput, da CLT - a pessoalidade. Contudo, a diferença essencial a afastar as duas figuras é a dicotomia autonomia versus subordinação. A prestação de serviços abrange, necessariamente, prestações laborais autônomas, ao passo que o contrato empregatício abrange, necessariamente, prestações laborais subordinadas. [...] Autonomia laborativa consiste na preservação, pelo trabalhador, da direção cotidiana sobre sua prestação de serviços; subordinação laborativa, ao contrário, consiste na concentração, no tomador de serviços, da direção cotidiana sobre a prestação laboral efetuada pelo trabalhador [...] (Curso de Direito do Trabalho. 6ª ed. São Paulo: Ltr. 2007. p. 586/587). Sob tal ótica, não há como ter por pressuposto para aferir-se a existência ou não de liame de emprego a mera ausência de ordens diretas do empregador sobre o serviço do prestador. Afinal, o controle pode ser realizado mediante o resultado do trabalho, rompendo-se, assim, o conceito clássico de hierarquia funcional. Na hipótese vertente, é incontroverso que a autora e a primeira reclamada firmaram relação de trabalho autônomo, vocacionado para "atuar na prestação de serviços do zoológico". Segundo a contestação ofertada pela primeira reclamada, "A prestação de serviços no contrato do jardim zoológico ocorre sempre por estudantes dos cursos de veterinário, zootécnica que para adquirir experiência profissional efetuam cadastro e deixam currículo para que me eventuais necessidades possam ser chamados a prestar serviços de maneira eventual" (a fls. 886). "Desta forma", continua a peça defensiva, "todos os pagamentos efetuados a Reclamante eram realizados mediante a categoria da prestação de dos serviços (RPA) com a devida apuração e o recolhimento dos tributos exigidos pela legislação" (a fls. 887). O preposto da primeira reclamada disse, em audiência, que (a fls. 1.054): Em relação à prestação de serviços pela autora, afirma que há um cadastro, onde estudantes de cursos que têm relação com a atividade, deixam seus dados para serem chamados para realizar cobertura de ausências de empregados. Atuando como diarista de forma autônoma. Foi o que ocorreu com a autora, que inicialmente foi chamada para atuar por 3 dias para cobrir um atestado médico e, posteriormente, houve prorrogação do período em razão de outras necessidades. Na época em que a autora prestou serviços, o valor da diária era de 130 reais. Que não é assinado um contrato, apenas é preenchido um formulário que solicitado, que se apresentem os documentos pessoais. A única testemunha ouvida declarou (a fls. 1.055): Trabalha para a reclamada desde 2019 como encarregada. A autora foi trabalhar no local por ter apresentado um currículo para atuar como diarista quando houvesse necessidade. Que os diaristas são chamados quando há afastamento de empregados da reclamada. Que os diaristas normalmente são formados em biologia. Quando são chamados são recepcionados pelos supervisores de manejo de fauna que são empregados da reclamada, que orientam sobre o trabalho que deve ser realizado. Não tem conhecimento se há um protocolo, que deve ser observado quando da realização das atividades nos ambientes em que os animais estão recolhidos [...] Que no dia do acidente, a depoente solicitou à empresa que efetuasse o pagamento das diárias trabalhadas; no período em que a autora ficou afastada, não houve pagamento de diárias. No momento em que a diarista chamado para atuar informada a condição de trabalho de diarista, o valor da diária, e é solicitado que apresente manifestação de que se concorda com as condições. Manifestando concordância e havendo a necessidade à escala para o trabalho. Ressai dos autos que a autora, embora inicialmente contratada por diária, passou a "cobrir o empregado Tiago Benjamin de Sousa que esteve afastado das atividades profissionais". Consoante se verifica, o que era tratado como autonomia passou a sê-lo como ajuste por tempo indeterminado. Sabido que, nesta Justiça Especializada, vigora o princípio da primazia da realidade sobre a forma, o qual prefere a prática concreta às formalidades inerentes aos instrumentos escritos e registros do empregado. Sob esse viés, pode-se afirmar que a relação de emprego pode ser caracterizada, pois é cediço que importa o que realmente aconteceu e não o que está escrito ou qualquer outra formalidade. A esse respeito, Plá Rodrigues, citado por Vólia Bonfim, leciona que "Isto significa que, em matéria trabalhista, importa o que ocorre na prática mais do que as partes pactuarem, em forma mais ou menos solene ou expressa, ou o que se insere em documentos, formulários e instrumentos de contrato". (Direito do Trabalho. 19ª ed, Método, 2022, pág. 192). Todo o exposto corrobora a conclusão de que não há necessidade de se provar vício de consentimento para fins de eventual nulidade do contrato firmado, bem como que a reclamante, por ser universitária e deter conhecimentos técnicos, tem plena consciência de que não teria o vínculo de emprego declarado. Não destoa da razoabilidade argumentar que o fato de se possuir conhecimentos técnicos não se revela como suficiente para afastar alegação de nulidade e eventual pedido de vínculo de emprego. É veraz que, ao anuir com a proposta de contrato, a reclamante concordou com os termos ali dispostos. Todavia, essa só circunstância não afasta a conclusão de que, no curso da relação, ela não pudesse compreender que o combinado passou a não ser cumprido e, com isso, se visse numa relação de emprego, ou seja, o contrato inicialmente constituído sob a forma de autônomo transmudou-se para típica relação empregatícia. Releva-se, não fosse bastante, que "a discussão sobre a limitação do arbítrio na fase elaborativa dos contratos apenas repete a velha controvérsia surgida no campo filosófico, sobre os problemas de livre arbítrio; e aqui, como lá, pode-se concluir que o consentimento, elemento indispensável e essencial do contrato de trabalho, não tem caráter ilimitado, pois sofre restrições que a vida social impõe e que o Estado insere nas leis que promulga" (CARMO, Júlio Bernardo do. A Formação do Contrato de Trabalho e os Vícios do Consentimento. Belo Horizonte: Revista do Tribunal Regional do Trabalho. 3ª Regão. 30 (60): 39-58, Jul./Dez.995, p. 5). Nesse passo, a questão sequer situaria sua resolução sob o prisma de vício de consentimento. Assim, a despeito de se cogitar não haver ilegalidade na formação da avença, o desenvolvimento do contrato revelou sua nulidade. Não fosse suficiente, ao revés do que afirmado na defesa, a reclamante não foi admitida por possuir curso de medicina veterinária. Consoante é percebido, prova colacionada aos autos demonstra que a autora não possuía a ventilada autonomia em seus afazeres. As conversas realizadas por meio de aplicativo revelam imposição de horário de trabalho, que era realizado de segunda-feira a sexta-feira "por tempo indeterminado" (a fls. 41). Veja-se, inclusive, que à autora foi dito que, ao retornar do afastamento causado pelo acidente, que atuaria como plantonista, inclusive em finais de semana (a fls. 55). O trabalho era prestado de forma não eventual. Havia pagamento pelos serviços prestados, o que revela a presença de onerosidade. Nesse particular, há de ser refutada suposta verificação de serviço voluntário. Segundo prevê o caput do art. 1º da Lei nº 9.608/1998, a atividade prestada em tal modalidade de serviço não é remunerada. Nesse toar, declara-se a existência de liame empregatício entre a reclamante e a primeira reclamada. O cargo, o período de prestação de serviços e a remuneração percebida são incontroversos. Desse modo, Portanto, deverá ser anotado, em CTPS, o cargo de Tratadora de Animal, no período de 22/1/2024 a 16/2/2024 e remuneração de R$2.000,00 (dois mil reais). Em atenção ao que estritamente pedido, são devidos saldo de salário de 14 dias, salário trezeno proporcional (1/12), férias proporcionais (1/12) + 1/3 e recolhimento de FGTS acrescido da multa de 40%. Dou parcial provimento. 2.2. ACIDENTE DE TRABALHO. DANO MORAL Narra a reclamante que foi contratada para a função de Tratadora de Animais e que não recebeu treinamentos de segurança do trabalho e nem fornecimento de EPIs. Noticia que, em 2/2/2024, ao realizar a limpeza da ala dos macacos, foi atacada por vários macacos-pregos e sofreu múltiplas lesões nas mãos e na coxa. Aduz que o local não possui "área de cambiamento - ou seja, um espaço de confinamento destinado a procedimentos veterinários, nutricionais ou monitoramento diário, onde os animais pudessem ser isolados para possibilitar a limpeza". Registra que a primeira reclamada não foi diligente no dever de cautela, além da necessária fiscalização. Refere que a atividade envolve o manejo de animais reveste-se de risco acentuado e, por isso, a expõe à probabilidade da ocorrência de vários possíveis sinistros, como no caso concreto dos autos. Assegura que, ainda que se tratasse de trabalhadora autônoma, também é detentora da incidência dos princípios fundamentais da dignidade humana e do valor social do trabalho (art. 1º, incs. III e IV, da CRFB/1988). Nesse passo, aduz que não se pode considerar o ocorrido como mera infração administrativa de menor gravidade, dado o total descaso com as medidas preventivas de Segurança e Saúde do Trabalho no âmbito do Zoológico. Ressalta que estão presentes os requisitos dano, culpa e nexo de causalidade, de modo que pede a condenação patronal em reparação de dano moral. Há de se relevar, de início, que o fato de o acidente envolver trabalhador autônomo, ainda que por diária, não tem o condão de afastar a competência da Justiça do Trabalho para apreciar a pretensão da vítima. O art. 114, inc. VI, da Constituição Federal disciplina que compete à Justiça do Trabalho "processar e julgar as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho", não se olvidando, do mesmo modo, a dicção da Súmula nº 392/TST. Logo, a esta Justiça Especializada compete averiguar pleito de obrigação de reparar eventual dano, se estiverem presentes os requisitos respectivos, culpa ou dolo, nexo causal entre a conduta (culposa/dolosa) e o resultado danoso. Não fosse isso, como visto no capítulo precedente, restou declarado que a relação mantida entre as partes se deu sob a modalidade empregatícia. Nesse contexto, diga-se que o ordenamento jurídico pátrio consagra, como regra, a responsabilidade subjetiva, a qual se caracteriza com a presença dos elementos dano, nexo de causalidade e culpa ou dolo (arts. 186, 187, 927 do CC e art. 7.º, inc. XXVIII, da Carta Política). Realça-se, contudo, que o Código Civil disciplina hipóteses em que se aplica a responsabilidade objetiva, isto é, em que é prescindível a comprovação da culpa ou dolo do agente pelo dano causado. Trata-se, é cedido, de modalidade excepcional de responsabilidade para que seja aplicada. Assim, não basta a simples menção a sua adoção, sendo necessário serem consignadas as circunstâncias fáticas e os motivos jurídicos que permitiram a adoção dessa forma de responsabilidade, como, por exemplo, o abuso de direito, contido no art. 187 do Código Civil ou a teoria do risco consagrada no art. 927 do mesmo diploma legal. É incontroverso nos autos a materialidade do dano ocorrido, ou seja, durante a jornada laboral, no exercício de sua função de tratadora, foi atacada por macacos-pregos, que lhe morderam mãos e coxa. Portanto, a reclamante foi vítima de acidente de trabalho típico. Não se pode ignorar, na hipótese vertente, que se trata de atividade de risco. Essa condição atrai ao caso a norma do parágrafo único do art. 927 do CCB, moldura que revela desnecessária a comprovação de culpa, haja vista a configuração de responsabilidade objetiva do empregador, capaz, assim, de ensejar direito a reparações. Apesar disso, impende relevar que, em tal contexto, fica excluída a figura em exame, diante da presença de culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito, força maior e cláusula de não indenizar, vale dizer, as denominadas causas excludentes de responsabilidade. Não há nenhum elemento que revele a presença de algumas dessas excludentes. Exsurge, pois, a responsabilidade objetiva da empregadora. Ao lado dessa modalidade, as provas produzidas nos autos evidenciam a responsabilidade subjetiva patronal, na modalidade negligência. O preposto da primeira acionada disse que: as pessoas que prestam serviço da forma com que prestou autora recebem o treinamento no dia em que se apresentam [...] Não sabe dizer qual é a duração do treinamento e se há algum registro da realização dessa atividade ou emissão de certificado. Não sabe informar se há um documento escrito com as ordens de serviço que são passadas aos tratadores para a realização de suas atividades. Não sabe informar se há qualquer registro de documento referente aos treinamentos que são realizados com esses contratados para cobertura. Que não há fornecimento de equipamentos de proteção individual para aqueles que prestam serviços como autônomos e diaristas" (a fls. 1.054). Por outro lado, assim como alertou a sentença, "a empregadora nem sequer atentou aos dispositivos da Instrução Normativa IBAMA Nº07/ 2015: ANEXO IV - VI - possuir serviço permanente de tratadores, devidamente treinados para o desempenho de suas funções; LEGENDA: a) Na coluna 'Número de indivíduos': considerar, além do número discriminado, uma prole enquanto dependente; b) Para a coluna 'Nível de Segurança' (NS): I - O tratador pode entrar estando o animal solto no recinto II - Deve-se prender o animal para o tratador entrar III - Além de prender o animal no cambiamento com trava e cadeado, deverá haver corredor ou câmara de segurança". Nessa quadra, destacam-se os princípios da precaução e o da prevenção. O primeiro dirige-se pela atuação puramente preventiva, ante o não conhecimento dos possíveis riscos que o meio ambiente de trabalho pode sofrer, ao passo que, no segundo, os riscos são previamente conhecidos, buscando-se formas para se prevenir os possíveis danos. Entretanto, percebe-se que a primeira reclamada não agiu com a obrigação de preservar a saúde da prestadora de serviços, nem agiu com a cautela necessária, porquanto inobservadas as pertinentes normas de segurança do trabalho. Segundo bem expressou o Parquet, "A omissão do empregador em fornecer treinamentos e orientações adequadas para o desempenho das funções, que envolviam o risco de contato com animais selvagens, configura a culpa do empregador, que deve ser responsabilizado pelos danos causados à obreira". A circunstância examinada nestes autos acarreta dano moral in re ipsa e, devido a isso, prescinde de comprovação de sua existência. Portanto, configura-se o dano, a culpa da recorrida e a relação de causalidade, de modo que exsurge, igualmente, a responsabilidade civil subjetiva da primeira reclamada. Sobre o quantum a ser fixado, consigna-se que o tabelamento das indenizações por dano extrapatrimonial ou danos morais trabalhistas, nos termos do art. 223-G da CLT, deverá ser observado pelo julgador como critério orientador de fundamentação da decisão judicial, sem que impeça a fixação de condenação em quantia superior, desde que devidamente motivada (Ações Diretas de Inconstitucionalidades nos 6050, 6069 e 6082). Nesse passo e considerado o quadro de dor, a afetação psíquica, a gravidade do evento, o grau de culpa no evento danoso, o caráter pedagógico, a extensão do dano (art. 944/CCB), a proporcionalidade e, ademais, em atenção à jurisprudência firmada no âmbito da egr. Terceira Turma, fixa-se a quantia de R$3.000,00 (três mil reais) à reparação. Dou parcial provimento. 2.3. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA Em recurso, reclamante afirma que restou evidenciada conduta culposa das reclamadas, devendo responder pela reparação do acidente ocorrido. Assinala que, independente da relação existente entre prestador e tomador de serviços - autônoma ou empregatícia - o tomador pode ser responsabilizado em caso de acidente de trabalho, se estiverem presentes os elementos da responsabilidade civil. Postula a responsabilidade subsidiária do segundo acionado (Distrito Federal). De plano, impõe-se sinalar a conhecida regra tantum devolutum quantum apellatum, que constrange o julgador ad quem de empreender exame e, eventualmente, reformar a sentença naquilo que foi objeto do recurso. Divisa-se que a reclamante, conquanto, na inicial, tenha pedido a responsabilidade subsidiária do segundo reclamado (Distrito Federal) pelos haveres que entende devidos, no recurso ordinário devolveu a pretensão somente sob o viés acidentário. Reforçam essa conclusão, por exemplo, as seguintes afirmações articuladas: "As reclamadas negligenciaram seu dever legal e constitucional de assegurar a saúde física de seus trabalhadores e de proporcionar um ambiente de trabalho hígido e seguro (art. 7º, XXII, art. 200, VIII, c/c art. 225 da CF/1988) [...] De conseguinte, cumpre registrar que as reclamadas não foram diligentes no dever de cautela, além da devida fiscalização, evidenciando conduta culposa, devendo responder pela reparação do acidente ocorrido"(a fls. 1.251). Como se nota, nada foi dito em relação aos demais pleitos. Com essa devida ressalva, passa-se ao exame. O caso não se insere como direito trabalhista típico. Possui feição estritamente cível, visto pelo prisma da responsabilidade extracontratual. Na hipótese vertente, é incontornável que o segundo reclamado (Distrito Federal) foi tomador e beneficiário direto do trabalho prestado pela demandante na vigência do contrato de trabalho, sendo certo que a hipótese não é de licitude ou ilicitude da terceirização. Dentro de tal moldura, cumpre sinalar que é do empregador a responsabilidade de reparar o dano, em razão de acidente ocorrido no transcorrer do trabalho, quando o (a) empregado (a) estava a sua disposição. O fato de terceiro não exonera a responsabilidade do ocasionador direto do dano, podendo aquele que ressarcir o dano causado por outrem reaver o que houver pago daquele por quem pagou em ação regressiva, art. 934 do Código Civil. Nessa linha e atentando-se para a regra dos arts. 932, inc. III, e 933 do CC, tanto a prestadora quanto o contratante respondem solidariamente pelos prejuízos que o (a) trabalhador (a) vier a sofrer no exercício de suas atividades. Consoante visto, a dinâmica do acidente descrita nos autos impõe que se reconheça que os demandados contribuíram, direta e indiretamente, por conduta negligente, para o acidente. Nessa perspectiva, seria o caso de aplicar-se a norma do art. 942 do mesmo Código Civil, vale dizer, "se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação". Ou o parágrafo único do mesmo artigo: "São solidariamente responsáveis com os autores os co-autores e as pessoas designadas no art. 932". Sob esse prisma, ficaria configurada a responsabilidade civil solidária das reclamadas. Nada obstante, observando-se exatamente o pleito, responde o ente público, de forma subsidiária, pelos haveres reconhecidos à autora no que pertine ao acidente de trabalho. Provido. CONCLUSÃO Ante o exposto, conheço do recurso ordinário e, no mérito, dou-lhe parcial provimento para: i) declarar o vínculo de emprego entre a reclamante e a primeira reclamada no período de 22/1/2024 a 16/2/2024, na função de Tratadora de Animal e remuneração de R$2.000,00 (dois mil reais); ii) condenar a primeira reclamada ao pagamento de saldo de salário de 14 dias, salário trezeno proporcional (1/12), férias proporcionais (1/12) + 1/3 e de recolhimento de FGTS acrescido da multa de 40%, bem como de reparação de dano moral no importe de R$3.000,00 (três mil reais); e iii) condenar o segundo acionado (Distrito Federal), de forma subsidiária, no que pertine à pretensão relacionada ao acidente de trabalho. Tudo nos termos da fundamentação. A reclamante deverá apresentar sua CPTS na Secretaria da MM. Vara, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas após o trânsito em julgado desta decisão, para que a primeira reclamada, contado de sua intimação para tal mister, realize as retificações e anotações acima indicadas. Na hipótese de não cumprir sua obrigação de fazer no prazo supra, incidirá multa diária de R$ 100,00 (cem reais), por dia de atraso, limitada a R$ 1.000,00 (mil reais), devendo a Secretaria realizar as anotações na CTPS, com subsequente comunicação do fato ao órgão fiscal responsável para que sejam tomadas as providências cabíveis (art. 39, §3º, da CLT). Para fins do §3º do art. 832 da CLT, as parcelas saldo de salário e salário trezeno proporcional possuem natureza salarial e sobre ela incidem contribuições previdenciárias, arcando cada uma das partes com a sua quota-parte. Considerando-se que a ação foi proposta antes da entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024, 30/8/2024, e os parâmetros estabelecidos na decisão proferida pela SBDI-1 do col. TST, nos autos do E-ED-RR 713-03.2010.5.04.0029, determino que sejam observados os seguintes critérios para atualização do crédito reconhecido: na fase pré-judicial, incide IPCA-E acrescido dos juros de mora previstos no caput do art. 39 da Lei nº 8.177/1991; a partir do ingresso em juízo da ação até 29/8/2024, aplica-se a Taxa Selic, ressalvados os valores eventualmente pagos (vedada a dedução ou compensação de eventuais diferenças pelo critério de cálculo anterior); e a partir de 30/8/2024, será utilizado, no cálculo da atualização monetária, o IPCA (art. 389, parágrafo único, do Código Civil); e os juros de mora corresponderão ao resultado da subtração Selic - IPCA nos termos do art. 406 e §§ do Código Civil. Em razão desta decisão, arbitro custas processuais a cargo da primeira reclamada, no valor de R$400,00 (quatrocentos reais), calculadas sobre o novo valor da condenação de R$20.000,00 (vinte mil reais). É o voto. ACÓRDÃO Por tais fundamentos, ACORDAM os integrantes da Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, conforme certidão de julgamento a fls. retro, em aprovar o relatório, conhecer do recurso ordinário e, no mérito, dar-lhe parcial provimento para: i) declarar o vínculo de emprego entre a reclamante e a primeira reclamada no período de 22/1/2024 a 16/2/2024, na função de Tratadora de Animal e remuneração de R$2.000,00 (dois mil reais); ii) condenar a primeira reclamada ao pagamento de saldo de salário de 14 dias, salário trezeno proporcional (1/12), férias proporcionais (1/12) + 1/3 e de recolhimento de FGTS acrescido da multa de 40%, bem como de reparação de dano moral no importe de R$3.000,00 (três mil reais); e iii)condenar o segundo acionado (Distrito Federal), de forma subsidiária no que pertine à pretensão relacionada ao acidente de trabalho. A reclamante deverá apresentar sua CPTS na Secretaria da MM. Vara, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas após o trânsito em julgado desta decisão, para que a primeira reclamada, contado de sua intimação para tal mister, realize as retificações e anotações acima indicadas. Na hipótese de não cumprir sua obrigação de fazer no prazo supra, incidirá multa diária de R$ 100,00 (cem reais), por dia de atraso, limitada a R$ 1.000,00 (mil reais), devendo a Secretaria realizar as anotações na CTPS, com subsequente comunicação do fato ao órgão fiscal responsável para que sejam tomadas as providências cabíveis (art. 39, §3º, da CLT). Para fins do §3º do art. 832 da CLT, as parcelas saldo de salário e salário trezeno proporcional possuem natureza salarial e sobre ela incidem contribuições previdenciárias, arcando cada uma das partes com a sua quota-parte. Considerando-se que a ação foi proposta antes da entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024, 30/8/2024, e os parâmetros estabelecidos na decisão proferida pela SBDI-1 do col. TST, nos autos do E-ED-RR 713-03.2010.5.04.0029, determino que sejam observados os seguintes critérios para atualização do crédito reconhecido: na fase pré-judicial, incide IPCA-E acrescido dos juros de mora previstos no caput do art. 39 da Lei nº 8.177/1991; a partir do ingresso em juízo da ação até 29/8/2024, aplica-se a Taxa Selic, ressalvados os valores eventualmente pagos (vedada a dedução ou compensação de eventuais diferenças pelo critério de cálculo anterior); e a partir de 30/8/2024, será utilizado, no cálculo da atualização monetária, o IPCA (art. 389, parágrafo único, do Código Civil); e os juros de mora corresponderão ao resultado da subtração Selic - IPCA nos termos do art. 406 e §§ do Código Civil. Em razão desta decisão, arbitrar custas processuais a cargo da primeira reclamada, no valor de R$400,00 (quatrocentos reais), calculadas sobre o novo valor da condenação de R$20.000,00 (vinte mil reais). Tudo nos termos do voto do Desembargador Relator. Julgamento ocorrido à unanimidade de votos, estando presentes os Desembargadores Pedro Luís Vicentin Foltran (Presidente), Maria Regina Machado Guimarães, Brasilino Santos Ramos, Cilene Ferreira Amaro Santos e Augusto César Alves de Souza Barreto. Representando o Ministério Público do Trabalho a Procuradora Regional do Trabalho Valesca de Morais do Monte; opinando em parecer oral pelo prosseguimento do feito ante a ausência de interesse público que justificasse a intervenção do parquet. Secretária-adjunta da Turma, a Sra. Bárbara França Gontijo. Secretaria da 3ª Turma. Brasília /DF, 23 de abril de 2025. (data do julgamento). BRASILINO SANTOS RAMOS Desembargador Relator DECLARAÇÃO DE VOTO BRASILIA/DF, 25 de abril de 2025. CARLOS JOSINO LIMA, Servidor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - MICHELE DUARTE DA SILVA

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Michele Duarte Da Silva e outros x Distrito Federal e outros

ID: 261179825

Tribunal: TRT10 Órgão: 3ª Turma Classe: RECURSO ORDINáRIO - RITO SUMARíSSIMO Nº Processo: 0000374-69.2024.5.10.0002

Data de Disponibilização: 28/04/2025

Polo Ativo:

MICHELE DUARTE DA SILVA MINISTéRIO PúBLICO DO TRABALHO

Polo Passivo:

DISTRITO FEDERAL INTERATIVA FACILITIES LTDA

Acórdão

Advogados:

ALIPIO MARIA JUNIOR

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

RAYANE RODRIGUES MOREIRA

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 3ª TURMA Relator: BRASILINO SANTOS RAMOS 0000374-69.2024.5.10.0002 : MICHELE DUARTE DA SILVA : INTERATIVA FACI… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 3ª TURMA Relator: BRASILINO SANTOS RAMOS 0000374-69.2024.5.10.0002 : MICHELE DUARTE DA SILVA : INTERATIVA FACILITIES LTDA E OUTROS (1) PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO PROCESSO n.º 0000374-69.2024.5.10.0002 - RECURSO ORDINÁRIO - RITO SUMARÍSSIMO (11886) RELATOR : DESEMBARGADOR BRASILINO SANTOS RAMOS RECORRENTE: MICHELE DUARTE DA SILVA RECORRIDOS: INTERATIVA FACILITIES LTDA, DISTRITO FEDERAL gdbsr1 EMENTA 1. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE FORMA AUTÔNOMA. DESCONFIGURAÇÃO. VÍNCULO EMPREGATÍCIO DECLARADO. A declaração de vínculo de emprego deve, necessariamente, advir da constatação da existência de fraude na relação contratual havida entre as partes, pois não se admite, no Direito do Trabalho, a prática de atos com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação das disposições previstas no Texto Consolidado (CLT, art. 9°). É pacífico que a relação de emprego emerge da conjugação de certos elementos fático-jurídicos, verdadeiros pressupostos para a caracterização do vínculo empregatício, definidos precipuamente nos arts. 2º e 3º da CLT. São eles: prestado por pessoa física, de forma pessoal, em trabalho não-eventual, sob subordinação e com onerosidade. Na hipótese vertente, embora incontroverso que a autora e a primeira reclamada firmaram relação de trabalho autônomo, vocacionado para "atuar na prestação de serviços do zoológico" e que contratada por diária, as provas produzidas nos autos demonstram que a obreira passou a exercer suas funções de maneira regular. Ressai que o que era tratado como autonomia passou a sê-lo como ajuste por tempo indeterminado. Assim, a despeito de se cogitar não haver ilegalidade na formação da avença, o desenvolvimento do contrato revelou sua nulidade. Por conseguinte, a declaração de vínculo de emprego é medida que se impõe. 2. TRATADORA DE ANIMAIS. ATIVIDADE DE RISCO. MORDIDAS CAUSADAS POR MACACOS-PREGOS. ACIDENTE DE TRABALHO. CONFIGURAÇÃO. DANO MORAL PRESUMIDO. RESPONSABILIDADE CIVIL. REPARAÇÃO DEVIDA. O Código Civil estabelece que há determinadas hipóteses em que se aplica a responsabilidade objetiva, isto é, em que é prescindível a comprovação da culpa ou dolo do agente pelo dano causado. Trata-se, porém, de modalidade excepcional de responsabilidade, sendo certo que fica excluída a figura em exame ante a presença de culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito, força maior e cláusula de não indenizar, vale dizer, as denominadas causas excludentes de responsabilidade. Na hipótese vertente, a reclamante prestava serviços de tratadora de animais, no âmbito do Zoológico de Brasília, quando, durante a jornada laboral, foi atacada por macacos-pregos, que lhe morderam mãos e coxa. Portanto, a reclamante foi vítima de acidente de trabalho típico e não se pode ignorar que se trata de atividade de risco. Ao lado dessa modalidade, as provas produzidas nos autos evidenciam a responsabilidade subjetiva patronal, na modalidade negligência, porquanto inobservadas as pertinentes normas de segurança do trabalho. A circunstância examinada nestes autos acarreta dano moral in re ipsa e, devido a isso, prescinde de comprovação de sua existência. Portanto, além da responsabilidade objetiva, configurado o dano, a culpa da recorrida e a relação de causalidade, exsurge a responsabilidade civil subjetiva da primeira reclamada. Sobre o quantum, considerados os critérios do art. 223-G da CLT, o quadro de dor, a afetação psíquica, a gravidade do evento, o grau de culpa no evento danoso, o caráter pedagógico, a extensão do dano (art. 944/CCB), a proporcionalidade e, ademais, em atenção à jurisprudência firmada no âmbito da egr. Terceira Turma, reputa-se razoável fixá-lo em R$3.000,00 (três mil reais). 3. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DO DISTRITO FEDERAL. O caso não se insere como direito trabalhista típico, mas possui feição estritamente cível. Sob esse viés, todos aqueles que contribuíram para o infortúnio respondem solidariamente pela reparação (arts. 932, inc. III, 933 e 942, do Código Civil), sendo certo que o fato de terceiro não exonera de responsabilidade o ocasionador direto do dano, podendo aquele que o ressarciu reaver o que houver pago daquele por quem pagou em ação regressiva, art. 934 do mesmo Codex. Nessa perspectiva, afigurando-se que os demandados contribuíram, direta e indiretamente, para o infortúnio, mas tendo em vista o que exatamente pedido na inicial, o Distrito Federal responde de forma subsidiária no que pertine à pretensão relacionada ao acidente de trabalho. 4. Recurso ordinário conhecido e parcialmente provido. RELATÓRIO A MM. 2ª Vara do Trabalho de Brasília/DF julgou improcedentes os pedidos articulados na inicial, conforme r. sentença, a fls. 1.212/1.218, complementada em sede de embargos de declaração, a fls. 1.230/1.232. A reclamante interpõe recurso ordinário. A fls. 1.236/1.256, almeja a declaração de vínculo de emprego com a primeira reclamada (INTERATIVA FACILITIES LTDA), com sua condenação nos haveres consectários, e a responsabilidade subsidiária do DISTRITO FEDERAL, segundo acionado. Postula, também, o pagamento de reparação de dano moral decorrente de acidente de trabalho. Contrarrazões: a fls. 1.282/1.290, primeira demandada; a fls. 1.292/1.293, segundo acionado. Ministério Público do Trabalho oficia pelo conhecimento e provimento do recurso, nos termos do parecer, a fls. 1.298/1.299. É o relatório. FUNDAMENTAÇÃO 1. ADMISSIBILIDADE Preenchidos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso ordinário. 2. MÉRITO 2.1. VÍNCULO DE EMPREGO O MM. Juízo de primeiro grau julgou improcedente o pedido de declaração de vínculo de emprego entre a autora e a primeira reclamada (, ) com os seguintes fundamentos (a fls. 1.12/1.214): 1 - VÍNCULO DE EMPREGO X PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS A parte Autora alega que foi contratada pelo Réu para a função de tratadora no dia 22/01/2024, sem anotação da CTPS. Afirma que foi dispensado sem justa causa em 16/02/2024. Pints WHATSAPP FLS. 6. A Reclamada afirma que. primordialmente, cumpre esclarecer que a Reclamante JAMAIS foi empregada da Reclamada. Fato é que era prestadora de serviços do zoológico, efetuando a cobertura do empregado Tiago Benjamin de Sousa que esteve afastado das atividades profissionais. A prestação de serviços no contrato do jardim zoológico ocorre sempre por estudantes dos cursos de veterinário, zootécnica que para adquirir experiência profissional efetuam cadastro e deixam currículo para que me eventuais necessidades possam ser chamados a prestar serviços de maneira eventual. Desta forma, todos os pagamentos efetuados a Reclamante era realizados mediante a categoria da prestação de dos serviços (RPA) com a devida apuração e o recolhimento dos tributos exigidos pela legislação, conforme documentos em anexo. A Reclamante apenas prestou serviços para a Reclamada, que não precisava ser o mesmo a realizar os serviços, se caracterizando prontamente como serviço autônomo. Depoimentos e testemunhas: Depoimento da reclamante: 'Que soube da vaga para o trabalho por indicação de uma outra pessoa que trabalhava no local, porque a indicação era para o cargo de tratadora. Que a época já era formada em ciências da natureza com pós-graduação em ecologia. Que foi dispensada após sofrer o acidente do trabalho. Quando da contratação, solicitaram a apresentação de documentos pessoais e comprovação da formação acadêmica. Que não foi feito nenhum tipo de contrato e não houve solicitação de apresentação da carteira de trabalho. Que a única coisa que assinou no período em que trabalhou era a folha de ponto. (...) Depoimento do preposto: 'Que a reclamada presta serviços para o zoológico desde 2017. Que há um contrato e aditivos referentes a essa prestação de serviço. Que a empresa fornece tratadores e um supervisor de educação ambiental. Que, pelo que se recorda, a empresa possui 25 tratadores contratados com carteira assinada. Em relação à prestação de serviços pela autora, afirma que há um cadastro, onde estudantes de cursos que têm relação com a atividade, deixam seus dados para serem chamados para realizar cobertura de ausências de empregados. Atuando como diarista de forma autônoma. Foi o que ocorreu com a autora, que inicialmente foi chamada para atuar por 3 dias para cobrir um atestado médico e, posteriormente, houve prorrogação do período em razão de outras necessidades. Na época em que a autora prestou serviços, o valor da diária era de 130 reais. Que não é assinado um contrato, apenas é preenchido um formulário que solicitado, que se apresentem os documentos pessoais. Que para atividade prestada dessa forma, a empresa não possui um seguro. Que aqueles que são empregados possuem um seguro previsto na convenção coletiva, que é um seguro de vida e cobertura de despesas com funeral. (...) Testemunha da reclamada: Daniele Pessoa de Melo. Advertida e compromissada. Depoimento: 'Trabalha para a reclamada desde 2019 como encarregada. A autora foi trabalhar no local por ter apresentado um currículo para atuar como diarista quando houvesse necessidade. Que os diaristas são chamados quando há afastamento de empregados da reclamada. Que os diaristas normalmente são formados em biologia. Quando são chamados são recepcionados pelos supervisores de manejo de fauna que são empregados da reclamada, que orientam sobre o trabalho que deve ser realizado. (...) Que no dia do acidente, a depoente solicitou à empresa que efetuasse o pagamento das diárias trabalhadas; no período em que a autora ficou afastada, não houve pagamento de diárias. No momento em que a diarista chamado para atuar informada a condição de trabalho de diarista, o valor da diária, e é solicitado que apresente manifestação de que se concorda com as condições. Manifestando concordância e havendo a necessidade à escala para o trabalho. Ao exame: Os diálogos por meio de aplicativo de mensagens reproduzidos às fls. 36/65, ocorridos entre a Autora e a Encarregada da primeira Reclamada confirmam que o chamado para a prestação de serviços foi ajustada, desde o início, para atuação sob demanda com pagamento de diárias por dia trabalhado. A Autora tanto anuiu com a forma de contratação que, mesmo após o acidente, manteve a disposição de retornar à prestação de serviços. Ou seja, não se trata de ajuste para contrato de trabalho com vínculo empregatício. Trata-se de prestação de serviço eventual. Não há falar em vínculo de emprego ou pagamento de verbas contratuais e rescisórias. Improcedente. A reclamante diz que é hipossuficiente e que sua admissão não ocorreu por ser estudante de curso veterinário, nem porque estava regularmente matriculada em algum outro que justificasse ser considerada autônoma. Pontua que não foi apresentado registro ou cadastro, em qualquer plataforma utilizada pela reclamada, que se referisse a trabalho voluntário. Ressalta que foi contratada e despedida por meio de mensagens de WhatsApp, enviadas por pessoas que se identificaram como encarregados ou supervisores. Destaca, ainda, que o trabalho que desempenhou estava diretamente relacionado à atividade econômica da empregadora e que tinha a feição indeterminada. Insiste na declaração de vínculo de emprego com a primeira acionada, porque presentes os requisitos previstos no art. 3º Consolidado, o que restou violado. Pede, por decorrência, a condenação da primeira acionada nas obrigações consectárias previstas em lei. O art. 442-B, incluído pela Lei nº 13.467/2017, estabelece que "A contratação do autônomo, cumpridas por este todas as formalidades legais, com ou sem exclusividade, de forma contínua ou não, afasta a qualidade de empregado prevista no art. 3º desta Consolidação". Depreende-se que o dispositivo não afasta a relação de emprego de forma irrefutável, mas apenas reafirma o entendimento, já pacificado nesta Especializada quanto ao cumprimento dos requisitos para a configuração da relação de emprego. Portanto, vale consignar que a declaração de vínculo de emprego deve, necessariamente, advir da constatação da existência de fraude na relação contratual havida entre as partes, pois não se admite, no Direito do Trabalho, a prática de atos com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação das disposições previstas no Texto Consolidado (CLT, art. 9°). É pacífico o entendimento de que a relação de emprego emerge da conjugação de certos elementos fático-jurídicos, verdadeiros pressupostos para a caracterização do vínculo empregatício, definidos precipuamente nos arts. 2º e 3º da CLT. São eles: prestado por pessoa física, de forma pessoal, em trabalho não-eventual, sob subordinação e com onerosidade. A pessoalidade deve ser considerada pelo enfoque do impedimento de ser o obreiro substituído na prestação de seus serviços (intransmissibilidade do contrato individual), eis que o contrato de trabalho é intransmissível. O requisito da não-eventualidade é traduzido pela exigência de que os serviços sejam necessários ao funcionamento normal do empregador. Em sentido contrário, eventual há de ser o trabalho acidental, fortuito, ocasional, de acontecimento incerto. A onerosidade relaciona a contraprestação pecuniária aos serviços prestados. A subordinação jurídica - inerente à dependência hierárquica do empregado quanto à forma de realização dos serviços - é considerada o principal elemento apto a diferenciar a relação de emprego das demais formas de prestação de serviços, mormente aquelas realizadas de maneira autônoma. Cediço que ela é considerada como elemento principal a diferenciar a relação de emprego das demais formas de prestação de serviços, mormente aquelas realizadas de maneira autônoma. Nesse sentido, a subordinação deve ser vista, não sobre a pessoa do trabalhador, mas sobre o modo de realização dos serviços, ou seja, a forma pela qual os serviços são prestados. Mister acrescentar que esse critério tradicional tem sido insuficiente para diferençar o trabalhador empregado de outras formas de vínculo mantido, sobretudo referente ao prestado sob forma autônoma. Sobre o tema, leciona Maurício Godinho Delgado: [...] A prestação de serviços pode ser pactuada com ou sem pessoalidade no que tange à figura do prestador laboral. [...] Pactuado sem pessoalidade, o contrato de locação de serviços distanciar-se-á bastante do pacto empregatício por acrescentar um segundo elemento essencial de diferenciação em contraponto ao tipo legal do art. 3º, caput, da CLT - a pessoalidade. Contudo, a diferença essencial a afastar as duas figuras é a dicotomia autonomia versus subordinação. A prestação de serviços abrange, necessariamente, prestações laborais autônomas, ao passo que o contrato empregatício abrange, necessariamente, prestações laborais subordinadas. [...] Autonomia laborativa consiste na preservação, pelo trabalhador, da direção cotidiana sobre sua prestação de serviços; subordinação laborativa, ao contrário, consiste na concentração, no tomador de serviços, da direção cotidiana sobre a prestação laboral efetuada pelo trabalhador [...] (Curso de Direito do Trabalho. 6ª ed. São Paulo: Ltr. 2007. p. 586/587). Sob tal ótica, não há como ter por pressuposto para aferir-se a existência ou não de liame de emprego a mera ausência de ordens diretas do empregador sobre o serviço do prestador. Afinal, o controle pode ser realizado mediante o resultado do trabalho, rompendo-se, assim, o conceito clássico de hierarquia funcional. Na hipótese vertente, é incontroverso que a autora e a primeira reclamada firmaram relação de trabalho autônomo, vocacionado para "atuar na prestação de serviços do zoológico". Segundo a contestação ofertada pela primeira reclamada, "A prestação de serviços no contrato do jardim zoológico ocorre sempre por estudantes dos cursos de veterinário, zootécnica que para adquirir experiência profissional efetuam cadastro e deixam currículo para que me eventuais necessidades possam ser chamados a prestar serviços de maneira eventual" (a fls. 886). "Desta forma", continua a peça defensiva, "todos os pagamentos efetuados a Reclamante eram realizados mediante a categoria da prestação de dos serviços (RPA) com a devida apuração e o recolhimento dos tributos exigidos pela legislação" (a fls. 887). O preposto da primeira reclamada disse, em audiência, que (a fls. 1.054): Em relação à prestação de serviços pela autora, afirma que há um cadastro, onde estudantes de cursos que têm relação com a atividade, deixam seus dados para serem chamados para realizar cobertura de ausências de empregados. Atuando como diarista de forma autônoma. Foi o que ocorreu com a autora, que inicialmente foi chamada para atuar por 3 dias para cobrir um atestado médico e, posteriormente, houve prorrogação do período em razão de outras necessidades. Na época em que a autora prestou serviços, o valor da diária era de 130 reais. Que não é assinado um contrato, apenas é preenchido um formulário que solicitado, que se apresentem os documentos pessoais. A única testemunha ouvida declarou (a fls. 1.055): Trabalha para a reclamada desde 2019 como encarregada. A autora foi trabalhar no local por ter apresentado um currículo para atuar como diarista quando houvesse necessidade. Que os diaristas são chamados quando há afastamento de empregados da reclamada. Que os diaristas normalmente são formados em biologia. Quando são chamados são recepcionados pelos supervisores de manejo de fauna que são empregados da reclamada, que orientam sobre o trabalho que deve ser realizado. Não tem conhecimento se há um protocolo, que deve ser observado quando da realização das atividades nos ambientes em que os animais estão recolhidos [...] Que no dia do acidente, a depoente solicitou à empresa que efetuasse o pagamento das diárias trabalhadas; no período em que a autora ficou afastada, não houve pagamento de diárias. No momento em que a diarista chamado para atuar informada a condição de trabalho de diarista, o valor da diária, e é solicitado que apresente manifestação de que se concorda com as condições. Manifestando concordância e havendo a necessidade à escala para o trabalho. Ressai dos autos que a autora, embora inicialmente contratada por diária, passou a "cobrir o empregado Tiago Benjamin de Sousa que esteve afastado das atividades profissionais". Consoante se verifica, o que era tratado como autonomia passou a sê-lo como ajuste por tempo indeterminado. Sabido que, nesta Justiça Especializada, vigora o princípio da primazia da realidade sobre a forma, o qual prefere a prática concreta às formalidades inerentes aos instrumentos escritos e registros do empregado. Sob esse viés, pode-se afirmar que a relação de emprego pode ser caracterizada, pois é cediço que importa o que realmente aconteceu e não o que está escrito ou qualquer outra formalidade. A esse respeito, Plá Rodrigues, citado por Vólia Bonfim, leciona que "Isto significa que, em matéria trabalhista, importa o que ocorre na prática mais do que as partes pactuarem, em forma mais ou menos solene ou expressa, ou o que se insere em documentos, formulários e instrumentos de contrato". (Direito do Trabalho. 19ª ed, Método, 2022, pág. 192). Todo o exposto corrobora a conclusão de que não há necessidade de se provar vício de consentimento para fins de eventual nulidade do contrato firmado, bem como que a reclamante, por ser universitária e deter conhecimentos técnicos, tem plena consciência de que não teria o vínculo de emprego declarado. Não destoa da razoabilidade argumentar que o fato de se possuir conhecimentos técnicos não se revela como suficiente para afastar alegação de nulidade e eventual pedido de vínculo de emprego. É veraz que, ao anuir com a proposta de contrato, a reclamante concordou com os termos ali dispostos. Todavia, essa só circunstância não afasta a conclusão de que, no curso da relação, ela não pudesse compreender que o combinado passou a não ser cumprido e, com isso, se visse numa relação de emprego, ou seja, o contrato inicialmente constituído sob a forma de autônomo transmudou-se para típica relação empregatícia. Releva-se, não fosse bastante, que "a discussão sobre a limitação do arbítrio na fase elaborativa dos contratos apenas repete a velha controvérsia surgida no campo filosófico, sobre os problemas de livre arbítrio; e aqui, como lá, pode-se concluir que o consentimento, elemento indispensável e essencial do contrato de trabalho, não tem caráter ilimitado, pois sofre restrições que a vida social impõe e que o Estado insere nas leis que promulga" (CARMO, Júlio Bernardo do. A Formação do Contrato de Trabalho e os Vícios do Consentimento. Belo Horizonte: Revista do Tribunal Regional do Trabalho. 3ª Regão. 30 (60): 39-58, Jul./Dez.995, p. 5). Nesse passo, a questão sequer situaria sua resolução sob o prisma de vício de consentimento. Assim, a despeito de se cogitar não haver ilegalidade na formação da avença, o desenvolvimento do contrato revelou sua nulidade. Não fosse suficiente, ao revés do que afirmado na defesa, a reclamante não foi admitida por possuir curso de medicina veterinária. Consoante é percebido, prova colacionada aos autos demonstra que a autora não possuía a ventilada autonomia em seus afazeres. As conversas realizadas por meio de aplicativo revelam imposição de horário de trabalho, que era realizado de segunda-feira a sexta-feira "por tempo indeterminado" (a fls. 41). Veja-se, inclusive, que à autora foi dito que, ao retornar do afastamento causado pelo acidente, que atuaria como plantonista, inclusive em finais de semana (a fls. 55). O trabalho era prestado de forma não eventual. Havia pagamento pelos serviços prestados, o que revela a presença de onerosidade. Nesse particular, há de ser refutada suposta verificação de serviço voluntário. Segundo prevê o caput do art. 1º da Lei nº 9.608/1998, a atividade prestada em tal modalidade de serviço não é remunerada. Nesse toar, declara-se a existência de liame empregatício entre a reclamante e a primeira reclamada. O cargo, o período de prestação de serviços e a remuneração percebida são incontroversos. Desse modo, Portanto, deverá ser anotado, em CTPS, o cargo de Tratadora de Animal, no período de 22/1/2024 a 16/2/2024 e remuneração de R$2.000,00 (dois mil reais). Em atenção ao que estritamente pedido, são devidos saldo de salário de 14 dias, salário trezeno proporcional (1/12), férias proporcionais (1/12) + 1/3 e recolhimento de FGTS acrescido da multa de 40%. Dou parcial provimento. 2.2. ACIDENTE DE TRABALHO. DANO MORAL Narra a reclamante que foi contratada para a função de Tratadora de Animais e que não recebeu treinamentos de segurança do trabalho e nem fornecimento de EPIs. Noticia que, em 2/2/2024, ao realizar a limpeza da ala dos macacos, foi atacada por vários macacos-pregos e sofreu múltiplas lesões nas mãos e na coxa. Aduz que o local não possui "área de cambiamento - ou seja, um espaço de confinamento destinado a procedimentos veterinários, nutricionais ou monitoramento diário, onde os animais pudessem ser isolados para possibilitar a limpeza". Registra que a primeira reclamada não foi diligente no dever de cautela, além da necessária fiscalização. Refere que a atividade envolve o manejo de animais reveste-se de risco acentuado e, por isso, a expõe à probabilidade da ocorrência de vários possíveis sinistros, como no caso concreto dos autos. Assegura que, ainda que se tratasse de trabalhadora autônoma, também é detentora da incidência dos princípios fundamentais da dignidade humana e do valor social do trabalho (art. 1º, incs. III e IV, da CRFB/1988). Nesse passo, aduz que não se pode considerar o ocorrido como mera infração administrativa de menor gravidade, dado o total descaso com as medidas preventivas de Segurança e Saúde do Trabalho no âmbito do Zoológico. Ressalta que estão presentes os requisitos dano, culpa e nexo de causalidade, de modo que pede a condenação patronal em reparação de dano moral. Há de se relevar, de início, que o fato de o acidente envolver trabalhador autônomo, ainda que por diária, não tem o condão de afastar a competência da Justiça do Trabalho para apreciar a pretensão da vítima. O art. 114, inc. VI, da Constituição Federal disciplina que compete à Justiça do Trabalho "processar e julgar as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho", não se olvidando, do mesmo modo, a dicção da Súmula nº 392/TST. Logo, a esta Justiça Especializada compete averiguar pleito de obrigação de reparar eventual dano, se estiverem presentes os requisitos respectivos, culpa ou dolo, nexo causal entre a conduta (culposa/dolosa) e o resultado danoso. Não fosse isso, como visto no capítulo precedente, restou declarado que a relação mantida entre as partes se deu sob a modalidade empregatícia. Nesse contexto, diga-se que o ordenamento jurídico pátrio consagra, como regra, a responsabilidade subjetiva, a qual se caracteriza com a presença dos elementos dano, nexo de causalidade e culpa ou dolo (arts. 186, 187, 927 do CC e art. 7.º, inc. XXVIII, da Carta Política). Realça-se, contudo, que o Código Civil disciplina hipóteses em que se aplica a responsabilidade objetiva, isto é, em que é prescindível a comprovação da culpa ou dolo do agente pelo dano causado. Trata-se, é cedido, de modalidade excepcional de responsabilidade para que seja aplicada. Assim, não basta a simples menção a sua adoção, sendo necessário serem consignadas as circunstâncias fáticas e os motivos jurídicos que permitiram a adoção dessa forma de responsabilidade, como, por exemplo, o abuso de direito, contido no art. 187 do Código Civil ou a teoria do risco consagrada no art. 927 do mesmo diploma legal. É incontroverso nos autos a materialidade do dano ocorrido, ou seja, durante a jornada laboral, no exercício de sua função de tratadora, foi atacada por macacos-pregos, que lhe morderam mãos e coxa. Portanto, a reclamante foi vítima de acidente de trabalho típico. Não se pode ignorar, na hipótese vertente, que se trata de atividade de risco. Essa condição atrai ao caso a norma do parágrafo único do art. 927 do CCB, moldura que revela desnecessária a comprovação de culpa, haja vista a configuração de responsabilidade objetiva do empregador, capaz, assim, de ensejar direito a reparações. Apesar disso, impende relevar que, em tal contexto, fica excluída a figura em exame, diante da presença de culpa exclusiva da vítima, fato de terceiro, caso fortuito, força maior e cláusula de não indenizar, vale dizer, as denominadas causas excludentes de responsabilidade. Não há nenhum elemento que revele a presença de algumas dessas excludentes. Exsurge, pois, a responsabilidade objetiva da empregadora. Ao lado dessa modalidade, as provas produzidas nos autos evidenciam a responsabilidade subjetiva patronal, na modalidade negligência. O preposto da primeira acionada disse que: as pessoas que prestam serviço da forma com que prestou autora recebem o treinamento no dia em que se apresentam [...] Não sabe dizer qual é a duração do treinamento e se há algum registro da realização dessa atividade ou emissão de certificado. Não sabe informar se há um documento escrito com as ordens de serviço que são passadas aos tratadores para a realização de suas atividades. Não sabe informar se há qualquer registro de documento referente aos treinamentos que são realizados com esses contratados para cobertura. Que não há fornecimento de equipamentos de proteção individual para aqueles que prestam serviços como autônomos e diaristas" (a fls. 1.054). Por outro lado, assim como alertou a sentença, "a empregadora nem sequer atentou aos dispositivos da Instrução Normativa IBAMA Nº07/ 2015: ANEXO IV - VI - possuir serviço permanente de tratadores, devidamente treinados para o desempenho de suas funções; LEGENDA: a) Na coluna 'Número de indivíduos': considerar, além do número discriminado, uma prole enquanto dependente; b) Para a coluna 'Nível de Segurança' (NS): I - O tratador pode entrar estando o animal solto no recinto II - Deve-se prender o animal para o tratador entrar III - Além de prender o animal no cambiamento com trava e cadeado, deverá haver corredor ou câmara de segurança". Nessa quadra, destacam-se os princípios da precaução e o da prevenção. O primeiro dirige-se pela atuação puramente preventiva, ante o não conhecimento dos possíveis riscos que o meio ambiente de trabalho pode sofrer, ao passo que, no segundo, os riscos são previamente conhecidos, buscando-se formas para se prevenir os possíveis danos. Entretanto, percebe-se que a primeira reclamada não agiu com a obrigação de preservar a saúde da prestadora de serviços, nem agiu com a cautela necessária, porquanto inobservadas as pertinentes normas de segurança do trabalho. Segundo bem expressou o Parquet, "A omissão do empregador em fornecer treinamentos e orientações adequadas para o desempenho das funções, que envolviam o risco de contato com animais selvagens, configura a culpa do empregador, que deve ser responsabilizado pelos danos causados à obreira". A circunstância examinada nestes autos acarreta dano moral in re ipsa e, devido a isso, prescinde de comprovação de sua existência. Portanto, configura-se o dano, a culpa da recorrida e a relação de causalidade, de modo que exsurge, igualmente, a responsabilidade civil subjetiva da primeira reclamada. Sobre o quantum a ser fixado, consigna-se que o tabelamento das indenizações por dano extrapatrimonial ou danos morais trabalhistas, nos termos do art. 223-G da CLT, deverá ser observado pelo julgador como critério orientador de fundamentação da decisão judicial, sem que impeça a fixação de condenação em quantia superior, desde que devidamente motivada (Ações Diretas de Inconstitucionalidades nos 6050, 6069 e 6082). Nesse passo e considerado o quadro de dor, a afetação psíquica, a gravidade do evento, o grau de culpa no evento danoso, o caráter pedagógico, a extensão do dano (art. 944/CCB), a proporcionalidade e, ademais, em atenção à jurisprudência firmada no âmbito da egr. Terceira Turma, fixa-se a quantia de R$3.000,00 (três mil reais) à reparação. Dou parcial provimento. 2.3. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA Em recurso, reclamante afirma que restou evidenciada conduta culposa das reclamadas, devendo responder pela reparação do acidente ocorrido. Assinala que, independente da relação existente entre prestador e tomador de serviços - autônoma ou empregatícia - o tomador pode ser responsabilizado em caso de acidente de trabalho, se estiverem presentes os elementos da responsabilidade civil. Postula a responsabilidade subsidiária do segundo acionado (Distrito Federal). De plano, impõe-se sinalar a conhecida regra tantum devolutum quantum apellatum, que constrange o julgador ad quem de empreender exame e, eventualmente, reformar a sentença naquilo que foi objeto do recurso. Divisa-se que a reclamante, conquanto, na inicial, tenha pedido a responsabilidade subsidiária do segundo reclamado (Distrito Federal) pelos haveres que entende devidos, no recurso ordinário devolveu a pretensão somente sob o viés acidentário. Reforçam essa conclusão, por exemplo, as seguintes afirmações articuladas: "As reclamadas negligenciaram seu dever legal e constitucional de assegurar a saúde física de seus trabalhadores e de proporcionar um ambiente de trabalho hígido e seguro (art. 7º, XXII, art. 200, VIII, c/c art. 225 da CF/1988) [...] De conseguinte, cumpre registrar que as reclamadas não foram diligentes no dever de cautela, além da devida fiscalização, evidenciando conduta culposa, devendo responder pela reparação do acidente ocorrido"(a fls. 1.251). Como se nota, nada foi dito em relação aos demais pleitos. Com essa devida ressalva, passa-se ao exame. O caso não se insere como direito trabalhista típico. Possui feição estritamente cível, visto pelo prisma da responsabilidade extracontratual. Na hipótese vertente, é incontornável que o segundo reclamado (Distrito Federal) foi tomador e beneficiário direto do trabalho prestado pela demandante na vigência do contrato de trabalho, sendo certo que a hipótese não é de licitude ou ilicitude da terceirização. Dentro de tal moldura, cumpre sinalar que é do empregador a responsabilidade de reparar o dano, em razão de acidente ocorrido no transcorrer do trabalho, quando o (a) empregado (a) estava a sua disposição. O fato de terceiro não exonera a responsabilidade do ocasionador direto do dano, podendo aquele que ressarcir o dano causado por outrem reaver o que houver pago daquele por quem pagou em ação regressiva, art. 934 do Código Civil. Nessa linha e atentando-se para a regra dos arts. 932, inc. III, e 933 do CC, tanto a prestadora quanto o contratante respondem solidariamente pelos prejuízos que o (a) trabalhador (a) vier a sofrer no exercício de suas atividades. Consoante visto, a dinâmica do acidente descrita nos autos impõe que se reconheça que os demandados contribuíram, direta e indiretamente, por conduta negligente, para o acidente. Nessa perspectiva, seria o caso de aplicar-se a norma do art. 942 do mesmo Código Civil, vale dizer, "se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação". Ou o parágrafo único do mesmo artigo: "São solidariamente responsáveis com os autores os co-autores e as pessoas designadas no art. 932". Sob esse prisma, ficaria configurada a responsabilidade civil solidária das reclamadas. Nada obstante, observando-se exatamente o pleito, responde o ente público, de forma subsidiária, pelos haveres reconhecidos à autora no que pertine ao acidente de trabalho. Provido. CONCLUSÃO Ante o exposto, conheço do recurso ordinário e, no mérito, dou-lhe parcial provimento para: i) declarar o vínculo de emprego entre a reclamante e a primeira reclamada no período de 22/1/2024 a 16/2/2024, na função de Tratadora de Animal e remuneração de R$2.000,00 (dois mil reais); ii) condenar a primeira reclamada ao pagamento de saldo de salário de 14 dias, salário trezeno proporcional (1/12), férias proporcionais (1/12) + 1/3 e de recolhimento de FGTS acrescido da multa de 40%, bem como de reparação de dano moral no importe de R$3.000,00 (três mil reais); e iii) condenar o segundo acionado (Distrito Federal), de forma subsidiária, no que pertine à pretensão relacionada ao acidente de trabalho. Tudo nos termos da fundamentação. A reclamante deverá apresentar sua CPTS na Secretaria da MM. Vara, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas após o trânsito em julgado desta decisão, para que a primeira reclamada, contado de sua intimação para tal mister, realize as retificações e anotações acima indicadas. Na hipótese de não cumprir sua obrigação de fazer no prazo supra, incidirá multa diária de R$ 100,00 (cem reais), por dia de atraso, limitada a R$ 1.000,00 (mil reais), devendo a Secretaria realizar as anotações na CTPS, com subsequente comunicação do fato ao órgão fiscal responsável para que sejam tomadas as providências cabíveis (art. 39, §3º, da CLT). Para fins do §3º do art. 832 da CLT, as parcelas saldo de salário e salário trezeno proporcional possuem natureza salarial e sobre ela incidem contribuições previdenciárias, arcando cada uma das partes com a sua quota-parte. Considerando-se que a ação foi proposta antes da entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024, 30/8/2024, e os parâmetros estabelecidos na decisão proferida pela SBDI-1 do col. TST, nos autos do E-ED-RR 713-03.2010.5.04.0029, determino que sejam observados os seguintes critérios para atualização do crédito reconhecido: na fase pré-judicial, incide IPCA-E acrescido dos juros de mora previstos no caput do art. 39 da Lei nº 8.177/1991; a partir do ingresso em juízo da ação até 29/8/2024, aplica-se a Taxa Selic, ressalvados os valores eventualmente pagos (vedada a dedução ou compensação de eventuais diferenças pelo critério de cálculo anterior); e a partir de 30/8/2024, será utilizado, no cálculo da atualização monetária, o IPCA (art. 389, parágrafo único, do Código Civil); e os juros de mora corresponderão ao resultado da subtração Selic - IPCA nos termos do art. 406 e §§ do Código Civil. Em razão desta decisão, arbitro custas processuais a cargo da primeira reclamada, no valor de R$400,00 (quatrocentos reais), calculadas sobre o novo valor da condenação de R$20.000,00 (vinte mil reais). É o voto. ACÓRDÃO Por tais fundamentos, ACORDAM os integrantes da Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, conforme certidão de julgamento a fls. retro, em aprovar o relatório, conhecer do recurso ordinário e, no mérito, dar-lhe parcial provimento para: i) declarar o vínculo de emprego entre a reclamante e a primeira reclamada no período de 22/1/2024 a 16/2/2024, na função de Tratadora de Animal e remuneração de R$2.000,00 (dois mil reais); ii) condenar a primeira reclamada ao pagamento de saldo de salário de 14 dias, salário trezeno proporcional (1/12), férias proporcionais (1/12) + 1/3 e de recolhimento de FGTS acrescido da multa de 40%, bem como de reparação de dano moral no importe de R$3.000,00 (três mil reais); e iii)condenar o segundo acionado (Distrito Federal), de forma subsidiária no que pertine à pretensão relacionada ao acidente de trabalho. A reclamante deverá apresentar sua CPTS na Secretaria da MM. Vara, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas após o trânsito em julgado desta decisão, para que a primeira reclamada, contado de sua intimação para tal mister, realize as retificações e anotações acima indicadas. Na hipótese de não cumprir sua obrigação de fazer no prazo supra, incidirá multa diária de R$ 100,00 (cem reais), por dia de atraso, limitada a R$ 1.000,00 (mil reais), devendo a Secretaria realizar as anotações na CTPS, com subsequente comunicação do fato ao órgão fiscal responsável para que sejam tomadas as providências cabíveis (art. 39, §3º, da CLT). Para fins do §3º do art. 832 da CLT, as parcelas saldo de salário e salário trezeno proporcional possuem natureza salarial e sobre ela incidem contribuições previdenciárias, arcando cada uma das partes com a sua quota-parte. Considerando-se que a ação foi proposta antes da entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024, 30/8/2024, e os parâmetros estabelecidos na decisão proferida pela SBDI-1 do col. TST, nos autos do E-ED-RR 713-03.2010.5.04.0029, determino que sejam observados os seguintes critérios para atualização do crédito reconhecido: na fase pré-judicial, incide IPCA-E acrescido dos juros de mora previstos no caput do art. 39 da Lei nº 8.177/1991; a partir do ingresso em juízo da ação até 29/8/2024, aplica-se a Taxa Selic, ressalvados os valores eventualmente pagos (vedada a dedução ou compensação de eventuais diferenças pelo critério de cálculo anterior); e a partir de 30/8/2024, será utilizado, no cálculo da atualização monetária, o IPCA (art. 389, parágrafo único, do Código Civil); e os juros de mora corresponderão ao resultado da subtração Selic - IPCA nos termos do art. 406 e §§ do Código Civil. Em razão desta decisão, arbitrar custas processuais a cargo da primeira reclamada, no valor de R$400,00 (quatrocentos reais), calculadas sobre o novo valor da condenação de R$20.000,00 (vinte mil reais). Tudo nos termos do voto do Desembargador Relator. Julgamento ocorrido à unanimidade de votos, estando presentes os Desembargadores Pedro Luís Vicentin Foltran (Presidente), Maria Regina Machado Guimarães, Brasilino Santos Ramos, Cilene Ferreira Amaro Santos e Augusto César Alves de Souza Barreto. Representando o Ministério Público do Trabalho a Procuradora Regional do Trabalho Valesca de Morais do Monte; opinando em parecer oral pelo prosseguimento do feito ante a ausência de interesse público que justificasse a intervenção do parquet. Secretária-adjunta da Turma, a Sra. Bárbara França Gontijo. Secretaria da 3ª Turma. Brasília /DF, 23 de abril de 2025. (data do julgamento). BRASILINO SANTOS RAMOS Desembargador Relator DECLARAÇÃO DE VOTO BRASILIA/DF, 25 de abril de 2025. CARLOS JOSINO LIMA, Servidor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - INTERATIVA FACILITIES LTDA

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ID: 257793652

Tribunal: TRT10 Órgão: 2ª Turma Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0000694-74.2024.5.10.0017

Data de Disponibilização: 22/04/2025

Polo Ativo:

LARIA REGIA CARVALHO ROSA DIAS LM EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA

Polo Passivo:

LARIA REGIA CARVALHO ROSA DIAS LM EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA

Acórdão

Advogados:

CARLUCIO CAMPOS RODRIGUES COELHO

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

JEFFERSON LIMA ROSENO

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 2ª TURMA Relator: GILBERTO AUGUSTO LEITAO MARTINS 0000694-74.2024.5.10.0017 : LARIA REGIA CARVALHO ROSA DIAS E … PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 2ª TURMA Relator: GILBERTO AUGUSTO LEITAO MARTINS 0000694-74.2024.5.10.0017 : LARIA REGIA CARVALHO ROSA DIAS E OUTROS (1) : LM EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA E OUTROS (1) PROCESSO n.º 0000694-74.2024.5.10.0017 - RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA (1009) RELATOR(A): Desembargador Gilberto Augusto Leitão Martins RECORRENTE: LARIA REGIA CARVALHO ROSA DIAS Advogado: JEFFERSON LIMA ROSENO - DF0027875 RECORRENTE: LM EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA Advogado: CARLUCIO CAMPOS RODRIGUES COELHO - DF0007480 RECORRIDOS: OS MESMOS ORIGEM: 17ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA - DF CLASSE ORIGINÁRIA: AÇÃO TRABALHISTA JUIZ(A): ANGELICA GOMES REZENDE EMENTA: AUSÊNCIA DE JUNTADA DE CARTA DE PREPOSIÇÃO. REVELIA. INOCORRÊNCIA. A ausência de carta de preposição não induz, por si só, revelia do reclamado, na medida em que ele compareceu à audiência e apresentou contestação, restando evidente o ânimo de defesa. PEDIDO CONTRAPOSTO. POSSIBILIDADE. Confessado pela autora o recebimento de adiantamento de salário, possível a análise do pedido contraposto de compensação formulado pela defesa, ante o que dispõe a Súmula 18 do col. TST "A compensação, na Justiça do Trabalho, está restrita a dívidas de natureza trabalhista". HORAS EXTRAS. Injustificadamente não apresentadas os registros de frequência, prevalece a jornada inicial porque não afastada por prova em sentido contrário (Súmula 338 do TST). Logo, devido o pagamento de horas extras. DIVISOR. "Para os empregados a que alude o art. 58, caput, da CLT, quando sujeitos a 40 horas semanais de trabalho, aplica-se o divisor 200 (duzentos) para o cálculo do valor do salário-hora" (Súmula 431 do col. TST). DIFERENÇAS POR ACÚMULO DE FUNÇÃO. DEVIDAS. A contraprestação pelo acúmulo de função decorre do princípio da proteção do trabalhador. Firmadas as condições de trabalho referentes às atribuições do empregado, o acúmulo de outras funções para além da inicialmente combinadas dá ao empregado o direito à contraprestação compatível com a modificação realizada, nos termos do art. 468 da CLT. ASSÉDIO MORAL. NÃO CONSTATADO. Não tendo a reclamante se desvencilhado do ônus de comprovar o assédio narrado na inicial, não há que se falar em reparação. DISSOLUÇÃO CONTRATUAL APÓS O AFASTAMENTOS DA EMPREGADA POR MOTIVO DE SAÚDE. DISCRIMINAÇÃO. INDENIZAÇÃO. DEVIDA. O sistema jurídico brasileiro assegura a despedida sem justa causa como direito potestativo do empregador. Todavia, essa prerrogativa não é absoluta, encontrando limites, tendo como contrapeso os direitos fundamentais, não só os de conteúdo trabalhista, como também os gerais que alcançam todo e qualquer cidadão, como o direito à intimidade, à imagem, à liberdade de crença, de expressão, de informação e o direito a não ser discriminado. A dispensa de trabalhador enfermo após vários períodos de afastamento por atestado médico pressupõe a ocorrência de demissão discriminatória, na forma da Súmula 443 do col. TST. Não tendo o empregador se desvencilhado do ônus de comprovar a licitude da dispensa, prevalece o viés discriminatório sustentado na inicial. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. NÃO OCORRÊNCIA. Não configurado o uso de ardil com intuito de prejudicar a parte contrária, mas mero exercício do direito de defesa, não há que se falar em litigância de má-fé. Recurso do reclamado conhecido e não provido; recurso da reclamante conhecido e parcialmente provido. I - RELATÓRIO A Exma. Juíza do Trabalho ANGELICA GOMES REZENDE, por meio da sentença às fls. 167/185 do PDF, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais. A reclamada recorre às fls. 191/197, buscando afastar a condenação em horas extras. A reclamante também apresenta recurso ordinário (fls. 211/232). Pede o reconhecimento da revelia do réu, sua condenação em honorários advocatícios, aplicação do divisor 200 ao cômputo das horas extras, indenização por dispensa discriminatória, adicional por acúmulo de função e indenização por assédio moral. Insurge-se ainda contra o deferimento do pedido contraposto formulado pela defesa. Contrarrazões ofertadas pela reclamante às fls. 236/237 e pelo reclamado (fls. 238/249). Desnecessária a prévia manifestação do Ministério Público do Trabalho, nos termos do artigo 102 do Regimento Interno deste Tribunal. É o relatório. II - VOTO 1. ADMISSIBILIDADE Preenchidos os pressupostos processuais objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço dos recursos. 2. MÉRITO REVELIA (RECURSO DA RECLAMANTE) A autora pede a declaração da revelia da reclamada, em virtude da ausência de juntada de carta de preposição no prazo determinado pelo juízo. Entretanto, não há que se falar em revelia porque a reclamado compareceu à audiência (fl. 156) e apresentou contestação aos pedidos iniciais, restando evidente o ânimo de defesa. Nesse sentido, o entendimento do col. TST: A) AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. CERCEAMENTO DE DEFESA . AUSÊNCIA DE JUNTADA DE CARTA DE PREPOSIÇÃO. APLICAÇÃO DA PENA DE REVELIA E CONFISSÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. VIOLAÇÃO DOS ARTS . 844 DA CLT E DO ART. 5º, LV, DA CF. CONHECIMENTO E PROVIMENTO. I. Os fundamentos da decisão agravada foram desconstituídos pelas razões do agravo interno interposto pela Reclamada, ficando demonstrada possível ofensa ao artigo 844 da CLT, decorrente de sua má-aplicação, e a violação do art. 5º, LV, da CF. II. Agravo de que se conhece e a que se dá provimento para, reformando a decisão agravada, passar à análise do agravo de instrumento em recurso de revista . B) AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. CERCEAMENTO DE DEFESA . AUSÊNCIA DE JUNTADA DE CARTA DE PREPOSIÇÃO. APLICAÇÃO DA PENA DE REVELIA E CONFISSÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 844 DA CLT E DO ART. 5º, LV, DA CF. TRANSCENDÊNCA POLÍTICA RECONHECIDA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO. I. Demonstrado o desacerto do despacho de admissibilidade a quo, bem como a possível ofensa aos arts. 844 da CLT e 5º, LV, da CF, deve ser provido o agravo de instrumento, a fim de destrancar o recurso de revista. II. Agravo de instrumento de que se conhece e a que se dá provimento, para determinar o processamento do recurso de revista, observando-se o disposto no ATO SEGJUD.GP Nº 202/2019 do TST. C) RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13 .467/2017. 1. AUSÊNCIA DE JUNTADA DE CARTA DE PREPOSIÇÃO. APLICAÇÃO DA PENA DE REVELIA E CONFISSÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 844 DA CLT E DO ART. 5º, LV, DA CF. TRANSCENDÊNCA POLÍTICA RECONHECIDA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO. I. O Eg. Tribunal Regional aplicou à Reclamada a pena de revelia, em razão da ausência da apresentação de carta de preposição e do descumprimento do prazo assinalado para tal. II. Verifica-se que não há falar em irregularidade de representação, na medida em que inexiste previsão legal que imponha a apresentação obrigatória da carta de preposição, razão pela qual a ausência do referido documento não acarreta, por si só, a aplicação dos efeitos da revelia, de que trata o art. 844 da CLT. Precedentes. Demonstrada a transcendência política da causa, bem como a ofensa ao art. 844 da CLT, decorrente de sua má-aplicação, e a violação do art. 5º, LV, da CF. III. Transcendência política reconhecida. Recurso de Revista de que se conhece e a que se dá provimento. (TST - RR: 0000262-97 .2015.5.21.0006, Relator.: Alexandre Luiz Ramos, Data de Julgamento: 09/04/2024, 4ª Turma, Data de Publicação: 12/04/2024) Nego provimento. IMPOSSIBILIDADE DE FORMULAÇÃO DE PEDIDO CONTRAPOSTO (RECURSO DA RECLAMANTE) Aduz a reclamante a inviabilidade do pedido contraposto formulado na defesa, referente à compensação entre créditos trabalhistas e dívida cível contraída com o empregador. Sem razão. A própria inicial informa que: "Reclamante teve um adiantamento salarial, no valor de 8.000,00 (oito mil reais), em outubro de 2023, ficando acertado o desconto mensal de R$500,00 (quinhentos reais) direto do salário da obreira, a partir de novembro de 2023. Com isso, a Reclamada fez os descontos de adiantamento no valor acertado nos meses de novembro.2023, dezembro.2023, janeiro.2024 e fevereiro.2024, totalizando o montante de R$2.000,00 (dois mil reais)" (fl. 4, grifos nossos) Logo, devida a compensação vindicada na defesa, ante o que dispõe a Súmula 18 do TST "A compensação, na Justiça do Trabalho, está restrita a dívidas de natureza trabalhista". Por considerar bem analisado o pedido exordial, bem como por não trazer a recorrente fundamentos capazes de desconstituir as conclusões a que chegou o Órgão julgador de primeiro grau, mantenho a sentença também por seus próprios fundamentos. Nego provimento. HORAS EXTRAS (RECURSO DO RECLAMADO) A demandada requer o afastamento da condenação em horas extras, sob o argumento de que a autora desempenhava cargo de gestão, na forma do art. 62, II, da CLT. Sem razão. A própria defesa negou o exercício de cargo de gestão pela autora (fl. 110), tendo a preposta feito o mesmo em audiência: "...a reclamante não era lider e não exercia cargo de confiança, tampouco era chefe de alguém; a reclamante não poderia admitir ou demitir empregados; a reclamante não tinha autonomia para negociar taxas da locação com os clientes" (fl. 157). Ademais, extrai-se da conversa do whatsaap à fl. 83 que o empregador exigiu que a autora avisasse por meio do mencionado aplicativo os horários de entrada e saída do trabalho. Conclui-se que o empregador controlava a jornada da empregada e apesar o juízo ter lhe concedido prazo apresentar os avisos da autora no whatsaap (fl. 159), o réu não o fez, atraindo a presunção de veracidade da jornada inicial (Súmula 338 do col. TST), parcialmente afastada pelo depoimento da reclamante, conforme pontuado na sentença. No mais, entendo que a matéria foi bem analisada e decida com acerto na instância de origem. Razão pela qual, mantenho a sentença também pelos seus próprios fundamentos: "A reclamante afirma que, contratada para a função de supervisora com a percepção de remuneração fixa de R$ 2.700,00, após 03 meses de trabalho passou a perceber o valor de R$ 3.000,00, sem valor a título de gratificação. Dessa maneira, apontando que ocupava cargo de gestão, nos termos do art. 62, II, parágrafo único, da CLT, requer o pagamento do valor de R$1.200,00 a título de gratificação da função de supervisora (40% da remuneração), por todo o pacto contratual. Alternativamente, caso não se entenda que a reclamante ocupava cargo de gestão, postula o pagamento de horas extras e intervalo intrajornada tendo em vista o cumprimento de jornada das 09h às 21h, sem intervalo, de segunda a sexta-feira, além dos reflexos nas demais parcelas. A parte reclamada argumenta que a função de gerente na empresa era exercida pelo Sr. Leandro, sendo este auxiliado na parte financeira e administrativa por sua esposa, Mariana, cabendo à reclamante apenas auxiliá-los, pelo que não há falar que ocupava a função de supervisora. No que compete à jornada de trabalho, dispõe que a reclamada fechava as portas às 18h, sendo todos os funcionários dispensados na hora citada, afirmando que a autora se ativava das 09h às 18h, com o gozo de 01 hora de intervalo. Analisa-se. Veja-se que, não obstante o depoimento da testemunha acima reproduzido ateste que a reclamante possuía grau de fidúcia diferenciado em relação aos demais empregados, considerando que as decisões finais eram emanadas pelo proprietário Leandro, inexistem fundamentos nos autos que permitam alcançar a conclusão de que a reclamante estivesse submetida a regra prevista no art. 62, II, da CLT. Registro que, ainda o contrário fosse, o fato de um empregado se enquadrar na regra do artigo citado não o faz automaticamente detentor do direito à gratificação de 40%. Pela redação do artigo 62, parágrafo único, da CLT, haverá a incidência das regras do capítulo pertinente à duração do trabalho caso o empregado que ocupe cargo de confiança receba salário, assim como gratificação de função se houver, inferior a 40% do cargo efetivo. Ou seja, não há obrigatoriedade de que haja uma parcela específica de gratificação de 40% no contracheque do ocupante de cargo de confiança, tanto que o parágrafo único da CLT descreve 'se houver' ao se referir à gratificação de função. O sentido da norma (artigo 62, parágrafo único, da CLT) é de que o salário do empregado que ocupe cargo de confiança, tendo ou não gratificação de função, deve ser superior a 40% do salário do cargo dos subordinados. Logo, sendo o fato negado pela ré e tendo a prova testemunhal, como dito, deixado claro que a reclamante não era a álter ego do empregador, julgo improcedente o pedido de pagamento de gratificação pela função de supervisora no percentual de 40% da remuneração. Por outro lado, sendo afirmado pela própria reclamante no depoimento pessoal que '(...) trabalhava das 09h às 21h30min, de segunda a sextafeira, com 15/20 minutos de intervalo; não havia registro de ponto, mas enviava mensagem de 'bom dia' e 'boa noite' no WhatsApp; (...)' (ID fcd86f0), considerando que tinha jornada a cumprir e a fiscalização se dava por meio de conversas de WhatsApp, infere-se que a autora estava sujeita a controle de jornada. Assim sendo, exposto pela testemunha, MAYSE CASSIA LUZ CUNHA, que 'a reclamante trabalhava das 09h às 20h30min, de segunda a sexta-feira e além, pois muitas vezes a depoente saía e a reclamante permanecia; (...)' (ID fcd86f0), tendo em vista que a controvérsia instalada refere-se ao término da jornada, competia à parte reclamada a produção de provas em sentido contrário. Em vista disso, não tendo juntado aos autos as conversas de WhatsApp através das quais se demonstraria o horário de trabalho da reclamante, fixo a jornada de trabalho da autora de segunda a sexta-feira das 09:00h às 21:00h, com 20, consoante por ela declarado minutos de intervalo intrajornada em depoimento pessoal. Ante o exposto, defiro o pagamento das horas extras excedentes à oitava hora diária e quadragésima quarta hora semanal, o que for mais favorável à reclamante, conforme jornada acima fixada, durante todo o período contratual, com adicional de 50%. Devido à habitualidade, defiro os reflexos em aviso prévio indenizado, férias com terço constitucional, gratificação natalina, RSR e FGTS + 40%. Considerando que a jornada de trabalho era superior a 06 horas diárias de segunda a sexta-feira, a reclamante fazia jus à concessão de intervalo intrajornada de 01 hora nos 05 dias trabalhados na semana. Portanto, diante da concessão de apenas de 20 minutos de intervalo para repouso e alimentação, defiro à reclamante o pagamento de 40 minutos diários de intervalo intrajornada, por todo o período contratual, com adicional de 50%, sem reflexos, haja vista a feição indenizatória da parcela. Compete ressaltar que, ao contrário do que tenta induzir a parte reclamada, na hipótese dos autos não há falar que a jornada extraordinária realizada ao longo da semana fazia-se compensada com os sábados não trabalhados, vez que, ainda assim, a jornada da autora ultrapassava a quadragésima quarta hora semanal. Para elaboração dos cálculos deverá ser observada a evolução salarial constante nos contracheques e o divisor 220. Excluam-se os períodos de dias não trabalhados, desde que já estejam devidamente comprovados nos autos." (fls. 173/176) Nego provimento. DIVISOR (RECURSO DA RECLAMANTE) A demandante requer a adoção do divisor 200, sob o argumento de que o empregador confessou que a jornada semanal era 40h. Com razão. O réu confessou na contestação que inobstante ter admitido a autora para trabalhar 44 semanais, exigiu somente a prestação de 40h (fl. 112). Logo, tal condição mais benéfica aderiu ao contrato de trabalho da reclamante, atraindo a adoção do divisor 200, nos termos da Súmula 431 do col. TST "Para os empregados a que alude o art. 58, caput, da CLT, quando sujeitos a 40 horas semanais de trabalho, aplica-se o divisor 200 (duzentos) para o cálculo do valor do salário-hora". Assim, dou provimento ao recurso da reclamante para determinar a apuração das horas extras com base no divisor 200. ACÚMULO DE FUNÇÃO (RECURSO DA RECLAMANTE) A reclamante informou na inicial que além das atribuições do cargo de Supervisora, assumiu as atividades do financeiro, corretagem e serviços gerais do reclamado. Assim, pediu o pagamento de diferenças salariais de 40% e reflexos, por acúmulo de função (fl. 21). A d. magistrada de primeira instância indeferiu o pedido, sob os seguintes fundamentos: "A reclamante assevera que foi contratada pela parte reclamada na data de 15/05/2023, para o exercício da função de supervisora, percebendo salário de R$ 3.000,00, com vigência do contrato de trabalho até o dia 28/02/2024. Por assumir o financeiro da reclamada na data de 06/06/2023, aduz que solicitou aumento de salário em 01/08/2023, o que lhe fora negado, embora a comunicação do supervisor hierárquico de que, além da realização dos demais serviços que já eram de sua responsabilidade, assumiria a função de maneira definida. Requer, como consequência, a condenação da parte reclamada ao pagamento de 40% sobre o salário percebido em razão do acúmulo de funções, do período de 15/05/2023 a 28/02/2024, e reflexos nas demais parcelas. (...) A parte reclamada argumenta que, por se tratar de empresa de pequeno porte, a atividade por ela desempenhada não demanda a contratação de muitos funcionários e o exercício de funções complexas ou incompatíveis entre si, esclarecendo que a autora, por ter certa ascendência sobre os demais empregados, já percebia salário superior, aduzindo que sempre ajudou a reclamada com os serviços financeiros, não existindo profissional contratado para tanto. (...) Em depoimento pessoal, a reclamante afirmou que: 'na época havia quatro funcionários na reclamada; (...); foi contratada para ser supervisora, para fazer e delegar atividades e um mês depois foi acrescentado o serviço do financeiro; a depoente passou a fazer o serviço do financeiro sozinha (fazendo os lançamentos, extratos do que havia a ser pago), sendo que a Mariana e o Leandro apenas liberavam a senha para fazer o pagamento; a Karoline e a Mayse não a ajudavam no financeiro e não tinham acesso ao sistema ou parte do setor financeiro; o senhores Leandro e Mariana eram os sócios da reclamada, sendo que Mariana autorizava os pagamentos de dentro de casa e o Leandro fazia venda dos imóveis e a depoente fazia a locação; a depoente tinha poder para admitir e demitir empregados, aplicar penalidades, definir férias; a Mayse, Karol e Priscila eram subordinadas à depoente, sendo que qualquer das três que precisasse faltar ao trabalho precisaria se reportar à depoente; (...); acima da depoente havia apenas o dono da empresa, Sr. Leandro; geralmente se reunia com Leandro e Mariane para decidirem as taxas de locação, mas o que a depoente definisse com o cliente já era válido; a depoente precisaria apenas informar para o Leandro caso fosse dispensar algum empregado, mas nunca precisou fazer isso; a depoente tinha 'carta branca' para essas decisões sobre empregados; lembra da situação em que não houve vistoria em uns aparelhos de ar condicionado, sendo que na ocasião o Leandro pediu para a depoente encaminhar o estagiário para fazer a vistoria; o estagiário fez a vistoria e disse que estava tudo certo, mas quando o cliente se mudou houve uma queda de energia e queimou os eletros.' (ID fcd86f0). Seguem os dizeres da preposta da parte reclamada: "(...); a depoente é auxiliar administrativo; a reclamante era analista administrativo; as atribuições da reclamante eram de serviços administrativos, elaborar contratos, entrar em contato com interessados na locação, conversava com proprietários sobre as propostas e rotinas administrativas; a reclamante não era responsável pela parte financeira, sendo realizada por uma funcionária, que trabalhava externamente; não se lembra do nome da referida funcionária; na verdade essa não era uma funcionária da reclamada e sim uma prestadora de serviço; atualmente essa pessoa não faz o financeiro da empresa e sim a Mariana, esposa do Leandro; a parte de corretagem era feita pelo Leandro; a entrega de chave era feita para a recepcionista; a recepcionista da empresa (na época era a Karoline) era quem apresentava os flats para os interessados; o serviço geral de limpeza nos flats era disponibilizado pelo hotel; a reclamada administrava aproximadamente 70 flats dentro do hotel; a reclamada também tinha uma média de 5 imóveis que eram administrados fora do hotel; há variação no valor da locação dos flats, a depender se o imóvel é reformado e do proprietário; a média da locação (aluguel, condomínio e IPTU) no flat é de R$ 5.000,00; a rotatividade na locação depende do período do ano, porque a maioria dos clientes possuem contratos anuais; a reclamante não era lider e não exercia cargo de confiança, tampouco era chefe de alguém; a reclamante não poderia admitir ou demitir empregados; a reclamante não tinha autonomia para negociar taxas da locação com os clientes; a reclamada tinha 4 empregados; os empregados eram subordinados à Leandro e Mariana; (...)'. (ID fcd86f0). Por sua vez, a testemunha, MAYSE CASSIA LUZ CUNHA, dispôs que: 'trabalhou na reclamada da última semana de novembro de 2023 a final de fevereiro de 2024, tendo sido contratada para ser concierge, para apenas prospectar clientes, porém passou a trabalhar diariamente no escritório para fazer documentos (multas contratuais, contratos de compra e venda e locação), vistorias, apresentar flats para os possíveis clientes, limpava e organizava os flats, trocava roupa de cama dos flats e as recolhia para a lavanderia e fazia a limpeza geral do flat; a depoente não tinha CTPS assinada, embora tivesse havido promessa; o Sr. Leandro foi quem passou essas atividades para a depoente fazer; a depoente tinha que cumprir horário de trabalho das 09h às 19h, embora saísse por volta das 20h /20h30min; a reclamante foi apresentada pelo Leandro como supervisora da imobiliária; no dia a dia via a reclamante fazendo de tudo, emitir boletos, fazia contratos, vistoria, controle de pagamentos, cuidava do financeiro etc; quando a depoente começou na empresa, a reclamante cuidava do financeiro e estava treinando a Priscila para assumir essa função; a Priscila assumiu de fato o financeiro apenas quando a reclamante se afastou por atestado médico; (...); na época trabalhavam quatro pessoas e elas se reportavam para a reclamante e para o Leandro, caso precisassem se ausentar do serviço; a reclamante fazia limpeza geral dos flats; o hotel tem as camareiras, mas elas organizam os flats que são do hotel e não dos que são dos proprietários clientes da reclamada; a reclamante fazia uma média de 3 a 4 limpezas de flat por semana; a reclamada tinha uma faxineira que fazia limpeza pós obra nos flats, vendo ela ir uma ou duas vezes no período em que a depoente trabalhou na ré; a reclamada administrava uma média de 100 imóveis no hotel; o valor da locação médio é entre R$ 5.000,00 e R$ 20.000,00, dependendo do tamanho e reformas do local; a reclamante tinha um grau de confiança a mais, tanto que foi apresentda como supervisora e delegava a agenda e as atividades para os demais trabalhadores, além de dar treinamentos; eram subordinados à reclamante a depoente, a Karol e a Priscila; houve um episódio em meados de dezembro de 2023 em que a reclamante apresentou tremores, inchaço e ficou nervosa, não conseguindo trabalhar mais; no dia houve um período conturbado de trabalho e o Leandro cobrava a reclamante por telefone e falava de forma agressiva com ela, chegando a acusar de desvio de valores; sabe que Leandro estava agressivo porque ele enviou mensagens no grupo de WhatsApp de trabalho; o Leandro estava falando para a reclamante apresentar os comprovantes de pagamento do seguro incêndio, porque os valores que tinham disponíveis não estavam batendo e dizia que isso era muito estranho; participavam do grupo de WhatsApp todos os funcionários (reclamante, depoente, Karol, Priscila), Leandro e o corretor autônomo JD (João Daniel); essa foi a única manifestação de problema de saúde da reclamante que a depoente presenciou; a reclamante se afastou alguns dias, voltou a trabalhar e depois se afastou novamente; o Leandro comentou que a reclamante estava com problemas de ordem psicológico, por conta da sobrecarga de trabalho; a depoente ainda trabalhava na reclamada quando a reclamante foi dispensada; não sabe o motivo da dispensa da reclamante; quem assumiu as funções da reclamante foi a Priscila; que a depoente era a reclamante quem fazia o financeiro e depois passou a ter a ajuda da Priscila; a depoente foi contratada pelo Leandro; apenas a reclamante foi dispensada no período em que a depoente trabalhava na reclamada; lembra que o JD também foi dispensado dos serviços da reclamada em dezembro de 2023, logo após o episódio em que a reclamante passou mal, quando ele não fechou uma compra e então se desentendeu com o Leandro; não tinham o hábito de almoçar na Vila Planalto, sendo que a depoente só foi uma vez e lembra de ter visto a reclamante indo apenas uma vez; a depoente ainda tem as mensagens do grupo de WhatsApp da reclamada.' (ID fcd86f0). Consoante as asseverações da testemunha, MAYSE CASSIA LUZ CUNHA, é certo que a reclamante respondia sozinha pelas atribuições do setor financeiro até a chegada da empregada Priscila, a qual, recebendo treinamento por parte da autora, passou a auxiliá-la, com o fito de assumir o setor. No entanto, tendo em vista que a testemunha referenciada não trabalhou desde a contratação da reclamante, iniciando os serviços na empresa somente no final do mês de novembro de 2023, os seus dizeres não são suficientes para a comprovação de que a execução de atividades do setor financeiro não se incluíam nas atividades para as quais a reclamante fora, desde o início, contratada. Por conseguinte, não tendo a reclamante se desincumbido do ônus probatório que ficou a cargo de sua responsabilidade de demonstrar que as atividades competentes ao setor financeiro foram acrescidas ao contrato somente em momento posterior à admissão e, consequentemente, não sendo demonstrado alteração qualitativa e quantitativa das atividades realizadas acarretando o desequilíbrio econômico do contrato e o enriquecimento sem causa da parte reclamada, julgo improcedente o pedido de acúmulo de funções e reflexos." (fls. 169/173) Inconformada, a reclamante insiste nas diferenças por acúmulo de função. Pois bem. A contraprestação pelo acúmulo de função decorre do princípio da proteção do trabalhador. Firmadas as condições de trabalho referentes às atribuições do empregado, o acúmulo de outras funções para além das inicialmente combinadas dá ao obreiro o direito à contraprestação compatível com a modificação realizada, nos termos do art. 468 da CLT. Isso, inclusive para evitar o enriquecimento sem causa do empregador. O que não se admite, conforme art. 884 do CC/02. Além disso, o pagamento do acúmulo tem respaldo na aplicação analógica do art. 13 da legislação dos radialistas (Lei nº 6.615/78). Feitas tais considerações, observo que a narrativa inicial é no sentido de que a demandante foi admitida como Supervisora em 15/05/23 (fl. 7) e, a partir de 06/06/23, passou a ser responsável também pelo setor financeiro do réu, corretagem e serviços gerais (fl. 17). Na contestação o demandado negou o exercício da função de supervisora pela reclamante (fl. 110) assim como o acúmulo funcional (fl. 113). Entretanto, na conversa do whatsaap de fl. 70, não especificamente impugnada na contestação, o sócio da reclamada Leandro indica a autora como Supervisora da empresa a um cliente e, no mesmo sentido, a única testemunha ouvida narrou que "a reclamante foi apresentada pelo Leandro como supervisora da imobiliária" (fl. 158). Nesse cenário, incontroversa a informação inicial, no sentido de que a empregada foi admitida como Supervisora. E apesar de a única testemunha ouvida ter atestado que a reclamante trabalhou na área financeira, informando que "...no dia a dia via a reclamante fazendo de tudo, emitir boletos, fazia contratos, vistoria, controle de pagamentos, cuidava do financeiro etc..." (fl. 158), não vislumbro o acúmulo funcional sob tal aspecto, por não constatar incompatibilidade com a função de Supervisora, até porque as respectivas atribuições sequer foram delimitadas na inicial. Contudo, a testemunha informou que a reclamante também fazia de 3 a 4 limpezas por semana nos flats do réu (fl. 158), atividade que não se revela compatível com a função de supervisora, sendo devida a diferença por acúmulo funcional, a qual arbitro na ordem 10%. Logo, dou parcial provimento ao recurso da reclamante para deferir-lhe, durante todo o contrato de trabalho, o pagamento de diferenças salariais de 10% com reflexos em aviso prévio indenizado, férias + 1/3, 13º salário, FGTS + 40%. ASSÉDIO MORAL (RECURSO DA RECLAMANTE) Insiste a demandante na ocorrência de assédio moral, em virtude da sobrecarga no trabalho. Diz ainda que, nos dias 09 e 10/11/2023, foi obrigada a trabalhar isolada numa sala sem contato com os demais colegas de trabalho e que o empregador insinuou que a demandante teria furtado dinheiro da empresa. Pois bem. Considero que o acúmulo funcional constatado no tópico precedente não é suficiente para gerar danos morais, sendo que a respectiva reparação material já foi deferida. Apesar de constar dos autos relatório médico, informando problemas psíquicos da empregada em virtude da de problemas no trabalho, o referido documento foi realizado após a dispensa da autora e com base apenas nas suas alegações. Ademais, o referido documento evidencia que a reclamante possui histórico de fibromialgia anterior à admissão na ré, sendo que na conversa do whatsaap à fl. 72 a reclamante diz ao empregador que já sofreu problema de stress há alguns anos. Tudo a indicar a existência problemas de saúde anteriores à admissão na reclamada. Por sua vez, o trabalho mediante isolamento não foi comprovado por qualquer elemento dos autos. Quanto à acusação da prática de furto pela empregada, a própria recorrente admite que houve mera "insinuação" do empregador nesse sentido. O que se revela subjetivo. Note-se que apesar de a única testemunha ouvida ter informado que o empregador acusou a autora de ter desviado valores, a testemunha explicou, em seguida, que o sócio da ré pediu os comprovantes do seguro de incêndio porque os valores não "estavam batendo" (fl. 158). Assim, considero que a exigência de apresentação de documentos pelo empregador não configura abuso, sendo que certo que, por trabalhar no setor financeiro da empresa, a reclamante tinha obrigação de esclarecer as movimentações financeiras. Nesse cenário, considero que a demandante não se desvencilhou do seu ônus processual de comprovar o assédio moral no trabalho. Assim, mantenho a decisão recorrida, inclusive pelos seus próprios fundamentos. Nego provimento. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA (RECURSO DA RECLAMANTE) A d. magistrada de primeira instância indeferiu o pedido indenização por dispensa discriminatória, sob os seguintes fundamentos: "A reclamante aduz que, na data de 31/12/2023, foi internada em razão de grave crise que sofreu pelo acúmulo de serviço e o ambiente de trabalho estressante a que estava imersa, recebendo alta em 01/01/2024, sendo diagnosticada com fibromialgia (CID M79.7). Ademais, encaminhada para o atendimento com profissional de psicologia, atesta que, consoante relatório anexo, o psicólogo inferiu que o quadro clínico da autora possuía nexo causal com o ambiente de trabalho, sendo afastada do labor por mais de 15 dias, usufruindo de benefício previdenciário que se encerraria na data de 28/02/2024, data em que foi comunicada da dispensa. Assim, sob a afirmativa de que sua dispensa fora discriminatória e que, consequentemente, o ato demissional é nulo de pleno direito, requer a condenação da parte reclamada ao pagamento em dobro de sua remuneração mensal, a partir de janeiro de 2024 até o trânsito em julgado da presente ação, requerendo, ainda, o pagamento de indenização a título de dano moral (art. 4º, caput, Lei 9.029/95). A parte reclamada defende, por seu turno, que a fibromialgia não se trata de doença grave estigmatizante ou que possa causar preconceitos, além de apontar que a doença não possui cunho ocupacional, pelo que impugna o pedido da autora. Analisa-se. Com efeito, o TST, através de sua Súmula nº 443, dispôs que se presume discriminatória a dispensa do empregado que suscite estigma ou preconceito. Porém, o fato de a doença não ser classificada como grave, que suscite estigma ou preconceito, não impede a constatação da ocorrência de dispensa discriminatória quando esta estiver evidenciada pelo conjunto probatório dos autos. Passo, portanto, ao exame da prova oral produzida. A preposta da parte reclamada afirmou que '(...); não presenciou a reclamante manifestando problema de saúde no decorrer do contrato de trabalho.' (ID fcd86f0). Quanto aos dizeres da testemunha, MAYSE CASSIA LUZ CUNHA, segundo depoimento já reproduzido em tópico precedente, embora a depoente tenha confirmado que presenciou os afastamentos da autora ao trabalho ocasionados por problemas de saúde, afirmou não saber o motivo pelo qual a reclamante foi dispensada. Dessa maneira, apesar de suas asseverações sobre a temática, não há prova contundente nos autos de que o desligamento da autora tenha se dado por razão de cunho discriminatório. No mesmo sentido, em que pese os atestados/relatórios médicos (IDs 03c3a43, fb5fa3a) e a percepção de benefício previdenciário (ID add0bdf) comprovem o quadro clínico da autora, não fazem prova de que a dispensa tenha sido por ele justificada, inclusive porque, o fato de a reclamante ser portadora de doença, sobretudo que não cause estigma ou preconceito, não presume que a dispensa tenha ocorrido por conta dela. Assim sendo, inferindo-se pela insuficiência de provas aptas a comprovação de que a dispensa da reclamante é proveniente do quadro de fibromialgia ou enfermidades psíquicas, a dispensa encontra respaldo no jus variandi do empregador, que lhe confere a liberalidade de encerramento do contrato de trabalho de maneira unilateral. Saliento, inclusive, que, considerando a dispensa da autora no momento em que, encerrado o período para a fruição de benefício previdenciário, não gozava de afastamento ao trabalho por atestado médico, inexistia óbice que impedisse a dispensa regular por parte do empregador. Pelas razões expostas, ausente reconhecimento da dispensa discriminatória, julgo improcedente o pedido de pagamento em dobro dos salários e de pagamento de indenização a título de dano moral proveniente de rompimento da relação de trabalho por ato discriminatório." (fls. 176/177). A autora repete a tese de que foi demitida por discriminação, por causa dos afastamentos médicos. Pois bem. Incontroverso que a reclamante trabalhou para a reclamada, no período de 15/05/23 a 28/02/24. Consta dos autos atestado médico de 1 dia, em 27/12/23, pelo CID M79.1 (mialgia), 30 dias em, 02/01/24, pelo CID M79.7 (fibromialgia) e mais 30 dias, em 30/01/24, também por fibromialgia (fls. 36/38). Conforme informações e conversas do whatsaap registradas na inicial, não especificamente impugnadas na defesa, é incontroverso que a autora, em virtude de problemas de saúde, chegou atrasada no dia 02/08/23 (fl. 11), afastou-se do trabalho nos dias 27 e 31/12/23 (fl. 12) e por 15 dias em fevereiro de 2024 (fl. 13), sendo o último afastamento confirmado pela comunicação do INSS à fl. 46. E no mesmo sentido, o depoimento da testemunha: "houve um episódio em meados de dezembro de 2023 em que a reclamante apresentou tremores, inchaço e ficou nervosa, não conseguindo trabalhar mais... essa foi a única manifestação de problema de saúde da reclamante que a depoente presenciou; a reclamante se afastou alguns dias, voltou a trabalhar e depois se afastou novamente..." (fl. 158). Observo ainda que o réu não impugnou especificamente a conversa do whatsaap registrada na inicial (fl. 16), em que a demandante informa ao empregador, no dia 27/02/24, que seu atestado estava terminando, sendo que a empregada foi dispensada justamente no dia seguinte (28/02/24 - TRTC, fl. 28), inclusive sem cumprimento de aviso prévio. Certo é que a demandante precisou se afastar do trabalho, em virtude dos problemas de saúde, os quais eram de pleno conhecimento da demandada, inclusive conforme conversas do whatsaap (fl. 16 e 72) e informações iniciais não impugnadas na defesa. Nesse cenário, pertencia à demanda o ônus de comprovar que a dispensa se deu sem viés discriminatório. Encargo do qual não conseguiu se desvencilhar. Razão pela qual, prevalece a tese inicial da dispensa discriminatória. Conforme página da internet da Sociedade Brasileira de Reumatologia: "A fibromialgia (FM) é uma condição que se caracteriza por dor muscular generalizada, crônica (dura mais que três meses), mas que não apresenta evidência de inflamação nos locais de dor. Ela é acompanhada de sintomas típicos, como sono não reparador (sono que não restaura a pessoa) e cansaço. Pode haver também distúrbios do humor como ansiedade e depressão, e muitos pacientes queixam-se de alterações da concentração e de memória." Nesse cenário, a despeito dos argumentos da contestação, considero que a enfermidade possui aptidão para causa estigma, principalmente em virtude da necessidade de afastamentos médicos, constatados nos autos. Assim, tenho por configurada a dispensa discriminatória da reclamante, sendo devido o pagamento dobrado da remuneração referente ao período de afastamento, nos termos inciso II do art. 4º da Lei nº 9.029/95. Assim, dou provimento ao recurso da reclamante para deferir-lhe o pagamento dobrado da sua remuneração a partir de 28/02/24 até a publicação deste acórdão. MÁ-FÉ (RECURSO DA RECLAMANTE) Pede a autora a condenação da ré em litigância de má-fe, por ter se intitulado como EIRELI. Ora, a defesa apenas diz que o réu "era" Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (fl. 103) e apresentou documentos correspondentes com seu atual tipo societário (fl. 92/101). Inexistente, portanto, a má-fé. Nada a deferir, portanto. III - CONCLUSÃO Pelo exposto, conheço dos recursos e, no mérito, nego provimento ao do reclamado e dou parcial provimento ao da autora para: a) determinar a apuração das horas extras com base no divisor 200; b) deferir-lhe, durante todo o contrato de trabalho, o pagamento de diferenças salariais de 10% com reflexos em aviso prévio indenizado, férias + 1/3, 13º salário, FGTS + 40%; e c) deferir o pagamento dobrado da sua remuneração a partir de 28/02/24 até a publicação do acórdão. Tudo nos termos da fundamentação. Ante o parcial provimento do recurso da reclamante, arbitro à condenação novo valor de R$80.000,00 e às custas processuais o importe de R$1.600,00. ACÓRDÃO É o meu voto. Por tais fundamentos, ACORDAM os Desembargadores da Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Região, em sessão realizada na data e nos termos da respectiva certidão de julgamento, aprovar o relatório, conhecer dos recursos e, no mérito, negar provimento ao do reclamado e dar parcial provimento ao da reclamante, nos termos do voto do Desembargador Relator. Ementa aprovada. Brasília (DF), 09 de abril de 2025 (data do julgamento) Desembargador Gilberto Augusto Leitão Martins Relator DECLARAÇÃO DE VOTO BRASILIA/DF, 15 de abril de 2025. ELIDA SANTOS CABRAL, Servidor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - LARIA REGIA CARVALHO ROSA DIAS

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Laria Regia Carvalho Rosa Dias e outros x Laria Regia Carvalho Rosa Dias e outros

ID: 257793689

Tribunal: TRT10 Órgão: 2ª Turma Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0000694-74.2024.5.10.0017

Data de Disponibilização: 22/04/2025

Polo Ativo:

LARIA REGIA CARVALHO ROSA DIAS LM EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA

Polo Passivo:

LARIA REGIA CARVALHO ROSA DIAS LM EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA

Acórdão

Advogados:

CARLUCIO CAMPOS RODRIGUES COELHO

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

JEFFERSON LIMA ROSENO

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 2ª TURMA Relator: GILBERTO AUGUSTO LEITAO MARTINS 0000694-74.2024.5.10.0017 : LARIA REGIA CARVALHO ROSA DIAS E … PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 2ª TURMA Relator: GILBERTO AUGUSTO LEITAO MARTINS 0000694-74.2024.5.10.0017 : LARIA REGIA CARVALHO ROSA DIAS E OUTROS (1) : LM EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA E OUTROS (1) PROCESSO n.º 0000694-74.2024.5.10.0017 - RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA (1009) RELATOR(A): Desembargador Gilberto Augusto Leitão Martins RECORRENTE: LARIA REGIA CARVALHO ROSA DIAS Advogado: JEFFERSON LIMA ROSENO - DF0027875 RECORRENTE: LM EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA Advogado: CARLUCIO CAMPOS RODRIGUES COELHO - DF0007480 RECORRIDOS: OS MESMOS ORIGEM: 17ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA - DF CLASSE ORIGINÁRIA: AÇÃO TRABALHISTA JUIZ(A): ANGELICA GOMES REZENDE EMENTA: AUSÊNCIA DE JUNTADA DE CARTA DE PREPOSIÇÃO. REVELIA. INOCORRÊNCIA. A ausência de carta de preposição não induz, por si só, revelia do reclamado, na medida em que ele compareceu à audiência e apresentou contestação, restando evidente o ânimo de defesa. PEDIDO CONTRAPOSTO. POSSIBILIDADE. Confessado pela autora o recebimento de adiantamento de salário, possível a análise do pedido contraposto de compensação formulado pela defesa, ante o que dispõe a Súmula 18 do col. TST "A compensação, na Justiça do Trabalho, está restrita a dívidas de natureza trabalhista". HORAS EXTRAS. Injustificadamente não apresentadas os registros de frequência, prevalece a jornada inicial porque não afastada por prova em sentido contrário (Súmula 338 do TST). Logo, devido o pagamento de horas extras. DIVISOR. "Para os empregados a que alude o art. 58, caput, da CLT, quando sujeitos a 40 horas semanais de trabalho, aplica-se o divisor 200 (duzentos) para o cálculo do valor do salário-hora" (Súmula 431 do col. TST). DIFERENÇAS POR ACÚMULO DE FUNÇÃO. DEVIDAS. A contraprestação pelo acúmulo de função decorre do princípio da proteção do trabalhador. Firmadas as condições de trabalho referentes às atribuições do empregado, o acúmulo de outras funções para além da inicialmente combinadas dá ao empregado o direito à contraprestação compatível com a modificação realizada, nos termos do art. 468 da CLT. ASSÉDIO MORAL. NÃO CONSTATADO. Não tendo a reclamante se desvencilhado do ônus de comprovar o assédio narrado na inicial, não há que se falar em reparação. DISSOLUÇÃO CONTRATUAL APÓS O AFASTAMENTOS DA EMPREGADA POR MOTIVO DE SAÚDE. DISCRIMINAÇÃO. INDENIZAÇÃO. DEVIDA. O sistema jurídico brasileiro assegura a despedida sem justa causa como direito potestativo do empregador. Todavia, essa prerrogativa não é absoluta, encontrando limites, tendo como contrapeso os direitos fundamentais, não só os de conteúdo trabalhista, como também os gerais que alcançam todo e qualquer cidadão, como o direito à intimidade, à imagem, à liberdade de crença, de expressão, de informação e o direito a não ser discriminado. A dispensa de trabalhador enfermo após vários períodos de afastamento por atestado médico pressupõe a ocorrência de demissão discriminatória, na forma da Súmula 443 do col. TST. Não tendo o empregador se desvencilhado do ônus de comprovar a licitude da dispensa, prevalece o viés discriminatório sustentado na inicial. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. NÃO OCORRÊNCIA. Não configurado o uso de ardil com intuito de prejudicar a parte contrária, mas mero exercício do direito de defesa, não há que se falar em litigância de má-fé. Recurso do reclamado conhecido e não provido; recurso da reclamante conhecido e parcialmente provido. I - RELATÓRIO A Exma. Juíza do Trabalho ANGELICA GOMES REZENDE, por meio da sentença às fls. 167/185 do PDF, julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais. A reclamada recorre às fls. 191/197, buscando afastar a condenação em horas extras. A reclamante também apresenta recurso ordinário (fls. 211/232). Pede o reconhecimento da revelia do réu, sua condenação em honorários advocatícios, aplicação do divisor 200 ao cômputo das horas extras, indenização por dispensa discriminatória, adicional por acúmulo de função e indenização por assédio moral. Insurge-se ainda contra o deferimento do pedido contraposto formulado pela defesa. Contrarrazões ofertadas pela reclamante às fls. 236/237 e pelo reclamado (fls. 238/249). Desnecessária a prévia manifestação do Ministério Público do Trabalho, nos termos do artigo 102 do Regimento Interno deste Tribunal. É o relatório. II - VOTO 1. ADMISSIBILIDADE Preenchidos os pressupostos processuais objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço dos recursos. 2. MÉRITO REVELIA (RECURSO DA RECLAMANTE) A autora pede a declaração da revelia da reclamada, em virtude da ausência de juntada de carta de preposição no prazo determinado pelo juízo. Entretanto, não há que se falar em revelia porque a reclamado compareceu à audiência (fl. 156) e apresentou contestação aos pedidos iniciais, restando evidente o ânimo de defesa. Nesse sentido, o entendimento do col. TST: A) AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. CERCEAMENTO DE DEFESA . AUSÊNCIA DE JUNTADA DE CARTA DE PREPOSIÇÃO. APLICAÇÃO DA PENA DE REVELIA E CONFISSÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. VIOLAÇÃO DOS ARTS . 844 DA CLT E DO ART. 5º, LV, DA CF. CONHECIMENTO E PROVIMENTO. I. Os fundamentos da decisão agravada foram desconstituídos pelas razões do agravo interno interposto pela Reclamada, ficando demonstrada possível ofensa ao artigo 844 da CLT, decorrente de sua má-aplicação, e a violação do art. 5º, LV, da CF. II. Agravo de que se conhece e a que se dá provimento para, reformando a decisão agravada, passar à análise do agravo de instrumento em recurso de revista . B) AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. CERCEAMENTO DE DEFESA . AUSÊNCIA DE JUNTADA DE CARTA DE PREPOSIÇÃO. APLICAÇÃO DA PENA DE REVELIA E CONFISSÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 844 DA CLT E DO ART. 5º, LV, DA CF. TRANSCENDÊNCA POLÍTICA RECONHECIDA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO. I. Demonstrado o desacerto do despacho de admissibilidade a quo, bem como a possível ofensa aos arts. 844 da CLT e 5º, LV, da CF, deve ser provido o agravo de instrumento, a fim de destrancar o recurso de revista. II. Agravo de instrumento de que se conhece e a que se dá provimento, para determinar o processamento do recurso de revista, observando-se o disposto no ATO SEGJUD.GP Nº 202/2019 do TST. C) RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13 .467/2017. 1. AUSÊNCIA DE JUNTADA DE CARTA DE PREPOSIÇÃO. APLICAÇÃO DA PENA DE REVELIA E CONFISSÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. VIOLAÇÃO DOS ARTS. 844 DA CLT E DO ART. 5º, LV, DA CF. TRANSCENDÊNCA POLÍTICA RECONHECIDA. CONHECIMENTO E PROVIMENTO. I. O Eg. Tribunal Regional aplicou à Reclamada a pena de revelia, em razão da ausência da apresentação de carta de preposição e do descumprimento do prazo assinalado para tal. II. Verifica-se que não há falar em irregularidade de representação, na medida em que inexiste previsão legal que imponha a apresentação obrigatória da carta de preposição, razão pela qual a ausência do referido documento não acarreta, por si só, a aplicação dos efeitos da revelia, de que trata o art. 844 da CLT. Precedentes. Demonstrada a transcendência política da causa, bem como a ofensa ao art. 844 da CLT, decorrente de sua má-aplicação, e a violação do art. 5º, LV, da CF. III. Transcendência política reconhecida. Recurso de Revista de que se conhece e a que se dá provimento. (TST - RR: 0000262-97 .2015.5.21.0006, Relator.: Alexandre Luiz Ramos, Data de Julgamento: 09/04/2024, 4ª Turma, Data de Publicação: 12/04/2024) Nego provimento. IMPOSSIBILIDADE DE FORMULAÇÃO DE PEDIDO CONTRAPOSTO (RECURSO DA RECLAMANTE) Aduz a reclamante a inviabilidade do pedido contraposto formulado na defesa, referente à compensação entre créditos trabalhistas e dívida cível contraída com o empregador. Sem razão. A própria inicial informa que: "Reclamante teve um adiantamento salarial, no valor de 8.000,00 (oito mil reais), em outubro de 2023, ficando acertado o desconto mensal de R$500,00 (quinhentos reais) direto do salário da obreira, a partir de novembro de 2023. Com isso, a Reclamada fez os descontos de adiantamento no valor acertado nos meses de novembro.2023, dezembro.2023, janeiro.2024 e fevereiro.2024, totalizando o montante de R$2.000,00 (dois mil reais)" (fl. 4, grifos nossos) Logo, devida a compensação vindicada na defesa, ante o que dispõe a Súmula 18 do TST "A compensação, na Justiça do Trabalho, está restrita a dívidas de natureza trabalhista". Por considerar bem analisado o pedido exordial, bem como por não trazer a recorrente fundamentos capazes de desconstituir as conclusões a que chegou o Órgão julgador de primeiro grau, mantenho a sentença também por seus próprios fundamentos. Nego provimento. HORAS EXTRAS (RECURSO DO RECLAMADO) A demandada requer o afastamento da condenação em horas extras, sob o argumento de que a autora desempenhava cargo de gestão, na forma do art. 62, II, da CLT. Sem razão. A própria defesa negou o exercício de cargo de gestão pela autora (fl. 110), tendo a preposta feito o mesmo em audiência: "...a reclamante não era lider e não exercia cargo de confiança, tampouco era chefe de alguém; a reclamante não poderia admitir ou demitir empregados; a reclamante não tinha autonomia para negociar taxas da locação com os clientes" (fl. 157). Ademais, extrai-se da conversa do whatsaap à fl. 83 que o empregador exigiu que a autora avisasse por meio do mencionado aplicativo os horários de entrada e saída do trabalho. Conclui-se que o empregador controlava a jornada da empregada e apesar o juízo ter lhe concedido prazo apresentar os avisos da autora no whatsaap (fl. 159), o réu não o fez, atraindo a presunção de veracidade da jornada inicial (Súmula 338 do col. TST), parcialmente afastada pelo depoimento da reclamante, conforme pontuado na sentença. No mais, entendo que a matéria foi bem analisada e decida com acerto na instância de origem. Razão pela qual, mantenho a sentença também pelos seus próprios fundamentos: "A reclamante afirma que, contratada para a função de supervisora com a percepção de remuneração fixa de R$ 2.700,00, após 03 meses de trabalho passou a perceber o valor de R$ 3.000,00, sem valor a título de gratificação. Dessa maneira, apontando que ocupava cargo de gestão, nos termos do art. 62, II, parágrafo único, da CLT, requer o pagamento do valor de R$1.200,00 a título de gratificação da função de supervisora (40% da remuneração), por todo o pacto contratual. Alternativamente, caso não se entenda que a reclamante ocupava cargo de gestão, postula o pagamento de horas extras e intervalo intrajornada tendo em vista o cumprimento de jornada das 09h às 21h, sem intervalo, de segunda a sexta-feira, além dos reflexos nas demais parcelas. A parte reclamada argumenta que a função de gerente na empresa era exercida pelo Sr. Leandro, sendo este auxiliado na parte financeira e administrativa por sua esposa, Mariana, cabendo à reclamante apenas auxiliá-los, pelo que não há falar que ocupava a função de supervisora. No que compete à jornada de trabalho, dispõe que a reclamada fechava as portas às 18h, sendo todos os funcionários dispensados na hora citada, afirmando que a autora se ativava das 09h às 18h, com o gozo de 01 hora de intervalo. Analisa-se. Veja-se que, não obstante o depoimento da testemunha acima reproduzido ateste que a reclamante possuía grau de fidúcia diferenciado em relação aos demais empregados, considerando que as decisões finais eram emanadas pelo proprietário Leandro, inexistem fundamentos nos autos que permitam alcançar a conclusão de que a reclamante estivesse submetida a regra prevista no art. 62, II, da CLT. Registro que, ainda o contrário fosse, o fato de um empregado se enquadrar na regra do artigo citado não o faz automaticamente detentor do direito à gratificação de 40%. Pela redação do artigo 62, parágrafo único, da CLT, haverá a incidência das regras do capítulo pertinente à duração do trabalho caso o empregado que ocupe cargo de confiança receba salário, assim como gratificação de função se houver, inferior a 40% do cargo efetivo. Ou seja, não há obrigatoriedade de que haja uma parcela específica de gratificação de 40% no contracheque do ocupante de cargo de confiança, tanto que o parágrafo único da CLT descreve 'se houver' ao se referir à gratificação de função. O sentido da norma (artigo 62, parágrafo único, da CLT) é de que o salário do empregado que ocupe cargo de confiança, tendo ou não gratificação de função, deve ser superior a 40% do salário do cargo dos subordinados. Logo, sendo o fato negado pela ré e tendo a prova testemunhal, como dito, deixado claro que a reclamante não era a álter ego do empregador, julgo improcedente o pedido de pagamento de gratificação pela função de supervisora no percentual de 40% da remuneração. Por outro lado, sendo afirmado pela própria reclamante no depoimento pessoal que '(...) trabalhava das 09h às 21h30min, de segunda a sextafeira, com 15/20 minutos de intervalo; não havia registro de ponto, mas enviava mensagem de 'bom dia' e 'boa noite' no WhatsApp; (...)' (ID fcd86f0), considerando que tinha jornada a cumprir e a fiscalização se dava por meio de conversas de WhatsApp, infere-se que a autora estava sujeita a controle de jornada. Assim sendo, exposto pela testemunha, MAYSE CASSIA LUZ CUNHA, que 'a reclamante trabalhava das 09h às 20h30min, de segunda a sexta-feira e além, pois muitas vezes a depoente saía e a reclamante permanecia; (...)' (ID fcd86f0), tendo em vista que a controvérsia instalada refere-se ao término da jornada, competia à parte reclamada a produção de provas em sentido contrário. Em vista disso, não tendo juntado aos autos as conversas de WhatsApp através das quais se demonstraria o horário de trabalho da reclamante, fixo a jornada de trabalho da autora de segunda a sexta-feira das 09:00h às 21:00h, com 20, consoante por ela declarado minutos de intervalo intrajornada em depoimento pessoal. Ante o exposto, defiro o pagamento das horas extras excedentes à oitava hora diária e quadragésima quarta hora semanal, o que for mais favorável à reclamante, conforme jornada acima fixada, durante todo o período contratual, com adicional de 50%. Devido à habitualidade, defiro os reflexos em aviso prévio indenizado, férias com terço constitucional, gratificação natalina, RSR e FGTS + 40%. Considerando que a jornada de trabalho era superior a 06 horas diárias de segunda a sexta-feira, a reclamante fazia jus à concessão de intervalo intrajornada de 01 hora nos 05 dias trabalhados na semana. Portanto, diante da concessão de apenas de 20 minutos de intervalo para repouso e alimentação, defiro à reclamante o pagamento de 40 minutos diários de intervalo intrajornada, por todo o período contratual, com adicional de 50%, sem reflexos, haja vista a feição indenizatória da parcela. Compete ressaltar que, ao contrário do que tenta induzir a parte reclamada, na hipótese dos autos não há falar que a jornada extraordinária realizada ao longo da semana fazia-se compensada com os sábados não trabalhados, vez que, ainda assim, a jornada da autora ultrapassava a quadragésima quarta hora semanal. Para elaboração dos cálculos deverá ser observada a evolução salarial constante nos contracheques e o divisor 220. Excluam-se os períodos de dias não trabalhados, desde que já estejam devidamente comprovados nos autos." (fls. 173/176) Nego provimento. DIVISOR (RECURSO DA RECLAMANTE) A demandante requer a adoção do divisor 200, sob o argumento de que o empregador confessou que a jornada semanal era 40h. Com razão. O réu confessou na contestação que inobstante ter admitido a autora para trabalhar 44 semanais, exigiu somente a prestação de 40h (fl. 112). Logo, tal condição mais benéfica aderiu ao contrato de trabalho da reclamante, atraindo a adoção do divisor 200, nos termos da Súmula 431 do col. TST "Para os empregados a que alude o art. 58, caput, da CLT, quando sujeitos a 40 horas semanais de trabalho, aplica-se o divisor 200 (duzentos) para o cálculo do valor do salário-hora". Assim, dou provimento ao recurso da reclamante para determinar a apuração das horas extras com base no divisor 200. ACÚMULO DE FUNÇÃO (RECURSO DA RECLAMANTE) A reclamante informou na inicial que além das atribuições do cargo de Supervisora, assumiu as atividades do financeiro, corretagem e serviços gerais do reclamado. Assim, pediu o pagamento de diferenças salariais de 40% e reflexos, por acúmulo de função (fl. 21). A d. magistrada de primeira instância indeferiu o pedido, sob os seguintes fundamentos: "A reclamante assevera que foi contratada pela parte reclamada na data de 15/05/2023, para o exercício da função de supervisora, percebendo salário de R$ 3.000,00, com vigência do contrato de trabalho até o dia 28/02/2024. Por assumir o financeiro da reclamada na data de 06/06/2023, aduz que solicitou aumento de salário em 01/08/2023, o que lhe fora negado, embora a comunicação do supervisor hierárquico de que, além da realização dos demais serviços que já eram de sua responsabilidade, assumiria a função de maneira definida. Requer, como consequência, a condenação da parte reclamada ao pagamento de 40% sobre o salário percebido em razão do acúmulo de funções, do período de 15/05/2023 a 28/02/2024, e reflexos nas demais parcelas. (...) A parte reclamada argumenta que, por se tratar de empresa de pequeno porte, a atividade por ela desempenhada não demanda a contratação de muitos funcionários e o exercício de funções complexas ou incompatíveis entre si, esclarecendo que a autora, por ter certa ascendência sobre os demais empregados, já percebia salário superior, aduzindo que sempre ajudou a reclamada com os serviços financeiros, não existindo profissional contratado para tanto. (...) Em depoimento pessoal, a reclamante afirmou que: 'na época havia quatro funcionários na reclamada; (...); foi contratada para ser supervisora, para fazer e delegar atividades e um mês depois foi acrescentado o serviço do financeiro; a depoente passou a fazer o serviço do financeiro sozinha (fazendo os lançamentos, extratos do que havia a ser pago), sendo que a Mariana e o Leandro apenas liberavam a senha para fazer o pagamento; a Karoline e a Mayse não a ajudavam no financeiro e não tinham acesso ao sistema ou parte do setor financeiro; o senhores Leandro e Mariana eram os sócios da reclamada, sendo que Mariana autorizava os pagamentos de dentro de casa e o Leandro fazia venda dos imóveis e a depoente fazia a locação; a depoente tinha poder para admitir e demitir empregados, aplicar penalidades, definir férias; a Mayse, Karol e Priscila eram subordinadas à depoente, sendo que qualquer das três que precisasse faltar ao trabalho precisaria se reportar à depoente; (...); acima da depoente havia apenas o dono da empresa, Sr. Leandro; geralmente se reunia com Leandro e Mariane para decidirem as taxas de locação, mas o que a depoente definisse com o cliente já era válido; a depoente precisaria apenas informar para o Leandro caso fosse dispensar algum empregado, mas nunca precisou fazer isso; a depoente tinha 'carta branca' para essas decisões sobre empregados; lembra da situação em que não houve vistoria em uns aparelhos de ar condicionado, sendo que na ocasião o Leandro pediu para a depoente encaminhar o estagiário para fazer a vistoria; o estagiário fez a vistoria e disse que estava tudo certo, mas quando o cliente se mudou houve uma queda de energia e queimou os eletros.' (ID fcd86f0). Seguem os dizeres da preposta da parte reclamada: "(...); a depoente é auxiliar administrativo; a reclamante era analista administrativo; as atribuições da reclamante eram de serviços administrativos, elaborar contratos, entrar em contato com interessados na locação, conversava com proprietários sobre as propostas e rotinas administrativas; a reclamante não era responsável pela parte financeira, sendo realizada por uma funcionária, que trabalhava externamente; não se lembra do nome da referida funcionária; na verdade essa não era uma funcionária da reclamada e sim uma prestadora de serviço; atualmente essa pessoa não faz o financeiro da empresa e sim a Mariana, esposa do Leandro; a parte de corretagem era feita pelo Leandro; a entrega de chave era feita para a recepcionista; a recepcionista da empresa (na época era a Karoline) era quem apresentava os flats para os interessados; o serviço geral de limpeza nos flats era disponibilizado pelo hotel; a reclamada administrava aproximadamente 70 flats dentro do hotel; a reclamada também tinha uma média de 5 imóveis que eram administrados fora do hotel; há variação no valor da locação dos flats, a depender se o imóvel é reformado e do proprietário; a média da locação (aluguel, condomínio e IPTU) no flat é de R$ 5.000,00; a rotatividade na locação depende do período do ano, porque a maioria dos clientes possuem contratos anuais; a reclamante não era lider e não exercia cargo de confiança, tampouco era chefe de alguém; a reclamante não poderia admitir ou demitir empregados; a reclamante não tinha autonomia para negociar taxas da locação com os clientes; a reclamada tinha 4 empregados; os empregados eram subordinados à Leandro e Mariana; (...)'. (ID fcd86f0). Por sua vez, a testemunha, MAYSE CASSIA LUZ CUNHA, dispôs que: 'trabalhou na reclamada da última semana de novembro de 2023 a final de fevereiro de 2024, tendo sido contratada para ser concierge, para apenas prospectar clientes, porém passou a trabalhar diariamente no escritório para fazer documentos (multas contratuais, contratos de compra e venda e locação), vistorias, apresentar flats para os possíveis clientes, limpava e organizava os flats, trocava roupa de cama dos flats e as recolhia para a lavanderia e fazia a limpeza geral do flat; a depoente não tinha CTPS assinada, embora tivesse havido promessa; o Sr. Leandro foi quem passou essas atividades para a depoente fazer; a depoente tinha que cumprir horário de trabalho das 09h às 19h, embora saísse por volta das 20h /20h30min; a reclamante foi apresentada pelo Leandro como supervisora da imobiliária; no dia a dia via a reclamante fazendo de tudo, emitir boletos, fazia contratos, vistoria, controle de pagamentos, cuidava do financeiro etc; quando a depoente começou na empresa, a reclamante cuidava do financeiro e estava treinando a Priscila para assumir essa função; a Priscila assumiu de fato o financeiro apenas quando a reclamante se afastou por atestado médico; (...); na época trabalhavam quatro pessoas e elas se reportavam para a reclamante e para o Leandro, caso precisassem se ausentar do serviço; a reclamante fazia limpeza geral dos flats; o hotel tem as camareiras, mas elas organizam os flats que são do hotel e não dos que são dos proprietários clientes da reclamada; a reclamante fazia uma média de 3 a 4 limpezas de flat por semana; a reclamada tinha uma faxineira que fazia limpeza pós obra nos flats, vendo ela ir uma ou duas vezes no período em que a depoente trabalhou na ré; a reclamada administrava uma média de 100 imóveis no hotel; o valor da locação médio é entre R$ 5.000,00 e R$ 20.000,00, dependendo do tamanho e reformas do local; a reclamante tinha um grau de confiança a mais, tanto que foi apresentda como supervisora e delegava a agenda e as atividades para os demais trabalhadores, além de dar treinamentos; eram subordinados à reclamante a depoente, a Karol e a Priscila; houve um episódio em meados de dezembro de 2023 em que a reclamante apresentou tremores, inchaço e ficou nervosa, não conseguindo trabalhar mais; no dia houve um período conturbado de trabalho e o Leandro cobrava a reclamante por telefone e falava de forma agressiva com ela, chegando a acusar de desvio de valores; sabe que Leandro estava agressivo porque ele enviou mensagens no grupo de WhatsApp de trabalho; o Leandro estava falando para a reclamante apresentar os comprovantes de pagamento do seguro incêndio, porque os valores que tinham disponíveis não estavam batendo e dizia que isso era muito estranho; participavam do grupo de WhatsApp todos os funcionários (reclamante, depoente, Karol, Priscila), Leandro e o corretor autônomo JD (João Daniel); essa foi a única manifestação de problema de saúde da reclamante que a depoente presenciou; a reclamante se afastou alguns dias, voltou a trabalhar e depois se afastou novamente; o Leandro comentou que a reclamante estava com problemas de ordem psicológico, por conta da sobrecarga de trabalho; a depoente ainda trabalhava na reclamada quando a reclamante foi dispensada; não sabe o motivo da dispensa da reclamante; quem assumiu as funções da reclamante foi a Priscila; que a depoente era a reclamante quem fazia o financeiro e depois passou a ter a ajuda da Priscila; a depoente foi contratada pelo Leandro; apenas a reclamante foi dispensada no período em que a depoente trabalhava na reclamada; lembra que o JD também foi dispensado dos serviços da reclamada em dezembro de 2023, logo após o episódio em que a reclamante passou mal, quando ele não fechou uma compra e então se desentendeu com o Leandro; não tinham o hábito de almoçar na Vila Planalto, sendo que a depoente só foi uma vez e lembra de ter visto a reclamante indo apenas uma vez; a depoente ainda tem as mensagens do grupo de WhatsApp da reclamada.' (ID fcd86f0). Consoante as asseverações da testemunha, MAYSE CASSIA LUZ CUNHA, é certo que a reclamante respondia sozinha pelas atribuições do setor financeiro até a chegada da empregada Priscila, a qual, recebendo treinamento por parte da autora, passou a auxiliá-la, com o fito de assumir o setor. No entanto, tendo em vista que a testemunha referenciada não trabalhou desde a contratação da reclamante, iniciando os serviços na empresa somente no final do mês de novembro de 2023, os seus dizeres não são suficientes para a comprovação de que a execução de atividades do setor financeiro não se incluíam nas atividades para as quais a reclamante fora, desde o início, contratada. Por conseguinte, não tendo a reclamante se desincumbido do ônus probatório que ficou a cargo de sua responsabilidade de demonstrar que as atividades competentes ao setor financeiro foram acrescidas ao contrato somente em momento posterior à admissão e, consequentemente, não sendo demonstrado alteração qualitativa e quantitativa das atividades realizadas acarretando o desequilíbrio econômico do contrato e o enriquecimento sem causa da parte reclamada, julgo improcedente o pedido de acúmulo de funções e reflexos." (fls. 169/173) Inconformada, a reclamante insiste nas diferenças por acúmulo de função. Pois bem. A contraprestação pelo acúmulo de função decorre do princípio da proteção do trabalhador. Firmadas as condições de trabalho referentes às atribuições do empregado, o acúmulo de outras funções para além das inicialmente combinadas dá ao obreiro o direito à contraprestação compatível com a modificação realizada, nos termos do art. 468 da CLT. Isso, inclusive para evitar o enriquecimento sem causa do empregador. O que não se admite, conforme art. 884 do CC/02. Além disso, o pagamento do acúmulo tem respaldo na aplicação analógica do art. 13 da legislação dos radialistas (Lei nº 6.615/78). Feitas tais considerações, observo que a narrativa inicial é no sentido de que a demandante foi admitida como Supervisora em 15/05/23 (fl. 7) e, a partir de 06/06/23, passou a ser responsável também pelo setor financeiro do réu, corretagem e serviços gerais (fl. 17). Na contestação o demandado negou o exercício da função de supervisora pela reclamante (fl. 110) assim como o acúmulo funcional (fl. 113). Entretanto, na conversa do whatsaap de fl. 70, não especificamente impugnada na contestação, o sócio da reclamada Leandro indica a autora como Supervisora da empresa a um cliente e, no mesmo sentido, a única testemunha ouvida narrou que "a reclamante foi apresentada pelo Leandro como supervisora da imobiliária" (fl. 158). Nesse cenário, incontroversa a informação inicial, no sentido de que a empregada foi admitida como Supervisora. E apesar de a única testemunha ouvida ter atestado que a reclamante trabalhou na área financeira, informando que "...no dia a dia via a reclamante fazendo de tudo, emitir boletos, fazia contratos, vistoria, controle de pagamentos, cuidava do financeiro etc..." (fl. 158), não vislumbro o acúmulo funcional sob tal aspecto, por não constatar incompatibilidade com a função de Supervisora, até porque as respectivas atribuições sequer foram delimitadas na inicial. Contudo, a testemunha informou que a reclamante também fazia de 3 a 4 limpezas por semana nos flats do réu (fl. 158), atividade que não se revela compatível com a função de supervisora, sendo devida a diferença por acúmulo funcional, a qual arbitro na ordem 10%. Logo, dou parcial provimento ao recurso da reclamante para deferir-lhe, durante todo o contrato de trabalho, o pagamento de diferenças salariais de 10% com reflexos em aviso prévio indenizado, férias + 1/3, 13º salário, FGTS + 40%. ASSÉDIO MORAL (RECURSO DA RECLAMANTE) Insiste a demandante na ocorrência de assédio moral, em virtude da sobrecarga no trabalho. Diz ainda que, nos dias 09 e 10/11/2023, foi obrigada a trabalhar isolada numa sala sem contato com os demais colegas de trabalho e que o empregador insinuou que a demandante teria furtado dinheiro da empresa. Pois bem. Considero que o acúmulo funcional constatado no tópico precedente não é suficiente para gerar danos morais, sendo que a respectiva reparação material já foi deferida. Apesar de constar dos autos relatório médico, informando problemas psíquicos da empregada em virtude da de problemas no trabalho, o referido documento foi realizado após a dispensa da autora e com base apenas nas suas alegações. Ademais, o referido documento evidencia que a reclamante possui histórico de fibromialgia anterior à admissão na ré, sendo que na conversa do whatsaap à fl. 72 a reclamante diz ao empregador que já sofreu problema de stress há alguns anos. Tudo a indicar a existência problemas de saúde anteriores à admissão na reclamada. Por sua vez, o trabalho mediante isolamento não foi comprovado por qualquer elemento dos autos. Quanto à acusação da prática de furto pela empregada, a própria recorrente admite que houve mera "insinuação" do empregador nesse sentido. O que se revela subjetivo. Note-se que apesar de a única testemunha ouvida ter informado que o empregador acusou a autora de ter desviado valores, a testemunha explicou, em seguida, que o sócio da ré pediu os comprovantes do seguro de incêndio porque os valores não "estavam batendo" (fl. 158). Assim, considero que a exigência de apresentação de documentos pelo empregador não configura abuso, sendo que certo que, por trabalhar no setor financeiro da empresa, a reclamante tinha obrigação de esclarecer as movimentações financeiras. Nesse cenário, considero que a demandante não se desvencilhou do seu ônus processual de comprovar o assédio moral no trabalho. Assim, mantenho a decisão recorrida, inclusive pelos seus próprios fundamentos. Nego provimento. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA (RECURSO DA RECLAMANTE) A d. magistrada de primeira instância indeferiu o pedido indenização por dispensa discriminatória, sob os seguintes fundamentos: "A reclamante aduz que, na data de 31/12/2023, foi internada em razão de grave crise que sofreu pelo acúmulo de serviço e o ambiente de trabalho estressante a que estava imersa, recebendo alta em 01/01/2024, sendo diagnosticada com fibromialgia (CID M79.7). Ademais, encaminhada para o atendimento com profissional de psicologia, atesta que, consoante relatório anexo, o psicólogo inferiu que o quadro clínico da autora possuía nexo causal com o ambiente de trabalho, sendo afastada do labor por mais de 15 dias, usufruindo de benefício previdenciário que se encerraria na data de 28/02/2024, data em que foi comunicada da dispensa. Assim, sob a afirmativa de que sua dispensa fora discriminatória e que, consequentemente, o ato demissional é nulo de pleno direito, requer a condenação da parte reclamada ao pagamento em dobro de sua remuneração mensal, a partir de janeiro de 2024 até o trânsito em julgado da presente ação, requerendo, ainda, o pagamento de indenização a título de dano moral (art. 4º, caput, Lei 9.029/95). A parte reclamada defende, por seu turno, que a fibromialgia não se trata de doença grave estigmatizante ou que possa causar preconceitos, além de apontar que a doença não possui cunho ocupacional, pelo que impugna o pedido da autora. Analisa-se. Com efeito, o TST, através de sua Súmula nº 443, dispôs que se presume discriminatória a dispensa do empregado que suscite estigma ou preconceito. Porém, o fato de a doença não ser classificada como grave, que suscite estigma ou preconceito, não impede a constatação da ocorrência de dispensa discriminatória quando esta estiver evidenciada pelo conjunto probatório dos autos. Passo, portanto, ao exame da prova oral produzida. A preposta da parte reclamada afirmou que '(...); não presenciou a reclamante manifestando problema de saúde no decorrer do contrato de trabalho.' (ID fcd86f0). Quanto aos dizeres da testemunha, MAYSE CASSIA LUZ CUNHA, segundo depoimento já reproduzido em tópico precedente, embora a depoente tenha confirmado que presenciou os afastamentos da autora ao trabalho ocasionados por problemas de saúde, afirmou não saber o motivo pelo qual a reclamante foi dispensada. Dessa maneira, apesar de suas asseverações sobre a temática, não há prova contundente nos autos de que o desligamento da autora tenha se dado por razão de cunho discriminatório. No mesmo sentido, em que pese os atestados/relatórios médicos (IDs 03c3a43, fb5fa3a) e a percepção de benefício previdenciário (ID add0bdf) comprovem o quadro clínico da autora, não fazem prova de que a dispensa tenha sido por ele justificada, inclusive porque, o fato de a reclamante ser portadora de doença, sobretudo que não cause estigma ou preconceito, não presume que a dispensa tenha ocorrido por conta dela. Assim sendo, inferindo-se pela insuficiência de provas aptas a comprovação de que a dispensa da reclamante é proveniente do quadro de fibromialgia ou enfermidades psíquicas, a dispensa encontra respaldo no jus variandi do empregador, que lhe confere a liberalidade de encerramento do contrato de trabalho de maneira unilateral. Saliento, inclusive, que, considerando a dispensa da autora no momento em que, encerrado o período para a fruição de benefício previdenciário, não gozava de afastamento ao trabalho por atestado médico, inexistia óbice que impedisse a dispensa regular por parte do empregador. Pelas razões expostas, ausente reconhecimento da dispensa discriminatória, julgo improcedente o pedido de pagamento em dobro dos salários e de pagamento de indenização a título de dano moral proveniente de rompimento da relação de trabalho por ato discriminatório." (fls. 176/177). A autora repete a tese de que foi demitida por discriminação, por causa dos afastamentos médicos. Pois bem. Incontroverso que a reclamante trabalhou para a reclamada, no período de 15/05/23 a 28/02/24. Consta dos autos atestado médico de 1 dia, em 27/12/23, pelo CID M79.1 (mialgia), 30 dias em, 02/01/24, pelo CID M79.7 (fibromialgia) e mais 30 dias, em 30/01/24, também por fibromialgia (fls. 36/38). Conforme informações e conversas do whatsaap registradas na inicial, não especificamente impugnadas na defesa, é incontroverso que a autora, em virtude de problemas de saúde, chegou atrasada no dia 02/08/23 (fl. 11), afastou-se do trabalho nos dias 27 e 31/12/23 (fl. 12) e por 15 dias em fevereiro de 2024 (fl. 13), sendo o último afastamento confirmado pela comunicação do INSS à fl. 46. E no mesmo sentido, o depoimento da testemunha: "houve um episódio em meados de dezembro de 2023 em que a reclamante apresentou tremores, inchaço e ficou nervosa, não conseguindo trabalhar mais... essa foi a única manifestação de problema de saúde da reclamante que a depoente presenciou; a reclamante se afastou alguns dias, voltou a trabalhar e depois se afastou novamente..." (fl. 158). Observo ainda que o réu não impugnou especificamente a conversa do whatsaap registrada na inicial (fl. 16), em que a demandante informa ao empregador, no dia 27/02/24, que seu atestado estava terminando, sendo que a empregada foi dispensada justamente no dia seguinte (28/02/24 - TRTC, fl. 28), inclusive sem cumprimento de aviso prévio. Certo é que a demandante precisou se afastar do trabalho, em virtude dos problemas de saúde, os quais eram de pleno conhecimento da demandada, inclusive conforme conversas do whatsaap (fl. 16 e 72) e informações iniciais não impugnadas na defesa. Nesse cenário, pertencia à demanda o ônus de comprovar que a dispensa se deu sem viés discriminatório. Encargo do qual não conseguiu se desvencilhar. Razão pela qual, prevalece a tese inicial da dispensa discriminatória. Conforme página da internet da Sociedade Brasileira de Reumatologia: "A fibromialgia (FM) é uma condição que se caracteriza por dor muscular generalizada, crônica (dura mais que três meses), mas que não apresenta evidência de inflamação nos locais de dor. Ela é acompanhada de sintomas típicos, como sono não reparador (sono que não restaura a pessoa) e cansaço. Pode haver também distúrbios do humor como ansiedade e depressão, e muitos pacientes queixam-se de alterações da concentração e de memória." Nesse cenário, a despeito dos argumentos da contestação, considero que a enfermidade possui aptidão para causa estigma, principalmente em virtude da necessidade de afastamentos médicos, constatados nos autos. Assim, tenho por configurada a dispensa discriminatória da reclamante, sendo devido o pagamento dobrado da remuneração referente ao período de afastamento, nos termos inciso II do art. 4º da Lei nº 9.029/95. Assim, dou provimento ao recurso da reclamante para deferir-lhe o pagamento dobrado da sua remuneração a partir de 28/02/24 até a publicação deste acórdão. MÁ-FÉ (RECURSO DA RECLAMANTE) Pede a autora a condenação da ré em litigância de má-fe, por ter se intitulado como EIRELI. Ora, a defesa apenas diz que o réu "era" Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (fl. 103) e apresentou documentos correspondentes com seu atual tipo societário (fl. 92/101). Inexistente, portanto, a má-fé. Nada a deferir, portanto. III - CONCLUSÃO Pelo exposto, conheço dos recursos e, no mérito, nego provimento ao do reclamado e dou parcial provimento ao da autora para: a) determinar a apuração das horas extras com base no divisor 200; b) deferir-lhe, durante todo o contrato de trabalho, o pagamento de diferenças salariais de 10% com reflexos em aviso prévio indenizado, férias + 1/3, 13º salário, FGTS + 40%; e c) deferir o pagamento dobrado da sua remuneração a partir de 28/02/24 até a publicação do acórdão. Tudo nos termos da fundamentação. Ante o parcial provimento do recurso da reclamante, arbitro à condenação novo valor de R$80.000,00 e às custas processuais o importe de R$1.600,00. ACÓRDÃO É o meu voto. Por tais fundamentos, ACORDAM os Desembargadores da Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Região, em sessão realizada na data e nos termos da respectiva certidão de julgamento, aprovar o relatório, conhecer dos recursos e, no mérito, negar provimento ao do reclamado e dar parcial provimento ao da reclamante, nos termos do voto do Desembargador Relator. Ementa aprovada. Brasília (DF), 09 de abril de 2025 (data do julgamento) Desembargador Gilberto Augusto Leitão Martins Relator DECLARAÇÃO DE VOTO BRASILIA/DF, 15 de abril de 2025. ELIDA SANTOS CABRAL, Servidor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - LM EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA

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ID: 258969443

Tribunal: TRT10 Órgão: 2ª Turma Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0001269-07.2023.5.10.0021

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

COMERCIAL ROFE LTDA MINISTéRIO PúBLICO DO TRABALHO RICARDO TURBIANI

Polo Passivo:

COMERCIAL ROFE LTDA RICARDO TURBIANI

Acórdão

Advogados:

TTHAYSON D CESARES SANTANA QUEIROZ

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

DIEGO MENEZES SOARES

OAB/MA XXXXXX Desbloquear

CESAR HENRIQUE SANTOS PIRES FILHO

OAB/MA XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 2ª TURMA Relator: JOAO AMILCAR SILVA E SOUZA PAVAN 0001269-07.2023.5.10.0021 : RICARDO TURBIANI E OUTROS (1) :… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 2ª TURMA Relator: JOAO AMILCAR SILVA E SOUZA PAVAN 0001269-07.2023.5.10.0021 : RICARDO TURBIANI E OUTROS (1) : RICARDO TURBIANI E OUTROS (1) PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO PROCESSO n.º 0001269-07.2023.5.10.0021 - RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA (1009) RELATOR(A): Desembargador João Amilcar Silva e Souza Pavan RECORRENTE: RICARDO TURBIANI ADVOGADO: TTHAYSON D CESARES SANTANA QUEIROZ RECORRENTE: COMERCIAL ROFE LTDA ADVOGADO: DIEGO MENEZES SOARES ADVOGADO: CESAR HENRIQUE SANTOS PIRES FILHO RECORRIDO: OS MESMOS ORIGEM: 21ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA/DF CLASSE ORIGINÁRIA: Ação Trabalhista - Rito Ordinário (JUÍZA MARIANA NASCIMENTO PEREIRA) EMENTA SALÁRIO INFORMAL. COMPLEMENTO DE REMUNERAÇÃO. PREMIAÇÃO. PROVA. ÔNUS. 1. O ônus de provar a percepção de salário informal é do empregado, por ser fato constitutivo do direito às parcelas postuladas em juízo (art. 818, inciso I, da CLT). 2. Satisfeito o encargo sob o prisma da complementação da remuneração mensal, são devidas as repercussões legais da parcela. Já quanto às alegadas comissões solvidas de forma marginal, não há espaço para as irradiações postuladas, porquanto demonstrada a vinculação de tais valores à satisfação de premiação pelo atingimento de metas, a teor do art. 457, §1º, da CLT. CONTRATO DE EMPREGO. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. REQUISITOS. DANO MORAL. 1. A Lei nº 9.029/1995, ao enumerar atos passíveis de cristalizar a dispensa discriminatória, não exibe rol restritivo, apanhando também todas aquelas situações nas quais uma característica pessoal do empregado impulsiona a rescisão do contrato. 2. Ausentes elementos capazes de desvelar o ato, o qual encerraria a potencialidade de viciar o ato da dispensa, gerando lesão ao patrimônio imaterial do empregado, inexiste espaço para reconhecer o ilícito ventilado, a postulada garantia de emprego ou o dever de indenizar. CONTRATO DE TRABALHO. SUSPENSÃO. LICENÇA MÉDICA. EFEITOS. Em razão da suspensão do contrato, por motivo de licença médica, cabe apenas a postergação da data de dispensa do empregado, com a retificação das anotações da sua CTPS. Recursos conhecidos, com o parcial provimento do interposto pelo reclamante. RELATÓRIO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima descritas. A MM. 21ª Vara do Trabalho de Brasília/DF julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados, condenando a reclamada ao pagamento de reflexos decorrentes da percepção de salário informal. De resto, concedeu ao autor os benefícios da justiça gratuita e impôs às partes a satisfação de honorários advocatícios (fls. 336/343). Inconformado, o reclamante interpõe recurso ordinário. Reafirma de início a percepção de comissões às margens dos recibos, postulando a declaração da sua natureza salarial, com irradiação sobre as demais parcelas do contrato. Defende, ainda, a nulidade da dispensa, com as consequências daí advindas, inclusive sob o prisma da reparação moral (fls. 346/350). A empresa apresentou contrarrazões (fls. 363/370), e ato contínuo interpôs recurso adesivo, atacando a obrigação de pagar imposta com lastro na inadequada apreciação da prova oral (fls. 353/358). Comprovantes de recolhimento das custas processuais e do depósito recursal às fls. 359/362. Conquanto intimado, o reclamante não apresentou contrariedade (fl. 372). Os autos não foram remetidos ao d. Ministério Público do Trabalho, na forma regimental. É o relatório. VOTO ADMISSIBILIDADE. A reclamada ventila o não conhecimento do recurso do empregado, acenando com a ausência de dialeticidade (fls. 365/366). Todavia, não extraio o indigitado vício processual, uma vez que das razões lançadas é possível extrair efetivamente que houve impugnação aos fundamentos da r. decisão. Em outros termos, o eventual acolhimento das teses ventiladas no recurso bastaria para reverter o resultado desfavorável à parte - logo, vislumbro satisfeito o requisito do preceito legal em comento. De resto, os recursos são próprios, tempestivos e o da empresa conta com regular preparo, detendo os sucumbentes recíprocos boa representação processual. Presentes os demais pressupostos legais, rejeito a preliminar suscitada e deles conheço. SALÁRIO INFORMAL. COMPLEMENTO DE REMUNERAÇÃO. PREMIAÇÃO. PROVA. ÔNUS. O obreiro, admitido em 03/10/2022 como gerente comercial, afirmou que auferia a remuneração lançada nos recibos, além de frações informais, por meio de depósito em cartão, nos importes de R$ 2.500,00 e R$ 4.500,00 por mês, respectivamente, a título de salário e comissões (fls. 03/07). Postulou, assim, a percepção dos correspondentes reflexos (fls. 19/20). A empregadora, por sua vez, negou a prática, asseverando, especificamente quanto às ditas comissões, que na verdade havia a satisfação de premiação no caso do cumprimento de metas (fls. 124/131). E a r. sentença julgou procedente o pedido tão somente sob a ótica da complementação da remuneração mensal, acolhendo, por outro lado, a tese da defesa relativa aos prêmios (fls. 337/338), desfecho atacado por ambos os litigantes. O autor reafirma o pagamento informal de comissões às fls. 348/349, enquanto a empresa contrasta a obrigação imposta, vinculando os depósitos remanescentes no cartão ao custeio de despesas (fls. 355/357). De início, quanto ao apelo do reclamante, entendo ser necessário estabelecer as premissas jurídicas da matéria devolvida à revisão, especialmente à luz das alterações defluentes da Lei nº 13.467/2017, inclusive considerando que a relação jurídica em análise iniciou após a vigência da norma. O salário pode ser compreendido, de forma singela, como aquele universo contraprestativo dado pelo empregador, como decorrência direta do aproveitamento do resultado da força de trabalho do empregado. Não se trata de parcela única, nem mesmo no seu conceito stricto sensu, mas sim todas aquelas ajustadas entre as partes, de sorte a fazer face, diretamente, à prestação de serviços (CATHARINO). Ele diz àquelas atividades ordinárias ou usuais do trabalhador, quando em atuação ou aguardando ordens, constituindo o mínimo devido ao último, mas obviamente tal perímetro engloba, quando menos, o salário variável. No pagamento de comissões a empregadora destina determinada fração de seu faturamento ao empregado, de forma proporcional ao seu desempenho, e ainda assim o ordenamento jurídico repele qualquer contraste à feição salarial da parcela - art. 457, § 1º, da CLT. Elas naturalmente são variáveis, de acordo com seu fato gerador, mas ainda assim tal circunstância não altera a sua substância explícita, como contraprestação que é pelo labor desempenhado pelo empregado. Da mesma forma, e apenas com denominação diversa, o adicional de produtividade decorre também do volume da atividade primária, ou usual, do empregado, variando de acordo com os resultados finais do fruto de seu trabalho. A única distinção entre as duas está situada na fonte do pagamento, pois as comissões, normalmente, decorrem da celebração de negócios com terceiros, enquanto a produtividade é intrínseca às partes integrantes do vínculo de emprego. Já os prêmios, no cenário jurídico atual, vêm disciplinados no § 4º do art. 457 da CLT, in verbis: "§ 4º Consideram-se prêmios as liberalidades concedidas pelo empregador em forma de bens, serviços ou valor em dinheiro a empregado ou a grupo de empregados, em razão de desempenho superior ao ordinariamente esperado no exercício de suas atividades." Segundo o preceito, dois são os elementos de interesse - a liberalidade concedida pelo empregador (a), aliada à sua vinculação ao "...desempenho superior ao ordinariamente esperado..." do empregado (b) -, e eles, data venia das razões recursais, emergem com tranquilidade do acervo probatório. Nesse sentido, logo no início do seu depoimento, o autor qualificou a parcela por ele impugnada como premiação. Na sequência, não só discorreu sobre a forma de apuração, evidenciando o cálculo atrelado ao cumprimento de metas, com atribuição de pontuação em diversos indicadores de rendimento, como admitiu que ela não era devida nos meses em que não atingida nota mínima (a partir dos 02:16 minutos). Tal relato, aliás, está em harmonia com as planilhas juntadas pela empresa às fls. 260/266, contexto a atrair a improcedência do pleito. A propósito, apenas acrescento que o meio de pagamento adotado, assim como a fixação de critérios relacionados às vendas realizadas ou mesmo a habitualidade do ato não resultam, por si só, no reconhecimento postulado, sendo o de interesse a vinculação da parcela ao atingimento de metas específicas e pré-determinadas, acima da expectativa - justamente a hipótese dos autos. Superada tal questão, observo que a empregadora busca, no recurso adesivo, afastar o reconhecimento de salário informal - destinado à complementação da remuneração mensal - com estofo nos depoimentos prestados, atrelando os depósitos remanescentes realizados no cartão ao reembolso de despesas, o que também não merece prosperar. Ora, a contestação no aspecto apenas refutou a existência de remuneração à margem dos recibos, sequer ventilando o alegado ressarcimento - a perspectiva, assim, sugerida de relance apenas nas razões finais (fls. 325/326), apresenta nítidos contornos inovatórios. A par disso, a preposta afirmou desconhecer a satisfação de quantias mensais no cartão do autor, com exceção das premiações (aos 9:33 minutos), o que reforça a inconsistência da argumentação. Noutro giro a única testemunha ouvida apenas declarou a sua situação pessoal a tal respeito (dos 03:52 aos 05:45 minutos) - até há posteriormente relato de saques dos valores depositados no cartão pelo autor, mas nitidamente relacionados às premiações (07:55 minutos) -, não sendo possível espargir, por presunção, efeitos dessa realidade ao obreiro. De resto o reclamante claramente defende a conduta fraudulenta da empresa em audiência, não havendo espaço para cogitar da confissão real ventilada. Com efeito, ele asseverou que, embora o cartão fosse em tese destinado ao custeio de alimentação, ele era utilizado para fins de satisfação de complementação do salário e premiação, visando burlar a legislação trabalhista (a partir dos 42 segundos). Logo, não há como acolher as perspectivas ora defendidas pela reclamada, devendo a r. sentença ser mantida no particular. Nego provimento aos recursos. CONTRATO DE EMPREGO. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. REQUISITOS. DANO MORAL. O reclamante afirmou que em virtude do agravamento de lesão sofrida em junho de 2023 foi-lhe concedido atestado médico em 21/08/2023, de cento e vinte dias, documento entregue à empresa. Alegou a seguir que, embora o seu estado de saúde fosse de conhecimento de todos, a empregadora optou por dispensá-lo em 25/08/2023, ou seja, logo após a apresentação do atestado e no curso da licença médica. Nesse contexto, defendeu o caráter discriminatório do ato, postulando o reconhecimento da sua nulidade, além do recebimento das remunerações durante o período do afastamento médico e indenização por dano moral (fls. 04/14). Já a empregadora argumentou que jamais recebeu a aludida ordem médica, sendo a dispensa assentada, em verdade, na produtividade do obreiro (fls. 125/127). O juízo de primeiro grau, por sua vez, entendeu que o autor não comprovou a ciência da empresa acerca do seu estado de saúde no momento da dispensa e julgou improcedentes os pedidos formulados (fls. 338/341), daí o recurso em exame. Em suas razões o reclamante reafirma a comunicação da sua condição médica à empresa, aduzindo, a par disso, que a rescisão deve ser considerada nula ainda que a ciência da incapacidade tenha ocorrido após o ato. Pede, pois, o provimento do apelo, para que seja reconhecida a nulidade da dispensa, com o pagamento das indenizações daí decorrentes, inclusive de ordem moral (fls. 349/350). A Lei nº 9.029/1995, ao enumerar os motivos ensejadores do reconhecimento da dispensa discriminatória, assim dispõe, in verbis: "Art. 1º Fica proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso a relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, ressalvadas, neste caso, as hipóteses de proteção ao menor previstas no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal. Art. 2º Constituem crime as seguintes práticas discriminatórias: I - a exigência de teste, exame, perícia, laudo, atestado, declaração ou qualquer outro procedimento relativo à esterilização ou a estado de gravidez; II - a adoção de quaisquer medidas, de iniciativa do empregador, que configurem; a) indução ou instigamento à esterilização genética; b) promoção do controle de natalidade, assim não considerado o oferecimento de serviços e de aconselhamento ou planejamento familiar, realizados através de instituições públicas ou privadas, submetidas às normas do Sistema Único de Saúde (SUS)." Ainda que aparente reger apenas aquelas situações específicas e limitadas, em verdadeiro rol da modalidade numerus clausus, a jurisprudência trabalhista está direcionada a interpretar a norma de modo amplo, como instrumento de concretização da Convenção nº 111 da OIT e os princípios inseridos no art. 3º, incisos III e IV, da CF. Assim, permito-me apenas transcrever algumas ementas dispondo nesse sentido, ad litteram: "AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA - GARANTIA CONTRATUAL DE EMPREGO - DISPENSA ARBITRÁRIA - RETALIAÇÃO PELA PROPOSITURA DE RECLAMAÇÃO TRABALHISTA CONTRA O EMPREGADOR - INDENIDADE - NULIDADE DA DISPENSA- REINTEGRAÇÃO AO EMPREGO. A Corte regional registrou que, por meio de norma intitulada -Política de Avaliação e Desenvolvimento-, o reclamado instituiu um rigoroso sistema de avaliação dos trabalhadores, vinculando-se, por conseguinte, à adoção dos critérios ali estabelecidos para dispensa de pessoal. Nesse contexto, diante da evidência fática de que o reclamante obteve o melhor conceito nas avaliações às quais o reclamado se vinculou e, no entanto, foi dispensado arbitrariamente como forma de retaliação pelo exercício do direito constitucional de acesso ao Poder Judiciário, decidiu a Corte a quo reintegrar o trabalhador no emprego. A incorporação de condição mais benéfica estabelecida pela empresa ao contrato de trabalho decorre do princípio protetivo, que determina o caráter prospectivo do contrato de trabalho. Assim, o direito de não ser dispensado arbitrariamente se agrega ao patrimônio jurídico do trabalhador quando a empresa, por liberalidade, institui critérios para dispensados seus empregados. Nesse sentido, não há violação dos arts. 5º, II, da Constituição Federal e 482 da CLT na decisão regional, porquanto a controvérsia foi dirimida em razão do estatuto contratual singular verificado nos autos. E, ainda que assim não fosse, a conduta empresarial de perseguir o trabalhador em razão do exercício regular do direito de ação também pode ser enquadrada no disposto no art. 1º da Lei nº 9.029/95, ensejando, de toda sorte, a reintegração do empregado, nos termos do art. 4º deste diploma legal. O direito do trabalhador de reclamar judicialmente contra as violações dos seus direitos laborais merece ser garantido em face de medidas de retaliação que ameacem a sua permanência no emprego, sob pena de inviabilizar a atuação do Poder Judiciário trabalhista no curso das relações de emprego. Cabe aqui a utilização do direito comparado, nos termos do art. 8º da CLT, a fim de trazer, do direito espanhol, a construção jurídica a partir da qual emergiu a garantia de indenidade, compreendida como a imunização que previne o trabalhador contra a represália empresarial a partir de quando ele ajuíza uma ação judicial em face do seu empregador-. O art. 7º, I, da Constituição Federal não pode ser interpretado como um direito absoluto do empregador de dispensar imotivadamente, em detrimento dos demais bens jurídicos preservados pela ordem constitucional. Nesse sentido, a interpretação do art. 1° da Lei n° 9.029/95, à luz dos fundamentos da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho insculpidos no art. 1º, III e IV, da Constituição Federal, bem como à luz do princípio da não discriminação contido no art. 3º, IV, da Lei Maior e amparado internacionalmente pela Convenção nº 111 da OIT, conduz à conclusão de que o rol de discriminações ali contidas não é taxativo, devendo abranger também a decorrente do exercício do direito de ação, porque o objetivo da diretriz constitucional vedatória da discriminação, num Estado Democrático de Direito, é afastar dos cidadãos toda constrição de direitos pautada em critérios ilegítimos, independentemente de quais sejam esses critérios. Agravo de instrumento desprovido." (grifos acrescidos) (AIRR - 77700-47.2009.5.04.0019, Relator Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, 4ª Turma, DEJT 28/09/2012) "RECURSO DE REVISTA. EMPREGADO PORTADOR DO VÍRUS HIV. PRESUNÇÃO DE DESPEDIDA DISCRIMINATÓRIA. REINTEGRAÇÃO. 1. O ordenamento jurídico nacional e internacional (CF, art. 1º, III e IV, e Lei nº 9.029/95; Convenção nº 111 da Organização Internacional do Trabalho) contempla regras que vedam práticas discriminatórias para efeitos admissionais e de manutenção da relação jurídica de trabalho. 2. Em consonância com tal regramento, a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho é firme no sentido de que, ciente de que o empregado é portador do vírus HIV, presume-se discriminatório, e arbitrário, o exercício do direito potestativo de dispensa pelo empregador, salvo na hipótese de resolução motivada do contrato de trabalho. 3. No caso presente, evidenciado que o empregador abusou de seu direito ao despedir empregado acometido de doença grave, anula-se o ato e determina-se a reintegração do reclamante no emprego, permitindo-lhe manter condições dignas de sobrevivência pessoal e familiar, ao mesmo tempo em que se desestimula a despedida motivada apenas pelo preconceito, e não por motivo disciplinar, técnico, econômico ou financeiro. Recurso de revista conhecido e provido. (RR - 281540-92.2005.5.02.0014, Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa, 1ª Turma, DEJT 21/09/2012); "RECURSO DE REVISTA. REINTEGRAÇÃO NO EMPREGO. DISPENSA ARBITRÁRIA. TRABALHADOR PORTADOR DE ESQUIZOFRENIA. 1. O sistema jurídico pátrio consagra a despedida sem justa causa como direito potestativo do empregador, o qual, todavia, não é absoluto, encontrando limites, dentre outros, no princípio da não discriminação, com assento constitucional. A motivação discriminatória na voluntas que precede a dispensa implica a ilicitude desta, pelo abuso que traduz, a viciar o ato, eivando-o de nulidade. 2. A proteção do empregado contra discriminação, independente de qual seja sua causa, emana dos pilares insculpidos na Constituição da República Federativa do Brasil, notadamente os arts. 1º, III e IV, 3º, IV, 5º, caput e XLI, e 7º, XXX. 3. Acerca da dignidade da pessoa humana, destaca Ingo Wolfgang Sarlet, em sua obra -Eficácia dos Direitos Fundamentais- (São Paulo: Ed. Livraria do Advogado, 2001, pp. 110-1), que -constitui pressuposto essencial para o respeito da dignidade da pessoa humana a garantia da isonomia de todos os seres humanos, que não podem ser submetidos a tratamento discriminatório e arbitrário, razão pela qual são intoleráveis a escravidão, a discriminação racial, perseguição em virtude de motivos religiosos, etc. (...). O que se percebe, em última análise, é que onde não houver respeito pela vida e pela integridade física do ser humano, onde as condições mínimas para uma existência digna não forem asseguradas, onde a intimidade e identidade do indivíduo forem objeto de ingerências indevidas, onde sua igualdade relativamente aos demais não for garantida, bem como onde não houver limitação do poder, não haverá espaço para a dignidade da pessoa humana, e esta não passará de mero objeto de arbítrio e injustiças-. 4. O exercício do direito potestativo de denúncia vazia do contrato de trabalho sofre limites, igualmente, pelo princípio da proteção da relação de emprego contra despedida arbitrária, erigido no art. 7º, I, da Constituição - embora ainda não regulamentado, mas dotado de eficácia normativa -, e pelo princípio da função social da propriedade, conforme art. 170, III, da Lei Maior. 5. Na espécie, é de se sopesar, igualmente, o art. 196 da Carta Magna, que consagra a saúde como -direito de todos e dever do Estado-, impondo a adoção de políticas sociais que visem à redução de agravos ao doente. 6. Nesse quadro, e à luz do art. 8º, caput, da CLT, justifica-se hermenêutica ampliativa da Lei 9.029/95, cujo conteúdo pretende concretizar o preceito constitucional da não-discriminação no tocante ao estabelecimento e continuidade do pacto laboral. O art. 1º do diploma legal proíbe a adoção de qualquer prática discriminatória para efeito de acesso a relação de emprego, ou sua manutenção. Não obstante enumere certas modalidades de práticas discriminatórias, em razão de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, o rol não pode ser considerado numerus clausus, cabendo a integração pelo intérprete, ao se defrontar com a emergência de novas formas de discriminação. 7. De se observar que aos padrões tradicionais de discriminação, como os baseados no sexo, na raça ou na religião, práticas ainda disseminadas apesar de há muito conhecidas e combatidas, vieram a se somar novas formas de discriminação, fruto das profundas transformações das relações sociais ocorridas nos últimos anos, e que se voltam contra portadores de determinadas moléstias, dependentes químicos, homossexuais e, até mesmo, indivíduos que adotam estilos de vida considerados pouco saudáveis. Essas formas de tratamento diferenciado começam a ser identificadas à medida que se alastram, e representam desafios emergentes a demandar esforços com vistas à sua contenção. 8. A edição da Lei 9.029/95é decorrência não apenas dos princípios embasadores da Constituição Cidadã, mas também de importantes tratados internacionais sobre a matéria, como as Convenções 111 e 117 e a Declaração sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, de 1998, todas da OIT. 9. O arcabouço jurídico sedimentado em torno da matéria deve ser considerado, outrossim, sob a ótica da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, como limitação negativa da autonomia privada, sob pena de ter esvaziado seu conteúdo deontológico. 10. A distribuição do ônus da prova, em tais casos, acaba por sofrer matizações, à luz dos arts. 818 da CLT e 333 do CPC, tendo em vista a aptidão para a produção probatória, a possibilidade de inversão do encargo e de aplicação de presunção relativa. 11. In casu, restou consignado na decisão regional que a reclamada tinha ciência da doença de que era acometido o autor - esquizofrenia - e dispensou-o pouco tempo depois de um período de licença médica para tratamento de desintoxicação de substâncias psicoativas, embora, no momento da dispensa, não fossem evidentes os sintomas da enfermidade. É de se presumir, dessa maneira, discriminatório o despedimento do reclamante. Como consequência, o empregador é que haveria de demonstrar que a dispensa foi determinada por motivo outro que não a circunstância de ser o empregado portador de doença grave. A dispensa discriminatória, na linha da decisão regional, caracteriza abuso de direito, à luz do art. 187 do Código Civil, a teor do qual o exercício do direito potestativo à denúncia vazia do contrato de trabalho, como o de qualquer outro direito, não pode exceder os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. 12. Mais que isso, é de se ponderar que o exercício de uma atividade laboral é aspecto relevante no tratamento do paciente portador de doença grave e a manutenção do vínculo empregatício, por parte do empregador, deve ser entendida como expressão da função social da empresa e da propriedade, sendo, até mesmo, prescindível averiguar o animus discriminatório da dispensa. 13. Ilesos os arts. 5º, II - este inclusive não passível de violação direta e literal, na hipótese -, e 7º, I, da Constituição da República, 818 da CLT e 333, I, do CPC. 14. Precedentes desta Corte. Revista não conhecida, no tema." (RR - 105500-32.2008.5.04.0101, Redatora Ministra Rosa Maria Weber, 3ª Turma, DEJT 05/08/2011) Na realidade, o entendimento consagrado na Súmula 443 do TST contempla aquelas patologias que, pela forma como são contraídas ou sua existência, suscite algum tipo de preconceito ou estigma. Melhor dizendo, objetiva blindar o empregado enfermo contra situações em que a cultura nacional ainda não absorveu o seu estado com naturalidade. Exemplo disso é a AIDS - Síndrome da Imunodeficiência Adquirida -, citada expressamente no verbete, moléstia comumente relacionada, dentre outras causas, ao comportamento sexual promíscuo e desprotegido, ao uso de drogas e substâncias ilícitas, circunstâncias que na atualidade ainda suscitam alta reprovação e preconceito na sociedade. Mas, na espécie, a enfermidade do obreiro, em tese, não gera por si só tal efeito. Ela não suscita discriminação ou preconceito, nem provoca sinais físicos - v. g., mutilação - ou cicatrizes visíveis a gerar trauma e vergonha no empregado, bem como desconforto àquele que com ele convive profissionalmente. A matéria, de nítidos contornos fáticos, demanda análise detida das circunstâncias do caso concreto, de molde a evidenciar a ausência de motivo para a dispensa em face da circunstancial debilidade física do empregado. É o que depreende da recente jurisprudência do TST, conforme denotam os arestos que transcrevo, ad litteram: (...) DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE CARDIOPATIA GRAVE SÚMULA 443/TST. DANO MORAL DECORRENTE DA DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. Presume-se discriminatória a ruptura arbitrária do contrato de trabalho, quando não comprovado um motivo justificável, em face de circunstancial debilidade física causada por doença grave. Esse entendimento pode ser abstraído do contexto geral de normas do nosso ordenamento jurídico, que entende o trabalhador como indivíduo inserto numa sociedade que vela pelos valores sociais do trabalho, pela dignidade da pessoa humana e pela função social da propriedade (arts. 1º, III e IV, e 170, III e VIII, da CF). Não se olvide, outrossim, que faz parte do compromisso do Brasil, também na ordem internacional (Convenção 111 da OIT), o rechaçamento a toda forma de discriminação no âmbito laboral. Na esteira desse raciocínio, foi editada a Súmula 443/TST, que delimita a pacificação da jurisprudência trabalhista neste aspecto, com o seguinte teor: " Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego ". Importante registrar que, seguindo a diretriz normativa proibitória de práticas discriminatórias e limitativas à manutenção da relação de trabalho, tem-se que a não classificação da doença do empregado como suscetível de causar estigma ou preconceito, a teor da Súmula 443 desta Corte Superior, não constitui, por si só, em óbice à constatação da ocorrência de dispensa discriminatória, quando tal prática ilícita emergir do acervo probatório produzido nos autos. Nesse passo, se o ato de ruptura contratual ofende princípios constitucionais basilares, é inviável a preservação de seus efeitos jurídicos. Frise-se, entretanto, que a presunção de ilegalidade do ato de dispensa do empregado portador de doença grave, ressoante na jurisprudência trabalhista, não pode ser de modo algum absoluta, sob risco de se criar uma nova espécie de estabilidade empregatícia totalmente desvinculada do caráter discriminatório que se quer reprimir. Assim, além da viabilidade da dispensa por justa causa, é possível também que a denúncia vazia do contrato de trabalho seja considerada legal e não se repute discriminatório o ato de dispensa. Porém esse não é o caso dos autos. Na hipótese, restou comprovado que o Reclamante trabalhou para a Reclamada no período de 20.09.2007 a 03.06.2017 sendo, também, incontroverso que o Empregado sofreu infarto agudo do miocárdio (tendo sido submetido a Angioplastia com implante de stent para coronária direita, em virtude de lesões ACD com lesão de 90% no 1/3 médio) e que, por conta disso, foi afastado do trabalho, recebendo auxílio doença pelo código 31, no período de 14.03 a 31.08.2016. Além disso, registra o acórdão regional que, quando do retorno do Reclamante ao labor em virtude da cessação de benefício previdenciário, o Obreiro foi demitido sem justa causa em 02.06.2017. Entretanto, o TRT negou provimento ao recurso ordinário do Obreiro quanto ao pleito de indenização por dano moral em razão de despedida discriminatória, por entender que " ainda que possa ser considerada grave, não suscita estigma ou preconceito, de modo que não há falar em presunção de dispensa discriminatória, tal como prevista na Súmula 443 do TST. Nesse cenário, evidencia-se dos elementos fáticos delineados pela Corte Regional que o Reclamante foi dispensado doente e que a Ré detinha conhecimento sobre o seu quadro de saúde, bem como sobre a probabilidade de novos afastamentos em razão da doença - de incontestável natureza grave. Desse modo, considera-se que a decisão regional, ao entender que não houve discriminação na dispensa do Reclamante, foi proferida em dissonância ao entendimento consubstanciado na Súmula 443/TST. Registre-se, outrossim, que a conduta discriminatória é gravemente censurada pela ordem jurídica, especialmente a partir dos comandos constitucionais de 5.10.1988 (Preâmbulo do Texto Máximo; art. 1º, III; art. 3º, I e IV; art. 5º, caput e inciso I; art. 5º, III, in fine, todos preceitos da Constituição da República). Na hipótese, forçoso concluir que é inequívoco o dano moral sofrido pelo Reclamante, pois a caracterização da dispensa discriminatória configura ato ilícito que atentou contra a sua dignidade, a sua integridade psíquica e o seu bem-estar individual - bens imateriais que compõem seu patrimônio moral protegido pela Constituição -, ensejando a reparação moral, conforme autorizam os incisos V e X do art. 5º da Constituição Federal e os arts. 186 e 927, caput, do CCB/2002. Recurso de revista conhecido e provido no tema" (RR-1365-50.2017.5.11.0006, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 11/09/2020). "INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. CARDIOPATIA. No caso, o Regional manteve a sentença em que se concluiu, com base nas provas dos autos, que a dispensa do autor foi discriminatória. Está registrado, no acórdão recorrido, que o autor, no primeiro dia de trabalho, sofreu um infarto e ficou aproximadamente dois meses afastado, e, quando retornou, foi dispensado pela reclamada. Fundamentou a Corte de origem que " a dispensa do trabalhador em situação de vulnerabilidade, de conhecimento do empregador, como no caso em apreço, com dificuldades de reinserção no mercado de trabalho, viola o comando constitucional de valorização do trabalho humano e da busca do pleno emprego ". Destacou que, mesmo " que se entenda que a cardiopatia não se trate de doença que gere estigma ou preconceito, demonstrado que foi o motivo da dispensa do trabalhador, configura-se o abuso de direito, pois excede os limites impostos pelo fim econômico e social, pela boa-fé e pelos bons costumes". A jurisprudência desta Corte posiciona-se no sentido de que a despedida de empregado doente caracteriza ato discriminatório passível de ensejar o direito ao recebimento de indenização por dano moral, razão pela qual não merece reparos a decisão proferida pelo Regional. O fato de a doença do reclamante não ser classificada como grave, que suscite estigma ou preconceito, não impede a constatação da ocorrência de dispensa discriminatória quando esta estiver evidenciada pelo conjunto fático-probatório, hipótese dos autos. Precedentes desta Corte. Recurso de revista não conhecido. VALOR ARBITRADO À INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. O recurso não merece processamento, porquanto os dispositivos indicados não são específicos para discussão sobre valor arbitrado à indenização por danos morais. Recurso de revista não conhecido" (RR-360-41.2018.5.12.0002, 2ª Turma, Relator Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DEJT 29/05/2020). "I - RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA - DISPENSA DISCRIMINATÓRIA - DANOS MORAIS 1. O Tribunal Regional consignou que a dispensa do Autor um dia após seu retorno ao trabalho, em decorrência de anterior afastamento por haver sofrido infarto, derrame e se submetido a intervenção cirúrgica, revestiu-se de caráter discriminatório. Entendimento diverso encontra óbice na Súmula nº 126 do TST. 2. O valor atribuído à verba pela instância ordinária adequa-se à extensão do dano, mormente considerando-se a afirmação do Tribunal Regional de que o autor laborou por quase vinte anos para a Ré, sem nenhuma mácula em seu trabalho. DIFERENÇAS DE AVISO-PRÉVIO - PREVALÊNCIA DA NORMA MAIS BENÉFICA Consoante a jurisprudência da C. SBDI-1, havendo conflito entre convenção coletiva e acordo coletivo de trabalho, devem prevalecer as normas do instrumento que, como um todo, mostra-se mais benéfico para os trabalhadores. Precedentes. HORAS EXTRAS - INVALIDADE DO ACORDO DE COMPENSAÇÃO DE JORNADA A prestação de horas extras habituais descaracteriza o acordo de compensação de jornada. Súmula nº 85, IV, do TST. MULTAS CONVENCIONAIS Uma vez mantida a condenação da Reclamada ao pagamento de horas extras e diferenças de aviso-prévio, afigura-se irreparável o acórdão regional quanto à incidência das multas convencionais alusivas à inobservância dos referidos direitos. Recurso de Revista não conhecido. II - RECURSO DE REVISTA ADESIVO DO RECLAMANTE Exame prejudicado, haja vista o não conhecimento do Recurso de Revista principal. Aplicação do artigo 500, inciso III, do CPC" (RR-972-74.2011.5.09.0594, 8ª Turma, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 04/09/2015). "EMBARGOS. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE CARDIOPATIA GRAVE. DECISÃO DA TURMA QUE CONCEDE A REINTEGRAÇÃO. DESPROVIMENTO A C. Turma entendeu pela caracterização de dispensa discriminatória em razão da dispensa do autor, portador de cardiopatia grave, por retratar ato ilícito, a ensejar reparação. Não há como afastar a nulidade da dispensa sem justa causa, quando não evidenciada motivação lícita, a implicar em presunção de discriminação do empregado, portador de doença grave, e determina o pagamento das remunerações devidas, nos termos do art. 4º, I, da Lei 9.029/95, nos termos do que dispõe a Súmula 443 do c. TST. O poder diretivo do empregador encontra limite nos princípios fundamentais erigidos pela Constituição Federal, em especial o princípio da dignidade da pessoa humana e da proteção à saúde do trabalhador. Cabe ao empregador afastar a presunção de conduta discriminatória quando sua a iniciativa de dispensa de empregado portador de doença grave, comprovando a motivação diversa da mera discriminação, para o fim de efetivação dos direitos fundamentais à saúde e ao trabalho. Embargos conhecidos e desprovido. AGRAVO. EMBARGOS NÃO ADMITIDOS. DANO MORAL DECORRENTE DA DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. DESPROVIMENTO. Não merece reforma decisão que não admite Embargos, constatado o não cumprimento do requisito do art. 894, II, da CLT. Agravo desprovido" (Ag-ED-E-ED-RR-10294-11.2019.5.15.0097, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Aloysio Correa da Veiga, DEJT 29/07/2022). Fixada tal premissa, e volvendo à causa de pedir, reitero que o móvel do pedido residiu na dispensa sem justa causa do empregado, logo após a apresentação de atestado e no curso da licença médica. Na distribuição subjetiva do ônus da prova, entendo ser o inicial do autor para trazer, quando menos, indícios suficientes a demonstrar a pertinência de sua tese. Daí em diante ele é deslocado, por dinâmico que é, para a empregadora, pois as circunstâncias que afloram nessas espécies de rescisão são usualmente ocultadas, de sorte a mascarar o seu real motivo. Consigno, ainda, que o regramento do art. 818, incisos I e II, da CLT, não colide com a proposição adotada, que encontra eco nas decisões da mais alta corte trabalhista, como revelam os precedentes transcritos. No caso concreto não paira dissenso que foi concedido atestado médico ao autor em 21/08/2023 (fls. 31/32), em virtude de lesão no ombro direito, enquanto a dispensa foi realizada quatro dias depois, em 25/08/2023 (fls. 151/152). Todavia, não há prova mínima da entrega do documento à empregadora, o que efetivamente retira a consistência do núcleo da pretensão; ao reverso, a prova colhida vai de encontro à versão do obreiro. Em audiência, o reclamante declarou inicialmente que não comunicou à empresa acerca do atestado emitido em 21/08/2023, já que estava em teletrabalho e em semana de reunião - em suas palavras, "...fiquei ali na minha, fazendo meu serviço..." (aos 11:16 minutos). Na sequência, porém, ventilou o envio do documento ao seu superior hierárquico pelo aplicativo WhatsApp, o que, importa dizer, além da contradição, não encontra eco na prova documental e oral produzida. A par disso, ele reconheceu que o diretor que o dispensou declarou desconhecer a condição médica ora agitada, por ocasião da comunicação de rescisão - cenário, aliás, em sintonia com o e-mail de fl. 150 -, como também admitiu que não enviou o atestado após o evento, pois achou desimportante no contexto. No mais registro que a testemunha ouvida apenas relatou o uso de tipoia pelo autor em algumas reuniões, o que é insuficiente para os fins almejados. Em suma, não há elementos capazes de revelar a ciência da empresa acerca do afastamento médico à época da dispensa, tal como decidido na origem, do que decorre a insubsistência da alegada dispensa discriminatória. Desse modo, o pleito de recebimento de salário pelo período da garantia de emprego carece de suporte fático, e em sendo ela inexistente não há falar também na postulada indenização por danos morais. A tese obreira, na realidade, encontra estofo tão-somente nas suas alegações, as quais não encerram suficiência para autorizar o reconhecimento do fato gerador do dano. Por outro lado, o princípio da continuidade tem como estofo a preservação da fonte de trabalho, com o objetivo de dar segurança ao empregado para o seu sustento e de sua família, motivo da preferência explícita da norma consolidada pelos contratos por prazo indeterminado. Idêntico raciocínio é aplicável quando da manutenção do pacto laboral, nas hipóteses de sua interrupção ou suspensão, que em virtude de certos fatos levam à paralisação transitória da prestação de serviços. Conforme dispõem os arts. 471 a 476 da CLT, o evento em exame produz efeitos no contrato. Assim, tanto na interrupção quanto na suspensão há uma cessação temporária do labor, mas não há a extinção contratual. Apenas a sua execução é que fica suspensa - as denominadas descontinuidades executivas parcial ou total (CATHARINO). Em ambos os casos o empregador fica impossibilitado de resolver o contrato de emprego, salvo justa causa ou extinção da empresa. Em outros termos, a licença médica, ainda que sem afastamento previdenciário, suspende, ope legis, o contrato de emprego, fenômeno que impossibilidade a regular extinção da relação empregatícia enquanto perdurar a situação. Nesse sentido invoco a inteligência da Súmula 371 do TST, de sorte que os efeitos da dispensa somente são concretizados após o fim do período de afastamento médico, sem que isso importe, no entanto, o direito à garantia provisória ao emprego. Em consequência a dispensa é válida; ela apenas tem seus efeitos protraídos para o dia seguinte ao término da licença médica. Desse modo, é devida apenas a retificação da CPTS do obreiro (CLT, art. 39, §2º), sendo oportuno esclarecer que descabe falar no pagamento de salários, e idêntica sorte apanha os consectários. Ademais, o empregador não tem a obrigação em realizar os depósitos de FGTS, porque, segundo a disciplina do art. 15, § 5º, da Lei nº 8.036/1990, somente os afastamentos ocasionados pela prestação do serviço militar obrigatório e licença por acidente do trabalho impõem o recolhimento mensal da verba. E, como visto, o caso é diverso do tratado no preceito. Em conclusão, dou parcial provimento ao recurso obreiro, apenas para fixar como data do término do contrato de trabalho e seus efeitos o dia 25/01/2024, já observada a projeção do aviso prévio, além de determinar a retificação das anotações da sua CTPS. CONCLUSÃO Rejeito a preliminar suscitada, conheço dos recursos e no mérito nego provimento ao interposto pela empresa, além de prover, em parte, o do reclamante, para fixar como término do contrato de trabalho o dia 25/01/2024 e determinar a retificação das anotações da sua CTPS, tudo nos estritos termos da fundamentação. ACÓRDÃO Por tais fundamentos, ACORDAM os Desembargadores da Segunda Turma do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da Décima Região, em Sessão Ordinária, à vista do contido na certidão de julgamento (fl. retro), aprovar o relatório, rejeitar a preliminar suscitada, conhecer dos recursos e no mérito negar provimento ao interposto pela empresa, além de prover, em parte, o do reclamante, nos termos do voto do Relator. Desembargador João Amilcar Silva e Souza Pavan Relator(a) DECLARAÇÃO DE VOTO BRASILIA/DF, 22 de abril de 2025. FRANCISCA DAS CHAGAS SOUTO , Servidor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - RICARDO TURBIANI

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ID: 258969480

Tribunal: TRT10 Órgão: 2ª Turma Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0001269-07.2023.5.10.0021

Data de Disponibilização: 23/04/2025

Polo Ativo:

COMERCIAL ROFE LTDA MINISTéRIO PúBLICO DO TRABALHO RICARDO TURBIANI

Polo Passivo:

COMERCIAL ROFE LTDA RICARDO TURBIANI

Acórdão

Advogados:

TTHAYSON D CESARES SANTANA QUEIROZ

OAB/DF XXXXXX Desbloquear

DIEGO MENEZES SOARES

OAB/MA XXXXXX Desbloquear

CESAR HENRIQUE SANTOS PIRES FILHO

OAB/MA XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 2ª TURMA Relator: JOAO AMILCAR SILVA E SOUZA PAVAN 0001269-07.2023.5.10.0021 : RICARDO TURBIANI E OUTROS (1) :… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 2ª TURMA Relator: JOAO AMILCAR SILVA E SOUZA PAVAN 0001269-07.2023.5.10.0021 : RICARDO TURBIANI E OUTROS (1) : RICARDO TURBIANI E OUTROS (1) PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO PROCESSO n.º 0001269-07.2023.5.10.0021 - RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA (1009) RELATOR(A): Desembargador João Amilcar Silva e Souza Pavan RECORRENTE: RICARDO TURBIANI ADVOGADO: TTHAYSON D CESARES SANTANA QUEIROZ RECORRENTE: COMERCIAL ROFE LTDA ADVOGADO: DIEGO MENEZES SOARES ADVOGADO: CESAR HENRIQUE SANTOS PIRES FILHO RECORRIDO: OS MESMOS ORIGEM: 21ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA/DF CLASSE ORIGINÁRIA: Ação Trabalhista - Rito Ordinário (JUÍZA MARIANA NASCIMENTO PEREIRA) EMENTA SALÁRIO INFORMAL. COMPLEMENTO DE REMUNERAÇÃO. PREMIAÇÃO. PROVA. ÔNUS. 1. O ônus de provar a percepção de salário informal é do empregado, por ser fato constitutivo do direito às parcelas postuladas em juízo (art. 818, inciso I, da CLT). 2. Satisfeito o encargo sob o prisma da complementação da remuneração mensal, são devidas as repercussões legais da parcela. Já quanto às alegadas comissões solvidas de forma marginal, não há espaço para as irradiações postuladas, porquanto demonstrada a vinculação de tais valores à satisfação de premiação pelo atingimento de metas, a teor do art. 457, §1º, da CLT. CONTRATO DE EMPREGO. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. REQUISITOS. DANO MORAL. 1. A Lei nº 9.029/1995, ao enumerar atos passíveis de cristalizar a dispensa discriminatória, não exibe rol restritivo, apanhando também todas aquelas situações nas quais uma característica pessoal do empregado impulsiona a rescisão do contrato. 2. Ausentes elementos capazes de desvelar o ato, o qual encerraria a potencialidade de viciar o ato da dispensa, gerando lesão ao patrimônio imaterial do empregado, inexiste espaço para reconhecer o ilícito ventilado, a postulada garantia de emprego ou o dever de indenizar. CONTRATO DE TRABALHO. SUSPENSÃO. LICENÇA MÉDICA. EFEITOS. Em razão da suspensão do contrato, por motivo de licença médica, cabe apenas a postergação da data de dispensa do empregado, com a retificação das anotações da sua CTPS. Recursos conhecidos, com o parcial provimento do interposto pelo reclamante. RELATÓRIO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima descritas. A MM. 21ª Vara do Trabalho de Brasília/DF julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados, condenando a reclamada ao pagamento de reflexos decorrentes da percepção de salário informal. De resto, concedeu ao autor os benefícios da justiça gratuita e impôs às partes a satisfação de honorários advocatícios (fls. 336/343). Inconformado, o reclamante interpõe recurso ordinário. Reafirma de início a percepção de comissões às margens dos recibos, postulando a declaração da sua natureza salarial, com irradiação sobre as demais parcelas do contrato. Defende, ainda, a nulidade da dispensa, com as consequências daí advindas, inclusive sob o prisma da reparação moral (fls. 346/350). A empresa apresentou contrarrazões (fls. 363/370), e ato contínuo interpôs recurso adesivo, atacando a obrigação de pagar imposta com lastro na inadequada apreciação da prova oral (fls. 353/358). Comprovantes de recolhimento das custas processuais e do depósito recursal às fls. 359/362. Conquanto intimado, o reclamante não apresentou contrariedade (fl. 372). Os autos não foram remetidos ao d. Ministério Público do Trabalho, na forma regimental. É o relatório. VOTO ADMISSIBILIDADE. A reclamada ventila o não conhecimento do recurso do empregado, acenando com a ausência de dialeticidade (fls. 365/366). Todavia, não extraio o indigitado vício processual, uma vez que das razões lançadas é possível extrair efetivamente que houve impugnação aos fundamentos da r. decisão. Em outros termos, o eventual acolhimento das teses ventiladas no recurso bastaria para reverter o resultado desfavorável à parte - logo, vislumbro satisfeito o requisito do preceito legal em comento. De resto, os recursos são próprios, tempestivos e o da empresa conta com regular preparo, detendo os sucumbentes recíprocos boa representação processual. Presentes os demais pressupostos legais, rejeito a preliminar suscitada e deles conheço. SALÁRIO INFORMAL. COMPLEMENTO DE REMUNERAÇÃO. PREMIAÇÃO. PROVA. ÔNUS. O obreiro, admitido em 03/10/2022 como gerente comercial, afirmou que auferia a remuneração lançada nos recibos, além de frações informais, por meio de depósito em cartão, nos importes de R$ 2.500,00 e R$ 4.500,00 por mês, respectivamente, a título de salário e comissões (fls. 03/07). Postulou, assim, a percepção dos correspondentes reflexos (fls. 19/20). A empregadora, por sua vez, negou a prática, asseverando, especificamente quanto às ditas comissões, que na verdade havia a satisfação de premiação no caso do cumprimento de metas (fls. 124/131). E a r. sentença julgou procedente o pedido tão somente sob a ótica da complementação da remuneração mensal, acolhendo, por outro lado, a tese da defesa relativa aos prêmios (fls. 337/338), desfecho atacado por ambos os litigantes. O autor reafirma o pagamento informal de comissões às fls. 348/349, enquanto a empresa contrasta a obrigação imposta, vinculando os depósitos remanescentes no cartão ao custeio de despesas (fls. 355/357). De início, quanto ao apelo do reclamante, entendo ser necessário estabelecer as premissas jurídicas da matéria devolvida à revisão, especialmente à luz das alterações defluentes da Lei nº 13.467/2017, inclusive considerando que a relação jurídica em análise iniciou após a vigência da norma. O salário pode ser compreendido, de forma singela, como aquele universo contraprestativo dado pelo empregador, como decorrência direta do aproveitamento do resultado da força de trabalho do empregado. Não se trata de parcela única, nem mesmo no seu conceito stricto sensu, mas sim todas aquelas ajustadas entre as partes, de sorte a fazer face, diretamente, à prestação de serviços (CATHARINO). Ele diz àquelas atividades ordinárias ou usuais do trabalhador, quando em atuação ou aguardando ordens, constituindo o mínimo devido ao último, mas obviamente tal perímetro engloba, quando menos, o salário variável. No pagamento de comissões a empregadora destina determinada fração de seu faturamento ao empregado, de forma proporcional ao seu desempenho, e ainda assim o ordenamento jurídico repele qualquer contraste à feição salarial da parcela - art. 457, § 1º, da CLT. Elas naturalmente são variáveis, de acordo com seu fato gerador, mas ainda assim tal circunstância não altera a sua substância explícita, como contraprestação que é pelo labor desempenhado pelo empregado. Da mesma forma, e apenas com denominação diversa, o adicional de produtividade decorre também do volume da atividade primária, ou usual, do empregado, variando de acordo com os resultados finais do fruto de seu trabalho. A única distinção entre as duas está situada na fonte do pagamento, pois as comissões, normalmente, decorrem da celebração de negócios com terceiros, enquanto a produtividade é intrínseca às partes integrantes do vínculo de emprego. Já os prêmios, no cenário jurídico atual, vêm disciplinados no § 4º do art. 457 da CLT, in verbis: "§ 4º Consideram-se prêmios as liberalidades concedidas pelo empregador em forma de bens, serviços ou valor em dinheiro a empregado ou a grupo de empregados, em razão de desempenho superior ao ordinariamente esperado no exercício de suas atividades." Segundo o preceito, dois são os elementos de interesse - a liberalidade concedida pelo empregador (a), aliada à sua vinculação ao "...desempenho superior ao ordinariamente esperado..." do empregado (b) -, e eles, data venia das razões recursais, emergem com tranquilidade do acervo probatório. Nesse sentido, logo no início do seu depoimento, o autor qualificou a parcela por ele impugnada como premiação. Na sequência, não só discorreu sobre a forma de apuração, evidenciando o cálculo atrelado ao cumprimento de metas, com atribuição de pontuação em diversos indicadores de rendimento, como admitiu que ela não era devida nos meses em que não atingida nota mínima (a partir dos 02:16 minutos). Tal relato, aliás, está em harmonia com as planilhas juntadas pela empresa às fls. 260/266, contexto a atrair a improcedência do pleito. A propósito, apenas acrescento que o meio de pagamento adotado, assim como a fixação de critérios relacionados às vendas realizadas ou mesmo a habitualidade do ato não resultam, por si só, no reconhecimento postulado, sendo o de interesse a vinculação da parcela ao atingimento de metas específicas e pré-determinadas, acima da expectativa - justamente a hipótese dos autos. Superada tal questão, observo que a empregadora busca, no recurso adesivo, afastar o reconhecimento de salário informal - destinado à complementação da remuneração mensal - com estofo nos depoimentos prestados, atrelando os depósitos remanescentes realizados no cartão ao reembolso de despesas, o que também não merece prosperar. Ora, a contestação no aspecto apenas refutou a existência de remuneração à margem dos recibos, sequer ventilando o alegado ressarcimento - a perspectiva, assim, sugerida de relance apenas nas razões finais (fls. 325/326), apresenta nítidos contornos inovatórios. A par disso, a preposta afirmou desconhecer a satisfação de quantias mensais no cartão do autor, com exceção das premiações (aos 9:33 minutos), o que reforça a inconsistência da argumentação. Noutro giro a única testemunha ouvida apenas declarou a sua situação pessoal a tal respeito (dos 03:52 aos 05:45 minutos) - até há posteriormente relato de saques dos valores depositados no cartão pelo autor, mas nitidamente relacionados às premiações (07:55 minutos) -, não sendo possível espargir, por presunção, efeitos dessa realidade ao obreiro. De resto o reclamante claramente defende a conduta fraudulenta da empresa em audiência, não havendo espaço para cogitar da confissão real ventilada. Com efeito, ele asseverou que, embora o cartão fosse em tese destinado ao custeio de alimentação, ele era utilizado para fins de satisfação de complementação do salário e premiação, visando burlar a legislação trabalhista (a partir dos 42 segundos). Logo, não há como acolher as perspectivas ora defendidas pela reclamada, devendo a r. sentença ser mantida no particular. Nego provimento aos recursos. CONTRATO DE EMPREGO. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. REQUISITOS. DANO MORAL. O reclamante afirmou que em virtude do agravamento de lesão sofrida em junho de 2023 foi-lhe concedido atestado médico em 21/08/2023, de cento e vinte dias, documento entregue à empresa. Alegou a seguir que, embora o seu estado de saúde fosse de conhecimento de todos, a empregadora optou por dispensá-lo em 25/08/2023, ou seja, logo após a apresentação do atestado e no curso da licença médica. Nesse contexto, defendeu o caráter discriminatório do ato, postulando o reconhecimento da sua nulidade, além do recebimento das remunerações durante o período do afastamento médico e indenização por dano moral (fls. 04/14). Já a empregadora argumentou que jamais recebeu a aludida ordem médica, sendo a dispensa assentada, em verdade, na produtividade do obreiro (fls. 125/127). O juízo de primeiro grau, por sua vez, entendeu que o autor não comprovou a ciência da empresa acerca do seu estado de saúde no momento da dispensa e julgou improcedentes os pedidos formulados (fls. 338/341), daí o recurso em exame. Em suas razões o reclamante reafirma a comunicação da sua condição médica à empresa, aduzindo, a par disso, que a rescisão deve ser considerada nula ainda que a ciência da incapacidade tenha ocorrido após o ato. Pede, pois, o provimento do apelo, para que seja reconhecida a nulidade da dispensa, com o pagamento das indenizações daí decorrentes, inclusive de ordem moral (fls. 349/350). A Lei nº 9.029/1995, ao enumerar os motivos ensejadores do reconhecimento da dispensa discriminatória, assim dispõe, in verbis: "Art. 1º Fica proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso a relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, ressalvadas, neste caso, as hipóteses de proteção ao menor previstas no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal. Art. 2º Constituem crime as seguintes práticas discriminatórias: I - a exigência de teste, exame, perícia, laudo, atestado, declaração ou qualquer outro procedimento relativo à esterilização ou a estado de gravidez; II - a adoção de quaisquer medidas, de iniciativa do empregador, que configurem; a) indução ou instigamento à esterilização genética; b) promoção do controle de natalidade, assim não considerado o oferecimento de serviços e de aconselhamento ou planejamento familiar, realizados através de instituições públicas ou privadas, submetidas às normas do Sistema Único de Saúde (SUS)." Ainda que aparente reger apenas aquelas situações específicas e limitadas, em verdadeiro rol da modalidade numerus clausus, a jurisprudência trabalhista está direcionada a interpretar a norma de modo amplo, como instrumento de concretização da Convenção nº 111 da OIT e os princípios inseridos no art. 3º, incisos III e IV, da CF. Assim, permito-me apenas transcrever algumas ementas dispondo nesse sentido, ad litteram: "AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA - GARANTIA CONTRATUAL DE EMPREGO - DISPENSA ARBITRÁRIA - RETALIAÇÃO PELA PROPOSITURA DE RECLAMAÇÃO TRABALHISTA CONTRA O EMPREGADOR - INDENIDADE - NULIDADE DA DISPENSA- REINTEGRAÇÃO AO EMPREGO. A Corte regional registrou que, por meio de norma intitulada -Política de Avaliação e Desenvolvimento-, o reclamado instituiu um rigoroso sistema de avaliação dos trabalhadores, vinculando-se, por conseguinte, à adoção dos critérios ali estabelecidos para dispensa de pessoal. Nesse contexto, diante da evidência fática de que o reclamante obteve o melhor conceito nas avaliações às quais o reclamado se vinculou e, no entanto, foi dispensado arbitrariamente como forma de retaliação pelo exercício do direito constitucional de acesso ao Poder Judiciário, decidiu a Corte a quo reintegrar o trabalhador no emprego. A incorporação de condição mais benéfica estabelecida pela empresa ao contrato de trabalho decorre do princípio protetivo, que determina o caráter prospectivo do contrato de trabalho. Assim, o direito de não ser dispensado arbitrariamente se agrega ao patrimônio jurídico do trabalhador quando a empresa, por liberalidade, institui critérios para dispensados seus empregados. Nesse sentido, não há violação dos arts. 5º, II, da Constituição Federal e 482 da CLT na decisão regional, porquanto a controvérsia foi dirimida em razão do estatuto contratual singular verificado nos autos. E, ainda que assim não fosse, a conduta empresarial de perseguir o trabalhador em razão do exercício regular do direito de ação também pode ser enquadrada no disposto no art. 1º da Lei nº 9.029/95, ensejando, de toda sorte, a reintegração do empregado, nos termos do art. 4º deste diploma legal. O direito do trabalhador de reclamar judicialmente contra as violações dos seus direitos laborais merece ser garantido em face de medidas de retaliação que ameacem a sua permanência no emprego, sob pena de inviabilizar a atuação do Poder Judiciário trabalhista no curso das relações de emprego. Cabe aqui a utilização do direito comparado, nos termos do art. 8º da CLT, a fim de trazer, do direito espanhol, a construção jurídica a partir da qual emergiu a garantia de indenidade, compreendida como a imunização que previne o trabalhador contra a represália empresarial a partir de quando ele ajuíza uma ação judicial em face do seu empregador-. O art. 7º, I, da Constituição Federal não pode ser interpretado como um direito absoluto do empregador de dispensar imotivadamente, em detrimento dos demais bens jurídicos preservados pela ordem constitucional. Nesse sentido, a interpretação do art. 1° da Lei n° 9.029/95, à luz dos fundamentos da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho insculpidos no art. 1º, III e IV, da Constituição Federal, bem como à luz do princípio da não discriminação contido no art. 3º, IV, da Lei Maior e amparado internacionalmente pela Convenção nº 111 da OIT, conduz à conclusão de que o rol de discriminações ali contidas não é taxativo, devendo abranger também a decorrente do exercício do direito de ação, porque o objetivo da diretriz constitucional vedatória da discriminação, num Estado Democrático de Direito, é afastar dos cidadãos toda constrição de direitos pautada em critérios ilegítimos, independentemente de quais sejam esses critérios. Agravo de instrumento desprovido." (grifos acrescidos) (AIRR - 77700-47.2009.5.04.0019, Relator Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, 4ª Turma, DEJT 28/09/2012) "RECURSO DE REVISTA. EMPREGADO PORTADOR DO VÍRUS HIV. PRESUNÇÃO DE DESPEDIDA DISCRIMINATÓRIA. REINTEGRAÇÃO. 1. O ordenamento jurídico nacional e internacional (CF, art. 1º, III e IV, e Lei nº 9.029/95; Convenção nº 111 da Organização Internacional do Trabalho) contempla regras que vedam práticas discriminatórias para efeitos admissionais e de manutenção da relação jurídica de trabalho. 2. Em consonância com tal regramento, a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho é firme no sentido de que, ciente de que o empregado é portador do vírus HIV, presume-se discriminatório, e arbitrário, o exercício do direito potestativo de dispensa pelo empregador, salvo na hipótese de resolução motivada do contrato de trabalho. 3. No caso presente, evidenciado que o empregador abusou de seu direito ao despedir empregado acometido de doença grave, anula-se o ato e determina-se a reintegração do reclamante no emprego, permitindo-lhe manter condições dignas de sobrevivência pessoal e familiar, ao mesmo tempo em que se desestimula a despedida motivada apenas pelo preconceito, e não por motivo disciplinar, técnico, econômico ou financeiro. Recurso de revista conhecido e provido. (RR - 281540-92.2005.5.02.0014, Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa, 1ª Turma, DEJT 21/09/2012); "RECURSO DE REVISTA. REINTEGRAÇÃO NO EMPREGO. DISPENSA ARBITRÁRIA. TRABALHADOR PORTADOR DE ESQUIZOFRENIA. 1. O sistema jurídico pátrio consagra a despedida sem justa causa como direito potestativo do empregador, o qual, todavia, não é absoluto, encontrando limites, dentre outros, no princípio da não discriminação, com assento constitucional. A motivação discriminatória na voluntas que precede a dispensa implica a ilicitude desta, pelo abuso que traduz, a viciar o ato, eivando-o de nulidade. 2. A proteção do empregado contra discriminação, independente de qual seja sua causa, emana dos pilares insculpidos na Constituição da República Federativa do Brasil, notadamente os arts. 1º, III e IV, 3º, IV, 5º, caput e XLI, e 7º, XXX. 3. Acerca da dignidade da pessoa humana, destaca Ingo Wolfgang Sarlet, em sua obra -Eficácia dos Direitos Fundamentais- (São Paulo: Ed. Livraria do Advogado, 2001, pp. 110-1), que -constitui pressuposto essencial para o respeito da dignidade da pessoa humana a garantia da isonomia de todos os seres humanos, que não podem ser submetidos a tratamento discriminatório e arbitrário, razão pela qual são intoleráveis a escravidão, a discriminação racial, perseguição em virtude de motivos religiosos, etc. (...). O que se percebe, em última análise, é que onde não houver respeito pela vida e pela integridade física do ser humano, onde as condições mínimas para uma existência digna não forem asseguradas, onde a intimidade e identidade do indivíduo forem objeto de ingerências indevidas, onde sua igualdade relativamente aos demais não for garantida, bem como onde não houver limitação do poder, não haverá espaço para a dignidade da pessoa humana, e esta não passará de mero objeto de arbítrio e injustiças-. 4. O exercício do direito potestativo de denúncia vazia do contrato de trabalho sofre limites, igualmente, pelo princípio da proteção da relação de emprego contra despedida arbitrária, erigido no art. 7º, I, da Constituição - embora ainda não regulamentado, mas dotado de eficácia normativa -, e pelo princípio da função social da propriedade, conforme art. 170, III, da Lei Maior. 5. Na espécie, é de se sopesar, igualmente, o art. 196 da Carta Magna, que consagra a saúde como -direito de todos e dever do Estado-, impondo a adoção de políticas sociais que visem à redução de agravos ao doente. 6. Nesse quadro, e à luz do art. 8º, caput, da CLT, justifica-se hermenêutica ampliativa da Lei 9.029/95, cujo conteúdo pretende concretizar o preceito constitucional da não-discriminação no tocante ao estabelecimento e continuidade do pacto laboral. O art. 1º do diploma legal proíbe a adoção de qualquer prática discriminatória para efeito de acesso a relação de emprego, ou sua manutenção. Não obstante enumere certas modalidades de práticas discriminatórias, em razão de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, o rol não pode ser considerado numerus clausus, cabendo a integração pelo intérprete, ao se defrontar com a emergência de novas formas de discriminação. 7. De se observar que aos padrões tradicionais de discriminação, como os baseados no sexo, na raça ou na religião, práticas ainda disseminadas apesar de há muito conhecidas e combatidas, vieram a se somar novas formas de discriminação, fruto das profundas transformações das relações sociais ocorridas nos últimos anos, e que se voltam contra portadores de determinadas moléstias, dependentes químicos, homossexuais e, até mesmo, indivíduos que adotam estilos de vida considerados pouco saudáveis. Essas formas de tratamento diferenciado começam a ser identificadas à medida que se alastram, e representam desafios emergentes a demandar esforços com vistas à sua contenção. 8. A edição da Lei 9.029/95é decorrência não apenas dos princípios embasadores da Constituição Cidadã, mas também de importantes tratados internacionais sobre a matéria, como as Convenções 111 e 117 e a Declaração sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, de 1998, todas da OIT. 9. O arcabouço jurídico sedimentado em torno da matéria deve ser considerado, outrossim, sob a ótica da eficácia horizontal dos direitos fundamentais, como limitação negativa da autonomia privada, sob pena de ter esvaziado seu conteúdo deontológico. 10. A distribuição do ônus da prova, em tais casos, acaba por sofrer matizações, à luz dos arts. 818 da CLT e 333 do CPC, tendo em vista a aptidão para a produção probatória, a possibilidade de inversão do encargo e de aplicação de presunção relativa. 11. In casu, restou consignado na decisão regional que a reclamada tinha ciência da doença de que era acometido o autor - esquizofrenia - e dispensou-o pouco tempo depois de um período de licença médica para tratamento de desintoxicação de substâncias psicoativas, embora, no momento da dispensa, não fossem evidentes os sintomas da enfermidade. É de se presumir, dessa maneira, discriminatório o despedimento do reclamante. Como consequência, o empregador é que haveria de demonstrar que a dispensa foi determinada por motivo outro que não a circunstância de ser o empregado portador de doença grave. A dispensa discriminatória, na linha da decisão regional, caracteriza abuso de direito, à luz do art. 187 do Código Civil, a teor do qual o exercício do direito potestativo à denúncia vazia do contrato de trabalho, como o de qualquer outro direito, não pode exceder os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. 12. Mais que isso, é de se ponderar que o exercício de uma atividade laboral é aspecto relevante no tratamento do paciente portador de doença grave e a manutenção do vínculo empregatício, por parte do empregador, deve ser entendida como expressão da função social da empresa e da propriedade, sendo, até mesmo, prescindível averiguar o animus discriminatório da dispensa. 13. Ilesos os arts. 5º, II - este inclusive não passível de violação direta e literal, na hipótese -, e 7º, I, da Constituição da República, 818 da CLT e 333, I, do CPC. 14. Precedentes desta Corte. Revista não conhecida, no tema." (RR - 105500-32.2008.5.04.0101, Redatora Ministra Rosa Maria Weber, 3ª Turma, DEJT 05/08/2011) Na realidade, o entendimento consagrado na Súmula 443 do TST contempla aquelas patologias que, pela forma como são contraídas ou sua existência, suscite algum tipo de preconceito ou estigma. Melhor dizendo, objetiva blindar o empregado enfermo contra situações em que a cultura nacional ainda não absorveu o seu estado com naturalidade. Exemplo disso é a AIDS - Síndrome da Imunodeficiência Adquirida -, citada expressamente no verbete, moléstia comumente relacionada, dentre outras causas, ao comportamento sexual promíscuo e desprotegido, ao uso de drogas e substâncias ilícitas, circunstâncias que na atualidade ainda suscitam alta reprovação e preconceito na sociedade. Mas, na espécie, a enfermidade do obreiro, em tese, não gera por si só tal efeito. Ela não suscita discriminação ou preconceito, nem provoca sinais físicos - v. g., mutilação - ou cicatrizes visíveis a gerar trauma e vergonha no empregado, bem como desconforto àquele que com ele convive profissionalmente. A matéria, de nítidos contornos fáticos, demanda análise detida das circunstâncias do caso concreto, de molde a evidenciar a ausência de motivo para a dispensa em face da circunstancial debilidade física do empregado. É o que depreende da recente jurisprudência do TST, conforme denotam os arestos que transcrevo, ad litteram: (...) DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE CARDIOPATIA GRAVE SÚMULA 443/TST. DANO MORAL DECORRENTE DA DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. Presume-se discriminatória a ruptura arbitrária do contrato de trabalho, quando não comprovado um motivo justificável, em face de circunstancial debilidade física causada por doença grave. Esse entendimento pode ser abstraído do contexto geral de normas do nosso ordenamento jurídico, que entende o trabalhador como indivíduo inserto numa sociedade que vela pelos valores sociais do trabalho, pela dignidade da pessoa humana e pela função social da propriedade (arts. 1º, III e IV, e 170, III e VIII, da CF). Não se olvide, outrossim, que faz parte do compromisso do Brasil, também na ordem internacional (Convenção 111 da OIT), o rechaçamento a toda forma de discriminação no âmbito laboral. Na esteira desse raciocínio, foi editada a Súmula 443/TST, que delimita a pacificação da jurisprudência trabalhista neste aspecto, com o seguinte teor: " Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego ". Importante registrar que, seguindo a diretriz normativa proibitória de práticas discriminatórias e limitativas à manutenção da relação de trabalho, tem-se que a não classificação da doença do empregado como suscetível de causar estigma ou preconceito, a teor da Súmula 443 desta Corte Superior, não constitui, por si só, em óbice à constatação da ocorrência de dispensa discriminatória, quando tal prática ilícita emergir do acervo probatório produzido nos autos. Nesse passo, se o ato de ruptura contratual ofende princípios constitucionais basilares, é inviável a preservação de seus efeitos jurídicos. Frise-se, entretanto, que a presunção de ilegalidade do ato de dispensa do empregado portador de doença grave, ressoante na jurisprudência trabalhista, não pode ser de modo algum absoluta, sob risco de se criar uma nova espécie de estabilidade empregatícia totalmente desvinculada do caráter discriminatório que se quer reprimir. Assim, além da viabilidade da dispensa por justa causa, é possível também que a denúncia vazia do contrato de trabalho seja considerada legal e não se repute discriminatório o ato de dispensa. Porém esse não é o caso dos autos. Na hipótese, restou comprovado que o Reclamante trabalhou para a Reclamada no período de 20.09.2007 a 03.06.2017 sendo, também, incontroverso que o Empregado sofreu infarto agudo do miocárdio (tendo sido submetido a Angioplastia com implante de stent para coronária direita, em virtude de lesões ACD com lesão de 90% no 1/3 médio) e que, por conta disso, foi afastado do trabalho, recebendo auxílio doença pelo código 31, no período de 14.03 a 31.08.2016. Além disso, registra o acórdão regional que, quando do retorno do Reclamante ao labor em virtude da cessação de benefício previdenciário, o Obreiro foi demitido sem justa causa em 02.06.2017. Entretanto, o TRT negou provimento ao recurso ordinário do Obreiro quanto ao pleito de indenização por dano moral em razão de despedida discriminatória, por entender que " ainda que possa ser considerada grave, não suscita estigma ou preconceito, de modo que não há falar em presunção de dispensa discriminatória, tal como prevista na Súmula 443 do TST. Nesse cenário, evidencia-se dos elementos fáticos delineados pela Corte Regional que o Reclamante foi dispensado doente e que a Ré detinha conhecimento sobre o seu quadro de saúde, bem como sobre a probabilidade de novos afastamentos em razão da doença - de incontestável natureza grave. Desse modo, considera-se que a decisão regional, ao entender que não houve discriminação na dispensa do Reclamante, foi proferida em dissonância ao entendimento consubstanciado na Súmula 443/TST. Registre-se, outrossim, que a conduta discriminatória é gravemente censurada pela ordem jurídica, especialmente a partir dos comandos constitucionais de 5.10.1988 (Preâmbulo do Texto Máximo; art. 1º, III; art. 3º, I e IV; art. 5º, caput e inciso I; art. 5º, III, in fine, todos preceitos da Constituição da República). Na hipótese, forçoso concluir que é inequívoco o dano moral sofrido pelo Reclamante, pois a caracterização da dispensa discriminatória configura ato ilícito que atentou contra a sua dignidade, a sua integridade psíquica e o seu bem-estar individual - bens imateriais que compõem seu patrimônio moral protegido pela Constituição -, ensejando a reparação moral, conforme autorizam os incisos V e X do art. 5º da Constituição Federal e os arts. 186 e 927, caput, do CCB/2002. Recurso de revista conhecido e provido no tema" (RR-1365-50.2017.5.11.0006, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 11/09/2020). "INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. CARDIOPATIA. No caso, o Regional manteve a sentença em que se concluiu, com base nas provas dos autos, que a dispensa do autor foi discriminatória. Está registrado, no acórdão recorrido, que o autor, no primeiro dia de trabalho, sofreu um infarto e ficou aproximadamente dois meses afastado, e, quando retornou, foi dispensado pela reclamada. Fundamentou a Corte de origem que " a dispensa do trabalhador em situação de vulnerabilidade, de conhecimento do empregador, como no caso em apreço, com dificuldades de reinserção no mercado de trabalho, viola o comando constitucional de valorização do trabalho humano e da busca do pleno emprego ". Destacou que, mesmo " que se entenda que a cardiopatia não se trate de doença que gere estigma ou preconceito, demonstrado que foi o motivo da dispensa do trabalhador, configura-se o abuso de direito, pois excede os limites impostos pelo fim econômico e social, pela boa-fé e pelos bons costumes". A jurisprudência desta Corte posiciona-se no sentido de que a despedida de empregado doente caracteriza ato discriminatório passível de ensejar o direito ao recebimento de indenização por dano moral, razão pela qual não merece reparos a decisão proferida pelo Regional. O fato de a doença do reclamante não ser classificada como grave, que suscite estigma ou preconceito, não impede a constatação da ocorrência de dispensa discriminatória quando esta estiver evidenciada pelo conjunto fático-probatório, hipótese dos autos. Precedentes desta Corte. Recurso de revista não conhecido. VALOR ARBITRADO À INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. O recurso não merece processamento, porquanto os dispositivos indicados não são específicos para discussão sobre valor arbitrado à indenização por danos morais. Recurso de revista não conhecido" (RR-360-41.2018.5.12.0002, 2ª Turma, Relator Ministro Jose Roberto Freire Pimenta, DEJT 29/05/2020). "I - RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA - DISPENSA DISCRIMINATÓRIA - DANOS MORAIS 1. O Tribunal Regional consignou que a dispensa do Autor um dia após seu retorno ao trabalho, em decorrência de anterior afastamento por haver sofrido infarto, derrame e se submetido a intervenção cirúrgica, revestiu-se de caráter discriminatório. Entendimento diverso encontra óbice na Súmula nº 126 do TST. 2. O valor atribuído à verba pela instância ordinária adequa-se à extensão do dano, mormente considerando-se a afirmação do Tribunal Regional de que o autor laborou por quase vinte anos para a Ré, sem nenhuma mácula em seu trabalho. DIFERENÇAS DE AVISO-PRÉVIO - PREVALÊNCIA DA NORMA MAIS BENÉFICA Consoante a jurisprudência da C. SBDI-1, havendo conflito entre convenção coletiva e acordo coletivo de trabalho, devem prevalecer as normas do instrumento que, como um todo, mostra-se mais benéfico para os trabalhadores. Precedentes. HORAS EXTRAS - INVALIDADE DO ACORDO DE COMPENSAÇÃO DE JORNADA A prestação de horas extras habituais descaracteriza o acordo de compensação de jornada. Súmula nº 85, IV, do TST. MULTAS CONVENCIONAIS Uma vez mantida a condenação da Reclamada ao pagamento de horas extras e diferenças de aviso-prévio, afigura-se irreparável o acórdão regional quanto à incidência das multas convencionais alusivas à inobservância dos referidos direitos. Recurso de Revista não conhecido. II - RECURSO DE REVISTA ADESIVO DO RECLAMANTE Exame prejudicado, haja vista o não conhecimento do Recurso de Revista principal. Aplicação do artigo 500, inciso III, do CPC" (RR-972-74.2011.5.09.0594, 8ª Turma, Relatora Ministra Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DEJT 04/09/2015). "EMBARGOS. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE CARDIOPATIA GRAVE. DECISÃO DA TURMA QUE CONCEDE A REINTEGRAÇÃO. DESPROVIMENTO A C. Turma entendeu pela caracterização de dispensa discriminatória em razão da dispensa do autor, portador de cardiopatia grave, por retratar ato ilícito, a ensejar reparação. Não há como afastar a nulidade da dispensa sem justa causa, quando não evidenciada motivação lícita, a implicar em presunção de discriminação do empregado, portador de doença grave, e determina o pagamento das remunerações devidas, nos termos do art. 4º, I, da Lei 9.029/95, nos termos do que dispõe a Súmula 443 do c. TST. O poder diretivo do empregador encontra limite nos princípios fundamentais erigidos pela Constituição Federal, em especial o princípio da dignidade da pessoa humana e da proteção à saúde do trabalhador. Cabe ao empregador afastar a presunção de conduta discriminatória quando sua a iniciativa de dispensa de empregado portador de doença grave, comprovando a motivação diversa da mera discriminação, para o fim de efetivação dos direitos fundamentais à saúde e ao trabalho. Embargos conhecidos e desprovido. AGRAVO. EMBARGOS NÃO ADMITIDOS. DANO MORAL DECORRENTE DA DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. DESPROVIMENTO. Não merece reforma decisão que não admite Embargos, constatado o não cumprimento do requisito do art. 894, II, da CLT. Agravo desprovido" (Ag-ED-E-ED-RR-10294-11.2019.5.15.0097, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Aloysio Correa da Veiga, DEJT 29/07/2022). Fixada tal premissa, e volvendo à causa de pedir, reitero que o móvel do pedido residiu na dispensa sem justa causa do empregado, logo após a apresentação de atestado e no curso da licença médica. Na distribuição subjetiva do ônus da prova, entendo ser o inicial do autor para trazer, quando menos, indícios suficientes a demonstrar a pertinência de sua tese. Daí em diante ele é deslocado, por dinâmico que é, para a empregadora, pois as circunstâncias que afloram nessas espécies de rescisão são usualmente ocultadas, de sorte a mascarar o seu real motivo. Consigno, ainda, que o regramento do art. 818, incisos I e II, da CLT, não colide com a proposição adotada, que encontra eco nas decisões da mais alta corte trabalhista, como revelam os precedentes transcritos. No caso concreto não paira dissenso que foi concedido atestado médico ao autor em 21/08/2023 (fls. 31/32), em virtude de lesão no ombro direito, enquanto a dispensa foi realizada quatro dias depois, em 25/08/2023 (fls. 151/152). Todavia, não há prova mínima da entrega do documento à empregadora, o que efetivamente retira a consistência do núcleo da pretensão; ao reverso, a prova colhida vai de encontro à versão do obreiro. Em audiência, o reclamante declarou inicialmente que não comunicou à empresa acerca do atestado emitido em 21/08/2023, já que estava em teletrabalho e em semana de reunião - em suas palavras, "...fiquei ali na minha, fazendo meu serviço..." (aos 11:16 minutos). Na sequência, porém, ventilou o envio do documento ao seu superior hierárquico pelo aplicativo WhatsApp, o que, importa dizer, além da contradição, não encontra eco na prova documental e oral produzida. A par disso, ele reconheceu que o diretor que o dispensou declarou desconhecer a condição médica ora agitada, por ocasião da comunicação de rescisão - cenário, aliás, em sintonia com o e-mail de fl. 150 -, como também admitiu que não enviou o atestado após o evento, pois achou desimportante no contexto. No mais registro que a testemunha ouvida apenas relatou o uso de tipoia pelo autor em algumas reuniões, o que é insuficiente para os fins almejados. Em suma, não há elementos capazes de revelar a ciência da empresa acerca do afastamento médico à época da dispensa, tal como decidido na origem, do que decorre a insubsistência da alegada dispensa discriminatória. Desse modo, o pleito de recebimento de salário pelo período da garantia de emprego carece de suporte fático, e em sendo ela inexistente não há falar também na postulada indenização por danos morais. A tese obreira, na realidade, encontra estofo tão-somente nas suas alegações, as quais não encerram suficiência para autorizar o reconhecimento do fato gerador do dano. Por outro lado, o princípio da continuidade tem como estofo a preservação da fonte de trabalho, com o objetivo de dar segurança ao empregado para o seu sustento e de sua família, motivo da preferência explícita da norma consolidada pelos contratos por prazo indeterminado. Idêntico raciocínio é aplicável quando da manutenção do pacto laboral, nas hipóteses de sua interrupção ou suspensão, que em virtude de certos fatos levam à paralisação transitória da prestação de serviços. Conforme dispõem os arts. 471 a 476 da CLT, o evento em exame produz efeitos no contrato. Assim, tanto na interrupção quanto na suspensão há uma cessação temporária do labor, mas não há a extinção contratual. Apenas a sua execução é que fica suspensa - as denominadas descontinuidades executivas parcial ou total (CATHARINO). Em ambos os casos o empregador fica impossibilitado de resolver o contrato de emprego, salvo justa causa ou extinção da empresa. Em outros termos, a licença médica, ainda que sem afastamento previdenciário, suspende, ope legis, o contrato de emprego, fenômeno que impossibilidade a regular extinção da relação empregatícia enquanto perdurar a situação. Nesse sentido invoco a inteligência da Súmula 371 do TST, de sorte que os efeitos da dispensa somente são concretizados após o fim do período de afastamento médico, sem que isso importe, no entanto, o direito à garantia provisória ao emprego. Em consequência a dispensa é válida; ela apenas tem seus efeitos protraídos para o dia seguinte ao término da licença médica. Desse modo, é devida apenas a retificação da CPTS do obreiro (CLT, art. 39, §2º), sendo oportuno esclarecer que descabe falar no pagamento de salários, e idêntica sorte apanha os consectários. Ademais, o empregador não tem a obrigação em realizar os depósitos de FGTS, porque, segundo a disciplina do art. 15, § 5º, da Lei nº 8.036/1990, somente os afastamentos ocasionados pela prestação do serviço militar obrigatório e licença por acidente do trabalho impõem o recolhimento mensal da verba. E, como visto, o caso é diverso do tratado no preceito. Em conclusão, dou parcial provimento ao recurso obreiro, apenas para fixar como data do término do contrato de trabalho e seus efeitos o dia 25/01/2024, já observada a projeção do aviso prévio, além de determinar a retificação das anotações da sua CTPS. CONCLUSÃO Rejeito a preliminar suscitada, conheço dos recursos e no mérito nego provimento ao interposto pela empresa, além de prover, em parte, o do reclamante, para fixar como término do contrato de trabalho o dia 25/01/2024 e determinar a retificação das anotações da sua CTPS, tudo nos estritos termos da fundamentação. ACÓRDÃO Por tais fundamentos, ACORDAM os Desembargadores da Segunda Turma do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da Décima Região, em Sessão Ordinária, à vista do contido na certidão de julgamento (fl. retro), aprovar o relatório, rejeitar a preliminar suscitada, conhecer dos recursos e no mérito negar provimento ao interposto pela empresa, além de prover, em parte, o do reclamante, nos termos do voto do Relator. Desembargador João Amilcar Silva e Souza Pavan Relator(a) DECLARAÇÃO DE VOTO BRASILIA/DF, 22 de abril de 2025. FRANCISCA DAS CHAGAS SOUTO , Servidor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - COMERCIAL ROFE LTDA

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Claudia Iarany Gomes Cardoso x Palmas Tecidos Ltda

ID: 280429977

Tribunal: TRT10 Órgão: 1ª Turma Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0001635-97.2024.5.10.0801

Data de Disponibilização: 27/05/2025

Polo Ativo:

CLAUDIA IARANY GOMES CARDOSO

Polo Passivo:

PALMAS TECIDOS LTDA

Acórdão

Advogados:

CARLOS AUGUSTO DE SOUZA PINHEIRO

OAB/TO XXXXXX Desbloquear

MARCIO AUGUSTO MONTEIRO MARTINS

OAB/TO XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 1ª TURMA Relator: LUIZ HENRIQUE MARQUES DA ROCHA ROT 0001635-97.2024.5.10.0801 RECORRENTE: CLAUDIA IARANY GOMES … PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 1ª TURMA Relator: LUIZ HENRIQUE MARQUES DA ROCHA ROT 0001635-97.2024.5.10.0801 RECORRENTE: CLAUDIA IARANY GOMES CARDOSO RECORRIDO: PALMAS TECIDOS LTDA PROCESSO n.º 0001635-97.2024.5.10.0801 - RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA (1009) RELATOR: JUIZ CONVOCADO LUIZ HENRIQUE MARQUES DA ROCHA RECORRENTE: CLÁUDIA IARANY GOMES CARDOSO ADVOGADO: MÁRCIO AUGUSTO MONTEIRO MARTINS RECORRIDO: PALMAS TECIDOS LTDA ADVOGADO: CARLOS AUGUSTO DE SOUZA PINHEIRO ORIGEM: 1ª VARA DO TRABALHO DE PALMAS/TO CLASSE ORIGINÁRIA: Ação Trabalhista - Rito Ordinário (JUIZ REINALDO MARTINI) 15EMV EMENTA DIREITO DO TRABALHO. RECURSO ORDINÁRIO. RESCISÃO INDIRETA. ASSÉDIO MORAL NÃO CONFIGURADO. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Recurso ordinário interposto por trabalhadora que alega ter sido forçada a pedir demissão por conta de perseguições e humilhações sofridas no ambiente de trabalho após comunicar sua gravidez. Pleiteia o reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do art. 483, alínea "d", da CLT, com o pagamento das verbas rescisórias devidas e indenização por danos morais no valor de R$ 30.000,00. A sentença de origem julgou improcedentes os pedidos, reconhecendo a validade do pedido de demissão por ausência de prova dos fatos alegados. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se estão presentes os requisitos autorizadores da rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do art. 483 da CLT; (ii) estabelecer se houve assédio moral apto a ensejar indenização por danos morais. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A configuração da rescisão indireta exige a demonstração, pelo empregado, de conduta patronal grave que torne impossível a continuidade da relação empregatícia, nos termos dos arts. 483 da CLT, 818 da CLT e 373, I, do CPC. 4. As provas testemunhais apresentadas pela reclamante foram desqualificadas em razão do acolhimento das contraditas, comprometendo sua credibilidade e valor probatório. 5. A única testemunha considerada válida, indicada pela reclamada, afirmou inexistirem atos de perseguição, humilhação ou restrição ao uso de banheiro, água ou uniforme, além de relatar conduta respeitosa da gerente acusada. 6. Diante da ausência de prova robusta acerca da ocorrência de falta grave por parte do empregador, mantém-se a validade do pedido de demissão realizado pela reclamante. 7. Inexistente a prática de ato ilícito ou abusivo, é indevida a indenização por danos morais. 8. Com a improcedência dos pedidos, permanece a condenação da reclamante ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, cuja exigibilidade, entretanto, fica suspensa nos termos do art. 791-A, §4º, da CLT, conforme interpretação do STF na ADI 5766 e do TRT da 10ª Região na ArgInc-0000163.15.2019.5.10.0000. IV. DISPOSITIVO E TESE 10. Recurso conhecido porém desprovido. Tese de julgamento: 1. A configuração da rescisão indireta exige prova inequívoca da prática de falta grave pelo empregador, o que não se presume. 2. A ausência de prova válida e robusta impede o reconhecimento do assédio moral e, consequentemente, a concessão de indenização por danos morais. 3. É válida a condenação do trabalhador ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, ainda que com exigibilidade suspensa, nos termos do art. 791-A, §4º, da CLT, interpretado conforme decisão do STF na ADI 5766. Dispositivos relevantes citados: CLT, arts. 483, "d"; 818; 791-A, §4º; CPC, art. 373, I; CF/1988, art. 5º, II e LXXIV. Jurisprudência relevante citada: TRT-10ª Região, ArgInc-0000163.15.2019.5.10.0000, Pleno, j. 2019; STF, ADI 5766, Rel. Min. Luiz Fux, Plenário, j. 20.10.2021. RELATÓRIO O Exmo. Juiz REINALDO MARTINI, da MM. 1ª Vara do Trabalho de Palmas-TO, por intermédio da sentença ao ID e418c79, julgou improcedentes os pedidos ajuizados por CLÁUDIA IARANY GOMES CARDOSO em face de PALMAS TECIDOS LTDA. Recurso ordinário interposto pela reclamante ao ID 74a09c8. Contrarrazões apresentadas pela reclamada ao ID 0f8cc2f. Dispensada a remessa dos autos ao d. Ministério Público do Trabalho, porquanto ausentes as hipóteses insertas no art. 102 do Regimento Interno deste Décimo Regional Trabalhista. É o relatório. VOTO ADMISSIBILIDADE Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso ordinário interposto. MÉRITO DA FORMA DE TERMINAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO/DANO MORAL Em sua exordial, a reclamante assinala admissão pela reclamada em 05.01.2023, para exercer a função de vendedora, tendo sido demitida a pedido em 12.06.2024. Alega que a rescisão contratual se deu em razão de faltas graves imputáveis à reclamada, consistentes em assédio moral, configurando rescisão indireta do contrato de trabalho nos termos dos arts. 483, alíneas 'b', 'c' e 'd', da CLT. Afirma que a rescisão contratual, apesar de formalmente configurada como demissão, decorreu da impossibilidade de manutenção da relação empregatícia em razão do comportamento da reclamada. Sustenta que o assédio moral, caracterizado por gritos, animosidade infundada, apontamento de dedos em sua direção, cobranças excessivas e descabidas, humilhações perante outros empregados, impedimentos para acesso ao banheiro e para se hidratar, tornou-se intolerável, ensejando a rescisão indireta. Ressalta que a perseguição se intensificou após comunicar sua gravidez à empresa. Em razão do exposto, requer a declaração de rescisão indireta do contrato de trabalho, com o consequente pagamento das verbas rescisórias devidas nessa modalidade, nos termos do art. 483, "d", da CLT. Pleiteia, ainda, indenização por danos morais no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), em virtude dos danos sofridos em decorrência do assédio moral praticado pela reclamada. Em contestação, a reclamada impugna as alegações da reclamante, negando a prática de quaisquer atos que configurem assédio moral ou ensejem indenização por danos morais. Sustenta que os fatos narrados pela autora são inverídicos e foram alegados exclusivamente com o intuito de obter a declaração de rescisão indireta do contrato de trabalho, o que não se coaduna com a realidade dos fatos. Afirma que não houve rigor excessivo por parte da empresa, nem qualquer situação que tenha colocado a autora em perigo ou sofrimento considerável, tendo a reclamada sempre cumprido integralmente suas obrigações contratuais. Assim, pugna pela improcedência do pedido de rescisão indireta do contrato de trabalho, por ausência de justa causa imputável à reclamada. Requer, ainda, a improcedência do pedido de indenização por danos morais, por falta de comprovação de qualquer ato ilícito ou abusivo por parte da empregadora que tenha causado dano à reclamante. O juízo de origem assim decidiu sobre os temas: "DA FORMA DE TERMINAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO Não conheço da réplica de ID 833efaf, por intempestiva. A reclamada comprovou nos autos o pagamento de salário e demais verbas do contrato de trabalho, até o final do período de estabilidade da reclamante, mesmo sem a contraprestação de serviços - vide documentos de Ids 9751f27, 92d2f21, 170b104, 579e9c7, b1f2bea, af61ac7. A empresa demonstrou a convocação da reclamante para o retorno ao trabalho (ID 4bc5a1f), bem como que a reclamante responde que não retornaria por fazer "uso das prerrogativas do Artigo 483, alínea "d" e "g"da CLT" (vide ID 92503bf). Dessa maneira, tenho por prejudicada a análise do pedido de estabilidade da gestante e passo a analisar os pedidos de rescisão indireta e dano/assédio moral, nos seguintes termos: A parte autora refere, na inicial, que faz jus à declaração de rescisão indireta do contrato de trabalho, sob o argumento de que "assim que informou a empresa que estava grávida, a partir de janeiro de 2024 a reclamante começou a sofrer perseguição e humilhações dentro das dependências da empresa. A reclamada por meio da sua gerente (Fabiana Soares Cardoso) humilhava a reclamante, já foi limitado pela empresa o acesso a papel higiênico (limitando as idas ao banheiro da reclamante), esse fato em especial é taxativo pelo fato de uma grávida precisar ir ao banheiro com mais frequência do que o comum. Continuando a perseguição, a reclamante também fazia uso de uma garrafinha de água para não ter que subir as escadas da empresa pois o bebedouro ficava no segundo andar e por ela estar grávida, queria evitar ficar subindo escadas para não prejudicar sua gravidez. Ocorre que a gerente já citada costumava chamar a atenção da reclamante na frente de funcionários e clientes, além do que quando encontrava a garrafinha da reclamante, a jogava fora. Com isso a reclamante era obrigada a sofrer esta humilhação em frente a seus colegas e subir escadas várias vezes durante o dia para conseguir beber água e manter sua gravidez saudável. Continuando com a humilhação e perseguição, a reclamada fornecia uniforme, e por obvio, a reclamante começou a crescer devido a sua gravidez e o uniforme, principalmente a calça, ficou pequeno para a reclamante, concomitante a isso foi indicado a reclamante de forma oral pelo médico que a acompanha na gravidez que ela utilizasse vestimentas leves e folgadas. Após informar a reclamada que o uniforme estava apertando sua barriga e o médico recomendado que fosse usado vestimentas mais folgadas, a reclamada ignorou e informou a reclamante que mesmo a apertando ela teria que usar o uniforme que já tinha sido fornecido pela empresa. Inclusive, a reclamante sofria forte pressão, com ameaças de demissão mesmo estando passando mal por causa da sua gravidez". A ré, em defesa, "nega que tenha assediado moralmente a Reclamante, nega que tenha proibido a Autora de usar roupas mais espaçosas; jamais a Reclamada negou a Reclamante acesso ao banheiro, bem como a inexistência de papel higiênico, até porque o banheiro que a Autora faz uso serve todos os funcionários e clientes da empresa. Nega ainda que tenha havido pelos superiores da Autora, pressão e ameaça de demissão mesmo passando mal pela gestação, bem como nega assédio moral e perseguição no trabalho através de gritos, animosidade, dedos apontados, cobranças, humilhações, fatos estes que jamais ocorreram. Pois bem, de início, consigo que o vídeo colacionado ao corpo da petição inicial não tem força probante necessária a demonstrar a ocorrência da assédio moral. Ademais, a única testemunha ouvida nos autos refere que: "01) trabalha na reclamada desde 1/2/2002; 02) é operadora de caixa; 03) autora trabalhava na seção masculina; 04) a distância do caixa até a seção da autora era de 2 mts; 05) via a autora todos os dias trabalhando; 06) já esteve gestante na reclamada uma vez; 07) existe na reclamada uniforme para gestante que é moldado sob medida, conforme a barriga vai aumentando; 08) foi entregue à autora uniforme nos mesmos moldes mas não viu autora recebendo, nem usando o referido uniforme; 09) a reclamada possui 3 bebedouros e cada empregado possui uma squeeze personalizada mas nunca ficou observando se a autora usava ou não; 10) a reclamada conta com 5 banheiros, sendo 2 masculinos, 2 femininos e 1 para cadeirante; 11) a reclamada possui elevador e empregado pode usar e autora usava; 12) a gerente Fabiana é educada, não grita ou xinga os funcionários; 13) não viu Fabiana tratando mal ou humilhando a demandante; 14) não viu Fabiana proibindo uso de água ou banheiro; 15) sempre tem papel higiênico nos banheiros; 16) não viu Fabiana chamar a atenção da autora por estar sentada ou dar qualquer advertência; 17) não existe uma caixinha fora do banheiro onde é guardado papel higiênico". De tal depoimento, não se extrai a ocorrência de perseguição ou humilhação à reclamante, motivo pelo qual, entendo que, no caso, não estão presentes os requisitos necessário à declaração da pretendida rescisão indireta do contrato de trabalho, na forma do art. 473 da CLT, motivo pelo qual considero que o vínculo foi rompido por iniciativa da trabalhadora (pedido de demissão) e as verbas rescisória devidamente quitadas, na forma TRCT de ID bf49a46. Assim, não há falar em pagamentos rescisórios elencados na inicial, bem como os de multa dos arts. 467 e 477 da CLT e de liberação de guias para saque do FGTS e habilitação no seguro-desemprego. Pelo mesmo motivo, ausência da prova de humilhação/perseguição/coação e pressão psicológica, indefiro o pedido de dano moral". Contra tal decisão, insurge-se a autora renovando sua pretensão inicial. Alega que comprovou, pelas provas apresentadas, o descumprimento contratual pela reclamada, que a submeteu a tratamento humilhante e vexatório, agravado após a comunicação de sua gravidez. Assevera que tal conduta configura rescisão indireta, justificando a declaração da rescisão e o pagamento das verbas rescisórias devidas. Requer, ainda, a reforma da sentença para deferimento da indenização por danos morais decorrentes do assédio moral sofrido. Examino. O instituto da rescisão indireta exige a comprovação de falta grave do empregador, apta a inviabilizar a continuidade do vínculo de emprego, devendo a conduta ser suficientemente grave e ensejar a impossibilidade de manutenção da relação laboral. Nos termos do artigo 818 da CLT e do artigo 373, inciso I, do CPC, é do empregado o ônus de demonstrar a ocorrência de justa causa patronal. O artigo 483, alínea "d", da CLT autoriza a rescisão indireta quando o empregador descumpre obrigações contratuais. Inicialmente, Para melhor aquilatar os fatos e o direito, oportuna a transcrição dos depoimentos colhidos nos autos, verbis: "Depoimento pessoal do(a) preposto da Reclamada:"01) Fabiana é gerente e não ficava humilhando e xingando a autora; 02) o papel higiênico fica nos banheiros e todos os empregados podem usar e é o mesmo de cliente e também tem banheiro exclusivo para empregados; 03) na reclamada existe escada e elevador; 04) os empregados podem e usam o elevador; 05) os caixas ficam cerca de 2 mts do local onde autora trabalhava; 06) autora não trabalha mais na reclamada; 07) não havia determinação da gerente proibindo sentar durante o expediente sendo que na seção tem bancos; 08) quando autora foi reintegrada não houve restrição para uso de celular ou câmera na loja e ninguém ficava acompanhando a autora para ver se estava filmando; 09) quando autora ficou grávida foi dado uniforme novo sob-medida; 10) foi pago o salário da autora até o final da licença-maternidade, até novembro." Nada mais. Primeira testemunha da reclamante: JAYANE GOMES GASPAR DA SILVA. Testemunha contraditada sob a alegação de possuir amizade íntima. Inquirida, respondeu que está torcendo para a autora ganhar o processo, tem mágoa da empresa porque os empregados são maltratados, tudo é regulado, a gerente é ignorante, mal-educada e não tinha tolerância de 15 minutos de atraso e não é uma boa empresa. Acolho a contradita. Segunda testemunha da reclamante: KLAYANNA BITTENCOURT DA SILVA. Testemunha contraditada sob a alegação de possuir amizade íntima, possuir interesse na causa, possuir ação contra a reclamada, configurar troca de favores e possuir inimizade capital. Inquirida, respondeu: não ser amiga da autora, possui ação contra a reclamada por danos moais e saiu da empresa ofendida, porque era gestante e sofria muita humilhação, está torcendo para a autora ganhar a ação. Acolho a contradita. Protestos da autora. Testemunha da reclamada: VERA LUCIA NEVES VIANA. Testemunha contraditada sob a alegação de ter sido orientada. Inquirida, negou. Rejeito a contradita. Advertida e compromissada. Depoimento: "01) trabalha na reclamada desde 1/2/2002; 02) é operadora de caixa; 03) autora trabalhava na seção masculina; 04) a distância do caixa até a seção da autora era de 2 mts; 05) via a autora todos os dias trabalhando; 06) já esteve gestante na reclamada uma vez; 07) existe na reclamada uniforme para gestante que é moldado sob medida, conforme a barriga vai aumentando; 08) foi entregue à autora uniforme nos mesmos moldes mas não viu autora recebendo, nem usando o referido uniforme; 09) a reclamada possui 3 bebedouros e cada empregado possui uma squeeze personalizada mas nunca ficou observando se a autora usava ou não; 10) a reclamada conta com 5 banheiros, sendo 2 masculinos, 2 femininos e 1 para cadeirante; 11) a reclamada possui elevador e empregado pode usar e autora usava; 12) a gerente Fabiana é educada, não grita ou xinga os funcionários; 13) não viu Fabiana tratando mal ou humilhando a demandante; 14) não viu Fabiana proibindo uso de água ou banheiro; 15) sempre tem papel higiênico nos banheiros; 16) não viu Fabiana chamar a atenção da autora por estar sentada ou dar qualquer advertência; 17) não existe uma caixinha fora do banheiro onde é; guardado papel higiênico." Nada mais". Da análise dos depoimentos transcritos, não se vislumbra elemento probatório apto a evidenciar a existência de perseguição ou humilhação direcionadas à reclamante. Ressalta-se, ainda, o acolhimento das contraditas opostas às testemunhas indicadas pela parte ré, o que fragiliza a credibilidade dos relatos produzidos. Nesse contexto, não se encontram preenchidos os pressupostos permissivos da rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do art. 483 da CLT. Outrossim, incumbia à reclamante o ônus de comprovar os fatos constitutivos do direito alegado, especialmente quanto à prática de assédio moral, o que não se verificou nos autos. Diante do exposto, mantém-se incólume a r. sentença que indeferiu os pedidos de rescisão indireta e de indenização por danos morais. Nego provimento. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS O juízo a quo assim decidiu: "DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Sucumbentes os reclamantes, condeno-os ao pagamento de honorários sucumbenciais em importe equivalente a 10% do valor arbitrado à causa, nos termos do art. 791-A da CLT, observado, ante a acolhimento do pedido de gratuidade judiciária, o que consta do §4ºdo mesmo artigo, vide teor do verbete n.º 75/2019, do Pleno do TRT-10ª Região que assim decidiu: É inconstitucional a expressão "...desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes e suportar a despesa...", do art. 791-A da CLT, devendo ser suspensa a exigibilidade dos honorários advocatícios, assim como afastada a sua compensação com outros créditos trabalhistas, quando se tratar de parte hipossuficiente (art. 5º, incisos II e LXXIV da CF). Decisão adotada por maioria absoluta do Tribunal Pleno na ArgInc-0000163.15.2019.5.10.0000 para os fins do art. 97 da Constituição Federal". Irresignada com a decisão, recorre a reclamante. Requer a condenação da reclamada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios sucumbenciais. Examino. Mantida a r. sentença, indevidos honorários de sucumbência em favor do patrono da reclamante ou pagamento de custas processuais. Ademais, os honorários devidos pelo reclamante ficam sob condição suspensiva de exigibilidade, conforme entendimento do STF na ADI 5766 do e. STF. Nego provimento ao recurso da reclamante. CONCLUSÃO Em face do exposto, conheço do recurso ordinário interposto e, no mérito, nego-lhe provimento. Tudo nos termos da fundamentação. Acórdão Por tais fundamentos, ACORDAM os Integrantes da Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Região aprovar o relatório e conhecer do recurso ordinário interposto para, no mérito, negar-lhe provimento nos termos do voto do Juiz Relator e com ressalvas do Des. Grijalbo Coutinho. Ementa aprovada. Julgamento ocorrido por unanimidade de votos, sob a Presidência do Desembargador Grijalbo Coutinho, com a participação do Desembargador Dorival Borges e do Juiz convocado Luiz Henrique Marques da Rocha. Ausentes, justificadamente, os Desembargadores Flávia Falcão (na direção da Escola Judicial), Elaine Vasconcelos (em licença médica), André R. P. V. Damasceno (em gozo de férias) e o Juiz convocado Denilson B. Coêlho (em compromissos Institucionais). Pelo MPT, o Dr. Erlan José Peixoto do Prado (Procurador Regional do Trabalho). Presente o Dr. Carlos Pinheiro (advogado). Sessão Ordinária Presencial de 21 de maio de 2025 (data do julgamento). Juiz Convocado Luiz Henrique Marques da Rocha Relator(a) BRASILIA/DF, 26 de maio de 2025. ERIVELTO ANTONIO D ANUNCIACAO, Diretor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - CLAUDIA IARANY GOMES CARDOSO

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Claudia Iarany Gomes Cardoso x Palmas Tecidos Ltda

ID: 280430034

Tribunal: TRT10 Órgão: 1ª Turma Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0001635-97.2024.5.10.0801

Data de Disponibilização: 27/05/2025

Polo Ativo:

CLAUDIA IARANY GOMES CARDOSO

Polo Passivo:

PALMAS TECIDOS LTDA

Acórdão

Advogados:

CARLOS AUGUSTO DE SOUZA PINHEIRO

OAB/TO XXXXXX Desbloquear

MARCIO AUGUSTO MONTEIRO MARTINS

OAB/TO XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 1ª TURMA Relator: LUIZ HENRIQUE MARQUES DA ROCHA ROT 0001635-97.2024.5.10.0801 RECORRENTE: CLAUDIA IARANY GOMES … PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 1ª TURMA Relator: LUIZ HENRIQUE MARQUES DA ROCHA ROT 0001635-97.2024.5.10.0801 RECORRENTE: CLAUDIA IARANY GOMES CARDOSO RECORRIDO: PALMAS TECIDOS LTDA PROCESSO n.º 0001635-97.2024.5.10.0801 - RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA (1009) RELATOR: JUIZ CONVOCADO LUIZ HENRIQUE MARQUES DA ROCHA RECORRENTE: CLÁUDIA IARANY GOMES CARDOSO ADVOGADO: MÁRCIO AUGUSTO MONTEIRO MARTINS RECORRIDO: PALMAS TECIDOS LTDA ADVOGADO: CARLOS AUGUSTO DE SOUZA PINHEIRO ORIGEM: 1ª VARA DO TRABALHO DE PALMAS/TO CLASSE ORIGINÁRIA: Ação Trabalhista - Rito Ordinário (JUIZ REINALDO MARTINI) 15EMV EMENTA DIREITO DO TRABALHO. RECURSO ORDINÁRIO. RESCISÃO INDIRETA. ASSÉDIO MORAL NÃO CONFIGURADO. AUSÊNCIA DE PROVA ROBUSTA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Recurso ordinário interposto por trabalhadora que alega ter sido forçada a pedir demissão por conta de perseguições e humilhações sofridas no ambiente de trabalho após comunicar sua gravidez. Pleiteia o reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do art. 483, alínea "d", da CLT, com o pagamento das verbas rescisórias devidas e indenização por danos morais no valor de R$ 30.000,00. A sentença de origem julgou improcedentes os pedidos, reconhecendo a validade do pedido de demissão por ausência de prova dos fatos alegados. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se estão presentes os requisitos autorizadores da rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do art. 483 da CLT; (ii) estabelecer se houve assédio moral apto a ensejar indenização por danos morais. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A configuração da rescisão indireta exige a demonstração, pelo empregado, de conduta patronal grave que torne impossível a continuidade da relação empregatícia, nos termos dos arts. 483 da CLT, 818 da CLT e 373, I, do CPC. 4. As provas testemunhais apresentadas pela reclamante foram desqualificadas em razão do acolhimento das contraditas, comprometendo sua credibilidade e valor probatório. 5. A única testemunha considerada válida, indicada pela reclamada, afirmou inexistirem atos de perseguição, humilhação ou restrição ao uso de banheiro, água ou uniforme, além de relatar conduta respeitosa da gerente acusada. 6. Diante da ausência de prova robusta acerca da ocorrência de falta grave por parte do empregador, mantém-se a validade do pedido de demissão realizado pela reclamante. 7. Inexistente a prática de ato ilícito ou abusivo, é indevida a indenização por danos morais. 8. Com a improcedência dos pedidos, permanece a condenação da reclamante ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, cuja exigibilidade, entretanto, fica suspensa nos termos do art. 791-A, §4º, da CLT, conforme interpretação do STF na ADI 5766 e do TRT da 10ª Região na ArgInc-0000163.15.2019.5.10.0000. IV. DISPOSITIVO E TESE 10. Recurso conhecido porém desprovido. Tese de julgamento: 1. A configuração da rescisão indireta exige prova inequívoca da prática de falta grave pelo empregador, o que não se presume. 2. A ausência de prova válida e robusta impede o reconhecimento do assédio moral e, consequentemente, a concessão de indenização por danos morais. 3. É válida a condenação do trabalhador ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, ainda que com exigibilidade suspensa, nos termos do art. 791-A, §4º, da CLT, interpretado conforme decisão do STF na ADI 5766. Dispositivos relevantes citados: CLT, arts. 483, "d"; 818; 791-A, §4º; CPC, art. 373, I; CF/1988, art. 5º, II e LXXIV. Jurisprudência relevante citada: TRT-10ª Região, ArgInc-0000163.15.2019.5.10.0000, Pleno, j. 2019; STF, ADI 5766, Rel. Min. Luiz Fux, Plenário, j. 20.10.2021. RELATÓRIO O Exmo. Juiz REINALDO MARTINI, da MM. 1ª Vara do Trabalho de Palmas-TO, por intermédio da sentença ao ID e418c79, julgou improcedentes os pedidos ajuizados por CLÁUDIA IARANY GOMES CARDOSO em face de PALMAS TECIDOS LTDA. Recurso ordinário interposto pela reclamante ao ID 74a09c8. Contrarrazões apresentadas pela reclamada ao ID 0f8cc2f. Dispensada a remessa dos autos ao d. Ministério Público do Trabalho, porquanto ausentes as hipóteses insertas no art. 102 do Regimento Interno deste Décimo Regional Trabalhista. É o relatório. VOTO ADMISSIBILIDADE Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso ordinário interposto. MÉRITO DA FORMA DE TERMINAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO/DANO MORAL Em sua exordial, a reclamante assinala admissão pela reclamada em 05.01.2023, para exercer a função de vendedora, tendo sido demitida a pedido em 12.06.2024. Alega que a rescisão contratual se deu em razão de faltas graves imputáveis à reclamada, consistentes em assédio moral, configurando rescisão indireta do contrato de trabalho nos termos dos arts. 483, alíneas 'b', 'c' e 'd', da CLT. Afirma que a rescisão contratual, apesar de formalmente configurada como demissão, decorreu da impossibilidade de manutenção da relação empregatícia em razão do comportamento da reclamada. Sustenta que o assédio moral, caracterizado por gritos, animosidade infundada, apontamento de dedos em sua direção, cobranças excessivas e descabidas, humilhações perante outros empregados, impedimentos para acesso ao banheiro e para se hidratar, tornou-se intolerável, ensejando a rescisão indireta. Ressalta que a perseguição se intensificou após comunicar sua gravidez à empresa. Em razão do exposto, requer a declaração de rescisão indireta do contrato de trabalho, com o consequente pagamento das verbas rescisórias devidas nessa modalidade, nos termos do art. 483, "d", da CLT. Pleiteia, ainda, indenização por danos morais no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), em virtude dos danos sofridos em decorrência do assédio moral praticado pela reclamada. Em contestação, a reclamada impugna as alegações da reclamante, negando a prática de quaisquer atos que configurem assédio moral ou ensejem indenização por danos morais. Sustenta que os fatos narrados pela autora são inverídicos e foram alegados exclusivamente com o intuito de obter a declaração de rescisão indireta do contrato de trabalho, o que não se coaduna com a realidade dos fatos. Afirma que não houve rigor excessivo por parte da empresa, nem qualquer situação que tenha colocado a autora em perigo ou sofrimento considerável, tendo a reclamada sempre cumprido integralmente suas obrigações contratuais. Assim, pugna pela improcedência do pedido de rescisão indireta do contrato de trabalho, por ausência de justa causa imputável à reclamada. Requer, ainda, a improcedência do pedido de indenização por danos morais, por falta de comprovação de qualquer ato ilícito ou abusivo por parte da empregadora que tenha causado dano à reclamante. O juízo de origem assim decidiu sobre os temas: "DA FORMA DE TERMINAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO Não conheço da réplica de ID 833efaf, por intempestiva. A reclamada comprovou nos autos o pagamento de salário e demais verbas do contrato de trabalho, até o final do período de estabilidade da reclamante, mesmo sem a contraprestação de serviços - vide documentos de Ids 9751f27, 92d2f21, 170b104, 579e9c7, b1f2bea, af61ac7. A empresa demonstrou a convocação da reclamante para o retorno ao trabalho (ID 4bc5a1f), bem como que a reclamante responde que não retornaria por fazer "uso das prerrogativas do Artigo 483, alínea "d" e "g"da CLT" (vide ID 92503bf). Dessa maneira, tenho por prejudicada a análise do pedido de estabilidade da gestante e passo a analisar os pedidos de rescisão indireta e dano/assédio moral, nos seguintes termos: A parte autora refere, na inicial, que faz jus à declaração de rescisão indireta do contrato de trabalho, sob o argumento de que "assim que informou a empresa que estava grávida, a partir de janeiro de 2024 a reclamante começou a sofrer perseguição e humilhações dentro das dependências da empresa. A reclamada por meio da sua gerente (Fabiana Soares Cardoso) humilhava a reclamante, já foi limitado pela empresa o acesso a papel higiênico (limitando as idas ao banheiro da reclamante), esse fato em especial é taxativo pelo fato de uma grávida precisar ir ao banheiro com mais frequência do que o comum. Continuando a perseguição, a reclamante também fazia uso de uma garrafinha de água para não ter que subir as escadas da empresa pois o bebedouro ficava no segundo andar e por ela estar grávida, queria evitar ficar subindo escadas para não prejudicar sua gravidez. Ocorre que a gerente já citada costumava chamar a atenção da reclamante na frente de funcionários e clientes, além do que quando encontrava a garrafinha da reclamante, a jogava fora. Com isso a reclamante era obrigada a sofrer esta humilhação em frente a seus colegas e subir escadas várias vezes durante o dia para conseguir beber água e manter sua gravidez saudável. Continuando com a humilhação e perseguição, a reclamada fornecia uniforme, e por obvio, a reclamante começou a crescer devido a sua gravidez e o uniforme, principalmente a calça, ficou pequeno para a reclamante, concomitante a isso foi indicado a reclamante de forma oral pelo médico que a acompanha na gravidez que ela utilizasse vestimentas leves e folgadas. Após informar a reclamada que o uniforme estava apertando sua barriga e o médico recomendado que fosse usado vestimentas mais folgadas, a reclamada ignorou e informou a reclamante que mesmo a apertando ela teria que usar o uniforme que já tinha sido fornecido pela empresa. Inclusive, a reclamante sofria forte pressão, com ameaças de demissão mesmo estando passando mal por causa da sua gravidez". A ré, em defesa, "nega que tenha assediado moralmente a Reclamante, nega que tenha proibido a Autora de usar roupas mais espaçosas; jamais a Reclamada negou a Reclamante acesso ao banheiro, bem como a inexistência de papel higiênico, até porque o banheiro que a Autora faz uso serve todos os funcionários e clientes da empresa. Nega ainda que tenha havido pelos superiores da Autora, pressão e ameaça de demissão mesmo passando mal pela gestação, bem como nega assédio moral e perseguição no trabalho através de gritos, animosidade, dedos apontados, cobranças, humilhações, fatos estes que jamais ocorreram. Pois bem, de início, consigo que o vídeo colacionado ao corpo da petição inicial não tem força probante necessária a demonstrar a ocorrência da assédio moral. Ademais, a única testemunha ouvida nos autos refere que: "01) trabalha na reclamada desde 1/2/2002; 02) é operadora de caixa; 03) autora trabalhava na seção masculina; 04) a distância do caixa até a seção da autora era de 2 mts; 05) via a autora todos os dias trabalhando; 06) já esteve gestante na reclamada uma vez; 07) existe na reclamada uniforme para gestante que é moldado sob medida, conforme a barriga vai aumentando; 08) foi entregue à autora uniforme nos mesmos moldes mas não viu autora recebendo, nem usando o referido uniforme; 09) a reclamada possui 3 bebedouros e cada empregado possui uma squeeze personalizada mas nunca ficou observando se a autora usava ou não; 10) a reclamada conta com 5 banheiros, sendo 2 masculinos, 2 femininos e 1 para cadeirante; 11) a reclamada possui elevador e empregado pode usar e autora usava; 12) a gerente Fabiana é educada, não grita ou xinga os funcionários; 13) não viu Fabiana tratando mal ou humilhando a demandante; 14) não viu Fabiana proibindo uso de água ou banheiro; 15) sempre tem papel higiênico nos banheiros; 16) não viu Fabiana chamar a atenção da autora por estar sentada ou dar qualquer advertência; 17) não existe uma caixinha fora do banheiro onde é guardado papel higiênico". De tal depoimento, não se extrai a ocorrência de perseguição ou humilhação à reclamante, motivo pelo qual, entendo que, no caso, não estão presentes os requisitos necessário à declaração da pretendida rescisão indireta do contrato de trabalho, na forma do art. 473 da CLT, motivo pelo qual considero que o vínculo foi rompido por iniciativa da trabalhadora (pedido de demissão) e as verbas rescisória devidamente quitadas, na forma TRCT de ID bf49a46. Assim, não há falar em pagamentos rescisórios elencados na inicial, bem como os de multa dos arts. 467 e 477 da CLT e de liberação de guias para saque do FGTS e habilitação no seguro-desemprego. Pelo mesmo motivo, ausência da prova de humilhação/perseguição/coação e pressão psicológica, indefiro o pedido de dano moral". Contra tal decisão, insurge-se a autora renovando sua pretensão inicial. Alega que comprovou, pelas provas apresentadas, o descumprimento contratual pela reclamada, que a submeteu a tratamento humilhante e vexatório, agravado após a comunicação de sua gravidez. Assevera que tal conduta configura rescisão indireta, justificando a declaração da rescisão e o pagamento das verbas rescisórias devidas. Requer, ainda, a reforma da sentença para deferimento da indenização por danos morais decorrentes do assédio moral sofrido. Examino. O instituto da rescisão indireta exige a comprovação de falta grave do empregador, apta a inviabilizar a continuidade do vínculo de emprego, devendo a conduta ser suficientemente grave e ensejar a impossibilidade de manutenção da relação laboral. Nos termos do artigo 818 da CLT e do artigo 373, inciso I, do CPC, é do empregado o ônus de demonstrar a ocorrência de justa causa patronal. O artigo 483, alínea "d", da CLT autoriza a rescisão indireta quando o empregador descumpre obrigações contratuais. Inicialmente, Para melhor aquilatar os fatos e o direito, oportuna a transcrição dos depoimentos colhidos nos autos, verbis: "Depoimento pessoal do(a) preposto da Reclamada:"01) Fabiana é gerente e não ficava humilhando e xingando a autora; 02) o papel higiênico fica nos banheiros e todos os empregados podem usar e é o mesmo de cliente e também tem banheiro exclusivo para empregados; 03) na reclamada existe escada e elevador; 04) os empregados podem e usam o elevador; 05) os caixas ficam cerca de 2 mts do local onde autora trabalhava; 06) autora não trabalha mais na reclamada; 07) não havia determinação da gerente proibindo sentar durante o expediente sendo que na seção tem bancos; 08) quando autora foi reintegrada não houve restrição para uso de celular ou câmera na loja e ninguém ficava acompanhando a autora para ver se estava filmando; 09) quando autora ficou grávida foi dado uniforme novo sob-medida; 10) foi pago o salário da autora até o final da licença-maternidade, até novembro." Nada mais. Primeira testemunha da reclamante: JAYANE GOMES GASPAR DA SILVA. Testemunha contraditada sob a alegação de possuir amizade íntima. Inquirida, respondeu que está torcendo para a autora ganhar o processo, tem mágoa da empresa porque os empregados são maltratados, tudo é regulado, a gerente é ignorante, mal-educada e não tinha tolerância de 15 minutos de atraso e não é uma boa empresa. Acolho a contradita. Segunda testemunha da reclamante: KLAYANNA BITTENCOURT DA SILVA. Testemunha contraditada sob a alegação de possuir amizade íntima, possuir interesse na causa, possuir ação contra a reclamada, configurar troca de favores e possuir inimizade capital. Inquirida, respondeu: não ser amiga da autora, possui ação contra a reclamada por danos moais e saiu da empresa ofendida, porque era gestante e sofria muita humilhação, está torcendo para a autora ganhar a ação. Acolho a contradita. Protestos da autora. Testemunha da reclamada: VERA LUCIA NEVES VIANA. Testemunha contraditada sob a alegação de ter sido orientada. Inquirida, negou. Rejeito a contradita. Advertida e compromissada. Depoimento: "01) trabalha na reclamada desde 1/2/2002; 02) é operadora de caixa; 03) autora trabalhava na seção masculina; 04) a distância do caixa até a seção da autora era de 2 mts; 05) via a autora todos os dias trabalhando; 06) já esteve gestante na reclamada uma vez; 07) existe na reclamada uniforme para gestante que é moldado sob medida, conforme a barriga vai aumentando; 08) foi entregue à autora uniforme nos mesmos moldes mas não viu autora recebendo, nem usando o referido uniforme; 09) a reclamada possui 3 bebedouros e cada empregado possui uma squeeze personalizada mas nunca ficou observando se a autora usava ou não; 10) a reclamada conta com 5 banheiros, sendo 2 masculinos, 2 femininos e 1 para cadeirante; 11) a reclamada possui elevador e empregado pode usar e autora usava; 12) a gerente Fabiana é educada, não grita ou xinga os funcionários; 13) não viu Fabiana tratando mal ou humilhando a demandante; 14) não viu Fabiana proibindo uso de água ou banheiro; 15) sempre tem papel higiênico nos banheiros; 16) não viu Fabiana chamar a atenção da autora por estar sentada ou dar qualquer advertência; 17) não existe uma caixinha fora do banheiro onde é; guardado papel higiênico." Nada mais". Da análise dos depoimentos transcritos, não se vislumbra elemento probatório apto a evidenciar a existência de perseguição ou humilhação direcionadas à reclamante. Ressalta-se, ainda, o acolhimento das contraditas opostas às testemunhas indicadas pela parte ré, o que fragiliza a credibilidade dos relatos produzidos. Nesse contexto, não se encontram preenchidos os pressupostos permissivos da rescisão indireta do contrato de trabalho, nos termos do art. 483 da CLT. Outrossim, incumbia à reclamante o ônus de comprovar os fatos constitutivos do direito alegado, especialmente quanto à prática de assédio moral, o que não se verificou nos autos. Diante do exposto, mantém-se incólume a r. sentença que indeferiu os pedidos de rescisão indireta e de indenização por danos morais. Nego provimento. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS O juízo a quo assim decidiu: "DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Sucumbentes os reclamantes, condeno-os ao pagamento de honorários sucumbenciais em importe equivalente a 10% do valor arbitrado à causa, nos termos do art. 791-A da CLT, observado, ante a acolhimento do pedido de gratuidade judiciária, o que consta do §4ºdo mesmo artigo, vide teor do verbete n.º 75/2019, do Pleno do TRT-10ª Região que assim decidiu: É inconstitucional a expressão "...desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes e suportar a despesa...", do art. 791-A da CLT, devendo ser suspensa a exigibilidade dos honorários advocatícios, assim como afastada a sua compensação com outros créditos trabalhistas, quando se tratar de parte hipossuficiente (art. 5º, incisos II e LXXIV da CF). Decisão adotada por maioria absoluta do Tribunal Pleno na ArgInc-0000163.15.2019.5.10.0000 para os fins do art. 97 da Constituição Federal". Irresignada com a decisão, recorre a reclamante. Requer a condenação da reclamada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios sucumbenciais. Examino. Mantida a r. sentença, indevidos honorários de sucumbência em favor do patrono da reclamante ou pagamento de custas processuais. Ademais, os honorários devidos pelo reclamante ficam sob condição suspensiva de exigibilidade, conforme entendimento do STF na ADI 5766 do e. STF. Nego provimento ao recurso da reclamante. CONCLUSÃO Em face do exposto, conheço do recurso ordinário interposto e, no mérito, nego-lhe provimento. Tudo nos termos da fundamentação. Acórdão Por tais fundamentos, ACORDAM os Integrantes da Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Região aprovar o relatório e conhecer do recurso ordinário interposto para, no mérito, negar-lhe provimento nos termos do voto do Juiz Relator e com ressalvas do Des. Grijalbo Coutinho. Ementa aprovada. Julgamento ocorrido por unanimidade de votos, sob a Presidência do Desembargador Grijalbo Coutinho, com a participação do Desembargador Dorival Borges e do Juiz convocado Luiz Henrique Marques da Rocha. Ausentes, justificadamente, os Desembargadores Flávia Falcão (na direção da Escola Judicial), Elaine Vasconcelos (em licença médica), André R. P. V. Damasceno (em gozo de férias) e o Juiz convocado Denilson B. Coêlho (em compromissos Institucionais). Pelo MPT, o Dr. Erlan José Peixoto do Prado (Procurador Regional do Trabalho). Presente o Dr. Carlos Pinheiro (advogado). Sessão Ordinária Presencial de 21 de maio de 2025 (data do julgamento). Juiz Convocado Luiz Henrique Marques da Rocha Relator(a) BRASILIA/DF, 26 de maio de 2025. ERIVELTO ANTONIO D ANUNCIACAO, Diretor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - PALMAS TECIDOS LTDA

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