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ID: 259139915
Tribunal: TRT10
Órgão: 3ª Turma
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 0001346-04.2023.5.10.0801
Data de Disponibilização:
23/04/2025
Advogados:
CINTIA REGINA MENDES
OAB/SP XXXXXX
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MURILO BRAZ VIEIRA
OAB/TO XXXXXX
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MARCO ANTONIO HENGLES
OAB/SP XXXXXX
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ELISANDRA JUCARA CARMELIN
OAB/TO XXXXXX
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ANA PAULA CRISPIM CAVALHEIRO
OAB/SP XXXXXX
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KATIUSCIA DA SILVA ABREU
OAB/TO XXXXXX
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SONIA MARIA FONSECA PEREIRA BOM
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 3ª TURMA Relatora: CILENE FERREIRA AMARO SANTOS 0001346-04.2023.5.10.0801 : SINDICATO DOS EMPREGADOS NO COMERCI…
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Ministério Público Do Trabalho e outros x Pet Center Comercio E Participacoes S.A. e outros
ID: 259139954
Tribunal: TRT10
Órgão: 3ª Turma
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 0001346-04.2023.5.10.0801
Data de Disponibilização:
23/04/2025
Advogados:
CINTIA REGINA MENDES
OAB/SP XXXXXX
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MURILO BRAZ VIEIRA
OAB/TO XXXXXX
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MARCO ANTONIO HENGLES
OAB/SP XXXXXX
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ELISANDRA JUCARA CARMELIN
OAB/TO XXXXXX
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ANA PAULA CRISPIM CAVALHEIRO
OAB/SP XXXXXX
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KATIUSCIA DA SILVA ABREU
OAB/TO XXXXXX
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SONIA MARIA FONSECA PEREIRA BOM
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 3ª TURMA Relatora: CILENE FERREIRA AMARO SANTOS 0001346-04.2023.5.10.0801 : SINDICATO DOS EMPREGADOS NO COMERCI…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 3ª TURMA Relatora: CILENE FERREIRA AMARO SANTOS 0001346-04.2023.5.10.0801 : SINDICATO DOS EMPREGADOS NO COMERCIO ESTADO TOCANTINS E OUTROS (1) : SINDICATO DOS EMPREGADOS NO COMERCIO ESTADO TOCANTINS E OUTROS (1) PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO PROCESSO nº 0001346-04.2023.5.10.0801 RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA (1009) RELATORA : DESEMBARGADORA CILENE FERREIRA AMARO SANTOS RECORRENTES: SINDICATO DOS EMPREGADOS NO COMERCIO ESTADO TOCANTINS PET CENTER COMÉRCIO E PARTICIPAÇÕES S.A. RECORRIDAS : AS MESMAS PARTES CFAS/6 EMENTA 1. RECURSO ORDINÁRIO DA RÉ 1.1 ILEGITIMIDADE ATIVA DE SINDICATO. Nos termos do art. 8º, III, da CF, o sindicato possui legitimação extraordinária para defender os interesses individuais e coletivos da categoria, razão pela qual não prospera a alegação da ré quanto à ilegitimidade ativa. 1.2 INÉPCIA DA INICIAL. AUSÊNCIA DE ROL DE SUBSTITUÍDOS. Em face da substituição ampla conferida aos sindicatos no art. 8º, III, da CF, o Supremo Tribunal Federal, em decisão vinculante, dispensou a exigência de rol de substituídos e por esse motivo foi cancelada a Súmula 310 do TST. Não há, portanto, inépcia da inicial. 1.3 INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. A ação civil pública é o instrumento apto para a defesa de direitos coletivos, caso dos autos, não se apresentando a alegada inadequação da via eleita. 2. RECURSO ORDINÁRIO DO AUTOR E DA RÉ. APRECIAÇÃO CONJUNTA 2.1 INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL INDIVIDUAL E COLETIVO. DESTINAÇÃO DOS VALORES INDENIZATÓRIOS. A configuração do dano moral coletivo pressupõe que o ilícito (descumprimento pelo agente de determinadas normas de conduta trabalhista) e seus efeitos excedam a esfera individual e atinja o patrimônio da coletividade. No caso, a ré realizou cobranças excessivas para o atingimento de metas de vendas de livros de parceiro comercial e expôs os empregados que ficassem por mais de 5min no banheiro, assim, evidenciada a conduta antijurídica, que atinge a coletividade, com grau de reprovabilidade diante da ordem jurídica, que faz emergir in re ipsa a afetação do patrimônio imaterial coletivo e autoriza o deferimento da indenização. O valor da indenização levou em consideração a gravidade da conduta praticada pela ré, o caráter inibitório e preventivo da medida. Não há falar em destinação dos valores ao sindicato autor, tendo em vista que o Supremo Tribunal Federal decidiu, na ADPF 944, que os valores relativos a condenações em ações civis públicas trabalhistas por danos morais coletivos devem ser direcionados para dois fundos: o Fundo dos Direitos Difusos (FDD) e o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). A sentença obedeceu aos comandos da decisão vinculante, nada havendo para ser reformado no aspecto. 3. RECURSO ORDINÁRIO DO AUTOR 3.1 HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Tratando-se de ação ajuizada na vigência do art. 791-A da CLT são devidos honorários advocatícios decorrentes da sucumbência, os quais não são cumuláveis com honorários assistenciais. Por esse motivo o pedido de honorários assistenciais na forma da Lei 5.584/70 são indeferidos. Tratando-se de causa de média complexidade, o percentual de honorários advocatícios fixados em primeira instância é proporcional e adequado, nada havendo para ser reformado no aspecto. 4. PEDIDO FORMULADO EM CONTRARRAZÕES 4.1 MAJORAÇÃO DO PERCENTUAL DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.O entendimento da Turma é de que não se aplica o art. 85, § 11, da CLT em razão da regulamentação específica do tema no art. 791-A da CLT. Pleito indeferido. Recurso ordinário do autor conhecido e não provido. Recurso ordinário da ré conhecido e parcialmente provido. RELATÓRIO Trata-se de recursos ordinários contra decisão proferida pelo Excelentíssimo Juiz Reinaldo Martini, da 1ª Vara do Trabalho de Palmas - TO, que julgou parcialmente procedentes os pedidos. A ré suscita a ilegitimidade ativa do Sindicato, a inépcia da inicial, a inadequação da via eleita e recorre quanto à indenização por dano moral coletivo. O sindicato autor recorre quanto à indenização por dano moral individual, à destinação da indenização por dano moral coletivo e aos honorários. Contrarrazões pelo sindicato autor às fls. 4.729/4.739 e pela reclamada às fls. 4.740/4.757. O Ministério Público do Trabalho se manifestou pela reiteração do parecer de fls. 4.645/4.670, da lavra da Excelentíssima Procuradora Luísa Nunes de Castro Anabuki, que entendeu pelo conhecimento e procedência parcial dos pedidos. FUNDAMENTAÇÃO ADMISSIBILIDADE RECURSO ORDINÁRIO DO SINDICATO AUTOR O recurso ordinário é regular e tempestivo. O valor da causa supera o dobro do salário mínimo. Há sucumbência. As partes estão devidamente representadas (fls. 44 e 133). Não há custas a cargo do autor (fl. 4.677). Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade do recurso, dele conheço. Não conheço do pedido de reversão dos honorários advocatícios formulado em contrarrazões pela ré, por inadequação da via eleita. RECURSO ORDINÁRIO DA RÉ O recurso ordinário é regular e tempestivo. O valor da causa supera o dobro do salário mínimo. Há sucumbência. As partes estão devidamente representadas (fls. 44 e 133). As custas e o depósito recursal foram recolhidos (fls. 4.707/4.710). Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade do recurso, dele conheço. MÉRITO 1. RECURSO ORDINÁRIO DA RÉ 1.1 ILEGITIMIDADE ATIVA A reclamada suscita a ilegitimidade ativa do sindicato autor para postular direitos individuais homogêneos em razão da inexistência de prévia assembleia para autorizar o sindicato a ajuizar a ação coletiva. A legitimidade do sindicato para pleitear direitos coletivos e individuais decorre da Constituição (art. 8º, III, da CF), por isso, não há que se falar em ilegitimidade do autor para pleitear direitos dos representados. O estatuto social do sindicato, inclusive, prevê que é prerrogativa do ente sindical "defender os direitos e interesse coletivos ou individuais, dos integrantes da categoria profissional representada, inclusive como substituto processual" (fl. 54). Com base nisso, a atuação do sindicato é como substituto processual e não é necessária a realização de assembleia para votação e autorização do ajuizamento de ação coletiva, pois a autorização é constitucional. O pedido do sindicato autor é de condenação da reclamada pela prática de condutas abusivas no exercício do poder diretivo do empregador, que impõe metas de vendas de livros de parceira comercial, com cobranças excessivas e aplicação de penalidades aos empregados que não alcançam os objetivos de vendas. A narrativa da inicial permite a conclusão de que se trata de direito individual homogêneo, qualificado pelo Código de Defesa do Consumidor como aquele que tenha origem comum. No caso dos autos, a alegação é de comportamento ilícito da reclamada, em abuso de direito, na cobrança excessiva de metas com violação aos direitos de personalidade de seus empregados. Este é o fato comum. O Sindicato dos Empregados no Comércio no Estado do Tocantins - SECETO tem legitimidade para atuar em representação dos trabalhadores no comércio no Estado do Tocantins (fl. 53), logo, é legítimo para substituir os empregados da reclamada no Tocantins. Logo, não há que se falar em ilegitimidade do sindicato. Diante do exposto, nego provimento ao recurso. 1.2 INÉPCIA DA INICIAL A reclamada suscita a inépcia da inicial ao argumento de que o sindicato autor deixou de apresentar o rol de substituídos que autorizaram expressamente o ajuizamento da ação coletiva. Tratando-se de legitimação extraordinária, o Supremo Tribunal Federal, em decisão vinculante, afastou a necessidade de apresentação de rol de substituídos, o que motivou o cancelamento da Súmula 310 do TST há mais de vinte anos. Assim sendo, não há falar em inépcia da inicial por ausência do rol de substituídos. Diante do exposto, nego provimento ao recurso. 1.3 INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA A reclamada afirma que falta pressuposto processual de validade e constituição e desenvolvimento do processo, por isso, a ação não pode ser conhecida. Aduz que a narrativa da inicial demonstra que os direitos objeto da ação civil pública tem natureza individual e exigem a análise da situação de cada colaborador, razão pela qual a tutela coletiva não é a via adequada. A inadequação da via eleita ocorre quando a parte escolhe um tipo de ação ou procedimento que não é adequado para resolver a questão jurídica apresentada. O pedido do sindicato autor é de condenação da reclamada pela prática de condutas abusivas no exercício do poder diretivo do empregador, que impõe metas de vendas de livros de parceira comercial, com cobranças excessivas e aplicação de penalidades aos empregados que não alcançam os objetivos de vendas. Trata-se de defesa de direito coletivo dos empregados da reclamada, logo, não há falar em inadequação da via eleita. A hipótese não se relaciona com o Verbete 71, II, deste Regional, que trata das ações coletivas e não de ação civil pública. Diante do exposto, nego provimento ao recurso. 2. RECURSOS ORDINÁRIOS DA RÉ E DO SINDICATO AUTOR. APRECIAÇÃO CONJUNTA 2.1 AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL COLETIVO E INDIVIDUAL. DESTINAÇÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO O pedido de indenização por dano moral coletivo e individual foram julgados parcialmente procedentes com os seguintes fundamentos: "O sindicato autor postulou o pagamento de danos morais individuais e coletivos em virtude da ocorrência de atos realizados pela reclamada em face de seus funcionários, sob os seguintes fundamentos: cobrança de metas abusivas para a venda de livros; ameaças de punições caso os empregados não atinjam as metas; pressão psicológica exercida sobre os empregados; limitação do uso do banheiro; anúncio do nome do empregado no microfone em caso de demora. A reclamada negou a existência de metas a serem alcançadas pelos funcionários, bem como a obrigatoriedade da venda dos livros, havendo apenas o incentivo para que os funcionários as realizem. Aduziu que a empresa atua com respeito e dignidade em relação aos seus empregados. Negou a limitação/controle de uso do banheiro pelos funcionários, como também o anúncio dos nomes pelo microfone. Requereu a improcedência dos pedidos. A respeito da alegação de obrigatoriedade e metas de vendas de livros, em audiência (ID 037233f), o preposto da reclamada afirmou que: "01) a campanha de venda de livros existe há 5 anos; 04) quem vende os livros ganha recompensas como folgas ou brindes, a critério do gerente, para estimular o comprometimento com a campanha e gerar uma competição saudável". A testemunha do autor NICOLY SAMARA CIDRIM LOFFREDO declarou em audiência (ID 037233f) que: "08) a gerente Érica cobrava a venda dos produtos MOL e essa cobrança era feita pessoalmente e também por mensagens whatsapp; 09) a referida gerente ficava também no caixa, cobrando as vendas e dizendo que, se não batesse a meta, iam ganhar suspensão; 10) havia meta de venda de 6 MOLs por dia para cada caixa; 11) já comprou MOL várias vezes para ajudar um colega". A testemunha da ré ANTHONY DE SOUZA MENDES, apesar de ter afirmado que não era obrigatório e não havia metas de vendas dos livros, disse em seguida que chega uma quantidade de livros e os empregados tentam vender o máximo. Além disso, que a gerente Érica queria ficar bem no ranking de vendas. Apesar da divergência, entendo que a prova oral produzida demonstra que a empresa promovia uma competição entre os funcionários, com a bonificação de prêmios, para estimular as vendas dos livros, com o intuito de figurar no topo do ranking. Em virtude disso, a gerente Érica realizava pressão diária nos funcionários operadores de caixa para que as vendas fossem realizadas, seja pessoalmente ou por grupo de whatsapp (ID bf35978), sob pena de suspensão. A jurisprudência do TRT da 10ª Região reconhece a ocorrência de assédio moral em casos de cobrança excessiva por metas, senão vejamos: DANO MORAL. INDENIZAÇÃO. COMPROVAÇÃO. ASSÉDIO MORAL. O rigor excessivo dos prepostos do empregador na cobrança de metas, à base de ameaça de demissão dos empregados menos produtivos, gera tensões e ansiedades, tornando o ambiente de trabalho impróprio e desgastante e atingindo a esfera psíquica dos trabalhadores. A ilicitude desta conduta agrava-se, pois a legislação atribui ao empregador o encargo de zelar e propiciar aos trabalhadores um ambiente de trabalho de boa qualidade. A destinação da indenização do dano moral é exatamente ressarcir o prejuízo íntimo decorrente de ato injusto. Porém, este prejuízo íntimo deve ser evidente a ponto de destacar-se das frustrações e decepções do cotidiano. Constatado o assédio moral pelas provas dos autos, com notória inquietação emocional imprimida por um ambiente severo e hostil, é cabível a indenização pelo dano moral. (RO 0001353-66.2017.5.10.0102, Relator: Des. Dorival Borges de Souza Neto, acórdão publicado em 25/05/2019). Sendo assim, considero que restou comprovada a prática de assédio moral coletivo pela reclamada em razão da cobrança excessiva na campanha de vendas de livros, inclusive com punições para os funcionários que não atingissem a meta diária imposta. Em relação à limitação do uso do banheiro e anúncio do nome do empregado no microfone em caso de demora, em audiência (ID 037233f), a testemunha do autor NICOLY SAMARA CIDRIM LOFFREDO declarou que: "13) para ir ao banheiro, tinham que pedir permissão para a gerente e só era permitido se alguém ficasse no lugar, para não ficar sem ninguém; 14) se o empregado demorasse 5 minutos no banheiro o nome dele era anunciado no microfone; 18) o depoente ficou uns 5 a 10 minutos no banheiro e foi chamado numa salinha da gerente Érica, o que aconteceu várias vezes, sendo perguntado se estava passando bem". Considerando o depoimento acima mencionado, bem como a impugnação genérica da ré, considero ilícitas as referidas ações da ré agravando a ocorrência do assédio moral dos trabalhadores. Sobre as cobranças excessivas sobre os empregados, apesar de o preposto justificar a demissão de alguns funcionários por descumprimentos das normas internas da ré, a prova oral demonstra um ambiente de trabalho conflituoso, com alguns empregados adoecidos, e com a utilização pela ré de diferentes critérios de punição em casos semelhantes. Evidenciada a existência de ilícito que afete uma coletividade de trabalhadores, entendo ser devido o pagamento de indenização por dano moral. O valor da indenização deve levar em conta o desvalor da conduta, a extensão do dano e o poder aquisitivo da empresa faltosa. O autor postulou o pagamento de indenização por danos individuais. No caso dos autos, não há elementos para aferição dessa extensão e da capacidade financeira da ré. Além disso, requer o pagamento para cada trabalhador substituído que laborou e está laborando na Reclamada, a ser individualizado em fase de liquidação. Ante a impossibilidade de individualização dos danos coletivos, tendo em vista os diversos fundamentos envolvidos para sua concessão e a situação fática de cada trabalhador, rejeito o pedido de indenização por danos individuais. Ainda, a parte autora postulou o pagamento de danos morais coletivos. Segundo Orlando Gomes, citado por Rodolfo Pamplona Filho (ob. cit., p. 86), a reparação do dano moral é uma sanção materializada através de uma compensação pecuniária. Dessa assertiva, extrai-se a dupla função da indenização concedida: punitiva e reparatória. Nesse sentido, Walmir Oliveira da Costa esclarece que: "a) função reparatória tem como finalidade oferecer compensação ao lesado e, assim, atenuar o seu sofrimento, recaindo em montante razoável do patrimônio do ofensor, de tal modo que ele não persista na conduta ilícita. b) a função punitiva consiste em aplicar uma sanção ao lesante, visando coibir ou inibir atentados ou investidas contra direitos personalíssimos de outrem, razão de funcionar como penalidade de natureza pedagógica. Serve de advertência para que o ofensor não reincida na prática de atos lesivos à personalidade alheia e de exemplo à sociedade que, em suas relações, deve pautar-se por conduta ética e de respeito mútuo no campo das relações jurídicas e sociais." (in Dano moral nas relações laborais, Curitiba: Juruá, p. 122). Por isso, e considerando tudo o que foi ponderado, julgo procedente o pedido de pagamento de indenização por danos morais coletivos, todavia no importe de R$150.000,00. Quanto à destinação da indenização deferida, o Ministério Público do Trabalho manifestou-se no ID 69ef38a, em consonância com a jurisprudência do C. TST e recente decisão do Ministro do Supremo Tribunal Federal Flávio Dino, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 944, para que seja observada a destinação social da condenação, não cabendo a reversão ao sindicato, ainda que em defesa da categoria representada. Desta forma, determino que a condenação seja revertida ao Fundo de Defesa dos Diretos Difusos (FDD), mediante transparência e rastreabilidade aos valores, podendo apenas ser utilizados para programas e projetos destinados à proteção dos direitos dos trabalhadores. Das Obrigações de Fazer e Pagar A parte autora pugnou pela condenação para que a reclamada institua percentual de comissão sobre a venda de produtos/livros, bem como pagar valores retroativos sobre as vendas realizadas desde o início do contrato de cada substituído, com reflexos nas verbas trabalhistas. O critério adotado pela empresa para pagamento da forma remuneração de seus trabalhadores está inserto nas prerrogativas do seu poder diretivo, ou seja, do poder de direção da organização da prestação de serviços. A Cláusula 11ª da CCT 2021/2023 (ID e0e8d6f), dispõe que: "Aos vendedores, balconistas, demonstradores e comissionados em geral é assegurado um salário fixo na importância equivalente ao piso mínimo convencionado na Cláusula 3ª no valor de R$ 1.254,54 (mil duzentos e cinquenta e quatro reais e cinquenta e quatro centavos), vigente em cada mês, (+) comissão a ser negociada entre as partes, anotada em CTPS". (g.n) Competia ao postulante comprovar negociação entre as partes para instituição de comissões sobre as vendas, ônus que não se desincumbiu. Portanto, rejeito os pedidos de instituição e pagamento retroativo de comissões sobre as vendas."(fls. 4.673/4.677) A reclamada pretende a reforma da sentença ao argumento de que as declarações da informante tiveram peso maior que as declarações da testemunha arrolada pela ré. Afirma que não há prova de que a reclamada tenha estipulado metas absurdas e efetuado controles abusivos em relação à utilização dos banheiros. Aduz que existe um estímulo para a venda de livros, que não pode ser confundido com metas. Argumenta que não há prova de que o ambiente de trabalho era conflituoso e que alguns empregados adoeceram em razão das cobranças, assim como que as punições aplicadas foram legítimas e não se relacionavam com a venda de livros. Alega que as testemunhas apresentadas pelo autor são as denunciantes, ex-empregadas, dispensadas por condutas ilícitas, razão pela qual não possuem credibilidade. Pede, subsidiariamente, a redução do valor da indenização, na forma do art. 223 da CLT. O autor busca a reforma da sentença quanto ao dano moral individual. Afirma que as cobranças excessivas, a pressão diária e aplicação de punições aos empregados ocorriam pessoalmente e em grupo de whatsapp, a fim de que os empregados pedissem demissão. Aduz que a indenização por dano moral individual é cabível. Na inicial, o sindicato autor narrou que em julho de 2023 recebeu e-mails de ex-empregados da reclamada com denúncias de que a reclamada limitava o uso de banheiros em 5min, com exigência de que os empregados avisassem à gerência quando fossem usar o banheiro e, caso ultrapassado o lapso, os trabalhadores eram punidos com advertências verbais ou por escrito. Disse que a gerência, na figura de Israel e Nercinha, anunciavam no microfone o dever do empregado que estava no banheiro de voltar ao posto de trabalho. Alegou que, em um episódio, Israel abriu a porta do banheiro feminino e mandou a empregada sair e ir embora para casa. Aduziu que a prática causa dano psicológico aos empregados, como fortes crises de ansiedade, desânimo, estresse, medo e depressão. Afirmou que os empregados eram obrigados a vender livros, calendários, jogo dos sete erros e caça palavras da Editora Mol, diretamente nos caixas da loja, com a obrigação de vender 4 livros por dia, no valor de R$ 10,90 cada. Argumentou que os empregados trabalham sobre pressão recorrente e ameaças da reclamada de aplicação de advertências, suspensões e demissão por justa causa. Disse que a gerente Érika cobrava a venda de livros de 2 em 2 horas e exigia a venda de 4 livros por dia e que as cobranças ocorriam presencialmente e no whatsapp. Afirmou que os empregados não recebiam comissões pelas vendas e que os empregados costumavam a comprar livros uns dos outros para ajudar na meta individual dos colegas. Afirmou que a reclamada tratava os empregados com rigor excessivo a fim de forçá-los a pedir demissão, aplicando advertências e suspensões sem motivos plausíveis. Aduziu que ex-empregada recebeu advertência por não conseguir bater a meta de vendas do livro Mol e por não usar EPI, mas que ninguém na loja era cobrado do uso, bem como que a reclamada aplicou suspensão em razão da trabalhadora se negar a deixar a função de operadora de caixa. Alegou que os gerentes usam frases desrespeitosas, dão feedbacks constrangedores aos empregados e que falam para os empregados que "Se quiser sair às portas estão abertas" (fl. 17). Asseverou que a perseguição e a tortura psicológica aos antigos empregados por parte do gerente abrangia proibir a comunicação entre os funcionários, com ameaças de demissão e aplicação de suspensão sem motivos plausíveis. Afirmou que todos os empregados da filial da reclamada de Palmas-TO estão passando pelos abusos. A reclamada se defendeu ao argumento de que as denúncias de cobranças abusivas foram feitas por ex-empregados insubordinados, que descumprem as suas obrigações e não respeitam a hierarquia da loja. Aduziu que as trabalhadoras foram punidas por não cumprir com as obrigações do contrato de trabalho e não por não alcançar as metas de vendas. Disse que as empregadas deixaram de usar EPI, se recusaram a atender cliente e faltaram injustificadamente, por isso, receberam as punições. Alegou que a empregada Suzany foi dispensada por justa causa por ter xingado o gestor e que houve a aplicação de advertência a empregada por ter tirado duas horas de almoço injustificadamente. Argumentou que não há controle de uso de banheiro, excesso de cobrança de metas e aplicação de penalidades pelo não alcance da meta de vendas, bem como que o sindicato autor não realizou diligências na reclamada para confirmar as denúncias. Alegou que o contrato de trabalho dos empregados prevê o pagamento de remuneração e não comissão. A configuração do dano moral coletivo pressupõe que o ilícito (descumprimento pelo agente de determinadas normas de conduta trabalhista) e seus efeitos excedam a esfera individual e atinja o patrimônio da coletividade. Portanto, deve ser apurado se a conduta do réu atingiu coletividade de empregados e a existência de prejuízo para um grupo ou classe de pessoas bem como a reprovação social de tal procedimento. Comprovado esse fato, emerge in re ipsa a afetação do patrimônio imaterial da coletividade que autoriza o deferimento da indenização por dano moral coletivo, a qual não se confunde com a indenização por dano moral individual. As imagens de whatsapp de fls. 111/116 demonstram conversas com número não identificado em que uma das interlocutoras pede explicações sobre advertência recebida e recebe resposta de que a interlocutora não ficará respondendo sobre isso. Há conversas em grupo denominado "OP CAIXA Petz" em que Nercina Resplandes e Erika Petz cobram os participantes sobre a venda de 4 livros Mol por dia, com especial enfoque em Luana e Bruna, além disso, Erika Petz afirma que será chata na cobrança e Nercina informa que tem que ser vendidos uma média de 14 livros por semana antes da chegada de Carlos Distrital CO2. Em um dos diálogos, Erika Petz afirma que irá cobrar de duas em duas horas quanto cada empregada vendeu e uma das interlocutoras pergunta se está sendo punida por não ter vendido livros da Mol e fica sem resposta. À fl. 117 é comunicado de dispensa por justa causa da empregada Bruna Rafaela Silva Santos Rodrigues em 26/7/2023 por ato de insubordinação, pois negou atendimento do cliente após solicitação do encarregado da loja. À fl. 118 está o comunicado de dispensa por justa causa de Suzany Moreira de Oliveira em 29/7/2023 por mau procedimento, pois compareceu na loja com ex-empregado e ocorreram brigas e ameaças. Às fls. 161/2.475 estão listagens com nomes de pessoas e cargos, imagens de sistema com nome, remuneração, cargo e carga horária, e comprovantes de transferências. Em 1º/7/2023 a ex-empregada Bruna Rafaela Silva Santos Rodrigues recebeu advertência por desídia, pois deixou de usar EPI obrigatório fornecido pela empresa (fl. 2.476). Em 27/6/2023, a ex-empregada Bruna Rafaela Silva Santos Rodrigues recebeu advertência por ato de indisciplina ou insubordinação, pois faltou cumprimento de suas tarefas (fl. 2.477). Em 26/7/2023, a ex-empregada Bruna Rafaela Silva Santos Rodrigues foi dispensada por justa causa por ato de insubordinação, pois negou atendimento a cliente após solicitação do encarregado da loja (fl. 2.478). Em 7/7/2023, a ex-empregada Bruna Rafaela Silva Santos Rodrigues foi suspensa por 3 dias por falta injustificada em 6/7/2023 (fl. 2.479). No documento consta o início da suspensão em "7/6/2023", por inexatidão material e impossibilidade lógica, a data correta é 7/7/2023. Em 3/7/2023, a ex-empregada Bruna Rafaela Silva Santos Rodrigues foi suspensa por 2 dias por ter se negado a atender ordem de gerente de atender cliente na frente do consumidor (fl. 2.480). A ex-empregada Suzany Moreira de Oliveira foi suspensa em 21/6/2023 por desrespeitar os gestores da loja na frente dos clientes e os funcionários, deixando-os constrangidos (fl. 2.481). Em 29/7/2023, a ex-empregada Suzany Moreira de Oliveira foi dispensada por justa causa ao fundamento de que atuou com mau procedimento ao comparecer na loja acompanhada de ex-funcionário, ocasionando ameaças e brigas com os colaboradores (fl. 2.482). Em 31/5/2023, a ex-empregada Suzany Moreira de Oliveira recebeu pena de advertência por ter tirado mais de 2h de intervalo intrajornada (fl. 2.483). Em 31/1/2023, a ex-empregada Suzany Moreira de Oliveira recebeu penalidade de advertência por ter xingado o gestor e faltado com respeito (fl. 2.484). O empregado Lucas Gomes Rodrigues foi punido por incontinência de conduta ou mau procedimento por não ter cumprido o horário da sua jornada (fl. 2.485). A empregada Brenda Granja Sousa foi advertida em 13/7/2023 por indisciplina ou insubordinação ao ter conversas paralelas e aglomerar nos corredores da loja (fl. 2.486). A empregada Brenda Granja Sousa foi advertida em 15/7/2023 por desídia ao faltar com respeito com a gestão da loja, causar tumulto e alterar a voz e agir com agressividade (fl. 2.487). Os empregados Italla Gomes de Jesus, Nicoly Samara Cidrim Lofredo, Nubia Batista da Silva, Wanderson de Jesus Andrade, Lucas Gomes Rodrigues, Henrique Pereira da Silva, Luenda Jhully Pereira de Sousa, Rone Fonseca Araújo, Celso Alves Lima Costa do Carmo, Lindevaldo Junior, Israel Tedesco, Anthony de Souza Mendes, Hudson da Silva Barros e Francisco Israel dos Santos foram advertidos e suspensos por: conversas paralelas e aglomeração na loja, falha no "comprimento" dos processos dentro da sua função, ausência de respeito e obediência aos gestores, não cumprimento de suas tarefas, não cumprimento de seus deveres, falta de cumprimento de suas tarefas, uso de celular e conversas nos corredores, não cumprimento de suas obrigações, falta injustificada, atrasos constantes, falta de respeito com a gestão, permanência na copa por 15/20min, tratar encarregado com falta de respeito e falta de uso de EPI (fls. 2.488/2.511). A maior parte das penalidades foi aplicada por Erika, mesmo nome da interlocutora nas conversas de whatsapp, e a maioria das penalidades aplicadas são fundadas em motivos genéricos, como falta de cumprimento de funções ou tarefas, ausência de respeito aos superiores ou conversas paralelas e aglomerações. Às fls. 2.562/2.575 está listagem de livros com data e sigla da loja. Os links de fl. 2.576 retornam a mensagem de que o arquivo não existe. É responsabilidade da parte manter o arquivo no hospedeiro em todos os níveis recursais. A petição inicial e documentos da ação ajuizada pela ex-empregada Bruna Rafaela Silva Santos Rodrigues está às fls. 2.578/2.676. Nos documentos, constam mais imagens de whatsapp em que interlocutora salva como "Erika Petz" informa no grupo "OP CAIXA Petz" que está sendo cobrada pela venda de Mol de seus superiores, parabeniza pelas vendas no dia 23/5/2023, fixa meta de venda de 800 livros, diz que não quer ver ninguém sem fazer nada, que a Petz paga para os empregados trabalharem e se os gerentes pegarem fofocas e intrigas na loja, que ligam para Erika que dará advertência e manda para casa. Além disso, Erika pede que aos funcionários que só batam ponto e entrem na loja quando estiverem uniformizados, e solicita que Nercina Resplandes cobre dos funcionários. Os documentos de fls. 2.678/4.606 são 2ª via de comprovantes de crédito. Não há confissão do preposto da reclamada que aproveite a parte contrária. A testemunha Nicoly Samara Cidrim Loffredo, arrolada pelo autor, advertida e compromissada, declarou que: "01) os atos de cobrança excessiva eram praticados pela gerente Érica; 02) essa gerente perseguiu os empregados e demitiu os empregados antigos, sendo umas demissões por justa causa, mas sem motivo; 03) o depoente ficou triste com a empresa, pois era advertido constantemente, recebeu suspensão, precisou fazer tratamento psiquiátrico porque desenvolveu crises de ansiedade; 04) trabalhou com a gerente Érica por uns 3 ou 4 meses, ficando sabendo que ela só trabalhou na loja por 4 ou 5 meses e depois pediu transferência; 05) a Brenda passou por mais perseguições que o depoente, pois era operadora de caixa; 06) trabalhou na empresa por 1 ano e 7 meses, na função de atendente de pick up, para entrega das vendas on line, e, quando tinha tempo, como atendente de pátio; 07) já atuou no caixa; 08) a gerente Érica cobrava a venda dos produtos MOL e essa cobrança era feita pessoalmente e também por mensagens whatsapp; 09) a referida gerente ficava também no caixa, cobrando as vendas e dizendo que, se não batesse a meta, iam ganhar suspensão; 10) havia meta de venda de 6 MOLs por dia para cada caixa; 11) já comprou MOL várias vezes para ajudar um colega; 12) a gerente Érica ficava na loja infernizando os empregados e vigiando o trabalho, questionando quando os empregados ficavam conversando, dizendo em reunião que quem não estivesse satisfeito poderia sair; 13) para ir ao banheiro, tinham que pedir permissão para a gerente e só era permitido se alguém ficasse no lugar, para não ficar sem ninguém; 14) se o empregado demorasse 5 minutos no banheiro o nome dele era anunciado no microfone; 15) várias pessoas poderiam reclamar da demora no banheiro, incluindo caixas, supervisores e até o colega que ficou substituindo o posto; 16) não havia controle do número de idas ao banheiro; 17) a empresa pedia para avisar se o empregado tivesse algum problema de incontinência urinária; 18) o depoente ficou uns 5 a 10 minutos no banheiro e foi chamado numa salinha da gerente Érica, o que aconteceu várias vezes, sendo perguntado se estava passando bem; 19) também já foi chamado na salinha porque chegou atrasado ou porque não atendeu cliente ou não usou EPI por ter esquecido; 20) era obrigatório o uso de EPI; 21) presenciou todas as advertências de todos os funcionários da empresa e tinha conhecimento de todas as advertências; 22) já aconteceu de uma amiga ter recebido advertência e outro empregado não, embora os dois estivessem sem EPI; 23) essa amiga se chama Bruna e era perseguida; 24) não participou de reunião ou assembleia para decidir sobre essa ação." (fl. 4.634) As declarações da testemunha são no sentido de que a gerente Érica cobrava excessivamente o alcança da meta de venda de 6 livros Mol por dia, assim como perseguia empregados e os dispensava sem justa causa sem motivo. Disse que precisou fazer tratamento psiquiátrico e que as cobranças eram pessoais e por whatsapp. Declarou que a gerente ameaçava os funcionários com suspensão, caso não batessem as metas, que já comprou livros para ajudar os colegas e que a gerente dizia que quem não estivesse satisfeito poderia sair. Disse que tinham que pedir para ir ao banheiro e só poderiam ir se houvesse funcionário para ficar no lugar e, caso demorassem mais de 5min, o nome era anunciado no microfone da empresa, assim como que a empresa pedia para avisar se o funcionário tivesse problema de incontinência urinária. Declarou que ficou uns 5/10min no banheiro e foi chamado pela gerente Érica para questionar se a autora estava bem, que já foi chamada pela gerente por ter chegado atrasada e esquecido de usar EPI e que era obrigatório o uso de EPI. Disse que já aconteceu da empregada Bruna ter recebido advertência por não ter usado EPI e outro colega que também não usava, não. A testemunha Brenda Granja Sousa, arrolada pelo autor, inquirida, informou que foi perseguida na empresa e saiu de lá muito magoada, que se a empresa não fosse punida ficaria com a sensação de impunidade e, conforme o relato da magistrada, mostrou-se emocionada, demonstrando que seu ânimo se encontra afetado pelas ocorrências vividas no ambiente de trabalho. A testemunha foi ouvida como informante e declarou que: "01) de abril/2021 a agosto/2023, na função de operadora de caixa; 02) começou a fazer tratamento médico psiquiátrico em 2023, por crise de ansiedade, e ainda está em tratamento, com uso de medicação, e está melhor; 03) teve que voltar para o trabalho depois que teve seu primeiro filho, com licença 1 mês antes do nascimento, retornando quando a criança tinha só 3 meses, praticamente no puerpério; 04) teve crise de ansiedade quando voltou ao trabalho, principalmente pelas cobranças realizadas pela gerente Érica para a venda do MOL; 05) a cobrança era para bater a meta diária de 4 ou 5 livros do MOL e, se não atingisse, receberia advertência ou suspensão; 06) a depoente não vendeu a meta em um dia e a gerente disse à depoente que teria que sentar em seu lugar para fazer a função da depoente e vender o MOL, e a depoente não gostou como foi dito e por ter sido na frente das pessoas e questionou a gerente, dizendo que ela deveria dar o feedback no particular; 07) a gerente não gostou de ser questionada e falou que a depoente estava sendo insubordinada e deu suspensão de 3 dias, com desconto no salário; 08) não sabe se algum empregado já comprou MOL para bater a meta, o que nunca aconteceu com a depoente; 09) na orientação da empresa, o empregado tinha que pedir autorização para os gestores, e eles sempre deixavam, mas ficavam monitorando o tempo todo e, se demorasse, eles chamavam no microfone; 10) a depoente já foi chamada várias vezes no microfone, por causa do banheiro; 11) a empresa não estabelecia o tempo para ficar no banheiro, mas, se houvesse demora, o empregado era procurado; 12) já aconteceu de colegas caixas demorarem no banheiro e a depoente ficar sozinha no caixa, mas não reclamou disso; 13) o gerente dizia que se o empregado tivesse incontinência urinária isso deveria ser informado; 14) quando a Suzani foi suspensa ela não pôde bater o cartão de ponto, pois a máquina foi retirada do lugar, sendo dito que ninguém iria bater o ponto na saída porque a Suzani ainda estava na loja; 15) a empresa dizia que era obrigatório o uso de EPI, mas nem todo mundo usava; 16) a depoente usava EPI, salvo na gestação, que foi liberada pela empresa" Nada mais." (fl. 4.635) A testemunha trabalhou na reclamada de abril de 2021 a agosto de 2023 e declarou que começou a fazer tratamento psiquiátrico em 2023 por crise de ansiedade e ainda está em tratamento, que as crises começaram quando retornou ao trabalho, após a licença maternidade. Disse que a gerente cobrava a venda de 4 ou 5 livros mol por dia e, caso não fosse alcançada, recebiam advertências e suspensões, assim como que um dia que não alcançou a meta diária, a gerente disse à depoente que teria que se sentar no seu lugar para fazer sua função e vender mol, o que foi dito na frente de outras pessoas. Ao questionar a gerente, foi chamada de insubordinada e recebeu suspensão. Declarou que a orientação na empresa era de o empregado tinha que pedir autorização da gerência para usar o banheiro, que ficavam monitorando o tempo que demorava, e, se demorasse, chamavam o funcionário no microfone, o que já ocorreu consigo. Disse que os empregados com incontinência urinária deviam informar a condição à chefia e que era obrigatório o uso de EPI, mas que nem todo mundo usava. Declarou que os empregados não puderam bater o ponto em um dia, pois a máquina foi retirada por conta da empregada Suzany que foi suspensa e ainda estava na empresa. A testemunha Anthony de Souza Mendes, arrolada pela ré, advertida e compromissada, declarou que: "01) trabalha na empresa desde setembro/2022, atualmente na função de atendente, mas já desempenhou a função de repositor durante o primeiro ano de trabalho; 02) não é obrigatório vender livros do MOL, e não tem uma meta; 03) chega uma quantidade de livros do MOL e os empregados tentam vender o máximo; 04) trabalhou com a gerente Érica, que era muito centrada nas demandas da empresa, cuidando da organização de loja e do atendimento; 05) a Érica era um pouco rígida das caixas para tentar vender o máximo de MOL porque as vendas ajudavam as ONGs; 06) havia um ranking diário das vendas das lojas de Distrito, pois as lojas são divididas assim; 07) a gerente Érica queria ficar bem no referido ranking de vendas; 08) não tinha metas de vendas de MOL por dia; 09) Érica foi transferida de Palmas/TO, mas não sabe dizer o motivo; 10) a reclamada já ficou em 1º lugar no ranking; 11)não presenciou a gerente chamando a atenção na frente dos outros empregados, pois ela chamava na sala da gerência; recebeu advertência 12) por ter faltado ao trabalho sem justificativa." (fls. 4.635/4.636) A testemunha começou a trabalhar na empresa em setembro de 2022 e declarou que os empregados não eram obrigados a vender mol e que não existia a imposição de metas de vendas, que os livros chegavam e os empregados tentavam vender ao máximo, que a gerente Érica era muito centrada nas demandas da empresa, assim como era um pouco rígida com as caixas para tentar vender os livros Mol, pois ajudavam ONG´s. Disse que havia ranking de vendas no Distrito e que a gerente queria ficar bem no ranking de vendas, que não presenciou a gerente chamando a atenção na frente de outros colegas. A testemunha Nicoly declarou que a empresa orientava os funcionários a pedirem autorização para usar o banheiro e que o uso era limitado a 5min, caso ultrapassado, o nome do funcionário era chamado no microfone da empresa, assim como não havia limitação de idas ao banheiro e que a chefia pedia para os empregados informassem se tivessem incontinência urinária. As declarações da informante Brenda foram no mesmo sentido. Não há problema na conduta do empregador de pedir para que os empregados avisem ao ir ao banheiro, pois é necessário o controle de caixas e atendentes disponíveis na loja, o que é necessário ao comerciante a fim de manter a qualidade dos serviços, inclusive, a testemunha Nicoly declarou que não havia limitação de idas ao banheiro e a chefia pedia para que avisassem caso o empregado tivesse incontinência urinária. Todavia, chamar os empregados para conversar em sala particular quando havia demora superior a 5min no banheiro e chamar no microfone do estabelecimento os trabalhadores que demoravam no sanitário é conduta abusiva do empregador, configurada no abuso de direito. A testemunha Anthony não fez declarações sobre a limitação do uso do banheiro. A testemunha Nicoly declarou que a gerente Érika cobrava a venda de livros da Mol, presencialmente e por whatsapp, dizendo que se as metas não fossem batidas aplicaria suspensão, assim, como ficava nos corredores vigiando o trabalho, questionando os empregados que ficavam conversando e dizendo em reunião que quem não estava satisfeito poderia sair. Declarou que já foi chamada na "salinha" porque chegou atrasada e esqueceu de usar o EPI. As declarações da informante Brenda foram no sentido de que o gerente Érika cobrava a venda de 4 ou 5 livros da Mol por dia e quem não vendesse, receberia advertências e suspensões. A vigilância dos funcionários durante a jornada de trabalho quanto ao uso obrigatório de EPI e as conversas nos corredores da empresa não revelam abuso de direito do empregador. A ausência de uso de EPI gera consequências legais ao empregador e as conversas prejudicam o atendimento na loja, de igual modo, chamar a reclamante para conversar na "salinha" por atraso injustificado ou falta de EPI não é conduta abusiva, ainda mais ao se considerar que são descumprimentos de obrigações contratuais do empregado e foram feitas preservando a intimidade do trabalhador. A cobrança de vendas diárias de livros da Mol com a ameaça de advertências e suspensões é conduta abusiva do empregador. Dentre as penalidades aplicadas aos empregados, várias são genéricas, com as justificativas de falha no "comprimento" (sic) dos processos dentro da sua função, ausência de respeito e obediência aos gestores, não cumprimento de suas tarefas, não cumprimento de seus deveres, falta de cumprimento de suas tarefas e não cumprimento de suas obrigações. As imagens de diálogos no whatsapp demonstram que a gerente Érika cobrava os vendedores para a venda de 4 livros Mol por dia, com especial enfoque em Luana e Bruna, além disso, Erika Petz afirma que será chata na cobrança e Nercina informa que tem que ser vendidos uma média de 14 livros por semana antes da chegada de Carlos Distrital CO2. Em um dos diálogos, Erika Petz afirma que irá cobrar de duas em duas horas quanto cada empregada vendeu. Os diálogos são no sentido das declarações da testemunha Nicoly, incrementadas pelas declarações da informante Brenda, de que a gerente Érika cobrava os funcionários de vendas diárias, inclusive com informação de que deveriam vender 14 livros no dia pois Carlos chegaria, indicando que se tratava de um supervisor. Há ainda informação de Érika de que cobraria a venda de duas em duas horas e que a própria gerente Érika estava sendo cobrada quanto às vendas. A testemunha Anthony declarou que a gerente Érika era um pouco rígida e cobrava a venda dos livros para ajudar as ONG´s, assim como que não presenciou a gerente chamando a atenção na frente de outros empregados. As imagens de conversas no whatsapp demonstram a exigência contínua da gerente, que ocorreram em 19/5/2023, 22/5/2023 e 24/5/2023, além das imagens sem data. As declarações da testemunha Nicoly, da informante Brenda e as imagens de conversas de whatsapp são no sentido de que as cobranças eram constantes, as metas de vendas existiam e a gerente Érika fiscalizava a venda de livros de duas em duas horas. Parte das penalidades aplicadas aos empregados, inclusive às ex-empregadas que realizaram as denúncias, é baseada em justificativas genéricas. As condutas da ré de limitar o tempo gasto no uso do banheiro, com exposição dos empregados que ficavam mais de 5min nos sanitários no microfone da empresa e o ato de chamar estes funcionários para conversas particulares, assim como a cobrança exagerada de cumprimento de metas de vendas de livros de parceira comercial da parte ré, são condutas ilícitas que se configuram como abuso de direito do empregador. Configuradas as condutas ilícitas, emerge in re ipsa o direito à reparação coletiva. A exposição dos empregados que passam mais de 5min no banheiro e a cobrança de metas de forma abusiva violam o direito à intimidade, à saúde e segurança no ambiente de trabalho, bens de relevância coletiva. Embora haja origem comum do dano, a reparação por dano moral individual deve ser buscada em ações individuais, em que serão comprovadas as condutas específicas em relação a cada empregado. Dessa forma, não há como reformar a sentença quanto à indenização por dano moral individual. As declarações da informante não têm maior peso que as declarações da testemunha Anthony, pois esta não fez declarações sobre as limitações ao uso do banheiro e a exposição dos que ficavam mais de 5min nos sanitários, por isso, não há prova testemunhal no sentido da tese da reclamada no aspecto. Em relação à cobrança de metas, as declarações da testemunha Nicoly, da informante Brenda e as provas documentais vão no mesmo sentido, logo, as declarações da testemunha Anthony não podem prevalecer. Em relação ao valor da indenização, considerando a gravidade da conduta praticada pelo réu, bem como o caráter inibitório e preventivo da medida, entendo que valor de R$ 40.000,00 é razoável e proporcional para a indenização por dano moral coletivo, a ser revertido ao fundo definido na sentença, Fundo de Defesa aos Direitos Difusos (FDD). A indenização é fixada em face da gravidade da conduta da reclamada, entendo que o valor arbitrado é compatível com o porte da empresa, consoante estatuto social e capital social integralizado (fl. 136). Não há que se falar em destinação dos valores ao sindicato autor, tendo em vista que o Supremo Tribunal Federal decidiu, na ADPF 944, que os valores relativos a condenações em ações civis públicas trabalhistas por danos morais coletivos devem ser direcionados para dois fundos: o Fundo dos Direitos Difusos (FDD) e o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Incólumes os arts. 223 da CLT, 447, § 3º, II, do CPC, art. 13 da Lei 7.347/85. Diante do exposto, dou provimento parcial ao recurso da ré para reduzir a indenização por dano moral coletivo para R$40.000,00 e nego provimento ao recurso ordinário do autor. 3. RECURSO ORDINÁRIO DO AUTOR 3.1 HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Os honorários advocatícios foram definidos do seguinte modo: "Defiro, à parte autora, os benefícios da gratuidade de Justiça, consoante previsão do artigo 790, § 3º, da Consolidação das Leis do Trabalho. Destaco, ainda, que os documentos apresentados pelo sindicato assistente são suficientes para demonstrar a regularidade e cabimento da assistência jurídica sindical prestada pelo sindicato profissional. Tendo em vista a complexidade da causa e os demais os elementos dos autos, e observada a disciplina do artigo 791-A da CLT, defiro o pedido de pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, a serem suportados pela reclamada, correspondente a 10% sobre o valor arbitrado à condenação. Afasto a condenação da parte autora em honorários sucumbenciais, tendo em vista a declaração de inconstitucionalidade da norma prevista no artigo 790-B, , da CLT, conforme decisão proferida caput pelo STF, nos autos da ADI nº 5766)."(fl. 4.677) O autor pretende a condenação da ré em honorários assistenciais de 20% sobre o valor da condenação, ao argumento de que a Súmula 219, III, e 329 do TST autorizam a condenação da ré em honorários assistenciais. A presente ação foi ajuizada em 1º/9/2023, após à vigência da Lei nº 13.467/2017, logo, não há falar em pagamento de honorários assistenciais, mas apenas dos honorários advocatícios na forma do art. 791-A da CLT. Por esse motivo fica expressamente rejeitada a pretensão de condenação em honorários assistenciais de 20% sobre o valor da condenação. No que diz respeito à majoração do percentual dos honorários advocatícios, o art. 791-A da CLT dispõe que os honorários advocatícios devem ser fixados entre 5% e 15% sobre o valor que resultar da liquidação, do proveito econômico obtido ou sobre o valor da causa, conforme os critérios estabelecidos no § 2º do referido artigo. A causa encerra média complexidade, versando sobre questões rotineiramente submetidas a este Tribunal, não se apresentando a hipótese de fixação no percentual máximo. É proporcional o percentual de 10% fixado na origem. Diante do exposto, nego provimento ao recurso. 4. PEDIDO FORMULADO EM CONTRARRAZÕES 4.1 MAJORAÇÃO DO PERCENTUAL DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS A ré postula a majoração dos honorários advocatícios em contrarrazões. O art. 85, § 11, do CPC não se aplica ao Processo do Trabalho, haja vista a regulamentação específica da CLT. Diante do exposto, indefiro o pedido de majoração dos honorários advocatícios formulado em contrarrazões. CONCLUSÃO Ante o exposto, conheço do recurso ordinário do autor e, no mérito, nego-lhe provimento. Conheço do recurso ordinário da ré e, no mérito, dou-lhe provimento parcial para reduzir a indenização por dano moral coletivo para R$ 40.000,00. Indefiro o pedido de majoração dos honorários advocatícios formulado em contrarrazões. Custas de R$ 800,00, calculadas sobre o valor de R$ 40.000,00. É o meu voto. ACÓRDÃO Por tais fundamentos, ACORDAMos Desembargadores integrantes da Terceira Turma do Egrégio Tribunal Regional do Trabalho da Décima Região e conforme o contido na respectiva certidão de julgamento, aprovar o relatório, conhecer do recurso ordinário do autor e, no mérito, negar-lhe provimento. Conhecer do recurso ordinário da ré e, no mérito, dar-lhe provimento parcial. Indeferir o pedido de majoração dos honorários advocatícios formulado em contrarrazões. Decisão nos termos do voto da Desembargadora Relatora. Ementa aprovada. Julgamento ocorrido à unanimidade de votos, estando presentes os Desembargadores Pedro Luís Vicentin Foltran (Presidente), Maria Regina Machado Guimarães, Brasilino Santos Ramos - consignando ressalvas de fundamentação no presente caso -, Cilene Ferreira Amaro Santos e Augusto César Alves de Souza Barreto. Representando o Ministério Público do Trabalho a Procuradora Regional do Trabalho Valesca de Morais do Monte. Fizeram-se presente em plenário, fazendo uso da tribuna para sustentações orais por meio de videoconferência a partir do Foro da cidade de Palmas/TO, as advogadas Elisandra Juçara Carmelin - representando a parte Sindicato dos Empregados no Comércio Estado Tocantins - e Marília Conceição Benevides Bezerra - representando a parte Pet Center Comércio e Participações S/A -. Secretária da Turma, a Sra. Evaldelice D. R. Beltramini. Secretaria da 3ª Turma. Brasília /DF, 09 de abril de 2025. (data do julgamento). Documento assinado eletronicamente CILENE FERREIRA AMARO SANTOS Desembargadora Relatora BRASILIA/DF, 22 de abril de 2025. CARLOS JOSINO LIMA, Servidor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- PET CENTER COMERCIO E PARTICIPACOES S.A.
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Comercial De Alimentos Caique Ltda - Me e outros x Comercial De Alimentos Caique Ltda - Me e outros
ID: 325127289
Tribunal: TRT10
Órgão: 2ª Turma
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 0000979-76.2024.5.10.0014
Data de Disponibilização:
15/07/2025
Polo Passivo:
Advogados:
JULIANO DA COSTA FERREIRA
OAB/GO XXXXXX
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ELISANGELA SOUSA MEDRADO
OAB/DF XXXXXX
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DOUGLAS BARBOSA NOGUEIRA
OAB/DF XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 2ª TURMA Relatora: ELKE DORIS JUST ROT 0000979-76.2024.5.10.0014 RECORRENTE: MIKELE SILVA COSTA E OUTROS (1) RE…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 2ª TURMA Relatora: ELKE DORIS JUST ROT 0000979-76.2024.5.10.0014 RECORRENTE: MIKELE SILVA COSTA E OUTROS (1) RECORRIDO: MIKELE SILVA COSTA E OUTROS (1) PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO PROCESSO nº 0000979-76.2024.5.10.0014 - ACÓRDÃO 2ª TURMA/2025 (RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA (1009)) RELATORA: DESEMBARGADORA ELKE DORIS JUST RECORRENTE E RECORRIDA: MIKELE SILVA COSTA ADVOGADA: ELISÂNGELA SOUSA MEDRADO RECORRENTE E RECORRIDA: COMERCIAL DE ALIMENTOS CAIQUE LTDA - ME ADVOGADO: JULIANO DA COSTA FERREIRA ORIGEM: 14ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA - DF EMENTA RECURSO DA RECLAMANTE. ACÚMULO DE FUNÇÕES. ATENDENTE DE PADARIA. EXERCÍCIO DE ATIVIDADES DE AUXILIAR DE COZINHA. COMPROVAÇÃO. Comprovado nos autos que a empregada, contratada como atendente de padaria, exercia habitualmente e de forma concomitante atividades típicas de auxiliar de cozinha (preparo de bolos, pães, sanduíches e fritura de salgados), alheias ao conteúdo ocupacional da função para a qual foi contratada, resta configurado o acúmulo de funções, ensejando o pagamento do respectivo adicional. O exercício de tarefas que extrapolam os limites da função contratual, exigindo maior qualificação ou responsabilidade, sem a devida contraprestação, configura alteração contratual lesiva e enriquecimento sem causa do empregador. VALE-TRANSPORTE. OPÇÃO DA EMPREGADA PELO NÃO RECEBIMENTO. DECLARAÇÃO VÁLIDA. SÚMULA 460 DO TST. Tendo a empregada firmado declaração expressa de que não pretendia fazer uso do vale-transporte, e não havendo prova de vício de consentimento que macule tal manifestação, o empregador se desincumbe do ônus previsto na Súmula 460 do TST. Caberia à parte trabalhadora comprovar a existência de vício de consentimento apto a invalidar o referido documento, ônus do qual não se desincumbiu. TRABALHO DA MULHER. DESCANSO DOMINICAL. ART. 386 DA CLT. ESCALA DE REVEZAMENTO QUINZENAL. NORMA COLETIVA PREVENDO TRABALHO EM ATÉ TRÊS DOMINGOS POR MÊS. DIREITO INDISPONÍVEL. INAPLICABILIDADE DO TEMA 1.046 DO STF. PAGAMENTO EM DOBRO. A controvérsia reside na prevalência do art. 386 da CLT, que estabelece revezamento quinzenal para o repouso dominical da mulher, sobre norma coletiva que permite o trabalho feminino em até três domingos por mês. O art. 386 da CLT, interpretado à luz do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero e do art. 7º, XX, da Constituição Federal, configura direito indisponível, materializando proteção fundamental ao mercado de trabalho da mulher, insuscetível de limitação por negociação coletiva que estabeleça condição menos favorável. A tese firmada no Tema 1.046 da Repercussão Geral do STF não se aplica ao caso, dada a indisponibilidade do direito em questão, que visa à proteção da saúde e segurança da mulher trabalhadora e à promoção da igualdade substancial. A própria Lei nº 13.467/2017, em seu art. 611-B, XV, veda a supressão ou redução por negociação coletiva de normas relativas à "proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei". Constatado o labor em domingos consecutivos, em violação à escala quinzenal prevista no art. 386 da CLT, como demonstrado pelos cartões de ponto, é devido o pagamento em dobro dos domingos trabalhados irregularmente, com os reflexos legais. RESCISÃO INDIRETA. PEDIDO DE DEMISSÃO FORMALIZADO. CONVERSÃO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE FALTA GRAVE PATRONAL COM GRAVIDADE SUFICIENTE. A rescisão indireta do contrato de trabalho, conforme o art. 483 da CLT, requer a ocorrência de falta grave praticada pelo empregador, de tal modo que torne insustentável a continuidade da relação empregatícia. A existência de pedido de demissão formalizado de próprio punho pela empregada, sem prova de vício de consentimento, obsta a sua conversão em rescisão indireta quando as irregularidades contratuais reconhecidas judicialmente não demonstram, por si sós, gravidade suficiente para caracterizar a insustentabilidade do vínculo a ponto de justificar o rompimento por iniciativa da trabalhadora. Para a conversão de pedido de demissão em rescisão indireta, é imprescindível a demonstração de que o ato de demissão foi viciado ou que as faltas do empregador eram de tal magnitude que tornaram impossível a manutenção do contrato, sendo a demissão uma consequência direta e imediata dessa situação, o que não se verificou no caso dos autos. RECURSO DE AMBAS AS PARTES. AUXÍLIO ALIMENTAÇÃO. SUBSTITUIÇÃO POR CESTA BÁSICA. PREVISÃO EM ACORDO COLETIVO. ART. 620 DA CLT. MULTAS CONVENCIONAIS INDEVIDAS. Existindo Acordos Coletivos de Trabalho, firmados entre a empresa e o sindicato da categoria profissional, que expressamente autorizam a substituição do ticket refeição por cestas básicas, e comprovado o fornecimento destas, prevalecem as condições do acordo sobre eventual previsão em Convenção Coletiva, nos termos do art. 620 da CLT. Lícita a substituição, são indevidas as multas convencionais decorrentes do descumprimento da obrigação. Recurso ordinário da reclamante conhecido e parcialmente provido. Recurso ordinário da reclamada conhecido e provido. RELATÓRIO O juiz José Gervásio Abrão Meireles, da 14ª Vara do Trabalho de Brasília - DF, por meio de sentença (fls. 549/563), complementada pela decisão proferida em sede de embargos declaratórios (fls. 571/572), julgou parcialmente procedentes os pedidos da petição inicial. Nesse sentido, houve a condenação da reclamada, Comercial de Alimentos Caique LTDA - ME, ao cumprimento das obrigações reconhecidas em sentença. Além disso, deferiu à reclamante os benefícios da justiça gratuita. A reclamante, conforme fls. 594/604, interpôs recurso ordinário. Requer a reforma da sentença nos seguintes temas: a) acúmulo de função; b) auxílio alimentação; c) vale transporte; d) domingos laborados; e e) rescisão indireta. A reclamada também interpôs recurso ordinário (fls. 574/578). Pugna pela reforma da sentença no que tange o auxílio alimentação e a multa convencional. Contrarrazões ofertadas por ambos os polos (fls. 616/620, pela reclamante; fls. 607/615, pela reclamada). Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 102 do Regimento Interno deste Regional. Este é o relatório. VOTO ADMISSIBILIDADE O recurso ordinário da reclamante é tempestivo e consta com regular representação processual (fls. 18/20). Goza das mesmas características o recurso da reclamada, vez que é tempestivo e consta com regular representação (fl. 218). Demais disso, houve o recolhimento das custas e do depósito recursal (fls. 579/582). As contrarrazões apresentadas também são tempestivas e contêm regular representação processual. A reclamada argui o não conhecimento do recurso obreiro sob o argumento da violação de dialeticidade recursal. Rejeito a arguição. A motivação das razões recursais não está dissociada dos fundamentos da decisão combatida. Ao contrário, a recorrente delimita a sua insurgência com indicação do desacerto que entende ter ocorrido na sentença. Desse modo, conheço do recurso ordinário do reclamante e do recurso ordinário da reclamada, bem como das respectivas contrarrazões. MÉRITO RECURSO DA RECLAMANTE ACÚMULO DE FUNÇÃO A reclamante, na inicial (fls. 113/132), relatou que foi contratada como atendente de padaria, mas afirma que, de forma habitual e concomitante, também exercia funções de auxiliar de cozinha, como preparar bolos e sanduíches, além de realizar a faxina do setor. Alegou que tais atividades são distintas das previstas para sua função contratual e que não recebeu remuneração adicional por esse acúmulo de tarefas. Diante disso, requereu a condenação da empresa ao pagamento de um adicional de 20% sobre seus vencimentos, durante todo o período do vínculo empregatício, a título de acúmulo de função, com reflexos. Em contestação (fls. 231/256), a reclamada argumentou que a reclamante, como atendente de padaria, realizava atividades compatíveis com sua função, como atendimento ao cliente, colocação e retirada de pães do forno, conferência de validade, reposição e embalagem de produtos. Negou que a reclamante preparasse alimentos ou exercesse a função de auxiliar de cozinha, destacando que a produção era feita por padeiros e uma promotora. Admitiu apenas que, de forma rara e eventual, aos domingos, a reclamante fritava salgados. Nessa linha, aduziu que não houve desequilíbrio contratual nem exploração da mão de obra que caracterizasse acúmulo de função. Assim, pleiteou a improcedência do pedido e de seus reflexos. O Juízo de origem indeferiu o pleito autoral. Confira-se (fls. 549/563): "[...] De início, constata-se da CTPS (fl. 24) que a reclamante foi contratada para a função de atendente de lojas e mercados, ao passo que os contracheques indicam a função de atendente de padaria (fls. 26/30). A função de atendente de lojas e mercados/atendente de padaria implica uma gama significativa de tarefas, as quais se encaixam no poder diretivo do empregador. Apenas quando o trabalhador exerce quantidade significativa de tarefas relacionadas a outra função é que se pode cogitar de acúmulo funcional apto a gerar diferenças. Veja julgado do TST sobre o tema: [...] Em audiência, a testemunha indicada pela reclamante declara: "que a depoente trabalhou com a reclamante cerca de 6 meses até a saída da depoente, o que aconteceu em 22/04/2024; que a depoente e a reclamante eram atendente de padaria, sendo que desempenhavam as seguintes atividades: assavam pães, atendiam clientes, embalavam produtos, ajudavam na cozinha a fazer bolo, pão e a fritar salgado e organizavam os produtos dentro da loja; (...) na loja havia padeiro durante o tempo em que trabalharam juntas; que a depoente e a reclamante faziam uma faxina pesada por mês no estabelecimento da ré". In casu, as atividades de assar pães, de ajudar na cozinha a fazer bolo, pão, fritar salgado e de embalar e organizar produtos são compatíveis com a função de atendente de lojas e mercados/atendente de padaria e com a dinâmica do estabelecimento. Ora, sendo atendente de loja, em especial em uma padaria, não há qualquer sentido imaginar que haveria um acúmulo de funções pelo simples fato de preparar e organizar lanches para os clientes que atende. Qualquer pessoa que frequenta uma padaria sabe que os atendentes participam desta dinâmica, não ficando limitados ao atendimento de clientes. Incide o art. 375 do CPC: Art. 375. O juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e, ainda, as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a estas, o exame pericial. Neste ponto, o art. 456, parágrafo único, da CLT disciplina: Art. 456 (...) Parágrafo único. A falta de prova ou inexistindo cláusula expressa e tal respeito, entender-se-á que o empregado se obrigou a todo e qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal. Além disso, a realização de uma faxina ao mês não conduz ao acúmulo extra e indevido de atribuições. Recorde-se que, conforme trecho do julgado acima transcrito, "o simples exercício de algumas tarefas componentes de uma outra função não traduz, automaticamente, a ocorrência de uma efetiva alteração funcional no tocante ao empregado". Logo, não se constata nos autos qualquer acúmulo de função. Indeferem-se as diferenças requeridas e respectivos reflexos." A reclamante recorre (fls. 594/604). Reforça que exercia, de forma habitual, atividades próprias de auxiliar de cozinha e serviços gerais, como preparação de bolos, sanduíches e limpeza completa da padaria, além das funções de atendente de padaria para as quais foi contratada. Aponta que o depoimento da testemunha por ela indicada confirmou esse acúmulo funcional. Diante disso, defende que ficou caracterizado o acúmulo de função, com direito ao pagamento do respectivo adicional e seus reflexos. Analiso. A controvérsia central reside em determinar se as atividades desempenhadas pela reclamante, para além das funções inerentes ao cargo de atendente de padaria, configuram acúmulo funcional, a ensejar o pagamento do adicional postulado. O ônus de comprovar o acúmulo de funções, por se tratar de fato constitutivo de seu direito, competia à reclamante, nos termos dos artigos 818, I, da CLT e 373, I, do CPC, encargo do qual logrou se desvencilhar. A CTPS da obreira (fl. 24) registra a função de "atendente de lojas e mercados", enquanto os contracheques (fls. 26/30) apontam para "atendente de padaria". Embora a função de atendente em estabelecimentos comerciais possa abranger uma gama variada de tarefas, o exercício habitual e concomitante de atribuições que extrapolam os limites do contratado, caracterizando atividades de outra função mais complexa ou de natureza diversa, configura o acúmulo. A prova oral colhida em audiência (fls. 546/547) é crucial para o deslinde da questão. A testemunha indicada pela reclamante, que laborou com a autora por aproximadamente seis meses, declarou: "que a depoente trabalhou com a reclamante cerca de 6 meses até a saída da depoente, o que aconteceu em 22/04/2024; que a depoente e a reclamante eram atendente de padaria, sendo que desempenhavam as seguintes atividades: assavam pães, atendiam clientes, embalavam produtos, ajudavam na cozinha a fazer bolo, pão e a fritar salgado e organizavam os produtos dentro da loja; (...) na loja havia padeiro durante o tempo em que trabalharam juntas; que a depoente e a reclamante faziam uma faxina pesada por mês no estabelecimento da ré". - grifo nosso Do depoimento, extrai-se que, além das atividades típicas de atendimento (atender clientes, embalar produtos, organizar produtos na loja), a reclamante era demandada para "ajudar na cozinha a fazer bolo, pão e a fritar salgado". Tais tarefas - "fazer bolo, pão e fritar salgado" - são intrinsecamente ligadas à função de auxiliar de cozinha ou cozinheira, e não de mera atendente. O fato de haver um padeiro no local não elide a possibilidade de as atendentes serem sobrecarregadas com tarefas de produção que complementavam ou supriam a necessidade da cozinha. O art. 456, parágrafo único, da CLT, ao dispor que o empregado se obriga a todo e qualquer serviço compatível com sua condição pessoal na falta de prova ou cláusula expressa, não autoriza o empregador a exigir do trabalhador o desempenho de atividades distintas daquelas para as quais foi contratado, especialmente quando implicam maior responsabilidade, complexidade ou desgaste, sem a devida contraprestação. No caso, as tarefas de produção de alimentos (bolos, pães, salgados) não podem ser consideradas meramente compatíveis ou inerentes à função de atendente de padaria, que tem seu foco no atendimento ao cliente, operação de caixa, reposição e organização de produtos para venda, o manuseio final de produto. O preparo de alimentos como bolos e pães e a fritura de salgados, demandam conhecimentos e responsabilidades que não se confundem com as de um simples atendente. Se, por um lado, é comum que atendentes auxiliem em tarefas menores, por outro, não se pode generalizar a ponto de validar a exigência de produção de alimentos como parte integrante da função de atendente, sob pena de se chancelar o enriquecimento ilícito do empregador, que se beneficia de mão de obra para diversas funções pagando salário correspondente a apenas uma delas. Concluo, pois, que restou configurado o acúmulo de funções, uma vez que a situação enseja um desequilíbrio no contrato de trabalho, justificando o pagamento de um adicional. Destarte, dou provimento ao recurso para deferir o adicional por acúmulo de função no percentual de 20% sobre o salário base da reclamante, durante todo o período do vínculo empregatício. Por habituais, são devidos os reflexos do adicional por acúmulo de função em férias acrescidas de 1/3, 13º salários e FGTS. VALE TRANSPORTE A reclamante, na inicial (fls. 113/132), aduziu que o vale-transporte é um direito garantido por lei aos trabalhadores urbanos para assegurar o deslocamento entre casa e trabalho. Esse direito, conforme sustentou, é irrenunciável, exceto em situações específicas. Pontuou que reside a mais de 2 km do trabalho, o que exige o uso de transporte público, e a empresa não forneceu o benefício, o que caracteriza violação legal e compromete sua remuneração. A omissão da empresa desrespeita tanto a legislação quanto a Convenção Coletiva. Assim, concluiu que é legítimo o pedido de ressarcimento pelos valores pagos pela reclamante durante o período sem o vale-transporte. Em contestação (fls. 231/256), a reclamada sustentou que a própria reclamante optou espontaneamente por não receber o benefício, o que foi registrado no momento da admissão. A empresa ressaltou que não houve qualquer questionamento ou irregularidade quanto a essa escolha, e que a própria reclamante indicou, por escrito, não necessitar do vale-transporte no comprovante de endereço apresentado. O Juízo de origem indeferiu o pleito autoral. Confira-se (fls. 549/563): "[...] De fato, o documento de fl. 276, sem impugnação em réplica, evidencia que a autora não optou pela utilização do vale-transporte. Logo, indefere-se a pretensão." A reclamante recorre (fls. 594/604). Argumenta que a declaração de renúncia ao vale-transporte apresentada pela reclamada não possui validade jurídica, pois o direito ao benefício é indisponível e não pode ser renunciado pelo trabalhador. Assim, entende que a empresa tem a obrigação de fornecê-lo ou indenizar o período em que não foi concedido. Além disso, destaca que a declaração foi contestada em réplica. Por isso, requer a reforma da sentença e a condenação da reclamada ao pagamento do vale-transporte. Analiso. O vale-transporte, instituído pela Lei nº 7.418/85, é um direito do trabalhador que utiliza meios de transporte coletivo público para o deslocamento entre sua residência e o local de trabalho, e vice-versa. Sobre o tema, a o enunciado da Súmula 460 do TST dispõe: "VALE-TRANSPORTE. ÔNUS DA PROVA. É do empregador o ônus de comprovar que o empregado não satisfaz os requisitos indispensáveis à concessão do vale-transporte ou não pretenda fazer uso do benefício." No caso, a reclamada juntou o documento de "Declaração/Termo de Compromisso" de vale-transporte (fl. 276), devidamente assinado pela reclamante, no qual esta declara, marcando a opção correspondente, que não utilizaria transporte. Com a apresentação de tal declaração, a reclamada se desincumbiu da parte do ônus que lhe competia, nos termos da Súmula 460 do TST, qual seja, comprovar que a empregada "não pretendia fazer uso do benefício". Uma vez manifestada expressamente a opção da empregada pela não percepção do vale-transporte, presume-se válida tal declaração de vontade, cabendo à parte trabalhadora, caso alegue sua invalidade, o ônus de provar a existência de vício de consentimento que macule o ato jurídico, nos termos dos arts. 818, I, da CLT. Contudo, a mera alegação de que o direito é irrenunciável não configura vício de consentimento. Era necessário que a reclamante demonstrasse, por meios de prova, que foi coagida a assinar o termo de opção, ou que o fez por erro substancial induzido pela reclamada, ou qualquer outra circunstância que invalidasse sua manifestação de vontade. Nesse sentido, confira-se: 1. VALE-TRANSPORTE. SOLICITAÇÃO DE DISPENSA DA BENESSE. INEXISTÊNCIA DE FRAUDE DA DECLARAÇÃO . PARCELA INDEVIDA. [...] (TRT-10 - RORSum: 0000688-74 .2023.5.10.0802, Relator.: DENILSON BANDEIRA COELHO, Data de Julgamento: 01/06/2024, 1ª Turma - Desembargadora Flávia Simões Falcão) VALE-TRANSPORTE. OPÇÃO DO TRABALHADOR PELO NÃO RECEBIMENTO. VÍCIO DE VONTADE INEXISTENTE. BENEFÍCIO INDEVIDO . Compete ao empregador o fornecimento de vale-transporte ao trabalhador, na forma da disposição ínsita no art. 1º da Lei 7.418/85, sendo indevido o benefício quando comprovado que o empregado optou pelo não recebimento do vale-transporte e sendo inexistente vício de vontade neste particular. (TRT-10 - ROT: 0000432-28 .2022.5.10.0007, Relator.: ELAINE MACHADO VASCONCELOS, Data de Julgamento: 17/06/2024, 1ª Turma - Desembargadora Elaine Machado Vasconcelos) RECURSO DA RECLAMANTE. VALE TRANSPORTE. RENÚNCIA EXPRESSA. Não comprovada a existência de vício na manifestação de vontade do empregado, prevalece a renúncia expressa ao benefício do vale transporte . [...] (TRT-10 0000966-76 .2016.5.10.0008, Relator.: ELKE DORIS JUST, Data de Julgamento: 13/09/2017, Data de Publicação: 26/09/2017) Portanto, tendo a reclamante firmado declaração de que não pretendia fazer uso do vale-transporte, e não havendo prova de vício de consentimento que invalide tal declaração, mantenho a sentença que indeferiu o pedido. Nego provimento. DOMINGOS LABORADOS A reclamante, na inicial (fls. 113/132), sustentou que, durante todo o contrato de trabalho, a reclamada descumpriu o artigo 386 da CLT. Relatou que a mulher que trabalha num domingo deve obrigatoriamente folgar no domingo subsequente. Nessa linha, aduziu que a reclamante trabalhava três domingos e folgava apenas um, contrariando a legislação. Ressaltou que este direito é indisponível e não pode ser alterado por negociação coletiva. Diante da violação, a reclamante requereu o pagamento em dobro pelos domingos trabalhados. Em contestação (fls. 542/545), a reclamada argumentou que a CCT e o acordo de banco de horas autorizam o trabalho aos domingos, desde que haja folga compensatória, a qual foi devidamente concedida à reclamante. Assim, ponderou que não é cabível o pagamento em dobro dos domingos. Sustentou, ainda, que não há base legal para o pagamento adicional e que isso resultaria em enriquecimento sem causa. Contestou também o número de domingos apontado pela reclamante e afirmou que eventuais valores só devem ser apurados com base nos controles de jornada apresentados. O Juízo de origem deferiu parcialmente o pleito autoral, nos seguintes moldes (fls. 549/563): "[...] As convenções coletivas vigentes no período de 1º.11.2021 a 31.10.2023 (fl. 151) e de 01.11.2022 a 31.10.2024 (fl. 172) preveem, no parágrafo primeiro da cláusula quadragésima, que "nenhum empregado poderá trabalhar mais que 03 (três) domingos por mês" (fls. 162 e 183). Ademais, a mesma cláusula menciona, no caput, que o e pregado convocado possui direitos Registra-se que a norma coletiva em análise manifestou a vontade das partes envolvidas na negociação coletiva, cuja validade é garantida pelo art. 7º, XXVI, da CF, que assegura, no rol dos direitos sociais dos trabalhadores, o reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho. Ademais, o art. 444 da CLT prevê que as relações de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas, em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho. Por oportuno, o art. 611-A da CLT assegura uma ampla liberdade negocial. Vale registrar o conteúdo da tese do tema 1.046 da Lista de Repercussão Geral do STF: São constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis. Portanto, a cláusula normativa em comento é válida, devendo prevalecer em relação ao teor do art. 386 da CLT. Logo, considerando que foi observado o disposto na norma coletiva no que diz respeito ao labor máximo em 03 (três) domingos por mês, conforme reconhece a autora, indefere-se o pagamento de domingos laborados em dobro de 1º. 11.2021 (início da vigência das normas coletivas) a 09.08.2024 (data de rescisão contratual - fl. 513). No tocante ao período anterior a 1º.11.2021, a partir do início do pacto (19.08.2021), não foi juntada nenhuma convenção coletiva. Nesse período, constata-se das folhas de ponto (fls. 278/282) o labor em 2 domingos seguidos nos dias 03.10.2021 e 10.10.2021 (fl. 281), em violação ao art. 386 da CLT. Assim, defere-se o pagamento em dobro pelo labor no domingo de 10.10.2021. Defere-se o FGTS sobre o pagamento ora deferido de domingo em dobro. Considerando a ausência de habitualidade, indeferem-se reflexos em 13º salários e em férias acrescidas de 1/3." A reclamante recorre (fls. 594/604). Repisa que, durante todo o contrato, a reclamada descumpriu as normas da CLT relativas ao trabalho feminino aos domingos. Alega que o descanso quinzenal aos domingos para mulheres é um direito indisponível já reconhecido pelo STF, não podendo ser restringido por norma coletiva. Diante disso, requer a reforma da sentença para que seja reconhecido o direito ao pagamento em dobro de todos os domingos trabalhados, conforme pleiteado na inicial. Passo ao exame. A controvérsia reside em definir se a norma coletiva que permite o trabalho da mulher em até três domingos por mês prevalece sobre o disposto no art. 386 da CLT, que estabelece a obrigatoriedade de uma escala de revezamento quinzenal para o repouso dominical da mulher. A sentença entendeu que a norma coletiva seria válida, com base na tese do Tema 1.046 do STF, e indeferiu o pagamento em dobro dos domingos a partir de 01/11/2021. Para o período anterior, deferiu o pagamento dobrado do domingo de 10/10/2021 por violação direta ao art. 386 da CLT, ante a ausência de norma coletiva específica para o período. Conforme entendimento firmado pelo TST no julgamento do RR-Ag-41-58.2017.5.21.0002 (7ª Turma, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandao, DEJT 30/08/2024), ao analisar o art. 386 da CLT à luz do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero e do art. 7º, XX, da CF, concluiu-se ser "evidente o caráter indisponível do direito previsto no artigo 386 da CLT, por materializar o direito fundamental previsto no artigo 7º, XX, da Constituição Federal" e que, portanto, é "Inviável, portanto, a limitação do direito previsto no artigo 386 da CLT por norma coletiva.". Confira-se: [...] RECURSO DE REVISTA DO SINDICATO-AUTOR. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. TRABALHO DA MULHER . ARTIGO 386 DA CLT. PAGAMENTO EM DOBRO DOS DOMINGOS TRABALHADOS. PROTOCOLO PARA JULGAMENTO COM PERSPECTIVA DE GÊNERO. NORMA COLETIVA QUE LIMITA DIREITO INDISPONÍVEL . ARTIGO 7º, XX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. AUSÊNCIA DE ESTRITA ADERÊNCIA AO TEMA Nº 1.046 DE REPERCUSSÃO GERAL. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA . O descanso aos domingos remonta à história e tem origem na tradição religiosa. No Brasil, o descanso remunerado preferencialmente aos domingos sempre teve atenção especial no ordenamento jurídico. Para além da questão religiosa , a eleição do domingo como dia ideal para descanso relaciona-se, ainda, com aspectos de ordem social, familiar e até mesmo política. Isso porque se trata do dia da semana em que o trabalhador mais tem possibilidades de desfrutar do convívio social e familiar e participar da vida comunitária . Especificamente no que diz respeito às mulheres, o artigo 386 da CLT prevê: "havendo trabalho aos domingos, será organizada uma escala de revezamento quinzenal, que favoreça o repouso dominical". A SBDI-1 desta Corte, ao examinar a recepção desse dispositivo pela Constituição Federal e sua prevalência em relação ao artigo 6º, parágrafo único, da Lei nº 10.101/2000 (caso líder E-ED-RR-619-11.2017 .5.12.0054), entendeu que incide a mesma ratio decidendi firmada pelo Tribunal Pleno do TST no julgamento da arguição de inconstitucionalidade do artigo 384 da CLT, posteriormente confirmado pelo Supremo Tribunal Regional no julgamento referente ao Tema nº 528 de Repercussão Geral (RE 658.312) . A propósito deste julgamento do STF, cite-se, pela relevância, o fundamentado externado pelo Exmo. Ministro Dias Toffoli, relator do caso, para quem o reconhecimento da possibilidade tratamento diferenciado da mulher tem guarida constitucional, de forma a assegurar a plenitude do princípio da igualdade, e, ao fazê-lo, também se valeu de dados da realidade, entre os quais de componente social, pelo fato de ser comum o acúmulo de atividades pela mulher no lar e no ambiente de trabalho. Some-se a isto a aprovação, pelo Conselho Nacional de Justiça, da obrigatoriedade de os órgãos do Poder Judiciário observarem, em seus julgamentos, as diretrizes do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero , conforme Resolução nº 492/2023. Referido Protocolo, criado em 2021, tem por objetivo, a partir do reconhecimento da influência que as desigualdades históricas, sociais, culturais e políticas sofridas pelas mulheres ao longo do tempo teve na produção e aplicação do direito, criar "cultura jurídica emancipatória e de reconhecimento de direitos de todas as mulheres e meninas" . Destina-se, assim, a orientar a magistratura no julgamento de casos concretos, de modo que as decisões sejam produzidas sob as chamadas "lentes de gênero" para avançar-se na efetivação da igualdade e nas políticas de equidade. Julgar com lentes de gênero, por sua vez, significa não reforçar - nem ignorar - por meio da imperatividade da decisão judicial e sob o mito da "neutralidade" e "universalidade" da lei formal e abstrata, os estereótipos e os padrões de poder/subordinação desde sempre existentes entre homens e mulheres , levando-se em consideração, ainda, os demais marcadores interseccionais de vulnerabilidade, como raça, classe social e orientação sexual. Sob esta ótica, no particular, a apuração da situação mais "benéfica" para as empregadas deve ser guiada pelo aspecto da divisão sexual do trabalho e da assimetria de poder dela resultante. Assim, no presente caso, é devido o pagamento em dobro dos domingos laborados, pela inobservância da escala prevista no artigo 386 para as empregadas mulheres, não obstante a existência de previsão em norma coletiva de concessão de uma folga por semana, acrescida de outra folga em um domingo por mês, resultando em uma semana por mês com a concessão de duas folgas, para todos os empregados . Isso porque, conforme explicado, a questão em debate não é meramente quantitativa, isto é, relativa ao número de folgas, mas, sobretudo, de gênero e de conformação da igualdade substancial e do direito fundamental previsto no artigo previsto no artigo 7º, XX, da Constituição Federal ("a proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei"). Ainda, não há que se falar em aderência da presente discussão ao Tema 1.046 de Repercussão Geral, uma vez que as normas coletivas, no caso, não trataram especificamente do descanso aos domingos das mulheres. Além disso, é evidente o caráter indisponível do direito previsto no artigo 386 da CLT, por materializar o direito fundamental previsto no artigo 7º, XX, da Constituição Federal . Ressalta-se que a própria Lei nº 13.467/17, ao dispor sobre as matérias cuja supressão ou redução por negociação coletiva é vedada, nos termos do artigo 611-B, elencou expressamente aquelas relativas "à proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei" , nas quais se enquadra o disposto em questão. Inviável, portanto, a limitação do direito previsto no artigo 386 da CLT por norma coletiva. Recurso de revista conhecido e provido . (TST - RR-Ag: 00000415820175210002, Relator.: Claudio Mascarenhas Brandao, Data de Julgamento: 07/08/2024, 7ª Turma, Data de Publicação: 30/08/2024) - grifo nosso Este entendimento do TST, que trata especificamente da matéria e é posterior à tese geral do Tema 1.046 do STF, confere ao art. 386 da CLT a natureza de direito indisponível, relacionado à proteção da saúde e segurança da mulher trabalhadora, não passível de flexibilização por norma coletiva que estabeleça condição menos favorável. O julgado ressalta, inclusive, que a própria Lei nº 13.467/2017, no art. 611-B, veda a supressão ou redução por negociação coletiva de normas relativas à "proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei". Nesse mesmo sentido, ainda podemos citar: [...] REVEZAMENTO QUINZENAL. PROTEÇÃO AO TRABALHO DA MULHER. TRATAMENTO GENÉRICO POR NORMA COLETIVA. PRESERVAÇÃO DE NORMA ESPECIAL DE PROTEÇÃO DO TRABALHO . TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA. Cinge-se a controvérsia à aplicação da escala de revezamento que favoreça o descanso semanal com maior frequência aos domingos das mulheres que trabalham em atividade de comércio, dada a aparente antinomia que é suscitada entre o disposto no art. 386 da CLT e no art. 6º, parágrafo único, da Lei n . 10.101/2000, com redação dada pela Lei n. 11.603/2007 . A Subseção Especializada em Dissídios Individuais I do TST (SbDI-I) vem adotando a mesma ratio decidendi firmada pelo Tribunal Pleno na rejeição da arguição de inconstitucionalidade do art. 384 da CLT, no qual se destacou o "ônus da dupla missão, familiar e profissional, que despenha uma mulher trabalhadora" e que "o peso maior da administração da casa e da educação dos filhos acaba recaindo sobre a mulher". Essas premissas são as mesmas que justificam a aplicação da regra protetiva prevista no art. 386 da CLT, a qual permanece intacta após a denominada "reforma trabalhista" (Lei n . 13.467/2017). Em proveito da recepção pela ordem constitucional do art. 386 da CLT e de sua prevalência ante a regra mais abrangente do art . 6º da Lei n. 10.101/2000, põem-se em enlevo as seguintes premissas jurídicas que, com efeito, repercutem dados e valores culturais: a) o art. 7º, XX da Constituição prevê, entre os direitos fundamentais, a "proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei", o que induz à relevância de preceitos de lei que viabilizem progressivamente o ingresso das mulheres no mundo institucional do trabalho, sem embargo do tempo maior que dedicam à reprodução, formação e sociabilização da força de trabalho (cabe redarguir, como argumento ad terrorem e em desalinho com dados estatísticos, a ilação de ser a proteção das condições de trabalho da mulher um fator de redução da sua empregabilidade); b) em respeito à tridimensionalidade da norma jurídica, e agora sob o prisma histórico-cultural, é tempo de o Direito inverter a lógica perversa de desconsiderar ou comprometer o tempo dedicado à reprodução (trabalho reprodutivo) da fonte de trabalho mediante a atribuição à mulher de trabalho produtivo em condição incompatível com a sua função biológica, econômica e social; c) o art . 386 da CLT revela um estágio evolutivo na concretização do art. 7º, XX da Constituição que não comporta retrocesso se a restrição que se busca, por meio da atividade jurisdicional e de lege ferenda , não atende à exigência de ser "medida compatível com a natureza desses direitos e exclusivamente com o objetivo de favorecer o bem-estar geral em uma sociedade democrática" (art. 4º do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais); d) a progressividade dos direitos humanos e fundamentais - prevista no art. 2º .1 do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, no art. 26 da Convenção Americana de Direitos Humanos e, na espécie, no caput do art. 7º da Constituição - reveste-se de caráter normativo e se submete ao controle jurisdicional, consoante vem de decidir a Corte Interamericana de Direitos Humanos desde o caso Acevedo Buendía e outros vs Peru; e) o critério da especialidade, entre aqueles que servem à resolução de antinomias entre normas jurídicas, não é oponível à prevalência do art. 386 da CLT, em lugar do art . 6º da Lei n. 10.101/2000, dado que é aquele, e não este, o dispositivo que veicula a norma especial, vale dizer: da norma generalíssima contida na Lei n. 605/1949, raiz de todo o debate, destacam-se os destinatários da Lei n . 10.101/2000 (art. 6º), ou seja, todos os trabalhadores do comércio, e, dentre estes, destacam-se as mulheres trabalhadoras no comércio em geral - tuteladas, com maior especificidade, pelo art. 386 da CLT . Do contrário, a proteção de outros grupos vulneráveis potencialmente ativados no comércio - como crianças, adolescentes, idosos, pessoas com deficiência ou povos originários - estaria inviabilizada ante a predominância da regra consagrada, para todos, e todos indistintamente, na Lei n. 10.101/2000. Convém destacar que o entendimento firmado no âmbito da SBDI-I desta Corte foi endossado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 1 .403.904, no qual a ministra relatora, Cármen Lúcia, destacou que a escala diferenciada de repouso semanal, prevista no artigo 386 da CLT, trata-se de norma protetiva dos direitos fundamentais sociais das mulheres e não viola o princípio da isonomia, pois consubstancia a adoção de critério legítimo de discrímen. No caso, o Tribunal Regional entendeu que deveria prevalecer norma coletiva que torna o repouso aos domingos apenas facultativo, com possibilidade de descanso em outro dia da semana, e que essa regra, ao constituir objeto de negociação coletiva regular, com participação do sindicato representativo da categoria profissional, traduziria o melhor interesse para a categoria de uma forma global. Ou seja, a norma protetiva do art . 386 da CLT não poderia prevalecer sobre disposições oriundas da autonomia da vontade coletiva. A respeito dessas normas coletivas, de forma literal, o Regional registrou: " As normas coletivas preveem que o descanso semanal aos domingos é facultativo, garantindo-se folga compensatória em outro dia da semana, a exemplo da cláusula trigésima quarta da CCT 2016/2017 ". O Tribunal de origem também consignou que a norma coletiva não se destinou a tratar do revezamento quinzenal de repouso dominical assegurado pelo art. 386 da CLT às mulheres, afirmando: " Destaca-se que não há qualquer ressalva na norma coletiva, de maneira que deve ser aplicada a todo trabalhador do reclamado, inclusive mulheres " . Em razão do caráter genérico das disposições coletivas que tratam do trabalho aos domingos, não se verifica sequer a possibilidade de confronto entre a imperatividade do direito assegurado pelo art. 386 da CLT e a diretriz da autonomia da vontade coletiva. Dessa forma, não é justificável o afastamento do direito previsto em tal dispositivo se não há quaisquer relações de prejudicialidade entre ele e as disposições normativas decorrentes de negociação coletiva. Portanto, a garantia da escala mínima quinzenal de concessão do repouso semanal remunerado às mulheres aos domingos deve prevalecer sobre disposições genéricas de norma coletiva que tratam do instituto sem distinção entre trabalhadores homens e mulheres, a exemplo do que se observa no caso em exame, dado o caráter especial da norma protetiva constante do art . 386 da CLT, recepcionada pela Constituição Federal de 1988. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido. (TST - RR: 0001238-44 .2017.5.17.0007, Relator.: Augusto Cesar Leite De Carvalho, Data de Julgamento: 29/05/2024, 6ª Turma, Data de Publicação: 29/05/2024) - grifo nosso AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. REGIDO PELA LEI 13.467/2017 . LABOR AOS DOMINGOS. ATIVIDADES DO COMÉRCIO EM GERAL. ESCALA DE REVEZAMENTO. EMPREGADAS MULHERES . ARTIGO 386 DA CLT. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA NA DECISÃO AGRAVADA. A mens legis do parágrafo único do artigo 6º da Lei 10.101/2000 deu ao descanso semanal remunerado o devido valor social, haja vista que, no Brasil, é no domingo o dia tradicionalmente reconhecido pelas famílias como aquele em que usufruem de momentos de comunhão . Por se tratar de norma de proteção ao trabalho, o citado parágrafo único do artigo 6º, deve coexistir com as normas coletivas, as quais devem se completar no momento em que são interpretadas. Portanto, ao conceder a máxima efetividade a um direito social e a proteção à família, necessário se faz que o empregado tenha uma folga semanal coincidente com um domingo no mês. Ocorre que o art. 386 da CLT, inserido no capítulo que trata das normas de proteção ao trabalho da mulher, prevê que "havendo trabalho aos domingos, será organizada uma escala de revezamento quinzenal, que favoreça o repouso dominical" . Nesse contexto, entende-se que o artigo 386 da CLT foi recepcionado pela Constituição Federal, tanto que não foi ele revogado pela Lei 13.467/2017. Assim, aplicando-se o princípio da especialidade previsto no artigo 2º, § 2º, da LINDB e o princípio da norma mais favorável, o trabalho aos domingos da mulher deve ser organizado em escala de revezamento quinzenal, nos termos do artigo 386 da CLT. Logo, o descumprimento do art . 386 da CLT impõe o pagamento em dobro dos domingos quinzenais laborados. Nesse contexto, não afastados os fundamentos da decisão agravada, nenhum reparo enseja a decisão. Agravo não provido, com acréscimo de fundamentação. (TST - Ag-AIRR: 00000066120235210011, Relator.: Douglas Alencar Rodrigues, Data de Julgamento: 30/10/2024, 5ª Turma, Data de Publicação: 08/11/2024) - grifo nosso RECURSO ORDINÁRIO. DOMINGOS TRABALHADOS. EMPREGADA MULHER. DESCANSO DOMINICAL . ART. 386 DA CLT. NORMA COLETIVA. OBJETO ILÍCITO . INAPLICABILIDADE DO TEMA 1.046 DO STF. DIREITO INDISPONÍVEL. PROTEÇÃO DO MERCADO DE TRABALHO DA MULHER . PERSPECTIVA DE GÊNERO. A norma coletiva que afasta a aplicação do art. 386 da CLT e permite o labor habitual de empregadas mulheres aos domingos, sem a observância do revezamento quinzenal, incorre em objeto ilícito, nos termos do art. 611-B, XV, da CLT . Trata-se de direito indisponível, por consubstanciar proteção específica ao mercado de trabalho da mulher, com amparo no art. 7º, XX, da Constituição Federal. A jurisprudência do TST, alinhada ao Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do CNJ, reforça a necessidade de tratamento jurídico que reconheça desigualdades estruturais. Inaplicável o Tema 1 .046 do STF, diante da ausência de aderência estrita e da especialidade da norma em debate. Mantida a condenação ao pagamento em dobro dos domingos laborados, diante da inobservância da escala legal. (TRT-13 - ROT: 00014463520245130026, Relator.: ARNALDO JOSE DUARTE DO AMARAL, 1ª Turma - Gabinete do Desembargador Eduardo Sérgio de Almeida) TRABALHO DA MULHER. ESCALA DE REVEZAMENTO QUINZENAL PARA O TRABALHO AOS DOMINGOS. ARTIGO 386 DA CLT. Viola direito assegurado às trabalhadoras no art . 386 da CLT, norma recepcionada pela Constituição da Republica, a não concessão à empregada de repouso semanal aos domingos, a cada 15 dias. (TRT-12 - ROT: 0000619-34.2023.5 .12.0043, Relator.: HELIO HENRIQUE GARCIA ROMERO, 3ª Turma) No caso dos autos, as Convenções Coletivas juntadas (CCT 2021/2023, fls. 36/56, Cláusula Quadragésima, §1º, fl. 47; CCT 2022/2024, fls. 57/77, Cláusula Quadragésima, §1º, fl. 68; CCT 2023/2025, fls. 78/101, Cláusula Quadragésima, §1º, fl. 88) preveem que "Nenhum empregado poderá trabalhar mais que 03 (três) domingos por mês". Esta disposição, ao permitir o trabalho em três domingos consecutivos, contraria a exigência de revezamento quinzenal do art. 386 da CLT. Os cartões de ponto (fls. 278/339) demonstram, por exemplo, que, no período de 21/06/2022 a 20/07/2022 (fls. 298/299), a reclamante laborou nos domingos 26/06, 03/07 e 10/07, ou seja, em inobservância ao art. 386 da CLT. Assim, dou provimento ao recurso da reclamante para condenar a reclamada ao pagamento em dobro de todos os domingos trabalhados em violação à escala de revezamento quinzenal prevista no art. 386 da CLT, durante todo o período contratual, a serem apurados com base nos cartões de ponto juntados, com reflexos em férias + 1/3, 13º salários, DSR e FGTS. RECURSO DE AMBAS AS PARTES AUXÍLIO ALIMENTAÇÃO A reclamante, na inicial (fls. 113/132), dispôs que iniciou seu trabalho como atendente de padaria em 19/08/2021. Durante os primeiros 8 meses de contrato, a empresa fornecia alimentação no local, prática que foi posteriormente interrompida sem substituição por auxílio alimentação. Alegou que, de acordo com a CCT, a empresa estaria obrigada a fornecer o auxílio alimentação a todos os trabalhadores. Houve, portanto, descumprimento da Convenção Coletiva e supressão de direito, o que configura violação da legislação trabalhista. A reclamante requer, então, a condenação da empresa ao pagamento do respectivo valor. Em contestação (fls. 231/256), a reclamada informou que o Acordo Coletivo permite a substituição do auxílio alimentação (ticket) por cestas básicas, e que a reclamante sempre recebeu essas cestas após o fim do fornecimento de refeições no local, exceto nos períodos em que esteve afastada ou de férias, quando o benefício não é devido. Diante disso, alegou que cumpriu com suas obrigações. Assim, contestou os valores pleiteados pela reclamante a título de auxílio alimentação. O Juízo de origem deferiu parcialmente o pleito autoral. Confira-se (fls. 549/563): "[...] Acerca do assunto, a testemunha da autora declara: "que a depoente e a reclamante recebiam cesta básica todos os meses". Os acordos coletivos, vigentes nos períodos de 1º.7.2020 a 1º. 7.2021 (fl. 429), de 1º.7.2023 a 1º.7.2024 (fl. 449) e de 1º.7.2024 a 1º.7.2025 (fl. 456) preveem, na cláusula terceira, parágrafo único (fls. 430, 450 e 457), a substituição da obrigação do pagamento do ticket refeição prevista na cláusula 11ª da CCT pelo fornecimento de cestas básicas mensais aos empregados. Registra-se, por oportuno, que, a partir de 11.11.17 (vigência da reforma trabalhista), o art. 620 da CLT passou a prever expressamente: "As condições estabelecidas em acordo coletivo de trabalho sempre prevalecerão sobre as estipuladas em convenção coletiva de trabalho". Dessa forma, as disposições previstas em acordo coletivo de trabalho deverão prevalecer sobre as estipuladas em convenção coletiva de trabalho, sendo o que o texto é expresso quanto à prevalência ao incluir o advérbio "sempre". Considerando que a testemunha comprovou que a autora recebia cesta básica todos os meses e a predominância do acordo coletivo de trabalho sobre a convenção coletiva de trabalho, reputa-se que a empresa estava desobrigada a fornecer o ticket refeição previsto em convenção coletiva no período de vigência dos acordos coletivos. Logo, indefere-se a pretensão de pagamento do ticket alimentação/refeição no período de 01.07.2023 a 09.08.2024 (data de rescisão contratual - fl. 513). Por outro lado, tendo em vista a ausência de juntada de acordo coletivo e nos limites da exordial, defere-se a pretensão de pagamento do ticket alimentação/refeição no valor de R$ 15,00 por dia trabalhado, no período de 01.06.2022 a 31.10.2022, nos termos da cláusula décima primeira (fl. 154) da convenção coletiva vigente no período de 1º.11.2021 a 31.10.2023 (fl. 151), e no valor de R$ 16,00 por dia trabalhado, no período de 01.11.2022 a 30.06.2023, nos termos da cláusula décima primeira (fl. 175) da convenção coletiva vigente no período de 01.11.2022 a 31.10.2024 (fl. 172), devendo ser observados os dias efetivamente registrados nos controles de ponto. [...]" A reclamada recorre (fls. 574/578). Assevera que apresentou todos os Acordos Coletivos válidos durante o contrato de trabalho, os quais autorizam a substituição do ticket alimentação por cesta básica. Dessa forma, afirma que a sentença incorreu em erro ao afirmar que tais acordos não foram juntados, levando à condenação da empresa e à aplicação de multa convencional. Sustenta, então, que os acordos foram anexados tempestivamente na contestação e cobrem todo o período contratual, comprovando que não houve descumprimento das normas coletivas. Por isso, requer a reforma da sentença para afastar as condenações relativas ao ticket alimentação e às multas. A reclamante também recorre (fls. 594/604). Argumenta que, embora previsto em acordo, essa substituição resultou em prejuízo ao trabalhador, configurando alteração contratual lesiva, conforme o art. 468 da CLT, e violação ao princípio da condição mais benéfica (art. 444 da CLT). Defende que a supressão do vale-alimentação comprometeu sua subsistência e impactou sua remuneração, sendo inválida. Por isso, requer a reforma da sentença para que a recorrida seja condenada ao pagamento retroativo do ticket alimentação durante todo o contrato de trabalho, exceto nos primeiros 8 meses. Examino. Compulsando os autos, verifica-se que a reclamada colacionou os Acordos Coletivos de Trabalho que abrangem todo o período do pacto laboral da reclamante, iniciado em 19/08/2021 e findo em 09/08/2024. Porém, conforme delimitado, o pedido referente ao pleito em análise se dá a partir de junho de 2022. Conforme se extrai dos documentos juntados com a contestação, o ACT 2021/2022 (fls. 434/438), com vigência de 1º de julho de 2021 a 01 de julho de 2022. A cláusula terceira deste instrumento (fl. 435) dispõe sobre a faculdade de substituição do ticket refeição, previsto na cláusula 11ª da CCT, pelo fornecimento de cesta básica. O ACT 2022/2023 (fls. 439/443), com vigência de 1º de julho de 2022 a 01 de julho de 2023, reitera a permissão para substituição do ticket refeição por cesta básica. De igual forma, o ACT 2023/2024 (fls. 444/448) e o ACT 2024/2025 (fls. 456/462), também preveem a substituição. Assim, houve a juntada de Acordos Coletivos que abrangem os períodos da condenação e que, em suas cláusulas terceiras, expressamente autorizam a reclamada a substituir o pagamento do ticket refeição pelo fornecimento de cestas básicas mensais. Ademais, a própria sentença reconheceu, com base no depoimento da testemunha da autora, que "a depoente e a reclamante recebiam cesta básica todos os meses". Nesse diapasão, cumpre ressaltar a regra insculpida no art. 620 da CLT, que estabelece a prevalência das condições fixadas em acordo coletivo de trabalho sobre aquelas estipuladas em convenção coletiva de trabalho: "As condições estabelecidas em acordo coletivo de trabalho sempre prevalecerão sobre as estipuladas em convenção coletiva de trabalho". Portanto, existindo Acordos Coletivos específicos, firmados entre a empresa reclamada e o sindicato representativo da categoria profissional da reclamante, que permitem a substituição do auxílio alimentação por cestas básicas, e comprovado o fornecimento destas, não há descumprimento de obrigação ou direito ao recebimento do ticket alimentação com base na Convenção Coletiva. Consequentemente, afastada a condenação principal referente ao ticket alimentação, resta indevida a condenação ao pagamento das multas convencionais decorrentes do descumprimento desta obrigação. Destarte: Nego provimento ao recurso do reclamante. Dou provimento ao recurso da reclamada para afastar a condenação ao pagamento do ticket alimentação, bem como das multas convencionais. Indefiro o pedido da reclamada de exclusão da condenação ao pagamento de honorários, pois, em que pese a reforma neste particular, subsiste condenação da ré. RECURSO DA RECLAMANTE CONVERSÃO DO PEDIDO DE DEMISSÃO PARA RESCISÃO INDIRETA A reclamante, na inicial (fls. 113/132), relatou que, diante dos descumprimentos expostos, como o acúmulo de função, ausência de auxílio alimentação e de vale transporte, pediu demissão. Contudo, por entender que foi forçada a isso em razão das condições ilegais impostas, buscou a conversão do pedido de demissão em rescisão indireta do contrato de trabalho, com base no artigo 483, alínea "d", da CLT, considerando como data de admissão 18/08/2021 e rescisão indireta em 15/09/2024, já incluindo o aviso prévio projetado. Em contestação (fls. 231/256), a reclamada argumentou que o pedido de demissão feito pela reclamante é um ato jurídico perfeito, sem qualquer vício de vontade. Afirmou que a trabalhadora não demonstrou arrependimento ou coação no momento da demissão, e só alegou supostas faltas graves da empresa posteriormente. Assim, sustentou que é impossível converter o pedido de demissão em rescisão indireta. Ainda que essa hipótese fosse considerada, a reclamada negou ter cometido qualquer falta grave que justificasse tal medida. O Juízo de origem indeferiu o pleito autoral, nos seguintes moldes (fls. 549/563): "[...] O documento de fl. 511 aponta o pedido de demissão formulado pela autora, de próprio punho, em 09.08.2024. Ainda que defenda a autora que havia respaldo para o reconhecimento da rescisão indireta, tal possibilidade não seria capaz, por si só, de anular o pedido de demissão, ato perfeito e acabado. Absolutamente ninguém pode alegar desconhecimento da lei (art. 3º da LINDB). Assim, caso o autor tivesse interesse na rescisão indireta, deveria ter buscado a via própria. Descabe comparecer ao Judiciário invocando suposta violação de direitos trabalhistas como fundamento para invalidar ato perfeito e acabado que praticou voluntariamente. A nulidade de seu ato somente se justificaria se houvesse prova cabal de algum vício de consentimento, o que não existe nos autos. E o encargo probatório era da autora. Assim, este juízo reconhece como válido o pedido de demissão da reclamante em 09.08.2024. Como consequência, indeferem-se os pleitos de reversão do pedido de demissão em rescisão indireta, de pagamento de aviso prévio indenizado e de projeção do aviso sobre outras verbas rescisórias e na data de baixa na CTPS. Além disso, as verbas rescisórias atinentes à modalidade de ruptura contratual (pedido de demissão) - saldo de salário, 13º salário, férias integrais 2023/2024 acrescidas de 1/3 - foram pagas, conforme TRCT (fls. 513/514) e comprovante de fl. 516. Registra-se, por oportuno, que foi pago o saldo de salário relativo a 3 dias, tendo em vista que a autora usufruiu as férias relativas ao período aquisitivo 2022/2023 até 06.08.2024, com retorno ao serviço na data de 07.08.2024, consoante se extrai do documento de fl. 507. Nesse contexto, considerando a ausência de prova de baixa na CTPS, este juízo determina que a reclamada proceda à anotação de saída na CTPS para constar data de 09.08.2024, após o trânsito em julgado, em cinco dias contados da intimação para tal. O descumprimento dessa obrigação de fazer implicará pena de multa diária de R$ 200,00 até o limite máximo de R$ 1.000,00. No caso de inércia da reclamada, proceda a secretaria à anotação determinada." A reclamante recorre (fls. 594/604). Reforça que pediu demissão em 09/08/2024 devido a irregularidades e condutas abusivas da reclamada que tornaram insustentável a continuidade do vínculo empregatício. Com base no artigo 483 da CLT, argumenta que é possível a conversão do pedido de demissão em rescisão indireta, já que o empregador descumpriu obrigações contratuais essenciais. Alega ainda que, mesmo pedido demissão por desconhecimento de seus direitos, as faltas graves da empresa justificam a rescisão indireta. Assim, solicita a reforma da sentença para que a demissão seja convertida e a reclamada condenada ao pagamento das verbas rescisórias. Passo ao exame. A rescisão indireta do contrato de trabalho, prevista no art. 483 da CLT, exige a ocorrência de falta grave praticada pelo empregador, de tal modo que torne insustentável a continuidade da relação empregatícia. No caso dos autos, a reclamante formulou pedido de demissão de próprio punho em 09/08/2024 (fl. 511). Embora reconhecido o direito ao pagamento em dobro dos domingos trabalhados em desacordo com o art. 386 da CLT e ao adicional decorrente do acúmulo de função, as demais irregularidades apontadas (não pagamento de vale transporte e de auxílio alimentação) não foram reconhecidas. Para que se configure a rescisão indireta, é necessário que a falta patronal seja revestida de gravidade suficiente para justificar o rompimento do vínculo por iniciativa do empregado. Além disso, quando há pedido de demissão formalizado, a sua conversão em rescisão indireta demanda prova de que o ato de demissão foi viciado ou que as faltas do empregador eram de tal monta que, de fato, tornaram impossível a continuidade do contrato, sendo a demissão uma consequência direta e imediata dessa situação. No presente caso, não há nos autos prova de vício de consentimento no pedido de demissão. Quanto às faltas da reclamada, embora reconhecidas as irregularidades no tocante ao labor em domingos e ao acúmulo de função, não há elementos suficientes para concluir que tais irregularidades tenham tornado insustentável a relação de emprego a ponto de justificar a conversão da demissão em rescisão indireta, especialmente considerando que a reclamante optou por pedir demissão, sem especificar os motivos para tanto em sua comunicação. Cito, por oportuno, precedente deste Regional: [...] 2. DA CONVERSÃO DO PEDIDO DE DEMISSÃO EM RESCISÃO INDIRETA. O autor não se desincumbiu do encargo de apresentar elementos aptos a macularem o pedido de demissão, nem apresentou prova de que este foi motivado pelo descumprimento contratual (acúmulo de função). Além disso, a admissão em emprego melhor remunerado na mesma data em que rescindido o contrato só reforça a validade do desligamento a pedido . [...] (TRT-10 0000036-57.2023.5 .10.0802, Relator.: RUBENS CURADO SILVEIRA, Data de Julgamento: 22/11/2023, Data de Publicação: 29/11/2023) - grifo nosso Mantenho a sentença que reconheceu a validade do pedido de demissão. Nego provimento. CONCLUSÃO Pelo exposto, conheço do recurso ordinário do reclamante e do recurso ordinário da reclamada e, no mérito, dou parcial provimento ao recurso do reclamante para: (i) deferir o adicional por acúmulo de função no percentual de 20% sobre o salário base da reclamante, com reflexos; (ii) condenar a reclamada ao pagamento em dobro de todos os domingos trabalhados em violação à escala de revezamento quinzenal prevista no art. 386 da CLT, durante todo o período contratual, a serem apurados com base nos cartões de ponto juntados, com reflexos; e dou provimento ao recurso da reclamada para afastar a condenação ao pagamento do ticket alimentação, bem como das multas convencionais. Custas, pela reclamada, em R$ 200,00, arbitradas sob o valor da condenação de R$ 10.000,00. Tudo nos termos da fundamentação. ACÓRDÃO Por tais fundamentos, ACORDAM os Desembargadores da Segunda Turma do Tribunal Regional da Décima Região, conforme certidão de julgamento, em aprovar o relatório, conhecer do recurso ordinário do reclamante e do recurso ordinário da reclamada e, no mérito, dar parcial provimento ao recurso do reclamante para: (i) deferir o adicional por acúmulo de função no percentual de 20% sobre o salário base da reclamante, com reflexos; (ii) condenar a reclamada ao pagamento em dobro de todos os domingos trabalhados em violação à escala de revezamento quinzenal prevista no art. 386 da CLT, durante todo o período contratual, a serem apurados com base nos cartões de ponto juntados, com reflexos; e dar provimento ao recurso da reclamada para afastar a condenação ao pagamento do ticket alimentação, bem como das multas convencionais. Custas, pela reclamada, em R$ 200,00, arbitradas sob o valor da condenação de R$ 10.000,00. Tudo nos termos do voto da Desembargadora Relatora. Ementa aprovada. Brasília - DF, sala de sessões, 09 de julho de 2025. Assinado digitalmente. ELKE DORIS JUST Desembargadora Relatora DECLARAÇÃO DE VOTO BRASILIA/DF, 14 de julho de 2025. FRANCISCA DAS CHAGAS SOUTO , Servidor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- MIKELE SILVA COSTA
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Comercial De Alimentos Caique Ltda - Me e outros x Comercial De Alimentos Caique Ltda - Me e outros
ID: 325127320
Tribunal: TRT10
Órgão: 2ª Turma
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 0000979-76.2024.5.10.0014
Data de Disponibilização:
15/07/2025
Polo Passivo:
Advogados:
JULIANO DA COSTA FERREIRA
OAB/GO XXXXXX
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ELISANGELA SOUSA MEDRADO
OAB/DF XXXXXX
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DOUGLAS BARBOSA NOGUEIRA
OAB/DF XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 2ª TURMA Relatora: ELKE DORIS JUST ROT 0000979-76.2024.5.10.0014 RECORRENTE: MIKELE SILVA COSTA E OUTROS (1) RE…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 2ª TURMA Relatora: ELKE DORIS JUST ROT 0000979-76.2024.5.10.0014 RECORRENTE: MIKELE SILVA COSTA E OUTROS (1) RECORRIDO: MIKELE SILVA COSTA E OUTROS (1) PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO PROCESSO nº 0000979-76.2024.5.10.0014 - ACÓRDÃO 2ª TURMA/2025 (RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA (1009)) RELATORA: DESEMBARGADORA ELKE DORIS JUST RECORRENTE E RECORRIDA: MIKELE SILVA COSTA ADVOGADA: ELISÂNGELA SOUSA MEDRADO RECORRENTE E RECORRIDA: COMERCIAL DE ALIMENTOS CAIQUE LTDA - ME ADVOGADO: JULIANO DA COSTA FERREIRA ORIGEM: 14ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA - DF EMENTA RECURSO DA RECLAMANTE. ACÚMULO DE FUNÇÕES. ATENDENTE DE PADARIA. EXERCÍCIO DE ATIVIDADES DE AUXILIAR DE COZINHA. COMPROVAÇÃO. Comprovado nos autos que a empregada, contratada como atendente de padaria, exercia habitualmente e de forma concomitante atividades típicas de auxiliar de cozinha (preparo de bolos, pães, sanduíches e fritura de salgados), alheias ao conteúdo ocupacional da função para a qual foi contratada, resta configurado o acúmulo de funções, ensejando o pagamento do respectivo adicional. O exercício de tarefas que extrapolam os limites da função contratual, exigindo maior qualificação ou responsabilidade, sem a devida contraprestação, configura alteração contratual lesiva e enriquecimento sem causa do empregador. VALE-TRANSPORTE. OPÇÃO DA EMPREGADA PELO NÃO RECEBIMENTO. DECLARAÇÃO VÁLIDA. SÚMULA 460 DO TST. Tendo a empregada firmado declaração expressa de que não pretendia fazer uso do vale-transporte, e não havendo prova de vício de consentimento que macule tal manifestação, o empregador se desincumbe do ônus previsto na Súmula 460 do TST. Caberia à parte trabalhadora comprovar a existência de vício de consentimento apto a invalidar o referido documento, ônus do qual não se desincumbiu. TRABALHO DA MULHER. DESCANSO DOMINICAL. ART. 386 DA CLT. ESCALA DE REVEZAMENTO QUINZENAL. NORMA COLETIVA PREVENDO TRABALHO EM ATÉ TRÊS DOMINGOS POR MÊS. DIREITO INDISPONÍVEL. INAPLICABILIDADE DO TEMA 1.046 DO STF. PAGAMENTO EM DOBRO. A controvérsia reside na prevalência do art. 386 da CLT, que estabelece revezamento quinzenal para o repouso dominical da mulher, sobre norma coletiva que permite o trabalho feminino em até três domingos por mês. O art. 386 da CLT, interpretado à luz do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero e do art. 7º, XX, da Constituição Federal, configura direito indisponível, materializando proteção fundamental ao mercado de trabalho da mulher, insuscetível de limitação por negociação coletiva que estabeleça condição menos favorável. A tese firmada no Tema 1.046 da Repercussão Geral do STF não se aplica ao caso, dada a indisponibilidade do direito em questão, que visa à proteção da saúde e segurança da mulher trabalhadora e à promoção da igualdade substancial. A própria Lei nº 13.467/2017, em seu art. 611-B, XV, veda a supressão ou redução por negociação coletiva de normas relativas à "proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei". Constatado o labor em domingos consecutivos, em violação à escala quinzenal prevista no art. 386 da CLT, como demonstrado pelos cartões de ponto, é devido o pagamento em dobro dos domingos trabalhados irregularmente, com os reflexos legais. RESCISÃO INDIRETA. PEDIDO DE DEMISSÃO FORMALIZADO. CONVERSÃO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE FALTA GRAVE PATRONAL COM GRAVIDADE SUFICIENTE. A rescisão indireta do contrato de trabalho, conforme o art. 483 da CLT, requer a ocorrência de falta grave praticada pelo empregador, de tal modo que torne insustentável a continuidade da relação empregatícia. A existência de pedido de demissão formalizado de próprio punho pela empregada, sem prova de vício de consentimento, obsta a sua conversão em rescisão indireta quando as irregularidades contratuais reconhecidas judicialmente não demonstram, por si sós, gravidade suficiente para caracterizar a insustentabilidade do vínculo a ponto de justificar o rompimento por iniciativa da trabalhadora. Para a conversão de pedido de demissão em rescisão indireta, é imprescindível a demonstração de que o ato de demissão foi viciado ou que as faltas do empregador eram de tal magnitude que tornaram impossível a manutenção do contrato, sendo a demissão uma consequência direta e imediata dessa situação, o que não se verificou no caso dos autos. RECURSO DE AMBAS AS PARTES. AUXÍLIO ALIMENTAÇÃO. SUBSTITUIÇÃO POR CESTA BÁSICA. PREVISÃO EM ACORDO COLETIVO. ART. 620 DA CLT. MULTAS CONVENCIONAIS INDEVIDAS. Existindo Acordos Coletivos de Trabalho, firmados entre a empresa e o sindicato da categoria profissional, que expressamente autorizam a substituição do ticket refeição por cestas básicas, e comprovado o fornecimento destas, prevalecem as condições do acordo sobre eventual previsão em Convenção Coletiva, nos termos do art. 620 da CLT. Lícita a substituição, são indevidas as multas convencionais decorrentes do descumprimento da obrigação. Recurso ordinário da reclamante conhecido e parcialmente provido. Recurso ordinário da reclamada conhecido e provido. RELATÓRIO O juiz José Gervásio Abrão Meireles, da 14ª Vara do Trabalho de Brasília - DF, por meio de sentença (fls. 549/563), complementada pela decisão proferida em sede de embargos declaratórios (fls. 571/572), julgou parcialmente procedentes os pedidos da petição inicial. Nesse sentido, houve a condenação da reclamada, Comercial de Alimentos Caique LTDA - ME, ao cumprimento das obrigações reconhecidas em sentença. Além disso, deferiu à reclamante os benefícios da justiça gratuita. A reclamante, conforme fls. 594/604, interpôs recurso ordinário. Requer a reforma da sentença nos seguintes temas: a) acúmulo de função; b) auxílio alimentação; c) vale transporte; d) domingos laborados; e e) rescisão indireta. A reclamada também interpôs recurso ordinário (fls. 574/578). Pugna pela reforma da sentença no que tange o auxílio alimentação e a multa convencional. Contrarrazões ofertadas por ambos os polos (fls. 616/620, pela reclamante; fls. 607/615, pela reclamada). Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 102 do Regimento Interno deste Regional. Este é o relatório. VOTO ADMISSIBILIDADE O recurso ordinário da reclamante é tempestivo e consta com regular representação processual (fls. 18/20). Goza das mesmas características o recurso da reclamada, vez que é tempestivo e consta com regular representação (fl. 218). Demais disso, houve o recolhimento das custas e do depósito recursal (fls. 579/582). As contrarrazões apresentadas também são tempestivas e contêm regular representação processual. A reclamada argui o não conhecimento do recurso obreiro sob o argumento da violação de dialeticidade recursal. Rejeito a arguição. A motivação das razões recursais não está dissociada dos fundamentos da decisão combatida. Ao contrário, a recorrente delimita a sua insurgência com indicação do desacerto que entende ter ocorrido na sentença. Desse modo, conheço do recurso ordinário do reclamante e do recurso ordinário da reclamada, bem como das respectivas contrarrazões. MÉRITO RECURSO DA RECLAMANTE ACÚMULO DE FUNÇÃO A reclamante, na inicial (fls. 113/132), relatou que foi contratada como atendente de padaria, mas afirma que, de forma habitual e concomitante, também exercia funções de auxiliar de cozinha, como preparar bolos e sanduíches, além de realizar a faxina do setor. Alegou que tais atividades são distintas das previstas para sua função contratual e que não recebeu remuneração adicional por esse acúmulo de tarefas. Diante disso, requereu a condenação da empresa ao pagamento de um adicional de 20% sobre seus vencimentos, durante todo o período do vínculo empregatício, a título de acúmulo de função, com reflexos. Em contestação (fls. 231/256), a reclamada argumentou que a reclamante, como atendente de padaria, realizava atividades compatíveis com sua função, como atendimento ao cliente, colocação e retirada de pães do forno, conferência de validade, reposição e embalagem de produtos. Negou que a reclamante preparasse alimentos ou exercesse a função de auxiliar de cozinha, destacando que a produção era feita por padeiros e uma promotora. Admitiu apenas que, de forma rara e eventual, aos domingos, a reclamante fritava salgados. Nessa linha, aduziu que não houve desequilíbrio contratual nem exploração da mão de obra que caracterizasse acúmulo de função. Assim, pleiteou a improcedência do pedido e de seus reflexos. O Juízo de origem indeferiu o pleito autoral. Confira-se (fls. 549/563): "[...] De início, constata-se da CTPS (fl. 24) que a reclamante foi contratada para a função de atendente de lojas e mercados, ao passo que os contracheques indicam a função de atendente de padaria (fls. 26/30). A função de atendente de lojas e mercados/atendente de padaria implica uma gama significativa de tarefas, as quais se encaixam no poder diretivo do empregador. Apenas quando o trabalhador exerce quantidade significativa de tarefas relacionadas a outra função é que se pode cogitar de acúmulo funcional apto a gerar diferenças. Veja julgado do TST sobre o tema: [...] Em audiência, a testemunha indicada pela reclamante declara: "que a depoente trabalhou com a reclamante cerca de 6 meses até a saída da depoente, o que aconteceu em 22/04/2024; que a depoente e a reclamante eram atendente de padaria, sendo que desempenhavam as seguintes atividades: assavam pães, atendiam clientes, embalavam produtos, ajudavam na cozinha a fazer bolo, pão e a fritar salgado e organizavam os produtos dentro da loja; (...) na loja havia padeiro durante o tempo em que trabalharam juntas; que a depoente e a reclamante faziam uma faxina pesada por mês no estabelecimento da ré". In casu, as atividades de assar pães, de ajudar na cozinha a fazer bolo, pão, fritar salgado e de embalar e organizar produtos são compatíveis com a função de atendente de lojas e mercados/atendente de padaria e com a dinâmica do estabelecimento. Ora, sendo atendente de loja, em especial em uma padaria, não há qualquer sentido imaginar que haveria um acúmulo de funções pelo simples fato de preparar e organizar lanches para os clientes que atende. Qualquer pessoa que frequenta uma padaria sabe que os atendentes participam desta dinâmica, não ficando limitados ao atendimento de clientes. Incide o art. 375 do CPC: Art. 375. O juiz aplicará as regras de experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece e, ainda, as regras de experiência técnica, ressalvado, quanto a estas, o exame pericial. Neste ponto, o art. 456, parágrafo único, da CLT disciplina: Art. 456 (...) Parágrafo único. A falta de prova ou inexistindo cláusula expressa e tal respeito, entender-se-á que o empregado se obrigou a todo e qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal. Além disso, a realização de uma faxina ao mês não conduz ao acúmulo extra e indevido de atribuições. Recorde-se que, conforme trecho do julgado acima transcrito, "o simples exercício de algumas tarefas componentes de uma outra função não traduz, automaticamente, a ocorrência de uma efetiva alteração funcional no tocante ao empregado". Logo, não se constata nos autos qualquer acúmulo de função. Indeferem-se as diferenças requeridas e respectivos reflexos." A reclamante recorre (fls. 594/604). Reforça que exercia, de forma habitual, atividades próprias de auxiliar de cozinha e serviços gerais, como preparação de bolos, sanduíches e limpeza completa da padaria, além das funções de atendente de padaria para as quais foi contratada. Aponta que o depoimento da testemunha por ela indicada confirmou esse acúmulo funcional. Diante disso, defende que ficou caracterizado o acúmulo de função, com direito ao pagamento do respectivo adicional e seus reflexos. Analiso. A controvérsia central reside em determinar se as atividades desempenhadas pela reclamante, para além das funções inerentes ao cargo de atendente de padaria, configuram acúmulo funcional, a ensejar o pagamento do adicional postulado. O ônus de comprovar o acúmulo de funções, por se tratar de fato constitutivo de seu direito, competia à reclamante, nos termos dos artigos 818, I, da CLT e 373, I, do CPC, encargo do qual logrou se desvencilhar. A CTPS da obreira (fl. 24) registra a função de "atendente de lojas e mercados", enquanto os contracheques (fls. 26/30) apontam para "atendente de padaria". Embora a função de atendente em estabelecimentos comerciais possa abranger uma gama variada de tarefas, o exercício habitual e concomitante de atribuições que extrapolam os limites do contratado, caracterizando atividades de outra função mais complexa ou de natureza diversa, configura o acúmulo. A prova oral colhida em audiência (fls. 546/547) é crucial para o deslinde da questão. A testemunha indicada pela reclamante, que laborou com a autora por aproximadamente seis meses, declarou: "que a depoente trabalhou com a reclamante cerca de 6 meses até a saída da depoente, o que aconteceu em 22/04/2024; que a depoente e a reclamante eram atendente de padaria, sendo que desempenhavam as seguintes atividades: assavam pães, atendiam clientes, embalavam produtos, ajudavam na cozinha a fazer bolo, pão e a fritar salgado e organizavam os produtos dentro da loja; (...) na loja havia padeiro durante o tempo em que trabalharam juntas; que a depoente e a reclamante faziam uma faxina pesada por mês no estabelecimento da ré". - grifo nosso Do depoimento, extrai-se que, além das atividades típicas de atendimento (atender clientes, embalar produtos, organizar produtos na loja), a reclamante era demandada para "ajudar na cozinha a fazer bolo, pão e a fritar salgado". Tais tarefas - "fazer bolo, pão e fritar salgado" - são intrinsecamente ligadas à função de auxiliar de cozinha ou cozinheira, e não de mera atendente. O fato de haver um padeiro no local não elide a possibilidade de as atendentes serem sobrecarregadas com tarefas de produção que complementavam ou supriam a necessidade da cozinha. O art. 456, parágrafo único, da CLT, ao dispor que o empregado se obriga a todo e qualquer serviço compatível com sua condição pessoal na falta de prova ou cláusula expressa, não autoriza o empregador a exigir do trabalhador o desempenho de atividades distintas daquelas para as quais foi contratado, especialmente quando implicam maior responsabilidade, complexidade ou desgaste, sem a devida contraprestação. No caso, as tarefas de produção de alimentos (bolos, pães, salgados) não podem ser consideradas meramente compatíveis ou inerentes à função de atendente de padaria, que tem seu foco no atendimento ao cliente, operação de caixa, reposição e organização de produtos para venda, o manuseio final de produto. O preparo de alimentos como bolos e pães e a fritura de salgados, demandam conhecimentos e responsabilidades que não se confundem com as de um simples atendente. Se, por um lado, é comum que atendentes auxiliem em tarefas menores, por outro, não se pode generalizar a ponto de validar a exigência de produção de alimentos como parte integrante da função de atendente, sob pena de se chancelar o enriquecimento ilícito do empregador, que se beneficia de mão de obra para diversas funções pagando salário correspondente a apenas uma delas. Concluo, pois, que restou configurado o acúmulo de funções, uma vez que a situação enseja um desequilíbrio no contrato de trabalho, justificando o pagamento de um adicional. Destarte, dou provimento ao recurso para deferir o adicional por acúmulo de função no percentual de 20% sobre o salário base da reclamante, durante todo o período do vínculo empregatício. Por habituais, são devidos os reflexos do adicional por acúmulo de função em férias acrescidas de 1/3, 13º salários e FGTS. VALE TRANSPORTE A reclamante, na inicial (fls. 113/132), aduziu que o vale-transporte é um direito garantido por lei aos trabalhadores urbanos para assegurar o deslocamento entre casa e trabalho. Esse direito, conforme sustentou, é irrenunciável, exceto em situações específicas. Pontuou que reside a mais de 2 km do trabalho, o que exige o uso de transporte público, e a empresa não forneceu o benefício, o que caracteriza violação legal e compromete sua remuneração. A omissão da empresa desrespeita tanto a legislação quanto a Convenção Coletiva. Assim, concluiu que é legítimo o pedido de ressarcimento pelos valores pagos pela reclamante durante o período sem o vale-transporte. Em contestação (fls. 231/256), a reclamada sustentou que a própria reclamante optou espontaneamente por não receber o benefício, o que foi registrado no momento da admissão. A empresa ressaltou que não houve qualquer questionamento ou irregularidade quanto a essa escolha, e que a própria reclamante indicou, por escrito, não necessitar do vale-transporte no comprovante de endereço apresentado. O Juízo de origem indeferiu o pleito autoral. Confira-se (fls. 549/563): "[...] De fato, o documento de fl. 276, sem impugnação em réplica, evidencia que a autora não optou pela utilização do vale-transporte. Logo, indefere-se a pretensão." A reclamante recorre (fls. 594/604). Argumenta que a declaração de renúncia ao vale-transporte apresentada pela reclamada não possui validade jurídica, pois o direito ao benefício é indisponível e não pode ser renunciado pelo trabalhador. Assim, entende que a empresa tem a obrigação de fornecê-lo ou indenizar o período em que não foi concedido. Além disso, destaca que a declaração foi contestada em réplica. Por isso, requer a reforma da sentença e a condenação da reclamada ao pagamento do vale-transporte. Analiso. O vale-transporte, instituído pela Lei nº 7.418/85, é um direito do trabalhador que utiliza meios de transporte coletivo público para o deslocamento entre sua residência e o local de trabalho, e vice-versa. Sobre o tema, a o enunciado da Súmula 460 do TST dispõe: "VALE-TRANSPORTE. ÔNUS DA PROVA. É do empregador o ônus de comprovar que o empregado não satisfaz os requisitos indispensáveis à concessão do vale-transporte ou não pretenda fazer uso do benefício." No caso, a reclamada juntou o documento de "Declaração/Termo de Compromisso" de vale-transporte (fl. 276), devidamente assinado pela reclamante, no qual esta declara, marcando a opção correspondente, que não utilizaria transporte. Com a apresentação de tal declaração, a reclamada se desincumbiu da parte do ônus que lhe competia, nos termos da Súmula 460 do TST, qual seja, comprovar que a empregada "não pretendia fazer uso do benefício". Uma vez manifestada expressamente a opção da empregada pela não percepção do vale-transporte, presume-se válida tal declaração de vontade, cabendo à parte trabalhadora, caso alegue sua invalidade, o ônus de provar a existência de vício de consentimento que macule o ato jurídico, nos termos dos arts. 818, I, da CLT. Contudo, a mera alegação de que o direito é irrenunciável não configura vício de consentimento. Era necessário que a reclamante demonstrasse, por meios de prova, que foi coagida a assinar o termo de opção, ou que o fez por erro substancial induzido pela reclamada, ou qualquer outra circunstância que invalidasse sua manifestação de vontade. Nesse sentido, confira-se: 1. VALE-TRANSPORTE. SOLICITAÇÃO DE DISPENSA DA BENESSE. INEXISTÊNCIA DE FRAUDE DA DECLARAÇÃO . PARCELA INDEVIDA. [...] (TRT-10 - RORSum: 0000688-74 .2023.5.10.0802, Relator.: DENILSON BANDEIRA COELHO, Data de Julgamento: 01/06/2024, 1ª Turma - Desembargadora Flávia Simões Falcão) VALE-TRANSPORTE. OPÇÃO DO TRABALHADOR PELO NÃO RECEBIMENTO. VÍCIO DE VONTADE INEXISTENTE. BENEFÍCIO INDEVIDO . Compete ao empregador o fornecimento de vale-transporte ao trabalhador, na forma da disposição ínsita no art. 1º da Lei 7.418/85, sendo indevido o benefício quando comprovado que o empregado optou pelo não recebimento do vale-transporte e sendo inexistente vício de vontade neste particular. (TRT-10 - ROT: 0000432-28 .2022.5.10.0007, Relator.: ELAINE MACHADO VASCONCELOS, Data de Julgamento: 17/06/2024, 1ª Turma - Desembargadora Elaine Machado Vasconcelos) RECURSO DA RECLAMANTE. VALE TRANSPORTE. RENÚNCIA EXPRESSA. Não comprovada a existência de vício na manifestação de vontade do empregado, prevalece a renúncia expressa ao benefício do vale transporte . [...] (TRT-10 0000966-76 .2016.5.10.0008, Relator.: ELKE DORIS JUST, Data de Julgamento: 13/09/2017, Data de Publicação: 26/09/2017) Portanto, tendo a reclamante firmado declaração de que não pretendia fazer uso do vale-transporte, e não havendo prova de vício de consentimento que invalide tal declaração, mantenho a sentença que indeferiu o pedido. Nego provimento. DOMINGOS LABORADOS A reclamante, na inicial (fls. 113/132), sustentou que, durante todo o contrato de trabalho, a reclamada descumpriu o artigo 386 da CLT. Relatou que a mulher que trabalha num domingo deve obrigatoriamente folgar no domingo subsequente. Nessa linha, aduziu que a reclamante trabalhava três domingos e folgava apenas um, contrariando a legislação. Ressaltou que este direito é indisponível e não pode ser alterado por negociação coletiva. Diante da violação, a reclamante requereu o pagamento em dobro pelos domingos trabalhados. Em contestação (fls. 542/545), a reclamada argumentou que a CCT e o acordo de banco de horas autorizam o trabalho aos domingos, desde que haja folga compensatória, a qual foi devidamente concedida à reclamante. Assim, ponderou que não é cabível o pagamento em dobro dos domingos. Sustentou, ainda, que não há base legal para o pagamento adicional e que isso resultaria em enriquecimento sem causa. Contestou também o número de domingos apontado pela reclamante e afirmou que eventuais valores só devem ser apurados com base nos controles de jornada apresentados. O Juízo de origem deferiu parcialmente o pleito autoral, nos seguintes moldes (fls. 549/563): "[...] As convenções coletivas vigentes no período de 1º.11.2021 a 31.10.2023 (fl. 151) e de 01.11.2022 a 31.10.2024 (fl. 172) preveem, no parágrafo primeiro da cláusula quadragésima, que "nenhum empregado poderá trabalhar mais que 03 (três) domingos por mês" (fls. 162 e 183). Ademais, a mesma cláusula menciona, no caput, que o e pregado convocado possui direitos Registra-se que a norma coletiva em análise manifestou a vontade das partes envolvidas na negociação coletiva, cuja validade é garantida pelo art. 7º, XXVI, da CF, que assegura, no rol dos direitos sociais dos trabalhadores, o reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho. Ademais, o art. 444 da CLT prevê que as relações de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas, em tudo quanto não contravenha às disposições de proteção ao trabalho. Por oportuno, o art. 611-A da CLT assegura uma ampla liberdade negocial. Vale registrar o conteúdo da tese do tema 1.046 da Lista de Repercussão Geral do STF: São constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis. Portanto, a cláusula normativa em comento é válida, devendo prevalecer em relação ao teor do art. 386 da CLT. Logo, considerando que foi observado o disposto na norma coletiva no que diz respeito ao labor máximo em 03 (três) domingos por mês, conforme reconhece a autora, indefere-se o pagamento de domingos laborados em dobro de 1º. 11.2021 (início da vigência das normas coletivas) a 09.08.2024 (data de rescisão contratual - fl. 513). No tocante ao período anterior a 1º.11.2021, a partir do início do pacto (19.08.2021), não foi juntada nenhuma convenção coletiva. Nesse período, constata-se das folhas de ponto (fls. 278/282) o labor em 2 domingos seguidos nos dias 03.10.2021 e 10.10.2021 (fl. 281), em violação ao art. 386 da CLT. Assim, defere-se o pagamento em dobro pelo labor no domingo de 10.10.2021. Defere-se o FGTS sobre o pagamento ora deferido de domingo em dobro. Considerando a ausência de habitualidade, indeferem-se reflexos em 13º salários e em férias acrescidas de 1/3." A reclamante recorre (fls. 594/604). Repisa que, durante todo o contrato, a reclamada descumpriu as normas da CLT relativas ao trabalho feminino aos domingos. Alega que o descanso quinzenal aos domingos para mulheres é um direito indisponível já reconhecido pelo STF, não podendo ser restringido por norma coletiva. Diante disso, requer a reforma da sentença para que seja reconhecido o direito ao pagamento em dobro de todos os domingos trabalhados, conforme pleiteado na inicial. Passo ao exame. A controvérsia reside em definir se a norma coletiva que permite o trabalho da mulher em até três domingos por mês prevalece sobre o disposto no art. 386 da CLT, que estabelece a obrigatoriedade de uma escala de revezamento quinzenal para o repouso dominical da mulher. A sentença entendeu que a norma coletiva seria válida, com base na tese do Tema 1.046 do STF, e indeferiu o pagamento em dobro dos domingos a partir de 01/11/2021. Para o período anterior, deferiu o pagamento dobrado do domingo de 10/10/2021 por violação direta ao art. 386 da CLT, ante a ausência de norma coletiva específica para o período. Conforme entendimento firmado pelo TST no julgamento do RR-Ag-41-58.2017.5.21.0002 (7ª Turma, Relator Ministro Claudio Mascarenhas Brandao, DEJT 30/08/2024), ao analisar o art. 386 da CLT à luz do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero e do art. 7º, XX, da CF, concluiu-se ser "evidente o caráter indisponível do direito previsto no artigo 386 da CLT, por materializar o direito fundamental previsto no artigo 7º, XX, da Constituição Federal" e que, portanto, é "Inviável, portanto, a limitação do direito previsto no artigo 386 da CLT por norma coletiva.". Confira-se: [...] RECURSO DE REVISTA DO SINDICATO-AUTOR. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. TRABALHO DA MULHER . ARTIGO 386 DA CLT. PAGAMENTO EM DOBRO DOS DOMINGOS TRABALHADOS. PROTOCOLO PARA JULGAMENTO COM PERSPECTIVA DE GÊNERO. NORMA COLETIVA QUE LIMITA DIREITO INDISPONÍVEL . ARTIGO 7º, XX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. AUSÊNCIA DE ESTRITA ADERÊNCIA AO TEMA Nº 1.046 DE REPERCUSSÃO GERAL. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA . O descanso aos domingos remonta à história e tem origem na tradição religiosa. No Brasil, o descanso remunerado preferencialmente aos domingos sempre teve atenção especial no ordenamento jurídico. Para além da questão religiosa , a eleição do domingo como dia ideal para descanso relaciona-se, ainda, com aspectos de ordem social, familiar e até mesmo política. Isso porque se trata do dia da semana em que o trabalhador mais tem possibilidades de desfrutar do convívio social e familiar e participar da vida comunitária . Especificamente no que diz respeito às mulheres, o artigo 386 da CLT prevê: "havendo trabalho aos domingos, será organizada uma escala de revezamento quinzenal, que favoreça o repouso dominical". A SBDI-1 desta Corte, ao examinar a recepção desse dispositivo pela Constituição Federal e sua prevalência em relação ao artigo 6º, parágrafo único, da Lei nº 10.101/2000 (caso líder E-ED-RR-619-11.2017 .5.12.0054), entendeu que incide a mesma ratio decidendi firmada pelo Tribunal Pleno do TST no julgamento da arguição de inconstitucionalidade do artigo 384 da CLT, posteriormente confirmado pelo Supremo Tribunal Regional no julgamento referente ao Tema nº 528 de Repercussão Geral (RE 658.312) . A propósito deste julgamento do STF, cite-se, pela relevância, o fundamentado externado pelo Exmo. Ministro Dias Toffoli, relator do caso, para quem o reconhecimento da possibilidade tratamento diferenciado da mulher tem guarida constitucional, de forma a assegurar a plenitude do princípio da igualdade, e, ao fazê-lo, também se valeu de dados da realidade, entre os quais de componente social, pelo fato de ser comum o acúmulo de atividades pela mulher no lar e no ambiente de trabalho. Some-se a isto a aprovação, pelo Conselho Nacional de Justiça, da obrigatoriedade de os órgãos do Poder Judiciário observarem, em seus julgamentos, as diretrizes do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero , conforme Resolução nº 492/2023. Referido Protocolo, criado em 2021, tem por objetivo, a partir do reconhecimento da influência que as desigualdades históricas, sociais, culturais e políticas sofridas pelas mulheres ao longo do tempo teve na produção e aplicação do direito, criar "cultura jurídica emancipatória e de reconhecimento de direitos de todas as mulheres e meninas" . Destina-se, assim, a orientar a magistratura no julgamento de casos concretos, de modo que as decisões sejam produzidas sob as chamadas "lentes de gênero" para avançar-se na efetivação da igualdade e nas políticas de equidade. Julgar com lentes de gênero, por sua vez, significa não reforçar - nem ignorar - por meio da imperatividade da decisão judicial e sob o mito da "neutralidade" e "universalidade" da lei formal e abstrata, os estereótipos e os padrões de poder/subordinação desde sempre existentes entre homens e mulheres , levando-se em consideração, ainda, os demais marcadores interseccionais de vulnerabilidade, como raça, classe social e orientação sexual. Sob esta ótica, no particular, a apuração da situação mais "benéfica" para as empregadas deve ser guiada pelo aspecto da divisão sexual do trabalho e da assimetria de poder dela resultante. Assim, no presente caso, é devido o pagamento em dobro dos domingos laborados, pela inobservância da escala prevista no artigo 386 para as empregadas mulheres, não obstante a existência de previsão em norma coletiva de concessão de uma folga por semana, acrescida de outra folga em um domingo por mês, resultando em uma semana por mês com a concessão de duas folgas, para todos os empregados . Isso porque, conforme explicado, a questão em debate não é meramente quantitativa, isto é, relativa ao número de folgas, mas, sobretudo, de gênero e de conformação da igualdade substancial e do direito fundamental previsto no artigo previsto no artigo 7º, XX, da Constituição Federal ("a proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei"). Ainda, não há que se falar em aderência da presente discussão ao Tema 1.046 de Repercussão Geral, uma vez que as normas coletivas, no caso, não trataram especificamente do descanso aos domingos das mulheres. Além disso, é evidente o caráter indisponível do direito previsto no artigo 386 da CLT, por materializar o direito fundamental previsto no artigo 7º, XX, da Constituição Federal . Ressalta-se que a própria Lei nº 13.467/17, ao dispor sobre as matérias cuja supressão ou redução por negociação coletiva é vedada, nos termos do artigo 611-B, elencou expressamente aquelas relativas "à proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei" , nas quais se enquadra o disposto em questão. Inviável, portanto, a limitação do direito previsto no artigo 386 da CLT por norma coletiva. Recurso de revista conhecido e provido . (TST - RR-Ag: 00000415820175210002, Relator.: Claudio Mascarenhas Brandao, Data de Julgamento: 07/08/2024, 7ª Turma, Data de Publicação: 30/08/2024) - grifo nosso Este entendimento do TST, que trata especificamente da matéria e é posterior à tese geral do Tema 1.046 do STF, confere ao art. 386 da CLT a natureza de direito indisponível, relacionado à proteção da saúde e segurança da mulher trabalhadora, não passível de flexibilização por norma coletiva que estabeleça condição menos favorável. O julgado ressalta, inclusive, que a própria Lei nº 13.467/2017, no art. 611-B, veda a supressão ou redução por negociação coletiva de normas relativas à "proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei". Nesse mesmo sentido, ainda podemos citar: [...] REVEZAMENTO QUINZENAL. PROTEÇÃO AO TRABALHO DA MULHER. TRATAMENTO GENÉRICO POR NORMA COLETIVA. PRESERVAÇÃO DE NORMA ESPECIAL DE PROTEÇÃO DO TRABALHO . TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA. Cinge-se a controvérsia à aplicação da escala de revezamento que favoreça o descanso semanal com maior frequência aos domingos das mulheres que trabalham em atividade de comércio, dada a aparente antinomia que é suscitada entre o disposto no art. 386 da CLT e no art. 6º, parágrafo único, da Lei n . 10.101/2000, com redação dada pela Lei n. 11.603/2007 . A Subseção Especializada em Dissídios Individuais I do TST (SbDI-I) vem adotando a mesma ratio decidendi firmada pelo Tribunal Pleno na rejeição da arguição de inconstitucionalidade do art. 384 da CLT, no qual se destacou o "ônus da dupla missão, familiar e profissional, que despenha uma mulher trabalhadora" e que "o peso maior da administração da casa e da educação dos filhos acaba recaindo sobre a mulher". Essas premissas são as mesmas que justificam a aplicação da regra protetiva prevista no art. 386 da CLT, a qual permanece intacta após a denominada "reforma trabalhista" (Lei n . 13.467/2017). Em proveito da recepção pela ordem constitucional do art. 386 da CLT e de sua prevalência ante a regra mais abrangente do art . 6º da Lei n. 10.101/2000, põem-se em enlevo as seguintes premissas jurídicas que, com efeito, repercutem dados e valores culturais: a) o art. 7º, XX da Constituição prevê, entre os direitos fundamentais, a "proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei", o que induz à relevância de preceitos de lei que viabilizem progressivamente o ingresso das mulheres no mundo institucional do trabalho, sem embargo do tempo maior que dedicam à reprodução, formação e sociabilização da força de trabalho (cabe redarguir, como argumento ad terrorem e em desalinho com dados estatísticos, a ilação de ser a proteção das condições de trabalho da mulher um fator de redução da sua empregabilidade); b) em respeito à tridimensionalidade da norma jurídica, e agora sob o prisma histórico-cultural, é tempo de o Direito inverter a lógica perversa de desconsiderar ou comprometer o tempo dedicado à reprodução (trabalho reprodutivo) da fonte de trabalho mediante a atribuição à mulher de trabalho produtivo em condição incompatível com a sua função biológica, econômica e social; c) o art . 386 da CLT revela um estágio evolutivo na concretização do art. 7º, XX da Constituição que não comporta retrocesso se a restrição que se busca, por meio da atividade jurisdicional e de lege ferenda , não atende à exigência de ser "medida compatível com a natureza desses direitos e exclusivamente com o objetivo de favorecer o bem-estar geral em uma sociedade democrática" (art. 4º do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais); d) a progressividade dos direitos humanos e fundamentais - prevista no art. 2º .1 do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, no art. 26 da Convenção Americana de Direitos Humanos e, na espécie, no caput do art. 7º da Constituição - reveste-se de caráter normativo e se submete ao controle jurisdicional, consoante vem de decidir a Corte Interamericana de Direitos Humanos desde o caso Acevedo Buendía e outros vs Peru; e) o critério da especialidade, entre aqueles que servem à resolução de antinomias entre normas jurídicas, não é oponível à prevalência do art. 386 da CLT, em lugar do art . 6º da Lei n. 10.101/2000, dado que é aquele, e não este, o dispositivo que veicula a norma especial, vale dizer: da norma generalíssima contida na Lei n. 605/1949, raiz de todo o debate, destacam-se os destinatários da Lei n . 10.101/2000 (art. 6º), ou seja, todos os trabalhadores do comércio, e, dentre estes, destacam-se as mulheres trabalhadoras no comércio em geral - tuteladas, com maior especificidade, pelo art. 386 da CLT . Do contrário, a proteção de outros grupos vulneráveis potencialmente ativados no comércio - como crianças, adolescentes, idosos, pessoas com deficiência ou povos originários - estaria inviabilizada ante a predominância da regra consagrada, para todos, e todos indistintamente, na Lei n. 10.101/2000. Convém destacar que o entendimento firmado no âmbito da SBDI-I desta Corte foi endossado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário 1 .403.904, no qual a ministra relatora, Cármen Lúcia, destacou que a escala diferenciada de repouso semanal, prevista no artigo 386 da CLT, trata-se de norma protetiva dos direitos fundamentais sociais das mulheres e não viola o princípio da isonomia, pois consubstancia a adoção de critério legítimo de discrímen. No caso, o Tribunal Regional entendeu que deveria prevalecer norma coletiva que torna o repouso aos domingos apenas facultativo, com possibilidade de descanso em outro dia da semana, e que essa regra, ao constituir objeto de negociação coletiva regular, com participação do sindicato representativo da categoria profissional, traduziria o melhor interesse para a categoria de uma forma global. Ou seja, a norma protetiva do art . 386 da CLT não poderia prevalecer sobre disposições oriundas da autonomia da vontade coletiva. A respeito dessas normas coletivas, de forma literal, o Regional registrou: " As normas coletivas preveem que o descanso semanal aos domingos é facultativo, garantindo-se folga compensatória em outro dia da semana, a exemplo da cláusula trigésima quarta da CCT 2016/2017 ". O Tribunal de origem também consignou que a norma coletiva não se destinou a tratar do revezamento quinzenal de repouso dominical assegurado pelo art. 386 da CLT às mulheres, afirmando: " Destaca-se que não há qualquer ressalva na norma coletiva, de maneira que deve ser aplicada a todo trabalhador do reclamado, inclusive mulheres " . Em razão do caráter genérico das disposições coletivas que tratam do trabalho aos domingos, não se verifica sequer a possibilidade de confronto entre a imperatividade do direito assegurado pelo art. 386 da CLT e a diretriz da autonomia da vontade coletiva. Dessa forma, não é justificável o afastamento do direito previsto em tal dispositivo se não há quaisquer relações de prejudicialidade entre ele e as disposições normativas decorrentes de negociação coletiva. Portanto, a garantia da escala mínima quinzenal de concessão do repouso semanal remunerado às mulheres aos domingos deve prevalecer sobre disposições genéricas de norma coletiva que tratam do instituto sem distinção entre trabalhadores homens e mulheres, a exemplo do que se observa no caso em exame, dado o caráter especial da norma protetiva constante do art . 386 da CLT, recepcionada pela Constituição Federal de 1988. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido. (TST - RR: 0001238-44 .2017.5.17.0007, Relator.: Augusto Cesar Leite De Carvalho, Data de Julgamento: 29/05/2024, 6ª Turma, Data de Publicação: 29/05/2024) - grifo nosso AGRAVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. REGIDO PELA LEI 13.467/2017 . LABOR AOS DOMINGOS. ATIVIDADES DO COMÉRCIO EM GERAL. ESCALA DE REVEZAMENTO. EMPREGADAS MULHERES . ARTIGO 386 DA CLT. TRANSCENDÊNCIA NÃO RECONHECIDA NA DECISÃO AGRAVADA. A mens legis do parágrafo único do artigo 6º da Lei 10.101/2000 deu ao descanso semanal remunerado o devido valor social, haja vista que, no Brasil, é no domingo o dia tradicionalmente reconhecido pelas famílias como aquele em que usufruem de momentos de comunhão . Por se tratar de norma de proteção ao trabalho, o citado parágrafo único do artigo 6º, deve coexistir com as normas coletivas, as quais devem se completar no momento em que são interpretadas. Portanto, ao conceder a máxima efetividade a um direito social e a proteção à família, necessário se faz que o empregado tenha uma folga semanal coincidente com um domingo no mês. Ocorre que o art. 386 da CLT, inserido no capítulo que trata das normas de proteção ao trabalho da mulher, prevê que "havendo trabalho aos domingos, será organizada uma escala de revezamento quinzenal, que favoreça o repouso dominical" . Nesse contexto, entende-se que o artigo 386 da CLT foi recepcionado pela Constituição Federal, tanto que não foi ele revogado pela Lei 13.467/2017. Assim, aplicando-se o princípio da especialidade previsto no artigo 2º, § 2º, da LINDB e o princípio da norma mais favorável, o trabalho aos domingos da mulher deve ser organizado em escala de revezamento quinzenal, nos termos do artigo 386 da CLT. Logo, o descumprimento do art . 386 da CLT impõe o pagamento em dobro dos domingos quinzenais laborados. Nesse contexto, não afastados os fundamentos da decisão agravada, nenhum reparo enseja a decisão. Agravo não provido, com acréscimo de fundamentação. (TST - Ag-AIRR: 00000066120235210011, Relator.: Douglas Alencar Rodrigues, Data de Julgamento: 30/10/2024, 5ª Turma, Data de Publicação: 08/11/2024) - grifo nosso RECURSO ORDINÁRIO. DOMINGOS TRABALHADOS. EMPREGADA MULHER. DESCANSO DOMINICAL . ART. 386 DA CLT. NORMA COLETIVA. OBJETO ILÍCITO . INAPLICABILIDADE DO TEMA 1.046 DO STF. DIREITO INDISPONÍVEL. PROTEÇÃO DO MERCADO DE TRABALHO DA MULHER . PERSPECTIVA DE GÊNERO. A norma coletiva que afasta a aplicação do art. 386 da CLT e permite o labor habitual de empregadas mulheres aos domingos, sem a observância do revezamento quinzenal, incorre em objeto ilícito, nos termos do art. 611-B, XV, da CLT . Trata-se de direito indisponível, por consubstanciar proteção específica ao mercado de trabalho da mulher, com amparo no art. 7º, XX, da Constituição Federal. A jurisprudência do TST, alinhada ao Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do CNJ, reforça a necessidade de tratamento jurídico que reconheça desigualdades estruturais. Inaplicável o Tema 1 .046 do STF, diante da ausência de aderência estrita e da especialidade da norma em debate. Mantida a condenação ao pagamento em dobro dos domingos laborados, diante da inobservância da escala legal. (TRT-13 - ROT: 00014463520245130026, Relator.: ARNALDO JOSE DUARTE DO AMARAL, 1ª Turma - Gabinete do Desembargador Eduardo Sérgio de Almeida) TRABALHO DA MULHER. ESCALA DE REVEZAMENTO QUINZENAL PARA O TRABALHO AOS DOMINGOS. ARTIGO 386 DA CLT. Viola direito assegurado às trabalhadoras no art . 386 da CLT, norma recepcionada pela Constituição da Republica, a não concessão à empregada de repouso semanal aos domingos, a cada 15 dias. (TRT-12 - ROT: 0000619-34.2023.5 .12.0043, Relator.: HELIO HENRIQUE GARCIA ROMERO, 3ª Turma) No caso dos autos, as Convenções Coletivas juntadas (CCT 2021/2023, fls. 36/56, Cláusula Quadragésima, §1º, fl. 47; CCT 2022/2024, fls. 57/77, Cláusula Quadragésima, §1º, fl. 68; CCT 2023/2025, fls. 78/101, Cláusula Quadragésima, §1º, fl. 88) preveem que "Nenhum empregado poderá trabalhar mais que 03 (três) domingos por mês". Esta disposição, ao permitir o trabalho em três domingos consecutivos, contraria a exigência de revezamento quinzenal do art. 386 da CLT. Os cartões de ponto (fls. 278/339) demonstram, por exemplo, que, no período de 21/06/2022 a 20/07/2022 (fls. 298/299), a reclamante laborou nos domingos 26/06, 03/07 e 10/07, ou seja, em inobservância ao art. 386 da CLT. Assim, dou provimento ao recurso da reclamante para condenar a reclamada ao pagamento em dobro de todos os domingos trabalhados em violação à escala de revezamento quinzenal prevista no art. 386 da CLT, durante todo o período contratual, a serem apurados com base nos cartões de ponto juntados, com reflexos em férias + 1/3, 13º salários, DSR e FGTS. RECURSO DE AMBAS AS PARTES AUXÍLIO ALIMENTAÇÃO A reclamante, na inicial (fls. 113/132), dispôs que iniciou seu trabalho como atendente de padaria em 19/08/2021. Durante os primeiros 8 meses de contrato, a empresa fornecia alimentação no local, prática que foi posteriormente interrompida sem substituição por auxílio alimentação. Alegou que, de acordo com a CCT, a empresa estaria obrigada a fornecer o auxílio alimentação a todos os trabalhadores. Houve, portanto, descumprimento da Convenção Coletiva e supressão de direito, o que configura violação da legislação trabalhista. A reclamante requer, então, a condenação da empresa ao pagamento do respectivo valor. Em contestação (fls. 231/256), a reclamada informou que o Acordo Coletivo permite a substituição do auxílio alimentação (ticket) por cestas básicas, e que a reclamante sempre recebeu essas cestas após o fim do fornecimento de refeições no local, exceto nos períodos em que esteve afastada ou de férias, quando o benefício não é devido. Diante disso, alegou que cumpriu com suas obrigações. Assim, contestou os valores pleiteados pela reclamante a título de auxílio alimentação. O Juízo de origem deferiu parcialmente o pleito autoral. Confira-se (fls. 549/563): "[...] Acerca do assunto, a testemunha da autora declara: "que a depoente e a reclamante recebiam cesta básica todos os meses". Os acordos coletivos, vigentes nos períodos de 1º.7.2020 a 1º. 7.2021 (fl. 429), de 1º.7.2023 a 1º.7.2024 (fl. 449) e de 1º.7.2024 a 1º.7.2025 (fl. 456) preveem, na cláusula terceira, parágrafo único (fls. 430, 450 e 457), a substituição da obrigação do pagamento do ticket refeição prevista na cláusula 11ª da CCT pelo fornecimento de cestas básicas mensais aos empregados. Registra-se, por oportuno, que, a partir de 11.11.17 (vigência da reforma trabalhista), o art. 620 da CLT passou a prever expressamente: "As condições estabelecidas em acordo coletivo de trabalho sempre prevalecerão sobre as estipuladas em convenção coletiva de trabalho". Dessa forma, as disposições previstas em acordo coletivo de trabalho deverão prevalecer sobre as estipuladas em convenção coletiva de trabalho, sendo o que o texto é expresso quanto à prevalência ao incluir o advérbio "sempre". Considerando que a testemunha comprovou que a autora recebia cesta básica todos os meses e a predominância do acordo coletivo de trabalho sobre a convenção coletiva de trabalho, reputa-se que a empresa estava desobrigada a fornecer o ticket refeição previsto em convenção coletiva no período de vigência dos acordos coletivos. Logo, indefere-se a pretensão de pagamento do ticket alimentação/refeição no período de 01.07.2023 a 09.08.2024 (data de rescisão contratual - fl. 513). Por outro lado, tendo em vista a ausência de juntada de acordo coletivo e nos limites da exordial, defere-se a pretensão de pagamento do ticket alimentação/refeição no valor de R$ 15,00 por dia trabalhado, no período de 01.06.2022 a 31.10.2022, nos termos da cláusula décima primeira (fl. 154) da convenção coletiva vigente no período de 1º.11.2021 a 31.10.2023 (fl. 151), e no valor de R$ 16,00 por dia trabalhado, no período de 01.11.2022 a 30.06.2023, nos termos da cláusula décima primeira (fl. 175) da convenção coletiva vigente no período de 01.11.2022 a 31.10.2024 (fl. 172), devendo ser observados os dias efetivamente registrados nos controles de ponto. [...]" A reclamada recorre (fls. 574/578). Assevera que apresentou todos os Acordos Coletivos válidos durante o contrato de trabalho, os quais autorizam a substituição do ticket alimentação por cesta básica. Dessa forma, afirma que a sentença incorreu em erro ao afirmar que tais acordos não foram juntados, levando à condenação da empresa e à aplicação de multa convencional. Sustenta, então, que os acordos foram anexados tempestivamente na contestação e cobrem todo o período contratual, comprovando que não houve descumprimento das normas coletivas. Por isso, requer a reforma da sentença para afastar as condenações relativas ao ticket alimentação e às multas. A reclamante também recorre (fls. 594/604). Argumenta que, embora previsto em acordo, essa substituição resultou em prejuízo ao trabalhador, configurando alteração contratual lesiva, conforme o art. 468 da CLT, e violação ao princípio da condição mais benéfica (art. 444 da CLT). Defende que a supressão do vale-alimentação comprometeu sua subsistência e impactou sua remuneração, sendo inválida. Por isso, requer a reforma da sentença para que a recorrida seja condenada ao pagamento retroativo do ticket alimentação durante todo o contrato de trabalho, exceto nos primeiros 8 meses. Examino. Compulsando os autos, verifica-se que a reclamada colacionou os Acordos Coletivos de Trabalho que abrangem todo o período do pacto laboral da reclamante, iniciado em 19/08/2021 e findo em 09/08/2024. Porém, conforme delimitado, o pedido referente ao pleito em análise se dá a partir de junho de 2022. Conforme se extrai dos documentos juntados com a contestação, o ACT 2021/2022 (fls. 434/438), com vigência de 1º de julho de 2021 a 01 de julho de 2022. A cláusula terceira deste instrumento (fl. 435) dispõe sobre a faculdade de substituição do ticket refeição, previsto na cláusula 11ª da CCT, pelo fornecimento de cesta básica. O ACT 2022/2023 (fls. 439/443), com vigência de 1º de julho de 2022 a 01 de julho de 2023, reitera a permissão para substituição do ticket refeição por cesta básica. De igual forma, o ACT 2023/2024 (fls. 444/448) e o ACT 2024/2025 (fls. 456/462), também preveem a substituição. Assim, houve a juntada de Acordos Coletivos que abrangem os períodos da condenação e que, em suas cláusulas terceiras, expressamente autorizam a reclamada a substituir o pagamento do ticket refeição pelo fornecimento de cestas básicas mensais. Ademais, a própria sentença reconheceu, com base no depoimento da testemunha da autora, que "a depoente e a reclamante recebiam cesta básica todos os meses". Nesse diapasão, cumpre ressaltar a regra insculpida no art. 620 da CLT, que estabelece a prevalência das condições fixadas em acordo coletivo de trabalho sobre aquelas estipuladas em convenção coletiva de trabalho: "As condições estabelecidas em acordo coletivo de trabalho sempre prevalecerão sobre as estipuladas em convenção coletiva de trabalho". Portanto, existindo Acordos Coletivos específicos, firmados entre a empresa reclamada e o sindicato representativo da categoria profissional da reclamante, que permitem a substituição do auxílio alimentação por cestas básicas, e comprovado o fornecimento destas, não há descumprimento de obrigação ou direito ao recebimento do ticket alimentação com base na Convenção Coletiva. Consequentemente, afastada a condenação principal referente ao ticket alimentação, resta indevida a condenação ao pagamento das multas convencionais decorrentes do descumprimento desta obrigação. Destarte: Nego provimento ao recurso do reclamante. Dou provimento ao recurso da reclamada para afastar a condenação ao pagamento do ticket alimentação, bem como das multas convencionais. Indefiro o pedido da reclamada de exclusão da condenação ao pagamento de honorários, pois, em que pese a reforma neste particular, subsiste condenação da ré. RECURSO DA RECLAMANTE CONVERSÃO DO PEDIDO DE DEMISSÃO PARA RESCISÃO INDIRETA A reclamante, na inicial (fls. 113/132), relatou que, diante dos descumprimentos expostos, como o acúmulo de função, ausência de auxílio alimentação e de vale transporte, pediu demissão. Contudo, por entender que foi forçada a isso em razão das condições ilegais impostas, buscou a conversão do pedido de demissão em rescisão indireta do contrato de trabalho, com base no artigo 483, alínea "d", da CLT, considerando como data de admissão 18/08/2021 e rescisão indireta em 15/09/2024, já incluindo o aviso prévio projetado. Em contestação (fls. 231/256), a reclamada argumentou que o pedido de demissão feito pela reclamante é um ato jurídico perfeito, sem qualquer vício de vontade. Afirmou que a trabalhadora não demonstrou arrependimento ou coação no momento da demissão, e só alegou supostas faltas graves da empresa posteriormente. Assim, sustentou que é impossível converter o pedido de demissão em rescisão indireta. Ainda que essa hipótese fosse considerada, a reclamada negou ter cometido qualquer falta grave que justificasse tal medida. O Juízo de origem indeferiu o pleito autoral, nos seguintes moldes (fls. 549/563): "[...] O documento de fl. 511 aponta o pedido de demissão formulado pela autora, de próprio punho, em 09.08.2024. Ainda que defenda a autora que havia respaldo para o reconhecimento da rescisão indireta, tal possibilidade não seria capaz, por si só, de anular o pedido de demissão, ato perfeito e acabado. Absolutamente ninguém pode alegar desconhecimento da lei (art. 3º da LINDB). Assim, caso o autor tivesse interesse na rescisão indireta, deveria ter buscado a via própria. Descabe comparecer ao Judiciário invocando suposta violação de direitos trabalhistas como fundamento para invalidar ato perfeito e acabado que praticou voluntariamente. A nulidade de seu ato somente se justificaria se houvesse prova cabal de algum vício de consentimento, o que não existe nos autos. E o encargo probatório era da autora. Assim, este juízo reconhece como válido o pedido de demissão da reclamante em 09.08.2024. Como consequência, indeferem-se os pleitos de reversão do pedido de demissão em rescisão indireta, de pagamento de aviso prévio indenizado e de projeção do aviso sobre outras verbas rescisórias e na data de baixa na CTPS. Além disso, as verbas rescisórias atinentes à modalidade de ruptura contratual (pedido de demissão) - saldo de salário, 13º salário, férias integrais 2023/2024 acrescidas de 1/3 - foram pagas, conforme TRCT (fls. 513/514) e comprovante de fl. 516. Registra-se, por oportuno, que foi pago o saldo de salário relativo a 3 dias, tendo em vista que a autora usufruiu as férias relativas ao período aquisitivo 2022/2023 até 06.08.2024, com retorno ao serviço na data de 07.08.2024, consoante se extrai do documento de fl. 507. Nesse contexto, considerando a ausência de prova de baixa na CTPS, este juízo determina que a reclamada proceda à anotação de saída na CTPS para constar data de 09.08.2024, após o trânsito em julgado, em cinco dias contados da intimação para tal. O descumprimento dessa obrigação de fazer implicará pena de multa diária de R$ 200,00 até o limite máximo de R$ 1.000,00. No caso de inércia da reclamada, proceda a secretaria à anotação determinada." A reclamante recorre (fls. 594/604). Reforça que pediu demissão em 09/08/2024 devido a irregularidades e condutas abusivas da reclamada que tornaram insustentável a continuidade do vínculo empregatício. Com base no artigo 483 da CLT, argumenta que é possível a conversão do pedido de demissão em rescisão indireta, já que o empregador descumpriu obrigações contratuais essenciais. Alega ainda que, mesmo pedido demissão por desconhecimento de seus direitos, as faltas graves da empresa justificam a rescisão indireta. Assim, solicita a reforma da sentença para que a demissão seja convertida e a reclamada condenada ao pagamento das verbas rescisórias. Passo ao exame. A rescisão indireta do contrato de trabalho, prevista no art. 483 da CLT, exige a ocorrência de falta grave praticada pelo empregador, de tal modo que torne insustentável a continuidade da relação empregatícia. No caso dos autos, a reclamante formulou pedido de demissão de próprio punho em 09/08/2024 (fl. 511). Embora reconhecido o direito ao pagamento em dobro dos domingos trabalhados em desacordo com o art. 386 da CLT e ao adicional decorrente do acúmulo de função, as demais irregularidades apontadas (não pagamento de vale transporte e de auxílio alimentação) não foram reconhecidas. Para que se configure a rescisão indireta, é necessário que a falta patronal seja revestida de gravidade suficiente para justificar o rompimento do vínculo por iniciativa do empregado. Além disso, quando há pedido de demissão formalizado, a sua conversão em rescisão indireta demanda prova de que o ato de demissão foi viciado ou que as faltas do empregador eram de tal monta que, de fato, tornaram impossível a continuidade do contrato, sendo a demissão uma consequência direta e imediata dessa situação. No presente caso, não há nos autos prova de vício de consentimento no pedido de demissão. Quanto às faltas da reclamada, embora reconhecidas as irregularidades no tocante ao labor em domingos e ao acúmulo de função, não há elementos suficientes para concluir que tais irregularidades tenham tornado insustentável a relação de emprego a ponto de justificar a conversão da demissão em rescisão indireta, especialmente considerando que a reclamante optou por pedir demissão, sem especificar os motivos para tanto em sua comunicação. Cito, por oportuno, precedente deste Regional: [...] 2. DA CONVERSÃO DO PEDIDO DE DEMISSÃO EM RESCISÃO INDIRETA. O autor não se desincumbiu do encargo de apresentar elementos aptos a macularem o pedido de demissão, nem apresentou prova de que este foi motivado pelo descumprimento contratual (acúmulo de função). Além disso, a admissão em emprego melhor remunerado na mesma data em que rescindido o contrato só reforça a validade do desligamento a pedido . [...] (TRT-10 0000036-57.2023.5 .10.0802, Relator.: RUBENS CURADO SILVEIRA, Data de Julgamento: 22/11/2023, Data de Publicação: 29/11/2023) - grifo nosso Mantenho a sentença que reconheceu a validade do pedido de demissão. Nego provimento. CONCLUSÃO Pelo exposto, conheço do recurso ordinário do reclamante e do recurso ordinário da reclamada e, no mérito, dou parcial provimento ao recurso do reclamante para: (i) deferir o adicional por acúmulo de função no percentual de 20% sobre o salário base da reclamante, com reflexos; (ii) condenar a reclamada ao pagamento em dobro de todos os domingos trabalhados em violação à escala de revezamento quinzenal prevista no art. 386 da CLT, durante todo o período contratual, a serem apurados com base nos cartões de ponto juntados, com reflexos; e dou provimento ao recurso da reclamada para afastar a condenação ao pagamento do ticket alimentação, bem como das multas convencionais. Custas, pela reclamada, em R$ 200,00, arbitradas sob o valor da condenação de R$ 10.000,00. Tudo nos termos da fundamentação. ACÓRDÃO Por tais fundamentos, ACORDAM os Desembargadores da Segunda Turma do Tribunal Regional da Décima Região, conforme certidão de julgamento, em aprovar o relatório, conhecer do recurso ordinário do reclamante e do recurso ordinário da reclamada e, no mérito, dar parcial provimento ao recurso do reclamante para: (i) deferir o adicional por acúmulo de função no percentual de 20% sobre o salário base da reclamante, com reflexos; (ii) condenar a reclamada ao pagamento em dobro de todos os domingos trabalhados em violação à escala de revezamento quinzenal prevista no art. 386 da CLT, durante todo o período contratual, a serem apurados com base nos cartões de ponto juntados, com reflexos; e dar provimento ao recurso da reclamada para afastar a condenação ao pagamento do ticket alimentação, bem como das multas convencionais. Custas, pela reclamada, em R$ 200,00, arbitradas sob o valor da condenação de R$ 10.000,00. Tudo nos termos do voto da Desembargadora Relatora. Ementa aprovada. Brasília - DF, sala de sessões, 09 de julho de 2025. Assinado digitalmente. ELKE DORIS JUST Desembargadora Relatora DECLARAÇÃO DE VOTO BRASILIA/DF, 14 de julho de 2025. FRANCISCA DAS CHAGAS SOUTO , Servidor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- COMERCIAL DE ALIMENTOS CAIQUE LTDA - ME
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Brasiliense Futebol Clube e outros x Brasiliense Futebol Clube e outros
ID: 323808709
Tribunal: TRT10
Órgão: 1ª Turma
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 0001048-57.2023.5.10.0010
Data de Disponibilização:
14/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MARCELO LUIZ AVILA DE BESSA
OAB/DF XXXXXX
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RODRIGO SILVA MENEZES
OAB/GO XXXXXX
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ALESSANDRA TEREZA PAGI CHAVES FONSECA
OAB/DF XXXXXX
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PAULO HENRIQUE SILVA PINHEIRO
OAB/GO XXXXXX
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NATHALIA RODRIGUES CARNEIRO
OAB/DF XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 1ª TURMA Relator: GRIJALBO FERNANDES COUTINHO ROT 0001048-57.2023.5.10.0010 RECORRENTE: EDMAR DA SILVA OLIVEIRA …
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 1ª TURMA Relator: GRIJALBO FERNANDES COUTINHO ROT 0001048-57.2023.5.10.0010 RECORRENTE: EDMAR DA SILVA OLIVEIRA E OUTROS (1) RECORRIDO: EDMAR DA SILVA OLIVEIRA E OUTROS (1) PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO TRT 0001048-57.2023.5.10.0010 ROT - ACÓRDÃO 1ªTURMA RELATOR : DESEMBARGADOR GRIJALBO FERNANDES COUTINHO RECORRENTE: EDMAR DA SILVA OLIVEIRA ADVOGADO: PAULO HENRIQUE SILVA PINHEIRO ADVOGADO: RODRIGO SILVA MENEZES RECORRENTE: BRASILIENSE FUTEBOL CLUBE ADVOGADO: ALESSANDRA TEREZA PAGI CHAVES FONSECA ADVOGADO: MARCELO LUIZ AVILA DE BESSA ADVOGADO: NATHALIA RODRIGUES CARNEIRO RECORRIDOS: OS MESMOS ORIGEM : 10ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA/TO CLASSE ORIGINÁRIA: Ação Trabalhista - Rito Ordinário (JUÍZA RAQUEL GONCALVES MAYNARDE OLIVEIRA) EMENTA 1. UNICIDADE CONTRATUAL. RESCISÃO DE "COMUM ACORDO". NOVA CONTRATAÇÃO. FRAUDE. NULIDADE DA RENÚNCIA A DIREITOS. A Constituição da República admite transação coletiva envolvendo a redução salarial, a compensação de horários e a redução da jornada, além da jornada superior a 06 (seis) horas para os turnos ininterruptos de revezamento (CF, artigo 7º, incisos VI, XIII e XIV). Fora de tais parâmetros, qualquer negociação que possa resultar no rebaixamento do patamar definido por norma constitucional ou legal, estará eivada de vício, sujeita, portanto, à decretação de sua nulidade. A renúncia a direitos decorrentes do pacto laboral e rescisórios, notadamente quando feita individualmente, sem atuação sindical, não é compatível com a Constituição (CRFB, artigos 1º incisos III e IV, e 7º, incisos I, II e XXI; ADCT, art.10, inciso I). Com efeito, é manifestamente nula a renúncia ao direito de perceber salários e consectários durante o período de incapacidade laborativa. Nesse contexto, presume-se que houve vício de vontade, aplicando-se os princípios irrenunciabilidade de direitos e da continuidade da relação emprego. Em síntese, é nula a rescisão contratual, ainda que formalizada como "comum acordo", quando firmada com empregado em condição de vulnerabilidade. O afastamento das atividades do atleta profissional por lesão faz presumir o vício de vontade no ato de ruptura contratual por "comum acordo", configurando renúncia a direitos indisponíveis, especialmente quando celebrado um novo contrato de trabalho em curto espaço de tempo, após a suposta rescisão, o que reforça a caracterização da manobra fraudulenta(art. 9º da CLT). 2. DIREITO AO USO DA IMAGEM. ATLETA PROFISSIONAL. INOBSERVÂNCIA DO LIMITE DE 40% DA REMUNERAÇÃO TOTAL. AUSÊNCIA DE EFETIVA EXPLORAÇÃO DA IMAGEM. FRAUDE. O art. 87-A da Lei nº 9.615/98 prevê condições para o direito ao uso da imagem do atleta e estabelece que o valor correspondente não poderá ultrapassar 40% (quarenta por cento) da remuneração total do profissional. Superado o limite legal e ausente a efetiva exploração da imagem do atleta, o contrato para fins de uso da imagem é manifestamente nulo. Comprovada fraude à legislação trabalhista, os valores recebidos pelo atleta profissional a título direito de imagem integram a remuneração para todos os efeitos legais. 3. MULTAS DOS ARTIGOS 467 E 477 DA CLT. Tendo em vista a ausência de pagamento das verbas rescisórias incontroversas tempestivamente, incidem as multas dos arts. 467 e 477 da CLT. 4. JUSTIÇA GRATUITA. Nada havendo a infirmar a veracidade da declaração de hipossuficiência expendida pelo reclamante, inexistem elementos concretos para o indeferimento, à parte autora, da gratuidade da justiça, que, em sua acepção mais ampla, resta assegurada pelo inc. LXXIV do art. 5.° da Constituição da República "aos que comprovem insuficiência de recursos" e tem suas raízes fincadas na garantia de acesso à Justiça. 5. LEI Nº 14.905-2024. ALTERAÇÃO DOS ARTIGOS 389 E 406 DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA SOBRE OS DÉBITOS TRABALHISTAS. A partir do que restara decidido pelo Supremo Tribunal Federal nos autos da ADC nº 58, em caráter vinculante e com efeitos erga omnes, inclusive, a inusitada e surpreendente solução adotada pelo Tribunal possui validade até a edição de lei nova reguladora da correção monetária e dos juros de mora. Surgindo no cenário, após a apreciação da ADC 58, lei civil que estabelece outros parâmetros relacionados à correção monetária e aos juros de mora sobre dívidas cujos índices respectivos deixaram de ser pactuados contratualmente, os seus preceitos devem ser aplicados também em relação aos débitos trabalhistas, na esteira do pronunciamento do STF naquela ação de controle concentrado. Como mera decorrência, a Lei nº 14.905 de 28 de junho de 2024, que deu nova redação aos artigos 389 e 406 do Código Civil Brasileiro, aplica-se aos débitos trabalhistas. 6. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. REGIME ESPECIAL. EQUIPE DE FUTEBOL PROFISSIONAL. O art. 22, § 6º, da Lei nº 8.212/1991, prevê que a contribuição previdenciária das associações esportivas, especificamente em relação à equipe de futebol profissional, deve corresponder a 5% da receita bruta decorrente dos espetáculos desportivos de que participou. 7. ACIDENTE DE TRABALHO. PRESCRIÇÃO. O termo inicial do prazo prescricional da indenização por danos decorrentes de acidente do trabalho é a data em que o trabalhador teve ciência inequívoca da incapacidade laboral ou do resultado gravoso para a saúde física e/ou mental. Ajuizada a demanda cinco anos depois da ciência inequívoca do resultado do acidente, a pretensão está soterrada pela prescrição. 8. CLÁUSULA COMPENSATÓRIA. À míngua de encerramento do vínculo com o reclamado antes do prazo fixado no contrato, não é devida a cláusula compensatória, conforme decidido na origem. 9. Recurso do reclamado conhecido, em parte, e parcialmente provido. Recurso adesivo do reclamante conhecido e desprovido. I - RELATÓRIO O Juízo da 10ª Vara do Trabalho de Brasília-DF julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na reclamação trabalhista ajuizada por EDMAR DA SILVA OLIVEIRA em face de BRASILIENSE FUTEBOL CLUBE. O reclamado interpõe recurso ordinário quanto às seguintes matérias: direito de imagem; multas dos arts. 467 e 477 da CLT; ausência de unicidade; gratuidade judicial; contribuição previdenciária; juros e correção monetária. O reclamante interpõe recurso adesivo quanto ao acidente de trabalho (prescrição) e à cláusula compensatória. Contrarrazões apresentadas pelas partes. É o relatório. II - VOTO 1- ADMISSIBILIDADE. CONHECIMENTO PARCIAL DO RECURSO DO RECLAMADO Não conheço do recurso patronal quanto à prescrição relativa ao FGTS, à míngua de sucumbência. A prescrição reconhecida na origem não ressalvou o FGTS: "3.2. DA PREJUDICIAL DE MÉRITO - PRESCRIÇÃO Reconhecida, no item anterior, a unicidade contratual, rejeito a prejudicial de prescrição total suscitada pelo Reclamado haja vista que, rescindido o contrato de trabalho do Reclamante em 10/11/2021, o ajuizamento da presente ação em 4/10/2023 observou o biênio constitucional. Contudo, havendo pleitos que abrangem parcelas vencidas a partir de Dezembro/2016, parte delas se encontra soterrada pela prescrição quinquenal (CF, art. 7°, XXIX e Súmula n° 308/TST). Desta forma, tendo em vista que a presente ação apenas foi ajuizada em 4/10/2023 (fls.1), acolho a prejudicial de prescrição parcial e julgo extinto o processo com resolução do mérito (CPC/2015, art. 487, II) com relação às parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio a contar da propositura da presente ação, ou seja, 4/10/2018. Tendo em vista que tanto o acidente de trabalho quanto a consolidação das lesões do Autor e, ainda, a não contratação de Seguro Acidente dizem respeito a fatos ocorridos no período prescrito, são igualmente atingidos pela prescrição ora declarada." Com efeito, os respectivos recolhimentos são devidos durante todo o pacto, observado o prazo prescricional. Preenchidos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço dos recursos interpostos pelas partes quanto aos demais temas. 2- MÉRITO RECURSAL 2.1- RECURSO DO RECLAMADO 2.1.1. UNICIDADE CONTRATUAL. RESCISÃO DE "COMUM ACORDO". NOVA CONTRATAÇÃO. FRAUDE. NULIDADE DA RENÚNCIA A DIREITOS O reclamante, na inicial, alegou que, apesar de formalmente ter tido um contrato rescindido em 02.06.2017 e um novo pacto firmado em 01.11.2017, o vínculo foi, na prática, ininterrupto no período de 01.12.2016 a 10.11.2021. Descreveu que o término formal do primeiro contrato foi fraudulento. Postulou a reconhecimento de um contrato único no período de 01.12.2016 a 10.11.2021. O reclamado, em contestação, negou a existência de um vínculo único. A Magistrada originária da causa deferiu a pretensão exordial e reconheceu a unicidade, sob os seguintes fundamentos: "3.1. DA UNICIDADE CONTRATUAL - RESCISÃO CONTRATUAL DE COMUM ACORDO - ACIDENTE DE TRABALHO - NOVA CONTRATAÇÃO A prova documental colhida nos autos, inclusive o cadastro CNIS do Reclamante juntado por este Juízo, revela que, no interregno em comento, o Reclamante efetivamente firmou 2 contratos de trabalho distintos com o Reclamado: o primeiro de 1/12/2016 a 1/06/2017 e o segundo de 1/11/2017 a 10/11/2021. Tal fato, por si só, não evidencia, como aponta a Reclamada em contestação, qualquer irregularidade, diante da sazonalidade típica dos contratos de trabalho dos atletas profissionais. Isto posto, por ser fato constitutivo do seu direito (CPC/2015, art. 373, I, e CLT, art. 818), ao Reclamante incumbia o ônus da prova de que houve, como alega, irregularidade na rescisão contratual ocorrida em 1/06/2017. O Autor, a meu ver, se desincumbiu satisfatoriamente de sua obrigação. Isto porque, de plano, resulta incontroverso nos autos que o Autor sofreu lesão no ombro enquanto jogava partida a serviço do Reclamado, em Fevereiro/2017, e, ainda, que teria que permanecer afastado de suas atividades profissionais para recuperação. Assim, não se afigura crível que o trabalhador machucado, sem condições de exercer suas atividades tenha firmado documento para rescisão de "comum acordo" de seu contrato de trabalho (fls. 36) em Junho/2017, o que apenas lhe traria prejuízos, já que deixaria de receber salários e, ainda, a possibilidade de percepção de benefício previdenciário, se fosse o caso. A própria preposta do Reclamado, em depoimento pessoa, reconhece que, com a rescisão deixou de custear o tratamento do Autor (minuto 1:45 a 1:55 da gravação). Prova que era intenção da Reclamada apenas se eximir de eventuais obrigações trabalhistas foi a assinatura de "Promessa de Compromisso e Protocolo de Intenções" pelo Reclamado com o Autor logo no dia seguinte à rescisão de seu contrato de trabalho, em 2/06/2017 (fls. 39/41). Por óbvio que durante o interregno medeado entre a "rescisão por comum acordo" e a nova contratação do Reclamante não houve prestação de serviços pelo Autor exatamente porque o Reclamante estava impossibilitado de desempenhar suas atividades. Assim, não emergindo nos autos qualquer justificativa plausível para que o trabalhador lesionado pretendesse a rescisão amigável de seu contrato de trabalho, presume-se que houve vício de vontade, aplicando-se os princípios da hipossuficiência do trabalhador e, ainda, da continuidade da relação emprego que são basilares ao Direito do Trabalho. Destaque-se que assim que o Reclamante teve condições de retornar ao trabalho foi firmado o novo contrato com o Reclamado, datado de 1/11/2017. Diante de todo o exposto, flagrante o vício de vontade do Reclamante na assinatura da rescisão de comum acordo datada de 1/06/2017, defiro o pleito do Autor para reconhecer a existência de um único contrato de trabalho com o Reclamado de 1/12/2016 a 10/11/2021. Como consequência, condeno o Reclamado a proceder à retificação da CTPS do Reclamante para fazer constar um único contrato de trabalho durante o período de 1/12/2016 a 10/11/2021, sob pena de fazê-lo a Secretaria desta Vara, sem prejuízo das penalidades administrativas cabíveis (CLT, arts. 39, §1º, e 54)." Em recurso, a parte reclamada pugna pela reforma da sentença. Argumenta que não cabe a aplicação das regras gerais da CLT quanto à unicidade contratual, porquanto há legislação específica no tocante ao trabalho do atleta profissional. Sustenta, ainda a validade da primeira rescisão contratual ocorrida em 02.06.2017. Afirma que a extinção do primeiro contrato não uma decorreu de uma rescisão por comum acordo entre as partes, modalidade que pressupõe o consenso e a vontade mútua de encerrar o vínculo. Refuta a existência de vício de vontade. À análise. No caso concreto, conforme fundamentação esposada na origem, é incontroverso que o reclamante sofreu lesão no ombro enquanto jogava partida pelo reclamado, em fevereiro/2017, e, ainda, que teria que permanecer afastado de suas atividades profissionais para recuperação. Assim, considerando o que ordinariamente acontece, o trabalhador, atleta profissional de futebol, lesionado e sem condição de exercer sua atividade, não aceitaria rescindir o contrato "de comum acordo" para lhe gerar apenas prejuízos, "já que deixaria de receber salários e, ainda, a possibilidade de percepção de benefício previdenciário, se fosse o caso." Vale ressaltar que a preposta reconheceu que, com a rescisão, o reclamado deixou de custear o tratamento do reclamante. Consoante bem apontado na origem, qual seria o motivo de um trabalhador lesionado, sem condições de exercer suas atividades, de assinar um "acordo" renunciando a seus direitos e, no dia seguinte, pactuar uma "Promessa de Compromisso e Protocolo de Intenções" (fls. 39/41)? Ora, o pacto com promessa de recontratação realizado no dia seguinte à ruptura, com efeitos futuros para cerca de seis meses depois (01.12.2017), revela a intenção patronal de excluir de seus quadros o atleta com lesão para uma recontratação após a recuperação da sua capacidade. Reitera-se que a tal "Promessa" foi assinada no dia seguinte à ruptura contratual. A Constituição da República admite transação coletiva envolvendo a redução salarial, a compensação de horários e a redução da jornada, além da jornada superior a 06 (seis) horas para os turnos ininterruptos de revezamento (CF, artigo 7º, incisos VI, XIII e XIV). Fora de tais parâmetros, qualquer negociação que possa resultar no rebaixamento do patamar definido por norma constitucional ou legal, estará eivada de vício, sujeita, portanto, à decretação de sua nulidade. A renúncia a direitos decorrentes do pacto laboral e rescisórios, notadamente quando feitas individualmente, sem atuação sindical, não são compatíveis com a Constituição (CRFB, artigos 1º incisos III e IV, e 7º, incisos I, II e XXI; ADCT, art.10, inciso I). Nos termos da sentença originária, "durante o interregno entre a "rescisão por comum acordo" e a nova contratação do Reclamante não houve prestação de serviços pelo Autor exatamente porque o reclamante estava impossibilitado de desempenhar suas atividades". Com efeito, é manifestamente nula a renúncia aos direitos de perceber salários e consectários durante o período de incapacidade laborativa. Nesse contexto, presume-se que houve vício de vontade, aplicando-se os princípios irrenunciabilidade de direitos e da continuidade da relação emprego. Reforça esse entendimento o fato de que o reclamante, assim que teve condições de retornar ao trabalho, firmou o novo contrato com o reclamado, conforme promessa já mencionada, a partir de 01.11.2017. Evidente, portanto, o vício de vontade na assinatura da denominada "rescisão por comum acordo" em 01.06.2017. Em síntese, é nula a rescisão contratual, ainda que formalizada como "comum acordo", quando firmada com empregado em condição de vulnerabilidade. O afastamento das atividades do atleta profissional por lesão faz presumir o vício de vontade no ato de ruptura contratual por "comum acordo", configurando renúncia a direitos indisponíveis, notadamente quando celebrado um novo contrato de trabalho em curto espaço de tempo, após a suposta rescisão, o que reforça a caracterização da manobra fraudulenta(art. 9º da CLT). Portanto, seja considerando a CLT, seja considerando a lei específica mencionada no recurso, a fraude à lei imperativa enseja o reconhecimento de nulidade, revelando-se imperiosa a declaração de unicidade contratual, consoante bem fundamentado pela Magistrada da instância originária da causa. Nada a prover. 2.1.2. DIREITO DE IMAGEM. NATUREZA JURÍDICA. PRESCRIÇÃO. FÉRIAS Na inicial o reclamante descreveu ter pactuado o recebimento remuneração mensal no importe de "R$ 7.000,00 (sete mil reais), de 01/12/2016 a 30/10/2017; R$ 8.000,00 (oito mil reais), de 01/11/2017 a 30/11/2018; R$ 9.000,00 (nove mil reais), de 01/12/2018 a 30/11/2020; e de R$ 10.800,00 (dez mil e oitocentos reais), de 01/12/2020 a 10/11/2021". Descreveu que na CTPS era registrado tão somente R$ 2.000,00 (dois mil reais) e o restante pago a título de direito de imagem. Invocou a tese de fraude no tocante ao pagamento a título de imagem, tendo em vista a inobservância dos requisitos legais e a ausência de efetiva utilização da imagem. Requereu o reconhecimento da natureza salarial da parcela e o pagamento dos consectários decorrentes. O reclamado refutou a natureza salarial do direito de imagem. Defendeu a tese de pactuação de contrato autônomo, desvinculado da remuneração, conforme preceitua o artigo 87-A da Lei nº 9.615/98. A Magistrada originária deferiu a pretensão exordial, sob os seguintes fundamentos: "3.3. DA NATUREZA JURÍDICA DOS VALORES PERCEBIDOS PELO AUTOR A TÍTULO DE DIREITO DE IMAGEM Pretende o Reclamante a integração à sua remuneração dos valores recebidos a título de Direito de Imagem sob o argumento de que tinham natureza jurídica de salário e apenas foram pagos desta forma para evitar os reflexos trabalhistas. O Reclamado, por sua vez, assevera que a assinatura deste tipo de contrato é praxe no caso de atletas profissionais e se dá em contrapartida da utilização pelo time da imagem do jogador, não ostentando natureza de salário. Aduz que tal contrato encontra inclusive previsão na Lei Pelé. Por ser fato constitutivo do seu direito (CPC/2015, art. 373, I, e CLT, art. 818), ao Reclamante incumbia o ônus da prova de suas alegações. Não há dúvidas de que o art. 87-A da Lei nº 9.615/98 trouxe uma presunção iuris tantum do caráter não salarial da parcela paga ao atleta, por meio de contrato civil, a título de direito de imagem, sendo certo que, a partir da edição da Lei nº 13.155/2015 esta realidade ficou restrita a valores que fosse inferiores 40% da remuneração total paga ao atleta. No mesmo sentido, é a norma contida no art. 45 do Decreto nº 7.984/2013, que regulamentou a matéria, in verbis: "Art. 45. O direito ao uso da imagem do atleta, disposto no art. 87-A da Lei nº 9.615, de 1998, pode ser por ele cedido ou explorado, por ajuste contratual de natureza civil e com fixação de direitos, deveres e condições inconfundíveis com o contrato especial de trabalho desportivo. §1º O ajuste de natureza civil referente ao uso da imagem do atleta não substitui o vínculo trabalhista entre ele e a entidade de prática desportiva e não depende de registro em entidade de administração do desporto. §2º Serão nulos de pleno direito os atos praticados através de contrato civil de cessão da imagem com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar as garantias e direitos trabalhistas do atleta." Isto posto, importa aferir se o Reclamante recebia os valores pagos a título de direito de imagem efetivamente em razão da exploração de sua imagem pelo clube ou não, a fim de aferir a real natureza jurídica da parcela em comento. No caso em tela, embora o Reclamado tenha asseverado que utilizou a imagem do jogador para promoção do time em redes sociais, em eventos e em transmissões televisivas, não trouxe aos autos qualquer prova deste uso. Ou seja, desde logo se verifica que o fato gerador do pagamento da parcela denominada de direito de imagem não se vinculava à efetiva utilização da imagem do Reclamante, o que desconstitui a presunção trazida pelo art. 87-A da Lei nº 9.615/98. Ademais, a contraprestação foi estabelecida em valor fixo de R$ 5.000,00 mensais (até 30/04/2018), R$ 6.000,00 (de 1/05/2018 a 30/11/2018), de R$ 7.000,00 (de 1/12/2018 a 30/11/2020) e R$ 8.800,00 (no período de 1/12/2020 em diante) independentemente de haver maior ou menor exposição da imagem do Reclamante em um determinado mês, termos estes que deixam evidente a natureza de parcela salarial, mascarada sob o título de direito de imagem, mormente quando se constata que o direito à imagem corresponde a mais que 3 vezes o valor de salário pago ao Autor. No mesmo sentido é o seguinte precedente deste eg. Tribunal Regional: "ATLETA PROFISSIONAL. DIREITO DE IMAGEM. NATUREZA JURÍDICA. INTEGRAÇÃO. Hipótese dos autos em que o pagamento da parcela 'direito de imagem' não foi atrelada à veiculação dos jogos pela televisão, tampouco aventada condição para o recebimento da parcela, mas foi estabelecida em valor fixo e em termos que não deixam dúvidas quanto ao compromisso de pagamento regular. Ostenta, portanto, natureza salarial e deve compor a remuneração." (RO nº 01904-2010-103-10-00-5, 1ª Turma, Des. Flávia Simões Falcão, DEJT 24/08/2012) Destarte, defiro o pleito do Reclamante de reconhecimento da natureza salarial dos valores que lhe eram pagos mensalmente a título de direito de imagem (R$ 5.000,00 mensais - até 30/04/2018 - , R$ 6.000,00 - de 1/05/2018 a 30/11/2018 -, R$ 7.000,00 - de 1/12/2018 a 30/11/2020 - e R$ 8.800,00 - no período de 1/12/2020 em diante), devendo integrar a remuneração do obreiro para todos os fins. Como consequência, defiro o pleito do Reclamante de condenação do Reclamado ao pagamento dos reflexos desta parcela em 13ºs salários, férias acrescidas de 1/3 e FGTS acrescido da multa de 40% relativamente a todo o vínculo. O Reclamado deverá, ainda, proceder à retificação da CTPS do Reclamante para fazer constar como salário mensal do obreiro a evolução salarial acima reconhecida (acrescida do salário-base de R$ 2.000,00), já considerando a integração do direito de imagem, sob pena de fazê-lo a Secretaria desta Vara, sem prejuízo das penalidades administrativas cabíveis (CLT, arts. 39, §1°, e 54). Da mesma forma, incontroverso que o Reclamado não promoveu o pagamento das verbas rescisórias decorrentes da rescisão imotivada do contrato de trabalho do Reclamante ocorrida em 10/11/2021, defiro o pleito do Reclamante de condenação do Reclamado ao pagamento das seguintes parcelas, observados os limites do pedido (CPC/2015, arts. 141 e 492) e a prescrição acima declarada: - saldo de salário de 10 dias de Novembro/2021; - 2/12 de 13º salário proporcional/2018; - 13ºs salários integrais 2019 e 2020; - 11/12 de 13º salário proporcional/2021; - férias vencidas 2017/2018, em dobro, acrescidas de 1/3; - férias vencidas 2018/2019, em dobro, acrescidas de 1/3; - férias vencidas 2019/2020, de forma simples, acrescidas de 1/3; - 11/12 de férias proporcionais 2020/2021, acrescidas de 1/3; - FGTS de todo o vínculo, deduzida a importância já depositada; e - multa de 40% sobre a integralidade do FGTS. Uma vez que a presente ação foi ajuizada após a entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017, que desobriga o empregador a efetuar a entrega de guias TRCT, deverá o Reclamado proceder a comunicação da dispensa imotivada do obreiro junto aos Órgãos Competentes (CLT, art. 477, caput), a fim de propiciar ao saque pelo Autor do saldo de FGTS e dos valores de depósito ora determinados, sob pena de expedição de alvará e/ou indenização equivalente. A fim de se evitar o enriquecimento sem causa do Autor, deduza-se do montante a ser apurado em seu favor a importância de R$ 14.578,86 já quitada pelo Reclamado por meio de depósito judicial nos presentes autos. Da mesma forma, comprovado o pagamento de R$ 2.161,01 ao Reclamante quando da rescisão realizada em 1/06/2017 (TRCT de fls. 222/223), proceda-se igualmente à dedução de tais valores." Em recurso, o reclamado aponta que a imagem do atleta era efetivamente utilizada, inclusive por meio de plataformas digitais. Subsidiariamente, aduz que deve ser considerada salarial tão somente o importe que exceder o limite de 40% previsto no art. 87-A da Lei nº 9.615/98. À análise. O art. 87-A da Lei nº 9.615/98 prevê condições para o direito ao uso da imagem do atleta e estabelece que o valor correspondente não poderá ultrapassar 40% (quarenta por cento) da remuneração total do profissional: "Art. 87-A. O direito ao uso da imagem do atleta pode ser por ele cedido ou explorado, mediante ajuste contratual de natureza civil e com fixação de direitos, deveres e condições inconfundíveis com o contrato especial de trabalho desportivo. (Incluído pela Lei nº 12.395, de 2011). Parágrafo único. Quando houver, por parte do atleta, a cessão de direitos ao uso de sua imagem para a entidade de prática desportiva detentora do contrato especial de trabalho desportivo, o valor correspondente ao uso da imagem não poderá ultrapassar 40% (quarenta por cento) da remuneração total paga ao atleta, composta pela soma do salário e dos valores pagos pelo direito ao uso da imagem. (Incluído pela Lei nº 13.155, de 2015)" (grifo acrescido) No caso concreto, é incontroverso o ajuste com previsão de pagamento de direito de imagem de "R$ 5.000,00 mensais - até 30/04/2018 - , R$ 6.000,00 - de 1/05/2018 a 30/11/2018 -, R$ 7.000,00 - de 1/12/2018 a 30/11/2020 - e R$ 8.800,00 - no período de 1/12/2020 em diante)". Com efeito, o limite máximo de 40% da remuneração foi superado. Logo, o contrato para fins de uso de imagem é manifestamente nulo. Não cabe ao julgador substituir as cláusulas contratuais e "ajustar" o contrato ao limite máximo previsto em lei. Em outras palavras, comprovada fraude à legislação trabalhista, os valores recebidos pelo atleta profissional a esse título integram a remuneração para todos os efeitos legais. Outrossim, não restou evidenciada a efetiva utilização da imagem do reclamante. Os recortes trazidos pelo reclamado limitam-se a poucas publicações em redes sociais e à matéria jornalista. Não obstante a tese de defesa, não há prova de monetização específica por postagens em plataformas digitais em relação ao reclamante. Além disso, a menção a poucas reportagens na imprensa (fls. 355/358) também não caracteriza a efetiva exploração da imagem do atleta. Com efeito, restou demonstrada a fraude com o escopo de sonegar direitos trabalhistas, reforçada pelo pagamento mensal em valor fixo, sem qualquer vinculação à exploração da imagem do atleta. A jurisprudência do Tribunal Superior do trabalho considera fraude à lei trabalhista o pagamento de direito de imagem, de forma habitual e desvinculada da exploração da imagem do atleta profissional, em quantia muito superior à remuneração total ajustada entre as partes: "AGRAVO EMBARGOS. CONHECIMENTO. DISSENSO JURISPRUDENCIAL EVIDENCIADO. SÚMULA N.º 296, I, DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. ATLETA PROFISSIONAL. DIREITO DE IMAGEM. ARTIGO 87-A DA LEI N.º 9.615/1998. NATUREZA JURÍDICA. 1 . Caso concreto em que a Turma do TST concluiu que, em regra, por força do que dispõe o artigo 87-A da Lei n.o 9.615/1998, os valores recebidos em contraprestação à cessão do direito de imagem do atleta profissional não consubstanciam salário, pois decorrem de ajuste contratual de natureza civil entre o atleta e o clube desportivo empregador. Asseverou, ainda, o douto Órgão fracionário, que, na hipótese vertente dos autos, não transmuda a natureza civil do ajuste entabulado entre as partes a ausência de demonstração da exploração efetiva da imagem do atleta e o montante dos valores percebidos a esse título, com habitualidade, muito superiores ao salário do autor. Forte nessas razões, a egrégia Turma concluiu pela inocorrência de fraude à legislação trabalhista, nos termos do artigo 9º da CLT. 2 . Prospera a pretensão obreira, no sentido de demonstrar dissenso jurisprudencial, em sede de Embargos à SBDI-1, mediante a transcrição de arestos paradigmas oriundos de outra Turma desta Corte superior, segundo os quais o pagamento de valores auferidos a título de cessão do direito de imagem, de forma habitual e desvinculada da exposição da imagem do atleta profissional , em quantia muito superior à remuneração total ajustada entre as partes , configura fraude à legislação trabalhista , à luz do mesmo dispositivo legal invocado pela Turma de origem, qual seja, o artigo 9º da CLT . Cuidam-se, assim, de " teses diversas na interpretação de um mesmo dispositivo legal, embora idênticos os fatos que as ensejaram ", consoante a diretriz da Súmula n.º 296, I, do TST. 3 . Admissíveis os Embargos, por dissenso jurisprudencial, merece reforma a decisão monocrática obstativa do seu prosseguimento. 4 . Agravo a que se dá provimento. EMBARGOS ATLETA PROFISSIONAL. DIREITO DE IMAGEM. ARTIGO 87-A DA LEI N.º 9.615/1998. NATUREZA JURÍDICA. 1 . Prevalece, nesta Corte superior, entendimento segundo o qual, por força do que dispõe a norma do artigo 87-A da Lei n.º 9.615/1998, em princípio , não ostentam natureza jurídica salarial os valores auferidos pelo atleta profissional a título de cessão do direito de imagem. Têm-se ressalvado , contudo, da aplicação do artigo 87-A da Lei n.º 9.615/1998 as hipóteses em que efetivamente demonstrado, nas instâncias ordinárias, o desvirtuamento do contrato de natureza civil entabulado originalmente entre o atleta e a agremiação desportiva , a atrair a aplicação do artigo 9º da CLT. Em tais casos, segundo a jurisprudência iterativa e notória desta Corte superior, uma vez comprovada fraude à legislação trabalhista, os valores auferidos pelo atleta profissional a esse título integram a remuneração para todos os efeitos legais . Precedentes da SBDI-1 e de Turmas do TST. 2 . A desvinculação do pagamento efetuado pela agremiação desportiva a título de cessão do direito imaterial do atleta profissional da efetiva exploração de sua imagem desnatura o objeto do contrato civil celebrado sob o pálio do artigo 87-A da Lei n.º 9.615/1998 , atraindo, assim, o reconhecimento da natureza salarial das parcelas recebidas sob essa rubrica, por aplicação da norma insculpida no artigo 9º da CLT. A esse respeito, a SBDI-1, em acórdão recente , decidiu que, " inexistindo correspondência entre o uso da imagem do reclamante e os valores mensalmente pagos , mantém-se a conclusão do TRT (...) e da Turma quanto à fraude, uma vez que evidenciado que o pagamento tem como objetivo, na realidade, desvirtuar a aplicação da legislação trabalhista . Recurso de embargos conhecido e desprovido " (E-RR-358-48.2014.5.12.0055, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT de 22/5/2020; os destaques foram acrescidos). 3. Conquanto não se aplique aos contratos de trabalho desportivos firmados anteriormente à sua vigência (caso dos autos) a norma prevista no parágrafo único do artigo 87-A da Lei n.º 9.615/1998 - que fixou um teto para o percentual pago a título de cessão do direito de imagem, tendo por base a remuneração total devida ao atleta profissional (40%) - , é possível extrair da alteração legislativa o claro intuito de, entre outras finalidades, emprestar maior transparência à contratação e coibir práticas fraudulentas perpetradas em violação à legislação trabalhista e previdenciária no âmbito desportivo . É o que deflui da exposição de motivos da Medida Provisória n.º 671/2015, posteriormente convertida na Lei n.º 13.155/2015, que introduziu o parágrafo único ao artigo 87-A da Lei n.º 9.615/1998 (os destaques foram acrescidos): "(...) Dentre as medidas que integram esse projeto, destacam-se a obrigação de apresentação regular de demonstrações financeiras contábeis, a regularidade de pagamento das obrigações tributárias, previdenciárias, trabalhistas e contratuais com atletas e demais funcionários, inclusive quanto ao direito de imagem , assim como o estabelecimento de um limite máximo com folha de pagamento e direitos de imagem de atletas profissionais de futebol não superior a setenta por cento da receita bruta anual ." Daí se conclui que a introdução do parágrafo único ao artigo 87-A da Lei n.º 9.615/1998, por iniciativa do legislador ordinário, apenas explicitou, de forma objetiva, vedação já existente, impeditiva do desvirtuamento do instituto previsto na cabeça do referido preceito legal, decorrente das disposições do artigo 9º da CLT. 4. Embargos interpostos pelo reclamante de que se conhece, por divergência jurisprudencial, e a que se dá provimento para restabelecer o acórdão prolatado pelo Tribunal Regional de origem" (E-ED-RR-1442-94.2014.5.09.0014, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Lelio Bentes Correa, DEJT 25/03/2022)." (grifos acrescidos) Escorreita, portanto, a sentença originária. Vale ressaltar que as pretensões anteriores a 04.10.2018 foram declaradas prescritas. Ao contrário da tese recursal, o período de férias de 2017/2018 não está alcançado pela prescrição, tendo em vista que a prescrição das férias inicia-se a partir do final do período concessivo (CLT, art 137, §1º). Nego provimento ao apelo. 2.1.3. MULTAS DOS ARTIGOS 467 E 477 DA CLT O Juízo originário deferiu o pedido de pagamento das multas dos artigos 467 e 477 da CLT, nos seguintes termos: "3.4. DO ACRÉSCIMO DO ART. 467 E DA MULTA DO ART. 477, §8º, DA CLT Tendo em vista que sequer o pagamento das verbas rescisórias incontroversas foi feito no prazo legal, fato reconhecido pelo Reclamado em contestação, defiro o pleito do Reclamante de condenação do Reclamado ao pagamento da multa prevista no art. 477, §8º, da CLT e do acréscimo do art. 467 da CLT, sendo este último incidente sobre saldo de salário, 13ºs salários e férias acrescidas de 1/3." Em recurso, o reclamado aduz que pagou as verbas rescisórias incontroversas tempestivamente. No entanto, o pagamento das verbas incontroversas ocorreu após o prazo legal, conforme reconhecido na defesa. Reitero que a defesa reconheceu como devida a multa do art. 477 da CLT: "Reconhece a empresa ser devido ao Autor o pagamento do 13º salário proporcional de 2023 e as férias proporcionais, acrescidas de 1/3 e, ainda, a multa prevista no§ 8º, do artigo 477, da CLT, em face da mora no pagamento da integralidade das verbas rescisórias". Logo, as razões recursais destoam da própria tese de defesa. Além disso, o depósito judicial de R$ 14.578,86, conforme discriminado na defesa (fl. 204), nem de longe alcança todas as verbas rescisórias devidas e detalhadas na sentença. Nego provimento. 2.1.4. BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA No apelo, o reclamado impugna a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita à parte autora. Dispõe o art. 790, §§ 3º e 4º da CLT: "Art. 790 [...] § 3o É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. § 4o O benefício da justiça gratuita será concedido à parte que comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo." Depreende-se do novo texto legal (§§ 3º e 4º do Art. 790 da CLT) que, para aqueles que percebem salário igual ou inferior a quarenta por cento do limite do RGPS, há presunção de serem beneficiários da Justiça gratuita e, de outro lado, para aqueles cujo salário ultrapassa tal teto, resta mantida a possibilidade de comprovação da hipossuficiência, podendo esta ser firmada por mera declaração, nos termos da Lei n.º 7.115/1983, que confere à simples declaração presunção de veracidade, para fins de comprovação do estado de pobreza. Eis a regra específica em sua literalidade: "Art. . 1º - A declaração destinada a fazer prova de vida, residência, pobreza, dependência econômica, homonímia ou bons antecedentes, quando firmada pelo próprio interessado ou por procurador bastante, e sob as penas da Lei, presume-se verdadeira. Parágrafo único - O dispositivo neste artigo não se aplica para fins de prova em processo penal. Art. . 2º - Se comprovadamente falsa a declaração, sujeitar-se-á o declarante às sanções civis, administrativas e criminais previstas na legislação aplicável. Art. . 3º - A declaração mencionará expressamente a responsabilidade do declarante. Art. . 4º - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. . 5º - Revogam-se as disposições em contrário." Ademais, o estado de hipossuficiência não deve ser medido pelo simples valor do salário, mas pela potencialidade de eventual pagamento das despesas processuais, somado aos gastos particulares, comprometer o sustento próprio e da família. Nesse sentido, o informativo nº 151, do TST: Justiça gratuita. Declaração de pobreza. Presunção relativa de veracidade não elidida pelo fato de o reclamante ter recebido verbas rescisórias e de indenização em decorrência de adesão a plano de demissão voluntária. O fato de o reclamante ter recebido quantia vultosa (R$ 1.358.507,65) decorrente de verbas rescisórias e de indenização oriunda de adesão a plano de demissão voluntária não é suficiente para elidir a presunção de veracidade da declaração de pobreza por ele firmada. Sob esse fundamento, a SBDI-I, maioria, conheceu dos embargos por contrariedade à Orientação Jurisprudencial nº 304 da SBDI-I, e, no mérito, deu-lhes provimento para restabelecer a sentença que deferira os benefícios da justiça gratuita. Vencidos os Ministros João Oreste Dalazen, Renato de Lacerda Paiva e Alexandre Agra Belmonte. TST-ERR-11237-87.2014.5.18.0010, SBDI-I, rel. Min. Hugo Carlos Scheuermann, 2.2.2017. Informativo TST nº 151. Não se olvide que as benesses da Justiça Gratuita têm previsão constitucional, segundo o qual "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos" (CF, art. 5º, LXXIV), medida que concretiza o direito de acesso à Justiça. Seguindo esse norte, o Código de Processo Civil de 2015 disciplina, em seu art. 98, § 1º, a gratuidade de justiça, deixando expressa tanto a inclusão de isenção do pagamento de custas judiciais, como um dos benefícios decorrentes de tal benesse, quanto a possibilidade de comprovação da hipossuficiência por simples declaração, cabendo à parte contrária o ônus de demonstrar que o requerente não preenche os requisitos para o deferimento do instituto (CPC, art. 99, §3º c/c CLT, art. 769). O que se depreende disso é a disparidade causada pelo legislador ordinário no tratamento do beneficiário de tal Gratuidade que litiga na Justiça Comum frente àquele litigante na Justiça do Trabalho. Ora, o Direito do Trabalho teve origem na necessidade de proteção ao empregado hipossuficiente, sendo esse princípio o próprio esteio e razão de ser desta Justiça Especializada. Tornou-se necessário, portanto, trilhar uma interpretação constitucionalmente adequada dos novos preceitos trazidos pela Lei n.º 13.467/2017, com um olhar atento a todo o ordenamento jurídico. Em síntese, independentemente dos parâmetros fixados pela reforma, segue plenamente possível a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita com base na simples declaração. No caso, a parte reclamante juntou declaração de hipossuficiência. Portanto, nada havendo a infirmar a veracidade da declaração de hipossuficiência expendida pelo reclamante, inexistem elementos concretos para o indeferimento, à parte autora, da gratuidade da justiça, que, em sua acepção mais ampla, resta assegurada pelo inc. LXXIV do art. 5.° da Constituição da República "aos que comprovem insuficiência de recursos" e tem suas raízes fincadas na garantia de acesso à Justiça. Nada a prover. 2.1.5. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. REGIME ESPECIAL. EQUIPE DE FUTEBOL PROFISSIONAL Em recurso, o reclamado renova a tese de incidência do regime especial previsto para as equipes de futebol profissional, em relação aos recolhimentos previdenciários. O art. 22, § 6º, da Lei nº 8.212/1991, prevê que a contribuição previdenciária das associações esportivas, especificamente em relação à equipe de futebol profissional, deve corresponder a 5% da receita bruta decorrente dos espetáculos desportivos de que participou. Nesse sentido a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho: "I - AGRAVO DE INSTRUMENTO . RECURSO DE REVISTA . RECLAMADO. LEI Nº 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA . CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. COTA PATRONAL. REGIME ESPECIAL. EQUIPE DE FUTEBOL PROFISSIONAL. 1 - Deve ser reconhecida a transcendência jurídica quando se mostra aconselhável o exame mais detido da controvérsia devido às peculiaridades do caso concreto. O enfoque exegético da aferição dos indicadores de transcendência em princípio deve ser positivo, especialmente nos casos de alguma complexidade, em que se torna aconselhável o debate mais aprofundado da matéria. 2 - Aconselhável o provimento do agravo de instrumento, para determinar o processamento do recurso de revista, em razão da provável violação do art. 22, § 6º, da Lei n. 8212/1991. 3 - Agravo de instrumento a que se dá provimento . II - RECURSO DE REVISTA. RECLAMADO. LEI Nº 13.467/2017. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. COTA PATRONAL. REGIME ESPECIAL. EQUIPE DE FUTEBOL PROFISSIONAL. 1 - Interposto o recurso de revista na vigência da Lei n. 13.015/2014, consideram-se atendidas as exigências do artigo 896, § 1º-A e incisos, da CLT. 2 - A controvérsia cinge-se à aplicação ou não do regime especial de contribuição previdenciária da associação desportiva que mantém equipe de futebol profissional, previsto no art. 22, § 6º, da Lei n. 8.212/1991, à hipótese de valores reconhecidos em juízo, por meio de sentença condenatória. 3 - O art. 22, § 6º, da Lei n. 8.212/1991, prevê regime de recolhimento previdenciário especial das associações desportivas em relação à equipe de futebol profissional, de modo que sua contribuição previdenciária deve corresponder a 5% da receita bruta decorrente dos espetáculos desportivos de que participou. 4 - Recurso de revista a que se dá provimento " (RR-20093-14.2020.5.04.0012, 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT 15/09/2023).(grifo acrescido) Dou provimento ao recurso do reclamado para esclarecer que, em relação à contribuição previdenciária patronal, incide o regime especial previsto no §6º do art. 22, da Lei 8.212/91. 2.1.6. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA APLICÁVEIS SOBRE OS DÉBITOS TRABALHISTAS. SUPERVENIÊNCIA DE SOLUÇÃO LEGISLATIVA APÓS O DECIDIDO PELO STF NOS AUTOS DA ADC NÚMERO 58. LEI NÚMERO 14.905/2024 Sobre a aplicação da atualização monetária e dos juros de mora sobre o débito trabalhista, o Juízo de origem assim decidiu a controvérsia: "(...)Sobre as parcelas deferidas, incidem juros, na forma do art. 883 da CLT, e Súmula nº 200/TST. Correção monetária, na forma do art. 883 da CLT (juros incidentes a partir da data do ajuizamento da demanda), segundo os índices oficiais à época da execução, nos moldes das tabelas oficiais expedidas pelo col. CSJT. O Reclamado deverá, ainda, recolher as contribuições previdenciárias e fiscais incidentes sobre as parcelas de natureza salarial, na forma dos arts. 46 da Lei nº 8.541/92, 43 da Lei nº 8.620/93, 28 da Lei nº 10.833/03 e 198 do Decreto nº 3.048/99, da Súmula nº 368 do C. TST e dos Provimentos TST/CG nºs 02/1993 e 03/2005. Em liquidação, observar a IN 1500/2014 RFB e alterações posteriores, exceto quanto à inclusão dos juros de mora na base de cálculo do Imposto de Renda Pessoa Física, bem como trazer aos autos o comprovante de recolhimento das parcelas relativas ao período do vínculo empregatício ora reconhecido, sob pena de execução." (...). Em seu recurso ordinário, o reclamado busca a reforma da sentença "para seja determinada a aplicação do IPCA-E até o ajuizamento da ação e, a partir da citação, a taxa SELIC (este último que já engloba juros), para cálculo das parcelas deferidas na presente ação, caso assim, mantidas". No caso concreto, é necessário complementar a prestação jurisdicional acerca do tema. Ao apreciar o pedido contido na ADC 58, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a fórmula ali adotada, quanto à aplicação de atualização monetária e dos juros de mora sobre os débitos trabalhistas, seria ´válida até a superveniência de lei cuidando novamente dos dois institutos, conforme se verifica do resumo do deliberado pelo STF "Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou parcialmente procedente a ação, para conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 879, § 7º, e ao art. 899, § 4º, da CLT, na redação dada pela Lei 13.467 de 2017, no sentido de considerar que à atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial e à correção dos depósitos recursais em contas judiciais na Justiça do Trabalho deverão ser aplicados, até que sobrevenha solução legislativa, os mesmos índices de correção monetária e de juros que vigentes para as condenações cíveis em geral, quais sejam a incidência do IPCA-E na fase pré-judicial e, a partir da citação, a incidência da taxa SELIC (art. 406 do Código Civil), nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio. Por fim, por maioria, modulou os efeitos da decisão, ao entendimento de que (i) são reputados válidos e não ensejarão qualquer rediscussão (na ação em curso ou em nova demanda, incluindo ação rescisória) todos os pagamentos realizados utilizando a TR (IPCA-E ou qualquer outro índice), no tempo e modo oportunos (de forma extrajudicial ou judicial, inclusive depósitos judiciais) e os juros de mora de 1% ao mês, assim como devem ser mantidas e executadas as sentenças transitadas em julgado que expressamente adotaram, na sua fundamentação ou no dispositivo, a TR (ou o IPCA-E) e os juros de mora de 1% ao mês; (ii) os processos em curso que estejam sobrestados na fase de conhecimento (independentemente de estarem com ou sem sentença, inclusive na fase recursal) devem ter aplicação, de forma retroativa, da taxa Selic (juros e correção monetária), sob pena de alegação futura de inexigibilidade de título judicial fundado em interpretação contrária ao posicionamento do STF (art. 525, §§ 12 e 14, ou art. 535, §§ 5º e 7º, do CPC) e (iii) igualmente, ao acórdão formalizado pelo Supremo sobre a questão dever-se-á aplicar eficácia erga omnes e efeito vinculante, no sentido de atingir aqueles feitos já transitados em julgado desde que sem qualquer manifestação expressa quanto aos índices de correção monetária e taxa de juros (omissão expressa ou simples consideração de seguir os critérios legais), vencidos os Ministros Alexandre de Moraes e Marco Aurélio, que não modulavam os efeitos da decisão. Impedido o Ministro Luiz Fux (Presidente). Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber (Vice-Presidente). Plenário, 18.12.2020 (Sessão realizada por videoconferência - Resolução 672/2020/STF)". A Ementa número 5 daquele julgado(ADC 58) tem o seguinte conteúdo: "5. Confere-se interpretação conforme à Constituição ao art. 879, §7º, e ao art. 899, §4º, da CLT, na redação dada pela Lei 13.467, de 2017, definindo-se que, até que sobrevenha solução legislativa, deverão ser aplicados à atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial e à correção dos depósitos recursais em contas judiciais na Justiça do Trabalho os mesmos índices de correção monetária e de juros vigentes para as hipóteses de condenações cíveis em geral (art. 406 do Código Civil), à exceção das dívidas da Fazenda Pública que possui regramento específico (art. 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009), com a exegese conferida por esta Corte na ADI 4.357, ADI 4.425, ADI 5.348 e no RE 870.947-RG (tema 810)." Toda a tônica do voto do relator da ADC número 58, ministro Gilmar Mendes, ao criar inusitada fórmula de incidência de correção monetária e juros de mora sobre os débitos trabalhistas, esteve fundada em alegado tratamento isonômico, também denominado de "integridade sistêmica do plexo normativo infraconstitucional", com as dívidas civis objeto de controvérsia perante à Justiça Comum, conforme trechos a seguir destacados: "Em termos bastante objetivos: não se pode, a pretexto de corrigir uma inconstitucionalidade, incorrer-se em outra. Valendo-se da técnica de interpretação conforme à Constituição, a proposta que trago à colação é a de que, uma vez afastada a validade da TR, seja utilizado, na Justiça Trabalhista, o mesmo critério de juros e correção monetária utilizado nas condenações cíveis em geral. Essa solução, ao meu ver, atende à integridade sistêmica do plexo normativo infraconstitucional, já que, salvo disposição em sentido contrário, a rigor, na fase de liquidação da sentença, deve-se observar a regra geral do art. 406 do Código Civil, o qual dispõe que "quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional. (...) Sendo assim, posiciono-me pela necessidade de conferirmos interpretação conforme à Constituição ao art. 899, §4º, da CLT, na redação dada pela Lei 13.467, de 2017, definindo-se que, até que sobrevenha solução legislativa, deverão ser aplicados à atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial e à correção dos depósitos recursais em contas judiciais na Justiça do Trabalho os mesmos índices de correção monetária e de juros vigentes para as hipóteses de condenações cíveis em geral (art. 406 do Código Civil)." A partir do que restara decidido pelo Supremo Tribunal Federal nos autos da ADC nº 58, em caráter vinculante e com efeitos erga omnes, inclusive, a inusitada e surpreendente solução adotada pelo Tribunal possui validade até a edição de lei nova reguladora da correção monetária e dos juros de mora. Surgindo no cenário, após a apreciação da ADC 58, lei civil que estabelece outros parâmetros relacionados à correção monetária e aos juros de mora sobre dívidas cujos índices respectivos deixaram de ser pactuados contratualmente, os seus preceitos devem ser aplicados também em relação aos débitos trabalhistas, na esteira do pronunciamento do STF naquela ação de controle concentrado. Há superveniência de lei civil tratando da correção monetária. No objeto do interesse, a Lei nº 14.905, de 28 de junho de 2024, tem o seguinte conteúdo: Art. 1º Esta Lei altera a Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), para dispor sobre atualização monetária e juros. Art. 2º A Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), passa a vigorar com as seguintes alterações: "Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros, atualização monetária e honorários de advogado. Parágrafo único. Na hipótese de o índice de atualização monetária não ter sido convencionado ou não estar previsto em lei específica, será aplicada a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurado e divulgado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou do índice que vier a substituí-lo." (NR) Art. 406. Quando não forem convencionados, ou quando o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, os juros serão fixados de acordo com a taxa legal. § 1º A taxa legal corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), deduzido o índice de atualização monetária de que trata o parágrafo único do art. 389 deste Código. Em primeiro lugar, cabe dizer que a decisão do STF(ADC nº 58) não é inteiramente suplantada pela Lei nº 14.905 de 28 de junho de 2024. Esclareço. Até o pronunciamento do STF naquela Ação Direta de Constitucionalidade(58) os débitos trabalhistas eram apurados, quando da aplicação de correção monetária e juros de mora, de acordo com a legislação trabalhista, que jamais foi omissa a esse respeito. O Supremo Tribunal Federal afastou do mundo jurídico as normas trabalhistas reguladoras da correção monetária e dos juros de mora, ainda que não tenha declarado expressamente nenhuma inconstitucionalidade das normas da Lei nº 8.177 de 1991 e de outras. Não obstante a lei nova civil, o STF fixou comandos os quais devem dialogar ou colocar em xeque toda e qualquer alteração legislativa em torno da correção monetária e dos juros de mora sobre os débitos trabalhistas. Por outro lado, havendo lei civil tratando especificamente da correção monetária e dos juros de mora, os seus preceitos devem ser aplicados também na época da apuração dos débitos trabalhistas. Como mera decorrência, a Lei nº 14.905 de 28 de junho de 2024, que deu nova redação aos artigos 389 e 406 do Código Civil Brasileiro, aplica-se aos débitos trabalhistas. Segundo tal compreensão, tenho que a Lei nº 14.905 de 28 de junho de 2024, que deu nova redação aos artigos 389 e 406 do Código Civil Brasileiro, aplica-se aos débitos trabalhistas. Os comandos legais novos impõem a aplicação do IPCA-E como fator de atualização monetária dos débitos trabalhistas, desde a data da exigibilidade de cada parcela(parágrafo único do artigo 389 do Código Civil Brasileiro). Desde o ajuizamento da ação trabalhista, registre-se, a taxa de juros de mora é a Selic(§1º do artigo 406 do CCB), mas agora com a dedução do índice de atualização monetária apurado pelo IPCA-E. Considerando o quadro atual, com a taxa Selic muito mais elevada do que o IPCA-E, na prática, os juros e a correção monetária corresponderão ao percentual da taxa Selic. Outra será a situação quando a SELIC for reduzida, como chegou acontecer no final dos anos 2010(2% ao ano) e a inflação estiver elevada. A ordem dos produtos, nesse caso, altera os fatores. Há um limite para a dedução, que é o percentual mais baixo de qualquer um dos institutos - correção monetária e juros de mora-. No momento atual, portanto, as mudanças legislativas guiadas pelas orientações advindas da decisão do STF nos autos da ADC 58,não alteraram praticamente nada O legislador acabou legitimando as inovações regressivas levadas a cabo antes pelo Supremo Tribunal Federal, como havia feito também o legislador constituinte reformador, ao modificar com redução a atualização monetária e os juros de mora sobre as dívidas pagas por precatório, mediante a introdução da taxa Selic como fator agregador dos dois institutos( Emenda Constitucional nº 113, de 8 de dezembro de 2021). Dou parcial provimento ao recurso ordinário do reclamado para complementar a prestação jurisdicional acerca do tema e determinar que a correção monetária seja apurada de acordo com o índice do IPCA-E, desde a data de exigibilidade de cada uma das parcelas deferidas, até o dia do ajuizamento da ação com o acréscimo dos juros nessa fase pré-processual, equivalentes à TRD(vide decisão do STF na ADC 58). Na fase judicial, continuará incidindo a correção monetária como antes fora anunciado, além dos juros de mora com base na taxa Selic, mas com a dedução do índice de correção monetária antes definido. 2.2 - RECURSO ADESIVO DO RECLAMANTE 2.2.1. ACIDENTE DE TRABALHO. PRESCRIÇÃO Na inicial o reclamante descreveu ter sofrido acidente do trabalho durante uma partida de futebol na primeira semana de fevereiro/2017, "lesionando gravemente seu ombro esquerdo e ficando cerca de 6 (seis) meses afastado de suas atividades esportivas." Postulou o pagamento de indenização por danos morais e materiais. A Magistrada originária reconheceu a prescrição das pretensões anteriores a 04.10.2018, incluindo aquelas relacionadas ao acidente de trabalho, nos seguintes termos: "3.2. DA PREJUDICIAL DE MÉRITO - PRESCRIÇÃO Reconhecida, no item anterior, a unicidade contratual, rejeito a prejudicial de prescrição total suscitada pelo Reclamado haja vista que, rescindido o contrato de trabalho do Reclamante em 10/11/2021, o ajuizamento da presente ação em 4/10/2023 observou o biênio constitucional. Contudo, havendo pleitos que abrangem parcelas vencidas a partir de Dezembro/2016, parte delas se encontra soterrada pela prescrição quinquenal (CF, art. 7°, XXIX e Súmula n° 308/TST). Desta forma, tendo em vista que a presente ação apenas foi ajuizada em 4/10/2023 (fls.1), acolho a prejudicial de prescrição parcial e julgo extinto o processo com resolução do mérito (CPC/2015, art. 487, II) com relação às parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio a contar da propositura da presente ação, ou seja, 4/10/2018. Tendo em vista que tanto o acidente de trabalho quanto a consolidação das lesões do Autor e, ainda, a não contratação de Seguro Acidente dizem respeito a fatos ocorridos no período prescrito, são igualmente atingidos pela prescrição ora declarada." Em recurso, o reclamante invoca a tese de lesão continuada, não incidindo a prescrição reconhecida na origem. Vejamos. O termo inicial do prazo prescricional da indenização por danos decorrentes de acidente do trabalho é a data em que o trabalhador teve ciência inequívoca da incapacidade laboral ou do resultado gravoso para a saúde física e/ou mental. No âmbito desta Corte, pacificou-se, por meio do item I do Verbete n.º 32/2008, que a actio nata, para a demanda envolvendo a indenização por danos, materiais ou morais, decorrentes do acidente e doença profissionais, surge na data da ciência inequívoca da perda da capacidade laboral. Referida jurisprudência estabelece que "A prescrição da pretensão de reparação de dano, defluente de acidente ou doença profissionais, tem seu marco inicial na data da ciência inequívoca da perda da capacidade laboral (súmulas 278/STJ e 230/STF)". Acerca da ciência inequívoca, ela, na minha leitura, coincide com a data em que se tem conhecimento da totalidade das dimensões geradas com o acidente, seja por intermédio da concessão de aposentadoria por invalidez mediante ato administrativo do órgão previdenciário, seja por meio de decisão judicial. Assim, a data da ciência inequívoca, sobre a qual não deve pairar nenhuma controvérsia, a não deixar sequer dúvida sobre o evento, a intensidade presente e as suas definitivas consequências, coincide com o dia em que o trabalhador toma conhecimento da perda, parcial ou definitiva; ou seja, por meio de decisão judicial ou quando o órgão previdenciário atesta de modo definitivo qual é o estado de saúde do empregado, concedendo-lhe, por exemplo, aposentadoria por invalidez. É nesse momento que há, de fato, como regra, a ciência inequívoca da perda da capacidade laboral. No caso concreto, é incontroverso o acidente ocorrido em fevereiro/2017, com o retorno às atividades laborais em dezembro/2017. Não há notícia de sequelas do acidente ou de redução da capacidade laborativa após dezembro/2017. Com efeito, a ciência inequívoca das consequências do acidente ocorreu ainda em 2017. Logo, ante o reconhecimento do marco prescricional em 04.10.2018, as pretensões decorrentes estão soterradas pela prescrição, conforme decidido na origem. Nego provimento. 2.2.2. CLÁUSULA COMPENSATÓRIA A Magistrada da instância originária da causa indeferiu o pedido de pagamento relativo à cláusula compensatória, sob os seguintes fundamentos: "Indefiro o requerimento do Autor de condenação do Reclamado ao pagamento de Cláusula Compensatória pela rescisão antecipada de contrato por prazo determinado haja vista que foi firmado com o Reclamado novo contrato imediatamente após a rescisão daquele findo em 10/11/2021, conforme extrato CNIS carreado aos autos. " Em recurso, o reclamante reitera o pedido de pagamento relativo ao período restante do contrato rescindido antecipadamente. Na hipótese vertente, o Juízo do primeiro grau de jurisdição verificou que o vínculo com o reclamado não se encerrou em 10.11.2021. Pelo contrário, houve prorrogação do contrato com o mesmo empregador. Indevida, portanto, a cláusula compensatória, conforme decidido na origem. Nada a prover. III- CONCLUSÃO Ante o exposto, conheço do recurso adesivo do reclamante e, no mérito, nego-lhe provimento; conheço parcialmente do recurso do reclamado e, no mérito, dou-lhe parcial provimento para: a) esclarecer que, em relação à contribuição previdenciária patronal, incide o regime especial previsto no §6º do art. 22, da Lei 8.212/91; b) complementar a prestação jurisdicional acerca do tema e determinar que a correção monetária seja apurada de acordo com o índice do IPCA-E, desde a data de exigibilidade de cada uma das parcelas deferidas, até o dia do ajuizamento da ação com o acréscimo dos juros nessa fase pré-processual, equivalentes à TRD(vide decisão do STF na ADC 58). Na fase judicial, continuará incidindo a correção monetária como antes fora anunciado, além dos juros de mora com base na taxa Selic, mas com a dedução do índice de correção monetária antes definido. Fica mantido o valor da condenação, pois ainda compatível. Tudo nos termos da fundamentação. É o voto. ACÓRDÃO Por tais fundamentos, ACORDAM os Desembargadores da Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Região, em aprovar o relatório, conhecer do recurso adesivo do reclamante e, no mérito, negar-lhe provimento; conhecer parcialmente do recurso do reclamado e, no mérito, dar-lhe parcial provimento para: a) esclarecer que, em relação à contribuição previdenciária patronal, incide o regime especial previsto no §6º do art. 22, da Lei 8.212/91; b) complementar a prestação jurisdicional acerca do tema e determinar que a correção monetária seja apurada de acordo com o índice do IPCA-E, desde a data de exigibilidade de cada uma das parcelas deferidas, até o dia do ajuizamento da ação com o acréscimo dos juros nessa fase pré-processual, equivalentes à TRD(vide decisão do STF na ADC 58). Na fase judicial, continuará incidindo a correção monetária como antes fora anunciado, além dos juros de mora com base na taxa Selic, mas com a dedução do índice de correção monetária antes definido. Fica mantido o valor da condenação, pois ainda compatível. Tudo nos termos do voto do Desembargador Relator. Ementa aprovada. Julgamento ocorrido por unanimidade de votos, sob a Presidência do Desembargador Grijalbo Coutinho, com a participação dos Desembargadores Elaine Vasconcelos, André R. P. V. Damasceno, Dorival Borges e do Juiz convocado Denilson B. Coêlho. Ausente, justificadamente, a Desembargadora Flávia Falcão (na direção da Escola Judicial). Pelo MPT, a Dra. Valesca de M. do Monte (Procuradora Regional do Trabalho). Sessão Ordinária Presencial de 9 de julho de 2025 (data do julgamento). GRIJALBO FERNANDES COUTINHO Desembargador Relator BRASILIA/DF, 11 de julho de 2025. MARIA APARECIDA FONSECA MATOS, Servidor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- EDMAR DA SILVA OLIVEIRA
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Brasiliense Futebol Clube e outros x Brasiliense Futebol Clube e outros
ID: 323808755
Tribunal: TRT10
Órgão: 1ª Turma
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 0001048-57.2023.5.10.0010
Data de Disponibilização:
14/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MARCELO LUIZ AVILA DE BESSA
OAB/DF XXXXXX
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RODRIGO SILVA MENEZES
OAB/GO XXXXXX
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ALESSANDRA TEREZA PAGI CHAVES FONSECA
OAB/DF XXXXXX
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PAULO HENRIQUE SILVA PINHEIRO
OAB/GO XXXXXX
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NATHALIA RODRIGUES CARNEIRO
OAB/DF XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 1ª TURMA Relator: GRIJALBO FERNANDES COUTINHO ROT 0001048-57.2023.5.10.0010 RECORRENTE: EDMAR DA SILVA OLIVEIRA …
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 1ª TURMA Relator: GRIJALBO FERNANDES COUTINHO ROT 0001048-57.2023.5.10.0010 RECORRENTE: EDMAR DA SILVA OLIVEIRA E OUTROS (1) RECORRIDO: EDMAR DA SILVA OLIVEIRA E OUTROS (1) PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO TRT 0001048-57.2023.5.10.0010 ROT - ACÓRDÃO 1ªTURMA RELATOR : DESEMBARGADOR GRIJALBO FERNANDES COUTINHO RECORRENTE: EDMAR DA SILVA OLIVEIRA ADVOGADO: PAULO HENRIQUE SILVA PINHEIRO ADVOGADO: RODRIGO SILVA MENEZES RECORRENTE: BRASILIENSE FUTEBOL CLUBE ADVOGADO: ALESSANDRA TEREZA PAGI CHAVES FONSECA ADVOGADO: MARCELO LUIZ AVILA DE BESSA ADVOGADO: NATHALIA RODRIGUES CARNEIRO RECORRIDOS: OS MESMOS ORIGEM : 10ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA/TO CLASSE ORIGINÁRIA: Ação Trabalhista - Rito Ordinário (JUÍZA RAQUEL GONCALVES MAYNARDE OLIVEIRA) EMENTA 1. UNICIDADE CONTRATUAL. RESCISÃO DE "COMUM ACORDO". NOVA CONTRATAÇÃO. FRAUDE. NULIDADE DA RENÚNCIA A DIREITOS. A Constituição da República admite transação coletiva envolvendo a redução salarial, a compensação de horários e a redução da jornada, além da jornada superior a 06 (seis) horas para os turnos ininterruptos de revezamento (CF, artigo 7º, incisos VI, XIII e XIV). Fora de tais parâmetros, qualquer negociação que possa resultar no rebaixamento do patamar definido por norma constitucional ou legal, estará eivada de vício, sujeita, portanto, à decretação de sua nulidade. A renúncia a direitos decorrentes do pacto laboral e rescisórios, notadamente quando feita individualmente, sem atuação sindical, não é compatível com a Constituição (CRFB, artigos 1º incisos III e IV, e 7º, incisos I, II e XXI; ADCT, art.10, inciso I). Com efeito, é manifestamente nula a renúncia ao direito de perceber salários e consectários durante o período de incapacidade laborativa. Nesse contexto, presume-se que houve vício de vontade, aplicando-se os princípios irrenunciabilidade de direitos e da continuidade da relação emprego. Em síntese, é nula a rescisão contratual, ainda que formalizada como "comum acordo", quando firmada com empregado em condição de vulnerabilidade. O afastamento das atividades do atleta profissional por lesão faz presumir o vício de vontade no ato de ruptura contratual por "comum acordo", configurando renúncia a direitos indisponíveis, especialmente quando celebrado um novo contrato de trabalho em curto espaço de tempo, após a suposta rescisão, o que reforça a caracterização da manobra fraudulenta(art. 9º da CLT). 2. DIREITO AO USO DA IMAGEM. ATLETA PROFISSIONAL. INOBSERVÂNCIA DO LIMITE DE 40% DA REMUNERAÇÃO TOTAL. AUSÊNCIA DE EFETIVA EXPLORAÇÃO DA IMAGEM. FRAUDE. O art. 87-A da Lei nº 9.615/98 prevê condições para o direito ao uso da imagem do atleta e estabelece que o valor correspondente não poderá ultrapassar 40% (quarenta por cento) da remuneração total do profissional. Superado o limite legal e ausente a efetiva exploração da imagem do atleta, o contrato para fins de uso da imagem é manifestamente nulo. Comprovada fraude à legislação trabalhista, os valores recebidos pelo atleta profissional a título direito de imagem integram a remuneração para todos os efeitos legais. 3. MULTAS DOS ARTIGOS 467 E 477 DA CLT. Tendo em vista a ausência de pagamento das verbas rescisórias incontroversas tempestivamente, incidem as multas dos arts. 467 e 477 da CLT. 4. JUSTIÇA GRATUITA. Nada havendo a infirmar a veracidade da declaração de hipossuficiência expendida pelo reclamante, inexistem elementos concretos para o indeferimento, à parte autora, da gratuidade da justiça, que, em sua acepção mais ampla, resta assegurada pelo inc. LXXIV do art. 5.° da Constituição da República "aos que comprovem insuficiência de recursos" e tem suas raízes fincadas na garantia de acesso à Justiça. 5. LEI Nº 14.905-2024. ALTERAÇÃO DOS ARTIGOS 389 E 406 DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA SOBRE OS DÉBITOS TRABALHISTAS. A partir do que restara decidido pelo Supremo Tribunal Federal nos autos da ADC nº 58, em caráter vinculante e com efeitos erga omnes, inclusive, a inusitada e surpreendente solução adotada pelo Tribunal possui validade até a edição de lei nova reguladora da correção monetária e dos juros de mora. Surgindo no cenário, após a apreciação da ADC 58, lei civil que estabelece outros parâmetros relacionados à correção monetária e aos juros de mora sobre dívidas cujos índices respectivos deixaram de ser pactuados contratualmente, os seus preceitos devem ser aplicados também em relação aos débitos trabalhistas, na esteira do pronunciamento do STF naquela ação de controle concentrado. Como mera decorrência, a Lei nº 14.905 de 28 de junho de 2024, que deu nova redação aos artigos 389 e 406 do Código Civil Brasileiro, aplica-se aos débitos trabalhistas. 6. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. REGIME ESPECIAL. EQUIPE DE FUTEBOL PROFISSIONAL. O art. 22, § 6º, da Lei nº 8.212/1991, prevê que a contribuição previdenciária das associações esportivas, especificamente em relação à equipe de futebol profissional, deve corresponder a 5% da receita bruta decorrente dos espetáculos desportivos de que participou. 7. ACIDENTE DE TRABALHO. PRESCRIÇÃO. O termo inicial do prazo prescricional da indenização por danos decorrentes de acidente do trabalho é a data em que o trabalhador teve ciência inequívoca da incapacidade laboral ou do resultado gravoso para a saúde física e/ou mental. Ajuizada a demanda cinco anos depois da ciência inequívoca do resultado do acidente, a pretensão está soterrada pela prescrição. 8. CLÁUSULA COMPENSATÓRIA. À míngua de encerramento do vínculo com o reclamado antes do prazo fixado no contrato, não é devida a cláusula compensatória, conforme decidido na origem. 9. Recurso do reclamado conhecido, em parte, e parcialmente provido. Recurso adesivo do reclamante conhecido e desprovido. I - RELATÓRIO O Juízo da 10ª Vara do Trabalho de Brasília-DF julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na reclamação trabalhista ajuizada por EDMAR DA SILVA OLIVEIRA em face de BRASILIENSE FUTEBOL CLUBE. O reclamado interpõe recurso ordinário quanto às seguintes matérias: direito de imagem; multas dos arts. 467 e 477 da CLT; ausência de unicidade; gratuidade judicial; contribuição previdenciária; juros e correção monetária. O reclamante interpõe recurso adesivo quanto ao acidente de trabalho (prescrição) e à cláusula compensatória. Contrarrazões apresentadas pelas partes. É o relatório. II - VOTO 1- ADMISSIBILIDADE. CONHECIMENTO PARCIAL DO RECURSO DO RECLAMADO Não conheço do recurso patronal quanto à prescrição relativa ao FGTS, à míngua de sucumbência. A prescrição reconhecida na origem não ressalvou o FGTS: "3.2. DA PREJUDICIAL DE MÉRITO - PRESCRIÇÃO Reconhecida, no item anterior, a unicidade contratual, rejeito a prejudicial de prescrição total suscitada pelo Reclamado haja vista que, rescindido o contrato de trabalho do Reclamante em 10/11/2021, o ajuizamento da presente ação em 4/10/2023 observou o biênio constitucional. Contudo, havendo pleitos que abrangem parcelas vencidas a partir de Dezembro/2016, parte delas se encontra soterrada pela prescrição quinquenal (CF, art. 7°, XXIX e Súmula n° 308/TST). Desta forma, tendo em vista que a presente ação apenas foi ajuizada em 4/10/2023 (fls.1), acolho a prejudicial de prescrição parcial e julgo extinto o processo com resolução do mérito (CPC/2015, art. 487, II) com relação às parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio a contar da propositura da presente ação, ou seja, 4/10/2018. Tendo em vista que tanto o acidente de trabalho quanto a consolidação das lesões do Autor e, ainda, a não contratação de Seguro Acidente dizem respeito a fatos ocorridos no período prescrito, são igualmente atingidos pela prescrição ora declarada." Com efeito, os respectivos recolhimentos são devidos durante todo o pacto, observado o prazo prescricional. Preenchidos os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço dos recursos interpostos pelas partes quanto aos demais temas. 2- MÉRITO RECURSAL 2.1- RECURSO DO RECLAMADO 2.1.1. UNICIDADE CONTRATUAL. RESCISÃO DE "COMUM ACORDO". NOVA CONTRATAÇÃO. FRAUDE. NULIDADE DA RENÚNCIA A DIREITOS O reclamante, na inicial, alegou que, apesar de formalmente ter tido um contrato rescindido em 02.06.2017 e um novo pacto firmado em 01.11.2017, o vínculo foi, na prática, ininterrupto no período de 01.12.2016 a 10.11.2021. Descreveu que o término formal do primeiro contrato foi fraudulento. Postulou a reconhecimento de um contrato único no período de 01.12.2016 a 10.11.2021. O reclamado, em contestação, negou a existência de um vínculo único. A Magistrada originária da causa deferiu a pretensão exordial e reconheceu a unicidade, sob os seguintes fundamentos: "3.1. DA UNICIDADE CONTRATUAL - RESCISÃO CONTRATUAL DE COMUM ACORDO - ACIDENTE DE TRABALHO - NOVA CONTRATAÇÃO A prova documental colhida nos autos, inclusive o cadastro CNIS do Reclamante juntado por este Juízo, revela que, no interregno em comento, o Reclamante efetivamente firmou 2 contratos de trabalho distintos com o Reclamado: o primeiro de 1/12/2016 a 1/06/2017 e o segundo de 1/11/2017 a 10/11/2021. Tal fato, por si só, não evidencia, como aponta a Reclamada em contestação, qualquer irregularidade, diante da sazonalidade típica dos contratos de trabalho dos atletas profissionais. Isto posto, por ser fato constitutivo do seu direito (CPC/2015, art. 373, I, e CLT, art. 818), ao Reclamante incumbia o ônus da prova de que houve, como alega, irregularidade na rescisão contratual ocorrida em 1/06/2017. O Autor, a meu ver, se desincumbiu satisfatoriamente de sua obrigação. Isto porque, de plano, resulta incontroverso nos autos que o Autor sofreu lesão no ombro enquanto jogava partida a serviço do Reclamado, em Fevereiro/2017, e, ainda, que teria que permanecer afastado de suas atividades profissionais para recuperação. Assim, não se afigura crível que o trabalhador machucado, sem condições de exercer suas atividades tenha firmado documento para rescisão de "comum acordo" de seu contrato de trabalho (fls. 36) em Junho/2017, o que apenas lhe traria prejuízos, já que deixaria de receber salários e, ainda, a possibilidade de percepção de benefício previdenciário, se fosse o caso. A própria preposta do Reclamado, em depoimento pessoa, reconhece que, com a rescisão deixou de custear o tratamento do Autor (minuto 1:45 a 1:55 da gravação). Prova que era intenção da Reclamada apenas se eximir de eventuais obrigações trabalhistas foi a assinatura de "Promessa de Compromisso e Protocolo de Intenções" pelo Reclamado com o Autor logo no dia seguinte à rescisão de seu contrato de trabalho, em 2/06/2017 (fls. 39/41). Por óbvio que durante o interregno medeado entre a "rescisão por comum acordo" e a nova contratação do Reclamante não houve prestação de serviços pelo Autor exatamente porque o Reclamante estava impossibilitado de desempenhar suas atividades. Assim, não emergindo nos autos qualquer justificativa plausível para que o trabalhador lesionado pretendesse a rescisão amigável de seu contrato de trabalho, presume-se que houve vício de vontade, aplicando-se os princípios da hipossuficiência do trabalhador e, ainda, da continuidade da relação emprego que são basilares ao Direito do Trabalho. Destaque-se que assim que o Reclamante teve condições de retornar ao trabalho foi firmado o novo contrato com o Reclamado, datado de 1/11/2017. Diante de todo o exposto, flagrante o vício de vontade do Reclamante na assinatura da rescisão de comum acordo datada de 1/06/2017, defiro o pleito do Autor para reconhecer a existência de um único contrato de trabalho com o Reclamado de 1/12/2016 a 10/11/2021. Como consequência, condeno o Reclamado a proceder à retificação da CTPS do Reclamante para fazer constar um único contrato de trabalho durante o período de 1/12/2016 a 10/11/2021, sob pena de fazê-lo a Secretaria desta Vara, sem prejuízo das penalidades administrativas cabíveis (CLT, arts. 39, §1º, e 54)." Em recurso, a parte reclamada pugna pela reforma da sentença. Argumenta que não cabe a aplicação das regras gerais da CLT quanto à unicidade contratual, porquanto há legislação específica no tocante ao trabalho do atleta profissional. Sustenta, ainda a validade da primeira rescisão contratual ocorrida em 02.06.2017. Afirma que a extinção do primeiro contrato não uma decorreu de uma rescisão por comum acordo entre as partes, modalidade que pressupõe o consenso e a vontade mútua de encerrar o vínculo. Refuta a existência de vício de vontade. À análise. No caso concreto, conforme fundamentação esposada na origem, é incontroverso que o reclamante sofreu lesão no ombro enquanto jogava partida pelo reclamado, em fevereiro/2017, e, ainda, que teria que permanecer afastado de suas atividades profissionais para recuperação. Assim, considerando o que ordinariamente acontece, o trabalhador, atleta profissional de futebol, lesionado e sem condição de exercer sua atividade, não aceitaria rescindir o contrato "de comum acordo" para lhe gerar apenas prejuízos, "já que deixaria de receber salários e, ainda, a possibilidade de percepção de benefício previdenciário, se fosse o caso." Vale ressaltar que a preposta reconheceu que, com a rescisão, o reclamado deixou de custear o tratamento do reclamante. Consoante bem apontado na origem, qual seria o motivo de um trabalhador lesionado, sem condições de exercer suas atividades, de assinar um "acordo" renunciando a seus direitos e, no dia seguinte, pactuar uma "Promessa de Compromisso e Protocolo de Intenções" (fls. 39/41)? Ora, o pacto com promessa de recontratação realizado no dia seguinte à ruptura, com efeitos futuros para cerca de seis meses depois (01.12.2017), revela a intenção patronal de excluir de seus quadros o atleta com lesão para uma recontratação após a recuperação da sua capacidade. Reitera-se que a tal "Promessa" foi assinada no dia seguinte à ruptura contratual. A Constituição da República admite transação coletiva envolvendo a redução salarial, a compensação de horários e a redução da jornada, além da jornada superior a 06 (seis) horas para os turnos ininterruptos de revezamento (CF, artigo 7º, incisos VI, XIII e XIV). Fora de tais parâmetros, qualquer negociação que possa resultar no rebaixamento do patamar definido por norma constitucional ou legal, estará eivada de vício, sujeita, portanto, à decretação de sua nulidade. A renúncia a direitos decorrentes do pacto laboral e rescisórios, notadamente quando feitas individualmente, sem atuação sindical, não são compatíveis com a Constituição (CRFB, artigos 1º incisos III e IV, e 7º, incisos I, II e XXI; ADCT, art.10, inciso I). Nos termos da sentença originária, "durante o interregno entre a "rescisão por comum acordo" e a nova contratação do Reclamante não houve prestação de serviços pelo Autor exatamente porque o reclamante estava impossibilitado de desempenhar suas atividades". Com efeito, é manifestamente nula a renúncia aos direitos de perceber salários e consectários durante o período de incapacidade laborativa. Nesse contexto, presume-se que houve vício de vontade, aplicando-se os princípios irrenunciabilidade de direitos e da continuidade da relação emprego. Reforça esse entendimento o fato de que o reclamante, assim que teve condições de retornar ao trabalho, firmou o novo contrato com o reclamado, conforme promessa já mencionada, a partir de 01.11.2017. Evidente, portanto, o vício de vontade na assinatura da denominada "rescisão por comum acordo" em 01.06.2017. Em síntese, é nula a rescisão contratual, ainda que formalizada como "comum acordo", quando firmada com empregado em condição de vulnerabilidade. O afastamento das atividades do atleta profissional por lesão faz presumir o vício de vontade no ato de ruptura contratual por "comum acordo", configurando renúncia a direitos indisponíveis, notadamente quando celebrado um novo contrato de trabalho em curto espaço de tempo, após a suposta rescisão, o que reforça a caracterização da manobra fraudulenta(art. 9º da CLT). Portanto, seja considerando a CLT, seja considerando a lei específica mencionada no recurso, a fraude à lei imperativa enseja o reconhecimento de nulidade, revelando-se imperiosa a declaração de unicidade contratual, consoante bem fundamentado pela Magistrada da instância originária da causa. Nada a prover. 2.1.2. DIREITO DE IMAGEM. NATUREZA JURÍDICA. PRESCRIÇÃO. FÉRIAS Na inicial o reclamante descreveu ter pactuado o recebimento remuneração mensal no importe de "R$ 7.000,00 (sete mil reais), de 01/12/2016 a 30/10/2017; R$ 8.000,00 (oito mil reais), de 01/11/2017 a 30/11/2018; R$ 9.000,00 (nove mil reais), de 01/12/2018 a 30/11/2020; e de R$ 10.800,00 (dez mil e oitocentos reais), de 01/12/2020 a 10/11/2021". Descreveu que na CTPS era registrado tão somente R$ 2.000,00 (dois mil reais) e o restante pago a título de direito de imagem. Invocou a tese de fraude no tocante ao pagamento a título de imagem, tendo em vista a inobservância dos requisitos legais e a ausência de efetiva utilização da imagem. Requereu o reconhecimento da natureza salarial da parcela e o pagamento dos consectários decorrentes. O reclamado refutou a natureza salarial do direito de imagem. Defendeu a tese de pactuação de contrato autônomo, desvinculado da remuneração, conforme preceitua o artigo 87-A da Lei nº 9.615/98. A Magistrada originária deferiu a pretensão exordial, sob os seguintes fundamentos: "3.3. DA NATUREZA JURÍDICA DOS VALORES PERCEBIDOS PELO AUTOR A TÍTULO DE DIREITO DE IMAGEM Pretende o Reclamante a integração à sua remuneração dos valores recebidos a título de Direito de Imagem sob o argumento de que tinham natureza jurídica de salário e apenas foram pagos desta forma para evitar os reflexos trabalhistas. O Reclamado, por sua vez, assevera que a assinatura deste tipo de contrato é praxe no caso de atletas profissionais e se dá em contrapartida da utilização pelo time da imagem do jogador, não ostentando natureza de salário. Aduz que tal contrato encontra inclusive previsão na Lei Pelé. Por ser fato constitutivo do seu direito (CPC/2015, art. 373, I, e CLT, art. 818), ao Reclamante incumbia o ônus da prova de suas alegações. Não há dúvidas de que o art. 87-A da Lei nº 9.615/98 trouxe uma presunção iuris tantum do caráter não salarial da parcela paga ao atleta, por meio de contrato civil, a título de direito de imagem, sendo certo que, a partir da edição da Lei nº 13.155/2015 esta realidade ficou restrita a valores que fosse inferiores 40% da remuneração total paga ao atleta. No mesmo sentido, é a norma contida no art. 45 do Decreto nº 7.984/2013, que regulamentou a matéria, in verbis: "Art. 45. O direito ao uso da imagem do atleta, disposto no art. 87-A da Lei nº 9.615, de 1998, pode ser por ele cedido ou explorado, por ajuste contratual de natureza civil e com fixação de direitos, deveres e condições inconfundíveis com o contrato especial de trabalho desportivo. §1º O ajuste de natureza civil referente ao uso da imagem do atleta não substitui o vínculo trabalhista entre ele e a entidade de prática desportiva e não depende de registro em entidade de administração do desporto. §2º Serão nulos de pleno direito os atos praticados através de contrato civil de cessão da imagem com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar as garantias e direitos trabalhistas do atleta." Isto posto, importa aferir se o Reclamante recebia os valores pagos a título de direito de imagem efetivamente em razão da exploração de sua imagem pelo clube ou não, a fim de aferir a real natureza jurídica da parcela em comento. No caso em tela, embora o Reclamado tenha asseverado que utilizou a imagem do jogador para promoção do time em redes sociais, em eventos e em transmissões televisivas, não trouxe aos autos qualquer prova deste uso. Ou seja, desde logo se verifica que o fato gerador do pagamento da parcela denominada de direito de imagem não se vinculava à efetiva utilização da imagem do Reclamante, o que desconstitui a presunção trazida pelo art. 87-A da Lei nº 9.615/98. Ademais, a contraprestação foi estabelecida em valor fixo de R$ 5.000,00 mensais (até 30/04/2018), R$ 6.000,00 (de 1/05/2018 a 30/11/2018), de R$ 7.000,00 (de 1/12/2018 a 30/11/2020) e R$ 8.800,00 (no período de 1/12/2020 em diante) independentemente de haver maior ou menor exposição da imagem do Reclamante em um determinado mês, termos estes que deixam evidente a natureza de parcela salarial, mascarada sob o título de direito de imagem, mormente quando se constata que o direito à imagem corresponde a mais que 3 vezes o valor de salário pago ao Autor. No mesmo sentido é o seguinte precedente deste eg. Tribunal Regional: "ATLETA PROFISSIONAL. DIREITO DE IMAGEM. NATUREZA JURÍDICA. INTEGRAÇÃO. Hipótese dos autos em que o pagamento da parcela 'direito de imagem' não foi atrelada à veiculação dos jogos pela televisão, tampouco aventada condição para o recebimento da parcela, mas foi estabelecida em valor fixo e em termos que não deixam dúvidas quanto ao compromisso de pagamento regular. Ostenta, portanto, natureza salarial e deve compor a remuneração." (RO nº 01904-2010-103-10-00-5, 1ª Turma, Des. Flávia Simões Falcão, DEJT 24/08/2012) Destarte, defiro o pleito do Reclamante de reconhecimento da natureza salarial dos valores que lhe eram pagos mensalmente a título de direito de imagem (R$ 5.000,00 mensais - até 30/04/2018 - , R$ 6.000,00 - de 1/05/2018 a 30/11/2018 -, R$ 7.000,00 - de 1/12/2018 a 30/11/2020 - e R$ 8.800,00 - no período de 1/12/2020 em diante), devendo integrar a remuneração do obreiro para todos os fins. Como consequência, defiro o pleito do Reclamante de condenação do Reclamado ao pagamento dos reflexos desta parcela em 13ºs salários, férias acrescidas de 1/3 e FGTS acrescido da multa de 40% relativamente a todo o vínculo. O Reclamado deverá, ainda, proceder à retificação da CTPS do Reclamante para fazer constar como salário mensal do obreiro a evolução salarial acima reconhecida (acrescida do salário-base de R$ 2.000,00), já considerando a integração do direito de imagem, sob pena de fazê-lo a Secretaria desta Vara, sem prejuízo das penalidades administrativas cabíveis (CLT, arts. 39, §1°, e 54). Da mesma forma, incontroverso que o Reclamado não promoveu o pagamento das verbas rescisórias decorrentes da rescisão imotivada do contrato de trabalho do Reclamante ocorrida em 10/11/2021, defiro o pleito do Reclamante de condenação do Reclamado ao pagamento das seguintes parcelas, observados os limites do pedido (CPC/2015, arts. 141 e 492) e a prescrição acima declarada: - saldo de salário de 10 dias de Novembro/2021; - 2/12 de 13º salário proporcional/2018; - 13ºs salários integrais 2019 e 2020; - 11/12 de 13º salário proporcional/2021; - férias vencidas 2017/2018, em dobro, acrescidas de 1/3; - férias vencidas 2018/2019, em dobro, acrescidas de 1/3; - férias vencidas 2019/2020, de forma simples, acrescidas de 1/3; - 11/12 de férias proporcionais 2020/2021, acrescidas de 1/3; - FGTS de todo o vínculo, deduzida a importância já depositada; e - multa de 40% sobre a integralidade do FGTS. Uma vez que a presente ação foi ajuizada após a entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017, que desobriga o empregador a efetuar a entrega de guias TRCT, deverá o Reclamado proceder a comunicação da dispensa imotivada do obreiro junto aos Órgãos Competentes (CLT, art. 477, caput), a fim de propiciar ao saque pelo Autor do saldo de FGTS e dos valores de depósito ora determinados, sob pena de expedição de alvará e/ou indenização equivalente. A fim de se evitar o enriquecimento sem causa do Autor, deduza-se do montante a ser apurado em seu favor a importância de R$ 14.578,86 já quitada pelo Reclamado por meio de depósito judicial nos presentes autos. Da mesma forma, comprovado o pagamento de R$ 2.161,01 ao Reclamante quando da rescisão realizada em 1/06/2017 (TRCT de fls. 222/223), proceda-se igualmente à dedução de tais valores." Em recurso, o reclamado aponta que a imagem do atleta era efetivamente utilizada, inclusive por meio de plataformas digitais. Subsidiariamente, aduz que deve ser considerada salarial tão somente o importe que exceder o limite de 40% previsto no art. 87-A da Lei nº 9.615/98. À análise. O art. 87-A da Lei nº 9.615/98 prevê condições para o direito ao uso da imagem do atleta e estabelece que o valor correspondente não poderá ultrapassar 40% (quarenta por cento) da remuneração total do profissional: "Art. 87-A. O direito ao uso da imagem do atleta pode ser por ele cedido ou explorado, mediante ajuste contratual de natureza civil e com fixação de direitos, deveres e condições inconfundíveis com o contrato especial de trabalho desportivo. (Incluído pela Lei nº 12.395, de 2011). Parágrafo único. Quando houver, por parte do atleta, a cessão de direitos ao uso de sua imagem para a entidade de prática desportiva detentora do contrato especial de trabalho desportivo, o valor correspondente ao uso da imagem não poderá ultrapassar 40% (quarenta por cento) da remuneração total paga ao atleta, composta pela soma do salário e dos valores pagos pelo direito ao uso da imagem. (Incluído pela Lei nº 13.155, de 2015)" (grifo acrescido) No caso concreto, é incontroverso o ajuste com previsão de pagamento de direito de imagem de "R$ 5.000,00 mensais - até 30/04/2018 - , R$ 6.000,00 - de 1/05/2018 a 30/11/2018 -, R$ 7.000,00 - de 1/12/2018 a 30/11/2020 - e R$ 8.800,00 - no período de 1/12/2020 em diante)". Com efeito, o limite máximo de 40% da remuneração foi superado. Logo, o contrato para fins de uso de imagem é manifestamente nulo. Não cabe ao julgador substituir as cláusulas contratuais e "ajustar" o contrato ao limite máximo previsto em lei. Em outras palavras, comprovada fraude à legislação trabalhista, os valores recebidos pelo atleta profissional a esse título integram a remuneração para todos os efeitos legais. Outrossim, não restou evidenciada a efetiva utilização da imagem do reclamante. Os recortes trazidos pelo reclamado limitam-se a poucas publicações em redes sociais e à matéria jornalista. Não obstante a tese de defesa, não há prova de monetização específica por postagens em plataformas digitais em relação ao reclamante. Além disso, a menção a poucas reportagens na imprensa (fls. 355/358) também não caracteriza a efetiva exploração da imagem do atleta. Com efeito, restou demonstrada a fraude com o escopo de sonegar direitos trabalhistas, reforçada pelo pagamento mensal em valor fixo, sem qualquer vinculação à exploração da imagem do atleta. A jurisprudência do Tribunal Superior do trabalho considera fraude à lei trabalhista o pagamento de direito de imagem, de forma habitual e desvinculada da exploração da imagem do atleta profissional, em quantia muito superior à remuneração total ajustada entre as partes: "AGRAVO EMBARGOS. CONHECIMENTO. DISSENSO JURISPRUDENCIAL EVIDENCIADO. SÚMULA N.º 296, I, DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. ATLETA PROFISSIONAL. DIREITO DE IMAGEM. ARTIGO 87-A DA LEI N.º 9.615/1998. NATUREZA JURÍDICA. 1 . Caso concreto em que a Turma do TST concluiu que, em regra, por força do que dispõe o artigo 87-A da Lei n.o 9.615/1998, os valores recebidos em contraprestação à cessão do direito de imagem do atleta profissional não consubstanciam salário, pois decorrem de ajuste contratual de natureza civil entre o atleta e o clube desportivo empregador. Asseverou, ainda, o douto Órgão fracionário, que, na hipótese vertente dos autos, não transmuda a natureza civil do ajuste entabulado entre as partes a ausência de demonstração da exploração efetiva da imagem do atleta e o montante dos valores percebidos a esse título, com habitualidade, muito superiores ao salário do autor. Forte nessas razões, a egrégia Turma concluiu pela inocorrência de fraude à legislação trabalhista, nos termos do artigo 9º da CLT. 2 . Prospera a pretensão obreira, no sentido de demonstrar dissenso jurisprudencial, em sede de Embargos à SBDI-1, mediante a transcrição de arestos paradigmas oriundos de outra Turma desta Corte superior, segundo os quais o pagamento de valores auferidos a título de cessão do direito de imagem, de forma habitual e desvinculada da exposição da imagem do atleta profissional , em quantia muito superior à remuneração total ajustada entre as partes , configura fraude à legislação trabalhista , à luz do mesmo dispositivo legal invocado pela Turma de origem, qual seja, o artigo 9º da CLT . Cuidam-se, assim, de " teses diversas na interpretação de um mesmo dispositivo legal, embora idênticos os fatos que as ensejaram ", consoante a diretriz da Súmula n.º 296, I, do TST. 3 . Admissíveis os Embargos, por dissenso jurisprudencial, merece reforma a decisão monocrática obstativa do seu prosseguimento. 4 . Agravo a que se dá provimento. EMBARGOS ATLETA PROFISSIONAL. DIREITO DE IMAGEM. ARTIGO 87-A DA LEI N.º 9.615/1998. NATUREZA JURÍDICA. 1 . Prevalece, nesta Corte superior, entendimento segundo o qual, por força do que dispõe a norma do artigo 87-A da Lei n.º 9.615/1998, em princípio , não ostentam natureza jurídica salarial os valores auferidos pelo atleta profissional a título de cessão do direito de imagem. Têm-se ressalvado , contudo, da aplicação do artigo 87-A da Lei n.º 9.615/1998 as hipóteses em que efetivamente demonstrado, nas instâncias ordinárias, o desvirtuamento do contrato de natureza civil entabulado originalmente entre o atleta e a agremiação desportiva , a atrair a aplicação do artigo 9º da CLT. Em tais casos, segundo a jurisprudência iterativa e notória desta Corte superior, uma vez comprovada fraude à legislação trabalhista, os valores auferidos pelo atleta profissional a esse título integram a remuneração para todos os efeitos legais . Precedentes da SBDI-1 e de Turmas do TST. 2 . A desvinculação do pagamento efetuado pela agremiação desportiva a título de cessão do direito imaterial do atleta profissional da efetiva exploração de sua imagem desnatura o objeto do contrato civil celebrado sob o pálio do artigo 87-A da Lei n.º 9.615/1998 , atraindo, assim, o reconhecimento da natureza salarial das parcelas recebidas sob essa rubrica, por aplicação da norma insculpida no artigo 9º da CLT. A esse respeito, a SBDI-1, em acórdão recente , decidiu que, " inexistindo correspondência entre o uso da imagem do reclamante e os valores mensalmente pagos , mantém-se a conclusão do TRT (...) e da Turma quanto à fraude, uma vez que evidenciado que o pagamento tem como objetivo, na realidade, desvirtuar a aplicação da legislação trabalhista . Recurso de embargos conhecido e desprovido " (E-RR-358-48.2014.5.12.0055, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT de 22/5/2020; os destaques foram acrescidos). 3. Conquanto não se aplique aos contratos de trabalho desportivos firmados anteriormente à sua vigência (caso dos autos) a norma prevista no parágrafo único do artigo 87-A da Lei n.º 9.615/1998 - que fixou um teto para o percentual pago a título de cessão do direito de imagem, tendo por base a remuneração total devida ao atleta profissional (40%) - , é possível extrair da alteração legislativa o claro intuito de, entre outras finalidades, emprestar maior transparência à contratação e coibir práticas fraudulentas perpetradas em violação à legislação trabalhista e previdenciária no âmbito desportivo . É o que deflui da exposição de motivos da Medida Provisória n.º 671/2015, posteriormente convertida na Lei n.º 13.155/2015, que introduziu o parágrafo único ao artigo 87-A da Lei n.º 9.615/1998 (os destaques foram acrescidos): "(...) Dentre as medidas que integram esse projeto, destacam-se a obrigação de apresentação regular de demonstrações financeiras contábeis, a regularidade de pagamento das obrigações tributárias, previdenciárias, trabalhistas e contratuais com atletas e demais funcionários, inclusive quanto ao direito de imagem , assim como o estabelecimento de um limite máximo com folha de pagamento e direitos de imagem de atletas profissionais de futebol não superior a setenta por cento da receita bruta anual ." Daí se conclui que a introdução do parágrafo único ao artigo 87-A da Lei n.º 9.615/1998, por iniciativa do legislador ordinário, apenas explicitou, de forma objetiva, vedação já existente, impeditiva do desvirtuamento do instituto previsto na cabeça do referido preceito legal, decorrente das disposições do artigo 9º da CLT. 4. Embargos interpostos pelo reclamante de que se conhece, por divergência jurisprudencial, e a que se dá provimento para restabelecer o acórdão prolatado pelo Tribunal Regional de origem" (E-ED-RR-1442-94.2014.5.09.0014, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Lelio Bentes Correa, DEJT 25/03/2022)." (grifos acrescidos) Escorreita, portanto, a sentença originária. Vale ressaltar que as pretensões anteriores a 04.10.2018 foram declaradas prescritas. Ao contrário da tese recursal, o período de férias de 2017/2018 não está alcançado pela prescrição, tendo em vista que a prescrição das férias inicia-se a partir do final do período concessivo (CLT, art 137, §1º). Nego provimento ao apelo. 2.1.3. MULTAS DOS ARTIGOS 467 E 477 DA CLT O Juízo originário deferiu o pedido de pagamento das multas dos artigos 467 e 477 da CLT, nos seguintes termos: "3.4. DO ACRÉSCIMO DO ART. 467 E DA MULTA DO ART. 477, §8º, DA CLT Tendo em vista que sequer o pagamento das verbas rescisórias incontroversas foi feito no prazo legal, fato reconhecido pelo Reclamado em contestação, defiro o pleito do Reclamante de condenação do Reclamado ao pagamento da multa prevista no art. 477, §8º, da CLT e do acréscimo do art. 467 da CLT, sendo este último incidente sobre saldo de salário, 13ºs salários e férias acrescidas de 1/3." Em recurso, o reclamado aduz que pagou as verbas rescisórias incontroversas tempestivamente. No entanto, o pagamento das verbas incontroversas ocorreu após o prazo legal, conforme reconhecido na defesa. Reitero que a defesa reconheceu como devida a multa do art. 477 da CLT: "Reconhece a empresa ser devido ao Autor o pagamento do 13º salário proporcional de 2023 e as férias proporcionais, acrescidas de 1/3 e, ainda, a multa prevista no§ 8º, do artigo 477, da CLT, em face da mora no pagamento da integralidade das verbas rescisórias". Logo, as razões recursais destoam da própria tese de defesa. Além disso, o depósito judicial de R$ 14.578,86, conforme discriminado na defesa (fl. 204), nem de longe alcança todas as verbas rescisórias devidas e detalhadas na sentença. Nego provimento. 2.1.4. BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA No apelo, o reclamado impugna a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita à parte autora. Dispõe o art. 790, §§ 3º e 4º da CLT: "Art. 790 [...] § 3o É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. § 4o O benefício da justiça gratuita será concedido à parte que comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo." Depreende-se do novo texto legal (§§ 3º e 4º do Art. 790 da CLT) que, para aqueles que percebem salário igual ou inferior a quarenta por cento do limite do RGPS, há presunção de serem beneficiários da Justiça gratuita e, de outro lado, para aqueles cujo salário ultrapassa tal teto, resta mantida a possibilidade de comprovação da hipossuficiência, podendo esta ser firmada por mera declaração, nos termos da Lei n.º 7.115/1983, que confere à simples declaração presunção de veracidade, para fins de comprovação do estado de pobreza. Eis a regra específica em sua literalidade: "Art. . 1º - A declaração destinada a fazer prova de vida, residência, pobreza, dependência econômica, homonímia ou bons antecedentes, quando firmada pelo próprio interessado ou por procurador bastante, e sob as penas da Lei, presume-se verdadeira. Parágrafo único - O dispositivo neste artigo não se aplica para fins de prova em processo penal. Art. . 2º - Se comprovadamente falsa a declaração, sujeitar-se-á o declarante às sanções civis, administrativas e criminais previstas na legislação aplicável. Art. . 3º - A declaração mencionará expressamente a responsabilidade do declarante. Art. . 4º - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. . 5º - Revogam-se as disposições em contrário." Ademais, o estado de hipossuficiência não deve ser medido pelo simples valor do salário, mas pela potencialidade de eventual pagamento das despesas processuais, somado aos gastos particulares, comprometer o sustento próprio e da família. Nesse sentido, o informativo nº 151, do TST: Justiça gratuita. Declaração de pobreza. Presunção relativa de veracidade não elidida pelo fato de o reclamante ter recebido verbas rescisórias e de indenização em decorrência de adesão a plano de demissão voluntária. O fato de o reclamante ter recebido quantia vultosa (R$ 1.358.507,65) decorrente de verbas rescisórias e de indenização oriunda de adesão a plano de demissão voluntária não é suficiente para elidir a presunção de veracidade da declaração de pobreza por ele firmada. Sob esse fundamento, a SBDI-I, maioria, conheceu dos embargos por contrariedade à Orientação Jurisprudencial nº 304 da SBDI-I, e, no mérito, deu-lhes provimento para restabelecer a sentença que deferira os benefícios da justiça gratuita. Vencidos os Ministros João Oreste Dalazen, Renato de Lacerda Paiva e Alexandre Agra Belmonte. TST-ERR-11237-87.2014.5.18.0010, SBDI-I, rel. Min. Hugo Carlos Scheuermann, 2.2.2017. Informativo TST nº 151. Não se olvide que as benesses da Justiça Gratuita têm previsão constitucional, segundo o qual "o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos" (CF, art. 5º, LXXIV), medida que concretiza o direito de acesso à Justiça. Seguindo esse norte, o Código de Processo Civil de 2015 disciplina, em seu art. 98, § 1º, a gratuidade de justiça, deixando expressa tanto a inclusão de isenção do pagamento de custas judiciais, como um dos benefícios decorrentes de tal benesse, quanto a possibilidade de comprovação da hipossuficiência por simples declaração, cabendo à parte contrária o ônus de demonstrar que o requerente não preenche os requisitos para o deferimento do instituto (CPC, art. 99, §3º c/c CLT, art. 769). O que se depreende disso é a disparidade causada pelo legislador ordinário no tratamento do beneficiário de tal Gratuidade que litiga na Justiça Comum frente àquele litigante na Justiça do Trabalho. Ora, o Direito do Trabalho teve origem na necessidade de proteção ao empregado hipossuficiente, sendo esse princípio o próprio esteio e razão de ser desta Justiça Especializada. Tornou-se necessário, portanto, trilhar uma interpretação constitucionalmente adequada dos novos preceitos trazidos pela Lei n.º 13.467/2017, com um olhar atento a todo o ordenamento jurídico. Em síntese, independentemente dos parâmetros fixados pela reforma, segue plenamente possível a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita com base na simples declaração. No caso, a parte reclamante juntou declaração de hipossuficiência. Portanto, nada havendo a infirmar a veracidade da declaração de hipossuficiência expendida pelo reclamante, inexistem elementos concretos para o indeferimento, à parte autora, da gratuidade da justiça, que, em sua acepção mais ampla, resta assegurada pelo inc. LXXIV do art. 5.° da Constituição da República "aos que comprovem insuficiência de recursos" e tem suas raízes fincadas na garantia de acesso à Justiça. Nada a prover. 2.1.5. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. REGIME ESPECIAL. EQUIPE DE FUTEBOL PROFISSIONAL Em recurso, o reclamado renova a tese de incidência do regime especial previsto para as equipes de futebol profissional, em relação aos recolhimentos previdenciários. O art. 22, § 6º, da Lei nº 8.212/1991, prevê que a contribuição previdenciária das associações esportivas, especificamente em relação à equipe de futebol profissional, deve corresponder a 5% da receita bruta decorrente dos espetáculos desportivos de que participou. Nesse sentido a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho: "I - AGRAVO DE INSTRUMENTO . RECURSO DE REVISTA . RECLAMADO. LEI Nº 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA . CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. COTA PATRONAL. REGIME ESPECIAL. EQUIPE DE FUTEBOL PROFISSIONAL. 1 - Deve ser reconhecida a transcendência jurídica quando se mostra aconselhável o exame mais detido da controvérsia devido às peculiaridades do caso concreto. O enfoque exegético da aferição dos indicadores de transcendência em princípio deve ser positivo, especialmente nos casos de alguma complexidade, em que se torna aconselhável o debate mais aprofundado da matéria. 2 - Aconselhável o provimento do agravo de instrumento, para determinar o processamento do recurso de revista, em razão da provável violação do art. 22, § 6º, da Lei n. 8212/1991. 3 - Agravo de instrumento a que se dá provimento . II - RECURSO DE REVISTA. RECLAMADO. LEI Nº 13.467/2017. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. COTA PATRONAL. REGIME ESPECIAL. EQUIPE DE FUTEBOL PROFISSIONAL. 1 - Interposto o recurso de revista na vigência da Lei n. 13.015/2014, consideram-se atendidas as exigências do artigo 896, § 1º-A e incisos, da CLT. 2 - A controvérsia cinge-se à aplicação ou não do regime especial de contribuição previdenciária da associação desportiva que mantém equipe de futebol profissional, previsto no art. 22, § 6º, da Lei n. 8.212/1991, à hipótese de valores reconhecidos em juízo, por meio de sentença condenatória. 3 - O art. 22, § 6º, da Lei n. 8.212/1991, prevê regime de recolhimento previdenciário especial das associações desportivas em relação à equipe de futebol profissional, de modo que sua contribuição previdenciária deve corresponder a 5% da receita bruta decorrente dos espetáculos desportivos de que participou. 4 - Recurso de revista a que se dá provimento " (RR-20093-14.2020.5.04.0012, 6ª Turma, Relatora Ministra Katia Magalhaes Arruda, DEJT 15/09/2023).(grifo acrescido) Dou provimento ao recurso do reclamado para esclarecer que, em relação à contribuição previdenciária patronal, incide o regime especial previsto no §6º do art. 22, da Lei 8.212/91. 2.1.6. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA APLICÁVEIS SOBRE OS DÉBITOS TRABALHISTAS. SUPERVENIÊNCIA DE SOLUÇÃO LEGISLATIVA APÓS O DECIDIDO PELO STF NOS AUTOS DA ADC NÚMERO 58. LEI NÚMERO 14.905/2024 Sobre a aplicação da atualização monetária e dos juros de mora sobre o débito trabalhista, o Juízo de origem assim decidiu a controvérsia: "(...)Sobre as parcelas deferidas, incidem juros, na forma do art. 883 da CLT, e Súmula nº 200/TST. Correção monetária, na forma do art. 883 da CLT (juros incidentes a partir da data do ajuizamento da demanda), segundo os índices oficiais à época da execução, nos moldes das tabelas oficiais expedidas pelo col. CSJT. O Reclamado deverá, ainda, recolher as contribuições previdenciárias e fiscais incidentes sobre as parcelas de natureza salarial, na forma dos arts. 46 da Lei nº 8.541/92, 43 da Lei nº 8.620/93, 28 da Lei nº 10.833/03 e 198 do Decreto nº 3.048/99, da Súmula nº 368 do C. TST e dos Provimentos TST/CG nºs 02/1993 e 03/2005. Em liquidação, observar a IN 1500/2014 RFB e alterações posteriores, exceto quanto à inclusão dos juros de mora na base de cálculo do Imposto de Renda Pessoa Física, bem como trazer aos autos o comprovante de recolhimento das parcelas relativas ao período do vínculo empregatício ora reconhecido, sob pena de execução." (...). Em seu recurso ordinário, o reclamado busca a reforma da sentença "para seja determinada a aplicação do IPCA-E até o ajuizamento da ação e, a partir da citação, a taxa SELIC (este último que já engloba juros), para cálculo das parcelas deferidas na presente ação, caso assim, mantidas". No caso concreto, é necessário complementar a prestação jurisdicional acerca do tema. Ao apreciar o pedido contido na ADC 58, o Supremo Tribunal Federal decidiu que a fórmula ali adotada, quanto à aplicação de atualização monetária e dos juros de mora sobre os débitos trabalhistas, seria ´válida até a superveniência de lei cuidando novamente dos dois institutos, conforme se verifica do resumo do deliberado pelo STF "Decisão: O Tribunal, por maioria, julgou parcialmente procedente a ação, para conferir interpretação conforme à Constituição ao art. 879, § 7º, e ao art. 899, § 4º, da CLT, na redação dada pela Lei 13.467 de 2017, no sentido de considerar que à atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial e à correção dos depósitos recursais em contas judiciais na Justiça do Trabalho deverão ser aplicados, até que sobrevenha solução legislativa, os mesmos índices de correção monetária e de juros que vigentes para as condenações cíveis em geral, quais sejam a incidência do IPCA-E na fase pré-judicial e, a partir da citação, a incidência da taxa SELIC (art. 406 do Código Civil), nos termos do voto do Relator, vencidos os Ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio. Por fim, por maioria, modulou os efeitos da decisão, ao entendimento de que (i) são reputados válidos e não ensejarão qualquer rediscussão (na ação em curso ou em nova demanda, incluindo ação rescisória) todos os pagamentos realizados utilizando a TR (IPCA-E ou qualquer outro índice), no tempo e modo oportunos (de forma extrajudicial ou judicial, inclusive depósitos judiciais) e os juros de mora de 1% ao mês, assim como devem ser mantidas e executadas as sentenças transitadas em julgado que expressamente adotaram, na sua fundamentação ou no dispositivo, a TR (ou o IPCA-E) e os juros de mora de 1% ao mês; (ii) os processos em curso que estejam sobrestados na fase de conhecimento (independentemente de estarem com ou sem sentença, inclusive na fase recursal) devem ter aplicação, de forma retroativa, da taxa Selic (juros e correção monetária), sob pena de alegação futura de inexigibilidade de título judicial fundado em interpretação contrária ao posicionamento do STF (art. 525, §§ 12 e 14, ou art. 535, §§ 5º e 7º, do CPC) e (iii) igualmente, ao acórdão formalizado pelo Supremo sobre a questão dever-se-á aplicar eficácia erga omnes e efeito vinculante, no sentido de atingir aqueles feitos já transitados em julgado desde que sem qualquer manifestação expressa quanto aos índices de correção monetária e taxa de juros (omissão expressa ou simples consideração de seguir os critérios legais), vencidos os Ministros Alexandre de Moraes e Marco Aurélio, que não modulavam os efeitos da decisão. Impedido o Ministro Luiz Fux (Presidente). Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber (Vice-Presidente). Plenário, 18.12.2020 (Sessão realizada por videoconferência - Resolução 672/2020/STF)". A Ementa número 5 daquele julgado(ADC 58) tem o seguinte conteúdo: "5. Confere-se interpretação conforme à Constituição ao art. 879, §7º, e ao art. 899, §4º, da CLT, na redação dada pela Lei 13.467, de 2017, definindo-se que, até que sobrevenha solução legislativa, deverão ser aplicados à atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial e à correção dos depósitos recursais em contas judiciais na Justiça do Trabalho os mesmos índices de correção monetária e de juros vigentes para as hipóteses de condenações cíveis em geral (art. 406 do Código Civil), à exceção das dívidas da Fazenda Pública que possui regramento específico (art. 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009), com a exegese conferida por esta Corte na ADI 4.357, ADI 4.425, ADI 5.348 e no RE 870.947-RG (tema 810)." Toda a tônica do voto do relator da ADC número 58, ministro Gilmar Mendes, ao criar inusitada fórmula de incidência de correção monetária e juros de mora sobre os débitos trabalhistas, esteve fundada em alegado tratamento isonômico, também denominado de "integridade sistêmica do plexo normativo infraconstitucional", com as dívidas civis objeto de controvérsia perante à Justiça Comum, conforme trechos a seguir destacados: "Em termos bastante objetivos: não se pode, a pretexto de corrigir uma inconstitucionalidade, incorrer-se em outra. Valendo-se da técnica de interpretação conforme à Constituição, a proposta que trago à colação é a de que, uma vez afastada a validade da TR, seja utilizado, na Justiça Trabalhista, o mesmo critério de juros e correção monetária utilizado nas condenações cíveis em geral. Essa solução, ao meu ver, atende à integridade sistêmica do plexo normativo infraconstitucional, já que, salvo disposição em sentido contrário, a rigor, na fase de liquidação da sentença, deve-se observar a regra geral do art. 406 do Código Civil, o qual dispõe que "quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional. (...) Sendo assim, posiciono-me pela necessidade de conferirmos interpretação conforme à Constituição ao art. 899, §4º, da CLT, na redação dada pela Lei 13.467, de 2017, definindo-se que, até que sobrevenha solução legislativa, deverão ser aplicados à atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial e à correção dos depósitos recursais em contas judiciais na Justiça do Trabalho os mesmos índices de correção monetária e de juros vigentes para as hipóteses de condenações cíveis em geral (art. 406 do Código Civil)." A partir do que restara decidido pelo Supremo Tribunal Federal nos autos da ADC nº 58, em caráter vinculante e com efeitos erga omnes, inclusive, a inusitada e surpreendente solução adotada pelo Tribunal possui validade até a edição de lei nova reguladora da correção monetária e dos juros de mora. Surgindo no cenário, após a apreciação da ADC 58, lei civil que estabelece outros parâmetros relacionados à correção monetária e aos juros de mora sobre dívidas cujos índices respectivos deixaram de ser pactuados contratualmente, os seus preceitos devem ser aplicados também em relação aos débitos trabalhistas, na esteira do pronunciamento do STF naquela ação de controle concentrado. Há superveniência de lei civil tratando da correção monetária. No objeto do interesse, a Lei nº 14.905, de 28 de junho de 2024, tem o seguinte conteúdo: Art. 1º Esta Lei altera a Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), para dispor sobre atualização monetária e juros. Art. 2º A Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), passa a vigorar com as seguintes alterações: "Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros, atualização monetária e honorários de advogado. Parágrafo único. Na hipótese de o índice de atualização monetária não ter sido convencionado ou não estar previsto em lei específica, será aplicada a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurado e divulgado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou do índice que vier a substituí-lo." (NR) Art. 406. Quando não forem convencionados, ou quando o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, os juros serão fixados de acordo com a taxa legal. § 1º A taxa legal corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), deduzido o índice de atualização monetária de que trata o parágrafo único do art. 389 deste Código. Em primeiro lugar, cabe dizer que a decisão do STF(ADC nº 58) não é inteiramente suplantada pela Lei nº 14.905 de 28 de junho de 2024. Esclareço. Até o pronunciamento do STF naquela Ação Direta de Constitucionalidade(58) os débitos trabalhistas eram apurados, quando da aplicação de correção monetária e juros de mora, de acordo com a legislação trabalhista, que jamais foi omissa a esse respeito. O Supremo Tribunal Federal afastou do mundo jurídico as normas trabalhistas reguladoras da correção monetária e dos juros de mora, ainda que não tenha declarado expressamente nenhuma inconstitucionalidade das normas da Lei nº 8.177 de 1991 e de outras. Não obstante a lei nova civil, o STF fixou comandos os quais devem dialogar ou colocar em xeque toda e qualquer alteração legislativa em torno da correção monetária e dos juros de mora sobre os débitos trabalhistas. Por outro lado, havendo lei civil tratando especificamente da correção monetária e dos juros de mora, os seus preceitos devem ser aplicados também na época da apuração dos débitos trabalhistas. Como mera decorrência, a Lei nº 14.905 de 28 de junho de 2024, que deu nova redação aos artigos 389 e 406 do Código Civil Brasileiro, aplica-se aos débitos trabalhistas. Segundo tal compreensão, tenho que a Lei nº 14.905 de 28 de junho de 2024, que deu nova redação aos artigos 389 e 406 do Código Civil Brasileiro, aplica-se aos débitos trabalhistas. Os comandos legais novos impõem a aplicação do IPCA-E como fator de atualização monetária dos débitos trabalhistas, desde a data da exigibilidade de cada parcela(parágrafo único do artigo 389 do Código Civil Brasileiro). Desde o ajuizamento da ação trabalhista, registre-se, a taxa de juros de mora é a Selic(§1º do artigo 406 do CCB), mas agora com a dedução do índice de atualização monetária apurado pelo IPCA-E. Considerando o quadro atual, com a taxa Selic muito mais elevada do que o IPCA-E, na prática, os juros e a correção monetária corresponderão ao percentual da taxa Selic. Outra será a situação quando a SELIC for reduzida, como chegou acontecer no final dos anos 2010(2% ao ano) e a inflação estiver elevada. A ordem dos produtos, nesse caso, altera os fatores. Há um limite para a dedução, que é o percentual mais baixo de qualquer um dos institutos - correção monetária e juros de mora-. No momento atual, portanto, as mudanças legislativas guiadas pelas orientações advindas da decisão do STF nos autos da ADC 58,não alteraram praticamente nada O legislador acabou legitimando as inovações regressivas levadas a cabo antes pelo Supremo Tribunal Federal, como havia feito também o legislador constituinte reformador, ao modificar com redução a atualização monetária e os juros de mora sobre as dívidas pagas por precatório, mediante a introdução da taxa Selic como fator agregador dos dois institutos( Emenda Constitucional nº 113, de 8 de dezembro de 2021). Dou parcial provimento ao recurso ordinário do reclamado para complementar a prestação jurisdicional acerca do tema e determinar que a correção monetária seja apurada de acordo com o índice do IPCA-E, desde a data de exigibilidade de cada uma das parcelas deferidas, até o dia do ajuizamento da ação com o acréscimo dos juros nessa fase pré-processual, equivalentes à TRD(vide decisão do STF na ADC 58). Na fase judicial, continuará incidindo a correção monetária como antes fora anunciado, além dos juros de mora com base na taxa Selic, mas com a dedução do índice de correção monetária antes definido. 2.2 - RECURSO ADESIVO DO RECLAMANTE 2.2.1. ACIDENTE DE TRABALHO. PRESCRIÇÃO Na inicial o reclamante descreveu ter sofrido acidente do trabalho durante uma partida de futebol na primeira semana de fevereiro/2017, "lesionando gravemente seu ombro esquerdo e ficando cerca de 6 (seis) meses afastado de suas atividades esportivas." Postulou o pagamento de indenização por danos morais e materiais. A Magistrada originária reconheceu a prescrição das pretensões anteriores a 04.10.2018, incluindo aquelas relacionadas ao acidente de trabalho, nos seguintes termos: "3.2. DA PREJUDICIAL DE MÉRITO - PRESCRIÇÃO Reconhecida, no item anterior, a unicidade contratual, rejeito a prejudicial de prescrição total suscitada pelo Reclamado haja vista que, rescindido o contrato de trabalho do Reclamante em 10/11/2021, o ajuizamento da presente ação em 4/10/2023 observou o biênio constitucional. Contudo, havendo pleitos que abrangem parcelas vencidas a partir de Dezembro/2016, parte delas se encontra soterrada pela prescrição quinquenal (CF, art. 7°, XXIX e Súmula n° 308/TST). Desta forma, tendo em vista que a presente ação apenas foi ajuizada em 4/10/2023 (fls.1), acolho a prejudicial de prescrição parcial e julgo extinto o processo com resolução do mérito (CPC/2015, art. 487, II) com relação às parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio a contar da propositura da presente ação, ou seja, 4/10/2018. Tendo em vista que tanto o acidente de trabalho quanto a consolidação das lesões do Autor e, ainda, a não contratação de Seguro Acidente dizem respeito a fatos ocorridos no período prescrito, são igualmente atingidos pela prescrição ora declarada." Em recurso, o reclamante invoca a tese de lesão continuada, não incidindo a prescrição reconhecida na origem. Vejamos. O termo inicial do prazo prescricional da indenização por danos decorrentes de acidente do trabalho é a data em que o trabalhador teve ciência inequívoca da incapacidade laboral ou do resultado gravoso para a saúde física e/ou mental. No âmbito desta Corte, pacificou-se, por meio do item I do Verbete n.º 32/2008, que a actio nata, para a demanda envolvendo a indenização por danos, materiais ou morais, decorrentes do acidente e doença profissionais, surge na data da ciência inequívoca da perda da capacidade laboral. Referida jurisprudência estabelece que "A prescrição da pretensão de reparação de dano, defluente de acidente ou doença profissionais, tem seu marco inicial na data da ciência inequívoca da perda da capacidade laboral (súmulas 278/STJ e 230/STF)". Acerca da ciência inequívoca, ela, na minha leitura, coincide com a data em que se tem conhecimento da totalidade das dimensões geradas com o acidente, seja por intermédio da concessão de aposentadoria por invalidez mediante ato administrativo do órgão previdenciário, seja por meio de decisão judicial. Assim, a data da ciência inequívoca, sobre a qual não deve pairar nenhuma controvérsia, a não deixar sequer dúvida sobre o evento, a intensidade presente e as suas definitivas consequências, coincide com o dia em que o trabalhador toma conhecimento da perda, parcial ou definitiva; ou seja, por meio de decisão judicial ou quando o órgão previdenciário atesta de modo definitivo qual é o estado de saúde do empregado, concedendo-lhe, por exemplo, aposentadoria por invalidez. É nesse momento que há, de fato, como regra, a ciência inequívoca da perda da capacidade laboral. No caso concreto, é incontroverso o acidente ocorrido em fevereiro/2017, com o retorno às atividades laborais em dezembro/2017. Não há notícia de sequelas do acidente ou de redução da capacidade laborativa após dezembro/2017. Com efeito, a ciência inequívoca das consequências do acidente ocorreu ainda em 2017. Logo, ante o reconhecimento do marco prescricional em 04.10.2018, as pretensões decorrentes estão soterradas pela prescrição, conforme decidido na origem. Nego provimento. 2.2.2. CLÁUSULA COMPENSATÓRIA A Magistrada da instância originária da causa indeferiu o pedido de pagamento relativo à cláusula compensatória, sob os seguintes fundamentos: "Indefiro o requerimento do Autor de condenação do Reclamado ao pagamento de Cláusula Compensatória pela rescisão antecipada de contrato por prazo determinado haja vista que foi firmado com o Reclamado novo contrato imediatamente após a rescisão daquele findo em 10/11/2021, conforme extrato CNIS carreado aos autos. " Em recurso, o reclamante reitera o pedido de pagamento relativo ao período restante do contrato rescindido antecipadamente. Na hipótese vertente, o Juízo do primeiro grau de jurisdição verificou que o vínculo com o reclamado não se encerrou em 10.11.2021. Pelo contrário, houve prorrogação do contrato com o mesmo empregador. Indevida, portanto, a cláusula compensatória, conforme decidido na origem. Nada a prover. III- CONCLUSÃO Ante o exposto, conheço do recurso adesivo do reclamante e, no mérito, nego-lhe provimento; conheço parcialmente do recurso do reclamado e, no mérito, dou-lhe parcial provimento para: a) esclarecer que, em relação à contribuição previdenciária patronal, incide o regime especial previsto no §6º do art. 22, da Lei 8.212/91; b) complementar a prestação jurisdicional acerca do tema e determinar que a correção monetária seja apurada de acordo com o índice do IPCA-E, desde a data de exigibilidade de cada uma das parcelas deferidas, até o dia do ajuizamento da ação com o acréscimo dos juros nessa fase pré-processual, equivalentes à TRD(vide decisão do STF na ADC 58). Na fase judicial, continuará incidindo a correção monetária como antes fora anunciado, além dos juros de mora com base na taxa Selic, mas com a dedução do índice de correção monetária antes definido. Fica mantido o valor da condenação, pois ainda compatível. Tudo nos termos da fundamentação. É o voto. ACÓRDÃO Por tais fundamentos, ACORDAM os Desembargadores da Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Região, em aprovar o relatório, conhecer do recurso adesivo do reclamante e, no mérito, negar-lhe provimento; conhecer parcialmente do recurso do reclamado e, no mérito, dar-lhe parcial provimento para: a) esclarecer que, em relação à contribuição previdenciária patronal, incide o regime especial previsto no §6º do art. 22, da Lei 8.212/91; b) complementar a prestação jurisdicional acerca do tema e determinar que a correção monetária seja apurada de acordo com o índice do IPCA-E, desde a data de exigibilidade de cada uma das parcelas deferidas, até o dia do ajuizamento da ação com o acréscimo dos juros nessa fase pré-processual, equivalentes à TRD(vide decisão do STF na ADC 58). Na fase judicial, continuará incidindo a correção monetária como antes fora anunciado, além dos juros de mora com base na taxa Selic, mas com a dedução do índice de correção monetária antes definido. Fica mantido o valor da condenação, pois ainda compatível. Tudo nos termos do voto do Desembargador Relator. Ementa aprovada. Julgamento ocorrido por unanimidade de votos, sob a Presidência do Desembargador Grijalbo Coutinho, com a participação dos Desembargadores Elaine Vasconcelos, André R. P. V. Damasceno, Dorival Borges e do Juiz convocado Denilson B. Coêlho. Ausente, justificadamente, a Desembargadora Flávia Falcão (na direção da Escola Judicial). Pelo MPT, a Dra. Valesca de M. do Monte (Procuradora Regional do Trabalho). Sessão Ordinária Presencial de 9 de julho de 2025 (data do julgamento). GRIJALBO FERNANDES COUTINHO Desembargador Relator BRASILIA/DF, 11 de julho de 2025. MARIA APARECIDA FONSECA MATOS, Servidor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- BRASILIENSE FUTEBOL CLUBE
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Auto Posto Cinco Estrelas Ltda x Warley Santana Teixeira
ID: 262388987
Tribunal: TRT10
Órgão: 1ª Turma
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 0000913-52.2022.5.10.0019
Data de Disponibilização:
29/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DANIEL MUNIZ DA SILVA
OAB/DF XXXXXX
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RACHEL FARAH
OAB/DF XXXXXX
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NATALIA SANTOS MARQUES ALENCAR
OAB/DF XXXXXX
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THAMY DE SOUZA RIBEIRO DA SILVA
OAB/DF XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 1ª TURMA Relator: LUIZ HENRIQUE MARQUES DA ROCHA 0000913-52.2022.5.10.0019 : AUTO POSTO CINCO ESTRELAS LTDA : …
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 1ª TURMA Relator: LUIZ HENRIQUE MARQUES DA ROCHA 0000913-52.2022.5.10.0019 : AUTO POSTO CINCO ESTRELAS LTDA : WARLEY SANTANA TEIXEIRA PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO PROCESSO n.º 0000913-52.2022.5.10.0019 - RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA (1009) RELATOR(A): Juiz Convocado LUIZ HENRIQUE MARQUES DA ROCHA RECORRENTE: AUTO POSTO CINCO ESTRELAS LTDA ADVOGADO: DANIEL MUNIZ DA SILVA RECORRIDO: WARLEY SANTANA TEIXEIRA ADVOGADO: NATALIA SANTOS MARQUES ALENCAR ADVOGADO: THAMY DE SOUZA RIBEIRO DA SILVA ADVOGADO: RACHEL FARAH ORIGEM : 19ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA/DF CLASSE ORIGINÁRIA: Ação Trabalhista - Rito Ordinário (JUÍZA THAIS BERNARDES CAMILO ROCHA) emv06 EMENTA DIREITO DO TRABALHO. RECURSO ORDINÁRIO. PARCIALIDADE DE TESTEMUNHA. DESCONTOS INDEVIDOS. HORAS EXTRAS. RECONHECIMENTO DE CARGO DE CONFIANÇA. PROVIMENTO PARCIAL. I. CASO EM EXAME Recurso ordinário interposto pela reclamada contra sentença que deu validade ao depoimento de testemunha contraditada, deferiu restituição de descontos salariais e condenou ao pagamento de horas extras. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: (i) se a testemunha que litigou contra a reclamada possui impedimento para depor; (ii) se há comprovação de descontos indevidos realizados na remuneração do reclamante; e (iii) se a função exercida pelo reclamante se enquadra no art. 62, II, da CLT, afastando o direito às horas extras. III. RAZÕES DE DECIDIR A simples existência de ação contra o empregador não torna suspeita a testemunha, conforme a Súmula 357 do TST. Ausência de prova concreta de parcialidade. Não restou demonstrado nos autos que os valores apontados na inicial foram efetivamente descontados da remuneração do reclamante, sendo frágil a prova testemunhal sobre supostos pagamentos em espécie para reparação de furos de caixa. A documentação juntada aos autos e as provas orais comprovam o efetivo exercício de cargo de gestão pelo reclamante, com poderes de mando, gestão financeira e de pessoal e responsabilidade sobre a unidade, além da percepção de gratificação compatível com a função e anotação na CTPS. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso ordinário conhecido e parcialmente provido para excluir a condenação à restituição de descontos indevidos e ao pagamento de horas extras. Tese de julgamento: "1. A existência de ação trabalhista contra o mesmo empregador não torna, por si só, suspeita a testemunha. 2. O ônus da prova da realização de descontos indevidos na remuneração do empregado incumbe ao reclamante, que dele não se desincumbiu. 3. O exercício de cargo de gestão, com poderes de mando, afasta o direito às horas extras, nos termos do art. 62, II, da CLT." Dispositivos relevantes citados: CLT, arts. 62, II, e 818; CPC, art. 373; CC, art. 944. Jurisprudência relevante citada: TST, Súmula 357. RELATÓRIO A Exma. Juíza THAIS BERNARDES CAMILO ROCHA, da MM. 19ª Vara do Trabalho de Brasília/DF, por intermédio da sentença ID. ebe2e36, julgou procedentes em parte os pedidos contidos na ação trabalhista interposta por WARLEY SANTANA TEIXEIRA em face de AUTO POSTO CINCO ESTRELAS LTDA. Interpõe recurso ordinário a reclamada ao ID. 4ef227f. Contrarrazões do reclamante ao ID. 75a032b. Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, porquanto ausentes as hipóteses insertas no art. 102 do RITRT10. É o relatório. FUNDAMENTAÇÃO V O T O ADMISSIBILIDADE Preenchidos os pressuposto processuais objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso ordinário da reclamada. MÉRITO PARCIALIDADE DE TESTEMUNHA A recorrente afirma ter a sua condenação se escorado basicamente no depoimento de testemunha cuja isenção e imparcialidade não se mostram presentes. Aponta que para além da postulação da testemunha, em seu próprio processo contra a mesma ré, de reconhecimento de elementos a supostamente justificarem a rescisão indireta do contrato de trabalho, ..."só a circunstância de a testemunha pleitear indenização por dano moral, por si só, já lhe retira a isenção do ânimo. Isso porque confessa que teve abalo moral com determinada conduta patronal, não se podendo presumir que o depoente seria capaz de separar as circunstâncias." Pede seja invalidada a respectiva prova. A par da ata de audiência juntada ao ID. 27a78fc, percebe-se ter a testemunha convidada pelo reclamante restado contraditada sob a alegação de possuir demanda contra a ré, em que postula a rescisão indireta do contrato de trabalho, além de indenização por danos morais. Na ocasião, a Instância de origem afastou a pecha de parcialidade da testemunha registrando que ..."indagado pelo Juízo, o depoente disse que moveu ação em face da reclamada, tendo o feito sido solucionado através de acordo. Afirma que não possui qualquer mágoa ou ressentimento da empresa e que o pleito de dano moral formulado em seu processo estava fundado na alegação de desvio de função. Diante de tais declarações, e à míngua de prova de qualquer elemento que revele o comprometimento da isenção de ânimo do depoente, rejeito a contradita. Oportuno invocar ainda o entendimento consubstanciado na Súmula 357 do TST. Protestos da reclamada." A movimentação de ação pela testemunha contra a empresa ré, com interstício de cerca de apenas um ano entre as ações, apontando a existência de motivos bastantes para rescisão indireta da respectiva relação empregatícia, além de direito a reparação por danos à sua esfera íntima, efetivamente revela forte indício de que a isenção de ânimo da parte depoente poderá sofrer conturbação, exigindo do julgador especial atenção com a confiabilidade a ser emprestada à prova. Todavia, não a invalida de pronto. Com efeito, conforme orienta a Súmula 357 do TST, ..."não torna suspeita a testemunha o simples fato de estar litigando ou de ter litigado contra o mesmo empregador." Nesse panorama, efetivamente cumpria ao Juízo originário a realização da oitiva da testemunha em questão, para então lhe conferir a eventual confiabilidade plena, ou não, a par da coerência e do confronto das informações prestadas com os demais elementos de prova dos autos. Portanto, não há que se falar em, preliminarmente ao exame de mérito das questões discutidas no processo, invalidar-se o testemunho questionado, por imparcialidade. Nego provimento. DESCONTOS INDEVIDOS Na inicial, o reclamante aponta ter iniciado no emprego como frentista em 14/8/2020, sendo que após ter passado a eventualmente exercer função de gerente do posto veio a experimentar descontos indevidos na sua remuneração, cujo último salário teria sido de R$ 2.961,34, vindo a pedir demissão em 18/1/2022. Aduz que "todas as vezes em que havia quebra de caixa as diferenças eram descontadas do salário do reclamante quando os outros frentistas não pagavam". Relaciona diversos descontos de seus salário, que teriam ocorrido no período delimitado entre 26/10/2020 e pelo menos 8/12/2021, em valores alcançando mais de trinta mil reais, cuja comprovação estaria estampada nas diversas advertências recebidas em razão da responsabilidade pelas diferenças de caixa, às quais juntou à exordial. Em sua contestação, a reclamada aponta ter alçado o reclamante ao cargo de gerente poucos dias após sua contratação, em substituição ao gerente geral do posto, então lhe pagando gratificação por desvio de função, condição mantida até 30/6/2021, quando efetivado no referido encargo. Afirma inverídica a ofensiva do autor, pontuando que as advertências em questão de fato se referiram a diferenças de caixa, todavia não se relacionando a furos de caixa gerados pelos frentistas apenas, mas a efetivas diferenças da contabilidade empresarial, incluindo verdadeiros desfalques no caixa da empresa, sendo os respectivos valores referenciados apenas para escora das penalidades administrativa, não para descontos. Assevera que nenhum dos valores apontados na inicial teriam restado descontados do empregado, sendo que no decorrer de todo o pacto teria descontado do empregado apenas o valor indicado no seu TRCT, fruto de compensação rescisória. Em réplica, o autor apenas retomou sua tese da exordial, acrescentando que a confissão acerca do descontou em TRCT também comprovaria o hábito dos descontos indevidos. Eis o trato conferido à questão pela Instância ordinária: "Relata o autor que, no exercício do cargo de gerente, sofreu descontos em seu salário, referentes à quebra de caixa de outros frentistas, sempre que as diferenças encontradas não eram quitadas. Sustenta a ilegalidade dos descontos que, juntos, somaram o importe de R$30.775,47, conforme registrado nas advertências e suspensões aplicadas. Alega, por fim, que deixou de receber as ferias 2020/2021, eis que os valores das férias foram descontados a título de quebra de caixa. Pretende, assim, a restituição dos valores indevidamente descontados, e o pagamento das férias 2020/2021 em dobro. Em defesa, a reclamada alega que a hipótese não se refere a simples quebra de caixa, mas a desfalque/desaparecimento de valores de grande monta do caixa da empresa. Argumenta que o autor sempre exerceu o cargo de gerente, sendo o responsável por manter o controle financeiro/fluxo de caixa do posto, razão pela qual era o único empregado a receber as punições relativas a tal questão. Argumenta, contudo, que os valores especificados nas aludidas advertências serviram apenas como justificativa e contextualização da punição, não tendo sido descontados ou cobrados do autor. Sustenta, por fim, que o único valor descontado foi o montante de R$937,56, registrado no TRCT. Pois bem. A documentação juntada às fls. 34/51 revela que o autor recebeu diversas advertências por "incontinência de conduta ou mau procedimento" e "desídia no desempenho das respectivas funções", em razão de ter sido constatada "falta de caixa", em valores diversos, discriminados individualmente em cada penalidade aplicada. A ré não impugnou a totalidade das advertências e respectivos valores lançados na planilha de fl. 144 do PDF da inicial, alegando, contudo, não ter realizado a cobrança dos valores, especificando-os tão somente para fins de contextualização das punições. Os contracheques de fls. 257/277 do PDF de fato não evidenciam nenhum desconto a título de quebra de caixa do contracheque obreiro. Inquirido em audiência, o reclamante afirmou que os descontos não foram efetuados em contracheque, esclarecendo que o supervisor apresentava os valores relativos aos furos de caixa e cobrava do depoente o pagamento em espécie, para ser entregue ao dono da empresa. (ata de fls. 337 do PDF) Referida prática foi confirmada pela prova oral produzida nos autos. Vejamos: "que o depoente trabalhou para a reclamada de 12/03/2021 a março ou junho de 2023, na funçao de frentista; que o depoente trabalhou diretamente com o reclamante; que o reclamante era gerente; ... que ja trabalharam funcionarios de ma indole que deixaram furos de caixa, entao o reclamante tinha que pagar; que o depoente ja presenciou o supervisor cobrando o reclamante; que o depoente nao se recorda dos valores cobrados; que o depoente ja viu o reclamante fazendo entrega de dinheiro em especie para o supervisor, entretanto, o depoente nao sabe informar o montante; que o depoente presenciou esse pagamento somente uma vez; ... que as retiradas do caixa sao feitas na "boleta" e jogadas no cofre; que apos ser retirado o valor, e feita a conferência pelo gerente ou pelo chefe de pista; que o frentista e o responsavel (gerente ou chefe de pista) assinam a boleta; que entao o dinheiro e colocado no cofre e a boleta fica no caixa, depois o carro-forte recolhe; que o supervisor participa desse processo, pois ele se esta faltando algo no caixa, o depoente acredita que isso e feito nos dias em que ele comparece ao posto; indagado pelo procurador da reclamada sobre o motivo pelo qual o depoente afirmou que o pagamento realizado pelo reclamante ao supervisor se refere a quebra de caixa, o depoente explica que nessa ocasiao em que o depoente presenciou o reclamante entregando uma quantia em especie para o supervisor, o depoente tinha presenciado anteriormente o reclamante e o supervisor discutindo ou conversando sobre um furo de caixa que ele teria que pagar; que se o reclamante nao pagasse, ate onde o depoente sabe, o supervisor teria que fazê-lo; ..." (testemunha do autor, Sr. Dionathan Henrique de Sousa dos Santos, Ata de fls. 338 do PDF) Extrai-se do depoimento supra transcrito que o reclamante era cobrado pelo supervisor acerca dos furos de caixa dos frentistas, e o pagamento respectivo era realizado em espécie. Conquanto não tenha indicado nenhum valor específico, a testemunha relatou ter presenciado o reclamante realizando entrega de dinheiro em espécie ao supervisor, sendo que, na referida ocasião, havia presenciado anteriormente o supervisor discutindo/conversando sobre um furo de caixa que o reclamante teria que pagar. A testemunha inquirida a convite da própria reclamada, Sr. Cássio Augusto de Souza, reforça tal conclusão. Com efeito, embora tenha afirmado que nunca presenciou o reclamante pagando furo de caixa, acabou por declarar que, no caso de furo de caixa, acredita que, caso o frentista não pague, o gerente paga a diferença. (ata de fls. 340 do PDF) É certo que o contrato de trabalho do autor dispôs acerca da possibilidade de o empregador efetuar descontos dos prejuízos dos danos causados pelo empregado, nos termos do art. 462, §1º da CLT. (cláusula 7ª, fls. 333 do PDF). Ocorre que, no caso presente, não há evidências de que o reclamado tenha tomado as diligências necessárias a fim de aferir se os furos de caixa foram decorrentes de atos praticados pelo autor, não sendo suficiente, para tanto, a alegação de que o controle financeiro do posto fosse de responsabilidade do reclamante, enquanto gerente. Não há nenhum indicativo de que a ré tenha realizado qualquer investigação acerca dos responsáveis pelos valores identificados como furo de caixa, nem mesmo em relação aos montantes mais expressivos, a exemplo dos períodos de 01 a 05/01/2021, 23 a 26/11/2021 e 01 a 05/12/2021, nos valores de R$ 2.380,89, 4.640,49 e 7.264,94, respectivamente. Assim, a prática adotada pela ré, de cobrar do autor as diferenças de furo de caixa dos frentistas, sem adotar nenhuma diligência que comprove que referidas faltas decorreram de atos praticados pelo autor, evidencia nítida transferência ao trabalhador dos riscos do negócio (art. 2º da CLT). Dessa forma, é devida a restituição dos valores pagos pelo obreiro a título de furos de caixa. Quanto aos valores efetivamente devidos, importante pontuar que o autor confessou, em seu depoimento, ter recuperado junto aos frentistas parte dos montantes pagos ao supervisor. Com efeito, o autor esclareceu que, após entregar o valor para o supervisor, recolhia o pagamento dos frentistas responsáveis. Vejamos: "... que o depoente entregava pagamento em especie para repor o dinheiro que tinha sido constatado como furo de caixa; que o depoente entregava esse dinheiro na mao do supervisor Humberto, que o repassava ao dono da empresa; que esses pagamentos ocorriam todo dia 1º de cada me#s, apos o fechamento do caixa; que quanto ao pagamento de sete mil reais, o depoente esclarece que pagou quatro mil e no dia seguinte, quando caiu o valor de suas ferias, pagou mais tre#s mil; ... que o segundo maior valor que teve que pagar foi de cinco mil reais; ... o depoente esclarece que o furo de caixa era dos frentistas, que por isso depois que o depoente entregava o valor para o supervisor, recolhia o pagamento dos frentistas responsaveis, entretanto, esse pagamento dos frentistas nunca totalizava o valor pago pelo depoente, de forma antecipada, sempre faltava alguma coisa, o depoente diz que quanto ao furo de 7 mil reais, conseguiu pegar 2 mil reais com os frentistas e depois foi cobrando referidos funcionarios pois tinha que colocar o dinheiro no caixa, entretanto, nunca conseguiu recuperar o valor total, recuperou somente 3 mil reais no total; que o gerente era responsavel por todos os caixas do posto; que o depoente fazia confere#ncia do caixa com cada frentista, quando do fechamento." (depoimento do reclamante, Ata de fls. 336/337 do PDF) Nota-se, pelas declarações prestadas pelo autor, que este cobrava dos frentistas os valores pagos antecipadamente. Embora tenha declarado que nunca conseguiu recuperar o valor total, exemplificou que, no pagamento realizado de R$7 mil, recuperou o total de R$3 mil, o que corresponde a aproximadamente 40% do valor pago. Assim, a fim de evitar o enriquecimento ilícito do reclamante, tenho que aproximadamente 40% dos valores por ele custeados a título de furo de caixa foram recuperados junto aos frentistas. Ante o exposto, defiro ao autor a restituição de R$18.465,28, correspondente a 60% do total apontado à inicial a título de cobrança de furo de caixa. Indefiro o pagamento das férias 2020/2021, em dobro, eis que a parcela foi quitada pelo empregador, conforme comprovantes de fls. 278/280 do PDF. Registro que o fato de o autor ter utilizado referida quantia para pagar o furo de caixa cobrado pelo réu não autoriza novo pagamento da parcela, mormente considerando a restituição dos valores indevidamente cobrados, ora deferida". (grifos, todos, do original) A recorrente renova não ter imposto descontos à remuneração obreira, representando sua condenação violação aos artigos 944 do Código Civil, 373 do CPC e 818 da CLT, porquanto a apontada falta deveria ter sido robustamente comprovada, mas não o fora. Aponta que ..."o reclamante, somente durante o seu depoimento, confessou que não houve prejuízo de todo o valor contido na petição inicial, uma vez que parte dos valores foram "devolvidos" pelos frentistas a ele. Ora, se o reclamante faz essa confissão, competia a ele provar especificamente qual foi o seu prejuízo, o que não fez. Caso não fosse assim, presumir-se-ia como verdade tudo o que foi descrito na inicial, forçando a reclamada a produzir prova negativa, o que, concessa venia, não pode ser aceito por essa Especializada." Também afirma ..."que a sentença vinculou os alegados descontos às advertências de ID e798fdb. Ocorre que todas essas advertências são referentes ao mesmo ano (2021). A condenação, na forma como foi elaborada, faz crer, portanto, que no ano de 2021 o reclamante não recebeu qualquer valor de salário em vários meses, uma vez que o montante de R$18.465,28 quase supera a soma dos salários recebidos naquele ano, o que, concessa venia, não faz o menor sentido e ofende a razoabilidade." Apontando ser irreal e imoral o respectivo pedido contido na inicial, devendo a condenação ser excluída, com imputação de penalidade ao autor por litigância de má-fé. Na hipótese, a prova documental efetivamente não corrobora a pretensão da inicial. Os alegados descontos na remuneração obreira não aconteceram, conforme se verifica dos contracheques, de forma alguma havendo maneira de se vincular as "faltas de caixa" relatadas nas advertências ao autor com eventuais descontos dos valores nelas estampados. O único desconto havido na remuneração obreira no curso da relação foi no TRCT, a título de "falta de caixa", no valor de R$ 937,56. Porém, inexiste impugnação ao desconto no documento e a inicial não traz insurgência alguma quanto ao ponto, também não apontando a parcela como desconto indevido e eventualmente ensejador do dever de restituição. A réplica apenas trata o fato como comprovação de que os descontos de furos de caixa relatados na inicial efetivamente teriam ocorrido. Lado outro, é certo que o contrato de trabalho permite o desconto em tela(ID. Ff54f82). Em depoimento pessoal, porém, o reclamante reorientou a versão da inicial, para agora aduzir ..."que o depoente sempre exerceu a função de gerente"..., caindo por terra a eventualidade do exercício da gerência antes apontada. Também inovou e reorientou ao afirmar que ..."sofreu descontos, entretanto, não foram em contracheque, o depoente explica que o supervisor chegava com uma folha com valores de furos de caixa e pedia ao depoente para providenciar referido valor em espécie, para ser entregue ao dono da empresa, o depoente tinha que se virar e arrumar o dinheiro; que o depoente tem algumas dessas folhas, não tem todas; que os frentistas presenciavam essa cobrança." Ainda esclareceu ..."que o depoente entregava pagamento em espécie para repor o dinheiro que tinha sido constatado como furo de caixa; que o depoente entregava esse dinheiro na mão do supervisor Humberto, que o repassava ao dono da empresa; que esses pagamentos ocorriam todo dia 1º de cada mês, após o fechamento do caixa; que quanto ao pagamento de sete mil reais, o depoente esclarece que pagou quatro mil e no dia seguinte, quando caiu o valor de suas férias, pagou mais três mil, o depoente disse que seria mandado embora por justa causa e então negociou esse pagamento com a empresa; que o segundo maior valor que teve que pagar foi de cinco mil reais; que o depoente já ficou sem metade do seu salário para pagamento de furo de caixa; o depoente esclarece que o furo de caixa era dos frentistas, que por isso depois que o depoente entregava o valor para o supervisor, recolhia o pagamento dos frentistas responsáveis, entretanto, esse pagamento dos frentistas nunca totalizava o valor pago pelo depoente, de forma antecipada, sempre faltava alguma coisa, o depoente diz que quanto ao furo de 7 mil reais, conseguiu pegar 2 mil reais com os frentistas e depois foi cobrando referidos funcionários pois tinha que colocar o dinheiro no caixa, entretanto, nunca conseguiu recuperar o valor total, recuperou somente 3 mil reais no total; que o gerente era responsável por todos os caixas do posto; que o depoente fazia conferência do caixa com cada frentista, quando do fechamento." Já a testemunha ouvida a rogo do autor, Sr. DIONATHAN, afirmou .."que já trabalharam funcionários de má índole que deixaram furos de caixa, então o reclamante tinha que pagar; que o depoente já presenciou o supervisor cobrando o reclamante; que o depoente não se recorda dos valores cobrados; que o depoente já viu o reclamante fazendo entrega de dinheiro em espécie para o supervisor, entretanto, o depoente não sabe informar o montante; que o depoente presenciou esse pagamento somente uma vez." Em seguida, a ata de audiência registra que a testemunha ..."indagado pelo procurador da reclamada sobre o motivo pelo qual o depoente afirmou que o pagamento realizado pelo reclamante ao supervisor se refere à quebra de caixa, o depoente explica que nessa ocasião em que o depoente presenciou o reclamante entregando uma quantia em espécie para o supervisor, o depoente tinha presenciado anteriormente o reclamante e o supervisor discutindo ou conversando sobre um furo de caixa que ele teria que pagar; que se o reclamante não pagasse, até onde o depoente sabe, o supervisor teria que fazê-lo; que o depoente não sabe dizer como se dava a comunicação entre reclamante e supervisor." Com esse conteúdo, inclusive inseguro e necessitando de esclarecimento, novamente vacilante, considero frágeis e despiciendas as afirmações da testemunha acerca do seu testemunho ocular de uma, e somente uma, entrega de numerário em espécie pelo autor ao supervisor. Ante todas as alegações das partes e os elementos de prova acerca do pedido, não vejo condições de manutenção da condenação. Os alegados descontos na remuneração comprovadamente não aconteceram, não se desincumbindo o reclamante do seu ônus processual. A inovação trazida pelo autor em audiência, contra a qual sequer houve chance de defesa da reclamada em contestação, além de alterar substancialmente o pedido da inicial, traz consigo a necessidade de indicação específica, ao menos por amostragem, dos eventuais valores de furos de caixa supostamente não quitados pelos frentistas e arcados pelo reclamante gerente, ônus particular acerca do qual igualmente não logrou sucesso o autor. Ademais, a alegação de que a quitação dos furos de caixa se daria pessoalmente e em espécie não se coadunam com o compulsar das movimentações da conta corrente obreira juntadas aos autos, abrangendo o período de 23/7/2020 a 30/6/2021. Embora os créditos dos salários estejam ali demonstrados, os volumes de saques registrados nem de longe se afinariam com as necessárias retiradas para fazer frente a eventuais pagamentos, em espécie, das diferenças elencadas na inicial, ao supervisor. Aliás, ao início dos meses(até dia 15), diversos são os lançamentos de débitos em razão de compras pela rede shop, mas raríssimos e de pouca monta são os saques na conta salarial do reclamante débitos raros são os saques ao início dos meses. Portanto, também cai por terra a afirmação em depoimento pessoal no sentido de que os pagamentos em espécie ao supervisor "ocorriam todo dia 1º de cada mês", inclusive no referente ao mês de novembro/2021, período qual o reclamante aponta ter sido responsabilizado e pago 6(seis) diferenças de caixa, que juntas alcançariam mais de R$ 8.000,00, haja vista o extrato da conta corrente salarial do período de 2/11/2021 a 7/1/2022, também juntado pelo autor, ao ID. 48ad92d. Outrossim, a quitação dos altos valores de furos de caixa afirmados pelo autor soam irreais, mormente porquanto algumas vezes até mesmo superam, em muito, o próprio salário mensal recebido, alcançando cifra total quase equivalentes à soma da remuneração acumulada por ele durante o contrato de trabalho. Nesse panorama, independente das informações prestadas pela testemunha DIONATHAN, vejo não ter o autor logrado se desincumbir do seu ônus provatório relativo à comprovação do direito requerido, seja segundo a tese da inicial, ou mesmo quanto à verdade alternativa posta em audiência. Dou provimento ao recurso da reclamada para afastar sua condenação à restituição de valores supostamente "descontados" indevidamente de sua remuneração. JORNADA DE TRABALHO. GERENTE. ARTIGO 62, II, DA CLT Examinando o pleito obreiro de horas extras impagas, a Instância ordinária deu-lhe parcial provimento, condenando a reclamada recorrente, nestes termos: "Nos termos da exordial, o autor se ativava das 6h às 18h, sem intervalo intrajornada, à exceção dos domingos. Pretende o pagamento das horas extras laboradas, intervalo intrajornada, e reflexos. Contrapõe-se a ré, sustentando que o autor sempre exerceu o cargo de confiança de gerente, inicialmente em caráter de substituição e posteriormente de forma efetiva, não estado submetido ao controle de jornada, enquadrando-se na exceção do art. 62, II, da CLT. Pois bem. Registre-se inicialmente que o artigo 62, II, da CLT contempla dois requisitos para caracterização da hipótese excetiva invocada: um de ordem objetiva e um de índole subjetiva; quais sejam, distinção remuneratória em relação ao salário do cargo efetivo e elevadas atribuições e poderes de gestão. O atendimento aos requisitos referidos é cumulativo, a ausência de um deles afasta a hipótese de exceção invocada. Outrossim, referido dispositivo legal encerra uma presunção - de que referidos empregados, justamente pelo maior patamar na estrutura organizativa da empresa, não estão sujeitos a controle de jornada. Tal presunção não é absoluta. E a ré não demonstrou que o reclamante detivesse expressivos poderes de mando ou gestão, em molde a caracterizar a hipótese legal aventada em contestação (art. 373, II, do CPC). Conquanto tenha sido formalmente enquadrado no cargo de gerente, em substituição ou de forma efetiva, a prova oral produzida revela que o autor, embora exercesse função com fidúcia diferenciada, não possuía elevados poderes de mando e gestão, necessários à caracterização da hipótese excetiva em tela (art. 373, II, do CPC). Em audiência, o preposto da ré, embora tenha afirmado que o autor era o "chefe geral do posto", acabou por admitir que havia supervisão/fiscalização das atribuições do autor pelo supervisor (ata de fls. 338 do PDF) O autor não possuía poder admissional ou demissional. A testemunha Dionathan Henrique de Sousa revelou ter sido encaminhado ao reclamante somente após ter sido contratado pelo RH. (ata de fls. 339 do PDF) E a testemunha inquirida a convite da ré, Sr. Cássio Augusto de Souza, também afirmou que, quando foi conversar com o reclamante sobre a data de início, já estava contratado (ata de fls. 340 do PDF), donde se concluiu que o autor não detinha autonomia para a contratação de funcionários. Tampouco restou demonstrado que o autor detivesse poder demissional (art. 373, II, do CPC), não tendo as testemunhas presenciado nenhuma demissão. Ademais, apesar de a testemunha da ré ter declarado que o autor tinha autonomia para tomar as decisões de "problemas normais" do posto, acabou por revelar que, caso o autor não conseguisse resolver o problema, passava para o supervisor. Revelou ainda que a sua promoção, de frentista para chefe de loja, foi realizada pelo gerente juntamente com o supervisor. Assim, o que se extrai do contexto probatório é que o autor, embora detivesse certo grau de autonomia na gestão do posto, não possuía amplos poderes de mando e gestão, em molde a justificar a incidência do art. 62, II, da CLT. Reitere-se que, para caracterização da hipótese excetiva aventada pela ré, necessário o exercício de elevados poderes de gestão pelo empregado, de modo que este atue como espécie de longa manus do empregador, o que muito se distancia da hipótese dos autos. Resta, portanto, afastada a circunstância legal prevista no art. 62, II, da CLT. Quanto ao horário efetivamente cumprido pelo reclamante, assim foi produzida a prova oral: "que o depoente trabalhou para a reclamada de 12/03/2021 a marc#o ou junho de 2023, na func#ao de frentista; que o depoente trabalhou diretamente com o reclamante; ... que o depoente trabalhou preponderantemente na parte da tarde, das 14h as 22h, mas como se tratou de um periodo com falta de funcionarios no posto, trabalhou tambem na parte da manha; que o depoente sempre viu o reclamante trabalhando das 6h as 17h e pouco/18h; que o reclamante apenas nao trabalhava aos domingos; que o reclamante cumpriu sempre essa jornada; que o depoente nunca viu o reclamante tirar intervalo; ... que o depoente nunca viu o reclamante chegar mais tarde ou sair mais cedo; que tambem nunca viu o reclamante faltar ao trabalho;..."(testemunha do autor, Sr. Dionathan Henrique de Sousa dos Santos, Ata de fls. 338 do PDF) "que o depoente trabalha para a reclamada desde julho de 2019, ... que inicialmente o depoente trabalhava no horario da noite, de 15h as 23h, e depois foi para o horario de 6h as 14h; que o depoente acha que o reclamante entrava as 6h e saia as 18h, de segunda a sabado; que o depoente nao sabe o periodo de intervalo do reclamante; que o depoente acha que o reclamante trabalhava de 2a a 6a feira, sempre no horario acima relatado, que aos sabados trabalhava ate o meio-dia;..." (testemunha da ré. Sr. Cássio Augusto de Souza - Ata de fls. 340/341 do PDF) Nota-se que ambas as testemunhas relataram a jornada obreira de 6h às 18h, à exceção do sábado, não sabendo, nenhuma delas, informar acerca do período de intervalo. E o autor, inquirido em audiência, confessou que "trabalhava de 6h as 18h, de 2a a 6a feira; de 6h as 14h aos sabados e folgava aos domingos; que o depoente poucas vezes tirou 1 hora de intervalo, isso porque sempre tinha funcionario faltando e o depoente tinha que ir para a pista; que o depoente conseguiu tirar a hora integral de intervalo somente duas vezes na semana, que nas demais ocasioes tirava de 10 a 15 minutos de intervalo;... " (Ata de fls. 336 do PDF) Assim, com base na prova oral produzida, e observados os limites da inicial e do depoimento pessoal do reclamante, fixo a seguinte jornada de trabalho para o obreiro: das 06h às 18h de segunda a sexta, e das 06h às 14h aos sábados, com uma hora de intervalo duas vezes na semana, e 15 minutos de intervalo nos demais dias. Ante o exposto, defiro ao reclamante o pagamento das horas extras laboradas, assim entendidas aquelas excedentes à 44ª hora semanal, acrescidas do adicional de 50%, observado o período imprescrito do pacto. Reflexos em férias acrescidas do terço, 13º salário e FGTS.". (grifos do original) Recorre a reclamada, insistindo no real exercício de função gerencial e com poder de mando pelo reclamante, sendo os olhos do empregador, na unidade integrante da rede de postos de combustíveis. Destaca trechos das afirmações feitas pelas testemunhas e ressalta as provas documentais, que inequivocamente demonstrariam a gestão do reclamante sobre toda a operação do posto sob seu comando. Ao fim, pondera que ..."o fato de o supervisor, dentro da hierarquia empresarial, estar acima do reclamante não significa que todas as atribuições deste estarão absorvidas por aquele." Pede exclusão da condenação. De fato, os documentos coligidos aos autos demonstram à saciedade o formal exercício do encargo de gerente pelo autor, nos termos do art. 62, II, da CLT, com percepção de gratificação/remuneração expressivamente superior a 40% da função básica de frentista e, inclusive anotação da particularidade na CTPS, a partir da sua nomeação efetiva. O real exercício de poderes de gestão se encontra igualmente demonstrado a teor das provas documentais, que efetivamente demonstram sua responsabilidade pelo caixa da unidade, inclusive sua abertura e fechamento diário; ateste/recebimento das manutenções de equipamentos; assinatura e anuência com relatórios de auditoria externa; e gestão de empregados, seja para comunicar o exercício de encargo de chefia por seus subordinados e requerer o correspondente pagamento de remuneração adicional, para determinar a transferência de empregado para outra unidade, bem como para desligar funcionário que entende não adaptado ao serviço. Ressalte-se que as gestões relativas aos empregados, mesmo em caso de dispensa, são de feições imperativas, não se revestindo de características de pedido e contando com repasse para as áreas competentes mediante atuação do supervisor, sempre com simples menção no sentido de ..."favor atender a solicitação do gerente Warley." Portanto, não se vislumbra submissão do gerente da unidade ao supervisor de 7 unidades, mas puro cumprimento dos trâmites hierárquicos da decisão. As provas documentais se contrapõem, assim, às afirmações obreiras de ..."que quanto às demissões, o depoente não tinha autonomia, apenas dizia para o supervisor que o funcionário 'x' não tinha dado certo, então o supervisor respondia que como o reclamante tinha contratado, deveria se virar com o referido funcionário; que o depoente também não podia aplicar advertência;... que o depoente não transferia funcionário de posto, apenas o supervisor poderia fazê-lo... que o supervisor era a autoridade máxima do posto, o depoente tinha 'algumas autoridades', mas não era a pessoa que mandava em tudo." Outrossim, ainda considero digno de nota que o reclamante, enquanto gerente, foi apenado com advertências porquanto o horário de abertura e fechamento do caixa do posto teria restado inobservado em algumas oportunidades, sendo exemplo sua abertura apenas às 8h46, ou mesmo às 23h01, e fechamento às 8h45 do dia seguinte e, inclusive, somente após mais de 24h. Situação que sugere alguma mobilidade dos horários de trabalho do autor, além de confirmação de sua responsabilidade pessoal pelo caixa. Quanto às provas orais, transcrevo seus trechos de algum relevo para a presente celeuma, a saber: "Primeira testemunha do reclamante: DIONATHAN[...] "que o depoente trabalhou para a reclamada de 12/03/2021 a março ou junho de 2023, na função de frentista; que o depoente trabalhou diretamente com o reclamante; que o reclamante era gerente; que o depoente apresentou currículo, foi chamado pelo RH, que pediu ao depoente para se apresentar ao gerente Warley, o qual fez a entrevista do depoente; que melhor esclarecendo, o depoente veio do RH já contratado, mas isso tem muito tempo; que o primeiro contato que o depoente teve com o reclamante foi quando chegou ao posto, já contratado; que o depoente não sabe quem procedia à dispensa de funcionários; que até onde o depoente sabe, o reclamante não poderia dispensar funcionário; que o depoente acredita que o RH e o supervisor procedessem à dispensa de funcionário, mas nunca presenciou uma demissão; que o reclamante aplicava advertências e suspensões; que as autoridades máximas do posto eram o reclamante enquanto gerente e o supervisor Humberto;[...] que o depoente não sabe informar se o reclamante tinha seus horários de trabalho controlados por alguém; que o supervisor comparecia ao posto cerca de três vezes por semana; PERGUNTAS DA PROCURADORA DO RECLAMANTE: que o reclamante não tinha autonomia para nenhuma decisão; que o depoente nunca viu o reclamante chegar mais tarde ou sair mais cedo; que também nunca viu o reclamante faltar ao trabalho; PERGUNTAS DO PROCURADOR DA RECLAMADA: que o reclamante ou o chefe de pista recebiam o combustível na empresa; que em caso de diferença de combustível, quem responde é o gerente; que o depoente já viu o reclamante fazendo conferência de estoque; que o depoente acredita que o reclamante e o chefe de pista eram os responsáveis por tal atribuição; que em caso de diferença no estoque quem responde é o gerente;[...] que indagado o depoente do motivo pelo qual afirmou que o reclamante não tinha autonomia decisória, o depoente acredita que em uma empresa com vários graus de funções, o reclamante não poderia chegar e mandar alguém embora sem falar com o supervisor, "é o que o depoente acha"". Nada mais. Primeira testemunha do reclamado(s): CÁSSIO[...] "que o depoente trabalha para a reclamada desde julho de 2019, inicialmente na função de frentista, posteriormente na funçao de chefe de loja e atualmente como chefe de pista; que o depoente trabalhou diretamente com o reclamante, o depoente exercia a função de frentista e o reclamante era gerente; que o depoente foi contratado pelo reclamante; que o depoente deixou o currículo no posto de Taguatinga, então ligaram para o depoente do RH, então o depoente fez o procedimento de entrega de documentos e foi conversar com o reclamante, mas o depoente já estava contratado; que o RH disse ao depoente que ele estava contratado; que o depoente foi conversar com o reclamante somente sobre a data que iria começar; que o depoente não sabe dizer direito quem demitia, se era o reclamante ou o reclamante junto com o RH; que pelo que se lembra o depoente não presenciou nenhuma demissão; que o gerente aplica advertências ou suspensões; que o depoente já presenciou o reclamante aplicando essas penalidades; que o depoente não sabe se mais alguém participava dessa decisão de aplicação de advertência/suspensão ou se seria somente o reclamante; que o gerente resolvia questões de folga de funcionários e escala;[...] que o depoente não sabe dizer se alguém controlava os horários de trabalho do reclamante;[...] PERGUNTAS DO PROCURADOR DA RECLAMADA: que o reclamante fez o treinamento do depoente; que o gerente era a autoridade máxima do posto;[...] ERGUNTAS DA PROCURADORA DO RECLAMANTE:[...] que o reclamante tinha autonomia para tomar as decisões do posto; que o chefe de pista bate o caixa e se tive algum problema que não conseguiu resolver, o gerente resolver;[...] que o reclamante tinha autonomia para decisões de "problemas normais", problemas do posto, que se ele não puder ele passa para o supervisor; que o gerente manda mais no posto que o supervisor, que o supervisor está acima do gerente; que o gerente juntamente com o supervisor fez a promoção do depoente de frentista para chefe de loja;[...]". Nada mais. Dessas provas, chama atenção que a testemunha DIONATHAN, embora tenha feito afirmações reveladoras de autonomia da gestão do autor e posteriormente se retratado em algumas oportunidades, em geral sugerindo menor alçada do gerente, em outras ocasiões apenas demonstrou dúvida lacônica, como ao dizer ..."que o depoente não sabe quem procedia à dispensa de funcionários"..., ..."que o depoente nunca viu o reclamante chegar mais tarde ou sair mais cedo"...; ..."que também nunca viu o reclamante faltar ao trabalho." Mas também deixou transparecer poderes especiais de gestão do autor ao aduzir ..."que o reclamante aplicava advertências e suspensões"..., ..."não sabe informar se o reclamante tinha seus horários de trabalho controlados por alguém"..., ..."que em caso de diferença de combustível, quem responde é o gerente"..., ..."em caso de diferença no estoque quem responde é o gerente." Após tudo isso, porém, novamente tendeu à retirada de poder do gerente, afirmando "que o reclamante não tinha autonomia para nenhuma decisão", sendo que, interpelado pelo patrono da reclamada acerca dessa afirmação, tergiversou aduzindo que "o depoente acredita que em uma empresa com vários graus de funções, o reclamante não poderia chegar e mandar alguém embora sem falar com o supervisor, 'é o que o depoente acha." Novamente, vejo pouca credibilidade no testemunho, mormente pelas divagações negativas quanto ao poder decisório do gerente, autoridade máxima presente no posto. A testemunha CÁSSIO, por sua vez, trouxe informações firmes no sentido de ..."que o gerente aplica advertências ou suspensões; que o depoente já presenciou o reclamante aplicando essas penalidades"..., ..."que o gerente resolvia questões de folga de funcionários e escala"..., ..."que o reclamante fez o treinamento do depoente"..., ..."que o gerente era a autoridade máxima do posto"..., ..."que o reclamante tinha autonomia para tomar as decisões do posto"... e ..."que o gerente manda mais no posto que o supervisor, que o supervisor está acima do gerente." A par de toda essa instrução, chego a conclusão diversa daquela empreendida pelo Juízo "a quo", porquanto vejo demonstrado no feito o regular poder de gestão que se espera de um gerente geral de uma unidade empresarial, com anotação em CTPS, remuneração, benesses e responsabilidades típicas da função. Dou provimento ao recurso da reclamada para, reconhecendo a subsunção do autor aos ditames do art. 62, II, da CLT, reformar a sentença que condenou a reclamada em horas extras. CONCLUSÃO Em face do exposto, conheço do recurso ordinário da reclamada e, no mérito, dou-lhe parcial provimento, para excluir suas condenações à restituição de descontos indevidos e pagamento de horas extras, nos termos da fundamentação. Invertida a sucumbência, custas de R$ 3.019,83 pelo autor, apuradas sobre o valor dado à causa(R$ 150.991,91), das quais dispensado, em razão do benefício da Justiça Gratuita. ACÓRDÃO Por tais fundamentos, ACORDAM os Integrantes da egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Região, por unanimidade, aprovar o relatório, conhecer do recurso ordinário da reclamada e, no mérito, por maioria, dar-lhe parcial provimento, para excluir suas condenações à restituição de descontos indevidos e pagamento de horas extras. Invertida a sucumbência, custas de R$ 3.019,83 pelo autor, apuradas sobre o valor dado à causa(R$ 150.991,91), das quais dispensado, em razão do benefício da Justiça Gratuita. Tudo nos termos do voto do Juiz Relator. Vencido o Desembargador Grijalbo Coutinho, que juntará declaração de voto. Ementa aprovada. Julgamento ocorrido sob a Presidência do Desembargador Grijalbo Coutinho, com a participação dos Juízes convocados Denilson B. Coêlho e Luiz Henrique Marques da Rocha. Ausentes, justificadamente, os Desembargadores Flávia Falcão (na direção da Escola Judicial), Elaine Vasconcelos (em licença médica), André R. P. V. Damasceno (em gozo de férias) e Dorival Borges (compromissos junto à ouvidoria). Pelo MPT, o Dr. Alessandro Santos de Miranda (Procurador Regional do Trabalho). Sessão Extraordinária Presencial de 25 de abril de 2025 (data do julgamento). assinado digitalmente Juiz Convocado LUIZ HENRIQUE MARQUES DA ROCHA Relator DECLARAÇÃO DE VOTO Voto do(a) Des(a). GRIJALBO FERNANDES COUTINHO / Desembargador Grijalbo Fernandes Coutinho Destaquei para divergir e manter a sentença pelos seus próprios e jurídicos fundamentos a seguir transcritos de maneira literal,quanto à DEVOLUÇÃO DE DESCONTOS e às HORAS EXTRAS: "Relata o autor que, no exercício do cargo de gerente, sofreu descontos em seu salário, referentes à quebra de caixa de outros frentistas, sempre que as diferenças encontradas não eram quitadas. Sustenta a ilegalidade dos descontos que, juntos, somaram o importe de R$30.775,47, conforme registrado nas advertências e suspensões aplicadas. Alega, por fim, que deixou de receber as ferias 2020/2021, eis que os valores das férias foram descontados a título de quebra de caixa. Pretende, assim, a restituição dos valores indevidamente descontados, e o pagamento das férias 2020/2021 em dobro. Em defesa, a reclamada alega que a hipótese não se refere a simples quebra de caixa, mas a desfalque/desaparecimento de valores de grande monta do caixa da empresa. Argumenta que o autor sempre exerceu o cargo de gerente, sendo o responsável por manter o controle financeiro/fluxo de caixa do posto, razão pela qual era o único empregado a receber as punições relativas a tal questão. Argumenta, contudo, que os valores especificados nas aludidas advertências serviram apenas como justificativa e contextualização da punição, não tendo sido descontados ou cobrados do autor. Sustenta, por fim, que o único valor descontado foi o montante de R$937,56, registrado no TRCT. Pois bem. A documentação juntada às fls. 34/51 revela que o autor recebeu diversas advertências por "incontinência de conduta ou mau procedimento" e "desídia no desempenho das respectivas funções", em razão de ter sido constatada "falta de caixa", em valores diversos, discriminados individualmente em cada penalidade aplicada. A ré não impugnou a totalidade das advertências e respectivos valores lançados na planilha de fl. 144 do PDF da inicial, alegando, contudo, não ter realizado a cobrança dos valores, especificando-os tão somente para fins de contextualização das punições. Os contracheques de fls. 257/277 do PDF de fato não evidenciam nenhum desconto a título de quebra de caixa do contracheque obreiro. Inquirido em audiência, o reclamante afirmou que os descontos não foram efetuados em contracheque, esclarecendo que o supervisor apresentava os valores relativos aos furos de caixa e cobrava do depoente o pagamento em espécie, para ser entregue ao dono da empresa. (ata de fls. 337 do PDF) Referida prática foi confirmada pela prova oral produzida nos autos. Vejamos: "que o depoente trabalhou para a reclamada de 12/03/2021 a março ou junho de 2023, na funçao de frentista; que o depoente trabalhou diretamente com o reclamante; que o reclamante era gerente; ... que ja trabalharam funcionarios de ma indole que deixaram furos de caixa, entao o reclamante tinha que pagar; que o depoente ja presenciou o supervisor cobrando o reclamante; que o depoente nao se recorda dos valores cobrados; que o depoente ja viu o reclamante fazendo entrega de dinheiro em especie para o supervisor, entretanto, o depoente nao sabe informar o montante; que o depoente presenciou esse pagamento somente uma vez; ... que as retiradas do caixa sao feitas na "boleta" e jogadas no cofre; que apos ser retirado o valor, e feita a conferência pelo gerente ou pelo chefe de pista; que o frentista e o responsavel (gerente ou chefe de pista) assinam a boleta; que entao o dinheiro e colocado no cofre e a boleta fica no caixa, depois o carro-forte recolhe; que o supervisor participa desse processo, pois ele se esta faltando algo no caixa, o depoente acredita que isso e feito nos dias em que ele comparece ao posto; indagado pelo procurador da reclamada sobre o motivo pelo qual o depoente afirmou que o pagamento realizado pelo reclamante ao supervisor se refere a quebra de caixa, o depoente explica que nessa ocasiao em que o depoente presenciou o reclamante entregando uma quantia em especie para o supervisor, o depoente tinha presenciado anteriormente o reclamante e o supervisor discutindo ou conversando sobre um furo de caixa que ele teria que pagar; que se o reclamante nao pagasse, ate onde o depoente sabe, o supervisor teria que fazê-lo; ..." (testemunha do autor, Sr. Dionathan Henrique de Sousa dos Santos, Ata de fls. 338 do PDF) Extrai-se do depoimento supra transcrito que o reclamante era cobrado pelo supervisor acerca dos furos de caixa dos frentistas, e o pagamento respectivo era realizado em espécie. Conquanto não tenha indicado nenhum valor específico, a testemunha relatou ter presenciado o reclamante realizando entrega de dinheiro em espécie ao supervisor, sendo que, na referida ocasião, havia presenciado anteriormente o supervisor discutindo/conversando sobre um furo de caixa que o reclamante teria que pagar. A testemunha inquirida a convite da própria reclamada, Sr. Cássio Augusto de Souza, reforça tal conclusão. Com efeito, embora tenha afirmado que nunca presenciou o reclamante pagando furo de caixa, acabou por declarar que, no caso de furo de caixa, acredita que, caso o frentista não pague, o gerente paga a diferença. (ata de fls. 340 do PDF) É certo que o contrato de trabalho do autor dispôs acerca da possibilidade de o empregador efetuar descontos dos prejuízos dos danos causados pelo empregado, nos termos do art. 462, §1º da CLT. (cláusula 7ª, fls. 333 do PDF). Ocorre que, no caso presente, não há evidências de que o reclamado tenha tomado as diligências necessárias a fim de aferir se os furos de caixa foram decorrentes de atos praticados pelo autor, não sendo suficiente, para tanto, a alegação de que o controle financeiro do posto fosse de responsabilidade do reclamante, enquanto gerente. Não há nenhum indicativo de que a ré tenha realizado qualquer investigação acerca dos responsáveis pelos valores identificados como furo de caixa, nem mesmo em relação aos montantes mais expressivos, a exemplo dos períodos de 01 a 05/01/2021, 23 a 26/11/2021 e 01 a 05/12/2021, nos valores de R$ 2.380,89, 4.640,49 e 7.264,94, respectivamente. Assim, a prática adotada pela ré, de cobrar do autor as diferenças de furo de caixa dos frentistas, sem adotar nenhuma diligência que comprove que referidas faltas decorreram de atos praticados pelo autor, evidencia nítida transferência ao trabalhador dos riscos do negócio (art. 2º da CLT). Dessa forma, é devida a restituição dos valores pagos pelo obreiro a título de furos de caixa. Quanto aos valores efetivamente devidos, importante pontuar que o autor confessou, em seu depoimento, ter recuperado junto aos frentistas parte dos montantes pagos ao supervisor. Com efeito, o autor esclareceu que, após entregar o valor para o supervisor, recolhia o pagamento dos frentistas responsáveis. Vejamos: "... que o depoente entregava pagamento em especie para repor o dinheiro que tinha sido constatado como furo de caixa; que o depoente entregava esse dinheiro na mao do supervisor Humberto, que o repassava ao dono da empresa; que esses pagamentos ocorriam todo dia 1º de cada me#s, apos o fechamento do caixa; que quanto ao pagamento de sete mil reais, o depoente esclarece que pagou quatro mil e no dia seguinte, quando caiu o valor de suas ferias, pagou mais tre#s mil; ... que o segundo maior valor que teve que pagar foi de cinco mil reais; ... o depoente esclarece que o furo de caixa era dos frentistas, que por isso depois que o depoente entregava o valor para o supervisor, recolhia o pagamento dos frentistas responsaveis, entretanto, esse pagamento dos frentistas nunca totalizava o valor pago pelo depoente, de forma antecipada, sempre faltava alguma coisa, o depoente diz que quanto ao furo de 7 mil reais, conseguiu pegar 2 mil reais com os frentistas e depois foi cobrando referidos funcionarios pois tinha que colocar o dinheiro no caixa, entretanto, nunca conseguiu recuperar o valor total, recuperou somente 3 mil reais no total; que o gerente era responsavel por todos os caixas do posto; que o depoente fazia confere#ncia do caixa com cada frentista, quando do fechamento." (depoimento do reclamante, Ata de fls. 336/337 do PDF) Nota-se, pelas declarações prestadas pelo autor, que este cobrava dos frentistas os valores pagos antecipadamente. Embora tenha declarado que nunca conseguiu recuperar o valor total, exemplificou que, no pagamento realizado de R$7 mil, recuperou o total de R$3 mil, o que corresponde a aproximadamente 40% do valor pago. Assim, a fim de evitar o enriquecimento ilícito do reclamante, tenho que aproximadamente 40% dos valores por ele custeados a título de furo de caixa foram recuperados junto aos frentistas. Ante o exposto, defiro ao autor a restituição de R$18.465,28, correspondente a 60% do total apontado à inicial a título de cobrança de furo de caixa." --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- "Nos termos da exordial, o autor se ativava das 6h às 18h, sem intervalo intrajornada, à exceção dos domingos. Pretende o pagamento das horas extras laboradas, intervalo intrajornada, e reflexos. Contrapõe-se a ré, sustentando que o autor sempre exerceu o cargo de confiança de gerente, inicialmente em caráter de substituição e posteriormente de forma efetiva, não estado submetido ao controle de jornada, enquadrando-se na exceção do art. 62, II, da CLT. Pois bem. Registre-se inicialmente que o artigo 62, II, da CLT contempla dois requisitos para caracterização da hipótese excetiva invocada: um de ordem objetiva e um de índole subjetiva; quais sejam, distinção remuneratória em relação ao salário do cargo efetivo e elevadas atribuições e poderes de gestão. O atendimento aos requisitos referidos é cumulativo, a ausência de um deles afasta a hipótese de exceção invocada. Outrossim, referido dispositivo legal encerra uma presunção - de que referidos empregados, justamente pelo maior patamar na estrutura organizativa da empresa, não estão sujeitos a controle de jornada. Tal presunção não é absoluta. E a ré não demonstrou que o reclamante detivesse expressivos poderes de mando ou gestão, em molde a caracterizar a hipótese legal aventada em contestação (art. 373, II, do CPC). Conquanto tenha sido formalmente enquadrado no cargo de gerente, em substituição ou de forma efetiva, a prova oral produzida revela que o autor, embora exercesse função com fidúcia diferenciada, não possuía elevados poderes de mando e gestão, necessários à caracterização da hipótese excetiva em tela (art. 373, II, do CPC). Em audiência, o preposto da ré, embora tenha afirmado que o autor era o "chefe geral do posto", acabou por admitir que havia supervisão/fiscalização das atribuições do autor pelo supervisor (ata de fls. 338 do PDF) O autor não possuía poder admissional ou demissional. A testemunha Dionathan Henrique de Sousa revelou ter sido encaminhado ao reclamante somente após ter sido contratado pelo RH. (ata de fls. 339 do PDF) E a testemunha inquirida a convite da ré, Sr. Cássio Augusto de Souza, também afirmou que, quando foi conversar com o reclamante sobre a data de início, já estava contratado (ata de fls. 340 do PDF), donde se concluiu que o autor não detinha autonomia para a contratação de funcionários. Tampouco restou demonstrado que o autor detivesse poder demissional (art. 373, II, do CPC), não tendo as testemunhas presenciado nenhuma demissão. Ademais, apesar de a testemunha da ré ter declarado que o autor tinha autonomia para tomar as decisões de "problemas normais" do posto, acabou por revelar que, caso o autor não conseguisse resolver o problema, passava para o supervisor. Revelou ainda que a sua promoção, de frentista para chefe de loja, foi realizada pelo gerente juntamente com o supervisor. Assim, o que se extrai do contexto probatório é que o autor, embora detivesse certo grau de autonomia na gestão do posto, não possuía amplos poderes de mando e gestão, em molde a justificar a incidência do art. 62, II, da CLT. Reitere-se que, para caracterização da hipótese excetiva aventada pela ré, necessário o exercício de elevados poderes de gestão pelo empregado, de modo que este atue como espécie de longa manus do empregador, o que muito se distancia da hipótese dos autos. Resta, portanto, afastada a circunstância legal prevista no art. 62, II, da CLT. Quanto ao horário efetivamente cumprido pelo reclamante, assim foi produzida a prova oral: "que o depoente trabalhou para a reclamada de 12/03/2021 a marc#o ou junho de 2023, na func#ao de frentista; que o depoente trabalhou diretamente com o reclamante; ... que o depoente trabalhou preponderantemente na parte da tarde, das 14h as 22h, mas como se tratou de um periodo com falta de funcionarios no posto, trabalhou tambem na parte da manha; que o depoente sempre viu o reclamante trabalhando das 6h as 17h e pouco/18h; que o reclamante apenas nao trabalhava aos domingos; que o reclamante cumpriu sempre essa jornada; que o depoente nunca viu o reclamante tirar intervalo; ... que o depoente nunca viu o reclamante chegar mais tarde ou sair mais cedo; que tambem nunca viu o reclamante faltar ao trabalho;..."(testemunha do autor, Sr. Dionathan Henrique de Sousa dos Santos, Ata de fls. 338 do PDF) "que o depoente trabalha para a reclamada desde julho de 2019, ... que inicialmente o depoente trabalhava no horario da noite, de 15h as 23h, e depois foi para o horario de 6h as 14h; que o depoente acha que o reclamante entrava as 6h e saia as 18h, de segunda a sabado; que o depoente nao sabe o periodo de intervalo do reclamante; que o depoente acha que o reclamante trabalhava de 2a a 6a feira, sempre no horario acima relatado, que aos sabados trabalhava ate o meio-dia;..." (testemunha da ré. Sr. Cássio Augusto de Souza - Ata de fls. 340/341 do PDF) Nota-se que ambas as testemunhas relataram a jornada obreira de 6h às 18h, à exceção do sábado, não sabendo, nenhuma delas, informar acerca do período de intervalo. E o autor, inquirido em audiência, confessou que "trabalhava de 6h as 18h, de 2a a 6a feira; de 6h as 14h aos sabados e folgava aos domingos; que o depoente poucas vezes tirou 1 hora de intervalo, isso porque sempre tinha funcionario faltando e o depoente tinha que ir para a pista; que o depoente conseguiu tirar a hora integral de intervalo somente duas vezes na semana, que nas demais ocasioes tirava de 10 a 15 minutos de intervalo;... " (Ata de fls. 336 do PDF) Assim, com base na prova oral produzida, e observados os limites da inicial e do depoimento pessoal do reclamante, fixo a seguinte jornada de trabalho para o obreiro: das 06h às 18h de segunda a sexta, e das 06h às 14h aos sábados, com uma hora de intervalo duas vezes na semana, e 15 minutos de intervalo nos demais dias. Ante o exposto, defiro ao reclamante o pagamento das horas extras laboradas, assim entendidas aquelas excedentes à 44ª hora semanal, acrescidas do adicional de 50%, observado o período imprescrito do pacto. Reflexos em férias acrescidas do terço, 13º salário e FGTS.". Conheço e nego provimento ao recurso da reclamada para manter a sentença pelos seus fundamentos antes transcritos literalmente. BRASILIA/DF, 28 de abril de 2025. FERNANDO HENRIQUE MELLO RODRIGUES, Servidor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- AUTO POSTO CINCO ESTRELAS LTDA
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Auto Posto Cinco Estrelas Ltda x Warley Santana Teixeira
ID: 262389019
Tribunal: TRT10
Órgão: 1ª Turma
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 0000913-52.2022.5.10.0019
Data de Disponibilização:
29/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
THAMY DE SOUZA RIBEIRO DA SILVA
OAB/DF XXXXXX
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RACHEL FARAH
OAB/DF XXXXXX
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NATALIA SANTOS MARQUES ALENCAR
OAB/DF XXXXXX
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DANIEL MUNIZ DA SILVA
OAB/DF XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 1ª TURMA Relator: LUIZ HENRIQUE MARQUES DA ROCHA 0000913-52.2022.5.10.0019 : AUTO POSTO CINCO ESTRELAS LTDA : …
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 1ª TURMA Relator: LUIZ HENRIQUE MARQUES DA ROCHA 0000913-52.2022.5.10.0019 : AUTO POSTO CINCO ESTRELAS LTDA : WARLEY SANTANA TEIXEIRA PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO PROCESSO n.º 0000913-52.2022.5.10.0019 - RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA (1009) RELATOR(A): Juiz Convocado LUIZ HENRIQUE MARQUES DA ROCHA RECORRENTE: AUTO POSTO CINCO ESTRELAS LTDA ADVOGADO: DANIEL MUNIZ DA SILVA RECORRIDO: WARLEY SANTANA TEIXEIRA ADVOGADO: NATALIA SANTOS MARQUES ALENCAR ADVOGADO: THAMY DE SOUZA RIBEIRO DA SILVA ADVOGADO: RACHEL FARAH ORIGEM : 19ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA/DF CLASSE ORIGINÁRIA: Ação Trabalhista - Rito Ordinário (JUÍZA THAIS BERNARDES CAMILO ROCHA) emv06 EMENTA DIREITO DO TRABALHO. RECURSO ORDINÁRIO. PARCIALIDADE DE TESTEMUNHA. DESCONTOS INDEVIDOS. HORAS EXTRAS. RECONHECIMENTO DE CARGO DE CONFIANÇA. PROVIMENTO PARCIAL. I. CASO EM EXAME Recurso ordinário interposto pela reclamada contra sentença que deu validade ao depoimento de testemunha contraditada, deferiu restituição de descontos salariais e condenou ao pagamento de horas extras. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há três questões em discussão: (i) se a testemunha que litigou contra a reclamada possui impedimento para depor; (ii) se há comprovação de descontos indevidos realizados na remuneração do reclamante; e (iii) se a função exercida pelo reclamante se enquadra no art. 62, II, da CLT, afastando o direito às horas extras. III. RAZÕES DE DECIDIR A simples existência de ação contra o empregador não torna suspeita a testemunha, conforme a Súmula 357 do TST. Ausência de prova concreta de parcialidade. Não restou demonstrado nos autos que os valores apontados na inicial foram efetivamente descontados da remuneração do reclamante, sendo frágil a prova testemunhal sobre supostos pagamentos em espécie para reparação de furos de caixa. A documentação juntada aos autos e as provas orais comprovam o efetivo exercício de cargo de gestão pelo reclamante, com poderes de mando, gestão financeira e de pessoal e responsabilidade sobre a unidade, além da percepção de gratificação compatível com a função e anotação na CTPS. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso ordinário conhecido e parcialmente provido para excluir a condenação à restituição de descontos indevidos e ao pagamento de horas extras. Tese de julgamento: "1. A existência de ação trabalhista contra o mesmo empregador não torna, por si só, suspeita a testemunha. 2. O ônus da prova da realização de descontos indevidos na remuneração do empregado incumbe ao reclamante, que dele não se desincumbiu. 3. O exercício de cargo de gestão, com poderes de mando, afasta o direito às horas extras, nos termos do art. 62, II, da CLT." Dispositivos relevantes citados: CLT, arts. 62, II, e 818; CPC, art. 373; CC, art. 944. Jurisprudência relevante citada: TST, Súmula 357. RELATÓRIO A Exma. Juíza THAIS BERNARDES CAMILO ROCHA, da MM. 19ª Vara do Trabalho de Brasília/DF, por intermédio da sentença ID. ebe2e36, julgou procedentes em parte os pedidos contidos na ação trabalhista interposta por WARLEY SANTANA TEIXEIRA em face de AUTO POSTO CINCO ESTRELAS LTDA. Interpõe recurso ordinário a reclamada ao ID. 4ef227f. Contrarrazões do reclamante ao ID. 75a032b. Dispensada a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, porquanto ausentes as hipóteses insertas no art. 102 do RITRT10. É o relatório. FUNDAMENTAÇÃO V O T O ADMISSIBILIDADE Preenchidos os pressuposto processuais objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso ordinário da reclamada. MÉRITO PARCIALIDADE DE TESTEMUNHA A recorrente afirma ter a sua condenação se escorado basicamente no depoimento de testemunha cuja isenção e imparcialidade não se mostram presentes. Aponta que para além da postulação da testemunha, em seu próprio processo contra a mesma ré, de reconhecimento de elementos a supostamente justificarem a rescisão indireta do contrato de trabalho, ..."só a circunstância de a testemunha pleitear indenização por dano moral, por si só, já lhe retira a isenção do ânimo. Isso porque confessa que teve abalo moral com determinada conduta patronal, não se podendo presumir que o depoente seria capaz de separar as circunstâncias." Pede seja invalidada a respectiva prova. A par da ata de audiência juntada ao ID. 27a78fc, percebe-se ter a testemunha convidada pelo reclamante restado contraditada sob a alegação de possuir demanda contra a ré, em que postula a rescisão indireta do contrato de trabalho, além de indenização por danos morais. Na ocasião, a Instância de origem afastou a pecha de parcialidade da testemunha registrando que ..."indagado pelo Juízo, o depoente disse que moveu ação em face da reclamada, tendo o feito sido solucionado através de acordo. Afirma que não possui qualquer mágoa ou ressentimento da empresa e que o pleito de dano moral formulado em seu processo estava fundado na alegação de desvio de função. Diante de tais declarações, e à míngua de prova de qualquer elemento que revele o comprometimento da isenção de ânimo do depoente, rejeito a contradita. Oportuno invocar ainda o entendimento consubstanciado na Súmula 357 do TST. Protestos da reclamada." A movimentação de ação pela testemunha contra a empresa ré, com interstício de cerca de apenas um ano entre as ações, apontando a existência de motivos bastantes para rescisão indireta da respectiva relação empregatícia, além de direito a reparação por danos à sua esfera íntima, efetivamente revela forte indício de que a isenção de ânimo da parte depoente poderá sofrer conturbação, exigindo do julgador especial atenção com a confiabilidade a ser emprestada à prova. Todavia, não a invalida de pronto. Com efeito, conforme orienta a Súmula 357 do TST, ..."não torna suspeita a testemunha o simples fato de estar litigando ou de ter litigado contra o mesmo empregador." Nesse panorama, efetivamente cumpria ao Juízo originário a realização da oitiva da testemunha em questão, para então lhe conferir a eventual confiabilidade plena, ou não, a par da coerência e do confronto das informações prestadas com os demais elementos de prova dos autos. Portanto, não há que se falar em, preliminarmente ao exame de mérito das questões discutidas no processo, invalidar-se o testemunho questionado, por imparcialidade. Nego provimento. DESCONTOS INDEVIDOS Na inicial, o reclamante aponta ter iniciado no emprego como frentista em 14/8/2020, sendo que após ter passado a eventualmente exercer função de gerente do posto veio a experimentar descontos indevidos na sua remuneração, cujo último salário teria sido de R$ 2.961,34, vindo a pedir demissão em 18/1/2022. Aduz que "todas as vezes em que havia quebra de caixa as diferenças eram descontadas do salário do reclamante quando os outros frentistas não pagavam". Relaciona diversos descontos de seus salário, que teriam ocorrido no período delimitado entre 26/10/2020 e pelo menos 8/12/2021, em valores alcançando mais de trinta mil reais, cuja comprovação estaria estampada nas diversas advertências recebidas em razão da responsabilidade pelas diferenças de caixa, às quais juntou à exordial. Em sua contestação, a reclamada aponta ter alçado o reclamante ao cargo de gerente poucos dias após sua contratação, em substituição ao gerente geral do posto, então lhe pagando gratificação por desvio de função, condição mantida até 30/6/2021, quando efetivado no referido encargo. Afirma inverídica a ofensiva do autor, pontuando que as advertências em questão de fato se referiram a diferenças de caixa, todavia não se relacionando a furos de caixa gerados pelos frentistas apenas, mas a efetivas diferenças da contabilidade empresarial, incluindo verdadeiros desfalques no caixa da empresa, sendo os respectivos valores referenciados apenas para escora das penalidades administrativa, não para descontos. Assevera que nenhum dos valores apontados na inicial teriam restado descontados do empregado, sendo que no decorrer de todo o pacto teria descontado do empregado apenas o valor indicado no seu TRCT, fruto de compensação rescisória. Em réplica, o autor apenas retomou sua tese da exordial, acrescentando que a confissão acerca do descontou em TRCT também comprovaria o hábito dos descontos indevidos. Eis o trato conferido à questão pela Instância ordinária: "Relata o autor que, no exercício do cargo de gerente, sofreu descontos em seu salário, referentes à quebra de caixa de outros frentistas, sempre que as diferenças encontradas não eram quitadas. Sustenta a ilegalidade dos descontos que, juntos, somaram o importe de R$30.775,47, conforme registrado nas advertências e suspensões aplicadas. Alega, por fim, que deixou de receber as ferias 2020/2021, eis que os valores das férias foram descontados a título de quebra de caixa. Pretende, assim, a restituição dos valores indevidamente descontados, e o pagamento das férias 2020/2021 em dobro. Em defesa, a reclamada alega que a hipótese não se refere a simples quebra de caixa, mas a desfalque/desaparecimento de valores de grande monta do caixa da empresa. Argumenta que o autor sempre exerceu o cargo de gerente, sendo o responsável por manter o controle financeiro/fluxo de caixa do posto, razão pela qual era o único empregado a receber as punições relativas a tal questão. Argumenta, contudo, que os valores especificados nas aludidas advertências serviram apenas como justificativa e contextualização da punição, não tendo sido descontados ou cobrados do autor. Sustenta, por fim, que o único valor descontado foi o montante de R$937,56, registrado no TRCT. Pois bem. A documentação juntada às fls. 34/51 revela que o autor recebeu diversas advertências por "incontinência de conduta ou mau procedimento" e "desídia no desempenho das respectivas funções", em razão de ter sido constatada "falta de caixa", em valores diversos, discriminados individualmente em cada penalidade aplicada. A ré não impugnou a totalidade das advertências e respectivos valores lançados na planilha de fl. 144 do PDF da inicial, alegando, contudo, não ter realizado a cobrança dos valores, especificando-os tão somente para fins de contextualização das punições. Os contracheques de fls. 257/277 do PDF de fato não evidenciam nenhum desconto a título de quebra de caixa do contracheque obreiro. Inquirido em audiência, o reclamante afirmou que os descontos não foram efetuados em contracheque, esclarecendo que o supervisor apresentava os valores relativos aos furos de caixa e cobrava do depoente o pagamento em espécie, para ser entregue ao dono da empresa. (ata de fls. 337 do PDF) Referida prática foi confirmada pela prova oral produzida nos autos. Vejamos: "que o depoente trabalhou para a reclamada de 12/03/2021 a março ou junho de 2023, na funçao de frentista; que o depoente trabalhou diretamente com o reclamante; que o reclamante era gerente; ... que ja trabalharam funcionarios de ma indole que deixaram furos de caixa, entao o reclamante tinha que pagar; que o depoente ja presenciou o supervisor cobrando o reclamante; que o depoente nao se recorda dos valores cobrados; que o depoente ja viu o reclamante fazendo entrega de dinheiro em especie para o supervisor, entretanto, o depoente nao sabe informar o montante; que o depoente presenciou esse pagamento somente uma vez; ... que as retiradas do caixa sao feitas na "boleta" e jogadas no cofre; que apos ser retirado o valor, e feita a conferência pelo gerente ou pelo chefe de pista; que o frentista e o responsavel (gerente ou chefe de pista) assinam a boleta; que entao o dinheiro e colocado no cofre e a boleta fica no caixa, depois o carro-forte recolhe; que o supervisor participa desse processo, pois ele se esta faltando algo no caixa, o depoente acredita que isso e feito nos dias em que ele comparece ao posto; indagado pelo procurador da reclamada sobre o motivo pelo qual o depoente afirmou que o pagamento realizado pelo reclamante ao supervisor se refere a quebra de caixa, o depoente explica que nessa ocasiao em que o depoente presenciou o reclamante entregando uma quantia em especie para o supervisor, o depoente tinha presenciado anteriormente o reclamante e o supervisor discutindo ou conversando sobre um furo de caixa que ele teria que pagar; que se o reclamante nao pagasse, ate onde o depoente sabe, o supervisor teria que fazê-lo; ..." (testemunha do autor, Sr. Dionathan Henrique de Sousa dos Santos, Ata de fls. 338 do PDF) Extrai-se do depoimento supra transcrito que o reclamante era cobrado pelo supervisor acerca dos furos de caixa dos frentistas, e o pagamento respectivo era realizado em espécie. Conquanto não tenha indicado nenhum valor específico, a testemunha relatou ter presenciado o reclamante realizando entrega de dinheiro em espécie ao supervisor, sendo que, na referida ocasião, havia presenciado anteriormente o supervisor discutindo/conversando sobre um furo de caixa que o reclamante teria que pagar. A testemunha inquirida a convite da própria reclamada, Sr. Cássio Augusto de Souza, reforça tal conclusão. Com efeito, embora tenha afirmado que nunca presenciou o reclamante pagando furo de caixa, acabou por declarar que, no caso de furo de caixa, acredita que, caso o frentista não pague, o gerente paga a diferença. (ata de fls. 340 do PDF) É certo que o contrato de trabalho do autor dispôs acerca da possibilidade de o empregador efetuar descontos dos prejuízos dos danos causados pelo empregado, nos termos do art. 462, §1º da CLT. (cláusula 7ª, fls. 333 do PDF). Ocorre que, no caso presente, não há evidências de que o reclamado tenha tomado as diligências necessárias a fim de aferir se os furos de caixa foram decorrentes de atos praticados pelo autor, não sendo suficiente, para tanto, a alegação de que o controle financeiro do posto fosse de responsabilidade do reclamante, enquanto gerente. Não há nenhum indicativo de que a ré tenha realizado qualquer investigação acerca dos responsáveis pelos valores identificados como furo de caixa, nem mesmo em relação aos montantes mais expressivos, a exemplo dos períodos de 01 a 05/01/2021, 23 a 26/11/2021 e 01 a 05/12/2021, nos valores de R$ 2.380,89, 4.640,49 e 7.264,94, respectivamente. Assim, a prática adotada pela ré, de cobrar do autor as diferenças de furo de caixa dos frentistas, sem adotar nenhuma diligência que comprove que referidas faltas decorreram de atos praticados pelo autor, evidencia nítida transferência ao trabalhador dos riscos do negócio (art. 2º da CLT). Dessa forma, é devida a restituição dos valores pagos pelo obreiro a título de furos de caixa. Quanto aos valores efetivamente devidos, importante pontuar que o autor confessou, em seu depoimento, ter recuperado junto aos frentistas parte dos montantes pagos ao supervisor. Com efeito, o autor esclareceu que, após entregar o valor para o supervisor, recolhia o pagamento dos frentistas responsáveis. Vejamos: "... que o depoente entregava pagamento em especie para repor o dinheiro que tinha sido constatado como furo de caixa; que o depoente entregava esse dinheiro na mao do supervisor Humberto, que o repassava ao dono da empresa; que esses pagamentos ocorriam todo dia 1º de cada me#s, apos o fechamento do caixa; que quanto ao pagamento de sete mil reais, o depoente esclarece que pagou quatro mil e no dia seguinte, quando caiu o valor de suas ferias, pagou mais tre#s mil; ... que o segundo maior valor que teve que pagar foi de cinco mil reais; ... o depoente esclarece que o furo de caixa era dos frentistas, que por isso depois que o depoente entregava o valor para o supervisor, recolhia o pagamento dos frentistas responsaveis, entretanto, esse pagamento dos frentistas nunca totalizava o valor pago pelo depoente, de forma antecipada, sempre faltava alguma coisa, o depoente diz que quanto ao furo de 7 mil reais, conseguiu pegar 2 mil reais com os frentistas e depois foi cobrando referidos funcionarios pois tinha que colocar o dinheiro no caixa, entretanto, nunca conseguiu recuperar o valor total, recuperou somente 3 mil reais no total; que o gerente era responsavel por todos os caixas do posto; que o depoente fazia confere#ncia do caixa com cada frentista, quando do fechamento." (depoimento do reclamante, Ata de fls. 336/337 do PDF) Nota-se, pelas declarações prestadas pelo autor, que este cobrava dos frentistas os valores pagos antecipadamente. Embora tenha declarado que nunca conseguiu recuperar o valor total, exemplificou que, no pagamento realizado de R$7 mil, recuperou o total de R$3 mil, o que corresponde a aproximadamente 40% do valor pago. Assim, a fim de evitar o enriquecimento ilícito do reclamante, tenho que aproximadamente 40% dos valores por ele custeados a título de furo de caixa foram recuperados junto aos frentistas. Ante o exposto, defiro ao autor a restituição de R$18.465,28, correspondente a 60% do total apontado à inicial a título de cobrança de furo de caixa. Indefiro o pagamento das férias 2020/2021, em dobro, eis que a parcela foi quitada pelo empregador, conforme comprovantes de fls. 278/280 do PDF. Registro que o fato de o autor ter utilizado referida quantia para pagar o furo de caixa cobrado pelo réu não autoriza novo pagamento da parcela, mormente considerando a restituição dos valores indevidamente cobrados, ora deferida". (grifos, todos, do original) A recorrente renova não ter imposto descontos à remuneração obreira, representando sua condenação violação aos artigos 944 do Código Civil, 373 do CPC e 818 da CLT, porquanto a apontada falta deveria ter sido robustamente comprovada, mas não o fora. Aponta que ..."o reclamante, somente durante o seu depoimento, confessou que não houve prejuízo de todo o valor contido na petição inicial, uma vez que parte dos valores foram "devolvidos" pelos frentistas a ele. Ora, se o reclamante faz essa confissão, competia a ele provar especificamente qual foi o seu prejuízo, o que não fez. Caso não fosse assim, presumir-se-ia como verdade tudo o que foi descrito na inicial, forçando a reclamada a produzir prova negativa, o que, concessa venia, não pode ser aceito por essa Especializada." Também afirma ..."que a sentença vinculou os alegados descontos às advertências de ID e798fdb. Ocorre que todas essas advertências são referentes ao mesmo ano (2021). A condenação, na forma como foi elaborada, faz crer, portanto, que no ano de 2021 o reclamante não recebeu qualquer valor de salário em vários meses, uma vez que o montante de R$18.465,28 quase supera a soma dos salários recebidos naquele ano, o que, concessa venia, não faz o menor sentido e ofende a razoabilidade." Apontando ser irreal e imoral o respectivo pedido contido na inicial, devendo a condenação ser excluída, com imputação de penalidade ao autor por litigância de má-fé. Na hipótese, a prova documental efetivamente não corrobora a pretensão da inicial. Os alegados descontos na remuneração obreira não aconteceram, conforme se verifica dos contracheques, de forma alguma havendo maneira de se vincular as "faltas de caixa" relatadas nas advertências ao autor com eventuais descontos dos valores nelas estampados. O único desconto havido na remuneração obreira no curso da relação foi no TRCT, a título de "falta de caixa", no valor de R$ 937,56. Porém, inexiste impugnação ao desconto no documento e a inicial não traz insurgência alguma quanto ao ponto, também não apontando a parcela como desconto indevido e eventualmente ensejador do dever de restituição. A réplica apenas trata o fato como comprovação de que os descontos de furos de caixa relatados na inicial efetivamente teriam ocorrido. Lado outro, é certo que o contrato de trabalho permite o desconto em tela(ID. Ff54f82). Em depoimento pessoal, porém, o reclamante reorientou a versão da inicial, para agora aduzir ..."que o depoente sempre exerceu a função de gerente"..., caindo por terra a eventualidade do exercício da gerência antes apontada. Também inovou e reorientou ao afirmar que ..."sofreu descontos, entretanto, não foram em contracheque, o depoente explica que o supervisor chegava com uma folha com valores de furos de caixa e pedia ao depoente para providenciar referido valor em espécie, para ser entregue ao dono da empresa, o depoente tinha que se virar e arrumar o dinheiro; que o depoente tem algumas dessas folhas, não tem todas; que os frentistas presenciavam essa cobrança." Ainda esclareceu ..."que o depoente entregava pagamento em espécie para repor o dinheiro que tinha sido constatado como furo de caixa; que o depoente entregava esse dinheiro na mão do supervisor Humberto, que o repassava ao dono da empresa; que esses pagamentos ocorriam todo dia 1º de cada mês, após o fechamento do caixa; que quanto ao pagamento de sete mil reais, o depoente esclarece que pagou quatro mil e no dia seguinte, quando caiu o valor de suas férias, pagou mais três mil, o depoente disse que seria mandado embora por justa causa e então negociou esse pagamento com a empresa; que o segundo maior valor que teve que pagar foi de cinco mil reais; que o depoente já ficou sem metade do seu salário para pagamento de furo de caixa; o depoente esclarece que o furo de caixa era dos frentistas, que por isso depois que o depoente entregava o valor para o supervisor, recolhia o pagamento dos frentistas responsáveis, entretanto, esse pagamento dos frentistas nunca totalizava o valor pago pelo depoente, de forma antecipada, sempre faltava alguma coisa, o depoente diz que quanto ao furo de 7 mil reais, conseguiu pegar 2 mil reais com os frentistas e depois foi cobrando referidos funcionários pois tinha que colocar o dinheiro no caixa, entretanto, nunca conseguiu recuperar o valor total, recuperou somente 3 mil reais no total; que o gerente era responsável por todos os caixas do posto; que o depoente fazia conferência do caixa com cada frentista, quando do fechamento." Já a testemunha ouvida a rogo do autor, Sr. DIONATHAN, afirmou .."que já trabalharam funcionários de má índole que deixaram furos de caixa, então o reclamante tinha que pagar; que o depoente já presenciou o supervisor cobrando o reclamante; que o depoente não se recorda dos valores cobrados; que o depoente já viu o reclamante fazendo entrega de dinheiro em espécie para o supervisor, entretanto, o depoente não sabe informar o montante; que o depoente presenciou esse pagamento somente uma vez." Em seguida, a ata de audiência registra que a testemunha ..."indagado pelo procurador da reclamada sobre o motivo pelo qual o depoente afirmou que o pagamento realizado pelo reclamante ao supervisor se refere à quebra de caixa, o depoente explica que nessa ocasião em que o depoente presenciou o reclamante entregando uma quantia em espécie para o supervisor, o depoente tinha presenciado anteriormente o reclamante e o supervisor discutindo ou conversando sobre um furo de caixa que ele teria que pagar; que se o reclamante não pagasse, até onde o depoente sabe, o supervisor teria que fazê-lo; que o depoente não sabe dizer como se dava a comunicação entre reclamante e supervisor." Com esse conteúdo, inclusive inseguro e necessitando de esclarecimento, novamente vacilante, considero frágeis e despiciendas as afirmações da testemunha acerca do seu testemunho ocular de uma, e somente uma, entrega de numerário em espécie pelo autor ao supervisor. Ante todas as alegações das partes e os elementos de prova acerca do pedido, não vejo condições de manutenção da condenação. Os alegados descontos na remuneração comprovadamente não aconteceram, não se desincumbindo o reclamante do seu ônus processual. A inovação trazida pelo autor em audiência, contra a qual sequer houve chance de defesa da reclamada em contestação, além de alterar substancialmente o pedido da inicial, traz consigo a necessidade de indicação específica, ao menos por amostragem, dos eventuais valores de furos de caixa supostamente não quitados pelos frentistas e arcados pelo reclamante gerente, ônus particular acerca do qual igualmente não logrou sucesso o autor. Ademais, a alegação de que a quitação dos furos de caixa se daria pessoalmente e em espécie não se coadunam com o compulsar das movimentações da conta corrente obreira juntadas aos autos, abrangendo o período de 23/7/2020 a 30/6/2021. Embora os créditos dos salários estejam ali demonstrados, os volumes de saques registrados nem de longe se afinariam com as necessárias retiradas para fazer frente a eventuais pagamentos, em espécie, das diferenças elencadas na inicial, ao supervisor. Aliás, ao início dos meses(até dia 15), diversos são os lançamentos de débitos em razão de compras pela rede shop, mas raríssimos e de pouca monta são os saques na conta salarial do reclamante débitos raros são os saques ao início dos meses. Portanto, também cai por terra a afirmação em depoimento pessoal no sentido de que os pagamentos em espécie ao supervisor "ocorriam todo dia 1º de cada mês", inclusive no referente ao mês de novembro/2021, período qual o reclamante aponta ter sido responsabilizado e pago 6(seis) diferenças de caixa, que juntas alcançariam mais de R$ 8.000,00, haja vista o extrato da conta corrente salarial do período de 2/11/2021 a 7/1/2022, também juntado pelo autor, ao ID. 48ad92d. Outrossim, a quitação dos altos valores de furos de caixa afirmados pelo autor soam irreais, mormente porquanto algumas vezes até mesmo superam, em muito, o próprio salário mensal recebido, alcançando cifra total quase equivalentes à soma da remuneração acumulada por ele durante o contrato de trabalho. Nesse panorama, independente das informações prestadas pela testemunha DIONATHAN, vejo não ter o autor logrado se desincumbir do seu ônus provatório relativo à comprovação do direito requerido, seja segundo a tese da inicial, ou mesmo quanto à verdade alternativa posta em audiência. Dou provimento ao recurso da reclamada para afastar sua condenação à restituição de valores supostamente "descontados" indevidamente de sua remuneração. JORNADA DE TRABALHO. GERENTE. ARTIGO 62, II, DA CLT Examinando o pleito obreiro de horas extras impagas, a Instância ordinária deu-lhe parcial provimento, condenando a reclamada recorrente, nestes termos: "Nos termos da exordial, o autor se ativava das 6h às 18h, sem intervalo intrajornada, à exceção dos domingos. Pretende o pagamento das horas extras laboradas, intervalo intrajornada, e reflexos. Contrapõe-se a ré, sustentando que o autor sempre exerceu o cargo de confiança de gerente, inicialmente em caráter de substituição e posteriormente de forma efetiva, não estado submetido ao controle de jornada, enquadrando-se na exceção do art. 62, II, da CLT. Pois bem. Registre-se inicialmente que o artigo 62, II, da CLT contempla dois requisitos para caracterização da hipótese excetiva invocada: um de ordem objetiva e um de índole subjetiva; quais sejam, distinção remuneratória em relação ao salário do cargo efetivo e elevadas atribuições e poderes de gestão. O atendimento aos requisitos referidos é cumulativo, a ausência de um deles afasta a hipótese de exceção invocada. Outrossim, referido dispositivo legal encerra uma presunção - de que referidos empregados, justamente pelo maior patamar na estrutura organizativa da empresa, não estão sujeitos a controle de jornada. Tal presunção não é absoluta. E a ré não demonstrou que o reclamante detivesse expressivos poderes de mando ou gestão, em molde a caracterizar a hipótese legal aventada em contestação (art. 373, II, do CPC). Conquanto tenha sido formalmente enquadrado no cargo de gerente, em substituição ou de forma efetiva, a prova oral produzida revela que o autor, embora exercesse função com fidúcia diferenciada, não possuía elevados poderes de mando e gestão, necessários à caracterização da hipótese excetiva em tela (art. 373, II, do CPC). Em audiência, o preposto da ré, embora tenha afirmado que o autor era o "chefe geral do posto", acabou por admitir que havia supervisão/fiscalização das atribuições do autor pelo supervisor (ata de fls. 338 do PDF) O autor não possuía poder admissional ou demissional. A testemunha Dionathan Henrique de Sousa revelou ter sido encaminhado ao reclamante somente após ter sido contratado pelo RH. (ata de fls. 339 do PDF) E a testemunha inquirida a convite da ré, Sr. Cássio Augusto de Souza, também afirmou que, quando foi conversar com o reclamante sobre a data de início, já estava contratado (ata de fls. 340 do PDF), donde se concluiu que o autor não detinha autonomia para a contratação de funcionários. Tampouco restou demonstrado que o autor detivesse poder demissional (art. 373, II, do CPC), não tendo as testemunhas presenciado nenhuma demissão. Ademais, apesar de a testemunha da ré ter declarado que o autor tinha autonomia para tomar as decisões de "problemas normais" do posto, acabou por revelar que, caso o autor não conseguisse resolver o problema, passava para o supervisor. Revelou ainda que a sua promoção, de frentista para chefe de loja, foi realizada pelo gerente juntamente com o supervisor. Assim, o que se extrai do contexto probatório é que o autor, embora detivesse certo grau de autonomia na gestão do posto, não possuía amplos poderes de mando e gestão, em molde a justificar a incidência do art. 62, II, da CLT. Reitere-se que, para caracterização da hipótese excetiva aventada pela ré, necessário o exercício de elevados poderes de gestão pelo empregado, de modo que este atue como espécie de longa manus do empregador, o que muito se distancia da hipótese dos autos. Resta, portanto, afastada a circunstância legal prevista no art. 62, II, da CLT. Quanto ao horário efetivamente cumprido pelo reclamante, assim foi produzida a prova oral: "que o depoente trabalhou para a reclamada de 12/03/2021 a marc#o ou junho de 2023, na func#ao de frentista; que o depoente trabalhou diretamente com o reclamante; ... que o depoente trabalhou preponderantemente na parte da tarde, das 14h as 22h, mas como se tratou de um periodo com falta de funcionarios no posto, trabalhou tambem na parte da manha; que o depoente sempre viu o reclamante trabalhando das 6h as 17h e pouco/18h; que o reclamante apenas nao trabalhava aos domingos; que o reclamante cumpriu sempre essa jornada; que o depoente nunca viu o reclamante tirar intervalo; ... que o depoente nunca viu o reclamante chegar mais tarde ou sair mais cedo; que tambem nunca viu o reclamante faltar ao trabalho;..."(testemunha do autor, Sr. Dionathan Henrique de Sousa dos Santos, Ata de fls. 338 do PDF) "que o depoente trabalha para a reclamada desde julho de 2019, ... que inicialmente o depoente trabalhava no horario da noite, de 15h as 23h, e depois foi para o horario de 6h as 14h; que o depoente acha que o reclamante entrava as 6h e saia as 18h, de segunda a sabado; que o depoente nao sabe o periodo de intervalo do reclamante; que o depoente acha que o reclamante trabalhava de 2a a 6a feira, sempre no horario acima relatado, que aos sabados trabalhava ate o meio-dia;..." (testemunha da ré. Sr. Cássio Augusto de Souza - Ata de fls. 340/341 do PDF) Nota-se que ambas as testemunhas relataram a jornada obreira de 6h às 18h, à exceção do sábado, não sabendo, nenhuma delas, informar acerca do período de intervalo. E o autor, inquirido em audiência, confessou que "trabalhava de 6h as 18h, de 2a a 6a feira; de 6h as 14h aos sabados e folgava aos domingos; que o depoente poucas vezes tirou 1 hora de intervalo, isso porque sempre tinha funcionario faltando e o depoente tinha que ir para a pista; que o depoente conseguiu tirar a hora integral de intervalo somente duas vezes na semana, que nas demais ocasioes tirava de 10 a 15 minutos de intervalo;... " (Ata de fls. 336 do PDF) Assim, com base na prova oral produzida, e observados os limites da inicial e do depoimento pessoal do reclamante, fixo a seguinte jornada de trabalho para o obreiro: das 06h às 18h de segunda a sexta, e das 06h às 14h aos sábados, com uma hora de intervalo duas vezes na semana, e 15 minutos de intervalo nos demais dias. Ante o exposto, defiro ao reclamante o pagamento das horas extras laboradas, assim entendidas aquelas excedentes à 44ª hora semanal, acrescidas do adicional de 50%, observado o período imprescrito do pacto. Reflexos em férias acrescidas do terço, 13º salário e FGTS.". (grifos do original) Recorre a reclamada, insistindo no real exercício de função gerencial e com poder de mando pelo reclamante, sendo os olhos do empregador, na unidade integrante da rede de postos de combustíveis. Destaca trechos das afirmações feitas pelas testemunhas e ressalta as provas documentais, que inequivocamente demonstrariam a gestão do reclamante sobre toda a operação do posto sob seu comando. Ao fim, pondera que ..."o fato de o supervisor, dentro da hierarquia empresarial, estar acima do reclamante não significa que todas as atribuições deste estarão absorvidas por aquele." Pede exclusão da condenação. De fato, os documentos coligidos aos autos demonstram à saciedade o formal exercício do encargo de gerente pelo autor, nos termos do art. 62, II, da CLT, com percepção de gratificação/remuneração expressivamente superior a 40% da função básica de frentista e, inclusive anotação da particularidade na CTPS, a partir da sua nomeação efetiva. O real exercício de poderes de gestão se encontra igualmente demonstrado a teor das provas documentais, que efetivamente demonstram sua responsabilidade pelo caixa da unidade, inclusive sua abertura e fechamento diário; ateste/recebimento das manutenções de equipamentos; assinatura e anuência com relatórios de auditoria externa; e gestão de empregados, seja para comunicar o exercício de encargo de chefia por seus subordinados e requerer o correspondente pagamento de remuneração adicional, para determinar a transferência de empregado para outra unidade, bem como para desligar funcionário que entende não adaptado ao serviço. Ressalte-se que as gestões relativas aos empregados, mesmo em caso de dispensa, são de feições imperativas, não se revestindo de características de pedido e contando com repasse para as áreas competentes mediante atuação do supervisor, sempre com simples menção no sentido de ..."favor atender a solicitação do gerente Warley." Portanto, não se vislumbra submissão do gerente da unidade ao supervisor de 7 unidades, mas puro cumprimento dos trâmites hierárquicos da decisão. As provas documentais se contrapõem, assim, às afirmações obreiras de ..."que quanto às demissões, o depoente não tinha autonomia, apenas dizia para o supervisor que o funcionário 'x' não tinha dado certo, então o supervisor respondia que como o reclamante tinha contratado, deveria se virar com o referido funcionário; que o depoente também não podia aplicar advertência;... que o depoente não transferia funcionário de posto, apenas o supervisor poderia fazê-lo... que o supervisor era a autoridade máxima do posto, o depoente tinha 'algumas autoridades', mas não era a pessoa que mandava em tudo." Outrossim, ainda considero digno de nota que o reclamante, enquanto gerente, foi apenado com advertências porquanto o horário de abertura e fechamento do caixa do posto teria restado inobservado em algumas oportunidades, sendo exemplo sua abertura apenas às 8h46, ou mesmo às 23h01, e fechamento às 8h45 do dia seguinte e, inclusive, somente após mais de 24h. Situação que sugere alguma mobilidade dos horários de trabalho do autor, além de confirmação de sua responsabilidade pessoal pelo caixa. Quanto às provas orais, transcrevo seus trechos de algum relevo para a presente celeuma, a saber: "Primeira testemunha do reclamante: DIONATHAN[...] "que o depoente trabalhou para a reclamada de 12/03/2021 a março ou junho de 2023, na função de frentista; que o depoente trabalhou diretamente com o reclamante; que o reclamante era gerente; que o depoente apresentou currículo, foi chamado pelo RH, que pediu ao depoente para se apresentar ao gerente Warley, o qual fez a entrevista do depoente; que melhor esclarecendo, o depoente veio do RH já contratado, mas isso tem muito tempo; que o primeiro contato que o depoente teve com o reclamante foi quando chegou ao posto, já contratado; que o depoente não sabe quem procedia à dispensa de funcionários; que até onde o depoente sabe, o reclamante não poderia dispensar funcionário; que o depoente acredita que o RH e o supervisor procedessem à dispensa de funcionário, mas nunca presenciou uma demissão; que o reclamante aplicava advertências e suspensões; que as autoridades máximas do posto eram o reclamante enquanto gerente e o supervisor Humberto;[...] que o depoente não sabe informar se o reclamante tinha seus horários de trabalho controlados por alguém; que o supervisor comparecia ao posto cerca de três vezes por semana; PERGUNTAS DA PROCURADORA DO RECLAMANTE: que o reclamante não tinha autonomia para nenhuma decisão; que o depoente nunca viu o reclamante chegar mais tarde ou sair mais cedo; que também nunca viu o reclamante faltar ao trabalho; PERGUNTAS DO PROCURADOR DA RECLAMADA: que o reclamante ou o chefe de pista recebiam o combustível na empresa; que em caso de diferença de combustível, quem responde é o gerente; que o depoente já viu o reclamante fazendo conferência de estoque; que o depoente acredita que o reclamante e o chefe de pista eram os responsáveis por tal atribuição; que em caso de diferença no estoque quem responde é o gerente;[...] que indagado o depoente do motivo pelo qual afirmou que o reclamante não tinha autonomia decisória, o depoente acredita que em uma empresa com vários graus de funções, o reclamante não poderia chegar e mandar alguém embora sem falar com o supervisor, "é o que o depoente acha"". Nada mais. Primeira testemunha do reclamado(s): CÁSSIO[...] "que o depoente trabalha para a reclamada desde julho de 2019, inicialmente na função de frentista, posteriormente na funçao de chefe de loja e atualmente como chefe de pista; que o depoente trabalhou diretamente com o reclamante, o depoente exercia a função de frentista e o reclamante era gerente; que o depoente foi contratado pelo reclamante; que o depoente deixou o currículo no posto de Taguatinga, então ligaram para o depoente do RH, então o depoente fez o procedimento de entrega de documentos e foi conversar com o reclamante, mas o depoente já estava contratado; que o RH disse ao depoente que ele estava contratado; que o depoente foi conversar com o reclamante somente sobre a data que iria começar; que o depoente não sabe dizer direito quem demitia, se era o reclamante ou o reclamante junto com o RH; que pelo que se lembra o depoente não presenciou nenhuma demissão; que o gerente aplica advertências ou suspensões; que o depoente já presenciou o reclamante aplicando essas penalidades; que o depoente não sabe se mais alguém participava dessa decisão de aplicação de advertência/suspensão ou se seria somente o reclamante; que o gerente resolvia questões de folga de funcionários e escala;[...] que o depoente não sabe dizer se alguém controlava os horários de trabalho do reclamante;[...] PERGUNTAS DO PROCURADOR DA RECLAMADA: que o reclamante fez o treinamento do depoente; que o gerente era a autoridade máxima do posto;[...] ERGUNTAS DA PROCURADORA DO RECLAMANTE:[...] que o reclamante tinha autonomia para tomar as decisões do posto; que o chefe de pista bate o caixa e se tive algum problema que não conseguiu resolver, o gerente resolver;[...] que o reclamante tinha autonomia para decisões de "problemas normais", problemas do posto, que se ele não puder ele passa para o supervisor; que o gerente manda mais no posto que o supervisor, que o supervisor está acima do gerente; que o gerente juntamente com o supervisor fez a promoção do depoente de frentista para chefe de loja;[...]". Nada mais. Dessas provas, chama atenção que a testemunha DIONATHAN, embora tenha feito afirmações reveladoras de autonomia da gestão do autor e posteriormente se retratado em algumas oportunidades, em geral sugerindo menor alçada do gerente, em outras ocasiões apenas demonstrou dúvida lacônica, como ao dizer ..."que o depoente não sabe quem procedia à dispensa de funcionários"..., ..."que o depoente nunca viu o reclamante chegar mais tarde ou sair mais cedo"...; ..."que também nunca viu o reclamante faltar ao trabalho." Mas também deixou transparecer poderes especiais de gestão do autor ao aduzir ..."que o reclamante aplicava advertências e suspensões"..., ..."não sabe informar se o reclamante tinha seus horários de trabalho controlados por alguém"..., ..."que em caso de diferença de combustível, quem responde é o gerente"..., ..."em caso de diferença no estoque quem responde é o gerente." Após tudo isso, porém, novamente tendeu à retirada de poder do gerente, afirmando "que o reclamante não tinha autonomia para nenhuma decisão", sendo que, interpelado pelo patrono da reclamada acerca dessa afirmação, tergiversou aduzindo que "o depoente acredita que em uma empresa com vários graus de funções, o reclamante não poderia chegar e mandar alguém embora sem falar com o supervisor, 'é o que o depoente acha." Novamente, vejo pouca credibilidade no testemunho, mormente pelas divagações negativas quanto ao poder decisório do gerente, autoridade máxima presente no posto. A testemunha CÁSSIO, por sua vez, trouxe informações firmes no sentido de ..."que o gerente aplica advertências ou suspensões; que o depoente já presenciou o reclamante aplicando essas penalidades"..., ..."que o gerente resolvia questões de folga de funcionários e escala"..., ..."que o reclamante fez o treinamento do depoente"..., ..."que o gerente era a autoridade máxima do posto"..., ..."que o reclamante tinha autonomia para tomar as decisões do posto"... e ..."que o gerente manda mais no posto que o supervisor, que o supervisor está acima do gerente." A par de toda essa instrução, chego a conclusão diversa daquela empreendida pelo Juízo "a quo", porquanto vejo demonstrado no feito o regular poder de gestão que se espera de um gerente geral de uma unidade empresarial, com anotação em CTPS, remuneração, benesses e responsabilidades típicas da função. Dou provimento ao recurso da reclamada para, reconhecendo a subsunção do autor aos ditames do art. 62, II, da CLT, reformar a sentença que condenou a reclamada em horas extras. CONCLUSÃO Em face do exposto, conheço do recurso ordinário da reclamada e, no mérito, dou-lhe parcial provimento, para excluir suas condenações à restituição de descontos indevidos e pagamento de horas extras, nos termos da fundamentação. Invertida a sucumbência, custas de R$ 3.019,83 pelo autor, apuradas sobre o valor dado à causa(R$ 150.991,91), das quais dispensado, em razão do benefício da Justiça Gratuita. ACÓRDÃO Por tais fundamentos, ACORDAM os Integrantes da egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Décima Região, por unanimidade, aprovar o relatório, conhecer do recurso ordinário da reclamada e, no mérito, por maioria, dar-lhe parcial provimento, para excluir suas condenações à restituição de descontos indevidos e pagamento de horas extras. Invertida a sucumbência, custas de R$ 3.019,83 pelo autor, apuradas sobre o valor dado à causa(R$ 150.991,91), das quais dispensado, em razão do benefício da Justiça Gratuita. Tudo nos termos do voto do Juiz Relator. Vencido o Desembargador Grijalbo Coutinho, que juntará declaração de voto. Ementa aprovada. Julgamento ocorrido sob a Presidência do Desembargador Grijalbo Coutinho, com a participação dos Juízes convocados Denilson B. Coêlho e Luiz Henrique Marques da Rocha. Ausentes, justificadamente, os Desembargadores Flávia Falcão (na direção da Escola Judicial), Elaine Vasconcelos (em licença médica), André R. P. V. Damasceno (em gozo de férias) e Dorival Borges (compromissos junto à ouvidoria). Pelo MPT, o Dr. Alessandro Santos de Miranda (Procurador Regional do Trabalho). Sessão Extraordinária Presencial de 25 de abril de 2025 (data do julgamento). assinado digitalmente Juiz Convocado LUIZ HENRIQUE MARQUES DA ROCHA Relator DECLARAÇÃO DE VOTO Voto do(a) Des(a). GRIJALBO FERNANDES COUTINHO / Desembargador Grijalbo Fernandes Coutinho Destaquei para divergir e manter a sentença pelos seus próprios e jurídicos fundamentos a seguir transcritos de maneira literal,quanto à DEVOLUÇÃO DE DESCONTOS e às HORAS EXTRAS: "Relata o autor que, no exercício do cargo de gerente, sofreu descontos em seu salário, referentes à quebra de caixa de outros frentistas, sempre que as diferenças encontradas não eram quitadas. Sustenta a ilegalidade dos descontos que, juntos, somaram o importe de R$30.775,47, conforme registrado nas advertências e suspensões aplicadas. Alega, por fim, que deixou de receber as ferias 2020/2021, eis que os valores das férias foram descontados a título de quebra de caixa. Pretende, assim, a restituição dos valores indevidamente descontados, e o pagamento das férias 2020/2021 em dobro. Em defesa, a reclamada alega que a hipótese não se refere a simples quebra de caixa, mas a desfalque/desaparecimento de valores de grande monta do caixa da empresa. Argumenta que o autor sempre exerceu o cargo de gerente, sendo o responsável por manter o controle financeiro/fluxo de caixa do posto, razão pela qual era o único empregado a receber as punições relativas a tal questão. Argumenta, contudo, que os valores especificados nas aludidas advertências serviram apenas como justificativa e contextualização da punição, não tendo sido descontados ou cobrados do autor. Sustenta, por fim, que o único valor descontado foi o montante de R$937,56, registrado no TRCT. Pois bem. A documentação juntada às fls. 34/51 revela que o autor recebeu diversas advertências por "incontinência de conduta ou mau procedimento" e "desídia no desempenho das respectivas funções", em razão de ter sido constatada "falta de caixa", em valores diversos, discriminados individualmente em cada penalidade aplicada. A ré não impugnou a totalidade das advertências e respectivos valores lançados na planilha de fl. 144 do PDF da inicial, alegando, contudo, não ter realizado a cobrança dos valores, especificando-os tão somente para fins de contextualização das punições. Os contracheques de fls. 257/277 do PDF de fato não evidenciam nenhum desconto a título de quebra de caixa do contracheque obreiro. Inquirido em audiência, o reclamante afirmou que os descontos não foram efetuados em contracheque, esclarecendo que o supervisor apresentava os valores relativos aos furos de caixa e cobrava do depoente o pagamento em espécie, para ser entregue ao dono da empresa. (ata de fls. 337 do PDF) Referida prática foi confirmada pela prova oral produzida nos autos. Vejamos: "que o depoente trabalhou para a reclamada de 12/03/2021 a março ou junho de 2023, na funçao de frentista; que o depoente trabalhou diretamente com o reclamante; que o reclamante era gerente; ... que ja trabalharam funcionarios de ma indole que deixaram furos de caixa, entao o reclamante tinha que pagar; que o depoente ja presenciou o supervisor cobrando o reclamante; que o depoente nao se recorda dos valores cobrados; que o depoente ja viu o reclamante fazendo entrega de dinheiro em especie para o supervisor, entretanto, o depoente nao sabe informar o montante; que o depoente presenciou esse pagamento somente uma vez; ... que as retiradas do caixa sao feitas na "boleta" e jogadas no cofre; que apos ser retirado o valor, e feita a conferência pelo gerente ou pelo chefe de pista; que o frentista e o responsavel (gerente ou chefe de pista) assinam a boleta; que entao o dinheiro e colocado no cofre e a boleta fica no caixa, depois o carro-forte recolhe; que o supervisor participa desse processo, pois ele se esta faltando algo no caixa, o depoente acredita que isso e feito nos dias em que ele comparece ao posto; indagado pelo procurador da reclamada sobre o motivo pelo qual o depoente afirmou que o pagamento realizado pelo reclamante ao supervisor se refere a quebra de caixa, o depoente explica que nessa ocasiao em que o depoente presenciou o reclamante entregando uma quantia em especie para o supervisor, o depoente tinha presenciado anteriormente o reclamante e o supervisor discutindo ou conversando sobre um furo de caixa que ele teria que pagar; que se o reclamante nao pagasse, ate onde o depoente sabe, o supervisor teria que fazê-lo; ..." (testemunha do autor, Sr. Dionathan Henrique de Sousa dos Santos, Ata de fls. 338 do PDF) Extrai-se do depoimento supra transcrito que o reclamante era cobrado pelo supervisor acerca dos furos de caixa dos frentistas, e o pagamento respectivo era realizado em espécie. Conquanto não tenha indicado nenhum valor específico, a testemunha relatou ter presenciado o reclamante realizando entrega de dinheiro em espécie ao supervisor, sendo que, na referida ocasião, havia presenciado anteriormente o supervisor discutindo/conversando sobre um furo de caixa que o reclamante teria que pagar. A testemunha inquirida a convite da própria reclamada, Sr. Cássio Augusto de Souza, reforça tal conclusão. Com efeito, embora tenha afirmado que nunca presenciou o reclamante pagando furo de caixa, acabou por declarar que, no caso de furo de caixa, acredita que, caso o frentista não pague, o gerente paga a diferença. (ata de fls. 340 do PDF) É certo que o contrato de trabalho do autor dispôs acerca da possibilidade de o empregador efetuar descontos dos prejuízos dos danos causados pelo empregado, nos termos do art. 462, §1º da CLT. (cláusula 7ª, fls. 333 do PDF). Ocorre que, no caso presente, não há evidências de que o reclamado tenha tomado as diligências necessárias a fim de aferir se os furos de caixa foram decorrentes de atos praticados pelo autor, não sendo suficiente, para tanto, a alegação de que o controle financeiro do posto fosse de responsabilidade do reclamante, enquanto gerente. Não há nenhum indicativo de que a ré tenha realizado qualquer investigação acerca dos responsáveis pelos valores identificados como furo de caixa, nem mesmo em relação aos montantes mais expressivos, a exemplo dos períodos de 01 a 05/01/2021, 23 a 26/11/2021 e 01 a 05/12/2021, nos valores de R$ 2.380,89, 4.640,49 e 7.264,94, respectivamente. Assim, a prática adotada pela ré, de cobrar do autor as diferenças de furo de caixa dos frentistas, sem adotar nenhuma diligência que comprove que referidas faltas decorreram de atos praticados pelo autor, evidencia nítida transferência ao trabalhador dos riscos do negócio (art. 2º da CLT). Dessa forma, é devida a restituição dos valores pagos pelo obreiro a título de furos de caixa. Quanto aos valores efetivamente devidos, importante pontuar que o autor confessou, em seu depoimento, ter recuperado junto aos frentistas parte dos montantes pagos ao supervisor. Com efeito, o autor esclareceu que, após entregar o valor para o supervisor, recolhia o pagamento dos frentistas responsáveis. Vejamos: "... que o depoente entregava pagamento em especie para repor o dinheiro que tinha sido constatado como furo de caixa; que o depoente entregava esse dinheiro na mao do supervisor Humberto, que o repassava ao dono da empresa; que esses pagamentos ocorriam todo dia 1º de cada me#s, apos o fechamento do caixa; que quanto ao pagamento de sete mil reais, o depoente esclarece que pagou quatro mil e no dia seguinte, quando caiu o valor de suas ferias, pagou mais tre#s mil; ... que o segundo maior valor que teve que pagar foi de cinco mil reais; ... o depoente esclarece que o furo de caixa era dos frentistas, que por isso depois que o depoente entregava o valor para o supervisor, recolhia o pagamento dos frentistas responsaveis, entretanto, esse pagamento dos frentistas nunca totalizava o valor pago pelo depoente, de forma antecipada, sempre faltava alguma coisa, o depoente diz que quanto ao furo de 7 mil reais, conseguiu pegar 2 mil reais com os frentistas e depois foi cobrando referidos funcionarios pois tinha que colocar o dinheiro no caixa, entretanto, nunca conseguiu recuperar o valor total, recuperou somente 3 mil reais no total; que o gerente era responsavel por todos os caixas do posto; que o depoente fazia confere#ncia do caixa com cada frentista, quando do fechamento." (depoimento do reclamante, Ata de fls. 336/337 do PDF) Nota-se, pelas declarações prestadas pelo autor, que este cobrava dos frentistas os valores pagos antecipadamente. Embora tenha declarado que nunca conseguiu recuperar o valor total, exemplificou que, no pagamento realizado de R$7 mil, recuperou o total de R$3 mil, o que corresponde a aproximadamente 40% do valor pago. Assim, a fim de evitar o enriquecimento ilícito do reclamante, tenho que aproximadamente 40% dos valores por ele custeados a título de furo de caixa foram recuperados junto aos frentistas. Ante o exposto, defiro ao autor a restituição de R$18.465,28, correspondente a 60% do total apontado à inicial a título de cobrança de furo de caixa." --------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------- "Nos termos da exordial, o autor se ativava das 6h às 18h, sem intervalo intrajornada, à exceção dos domingos. Pretende o pagamento das horas extras laboradas, intervalo intrajornada, e reflexos. Contrapõe-se a ré, sustentando que o autor sempre exerceu o cargo de confiança de gerente, inicialmente em caráter de substituição e posteriormente de forma efetiva, não estado submetido ao controle de jornada, enquadrando-se na exceção do art. 62, II, da CLT. Pois bem. Registre-se inicialmente que o artigo 62, II, da CLT contempla dois requisitos para caracterização da hipótese excetiva invocada: um de ordem objetiva e um de índole subjetiva; quais sejam, distinção remuneratória em relação ao salário do cargo efetivo e elevadas atribuições e poderes de gestão. O atendimento aos requisitos referidos é cumulativo, a ausência de um deles afasta a hipótese de exceção invocada. Outrossim, referido dispositivo legal encerra uma presunção - de que referidos empregados, justamente pelo maior patamar na estrutura organizativa da empresa, não estão sujeitos a controle de jornada. Tal presunção não é absoluta. E a ré não demonstrou que o reclamante detivesse expressivos poderes de mando ou gestão, em molde a caracterizar a hipótese legal aventada em contestação (art. 373, II, do CPC). Conquanto tenha sido formalmente enquadrado no cargo de gerente, em substituição ou de forma efetiva, a prova oral produzida revela que o autor, embora exercesse função com fidúcia diferenciada, não possuía elevados poderes de mando e gestão, necessários à caracterização da hipótese excetiva em tela (art. 373, II, do CPC). Em audiência, o preposto da ré, embora tenha afirmado que o autor era o "chefe geral do posto", acabou por admitir que havia supervisão/fiscalização das atribuições do autor pelo supervisor (ata de fls. 338 do PDF) O autor não possuía poder admissional ou demissional. A testemunha Dionathan Henrique de Sousa revelou ter sido encaminhado ao reclamante somente após ter sido contratado pelo RH. (ata de fls. 339 do PDF) E a testemunha inquirida a convite da ré, Sr. Cássio Augusto de Souza, também afirmou que, quando foi conversar com o reclamante sobre a data de início, já estava contratado (ata de fls. 340 do PDF), donde se concluiu que o autor não detinha autonomia para a contratação de funcionários. Tampouco restou demonstrado que o autor detivesse poder demissional (art. 373, II, do CPC), não tendo as testemunhas presenciado nenhuma demissão. Ademais, apesar de a testemunha da ré ter declarado que o autor tinha autonomia para tomar as decisões de "problemas normais" do posto, acabou por revelar que, caso o autor não conseguisse resolver o problema, passava para o supervisor. Revelou ainda que a sua promoção, de frentista para chefe de loja, foi realizada pelo gerente juntamente com o supervisor. Assim, o que se extrai do contexto probatório é que o autor, embora detivesse certo grau de autonomia na gestão do posto, não possuía amplos poderes de mando e gestão, em molde a justificar a incidência do art. 62, II, da CLT. Reitere-se que, para caracterização da hipótese excetiva aventada pela ré, necessário o exercício de elevados poderes de gestão pelo empregado, de modo que este atue como espécie de longa manus do empregador, o que muito se distancia da hipótese dos autos. Resta, portanto, afastada a circunstância legal prevista no art. 62, II, da CLT. Quanto ao horário efetivamente cumprido pelo reclamante, assim foi produzida a prova oral: "que o depoente trabalhou para a reclamada de 12/03/2021 a marc#o ou junho de 2023, na func#ao de frentista; que o depoente trabalhou diretamente com o reclamante; ... que o depoente trabalhou preponderantemente na parte da tarde, das 14h as 22h, mas como se tratou de um periodo com falta de funcionarios no posto, trabalhou tambem na parte da manha; que o depoente sempre viu o reclamante trabalhando das 6h as 17h e pouco/18h; que o reclamante apenas nao trabalhava aos domingos; que o reclamante cumpriu sempre essa jornada; que o depoente nunca viu o reclamante tirar intervalo; ... que o depoente nunca viu o reclamante chegar mais tarde ou sair mais cedo; que tambem nunca viu o reclamante faltar ao trabalho;..."(testemunha do autor, Sr. Dionathan Henrique de Sousa dos Santos, Ata de fls. 338 do PDF) "que o depoente trabalha para a reclamada desde julho de 2019, ... que inicialmente o depoente trabalhava no horario da noite, de 15h as 23h, e depois foi para o horario de 6h as 14h; que o depoente acha que o reclamante entrava as 6h e saia as 18h, de segunda a sabado; que o depoente nao sabe o periodo de intervalo do reclamante; que o depoente acha que o reclamante trabalhava de 2a a 6a feira, sempre no horario acima relatado, que aos sabados trabalhava ate o meio-dia;..." (testemunha da ré. Sr. Cássio Augusto de Souza - Ata de fls. 340/341 do PDF) Nota-se que ambas as testemunhas relataram a jornada obreira de 6h às 18h, à exceção do sábado, não sabendo, nenhuma delas, informar acerca do período de intervalo. E o autor, inquirido em audiência, confessou que "trabalhava de 6h as 18h, de 2a a 6a feira; de 6h as 14h aos sabados e folgava aos domingos; que o depoente poucas vezes tirou 1 hora de intervalo, isso porque sempre tinha funcionario faltando e o depoente tinha que ir para a pista; que o depoente conseguiu tirar a hora integral de intervalo somente duas vezes na semana, que nas demais ocasioes tirava de 10 a 15 minutos de intervalo;... " (Ata de fls. 336 do PDF) Assim, com base na prova oral produzida, e observados os limites da inicial e do depoimento pessoal do reclamante, fixo a seguinte jornada de trabalho para o obreiro: das 06h às 18h de segunda a sexta, e das 06h às 14h aos sábados, com uma hora de intervalo duas vezes na semana, e 15 minutos de intervalo nos demais dias. Ante o exposto, defiro ao reclamante o pagamento das horas extras laboradas, assim entendidas aquelas excedentes à 44ª hora semanal, acrescidas do adicional de 50%, observado o período imprescrito do pacto. Reflexos em férias acrescidas do terço, 13º salário e FGTS.". Conheço e nego provimento ao recurso da reclamada para manter a sentença pelos seus fundamentos antes transcritos literalmente. BRASILIA/DF, 28 de abril de 2025. FERNANDO HENRIQUE MELLO RODRIGUES, Servidor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- WARLEY SANTANA TEIXEIRA
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Cafe Do Sitio Industria E Comercio Ltda e outros x Cafe Do Sitio Industria E Comercio Ltda e outros
ID: 261256077
Tribunal: TRT10
Órgão: 3ª Turma
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 0000354-57.2024.5.10.0009
Data de Disponibilização:
28/04/2025
Advogados:
ALBERTO EMANUEL ALBERTIN MALTA
OAB/DF XXXXXX
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ARTUR ALUISIO NEVES DE PADUA
OAB/DF XXXXXX
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RAFAEL GOMES TEIXEIRA
OAB/DF XXXXXX
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LUCAS AUGUSTO DE MELO SANTOS
OAB/DF XXXXXX
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MATHAEUS LAZARINI DE ALMEIDA
OAB/DF XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 3ª TURMA Relator: PEDRO LUÍS VICENTIN FOLTRAN 0000354-57.2024.5.10.0009 : CAFE DO SITIO INDUSTRIA E COMERCIO LT…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 3ª TURMA Relator: PEDRO LUÍS VICENTIN FOLTRAN 0000354-57.2024.5.10.0009 : CAFE DO SITIO INDUSTRIA E COMERCIO LTDA E OUTROS (1) : CAFE DO SITIO INDUSTRIA E COMERCIO LTDA E OUTROS (1) PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO PROCESSO 0000354-57.2024.5.10.0009 ROT - ACÓRDÃO 3ª TURMA/2025 RELATOR: DESEMBARGADOR PEDRO LUÍS VICENTIN FOLTRAN RECORRENTE: LUCIANA MATOS BARBOSA ADVOGADO: RAFAEL GOMES TEIXEIRA RECORRENTE: CAFE DO SITIO INDUSTRIA E COMERCIO LTDA ADVOGADO: ALBERTO EMANUEL ALBERTIN MALTA RECORRIDOS: OS MESMOS EMENTA 1. CERCEAMENTO DE PRODUÇÃO DE PROVA. INDEFERIMENTO DE OITIVA DE TESTEMUNHAS. CONFISSÃO FICTA. A apresentação de respostas evasivas pela preposta às perguntas elaboradas pelo magistrado na audiência de instrução equivale à recusa de depor, nos termos do art. 386 do CPC. Sendo confesso o empregador, torna-se desnecessária a oitiva de testemunhas sobre o tema, conforme o art. 370, parágrafo único, do CPC. Preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de produção de prova rejeitada. 2. DANO MORAL. VIOLÊNCIA DE GÊNERO. MISOGINIA NO AMBIENTE LABORAL. Comportamentos misóginos são aqueles que refletem o desprezo e desrespeito às mulheres e a tudo o que se aproxima daquilo que, culturalmente, é entendido como feminino. "A raiz da misoginia é a cultura machista e sexista que reforça a superioridade masculina, ao mesmo tempo em que desvaloriza, inferioriza e anula a mulher." A estrutura que conhecemos como "patriarcado" - uma estrutura social hierárquica onde persistem relações de poder de homens sobre mulheres - se alimenta de ações e comportamentos misóginos. Verificada tal violência no ambiente de trabalho sem que o empregador tenha tomado medidas eficazes para reprimi-la e evitá-la, correta a sentença que impôs à empresa a obrigação de indenizar a ofendida. 3. DANO MORAL. FIXAÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO. O montante a ser pago a título de compensação pelo dano moral deve ser fixada com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, levando em conta a extensão do prejuízo, as condições das partes e o caráter pedagógico da medida. Recurso da consignada/reconvinte não provido. 4. RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. Em se tratando de dano grave ao patrimônio imaterial da trabalhadora, a conduta inadequada dos prepostos do empregador, criando um ambiente de trabalho hostil e insustentável, é suficiente para ensejar o reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho. Recurso da consignada/reconvinte parcialmente provido. 5. "VERBAS RESCISÓRIAS. PAGAMENTO. MULTA DO ARTIGO 477, § 8º, DA CLT. HIPÓTESES DE APLICAÇÃO. I - A multa prevista no art. 477, § 8º, da CLT, é devida quando inobservados os prazos fixados em seu § 6º, incluindo as hipóteses de reconhecimento judicial do vínculo de emprego, da rescisão indireta do contrato, da conversão da dispensa por justa causa em rescisão imotivada do contrato e da simulação, pelo empregador, capaz de obstar, no todo ou em parte, o recebimento das parcelas asseguradas em lei ao empregado" (Verbete n.º 61, I, do Pleno do TRT da 10ª Região). 6. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. A interpretação teleológica do art. 840, § 1º, da CLT, em conjunto com a Instrução Normativa n.º 41/2018 do colendo TST e com os princípios da informalidade, simplicidade, amplo acesso à jurisdição, dignidade da pessoa humana e proteção social ao trabalho, conduz à conclusão de que os valores indicados na petição inicial são meramente estimativos. Exigir que a parte autora apresente valores líquidos na petição inicial, sob pena de limitar a condenação, restringiria o jus postulandi e o acesso à justiça. Recurso da consignada/reconvinte provido. 7. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA. DEFERIMENTO. A declaração de hipossuficiência firmada por pessoa física (ou por seu advogado com poderes específicos para tanto) é suficiente para autorizar o deferimento dos benefícios da justiça gratuita, nos termos do inciso I da Súmula n.º 463 do colendo TST, mesmo após o início da vigência da Lei n.º 13.467/2017. Recurso do consignante/reconvindo não provido. 8. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. PERCENTUAL. PARTE BENEFICIÁRIA DA JUSTIÇA GRATUITA. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE. As ações ajuizadas posteriormente à vigência da Lei n.º 13.467/17 atraem a diretriz firmada no art. 791-A da CLT, e não do art. 98 do CPC, aplicável apenas quando há lacuna na lei trabalhista. Assim, os honorários advocatícios de sucumbência são devidos por qualquer dos vencidos entre o mínimo de 5% e o máximo de 15%, não sendo possível a exclusão da verba da condenação, mas apenas a suspensão da exigibilidade da parcela, nos termos previstos no Verbete n.º 75, editado por este egrégio Regional em sua composição plena, e nos moldes decididos pelo excelso STF ao julgar a ADI 5766. A condenação ao pagamento de honorários decorre da mera sucumbência, devendo ser definidos mesmo quando não houver requerimento ou recurso das partes acerca do tema. A verificação da sucumbência em relação a cada pedido considera se o pleito em questão foi julgado procedente (em sua totalidade ou parcialmente) ou improcedente. Considerando os parâmetros adotados pela egrégia 3ª Turma desta Corte para as causas de baixa e média complexidade, mostra-se razoável a fixação de honorários advocatícios de 10% quando estes são devidos pelas partes. Recursos dos litigantes não providos. RELATÓRIO O Exmo. Juiz Acélio Ricardo Vales Leite, atuando na 9ª Vara do Trabalho de Brasília/DF, por meio da sentença às fls. 303/316, complementada às fls. 349/367, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na ação de consignação em pagamento e na reconvenção. A consignada/reconvinte interpôs recurso ordinário às fls. 332/344. O consignante/reconvindo recorreu às fls. 359/394. Contrarrazões pela consignada/reconvinte às fls. 405/410 e pelo consignante/reconvindo às fls. 411/425. Diante da faculdade conferida pelo art. 102 do Regimento Interno deste Regional, deixou-se de encaminhar os presentes autos ao MPT. É o relatório. V O T O ADMISSIBILIDADE Presentes os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade, conheço dos recursos. RECURSO DO CONSIGNANTE/RECONVINDO CERCEAMENTO DE PRODUÇÃO DE PROVA Insurge-se o consignante/reconvindo contra o indeferimento da oitiva de suas testemunhas, requerendo a declaração de nulidade da sentença por cerceamento de produção de prova. Pois bem. Consta às fls. 269/279 a transcrição dos depoimentos prestados pelas partes na audiência de instrução cuja ata se encontra às fls. 233/234. A partir da transcrição, extrai-se que o Exmo. Juiz condutor da audiência perguntou à preposta do reclamado, em diversas oportunidades, qual teria sido a fala do Sr. Sílvio que teria causado sua punição com advertência; contudo, a preposta se esquivou às perguntas, limitando-se a afirmar que foi um "comentário infeliz", sem esclarecer quais teriam sido as palavras efetivamente ditas pelo Sr. Sílvio: "[00:08:43 --> 00:09:07] Preposta: A Luciana disse que estava um pouco desmotivada mesmo, pediu que fosse mandada embora, né? Se a gente conseguiria mandar embora. Só que a Luciana sempre teve um trabalho muito bom, sempre foi um trabalho bem valorizado, então não haveria o porquê, entendeu? De mandar embora. [00:09:08 --> 00:09:13] Advogado da reclamante: Mas foi em razão desse fato, né? Do almoço do Sr. Sílvio que ela manifestou, correto? [00:09:15 --> 00:09:25] Preposta: Então, a Luciana manifestou nesse momento, mas me disse que estava um pouco desmotivada, desanimada. [00:09:26 --> 00:09:28] Advogado da reclamante: Ok. Somente isso, Excelência. [00:09:30 --> 00:09:41] Juiz: Como a empresa considerou a conduta do Sr. Sílvio no episódio mencionado pela reclamante? A empresa viu alguma irregularidade na conduta do Sr. Sílvio? [00:09:44 --> 00:11:21] Preposta: Excelência, a empresa, no tanto que... se empenhou de fazer uma sindicância, então foi aberta uma sindicância. Primeiramente foi feita uma reunião com todos, para poder esclarecer, para poder entender, o RH sempre presente. Então foi aberta essa sindicância, então todos nós fomos ouvidos, pelo RH, pelo jurídico. E aí foi constatado que, de qualquer forma, realmente foi um comentário infeliz do Sílvio, mas foi feito um comentário, a gente estava realmente num momento informal, um almoço informal, não foi dentro das dependências da empresa, e depois de todo esse levantamento, a empresa constatou que, sim, foi um comentário infeliz, mas foram feitas todas as medidas disciplinares. Então, no tanto que o Sílvio recebeu a advertência, Samara foi advertida também. Samara estava pleiteando uma promoção, essa promoção foi encerrada, ela não foi efetivada, né? Então a empresa fez todo o processo que ela podia dentro desse... desse... desse assunto, né? Então foi feita a contraproposta para ela, né? Porque sempre foi uma promotora muito bem elogiada, uma promotora que sempre teve uma excelente execução, um excelente trabalho. [00:11:23 --> 00:11:30] Juiz: O senhor Sílvio foi advertido exatamente por quê? Qual foi considerada a transgressão disciplinar dele? [00:11:31 --> 00:11:37] Preposta: Por ter feito um comentário infeliz, né? foi um comentário, né?... Apesar de a gente estar informal, né? Foi um comentário infeliz, mas foi apurado e o jurídico e o RH, né? constatamos que foi mesmo para medida disciplinar. [00:11:57 --> 00:12:12] Juiz: Quando a senhora diz infeliz, a senhora quer dizer exatamente o quê? Ele foi contrário às normas da empresa, ele foi ofensivo à reclamante, ele... exatamente o que tinha de errado no comentário? [00:12:12 --> 00:12:28] Preposta: Senhor juiz, assim, simplesmente foi um comentário que, na verdade, ele não foi nem agressivo no sentido da palavra, porque foi um comentário só de um almoço informal, entendeu? [00:12:32 --> 00:12:45] Juiz: Mas ele foi punido, imagino que... consta da advertência o motivo da punição. Qual foi o motivo indicado na advertência? [00:12:45 --> 00:12:55] Preposta: É que foi um comentário feito na frente de Samara, na minha frente. Foi mais por isso, por esse motivo, entendeu? [00:13:02 --> 00:13:40] Juiz: Bem, eu acho que eu perguntei de forma suficiente, eu não me considero esclarecido. Eu vou dar mais uma oportunidade para a senhora dizer qual foi a transgressão, a falta que ele cometeu para ser punido. Eu não acho que a senhora tenha respondido. Eu vou considerar a empresa confessa quanto a esse ponto se a senhora não me oferecer uma resposta satisfatória, porque só dizer que ele fez um comentário não é motivo para punição, qualquer pessoa pode fazer um comentário. É preciso que haja algo de errado no comentário. Se a empresa não quer dizer o que ela acha que está de errado nesse comentário, eu vou considerar a empresa confessa. A senhora tem mais algo a esclarecer? [00:13:46 --> 00:14:17] Preposta: Seu juiz, foi feito o esclarecimento, foram todos ouvidos, né? Então, na verdade, ele fez esse comentário infeliz na frente de uma promotora, né? E a promotora acarretou em fofoca, entendeu? Então, assim, foi esse o sentido da questão das medidas disciplinares. [00:14:17 --> 00:14:35] Juiz: Bem, eu acho que eu fui suficientemente claro. Diante da resposta evasiva da preposta, eu considero que há recusa de depor, considero a empresa confessa, portanto, a prova testemunhal será indeferida" (fls. 273/275, sem destaque no original). É de se notar que havia controvérsia acerca do inteiro teor do "comentário infeliz", pois no documento às fls. 227/228 consta apenas uma das afirmações atribuídas ao Sr. Sílvio na reconvenção (fls. 48/59). Em seu depoimento, a preposta se manifestou de forma evasiva, sem responder diretamente às perguntas do magistrado, o que equivale à recusa de depor (art. 386 do CPC). Desse modo, não há de se falar em nulidade da sentença por cerceamento de produção de prova, pois, sendo confesso o reclamado, desnecessária a oitiva de testemunhas acerca do tema (art. 370, parágrafo único, do CPC). Preliminar que se rejeita. RECURSOS DAS PARTES DANO MORAL O Juízo a quo condenou o consignante/reconvindo ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 5.000,00, pelos seguintes fundamentos: "Narra a consignada-reconvinte que sofreu dano moral no trabalho porque 'sofreu constrangimentos e humilhações perante seus colegas de trabalho em razão das falas do preposto da empresa Sr. Silvio, durante um almoço, onde este afirmou para suas colegas que a obreira só conseguia as coisas por ser bonita, além de que, uma das próprias colegas a informou de sua fala sobre ela ter um caso com o gerente.'. A defesa nega a prática de ato ilícito e salienta que tomou as providências cabíveis diante de comentário feito pelo colaborador Sílvio durante encontro informal com outras empregadas. Assevera que a reclamante não se desligou da empresa pelos comentários, mas sim diante da proposta de novo emprego. Ao exame. Dispõe o artigo 186 do Código Civil: 'Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar danos a outrem, ainda que exclusivamente moral, comente ato ilícito.' Por sua vez, o artigo 927 do mesmo Estatuto, estabelece: 'Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.' Como de sabença, para prosperar o pedido de condenação em dano moral, necessária a demonstração de três elementos caracterizadores da responsabilidade civil: provas da existência de ato ilícito; do dano e do nexo de causalidade entre este e aquele. Infere-se do conjunto probatório que a própria consignante-reconvinda admite o comentário inadequado e de cunho machista do supervisor Sílvio com relação ao trabalho da consignada-reconvinte (depoimento pessoal da preposta - transcrição dos depoimentos - 00:09:44 a 00:11:21 - id. 5f3cbaa; advertência disciplinar - id. 4426789 - fls. 10/11). O Juiz é o destinatário da prova, a quem cabe, diante dos elementos constantes dos autos, formar o seu convencimento e emitir sua decisão mediante a respectiva fundamentação (artigo 371 do CPC), em observância aos princípios do livre convencimento motivado e da persuasão racional. Assim, não se vislumbra qualquer cerceamento de defesa ou atuação sem imparcialidade do Exmo. Magistrado condutor da audiência de instrução realizada. Como se não bastasse a confissão retratada em audiência, importante frisar que a prova documental supramencionada e o teor do depoimento pessoal da preposta são suficientes para firmar o convencimento acerca do tema, estando autorizado o Juiz indeferir provas inúteis ou meramente protelatórias, de acordo com o artigo 370, parágrafo único, do CPC. Nesse cenário, tem-se por demonstrados o dano propriamente dito (comentário ofensivo à honra e imagem da consignada-reconvinte) e o nexo de causalidade. Preenchidos, portanto, dois dos requisitos para exsurgir o dever da reclamada em indenizar a autora. Resta claro que a reclamada, por intermédio do respectivo supervisor, negligenciou no cumprimento de sua obrigação em proporcionar ambiente de trabalho saudável à colaboradora. Cometeu a consignante-reconvinda ato ilícito e deve responder pelos danos experimentados pela consignada-reconvinte. Preenchidos, portanto, todos os requisitos para exsurgir a responsabilidade civil da consignada/reconvinte: ato ilícito, dano e nexo de causalidade - artigos 186 c/c 927, do Código Civil Brasileiro. O artigo 944 do Código Civil estabelece que A indenização mede-se pela extensão do dano. No caso em apreço o dano é decorrente das atividades laborais. A conduta da consignante-reconvinda, em não oferecer à obreira ambiente de trabalho saudável contribuiu, sem dúvida, para o infortúnio. Todas essas circunstâncias fáticas devem ser levadas em consideração para fins de quantificar o dano moral. A reparação civil deve ser a mais ampla possível, de sorte a inibir a recidiva do ofensor e também, servir de lenitivo ao ofendido. A indenização decorrente de ato ilícito tem finalidades múltiplas. Primeiro, tem por objetivo propiciar momentos de euforia e de contentamento da vítima, neutralizando a dor e angústia sofridas, em face da lesão perpetrada. Mas a principal finalidade da reparação civil é a de evitar a recidiva da agressão perpetrada. Atua na prevenção, a fim de incutir no ofensor receio de tornara cometer novas agressões. O objetivo da reparação é a mantença do equilíbrio social, na busca da paz, onde os trabalhadores deverão ter respeitada a sua dignidade. E mais: deve servir de advertência a todos os componentes da sociedade, para que não se comportem como se comportou o ofensor, pois se assim agirem, receberão a mesma resposta do Estado-Juiz. Na fixação do valor da indenização, deve o Juiz considerar a situação das pessoas envolvidas, a gravidade das ofensas, de sorte que represente para a vítima uma satisfação, igualmente moral ou, que seja, psicológica, capaz de neutralizar ou amenizar o sofrimento impingidos pelo ofensor. A eficácia da contrapartida pecuniária está na aptidão para proporcionar tal satisfação em justa medida, de modo que tampouco signifique um enriquecimento sem causa da vítima, mas está também em produzir no causador do mal, impacto bastante para dissuadi-lo de igual e novo atentado contra a honra de qualquer pessoa. O Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, quando do julgamento do RO 00178-2004-002-10-00-0, Relator Juiz Brasilino Santos Ramos, deixou assentado: 'DANOS MORAIS. VALORAÇÃO. No arbitramento do valor da condenação em casos de dano moral, não pode o Juiz olvidar de certos indicativos para sua fixação, tais como o grau de culpa do empregador, a situação econômica das partes, a idade e o sexo da vítima, entre outros, sob pena de, ao reparar um dano, provocar a ocorrência de outros prejuízos, inclusive de natureza social. Deve o Magistrado, outrossim, considerar, em cada caso concreto, a equivalência entre o ato faltoso e o dano sofrido, bem como a possibilidade real de cumprimento da obrigação, sempre com observância ao princípio da razoabilidade e à vedação do enriquecimento sem causa' Assim, considerando a condição da consignada-reconvinte, o porte da consignante-reconvinda, e, ainda, a gravidade do ato, entendo que a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) é suficiente para atender as finalidades antes mencionadas. Assim, julgo parcialmente procedente o pedido e condeno a consignante-reconvinda a pagar à consignada-reconvinte a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de danos morais" (fls. 305/308). Em suas razões recursais, o consignante/reconvindo alega que houve julgamento extra petita, pois teria condenado "a empresa subjetivamente por ato único de terceiro, distinto do assédio moral alegado pela Recorrida nos autos" (fl. 381). Aduz, ainda, que não há prova da suposta conduta ofensiva nem de nexo de causalidade. Pretende, assim, a improcedência do pedido de indenização por danos morais. A consignada/reconvinte, por seu turno, postula a majoração do valor atribuído à compensação por prejuízos imateriais para R$ 15.000,00. Pois bem. Conforme decidido no tópico anterior, o consignante/reconvindo é confesso quanto ao teor das afirmações proferidas pelo Sr. Sílvio em desfavor da consignada/reconvinte. Desse modo, tem-se que em um almoço, fora do ambiente de trabalho, mas na presença de outros empregados, o supervisor atribuiu o bom desempenho da reclamante à sua aparência física. Além disso, na conversa foi insinuada a existência de um relacionamento interpessoal inapropriado entre a reclamante e o gerente do supermercado onde ela trabalhava. O teor de tal conversa ultrapassa os limites da mera opinião pessoal e configura ato ilícito, passível de indenização por danos morais, nos termos do art. 186 do Código Civil. O fato de o comentário ter sido feito fora do ambiente de trabalho não exime a empresa de responsabilidade. O supervisor, ao se manifestar dessa forma, agiu em nome da empresa, representando-a perante os demais empregados (art. 932, III, do Código Civil). É imprescindível destacar que a fala de Sílvio não se restringe a um "comentário infeliz", como dito pela preposta. É mais do que necessário, aqui, nomear a violência. Afinal, é apenas conceituando e nomeando as violências de gênero que conseguiremos alcançar uma sociedade equânime. O nome dessa violência é misoginia. "A misoginia se manifesta na discriminação e no ódio contra mulheres" (Portal Gov.br/mulheres). Comportamentos misóginos são aqueles que refletem o desprezo e desrespeito às mulheres e a tudo o que se aproxima daquilo que, culturalmente, é entendido como feminino. É por meio do rebaixamento e inferiorização de qualidades femininas - que se opõem às qualidades tidas como "másculas" - que violências cotidianas acontecem. "A raiz da misoginia é a cultura machista e sexista que reforça a superioridade masculina, ao mesmo tempo em que desvaloriza, inferioriza e anula a mulher. 'A misoginia contribui para assegurar a desigualdade de gênero. Ou seja, que as relações de poder assimétricas entre homens e mulheres persistam e que haja uma supremacia masculina'". (instituto claro.org) Para a pós-doutora e doutora em Psicologia Clínica, Valeska Zanello: "Certas diferenças físicas (diferenças sexuais) foram eleitas para justificar as desigualdades sociais. Às mulheres, pelo fato de terem útero e potencialmente serem mães, foi ligado o âmbito doméstico: elas seriam ´naturalmente´ cuidadoras de seus filhos, mas também da casa e de outras pessoas. Os homens foram ligados ao âmbito público, sendo considerado trabalho os ofícios que eles aí exerciam, supostamente implicando esforço por parte deles, o que seria digno de reconhecimento e remuneração. O capitalismo se firmou na divisão sexuada do trabalho e ´naturalizou´, invisibilizando, o trabalho de cuidar que atribuiu às mulheres (FEDERICI, 2019a, 2019b). Foi nesse momento histórico que surgiu o discurso do instinto materno. (BADINTER, 1985)." (Zanello, Valeska. 2022. A prateleira do amor - sobre mulheres homens e relações) Segundo Zanello, "na era do capitalismo, a diferença [entre homens e mulheres] foi traduzida em desigualdade. (...) Firmou-se a ideia de haver qualidades consideradas femininas - tais como doçura, passividade, disponibilidade e prontidão para cuidar e pensar nos outros, maternidade - relacionadas às mulheres; e outras tais como ambição, força, virilidade, sexualidade, capacidade para o trabalho e para a política, relacionadas aos homens." (Zanello, Valeska. 2022. A prateleira do amor - sobre mulheres homens e relações) Tais características tidas como femininas ou masculinas "têm significados e cargas valorativas distintas. O pouco valor que se atribui àquilo que associamos culturalmente ao 'feminino' (esfera privada, passividade, trabalho de cuidado ou desvalorizado, emoção em detrimento da razão) em comparação com o 'masculino' (esfera pública, atitude, agressividade trabalho remunerado, racionalidade e neutralidade) é fruto da relação de poder entre os gêneros e tende a perpetuá-las" (Fl. 21. Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero, CNJ. Grifos apostos.) Não à toa que, segundo o documento digital sobre Misoginia do site Gov.br, 54% das pessoas desempregadas são mulheres; 66% das mulheres prefeitas já sofreram ataques ofensas e foram vítimas de discurso misógino nas redes sociais e, diariamente, 673 mulheres registram boletim de ocorrência por agressões em contexto de violência doméstica. Portanto, a estrutura que conhecemos como "patriarcado" - uma estrutura social hierárquica onde persistem relações de poder de homens sobre mulheres - se alimenta de ações e comportamentos misóginos, onde homens são valorizados e mulheres são desvalorizadas. É nesse cenário que o "comentário infeliz" de que a reclamante teria "vantagens no trabalho por ser bonita" e por "ter um caso com o gerente" torna a situação absurdamente violenta. Não bastasse isso, como também a ideia de que, em que pese ter reconhecido a própria fala como "machista", o perpetrador ainda tentou justificá-la, se esforçando, assim, para naturalizar a violência, tratando o fato como algo corriqueiro e banal. De nada importa que a reclamante seja uma empregada competente, como relatou a preposta em seu depoimento. Luciana foi reduzida a um corpo objetificado que, na visão machista de Sílvio, só se presta a agradar aos olhos masculinos (por ser bonita) e servir sexualmente a outro homem (porque teria um caso com o gerente). É nesse lugar pequeno e subalterno que Sílvio, um empregado hierarquicamente superior à autora, colocou-a, e fez questão de fazê-lo e na presença de vários colegas de Luciana. Violências, ainda que cotidianas, seguem sendo violências e precisam ser conceituadas, nomeadas para que possam ser reprimidas. Por outro lado, a empresa não junta sequer um documento que garanta que, após a advertência, Sílvio tenha recebido algum tipo de capacitação mínima em letramento de gênero, de forma a não repetir o mesmo comportamento misógino em outras ocasiões e com outras mulheres. Tampouco consta dos autos provas de ações de acolhimento à autora, após ela, uma empregada supostamente valorizada e reconhecida na empresa, ter sido reduzida a um corpo e humilhada perante colegas de trabalho. Assim, considero que a empresa reclamada deve ser responsabilizada pelo ataque ao patrimônio imaterial da reclamante. Nego, pois, provimento ao recurso da empresa reclamada, realçando que não há de se falar em julgamento extra petita, pois a controvérsia foi analisada nos estritos limites delineados pelas partes. Especificamente quanto ao valor da compensação a ser deferida, destaco que doutrina e jurisprudência têm sedimentado que a fixação do quantum compensatório a ser arbitrado na reparação de dano moral deve ficar ao livre e prudente arbítrio do magistrado, único legitimado a aferir, a partir de seu convencimento, a extensão da lesão e o valor cabível que a ela corresponda. O ponto de partida para que o juiz proceda à avaliação do dano moral, ou seja, estime o quantum reparatório, há de ser, se presente, o valor pedido pelo autor, que, em tese, num primeiro momento, obviamente seria o único capaz de mensurar o quantum suficiente para minimizar os sentimentos de revolta e indignação, aliados ao natural desejo de punir, voltado que está para a própria dor. Num segundo instante, caberia a intervenção do juiz, que passaria a apreciar se o valor pretendido se ajusta à situação posta em julgamento, a compreender as circunstâncias do caso, a gravidade do dano, a situação da pessoa que lesa, a condição do lesado, preponderando, como orientação central, a ideia de sanção do ofensor, como forma de obstar a reiteração de casos futuros (BITTAR, Carlos Alberto. A Reparação do dano moral. Rio de Janeiro: Forense, p. 89). O valor da indenização, muito embora por vezes não seja suficiente para apagar as marcas dos danos impostos, não deve servir para o enriquecimento injustificado da parte; também não deve pouco significar para o patrimônio do lesante, já que não serviria para desestimulá-lo à repetição do ato. Assim, considerando a violência de gênero sofrida pela autora, que teve seu caráter profissional esvaziado, preenchido apenas como um corpo a ser avaliado pelos homens ao redor e sexualmente objetificado, e levando em conta o quanto a misoginia impacta na saúde mental de mulheres que, como Luciana, passam diariamente - sem exageros - por violências similares, e, por fim, o desfecho do caso que redundou na sua rescisão contratual, entendo por razoável aumentar o valor indenizatório para o porte de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Provido, aqui, parcialmente o recurso da empregada. RECURSO DA CONSIGNADA/RECONVINTE MODALIDADE DA EXTINÇÃO DO PACTO LABORAL O Juízo a quo indeferiu o pedido de pronunciamento da rescisão indireta do contrato de trabalho, pelos fundamentos que passo a expor: "Alegando descumprimentos contratuais e ofensa à sua honra e boa fama, a consignada-reconvinte pugna pela rescisão indireta do contrato de trabalho, entrega de guias e pagamento de verbas rescisórias, multa do artigo 477 da CLT. Por sua vez, a consignante-reconvinda nega falta grave a ensejar tal modalidade rescisória. Assevera que a obreira não se desligou da empresa pelos comentários do supervisor Sílvio, mas sim diante da proposta de novo emprego. Cabia à consignada-reconvinte provar a justa causa atribuída à consignante-reconvinda. E a prova da justa causa, seja obreira seja patronal, deve ser robusta, conforme se denota da inteligência dos seguintes julgados advindos do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região: RESCISÃO INDIRETA. ÔNUS DA PROVA. A rescisão indireta do contrato de trabalho exige prática de falta grave pelo empregador capaz de tornar insustentável a continuidade do vínculo empregatício, cujo ônus da prova é da parte autora, nos termos do disposto nos artigos 818 da CLT e 373, I, do NCPC. (Recurso Ordinário nº 0001055-20.2016.5.10.0002, Primeira Turma, Data de Julgamento: 27/02/2019, Data de Publicação: DEJT 09/03/2019) RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. A resolução do contrato de trabalho com suporte no artigo 483, alínea 'd', da CLT, reclama falta cometida pelo empregador, revestida de gravidade capaz de inviabilizar a continuidade do contrato de trabalho. Comprovadas as condutas imputadas ao empregador, impõe-se a manutenção da decisão que reconheceu a rescisão indireta. (Recurso Ordinário nº 0000997-57.2016.5.10.0021, Terceira Turma, Data de Julgamento: 23/01/2019, Data de Publicação: DEJT 01/02/2019) 'RESCISÃO INDIRETA. ÔNUS DA PROVA. A CLT prevê, como fator motivador da justa causa, tanto por parte do empregado como do empregador, o ato faltoso cuja gravidade inviabilize a continuidade da relação laboral. Ante o princípio da isonomia de tratamento das partes e da distribuição do ônus da prova, igualmente à justa causa cometida pelo empregado, a do empregador também deve restar cabalmente demonstrada. Caso em que confirmada a justa causa patronal apta a ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho.' (Recurso Ordinário nº 0000392-16.2017.5.10.0009, Redator Desembargador Pedro Luís Vicentin Foltran, Terceira Turma, Data de julgamento: 09/06/2021, Data de publicação: 12/06/2021). 'RESCISÃO INDIRETA. FALTA GRAVE DO EMPREGADOR. CONFIGURAÇÃO. 1 - A rescisão indireta do contrato de trabalho é a modalidade de cessação do contrato de trabalho por decisão do empregado em razão da justa causa praticada pelo empregador (art. 483 da CLT). Para sua configuração, mister que a falta cometida pelo empregador seja de tal monta que abale ou torne impossível a continuidade do contrato. 2. (...)'. (Recurso Ordinário nº 0000072-88.2016.5.10.0012, Redator Desembargador André Rodrigues Pereira da Veiga Damasceno, Primeira Turma, Data de julgamento: 04/08/2021, Data de publicação: 19/08/2021). Entretanto, o depoimento pessoal da obreira aponta que seu desligamento não se deu propriamente em razão dos comentários feitos pelo chefe ou por outra modalidade de descumprimento contratual. Vejamos os trechos a seguir, extraídos da transcrição em id. 5f3cbaa: '(...). [00:05:20 --> 00:05:25] Advogado da empresa: Depois dessa apuração que a empresa fez, você trabalhou normalmente? Como é que foi? Como é que estava o clima de trabalho? [00:05:26 --> 00:06:29] Reclamante: Eu não tava bem emocionalmente. Eu não queria sair. Isso não é... Não prejudicou só na minha área profissional, mas em todas as áreas. Eu não queria sair, eu não queria levantar da cama. Eu só queria ficar deitada, trancada. Mas só que eu não poderia sair... Eu não poderia sair da empresa, porque eu também tenho minhas contas para me pagar, tenho minhas particularidades. E até então eu peguei e comecei a procurar outras coisas fora. E até então que surgiu, aí eu peguei e fui lá na empresa. Falei com o Marcelo, pedi para ele me mandar embora porque eu não estava me sentindo bem, eu não estava feliz. E ele falou que não ia me mandar embora, me ofereceu uma proposta. Eu falei assim que não queria porque eu acho que tem valores que é E eu jamais vou inegociável. Dinheiro e nem emprego compra. me sujeitar a isso. Jamais vou aceitar um tipo de comentário desse, tá? [00:06:31 --> 00:06:39] Advogado da empresa: Certo. E então você saiu, né? Você tá atualmente num novo emprego, né? Reclamante: Sim. Advogado da empresa: Qual que é a empresa? [00:06:39 --> 00:06:40] Reclamante: Pérola Distribuição. [00:06:41 --> 00:06:49] Advogado da empresa: Isso desde mais ou menos de que mês? Reclamante: Como? Advogado da empresa: Que mês que você iniciou esse contrato novo na Pérola? [00:06:51 --> 00:06:59] Reclamante: Eu acredito que foi em maio e março. Não, assim que eu saí do Café do Sítio eu entrei nessa empresa depois de uma semana. [00:07:00 --> 00:07:07] Advogado da empresa: Certo. E a remuneração que você está recebendo lá é qual? [00:07:08 --> 00:07:14] Reclamante: Na carteira tá dois mil e alguma coisa. Mas tem as comissões, né? [00:07:15 --> 00:07:18] Advogado da empresa: É variável, né? Também posição de vendedora, promotora? [00:07:18 --> 00:07:19] Reclamante: É vendedora. (...).'. - destacado. Por todo o exposto, não se vislumbra a aplicabilidade do disposto no artigo 483, 'd', da CLT, mas a intenção da obreira em se desligar da consignante-reconvinda para aceitar outra proposta de emprego, motivo pelo qual julgo improcedente o pedido de rescisão indireta do contrato de trabalho. Consequentemente, declaro que o término contratual ocorreu por iniciativa da consignada-reconvinte em 19 de março de 2024, último dia trabalhado, nos termos do aviso subscrito pela obreira, juntado em id. aaf7c84. Considerando a modalidade rescisória reconhecida (pedido de demissão), ficam indeferidos os pleitos relativos a aviso prévio e indenização de 40%, bem como entrega de guias para saque do FGTS e habilitação no seguro-desemprego. Não sendo declarada a rescisão indireta, julgo improcedente a multa prevista no artigo 477 da CLT. As verbas rescisórias decorrentes do término contratual por iniciativa da trabalhadora foram especificadas em termo rescisório e consignadas em Juízo (id. 9993669). A causa de pedir não relata inadimplementos salariais ou irregularidades quanto ao recolhimento do FGTS. Nada a deferir no aspecto" (fls. 308/311). Recorre a consignada/reconvinte, sustentando que deve ser reconhecido o cometimento de falta grave do empregador apta a justificar a rescisão indireta do contrato de trabalho. Pois bem. De forma diversa do que compreendeu o Juízo a quo, extraio do depoimento da consignada/reconvinte que a iniciativa da empregada de procurar nova colocação decorreu do prejuízo imaterial sofrido em razão das falas do Sr. Sílvio; a consignada/reconvinte afirmou que não poderia pedir demissão, pois tinha contas a pagar, então candidatou-se a vagas em outras empresas e foi contratada em novo emprego uma semana após afastar-se do consignante/reconvindo. Desse modo, compreendo que não houve uma confissão de pedido de demissão para assumir um emprego "melhor", e sim a busca por um novo pacto laboral porque a consignada/reconvinte considerou que o dano moral sofrido era grave o suficiente para impossibilitar a subsistência do contrato de trabalho. A conduta da empresa que, num primeiro momento, na pessoa do supervisor, proferiu comentários sexistas e difamatórios contra a consignada/reconvinte e, posteriormente, ao receber a denúncia dos fatos ocorridos, limitou-se a advertir o supervisor, configura falta grave do empregador, apta a ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho por justa causa. O empregador tem o dever de respeitar a dignidade do empregado, atuando com boa-fé e evitando práticas discriminatórias. O ato do supervisor violou frontalmente esses deveres, criando um ambiente de trabalho hostil e insustentável para a consignada/reconvinte. A quebra da fidúcia, elemento essencial em qualquer relação contratual, é evidente nesse caso. Não se pode exigir que a empregada continue a prestar serviços em um ambiente onde sua dignidade é desrespeitada e sua reputação é questionada. Diante do exposto, configurada a justa causa do empregador para a rescisão indireta do contrato de trabalho, condeno o consignante/reconvindo a pagar aviso prévio de 45 dias, com repercussão sobre férias acrescidas de um terço e 13º salário e a entregar as guias para saque do FGTS e da respectiva multa de 40%. Não há de se falar em seguro-desemprego, pois a consignada/reconvinte foi contratada por outro empregador poucos dias após o término do pacto laboral com o consignante/reconvindo. Defiro, ainda, a multa prevista no § 8º do art. 477 da CLT, considerando o disposto no Verbete n.º 61, I, deste egrégio Regional: "VERBAS RESCISÓRIAS. PAGAMENTO. MULTA DO ARTIGO 477, § 8º, DA CLT. HIPÓTESES DE APLICAÇÃO. I - A multa prevista no art. 477, § 8º, da CLT, é devida quando inobservados os prazos fixados em seu § 6º, incluindo as hipóteses de reconhecimento judicial do vínculo de emprego, da rescisão indireta do contrato, da conversão da dispensa por justa causa em rescisão imotivada do contrato e da simulação, pelo empregador, capaz de obstar, no todo ou em parte, o recebimento das parcelas asseguradas em lei ao empregado". Recurso parcialmente provido, nestes termos. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO Insurge-se a consignada/reconvinte contra a determinação de que a condenação se limite aos valores indicados na reconvenção. Pois bem. Esta egrégia Turma vinha decidindo que somente se admite a atribuição de valores estimados aos pedidos quando houver impossibilidade verdadeira de indicação do montante que a parte entende ser-lhe devido. Contudo, diante que deliberou a colenda SDI-1 do TST, ao apreciar o Emb-RR 0000555-36.2021.5.09.0024, adoto como razões de decidir os fundamentos delineados no referido precedente: "EMBARGOS. RECURSO DE REVISTA. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DO ART. 840, §1º, DA CLT.APLICAÇÃO DA REGRA ESPECIAL PREVISTA NA IN 41/2018 C/C ART. 840, §1º, DA CLT. VALORES INDICADOS NA PETIÇÃO COMO MERA ESTIMATIVA. 1. A controvérsia dos autos cinge-se em definir se os valores atribuídos pela parte aos pedidos na petição inicial limitam a condenação, notadamente na hipótese dos autos em que o reclamante inseriu expressamente ressalva quanto ao valor da causa. 2. A adequada interpretação jurídica das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 aos parágrafos 1º e 2º do artigo 840, da CLT proporciona impacto na prática trabalhista, eis que introduz novos requisitos aos pedidos trazidos nas petições iniciais protocolizadas nas Varas do Trabalho. 3. A exigência de se consignar, na petição inicial, pedidos certos e determinados já era observada nas reclamações trabalhistas, uma vez que a antiga redação do art. 840, §1º, da CLT não continha detalhes acerca do conteúdo e especificações do pedido. Assim, aplicavam-se subsidiariamente (arts. 769, da CLT e 15, do CPC) os artigos 322 e 324 do CPC, quanto à necessidade de que os pedidos fossem certos e determinados. Com a entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017, o §1º do art. 840, da CLT torna-se norma específica que disciplina os requisitos da petição inicial no processo do trabalho. Portanto, além de estipular que os pedidos devem ser certos e determinados, inaugura-se a obrigatoriedade de que cada um contenha a indicação de seu valor. 4. Sob este viés, a exigência de indicação do valor dos pedidos determinada pelo artigo 840, §1º, da CLT objetiva que, desde a petição inicial, as partes delimitem, com razoável destreza, o alcance de sua pretensão. 5. A despeito disso, a redação do artigo 840, §1º, da CLT de determinação de indicação do valor na petição inicial não é inédita no sistema processual trabalhista. Desde os anos 2000, por meio do art. 852-B, I, da CLT (introduzida pela Lei nº 9.957/2000), passou-se a exigir que as petições iniciais submetidas ao rito sumaríssimo fossem líquidas, por se tratarem de causas que, dada a natureza, possuem condições de ser examinadas de forma mais célere pela Justiça do Trabalho. 6. Assim, o artigo 840, §1º, da CLT passou a prever uma equivalência entre os requisitos da petição inicial das ações submetidas ao rito sumaríssimo e àquelas sob o rito ordinário, cuja natureza das demandas, no entanto, tende a ser de ordem mais complexa. 7. Efetivamente, antes das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 nas ações submetidas ao rito ordinário, o quantum debeatur era estabelecido em fase própria de certificação, qual seja, a liquidação de sentença. Ou seja, apenas depois de ultrapassada toda a instrução processual, orientada pelo princípio da imediação, previsto no art. 820 da CLT, com a respectiva colheita de provas e análise de cada uma delas, iniciava-se o momento processual de liquidação dos pedidos. 8. Por força das determinações legais de serem apresentados pedidos certos e determinados, o sistema processual trabalhista então vigente, como houvera de ser, detinha preservados a ampla defesa e o contraditório do réu, que tinha ao seu dispor a possibilidade de contestar cada um dos pedidos, seja na fase de conhecimento, seja na de liquidação. 9. Isto é, o novo comando do art. 840, §1º, da CLT incorpora às demandas trabalhistas sob o rito ordinário critérios técnicos jamais antes exigidos e, uma vez não cumpridos, ter-se-á como consequência, a extinção do processo sem resolução de mérito, conforme determina o também novo §3º, do art. 840, da CLT. Com isso, passou-se a atribuir aos reclamantes o encargo processual de, para ingressar com uma demanda trabalhista, apresentar valores que venham a corresponder ao objeto dos pedidos, sem antes se ter iniciada a fase de instrução processual. 10. Inobstante, o rigor técnico exigido pelo art. 840, §1º, da CLT, interpretado de forma dissociada das demais normas e princípios que regem a processualística trabalhista, conduz a um estreitamento do jus postulandi (art. 791, da CLT), que historicamente é uma das características que mais singularizam, em essência, a jurisdição trabalhista. A contrario sensu, preservando-se essa orientação, mesmo com a nova redação do artigo 840, §1º, da CLT manteve-se a orientação de que, na petição inicial, basta 'uma breve exposição dos fatos', uma vez que as partes, via de regra, não possuem conhecimentos técnicos para formular fundamentos jurídicos do pedido. 11. Nesse cenário, a interpretação gramatical do dispositivo pode conduzir à mitigação do jus postulandi, em desatenção ao princípio do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF). 12. A determinação de indicação dos valores dos pedidos nas causas submetidas ao rito ordinário tem como reflexo a controvérsia trazida pela embargante, qual seja, a eventual vinculação ou limitação da condenação aos valores atribuídos a cada pedido apresentado já na exordial. 13. De fato, de acordo com a regra da congruência entre os pedidos formulados na ação e a condenação arbitrada (arts. 832, da CLT e arts. 141, §2º e 492, do CPC), nos termos do disciplinado nos arts. 141 e 492 do CPC, os valores indicados na petição inicial de forma líquida limitariam àqueles arbitrados na condenação, sob pena de se incorrer em decisão extra, ultra ou citra petita. 14. A partir desse cenário, a natureza do conflito trabalhista submetido à apreciação desta Corte perpassa, entre outros, a averiguação acerca da (im)possibilidade de se determinar que a condenação limite-se a exatamente os valores indicados para cada pedido na petição inicial, sob pena de violação aos artigos 141 e 492 do CPC. 15. No caso concreto, diferentemente do que entendeu o acórdão regional recorrido, no que diz respeito à indicação dos pedidos liquidados na petição inicial, a dicção dos dispositivos acima deve ser cotejada não só com uma interpretação teleológica do art. 840, §1º, da CLT, como também com os princípios da informalidade e da simplicidade, que orientam toda a lógica processual trabalhista. A partir desses princípios, no âmbito desta Justiça Especializada, não se pode exigir das partes reclamantes que, para que recebam a integralidade das verbas a que realmente fazem jus ao final de uma demanda trabalhista, correndo o risco de uma decisão citra, ultra ou extra petita, submetam-se, eventualmente, às regras de produção antecipada de prova e/ou contratação de serviço contábil especializado, a fim de liquidar com precisão cada um dos pedidos para adimplir a exigência do artigo 840, §1º, da CLT e, somente depois disso, ajuizar uma demanda trabalhista. Interpretação nesse sentido afrontaria, a um só tempo, o princípio da oralidade e o dispositivo, que, em conjunto, asseguram às partes reclamantes o direito de ir a juízo pleitear as verbas que entendem lhe serem devidas. 16. Ou seja, a análise sobre a necessidade de limitação do valor da condenação àqueles previamente apresentados na exordial deve ser orientada por uma perspectiva teleológica do direito processual do trabalho, cuja interpretação dos dispositivos que o integram deve, pois, ser sempre norteada pelos princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). 17. Em atenção a isso e considerando o impacto do art. 840, §1º, da CLT na processualística trabalhista, assim como a necessidade de oferecer ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, este Tribunal Superior do Trabalho aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que determina que 'Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil'. 18. A interpretação do art. 840, §1º, da CLT, aliada aos princípios mencionados permite chegar à conclusão de que, tendo o reclamante apresentado, em sua petição inicial, pedido certo e determinado com indicação de valor - estimado -, por um lado, atende-se à exigência do art. 840, §1º, da CLT. Por outro lado, possibilita ao polo passivo o integral exercício da ampla defesa e do contraditório, assegurados pelo artigo 5º, LV, da CF. Trata-se, assim, de interpretação que observa os princípios constitucionais do trabalho, conferindo, igualmente, efetivamente ao referido artigo celetista. 19. Assim, a Instrução Normativa nº 41/2018 ao se referir ao 'valor estimado da causa' acaba por delimitar que o pedido apresentado na petição inicial 'com indicação de seu valor' a que se refere o art. 840, §1º, da CLT deve ser considerado de forma estimada, eis que inexiste nos dispositivos do CPC a que faz remissão a instrução normativa qualquer delimitação em sentido contrário. O artigo 291, do CPC, pertinente à análise ora empreendida apenas se refere à necessidade de indicação de 'valor certo' da causa, inexistindo, portanto, qualquer obrigação de liquidação do valor da causa, tampouco do pedido, com efeito vinculativo à condenação. Ainda, considerando-se a necessária aplicação supletiva do CPC à hipótese, a ausência de indicação de valores na petição inicial não deve ter como consequência a extinção do feito sem resolução do mérito, devendo-se oportunizar à parte a possibilidade de saneamento do defeito, no prazo de 15 dias, por aplicação analógica da Súmula 263 deste TST c/c arts. 4º, 6º e 317 do CPC. 20. Nesse mesmo sentido, interpretando a redação do parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 em confronto com as exigências do art. 840, §1º, da CLT e, igualmente dos artigos 141 e 492 do CPC, este Tribunal Superior do Trabalho acumula precedentes no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante. 21. Por fim, não se ignora que a Eg. SBDI-1, do TST, em precedente publicado em 29/05/2020 (E-ARR-10472-61.2015.5.18.0211, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa) firmou entendimento de que a parte autora, ao formular pedidos com valores líquidos na petição inicial, sem registrar qualquer ressalva, limita a condenação a tais parâmetros, por expressa dicção do art. 492 do CPC. Ocorre que o precedente em questão configura situação singular, eis que o recurso de embargos analisado foi interposto em ação ajuizada antes da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017 e, portanto, da alteração do art. 840, §1º, da CLT c/c Instrução Normativa 41/2018. Assim, não sem razão, a matéria não foi analisada sob a ótica destas normas. Portanto, trata-se o caso concreto de hipótese que revela singularidades quanto àquela analisada pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, razão pela qual esta Turma não fica a ela vinculada. 22. A partir do exposto, na hipótese vertente, em que a inicial foi ajuizada em 04/08/2021, incidem as normas processuais previstas na CLT após as alterações da Lei 13.467/2017. Portanto, os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na reclamação trabalhista devem ser considerados como mera estimativa, não limitando a condenação, por força da Instrução Normativa nº 41/2018 c/c art. 840, §1º, da CLT e dos princípios constitucionais que regem o processo do trabalho, em especial os princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), da proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Embargos conhecidos e não providos" (TST, SDI-1, Emb-RR 0000555-36.2021.5.09.0024, Rel. Min. Alberto Bastos Balazeiro, julgado em 30/11/2023, publicado no DEJT em 7/12/2023). Assim, dou provimento ao recurso da consignada/reconvinte para afastar a limitação aos valores dos pedidos. RECURSOS DAS PARTES JUSTIÇA GRATUITA - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS O consignante/reconvindo se insurge contra o deferimento dos benefícios da justiça gratuita à consignada/reconvinte. Requer, ainda, a majoração dos honorários a cargo da empregada de 10% para 15% sobre o valor das parcelas julgadas improcedentes, bem como o afastamento de sua condenação ao pagamento de honorários de sucumbência. A consignada/reconvinte, por seu turno, requer o indeferimento dos honorários advocatícios em favor dos patronos do consignante/reconvindo. Pois bem. O caput do art. 98 do CPC assim disciplina: "Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei". O inciso I da Súmula n.º 463 do colendo TST dispõe o seguinte: "ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. COMPROVAÇÃO. I - A partir de 26.06.2017, para a concessão da assistência judiciária gratuita à pessoa natural, basta a declaração de hipossuficiência econômica firmada pela parte ou por seu advogado, desde que munido de procuração com poderes específicos para esse fim (art. 105 do CPC de 2015)". Nesse sentido: "(...) II - RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/17. JUSTIÇA GRATUITA. RECLAMAÇÃO TRABALHISTA AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. COMPROVAÇÃO DO ESTADO DE MISERABILIDADE MEDIANTE DECLARAÇÃO PROFERIDA POR PESSOA NATURAL. Entendeu a c. Corte regional que a simples declaração de hipossuficiência é insuficiente para reconhecer a condição de miserabilidade do trabalhador e que, no caso, o autor não comprovou a hipossuficiência de recursos, na medida em que percebe remuneração superior a 40% do limite dos benefícios do RGPS, não apontando despesas que pudessem ser deduzidos desse valor. Pontue-se, por outro lado, que constitui fato incontroverso a existência de declaração de hipossuficiência de recursos. Destarte, a controvérsia reside em saber se é necessária a comprovação do estado de miserabilidade no processo do trabalho para fins de concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita. A Lei nº 1.060/50, que estabelecia as normas para a concessão de assistência judiciária gratuita aos necessitados, previa no parágrafo único do art. 2º que 'Considera-se necessitado, para os fins legais, todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.' Por sua vez, o art. 4º estabelecia como requisito para concessão da gratuidade de justiça que 'A parte gozará dos benefícios da assistência judiciária, mediante simples afirmação, na própria petição inicial, de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família'. Dessa disposição, as partes começaram a apresentar nos autos a declaração de hipossuficiência. O art. 5º da referida lei dispunha expressamente que 'O juiz, se não tiver fundadas razões para indeferir o pedido, deverá julgá-lo de plano, motivando ou não o deferimento dentro do prazo de setenta e duas horas.' Portanto, surgiu para as partes requerentes do benefício da gratuidade da justiça a presunção de veracidade da declaração de hipossuficiência. A jurisprudência do TST havia se consolidado no sentido de que, para a concessão da assistência judiciária gratuita à pessoa natural, bastava a declaração de hipossuficiência econômica firmada pela parte ou por seu advogado. Na mesma linha, o art. 99 do CPC/2015, revogando as disposições da Lei nº 1.060/50 sobre gratuidade de justiça, trouxe em seu §3º que 'Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural'. Nesse sentido, após a entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015, o TST converteu a Orientação Jurisprudencial nº 304 da SBDI-1 na Súmula nº 463. Logo, para a pessoa natural requerer os benefícios da justiça gratuita bastava a juntada de declaração de hipossuficiência, sendo ônus da parte adversa comprovar que o requerente não se enquadrava em nenhuma das situações de miserabilidade. No caso de pedido formulado pelo advogado da parte, este deveria ter procuração com poderes específicos para este fim. No entanto, em 11/11/2017, entrou em vigor a Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista), que inseriu o parágrafo 4º ao art. 790 da CLT. Dessa forma, as ações ajuizadas a partir da entrada em vigor da reforma trabalhista estão submetidas ao que dispõe o § 4º do art. 790 da CLT, que exige a comprovação, pela parte requerente, da insuficiência de recursos para a concessão dos benefícios da justiça gratuita. Sem dúvida, o referido dispositivo inaugurou uma condição menos favorável à pessoa natural do que aquela prevista no Código de Processo Civil. No entanto, em se tratando de norma específica que rege o Processo do Trabalho, não há espaço, a priori, para se utilizar somente as disposições do CPC. Logo, o referido dispositivo implicaria, no ponto de vista do trabalhador, retrocesso social, dificultando o acesso deste ao Poder Judiciário. Assim, a par da questão da constitucionalidade ou não do § 4º do art. 790 da CLT, a aplicação do referido dispositivo não pode ocorrer isoladamente, mas sim deve ser interpretado sistematicamente com as demais normas, quer aquelas constantes na própria CLT, quer aquelas previstas na Constituição Federal e no Código de Processo Civil. Dessa forma, à luz do que dispõe o próprio § 3º do art. 790 da CLT c/c com os arts. 15 e 99, § 3º, do CPC, entende-se que a comprovação a que alude o § 4º do art. 790 da CLT pode ser feita mediante a simples declaração da parte, a fim de viabilizar o pleno acesso do trabalhador ao Poder Judiciário, dando, assim, cumprimento ao art. 5º, XXXV e LXXIV, da Constituição Federal. Isso porque não se pode atribuir ao trabalhador que postula, junto a esta Especializada, uma condição menos favorável àquela destinada aos cidadãos comuns que litigam na justiça comum, sob pena de afronta ao princípio da isonomia, previsto no caput do art. 5º da CF. Não conceder ao autor, no caso dos autos, os benefícios da gratuidade de justiça, é o mesmo que impedir o amplo acesso ao Poder Judiciário (art. 5º, XXXV, da CF) e discriminar o trabalhador em relação às pessoas naturais que litigam na justiça comum (art. 5º, caput, da CF). Recurso de revista conhecido por violação do art. 99, § 3º, do CPC e provido" (TST, 8ª Turma, RR 0002430-80.2020.5.12.0060, Rel. Min. Alexandre de Souza Agra Belmonte, julgado em 3/8/2022, publicado no DEJT em 9/8/2022, grifo nosso). Assim, inexistindo prova capaz de desconstituir a declaração de miserabilidade jurídica firmada pela consignada/reconvinte ou por procurador com poderes específicos para tanto, nego provimento ao recurso do consignante/reconvindo. Quanto aos honorários advocatícios, as ações ajuizadas posteriormente à vigência da Lei n.º 13.467/17 atraem a diretriz firmada no art. 791-A da CLT, e não do art. 98 do CPC, aplicável apenas quando há lacuna na lei trabalhista. Pelo mesmo fundamento, não há de se falar na incidência do texto previsto no art. 85, § 11, do CPC ao caso em tela. Assim, os honorários advocatícios de sucumbência são devidos por qualquer dos vencidos entre o mínimo de 5% e o máximo de 15%, não sendo possível a exclusão da verba da condenação, mas apenas a suspensão da exigibilidade da parcela, nos termos previstos no Verbete n.º 75, editado por este egrégio Regional em sua composição plena: "HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. GRATUIDADE JUDICIÁRIA. ART. 791-A, § 4º, DA CLT. INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL. É inconstitucional a expressão '...desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes e suportar a despesa...', do art. 791-A da CLT, devendo ser suspensa a exigibilidade dos honorários advocatícios, assim como afastada a sua compensação com outros créditos trabalhistas, quando se tratar de parte hipossuficiente (art. 5º, incisos II e LXXIV da CF)". Na mesma linha, decidiu o excelso STF ao julgar a ADI 5766: "CONHEÇO da Ação Direta e, no mérito, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para declarar a inconstitucionalidade da expressão 'ainda que beneficiária da justiça gratuita', constante do caput do art. 790-B; para declarar a inconstitucionalidade do § 4º do mesmo art. 790-B; declarar a inconstitucionalidade da expressão 'desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa', constante do § 4º do art. 791-A". Ressalto que a condenação ao pagamento de honorários decorre da mera sucumbência, devendo ser definidos mesmo quando não houver requerimento ou recurso das partes acerca do tema. Destaco que a verificação da sucumbência em relação a cada pedido considera se o pleito em questão foi julgado procedente (em sua totalidade ou parcialmente) ou improcedente. Considerando a complexidade da causa, o zelo profissional dos patronos e as despesas necessárias para o acompanhamento do processo, nego provimento aos recursos, para manter os honorários de sucumbência a cargo do consignante/reconvindo em 10% sobre o valor da condenação e os honorários devidos pela consignada/reconvinte em 10% sobre o valor dos pedidos julgados improcedentes, mantida a autorização de suspensão da exigibilidade da parcela, nos termos do Verbete n.º 75 deste egrégio Regional. CONCLUSÃO Pelo exposto, nos termos da fundamentação, conheço dos recursos interpostos pelas partes, rejeito a arguição de nulidade da sentença por cerceamento de produção de prova, nego provimento ao recurso do consignante/reconvindo e dou parcial provimento ao recurso da consignada/reconvinte para (i) reconhecer a rescisão indireta do contrato de trabalho firmado entre as partes, (ii) condenar o consignante/reconvindo a pagar aviso prévio de 45 dias, com repercussão sobre férias acrescidas de um terço e 13º salário, bem como a multa prevista no art. 477, § 8º, da CLT, e a entregar as guias para saque do FGTS e da respectiva multa de 40% e (iii)afastar a limitação da condenação aos valores descritos na reconvenção e (iv) majorar a indenização por danos morais para R$ 10.000,00. Custas pelo reconvindo no importe de R$300,00, calculadas sobre R$ 15.000,00, novo valor arbitrado à condenação referente à reconvenção. É como voto. ACÓRDÃO Por tais fundamentos, ACORDAM os Desembargadores da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, em sessão turmária e conforme o contido na respectiva certidão de julgamento, aprovar o relatório, conhecer dos recursos, rejeitar a arguição de nulidade da sentença, negar provimento ao recurso do consignante/reconvindo e dar parcial provimento ao recurso da consignada/reconvinte. Tudo nos termos do voto do Desembargador Relator. Ementa aprovada. Brasília(DF), sala de sessões. Julgamento ocorrido à unanimidade de votos, estando presentes os Desembargadores Pedro Luís Vicentin Foltran (Presidente), Maria Regina Machado Guimarães, Brasilino Santos Ramos, Cilene Ferreira Amaro Santos e Augusto César Alves de Souza Barreto. Deliberado em sessão envio do Acórdão à Coordenadoria de Comunicação Social e Relações Públicas - CDCOM para divulgação no site oficial do TRT/10. Representando o Ministério Público do Trabalho a Procuradora Regional do Trabalho Valesca de Morais do Monte. Fez-se presente em plenário, fazendo uso da tribuna para sustentações orais, o advogado Lucas Augusto de Melo Santos representando a parte Café do Sitio Indústria e Comércio Ltda. Secretária-adjunta da Turma, a Sra. Bárbara França Gontijo. Secretaria da 3ª Turma. Brasília /DF, 23 de abril de 2025. (data do julgamento). PEDRO LUÍS VICENTIN FOLTRAN Desembargador Relator ffp BRASILIA/DF, 25 de abril de 2025. CARLOS JOSINO LIMA, Servidor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- CAFE DO SITIO INDUSTRIA E COMERCIO LTDA
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ID: 261256124
Tribunal: TRT10
Órgão: 3ª Turma
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 0000354-57.2024.5.10.0009
Data de Disponibilização:
28/04/2025
Advogados:
ALBERTO EMANUEL ALBERTIN MALTA
OAB/DF XXXXXX
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ARTUR ALUISIO NEVES DE PADUA
OAB/DF XXXXXX
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RAFAEL GOMES TEIXEIRA
OAB/DF XXXXXX
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LUCAS AUGUSTO DE MELO SANTOS
OAB/DF XXXXXX
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MATHAEUS LAZARINI DE ALMEIDA
OAB/DF XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 3ª TURMA Relator: PEDRO LUÍS VICENTIN FOLTRAN 0000354-57.2024.5.10.0009 : CAFE DO SITIO INDUSTRIA E COMERCIO LT…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO 3ª TURMA Relator: PEDRO LUÍS VICENTIN FOLTRAN 0000354-57.2024.5.10.0009 : CAFE DO SITIO INDUSTRIA E COMERCIO LTDA E OUTROS (1) : CAFE DO SITIO INDUSTRIA E COMERCIO LTDA E OUTROS (1) PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO PROCESSO 0000354-57.2024.5.10.0009 ROT - ACÓRDÃO 3ª TURMA/2025 RELATOR: DESEMBARGADOR PEDRO LUÍS VICENTIN FOLTRAN RECORRENTE: LUCIANA MATOS BARBOSA ADVOGADO: RAFAEL GOMES TEIXEIRA RECORRENTE: CAFE DO SITIO INDUSTRIA E COMERCIO LTDA ADVOGADO: ALBERTO EMANUEL ALBERTIN MALTA RECORRIDOS: OS MESMOS EMENTA 1. CERCEAMENTO DE PRODUÇÃO DE PROVA. INDEFERIMENTO DE OITIVA DE TESTEMUNHAS. CONFISSÃO FICTA. A apresentação de respostas evasivas pela preposta às perguntas elaboradas pelo magistrado na audiência de instrução equivale à recusa de depor, nos termos do art. 386 do CPC. Sendo confesso o empregador, torna-se desnecessária a oitiva de testemunhas sobre o tema, conforme o art. 370, parágrafo único, do CPC. Preliminar de nulidade da sentença por cerceamento de produção de prova rejeitada. 2. DANO MORAL. VIOLÊNCIA DE GÊNERO. MISOGINIA NO AMBIENTE LABORAL. Comportamentos misóginos são aqueles que refletem o desprezo e desrespeito às mulheres e a tudo o que se aproxima daquilo que, culturalmente, é entendido como feminino. "A raiz da misoginia é a cultura machista e sexista que reforça a superioridade masculina, ao mesmo tempo em que desvaloriza, inferioriza e anula a mulher." A estrutura que conhecemos como "patriarcado" - uma estrutura social hierárquica onde persistem relações de poder de homens sobre mulheres - se alimenta de ações e comportamentos misóginos. Verificada tal violência no ambiente de trabalho sem que o empregador tenha tomado medidas eficazes para reprimi-la e evitá-la, correta a sentença que impôs à empresa a obrigação de indenizar a ofendida. 3. DANO MORAL. FIXAÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO. O montante a ser pago a título de compensação pelo dano moral deve ser fixada com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, levando em conta a extensão do prejuízo, as condições das partes e o caráter pedagógico da medida. Recurso da consignada/reconvinte não provido. 4. RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. Em se tratando de dano grave ao patrimônio imaterial da trabalhadora, a conduta inadequada dos prepostos do empregador, criando um ambiente de trabalho hostil e insustentável, é suficiente para ensejar o reconhecimento da rescisão indireta do contrato de trabalho. Recurso da consignada/reconvinte parcialmente provido. 5. "VERBAS RESCISÓRIAS. PAGAMENTO. MULTA DO ARTIGO 477, § 8º, DA CLT. HIPÓTESES DE APLICAÇÃO. I - A multa prevista no art. 477, § 8º, da CLT, é devida quando inobservados os prazos fixados em seu § 6º, incluindo as hipóteses de reconhecimento judicial do vínculo de emprego, da rescisão indireta do contrato, da conversão da dispensa por justa causa em rescisão imotivada do contrato e da simulação, pelo empregador, capaz de obstar, no todo ou em parte, o recebimento das parcelas asseguradas em lei ao empregado" (Verbete n.º 61, I, do Pleno do TRT da 10ª Região). 6. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. A interpretação teleológica do art. 840, § 1º, da CLT, em conjunto com a Instrução Normativa n.º 41/2018 do colendo TST e com os princípios da informalidade, simplicidade, amplo acesso à jurisdição, dignidade da pessoa humana e proteção social ao trabalho, conduz à conclusão de que os valores indicados na petição inicial são meramente estimativos. Exigir que a parte autora apresente valores líquidos na petição inicial, sob pena de limitar a condenação, restringiria o jus postulandi e o acesso à justiça. Recurso da consignada/reconvinte provido. 7. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. DECLARAÇÃO DE HIPOSSUFICIÊNCIA. DEFERIMENTO. A declaração de hipossuficiência firmada por pessoa física (ou por seu advogado com poderes específicos para tanto) é suficiente para autorizar o deferimento dos benefícios da justiça gratuita, nos termos do inciso I da Súmula n.º 463 do colendo TST, mesmo após o início da vigência da Lei n.º 13.467/2017. Recurso do consignante/reconvindo não provido. 8. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. PERCENTUAL. PARTE BENEFICIÁRIA DA JUSTIÇA GRATUITA. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE. As ações ajuizadas posteriormente à vigência da Lei n.º 13.467/17 atraem a diretriz firmada no art. 791-A da CLT, e não do art. 98 do CPC, aplicável apenas quando há lacuna na lei trabalhista. Assim, os honorários advocatícios de sucumbência são devidos por qualquer dos vencidos entre o mínimo de 5% e o máximo de 15%, não sendo possível a exclusão da verba da condenação, mas apenas a suspensão da exigibilidade da parcela, nos termos previstos no Verbete n.º 75, editado por este egrégio Regional em sua composição plena, e nos moldes decididos pelo excelso STF ao julgar a ADI 5766. A condenação ao pagamento de honorários decorre da mera sucumbência, devendo ser definidos mesmo quando não houver requerimento ou recurso das partes acerca do tema. A verificação da sucumbência em relação a cada pedido considera se o pleito em questão foi julgado procedente (em sua totalidade ou parcialmente) ou improcedente. Considerando os parâmetros adotados pela egrégia 3ª Turma desta Corte para as causas de baixa e média complexidade, mostra-se razoável a fixação de honorários advocatícios de 10% quando estes são devidos pelas partes. Recursos dos litigantes não providos. RELATÓRIO O Exmo. Juiz Acélio Ricardo Vales Leite, atuando na 9ª Vara do Trabalho de Brasília/DF, por meio da sentença às fls. 303/316, complementada às fls. 349/367, julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na ação de consignação em pagamento e na reconvenção. A consignada/reconvinte interpôs recurso ordinário às fls. 332/344. O consignante/reconvindo recorreu às fls. 359/394. Contrarrazões pela consignada/reconvinte às fls. 405/410 e pelo consignante/reconvindo às fls. 411/425. Diante da faculdade conferida pelo art. 102 do Regimento Interno deste Regional, deixou-se de encaminhar os presentes autos ao MPT. É o relatório. V O T O ADMISSIBILIDADE Presentes os requisitos subjetivos e objetivos de admissibilidade, conheço dos recursos. RECURSO DO CONSIGNANTE/RECONVINDO CERCEAMENTO DE PRODUÇÃO DE PROVA Insurge-se o consignante/reconvindo contra o indeferimento da oitiva de suas testemunhas, requerendo a declaração de nulidade da sentença por cerceamento de produção de prova. Pois bem. Consta às fls. 269/279 a transcrição dos depoimentos prestados pelas partes na audiência de instrução cuja ata se encontra às fls. 233/234. A partir da transcrição, extrai-se que o Exmo. Juiz condutor da audiência perguntou à preposta do reclamado, em diversas oportunidades, qual teria sido a fala do Sr. Sílvio que teria causado sua punição com advertência; contudo, a preposta se esquivou às perguntas, limitando-se a afirmar que foi um "comentário infeliz", sem esclarecer quais teriam sido as palavras efetivamente ditas pelo Sr. Sílvio: "[00:08:43 --> 00:09:07] Preposta: A Luciana disse que estava um pouco desmotivada mesmo, pediu que fosse mandada embora, né? Se a gente conseguiria mandar embora. Só que a Luciana sempre teve um trabalho muito bom, sempre foi um trabalho bem valorizado, então não haveria o porquê, entendeu? De mandar embora. [00:09:08 --> 00:09:13] Advogado da reclamante: Mas foi em razão desse fato, né? Do almoço do Sr. Sílvio que ela manifestou, correto? [00:09:15 --> 00:09:25] Preposta: Então, a Luciana manifestou nesse momento, mas me disse que estava um pouco desmotivada, desanimada. [00:09:26 --> 00:09:28] Advogado da reclamante: Ok. Somente isso, Excelência. [00:09:30 --> 00:09:41] Juiz: Como a empresa considerou a conduta do Sr. Sílvio no episódio mencionado pela reclamante? A empresa viu alguma irregularidade na conduta do Sr. Sílvio? [00:09:44 --> 00:11:21] Preposta: Excelência, a empresa, no tanto que... se empenhou de fazer uma sindicância, então foi aberta uma sindicância. Primeiramente foi feita uma reunião com todos, para poder esclarecer, para poder entender, o RH sempre presente. Então foi aberta essa sindicância, então todos nós fomos ouvidos, pelo RH, pelo jurídico. E aí foi constatado que, de qualquer forma, realmente foi um comentário infeliz do Sílvio, mas foi feito um comentário, a gente estava realmente num momento informal, um almoço informal, não foi dentro das dependências da empresa, e depois de todo esse levantamento, a empresa constatou que, sim, foi um comentário infeliz, mas foram feitas todas as medidas disciplinares. Então, no tanto que o Sílvio recebeu a advertência, Samara foi advertida também. Samara estava pleiteando uma promoção, essa promoção foi encerrada, ela não foi efetivada, né? Então a empresa fez todo o processo que ela podia dentro desse... desse... desse assunto, né? Então foi feita a contraproposta para ela, né? Porque sempre foi uma promotora muito bem elogiada, uma promotora que sempre teve uma excelente execução, um excelente trabalho. [00:11:23 --> 00:11:30] Juiz: O senhor Sílvio foi advertido exatamente por quê? Qual foi considerada a transgressão disciplinar dele? [00:11:31 --> 00:11:37] Preposta: Por ter feito um comentário infeliz, né? foi um comentário, né?... Apesar de a gente estar informal, né? Foi um comentário infeliz, mas foi apurado e o jurídico e o RH, né? constatamos que foi mesmo para medida disciplinar. [00:11:57 --> 00:12:12] Juiz: Quando a senhora diz infeliz, a senhora quer dizer exatamente o quê? Ele foi contrário às normas da empresa, ele foi ofensivo à reclamante, ele... exatamente o que tinha de errado no comentário? [00:12:12 --> 00:12:28] Preposta: Senhor juiz, assim, simplesmente foi um comentário que, na verdade, ele não foi nem agressivo no sentido da palavra, porque foi um comentário só de um almoço informal, entendeu? [00:12:32 --> 00:12:45] Juiz: Mas ele foi punido, imagino que... consta da advertência o motivo da punição. Qual foi o motivo indicado na advertência? [00:12:45 --> 00:12:55] Preposta: É que foi um comentário feito na frente de Samara, na minha frente. Foi mais por isso, por esse motivo, entendeu? [00:13:02 --> 00:13:40] Juiz: Bem, eu acho que eu perguntei de forma suficiente, eu não me considero esclarecido. Eu vou dar mais uma oportunidade para a senhora dizer qual foi a transgressão, a falta que ele cometeu para ser punido. Eu não acho que a senhora tenha respondido. Eu vou considerar a empresa confessa quanto a esse ponto se a senhora não me oferecer uma resposta satisfatória, porque só dizer que ele fez um comentário não é motivo para punição, qualquer pessoa pode fazer um comentário. É preciso que haja algo de errado no comentário. Se a empresa não quer dizer o que ela acha que está de errado nesse comentário, eu vou considerar a empresa confessa. A senhora tem mais algo a esclarecer? [00:13:46 --> 00:14:17] Preposta: Seu juiz, foi feito o esclarecimento, foram todos ouvidos, né? Então, na verdade, ele fez esse comentário infeliz na frente de uma promotora, né? E a promotora acarretou em fofoca, entendeu? Então, assim, foi esse o sentido da questão das medidas disciplinares. [00:14:17 --> 00:14:35] Juiz: Bem, eu acho que eu fui suficientemente claro. Diante da resposta evasiva da preposta, eu considero que há recusa de depor, considero a empresa confessa, portanto, a prova testemunhal será indeferida" (fls. 273/275, sem destaque no original). É de se notar que havia controvérsia acerca do inteiro teor do "comentário infeliz", pois no documento às fls. 227/228 consta apenas uma das afirmações atribuídas ao Sr. Sílvio na reconvenção (fls. 48/59). Em seu depoimento, a preposta se manifestou de forma evasiva, sem responder diretamente às perguntas do magistrado, o que equivale à recusa de depor (art. 386 do CPC). Desse modo, não há de se falar em nulidade da sentença por cerceamento de produção de prova, pois, sendo confesso o reclamado, desnecessária a oitiva de testemunhas acerca do tema (art. 370, parágrafo único, do CPC). Preliminar que se rejeita. RECURSOS DAS PARTES DANO MORAL O Juízo a quo condenou o consignante/reconvindo ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 5.000,00, pelos seguintes fundamentos: "Narra a consignada-reconvinte que sofreu dano moral no trabalho porque 'sofreu constrangimentos e humilhações perante seus colegas de trabalho em razão das falas do preposto da empresa Sr. Silvio, durante um almoço, onde este afirmou para suas colegas que a obreira só conseguia as coisas por ser bonita, além de que, uma das próprias colegas a informou de sua fala sobre ela ter um caso com o gerente.'. A defesa nega a prática de ato ilícito e salienta que tomou as providências cabíveis diante de comentário feito pelo colaborador Sílvio durante encontro informal com outras empregadas. Assevera que a reclamante não se desligou da empresa pelos comentários, mas sim diante da proposta de novo emprego. Ao exame. Dispõe o artigo 186 do Código Civil: 'Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar danos a outrem, ainda que exclusivamente moral, comente ato ilícito.' Por sua vez, o artigo 927 do mesmo Estatuto, estabelece: 'Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.' Como de sabença, para prosperar o pedido de condenação em dano moral, necessária a demonstração de três elementos caracterizadores da responsabilidade civil: provas da existência de ato ilícito; do dano e do nexo de causalidade entre este e aquele. Infere-se do conjunto probatório que a própria consignante-reconvinda admite o comentário inadequado e de cunho machista do supervisor Sílvio com relação ao trabalho da consignada-reconvinte (depoimento pessoal da preposta - transcrição dos depoimentos - 00:09:44 a 00:11:21 - id. 5f3cbaa; advertência disciplinar - id. 4426789 - fls. 10/11). O Juiz é o destinatário da prova, a quem cabe, diante dos elementos constantes dos autos, formar o seu convencimento e emitir sua decisão mediante a respectiva fundamentação (artigo 371 do CPC), em observância aos princípios do livre convencimento motivado e da persuasão racional. Assim, não se vislumbra qualquer cerceamento de defesa ou atuação sem imparcialidade do Exmo. Magistrado condutor da audiência de instrução realizada. Como se não bastasse a confissão retratada em audiência, importante frisar que a prova documental supramencionada e o teor do depoimento pessoal da preposta são suficientes para firmar o convencimento acerca do tema, estando autorizado o Juiz indeferir provas inúteis ou meramente protelatórias, de acordo com o artigo 370, parágrafo único, do CPC. Nesse cenário, tem-se por demonstrados o dano propriamente dito (comentário ofensivo à honra e imagem da consignada-reconvinte) e o nexo de causalidade. Preenchidos, portanto, dois dos requisitos para exsurgir o dever da reclamada em indenizar a autora. Resta claro que a reclamada, por intermédio do respectivo supervisor, negligenciou no cumprimento de sua obrigação em proporcionar ambiente de trabalho saudável à colaboradora. Cometeu a consignante-reconvinda ato ilícito e deve responder pelos danos experimentados pela consignada-reconvinte. Preenchidos, portanto, todos os requisitos para exsurgir a responsabilidade civil da consignada/reconvinte: ato ilícito, dano e nexo de causalidade - artigos 186 c/c 927, do Código Civil Brasileiro. O artigo 944 do Código Civil estabelece que A indenização mede-se pela extensão do dano. No caso em apreço o dano é decorrente das atividades laborais. A conduta da consignante-reconvinda, em não oferecer à obreira ambiente de trabalho saudável contribuiu, sem dúvida, para o infortúnio. Todas essas circunstâncias fáticas devem ser levadas em consideração para fins de quantificar o dano moral. A reparação civil deve ser a mais ampla possível, de sorte a inibir a recidiva do ofensor e também, servir de lenitivo ao ofendido. A indenização decorrente de ato ilícito tem finalidades múltiplas. Primeiro, tem por objetivo propiciar momentos de euforia e de contentamento da vítima, neutralizando a dor e angústia sofridas, em face da lesão perpetrada. Mas a principal finalidade da reparação civil é a de evitar a recidiva da agressão perpetrada. Atua na prevenção, a fim de incutir no ofensor receio de tornara cometer novas agressões. O objetivo da reparação é a mantença do equilíbrio social, na busca da paz, onde os trabalhadores deverão ter respeitada a sua dignidade. E mais: deve servir de advertência a todos os componentes da sociedade, para que não se comportem como se comportou o ofensor, pois se assim agirem, receberão a mesma resposta do Estado-Juiz. Na fixação do valor da indenização, deve o Juiz considerar a situação das pessoas envolvidas, a gravidade das ofensas, de sorte que represente para a vítima uma satisfação, igualmente moral ou, que seja, psicológica, capaz de neutralizar ou amenizar o sofrimento impingidos pelo ofensor. A eficácia da contrapartida pecuniária está na aptidão para proporcionar tal satisfação em justa medida, de modo que tampouco signifique um enriquecimento sem causa da vítima, mas está também em produzir no causador do mal, impacto bastante para dissuadi-lo de igual e novo atentado contra a honra de qualquer pessoa. O Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, quando do julgamento do RO 00178-2004-002-10-00-0, Relator Juiz Brasilino Santos Ramos, deixou assentado: 'DANOS MORAIS. VALORAÇÃO. No arbitramento do valor da condenação em casos de dano moral, não pode o Juiz olvidar de certos indicativos para sua fixação, tais como o grau de culpa do empregador, a situação econômica das partes, a idade e o sexo da vítima, entre outros, sob pena de, ao reparar um dano, provocar a ocorrência de outros prejuízos, inclusive de natureza social. Deve o Magistrado, outrossim, considerar, em cada caso concreto, a equivalência entre o ato faltoso e o dano sofrido, bem como a possibilidade real de cumprimento da obrigação, sempre com observância ao princípio da razoabilidade e à vedação do enriquecimento sem causa' Assim, considerando a condição da consignada-reconvinte, o porte da consignante-reconvinda, e, ainda, a gravidade do ato, entendo que a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) é suficiente para atender as finalidades antes mencionadas. Assim, julgo parcialmente procedente o pedido e condeno a consignante-reconvinda a pagar à consignada-reconvinte a quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de danos morais" (fls. 305/308). Em suas razões recursais, o consignante/reconvindo alega que houve julgamento extra petita, pois teria condenado "a empresa subjetivamente por ato único de terceiro, distinto do assédio moral alegado pela Recorrida nos autos" (fl. 381). Aduz, ainda, que não há prova da suposta conduta ofensiva nem de nexo de causalidade. Pretende, assim, a improcedência do pedido de indenização por danos morais. A consignada/reconvinte, por seu turno, postula a majoração do valor atribuído à compensação por prejuízos imateriais para R$ 15.000,00. Pois bem. Conforme decidido no tópico anterior, o consignante/reconvindo é confesso quanto ao teor das afirmações proferidas pelo Sr. Sílvio em desfavor da consignada/reconvinte. Desse modo, tem-se que em um almoço, fora do ambiente de trabalho, mas na presença de outros empregados, o supervisor atribuiu o bom desempenho da reclamante à sua aparência física. Além disso, na conversa foi insinuada a existência de um relacionamento interpessoal inapropriado entre a reclamante e o gerente do supermercado onde ela trabalhava. O teor de tal conversa ultrapassa os limites da mera opinião pessoal e configura ato ilícito, passível de indenização por danos morais, nos termos do art. 186 do Código Civil. O fato de o comentário ter sido feito fora do ambiente de trabalho não exime a empresa de responsabilidade. O supervisor, ao se manifestar dessa forma, agiu em nome da empresa, representando-a perante os demais empregados (art. 932, III, do Código Civil). É imprescindível destacar que a fala de Sílvio não se restringe a um "comentário infeliz", como dito pela preposta. É mais do que necessário, aqui, nomear a violência. Afinal, é apenas conceituando e nomeando as violências de gênero que conseguiremos alcançar uma sociedade equânime. O nome dessa violência é misoginia. "A misoginia se manifesta na discriminação e no ódio contra mulheres" (Portal Gov.br/mulheres). Comportamentos misóginos são aqueles que refletem o desprezo e desrespeito às mulheres e a tudo o que se aproxima daquilo que, culturalmente, é entendido como feminino. É por meio do rebaixamento e inferiorização de qualidades femininas - que se opõem às qualidades tidas como "másculas" - que violências cotidianas acontecem. "A raiz da misoginia é a cultura machista e sexista que reforça a superioridade masculina, ao mesmo tempo em que desvaloriza, inferioriza e anula a mulher. 'A misoginia contribui para assegurar a desigualdade de gênero. Ou seja, que as relações de poder assimétricas entre homens e mulheres persistam e que haja uma supremacia masculina'". (instituto claro.org) Para a pós-doutora e doutora em Psicologia Clínica, Valeska Zanello: "Certas diferenças físicas (diferenças sexuais) foram eleitas para justificar as desigualdades sociais. Às mulheres, pelo fato de terem útero e potencialmente serem mães, foi ligado o âmbito doméstico: elas seriam ´naturalmente´ cuidadoras de seus filhos, mas também da casa e de outras pessoas. Os homens foram ligados ao âmbito público, sendo considerado trabalho os ofícios que eles aí exerciam, supostamente implicando esforço por parte deles, o que seria digno de reconhecimento e remuneração. O capitalismo se firmou na divisão sexuada do trabalho e ´naturalizou´, invisibilizando, o trabalho de cuidar que atribuiu às mulheres (FEDERICI, 2019a, 2019b). Foi nesse momento histórico que surgiu o discurso do instinto materno. (BADINTER, 1985)." (Zanello, Valeska. 2022. A prateleira do amor - sobre mulheres homens e relações) Segundo Zanello, "na era do capitalismo, a diferença [entre homens e mulheres] foi traduzida em desigualdade. (...) Firmou-se a ideia de haver qualidades consideradas femininas - tais como doçura, passividade, disponibilidade e prontidão para cuidar e pensar nos outros, maternidade - relacionadas às mulheres; e outras tais como ambição, força, virilidade, sexualidade, capacidade para o trabalho e para a política, relacionadas aos homens." (Zanello, Valeska. 2022. A prateleira do amor - sobre mulheres homens e relações) Tais características tidas como femininas ou masculinas "têm significados e cargas valorativas distintas. O pouco valor que se atribui àquilo que associamos culturalmente ao 'feminino' (esfera privada, passividade, trabalho de cuidado ou desvalorizado, emoção em detrimento da razão) em comparação com o 'masculino' (esfera pública, atitude, agressividade trabalho remunerado, racionalidade e neutralidade) é fruto da relação de poder entre os gêneros e tende a perpetuá-las" (Fl. 21. Protocolo de Julgamento com Perspectiva de Gênero, CNJ. Grifos apostos.) Não à toa que, segundo o documento digital sobre Misoginia do site Gov.br, 54% das pessoas desempregadas são mulheres; 66% das mulheres prefeitas já sofreram ataques ofensas e foram vítimas de discurso misógino nas redes sociais e, diariamente, 673 mulheres registram boletim de ocorrência por agressões em contexto de violência doméstica. Portanto, a estrutura que conhecemos como "patriarcado" - uma estrutura social hierárquica onde persistem relações de poder de homens sobre mulheres - se alimenta de ações e comportamentos misóginos, onde homens são valorizados e mulheres são desvalorizadas. É nesse cenário que o "comentário infeliz" de que a reclamante teria "vantagens no trabalho por ser bonita" e por "ter um caso com o gerente" torna a situação absurdamente violenta. Não bastasse isso, como também a ideia de que, em que pese ter reconhecido a própria fala como "machista", o perpetrador ainda tentou justificá-la, se esforçando, assim, para naturalizar a violência, tratando o fato como algo corriqueiro e banal. De nada importa que a reclamante seja uma empregada competente, como relatou a preposta em seu depoimento. Luciana foi reduzida a um corpo objetificado que, na visão machista de Sílvio, só se presta a agradar aos olhos masculinos (por ser bonita) e servir sexualmente a outro homem (porque teria um caso com o gerente). É nesse lugar pequeno e subalterno que Sílvio, um empregado hierarquicamente superior à autora, colocou-a, e fez questão de fazê-lo e na presença de vários colegas de Luciana. Violências, ainda que cotidianas, seguem sendo violências e precisam ser conceituadas, nomeadas para que possam ser reprimidas. Por outro lado, a empresa não junta sequer um documento que garanta que, após a advertência, Sílvio tenha recebido algum tipo de capacitação mínima em letramento de gênero, de forma a não repetir o mesmo comportamento misógino em outras ocasiões e com outras mulheres. Tampouco consta dos autos provas de ações de acolhimento à autora, após ela, uma empregada supostamente valorizada e reconhecida na empresa, ter sido reduzida a um corpo e humilhada perante colegas de trabalho. Assim, considero que a empresa reclamada deve ser responsabilizada pelo ataque ao patrimônio imaterial da reclamante. Nego, pois, provimento ao recurso da empresa reclamada, realçando que não há de se falar em julgamento extra petita, pois a controvérsia foi analisada nos estritos limites delineados pelas partes. Especificamente quanto ao valor da compensação a ser deferida, destaco que doutrina e jurisprudência têm sedimentado que a fixação do quantum compensatório a ser arbitrado na reparação de dano moral deve ficar ao livre e prudente arbítrio do magistrado, único legitimado a aferir, a partir de seu convencimento, a extensão da lesão e o valor cabível que a ela corresponda. O ponto de partida para que o juiz proceda à avaliação do dano moral, ou seja, estime o quantum reparatório, há de ser, se presente, o valor pedido pelo autor, que, em tese, num primeiro momento, obviamente seria o único capaz de mensurar o quantum suficiente para minimizar os sentimentos de revolta e indignação, aliados ao natural desejo de punir, voltado que está para a própria dor. Num segundo instante, caberia a intervenção do juiz, que passaria a apreciar se o valor pretendido se ajusta à situação posta em julgamento, a compreender as circunstâncias do caso, a gravidade do dano, a situação da pessoa que lesa, a condição do lesado, preponderando, como orientação central, a ideia de sanção do ofensor, como forma de obstar a reiteração de casos futuros (BITTAR, Carlos Alberto. A Reparação do dano moral. Rio de Janeiro: Forense, p. 89). O valor da indenização, muito embora por vezes não seja suficiente para apagar as marcas dos danos impostos, não deve servir para o enriquecimento injustificado da parte; também não deve pouco significar para o patrimônio do lesante, já que não serviria para desestimulá-lo à repetição do ato. Assim, considerando a violência de gênero sofrida pela autora, que teve seu caráter profissional esvaziado, preenchido apenas como um corpo a ser avaliado pelos homens ao redor e sexualmente objetificado, e levando em conta o quanto a misoginia impacta na saúde mental de mulheres que, como Luciana, passam diariamente - sem exageros - por violências similares, e, por fim, o desfecho do caso que redundou na sua rescisão contratual, entendo por razoável aumentar o valor indenizatório para o porte de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Provido, aqui, parcialmente o recurso da empregada. RECURSO DA CONSIGNADA/RECONVINTE MODALIDADE DA EXTINÇÃO DO PACTO LABORAL O Juízo a quo indeferiu o pedido de pronunciamento da rescisão indireta do contrato de trabalho, pelos fundamentos que passo a expor: "Alegando descumprimentos contratuais e ofensa à sua honra e boa fama, a consignada-reconvinte pugna pela rescisão indireta do contrato de trabalho, entrega de guias e pagamento de verbas rescisórias, multa do artigo 477 da CLT. Por sua vez, a consignante-reconvinda nega falta grave a ensejar tal modalidade rescisória. Assevera que a obreira não se desligou da empresa pelos comentários do supervisor Sílvio, mas sim diante da proposta de novo emprego. Cabia à consignada-reconvinte provar a justa causa atribuída à consignante-reconvinda. E a prova da justa causa, seja obreira seja patronal, deve ser robusta, conforme se denota da inteligência dos seguintes julgados advindos do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região: RESCISÃO INDIRETA. ÔNUS DA PROVA. A rescisão indireta do contrato de trabalho exige prática de falta grave pelo empregador capaz de tornar insustentável a continuidade do vínculo empregatício, cujo ônus da prova é da parte autora, nos termos do disposto nos artigos 818 da CLT e 373, I, do NCPC. (Recurso Ordinário nº 0001055-20.2016.5.10.0002, Primeira Turma, Data de Julgamento: 27/02/2019, Data de Publicação: DEJT 09/03/2019) RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO. A resolução do contrato de trabalho com suporte no artigo 483, alínea 'd', da CLT, reclama falta cometida pelo empregador, revestida de gravidade capaz de inviabilizar a continuidade do contrato de trabalho. Comprovadas as condutas imputadas ao empregador, impõe-se a manutenção da decisão que reconheceu a rescisão indireta. (Recurso Ordinário nº 0000997-57.2016.5.10.0021, Terceira Turma, Data de Julgamento: 23/01/2019, Data de Publicação: DEJT 01/02/2019) 'RESCISÃO INDIRETA. ÔNUS DA PROVA. A CLT prevê, como fator motivador da justa causa, tanto por parte do empregado como do empregador, o ato faltoso cuja gravidade inviabilize a continuidade da relação laboral. Ante o princípio da isonomia de tratamento das partes e da distribuição do ônus da prova, igualmente à justa causa cometida pelo empregado, a do empregador também deve restar cabalmente demonstrada. Caso em que confirmada a justa causa patronal apta a ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho.' (Recurso Ordinário nº 0000392-16.2017.5.10.0009, Redator Desembargador Pedro Luís Vicentin Foltran, Terceira Turma, Data de julgamento: 09/06/2021, Data de publicação: 12/06/2021). 'RESCISÃO INDIRETA. FALTA GRAVE DO EMPREGADOR. CONFIGURAÇÃO. 1 - A rescisão indireta do contrato de trabalho é a modalidade de cessação do contrato de trabalho por decisão do empregado em razão da justa causa praticada pelo empregador (art. 483 da CLT). Para sua configuração, mister que a falta cometida pelo empregador seja de tal monta que abale ou torne impossível a continuidade do contrato. 2. (...)'. (Recurso Ordinário nº 0000072-88.2016.5.10.0012, Redator Desembargador André Rodrigues Pereira da Veiga Damasceno, Primeira Turma, Data de julgamento: 04/08/2021, Data de publicação: 19/08/2021). Entretanto, o depoimento pessoal da obreira aponta que seu desligamento não se deu propriamente em razão dos comentários feitos pelo chefe ou por outra modalidade de descumprimento contratual. Vejamos os trechos a seguir, extraídos da transcrição em id. 5f3cbaa: '(...). [00:05:20 --> 00:05:25] Advogado da empresa: Depois dessa apuração que a empresa fez, você trabalhou normalmente? Como é que foi? Como é que estava o clima de trabalho? [00:05:26 --> 00:06:29] Reclamante: Eu não tava bem emocionalmente. Eu não queria sair. Isso não é... Não prejudicou só na minha área profissional, mas em todas as áreas. Eu não queria sair, eu não queria levantar da cama. Eu só queria ficar deitada, trancada. Mas só que eu não poderia sair... Eu não poderia sair da empresa, porque eu também tenho minhas contas para me pagar, tenho minhas particularidades. E até então eu peguei e comecei a procurar outras coisas fora. E até então que surgiu, aí eu peguei e fui lá na empresa. Falei com o Marcelo, pedi para ele me mandar embora porque eu não estava me sentindo bem, eu não estava feliz. E ele falou que não ia me mandar embora, me ofereceu uma proposta. Eu falei assim que não queria porque eu acho que tem valores que é E eu jamais vou inegociável. Dinheiro e nem emprego compra. me sujeitar a isso. Jamais vou aceitar um tipo de comentário desse, tá? [00:06:31 --> 00:06:39] Advogado da empresa: Certo. E então você saiu, né? Você tá atualmente num novo emprego, né? Reclamante: Sim. Advogado da empresa: Qual que é a empresa? [00:06:39 --> 00:06:40] Reclamante: Pérola Distribuição. [00:06:41 --> 00:06:49] Advogado da empresa: Isso desde mais ou menos de que mês? Reclamante: Como? Advogado da empresa: Que mês que você iniciou esse contrato novo na Pérola? [00:06:51 --> 00:06:59] Reclamante: Eu acredito que foi em maio e março. Não, assim que eu saí do Café do Sítio eu entrei nessa empresa depois de uma semana. [00:07:00 --> 00:07:07] Advogado da empresa: Certo. E a remuneração que você está recebendo lá é qual? [00:07:08 --> 00:07:14] Reclamante: Na carteira tá dois mil e alguma coisa. Mas tem as comissões, né? [00:07:15 --> 00:07:18] Advogado da empresa: É variável, né? Também posição de vendedora, promotora? [00:07:18 --> 00:07:19] Reclamante: É vendedora. (...).'. - destacado. Por todo o exposto, não se vislumbra a aplicabilidade do disposto no artigo 483, 'd', da CLT, mas a intenção da obreira em se desligar da consignante-reconvinda para aceitar outra proposta de emprego, motivo pelo qual julgo improcedente o pedido de rescisão indireta do contrato de trabalho. Consequentemente, declaro que o término contratual ocorreu por iniciativa da consignada-reconvinte em 19 de março de 2024, último dia trabalhado, nos termos do aviso subscrito pela obreira, juntado em id. aaf7c84. Considerando a modalidade rescisória reconhecida (pedido de demissão), ficam indeferidos os pleitos relativos a aviso prévio e indenização de 40%, bem como entrega de guias para saque do FGTS e habilitação no seguro-desemprego. Não sendo declarada a rescisão indireta, julgo improcedente a multa prevista no artigo 477 da CLT. As verbas rescisórias decorrentes do término contratual por iniciativa da trabalhadora foram especificadas em termo rescisório e consignadas em Juízo (id. 9993669). A causa de pedir não relata inadimplementos salariais ou irregularidades quanto ao recolhimento do FGTS. Nada a deferir no aspecto" (fls. 308/311). Recorre a consignada/reconvinte, sustentando que deve ser reconhecido o cometimento de falta grave do empregador apta a justificar a rescisão indireta do contrato de trabalho. Pois bem. De forma diversa do que compreendeu o Juízo a quo, extraio do depoimento da consignada/reconvinte que a iniciativa da empregada de procurar nova colocação decorreu do prejuízo imaterial sofrido em razão das falas do Sr. Sílvio; a consignada/reconvinte afirmou que não poderia pedir demissão, pois tinha contas a pagar, então candidatou-se a vagas em outras empresas e foi contratada em novo emprego uma semana após afastar-se do consignante/reconvindo. Desse modo, compreendo que não houve uma confissão de pedido de demissão para assumir um emprego "melhor", e sim a busca por um novo pacto laboral porque a consignada/reconvinte considerou que o dano moral sofrido era grave o suficiente para impossibilitar a subsistência do contrato de trabalho. A conduta da empresa que, num primeiro momento, na pessoa do supervisor, proferiu comentários sexistas e difamatórios contra a consignada/reconvinte e, posteriormente, ao receber a denúncia dos fatos ocorridos, limitou-se a advertir o supervisor, configura falta grave do empregador, apta a ensejar a rescisão indireta do contrato de trabalho por justa causa. O empregador tem o dever de respeitar a dignidade do empregado, atuando com boa-fé e evitando práticas discriminatórias. O ato do supervisor violou frontalmente esses deveres, criando um ambiente de trabalho hostil e insustentável para a consignada/reconvinte. A quebra da fidúcia, elemento essencial em qualquer relação contratual, é evidente nesse caso. Não se pode exigir que a empregada continue a prestar serviços em um ambiente onde sua dignidade é desrespeitada e sua reputação é questionada. Diante do exposto, configurada a justa causa do empregador para a rescisão indireta do contrato de trabalho, condeno o consignante/reconvindo a pagar aviso prévio de 45 dias, com repercussão sobre férias acrescidas de um terço e 13º salário e a entregar as guias para saque do FGTS e da respectiva multa de 40%. Não há de se falar em seguro-desemprego, pois a consignada/reconvinte foi contratada por outro empregador poucos dias após o término do pacto laboral com o consignante/reconvindo. Defiro, ainda, a multa prevista no § 8º do art. 477 da CLT, considerando o disposto no Verbete n.º 61, I, deste egrégio Regional: "VERBAS RESCISÓRIAS. PAGAMENTO. MULTA DO ARTIGO 477, § 8º, DA CLT. HIPÓTESES DE APLICAÇÃO. I - A multa prevista no art. 477, § 8º, da CLT, é devida quando inobservados os prazos fixados em seu § 6º, incluindo as hipóteses de reconhecimento judicial do vínculo de emprego, da rescisão indireta do contrato, da conversão da dispensa por justa causa em rescisão imotivada do contrato e da simulação, pelo empregador, capaz de obstar, no todo ou em parte, o recebimento das parcelas asseguradas em lei ao empregado". Recurso parcialmente provido, nestes termos. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO Insurge-se a consignada/reconvinte contra a determinação de que a condenação se limite aos valores indicados na reconvenção. Pois bem. Esta egrégia Turma vinha decidindo que somente se admite a atribuição de valores estimados aos pedidos quando houver impossibilidade verdadeira de indicação do montante que a parte entende ser-lhe devido. Contudo, diante que deliberou a colenda SDI-1 do TST, ao apreciar o Emb-RR 0000555-36.2021.5.09.0024, adoto como razões de decidir os fundamentos delineados no referido precedente: "EMBARGOS. RECURSO DE REVISTA. LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES ATRIBUÍDOS AOS PEDIDOS NA PETIÇÃO INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DO ART. 840, §1º, DA CLT.APLICAÇÃO DA REGRA ESPECIAL PREVISTA NA IN 41/2018 C/C ART. 840, §1º, DA CLT. VALORES INDICADOS NA PETIÇÃO COMO MERA ESTIMATIVA. 1. A controvérsia dos autos cinge-se em definir se os valores atribuídos pela parte aos pedidos na petição inicial limitam a condenação, notadamente na hipótese dos autos em que o reclamante inseriu expressamente ressalva quanto ao valor da causa. 2. A adequada interpretação jurídica das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 aos parágrafos 1º e 2º do artigo 840, da CLT proporciona impacto na prática trabalhista, eis que introduz novos requisitos aos pedidos trazidos nas petições iniciais protocolizadas nas Varas do Trabalho. 3. A exigência de se consignar, na petição inicial, pedidos certos e determinados já era observada nas reclamações trabalhistas, uma vez que a antiga redação do art. 840, §1º, da CLT não continha detalhes acerca do conteúdo e especificações do pedido. Assim, aplicavam-se subsidiariamente (arts. 769, da CLT e 15, do CPC) os artigos 322 e 324 do CPC, quanto à necessidade de que os pedidos fossem certos e determinados. Com a entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017, o §1º do art. 840, da CLT torna-se norma específica que disciplina os requisitos da petição inicial no processo do trabalho. Portanto, além de estipular que os pedidos devem ser certos e determinados, inaugura-se a obrigatoriedade de que cada um contenha a indicação de seu valor. 4. Sob este viés, a exigência de indicação do valor dos pedidos determinada pelo artigo 840, §1º, da CLT objetiva que, desde a petição inicial, as partes delimitem, com razoável destreza, o alcance de sua pretensão. 5. A despeito disso, a redação do artigo 840, §1º, da CLT de determinação de indicação do valor na petição inicial não é inédita no sistema processual trabalhista. Desde os anos 2000, por meio do art. 852-B, I, da CLT (introduzida pela Lei nº 9.957/2000), passou-se a exigir que as petições iniciais submetidas ao rito sumaríssimo fossem líquidas, por se tratarem de causas que, dada a natureza, possuem condições de ser examinadas de forma mais célere pela Justiça do Trabalho. 6. Assim, o artigo 840, §1º, da CLT passou a prever uma equivalência entre os requisitos da petição inicial das ações submetidas ao rito sumaríssimo e àquelas sob o rito ordinário, cuja natureza das demandas, no entanto, tende a ser de ordem mais complexa. 7. Efetivamente, antes das alterações promovidas pela Lei nº 13.467/2017 nas ações submetidas ao rito ordinário, o quantum debeatur era estabelecido em fase própria de certificação, qual seja, a liquidação de sentença. Ou seja, apenas depois de ultrapassada toda a instrução processual, orientada pelo princípio da imediação, previsto no art. 820 da CLT, com a respectiva colheita de provas e análise de cada uma delas, iniciava-se o momento processual de liquidação dos pedidos. 8. Por força das determinações legais de serem apresentados pedidos certos e determinados, o sistema processual trabalhista então vigente, como houvera de ser, detinha preservados a ampla defesa e o contraditório do réu, que tinha ao seu dispor a possibilidade de contestar cada um dos pedidos, seja na fase de conhecimento, seja na de liquidação. 9. Isto é, o novo comando do art. 840, §1º, da CLT incorpora às demandas trabalhistas sob o rito ordinário critérios técnicos jamais antes exigidos e, uma vez não cumpridos, ter-se-á como consequência, a extinção do processo sem resolução de mérito, conforme determina o também novo §3º, do art. 840, da CLT. Com isso, passou-se a atribuir aos reclamantes o encargo processual de, para ingressar com uma demanda trabalhista, apresentar valores que venham a corresponder ao objeto dos pedidos, sem antes se ter iniciada a fase de instrução processual. 10. Inobstante, o rigor técnico exigido pelo art. 840, §1º, da CLT, interpretado de forma dissociada das demais normas e princípios que regem a processualística trabalhista, conduz a um estreitamento do jus postulandi (art. 791, da CLT), que historicamente é uma das características que mais singularizam, em essência, a jurisdição trabalhista. A contrario sensu, preservando-se essa orientação, mesmo com a nova redação do artigo 840, §1º, da CLT manteve-se a orientação de que, na petição inicial, basta 'uma breve exposição dos fatos', uma vez que as partes, via de regra, não possuem conhecimentos técnicos para formular fundamentos jurídicos do pedido. 11. Nesse cenário, a interpretação gramatical do dispositivo pode conduzir à mitigação do jus postulandi, em desatenção ao princípio do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF). 12. A determinação de indicação dos valores dos pedidos nas causas submetidas ao rito ordinário tem como reflexo a controvérsia trazida pela embargante, qual seja, a eventual vinculação ou limitação da condenação aos valores atribuídos a cada pedido apresentado já na exordial. 13. De fato, de acordo com a regra da congruência entre os pedidos formulados na ação e a condenação arbitrada (arts. 832, da CLT e arts. 141, §2º e 492, do CPC), nos termos do disciplinado nos arts. 141 e 492 do CPC, os valores indicados na petição inicial de forma líquida limitariam àqueles arbitrados na condenação, sob pena de se incorrer em decisão extra, ultra ou citra petita. 14. A partir desse cenário, a natureza do conflito trabalhista submetido à apreciação desta Corte perpassa, entre outros, a averiguação acerca da (im)possibilidade de se determinar que a condenação limite-se a exatamente os valores indicados para cada pedido na petição inicial, sob pena de violação aos artigos 141 e 492 do CPC. 15. No caso concreto, diferentemente do que entendeu o acórdão regional recorrido, no que diz respeito à indicação dos pedidos liquidados na petição inicial, a dicção dos dispositivos acima deve ser cotejada não só com uma interpretação teleológica do art. 840, §1º, da CLT, como também com os princípios da informalidade e da simplicidade, que orientam toda a lógica processual trabalhista. A partir desses princípios, no âmbito desta Justiça Especializada, não se pode exigir das partes reclamantes que, para que recebam a integralidade das verbas a que realmente fazem jus ao final de uma demanda trabalhista, correndo o risco de uma decisão citra, ultra ou extra petita, submetam-se, eventualmente, às regras de produção antecipada de prova e/ou contratação de serviço contábil especializado, a fim de liquidar com precisão cada um dos pedidos para adimplir a exigência do artigo 840, §1º, da CLT e, somente depois disso, ajuizar uma demanda trabalhista. Interpretação nesse sentido afrontaria, a um só tempo, o princípio da oralidade e o dispositivo, que, em conjunto, asseguram às partes reclamantes o direito de ir a juízo pleitear as verbas que entendem lhe serem devidas. 16. Ou seja, a análise sobre a necessidade de limitação do valor da condenação àqueles previamente apresentados na exordial deve ser orientada por uma perspectiva teleológica do direito processual do trabalho, cuja interpretação dos dispositivos que o integram deve, pois, ser sempre norteada pelos princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). 17. Em atenção a isso e considerando o impacto do art. 840, §1º, da CLT na processualística trabalhista, assim como a necessidade de oferecer ao jurisdicionado a segurança jurídica indispensável a possibilitar estabilidade das relações processuais, este Tribunal Superior do Trabalho aprovou a Instrução Normativa nº 41/2018, que determina que 'Para fim do que dispõe o art. 840, §§ 1º e 2º, da CLT, o valor da causa será estimado, observando-se, no que couber, o disposto nos arts. 291 a 293 do Código de Processo Civil'. 18. A interpretação do art. 840, §1º, da CLT, aliada aos princípios mencionados permite chegar à conclusão de que, tendo o reclamante apresentado, em sua petição inicial, pedido certo e determinado com indicação de valor - estimado -, por um lado, atende-se à exigência do art. 840, §1º, da CLT. Por outro lado, possibilita ao polo passivo o integral exercício da ampla defesa e do contraditório, assegurados pelo artigo 5º, LV, da CF. Trata-se, assim, de interpretação que observa os princípios constitucionais do trabalho, conferindo, igualmente, efetivamente ao referido artigo celetista. 19. Assim, a Instrução Normativa nº 41/2018 ao se referir ao 'valor estimado da causa' acaba por delimitar que o pedido apresentado na petição inicial 'com indicação de seu valor' a que se refere o art. 840, §1º, da CLT deve ser considerado de forma estimada, eis que inexiste nos dispositivos do CPC a que faz remissão a instrução normativa qualquer delimitação em sentido contrário. O artigo 291, do CPC, pertinente à análise ora empreendida apenas se refere à necessidade de indicação de 'valor certo' da causa, inexistindo, portanto, qualquer obrigação de liquidação do valor da causa, tampouco do pedido, com efeito vinculativo à condenação. Ainda, considerando-se a necessária aplicação supletiva do CPC à hipótese, a ausência de indicação de valores na petição inicial não deve ter como consequência a extinção do feito sem resolução do mérito, devendo-se oportunizar à parte a possibilidade de saneamento do defeito, no prazo de 15 dias, por aplicação analógica da Súmula 263 deste TST c/c arts. 4º, 6º e 317 do CPC. 20. Nesse mesmo sentido, interpretando a redação do parágrafo 2º do artigo 12 da IN 41/2018 em confronto com as exigências do art. 840, §1º, da CLT e, igualmente dos artigos 141 e 492 do CPC, este Tribunal Superior do Trabalho acumula precedentes no sentido de que os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na exordial devem ser considerados apenas como fim estimado, não havendo limitação da condenação àquele montante. 21. Por fim, não se ignora que a Eg. SBDI-1, do TST, em precedente publicado em 29/05/2020 (E-ARR-10472-61.2015.5.18.0211, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Walmir Oliveira da Costa) firmou entendimento de que a parte autora, ao formular pedidos com valores líquidos na petição inicial, sem registrar qualquer ressalva, limita a condenação a tais parâmetros, por expressa dicção do art. 492 do CPC. Ocorre que o precedente em questão configura situação singular, eis que o recurso de embargos analisado foi interposto em ação ajuizada antes da entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017 e, portanto, da alteração do art. 840, §1º, da CLT c/c Instrução Normativa 41/2018. Assim, não sem razão, a matéria não foi analisada sob a ótica destas normas. Portanto, trata-se o caso concreto de hipótese que revela singularidades quanto àquela analisada pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, razão pela qual esta Turma não fica a ela vinculada. 22. A partir do exposto, na hipótese vertente, em que a inicial foi ajuizada em 04/08/2021, incidem as normas processuais previstas na CLT após as alterações da Lei 13.467/2017. Portanto, os valores constantes nos pedidos apresentados de forma líquida na reclamação trabalhista devem ser considerados como mera estimativa, não limitando a condenação, por força da Instrução Normativa nº 41/2018 c/c art. 840, §1º, da CLT e dos princípios constitucionais que regem o processo do trabalho, em especial os princípios do amplo acesso à jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF), da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF), da proteção social do trabalho (art. 1º, IV, da CF). Embargos conhecidos e não providos" (TST, SDI-1, Emb-RR 0000555-36.2021.5.09.0024, Rel. Min. Alberto Bastos Balazeiro, julgado em 30/11/2023, publicado no DEJT em 7/12/2023). Assim, dou provimento ao recurso da consignada/reconvinte para afastar a limitação aos valores dos pedidos. RECURSOS DAS PARTES JUSTIÇA GRATUITA - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS O consignante/reconvindo se insurge contra o deferimento dos benefícios da justiça gratuita à consignada/reconvinte. Requer, ainda, a majoração dos honorários a cargo da empregada de 10% para 15% sobre o valor das parcelas julgadas improcedentes, bem como o afastamento de sua condenação ao pagamento de honorários de sucumbência. A consignada/reconvinte, por seu turno, requer o indeferimento dos honorários advocatícios em favor dos patronos do consignante/reconvindo. Pois bem. O caput do art. 98 do CPC assim disciplina: "Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei". O inciso I da Súmula n.º 463 do colendo TST dispõe o seguinte: "ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. COMPROVAÇÃO. I - A partir de 26.06.2017, para a concessão da assistência judiciária gratuita à pessoa natural, basta a declaração de hipossuficiência econômica firmada pela parte ou por seu advogado, desde que munido de procuração com poderes específicos para esse fim (art. 105 do CPC de 2015)". Nesse sentido: "(...) II - RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 13.467/17. JUSTIÇA GRATUITA. RECLAMAÇÃO TRABALHISTA AJUIZADA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. COMPROVAÇÃO DO ESTADO DE MISERABILIDADE MEDIANTE DECLARAÇÃO PROFERIDA POR PESSOA NATURAL. Entendeu a c. Corte regional que a simples declaração de hipossuficiência é insuficiente para reconhecer a condição de miserabilidade do trabalhador e que, no caso, o autor não comprovou a hipossuficiência de recursos, na medida em que percebe remuneração superior a 40% do limite dos benefícios do RGPS, não apontando despesas que pudessem ser deduzidos desse valor. Pontue-se, por outro lado, que constitui fato incontroverso a existência de declaração de hipossuficiência de recursos. Destarte, a controvérsia reside em saber se é necessária a comprovação do estado de miserabilidade no processo do trabalho para fins de concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita. A Lei nº 1.060/50, que estabelecia as normas para a concessão de assistência judiciária gratuita aos necessitados, previa no parágrafo único do art. 2º que 'Considera-se necessitado, para os fins legais, todo aquele cuja situação econômica não lhe permita pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo do sustento próprio ou da família.' Por sua vez, o art. 4º estabelecia como requisito para concessão da gratuidade de justiça que 'A parte gozará dos benefícios da assistência judiciária, mediante simples afirmação, na própria petição inicial, de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família'. Dessa disposição, as partes começaram a apresentar nos autos a declaração de hipossuficiência. O art. 5º da referida lei dispunha expressamente que 'O juiz, se não tiver fundadas razões para indeferir o pedido, deverá julgá-lo de plano, motivando ou não o deferimento dentro do prazo de setenta e duas horas.' Portanto, surgiu para as partes requerentes do benefício da gratuidade da justiça a presunção de veracidade da declaração de hipossuficiência. A jurisprudência do TST havia se consolidado no sentido de que, para a concessão da assistência judiciária gratuita à pessoa natural, bastava a declaração de hipossuficiência econômica firmada pela parte ou por seu advogado. Na mesma linha, o art. 99 do CPC/2015, revogando as disposições da Lei nº 1.060/50 sobre gratuidade de justiça, trouxe em seu §3º que 'Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural'. Nesse sentido, após a entrada em vigor do Código de Processo Civil de 2015, o TST converteu a Orientação Jurisprudencial nº 304 da SBDI-1 na Súmula nº 463. Logo, para a pessoa natural requerer os benefícios da justiça gratuita bastava a juntada de declaração de hipossuficiência, sendo ônus da parte adversa comprovar que o requerente não se enquadrava em nenhuma das situações de miserabilidade. No caso de pedido formulado pelo advogado da parte, este deveria ter procuração com poderes específicos para este fim. No entanto, em 11/11/2017, entrou em vigor a Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista), que inseriu o parágrafo 4º ao art. 790 da CLT. Dessa forma, as ações ajuizadas a partir da entrada em vigor da reforma trabalhista estão submetidas ao que dispõe o § 4º do art. 790 da CLT, que exige a comprovação, pela parte requerente, da insuficiência de recursos para a concessão dos benefícios da justiça gratuita. Sem dúvida, o referido dispositivo inaugurou uma condição menos favorável à pessoa natural do que aquela prevista no Código de Processo Civil. No entanto, em se tratando de norma específica que rege o Processo do Trabalho, não há espaço, a priori, para se utilizar somente as disposições do CPC. Logo, o referido dispositivo implicaria, no ponto de vista do trabalhador, retrocesso social, dificultando o acesso deste ao Poder Judiciário. Assim, a par da questão da constitucionalidade ou não do § 4º do art. 790 da CLT, a aplicação do referido dispositivo não pode ocorrer isoladamente, mas sim deve ser interpretado sistematicamente com as demais normas, quer aquelas constantes na própria CLT, quer aquelas previstas na Constituição Federal e no Código de Processo Civil. Dessa forma, à luz do que dispõe o próprio § 3º do art. 790 da CLT c/c com os arts. 15 e 99, § 3º, do CPC, entende-se que a comprovação a que alude o § 4º do art. 790 da CLT pode ser feita mediante a simples declaração da parte, a fim de viabilizar o pleno acesso do trabalhador ao Poder Judiciário, dando, assim, cumprimento ao art. 5º, XXXV e LXXIV, da Constituição Federal. Isso porque não se pode atribuir ao trabalhador que postula, junto a esta Especializada, uma condição menos favorável àquela destinada aos cidadãos comuns que litigam na justiça comum, sob pena de afronta ao princípio da isonomia, previsto no caput do art. 5º da CF. Não conceder ao autor, no caso dos autos, os benefícios da gratuidade de justiça, é o mesmo que impedir o amplo acesso ao Poder Judiciário (art. 5º, XXXV, da CF) e discriminar o trabalhador em relação às pessoas naturais que litigam na justiça comum (art. 5º, caput, da CF). Recurso de revista conhecido por violação do art. 99, § 3º, do CPC e provido" (TST, 8ª Turma, RR 0002430-80.2020.5.12.0060, Rel. Min. Alexandre de Souza Agra Belmonte, julgado em 3/8/2022, publicado no DEJT em 9/8/2022, grifo nosso). Assim, inexistindo prova capaz de desconstituir a declaração de miserabilidade jurídica firmada pela consignada/reconvinte ou por procurador com poderes específicos para tanto, nego provimento ao recurso do consignante/reconvindo. Quanto aos honorários advocatícios, as ações ajuizadas posteriormente à vigência da Lei n.º 13.467/17 atraem a diretriz firmada no art. 791-A da CLT, e não do art. 98 do CPC, aplicável apenas quando há lacuna na lei trabalhista. Pelo mesmo fundamento, não há de se falar na incidência do texto previsto no art. 85, § 11, do CPC ao caso em tela. Assim, os honorários advocatícios de sucumbência são devidos por qualquer dos vencidos entre o mínimo de 5% e o máximo de 15%, não sendo possível a exclusão da verba da condenação, mas apenas a suspensão da exigibilidade da parcela, nos termos previstos no Verbete n.º 75, editado por este egrégio Regional em sua composição plena: "HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. GRATUIDADE JUDICIÁRIA. ART. 791-A, § 4º, DA CLT. INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL. É inconstitucional a expressão '...desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes e suportar a despesa...', do art. 791-A da CLT, devendo ser suspensa a exigibilidade dos honorários advocatícios, assim como afastada a sua compensação com outros créditos trabalhistas, quando se tratar de parte hipossuficiente (art. 5º, incisos II e LXXIV da CF)". Na mesma linha, decidiu o excelso STF ao julgar a ADI 5766: "CONHEÇO da Ação Direta e, no mérito, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para declarar a inconstitucionalidade da expressão 'ainda que beneficiária da justiça gratuita', constante do caput do art. 790-B; para declarar a inconstitucionalidade do § 4º do mesmo art. 790-B; declarar a inconstitucionalidade da expressão 'desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa', constante do § 4º do art. 791-A". Ressalto que a condenação ao pagamento de honorários decorre da mera sucumbência, devendo ser definidos mesmo quando não houver requerimento ou recurso das partes acerca do tema. Destaco que a verificação da sucumbência em relação a cada pedido considera se o pleito em questão foi julgado procedente (em sua totalidade ou parcialmente) ou improcedente. Considerando a complexidade da causa, o zelo profissional dos patronos e as despesas necessárias para o acompanhamento do processo, nego provimento aos recursos, para manter os honorários de sucumbência a cargo do consignante/reconvindo em 10% sobre o valor da condenação e os honorários devidos pela consignada/reconvinte em 10% sobre o valor dos pedidos julgados improcedentes, mantida a autorização de suspensão da exigibilidade da parcela, nos termos do Verbete n.º 75 deste egrégio Regional. CONCLUSÃO Pelo exposto, nos termos da fundamentação, conheço dos recursos interpostos pelas partes, rejeito a arguição de nulidade da sentença por cerceamento de produção de prova, nego provimento ao recurso do consignante/reconvindo e dou parcial provimento ao recurso da consignada/reconvinte para (i) reconhecer a rescisão indireta do contrato de trabalho firmado entre as partes, (ii) condenar o consignante/reconvindo a pagar aviso prévio de 45 dias, com repercussão sobre férias acrescidas de um terço e 13º salário, bem como a multa prevista no art. 477, § 8º, da CLT, e a entregar as guias para saque do FGTS e da respectiva multa de 40% e (iii)afastar a limitação da condenação aos valores descritos na reconvenção e (iv) majorar a indenização por danos morais para R$ 10.000,00. Custas pelo reconvindo no importe de R$300,00, calculadas sobre R$ 15.000,00, novo valor arbitrado à condenação referente à reconvenção. É como voto. ACÓRDÃO Por tais fundamentos, ACORDAM os Desembargadores da 3ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, em sessão turmária e conforme o contido na respectiva certidão de julgamento, aprovar o relatório, conhecer dos recursos, rejeitar a arguição de nulidade da sentença, negar provimento ao recurso do consignante/reconvindo e dar parcial provimento ao recurso da consignada/reconvinte. Tudo nos termos do voto do Desembargador Relator. Ementa aprovada. Brasília(DF), sala de sessões. Julgamento ocorrido à unanimidade de votos, estando presentes os Desembargadores Pedro Luís Vicentin Foltran (Presidente), Maria Regina Machado Guimarães, Brasilino Santos Ramos, Cilene Ferreira Amaro Santos e Augusto César Alves de Souza Barreto. Deliberado em sessão envio do Acórdão à Coordenadoria de Comunicação Social e Relações Públicas - CDCOM para divulgação no site oficial do TRT/10. Representando o Ministério Público do Trabalho a Procuradora Regional do Trabalho Valesca de Morais do Monte. Fez-se presente em plenário, fazendo uso da tribuna para sustentações orais, o advogado Lucas Augusto de Melo Santos representando a parte Café do Sitio Indústria e Comércio Ltda. Secretária-adjunta da Turma, a Sra. Bárbara França Gontijo. Secretaria da 3ª Turma. Brasília /DF, 23 de abril de 2025. (data do julgamento). PEDRO LUÍS VICENTIN FOLTRAN Desembargador Relator ffp BRASILIA/DF, 25 de abril de 2025. CARLOS JOSINO LIMA, Servidor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- LUCIANA MATOS BARBOSA
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