Ifood.Com Agencia De Restaurantes Online S.A. e outros x Antonio Charles Costa Do Nascimento e outros
ID: 259598438
Tribunal: TRT7
Órgão: 2ª Turma
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 0000305-03.2024.5.07.0008
Data de Disponibilização:
24/04/2025
Advogados:
ANACLETO FIGUEIREDO DE PAULA PESSOA NETO
OAB/CE XXXXXX
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TATIANA GUIMARAES FERRAZ ANDRADE
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 7ª REGIÃO 2ª TURMA Relator: FRANCISCO JOSÉ GOMES DA SILVA 0000305-03.2024.5.07.0008 : IFOOD.COM AGENCIA DE RESTAURANTES ON…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 7ª REGIÃO 2ª TURMA Relator: FRANCISCO JOSÉ GOMES DA SILVA 0000305-03.2024.5.07.0008 : IFOOD.COM AGENCIA DE RESTAURANTES ONLINE S.A. : ANTONIO CHARLES COSTA DO NASCIMENTO E OUTROS (1) EMENTA DIREITO INDIVIDUAL DO TRABALHO. RECURSO ORDINÁRIO DO SEGUNDO RECLAMADO. ENTREGADOR DE APLICATIVO. RELAÇÃO DE EMPREGO. INOCORRÊNCIA. CONFISSÃO QUANTO A AUSÊNCIA DE SUBORDINAÇÃO. REFORMA SENTENCIAL. Não se visualiza na relação entre o reclamante, na condição de entregador, e a primeira empresa reclamada, operadora logística de entregas, que se utilizam da plataforma digital do segundo reclamado, a qual tem por objetivo intermediar os interesses dos respectivos usuários, no caso do trabalhador, a obtenção de clientes para sua oferta de serviço de entrega, nenhum elemento que desvirtue sua natureza autônoma, especialmente quanto à subordinação, objeto de confissão do reclamante, afigurando-se, portanto, descabida a pretensão de reconhecimento do vínculo de emprego descrito na vestibular. Recurso ordinário a que se dá provimento, para julgar improcedente a demanda. RELATÓRIO De início, pede-se vênia para adotar o relatório do MM Desembargador Relator originário JOÃO CARLOS DE OLIVEIRA UCHOA, in verbis: "V I S T O S, relatados e discutidos estes autos de RECURSO ORDINÁRIO, provenientes da 8ª VARA DO TRABALHO DE FORTALEZA. Inconformado com a sentença de Id. 0fa70bc, complementada pela de Id. 5712e02, proferidas pelo Exmo. Juiz do Trabalho, Konrad Saraiva Mota, que julgou procedente em parte a demanda, dela recorre o segundo reclamado, consoante razões de Id. b3c3b15. Contrarrazões sob o Id. b6d793e Houve intervenção do Ministério Público do Trabalho. É o relatório". FUNDAMENTAÇÃO ADMISSIBILIDADE De se conhecer do apelo em face do preenchimento dos pressupostos de admissibilidade. MÉRITO Em suas razões recursais de ID 086c3c8 requer a recorrente a reforma da sentença alegando a inexistência de vínculo entre as partes, e via de consequência, indevida a condenação no pagamento as verbas rescisórias deferidas na sentença, a exemplo do seguro desemprego, horas extras e intervalo intrajornada, multa do art. 477, da CLT, bem como o deferimento ao autor dos benefícios da justiça gratuita. Pois bem. Do exame dos autos, forçoso reconhecer que não assiste razão à recorrente no tocante à inexistência de vínculo de emprego entre as partes. Nessa toada, pede-se vênia para adotar em parte as razões do acórdão proferido por esta douta 2ª Turma nos autos do Processo nº 0000662-51.2022.5.07.0008; cujo julgado data de 24/05/2023, de relatoria do douto Des. Emmanuel Teófilo Furtado: [...] Os elementos constitutivos da relação de emprego vindicada pelo reclamante estão claramente evidenciados nos autos. A pessoalidade é nítida e insofismável, uma vez que o reclamante realizou seu próprio cadastro no aplicativo e por meio dele foi acionado inúmeras vezes para fazer entregas de alimentos, atendendo à finalidade econômica da empresa, não podendo ser substituído por outra pessoa na execução da tarefa. O entregador, segundo afirmações da própria defesa do IFOOD, está plenamente identificado na plataforma para poder executar os serviços quando é chamado para realizar uma entrega e a aceita, ou seja, somente ele poderá fazê-la, pessoalmente. A pessoalidade do entregador está expressamente prevista no documento denominado "TERMOS E CONDIÇÕES DE USO IFOOD PARA ENTREGADORES", acostado sob id d8b2a2a, em especial nos requisitos e condições estabelecidos na Cláusula Terceira, que regulamenta, de forma minudente, o cadastro dos entregadores, isto é, a criação de um perfil de usuário para utilização da plataforma. Sendo assim, o requisito empregatício da prestação de serviços por pessoa física dispensa maiores fundamentos, pois era exatamente essa a condição do reclamante no seu labor em prol da empresa. Quanto à não eventualidade, frisa-se que o simples fato de o reclamante ter flexibilidade de dias e horários para se conectar no aplicativo não é suficiente para descaracterizar tal requisito. No caso em exame, as provas documentais demonstram que o reclamante se ativou com bastante regularidade no período de 2020 a 2022, realizando centenas de entregas de alimentos, conforme relatórios acostados pelo próprio IFOOD mostrando a continuidade e a habitualidade do trabalho desempenhado mediante uso da plataforma. A onerosidade é induvidosa, pois a prestação de serviços não ocorreu de forma gratuita, mas sim mediante contraprestação pecuniária, motivo pelo qual o reclamante criou seu perfil na plataforma IFOOD para poder desempenhar labor com o fim de obter recursos financeiros para a subsistência própria e familiar, colocando sua mão de obra em prol da empresa, que a remunerou pelos serviços prestados. E mesmo que o pagamento do trabalho executado se efetivasse por intermédio do chamado operador logístico, nem por isso se haveria de negar a existência da onerosidade, pois a empresa reclamada é quem remunera o trabalhador, sendo a responsável pela fixação dos preços do serviço de entrega, conforme sua conveniência no mercado de trabalho, bem como recebe os valores pagos pelos consumidores e os repassa aos estabelecimentos fornecedores dos produtos alimentícios, após deduzido seu percentual de ganho estipulado para a operação. Também não desconfigura a onerosidade do serviço realizado o fato de o entregador receber uma fração um pouco mais elevada do montante pago pelo destinatário da entrega, uma vez que o valor recebido se justifica por ser ele o responsável por arcar com as despesas do próprio transporte (combustível, manutenção do veículo, celular com internet etc), o que confirma, em última análise, a prática da plataforma IFOOD de buscar transferir ao trabalhador os riscos de seu empreendimento, já que o entregador, não sendo sócio nem proprietário da empresa, muito menos dono dos serviços de entrega de alimentos, não pode ser considerado trabalhador autônomo nem responder pelo custeio da atividade empresarial. Houve, na espécie, remuneração por produção, existindo, outrossim, reciprocidade entre pagamento e serviço prestado, sucessividade e periodicidade nos recebimentos pecuniários, com fixação dos valores de modo unilateral pela empresa demandada, gestora dos serviços. Por fim, a subordinação jurídica tem sido objeto do maior e mais enfático questionamento das empresas que atuam por meio de plataformas digitais. É imperativo registrar que o reclamado IFOOD, diferentemente do que sustenta em sua defesa, não tem por objeto a simples intermediação entre fornecedores de produtos alimentícios, entregadores e consumidores, tratando-se, em verdade, de uma empresa que propicia uma logística de entregas para que outros estabelecimentos comerciais consigam fazer chegar os frutos de suas atividades ao destinatário final, ou seja, àquele que os adquire. Com efeito, consta como atividade principal no artigo 3.º do contrato social da empresa IFOOD que "A Companhia tem por objeto social (a). a agência de restaurantes, bares, padarias e quaisquer outros estabelecimentos comerciais, por meio de plataformas digitais que poderão ser acessadas por meio de sites na internet ou aplicativos para celulares desenvolvidos pela Companhia (as "Plataformas")". Agência, agenciamento, agenciar. Essa é a finalidade da empresa, que significa tratar de negócios, trabalhar, solicitar, diligenciar, procurar. Ora, o serviço explorado pelo reclamado IFOOD não é apenas o uso de uma ferramenta eletrônica, um aplicativo de celular, pois a empresa agencia e oferece no mercado consumidor, essencialmente, o transporte de mercadorias, a entrega de produtos alimentícios, uma atividade econômica que estrutura, organiza e dirige de forma plena o serviço de entregas do início ao fim, desde o pedido efetuado pelo consumidor até o recebimento do produto adquirido. O aplicativo não é o objetivo primordial da atividade da empresa, mas tão somente uma ferramenta de informática, um instrumento que viabiliza a concretização de sua atividade econômica. E para a consecução de tal finalidade, naturalmente, precisa dos entregadores, pessoas físicas que colocam a força de trabalho à disposição da empresa para realizar o serviço, a ela se conectando por via do aplicativo, seguindo as estritas regras estabelecidas no documento de adesão intitulado "Termos e Condições de Uso - IFOOD Para Entregadores", sendo remunerado pelo trabalho prestado, com valores fixados pelo próprio IFOOD. Em tal documento, consta regramento que prevê a avaliação do trabalho dos entregadores por estabelecimentos e consumidores e pelo próprio IFOOD, podendo este fixar parâmetros mínimos a serem alcançados, o que evidencia um controle sobre as tarefas realizadas e a qualidade da execução. É a caracterização do poder disciplinar do empregador. E o entregador é escolhido pelo algoritmo, não pelo cliente ou pelo estabelecimento fornecedor do alimento objeto da entrega, havendo designação automática pelo aplicativo. A fixação dos preços dos serviços de entrega, deliberada de modo exclusivo pela plataforma, em conformidade com o algoritmo que rege o funcionamento do aplicativo, é uma sinalização clara da subordinação jurídica do entregador ao comando organizacional da empresa IFOOD, que classifica o trabalhador como autônomo, quando, na verdade, ele não dispõe sequer do poder de atribuir valor a seu serviço, circunstância que desfigura por completo a alegada autonomia. Acresça-se, ademais, que o entregador não tem ingerência nem mesmo sobre eventuais pagamentos de gorjetas e nada recebe diretamente dos clientes a quem realiza as entregas, mas, unicamente, da empresa reclamada, que pode, inclusive, alterar livremente as regras que disciplinam os valores e o pagamento dos serviços, sem que o trabalhador possa fazer a mínima oposição. Outrossim, as partes concordaram com a utilização de provas emprestadas, a saber, os depoimentos das testemunhas RAFAEL MATIAS DIAS DA SILVA (ATSum 0010336-83.2020.5.03.0186, da 48.ª VT de Belo Horizonte, id 3000fb2, páginas 642/463 do PDF), HENRIQUE VIEIRA SANTOS (ATSum 0010221-71.2020.5.03.0183, da 45.ª VT de Belo Horizonte, id 14b17cf, página 1004 do PDF) e RENAN FERREIRA TADEI ( ATSum 0010354-95.2021.5.03.0113, da 34.ª VT de Belo Horizonte, id 731f9d7, página 1009 do PDF). Os depoimentos colhidos nas referidas provas emprestadas esclarecem que o entregador da empresa IFOOD está sujeito a punições pela ocorrência de eventos como não se manter conectado ao aplicativo por períodos mínimos de tempo ou em horários de demanda mais intensa, ou por cancelar pedidos em excesso, situações em que pode ficar sem receber chamadas temporariamente. E, em hipóteses extremas, pode ser bloqueado na plataforma ou descadastrado, sem prévio aviso ou informação dos motivos. Em outros termos, a decantada flexibilidade na escolha dos horários de trabalho não sinaliza autonomia do trabalhador, como sustenta o reclamado, até porque o entregador está sujeito a medidas de caráter punitivo nas situações retro mencionadas. Trata-se, portanto, de relação jurídica que nada tem de parceria com os entregadores, configurando-se, na realidade, um modelo de gestão da atividade comercial a que se dedica a empresa IFOOD, que mantém os entregadores em situação de nítida e inafastável subordinação a seus comandos. Não há, pois, no controle da prestação dos serviços de entrega por meio de um algoritmo, a descaracterização do poder diretivo da empresa. Nesse diapasão, o pedido do reclamante de reconhecimento do vínculo de emprego na função de entregador insere-se perfeitamente na atividade econômica da empresa reclamada. No mundo tecnológico atual, o uso do aplicativo é apenas o modo de operação do serviço, a forma mais ágil, fácil e moderna de como os clientes são captados mais facilmente para viabilizar seus pedidos e entregas de alimentos, distinguindo-se do tradicional modelo de compras em que, por exemplo, o cliente necessita de comparecimento pessoal ao estabelecimento comercial para consumir in loco ou levar os produtos para casa. Na esteira da recente jurisprudência do TST em caso similar, "se percebe a configuração da subordinação jurídica nas diversas dimensões: a) clássica, em face da existência de incessantes ordens diretas da reclamada promovidas por meios remotos e digitais (art. 6º, parágrafo primeiro, da CLT), demonstrando a existência da assimetria poder de direção/subordinação e, ainda, os aspectos diretivo, regulamentar, fiscalizatório e disciplinar do poder empregatício; b) objetiva, tendo em vista o trabalho executado estritamente alinhado aos objetivos empresariais; c) estrutural, mediante a inteira inserção do profissional contratado na organização da atividade econômica desempenhada pela reclamada, em sua dinâmica de funcionamento e na cultura jurídica e organizacional nela preponderante; d) por fim, a subordinação algorítima, que consiste naquela efetivada por intermédio de aferições, acompanhamentos, comandos, diretrizes e avaliações concretizadas pelo computador empresarial, no denominado algoritmo digital típico de tais empresas da Tecnologia 4.0. Saliente-se, por oportuno, que a suposta liberdade do profissional para definir seus horários de trabalho e de folgas, para manter-se ligado, ou não, à plataforma digital, bem como o fato de o Reclamante ser detentor e mantenedor de uma ferramenta de trabalho. no caso, o automóvel utilizado para o transporte de pessoas. são circunstâncias que não têm o condão de definir o trabalho como autônomo e afastar a configuração do vínculo de emprego." (TST; RR 0100353-02.2017.5.01.0066; Terceira Turma; Rel. Min. Mauricio Godinho Delgado; DEJT 11/04/2022; Pág. 934). No mesmo sentido, cita-se o acórdão do processo RRAg-100853-94.2019.5.01.0067, 8ª Turma, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 03/02/2023. O simples fato de a prestação laboral se submeter aos ditames de um algoritmo, dispensando a presença de um chefe, pessoa física que comanda diretamente a execução dos trabalhos, em nada afasta a subordinação jurídica em sua feição tradicional insculpida na CLT. Com efeito, nos termos do art. 6.º, parágrafo único, da CLT, "os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio." Sem dúvidas, esse meio telemático e informatizado de comando e controle da força de trabalho é o que realmente acontece no presente caso, sendo nítida a fiscalização tecnológica da prestação de serviços pelo reclamado através da plataforma digital, a qual programa, comanda e controla por meio de algoritmo a atividade do obreiro, não havendo, portanto, a relação de trabalho autônoma alegada pela empresa demandada em sua defesa, mas, sim, um labor pessoal e oneroso, fiscalizado pela engenharia eletrônica dos softwares do reclamado, que, inclusive, pode bloquear e descredenciar o entregador como forma de punição, retirando deste a remuneração auferida pelas entregas que realizada utilizando o sistema de trabalho por aplicativo. Em suma, em sintonia com a novel jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho e mediante o cotejo de todos os elementos probantes contidos nos autos, resulta comprovada a presença da subordinação jurídica e dos demais requisitos da relação empregatícia, na forma dos artigos 2.º e 3.º da CLT, afastando-se, assim, a tese da reclamado de ter havido uma prestação de serviços de forma independente e autônoma, fato impeditivo ou modificativo de direito alegado pela defesa e não suficientemente provado, a corroborar a procedência do pedido de reconhecimento do vínculo empregatício, evidenciado pelas provas testemunhais dos autos. Nesse diapasão, conclui-se que o modelo de contratação de entregadores adotado pela empresa IFOOD configura fraude à legislação trabalhista, pois sonega direitos legais de trabalhadores em uma relação de trabalho na qual estão verdadeiramente presentes todos os requisitos caracterizadores do vínculo de emprego celetista. Portanto, com base nos fatos e provas dos autos, bem como em observância aos limites da lide, impõe-se dar provimento ao recurso ordinário interposto pelo reclamante para efetivamente se reconhecer o vínculo de emprego na função de entregador, com admissão em 05/01/2020, na modalidade de contrato de trabalho intermitente, não se tendo notícia, até aqui, de encerramento desse liame, uma vez que o autor asseverou na exordial ainda estar cadastrado na plataforma e laborando para o reclamado normalmente, e o direito do trabalho orienta-se pelo princípio da continuidade do vínculo de emprego. Esclareça-se, no tocante à formalização do contrato de trabalho intermitente, como postulado na exordial, que, embora inexistam nos autos provas documentais do atendimento de algumas das prescrições normativas que disciplinam tal espécie contratual, como a pactuação celebrada por escrito e os prazos para convocação do trabalhador e resposta deste ao empregador, conforme estabelece o art. 452-A da CLT, essa modalidade de contratação intermitente é a mais adequada ao caso em apreço por melhor se amoldar à realidade verificada na prestação de serviços pelo reclamante, ou seja, aplicação do princípio da primazia da realidade tendo em conta a definição esculpida no § 3.º do art. 443 da CLT: Considera-se como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria." No caso dos autos, o reclamante não celebrou um contrato de trabalho por escrito, em papel, no sentido literal do vocábulo, mas aderiu ao regramento estabelecido pela empresa no documento denominado "TERMOS E CONDIÇÕES DE USO IFOOD PARA ENTREGADORES", acostado sob id d8b2a2a, para fins de criação de um perfil de usuário, que é personalíssimo, individual, para utilização da plataforma, atendendo aos requisitos e condições estabelecidos na Cláusula Terceira de tal documento, que regulamenta detalhadamente o cadastro dos entregadores, isto é, houve, ainda que remotamente, a celebração de um contrato entre o entregador e a empresa IFOOD. De outra banda, tem-se comprovada a realização concreta de uma atividade laboral pessoal caracterizada pela intermitência, porquanto é possível a conexão e a desconexão do trabalhador ao aplicativo em períodos de horas, dias ou mesmo em lapsos superiores, sem que o liame com a plataforma IFOOD tenha termo final, e sendo permitida, inclusive, a prestação de serviços para outros aplicativos ou contratantes nos períodos de intermitência, conforme a previsão do § 5.º do art. 452-A da CLT, porém sempre mantida a relação de subordinação jurídica com a plataforma IFOOD. [...] CONCLUSÃO DO VOTO Ante o exposto, voto no sentido de conhecer do recurso ordinário e, no mérito, negar-lhe provimento para manter a sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos. DISPOSITIVO ACORDAM OS INTEGRANTES DA 2ª TURMA DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 7ª REGIÃO, por unanimidade, conhecer do recurso ordinário do reclamado e, por maioria, negar-lhe provimento, mantendo a sentença recorrida por seus próprios fundamentos. Vencido o Desembargador Relator, nos termos da fundamentação que integra o presente aresto. Redigirá o acórdão o Desembargador Francisco José Gomes da Silva. Presidiu a sessão o Exmo. Sr. Desembargador Paulo Régis Machado Botelho. Participaram do presente julgamento os Exmos. Srs. Desembargadores João Carlos de Oliveira Uchoa (Relator), Francisco José Gomes da Silva e Emmanuel Teófilo Furtado. Presente ainda o(a) Exmo(a). Sr(a). membro do Ministério Público do Trabalho. Fortaleza, 24 de março de 2025. FRANCISCO JOSÉ GOMES DA SILVA Desembargador Relator Designado VOTOS Voto do(a) Des(a). JOAO CARLOS DE OLIVEIRA UCHOA / Gab. Des. João Carlos de Oliveira Uchôa DIREITO INDIVIDUAL DO TRABALHO. RECURSO ORDINÁRIO DO SEGUNDO RECLAMADO. ENTREGADOR DE APLICATIVO. RELAÇÃO DE EMPREGO. INOCORRÊNCIA. CONFISSÃO QUANTO A AUSÊNCIA DE SUBORDINAÇÃO. REFORMA SENTENCIAL. Não se visualiza na relação entre o reclamante, na condição de entregador, e a primeira empresa reclamada, operadora logística de entregas, que se utilizam da plataforma digital do segundo reclamado, a qual tem por objetivo intermediar os interesses dos respectivos usuários, no caso do trabalhador, a obtenção de clientes para sua oferta de serviço de entrega, nenhum elemento que desvirtue sua natureza autônoma, especialmente quanto à subordinação, objeto de confissão do reclamante, afigurando-se, portanto, descabida a pretensão de reconhecimento do vínculo de emprego descrito na vestibular. Recurso ordinário a que se dá provimento, para julgar improcedente a demanda. MÉRITO O juiz sentenciante, por força da revelia da primeira reclamada, reconheceu o vínculo de emprego descrito na inicial e condenou a primeira reclamada, com a responsabilização subsidiária do segundo reclamado, no pagamento de parcelas salariais, rescisórias e fundiárias, mediante os seguintes termos: "Preliminares Competência da Justiça do Trabalho Postula a segunda reclamada a declaração da incompetência da Justiça do Trabalho para instruir e julgar o feito, argumentando que a prestação de serviços em favor das acionadas tem caráter estritamente civil. Em que pesem os argumentos, vindica o autor o reconhecimento da relação de emprego, sendo certo que a competência é estabelecida de acordo com a causa de pedir e o pedido. A Constituição estabelece que compete à Justiça do Trabalho processar e julgar, dentre outras, as ações oriundas da relação de trabalho, consoante redação concedida pela Emenda Constitucional nº 45 de 2004 - artigo 114, inciso I. Rejeito, pois, a preliminar para declarar a competência deste Juízo, em razão da matéria, na forma do art.114 da CF/88. Ilegitimidade Passiva da 2ª Reclamada A segunda reclamada (Ifood) alega sua ilegitimidade passiva ad causam sob o argumento de que não manteve qualquer relação com o reclamante. De acordo com a teoria da asserção, a lide deve ser analisada nos limites subjetivos de sua proposição. In casu, é do interesse do reclamante ver reclamada condenada ao pagamento de verbas trabalhistas, tendo em vista que postulou isso, pelo fato de ter prestado seus serviços diretamente para ela. Assim sendo, tenho como suficiente tal afirmação para considerar satisfeita a condição da ação, consistente na legitimidade para figurar no polo passivo da relação processual regularmente instaurada. Também assim tem decidido a mais alta Corte Trabalhista: ILEGITIMIDADE PASSIVA. A legitimidade passiva deve ser verificada em abstrato. In casu, conforme registrado no acórdão regional, o pedido de complementação de aposentadoria decorre diretamente do contrato de trabalho firmado com a Reclamada (Petrobras). É notório, ainda, o fato de que ela é patrocinadora e instituidora da entidade de previdência privada (Petros). (...) (Processo: A-AIRR - 108840-85.1999.5.02.0252, Relator Ministro: José Simpliciano Fontes de F. Fernandes, 2ª Turma, DEJT 05/02/2010). Ressalte-se que a comprovação ou não dessas alegações feitas na inicial não é objeto de preliminar, mas sim questão de fundo, ligada ao mérito, a ser apreciada oportunamente. Portanto, rejeito a arguição de ilegitimidade passiva da segunda reclamada. Mérito Revelia O reclamante postula o pagamento das verbas declinadas na exordial, sob o argumento de que foi contratado pela primeira reclamada, para trabalhar como motoboy tendo prestado serviços em benefício da segunda reclamada. Relata que trabalhou no período de 14.03.2022 a 15.02.2024, recebendo remuneração mensal de R$8.000,00. Assevera que foi dispensado sem justa causa e que não recebeu o pagamento das verbas rescisórias e trabalhistas devidas. Atribuiu à causa o valor de R$ 669.982,78. Anexou aos autos documentos. Diante da ausência injustificada do primeiro reclamado (PH MOTOBOY EXPRESSO (PEDRO HENRIQUE SAMPAIO PEREIRA), embora regularmente notificado, foi decretada a revelia e aplicada a pena de confissão quanto à matéria fática, nos termos do art. 844 da CLT, ficando encerrada sua prova. A pena de confissão imposta ao primeiro reclamado eleva à condição de verdadeiros os fatos narrados pela parte reclamante, como fundamentos de sua pretensão, excetuando-se a hipótese de existência nos autos de elementos de convicção em sentido adverso. Vale dizer, a confissão ficta, por ser relativa, admite prova em sentido contrário que possa afastar seus efeitos. Registre-se que, nos termos da Súmula n. 74 do TST, no caso de aplicação da pena de confissão ficta à parte ausente, somente a prova pré-constituída nos autos pode ser levada em consideração para confronto com a confissão ficta (arts. 442 e 443, do CPC de 2015 - art. 400, I, do CPC de 1973), não implicando cerceamento de defesa o indeferimento de provas posteriores. E vai mais além ao dispor que a vedação à produção de prova posterior pela parte confessa somente a ela se aplica, não afetando o exercício, pelo magistrado, do poder/dever de conduzir o processo. Observo, porém, que a segunda reclamada apresentou defesa escrita acompanhada de documentos, mas não impugnou especificamente os fatos declinados na exordial, com exceção da sua responsabilização subsidiária e inexistência de qualquer relação mantida entre ela e o trabalhador. Diante do teor da contestação apresentada pela segunda reclamada, não se aplica, ao presente caso, a regra do art. 844, parágrafo 4o, inc. I da CLT, pelo que a pena de confissão imposta ao primeiro reclamado eleva à condição de verdadeiros os fatos narrados pela parte reclamante, como fundamentos de sua pretensão, nos termos da Súmula n. 74 do TST. No presente caso, inexistem nos autos elementos de convicção em sentido adverso, pelo que presumo verdadeiras as alegações autorais no quanto ao período do contrato de trabalho (14.03.2022 a 15.02.2024), à função de motoboy, à jornada de trabalho e à dispensa imotivada, conforme declinado na exordial. Contrato de Trabalho Não existe controvérsia nos autos acerca da existência de vínculo de emprego entre o reclamante e a reclamada PEDRO HENRIQUE SAMPAIO PEREIRA 00031322344, com início em 14/03/2022, término por rescisão injusta em 15/02/2024 (sem considerar a projeção do aviso prévio), quando exercia a função de Motoboy e recebia salário no valor de R$ 8.000,00, devendo a reclamada proceder com a merecida anotação na CTPS DIGITAL do trabalhador. Direitos Pleiteados Aviso Prévio Indenizado Reconhecida a despedida injusta do trabalhador, sem a concessão de aviso prévio, resta devido o seu pagamento sob a forma indenizada, no valor equivalente a 33 dias de salário do obreiro, cujo tempo respectivo deverá integrar o contrato de emprego, projetando seu término para 19/03/2024, conforme art. 487, § 1º, da CLT c/c Lei 12.506/2011. 13º Salário Reconhecida a existência de vínculo de emprego entre as partes, bem como a rescisão injusta da contratação, tem-se devida a gratificação natalina, nos termos do art. 1º, da Lei 4.090/62, sendo: 13º salário proporcional de 2022 à razão de 10/12, 13º salário integral de 2023, 13º salário proporcional de 2024 à razão de 3/12, nos limites do pedido. Férias acrescidas de 1/3 Reconhecida a existência de vínculo de emprego entre as partes, bem como a rescisão injusta da contratação, tem-se devido o descanso anual indenizado acrescido de 1/3 constitucional, nos termos do art. 129 e seguintes da CLT, sendo férias em dobro de 2022/2023 e férias simples de 2023/2024, nos limites do pedido. Horas Extras e seus Reflexos Requer o reclamante a condenação da reclamada ao pagamento de horas extras e seus reflexos. Alegado o labor em sobrejornada, e aplicando-se as regras processuais descritas no artigo 818 da CLT, é certo que cabe à parte autora o ônus da prova do fato constitutivo de seu direito, competindo-lhe a comprovação do tempo de efetivo trabalho, para fazer jus ao recebimento das horas extras postuladas. Tendo em vista a revelia, fixo a jornada de trabalho do reclamante como sendo de segunda a domingo, das 11h00 às 00h00, com 20 min de intervalo intrajornada, perfazendo um total de 44 horas extras semanais e 176 horas extras mensais. Com efeito, considerando que a jornada de trabalho do reclamante não observava os limites dispostos no art. 7º, XIII, da CF/88, tem-se que o mesmo faz jus ao adicional previsto no inciso XVI do aludido artigo constitucional, nos limites do pedido. Outrossim, sendo habitual a sobrejornada (Súmula 376 do TST), a mesma passou a integrar o complexo salarial do obreiro, refletindo para efeito de aviso prévio, 13º salário, férias acrescidas de 1/3 e FGTS acrescido de 40% (Súmula 63 do TST). No cômputo das horas extras deverá ser utilizado o divisor 220, bem como considerada a evolução salarial do trabalhador, caso reconhecida. Intervalo Intrajornada Requer o reclamante a condenação da reclamada ao pagamento de intervalo intrajornada não concedido. Diante da revelia aplicada, tem-se por verdadeira a jornada de trabalho narrada na inicial, razão pela qual condeno a reclamada ao pagamento de 40 minutos extra por dia acrescida de 50% por mês, a título de intervalo intrajornada não concedido, com natureza indenizatória e sem repercussão nas demais verbas trabalhistas, conforme redação vigente do art. 71, §4 º, da CLT. Adicional Noturno Pleiteia o reclamante pela condenação da reclamada ao pagamento de adicional noturno. Tendo em vista a revelia, bem como a jornada de trabalho do reclamante fixada no item anterior, tem-se a existência de trabalho em horário noturno, assim considerado aquele compreendido entre 22h de um dia e 5h do dia seguinte (art. 73, § 2º, da CLT), fazendo jus o reclamante ao adicional de 20% sobre a hora normal (art. 73, caput, da CLT), nos limites do pedido, no valor de R$ 2.442,72. FGTS acrescido de 40% Reconhecida a existência de contrato de emprego entre as partes e inexistindo nos autos comprovação completa de recolhimento do FGTS e da multa de 40%, tem-se o mesmo devido (art. 7º, III, da CF/88), no valor de R$ 21.504,00, nos limites do pedido. Adicional de Periculosidade O autor afirma ser devido o adicional de periculosidade, visto que as atividades eram realizadas mediante a utilização habitual de motocicleta, requerendo o pagamento do adicional de 30% durante todo o pacto laboral. O reclamante prestava serviços de entrega utilizando-se para tanto de motocicleta, atraindo a aplicação do §4º do art. 193 da CLT, de forma a reconhecer que o obreiro faz jus ao adicional de periculosidade, de todo o período laborado, no patamar de 30% (trinta por cento) sobre o salário-base. Esclareço que o fato de o Ministério do Trabalho ter revogado a Portaria 1.565/2014 não afeta o benefício do reclamante ao adicional de periculosidade, pois, o próprio Ministério do Trabalho publicou a Portaria MTE nº 5/2015, restabelecendo o direito ao adicional de periculosidade, ressalvado apenas o caso dos associados da ABIR. Desse modo, diante da revelia aplicada e não tendo sido comprovado o pagamento do adicional, julgo procedente o pedido do autor e condeno a reclamada no pagamento do adicional de 30% sobre o salário-base. Responsabilidade subsidiária do Ifood O reclamante pede o reconhecimento da responsabilidade subsidiária da segunda reclamada para que responda pelo pagamento das verbas trabalhistas e rescisórias objeto da condenação, por ter usufruído do seu labor. Alega que o primeiro reclamado fornecia mão-de-obra para a segunda reclamada para o exercício de sua atividade-fim. A segunda reclamada contesta o pedido de responsabilidade subsidiária, sob o argumento de que não foi empregadora do autor, não tendo sido diretamente beneficiada com a prestação de serviços do reclamante, aduzindo que sua atuação é limitada a viabilizar o elo entre os entregadores e estabelecimentos que necessitam de serviço de entrega. Sobre a responsabilidade do tomador de serviços, a Lei 6.019/74 (com redação dada pelas Lei 13.423/2017 e 13467/2017), dispõe: Art. 5º [...] § 5o A empresa contratante é subsidiariamente responsável pelas obrigações trabalhistas referentes ao período em que ocorrer a prestação de serviços, e o recolhimento das contribuições previdenciárias observará o disposto no art. 31 da Lei no 8.212, de 24 de julho de 1991. (grifamos) Assim, em se tratando de ente privado na qualidade de tomador de serviços, sua responsabilidade subsidiária decorre pura e simplesmente de ter usufruído do labor do trabalhador terceirizado, sendo desnecessária a configuração de culpa in vigilando e in eligendo. Nesse sentido, tem se posicionado a jurisprudência, vejamos: RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTE PRIVADO. A responsabilidade da empresa tomadora de serviços - na qualidade de ente privado - decorre do simples fato de ter se beneficiado com a força de trabalho de um empregado, por meio de empresa prestadora de serviços, sendo desnecessária a comprovação de culpa in eligendo e in vigilando da tomadora. Mantenho a sentença, no particular. (TRT-2 10015225520165020082 SP, Relator: WILMA GOMES DA SILVA HERNANDES, 11ª Turma - Cadeira 1, Data de Publicação: 25/08/2020) (grifamos) Ademais, o Judiciário Trabalhista, com base no princípio da primazia da realidade, tem reiteradamente entendido que o Contrato de Distribuição firmado pela segunda reclamada trata-se, na verdade de prestação de serviços com roupagem de contrato comercial, vejamos: AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO. TERCEIRIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. Segundo o Regional, instância soberana na valoração de fatos e provas, na forma da Súmula nº 126/TST, as reclamadas firmaram contrato de distribuição, destinado à comercialização de bens e serviços da segunda reclamada - Telefônica Brasil S.A (Vivo). Entretanto, extrai-se do acórdão regional que as cláusulas avençadas ultrapassam os limites de mera venda ou distribuição de produtos, na medida em que restou estabelecida a exclusividade e evidenciada a realização de serviços essenciais aos fins econômicos da segunda reclamada. A partir de tais premissas, o Regional concluiu se tratar de hipótese de terceirização de serviços, devendo a tomadora dos serviços ser responsabilizada subsidiariamente pelos créditos trabalhistas reconhecidos nesta demanda. Tal conclusão se amolda ao entendimento sedimentado no item IV da Súmula nº 331/TST, segundo o qual o inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial. Incidência da Súmula nº 333/TST. Agravo de instrumento conhecido e não provido. (TST - AIRR: 1300944820155130026, Relator: Dora Maria da Costa, Data de Julgamento: 22/02/2017, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 03/03/2017) Restou incontroverso nos autos que o primeiro reclamado era um operador logístico da segunda reclamada. Tem-se que o contrato de intermediação de negócios (serviços de entrega) firmado entre os reclamados não deixa dúvidas de que o IFOOD é beneficiário do serviço fornecido pelo operador logístico na medida em que o objeto contratual estabelecido é o fornecimento de mão de obra habilitada de entrega utilizada para atender a demanda de serviço de entrega de produtos alimentícios e congêneres ofertada por sua plataforma digital. Ademais, a atividade econômica da ré IFOOD somente subsiste com a efetiva prestação de serviços pelos motoristas entregadores contratados pela prestadora de serviços. Ao beneficiar-se desta mão de obra, assume a condição de tomadora de serviços O tomador dos serviços, destinatário direto do esforço despendido pelo trabalhador, e que, por meio de uma opção administrativa decide delegar parte da atividade empresarial, não pode eximir-se de, diante do inadimplemento da empresa prestadora, arcar com os ônus decorrentes do contrato do qual auferiu os bônus, pois violou seu dever de vigiar o cumprimento integral das obrigações decorrentes do contrato entre empregado e empregador. Tese de repercussão geral fixada pelo STF no julgamento do RE 958252 . Artigo 5º-A , § 5º da Lei 6.019 /74. No presente caso, restou incontroverso que a segunda reclamada usufruiu do labor do reclamante, beneficiando-se do serviço por ele prestado enquanto entregador empregado do primeiro reclamado. Assim, sendo o IFOOD.COM AGENCIA DE RESTAURANTES ONLINE S.A. efetivo tomador dos serviços do demandante, deve responder subsidiariamente pelas verbas ora deferidas. Incidência da Súmula nº 331, V, do TST. Dessa forma, considerando que a segunda reclamada usufruiu do trabalho do reclamante, fato incontroverso, deve responder, de forma subsidiária, pelo inadimplemento das verbas dos trabalhadores de cujo trabalho tirou proveito, inclusive em relação às penalidades aplicadas ao primeiro reclamado. Corroborando o entendimento jurídico ora adotado, transcrevo as seguintes decisões: IFOOD. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS NOMINADO DE CONTRATO DE INTERMEDIAÇÃO DE NEGÓCIOS (SERVIÇOS DE ENTREGAS) E OUTRAS AVENÇAS. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. A atividade econômica da ré IFOOD somente subsiste com a efetiva prestação de serviços pelos motoristas entregadores contratados pela prestadora de serviços. Ao beneficiar-se desta mão de obra, assume a condição de tomadora de serviços. Nesse contexto, não tendo fiscalizado as obrigações e deveres da empresa prestadora para com seus empregados, incorreu em culpa in vigilando , configurando sua responsabilidade subsidiária, nos termos da Súmula no 331, itens IV e VI, do TST. (TRT-4 - ROT: 0020641-15.2022.5.04.0741, Relator: CLAUDIO ANTONIO CASSOU BARBOSA, Data de Julgamento: 23/11/2023, 5ª Turma) IFOOD. RESPONSABILIZAÇÃO SUBSIDIÁRIA. TOMADORA DE SERVIÇOS. Conquanto firmado um contrato de intermediação de negócios por meio do qual a IFOOD fornece a uma empresa um aplicativo capaz de interligar o pedido do cliente a um restaurante ou mercado, certo é que, no plano fático, há efetiva e exclusiva prestação de serviços, pelo entregador, em benefício da segunda reclamada ('intermediadora"), ainda mais levando-se em conta que esta mantinha o controle e comando da execução dos serviços prestados através de plataforma virtual. Trata-se de verdadeira terceirização de serviços, que enseja o reconhecimento da responsabilização subsidiária desta pelo adimplemento de todas as verbas trabalhistas deferidas no julgado. (TRT-1 - ROT: 01008370920215010282, Relator: MARCIA REGINA LEAL CAMPOS, Data de Julgamento: 15/02/2023, Nona Turma, Data de Publicação: DEJT 2023-03-03) EMENTA IFOOD. MOTOCICLISTA ENTREGADOR. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS NOMINADO DE CONTRATO DE INTERMEDIAÇÃO DE NEGÓCIOS (SERVIÇOS DE ENTREGAS) E OUTRAS AVENÇAS. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. Constatada que a atividade econômica da ré IFOOD somente subsiste com a efetiva prestação de serviços pelos motociclistas entregadores ("motoboys") contratados pela prestadora de serviços e que aquela se beneficiou desta mão de obra, assumiu a condição de tomadora de serviços. E, nesse contexto, não tendo fiscalizado as obrigações e deveres da empresa prestadora para com seus empregados, incorreu em culpa in vigilando , configurando sua responsabilidade subsidiária, nos termos da Súmula nº 331, itens IV e VI, do TST. (TRT-4 - ROT: 00202337320215040251, Relator: CLAUDIO ANTONIO CASSOU BARBOSA, Data de Julgamento: 11/07/2023, 5ª Turma) RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. IFOOD S/A. TOMADORA DE SERVIÇOS. No presente caso, resta evidente que a segunda reclamada (IFOOD.COM AGÊNCIA DE RESTAURANTES ONLINE S.A.) se beneficiava dos serviços do obreiro na condição de tomadora dos serviços, ainda que se pretenda a ausência de responsabilidade dada ao contrato de negócios firmados entre as reclamadas. Não se pode ocultar, com base no princípio da primazia da realidade, que as relações fáticas traduzem verdadeiro contrato de terceirização de serviços, os quais foram prestados pela primeira reclamada, ora empregadora, R&B MOTOS, e figurando como tomadora a empresa IFOOD.COM AGÊNCIA DE RESTAURANTES ONLINE S .A.. Assim, impõe-se a modificação da sentença para condenar subsidiariamente a segunda reclamada IFOOD.COM AGÊNCIA DE RESTAURANTES ONLINE S.A. pelo pagamento das verbas deferidas na sentença. (TRT-7 - ROT: 00002174920215070014, Relator: EMMANUEL TEOFILO FURTADO, 2ª Turma, Data de Publicação: 11/09/2023) Seguro-Desemprego Reconhecida a despedida injusta, tem-se que o trabalhador preenche os requisitos na Lei 7.998/90 para percepção do seguro-desemprego, devendo a reclamada providenciar o fornecimento das guias CD/SD, devidamente preenchidas, sob pena de indenização substitutiva. Multa do Art. 477 da CLT Devida, haja vista a incontrovérsia acerca da relação de emprego existente entre as partes e, por consequência, das verbas e demais obrigações dela decorrentes, cujo inadimplemento teria gerado a multa vindicada. Acréscimo do Art. 467 da CLT Devido, dada a existência de verbas rescisórias incontroversas nos autos. Demais Pedidos Justiça Gratuita Defiro o pedido de Justiça Gratuita formulado pelo reclamante, já que preenchidos os requisitos do art. 790, § 3º, da CLT. Honorários Advocatícios Devidos, no percentual de 15% sobre o valor da condenação, nos moldes do art. 791-A da CLT. Indefiro o pedido de honorários advocatícios em favor dos advogados da reclamada, tendo em vista que foram deferidos os benefícios da justiça gratuita ao reclamante e a declaração de inconstitucionalidade do art. 791-A, § 4º, da CLT pelo STF na decisão da ADI 5766. Atualização Monetária Conforme decido pelo Supremo Tribunal Federal nas ADCs 58 e 59 e ADIs 5867 e 6021, a atualização monetária dos débitos trabalhistas será, a partir do vencimento de cada parcela até a véspera do ajuizamento da ação, pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), acrescidos dos juros legais estabelecidos no art. 39, caput, da Lei 8.177/91 (TR). A partir do ajuizamento até o efetivo pagamento da obrigação, a atualização monetária e os juros de mora serão, juntos, fixados pelo índice do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), de acordo com artigo 406 do Código Civil. Contribuições Previdenciárias e Imposto de Renda As contribuições previdenciárias incidentes sobre as parcelas da sentença com natureza de salário-de-contribuição deverão ser escrituradas no eSocial (evento S-2500), confessadas na DCTFWeb - Reclamatória Trabalhista (evento S-2501) e recolhidas mediante Documento de Arrecadação de Receitas Federais - DARF gerado pela DCTFWeb, conforme art. 19, §1º, V, da Instrução Normativa RFB nº 2.005/2021, ficando o empregador autorizado a proceder com a retenção da cota atribuída ao empregado, conforme alíquotas definidas em Lei. O imposto de renda, apurado com base nas verbas remuneratórias da condenação, deverá ser retido e recolhido pelo empregador, nos termos do art. 46 da Lei 8.541/1992 e Provimento da GCGJT nº 04/2023, sempre observadas as faixas de isenção.". Apreciando os embargos de declaração do segundo reclamado, na sentença de Id. 5712E02, foram prestados esclarecimentos, mas sem efeitos infringentes. Em seu apelo, constituído pela peça de Id. b3c3b15 o segundo reclamado renova a tese de defesa quanto a preliminar de incompetência da Justiça do Trabalho e as alegações de mérito para o julgamento improcedente da reclamação trabalhista. Decido. DA PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO Correta a sentença. A discussão da presente lide gira em torno da natureza da relação de trabalho que incontroversamente existiu entre as partes, o que atrai, à luz do estabelecido no art. 114, da CF/88, a competência desta Justiça do Trabalho, considerando que os pedidos condenatórios são pertinentes à relação de emprego que o reclamante pretende ver reconhecido. DA NATUREZA DA RELAÇÃO JURÍDICA HAVIDA ENTRE AS PARTES Da reanálise dos autos e, à luz do inc. I, do §4º, do art. 844, da CLT, verifico, diferentemente do prontificado na origem, que, apesar da revelia e da pena da confissão ficta que se aplicou à primeira reclamada, do teor da peça de defesa apresentada pelo segundo reclamado, houve impugnação das pretensões vestibulares (Id. F005c30, passim), pois ali pontuado o seguinte, in verbis: "(...) a situação do Reclamante é muito simples, ele baixou o aplicativo, se cadastrou na plataforma, se vinculou ao operador logístico e passou a receber solicitações de serviços de usuários finais através do aplicativo, podendo recusá-las. (...) Em que pese o Reclamante, supostamente, ter prestado serviços para a primeira Reclamada, a Contestante impugna o pleito relativo ao reconhecimento de vínculo empregatício. (...) Desta forma, restam impugnados, além dos pleitos de reconhecimento do vínculo de trabalho e, consequentemente, anotação em CTPS, a condenação das Reclamadas, ou pelo menos da 2ª Reclamada, ora Contestante, ao pagamento das verbas rescisórias, inclusive saldo salário, décimo terceiro salário de todo o período, férias de todo período acrescidas de 1/3, aviso prévio indenizado, depósitos fundiarios + 40% etc.". Logo, não há que se falar nos efeitos da revelia na hipótese em apreço, consoante o indigitado dispositivo celetista. Passo a apreciar o mérito em si da lide. Verdadeiramente, não há como negar que a discussão envolvendo a natureza jurídica da relação havida entre os profissionais que prestam serviço via aplicativo mediada por plataformas digitais ocupa boa parte da cena no teatro laboral que nos circunda e exige, no atual momento de incerteza acerca de tal relação, um esforço adicional dos operadores do direito na análise e compreensão fenomênica dos detalhes fáticos e jurídicos que permeiam essa desafiadora situação. Com total razão estão aqueles que entendem que nos deparamos com uma nova modalidade contratual, que tem gênese nas transformações trazidas pelo influxo das inovações tecnológicas do mundo pós-moderno, uma vez que a novel relação parece não se ajustar, conforme doutas opiniões, às molduras jurídicas prevalentes no vigente ordenamento normativo celetista. Trata-se de um ambiente no qual os trabalhadores operam com autonomia de escolha quanto ao modo e conveniência da prestação dos serviços viabilizada por uma estrutura tecnológica que sinaliza o surgimento de novas formas de trabalho. Isso repercute em transformações sociais que exigem uma regulamentação e uma legislação própria, sendo certo que o atual quadro de insuficiência normativa para a subsunção deste fenômeno não pode se perpetuar, sob pena de relegar tais trabalhadores ao desamparo dos direitos sociais constitucionalmente tutelados. Felizmente, iniciativas deste jaez já se encaminham no Congresso Nacional onde tramitam alguns projetos de lei que se debruçam sobre a matéria, ainda que de forma incipiente. A exemplo do PL 1471/2022, que propõe alterar a Lei nº 12.587/2012, estabelecendo diretrizes de remuneração de motoristas do transporte remunerado privado individual de passageiros com a previsão "de valor mínimo a ser repassado ao motorista pelo fornecedor do aplicativo ou plataforma de comunicação em rede, quando esse intermediar o pagamento da tarifa", de modo que o valor mínimo constitua montante superior "ao valor horário do salário mínimo vigente", preservando, assim, o mínimo existencial. Inspirado também na aludida Lei nº 12.587/2012, tramita o PL 3498/2019 que dispõe sobre a obrigatoriedade de contratação, às expensas das empresas que fazem a intermediação do transporte por meio de aplicativo, de seguro de acidentes pessoais a passageiros, seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de vias terrestres e seguro de danos causados por colisão, incêndio, furto ou roubo de veículos utilizados pelos motoristas. Por sua vez, o PL 3570/2020, almeja transformar-se na "Lei de Proteção dos Trabalhadores de Aplicativos de Transporte Individual Privado ou Entrega de Mercadorias (LPTA)", da autoria do Senador Jaques Wagner (PT/BA). Acrescenta o art. 609-A, no Código Civil Brasileiro, para assegurar aos prestadores de serviço mediante uso de aplicativo, entre outros, o direito de associação, sindicalização e cooperativismo em âmbito municipal, propiciando à categoria negociar e firmar contrato coletivo com as empresas que operam com plataformas digitais para a definição dos custos e fixação de valor mínimo por hora/trabalho, definição do número de horas semanais ou mensais trabalhadas; a negociação para auxílio alimentação, auxílio transporte e plano de saúde para os associados; o fornecimento pelas empresas de relatórios auditáveis trimestrais para as associações/sindicatos/cooperativas com a formatação dos preços e algoritmos, dados da média de ganho, média de corridas e visão geral das corridas e entregas; extrato mensal individual com a prestação de contas, valores recebidos, descontos efetuados, valor de gorjetas, histórico de avaliação, desempenho do profissional e controle de jornada; fornecimento pela empresa de EPI e contratação de seguro pessoal individual ou coletivo; proibição à empresa de excluir, bloquear ou suspender o prestador de serviço, salvo por denúncia de ordem criminal perante o Poder Público, assegurada a ampla defesa e o contraditório; o benefício do seguro desemprego; auxílio acidente em valor não inferior ao salário mínimo. Alguns países partiram na frente e construíram a solução que entenderam lhes ser adequada, conforme as suas características e peculiaridades, a exemplo dos Estados Unidos (Califórnia: adotou legislação concebendo o motorista de aplicativo como empregado; Nova York, deliberou por fixar um pagamento mínimo por hora trabalhada; Seattle: adotou tarifa mínima a ser repassada ao motorista de aplicativo), França, Inglaterra, Portugal (que alterou o seu Código do Trabalho recentemente - 3.4.2023 - detalhando no art. 12º-A, tópico sobre "Presunção de Contrato de Trabalho no Âmbito de Plataforma Digital"), além de outros. No Brasil, todavia, a atmosfera parece estar agitada por uma tempestade de dúvida e questionamento acerca da condição e da natureza jurídica da relação de trabalho havida entre os prestadores de serviço e as empresas que exploram as plataformas digitais, inexistindo no atual momento unanimidade: uns, advogam a tese da natureza empregatícia sob a chancela do regramento celetista; outros, entendem se tratar de trabalho de conotação autônoma. Ante tal quadro de incerteza, há opiniões e decisões em todas as instâncias da Justiça do Trabalho (e em outras dimensões do Poder Judiciário) para todos os gostos. Aliás, pontuou o Min. Mauricio Godinho Delgado em voto de 06/04/2022: "Nada obstante, é inexistente a produção regulatória do Poder Legislativo do País sobre as questões de natureza trabalhista no âmbito das relações entre prestadores de serviço e empresas que utilizam as plataformas digitais. O enfrentamento dessa problemática pelas Cortes Trabalhistas, por outro lado, ainda não é significativa, notadamente no âmbito do TST, inexistindo uma jurisprudência pátria consolidada sobre o tema." (TST - RR: 1003530220175010066, Data de Julgamento: 06/04/2022, 3ª Turma, Data de Publicação: 11/04/2022). A propósito, a Segunda Seção do STJ já decidiu que não haveria sequer relação de trabalho, mas de cunho comercial, atuando os motoristas de aplicativo como empreendedores individuais, in verbis: "As ferramentas tecnológicas disponíveis atualmente permitiram criar uma nova modalidade de interação econômica, fazendo surgir a economia compartilhada (sharing economy), em que a prestação de serviços por detentores de veículos particulares é intermediada por aplicativos geridos por empresas de tecnologia. Nesse processo, os motoristas, executores da atividade, atuam como empreendedores individuais, sem vínculo de emprego com a empresa proprietária da plataforma." (CC n. 164.544/MG, relator Ministro Moura Ribeiro, Segunda Seção, julgado em 28/8/2019, DJe de 4/9/2019), precedente utilizado mais recentemente por aquela Corte no CC: 190261 MG 2022/0227000-0, Relator: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Publicação: DJ 08/02/2023, situação congênere a dos entregadores. Entendo particularmente, com respeito às opiniões em contrário, que ante a obrigação legal imposta ao julgador de apresentar solução às lides que lhe são submetidas e considerando a ausência de legislação específica a ser aplicada na matéria em exame, deverá o magistrado no exercício da sua atividade judicante se conduzir com especial equilíbrio, lucidez e ponderação técnica, jurídica e processual, evitando se deixar contaminar por afecções subjetivas, de forma a decidir a questão com base na mais criteriosa interpretação do pedido e análise, valoração e distribuição do ônus da prova. Posto isso, conforme se pode observar, a situação em análise, tendo em vista a tese da relação de emprego editada na inicial da reclamação trabalhista, demanda o enfrentamento de considerável conteúdo fático. Por não revestir matéria eminentemente de direito, não admite solução padronizada abstraída da simples subsunção fática a determinada norma ou a partir unicamente da replicação do entendimento de determinado(s) julgado(s), muito embora se reconheça a eventual importância de julgados e citações doutrinárias no reforço do argumento desenvolvido. Assim, efetivamente, os elementos de prova constantes dos autos pendem em favor da natureza autônoma do elo jurídico havido entre as partes, tendo o trabalhador, aliás, confessado a ausência de subordinação, ao afirmar "que não havia exigência de cumprimento de metas para entregas", além de assumir os custos e os riscos de sua atividade. De fato, infere-se dos autos que o reclamante realizou seu cadastro no aplicativo do segundo reclamado, no qual escolheu o operador logístico para fazer suas entregas, a primeira reclamada, utilizando-se em sua atividade motocicleta e celular próprios, percebendo pela entregas realizadas, podendo, inclusive, recusá-las. Em semelhantes casos já se posicionou o TST da mesma forma, por suas 1ª, 4ª, 5ª e 8ª Turmas, merecendo citados, aqui, os seguintes julgados: "RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO PELA PARTE AUTORA. RITO SUMARÍSSIMO. UBER E MOTORISTA DE APLICATIVO. INEXISTÊNCIA DOS ELEMENTOS CARACTERIZADORES DA RELAÇÃO EMPREGATÍCIA. 1. Não se desconhece que, em tempos atuais, a economia globalizada e a tecnologia aproximam pessoas que, conjugando interesses em um mundo em constante evolução e transformação, erigem novas modalidades de contrato atividade. Dentre o extenso rol de novas atividades surgidas ao longo dos últimos anos, destaca-se a do motorista de aplicativo, que propiciou maior dinamismo e facilidade no transporte de pessoas/produtos. 2. A controvérsia dos autos diz respeito ao enquadramento jurídico dessa nova relação de trabalho que aproxima o motorista e a empresa que oferece tecnologia para o transporte de pessoas/produtos por meio de uma interface entre o prestador do serviço e o usuário-cliente. 3. A respeito do tema é oportuna e atual a advertência de PAULO EMÍLIO RIBEIRO DE VILHENA: " Na atual conjuntura do Direito do Trabalho brasileiro, não podem o juiz, o intérprete, o aplicador do direito, deixar de ver que se está processando um gradual e respingado deslocamento do eixo dos princípios que alicerçam o Direito do Trabalho, representado pelos arts. 2º, 3º, 9º e 448 da CLT, o que torna, nestes dias que correm, incompreensível e indiscriminada, arbitrária e porque não dizer fanática e tendenciosa canalização de qualquer relação de trabalho, de qualquer contrato atividade (Molitor), tais como na representação comercial, franchising, a dos sócios diretores de empresas, a das empreitadas, ou na das cooperativas para o agasalho da relação de emprego como se a ordem jurídica e a infra-estrutura que ela cobre estivessem impregnadas de uma permanente fraude geral. (VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro; Relação de emprego. Estrutura legal e supostos; São Paulo: LTR, 1999, pág. 138). 4. Os fatos retratados no acórdão regional evidenciam que a relação jurídica que se estabeleceu entre a empresa de aplicativo e o autor não era de emprego, especialmente pela falta de subordinação jurídica, pois a empresa não dava ordens aos motoristas e nem coordenava a prestação do serviço (ausente o poder direito da empresa). 5. Registrou-se que o motorista liga/desliga seu aplicativo a hora que bem entender, faz as suas corridas na hora que quiser, pelo tempo que quiser, escolhendo os clientes que quiser, onde quiser. Essa ampla margem de liberdade e autodeterminação evidencia autonomia, o que é incompatível com a relação de emprego, que tem como pressuposto intrínseco a subordinação jurídica. 6. Impende destacar, ainda, que a observância de regras mínimas estabelecidas pela empresa para uso do aplicativo não significa ingerência desta no modo de trabalho prestado, e não tem o condão de afastar a autonomia do motorista, uma vez que, tratando-se de obrigações contratuais, serve apenas para preservar a credibilidade do aplicativo, mantendo-se a fidelidade dos seus usuários, em prol do sucesso do negócio jurídico entabulado. 7. Nesse contexto, nota-se claramente que: a) a UBER é uma empresa de aplicativo, que pactua negócio jurídico com motorista autônomo, para que este possa usufruir da tecnologia ofertada e, em contrapartida, como consequência lógica do aproveitamento do aplicativo para captação de clientes, retira um percentual dos ganhos auferidos; b) o motorista presta serviços diretamente para o passageiro, por meio dessa ferramenta tecnológica (instrumento de trabalho) que possibilita a interação entre motorista e usuário-cliente, com autodeterminação na execução do serviço contratado e assunção do ônus econômico da sua atividade. O motorista usa o aplicativo, não é usado por ele. 8. Não se desconhece a notória necessidade de proteção jurídica aos motoristas de aplicativo, porém, tal desiderato protetivo deve ser alcançado via legislativa, nada justificando trazê-los ao abrigo de uma relação de emprego que não foi pactuada, almejada e muito menos concretizada durante o desenvolvimento cotidiano da atividade. 9. Nessa perspectiva, não se divisa ofensa direta e literal aos dispositivos constitucionais invocados pelo autor. Recurso de revista de que não se conhece." (TST - RR: 00002717420225130026, Relator: Amaury Rodrigues Pinto Junior, Data de Julgamento: 19/04/2023, 1ª Turma, Data de Publicação: 28/04/2023) "RECURSO DE REVISTA OBREIRO - VÍNCULO DE EMPREGO ENTRE O MOTORISTA DE APLICATIVO E A EMPRESA PROVEDORA DA PLATAFORMA DE TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO (UBER) - IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DIANTE DA AUSÊNCIA DE SUBORDINAÇÃO JURÍDICA - TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA - RECURSO DESPROVIDO. 1. Avulta a transcendência jurídica da causa (CLT, art. 896-A, § 1º, IV), na medida em que o pleito de reconhecimento do vínculo de emprego envolvendo os recentes modelos de contratação firmados entre motoristas de aplicativo e empresas provedoras de plataformas de tecnologia por eles utilizadas ainda é nova no âmbito desta Corte, demandando a interpretação da legislação trabalhista em torno da questão. 2. Ademais, deixa-se de aplicar o óbice previsto na Súmula 126 desta Corte, uma vez que os atuais modelos de contratação firmados entre as empresas detentoras da plataforma de tecnologia (Uber) e os motoristas que delas se utilizam são de conhecimento público e notório (art. 374, I, do CPC) e consona com o quadro fático delineado pelo Regional. 3. Em relação às novas formas de trabalho e à incorporação de tecnologias digitais no trato das relações interpessoais - que estão provocando uma transformação profunda no Direito do Trabalho, mas carentes ainda de regulamentação legislativa específica - deve o Estado-Juiz, atento a essas mudanças, distinguir os novos formatos de trabalho daqueles em que se está diante de uma típica fraude à relação de emprego, de modo a não frear o desenvolvimento socioeconômico do país no afã de aplicar regras protetivas do direito laboral a toda e qualquer forma de trabalho. 4. Nesse contexto, analisando, à luz dos arts. 2º e 3º da CLT, a relação existente entre a Uber e os motoristas que se utilizam desse aplicativo para obterem clientes dos seus serviços de transporte, tem-se que: a) quanto à habitualidade, inexiste a obrigação de uma frequência predeterminada ou mínima de labor pelo motorista para o uso do aplicativo, estando a cargo do profissional definir os dias e a constância em que irá trabalhar; b) quanto à subordinação jurídica, a par da ampla autonomia do motorista em escolher os dias, horários e forma de labor, podendo desligar o aplicativo a qualquer momento e pelo tempo que entender necessário, sem nenhuma vinculação a metas determinadas pela Uber ou sanções decorrentes de suas escolhas, a necessidade de observância de cláusulas contratuais (v.g.,valores a serem cobrados, código de conduta, instruções de comportamento, avaliação do motorista pelos clientes), com as correspondentes sanções no caso de descumprimento (para que se preserve a confiabilidade e a manutenção do aplicativo no mercado concorrencial), não significa que haja ingerência no modo de trabalho prestado pelo motorista, reforçando a convicção quanto ao trabalho autônomo a inclusão da categoria de motorista de aplicativo independente, como o motorista da Uber, no rol de atividades permitidas para inscrição como Microempreendedor Individual - MEI, nos termos da Resolução 148/2019 do Comitê Gestor do Simples Nacional; c) quanto à remuneração, o caráter autônomo da prestação de serviços se caracteriza por arcar, o motorista, com os custos da prestação do serviço (manutenção do carro, combustível, IPVA), caber a ele a responsabilidade por eventuais sinistros, multas, atos ilícitos ocorridos, dentre outros (ainda que a empresa provedora da plataforma possa a vir a ser responsabilizada solidariamente em alguns casos), além de os percentuais fixados pela Uber, de cota parte do motorista, entre 75% e 80% do preço pago pelo usuário, serem superiores ao que este Tribunal vem admitindo como suficientes a caracterizar a relação de parceria entre os envolvidos. 5. Já quanto à alegada subordinação estrutural, não cabe ao Poder Judiciário ampliar conceitos jurídicos a fim de reconhecer o vínculo empregatício de profissionais que atuam em novas formas de trabalho, emergentes da dinâmica do mercado concorrencial atual e, principalmente, de desenvolvimentos tecnológicos, nas situações em que não se constata nenhuma fraude, como é o caso das empresas provedoras de aplicativos de tecnologia, que têm como finalidade conectar quem necessita da condução com o motorista credenciado, sendo o serviço prestado de motorista, em si, competência do profissional e apenas uma consequência inerente ao que propõe o dispositivo. 6. Assim sendo, não merece reforma o acórdão regional que não reconheceu o vínculo de emprego pleiteado na presente reclamação, sob o fundamento de ausência de subordinação jurídica entre o motorista e a empresa provedora do aplicativo Uber. Recurso de revista desprovido." (TST - RR: 105555420195030179, Relator: Ives Gandra Martins Filho, Data de Julgamento: 02/03/2021, 4ª Turma, Data de Publicação: 05/03/2021) "AGRAVO. RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. RECONHECIMENTO DO VÍNCULO DE EMPREGO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA NA DECISÃO AGRAVADA . Os elementos constantes dos autos revelam a inexistência do vínculo empregatício, tendo em vista a autonomia no desempenho das atividades do autor, a descaracterizar a subordinação. Isso porque é fato indubitável que o reclamante aderiu aos serviços de intermediação digital prestados pela reclamada, utilizando-se de aplicativo que oferece interface entre motoristas previamente cadastrados e usuários dos serviços. E, relativamente aos termos e condições relacionados aos referidos serviços, esta Corte, ao julgar processos envolvendo motoristas de aplicativo, ressaltou que o motorista percebe uma reserva do equivalente a 75% a 80% do valor pago pelo usuário. O referido percentual revela-se superior ao que esta Corte vem admitindo como bastante à caracterização da relação de parceria entre os envolvidos, uma vez que o rateio do valor do serviço em alto percentual a uma das partes evidencia vantagem remuneratória não condizente com o liame de emprego. Precedentes. Ante a improcedência do recurso, aplica-se à parte agravante a multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC. Agravo não provido, com imposição de multa." (TST - Ag-RR: 00014128620205100801, Relator: Breno Medeiros, Data de Julgamento: 16/08/2023, 5ª Turma, Data de Publicação: 18/08/2023) "AGRAVO DE INSTRUMENTO DO RECLAMANTE. RECURSO INTERPOSTO CONTRA DECISÃO PROFERIDA NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. ENTREGADOR MOTORIZADO (MOTOBOY). UTILIZAÇÃO DE PLATAFORMA DIGITAL. VÍNCULO DE EMPREGO. TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA. Considerando tratar-se a discussão de matéria nova, para a qual ainda não há no âmbito deste Tribunal Superior jurisprudência reiterada e pacificada, acerca do reconhecimento de vínculo de emprego com empresa detentora de plataforma digital, reconhece-se a transcendência jurídica da causa, nos termos do artigo 896-A, § 1º, IV, da CLT. 2 . ENTREGADOR MOTORIZADO (MOTOBOY). UTILIZAÇÃO DE PLATAFORMA DIGITAL. VÍNCULO DE EMPREGO. NÃO CONFIGURAÇÃO. NÃO PROVIMENTO . Como é cediço, para que se possa reconhecer a existência de vínculo de emprego, é necessário que na relação jurídica mantida entre as partes estejam presentes os elementos configurados do pretendido liame, na forma estabelecida pelos artigos 2º e 3º da CLT. Desse modo, somente há falar em relação de emprego quando devidamente comprovada a não eventualidade dos serviços prestados, a pessoalidade do trabalhador contratado, a subordinação jurídica e a onerosidade. Ausente um desses requisitos, não há falar em vínculo de emprego, e sim em relação de trabalho por meio de atividade em sentido estrito. Importante realçar que o fato de o tomador dos serviços fixar diretrizes e aferir resultados na prestação dos serviços não induz à conclusão de que estaria presente a subordinação jurídica. Isso porque todo trabalhador se submete, de alguma forma, à dinâmica empresarial de quem contrata seus serviços, em razão de ser ela (a empresa) a beneficiária final dos serviços prestados pelo trabalhador. Sendo assim, pode ela perfeitamente supervisionar e determinar a forma de execução das atividades, não cabendo para a espécie o reconhecimento de vínculo decorrente da chamada "subordinação estrutural". Precedentes . No que diz respeito à subordinação jurídica, para que haja a sua configuração, é necessário que estejam presentes na relação todos os elementos que compõem o poder hierárquico do empregador, quais sejam: os poderes diretivo, fiscalizatório, regulamentar e disciplinar, como bem ressaltou o eminente Ministro Alexandre Luiz Ramos no seu voto, no julgamento do RR-10088-46.2015.5.18.0002, de sua relatoria na Quarta Turma. Desse modo, inexistindo a convergência concreta de todos esses elementos, não há falar em subordinação jurídica e, por conseguinte, em relação de emprego. Na hipótese , extrai-se do acórdão recorrido que o Tribunal Regional manteve a sentença que não reconheceu o vínculo de emprego do reclamante com a reclamada (IFOOD) , por entender que o trabalhador que se cadastra nas plataformas digitais de transporte e entrega de produtos possui autonomia para fixar as datas, horários e a duração da prestação de serviços, além de poder rejeitar as corridas que lhe são oferecidas, arcando com todos os custos da atividade desempenhada . Enfatizou que restaram incontroversos, por meio da prova oral colhida, os seguintes pontos: ficava a critério do entregador o início e término do horário de utilização da plataforma; o entregador poderia alterar a rota definida pelo aplicativo; não havia exigência quanto ao número mínimo de entregas diárias; ficava a critério do entregador a participação ou não em promoções; o entregador apenas fez o cadastro por meio do aplicativo, não sendo realizado nenhum processo seletivo; é critério do entregador utilizar outras plataformas; o entregador decide os dias de folga, não sendo necessário justificar a ausência na plataforma; o entregador arca com as despesas do veículo, inclusive seguro; e a reclamada não garante remuneração mínima ao final do dia ou mês . Ressaltou ainda que, conquanto a plataforma digital - IFOOD - possua certo poder de opinar na forma de execução das atividades, inclusive oferecendo promoções e premiações para os prestadores de serviços que lhe atendiam com maior regularidade e frequência, isso em nada afasta a constatação de que o motorista pode executar suas atividades apenas quando desejar, sem compromisso prévio com a empresa de cumprimento de carga horária mínima ou mesmo de respeito a escalas, atuando a plataforma apenas como um elo para possibilitar a entrega de produtos e artigos alimentícios, com uma oferta bastante ampliada de clientes e serviços e cobrando por tal intermediação . Asseverou, por fim, que a definição prévia dos valores das corridas pelo aplicativo, longe de configurar ingerência por parte da reclamada , possibilita ao autor avaliar previamente se há vantagem ou não quanto aos custos que deveria suportar com a prestação de serviços por meio da plataforma, podendo, se fosse o caso, optar pela adesão a aplicativos concorrentes. Em vista disso, concluiu que não há na relação controvertida pessoalidade e subordinação jurídica próprias do vínculo de emprego constantes dos artigos 2º e 3º da CLT. Desse modo, ao reconhecer a configuração da relação autônoma no caso dos autos, o Regional deu a exata subsunção dos fatos à norma contida nos artigos 2º e 3º da CLT. No mesmo sentido, não se vislumbra ofensa aos artigos 7º, I, II, III, IV, V, VI, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XIX, XXI, XXIV, da Constituição Federal, pois referidos dispositivos abarcam direitos que não foram reconhecidos no caso em apreço. Igualmente, não há falar em violação dos artigos 1º, III e IV, 5º, LXXIV e XXXV, da Constituição Federal, uma vez que os princípios da dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, bem como o princípio da inafastabilidade da jurisdição foram devidamente respeitados neste processo, inclusive com a apreciação do presente recurso. Agravo de instrumento a que se nega provimento" (AIRR-10818-12.2022.5.03.0008, Rel. Min. Guilherme Augusto Caputo Bastos , 8ª Turma, DEJT de 24/10/23). A situação dos autos envolve ainda a figura do operador logístico, primeiro reclamado, pelo que cito aresto do TST nessa hipótese: "AGRAVO DE INSTRUMENTO DO RECLAMANTE - VÍNCULO DE EMPREGO ENTRE ENTREGADOR MOTORIZADO (MOTOBOY) E A RECLAMADA SIS MOTO ENTREGAS EXPRESS SERVICOS - EIRELI (OPERADORA LOGÍSTICA DE ENTREGAS) - RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA 2ª RECLAMADA - IFOOD.COM AGENCIA DE RESTAURANTES ONLINE S.A. (PLATAFORMA TECNOLÓGICA OU APLICATIVO CAPTADOR DE CLIENTES) - IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DIANTE DA AUSÊNCIA DE SUBORDINAÇÃO JURÍDICA - TRANSCENDÊNCIA JURÍDICA RECONHECIDA - DESPROVIMENTO . 1. Avulta a transcendência jurídica da causa ( CLT, art. 896-A, § 1º, IV), na medida em que o pleito de reconhecimento do vínculo de emprego envolvendo os recentes modelos de contratação firmados entre motoristas de aplicativo, entregadores motorizados (motoboys) e empresas provedoras de plataformas de tecnologia por eles utilizadas ainda é nova no âmbito desta Corte, demandando a interpretação da legislação trabalhista em torno da questão. 2. Ademais, afasta-se o óbice elencado no despacho agravado (art. 896, § 1º-A, I, da CLT), uma vez que a ementa transcrita contém os fundamentos essenciais ao prequestionamento da matéria controvertida, notadamente os elementos que afastaram a subordinação jurídica na relação contratual e a pessoalidade na prestação dos serviços. 3. Em relação às novas formas de trabalho e à incorporação de tecnologias digitais no trato das relações interpessoais - que estão provocando uma transformação profunda no Direito do Trabalho, mas carentes ainda de regulamentação legislativa específica - deve o Estado-Juiz, atento a essas mudanças, distinguir os novos formatos de trabalho daqueles em que se está diante de uma típica fraude à relação de emprego, de modo a não frear o desenvolvimento socioeconômico do país no afã de aplicar regras protetivas do direito laboral a toda e qualquer forma de trabalho. 4. Nesse contexto, analisando, à luz dos arts. 2º e 3º da CLT, a relação existente entre as Reclamadas e os entregadores motorizados que se utilizam das plataformas para obterem clientes dos seus serviços de entrega, tem-se que: a) quanto à habitualidade, segundo registro do Regional, verificou-se a inexistência de obrigatoriedade de uma frequência predeterminada ou mínima de labor pelo motoboy para o uso do aplicativo, tendo certa autonomia para escolher ou não as entregas que lhe eram oferecidas; b) quanto à subordinação jurídica, a par da autonomia do entregador em escolher os turnos e entregas que realizaria , podia se fazer substituir por outra pessoa mediante comunicação prévia ao líder. Eventuais sanções no caso de descumprimento das escalas de sexta, sábado e domingo não significa que haja ingerência no modo de trabalho prestado pelo motoboy; c) quanto à remuneração, o caráter autônomo da prestação de serviços se caracteriza por arcar, o entregador, com os custos da prestação do serviço (manutenção do veículo, combustível, IPVA), cabendo a ele a responsabilidade por eventuais sinistros, multas, atos ilícitos ocorridos, dentre outros (ainda que a empresa provedora da plataforma possa a vir a ser responsabilizada solidariamente em alguns casos). 5. Assim sendo, não merece reforma o acórdão regional que não reconheceu o vínculo de emprego pleiteado na presente reclamação, ao fundamento de ausência de subordinação jurídica entre o entregador motorizado e a empresa operadora logística de entregas, além de ausência de pessoalidade na prestação dos serviços. Por conseguinte, prejudicado o pleito de responsabilização subsidiária da provedora do aplicativo. Agravo de instrumento desprovido" (AIRR-697-10.2021.5.23.0005, Rel. Min. Ives Gandra da Silva Martins Filho , 4ª Turma, DEJT de 01/09/23). Colhem-se, também, na mesma direção, os seguintes precedentes deste Regional, por suas três Turmas, em demandas congêneres: "VÍNCULO EMPREGATÍCIO. ENTREGADOR POR APLICATIVO. "GIG ECONOMY". IFOOD. CARACTERES DA RELAÇÃO DE EMPREGO. AUSÊNCIA. TRABALHO AUTÔNOMO. SUBORDINAÇÃO AUSENTE. A formalização de contrato, típico ou atípico, não obsta, de per si, o reconhecimento da relação de emprego. Admitido o labor, cumpre ao empregador provar a prestação de serviços de forma autônoma. Caso, porém, em que a prova dos autos afasta a subordinação, eliminando, em consequência, a possibilidade de identificação de um vínculo empregatício. Atividade de entregador por aplicativo que não envolve subordinação. Recurso conhecido e não provido." (TRT da 7ª Região; Processo: 0000226-14.2021.5.07.0013; Data: 31-03-2023; Órgão Julgador: 1ª Turma; Relator(a): MARIA ROSELI MENDES ALENCAR) "VÍNCULO DE EMPREGO COM A 2. ª RECLAMADA 25/02/2018 a 22/04/2019 (IFOOD.COM AGÊNCIA DE RESTAURANTES ONLINE S.A) DE 25/02/2018 a 22/04/2019. CONFISSÃO. A 2.ª reclamada, ao negar a relação de emprego, atribuindo a prestação de serviços do reclamante/recorrente como autônomo (entregador), atraiu para si o ônus de comprovar os fatos impeditivos do direito vindicado (art. 818 da Consolidação das Leis do Trabalho c/c o inciso II do art. 373 do Código de Processo Civil), porém, o reclamante, em depoimento (id 4db45e1) confessa a autonomia e a ausência de pessoalidade da sua prestação de serviços. [...]" (TRT 7ª Região, RO 0000214-94.2021.5.07.0014, Relator FRANCISCO JOSÉ GOMES DA SILVA, 2ª Turma, Data da Publicação 18/10/2022, PJe-JT). "VÍNCULO DE EMPREGO. NÃO RECONHECIMENTO. Era da reclamada o ônus de comprovar a prestação de serviços do postulante em modalidade diversa da relação de emprego (art. 818, inc. II, da CLT), ônus do qual se desvencilhou satisfatoriamente. Adotam-se, como razões de decidir, no que diz respeito à constatação da inexistência de vínculo de emprego entre o autor e a acionada, os fundamentos expendidos na decisão recorrida. Recurso ordinário conhecido, mas não provido." (TRT da 7ª Região; Processo: 0000194-11.2022.5.07.0001; Data: 14-03-2023; Órgão Julgador: 3ª Turma; Relator(a): FRANCISCO TARCISIO GUEDES LIMA VERDE JUNIOR) Dada a relevância da matéria, também cito os seguintes julgados deste Regional: "RECURSO ORDINÁRIO DO AUTOR. MOTORISTAS E EMPRESAS DE APLICATIVOS. UBER. NATUREZA DA VINCULAÇÃO EXISTENTE ENTRE AS PARTES LITIGANTES. VÍNCULO EMPREGATÍCIO NÃO COMPROVADO. É cediço que para a configuração do vínculo empregatício é necessária a existência dos elementos fático-jurídicos componentes da relação de emprego, a saber: prestação de trabalho por pessoa física, com pessoalidade, a um tomador, de forma não-eventual, efetuada sob subordinação jurídica e com onerosidade, requisitos configuradores do liame empregatício, previstos nos artigos 2º e 3º da CLT. A ausência de qualquer um desses pressupostos fático-jurídicos impossibilita o reconhecimento da relação de emprego entre as partes. Recurso ordinário conhecido e improvido." (TRT-7 - ROT: 00007290720225070011, Relator: REGINA GLAUCIA CAVALCANTE NEPOMUCENO, 1ª Turma, Data de Publicação: 13/04/2023) "[...] MOTORISTA. PRESTADOR DE SERVIÇO PARA O APLICATIVO UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. TRABALHO AUTÔNOMO CARACTERIZADO. INEXISTÊNCIA DA PRETENDIDA RELAÇÃO DE EMPREGO. SENTENÇA CONFIRMADA. Incumbe ao empregador que nega ter admitido o trabalhador para ocupar posto de emprego, apontando outra situação de fato, como o trabalho autônomo, eventual e não subordinado, o ônus de provar esse fato impeditivo do direito do autor, aplicando-se, in casu, as regras estabelecidas nos art. 818, da CLT, e 373, do Código de Processo Civil, em sua função subsidiária do Direito Processual do Trabalho. No caso concreto, entretanto, a inexistência da pretensa relação de emprego aflora da própria natureza do trabalho e das condições em que fora prestado, admitindo-se, a partir dos fundamentos da defesa e dos documentos que lhe acompanham, bem como dos julgados (Acórdãos) do Tribunal Superior do Trabalho, que o reclamante aderiu, livremente, às condições previstas no documento "Termos e Condições Gerais dos Serviços de Intermediação Digital" da reclamada, não constando dos autos qualquer prova de fraude ou de outro vício capaz de nulificar a referida adesão. Afora isso, dúvidas inexistem de que o reclamante, na condição de motorista agregado ao aplicativo UBER, sempre laborou de forma autônoma, sem qualquer ingerência da empresa em suas atividades, restando certo, por outra banda, que auferia rendimentos, em termos proporcionais, bastante razoáveis, cerca de 75% da renda obtida em cada viagem, que permitem caracterizar sua relação com a reclamada como uma verdadeira parceria. (...)" (TRT-7 - ROT: 00000282920205070007 CE, Relator: DURVAL CESAR DE VASCONCELOS MAIA, 1ª Turma, Data de Publicação: 16/08/2022) "(...) Desse modo, comprovado, portanto, que o Reclamante não era um empregado,mas típico prestador de serviços, tanto que o obreiro reconhece que arcava com os custos relativos ao veículo (manutenção e combustível), tendo, inclusive, até alugado carro para tal finalidade, por lhe auferir renda nesta atividade, já que remunerado pelo passageiro, repassando tão somente o valor preestabelecido pelo uso da plataforma digital." (TRT-7 - RORSum: 00004763620205070028, Relator: PLAUTO CARNEIRO PORTO, 1ª Turma, Data de Publicação: 30/07/2022) "(...) 'Francamente, a própria forma de relação travada entre reclamante e reclamada não dá espaço para encaixar o reclamante na modalidade de contrato intermitente. A oferta é feita imediatamente, assim como a recusa, tudo de forma muito dinâmica, on line. Por estas razões, não reconheço o vínculo de emprego pretendido pelo reclamante, diante da ausência de um dos elementos definidores da relação empregatícia, a habitualidade, no caso.' Sentença mantida em sua íntegra, pois, pelos seus próprios e jurídicos fundamentos." (RORSum 0000671-50.2022.5.07.0028 Relator:FERNANDA MARIA UCHOA DE ALBUQUERQUE, 3ª Turma, Data de Publicação: 08/12/2022) Logo, sendo sugestivo nestes autos, como em outras demandas semelhantes a esta, que na relação entre o reclamante, na condição de entregador, e a primeira empresa reclamada, operadora logística de entregas, que se utilizam da plataforma digital do segundo reclamado, a qual tem por objetivo intermediar os interesses dos respectivos usuários, no caso do trabalhador, a obtenção de clientes para sua oferta de serviço de entrega, nenhum elemento que desvirtue sua natureza autônoma, afigura-se descabida a pretensão de reconhecimento do vínculo de emprego descrito na vestibular, com as repercussões disso decorrentes. Por fim, embora sucumbente na lide, por força do decidido pelo STF na ADI 5766, da respectiva verba honorária está a salvo o reclamante, beneficiário da gratuidade judiciária, o que ora ratifico, consoante reza a orientação jurisprudencial emergente da Súmula 463, do TST, reafirmada no IncJulgRREmbRep-277-83.2020.5.09.0084. Prejudicados os demais itens recursais. Voto pelo conhecimento do recurso ordinário do reclamado e dar-lhe parcial provimento, para julgar improcedente a reclamação trabalhista. Custas invertidas, mas dispensadas, nos termos da lei. FORTALEZA/CE, 23 de abril de 2025. ARLENE DE PAULA PESSOA STUDART Diretor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- ANTONIO CHARLES COSTA DO NASCIMENTO
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