David Sousa Albuquerque Freire x Uber Do Brasil Tecnologia Ltda.
ID: 276767224
Tribunal: TRT7
Órgão: 3ª Vara do Trabalho de Fortaleza
Classe: AçãO TRABALHISTA - RITO SUMARíSSIMO
Nº Processo: 0000299-74.2025.5.07.0003
Data de Disponibilização:
22/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RAFAEL ALFREDI DE MATOS
OAB/BA XXXXXX
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WENDRILL FABIANO CASSOL
OAB/RN XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 7ª REGIÃO 3ª VARA DO TRABALHO DE FORTALEZA ATSum 0000299-74.2025.5.07.0003 RECLAMANTE: DAVID SOUSA ALBUQUERQUE FREIRE RECLA…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 7ª REGIÃO 3ª VARA DO TRABALHO DE FORTALEZA ATSum 0000299-74.2025.5.07.0003 RECLAMANTE: DAVID SOUSA ALBUQUERQUE FREIRE RECLAMADO: UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA. INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Sentença ID 3f9087e proferida nos autos, cujo dispositivo consta a seguir: Trata-se de reclamação trabalhista ajuizada por David Sousa Albuquerque Freire em face de Uber do Brasil Tecnologia Ltda., ambos qualificados nos autos, por meio da qual formula o reclamante os pedidos alinhados na petição do id. 4e81defd. Valor da causa atribuído na peça de ingresso de R$ 18.154,22, que veio acompanhada por documentos. Em audiência (id 25cf489), inconciliáveis as partes, apresentou a parte reclamada defesa escrita (id. 82d4d8a), acompanhada de documentos, por meio das quais procurou rebater as alegações autorais. A título de negócio jurídico processual, as partes estabeleceram que a prova oral seria realizada sob a modalidade emprestada, tendo a reclamada informado a sua prova emprestada: Depoimento da testemunha Willian Douglas Pereira dos Santos - no processo 0010332-02.2020.5.03.0136 (ID 5b757a0) e Pedro Pacce Prochno, no processo 1001906-63.2016.5.02.0067 (ID e4c88e1). Foi concedido às partes o prazo de 10 dias para razões finais escritas, bem como para se manifestar sobre as provas juntadas. Declararam as partes não haver mais provas a produzir, sendo encerrada a instrução processual. Frustrada derradeira tentativa conciliatória. Vieram os autos conclusos para decisão. É o relatório. Passa-se à decisão. **INCOMPETÊNCIA MATERIAL** Rejeita-se. Como ensina a melhor doutrina processual, a competência é estabelecida pelo pedido e causa de pedir, sendo questão que precede o mérito da causa; portanto, questão preliminar. Assim sendo, revela-se patente que o caso presente diz respeito à busca, pela parte autora, do reconhecimento de alegada relação de emprego, na condição de pessoa física, perante a parte reclamada, pessoa jurídica, sob a alegação de estarem presentes os elementos fático-jurídicos da relação de emprego. Os demais pleitos nada mais são do que consectários deste eventual reconhecimento, todos guardando natureza estritamente trabalhista. Nesta senda, a discussão sobre a efetiva relação jurídica travada na espécie, se atinente a uma autêntica relação de emprego, ou se condizente com uma relação civil de prestação de serviços, ou mesmo de consumo, está claramente atrelada ao mérito da demanda, sendo estranha à presente análise preliminar. **INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO QUANTO À COBRANÇA DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS ALÉM DOS VALORES OBJETO DE EVENTUAL CONDENAÇÃO** Reconhece-se, ex officio, a incompetência desta Especializada para o pleito de cobrança de contribuições previdenciárias por todo o período do contrato laboral, na forma da petição inicial, como matéria processual de ordem pública (art. 485, §3º, do CPC), uma vez que a competência desta Justiça do Trabalho, na forma do Art. 114, VIII, da CF, resume-se à cobrança das contribuições previdenciárias incidentes sobre os valores das condenações emanadas das sentenças que proferir. Tal foi o entendimento do C. STF em feito de repercussão geral: EMENTA Recurso extraordinário. Repercussão geral reconhecida. Competência da Justiça do Trabalho. Alcance do art. 114, VIII, da Constituição Federal. 1. A competência da Justiça do Trabalho prevista no art. 114, VIII, da Constituição Federal alcança apenas a execução das contribuições previdenciárias relativas ao objeto da condenação constante das sentenças que proferir. 2. Recurso extraordinário conhecido e desprovido. Em coerência com tal inteligência, o Pretório Excelso editou, em 18.06.2015, a Súmula Vinculante nº. 53, que dispõe, in litteris: Súmula Vinculante 53 A competência da Justiça do Trabalho prevista no art. 114, VIII, da Constituição Federal alcança a execução de ofício das contribuições previdenciárias relativas ao objeto da condenação constante das sentenças que proferir e acordos por ela homologados. Nestes termos, julga-se extinto o pleito de cobrança das contribuições previdenciárias relativas a todo o período do contrato de trabalho, sem resolução do mérito, com espeque no art. 485, IV, do CPC. **PRESCRIÇÃO BIENAL** A reclamada arguiu, em sua sede de prejudicial de mérito, a ocorrência da prescrição bienal em relação à pretensão do reclamante. Sustenta que a última viagem do reclamante teria ocorrido em 06/02/2023, enquanto a ação foi ajuizada apenas em 07/03/2025, excedendo o prazo de dois anos previsto no artigo 7º, inciso XXIX, da Constituição Federal. Contudo, tal alegação não comporta acolhimento neste momento processual, pois está diretamente vinculada à questão de mérito, que versa sobre a configuração ou não de vínculo empregatício entre as partes. A definição da existência de vínculo laboral, bem como a delimitação dos períodos contratuais e do eventual marco inicial para a contagem do prazo prescricional, depende da análise pormenorizada das provas e fundamentos apresentados nos autos. Ademais, a controvérsia em questão demanda a verificação de elementos fático-jurídicos essenciais para caracterizar a natureza da relação entre as partes, o que inviabiliza a apreciação da prescrição bienal sem que se adentre ao mérito da demanda. Ressalte-se que, caso reconhecido o vínculo empregatício no período alegado pelo reclamante, será necessário avaliar a continuidade da relação para aferir a aplicabilidade da prescrição. Dessa forma, a análise da prejudicial de prescrição bienal deve ser remetida à apreciação de mérito, uma vez que não há, no presente momento, elementos suficientes para sua declaração. Por esse motivo, rejeita-se a prejudicial em tela. **PRESCRIÇÃO QUINQUENAL** Em atenção à arguição da parte ré, imperiosa é a pronúncia do corte prescricional em relação às parcelas anteriores a 07/03/2020, eis que anteriores ao quinquênio constitucionalmente eleito como marco prescricional das pretensões referentes aos direitos trabalhistas, tendo-se como base o ajuizamento da presente demanda, nos termos do art. 7º, XIX, da CF, resolvendo-se o feito, no particular, com espeque no art. 487, IV, do CPC. Ressalvam-se as pretensões de natureza declaratória, uma vez que imprescritíveis, à luz do art. 11 da CLT, a par do caráter de ordem pública do registro dos contratos laborais em nosso país. Consigne-se que a prescrição quinquenal se aplica igualmente aos depósitos do FGTS, tendo o Col. STF declarado a inconstitucionalidade da prescrição trintenária dos recolhimentos fundiários, nos termos do Tema 608 da Repercussão Geral daquela Corte. **CAPÍTULO I - VÍNCULO DE EMPREGO. RELAÇÃO MEDIANTE APLICATIVO** Afirma a parte autora ter aderido aos termos e condições da reclamada, iniciando suas atividades perante essa em 21/11/2021. Alega que realizava jornadas diárias de trabalho, de acordo com a demanda ofertada pela ré, em horários variáveis. Aduz que recebia pelo exercício da função de motorista o pagamento mensal médio de R$378,61, tendo sido bloqueada pela ré em 01/11/2023, jamais tendo qualquer direito trabalhista reconhecido. Requer o reconhecimento do vínculo empregatício perante o reclamado, dada a presença dos elementos fático-jurídicos da relação de emprego, nos termos dos artigos 2º e 3º da CLT, bem como sua reintegração ao emprego ou o pagamento das verbas rescisórias atinentes a demissão imotivada. O reclamado, por sua vez, alega ser empresa de tecnologia, utilizada pelos motoristas parceiros para localização e captação de usuários que visam seu deslocamento. Esses, por sua vez, ciosos da eficiência da tecnologia, utilizam o aplicativo para encontrar motoristas. Sustenta que seu objeto social formalizado não inclui transporte de passageiros. Defende que sua relação com o reclamado é de índole meramente comercial, atrelada ao serviço de intermediação digital entre o motorista independente e o usuário do serviço de transporte. Nega a presença dos elementos fático-jurídicos da relação de emprego perante o reclamante, notadamente a subordinação jurídica, o que afasta a caracterização da relação de emprego, mesmo que sob a forma intermitente. Analisa-se. De plano, tem-se que as partes, em legítimo e louvável negócio jurídico-processual, a bem da cooperação jurídica que deve permear a postura das partes no curso da relação processual (art. 6º do CPC), estabeleceram premissas fáticas incontroversas a serem adotadas na apreciação da presente demanda, como consta da última ata de audiência (id. 25cf489). Por óbvio, tais postulados consensuais serão utilizados, a par dos demais elementos de prova constantes dos autos, como bases para o presente julgamento. De início, e para adotar sistemática utilizada pela própria defesa, cumpre trazer algumas considerações acerca da natureza da atividade exercida pela empresa ora demandada. Com efeito, não merece prosperar a alegação da empresa no sentido de que não exerce a atividade de transporte de passageiros. Ora, toda a dinâmica da atividade da ré tem como núcleo central o serviço de transporte de pessoas. Esse é o mote comercial da empresa. O grande público não busca a empresa reclamada como uma "plataforma de intermediação digital", mas sim como uma forma alternativa de locomoção. Ademais, não é ocioso lembrar que a característica que desde o início chamou a atenção do grande público para o serviço da empresa foi exatamente o baixo custo das viagens para os passageiros, o que obviamente só foi possível devido ao modelo de contratação dos motoristas que realizam as corridas. Se é certo que a empresa tem interesse na captação de um grande número de motoristas, isso não se dá pelo fato de sua atividade ser a mera intermediação, mas sim pelo óbvio desejo de manter um numeroso rol de condutores aptos a prestar serviços aos consumidores. Sem que haja um expressivo número de condutores que aceitem receber baixas tarifas pelas corridas contratadas, em valor definido pelo algoritmo tecnológico da ré, mesmo tendo que arcar com os custos de combustível e manutenção do próprio veículo, o modelo de negócio da empresa fica absolutamente inviável. Tal conclusão não tem lastro jurídico, mas sim econômico. Analisada a natureza essencial da atividade econômica da ré, cumpre descortinar a dinâmica da atuação dos condutores perante a empresa, à luz dos elementos fático-jurídicos da relação de emprego. De início, não se pode perder de vista que, de fato, houve uma intensa transformação das relações de trabalho, não só no Brasil, mas em todo o mundo. Sob uma retórica própria, pode parecer "antiquado" configurar a relação de emprego em situações como a ora em apreço, oriundas da chamada "revolução industrial 4.0", pois o conceito da relação de emprego não mais dialogaria com os interesses dos próprios trabalhadores, que atualmente buscam maior autonomia e menos engessamento nas relações de trabalho. Entretanto, mais parece que tal retórica contém muito mais um viés distorcido do conceito da própria relação de emprego, como sendo necessariamente algo estático, engessado e que não possa se atualizar e se adaptar às transformações de nossa sociedade. Ou ainda, como se a chamada "modernidade" fosse incompatível com a relação de emprego. Ledo engano. Na verdade, o âmago do conceito da relação de emprego não está vinculado a um engessamento do trabalhador na prestação laboral, ou mesmo de uma fixação a um mesmo empregador, como muitas vezes se escuta. Mesmo segundo a acepção clássica, não figuram como requisitos da relação de emprego a exclusividade ou mesmo a definição de um horário fixo. Ora, já em sua redação original a CLT dispôs em seu art. 62 aqueles casos nos quais o empregado não estaria sujeito às limitações de horários, o que não desnatura sua condição empregatícia. Note-se que tal dispositivo legal sofreu inúmeras alterações ao longo do tempo, exatamente no intuito de adaptar o conceito da relação de emprego à marcha evolutiva das relações de trabalho. Neste sentido, as Leis 7.313/85, 8.966/94, 13.467/2017 e 14.442/2022, sempre com o escopo de incluir ou excluir determinada atividade de seu âmbito de abrangência. De particular relevância na ilustração da evolução que vem sofrendo o conceito da relação de emprego frente às mudanças nas relações de trabalho é a alteração produzida pela lei 12.551/2011 no art. 6º da CLT, que passou a dispor: "Art. 6º. Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego. (Redação dada pela Lei nº 12.551, de 2011) Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio. (Incluído pela Lei nº 12.551, de 2011)" Por fim, cabe trazer à tona a figura do contrato intermitente, já presente em legislações laborais de vários outros países, e trazido ao Direito brasileiro pela Lei 13.467/2017, que representou, na prática, o sepultamento definitivo da imagem do empregado como aquele que atua todos os dias, com horário fixo, por salário fixo, na sede da empresa e seguindo ordens diretas e verbais de um superior hierárquico. Essa visão da relação de emprego certamente se encontra em descompasso com a modernidade das relações laborais, até mesmo diante da legislação trabalhista já consolidada. Assim, passou a dispor o art. 443, §3º, da CLT, in verbis: "§ 3o Considera-se como intermitente o contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por legislação própria." (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017) Diante do exposto, nota-se que a relação de emprego pode ser descontínua, com alternância de períodos de atividade e inatividade, segundo às variações da demanda do empregador, como é o caso do contrato intermitente; que "os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio", como expressa o art. 6º, §único, da CLT; e que o empregado pode atuar sem previsão horário fixo, como nos casos do art. 62 da CLT, donde se destaca a recente alteração em relação ao teletrabalho (art. 62, III, da CLT), cuja atuação se dá por produção ou tarefa, sendo desvinculado do horário. Ainda que se reconheça a necessidade de uma maior regulamentação do trabalho por meio dos aplicativos, que cada vez mais se disseminam na sociedade, mormente num contexto de crise econômica duradoura e escassez de postos de trabalho, não se pode perder de vista que tal modalidade de labor implica, inequivocamente, numa dinâmica de subordinação telemática do trabalhador em relação ao detentor da tecnologia, na linha da situação já prevista pelo art. 6º, §único, da CLT. Não há como se coadunar a noção de autonomia com a atuação dos trabalhadores que atuam por meio do reclamado. Ora, que espécie de empreendedor é esse que sequer pode definir livremente o preço de seu serviço? Que é submetido a exigências e padrões de determinada empresa na condução de seus serviços? Em verdade, o que tenciona a empresa ré é tão somente se servir do trabalho subordinado dos motoristas, cuja disponibilidade é exponenciada pelo quadro de informalidade e desemprego estrutural, sem arcar com os devidos custos da exploração da força de trabalho alheia. Entretanto, não se olvide que a Constituição Federal de 1988 tem como pilares os "valores social do trabalho e da livre iniciativa" (art. 1º, IV, da CF); dispõe que "a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os princípios" da função social da propriedade e a busca do pleno emprego (art. 170, caput e incisos III e VI, da CF); e define que "a ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais". Visto que nossa Carta Magna definiu tais valores como basilares em nossa ordem jurídica, não há como a empresa se aproveitar de um suposto limbo jurídico, que como exposto acima sequer é real, para deixar à margem de qualquer proteção social todo um conjunto de trabalhadores responsáveis pela movimentação de sua efetiva atividade econômica. Não existe no direito brasileiro a figura do trabalhador parassubordinado, que seria um tertium genus entre o empregado e o autônomo, como ocorre no direito italiano. Em nosso país, se alguém se aproveita da força de trabalho de outrem no contexto de sua atividade econômica, ou bem se é empregado, o que como visto é a caracterização prestigiada pela Constituição Federal, pelos valores eleitos por nossa sociedade, ou não, nas excepcionais situações nas quais o trabalhador é autêntico dono dos meios de produção e tem autonomia efetiva nos destinos de sua atividade, o que claramente não se amolda ao caso em apreço. Prosseguindo, cumpre analisar os elementos fático-jurídicos da relação de emprego no caso concreto: **PESSOALIDADE** O cadastro por meio eletrônico representa justamente a pessoalidade prevista na CLT, na medida em que, para trabalhar como motorista para a reclamada, o reclamante teve que ser necessariamente cadastrado. A prova emprestada apresentada pelo reclamado demonstra que o cadastro é realizado de forma pessoal, com login e senha própria para cada motorista. A testemunha Pedro Pacce Prochno, gerente de comunicação da Uber, afirmou que "com o cadastramento do motorista, o mesmo recebe as informações sobre funcionamento da plataforma por e-mail, pelo site e pelo próprio aplicativo" e que "o 'de acordo' com as normas é realizado pelo motorista parceiro no próprio site da uber ou no aplicativo". Tal depoimento confirma que o motorista não pode se fazer substituir por outro na condução do veículo, uma vez que a empresa envia ao usuário solicitante do serviço de transporte dados sobre o veículo e o motorista, com o nome e a sua foto. Portanto, resta configurada a pessoalidade na prestação dos serviços. **NÃO-EVENTUALIDADE** O elemento da não-eventualidade também se faz presente. Conforme os dados constantes nos autos, o reclamante trabalhou por período considerável (de 21/11/2021 a 01/11/2023, segundo alega, ou de 25/11/2021 a 06/02/2023, segundo a reclamada), estando cadastrado no aplicativo e prestando serviços de transporte de passageiros em favor da empresa de forma contínua. A atividade do reclamante não era imprevisível ou esporádica, mas totalmente previsível, programada e controlada pela reclamada. O autor estava inserido na dinâmica do empreendimento, atendendo aos fins da atividade econômica da Uber. Vale registrar que, embora a defesa alegue que o reclamante tenha permanecido sem realizar viagens em alguns períodos, isso não desnatura a não-eventualidade da prestação dos serviços, especialmente quando considerada a natureza do contrato de trabalho intermitente. **ONEROSIDADE** A onerosidade se faz presente de forma clara, vez que existe retribuição de caráter econômico/monetário por um serviço de valor economicamente mensurável. Conforme evidenciado nos depoimentos, é a empresa quem conduz, de forma unilateral, toda a política de preços e pagamento pelo serviço de transporte ofertado aos seus clientes, estabelecendo preços dinâmicos e controlando a forma de pagamento. O motorista não tem qualquer ingerência sobre esses aspectos. Os demonstrativos de pagamento revelam que o pagamento pelo serviço prestado era feito pelo cliente diretamente à empresa, que fazia a retenção do seu percentual e repassava o valor devido ao autor de forma semanal. **SUBORDINAÇÃO** A subordinação resta configurada em suas diversas dimensões: objetiva, estrutural e algorítmica. A prova emprestada evidencia que a empresa exerce controle sobre diversos aspectos da prestação de serviços, como: - Monitoramento em tempo real da localização do motorista; - Definição unilateral dos preços das corridas; - Sistema de avaliação dos motoristas pelos usuários; - Possibilidade de desativação da conta do motorista por baixas avaliações; - Direcionamento das corridas aos motoristas; - Estabelecimento de padrões de atendimento e conduta. Tais elementos demonstram claramente a subordinação do motorista à plataforma, que exerce seu poder diretivo, regulamentar, fiscalizatório e disciplinar por meios telemáticos, nos termos do art. 6º, parágrafo único da CLT. **ALTERIDADE** Por fim, verifica-se que o risco do empreendimento é assumido pela Uber, que controla todos os aspectos operacionais e financeiros do serviço prestado. O motorista não tem qualquer ingerência sobre aspectos cruciais do negócio, como precificação, angariação de clientes, forma de pagamento, entre outros. Embora a testemunha Pedro Pacce Prochno afirme que "o próprio motorista arca com valores de combustível, multas e afins", isso não afasta a alteridade, uma vez que a Uber continua sendo a detentora do risco econômico da atividade como um todo. Ante o exposto, diante de todo o robusto conteúdo de provas produzidos nos autos, reconhecida a real natureza da atividade econômica da reclamada no contexto da indústria 4.0, e tendo em mente ainda as circunstâncias do caso concreto, concluo que estão presentes todos os requisitos do contrato de trabalho estabelecidos no art. 3º da CLT, principalmente a subordinação jurídica nos termos do novel art. 6º, §único, da CLT, razão pela qual, com base no art. 9º da CLT, declaro a nulidade do contrato de parceria/prestação de serviços havido entre a reclamada UBER e o reclamante motorista para reconhecer o vínculo de emprego entre as partes, na modalidade CONTRATO INTERMITENTE, com admissão em 21/11/2021. No tocante ao encerramento do contrato, tendo em vista que a ré, unilateralmente, impediu a prestação das atividades do autor ("bloqueio"), por tempo indeterminado, sem lhe oportunizar defesa, não lhe permitindo, sequer, tomar conhecimento sobre o teor das queixas alegadamente registradas por passageiros, tenho que o desenlace contratual ocorreu imotivadamente, por iniciativa da reclamada, em 01/11/2023. No entanto, mesmo diante do reconhecimento da relação de emprego entre as partes, inexiste qualquer garantia provisória do autor, a limitar a posição jurídica patronal quanto à dispensa unilateral. Tampouco restou configurada qualquer conduta discriminatória em desfavor da parte reclamante, tendo a reclamada exercido seu livre direito de gestão do negócio ao decidir pelo desligamento do autor. Assim, rejeita-se o pedido exordial de reintegração ao emprego. Diante disso, tendo em vista que a prescrição fulminou as parcelas anteriores a 07/03/2020, condena-se a reclamada no pagamento de aviso prévio indenizado (33 dias); férias em dobro de 2021/2022 e 2022/2023, acrescidas de um terço; trezeno de 2021, 2022 e 2023 (proporcional); integralização dos depósitos fundiários de todo o pacto imprescrito, acrescidos da respectiva indenização de 40%, ante a dispensa imotivada, observada a evolução salarial do autor segundo históricos de pagamento pelo réu. Condeno a ré na obrigação de proceder à anotação do contrato de trabalho (admissão em 21/11/2021 e término em 04/12/2023, considerando a projeção do aviso prévio proporcional), nos termos acima e respeitado o limite do pedido, no prazo de até 15 (quinze) dias após notificação da Vara acerca do cumprimento da determinação supra pela parte autora, sob pena de multa diária de R$ 500,00 (CPC, art. 461, § 4º), limitada a 30 (trinta) dias. Diante da modalidade rescisória ora reconhecida, expeça-se ofício para sua habilitação ao seguro-desemprego, caso preenchidos os demais requisitos legais. Prosseguindo, haja vista o não pagamento das verbas rescisórias, condena-se a reclamada no pagamento equivalente ao último salário da parte reclamante, em face do atraso no pagamento de tais parcelas, em virtude do insculpido no art. 477, § 8º, da CLT. Haja vista a amplitude da controvérsia estabelecida pela defesa, incabível a incidência da multa do art. 467 da CLT. **CAPÍTULO II - DANO MORAL POR DISPENSA ARBITRÁRIA** O reclamante postula indenização por dano moral em virtude de suposta dispensa arbitrária, alegando que foi bloqueado em 01/11/2023 de forma sumária e automatizada, sem qualquer direito de defesa, em afronta ao disposto no artigo 20 da Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709/2018). Sustenta que tal situação lhe causou prejuízos de ordem psíquica, visto que teve sua única fonte de renda abruptamente cortada. **Analisa-se.** Para a configuração do dano moral e consequente dever de indenizar, é necessária a conjugação simultânea de três requisitos basilares, quais sejam: (i) a existência de uma conduta ilícita ou antijurídica; (ii) a ocorrência de um dano efetivo à esfera extrapatrimonial do ofendido; e (iii) o nexo de causalidade entre a conduta e o dano experimentado. No caso em tela, ainda que se reconheça o vínculo empregatício entre as partes, isso não implica, por si só, que a terminação do contrato tenha sido ilícita ou que tenha violado direitos da personalidade do autor. Com efeito, é cediço na doutrina e jurisprudência trabalhistas que, no direito brasileiro, prevalece o chamado "direito potestativo" do empregador de romper o vínculo empregatício sem justa causa, conforme se infere do artigo 7º, inciso I, da Constituição Federal, que prevê a proteção contra a despedida arbitrária ou sem justa causa, mas nos termos da lei complementar ainda não editada. Esse direito potestativo patronal é compensado pelo pagamento das verbas rescisórias legalmente previstas, como aviso prévio, férias proporcionais, 13º salário proporcional, liberação dos depósitos do FGTS e sua multa de 40%. Nesse diapasão, não se vislumbra, no caso específico do reclamante, que o bloqueio de sua utilização da plataforma tenha extrapolado o legítimo exercício do poder diretivo patronal, caracterizando-se mera dispensa imotivada. Não se evidenciou nos autos qualquer indício de que a reclamada tenha agido com excesso ou abuso de direito, ou que tenha adotado condutas discriminatórias, persecutórias ou vexatórias em relação ao autor. Quanto à alegação de violação à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), cumpre esclarecer que o artigo 20 da referida norma versa sobre o direito do titular dos dados de solicitar a revisão de decisões tomadas unicamente com base em tratamento automatizado de dados pessoais que afetem seus interesses, incluindo decisões destinadas a definir seu perfil pessoal, profissional, de consumo e de crédito ou os aspectos de sua personalidade. Tal dispositivo legal garante ao titular de dados pessoais a possibilidade de compreender os critérios e procedimentos utilizados para a tomada de decisão automatizada, bem como solicitar a revisão da mesma. No entanto, não há vedação expressa à tomada de decisões automatizadas, desde que respeitados os direitos de informação e revisão. No caso em apreço, não há elementos contundentes que comprovem que a decisão de bloqueio tenha sido exclusivamente automatizada. Conforme a prova emprestada constante dos autos, a testemunha Willian Douglas Pereira dos Santos afirmou que "se for inobservado algum termo de uso da plataforma, o entregador pode ter o bloqueio do seu acesso à plataforma, assim como os clientes". Isso demonstra que o bloqueio decorreu de descumprimento dos termos de uso, tratando-se de exercício regular do direito potestativo contratual. Ademais, a mera alegação genérica de bloqueio automatizado, sem evidências concretas de que o reclamante tenha sido impedido de obter informações sobre os critérios da decisão ou tenha solicitado e lhe tenha sido negada a revisão da decisão, não configura violação à LGPD. Quanto aos supostos prejuízos psíquicos decorrentes da perda da fonte de renda, entendo que se trata de dissabor natural decorrente do fim de qualquer relação contratual. A dispensa imotivada de empregados é situação cotidiana nas relações laborais que, por si só, não configura dano moral indenizável, especialmente quando o empregador exerce regularmente seu direito potestativo e procede ao pagamento das verbas rescisórias legalmente previstas, como determinado nesta sentença. O dano moral pressupõe a existência de uma lesão anormal e desproporcional à esfera de direitos da personalidade do indivíduo, o que não se verificou no caso concreto. A perda do emprego, ainda que cause natural tristeza e preocupação financeira, não configura, isoladamente, situação excepcional apta a ensejar reparação por danos morais. Por fim, cabe ressaltar que o próprio ordenamento jurídico já prevê a compensação econômica para a ruptura contratual imotivada, através das verbas rescisórias correspondentes, não se justificando dupla reparação pelo mesmo fato. Diante do exposto, julgo improcedente o pedido de indenização por danos morais por dispensa arbitrária. **CAPÍTULO III - DANO MORAL PELA AUSÊNCIA DE COBERTURA PREVIDENCIÁRIA** O reclamante pleiteia indenização por danos morais em razão da ausência de cobertura previdenciária durante o período trabalhado, alegando que a reclamada deixou de efetuar os recolhimentos previdenciários obrigatórios, o que lhe teria causado prejuízos de ordem moral, situação agravada por uma eventual incapacidade laborativa temporária, sem a correspondente proteção social. **Analisa-se.** O pleito não comporta acolhimento. Com efeito, o dano moral, como construção jurídica consolidada na doutrina e jurisprudência pátrias, pressupõe a ofensa a direitos da personalidade, caracterizada por uma dor íntima, um sofrimento, um abalo psíquico que transcenda o mero aborrecimento cotidiano. Em outras palavras, para a configuração do dano moral é necessário que a conduta do ofensor provoque no ofendido uma lesão em sua esfera extrapatrimonial, afetando valores intrínsecos à sua pessoa, como a honra, a imagem, a autoestima, a dignidade, entre outros. No caso em tela, a ausência de recolhimentos previdenciários, embora configure ilícito de natureza trabalhista e previdenciária quando reconhecido o vínculo empregatício, por si só, não tem o condão de provocar o abalo moral alegado pelo reclamante, por algumas razões fundamentais. Primeiramente, trata-se de uma lesão de natureza eminentemente patrimonial, passível de reparação específica através da condenação da reclamada ao recolhimento das contribuições previdenciárias incidentes sobre as verbas reconhecidas em sentença, o que será determinado na fase de execução deste julgado, observadas as limitações de competência desta Especializada. Em segundo lugar, não restou demonstrado nos autos que o reclamante tenha efetivamente sofrido algum prejuízo concreto em decorrência da ausência de cobertura previdenciária durante o período laborado. Não há alegação ou prova de que tenha necessitado recorrer a algum benefício previdenciário e tenha sido obstado em razão da ausência de contribuições. Tampouco comprovou ter sofrido qualquer acidente de trabalho ou doença que reclamasse amparo securitário. A jurisprudência trabalhista é pacífica no sentido de que o dano moral não se presume pela mera ocorrência do ato ilícito (dano in re ipsa) quando se trata de ausência de recolhimentos previdenciários. É necessária a comprovação do efetivo prejuízo extrapatrimonial sofrido, o que não ocorreu na hipótese vertente. Vale ressaltar, ainda, que o próprio trabalhador poderia ter realizado contribuições previdenciárias na qualidade de contribuinte individual, conforme prevê a legislação, garantindo assim sua proteção previdenciária, o que mitiga a alegação de total desamparo. Ademais, a mera expectativa de potencial prejuízo futuro não configura dano moral atual e efetivo, requisito indispensável para o deferimento da indenização pleiteada. O dano hipotético ou eventual não enseja reparação civil, consoante entendimento doutrinário e jurisprudencial consolidado. Destaque-se, por fim, que eventuais prejuízos de ordem previdenciária poderão ser discutidos em sede própria, perante a Justiça Federal, competente para apreciar questões relativas a benefícios previdenciários, não cabendo a esta Especializada presumir danos que sequer foram adequadamente demonstrados. Por todo o exposto, não configurado o dano moral alegado, julgo improcedente o pedido de indenização por danos morais decorrentes da ausência de cobertura previdenciária. **CAPÍTULO IV - FORNECIMENTO DE INFORMAÇÕES COM BASE NA LGPD** O reclamante requer, com base no §1º do art. 20 da Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709/2018), que a reclamada forneça informações acerca dos critérios e dos procedimentos utilizados para a decisão automatizada de bloqueios/restrições/limitações de acesso ao aplicativo, sob pena de aplicação das cominações previstas no §2º do mesmo artigo. **Analisa-se.** O pleito não merece prosperar. A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) estabelece em seu artigo 20 que o titular dos dados tem direito a solicitar a revisão de decisões tomadas unicamente com base em tratamento automatizado de dados pessoais que afetem seus interesses, incluindo decisões destinadas a definir o seu perfil pessoal, profissional, de consumo e de crédito ou os aspectos de sua personalidade. O §1º do referido artigo determina que o controlador deverá fornecer, sempre que solicitadas, informações claras e adequadas a respeito dos critérios e dos procedimentos utilizados para a decisão automatizada, observados os segredos comercial e industrial. Entretanto, a mera previsão legal desse direito não autoriza, por si só, que tal solicitação seja processada e julgada na esfera trabalhista, especialmente quando desvinculada de uma pretensão principal de natureza trabalhista procedente. No caso em tela, embora tenha sido reconhecido o vínculo empregatício entre as partes, o pedido de fornecimento de informações com base na LGPD apresenta natureza jurídica distinta, inserindo-se no âmbito do direito civil, mais especificamente no contexto da proteção de dados pessoais. Com efeito, o artigo 22 da LGPD dispõe que "a defesa dos interesses e dos direitos dos titulares de dados poderá ser exercida em juízo, individual ou coletivamente, na forma do disposto na legislação pertinente [...]", sem especificar a competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar tais demandas. Ademais, não há na LGPD previsão expressa de competência material da Justiça do Trabalho para apreciar pedidos fundamentados exclusivamente em seus dispositivos, sendo certo que o artigo 114 da Constituição Federal delimita a competência desta Especializada às causas oriundas da relação de trabalho, o que não abrange, necessariamente, todas as relações jurídicas eventualmente estabelecidas entre empregado e empregador. Outrossim, a prova emprestada demonstra que a reclamada disponibiliza canais específicos para que os motoristas possam obter informações sobre as razões do bloqueio e, inclusive, solicitar revisão da decisão, não havendo nos autos evidência de que o reclamante tenha buscado tais canais antes de ajuizar a presente ação. Registre-se, ainda, que o pedido de fornecimento de informações com base na LGPD, tal como formulado, prescinde do reconhecimento do vínculo empregatício, uma vez que o direito previsto no artigo 20 da referida lei é assegurado a qualquer titular de dados pessoais, independentemente da natureza jurídica da relação mantida com o controlador dos dados. Por fim, ainda que se reconhecesse a competência desta Justiça Especializada para apreciar o pedido, o que se admite apenas para argumentar, verifica-se que o reclamante não demonstrou ter realizado qualquer solicitação prévia à reclamada para obtenção das informações desejadas, o que configura ausência de interesse processual, na modalidade necessidade, para o ajuizamento da presente ação quanto a este pedido específico. Ante o exposto, julgo improcedente o pedido de fornecimento de informações com base no §1º do art. 20 da LGPD. **HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS** Nos termos do art. 791-A da CLT, estipulam-se os honorários sucumbenciais, espécie do gênero despesa processual, no importe de 15% (quinze por cento), sobre o valor da condenação principal apurado em liquidação de sentença. Haja vista a patente sucumbência recíproca verificada na espécie, incide o disposto no art. 791-A, §3º, da CLT. Tratando a demanda de 4 (quatro) capítulos autônomos ("vínculo de emprego. relação mediante aplicativo", "dano moral por dispensa arbitrária", "dano moral pela ausência de cobertura previdenciária" e "fornecimento de informações com base na LGPD"), que representam os principais conflitos de teses de ordem meritória ocorridos nos autos, vê-se que a parte autora foi vencedora de 1 (um) capítulo ("vínculo de emprego. relação mediante aplicativo") e a reclamada foi vencedora em 3 (três) capítulos ("dano moral por dispensa arbitrária", "dano moral pela ausência de cobertura previdenciária" e "fornecimento de informações com base na LGPD"), chegando-se à proporcionalidade de êxito para cada litigante da ordem de 1/4 (um quarto) para a parte reclamante e 3/4 (três quartos) para a parte reclamada. Portanto, à luz do art. 86, §único, do CPC, aplicável ao Processo do Trabalho à míngua de norma específica a regular a sucumbência recíproca neste ramo processual (art. 769 consolidado), define-se que a parte reclamada pagará 1/4 (um quarto) do valor dos honorários de sucumbência à parte autora e essa pagará 3/4 (três quartos) do valor dos honorários à parte reclamada, observado o valor acima arbitrado, sendo vedada a compensação entre as rubricas, por força legal. Em se tratando de litigante albergado pela gratuidade judiciária, fica desde já conferida interpretação conforme ao disposto no art. 791-A, §4º, da CLT, para atribuir a tal dispositivo legal sistemática similar trazida ao legislador no bojo do art. 98, §3º, do CPC, aplicável ao Processo Civil. Leitura diversa conduziria a autêntico ferimento à Garantia de Acesso à Justiça (art. 5º, XXXV, da CF), atribuindo ônus financeiro àqueles que o próprio Estado reconhece como incapaz de arcar com as despesas do processo, a par de injustificável agravamento da posição jurídica do litigante perante a Justiça do Trabalho, em relação àqueles que acionam a Justiça Comum, ambas integrantes do Sistema Judiciário Não Penal, sem qualquer elemento sustentador de tal diferenciação, em franca mácula ao Princípio da Unidade do Ordenamento Jurídico e aos Princípios da Razoabilidade e Proporcionalidade, que incidem na interpretação sistêmica que se deve dar ao conjunto de normas em nosso país. Neste sentido foi o julgamento proferido pelo Col. STF na ADI 5.766/DF, quando se debruçou sobre o tema da sucumbência trazida pela Reforma Trabalhista em face do beneficiário da justiça gratuita: EMENTA : CONSTITUCIONAL. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 13.467/2017. REFORMA TRABALHISTA. REGRAS SOBRE GRATUIDADE DE JUSTIÇA. RESPONSABILIDADE PELO PAGAMENTO DE ÔNUS SUCUMBENCIAIS EM HIPÓTESES ESPECÍFICAS. ALEGAÇÕES DE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA ISONOMIA, INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO, ACESSO À JUSTIÇA, SOLIDARIEDADE SOCIAL E DIREITO SOCIAL À ASSISTÊNCIA JURÍDICA GRATUITA. MARGEM DE CONFORMAÇÃO DO LEGISLADOR. CRITÉRIOS DE RACIONALIZAÇÃO DA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AÇÃO DIRETA JULGADA PARCIALMENTE PROCEDENTE. 1. É inconstitucional a legislação que presume a perda da condição de hipossuficiência econômica para efeito de aplicação do benefício de gratuidade de justiça, apenas em razão da apuração de créditos em favor do trabalhador em outra relação processual, dispensado o empregador do ônus processual de comprovar eventual modificação na capacidade econômica do beneficiário. 2. A ausência injustificada à audiência de julgamento frustra o exercício da jurisdição e acarreta prejuízos materiais para o órgão judiciário e para a parte reclamada, o que não se coaduna com deveres mínimos de boa-fé, cooperação e lealdade processual, mostrando-se proporcional a restrição do benefício de gratuidade de justiça nessa hipótese. 3. Ação Direta julgada parcialmente procedente. Os termos da decisão em sede de controle concentrado de constitucionalidade podem ser melhor descortinados pelos termos do voto do E. Relator, Ministro Alexandre de Moraes: Em vista do exposto, CONHEÇO da Ação Direta e, no mérito, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido para declarar a inconstitucionalidade da expressão "ainda que beneficiária da justiça gratuita", constante do caput do art. 790-B; para declarar a inconstitucionalidade do § 4º do mesmo art. 790-B; declarar a inconstitucionalidade da expressão "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa", constante do § 4º do art. 791-A; para declarar constitucional o art. 844, § 2º, todos da CLT, com a redação dada pela Lei 13.467/2017. Neste sentido, não afastou o Pretório Excelso a possibilidade de condenação do beneficiário da gratuidade judiciária no pagamento de honorários sucumbenciais, mas sim declarou a inconstitucionalidade da expressão "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa", constante do §4º do art. 791-A da CLT, que permitiria a utilização de créditos trabalhistas reconhecidos no mesmo ou em outro processo para quitação da sucumbência. Portanto, face à interpretação conforme à Constituição Federal, que se impõe no caso em apreço, e nos termos da decisão em sede da ADI 5.766/DF pelo STF, afasta-se a possibilidade de utilização dos créditos alimentares aqui reconhecidos, ou em outro processo, em favor da parte autora para o pagamento dos honorários sucumbenciais recíprocos ora objeto de condenação. Isso posto, decide a 3ª Vara do Trabalho de Fortaleza – CE o seguinte: - **deferir** à parte reclamante o requesto de gratuidade judiciária, nos termos do art. 790, §3º, da CLT; - **rejeitar** as preliminares ventiladas em defesa; - **pronunciar** a prescrição parcial, na forma acima; - no mérito, **julgar parcialmente procedentes** os pedidos da presente reclamação para: a) **reconhecer a relação de emprego intermitente** entre as partes no período de 21/11/2021 a 01/11/2023; b) **condenar UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA, em favor de DAVID SOUSA ALBUQUERQUE FREIRE**, na obrigação de proceder ao registro da relação de emprego, bem como no pagamento de aviso prévio indenizado (33 dias); férias em dobro de 2021/2022 e 2022/2023, acrescidas de um terço; trezeno de 2021, 2022 e 2023 (proporcional); integralização dos depósitos fundiários de todo o pacto imprescrito, acrescidos da respectiva indenização de 40%; multa do art. 477, § 8º, da CLT; além de honorários advocatícios proporcionais; c) **condenar DAVID SOUSA ALBUQUERQUE FREIRE, em favor de UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA**, no pagamento de honorários advocatícios proporcionais, tudo na forma da fundamentação supra, que ora integra este decisum; - **improcedentes** os pedidos de danos morais por dispensa arbitrária, danos morais por ausência de cobertura previdenciária e fornecimento de informações com base na LGPD. Custas pela reclamada, no valor de R$300,00, sobre o valor da condenação ora arbitrada em R$15.000,00. Contribuições previdenciárias na forma da Súmula 368 do C. TST e contribuições fiscais na forma da Instrução normativa 1.127, de 7.2.2011, da Receita Federal do Brasil, com base no art. 12-A da Lei 7.713/88, considerando-se a natureza indenizatória das seguintes parcelas ora deferidas, na forma do art. 28, §9º, da Lei 8212/91: reflexos em aviso prévio, férias mais um terço, depósitos do FGTS acrescido de 40%, bem como os juros de mora incidentes sobre a presente condenação. A apuração da contribuição previdenciária patronal pelo regime especial previsto no art. 7º da Lei 12.546/2011 (com alterações promovidas pela Lei 12.715/12), que instituiu a desoneração da folha de pagamento, pela qual o cálculo do tributo tem por base a receita bruta da empresa, em substituição ao regramento legal instituído pelo art. 22, I, da Lei 8.212/1991, que estipula a apuração do valor segundo a folha de pagamentos dos empregados, deverá ser objeto de comprovação pela empresa, quanto à sua inclusão em dito regime especial, à luz da documentação dos autos, autorizada a comprovação até o momento da liquidação. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA: Aplica-se a atualização monetária e juros nos termos definidos pelo Col. TST no julgamento do E-ED-RR-20407-32.2015.5.04.0271 (Rel. Min. Alexandre Luiz Ramos, SDI-1, j. 24/10/2024, DEJT 08/11/2024), que, em observância à decisão vinculante do STF na ADC 58, estabeleceu os seguintes critérios: a) na fase pré-judicial: IPCA-E acrescido dos juros de mora (art. 39, caput, da Lei 8.177/1991); b) do ajuizamento da ação até 29/08/2024: taxa SELIC (englobando correção monetária e juros); c) a partir de 30/08/2024: IPCA para atualização monetária (art. 389, parágrafo único, do CC) e juros de mora correspondentes ao resultado da subtração SELIC - IPCA (art. 406, parágrafo único, do CC), observada a possibilidade de não incidência nos termos do § 3º do art. 406 do CC, conforme alterações da Lei 14.905/2024. Esclarece-se que não se pode confundir provimento "ultra petita", que representa a procedência de pretensões além daquelas pleiteadas na petição inicial, com a liquidação do objeto da condenação, visto que, como emerge do art 840, parágrafo 1º, da CLT, a inicial deverá tão somente realizar a indicação do valor de cada pedido, e não sua efetiva liquidação. Portanto, a liquidação do presente julgado não estará adstrita aos valores indicados para cada pedido pela peça exordial, o que será objeto de apuração no momento processual oportuno. Intimem-se as partes. ANDRE BRAGA BARRETO Juiz do Trabalho Substituto
Intimado(s) / Citado(s)
- DAVID SOUSA ALBUQUERQUE FREIRE
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