Hermanos Barbearia Ltda x Lucas Santos Cafe
ID: 333867315
Tribunal: TRT2
Órgão: 10ª Turma
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 1001527-92.2024.5.02.0051
Data de Disponibilização:
24/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GUSTAVO DE JESUS OLIVEIRA
OAB/SP XXXXXX
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LUAN VIEIRA BARRETO
OAB/SP XXXXXX
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EDUARDO ALCÂNTARA LOPES
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO 10ª TURMA Relatora: REGINA CELI VIEIRA FERRO ROT 1001527-92.2024.5.02.0051 RECORRENTE: HERMANOS BARBEARIA LTDA R…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO 10ª TURMA Relatora: REGINA CELI VIEIRA FERRO ROT 1001527-92.2024.5.02.0051 RECORRENTE: HERMANOS BARBEARIA LTDA RECORRIDO: LUCAS SANTOS CAFE Ficam as partes INTIMADAS quanto aos termos do v. Acórdão proferido nos presentes autos (#id:4bf04d6): PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO PROCESSO TRT/SP No. 1001527-92.2024.5.02.0051 - 10ª TURMA RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA 51ª VARA DO TRABALHO DE SÃO PAULO MAGISTRADA: RHIANE ZEFERINO GOULART RECORRENTE: HERMANOS BARBEARIA LTDA RECORRIDO: LUCAS SANTOS CAFÉ Ementa: DIREITO DO TRABALHO. RECONHECIMENTO DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO. CONTRATO DE PARCERIA ENTRE BARBEIRO E SALÃO DE BELEZA. INOBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DA REALIDADE. RECURSO NÃO PROVIDO. I. CASO EM EXAME Recurso ordinário interposto pela reclamada contra decisão que reconheceu o vínculo empregatício entre as partes. Alega a recorrente que a relação jurídica mantida com o reclamante se deu por meio de contrato de parceria, nos termos da Lei nº 13.352/2016 e que não estavam presentes os requisitos da relação de emprego. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) verificar se o contrato de parceria firmado entre as partes atende aos requisitos legais previstos na Lei nº 12.592/2012, com as alterações da Lei nº 13.352/2016; e (ii) determinar se estão presentes os elementos fático-jurídicos caracterizadores da relação de emprego, nos termos dos artigos 2º e 3º da CLT. III. RAZÕES DE DECIDIR A validade do contrato de parceria entre barbeiros e salões de beleza depende do cumprimento dos requisitos legais previstos na Lei nº 12.592/2012, notadamente a autonomia do profissional, a remuneração proporcional aos serviços prestados e a ausência de subordinação. O contrato firmado entre as partes apresenta irregularidades substanciais, como a ausência de cláusulas obrigatórias exigidas pelo §10 do artigo 1º-A da Lei nº 12.592/2012, incluindo a previsão de percentual sobre os serviços prestados, o recolhimento de tributos pelo salão e a homologação sindical. O conjunto probatório demonstra que o reclamante prestava serviços de forma pessoal e contínua, sem possibilidade de se fazer substituir, cumprindo jornada fixa de segunda a sábado, com pagamento de diária fixa, o que evidencia a habitualidade e a pessoalidade na prestação dos serviços. A existência de subordinação jurídica resta caracterizada pela obrigatoriedade de comparecimento ao salão, pela fiscalização da jornada e pela ausência de autonomia na organização dos atendimentos, além da exigência de cumprimento de regras estabelecidas pelo empregador. A onerosidade se verifica no pagamento de diárias fixas, independentemente do número de atendimentos realizados, afastando o modelo de remuneração por percentual sobre os serviços efetivamente prestados, próprio do contrato de parceria. A realidade fática demonstrada nos autos revela uma típica relação de emprego mascarada sob a forma de contrato de parceria, configurando fraude à legislação trabalhista e atraindo a incidência do artigo 9º da CLT. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: A configuração do contrato de parceria entre barbeiros e salões de beleza exige o cumprimento dos requisitos previstos na Lei nº 12.592/2012, sendo inválido se houver subordinação, pessoalidade, habitualidade e pagamento fixo sem correspondência com os serviços prestados.O pagamento de diária fixa, a imposição de jornada e a obrigatoriedade de comparecimento caracterizam vínculo empregatício nos termos dos artigos 2º e 3º da CLT. Na existência de conflito entre o contrato formal e a realidade dos fatos, prevalece esta última, em observância ao princípio da primazia da realidade. Dispositivos relevantes citados: CLT, arts. 2º, 3º e 9º; Lei nº 12.592/2012, art. 1º-A, §10; Lei nº 13.352/2016. Jurisprudência relevante citada: Não consta. Inconformada com a r. sentença de Id b2eefea e seus embargos de declaração (Id a0fe023), cujo relatório adoto, que julgou PROCEDENTES EM PARTE os pedidos da presente reclamação trabalhista, recorre, ordinariamente, a reclamada, com as razões de Id 748c180, arguindo preliminar de nulidade por negativa de prestação jurisdicional e, no mérito, requerendo a reforma do julgado quanto ao reconhecimento de vínculo empregatício, multa do artigo 477 da CLT, horas extras e reflexos, vale-transporte, auxílio-alimentação, honorários sucumbenciais e justiça gratuita concedida ao reclamante. A r. sentença reconheceu o vínculo de emprego entre as partes no período de 21.12.2023 a 29.7.2024, na função de barbeiro, considerando a dispensa sem justa causa, e condenou a reclamada ao pagamento de aviso prévio indenizado, férias proporcionais com o terço, décimo terceiro salário proporcional, horas extras excedentes da 8ª diária e da 44ª semanal, labor em feriados, auxílio-alimentação, vale-transporte, além da multa do art. 477, §8º, da CLT. Determinou, também, a anotação da CTPS e o recolhimento dos depósitos de FGTS, com a multa de 40%, fixando a remuneração mensal do reclamante em R$ 2.951,20. Tempestividade do apelo. Preparo recursal comprovado. Regular a representação processual. Contrarrazões apresentadas pelo reclamante (Id 5e0fa4a). Desnecessário o parecer do D. Procurador Regional do Trabalho, conforme Portaria PRT-02 nº 03, de 27 de janeiro de 2005. É o relatório. V O T O Análise da Petição de id 77ea39d. Afasto o requerido pela reclamada, por entender que a matéria ventilada nestes autos não se trata daquela prevista no Tema 1389 do C.STF, na medida em que a questão em discussão refere-se a contrato de parceria, prevista em lei (13.352/2016), e desta forma foi analisada, nos termos que seguem, observados os requisitos legais. Pressupostos de admissibilidade Conheço do recurso interposto, eis que presentes os pressupostos de admissibilidade recursal. PRELIMINAR 1. NULIDADE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL Alega a recorrente negativa de prestação jurisdicional, apontando que, embora tenha oposto embargos de declaração, o Juízo de origem não sanou omissão referente à apreciação da prova documental relativa à imprestabilidade do depoimento da testemunha do autor e a necessidade de aplicação de multa por litigância de má-fé, limitando-se a aplicar multa por embargos protelatórios. Argumenta que o depoimento da testemunha Sr. Erick contém contradições entre as informações prestadas no presente feito e as declaradas no processo por ele movido contra a mesma reclamada, Processo nº 1000785-13.2024.5.02.0069, sendo imprescindível a apreciação dessas contradições para o deslinde do feito. Sem razão. O art. 93, IX, da Constituição Federal, estabelece a necessidade de fundamentação de todas as decisões judiciais, sob pena de nulidade. Esse mandamento, todavia, não obriga o julgador a enfrentar todos os argumentos suscitados pelas partes, mas exige que exponha as razões de seu convencimento de forma clara e suficiente. No caso em exame, verifica-se que o Juízo de origem, ao julgar os embargos de declaração, entendeu inexistir omissão a ser sanada, considerando tratar-se de mero inconformismo com o julgado. Fundamentou expressamente que "não houve erro material, obscuridade, contradição, nem omissão no julgado, mas, sim, mero inconformismo pessoal da ré com o resultado do julgamento". Além disso, na sentença principal, houve análise específica sobre a questão da imprestabilidade do depoimento da testemunha do autor, tendo o magistrado concluído pela inexistência de elementos que justificassem a desconsideração dos depoimentos. O tema suscitado pela recorrente, relativo à suposta contradição entre o depoimento prestado pela testemunha nestes autos e as alegações feitas em processo próprio, foi implicitamente rejeitado pelo Juízo a quo, que conferiu validade aos depoimentos colhidos, atribuindo-lhes a credibilidade que entendeu pertinente dentro do seu livre convencimento motivado. Nesse cenário, não se vislumbra negativa de prestação jurisdicional, mas simples descontentamento com a avaliação probatória realizada, matéria que se confunde com o mérito e nessa sede será apreciada. Quanto à multa aplicada por embargos protelatórios, sua análise também será realizada no mérito. Por fim, conforme inteligência do artigo 1.013, §3º, do CPC/2015 e da Súmula nº 393, II, do C. TST, o efeito devolutivo em profundidade do recurso ordinário autoriza o conhecimento pela instância revisora de toda a matéria, com os fundamentos trazidos na petição inicial e na defesa, ainda que não examinados em sentença ou na decisão declaratória. Eis o teor do mencionado dispositivo de lei e do verbete sumular: Art. 1.013. A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada. § 3º Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando: III - constatar a omissão no exame de um dos pedidos, hipótese em que poderá julgá-lo; Súmula 393, II, do C. TST: II - Se o processo estiver em condições, o tribunal, ao julgar o recurso ordinário, deverá decidir desde logo o mérito da causa, nos termos do § 3º do art. 1.013 do CPC de 2015, inclusive quando constatar a omissão da sentença no exame de um dos pedidos. Rejeito. MÉRITO 2. TESTEMUNHA. DEPOIMENTO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ Questiona a reclamada a credibilidade do depoimento prestado pela testemunha do reclamante, Sr. Erick de Jesus dos Santos, ouvida a rogo do autor, alegando que ele teria faltado com a verdade ao contradizer informações prestadas em ação própria, movida contra a mesma reclamada (Processo nº 1000785-13.2024.5.02.0069). Afirma que a testemunha declarou, nestes autos, jornada até às 21h30 no mês de dezembro e labor aos domingos, informações que não constam de sua própria reclamação trabalhista. Pugna pela desconsideração integral do depoimento do Sr. Erick e pela aplicação de multa por litigância de má-fé. Analiso. Em princípio, cabe ressaltar que a análise e valoração das provas constituem prerrogativa do magistrado, conforme o princípio do livre convencimento motivado, insculpido no art. 371 do CPC, e no caso das provas testemunhais, em virtude do contato direto e imediato com as testemunhas, dispõe de melhor possibilidade para avaliar a lisura e segurança dos depoimentos. No caso em análise, o Juízo de origem considerou que não havia contradições substanciais que comprometessem a validade dos depoimentos prestados, entendimento do qual comungo. Destacou que, apesar de a testemunha do autor ter informado inicialmente jornada até as 21h30, posteriormente esclareceu que esse horário ocorria apenas no mês de dezembro e que, nos demais meses, o término do expediente era por volta das 20h30. De igual modo, quanto ao labor aos domingos, a testemunha posteriormente ajustou sua informação. O fato de a testemunha ter esclarecido pontos de seu depoimento não configura, por si só, contradição capaz de invalidar todo o seu testemunho. Ademais, eventuais divergências entre o depoimento prestado pela testemunha nestes autos e as alegações feitas em processo próprio não constituem, necessariamente, prova de falsidade, podendo decorrer de percepções distintas ou mesmo de circunstâncias diferentes vivenciadas pelas partes. Quanto à alegação de que a testemunha prestou informações falsas, não há nos autos prova cabal nesse sentido, tratando-se de mera presunção da recorrente. Para a caracterização da litigância de má-fé, prevista no art. 793-B da CLT, exige-se prova inequívoca da intenção deliberada de prejudicar a parte contrária ou obter vantagem indevida. Por fim, ressalto que o juízo de origem, ao fixar a jornada de trabalho do reclamante, não se baseou exclusivamente no depoimento da testemunha do autor, mas considerou todo o conjunto probatório, inclusive o depoimento da testemunha da reclamada, razão pela qual não fixou jornada até as 21h30 ou labor aos domingos. Mantenho, portanto, a credibilidade conferida pelo Juízo de origem aos depoimentos colhidos e indefiro o pedido de aplicação de multa por litigância de má-fé à testemunha, por ausência de previsão legal e de elementos que caracterizem tal conduta. Nego provimento. 3. MULTA POR EMBARGOS PROTELATÓRIOS A recorrente também se insurge contra a aplicação da multa por embargos protelatórios, no importe de 1% sobre o valor atualizado da causa, argumentando que os embargos opostos tinham pertinência e não possuíam intuito protelatório. Com razão. A recorrente somente exerceu o direito de utilização de uma medida processual prevista em lei. Vale consignar que o fato de suas intenções, nos embargos declaratórios, eventualmente terem sido rejeitadas nos termos em que foram propostas não é fator apto a caracterizar o intuito protelatório, previsto no artigo 1.026, § 2º, do CPC. Assim, reformo a r. decisão de origem para excluir a multa de 1% sobre o valor da causa. Dou provimento. 4. VÍNCULO DE EMPREGO. CONTRATO DE PARCERIA Insurge-se a reclamada contra o reconhecimento do vínculo empregatício, alegando que a relação mantida com o reclamante era de prestação de serviços autônomos, na forma de contrato de parceria, conforme prevê a Lei nº 13.352/2016. Sustenta que o contrato firmado entre as partes atendia aos requisitos legais, que o recorrido tinha autonomia na prestação dos serviços, liberdade de horário e podia se fazer substituir por outro profissional. O conjunto probatório dos autos, contudo, não ampara a tese defensiva. Em conformidade com os artigos 2º e 3º da CLT, a configuração da genuína relação empregatícia demanda o preenchimento concomitante dos seguintes requisitos fático-jurídicos: subordinação jurídica (quanto ao modo da prestação dos serviços), não-eventualidade (repetição regular e previsível da prestação no tempo, em especial nos fins normais do empreendimento), pessoalidade (caráter insubstituível do trabalhador perante o tomador) e onerosidade (mediante contraprestação remuneratória). Decorre do princípio protetor que rege o Direito do Trabalho a presunção de que a prestação de serviços prolongada no tempo consubstancia-se em uma relação de emprego. No caso em análise, o Juízo de origem reconheceu a existência de vínculo empregatício com base nos seguintes fundamentos: "(...) As provas produzidas nos autos evidenciaram que o autor cumpria jornada de trabalho, de segunda a sábado, mediante pagamento de diárias, conforme, inclusive, constou do citado contrato de prestação de serviços. Ademais, inexistem evidências nos autos de que o autor tinha liberdade para fazer a sua agenda de atendimentos, tanto que recebia por diária. Ficou consignado, ainda, no contrato firmado entre as partes, que, além da diária, o autor também faria jus a comissões pela venda de plano de barbearia, de serviços extras e de produtos. Todavia, como os serviços de corte de cabelo e barba - que eram os mais realizados - integravam o plano de barbearia, não havia pagamento de percentual para cada um desses serviços realizados, uma vez que somente os serviços alheios ao corte de barba e cabelo, como depilação de sobrancelha, é que eram remunerados adicionalmente. Nesse sentido, a testemunha do autor, Erick, pontuou que: [...] os pagamentos eram feitos por quinzena, R$ 1.449,00, sendo R$ 110,00 por dia, via transferência; [...] não recebia outro pagamento além da diária; tinha comissão sobre venda de produtos, mas raramente vendia alguma coisa; quando vendia, recebia essa comissão, 40% sobre o produto, como pomada, esfoliante, gel, essas coisas; se fizesse algum procedimento, depilação de sobrancelha, recebia valor sobre ele também; [...]. A testemunha da ré, Kawan, de igual modo, esclareceu que: [...] na época, recebia R$ 115,00 por dia trabalhado, que era pago de forma quinzenal; [...] havia comissões de venda de assinaturas de 50%, de venda de serviços de 50% e de venda de produtos de 40%; [...]. Logo, não foi observado, no caso, o requisito estabelecido no art. 1º-A, § 10, I, da Lei n. 12.592/2012 para a validade do alegado contrato de parceria firmado entre o profissional de barbearia e o salão. Ademais, embora a testemunha da ré, Kawan, tenha relatado que [...] se não pudesse ir, poderia indicar parceiro para substituí-lo; [...], não soube indicar uma situação em que isso tenha ocorrido. Por fim, como visto, o autor cumpria jornada de trabalho e não tinha liberdade para fazer a sua agenda, de modo que não há falar em ausência de subordinação, no caso, em razão da ausência de fiscalização quanto aos cortes realizados, uma vez que eram efetuados de acordo com o pedido do cliente e conforme os conhecimentos técnicos do profissional. Ainda, a testemunha da ré, Kawan, afirmou que somente poderiam ir embora mais cedo se conseguissem antecipar todos os clientes agendados, enquanto a testemunha do autor, Erick, relatou que: [...] se não tivesse horário agendado, mesmo assim tinha que estar na barbearia; [...]. Em razão, então, da realidade fática vivenciada pelo autor, ficou demonstrada a presença dos requisitos da pessoalidade e da não eventualidade na prestação dos serviços. Havia, também, subordinação na prestação de serviços, pois, como visto, o autor possuía horário de trabalho a cumprir e não tinha liberdade para alterar os seus horários de atendimento e/ou deixar o estabelecimento na ausência de cliente. Por fim, é fato admitido no processo como incontroverso que o autor recebia contraprestação pelos serviços prestados, caracterizando, assim, o requisito da onerosidade. Desse modo, presentes os elementos fático-jurídicos da relação empregatícia e não cumpridos todos os requisitos legais para a validade do contrato de parceria entre o profissional e o salão, ficam afastadas as alegações da ré de ausência de vínculo de emprego, em razão do contrato de prestação de serviços firmado entre as partes." Pois bem. A Lei nº 13.352/2016, que alterou a Lei nº 12.592/2012, regulamentou a possibilidade de celebração de contratos de parceria entre profissionais de beleza, incluindo barbeiros e salões de beleza, estabelecendo, no § 1º do art. 1º-A, que não haverá relação de emprego ou sociedade quando observados os requisitos legais. Contudo, para que se reconheça a validade dessa relação de parceria, é necessário que, na prática, sejam observados os requisitos legais, em especial a autonomia do profissional-parceiro, a forma de remuneração por percentuais sobre os serviços prestados e a ausência dos elementos caracterizadores da relação de emprego. A prestação dos serviços do reclamante à demandada é incontroversa, de modo que a conclusão mais natural a que se chega é de existência de vínculo empregatício. Sendo assim, nos termos dos artigos 818 da CLT e 333 do CPC, por ter alegado fato impeditivo do direito do autor, cabia à recorrente o ônus de provar, nos termos da defesa, a validade do contrato de parceria firmado entre eles, ônus do qual não se desvencilhou no decurso da instrução processual. Primeiramente, analiso o contrato de parceria firmado entre as partes (Id 93f20f6) à luz do que dispõe a Lei 12.592/2012, que regulamente o contrato de parceria entre os profissionais que exercem as atividades de Cabeleireiro, Barbeiro, Esteticista, Manicure, Pedicure, Depilador e Maquiador e pessoas jurídicas registradas como salão de beleza. Neste passo, identificam-se inconformidades no referido contrato como a ausência de cláusulas obrigatórias, conforme dispõe §10 do Art. 1º-A da aludida Lei: 10. São cláusulas obrigatórias do contrato de parceria, de que trata esta Lei, as que estabeleçam: I - percentual das retenções pelo salão-parceiro dos valores recebidos por cada serviço prestado pelo profissional-parceiro; II - obrigação, por parte do salão-parceiro, de retenção e de recolhimento dos tributos e contribuições sociais e previdenciárias devidos pelo profissional-parceiro em decorrência da atividade deste na parceria; III - condições e periodicidade do pagamento do profissional-parceiro, por tipo de serviço oferecido; IV - direitos do profissional-parceiro quanto ao uso de bens materiais necessários ao desempenho das atividades profissionais, bem como sobre o acesso e circulação nas dependências do estabelecimento; V - possibilidade de rescisão unilateral do contrato, no caso de não subsistir interesse na sua continuidade, mediante aviso prévio de, no mínimo, trinta dias; VI - responsabilidades de ambas as partes com a manutenção e higiene de materiais e equipamentos, das condições de funcionamento do negócio e do bom atendimento dos clientes; VII - obrigação, por parte do profissional-parceiro, de manutenção da regularidade de sua inscrição perante as autoridades fazendárias. Há inconformidades relevantes no contrato quanto aos requisitos da Lei nº 12.592/2012 (alterada pela Lei nº 13.352/2016): 1. Percentual de retenção sobre os serviços de barbearia: O contrato prevê pagamento de diária fixa (R$115,00) em vez de percentual sobre o valor dos serviços principais de barbearia (corte de cabelo e barba). Isto contraria o inciso I do §10 do Art. 1º-A, que exige "percentual das retenções pelo salão-parceiro dos valores recebidos por cada serviço prestado pelo profissional-parceiro", e descaracteriza a natureza de parceria, que pressupõe remuneração proporcional aos serviços efetivamente realizados. 2. Retenção e recolhimento de tributos: A cláusula 5.1 transfere integralmente a responsabilidade tributária para o profissional, quando o inciso II do §10 do Art. 1º-A exige que o contrato estabeleça a "obrigação, por parte do salão-parceiro, de retenção e de recolhimento dos tributos e contribuições sociais e previdenciárias devidos pelo profissional-parceiro". 3. Responsabilidades compartilhadas: Não há disposição clara sobre responsabilidades compartilhadas quanto à manutenção e higiene de materiais e equipamentos, conforme exigido pelo inciso VI do §10 do artigo 1º-A da Lei 12.592/2012. 4. Homologação pelo sindicato da categoria profissional: Não consta nos autos homologação do contrato pelo sindicato profissional da categoria profissional e laboral ou pelo órgão local competente do Ministério do Trabalho e Emprego, perante duas testemunhas, nos moldes do §8º, do artigo 1º-A da Lei 12.592/2012. Estas inconformidades são substanciais e comprometem a validade do contrato como legítima parceria nos termos da lei, reforçando o entendimento de que a relação se configurou como vínculo empregatício na prática. Mas não é só. Em audiência, foram colhidos os depoimentos do autor e de duas testemunhas: DEPOIMENTO DO AUTOR: entrou no final do ano passado, dezembro, próximo do Natal, não lembra o dia específico, mas trabalhou Natal e Ano Novo; no final do ano, estava recebendo um pouco a mais, não lembra exatamente; o valor mesmo era R$ 100,00; o valor era pago por quinzena; saiu, se não se engana, 1 mês antes de agosto ou "quase beirando agosto", não lembra muito bem; quando entrou, não tinham falado da opção de MEI, mas no final falaram que teria que abrir, se não, seria dispensado; no último mês, abriu MEI, mas, depois de uma semana, foi dispensado; às vezes, recebia comissões sobre vendas de produtos, como pomada, óleo; ia de segunda a sábado e folgava aos domingos; no último mês, aconteceram imprevistos, problemas de família e saúde e chegou a faltar 1 ou 2 vezes; se não fosse trabalhar, não recebia o dia; não poderia indicar alguém para trabalhar no seu lugar; quando faltava, não havia outras pessoas para "segurar" os clientes porque os demais barbeiros já estavam ocupados e tinham que dispensar os clientes; tinha que estar lá às 10h, mas chegava umas 9h30 para trocar a roupa, tomar café e iniciar os atendimentos; às vezes, por demora de clientes, passava das 20h, que era o seu horário de saída, e saía às 20h30, 20h40; tinha 1h de almoço e almoçava lá mesmo, levava marmita; quando entrou, havia 4 barbeiros; quando saiu, havia 8 barbeiros; atualmente, havia 9 ou 10, mas ao todo são 14 barbeiros. DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA DO AUTOR, ERICK DE JESUS DOS SANTOS: trabalhou com o autor, de dezembro de 2023 até julho de 2024; o autor era barbeiro e o depoente também; de segunda a sexta, o horário era das 10h às 21h30; aos sábados, era das 9h às 19h30; tinham o gerente Michael como superior hierárquico; os pagamentos eram feitos por quinzena, R$ 1.449,00, sendo R$ 110,00 por dia, via transferência; se faltasse, tomaria "gancho"; não recebia vale-refeição, nem vale-transporte; se a jornada caísse em dia de feriado, haveria expediente normal até às 16h; conhece a Rose, que trabalha no RH e faz o fechamento do pagamento; ela cobrou dos funcionários para que todos abrissem MEI; inquirido sobre se havia diferença entre os que tinham MEI e os que não tinham, respondeu que os que tinham MEI recebiam o pagamento certinho; em dezembro, trabalhavam de domingo a domingo, sendo até às 16h nesses dias; de segunda a sexta, era das 10h às 21h e, aos sábados, das 9h às 20h; quando entrou, não assinou contrato; o depoente não chegou a abrir MEI; não recebia outro pagamento além da diária; tinha comissão sobre venda de produtos, mas raramente vendia alguma coisa; quando vendia, recebia essa comissão, 40% sobre o produto, como pomada, esfoliante, gel, essas coisas; se fizesse algum procedimento, depilação de sobrancelha, recebia valor sobre ele também; se não pudesse ir, não poderia indicar ninguém para ir no seu lugar; era obrigado a ir, mesmo se não pudesse; os atestados também eram descontados; tinha hora de almoço, 1h; geralmente fazia menos porque o cliente chegava atrasado, mas tinha que atender mesmo assim; na época em que trabalhava, havia 5 barbeiros, sendo 6 com o gerente Michael, mas ele não cortava cabelo; os equipamentos eram todos do próprio barbeiro, sendo somente os produtos da barbearia; não anotavam cartão de ponto, mas havia horário nas agendas, o aplicativo mostrava; se não tivesse horário agendado, mesmo assim tinha que estar na barbearia; o autor fazia o mesmo horário do depoente, das 10h às 21h30, assim como todos os demais, em dezembro; normalmente, fora de dezembro, o horário era das 10h às 20h30. DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA DA RÉ, KAWAN DE OLIVEIRA LOPES: trabalhou com o autor, mas não se recorda da época, nem aproximadamente; o depoente trabalhou na barbearia do Tatuapé de 7 a 8 meses, se não se engana, nesse ano ainda; encontrou o autor nesse período; trabalhou como barbeiro; se tiver acabado de entrar, não necessariamente o barbeiro precisa ter MEI; o depoente tem contrato com a empresa de prestação de serviços, com CNPJ; na época, recebia R$ 115,00 por dia trabalhado, que era pago de forma quinzenal; não tinha diferença de pagamento para quem tinha MEI, ou não; os equipamentos são fornecidos pelos barbeiros, enquanto os materiais são fornecidos pela barbearia; se não pudesse ir, poderia indicar parceiro para substituí-lo; isso não aconteceu com o depoente, mas, com outros barbeiros, sim, inclusive da época do autor; o depoente ia todos os dias na barbearia, mas o autor não; numa semana, ela ia em torno de 6 dias; acontecia de ser menos do que isso também; se ele não fosse, não sofreria punição, só não receberia a diária; o gerente não dava "gancho" para os barbeiros que não fossem, nunca presenciou nada nesse sentido; o depoente costumava chegar geralmente meia hora antes de abrir, às 9h30, enquanto a barbearia abria às 10h; o autor costumava chegar com 5 a 10 minutos de atraso ou até mais; o autor recebia a diária mesmo assim; iam embora da barbearia às 20h; se ele conseguisse adiantar os clientes dele, o autor poderia sair mais cedo, o que o depoente já presenciou; não se recorda da frequência com que isso ocorria numa semana; tinham 1h de almoço; a empresa não tinha controle de jornada; contando com o depoente e o gerente, eram 6 barbeiros; tinham que entregar o que o cliente pedia quanto a corte; o gerente e a empresa não cobravam nesse sentido; ninguém fiscalizava o corte; havia liberdade de uso dos produtos da empresa; havia comissões de venda de assinaturas de 50%, de venda de serviços de 50% e de venda de produtos de 40%; recebiam no fechamento da quinzena; o depoente recebia corretamente pelos serviços feitos; se estivesse atendendo, não conseguiria ver a chegada com atraso do autor; se a sua agenda atrasasse e o cliente chegasse às 20h, o depoente poderia ir embora sem atender o cliente; não pode informar nome de barbeiro que tenha indicado outro para trabalhar no seu lugar se não pudesse ir; a programação da agenda semanal sai antes; o depoente abriu MEI antes de entrar na empresa; o Michael era o gerente; se o barbeiro tivesse algum problema, poderia falar com o Michael para resolver; a Rose é uma funcionária da empresa; aos sábados, o funcionamento era das 9h às 19h; em época de final de ano, dezembro, a barbearia funciona nos mesmos dias, normalmente; a barbearia não funciona aos domingos. A prova oral produzida, por sua vez, confirmou que o recorrido recebia um valor fixo por dia trabalhado (diária), independentemente da quantidade de serviços prestados. A testemunha do autor, Erick, declarou que "os pagamentos eram feitos por quinzena, R$ 1.449,00, sendo R$ 110,00 por dia, via transferência" e que "não recebia outro pagamento além da diária", indicando apenas comissões eventuais sobre venda de produtos ou serviços extras, como depilação de sobrancelha. Embora a testemunha da reclamada, Kawan, tenha afirmado que os barbeiros podiam indicar substitutos, não soube informar nenhum caso concreto em que isso tivesse ocorrido, e admitiu que o reclamante recebia diária mesmo quando chegava atrasado, o que evidencia pagamento fixo, característico de relação de emprego. Quanto ao argumento da recorrente de que o contrato previa percentuais sobre vendas e serviços, tal previsão não se mostrou suficiente para descaracterizar a relação empregatícia, uma vez que, na prática, a remuneração principal era feita por diárias, e as comissões constituíam apenas complemento eventual, conforme restou demonstrado pela prova oral. Ademais, o recebimento por diária, por si só, não caracteriza autonomia, especialmente quando há obrigatoriedade de comparecimento e permanência no estabelecimento em horários predeterminados, como ficou evidenciado no caso em análise. A autonomia, elemento essencial para caracterização do trabalho não-empregado, pressupõe liberdade na organização do próprio trabalho, possibilidade de recusa de serviços e ausência de fiscalização e controle pela empresa contratante, o que não restou demonstrado nos autos. Em suma, restaram preenchidos os requisitos do vínculo empregatício. A pessoalidade restou evidenciada pela impossibilidade de se fazer substituir por outro profissional na prestação dos serviços, e o pagamento por diária pressupõe a presença pessoal do reclamante. A habitualidade da prestação laboral é incontroversa, tendo o reclamante trabalhado de forma contínua no período de dezembro/2023 a julho/2024, com jornada regular de segunda a sábado. A subordinação jurídica manifestou-se de forma robusta através da permanência obrigatória no estabelecimento mesmo sem clientes agendados (testemunha do autor); impossibilidade de recusar atendimentos ou alterar sua agenda livremente; ausência de autonomia; e obrigação de comparecimento a treinamentos (cláusula 2.1.10 do contrato de prestação de serviços especializados em barbearia) Por fim, a onerosidade consistia no pagamento de diária fixa de R$115,00, independente da produtividade. Evidente, portanto, a incompatibilidade do contrato com os requisitos da Lei 12.592/2012, somada à presença dos elementos acima, configurando a relação de emprego nos termos dos artigos 2º e 3º da CLT. Como se vê, a tese defensiva de contrato de parceria não prospera diante do conjunto probatório. Embora exista formalmente um contrato de parceria, a realidade fática demonstra típica relação de emprego mascarada, em flagrante violação ao princípio da primazia da realidade. Nesse contexto, correta a sentença ao declarar a nulidade do contrato de parceria (artigo 9º da CLT) e reconhecer a relação de emprego, uma vez que, para além da forma contratual adotada, a realidade fática revelou a presença dos requisitos dos artigos 2º e 3º da CLT, atraindo a incidência do princípio da primazia da realidade. Mantenho, portanto, o reconhecimento do vínculo empregatício no período de 21.12.2023 a 29.7.2024, na função de barbeiro. Nego provimento. 5. VERBAS RESCISÓRIAS Pugna a reclamada, sucessivamente, pela reforma da sentença quanto à condenação em verbas rescisórias, alegando que, caso mantido o vínculo, deve-se reconhecer que houve pedido de demissão e não dispensa sem justa causa. Questiona, ainda, o deferimento de férias e aviso prévio, argumentando que o contrato não durou 12 meses. Examino. O Juízo de origem, com base no art. 375 do CPC e na Súmula nº 212 do TST, presumiu que a rescisão contratual decorreu de iniciativa do empregador, condenando a reclamada ao pagamento de aviso prévio, férias proporcionais com 1/3 e 13º salário proporcional. De fato, nos termos da Súmula nº 212 do C. TST, o ônus de comprovar o término da relação de emprego é do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado. Assim, incumbia à reclamada demonstrar que a rescisão ocorreu por iniciativa do empregado, ônus do qual não se desincumbiu, limitando-se a fazer alegações genéricas, sem apresentar prova de pedido de demissão ou abandono de emprego. Quanto às verbas rescisórias, o aviso prévio é direito assegurado ao empregado nas rescisões sem justa causa, mesmo antes de completado um ano de serviço, conforme artigo 487 da CLT e artigo 1º da Lei 12.506/2011. De igual modo, as férias proporcionais são devidas na rescisão do contrato de trabalho com menos de doze meses, por força do art. 147 da CLT, desde que a rescisão não tenha ocorrido por justa causa do empregado. Por fim, comungo do entendimento da Origem no sentido de que os "extratos bancários anexados aos autos, com a petição inicial, referente aos meses de junho e julho de 2024, demonstram que o autor, naquele período, recebeu o valor total de R$ 5.902,40 da ré, o que corresponde a um valor mensal de R$ 2.951,20 (id. 933c703).". Isto porque, restou configurado que o reclamante recebia a diária mais percentual de produtos vendidos, contudo, a reclamada não trouxe aos autos extrato das referidas vendas a fim de diferenciar as comissões e diárias dos pagamentos efetuados ao reclamante (Id 7476cbc). O princípio da aptidão para a prova determina que o ônus probatório recai sobre aquele que tem melhores condições de produzir a prova. No caso em tela, indiscutivelmente, a reclamada dispunha da capacidade de apresentar documentação sobre a discriminação dos valores pagos ao reclamante. Portanto, considerando a dispensa sem justa causa e o período contratual de 21.12.2023 a 29.7.2024, são devidas as verbas rescisórias deferidas na sentença. Nego provimento. 6. ANOTAÇÃO EM CTPS E RECOLHIMENTO DE FGTS A recorrente requer que seja explicitado que o prazo para cumprimento das obrigações de fazer seja de 15 dias úteis, contados a partir da intimação pessoal e específica para tanto, nos termos da Súmula nº 410 do STJ e do art. 815 do CPC. Pleiteia, ainda, a limitação da cláusula penal estabelecida para o caso de descumprimento, à luz da OJ nº 54 da SBDI-1 do TST e do art. 412 do Código Civil. Com parcial razão a reclamada. Primeiramente, a imposição de multa astreinte consiste em uma faculdade do juízo, e considero razoável o valor deferido da Origem - multa diária de R$ 200,00 limitada a R$ 6.000,00 - e o prazo fixado para cumprimento da obrigação - 5 dias úteis -. A aludida multa deve obedecer aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade e ser compatível com a obrigação determinada, sendo defeso o seu uso como meio de enriquecimento sem causa. Contudo, verifico que a sentença fixou multa diária de R$ 200,00, limitada a R$ 6.000,00, para o caso de descumprimento das obrigações de anotação da CTPS e recolhimento do FGTS, mas não explicitou a necessidade de intimação pessoal prévia do devedor. Sendo assim, reformo a r. sentença no particular, para determinar que a contagem do prazo para cumprimento das obrigações de fazer somente tenha início após o trânsito em julgado e a prévia intimação pessoal da reclamada com essa finalidade, nos termos do art. 815 do CPC e da Súmula nº 410 do STJ, mantida a multa nos termos fixados na sentença, por considerá-la razoável e proporcional ao caso concreto. Dou parcial provimento. 7. HORAS EXTRAS A demandada impugna a condenação ao pagamento de horas extras, argumentando que, mesmo que o recorrido fosse empregado, não teria direito a horas extras, dada a impossibilidade de presunção de veracidade da jornada declinada na inicial, considerando a dispensa de controle de jornada por ter menos de 20 empregados. Sustenta, ainda, que não havia carga de trabalho apta a justificar a extrapolação da jornada e que o recorrido tinha ampla autonomia quanto aos horários de trabalho. Sem razão. De fato, nos termos do art. 74, § 2º, da CLT, em sua redação anterior à Lei nº 13.874/2019, aplicável ao caso, estabelecimentos com mais de dez empregados estavam obrigados a manter registro da jornada de trabalho. Neste passo, cabia ao reclamante comprovar os fatos alegados na exordial, ônus do qual se desvencilhou no decurso da instrução processual. A partir da prova oral produzida, o Juízo de origem fixou a jornada de trabalho do reclamante como sendo: de segunda a sexta-feira, das 10h20 às 20h, aos sábados, das 10h20 às 19h, e, nos feriados, das 10h às 16h, sempre com 1h de intervalo intrajornada, entendimento do qual compartilho. Isto porque a jornada fixada encontra respaldo na prova testemunhal produzida, tendo o próprio reclamante declarado que "às vezes, por demora de clientes, passava das 20h, que era o seu horário de saída, e saía às 20h30, 20h40", sem especificar a periodicidade que tal fato ocorria. Mesmo a testemunha da reclamada, Kawan, confirmou que o horário de funcionamento do salão era até às 20h em dias normais e até às 19h aos sábados. Aliás, em sua própria contestação, a ora recorrente afirmou que "o horário de funcionamento da barbearia era de segunda a sexta-feira, das 10h00 às 20h00, e aos sábados das 09h00 às 19h00 e feriados das 10h00 às 16h00..." (Id 9f53b79, fl. 21). Portanto, ainda que a empresa não estivesse obrigada a manter controle formal de jornada, a prova oral produzida foi suficiente para demonstrar que o reclamante trabalhava além dos limites legais previstos no art. 7º, XIII, da CRFB/88. Quanto ao argumento de que não havia demanda suficiente para justificar a extrapolação da jornada, trata-se de alegação genérica, sem comprovação nos autos, insuficiente para afastar a prova oral produzida, inclusive pela própria recorrente. Por fim, a alegação de autonomia quanto aos horários de trabalho contradiz a própria dinâmica de pagamento por diárias, que pressupõe a presença do trabalhador durante todo o expediente, independentemente do volume de serviços realizados. No mais, as cautelas postuladas já foram atendidas pela sentença, sendo que o disposto na Súmula 85, III, do C. TST, não é aplicável diante da ausência de qualquer acordo para prorrogação de horas. Mantenho, portanto, a condenação ao pagamento de horas extras, nos termos fixados na sentença. Nego provimento. 8. MULTA DO ARTIGO 477 DA CLT A recorrente insurge-se contra a condenação ao pagamento da multa prevista no art. 477, § 8º, da CLT, argumentando que, tendo o vínculo empregatício sido reconhecido apenas em juízo, seria indevida a penalidade. Contudo, sem razão. A Súmula nº 462 do C. TST pacificou o entendimento de que "a circunstância de a relação de emprego ter sido reconhecida apenas em juízo não tem o condão de afastar a incidência da multa prevista no art. 477, § 8º, da CLT. A referida multa não será devida apenas quando, comprovadamente, o empregado der causa à mora no pagamento das verbas rescisórias". No caso em análise, não há prova de que o reclamante tenha dado causa à mora no pagamento das verbas rescisórias, sendo devida, portanto, a multa prevista no art. 477, § 8º, da CLT. Nego provimento. 9. VALE-TRANSPORTE A reclamada contesta a condenação ao pagamento de vale-transporte, alegando que caberia ao reclamante o ônus de comprovar a solicitação desse benefício, o que não teria ocorrido. Sem razão a recorrente. Nos termos da Súmula nº 460 do TST, "é do empregador o ônus de comprovar que o empregado não satisfaz os requisitos indispensáveis para a concessão do vale-transporte ou que não pretenda fazer uso do benefício". Assim, cabia à reclamada comprovar que o reclamante não necessitava do vale-transporte ou que havia manifestado desinteresse em recebê-lo, ônus do qual não se desincumbiu. A alegação de que o autor nunca solicitou o benefício não é suficiente para afastar a condenação, pois é obrigação do empregador informar o empregado sobre seus direitos e disponibilizar os meios para que possa exercê-los. Nego provimento. 10. AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO Não se conforma a reclamada com a condenação ao pagamento de auxílio-alimentação, alegando que não é signatária da convenção coletiva invocada e que, mesmo que fosse, o reclamante não preenchia os requisitos de assiduidade e pontualidade previsto na norma coletiva para a concessão do benefício. Sem razão. A convenção coletiva aplica-se a todas as empresas do segmento, independentemente de filiação sindical, por força do art. 611 da CLT, que assegura a aplicação das condições de trabalho estipuladas em convenção coletiva a todos os empregados das empresas compreendidas no âmbito de representação do sindicato. Quanto à alegação de que o reclamante não preencheria o requisito de assiduidade e pontualidade, trata-se de fato impeditivo do direito do autor, cujo ônus probatório incumbia à reclamada, nos termos do art. 818, II, da CLT, e do qual não se desincumbiu a contento. Embora a testemunha da reclamada tenha afirmado que o reclamante se atrasava com frequência, não foi especificado o tempo de atraso nem comprovado que tais atrasos configurariam faltas ou impontualidades graves a ponto de descaracterizar o requisito previsto na norma coletiva (Id 800eb50). Nego provimento. 11. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Os honorários sucumbenciais recíprocos já foram deferidos pela Origem. A questão, atualmente, não comporta maiores discussões acerca da melhor exegese a ser feita, diante da recente decisão do Colendo Supremo Tribunal Federal que, por maioria, na ADIn 5.766/DF, declarou a inconstitucionalidade parcial do parágrafo 4º, do artigo 791-A, da Consolidação das Leis do Trabalho. Em voto vencedor, o Ministro Alexandre de Moraes entendeu que não seria razoável nem proporcional a imposição do pagamento de honorários periciais e de sucumbência pelo beneficiário da justiça gratuita, sem que se provasse que ele deixou de ser hipossuficiente. Conclui-se, portanto, que a inconstitucionalidade declarada reside em parte do § 4º, do artigo 791-A, da CLT, qual seja, na locução "desde que tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo créditos capazes de suportar a despesa", a qual afronta a baliza do artigo 5º, incisos II e LXXIV, da Constituição Federal. Desta forma, entendo que a "ratio decidendi" do decidido pela Corte Suprema foi no sentido da declaração da inconstitucionalidade apenas no que viola o direito do beneficiário da justiça gratuita. Assim, caso cessem as condições de hipossuficiência, possível será a cobrança dos honorários de sucumbência. No presente caso, nada há a contrariar a declaração de hipossuficiência apresentada pela parte autora na inicial, a qual embasou o deferimento da assistência judiciária gratuita. Portanto, os valores objeto da condenação a título de honorários advocatícios sucumbenciais ficam sob condição suspensiva de exigibilidade, a teor do que dispõe o §4º, do já citado artigo 791-A, da CLT, afastando a compensação com outros créditos trabalhistas, como bem decidiu o juízo a quo. Ademais, diante da complexidade do presente processo, tenho que os honorários sucumbenciais fixados em 10% atendem os parâmetros previstos no § 2º, do artigo 791-A da CLT. Nego provimento. 12. JUSTIÇA GRATUITA A recorrente impugna a concessão dos benefícios da justiça gratuita ao reclamante, alegando que não foram comprovados os requisitos legais para tanto, notadamente a insuficiência de recursos. Entretanto, sem razão. A jurisprudência admite a concessão dos benefícios da justiça gratuita mediante declaração de miserabilidade. Portanto, até prova em contrário, presume-se verdadeira a declaração firmada pela parte autora e acostada aos autos (Id 529b407). Os §§3º e 4º do art. 790 da CLT em sua atual redação assim dispõem: §3° É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. (Parágrafo alterado pela Lei n° 13.467/2017 - DOU 14/07/2017) §4° O benefício da justiça gratuita será concedido à parte que comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo. (Parágrafo incluído pela Lei n° 13.467/2017 - DOU 14/07/2017) Neste passo, em razão da ausência de provas em sentido contrário à declaração de hipossuficiência da parte autora, entendo preenchidos os requisitos previstos no art. 790, §§ 3º e 4º, da CLT, em razão da declaração de hipossuficiência firmada pela parte autora. Observe-se que nesse sentido tem decidido esta E. 10ª Turma, inclusive ante o disposto na Súmula nº 5 deste Regional, na Orientação Jurisprudencial nº 304 da SDI-I do C. TST e no item I da recente Súmula nº 463 do C. TST, abaixo transcritas: Súmula n.º 5 do TRT-SP:"JUSTIÇA GRATUITA - ISENÇÃO DE DESPESAS PROCESSUAIS - CLT, ARTS. 790, 790-A E 790-B - DECLARAÇÃO DE INSUFICIÊNCIA ECONÔMICA FIRMADA PELO INTERESSADO OU PELO PROCURADOR - DIREITO LEGAL DO TRABALHADOR, INDEPENDENTEMENTE DE ESTAR ASSISTIDO PELO SINDICATO" OJ 304 da SBDI-I do TST: HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. DECLARAÇÃO DE POBREZA. COMPROVAÇÃO. Atendidos os requisitos da Lei nº 5.584/70 (art. 14, § 2º), para a concessão da assistência judiciária, basta a simples afirmação do declarante ou de seu advogado, na petição inicial, para se considerar configurada a sua situação econômica (art. 4º, § 1º, da Lei nº 7.510/86, que deu nova redação à Lei nº 1.060/50). 463. Assistência judiciária gratuita. Comprovação. (Conversão da Orientação Jurisprudencial nº 304 da SBDI-I, com alterações decorrentes do CPC de 2015 - Res. 219/2017 - DeJT 28/06/2017) I - A partir de 26.06.2017, para a concessão da assistência judiciária gratuita à pessoa natural, basta a declaração de hipossuficiência econômica firmada pela parte ou por seu advogado, desde que munido de procuração com poderes específicos para esse fim (art. 105 do CPC de 2015) Logo, afasta-se o óbice relativo ao patamar salarial, eis que há expressa declaração da parte autora de que não tem condições de arcar com as custas judiciais, sem provas em sentido contrário. Pelo exposto, adoto o posicionamento doutrinário acima exarado para confirmar os benefícios da Justiça Gratuita ao reclamante. Nego provimento. Prequestionamento As matérias a que se reportam os dispositivos normativos invocados pelas partes já se encontram prequestionadas na fundamentação da presente decisão. Anote-se que a jurisprudência trabalhista já se posicionou inclusive sobre a possibilidade de pré-questionamento ficto (Súmula 297, III. do C. TST), que restou positivado pelo art. 1.025 do CPC. Ante o exposto, ACORDAM os Magistrados da 10ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região em: CONHECER do recurso ordinário da reclamada; REJEITAR a preliminar de nulidade por negativa de prestação jurisdicional e, no mérito, DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO para a) afastar a multa por embargos protelatórios aplicada à recorrente e b) determinar que a contagem do prazo para cumprimento das obrigações de fazer somente tenha início após o trânsito em julgado e a prévia intimação pessoal da reclamada com essa finalidade, nos termos da fundamentação do voto da Relatora. No mais, mantêm-se os termos da r. decisão de Origem. Presidiu o julgamento o Excelentíssimo Senhor Desembargador ARMANDO AUGUSTO PINHEIRO PIRES. Tomaram parte no julgamento: REGINA CELI VIEIRA FERRO, ANA MARIA MORAES BARBOSA MACEDO e SÔNIA APARECIDA GINDRO. Votação: Unânime. Sustentação Oral Telepresencial: JULIANA FONTES HENRY SANT'ANNA. São Paulo, 15 de Julho de 2025. REGINA CELI VIEIRA FERRO Juíza do Trabalho Convocada Relatora DIE/1 VOTOS SAO PAULO/SP, 23 de julho de 2025. LEONOR ALVES LEAO Diretor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- HERMANOS BARBEARIA LTDA
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