Processo nº 6162055-20.2024.8.09.0067
ID: 297918920
Tribunal: TJGO
Órgão: 1ª Câmara Cível
Classe: MANDADO DE SEGURANçA CíVEL
Nº Processo: 6162055-20.2024.8.09.0067
Data de Disponibilização:
13/06/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GUSTAVO OLIVEIRA DE SOUZA
OAB/GO XXXXXX
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SILVIO ROSA CARNEIRO
OAB/GO XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
Desembargador Héber Carlos de Oliveira
APELAÇÃO CÍVEL N. 6162055-20.2024.8.09.0067
COMARCA DE GOIATUBA
JUIZ DE 1º …
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
Desembargador Héber Carlos de Oliveira
APELAÇÃO CÍVEL N. 6162055-20.2024.8.09.0067
COMARCA DE GOIATUBA
JUIZ DE 1º GRAU: DR. PAULO ROBERTO PALUDO
1ª CÂMARA CÍVEL
APELANTE: GABRIELLA ASSUNÇÃO OLIVEIRA SANTOS
APELADO: REITOR DA UNICERRADO – CENTRO UNIVERSITÁRIO DE GOIATUBA (FESG – FUNDAÇÃO DE ENSINO SUPERIOR DE GOIATUBA)
RELATOR: DESEMBARGADOR HÉBER CARLOS DE OLIVEIRA
VOTO
Conforme relatado, trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta pelo GABRIELLA ASSUNÇÃO OLIVEIRA SANTOS, contra a sentença proferida pelo Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Goiatuba, Dr. Dr. Paulo Roberto Paludo, na mov. 32 do presente mandado de segurança ajuizado contra ato acoimado de ilegal atribuído ao REITOR DA UNICERRADO – CENTRO UNIVERSITÁRIO DE GOIATUBA (FESG – FUNDAÇÃO DE ENSINO SUPERIOR DE GOIATUBA), ora apelado.
1 – CONTEXTUALIZAÇÃO DA LIDE
Em resumo da lide, consta da petição inicial que a impetrante é estudante do 9º período do curso de medicina na instituição de ensino impetrada, sendo beneficiária de bolsa estudantil integral concedida por meio do Programa Universitário do Bem – PROBEM, voltado a estudantes em situação de vulnerabilidade econômica residentes no Estado de Goiás.
Conforme narrado na inicial, a impetrante participou de processo seletivo interno (Edital nº 001/2025) destinado à definição dos locais para realização da fase de internato obrigatório do curso de medicina.
Classificada para cumprir o estágio em Araguari/MG, alegou impossibilidade financeira de se manter fora do Estado de Goiás, além de risco concreto de perder o benefício da bolsa, cujo regulamento exige, como requisito de permanência, a residência do bolsista em território goiano.
Sustenta que a decisão da universidade afronta princípios constitucionais da razoabilidade, proporcionalidade, dignidade da pessoa humana e igualdade material, notadamente por não considerar sua condição socioeconômica no processo seletivo.
Por tais razões, pleiteou a concessão da segurança, com o objetivo de assegurar que a realização do internato médico ocorra em município do Estado de Goiás, preferencialmente em Goiânia ou Aparecida de Goiânia, de acordo com as vagas disponibilizadas no edital do processo seletivo interno do qual a impetrante participou.
Notificada, a autoridade impetrada prestou informações, nas quais defendeu a legalidade do processo seletivo, ressaltando que a lotação dos alunos foi realizada com base em critérios objetivos previamente estabelecidos em edital, tais como média global, vínculo empregatício e matrícula de filhos no município pleiteado.
Enfatizou que o internato em unidade federativa diversa é autorizado pelo art. 24, §8º, da Resolução CNE/CES nº 3/2014, desde que não ultrapasse 25% da carga horária total do estágio.
A instituição destacou, ainda, que a lotação da impetrante em Araguari/MG respeita o limite normativo e foi aprovada pelo Conselho Universitário (CONSUNI), em reunião regularmente convocada e registrada em ata.
Sustenta, por fim, que a ingerência do Judiciário sobre a distribuição de campos de estágio comprometeria a autonomia universitária, consagrada no art. 207 da Constituição Federal.
Decorrido o trâmite processual, foi proferida sentença denegando a segurança, sob o fundamento de inexistência de direito líquido e certo demonstrado de plano, sendo ressaltado que o mandado de segurança não comporta dilação probatória.
O juízo de 1º Grau também entendeu que a impetrante inovou na causa de pedir ao levantar, apenas em sede de réplica, argumentos relativos ao percentual de carga horária permitida fora do estado, à ausência de justificativa para aplicação da excepcionalidade prevista na Resolução CNE/CES nº 3/2014 e à suposta desproporcionalidade na distribuição das vagas.
Pontuou, ainda, que a intervenção judicial no processo seletivo interno da universidade somente se justificaria diante de flagrante ilegalidade ou arbitrariedade, o que não se verifica nos autos.
2 – RAZÕES RECURSAIS
Em suas razões recursais, a impetrante afirma inicialmente que a sentença representa violação ao princípio da igualdade material, sustentando que, embora a faculdade tenha autonomia para alocar os estudantes em internatos fora do Estado, tal decisão não pode ignorar as circunstâncias econômicas específicas da impetrante, que possui baixa renda familiar e reside com o pai em Goiatuba-GO. Ressalta que a exigência de deslocamento para outro Estado (Minas Gerais) impõe ônus financeiro excessivo, incompatível com sua condição de bolsista.
Além disso, argumenta que a sentença adotou um raciocínio pautado na igualdade formal, desconsiderando as peculiaridades do caso concreto e o princípio da razoabilidade.
Discursa que o ato administrativo da universidade extrapolou os limites da legalidade e deve ser controlado judicialmente, uma vez que afetou diretamente o acesso à educação em razão de critério econômico não razoavelmente justificado.
Manifesta-se no sentido de que as Resoluções CNE/CES nº 4/2001 e nº 03/2014, que impõem a exigência de justificativa clara e técnica para autorizar, excepcionalmente, a realização de estágio em percentual superior ao permitido. Argumenta que tal justificativa não foi apresentada pela instituição de ensino, limitando-se a menções genéricas e desprovidas de embasamento técnico, o que caracteriza nulidade do ato administrativo e violação ao princípio da motivação previsto no art. 37 da Constituição.
Por fim, afirma que há direito líquido e certo a ser protegido, pois a regulamentação do internato contém normas objetivas e pré-constituídas, e a ausência de motivação adequada impede o controle judicial e a ampla defesa. Com base nesses fundamentos, pleiteia que a sentença seja reformada para lhe assegurar o direito de cursar os dois últimos períodos do internato no Estado de Goiás.
3 – ADMISSIBILIDADE DO RECURSO
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço da apelação cível.
4 – MÉRITO
4.1 – Cabimento do mandado de segurança
Como visto, a apelante sustenta, em síntese: (i) violação ao princípio da igualdade material, alegando que sua condição de bolsista integral do PROBEM não foi considerada; (ii) ausência de motivação válida para autorização de percentual superior a 25% da carga horária do internato fora da unidade federativa; (iii) existência de direito líquido e certo a ser protegido; (iv) aplicação inadequada da igualdade formal pelo juízo de origem.
Como é cediço, a concessão da segurança pressupõe a demonstração, de plano, da existência de direito líquido e certo violado ou ameaçado de violação por ato de autoridade pública, conforme dispõe o artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal e o artigo 1º da Lei nº 12.016/2009.
Com efeito, o mandado de segurança, nos termos do art. 1º da Lei 12.016/2009, destina-se à proteção de direito líquido e certo, conceituado pela doutrina como aquele que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração, prescindindo de dilação probatória.
Conforme magistério de Hely Lopes Meirelles, direito líquido e certo é aquele que “há de vir expresso em norma legal e trazer em si todos os requisitos e condições de sua aplicação ao impetrante: se sua existência for duvidosa; se sua extensão ainda não estiver delimitada; se seu exercício depender de situações e fatos ainda indeterminados, não rende ensejo à segurança”. (MEIRELLES, Hely Lopes. Mandado de segurança. 30. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p.38.)
Maria Helena Diniz complementa que direito líquido e certo é “aquele que não precisa ser apurado, em virtude de estar perfeitamente determinado, podendo ser exercido imediatamente, por ser incontestável e por não estar sujeito a quaisquer controvérsias”. (02. DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. Vol.1. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 39)
Assim, para que se configure o direito líquido e certo, é imprescindível que os fatos alegados sejam incontroversos e demonstráveis mediante prova pré-constituída, uma vez que o rito especial do mandado de segurança não comporta dilação probatória. A controvérsia, quando existente, deve limitar-se à interpretação jurídica dos fatos, jamais à sua ocorrência.
Ausente a demonstração inequívoca do direito, por provas pré-constituídas, resta inviável a concessão da segurança.
Nesse sentido, eis o entendimento do próprio Supremo Tribunal Federal:
MANDADO DE SEGURANÇA - PETIÇÃO INICIAL DESACOMPANHADA DOS DOCUMENTOS NECESSÁRIOS À COMPROVAÇÃO LIMINAR DOS FATOS ALEGADOS - INDISPENSABILIDADE DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA - CONCEITO DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO - FATOS INCONTROVERSOS E INCONTESTÁVEIS - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. - Refoge, aos estreitos limites da ação mandamental, o exame de fatos despojados da necessária liquidez, não se revelando possível a instauração, no âmbito do processo de mandado de segurança, de fase incidental de dilação probatória. Precedentes - A noção de direito líquido e certo ajusta-se, em seu específico sentido jurídico-processual, ao conceito de situação decorrente de fato incontestável e inequívoco, suscetível de imediata demonstração mediante prova literal pré-constituída. Precedentes . ( MS 23190 AgR, Relator (a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 16/10/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-026 DIVULG 06-02-2015 PUBLIC 09-02-2015) (STF - AgR MS: 23190 RJ - RIO DE JANEIRO 0002246-08.1998.0 .01.0000, Relator.: Min. CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 16/10/2014, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-026 09-02-2015)
Outro não é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
“(...) I - A jurisprudência desta Corte orienta-se no sentido de que o cabimento de mandado de segurança pressupõe a existência de direito líquido e certo, vale dizer, aquele comprovável mediante prova pré-constituída, o que não ocorreu no caso. II - Recurso ordinário improvido.” (RMS 54.093/RS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Rel. p/ Acórdão Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28/11/2017).
4.2 – Caso concreto
No presente caso, após uma análise minuciosa da situação concreta, não é possível vislumbrar a existência de direito líquido e certo apto a ser tutelado pela via mandamental.
Como visto, a apelante fundamenta sua pretensão na alegação de que sua condição de bolsista integral e beneficiária do PROBEM lhe conferiria o direito de realizar o internato exclusivamente no Estado de Goiás. Contudo, tal assertiva não encontra respaldo nos documentos carreados aos autos.
Pelo que consta do acervo probatório, o processo seletivo para distribuição das vagas de internato médico foi conduzido segundo critérios objetivos previamente estabelecidos em edital, quais sejam, como média global, vínculo empregatício no local pleiteado e matrícula de filhos em instituição de ensino na localidade, observando-se os princípios da legalidade, impessoalidade e isonomia.
A designação da impetrante para o município de Araguari/MG decorreu exclusivamente de sua classificação no certame, uma vez que não alcançou pontuação suficiente para as vagas destinadas aos municípios goianos.
A classificação da apelante decorreu da aplicação impessoal dos parâmetros previamente divulgados no edital, não havendo a demonstração de qualquer vício de legalidade ou arbitrariedade no procedimento adotado pela instituição de ensino.
Diante da classificação alcançada pela discente no certame, de acordo com os critérios objetivos constantes do edital, somente seria possível a realização do seu internato no Estado de Goiás se demonstrada a existência de vaga disponível em alguma das cidades localizadas nessa unidade federativa não preenchida por estudante melhor classificado.
Contudo, não há nos autos comprovação quanto à existência de vagas remanescentes nas cidades goianas contempladas pelo edital, além daquelas regularmente disponibilizadas pelo edital, e que foram destinadas para estudantes com pontuação superior à da impetrante.
Além disso, também não há comprovação de que estudantes com pontuação inferior à da impetrante tenham sido designados para as cidades de Goiânia ou Aparecida de Goiânia.
Desse modo, não é possível vislumbrar nenhuma ilegalidade no processo seletivo ou afronta aos critérios estabelecidos em edital. Os critérios utilizados são técnicos, objetivos e foram aplicados de forma isonômica a todos os participantes.
Com efeito, considerando a classificação obtida pela discente no processo seletivo, segundo os critérios objetivos estabelecidos no edital, apenas seria viável a realização do internato no Estado de Goiás mediante comprovação da existência de vaga não preenchida em alguma das cidades localizadas nesta unidade federativa. Tal prova, contudo, não foi produzida.
A apelante limita-se a postular que a universidade demonstre a inexistência de vagas, em uma tentativa de inverter o ônus probatório.
Entretanto, relembro que no mandado de segurança compete ao impetrante demonstrar de plano, desde o ajuizamento da ação, a existência do direito alegado, não sendo cabível a transferência desse ônus à autoridade coatora.
Portanto, a apelante não comprovou documentalmente, desde o ajuizamento da ação: (a) a existência de vagas disponíveis nas cidades de Goiânia e Aparecida de Goiânia; (b) eventual ilegalidade no processo seletivo; (c) violação concreta aos critérios editalícios estabelecidos, o que afasta a existência do direito líquido e certo alegado na petição inicial.
A ausência de demonstração, por prova pré-constituída, do direito líquido e certo alegado na peça de ingresso invariavelmente redunda na denegação da segurança, tal qual o que restou decidido pelo juízo de 1º Grau.
Nesse sentido:
AGRAVO INTERNO NA APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. NULIDADE DA DECISÃO MONOCRÁTICA AGRAVADA. PRELIMINAR AFASTADA. FUNDO DE COMBATE E ERRADICAÇÃO DA POBREZA. VINCULAÇÃO/AFETAÇÃO A IMPOSTO. POSSIBILIDADE. PROTEGE GOIÁS. INSTITUIÇÃO POR LEI ESTADUAL. VALIDADE. ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 11090-02.2014.8.09.0000. SUPERADA. RECURSOS. CONTRIBUIÇÃO FACULTATIVA. CONDIÇÃO PARA USUFRUIR DE BENEFÍCIO FISCAL. LEGITIMIDADE. (...) XII. Não demonstrado o direito líquido e certo da impetrante/apelante/agravante, a denegação da segurança é medida que se impõe, sendo imperiosa a manutenção da decisão monocrática vergastada. AGRAVO INTERNO ADMITIDO. DECISÃO MONOCRÁTICA CONFIRMADA. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 5204881-61.2019.8.09.0000, Rel. Des(a). Altair Guerra da Costa, 1ª Câmara Cível, julgado em 28/02/2024, DJe de 28/02/2024)
MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. QUADRO DE SERVIDORES DA SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA DO ESTADO DE GOIÁS. CARGO DE AGENTE DE POLÍCIA DA 3ª CLASSE. TESTE PSICOLÓGICO. PREVISÃO LEGAL E EDITALÍCIA. LEGALIDADE. CONFIRMAÇÃO DO ATO IMPUGNADO. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça se firmou no sentido de que a realização de exames psicotécnicos em concursos públicos é legítima se houver previsão legal e editalícia, se forem objetivos os critérios adotados para a avaliação e se couber a interposição de recurso contra o resultado. 2. Demonstrado nos autos o atendimento dos critérios referentes à previsão legal e editalícia, adoção de critérios objetivos para a avaliação e previsão de cabimento de recurso contra o resultado do exame psicológico, bem como verificado que o candidato não atingiu os requisitos necessários para a aprovação no certame, descabe-se falar em nulidade do ato de declaração de inaptidão do impetrante. 3. Ausente a comprovação do direito líquido e certo, a denegação da segurança é medida impositiva. 4. SEGURANÇA DENEGADA. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Processo de Conhecimento -> Procedimento de Conhecimento -> Procedimentos Especiais -> Procedimentos Regidos por Outros Códigos, Leis Esparsas e Regimentos -> Mandado de Segurança Cível 5416402-77.2023.8.09.0000, Rel. Des(a). WILLIAM COSTA MELLO, 1ª Câmara Cível, julgado em 29/01/2024, DJe de 29/01/2024)
4.3 – Autonomia universitária e legalidade do ato administrativo
Nos termos do art. 207 da Constituição Federal, as universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira.
Esta autonomia abrange a discricionariedade para definir critérios de seleção e distribuição de vagas em seus cursos, desde que observados os princípios constitucionais e legais aplicáveis.
A esse respeito, não é demais relembrar que o Poder Judiciário não deve interferir em decisões de cunho pedagógio e administrativas das universidades, salvo em caso de flagrante ilegalidade — situação que não se verifica no presente caso.
Veja-se, mutatis mutandis:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. TUTELA DE URGÊNCIA. CURSO SUPERIOR. MEDICINA. MATRÍCULA EM DISCIPLINA INDISPONÍVEL NA GRADE CURRICULAR. AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS. DECISÃO MANTIDA. I. CASO EM EXAME: 1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu tutela de urgência para autorizar matrícula da agravante na disciplina "Urgência e Emergência II", indisponível na grade curricular do segundo semestre de 2024, com vistas a evitar atraso na conclusão do curso de medicina. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO: 2. A questão em discussão consiste em saber se estão presentes os requisitos para a concessão da tutela de urgência, conforme previsto no art. 300 do CPC, frente à autonomia didático-científica das instituições de ensino. III. RAZÕES DE DECIDIR: 3. A autonomia universitária, assegurada pelo art. 207 da Constituição Federal e regulamentada pela Lei n. 9.394/96, confere às instituições de ensino superior competência para fixar sua grade curricular, limitando a intervenção do Poder Judiciário ao controle da legalidade dos atos. 4. Não restou evidenciada a probabilidade do direito, uma vez que a indisponibilidade da disciplina decorre de reprovações anteriores da agravante e está de acordo com os regulamentos institucionais. 5. O perigo de dano irreparável ou risco ao resultado útil do processo também não se demonstra, considerando que a agravante está regularmente matriculada nas demais disciplinas e poderá cursar ‘Urgência e Emergência II” no primeiro semestre de 2025. 6. Ausentes os requisitos para a tutela de urgência, mantém-se a decisão agravada.IV. DISPOSITIVO E TESE:7. Agravo de instrumento conhecido e desprovido. Tese de julgamento: "1. A autonomia universitária, prevista no art. 207 da Constituição Federal, confere às instituições de ensino superior a competência para organizar sua grade curricular, sendo vedada ao Poder Judiciário a interferência, salvo para análise da legalidade do ato." "2. A concessão de tutela de urgência exige a demonstração cumulativa da probabilidade do direito e do perigo de dano, nos termos do art. 300 do CPC, sob pena de manutenção da decisão recorrida." (Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Agravos -> Agravo de Instrumento, 5962719-18.2024.8.09.0105, FERNANDO RIBEIRO MONTEFUSCO - (DESEMBARGADOR), 6ª Câmara Cível, julgado em 06/02/2025)
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. TRANSFERÊNCIA ENTRE UNIVERSIDADES. CURSO DE MEDICINA. EDITAL. NÃO CUMPRIMENTO DE REQUISITO. INDEFERIMENTO DA INSCRIÇÃO. AUTONOMIA DIDÁTICO-CIENTÍFICA, ADMINISTRATIVA E DE GESTÃO FINANCEIRA E PATRIMONIAL. INTERFERÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO. 1 ? As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, de forma que a interferência do Poder Judiciário nas normas, regras e regimentos confeccionados por elas com base na autonomia que lhes é outorgada deve se dar por motivo relevante e desde que comprovada a existência de eventual procedimento lesivo. 2 ? Tratando-se de indeferimento de inscrição no processo de transferência entre universidades em virtude do não preenchimento de requisito necessário para a obtenção da mencionada transferência e previsto no edital, não há que se falar em procedimento lesivo. Apelação Cível conhecida e desprovida. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 5085279-38.2023.8.09.0032, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR GILBERTO MARQUES FILHO, 3ª Câmara Cível, julgado em 25/06/2024, DJe de 25/06/2024)
AGRAVO INTERNO E AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. MÉRITO PRONTO PARA JULGAMENTO. REQUISITOS PARA O DEFERIMENTO DA LIMINAR. FUMAÇA DO BOM DIREITO E PERIGO DA DEMORA. CURSO DE MEDICINA. REPROVAÇÃO EM DISCIPLINA DO EIXO MORFOFUNCIONAL VIII. IMPOSSIBILIDADE DE MATRÍCULA NO INTERNATO I DO 9º PERÍODO. VEDAÇÃO POR REGULAMENTO INTERNO. AUTONOMIA DA UNIVERSIDADE. INCOMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS. DECISÃO REFORMADA. I - Estando o agravo de instrumento pronto para receber julgamento, considera-se prejudicado o agravo interno interposto contra a decisão liminar, haja vista a análise do próprio mérito do recurso primário (art. 157 do RITJGO). II - Para a concessão de medida liminar em mandado de segurança, necessária se faz a presença de dois requisitos, quais sejam, fumus boni juris ? caracterizado pela relevância dos motivos em que se assenta o pedido exordial ? e periculum in mora ? representado pelo risco de ineficácia do tardio reconhecimento do direito do impetrante na decisão de mérito. III ? Em observância a autonomia didático-científica concedida às Universidades pela Constituição Federal e Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394/96), o Poder Judiciário não pode negar validade a regra interna que exige aprovação em disciplinas anteriores do eixo morfofuncional VIII para a matrícula em internato I do 9º período do curso de medicina, especialmente quando fica comprovado nos autos a incompatibilidade de honorários entre as matérias. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E PROVIDO. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Agravos -> Agravo de Instrumento 5575461-51.2023.8.09.0049, Rel. Des(a). BRENO CAIADO, 11ª Câmara Cível, julgado em 30/10/2023, DJe de 30/10/2023)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA A FIM DE COMPELIR INSTITUIÇÃO PARTICULAR DE ENSINO A RETOMAR A MESMA PROPORÇÃO DE AULAS SÍNCRONAS (PRESENCIAIS) E ASSÍNCRONAS, COM O NÚMERO DE ALUNOS POR SALA EM CONFORMIDADE COM O CONTRATO ASSINADO PELO ALUNO/CONSUMIDOR, SOB PENA DE MULTA. ATO INTERNA CORPORIS. INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO INDEVIDA. PREVISÃO LEGAL E CONTRATUAL QUANTO AS ALTERAÇÕES EMPREENDIDAS QUANTO A DISPONIBILIDADE DAS AULAS. EVENTUAIS PREJUÍZOS NÃO DEMONSTRADOS DE PLANO. FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA AUSENTES. 1. Tratando-se as medidas adotadas pela agravante, no período da pandemia, de ato interna corporis, à vista de sua autonomia didático-científica, inadmite-se a interferência do Poder Judiciário frente às questões pedagógicas e administrativas, salvo comprovada abusividade que prejudique sobremaneira o consumidor, o que não é o caso em testilha. 2. Evidenciado que a Instituição Educacional agira com supedâneo em Portarias do MEC (Nº 2.117/2019 E 343/2020), além de que, em previsão contratual, existente, antes mesmo da pandemia, no que se refere à ministração de aulas na modalidade de ensino à distância, até o limite de 40% da carga horária total do curso, inclusive, com eventuais alocações dos discentes em salas de aulas comuns com outros cursos em casos de disciplinas compartilhadas, não há falar em ilegalidade em sua conduta, mostrando-se desarrazoado interferência judicial para impor-lhe ditames quanto a tais questões, ante a ausência de ilegalidade. 3. In casu, não restou comprovada, de plano, a diminuição dos custos operacionais da instituição de ensino agravada, em razão das aulas passarem a ser ministradas na modalidade telepresencial durante a pandemia, razão pela qual não se mostra prudente a redução da mensalidade do curso superior, sem que oportunizado o amplo debate sob o crivo do contraditório. 4. Constatando-se ausentes um/ambos requisitos para concessão da tutela de urgência (artigo, 300, do Código de Ritos Processual), a revogação do ato a quo que o deferiu nessa condição é medida que se impõe. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E PROVIDO. DECISÃO MODIFICADA. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Agravos -> Agravo de Instrumento 5648838-13.2020.8.09.0000, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR FAUSTO MOREIRA DINIZ, 6ª Câmara Cível, julgado em 16/08/2021, DJe de 16/08/2021)
A organização dos campos de estágio e a definição das vagas de internato inserem-se na esfera discricionária da instituição, respaldada por sua autonomia constitucional e pelas normativas do Conselho Nacional de Educação (CNE/CES).
A Resolução CNE/CES nº 3/2014, em seu art. 24, § 8º, permite ao colegiado acadêmico superior da instituição autorizar, em caráter excepcional, percentual superior ao limite de 25% para realização do internato médico fora da unidade federativa em que localizada a instituição, desde que devidamente motivado e justificado.
A deliberação do CONSUNI, que ampliou este percentual, encontra-se formalmente registrada em ata, com observância das normativas vigentes.
O questionamento da ata de reunião do CONSUNI, apresentado pela impetrante na réplica à contestação (mov. 30), não é suficiente para demonstrar o direito líquido e certo alegado na petição inicial.
Trata-se, em verdade, como bem ressaltado na sentença objurgada, de indevida inovação da causa de pedir, na medida em que não foi apresentado na petição inicial, o que é vedado na via estreita do writ.
No mesmo rumo:
MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. EDITAL 007/2022. INOVAÇÃO NA CAUSA DE PEDIR. IMPOSSIBILIDADE. CLÁUSULA DE BARREIRA. CONSTITUCIONALIDADE. CANDIDATA CLASSIFICADA FORA DO NÚMERO PREVISTO PARA CADASTRO DE RESERVA. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. 1. Após a estabilização da lide é defeso à parte inovar a causa de pedir, eis que esta não pode ser modificada. 2. A Corte Suprema já se posicionou pela constitucionalidade da Cláusula de Barreira (Tema 376), eis que tem como finalidade selecionar os melhores classificados, a fim de atender ao interesse público e à prestação de um serviço público de qualidade. 3. Com efeito, a eliminação da impetrante afigura-se amparada na legalidade, porquanto classificada fora do número de vagas destinadas à composição de cadastro de reserva prevista na Cláusula de Barreira, não havendo que se falar em direito líquido e certo. SEGURANÇA DENEGADA. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Processo de Conhecimento -> Procedimento de Conhecimento -> Procedimentos Especiais -> Procedimentos Regidos por Outros Códigos, Leis Esparsas e Regimentos -> Mandado de Segurança Cível 5249015-78.2023.8.09.0051, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR ALAN SEBASTIÃO DE SENA CONCEIÇÃO, 5ª Câmara Cível, julgado em 18/08/2023, DJe de 18/08/2023)
Não bastasse isso, eventual reconhecimento de ilegalidade da deliberação do CONSUNI demanda dilação probatória, o que é incompatível com o rito do mandado de segurança, ficando ressalvada a possibilidade de discussão da matéria em ação judicial própria, na qual se admite ampla dilação probatória.
A corroborar:
APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. COBRANÇA ISSQN SOBRE VALOR TOTAL SERVIÇOS. ALEGAÇÃO DE COBRANÇA INCONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. 1. Tratando-se de Mandado de Segurança, cuja finalidade é a proteção de direito líquido e certo, não se admite dilação probatória, porquanto não comporta a fase instrutória, sendo necessária a juntada de prova pré-constituída apta a demonstrar, de plano, o direito alegado. 2. Ante a ausência de prova pré-constituída a comprovar o direito líquido e certo postulado, havendo a necessidade de ampla dilação probatória para o deslinde da controvérsia, a extinção do feito comporta julgamento sem resolução do mérito, em virtude da inadequação da via eleita (artigos 6º, §5º, da Lei nº. 12.016/09 e 485, inc. IV, do CPC). 3. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Recursos -> Apelação Cível 5345234-56.2023.8.09.0051, Rel. Des(a). DESEMBARGADOR GERSON SANTANA CINTRA, 3ª Câmara Cível, julgado em 15/07/2024, DJe de 15/07/2024)
MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. EMPRÉSTIMO PESSOAL CONSIGNADO NA FOLHA DE PAGAMENTO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. DILAÇÃO PROBATÓRIA. 1. O mandado de segurança somente é cabível quando plenamente aferível o direito líquido e certo no momento da impetração, cuja existência e delimitação devem ser comprovadas de plano, sem a necessidade de dilação probatória. 2. A denegação da segurança por ausência de demonstração do direito líquido e certo, mediante prova pré-constituída, não impede a Impetrante de ir a Juízo, valendo-se das vias ordinárias, nas quais se mostra possível a ampla dilação probatória, para a defesa de seu direito. SEGURANÇA DENEGADA. (TJGO, PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO -> Processo de Conhecimento -> Procedimento de Conhecimento -> Procedimentos Especiais -> Procedimentos Regidos por Outros Códigos, Leis Esparsas e Regimentos -> Mandado de Segurança Cível 5361802-72.2024.8.09.0000, Rel. Des(a). ROGÉRIO CARVALHO PINHEIRO, 8ª Câmara Cível, julgado em 15/07/2024, DJe de 15/07/2024)
4.4 – Condição socioeconômica da apelante
Embora se reconheça a condição de hipossuficiência econômica da impetrante, sendo bolsista integral, essa circunstância, por si só, não autoriza o afastamento das regras gerais do edital aplicáveis a todos os discentes.
O fato de a impetrante ser beneficiária de bolsa estudantil não lhe confere direito a tratamento diferenciado que prejudique outros estudantes que obtiveram melhor classificação no processo seletivo.
A concessão da ordem pretendida implicaria necessariamente a transferência de ônus indevido a outro discente melhor classificado, que deveria ser designado para o município de Araguari/MG para ocupar a vaga que seria da impetrante, o que comprometeria a higidez e a regularidade do processo seletivo conduzido de acordo com regras objetivas.
O princípio da igualdade material não autoriza tratamento privilegiado ou flexibilizações em desacordo com critérios objetivos previamente fixados.
Não se nega a possibilidade de tratamento diferenciado, justamente por se tratar de aluna beneficiária de bolsa de estuados.
Contudo, o tratamento diferenciado deve encontrar respaldo legal específico e não pode legitimar medidas que causem prejuízo àqueles que tenham cumprido integralmente as regras objetivas previamente fixadas.
Ademais, não há desproporcionalidade nos critérios adotados, que foram estabelecidas de forma impessoal e objetiva, aplicando-se indistintamente a todos os participantes.
Ora, a universidade não pode ser compelida a criar exceções baseadas em circunstâncias particulares de cada estudante, sob pena de comprometer a segurança jurídica do processo seletivo.
Por fim, a possibilidade de perda da bolsa estudantil também não é suficiente para a demonstração do direito líquido e certo alegado na exordial, notadamente porque, repito, a designação do município para a apelante realizar seu internato decorreu unicamente de sua classificação no processo seletivo, de acordo com a nota por ela obtida, inexistindo a demonstração de qualquer ilegalidade praticada pela universidade.
Nessa conjuntura, medida que se impõe é o desprovimento do recurso.
5. DISPOSITIVO
Ante o exposto, CONHEÇO da apelação cível, mas NEGO-LHE PROVIMENTO, mantendo incólume a sentença recorrida, por estes e seus próprios fundamentos.
É como voto.
Ausente a condenação em honorários sucumbenciais pelo juízo originário, nos termos do art. 25, da Lei n. 12.016/2009, incabível a majoração nos moldes do art. 85, § 11, do CPC.
Após o trânsito em julgado, DETERMINO a devolução dos autos ao juízo originário, dando-se baixa no acervo desta Relatoria.
Goiânia, datado e assinado digitalmente.
Desembargador HÉBER CARLOS DE OLIVEIRA
Relator
ACÓRDÃO
VISTOS, relatados e discutidos os presentes autos da Apelação Cível nº 6162055-20.2024.8.09.0067, Comarca de Goiânia.
ACORDAM os integrantes da Quinta Turma Julgadora, da 1ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, à unanimidade de votos, em conhecer e desprover o recurso, nos termos do voto do Relator.
VOTARAM, além do Relator, o Des. José Proto de Oliveira e o Des. Átila Naves Amaral.
Presidiu a sessão o Des. Átila Naves Amaral.
Presente o ilustre Procurador de Justiça, Dr. Mozart Brum Silva.
Goiânia, datado e assinado digitalmente.
Desembargador HÉBER CARLOS DE OLIVEIRA
Relator
APELAÇÃO CÍVEL N. 6162055-20.2024.8.09.0067
COMARCA DE GOIATUBA
JUIZ DE 1º GRAU: DR. PAULO ROBERTO PALUDO
1ª CÂMARA CÍVEL
APELANTE: GABRIELLA ASSUNÇÃO OLIVEIRA SANTOS
APELADO: REITOR DA UNICERRADO – CENTRO UNIVERSITÁRIO DE GOIATUBA (FESG – FUNDAÇÃO DE ENSINO SUPERIOR DE GOIATUBA)
RELATOR: DESEMBARGADOR HÉBER CARLOS DE OLIVEIRA
EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. CURSO DE MEDICINA. INTERNATO MÉDICO FORA DO ESTADO DE RESIDÊNCIA. POSSIBILIDADE. ALUNA BOLSISTA. CLASSIFICAÇÃO DE ACORDO COM A NOTA OBTIDA. PREVALÊNCIA DAS REGRAS EDITALÍCIAS OBJETIVAS. AUTONOMIA DA INSTITUIÇÃO DE ENSINO. DELIBERAÇÃO DO CONSELHO SUPERIOR UNIVERSITÁRIO. CONTROVÉRSIA QUANTO À MOTIVAÇÃO. ILEGALIDADE NÃO DEMONSTRADA DE PLANO. NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO NÃO COMPROVADO. RECURSO DESPROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível interposta contra sentença que denegou mandado de segurança impetrado com o objetivo de assegurar à impetrante, aluna de medicina bolsista do PROBEM, a realização do internato médico exclusivamente no Estado de Goiás, alegando vulnerabilidade socioeconômica e risco de perda do benefício estudantil. O juízo de origem denegou a segurança, por ausência do direito líquido e certo alegado.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há quatro questões em discussão:
(i) saber se a designação de internato fora do Estado de residência viola o princípio da igualdade material, em razão da condição socioeconômica da impetrante, bolsista integral do curso de medicina;
(ii) saber se a decisão da universidade encontra respaldo legal e foi adequadamente motivada;
(iii) saber se há direito líquido e certo à realização do internato em unidade federativa específica; e
(iv) saber se houve ilegalidade ou arbitrariedade no processo seletivo interno da instituição de ensino.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A impetrante não comprovou a existência de vagas disponíveis nos municípios pretendidos, localizados no Estado de Goiás, nem ilegalidade na sua designação para internato em município localizado em outra unidade da Federação (Araguari/MG).
4. A controvérsia quanto à ausência de motivação técnica na ata do CONSUNI, que ampliou a porcentagem do internato para unidade da federação diversa daquela em que a alua estuda, conforme previsto na Resolução CNE/CES nº 3/2014, afasta o alegado direito líquido e certo, porquanto demanda dilação probatória, devendo ser deduzida em ação judicial ordinária, sendo incabível na via estreita do mandado de segurança, que exige prova pré-constituída e demonstração inequívoca do direito alegado.
5. A impugnação à deliberação do conselho superior da instituição de ensino não é suficiente, por si só, para comprovar a existência de direito líquido e certo à realização do internato em uma das vagas disponibilizadas nas cidades localizadas no Estado de Goiás, porquanto o processo seletivo do internato seguiu critérios objetivos previamente definidos em edital, aplicados de forma impessoal a todos os discentes.
6. A autonomia universitária assegura à instituição a prerrogativa de organização pedagógica, nos termos do art. 207 da CF/1988, somente sendo cabível a intervenção do Poder Judiciário nos seus atos pedagógicos e/ou administrativos em casos de flagrante ilegalidade, o que não é o caso dos autos.
7. A condição de bolsista da impetrante não confere direito automático à preferência na escolha do local do internato, notadamente quando a designação dos discentes para uma ou outra cidade observou critérios objetivos previamente fixados em edital, tampouco autoriza tratamento diferenciado que comprometa as diretrizes do processo seletivo.
8. Tendo em vista que a designação do município para a apelante realizar seu internato decorreu unicamente de sua classificação no processo seletivo, de acordo com a nota por ela obtida, inexistindo a demonstração de qualquer ilegalidade praticada pela universidade, não se pode alegar que a possibilidade de perda da bolsa estudantil, em caso de residência em outro Estado, seria suficiente para a demonstração do direito líquido e certo alegado.
IV. DISPOSITIVO E TESE
8. Recurso conhecido e desprovido.
Tese de julgamento:
"1. A ausência de demonstração por prova pré-constituída de direito líquido e certo inviabiliza a concessão da segurança na via mandamental."
"2. A autonomia universitária abrange a definição dos critérios de distribuição de campos de estágio, desde que pautados na legalidade e isonomia."
"3. A condição de bolsista não garante, por si só, direito à realização do internato em localidade específica, devendo ser observada a classificação obtida em processo seletivo regido por critérios objetivos."
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 5º, LXIX; 37, caput; 207; Lei nº 12.016/2009, art. 1º; Resolução CNE/CES nº 3/2014, art. 24, §8º.
Jurisprudência relevante citada: STF, MS 23190 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, Plenário, j. 16.10.2014; STJ, RMS 54.093/RS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 28.11.2017; TJGO, ApCiv 5204881-61.2019.8.09.0000, Rel. Des. Altair Guerra da Costa, j. 28.02.2024.
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