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Processo nº 0000657-34.2011.8.10.0120

ID: 255988306

Tribunal: TJMA Órgão: 2ª Câmara Criminal Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 0000657-34.2011.8.10.0120

Data de Disponibilização: 14/04/2025

Polo Ativo:

REGINALDO ALMEIDA DOURADO

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

JOSE DE ALENCAR MACEDO ALVES

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ESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL SESSÃO VIRTUAL DE 03/04 A 10/04/2025 APELAÇÃO CRIMINAL N. 0000657-34.2011.8.10.0120 ORIGEM: VARA ÚNICA DA COMARCA DE SÃ… ESTADO DO MARANHÃO PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL SESSÃO VIRTUAL DE 03/04 A 10/04/2025 APELAÇÃO CRIMINAL N. 0000657-34.2011.8.10.0120 ORIGEM: VARA ÚNICA DA COMARCA DE SÃO BENTO/MA APELANTE: REGINALDO ALMEIDA DOURADO DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO MARANHÃO APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MARANHÃO RELATOR: DESEMBARGADOR SEBASTIÃO JOAQUIM LIMA BONFIM Ementa: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. SUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. PALAVRA DA VÍTIMA. VALORAÇÃO NEGATIVA DA CULPABILIDADE. DOSIMETRIA DA PENA ADEQUADAMENTE REALIZADA. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Criminal interposta por réu condenado pelo crime de estupro de vulnerável (art. 217-A do Código Penal), à pena de 9 (nove) anos de reclusão, em regime inicial fechado. O apelante sustenta (i) a insuficiência de provas para sua condenação e requer a absolvição e, subsidiariamente, (ii) a revisão da valoração negativa da culpabilidade, pleiteando a fixação da pena-base no mínimo legal. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) verificar se há suficiência probatória para a condenação do apelante pelo crime de estupro de vulnerável; e (ii) analisar se a valoração negativa da culpabilidade foi devidamente fundamentada na dosimetria da pena. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A materialidade e a autoria do crime restam comprovadas por elementos como os depoimentos da vítima, colhidos na fase policial e judicial, o relatório do conselho tutelar, o exame de corpo de delito e a certidão de nascimento que atesta a idade da vítima à época dos fatos. 4. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça reconhece que, nos crimes sexuais, a palavra da vítima assume especial relevância, principalmente quando corroborada por outros elementos probatórios, sendo suficiente para embasar a condenação. 5. O depoimento da vítima é coerente, detalhado e compatível com os demais elementos do processo, reforçando a credibilidade da narrativa e afastando a tese de insuficiência probatória. 6. A valoração negativa da culpabilidade fundamenta-se na maior reprovabilidade da conduta do apelante, considerando as lesões físicas infligidas à vítima durante sua tentativa de fuga, o que justifica a fixação da pena-base acima do mínimo legal. IV. DISPOSITIVO 7. Recurso desprovido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação Criminal nº 0000657-34.2011.8.10.0120, acordam os Desembargadores da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, por unanimidade e de acordo com o parecer ministerial, em negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Desembargador Relator, SEBASTIÃO JOAQUIM LIMA BONFIM, acompanhado pelos Desembargadores: FRANCISCO RONALDO MACIEL OLIVEIRA e NELSON FERREIRA MARTINS FILHO. Funcionou pela Procuradoria-Geral de Justiça o Dr. KRISHNAMURTI LOPES MENDES FRANCA. São Luís, data do sistema. Desembargador SEBASTIÃO JOAQUIM LIMA BONFIM Relator RELATÓRIO Trata-se de Apelação Criminal interposta por Reginaldo Almeida Dourado, inconformado com a sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de São Bento–MA (ID 43140891), que o condenou pela prática delitiva descrita no art. 217-A do Código Penal (estupro de vulnerável), à pena definitiva de 9 (nove) anos de reclusão, em regime inicial fechado. Consta dos autos que, no dia 29 de maio de 2011, por volta das 19h, no povoado Ilha Terceira, em Palmeirândia/MA, o apelante praticou o crime de estupro de vulnerável contra a vítima G.A. de 13 (treze) anos. Da narrativa dos fatos, verifica-se que a vítima estava em uma festa de aniversário na referida localidade quando o senhor Luis Augusto Dourado pediu para que o apelante a levasse para a casa em sua moto. No entanto, durante o percurso, em um trecho ermo e escuro, tentou agarrar a vítima à força sob ameaças de morte caso não ficasse com ele, momento em que G.A. negou e correu, mas foi derrubada e começaram a travar uma luta corporal. O apelante aproveitou-se da oportunidade para despir a vítima e apalpar–lhe o seio esquerdo. Quando a vítima conseguiu se desvencilhar, fugiu em direção à casa de uma moradora. Em suas razões recursais (ID 38261163), o apelante sustenta, em síntese: (i) a insuficiência de provas, requerendo, por conseguinte, sua absolvição; e, subsidiariamente, (ii) a irresignação quanto à valoração negativa da circunstância judicial da culpabilidade, pleiteando, assim, o redimensionamento da pena-base para o mínimo legal. Contrarrazões apresentadas pelo Ministério Público Estadual (ID 43140906), que pugnou pelo desprovimento do recurso. Embora devidamente intimada, a Procuradoria-Geral de Justiça não se manifestou nos autos, conforme certidão de ID 43633120. É o relatório. VOTO Presentes os pressupostos processuais de admissibilidade, conheço do presente recurso. Conforme relatado, o apelante sustenta, em síntese: (i) a insuficiência de provas, requerendo, consequentemente, sua absolvição; e, subsidiariamente, (ii) a inadequada valoração negativa da circunstância judicial da culpabilidade, pleiteando, assim, o redimensionamento da pena-base para o mínimo legal. O pleito recursal não merece acolhida, conforme passo a demonstrar. 1. DA SUFICIÊNCIA PROBATÓRIA Analisando os autos, verifica-se que restou comprovada a materialidade e a autoria delitiva, por meio de depoimentos prestados em sede policial e ratificados posteriormente em juízo, notadamente o depoimento da vítima, (ID 43140381, p. 10-11), relatório do conselho tutelar (ID 43140381, p. 9); exame de corpo de delito (ID 43140381, p. 13- 15) e Certidão de Nascimento da menor (ID 43140381, p. 12) que comprova que na época dos fatos a infante possuía apenas 13 (treze) anos. In casu, constata-se que os depoimentos da vítima são contundentes ao descrever a situação delituosa, como se pode observar nos trechos transcritos a seguir: Em sede policial: (...) por voltas 21:00 horas, quando voltava de um aniversário no Povoado São Luís dos Pacheco, em companhia de REGINALDO, mais conhecido como "PEDRO DE TEÓFILO", nas imediações do Povoado Ilha Terceira, neste município, em lugar desabitado e bastante escuro, este tentou agarrá-la a força, dizendo que ela tinha que "ficar" com ele e que se não o fizesse ele a mataria. Disse que saiu correndo, sendo derrubada pelas pernas e recebendo urna pedrada nas pernas quando estava caída ao chão, travando luta corporal com o REGINALDO. Disse que JOGOU UMA PEDRA NA BOCA DO PEDRO DE TEÓFILO, com o objetivo de se defender e que quando ainda estava caída ao chão, ele tentou tirar a sua blusa, passando a mão em seu seio esquerdo. Disse que conseguiu fugir do ACUSADO, seguindo o curso de um rio até chegar à casa de uma moradora de nome LUIZA. Em juízo: “QUE no dia fato delituoso a informante se encontrava em uma festa no Povoado Ilha Terceira, Município de Palmeirândia/MA, quando por volta das 01:00 hora da manhã quando o seu colega Zé Roxo disse a ela que a mesma iria para casa de carona com o acusado; QUE a informante disse que não queria ir com o acusado porque não o conhecia; QUE em contrapartida o seu amigo Zé Roxo podia ir com o acusado sem nenhum problema, porquanto, conhecia o acusado e era seu amigo; QUE em seguida a informante sentou na moto juntamente com o acusado; QUE o acusado conduzia a moto numa estrada quando em dado momento o mesmo parou a moto e disse à informante que iriam esperar o amigo Zé Roxo; QUE em seguida a informante disse ao acusado ‘que estava muito tarde e que Zé Roxo ia dormir na casa da sua namorada; ato contínuo o acusado disse à informante que era para a mesma ficar com ele; QUE em resposta a informante disse não queria ficar com ele; QUE em seguida o acusado agarrou a informante, passando mãos nos seus seios e no tórax e abdômen; QUE em seguida a informante saiu correndo; QUE o acusado saiu correndo atrás da informante; QUE em dado momento a informante caiu ao solo; QUE o acusado também caiu ao solo e se machucou no rosto; QUE a informante se levantou e foi andando para casa de uma amiga no povoado Ilha Terceira; QUE soube que o acusado foi para o hospital receber cuidados médicos; QUE em outra oportunidade o acusado ficou abusando ela em uma outra festa; QUE o pai do acusado mandou um indivíduo conhecido por Dico de Dedeco, falar com a mãe da informante, ocasião em que referido indivíduo ofereceu R$ 1.000,00 (hum mil reais) à mãe da informante para que tudo fosse esquecido”. Constata-se que o relato da menor, conforme consta no laudo, é coerente e detalhado na descrição dos fatos, em consonância com o seu depoimento judicial. Cabe asseverar que crimes desta natureza geralmente ocorrem em ambientes afastados de demais interferências e longe de outras pessoas, o que sobreleva a carga valorativa das palavras da vítima, sobretudo quando estas são reforçadas por outros elementos probatórios, conferindo fidedignidade ao relato dado, como na espécie. É esse o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. TESE DE NULIDADE. RECONHECIMENTO POR DEMAIS PROVAS NOS AUTOS PRODUZIDAS EM JUÍZO. PALAVRA DA VÍTIMA. ESPECIAL RELEVO. REVOLVIMENTO DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA N. 182, STJ. AGRAVO DESPROVIDO. I - Nos termos da jurisprudência consolidada nesta Corte, cumpre ao agravante impugnar especificamente os fundamentos estabelecidos na decisão agravada. II - Recentemente, a utilização do reconhecimento fotográfico ou pessoal na delegacia, sem atendimento aos requisitos legais, passou a ser mitigada como única prova à denúncia ou condenação. Tal entendimento, contudo, não é aplicável de forma irrestrita, em especial na existência de demais provas, sendo certo ainda que a Resolução CNJ n. 484/2022, além de não refutar o reconhecimento fotográfico de pessoas, traz expressamente as recomendações a serem observadas nos procedimentos futuros, deixando a cargo do julgador a valoração de tal prova. Precedentes. III - No caso dos autos, o reconhecimento da fase policial não foi o único elemento utilizado para embasar a condenação. Toda a dinâmica peculiar dos fatos foi devidamente corroborada pelo conjunto probatório produzido em juízo, inclusive a palavra do policial que acompanhou tudo, da própria vítima e das demais testemunhas. IV - Em crimes cometidos na clandestinidade, sem a presença de qualquer (ou mesmo pouca) testemunha, a palavra da vítima assume especial relevo como meio de prova, nos termos do entendimento desta Corte. Precedentes. V - Assente nesta Corte Superior que o habeas corpus não se presta para a apreciação de alegações de negativa de autoria, em virtude da necessidade de revolvimento do conjunto fático-probatório, o que é inviável na via eleita. Precedentes. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 837.319/GO, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 20/5/2024, DJe de 24/5/2024.) E na mesma linha de intelecção, já se manifestou esta Corte de Justiça: APELAÇÃO CRIMINAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL EM CONTINUIDADE DELITIVA E CONCURSO MATERIAL. ART. 217-A, CAPUT E ARTS. 69 E 71, TODOS DO CÓDIGO PENAL. PLEITO ABSOLUTÓRIO. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. PROCEDÊNCIA PARCIAL DA PRETENSÃO RECURSAL. AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVA PARCIALMENTE COMPROVADAS PELA ACUSAÇÃO. SENTENÇA REFORMADA. I. Conforme jurisprudência do STJ e do STF, nos crimes sexuais, a palavra da vítima, especialmente quando corroboradas por outros elementos probatórios, possui validade como prova, posto que, na maior parte dos casos, tais delitos, por sua própria natureza, não contam com testemunhas e sequer deixam vestígios. II. Demonstradas pela acusação, de forma parcial, a materialidade e a autoria dos delitos imputados ao recorrente, de rigor a decretação da absolvição em relação ao crime do qual o acervo probatório dos autos é insuficiente para legitimar a condenação postulada na denúncia. III. Havendo dúvidas razoáveis acerca da configuração do crime, impõe-se a aplicação do princípio do in dubio por reo. IV. Apelação criminal parcialmente provida para reformar a sentença, julgando-se improcedente a denúncia na parte relativa à vítima Ana Jéssica da Silva, nos termos do art. 386, VII, do CPP. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos de Apelação Criminal nº 0800448-12.2021.8.10.0078, unanimemente e de acordo, em parte, com o parecer da douta Procuradoria Geral de Justiça, a Segunda Câmara de Direito Criminal deu provimento parcial ao recurso, nos termos do voto do Desembargador Relator”. Votaram os Senhores Desembargadores Vicente de Castro (Relator), Francisco Ronaldo Maciel Oliveira e José Luiz Oliveira de Almeida. Funcionou pela Procuradoria Geral de Justiça o Dr. Joaquim Henrique de Carvalho Lobato. São Luís, Maranhão. Desembargador Vicente de Castro Relator (ApCrim 0800448-12.2021.8.10.0078, Rel. Desembargador(a) VICENTE DE PAULA GOMES DE CASTRO, 2ª CÂMARA CRIMINAL, DJe 03/11/2023) Ainda quanto aos depoimentos colhidos sob o contraditório, as demais testemunhas declararam: LUIZA MIRANDA DOURADO: “Que conhece Graciane Araujo; que no dia do fato a vítima chegou em sua casa pela noite; que a vítima lhe chamou e disse que estava correndo de uma pessoa; que ela não disse o nome do acusado; que ela falou que estava vindo da festa; que nega que disse em delegacia que a vítima havia lhe relatado que estava fugindo do acusado por medo de ser estuprada”. VERA LÚCIA FRANÇA PINHEIRO: “Que não se lembra dos fatos; que lembra apenas que a mãe da vítima foi ao conselho tutelar, que fizeram o relatório e encaminharam para o Ministério Público; que lembra de poucas coisas; que lembra que ela relatou que teve a tentativa; que o nome do suspeito era Reginaldo conhecido como Pedro; que viram a vítima; que lembra que ela relatou que a vítima mordeu o braço do acusado para tentar fugir dele”. DJANE DA LUZ PRADO PINHEIRO: “Que a mãe da vítima se deslocou até a sede do conselho tutelar; que ouviram seu relato e encaminharam uma via para o Ministério Público e para a Delegacia de Palmeirândia; que não chegaram a ter contato com a vítima; que ela relatou que o nome do indivíduo responsável pelo crime era Reginaldo; que não conheceu o acusado nem de vista e nem a menor”. Por sua vez, o acusado REGINALDO ALMEIDA DOURADO, relatou em seu interrogatório: “Que os fatos narrados na exordial acusatória não são verdadeiros; que seu amigo Zé Roxo chegou com a vítima e pediu para ele trazer a vítima; que comprou um salgadinho para a vítima; que disse para a vítima que quando passasse a chuva iriam embora; que a vítima morava na casa de sua avó; que quando saíram de lá, caíram na moto na saída; que quando chegaram mais a frente derraparam novamente com a moto; que ele e a vítima se feriram; que mais para frente caíram pela terceira vez de moto; que nesse momento a vítima disse que iria dali embora; que a vítima voltou só; que ele andando em sua moto caiu novamente, com a moto capotando por cima dele; que chegou em casa; que não tocou na vítima; que sabia que a vítima era menor de idade”. Observa-se que versão exculpatória do apelante está dissociada de todo o acervo constante dos autos. Dito isso, constata-se que conjunto probatório permite concluir pela autoria e materialidade do crime, uma vez que os depoimentos transcritos são harmônicos, coerentes e complementares, o que evidencia a prática do estupro de vulnerável, afastando a possibilidade de absolvição. Assim, passo à análise dos demais petitórios. 2. DA DOSIMETRIA DA PENA Na espécie, ao realizar a dosimetria da pena, o juízo a quo analisou as circunstâncias judiciais enunciadas no art. 59 do Código Penal, valorou negativamente a culpabilidade, fixando a pena-base do apelante em 9 (nove) anos de reclusão. Assim foi pontuada a culpabilidade: “Na primeira fase, a culpabilidade, que é anormal a espécie, devido às lesões físicas sofridas pela vítima, decorrente da dinâmica de fuga que teve que empreender, o que agravou a reprovabilidade da conduta do acusado.” Acerca do tema, iniciando pela valoração da culpabilidade, para ser ela considerada em desfavor do Acusado, demanda-se que sobre o crime e sobre o seu autor recaia um juízo de reprovabilidade social mais gravoso do que aquele inerente ao conteúdo do tipo penal. Isso significa que a conduta deve apresentar maior censurabilidade do que aquela comumente esperada na prática delitiva processada. Nas palavras de Cezar Roberto Bitencourt: Na verdade, impõe-se que se examine aqui a maior ou menor censurabilidade do comportamento do agente, a maior ou menor reprovabilidade da conduta praticada, não se esquecendo, porém, a realidade concreta em que ocorreu, especialmente a maior ou menor exigibilidade de outra conduta. O dolo que agora se encontra localizado no tipo penal - na verdade em um dos elementos do tipo, qual seja, a ação - pode e deve ser aqui considerado para avaliar o grau de censurabilidade da ação tida como típica e antijurídica: quanto mais intenso for o dolo, maior será a censura; quanto menor a sua intensidade, menor será a censura. (BITENCOURT. Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: vol. 1. 26 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020, p. 1834-1835. Versão eBook). O apelante, ao infligir escoriações à vítima na tentativa de constrangê-la à prática de ato sexual, evidenciou maior reprovabilidade em sua conduta. Assim, revela-se plenamente cabível a valoração negativa da circunstância judicial da culpabilidade, razão pela qual deve ser mantida. Diante disso, revela-se acertada a condenação consignada na sentença, inclusive no que pertine aos demais aspectos da dosimetria da pena, adequadamente realizada. Ante o exposto, CONHEÇO do recurso e, no mérito, NEGO-LHE PROVIMENTO, conforme a fundamentação supra. Após o trânsito em julgado, dê-se baixa nos autos ao juízo de origem para a adoção das providências cabíveis. É como voto. Sala das Sessões da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em São Luís/MA, data do sistema. Desembargador SEBASTIÃO JOAQUIM LIMA BONFIM Relator

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Processo nº 0000657-77.2016.8.10.0049

ID: 255745272

Tribunal: TJMA Órgão: 7ª Câmara Cível Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0000657-77.2016.8.10.0049

Data de Disponibilização: 14/04/2025

Polo Ativo:

JOSE RIBAMAR LOPES DE ARAUJO

Polo Passivo:

Acórdão (expediente)

Advogados:

PAULA HAECKEL TIMES DE CARVALHO ALMEIDA GOMES

OAB/PE XXXXXX Desbloquear

LUIS CARLOS OLIVEIRA DA SILVA

OAB/MA XXXXXX Desbloquear

APELAÇÃO N. 0000657-77.2016.8.10.0049 Sessão Virtual : 25.3 a 1.4.2025 Apelante : José Ribamar Lopes de Araújo Advogado : Luis Carlos Oliveira da Silva (OAB/MA 14.326-A) Apelada : Metropolitan Life S… APELAÇÃO N. 0000657-77.2016.8.10.0049 Sessão Virtual : 25.3 a 1.4.2025 Apelante : José Ribamar Lopes de Araújo Advogado : Luis Carlos Oliveira da Silva (OAB/MA 14.326-A) Apelada : Metropolitan Life Seguros e Previdência Privada S/A Advogada : Paula Haeckel Times de Carvalho Almeida Gomes (OAB/PE 38.343-A) Órgão Julgador : Sétima Câmara Cível Relator : Desembargador Josemar Lopes Santos Ementa: APELAÇÃO. DIREITO CIVIL. PRESCRIÇÃO EM AÇÃO DE COBRANÇA DE SEGURO. TERMO INICIAL. CIÊNCIA INEQUÍVOCA DA INCAPACIDADE LABORAL. CASSAÇÃO DA SENTENÇA. APELO CONHECIDO E PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação interposta contra sentença da 1ª Vara do Termo Judiciário de São Luís/MA, que reconheceu a prescrição da pretensão deduzida em ação de cobrança securitária, extinguindo o processo com resolução do mérito, razão pela quão o apelante pleiteia a reforma da sentença para afastar a prescrição com o prosseguimento da demanda na instância de origem. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em definir o marco inicial do prazo prescricional para a ação de cobrança de cobertura securitária em razão de sinistro, sendo controvertido se o termo inicial ocorre com a concessão do auxílio-doença ou com a ciência inequívoca da incapacidade laboral permanente. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A prescrição, conforme o Código Civil, limita a pretensão e a ação, não alcançando o direito em si. Segundo o art. 178, § 6º, II, do CC/1916 e as Súmulas 278 do STJ e 230 do STF, o termo inicial do prazo prescricional é a data em que o segurado toma ciência inequívoca da sua incapacidade laboral e não a data de concessão de benefício de auxílio-doença, que pressupõe apenas incapacidade temporária. 4. Precedentes do STJ (REsp n. 202.846/SP) indicam que o gozo de auxílio-doença, por sua natureza transitória, não constitui termo inicial para a prescrição ânua nas ações de cobrança contra seguradora, sendo necessária a ciência inequívoca da incapacidade laboral permanente para deflagrar o prazo. IV. DISPOSITIVO E TESE 5. Recurso provido. Sentença anulada com retorno dos autos à instância de origem para prosseguimento da demanda. Tese de julgamento: “O prazo prescricional ânuo em ação de cobrança securitária se inicia na data em que o segurado tem ciência inequívoca da incapacidade laboral permanente, e não na concessão de benefício previdenciário temporário como o auxílio-doença”. __________________________ Dispositivos relevantes citados: CC/1916, art. 178, § 6º, II; CF/1988, art. 93, IX. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp n. 202.846/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, j. 17.12.2004. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, “a Sétima Câmara Cível, por votação unânime, conheceu e deu provimento ao recurso, nos termos do voto do Desembargador Relator”. Participaram do julgamento os Desembargadores Josemar Lopes Santos (Presidente e Relator), Gervásio Protásio dos Santos Júnior e Raimundo Jose Barros de Sousa. Funcionou pela Procuradoria Geral de Justiça o Dr. Joaquim Henrique de Carvalho Lobato. São Luís/MA, 01 de abril de 2024. Desembargador Josemar Lopes Santos Relator RELATÓRIO Cuida-se de apelação interposta por José Ribamar Lopes de Araújo contra sentença exarada pela Juíza de Direito da 1ª Vara do Termo Judiciário de São Luís da Comarca da Ilha de São Luís /MA (ID n. 17769651), que, nos autos da ação de cobrança securitária ajuizada em face da Metropolitan Life Seguros e Previdência Privada S/A, reconheceu a prescrição da pretensão deduzida na inicial, extinguindo o processo com resolução do mérito. Da petição inicial (ID n. 17769645): O apelante ajuizou a demanda objetivando a condenação da apelada no pagamento da cobertura securitária devida, em razão da ocorrência de sinistro objeto da apólice durante a sua vigência. Da apelação (ID n. 17769653): Em suas razões recursais, o apelante almeja a reforma da sentença para que a prescrição seja afastada e o retorno dos autos ao juízo de origem para prosseguimento do feito. Das contrarrazões (ID n. 17769655): A apelada requer o desprovimento do recurso. Do parecer da Procuradoria-Geral de Justiça (ID n. 17769657): Manifestou-se no sentido de que seja o apelo conhecido e, no mérito, provido. É o relatório. VOTO Da admissibilidade recursal Presentes os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, conheço da apelação. Prejudicial de mérito - prescrição O instituto da prescrição é um limite temporal à eficácia das pretensões e das ações, servindo ao interesse público, ao garantir a segurança jurídica e o descongestionamento dos Tribunais que deixam de enfrentar questões relacionadas a situações muito antigas, de comprovação remota. Dessa forma, a prescrição não alcança o direito em si da parte, mas a sua pretensão e, consequentemente, a ação, conforme lições doutrinárias de Murilo Teixeira Avelino, a seguir transcritas: A prescrição se caracteriza pela perda da pretensão ou da demanda, ou seja, pela possibilidade de exigir de outrem uma prestação. Aquele que, titular de uma pretensão, não a exerce ou, encontrando resistência a ela, não propõe a ação no prazo devido, sofre com a prescrição. Com efeito, ultrapassado o interregno prescricional, apesar de o direito se manter ileso, não mais poderá ser exigido em juízo. Esta lição decorre do princípio da actio nata adotada pelo ordenamento civil brasileiro que, embora sem previsão expressa no Código Civil de 1916 aplicado na espécie, o vigente Código Civil de 2002 positivou o referido princípio no art. 1891. Assim sendo, segundo o art. 178, § 6º, II, do CC/19162 e os entendimentos sumulados 278 do STJ3 e 230 do STF4, o termo inicial do prazo prescricional na ação de indenização é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral. À luz do direito pátrio, não há como manter a tese adotada na sentença de que o deferimento ou a cessação do benefício previdenciário de auxílio-doença é o marco inicial para a contagem do prazo prescricional, já que o referido benefício previdenciário não se confunde com o da aposentadoria por invalidez, a qual pressupõe que o segurado da Previdência Social se encontre, comprovadamente, incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, a teor do art. 42, da Lei n. 8.213/91. Destarte, a concessão do auxílio-doença decorre da incapacidade temporária do segurado para o trabalho ou para a sua atividade habitual, em razão de doença ou de lesão, nos termos do art. 59, da Lei n. 8.213/1991, razão pela qual não serve a respectiva data para a fixação do termo inicial da prescrição ânua discutida. Sobre o tema, a jurisprudência do STJ se firma nessa linha, eis precedente adotando tal entendimento: CIVIL. SEGURO DE VIDA E ACIDENTES PESSOAIS EM GRUPO. PRESCRIÇÃO ÂNUA. SÚMULA 101. TERMO INICIAL. AUXÍLIO-DOENÇA. INAPLICABILIDADE. 1. O prazo prescricional da ação contra o segurador tem início quando o segurado toma conhecimento da incapacidade laboral e da respectiva amplitude (CC/16; Art. 178, § 6º, II e Súmula 101). 2. O gozo de auxílio-doença do INSS não marca termo inicial da prescrição ânua para cobrança de indenização do segurado em grupo contra seguradora. É que o auxílio-doença, podendo ser transitório (Lei 8.213/91; Art. 59), não se vincula a incapacidade permanente. Em regra, o segurado só tem ciência da incapacidade laboral, total ou parcial, mediante o conhecimento do laudo pericial. (STJ - Resp. n. 202.846/SP, Relator o Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, Acórdão publicado no DJ de 17/12/2004) - grifei Diante das premissas acima fixadas e do cenário fático dos autos, não se extrai qualquer elemento que demonstre que quando do ajuizamento da ação ocorrido em 5/4/2016 havia decorrido mais de 1 (um) ano da ciência inequívoca do segurado da sua invalidez permanente. Conclusão Por tais razões, de acordo com o parecer ministerial, com observância ao disposto no art. 93, IX, da Constituição Federal de 1988 e por tudo mais que dos autos consta, CONHEÇO DO APELO e DOU a ele PROVIMENTO para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à instância de origem para regular processamento do feito, nos termos da fundamentação supra. Em que pese o provimento recursal, não há verba honorária na espécie, uma vez cassada a sentença, a sua fixação se dará quando da prolação da futura decisão. É como voto. Sala das Sessões da Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, São Luís, 01 de abril de 2025. Desembargador Josemar Lopes Santos Relator 1 Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206. 2 Art. 178. Prescreve: § 6º Em um ano: II. A ação do segurado contra o segurador e vice-versa, se o fato que a autoriza se verificar no país, contado o prazo do dia em que o interessado tiver conhecimento do mesmo fato. 3 O termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral. 4 A prescrição da ação de acidente do trabalho conta-se do exame pericial que comprovar a enfermidade ou verificar a natureza da incapacidade.

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Processo nº 0000657-69.2017.8.10.0105

ID: 276336565

Tribunal: TJMA Órgão: 3ª Câmara Criminal Classe: APELAçãO CRIMINAL Nº Processo: 0000657-69.2017.8.10.0105

Data de Disponibilização: 22/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

ESTADO DO MARANHAO - PROCURADORIA GERAL DA JUSTICA

Acórdão (expediente)

SESSÃO INICIADA EM 12 DE MAIO DE 2025 E FINALIZADA EM 19 DE MAIO DE 2025 TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO CRIMINAL APELAÇÃO CRIMINAL NA AÇÃO PENAL Nº 0000657-69.2017.8.10.0105 APELANTE: MANOEL CLÉCIO BARBO… SESSÃO INICIADA EM 12 DE MAIO DE 2025 E FINALIZADA EM 19 DE MAIO DE 2025 TERCEIRA CÂMARA DE DIREITO CRIMINAL APELAÇÃO CRIMINAL NA AÇÃO PENAL Nº 0000657-69.2017.8.10.0105 APELANTE: MANOEL CLÉCIO BARBOSA DA SILVA DEFENSOR PÚBLICO: LUÍS EMÍDIO LIMA DE SOUSA FILHO APELADO: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MARANHÃO PROMOTOR DE JUSTIÇA: RENATO IGHOR VITURINO ARAGÃO ORIGEM: VARA ÚNICA DA COMARCA DE PARNARAMA INCIDÊNCIA PENAL: ART. 213 DO CÓDIGO PENAL. RELATORA: DESEMBARGADORA MARIA DA GRAÇA PERES SOARES AMORIM DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. ESTUPRO. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. DESCLASSIFICAÇÃO PARA TENTATIVA DE ESTUPRO. VIABILIDADE. DESCLASSIFICAÇÃO PARA IMPORTUNAÇÃO SEXUAL. IMPOSSIBILIDADE. DOSIMETRIA DA PENA. PENA-BASE. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS. CULPABILIDADE E CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. FUNDAMENTAÇÕES IDÔNEAS. VETORES CORRETOS. TENTATIVA. REDUÇÃO DA PENA NA FRAÇÃO MÁXIMA. INVIABILIDADE. RÉU QUE PERCORREU A QUASE TOTALIDADE DO ITER CRIMINIS. REGIME SEMIABERTO MANTIDO. PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação Criminal interposta pelo recorrente contra sentença que o condenou à pena de 7 (sete) anos de reclusão, em regime semiaberto, pela prática do crime de estupro (art. 213, caput, do Código Penal). O recorrente busca a absolvição por insuficiência de provas ou, subsidiariamente, a desclassificação para importunação sexual (art. 215-A do Código Penal) ou estupro tentado (art. 213 c/c art. 14, II, do Código Penal). Requer, ainda, a revisão da dosimetria da pena. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há quatro questões em discussão: (i) verificar se as provas constantes nos autos justificam a absolvição do apelante por ausência de autoria ou materialidade do delito; (ii) analisar se a conduta deve ser desclassificada para importunação sexual ou reconhecida como estupro tentado; (iii) Verificar a adequação da dosimetria da pena, especialmente quanto à valoração negativa das circunstâncias judiciais, à aplicação da causa de diminuição referente à tentativa e à fixação do regime inicial de cumprimento da pena. III. RAZÕES DE DECIDIR 2. As declarações da vítima, corroboradas por testemunha e demais provas constantes dos autos, demonstram a materialidade e a autoria delitiva, evidenciando que o recorrente tentou constranger a vítima à conjunção carnal, frustrado por circunstâncias alheias à sua vontade. 3. O crime de importunação sexual (art. 215-A do Código Penal) não se aplica ao caso, uma vez que a conduta foi praticada mediante grave ameaça, elemento típico do crime de estupro. 4. Reconhece-se que a conduta do acusado se amolda ao delito de estupro na modalidade tentada, nos termos do art. 213 c/c art. 14, II, do Código Penal, considerando que o iter criminis foi interrompido pela reação da vítima antes da consumação do ato. 5. Na dosimetria da pena, a culpabilidade e as circunstâncias do crime foram corretamente valoradas de forma negativa, justificando a fixação da pena-base acima do mínimo legal. 6. A fração de redução pela tentativa foi fixada em 1/3 (um terço), considerando o estágio avançado do iter criminis e a proximidade da consumação do delito. 7. Mantém-se o regime inicial semiaberto, conforme disposto no art. 33, § 2º, "b", do Código Penal, em razão da pena definitiva fixada e das circunstâncias judiciais desfavoráveis. IV. DISPOSITIVO E TESE 9. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: 1. O crime de estupro tentado caracteriza-se quando, iniciada a execução do ato, a consumação é frustrada por circunstâncias alheias à vontade do agente. 2. Não se aplica a desclassificação para importunação sexual em condutas praticadas mediante violência ou grave ameaça. 3. A redução da pena na tentativa deve observar o estágio alcançado no iter criminis, aplicando-se fração menor quando a consumação está próxima. Dispositivos relevantes citados: Código Penal, arts. 14, II, 59, 213, caput, e 215-A; Código de Processo Penal, art. 155. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no AREsp n. 2.030.511/SP, rel. Min. Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, j. 26/04/2022; TJ-MA, Apelação Criminal n. 0316492017, Rel. Des. Tyrone José Silva, Terceira Câmara Criminal, j. 28/01/2019. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos de Apelação Criminal na Ação Penal nº. 0000657-69.2017.8.10.0105, “unanimemente e em desacordo com o parecer ministerial, a Terceira Câmara de Direito Criminal deu parcial provimento ao recurso, nos termos do voto da Desembargadora Relatora”. Votaram os Senhores Desembargadores Maria da Graça Peres Soares Amorim, José Nilo Ribeiro Filho e Talvick Afonso Atta de Freitas. Funcionou pela Procuradoria Geral de Justiça a Dr. Joaquim Henrique de Carvalho Lobato. São Luís, MA,data do sistema. Desembargadora Maria da Graça Peres Soares Amorim Relatora RELATÓRIO Trata-se de Apelação Criminal interposta contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Parnarama/MA (ID 40012515), pela qual Manoel Clécio Barbosa da Silva foi condenado à pena definitiva de 7 (sete) anos de reclusão, pelo cometimento do crime previsto no artigo 213 do Código Penal. Segundo descreve a denúncia (ID 40012491), no dia 12 de março de 2017, por volta das 22h, na residência situada na Rua do Rosário, casa s/nº, Bairro Terra Nova, em Parnarama/MA, a vítima estava em sua residência, em seu quarto, com seu filho de 1 (um) ano de idade, quando foi surpreendida pelo denunciado, que se encontrava despido, já em sua cama, e lhe afirmou: "Cala a boca, faz tempo que tu sabe que sou louco por ti, tira a roupa". Consta dos autos que o denunciado tampou a boca de Aline para que ela não gritasse. A vítima tomou um grande susto, mas manteve a calma e pediu ao denunciado para se acalmar, afirmando que tiraria a roupa e "ficaria" com ele. Aproveitando-se da situação, a ofendida conseguiu se soltar e correu pela porta da frente de sua casa, pedindo ajuda aos vizinhos. As razões do apelo estão expostas no ID. 40012522, requerendo a absolvição do apelante, tendo em vista a insuficiência de provas para a condenação. Subsidiariamente, requer a desclassificação do crime para importunação sexual (art. 215-A do CPB), na modalidade tentada, uma vez que o ato libidinoso — embora iniciado pelo agente ao deitar-se nu sobre a vítima — não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade (fuga da vítima). Ainda que não acolhida a modalidade tentada, pleiteia-se o reconhecimento da forma consumada de importunação sexual. Caso esse pedido não seja acolhido, a defesa requer a desclassificação da conduta para estupro tentado (art. 213 c/c art. 14, II, do CPB). Requer, ainda, a reforma da dosimetria da pena, com o afastamento das circunstâncias judiciais valoradas negativamente e a fixação da pena no mínimo legal, aplicando a causa de diminuição pela tentativa no patamar máximo de dois terços. Por fim, pleiteia a concessão dos benefícios da justiça gratuita, bem como a fixação de regime inicial mais favorável ao acusado, no caso, o regime aberto, após a aplicação da causa de diminuição de pena no referido patamar. Contrarrazões do Ministério Público (ID nº 40012531), em que pugna pelo desprovimento do recurso e que seja mantida incólume, em todos os seus termos, a sentença recorrida. Em parecer elaborado pela Drª. Maria Luiza Ribeiro Martins, digna Procuradora de Justiça, a PGJ, manifesta-se “pelo conhecimento e DESPROVIMENTO do presente apelo, mantendo-se in totum a decisão vergastada, por seus próprios termos e legais fundamentos” (ID 42130814). É o relatório. Remetam-se os autos à douta Revisão, na forma do art. 323, I do RITJMA, sendo cabível o julgamento do feito em sessão virtual, nos termos do art. 343 do RITJMA. São Luís/MA, data do sistema. Desembargadora Maria da Graça Peres Soares Amorim Relatora VOTO Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de admissibilidade, conheço do recurso. Conforme relatado, Manoel Clécio Barbosa da Silva foi condenado à pena de 7 (sete) anos de reclusão, a ser cumprida em regime semiaberto, pela prática do crime previsto no art. 213 do Código Penal. O fato ocorreu no dia 2 de março de 2017, por volta das 22h, na residência localizada na Rua do Rosário, s/nº, Bairro Terra Nova, no município de Parnarama/MA. Na ocasião, o denunciado, de forma livre e consciente, mediante o uso de violência e grave ameaça, constrangeu a vítima a praticar conjunção carnal. O ato somente não se consumou por circunstâncias alheias à vontade do denunciado. Assim, pretende o recorrente, primordialmente, por meio do recurso de apelação interposto, a reforma da decisão condenatória, para que seja absolvido da acusação contra si imputada, sob o fundamento de inexistência de provas suficientes de autoria e materialidade. Requer, subsidiariamente, a desclassificação do crime para importunação sexual tentada (art. 215-A do CP), considerando que o ato não se consumou devido à fuga da vítima. Caso não seja acolhida a tese da tentativa, pleiteia-se o reconhecimento da forma consumada de importunação sexual. Não sendo aceita essa desclassificação, requer a tipificação como estupro tentado (art. 213 c/c art. 14, II, do CP). Adicionalmente, solicita a revisão da dosimetria da pena, com a fixação no mínimo legal e aplicação da causa de diminuição pela tentativa no patamar máximo de dois terços. Pugna, ainda, a concessão da justiça gratuita e a fixação de regime inicial aberto após a redução da pena. Desta forma, nas razões recursais, a defesa requer a desclassificação do delito de estupro praticado contra a vítima para a modalidade tentada, pedido que merece acolhimento, conforme se demonstra a seguir. Sem embargo, verifico que tanto a materialidade quanto a autoria delitiva do crime de estupro na forma tentada estão satisfatoriamente demonstradas pelos depoimentos da vítima e da testemunha colhidos durante o inquérito policial, devidamente ratificados na etapa judicial, quando submetidos ao crivo do contraditório e da ampla defesa. Nesse sentido, a materialidade restou devidamente comprovada pelo Boletim de Ocorrência nº 129/2017 (ID 40012491, pág. 11) e pelo Relatório Psicossocial/Escuta Qualificada – CREAS (ID 40012491, págs. 20/21). Desta forma, a negativa do apelante é repelida pelas declarações harmônicas e coerentes da vítima e da testemunha. A ofendida declarou em depoimento prestado em juízo: “que confirma os fatos relatados na denúncia; que estava dormindo com o seu filho; que quando acordou o acusado estava com a mão na sua boca, pedindo que ficasse em silêncio; que o acusado afirmou que ela já sabia que ele era 'louco por ela', palavras usadas por ele; que estava vestida e ele pediu que tirasse a roupa; que pediu para o acusado lhe soltar para poder tirar a roupa; que no momento em que ele lhe soltou correu para a rua para pedir socorro; que ele veio atrás e jogou um balde nas suas costas; que quando ele viu que tinha vizinhos acordados, saiu pela mesma porta e foi embora; que já conhecia o acusado; que ele mora em frente a sua casa; que ele sabia que morava sozinha com o seu filho; que ele entrou pelo telhado; que ele estava sem roupa quando ficou em cima do seu corpo; que, à época dos fatos, estava sozinha em casa com seu filho de cerca de 1 ano; que o seu filho estava na mesma cama; que gritou no meio da rua pedindo socorro; que quando correu, o seu filho ficou na cama; que não viu quando o acusado saiu da casa; que o vizinho que falou que o acusado já tinha saído da residência; que depois desse fato já encontrou o acusado, mas não se falaram; que tem medo, porque mora sozinha”. Corroborando com as declarações da vítima, a testemunha Marcolino De Almeida afirmou na etapa judicial: “ que reside próximo à casa da vítima e, na data dos fatos, estava na frente da casa do seu amigo Carlos André quando ouviu gritos de socorros da vítima, a qual estava apavorada dizendo que estavam tentando estuprá-la. Informou que a vítima estaca desesperada, tremendo e pedindo socorro que ela havia afirmado que o acusado tinha invadido a casa dela e tentado o estupro. Disse que percebeu que as portas da frente e da cozinha da casa da vítima estavam abertas, de modo que imediatamente, juntamente de outros vizinhos entraram na casa à procura do estuprador, mas esta já havia se evadido do local. Relatou que conheço o acusado e que este reside próximo ao local dos fatos” (transcrição retirada da sentença de ID.40012515). Em seu interrogatório em Juízo, o sentenciado negou as acusações: “que na data dos fatos havia usando entoe entes e estava embriagado, de modo que passou a noite em sua residência e somente foi noticiado do ocorrido no dia seguinte”. (transcrição retirada da sentença de ID.40012515). No entanto, a negativa de autoria sustentada pelo apelante em seu interrogatório não encontra amparo em nenhum outro meio de prova, não possuindo, de forma isolada, a força necessária para desconstituir o vasto arcabouço probatório reunido em seu desfavor. Ou seja, não merece credibilidade a versão do apelante diante do depoimento da vítima, que, como já transcrito, apresentou declarações claras e detalhadas, corroboradas pela testemunha, restando evidente a tentativa do acusado de praticar atos sexuais contra a ofendida. Conforme demonstrado nos autos, o réu, completamente despido, surpreendeu a vítima enquanto ela repousava em sua cama, deitando-se sobre ela e tampando-lhe a boca para impedir que pedisse ajuda. Constata-se que o recorrente, conhecido da vítima e ciente de que ela residia sozinha com seu filho, invadiu sua residência e tentou forçá-la a manter relação sexual. Nota-se que há fortes evidências de que a vítima passou por uma experiência traumática, conforme relatou em audiência de instrução e pelo Relatório Psicossocial/Escuta Qualificada – CREAS (ID 40012491, pág. 20/21), que concluiu que, durante a escuta, a ofendida demonstrou comportamento retraído, choro fácil, pobre capacidade cognitiva e dificuldade para estabelecer contato visual. É de se notar que em crimes sexuais da espécie, as declarações da vítima, especialmente quando corroboradas por outros elementos, possuem grande valor probatório, porque, na maioria dos casos, tais delitos, por sua natureza, não contam com testemunhas e, por vezes, não deixam vestígios. Eis o entendimento do colendo Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria: “PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. VIOLAÇÃO AO ART. 155 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL - CPP. NÃO OCORRÊNCIA. CONDENAÇÃO LASTREADA EM PROVAS COLHIDAS NO INQUÉRITO E EM JUÍZO. (...) 1.1. Consoante a jurisprudência desta Corte, em crimes de natureza sexual, a palavra da vítima possui relevante valor probatório, uma vez que nem sempre deixam vestígios e geralmente são praticados sem a presença de testemunhas. Precedentes.” (AgRg no AREsp n. 2.030.511/SP, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 26/4/2022, DJe de 3/5/2022). “PENAL. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. DECLARAÇÃO DA VÍTIMA, CORROBORADA PELO DEPOIMENTO DA GENITORA. REVALORAÇÃO DE PROVA PERMITIDA. AFASTAMENTO DA SÚMULA N. 7 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ. PROVAS SUFICIENTES PARA A CONDENAÇÃO. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A jurisprudência desta Corte admite a condenação pelo cometimento de delitos sexuais, que geralmente são praticados na clandestinidade, com base na palavra da vítima, assumindo esta prova especial relevância, mormente se consonante às demais provas dos autos. (...).” (AgRg no AREsp n. 2.009.659/TO, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 15/3/2022, DJe de 21/3/2022). “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. ART. 213 C/C ART. 226, II E ART. 234-A, III, POR DIVERSAS VEZES, N/F DO ART. 71, TODOS DO CÓDIGO PENAL. (...) - A palavra da vítima, como espécie probatória positivada no art. 201 do Código de Processo Penal, nos crimes praticados - à clandestinidade - no âmbito das relações domésticas ou nos crimes contra a dignidade sexual, goza de destacado valor probatório, sobretudo quando evidencia, com riqueza de detalhes, de forma coerente e em confronto com os demais elementos probatórios colhidos na instrução processual, as circunstâncias em que realizada a empreitada criminosa (AgRg no AREsp n. 1.275.084/TO, Rel. Ministra LAURITA VAZ, Sexta Turma, julgado em 28/5/2019, DJe 5/6/2019). (...).” (AgRg no HC n. 655.918/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 11/5/2021, DJe de 14/5/2021). No entanto, não se pode afirmar com a certeza exigida que ocorreram atos libidinosos suficientes para configurar o estupro consumado. Ainda que seja claro o desejo do apelante de manter relação sexual com a vítima, tal intento foi frustrado devido à rápida reação dela, que conseguiu fugir, impedindo a continuidade da ação. A intervenção imediata da vítima interrompeu o ato, evidenciando a interrupção do iter criminis. Assim, a consumação do delito de estupro foi evitada por circunstâncias alheias à vontade do acusado. Nesse contexto, em uma análise de adequação típica dos fatos, entendo que a conduta do apelante se enquadra no crime de estupro tentado, nos termos do artigo 213, combinado com o artigo 14, inciso II, do Código Penal. Não há elementos que justifiquem a absolvição, mas impõe-se a necessária desclassificação do crime consumado para a modalidade tentada em relação à vítima. De fato, os depoimentos são claros, harmônicos e coerentes, inexistindo contradições ou outra prova com força suficiente para afastar a condenação, evidenciando, portanto, a prática do crime de estupro na forma tentada. Relevante mencionar que tal entendimento está em plena consonância com a jurisprudência predominante sobre o tema, que exige a ocorrência de atos libidinosos suficientes para configurar a consumação do crime de estupro. A ausência de tais elementos no caso concreto impõe, necessariamente, a desclassificação para a modalidade tentada, afastando a hipótese de consumação. Nesse sentido, destaco o entendimento do Tribunal de Justiça do Maranhão: PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ESTUPRO NA FORMA TENTADA (ART. 213 C/C ART. 14, INCISO II, DO CÓDIGO PENAL). ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. INVIABILIDADE. MATERIALIDADE, AUTORIA E CULPABILIDADE SUFICIENTEMENTE DEMONSTRADAS EM FACE DO APELANTE. REDUÇÃO DA PENA-BASE. DESCABIMENTO. APENAMENTO INICIAL QUE FOI DEVIDAMENTE FUNDAMENTADO PELO JUÍZO RECORRIDO, NOS TERMOS DO ART. 59 DO CÓDIGO PENAL. REDUÇÃO DA PENA NA TERCEIRA FASE DA DOSIMETRIA. CABIMENTO. JUÍZO DE BASE QUE RECONHECEU A OCORRÊNCIA DO CRIME DE ESTUPRO NA FORMA TENTADA MAS NÃO REDUZIU A PENA DO APELANTE NA FORMA DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 14 DO CÓDIGO PENAL. REDIMENSIONAMENTO DA PENA QUE SE IMPÕE. RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE. ; 1) Nos termos do art. 213 do Código Penal, comete o crime de estupro o agente que Nome alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso. ; 2) De acordo com o art.14, inciso II, do Código Penal, considera-se o crime tentado quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente. Nesse caso, salvo disposição em contrário, pune-se a tentativa com a pena correspondente ao crime consumado, diminuída de um a dois terços, conforme parágrafo único do art. 14 do Código Penal; 3) Comprovado nos autos que o apelante, mediante graves ameaças e emprego de efetiva violência física, tentou praticar conjunção carnal com a vítima, não consumando o ato por razões alheias à sua vontade, de rigor o reconhecimento de que a sentença recorrida está correta quando condena o apelante pela prática do crime de estupro na forma tentada, capitulado no art. 213 c/c art. 14, inciso II, do Código Penal, devendo ser mantido o julgado neste ponto. (...) (TJ-MA 0316492017, Relator: TYRONE JOSÉ SILVA, TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL, Data de Publicação: 28/01/2019) Por outro lado, revela-se insustentável o pedido subsidiário de desclassificação para o crime de importunação sexual, previsto no art. 215-A do Código Penal, uma vez que tal dispositivo pressupõe a prática de ato libidinoso sem o emprego de violência ou grave ameaça, circunstâncias não verificadas no caso concreto, haja vista que o réu tapou a boca da vítima, ameaçando-a para que permanecesse calada. Nessa linha de raciocínio, cita-se o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ALEGAÇÃO INEXISTÊNCIA DE MATERIALIDADE DE ESTUPRO. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DE PROVAS. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE IMPORTUNAÇÃO SEXUAL. IMPOSSIBILIDADE. VIOLÊNCIA CONCRETA. AGRAVO DESPROVIDO. 1. Se as instâncias ordinárias, mediante valoração do acervo probatório produzido nos autos, em especial as declarações da vítima, entenderam, de forma fundamentada, haver prova da materialidade e da autoria dos crimes imputados ao paciente, inviável na célere via do habeas corpus, que exige prova pré-constituída, pretender conclusão diversa. 2. Inviável a desclassificação do crime de estupro para o de importunação sexual em razão do detalhamento da violência e grave ameaça no caso concreto, que restaram demonstradas a partir das provas. 3. A jurisprudência pátria é assente no sentido de que, nos delitos contra a liberdade sexual, por frequentemente não deixarem vestígios, a palavra da vítima tem valor probante diferenciado. 4. Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg no HC: 853991 PB 2023/0330828-6, Relator: Ministro RIBEIRO DANTAS, Data de Julgamento: 15/04/2024, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/04/2024). Ademais, em nenhum momento o acusado teve a intenção de meramente importunar a vítima. Pelo contrário, ficou demonstrado que o réu agiu com vontade livre e consciente de satisfazer sua lascívia, na tentativa de praticar atos libidinosos contra a vítima. Nesse contexto, conclui-se pela necessária readequação jurídica dos fatos. A condenação pelo crime de estupro tentado é medida que se impõe, afastando a hipótese de absolvição ou de desclassificação para o delito de importunação sexual, seja na modalidade tentada ou consumada, garantindo, assim, o correto enquadramento da conduta do acusado. Dessa forma, passo a apreciar a tese recursal secundária, relativa à retificação da dosimetria da pena. Por certo, sabe-se que cada uma das três etapas de fixação da pena (art. 68 do CP)[1] deve ser suficientemente fundamentada pelo juiz sentenciante. Busca-se, com tal imposição, além de garantir a correta individualização da sanção penal, assegurar ao réu o exercício da ampla defesa, ambos direitos fundamentais de todo cidadão (CF, art. 5º, XLVI e LV)[2]. No que se refere à primeira fase da dosimetria, correspondente ao estabelecimento da pena-base, a majoração da sanção mínima legalmente prevista para o crime imputado ao acusado deve ser justificada pela presença de circunstâncias judiciais desfavoráveis, concretamente demonstradas, conforme dispõe o art. 59 do Código Penal[3]. Sendo assim, o magistrado de base fixou a pena-base em 7 (sete) anos de reclusão, justificando sua aplicação acima do mínimo legal – que é de 6 (seis) anos – em face da valoração negativa de duas das oito circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal, a saber: culpabilidade e circunstâncias do crime. Para melhor análise, transcrevo o fragmento da sentença sobre o ponto em alusão (ID nº 40012515): “Analisando as circunstâncias do art. 59 do CP, verifico que o réu agiu com culpabilidade reprovável, grau de dolo exagerado, porquanto adentrou à casa da vítima à noite, premeditadamente, enquanto esta descansava para a execução do crime. (...) Quanto às circunstâncias em que ocorreram os fatos, verifico que estas demonstram uma maior ousadia do sentenciado em sua execução, porquanto o crime foi cometido enquanto o filho menor da vítima dormia na adjacência, conforme relatado nos autos (...).” Quanto a culpabilidade, é cediço que para fins de individualização da pena, deve ser compreendida como o juízo de reprovabilidade da conduta, ou seja, o menor ou maior grau de censura do comportamento do réu. Deste modo, constata-se a idoneidade dos fundamentos apontados pelo juízo de origem para valorar negativamente a culpabilidade, pois se mostra mais reprovável a conduta daquele que comete o delito ao adentrar na residência da vítima durante o período noturno, enquanto ela descansava, de forma premeditada. Ressalte-se que o réu entrou na residência da vítima pelo telhado, de maneira planejada. Nesse sentido, destaca-se o seguinte precedente: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. EXISTÊNCIA DE RELACIONAMENTO AMOROSO E CONSENTIMENTO. IRRELEVÂNCIA. DOSIMETRIA. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. CULPABILIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS E CONSEQUÊNCIAS DO DELITO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA.AGRAVO IMPROVIDO. 1. Esta Corte Superior firmou entendimento no sentido de que, nos delitos de estupro de vulnerável, a existência de relacionamento amoroso entre autor e vítima não afastam a tipicidade da conduta. Precedentes. 2. É idônea a valoração negativa da culpabilidade fundada na existência de premeditação na prática do delito, bem como das consequências do crime, em razão do sofrimento a que submetida a vítima, ao ser hostilizada no ambiente familiar - uma vez que autor e vítima são primos -, após ter sido violentada, evidenciando uma maior reprovabilidade. 3. Agravo regimental improvido. (STJ - AgRg no AREsp: 1339190 DF 2018/0198502-0, Relator: Ministro NEFI CORDEIRO, Data de Julgamento: 21/03/2019, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 02/04/2019). Grifou-se. De igual modo, as circunstâncias do crime também foram idoneamente valoradas como desfavoráveis com base em elementos do caso do concreto. Cumpre observar que as circunstâncias do crime, enquanto circunstância judicial do art. 59 do CP, estão ligadas ao modus operandi empregado na prática delitiva, em que averiguada se a dinâmica do fato revelou uma maior reprovabilidade da conduta do agente. De acordo com o professor Schimitt, as circunstâncias do crime “são elementos que não compõem o crime, mas que influenciam em sua gravidade, tais como o estado de ânimo do agente, o local da ação delituosa, o tempo de sua duração, as condições e o modo de agir, o objeto utilizado, a atitude assumida pelo autor no decorrer da realização do fato, o relacionamento existente entre autor e vítima, dentre outros.”[4] In casu, constata-se que o magistrado a quo considerou o fato de o agressor ter tentado praticar o crime de estupro enquanto o filho menor da vítima dormia nas proximidades. Nesse sentido: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO E ROUBO. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. DESPROPORCIONALIDADE. REDUÇÃO DA CONDENAÇÃO. 1. Tendo as instâncias ordinárias concluído pela autoria e materialidade delitiva, bem como constatada a premeditação, a reversão das premissas fáticas do acórdão recorrido demandaria o revolvimento do conjunto fático-probatório, inadmissível pela via do recurso especial, consoante Súmula 7/STJ. 2. Indicado fundamento concreto para a exasperação da pena-base do delito de estupro, evidenciado, quanto à culpabilidade, na prática do crime sob mais de uma forma de violência sexual e, em relação às circunstâncias do crime, conduta realizada na presença do filho da vítima, com dois anos ao tempo dos fatos, não se registra a suposta ilegalidade. (...) (STJ - AgRg no AREsp: 1835854 TO 2021/0041693-7, Relator: Ministro OLINDO MENEZES DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF 1 REGIÃO, Data de Julgamento: 09/11/2021, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 16/11/2021). Grifou-se. PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. ABSOLVIÇÃO. REVOLVIMENTO DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 7/STJ. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DO ART. 215-A DO CP. IMPOSSIBILIDADE. PENA-BASE. EXASPERAÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. CONTINUIDADE DELITIVA. FRAÇÃO DE AUMENTO APLICADA EM 2/3. NÚMERO DE CRIMES INDETERMINADO. SUCESSÃO DE ABUSOS POR LONGO PERÍODO. LEGALIDADE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (...) .6. As circunstâncias do crime como circunstância judicial refere-se à maior ou menor gravidade do crime em razão do modus operandi. Constata-se, assim, a existência de fundamentação concreta e idônea, a qual efetivamente evidenciou aspectos mais reprováveis do modus operandi delitivo e que não se afiguram inerentes ao próprio tipo penal, a justificar a majoração da pena, uma vez que o acusado ousou quanto aos momentos em que praticou os atos, que segundo a vítima aconteciam quando estavam assistindo filmes, inclusive na presença do filho do denunciado, contudo por de baixo das cobertas e até na praia, ou seja, em situações de lazer no convívio familiar, fundamento que justifica a maior gravidade da conduta e a exasperação da reprimenda. (...) (art. 71 do CP), como feito pelas instâncias de origem.10. Agravo regimental não provido. (STJ - AgRg no AREsp: 2393204 SC 2023/0208277-3, Relator: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Julgamento: 12/09/2023, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 18/09/2023). Grifou-se. Constata-se, assim, a existência de fundamentação concreta e idônea, a qual efetivamente evidenciou aspectos mais reprováveis do modus operandi delitivo, que não se afiguram inerentes ao próprio tipo penal, justificando a majoração da pena. Na fase intermediária, não foram reconhecidas circunstâncias agravantes nem atenuantes. Na terceira fase, não há causa de aumento de pena. Por outro lado, verifica-se a incidência da causa de diminuição prevista no art. 14, parágrafo único, do Código Penal, referente à tentativa, razão pela qual reduzo a pena em 1/3 (um terço), fixando-a definitivamente em 4 (quatro) anos e 8 (oito) meses de reclusão. Destaca-se que não há que se falar na aplicação da fração máxima prevista no art. 14, inciso II, parágrafo único, do Código Penal, no que se refere ao crime de estupro tentado. Esclarece-se que o parâmetro para a redução da pena nos crimes tentados está relacionado ao estágio atingido no iter criminis: quanto mais próxima a consumação, menor será a redução; quanto mais distante, maior será a diminuição. Considerando que a consumação do delito de estupro se dá com a prática de ato libidinoso, verifica-se que o apelante estava próximo de alcançar o resultado pretendido. A interrupção dos atos executórios ocorreu quando o acusado já havia se despido e se posicionado sobre a vítima, demonstrando de forma inequívoca a intenção de consumar a conjunção carnal. Todavia, o prosseguimento de seu intento libidinoso foi frustrado por circunstâncias alheias à sua vontade, tendo o acusado avançado de forma significativa na execução do crime. Portanto, o quantum redutor aplicado mostra-se plenamente compatível com as circunstâncias do caso, não havendo fundamento para o aumento da fração. Logo, mantenho o regime semiaberto fixado na sentença, conforme previsão do art. 33, § 2º, "b", do Código Penal, especialmente considerando duas circunstâncias judiciais valoradas negativamente, com fixação de pena definitiva superior a 4 (quatro) anos. Ante o exposto, em desacordo com o parecer da Procuradoria Geral de Justiça, conheço do presente apelo para DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO, para reformar a sentença e condenar o apelado nas sanções do artigo 213, caput, c/c artigo 14, inciso II, todos do Código Penal, redimensionando a pena para 04 (quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão, a ser cumprida em regime semiaberto, mantendo-se os demais termos da sentença. É como voto. Sala das Sessões da Terceira Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em São Luís, data do sistema. Desembargadora Maria da Graça Peres Soares Amorim Relatora [1]CP. Art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento. [2]CF/1988. Art. 5º. (...) XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos; (...) LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes; [3]CP. Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime: I - as penas aplicáveis dentre as cominadas; II - a quantidade de pena aplicável, dentro dos limites previstos; III - o regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade; IV - a substituição da pena privativa da liberdade aplicada, por outra espécie de pena, se cabível. [4]In Sentença Penal Condenatória – Teoria e Prática. 8. ed. Salvador: Juspodivm, 2013. p. 136.

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Processo nº 0812633-41.2017.8.10.0040

ID: 314621118

Tribunal: TJMA Órgão: Primeira Câmara de Direito Público Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 0812633-41.2017.8.10.0040

Data de Disponibilização: 03/07/2025

Polo Ativo:

MANOEL MOURA DE SOUSA

Polo Passivo:

Decisão (expediente)

Advogados:

BRUNO CENDES ESCORCIO

OAB/MA XXXXXX Desbloquear

PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0812633-41.2017.8.10.0040 APELANTE: MUNICÍPIO DE IMPERATRIZ Procuradora: Sara Medeiros Vieira da Silva APELADO: MANOEL MOURA DE SOUSA Defensor: Jo… PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0812633-41.2017.8.10.0040 APELANTE: MUNICÍPIO DE IMPERATRIZ Procuradora: Sara Medeiros Vieira da Silva APELADO: MANOEL MOURA DE SOUSA Defensor: João Paulo de Oliveira Aguiar Relator: Des. JORGE RACHID MUBÁRACK MALUF Ementa: DIREITO TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. CITAÇÃO POR EDITAL. AUSÊNCIA DE ESGOTAMENTO DOS MEIOS DE LOCALIZAÇÃO DO DEVEDOR. NULIDADE. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. TRANSCURSO DO PRAZO LEGAL SEM ATO INTERRUPTIVO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelação cível interposta pelo Município de Imperatriz contra sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Imperatriz, que extinguiu execução fiscal, reconhecendo a nulidade da citação por edital e a prescrição intercorrente do crédito tributário. O apelante sustenta a validade da citação ficta, com base em tentativa frustrada de citação pessoal no endereço cadastrado, e a inexistência de prescrição intercorrente, alegando a prática de atos processuais aptos a interromper o prazo. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a citação por edital na execução fiscal foi válida, à luz da necessidade de esgotamento das diligências para localização do devedor; e (ii) estabelecer se houve prescrição intercorrente diante da ausência de atos efetivos de cobrança após a suspensão do feito. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A citação por edital em execução fiscal é medida excepcional, admitida apenas após esgotadas todas as possibilidades razoáveis de localização do devedor, mediante consulta aos sistemas disponíveis ao Poder Judiciário, conforme dispõe o art. 256, § 3º, do CPC e a Súmula 414 do STJ. 4. A tentativa única de citação no endereço constante no cadastro municipal, desacompanhada de diligências complementares em bases como INFOJUD, RENAJUD e outros sistemas acessíveis, não satisfaz o requisito de exaustão, configurando nulidade da citação por edital e de todos os atos subsequentes. 5. A ausência de citação válida obsta a constituição da relação processual e afasta qualquer causa interruptiva da prescrição. Comprovado o transcurso superior a cinco anos entre a suspensão da execução e a prática de ato processual efetivo, configura-se a prescrição intercorrente, nos termos do art. 40, §§ 2º e 4º, da Lei nº 6.830/80, e da tese firmada no Tema 566/STJ. 6. A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que a inércia da Fazenda Pública após a suspensão do feito autoriza a extinção da execução fiscal por prescrição, nos termos do art. 156, V, do CTN e do art. 924, V, do CPC. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. A citação por edital na execução fiscal exige a prévia exaustão de diligências para localização do devedor, inclusive por meio de sistemas eletrônicos disponíveis ao Poder Judiciário, sob pena de nulidade. 2. O reconhecimento da nulidade da citação por edital impede a interrupção válida da prescrição e, diante da inércia da Fazenda Pública por período superior a cinco anos após a suspensão do feito, autoriza a extinção da execução fiscal por prescrição intercorrente. _________________________ Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 256, § 3º, e 924, V; CTN, arts. 156, V, e 174, I; Lei nº 6.830/1980, art. 40, §§ 2º e 4º. Jurisprudência relevante citada: STJ, Súmula 414; STJ, REsp 1.340.553/RS (Tema 566); STJ, AgInt no AREsp 1690727/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, T3, j. 16/11/2020; TJMA, ApCiv 0001582-93.2013.8.10.0044, Rel. Des. Lourival de Jesus Serejo Sousa, DJe 22/04/2025. DECISÃO Trata-se de Apelação Cível interposta pelo Município de Imperatriz contra a sentença proferida pelo Juízo de Direito da 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Imperatriz, que extinguiu a execução fiscal movida contra Manoel Moura de Sousa, reconhecendo a nulidade da citação por edital e a prescrição intercorrente do crédito tributário. Em suas razões recursais, o Município de Imperatriz alega que a sentença merece reforma, por entender que a citação por edital foi realizada de forma regular, uma vez que houve tentativa prévia de localização da parte executada, frustrada no endereço constante no cadastro imobiliário municipal. Sustenta que, diante da incerteza quanto ao paradeiro da parte executada, restaria autorizada a citação ficta, conforme previsão do art. 256, I, do CPC. Aduz, ainda, que a declaração de prescrição intercorrente também é indevida, pois não foram observadas as etapas procedimentais previstas no art. 40 da Lei de Execuções Fiscais (Lei nº 6.830/80). Argumenta que houve movimentação processual capaz de interromper o prazo prescricional, como os pedidos de citação e de bloqueio on-line via BacenJud, além da juntada de certidão de dívida ativa devidamente atualizada. Nas contrarrazões, o apelado defende a manutenção da sentença, reforçando que não houve qualquer demonstração de esgotamento das diligências necessárias para localização do executado antes da citação por edital, em desacordo com a exigência legal e jurisprudencial, inclusive da Súmula 414 do STJ, que estabelece como imprescindível a tentativa prévia de citação pessoal do devedor antes da utilização da citação ficta. Sustenta, ainda, que, reconhecida a nulidade da citação por edital, todos os atos processuais subsequentes restaram contaminados por vício insanável, inclusive quanto à possibilidade de interrupção da prescrição. Era o que cabia relatar. Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço do recurso e passo à análise do mérito, com base na prerrogativa constante do art. 932 do Código de Processo Civil que permite ao relator decidir monocraticamente o presente apelo, na medida em que já há jurisprudência firme nesta Corte e nos Tribunais Superiores acerca dos temas trazidos ao segundo grau. A controvérsia recursal diz respeito à validade da citação por edital realizada pelo Município de Imperatriz e à eventual ocorrência de prescrição intercorrente, que fundamentaram a decisão de extinção da execução fiscal. O apelante defende que foram exauridas todas as possibilidades de localização do devedor, além de que não houve inércia processual que justificasse a prescrição intercorrente. A sentença recorrida declarou a nulidade da citação por edital, sob o argumento de que não teria havido exaurimento das diligências necessárias para a localização da executada, nos termos do art. 8º da Lei nº 6.830/80 e da Súmula 414 do STJ. Inicialmente, é preciso destacar que a citação por edital configura-se como medida de caráter excepcional no ordenamento jurídico pátrio, admitida apenas quando restarem frustradas todas as alternativas razoáveis de localização do executado. O art. 256, §3º, do CPC1, dispõe que a parte somente poderá ser considerada em local incerto ou não sabido, para fins de citação ficta, após a realização de diligências infrutíferas nos bancos de dados disponíveis ao Poder Judiciário, tais como INFOJUD, RENAJUD, SIEL, SERASAJUD, e, inclusive, por meio de solicitação de informações junto a concessionárias de serviços públicos. No caso dos autos, observa-se que a exequente limitou-se a requerer a citação por edital após única diligência negativa realizada por oficial de justiça, sem que houvesse qualquer demonstração de tentativas de localização em outras fontes acessíveis ou por meio de ofícios a órgãos públicos. A ausência de tais medidas viola não apenas o disposto no art. 256, §3º, do CPC, como também contraria entendimento pacificado do Superior Tribunal de Justiça, consubstanciado na Súmula 414, segundo a qual "a citação por edital na execução fiscal é cabível quando frustradas as demais modalidades". É firme a jurisprudência do STJ no sentido de que o uso da citação por edital, dada sua natureza ficta, exige prévia e efetiva busca pelo endereço do devedor, inclusive com uso dos sistemas informatizados aos quais o Judiciário tem acesso. A ausência de diligência mínima para localização do executado, como se deu na espécie, compromete o contraditório e a ampla defesa, ensejando, de modo incontornável, a nulidade do ato citatório e de todos os atos subsequentes. A corroborar tale entendimento, os julgados desta Corte de Justiça: Ementa: APELAÇÕES CÍVEIS. EXECUÇÃO FISCAL. CITAÇÃO POR EDITAL. NÃO ESGOTAMENTO DOS MEIOS DE LOCALIZAÇÃO DO EXECUTADO. NULIDADE. OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. POSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO DA FAZENDA PÚBLICA EM FAVOR DA DEFENSORIA PÚBLICA. PROVIMENTO DO 1° APELO. DESPROVIMENTO DO 2° APELO. I. Caso em exame 1. Apelações cíveis interpostas pelo Estado do Maranhão e pela Defensoria Pública do Estado do Maranhão contra sentença que declarou a nulidade da citação por edital do executado, reconheceu a prescrição do crédito tributário e extinguiu a execução fiscal com resolução de mérito, isentando o ente público da condenação em honorários sucumbenciais com base na Súmula 421 do STJ. II. Questão em discussão 2. Há três questões em discussão: (i) a validade da citação por edital na execução fiscal, sem o esgotamento de todas as tentativas de localização do devedor; (ii) a configuração da prescrição intercorrente na hipótese de paralisação do feito por mais de cinco anos sem diligências efetivas da Fazenda Pública; e (iii) a possibilidade de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de honorários advocatícios em favor da Defensoria Pública do mesmo ente federado, diante do entendimento fixado pelo STF no Tema 1002. III. Razões de decidir 3. A citação por edital é medida excepcional, condicionada ao esgotamento prévio de diligências eficazes para localização do executado, incluindo pesquisas em bases cadastrais públicas e sistemas eletrônicos (Infojud, Renajud, Sisbajud), conforme art. 256, §3º, do CPC e jurisprudência do STJ. Ausência de comprovação do cumprimento desse requisito. 4. Caracterização da prescrição intercorrente, nos termos do art. 40 da Lei nº 6.830/1980 e do entendimento firmado no REsp nº 1.340.553/STJ, diante da paralisação do processo por mais de cinco anos após o despacho inicial sem constrição efetiva de bens ou citação válida do executado. 5. Superação da Súmula 421 do STJ pelo Tema 1002 do STF, que reconheceu a possibilidade de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de honorários advocatícios em favor da Defensoria Pública, com destinação ao respectivo Fundo de Aparelhamento. IV. Dispositivo 6. Apelação do Estado do Maranhão desprovida. Apelação da Defensoria Pública provida para condenar o Estado do Maranhão ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, em favor do Fundo de Aparelhamento da Defensoria Pública. (ApCiv 0800252-64.2018.8.10.0040, Rel. Desembargador(a) ANGELA MARIA MORAES SALAZAR, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO, DJe 02/04/2025) DIREITO TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. CITAÇÃO POR EDITAL. AUSÊNCIA DE ESGOTAMENTO DOS MEIOS DE LOCALIZAÇÃO DO DEVEDOR. NULIDADE. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. TRANSCURSO DO PRAZO QUINQUENAL. TEMA 566/STJ. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta pelo Município de Imperatriz contra sentença que reconheceu a nulidade da citação por edital, declarou a prescrição intercorrente e extinguiu a execução fiscal, nos termos do art. 487, II, do CPC. O apelante sustenta a regularidade da citação por edital e a inexistência de prescrição intercorrente, alegando que o feito não permaneceu inerte por mais de cinco anos. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) definir se a citação por edital foi válida, considerando a necessidade de esgotamento dos meios de localização do executado; e (ii) estabelecer se a prescrição intercorrente foi corretamente reconhecida, nos termos do entendimento consolidado pelo STJ. III. RAZÕES DE DECIDIR A citação por edital na execução fiscal somente é admissível após a comprovação do esgotamento de todos os meios possíveis para localização do devedor, conforme exige o art. 8º da Lei nº 6.830/80 e o entendimento consolidado no Tema 564/STJ e na Súmula 414/STJ. No caso concreto, o Município de Imperatriz realizou apenas uma tentativa de citação no endereço cadastrado, sem demonstrar diligências em cadastros públicos e sistemas eletrônicos, como INFOJUD, BACENJUD, RENAJUD e INFOSEG, tornando irregular a citação por edital. A prescrição intercorrente se configura quando a execução fiscal permanece paralisada por mais de cinco anos sem diligências efetivas, nos termos do art. 40, §§ 2º e 4º, da Lei nº 6.830/80, e do entendimento fixado no REsp 1.340.553/RS (Tema 566/STJ). No caso, a suspensão do feito ocorreu entre 17.8.2015 e 17.8.2016. Decorrido esse prazo, iniciou-se a contagem do prazo prescricional de cinco anos, que transcorreu até 17.8.2021 sem a adoção de medidas efetivas para a localização de bens penhoráveis, configurando a prescrição intercorrente. A extinção da execução fiscal pela prescrição intercorrente está prevista no art. 924, V, do CPC, sendo correta a decisão de primeiro grau. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso desprovido. Tese de julgamento: A citação por edital na execução fiscal exige a comprovação do esgotamento prévio de todos os meios de localização do devedor, sob pena de nulidade, conforme o art. 8º da Lei nº 6.830/80 e o entendimento consolidado pelo STJ. Configura-se a prescrição intercorrente na execução fiscal quando, após a suspensão por um ano, transcorrer o prazo de cinco anos sem a adoção de medidas efetivas para o prosseguimento do feito, nos termos do art. 40, §§ 2º e 4º, da Lei nº 6.830/80, e do Tema 566/STJ. (ApCiv 0001582-93.2013.8.10.0044, Rel. Desembargador(a) LOURIVAL DE JESUS SEREJO SOUSA, SEGUNDA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO, DJe 22/04/2025) A sentença recorrida também reconheceu a prescrição intercorrente, sob o argumento de que a execução permaneceu inerte por período superior a cinco anos, sem atos efetivos de cobrança por parte da Fazenda Pública. Em consequência lógica da nulidade da citação, tem-se que não houve causa interruptiva válida da prescrição, o que conduz, irremediavelmente, ao reconhecimento da prescrição intercorrente do crédito tributário. Nos termos do art. 174, I, do Código Tributário Nacional, e consoante a jurisprudência consolidada no julgamento do REsp 1.340.553/RS (Tema 566/STJ), o prazo prescricional de cinco anos recomeça após o despacho que ordena a citação válida do devedor. No presente caso, verificado o lapso superior a cinco anos entre esse despacho e a prática de qualquer ato válido apto a interromper a prescrição, impõe-se o reconhecimento da extinção do crédito fiscal pela prescrição intercorrente, nos termos do art. 156, V, do CTN. Nesse sentido: DIREITO TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. CITAÇÃO POR EDITAL. NULIDADE. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. SENTENÇA MANTIDA. DESPROVIMENTO DO RECURSO. I. Caso em exame 1. Apelação cível interposta pelo Município de Imperatriz contra sentença que, acolhendo exceção de pré-executividade, declarou a nulidade da citação editalícia realizada nos autos de execução fiscal contra MCM Participações S/A e extinguiu o feito com resolução do mérito, nos termos do art. 487, II, do CPC, reconhecendo a prescrição intercorrente. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em: (i) saber se a citação por edital realizada sem a exaustão de diligências para localização do executado é válida; (ii) verificar se ocorreu a prescrição intercorrente diante da nulidade da citação. III. Razões de decidir 3. A citação por edital sem a devida exaustão de meios para localização do executado viola o entendimento consolidado na Súmula 414/STJ e jurisprudência correlata. 4. Reconhecida a nulidade da citação por edital, o transcurso de mais de cinco anos desde o único marco interruptivo (despacho inicial) sem novas causas suspensivas ou interruptivas justifica a prescrição intercorrente, nos termos do art. 40, § 4º, da Lei nº 6.830/1980. 5. A jurisprudência do STJ reafirma que a inércia da Fazenda Pública no curso do processo acarreta a extinção da execução fiscal pela prescrição. IV. Dispositivo e tese 6. Apelação desprovida. Tese de julgamento: "1. A citação por edital em execução fiscal depende da exaustão de diligências para localização do devedor. 2. O reconhecimento da nulidade da citação por edital permite a decretação de prescrição intercorrente quando ultrapassado o prazo legal sem causas suspensivas ou interruptivas." Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 487, II; CTN, art. 174, I; Lei nº 6.830/1980, art. 40, §§ 1º a 4º. Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1690727/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, T3, j. 16/11/2020; STJ, AgInt no REsp 1.361.038/RJ, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, T1, j. 9/8/2016; TJMA, Apelação Cível nº 34143/2018, Terceira Câmara Cível, Rel. Des. JAMIL de Miranda GEDEON Neto, j. 21/03/2019. (ApCiv 0000657-68.2011.8.10.0044, Rel. Desembargador(a) KLEBER COSTA CARVALHO, PRIMEIRA CÂMARA DE DIREITO PÚBLICO, DJe 27/02/2025) Ante o exposto, nego provimento ao recurso. Cópia desta decisão servirá como ofício. Publique-se e cumpra-se. São Luís, data do sistema. Des. JORGE RACHID MUBÁRACK MALUF Relator 1Art. 256. A citação por edital será feita: (…) § 3º O réu será considerado em local ignorado ou incerto se infrutíferas as tentativas de sua localização, inclusive mediante requisição pelo juízo de informações sobre seu endereço nos cadastros de órgãos públicos ou de concessionárias de serviços públicos.

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