Estado Do Pará e outros x Iteo Romaldo Artmann
ID: 328599134
Tribunal: TJPA
Órgão: Vara Cível de Novo Progresso
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 0804131-71.2021.8.14.0005
Data de Disponibilização:
18/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ALEXANDRE CURTI DOS SANTOS
OAB/SP XXXXXX
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ESTADO DO PARÁ PODER JUDICIÁRIO VARA CÍVEL DA COMARCA DE NOVO PROGRESSO Fórum de Novo Progresso, R. do Cachimbo, 315 - Jardim Planalto, Novo Progresso - PA, 68193-000 ________________________________…
ESTADO DO PARÁ PODER JUDICIÁRIO VARA CÍVEL DA COMARCA DE NOVO PROGRESSO Fórum de Novo Progresso, R. do Cachimbo, 315 - Jardim Planalto, Novo Progresso - PA, 68193-000 ________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________ PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Processo nº 0804131-71.2021.8.14.0005 Requerente: Nome: ESTADO DO PARÁ Endereço: Rua dos Tamoios, 1671, Batista Campos, BELéM - PA - CEP: 66025-540 Nome: FERNANDA JORGE SEQUEIRA RODRIGUES Endereço: GOVERNADOR JOSE MALCHER, 163, BL B AP 303, GOVERNADOR JOSE MAL, BELéM - PA - CEP: 66055-260 Requerido(a): Nome: ITEO ROMALDO ARTMANN Endereço: Rua Francisco Rotesck, S/N, em frente a Igreja Católica Matriz, Castelo dos Sonhos, CASTELO DOS SONHOS (ALTAMIRA) - PA - CEP: 68379-200 SENTENÇA I. RELATÓRIO. Trata-se de AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS AMBIENTAIS C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER proposta pelo ESTADO DO PARÁ em desfavor de ITEO ROMALDO ARTMANN visando, em síntese, a condenação civil da parte requerida. Contestação apresentada, conforme certidão de (id. 111889797). Réplica acostada no (id. 119805744). Intimadas para manifestarem o interesse na produção de provas, a parte autora requereu o julgamento antecipado, enquanto a parte promovida solicitou a produção de prova pericial. Eis o breve relatório. DECIDO. II. FUNDAMENTAÇÃO. Promovo o julgamento antecipado do mérito, nos termos do art. 355, I, do CPC, tendo em vista a ação estar suficientemente instruída, bem como porque o acervo probatório se revela suficiente para a formação da convicção deste magistrado, motivo pela qual indefiro o pedido de prova pericial e testemunhal. O caso versa sobre o Auto de Infração nº AUT-3-S/20-10-00562, em 06/10/2020, além da lavratura do Termo de Embargo TEM-2-S/20-11-00272, de 05/11/2020, por destruir e danificar 365ha de mata da Floresta ou demais formas de vegetação nativa, sem licença outorgada pelo órgão competente. Em sede preliminar, a parte demandada argui a inépcia da inicial, sob a tese de que no auto de infração não constaria a data e horário do desmatamento, bem como que não haveria indicação do local exato e o modus operandi do promovido. Não merece prosperar a preliminar de inépcia da petição inicial. A peça exordial preenche todos os requisitos previstos no art. 319 do Código de Processo Civil, permitindo à parte demandada o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa. A descrição do fato ilícito – consistente em desmatamento de área protegida – está suficientemente delineada, com identificação do auto de infração, delimitação da área atingida, bem como elementos que permitem a individualização da conduta imputada. A ausência de menção exata à data e ao horário do desmatamento não compromete a higidez da inicial, notadamente em razão da natureza contínua ou permanente do dano ambiental, cujos efeitos se protraem no tempo e prescindem de delimitação pontual para a responsabilização do infrator. Exigir indicação específica de data e horário, ademais, seria ilógico e não possui qualquer razoabilidade, visto que o que se visa é a preservação do meio ambiente e a constatação do dano. Ademais, a jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça admite a responsabilização ambiental com base em provas técnicas e indiciárias, desde que haja elementos suficientes para vincular o agente à degradação ambiental, o que é o caso dos autos, em que houve a autuação e constatação de diversos elementos que comprovam a ocorrência do dano ambiental. Nesse diapasão, a descrição do local afetado encontra-se suficientemente instruída com documentos técnicos anexos, sendo plenamente possível à parte demandada reconhecer os fatos que lhe são imputados e formular defesa. Dessa forma, a alegação de inépcia deve ser rejeitada, permitindo-se o regular prosseguimento da ação. Rechaço, igualmente, a preliminar de ausência de interesse processual. A legitimidade ativa para a propositura de ação civil pública ambiental não é exclusiva do Ministério Público, estando expressamente prevista, através de interpretação analógica, no art. 5º da Lei n.º 7.347/85, que elenca como legitimados, entre outros, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Trata-se de prerrogativa conferida ao ente federativo para tutelar interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos, especialmente no que se refere à proteção do meio ambiente, direito fundamental consagrado no art. 225 da Constituição Federal. A presença do interesse de agir decorre da necessidade de tutela jurisdicional para compelir o infrator à reparação integral do dano ambiental, diante da omissão ou da ineficácia de medidas administrativas. Ademais, o interesse processual do Estado do Pará, na qualidade de ente federado e titular do dever-poder de proteção ambiental, manifesta-se na busca pela recomposição do equilíbrio ecológico lesado dentro de seu território, o que atende ao princípio da prevenção e reparação integral do dano ambiental, bem como à função institucional de garantir a sadia qualidade de vida às presentes e futuras gerações. Superadas as preliminares, adentro ao mérito. Inicialmente, destaco que a Constituição Federal atribui alta relevância ao meio ambiente, de modo que todo dano ambiental é significante e deve ter a devida reparação, especialmente por força da responsabilidade objetiva, nos termos do artigo 14, §1° da Lei n° 6.938/81, a qual dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, in verbis: Art. 14 – Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores: I - à multa simples ou diária, nos valores correspondentes, no mínimo, a 10 (dez) e, no máximo, a 1.000 (mil) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTNs, agravada em casos de reincidência específica, conforme dispuser o regulamento, vedada a sua cobrança pela União se já tiver sido aplicada pelo Estado, Distrito Federal, Territórios ou pelos Municípios. II - à perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público; III - à perda ou suspensão de participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito; IV - à suspensão de sua atividade. § 1º - Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente. As normas ambientais devem atender aos fins sociais a que se destinam, ou seja, necessária a interpretação e a integração de acordo com o princípio hermenêutico in dubio pro natura. Pois bem. Acerca da tese de ausência de autora e responsabilidade civil ambiental, não possui arcabouço jurídico tal linha defensiva, visto que as obrigações ambientais (ex: obrigação de reparar os danos ambientais) são propter rem. Isso significa que as obrigações ambientais aderem ao título de domínio ou posse e se transferem ao atual proprietário ou possuidor, ainda que eles não tenham sido os responsáveis pela degradação ambiental. Vale ressaltar também que não interessa discutir a boa ou má-fé do possuidor, considerando que não se está no âmbito da responsabilidade subjetiva, baseada em culpa. Coadunando-se com o exposto, veja-se: O atual titular, que se mantém inerte em face de degradação ambiental, ainda que pré-existente, comete ato ilícito, pois a preservação das áreas de preservação permanente e da reserva legal constituem “imposições genéricas, decorrentes diretamente da lei. São, por esse enfoque, pressupostos intrínsecos ou limites internos do direito de propriedade e posse (...) quem se beneficia da degradação ambiental alheia, a agrava ou lhe dá continuidade não é menos degradador” (STJ. 2ª Turma. REsp 948.921/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 11/11/2009). O art. 2º, § 2º, da Lei nº 12.651/2012 (Código Florestal) expressamente atribui caráter ambulatorial à obrigação ambiental, ao dispor que: Art. 2º (...) § 2º As obrigações previstas nesta Lei têm natureza real e são transmitidas ao sucessor, de qualquer natureza, no caso de transferência de domínio ou posse do imóvel rural. Tal norma, somada ao art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/81 que estabelece a responsabilidade ambiental objetiva, alicerça o entendimento de que “a responsabilidade pela recomposição ambiental é objetiva e propter rem, atingindo o proprietário do bem, independentemente de ter sido ele o causador do dano” (AgInt no REsp 1.856.089/MG, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 25/6/2020). Assim, de acordo com a jurisprudência do STJ, “a responsabilidade civil por danos ambientais é propter rem, além de objetiva e solidária entre todos os causadores diretos e indiretos do dano” (STJ. 2ª Turma. AgInt no AREsp 2.115.021/SP, Rel. Min. Francisco Falcão, DJe 16/3/2023). Esse entendimento encontra-se materializado em um enunciado do STJ: Súmula 623-STJ: As obrigações ambientais possuem natureza propter rem, sendo admissível cobrá-las do proprietário ou possuidor atual e/ou dos anteriores, à escolha do credor. O dano ambiental causado pela parte requerida configura-se como infração à ordem jurídica, em afronta ao disposto no artigo 225 da Constituição Federal, que assegura o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e impõe ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. A responsabilização pelo dano ambiental é objetiva, nos termos do artigo 14, §1º, da Lei nº 6.938/81, não se exigindo a demonstração de culpa, mas apenas do nexo causal entre a conduta e o dano. Os documentos que acompanham a peça inicial são bastante claros e objetivos quanto ao enquadramento das ações do réu, as quais implicam: (a) supressão irregular de floresta nativa (AINF n. AUT-3-S/20-10-00562), (b) porte e uso de rádio comunicador e soprador da marca “Stihl” sem autorização (Termo de Apreensão TAD-3-s/20-10-00090), (c) apreensão de trator tipo “skider” com uma lâmina de trator de esteira (Termo de Apreensão TAD-3S/20-10-00085) e (d) porte irregular de arma de fogo (BOL n. 00562/2020.100062-0). Destaque-se ainda que a fiscalização encontrou ainda diversas embalagens de óleo para motosserra, um motosserra com defeito e galões de combustível (gasolina, óleo diesel e óleo queimado). Ainda que dispensados frente o dano ambiental verificado, tais equipamentos indiciam autoria e materialidade da infração ambiental cometida. Ainda, conforme AINF n. AUT-3-S/20-10-00565 (Processo Administrativo Punitivo n. 2020/29464) verificou-se depósito de 31,2576 m3 de produto de origem florestal da madeira castanheira, bem como 500 (quinhentas) unidades de estacas da mesma espécie, cujo corte é proibido por lei (Lei Ordinária Estadual n. 6.462/2012). A madeira serrada e as estacas encontradas na propriedade foram identificadas como sendo da espécie Castanheira (bertholletia excelsa), protegida pela Lei Ordinária Estadual 6.895/2006. Os produtos de origem florestal se encontravam sem documentação de origem, bem como sem autorização ou licença de órgão ambiental competente. Dessa forma, a condenação da parte promovida é medida que se impõe, com a obrigação de recompor a área degradada mediante a elaboração e execução de plano de recuperação ambiental, nos termos do artigo 4º, VII e VIII, da Lei nº 12.651/12 (Código Florestal). Além disso, impõe-se a condenação ao pagamento de indenização pecuniária a ser revertida em favor de projetos ambientais voltados à preservação da Amazônia Legal. Coadunando-se com o exposto: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - DIREITO AMBIENTAL - INTERVENÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE - LEGISLAÇÃO AMBIENTAL APLICÁVEL À ÉPOCA DO FATO - LAUDO PERICIAL - COMPROVAÇÃO DO DANO - DEVER DE REPARAÇÃO, RECOMPOSIÇÃO E REFLORESTAMENTO - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA - MANUTENÇÃO. - Conforme entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça, aplica-se a norma ambiental vigente à época dos fatos imputados ao degradador, sendo irrelevante a data do registro do imóvel ou da demarcação da área degradada. - Havendo laudo pericial produzido sob o crivo do contraditório que atesta a supressão desautorizada de vegetação e a intervenção irregular em área de preservação permanente, deve ser mantida a sentença que condena o proprietário à recomposição do dano, de conformidade com projeto aprovado pelo órgão ambiental competente. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.23.158894-8/001, Relator(a): Des.(a) Luís Carlos Gambogi, 5ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 16/11/2023, publicação da súmula em 17/11/2023) No que tange a ausência de perícia, não merece acolhimento o argumento da parte ré quanto à suposta necessidade de realização de perícia técnica para comprovação do dano ambiental. Primeiramente, a invocação do art. 158 do Código de Processo Penal revela-se absolutamente incabível, porquanto inaplicável às demandas cíveis, visto que a presente demanda envolve a responsabilização civil pelo dano ecológico verificado. Nesse enredo, a pretensão deduzida nos autos não visa apurar infração penal, mas sim assegurar a reparação do meio ambiente lesado, cuja tutela se rege pelas normas do direito civil, ambiental e processual civil, com base no princípio da reparação integral e na responsabilidade objetiva, conforme disposto no art. 14, §1º, da Lei n.º 6.938/81. Ademais, o dano ambiental está devidamente comprovado nos autos, especialmente por meio do Relatório de Fiscalização REF-1-S/20-11-00461, elaborado por agentes ambientais no exercício regular de sua função pública, gozando de fé pública e presunção de legitimidade. O documento detalha o desmatamento de área de preservação permanente, com uso de fogo, presença de embalagens de óleo, galões de combustível e produtos de origem florestal, configurando-se prova suficiente para caracterizar o ilícito ambiental e ensejar a responsabilização do promovido. A extensão igualmente se encontra delineada e clara, sendo extraída através de imagem de satélite oriundo da operação "Amazônia Viva", realizada pela Força Estadual de Combate ao Desmatamento, que foi instituída pelo Governo do Pará por meio do decreto publicado no dia 18 de fevereiro de 2020, coordenada pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade, com a participação de diversos órgãos públicos. A referida operação abrangeu pontos do Estado do Pará, em municípios onde foram detectados focos de calor ou clareiras, mapeados por satélite, entre 13 e 31 de julho de 2020, visando combater o desmatamento ilegal na Amazônia. No caso comento, restou constatada atividade de supressão ambiental de 365ha de florestas ou demais formas de vegetação nativa sem autorização ou licença do órgão ambiental competente, análise técnica esta não refutada em nenhum momento pelo requerido e que, portanto, se encontra preclusa, o que torna incabível posterior pedido de perícia para verificar autoria e extensão. A jurisprudência pátria é firme no sentido de que não há exigência de perícia técnica quando os autos já contêm elementos suficientes para comprovar o dano, mormente em casos de fiscalização ambiental documentada e corroborada por imagens e laudos administrativos. Para ilustrar, colaciono: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. DETERMINAÇÃO DE RECUPERAÇÃO DE ÁREA DESMATADA E NÃO UTILIZAÇÃO PARA PASTAGEM. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DO PEDIDO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. APELO DO RÉU. ILEGITIMIDADE PASSIVA AFASTADA. MATÉRIA PRECLUSA. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. CERCEAMENTO DE DEFESA AFASTADO. DESNECESSIDADE DE NOVA PERÍCIA NO LOCAL. MÉRITO QUE SE NEGA PROVIMENTO. CONSTATAÇÃO DE NECESSIDADE DE RECUPERAÇÃO DA ÁREA PELA NATURATINS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1- A preliminar de ilegitimidade passiva não merece ser acolhida. Ao que se colhe dos autos, o réu alegou ser parte ilegítima para figurar no polo passivo da demanda, sustentando não ser mais proprietário do imóvel, repassado à terceiro. Porém, tem-se que tal preliminar fora afastada junto a decisão lançada no evento 35, sem que houvesse insurgência do réu quando aos termos do decidido. 2- Após a decisão lançada no evento 35, quando houve o afastamento da preliminar novamente alegada em sede de apelação, a parte ré fora devidamente intimada (certidão evento 36), e o réu, ora recorrente, não apresentou inconformismo quanto à decisão, eis que não apresentou recurso de agravo de instrumento quando de tal decisão. Desta forma, tem-se pela preclusão da matéria, ante a ausência de inconformismo do réu quando do saneamento do feito. 3- Da mesma forma, não merece prosperar a argumentação do réu, ora recorrente, de que houve cerceamento do seu direito de defesa, com a necessidade de anulação do julgado. Desnecessidade de realização de perícia no local. No mais, tem-se que depoimentos testemunhais não suprem a realização de perícia e vistoria no local, mais abrangente e conclusiva para o deslinde da causa. Desnecessária a reabertura da instrução processual. 4- No mérito, tem-se da mesma forma que o apelo não merece provimento, restando acertada a sentença ora objurgada. Houve a constatação, pela Naturatins, de desmatamento de área de 12 (doze) hectares de cerrado na chácara de posse do requerido, ora recorrente, sem a devida licença do órgão ambiental responsável. Ainda, tem-se que teve uma vistoria anterior, realizada em 2017, que constatou que a regeneração da área vem acontecendo, porém, há espécies de capim que atrapalham a recuperação das plantas nativas, com presença de gado bovino que também dificultam a reestruturação vegetal. 5- Desta forma, o réu, ora recorrente, recebeu recomendação de controle do capim e de animais na área, ou, alternativamente, que efetue o licenciamento ambiental para pastagem, na forma legal. A presente ação civil pública decorre de tais constatações, que não foram rechaçadas pelo réu, ora recorrente. 6- Recurso conhecido e improvido. (TJTO, Apelação Cível, 0003111-13.2019.8.27.2713, Rel. JACQUELINE ADORNO DE LA CRUZ BARBOSA, 1ª TURMA DA 1ª CÂMARA CÍVEL , julgado em 20/10/2021, juntado aos autos 28/10/2021 17:03:59) Passo ao julgamento dos pedidos indenizatórios, uma vez que não há impedimento para cumulação das obrigações de fazer e não fazer com indenização pelos danos causados ao meio ambiente (Súmula 629 do STJ). No caso dos autos, o autor pleiteou a condenação dos réus ao pagamento de indenização pelos danos interinos (constatados desde a alteração do meio ambiente até sua recuperação) e danos morais coletivos e danos sociais, além de reparação da área desmatada. Como se sabe, a obrigação de fazer (recomposição ambiental) não exclui a indenização pelos danos difusos causados à coletividade. O objetivo da condenação ao pagamento de indenização não é substituir a reparação física do dano, mas sim compensar o impacto social da degradação e reforçar a função pedagógica da responsabilização ambiental. Analisando assuntos envolvendo danos ambientais, o Superior Tribunal de Justiça entende que as espécies de dano ambiental podem envolver não apenas o dano em si (Reparável preferencialmente pela restauração do ambiente ao estado anterior), como também o dano residual (É um dano residual, perene, definitivo, permanente, que se protrai no tempo mesmo após os esforços de recuperação in natura) e o dano interino (É um dano intercorrente, intermediário, temporário, provisório, que ocorre entre a ocorrência da lesão em si e a reparação integral, haja ou não dano remanescente). Dessa forma, o Colendo STJ vem decidindo reiteradamente que a condenação a reparar o meio ambiente pode ser cumulada com a indenização por dano moral coletivo, por se tratar de sanções de natureza distinta, in litteris: 4. A reparação ambiental deve ser feita da forma mais completa possível, de modo que a condenação a recuperar a área lesionada não exclui o dever de indenizar, sobretudo pelo dano que permanece entre a sua ocorrência e o pleno restabelecimento do meio ambiente afetado (= dano interino ou intermediário), bem como pelo dano moral coletivo e pelo dano residual (= degradação ambiental que subsiste, não obstante todos os esforços de restauração). 5. A cumulação de obrigação de fazer, não fazer e pagar não configura bis in idem, porquanto a indenização não é para o dano especificamente já reparado, mas para os seus efeitos remanescentes, reflexos ou transitórios, com destaque para a privação temporária da fruição do bem de uso comum do povo, até sua efetiva e completa recomposição, assim como o retorno ao patrimônio público dos benefícios econômicos ilegalmente auferidos. (...)STJ. 2ª Turma. REsp 1.180.078/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 2/12/2010. ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIENTAL. INDENIZAÇÃO PECUNIÁRIA. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. A "reparação ambiental deve ser feita da forma mais completa possível, de modo que a condenação a recuperar a área lesionada não exclui o dever de indenizar, sobretudo pelo dano que permanece entre a sua ocorrência e o pleno restabelecimento do meio ambiente afetado (= dano interino ou intermediário), bem como pelo dano moral coletivo e pelo dano residual (= degradação ambiental que subsiste, não obstante todos os esforços de restauração)" (REsp 1.180.078/MG, relator Ministro Herman Benjamin, DJe 28/2/2012). 2. Desse modo, impõe-se o retorno dos autos ao Tribunal de origem para que verifique, no caso concreto, a existência de dano indenizável e, em caso positivo, estabeleça o respectivo quantum. 3. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp n. 1.573.246/SC, relator Ministro Teodoro Silva Santos, Segunda Turma, julgado em 26/3/2025, DJEN de 2/4/2025.) Por isso que, ao contrário do alegado pela parte requerida, não há que se falar em bis in idem, posto que a causa do dano interino é a lesão experimentada pelo meio ambiente desde o momento da lesão/dano em si (tempo passado) até sua reparação (tempo futuro). Nessas hipóteses, pode perfeitamente haver dano interino indenizável, ainda que não se vislumbre dano remanescente. Para sedimentar a condenação: O cumprimento da obrigação de reparar integralmente o dano ambiental (in natura ou pecuniariamente) não afasta a obrigação de indenizar os danos ambientais interinos. STJ. 2ª Turma. REsp 1.845.200-SC, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 16/8/2022 (Info Especial 8). Dessa forma, cabível, a condenação do réu a obrigação de indenizar os danos causados ao meio ambiente, quantia que, considerando outros julgados e entendimentos jurisprudenciais, bem como a extensão da área, fixo em R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais). A parte autora requereu, ainda, a condenação dos réus pelos danos morais coletivos causados em razão da degradação ambiental perpetrada. Como se vê, o dano moral coletivo caracteriza-se sempre que houver agressão a aspectos centrais da comunidade, que servem de alicerce para a construção da própria sociedade. Não há, nesse caso, análise de eventuais impactos psíquicos ou físicos, porque a espécie de indenização não se confunde com os danos morais individuais. Na seara coletiva, devem ser considerados os prejuízos sofridos pela sociedade em razão da própria violação de direito difuso. Sequer há possibilidade de se constatar, na prática, a violação da subjetividade de cada indivíduo atingido, justamente em razão da característica principal do direito ao meio ambiente equilibrado, que trata de direito difuso. Inclusive, a degradação do meio ambiente não encontra fronteiras geográficas, tampouco temporais. Afeta todo o planeta, em maior ou menor grau, e as gerações futuras. Portanto, constatada degradação ambiental pelo réu, os danos morais coletivos são dela decorrentes, não havendo necessidade de demonstração dos prejuízos. Para ilustrar, colaciono: DIREITO AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO MORAL COLETIVO AMBIENTAL. DESMATAMENTO ILEGAL DE VEGETAÇÃO NATIVA NO BIOMA AMAZÔNIA. RECURSO PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação cível interposta pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido em ação civil pública, condenando o réu a recuperar área degradada de 6,65 hectares de vegetação nativa, a regularizar a propriedade junto aos órgãos ambientais e a indenizar danos materiais, todavia, afastou a condenação por danos morais coletivos. II. Questão em discussão 2. A questão em discussão consiste em saber se o desmatamento ilegal de vegetação nativa no bioma Amazônia enseja o pagamento de indenização por dano moral coletivo ambiental. III. Razões de decidir 3. O dano moral coletivo prescinde da comprovação de dor, sofrimento ou abalo psicológico, sendo suficiente a violação de valores e interesses fundamentais da coletividade. 4. Em matéria ambiental, o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado de que a prática de desmatamento ilegal enseja dano moral coletivo, diante do impacto negativo sobre o meio ambiente e os direitos difusos da sociedade. 5. A Resolução n.º 433/2021 do Conselho Nacional de Justiça reforça o compromisso do Poder Judiciário na tutela do meio ambiente, ao estabelecer que a Política Nacional do Poder Judiciário para o Meio Ambiente se desenvolverá com base, entre outros, no princípio do poluidor-pagador, previsto no art. 4º, VIII, da Lei 6.938/81, bem como nos princípios da precaução, prevenção e solidariedade intergeracional (art. 1º, I, da Resolução). 6. No caso, o dano moral coletivo está configurado diante do desmatamento de 6,65 hectares de vegetação nativa no bioma Amazônia, sem autorização do órgão ambiental competente, configurando grave violação ao patrimônio ambiental. Nos termos do art. 14 da Resolução nº 433/2021 do CNJ, ao condenar por dano ambiental, o magistrado deve considerar, entre outros parâmetros, o impacto desse dano na mudança climática global, os danos difusos a povos e comunidades atingidos e o efeito dissuasório da medida. 7. Para a fixação do dano moral coletivo, observam-se os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando a gravidade da conduta, a extensão do impacto social e a capacidade econômica do causador do dano. Fixado o valor de R$ 15.711,53 (quinze mil, setecentos e onze reais e cinquenta e três centavos), com destinação ao Fundo Estadual do Meio Ambiente (FEMAM). IV. Dispositivo e tese 8. Recurso provido. Tese de julgamento: “1. O desmatamento ilegal de vegetação nativa no bioma Amazônia caracteriza dano moral coletivo indenizável, independentemente da demonstração de dor ou sofrimento da coletividade, bastando a comprovação da degradação ambiental e seu impacto nos valores e interesses fundamentais da sociedade. O quantum indenizatório deve considerar a dimensão da área degradada e as especificidades do caso concreto, mediante aplicação do método bifásico.” (TJMT - N.U 1002775-44.2023.8.11.0046, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PÚBLICO, RODRIGO ROBERTO CURVO, Primeira Câmara de Direito Público e Coletivo, Julgado em 12/03/2025, Publicado no DJE 19/03/2025) Sendo sua natureza transindividual, afetando interesses difusos e coletivos, bem como considerando a extensão da área 365ha, sob o prisma da gravidade da lesão ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e considerando os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, é medida que se impõe a condenação por dano moral coletivo, na quantia de R$ 100.000,00 (cem mil reais). Quanto aos danos sociais, malgrado possuir natureza distinta dos danos morais coletivos, indefiro tal pedido da parte requerente, por reputar que a condenação à restauração ambiental, conjuntamente com os danos interinos e danos morais coletivos serem suficientes para repreender a conduta da parte promovida. Ademais do exposto, não há que se falar em efeito confiscatório, visto que a condenação imposta possui como finalidade não apenas restaurar o dano causado ao meio ambiente, como também reparar os danos causados à coletividade, sendo necessária frente à extensão da área afetada. Nesse diapasão, apesar da parte promovida discorrer que o quantum pleiteado não estaria desestimulando a prática lesiva, mas sim impedindo a atividade na propriedade, emerge salientar que o promovido sequer é o proprietário legal da área, visto que esta pertence à União, sendo, portanto, mero possuidor do terreno, o que não lhe permite desmatar ao seu bel prazer. Arguir o réu que a área seria necessária ao seu sustento não possui qualquer arcabouço jurídico, pois entender o inverso possibilitaria que todos invadissem áreas de proteção ambiental/reservas legais sob o crivo do sustento familiar, o que vai na contramão do disposto constitucional do art. 225. III. DISPOSITIVO. Diante do exposto, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na presente ação proposta pela parte autora, para: 1. CONDENAR a parte requerida à obrigação de fazer, consistente na recuperação da área degradada de 365 (trezentos e sessenta e cinco) hectares, mediante reflorestamento com espécies nativas da Floresta Amazônica, conforme as seguintes diretrizes: 1.1. A parte requerida deverá apresentar, no prazo de 60 (sessenta) dias, Plano de Recuperação de Área Degradada – PRAD, elaborado por profissional habilitado e submetido à aprovação do IBAMA ou do órgão ambiental competente, o qual deverá conter: a) Diagnóstico da área degradada; b) Cronograma físico-financeiro de execução; c) Técnicas de plantio e isolamento da área; d) Lista de espécies nativas a serem reintroduzidas; e) Medidas para controle de espécies invasoras; f) Estratégia de manutenção e monitoramento. 1.2. A execução do PRAD deverá ocorrer no prazo total de até 36 (trinta e seis) meses, podendo ser realizada por etapas anuais equivalentes a, no mínimo, 120 hectares por ano, priorizando-se as áreas de maior fragilidade ecológica. 1.3. A parte requerida deverá garantir a manutenção e monitoramento das espécies reintroduzidas por, no mínimo, 5 (cinco) anos, com a apresentação de relatórios semestrais ao órgão ambiental competente, indicando taxas de sobrevivência (mínimo de 80%), replantios corretivos e condições gerais da regeneração. 1.4. Todos os custos relativos à elaboração do PRAD, aquisição de mudas, plantio, manutenção, monitoramento, replantio e assistência técnica correrão às expensas exclusivas da parte requerida. 1.5. Em caso de descumprimento parcial ou total das etapas previstas no PRAD aprovado, fixo multa cominatória mensal de R$ 10.000,00 (dez mil reais), até o limite de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), revertida ao Fundo previsto no art. 13 da Lei nº 7.347/85. 1.6. Na hipótese de comprovada impossibilidade técnica absoluta de reflorestamento da área degradada, a obrigação de fazer será convertida em indenização por perdas e danos, no valor de R$ 3.920.830,00 (três milhões, novecentos e vinte mil, oitocentos e trinta reais), a ser atualizado em fase de cumprimento de sentença, e destinado ao Fundo Estadual de Meio Ambiente ou a projeto ambiental previamente aprovado pelo órgão competente, prioritariamente relacionado à recuperação da Floresta Amazônica. 2. CONDENAR o réu ao pagamento de indenização por danos interinos no valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), com correção monetária pelo IPCA-E e juros moratórios pela taxa SELIC, ambos a partir da citação. 3. CONDENAR o réu ao pagamento de indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais), a ser corrigido pelo IPCA-E e juros moratórios pela taxa SELIC, ambos a partir da citação. 4. CONDENAR a parte requerida ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação pecuniária, a serem revertidos ao Fundo do Ministério Público do Estado do Pará, conforme art. 85, §2º, do CPC. 5. Oficie-se ao IBAMA e ao ICMBio, bem como à Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade, para ciência, fiscalização da execução da obrigação de fazer, e acompanhamento dos prazos estabelecidos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se. Novo Progresso/PA, data da assinatura digital. DANILO BRITO MARQUES Juiz de Direito Titular da Vara Cível da Comarca de Novo Progresso
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