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"1002180-06.2024.5.02.0242" - Resultados da Busca

Oseas Dias Da Silva x Cooperativa De Credito Do Norte De Rondonia Ltda. - Credisis Crediari e outros

ID: 321494736

Tribunal: TJRO Órgão: Ariquemes - 3ª Vara Cível Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 7000605-55.2025.8.22.0002

Data de Disponibilização: 10/07/2025

Polo Ativo:

OSEAS DIAS DA SILVA

Polo Passivo:

COOPERATIVA DE CREDITO DO NORTE DE RONDONIA LTDA. - CREDISIS CREDIARI FRANCIELE DE OLIVEIRA ALMEIDA RAFAEL SILVA DE LIMA

Sentença

Advogados:

WILLIAM ALVES JACINTHO RODRIGUES

OAB/RO XXXXXX Desbloquear

RAFAEL SILVA DE LIMA

OAB/RO XXXXXX Desbloquear

FRANCIELE DE OLIVEIRA ALMEIDA

OAB/RO XXXXXX Desbloquear

OSEAS DIAS DA SILVA

OAB/RO XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA Tribunal de Justiça de Rondônia Ariquemes - 3ª Vara Cível Avenida Juscelino Kubitschek, nº 2365, Bairro Setor Institucional, CEP 76872-853, Ariquemes, central_a… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA Tribunal de Justiça de Rondônia Ariquemes - 3ª Vara Cível Avenida Juscelino Kubitschek, nº 2365, Bairro Setor Institucional, CEP 76872-853, Ariquemes, central_ari@tjro.jus.br Processo n.: 7000605-55.2025.8.22.0002 Classe: Procedimento Comum Cível Valor da Causa:R$ 143.326,88 Última distribuição:16/01/2025 AUTOR: OSEAS DIAS DA SILVA, RUA TUCANO 1651 SETOR 01 - 76864-000 - CUJUBIM - RONDÔNIA Advogado do(a) AUTOR: OSEAS DIAS DA SILVA, OAB nº RO13861 RÉU: COOPERATIVA DE CREDITO DO NORTE DE RONDONIA LTDA. - CREDISIS CREDIARI, RUA HEITOR VILLA LOBOS 3613 SETOR INSTITUCIONAL - 76872-866 - ARIQUEMES - RONDÔNIA, COOPERATIVA DE CREDITO DA AMAZONIA - SICOOB AMAZONIA, AVENIDA AYRTON SENNA 1109, AVENIDA AYRTON SENNA, N 1109, SETOR 01 SETOR 1 - 76880-000 - BURITIS - RONDÔNIA Advogado do(a) RÉU: WILLIAM ALVES JACINTHO RODRIGUES, OAB nº RO3272, FRANCIELE DE OLIVEIRA ALMEIDA, OAB nº RO9541, RAFAEL SILVA DE LIMA, OAB nº RO13986, PROCURADORIA DA SICOOB AMAZÔNIA - COOPERATIVA DE CRÉDITO DA AMAZÔNIA SENTENÇA Vistos. Trata-se de AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS proposta por OSEAS DIAS DA SILVA em desfavor de COOPERATIVA DE CREDITO DO NORTE DE RONDONIA LTDA. - CREDISIS CREDIARI, COOPERATIVA DE CREDITO DA AMAZONIA - SICOOB AMAZONIA, alegando, em síntese, ser advogado, com salário líquido mensal variável entre de R$3.000,00 a R$5.000,00. A parte autora narra ter celebrado três contratos de empréstimo com as cooperativas rés. Dois deles foram firmados com a CREDISIS CREDIARI – COOPERATIVA DE CREDITO LTDA, sendo o contrato nº 0125002687, no valor de R$ 61.463,87, firmado em 15/05/2024, com vencimento em 08/05/2025; e o contrato nº 0125002842, no valor de R$ 51.863,01, firmado em 24/07/2024, com vencimento em 19/07/2025. O terceiro empréstimo foi contraído junto à COOPERATIVA DE CRÉDITO DA AMAZÔNIA – SICOOB AMAZÔNIA, por meio do contrato nº 112290-6, na modalidade de crédito rotativo, no valor de R$ 30.000,00, com pagamento mensal de R$ 620,00 a título de juros. O valor total das obrigações assumidas atinge a quantia de R$ 143.326,88. Afirma que os recursos foram destinados a investimentos no setor agrícola, os quais, no entanto, não se concretizaram no prazo esperado. Alega, ainda, que atualmente não dispõe de condições financeiras para arcar com os compromissos firmados, sob pena de comprometer sua subsistência, uma vez que possui despesas básicas inadiáveis, como moradia, água e energia, as quais garantem o mínimo existencial. Relata que buscou administrativamente a renegociação das dívidas junto às cooperativas rés, porém as propostas apresentadas envolviam encargos considerados excessivamente onerosos, inviabilizando qualquer acordo. Diante desse cenário, propõe a presente demanda com o objetivo de repactuar as obrigações assumidas, de modo a preservar sua dignidade, garantir o mínimo existencial e possibilitar sua reabilitação no mercado de consumo e crédito, uma vez que a atual situação compromete substancialmente sua renda e qualidade de vida. A requerida COOPERATIVA DE CRÉDITO DA AMAZÔNIA - SICOOB AMAZÔNIA, em sua contestação (ID 117835943), apresentou, preliminarmente, impugnação ao pedido de justiça gratuita, sustentando que o autor possui patrimônio considerável, incluindo imóveis rurais e semoventes, com valor estimado em R$ 1.800.218,70, o que afastaria a alegada hipossuficiência econômica. Requereu, ainda, o indeferimento da petição inicial por ausência de interesse processual. No mérito, opôs-se ao pedido de inversão do ônus da prova, argumentando que o autor é advogado, possuidor de conhecimentos técnicos suficientes para compreender os contratos firmados com as instituições rés, circunstância que afastaria a presunção de vulnerabilidade técnica ou informacional necessária à inversão probatória prevista no Código de Defesa do Consumidor. Ao final, requereu a total improcedência dos pedidos iniciais. Juntou documentos em sua defesa. A audiência conciliatória restou infrutífera (ID 117873272). A CREDISIS CREDIARI COOPERATIVA DE CRÉDITO LTDA, por meio de contestação (ID 118846331), suscitou, em sede preliminar, a inaplicabilidade da ação de repactuação de dívidas ao caso em exame, sob o argumento de que os empréstimos contraídos pelo autor não visavam à subsistência ou à satisfação de necessidades básicas, mas sim ao investimento em atividade empresarial de natureza agrícola. Alegou, ainda, a ausência de apresentação de plano de pagamento e de elementos que comprovem o comprometimento do mínimo existencial. No mérito, impugnou a concessão da justiça gratuita, sustentando que, no momento da contratação, o autor apresentou documentação demonstrando renda bruta anual de R$ 185.000,00. Acrescentou que o autor possui patrimônio relevante, composto por semoventes e imóveis rural e urbano, sendo este último o mesmo que o autor teria declarado, de forma inverídica, estar alugando, embora conste como de sua propriedade. Requereu, ainda, o indeferimento da inversão do ônus da prova, bem como a total improcedência da ação. Juntou documentos. Foi coligida impugnação às contestações (ID 119822866). Instadas as partes acerca das provas que pretendiam produzir, apenas umas das requeridas manifestou, requerendo o julgamento antecipado (ID 120137273). Vieram-me os autos conclusos. É, em essência, o relatório. FUNDAMENTO e DECIDO. Do Julgamento Antecipado: O processo em questão comporta o julgamento antecipado, nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, haja vista que a questão controvertida nos autos é meramente de direito, mostrando-se, por outro lado, suficiente a prova documental produzida, para dirimir as questões de fato suscitadas, de modo que desnecessário se faz designar audiência de instrução e julgamento para a produção de novas provas. Ademais, o Excelso Supremo Tribunal Federal já de há muito se posicionou no sentido de que a necessidade de produção de prova em audiência há de ficar evidenciada para que o julgamento antecipado da lide implique em cerceamento de defesa. A antecipação é legítima se os aspectos decisivos da causa estão suficientemente líquidos para embasar o convencimento do magistrado (RTJ 115/789). As provas produzidas nos autos não necessitam de outras para o justo deslinde da questão, nem deixam margem de dúvida. Por outro lado, “o julgamento antecipado da lide, por si só, não caracteriza cerceamento de defesa, já que cabe ao magistrado apreciar livremente as provas dos autos, indeferindo aquelas que considere inúteis ou meramente protelatórias” (STJ - 3ª Turma, Resp 251.038/SP, j. 18.02.2003, Rel. Min. Castro Filho). Sobre o tema, já se manifestou inúmeras vezes o Colendo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, no exercício de sua competência constitucional de Corte uniformizadora da interpretação de lei federal: “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESOLUÇÃO DE CONTRATO. INEXECUÇÃO NÃO DEMONSTRADA. PROVA NÃO PRODUZIDA. DESNECESSIDADE. LIVRE CONVENCIMENTO DO JUIZ. CERCEAMENTO DE DEFESA. SÚMULA 07/STJ. 1. Não configura o cerceamento de defesa o julgamento da causa sem a produção de prova testemunhal ou pericial requerida. Hão de ser levados em consideração o princípio da livre admissibilidade da prova e do livre convencimento do juiz, que, nos termos do art. 130 do Código de Processo Civil, permitem ao julgador determinar as provas que entende necessárias à instrução do processo, bem como o indeferimento daquelas que considerar inúteis ou protelatórias. Revisão vedada pela Súmula 7 do STJ. 2. Tendo a Corte de origem firmado a compreensão no sentido de que existiriam nos autos provas suficientes para o deslinde da controvérsia, rever tal posicionamento demandaria o reexame do conjunto probatório dos autos. Incidência da Súmula 7/STJ. 3. Agravo regimental não provido.” (STJ: AgRg no Ag 1350955/DF, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 18/10/2011, DJe 04/11/2011). “PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS Á EXECUÇÃO DE TÍTULO CAMBIAL. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. INDEFERIMENTO DE PRODUÇÃO DE PROVA CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CARACTERIZADO. I - Para que se tenha por caracterizado o cerceamento de defesa, em decorrência do indeferimento de pedido de produção de prova, faz-se necessário que, confrontada a prova requerida com os demais elementos de convicção carreados aos autos, essa não só apresente capacidade potencial de demonstrar o fato alegado, como também o conhecimento desse fato se mostre indispensável à solução da controvérsia, sem o que fica legitimado o julgamento antecipado da lide, nos termos do artigo 330, I, do Código de Processo Civil.” (STJ: 3ª Turma, Resp 251.038 - Edcl no AgRg, Rel. Min. Castro Filho). Consoante os Julgados acima expostos, nos quais espelho meu convencimento da desnecessidade da produção de prova diante da suficiência de todas aquelas acostadas aos autos, passo ao julgamento da causa. Das Preliminares: 1. Da inaplicabilidade da ação de repactuação de dívidas e da ausência de plano de pagamento. Alega a requerida, que a exordial não contém fundamentos jurídicos sólidos a embasar os pedidos e documentos indispensáveis à propositura da ação. Acrescenta que não foram preenchidos os requisitos previstos pela Lei do Superendividamento (Lei n. 14.181/21), quais sejam, comprovação de renda, apresentação de plano detalhado de pagamento, quantificação do mínimo existencial. Em que pesa a Lei do Superendividamento trate os pontos acima aludidos como requisitos importantes para a caracterização da condição e autorização da aplicação dos benefícios, as preliminares arguidas se confundem com o mérito da demanda, devendo ser analisadas conjuntamente. Isto porque para que seja identificada a possibilidade ou não financeira da parte autora é necessária a análise das alegações e documentos trazidos, assim como a análise do quantum das dívidas discutidas nestes autos. Assim, não merece guarida. 2. Da ausência do interesse de agir. Presente interesse de agir no ajuizamento da ação, que se mostra útil e necessária ao pleito. Vale dizer, que segundo a inicial, o autor deseja a renegociação de suas dívidas, sendo está a causa de pedir. Portanto, não há obrigatoriedade de a parte se valer da via administrativa antes do ajuizamento da ação judicial, sob pena de afronta ao princípio constitucional do acesso à justiça, direito fundamental previsto no inciso XXXV do artigo 5º da Constituição Federal. Assim, rejeito a preliminar. 3. Da impugnação à Justiça Gratuita. Suscitaram as requeridas, preliminarmente, que a concessão do benefício da gratuidade de justiça foi indevida. Ocorre que há nos autos declaração de hipossuficiência assinada pela parte autora e pedido de concessão formulado nos termos do art. 99 do CPC. Embora a referida declaração não goze de presunção absoluta (entendimento do STJ), cabe à parte ré infirmar a alegação do beneficiário, colacionando aos autos elementos para tanto, ônus do qual não se desincumbiu. Especificamente, no caso em tela, o processo versa sobre repactuação de dívidas, em que cabe averiguação do mínimo existencial para aferição se a parte faz jus à alegativa de superendividamento a possibilitar a modificação dos contratos predispostos e suas condições. Desta feita, como a natureza da pretensão, inclusive, versa sobre a impossibilidade financeira da parte autora, há mais um fundamento para credibilizar a assertiva de hipossuficiência financeira. Assim, rejeito a preliminar suscitada. Vencidas as preliminares, passo para a análise do mérito. Do mérito: Trata-se de lide consumerista proposta por OSEAS DIAS DA SILVA cuja causa de pedir é alusiva à temática do "SUPERENDIVIDAMENTO", objetivando o consumidor a repactuação de dívidas mediante plano judicial compulsório para pagamento em 5 anos (60 meses). A relação jurídica havida entre as partes é típica relação de consumo, nos termos do art. 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor, sujeitando-se, pois, à intervenção do Poder Judiciário sempre que seus contratos estabeleçam prestações desproporcionais ou excessivamente onerosas ao consumidor, conforme o disposto no art. 6º, inciso V, do CDC. No mesmo sentido é a Súmula 297 do STJ, segundo a qual “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. A celeuma refere-se, portanto, ao fenômeno social do “superendividamento”, que, diante da sua gravidade e dos impactos na vida das pessoas e na própria atividade econômica do país, ensejou a edição da Lei Federal 14.181 de 1 de julho de 2021, que, em síntese, objetiva aperfeiçoar a disciplina de crédito ao consumidor e para instituir dispositivos de prevenção e tratamento do superendividamento da pessoa física. Esta lei acarretou a modificação e acréscimos de dispositivos no Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990) e no Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003), conferindo instrumentos para que as partes interessadas, bem como o Poder Judiciário, possam lidar com essa questão da melhor maneira. De acordo com o art. 104-A do CDC, a repactuação de dívidas é um procedimento especial a ser instaurado pelo consumidor que não consegue mais pagar dívidas em geral e que, em razão disso, solicita a renegociação em bloco, com intermédio do Poder Judiciário em desfavor de todos os seus credores. A ação de repactuação de dívidas, por conta de superendividamento, pressupõe a apresentação prévia de plano de pagamento, sendo certo que a própria Lei prevê um rito a ser seguido em que o plano de pagamento deva incluir todos os seus credores, observar a atualização monetária e o prazo máximo de 5 anos, sendo que a primeira parcela será devida no prazo máximo de 180 dias, contados da homologação judicial, e o restante do saldo será devido em parcelas mensais iguais e sucessivas (art. 104-B, § 4º). Partindo do pressuposto de que a pessoa em situação de superendividamento necessita de proteção especial, a lei buscou garantir ao consumidor novos mecanismos de equalização e repactuação das dívidas por meio de um plano de pagamento que satisfaça o direito dos credores sem levar o devedor à humilhação e à indignidade. Inclusive o contraponto basilar para este instituto é a autonomia da vontade no que tange às disposições contratuais versus a dignidade da pessoa humana, sem olvidar é claro dos requisitos objetivos trazidos pela lei de superendividamento. Pois bem. Entende-se que o processo de superendividamento inaugura uma espécie de recuperação judicial da pessoa física junto ao Judiciário, no intuito de ser instituída uma forma de conciliação entre devedor e credores, na forma de plano de pagamento proposto pelo próprio devedor, que deve preservar o mínimo existencial e pode conter medidas de extensão dos prazos de pagamento e de redução dos juros da dívida ou da remuneração dos credores, entre outras medidas destinadas a facilitar o pagamento da dívida então existente. A lei estabelece objetivamente que na inexistência de conciliação entre devedor e seus credores, a pedido do credor, o juiz deverá instaurar processo de superendividamento, onde poderá proceder à revisão e repactuação das dívidas existentes por meio de plano judicial compulsório, o qual vinculará todos os credores, conforme dispõe o artigo 104-B do CDC, instituído pela Lei do Superendividamento. Entretanto, os planos de pagamentos importam na reunião de diferentes partes (de um lado o Devedor, e de outro, seus Credores) em um mesmo processo, e isso acarretará inevitavelmente na necessidade de ser concebido um juízo universal, que congrega a totalidade de credores, sob pena de imprestabilidade do instituto. Assim, deve ser conhecida a totalidade de credores, a limitação aplicada ao valor das parcelas e a duração dos respectivos pagamentos, caso contrário não há possibilidade de se analisar, por exemplo, se a parte tem condições de cumprir ou não o plano apresentado, o que se mostraria desde o início contrário à boa-fé processual. Importante dizer que a instauração do processo de repactuação de dívidas deve ocorrer apenas quando o consumidor se encontrar superendividado em razão de dívidas de consumo, não se incluindo neste contexto dívidas não decorrentes de relação de consumo. Neste ponto, o art. 2° do Decreto n°. 11.150/22, ao regulamentar a matéria atinente ao superendividamento, dispõe que entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial. Compreende-se como mínimo existencial, nos termos do art.° 3 do Decreto 11.150/22, a renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do salário mínimo vigente na data de publicação do Decreto. Feitos tais esclarecimentos, deve se apreciar no caso concreto se os requisitos objetivos estabelecidos em lei foram atendidos para homologação do pedido de repactuação de dívidas com fulcro no plano de pagamento OU se o pedido deve ser julgado improcedente. Pois bem. Em uma análise mais detida dos autos revela elementos que afastam a presunção alegada pelo autor. É imperativo que a análise do superendividamento seja feita de forma holística, considerando não apenas a renda declarada e as despesas, mas também o patrimônio do devedor, a fim de evitar o uso indevido do instituto e garantir a boa-fé objetiva, que permeia todas as relações jurídicas, inclusive as processuais, conforme se depreende dos artigos 422 do Código Civil e 5º do Código de Processo Civil. Conforme se extrai da documentação acostada aos autos, o autor, embora declare a renda e despesa acima mencionadas, possui bens de valor considerável. Verificou-se que o requerente é proprietário de imóvel urbano, localizado na cidade de Rua Tucano, n. 1643, Setor 01, Cujubim/RO (ID 118846336), e, ainda mais relevante, possui imóvel rural avaliado em R$1.721.575,20 (ID 117835947), além de alguns bovinos (ID 115708984). A Lei nº 14.181/2021, ao introduzir o Capítulo VI-A ao CDC, busca proteger o consumidor pessoa natural em situação de superendividamento de boa-fé, decorrente de incapacidade de pagar suas dívidas de consumo não profissionais. Contudo, a finalidade da norma não é servir como subterfúgio para devedores que, embora enfrentem dificuldades temporárias de fluxo de caixa, possuem patrimônio robusto que lhes permitiria adimplir suas obrigações, seja pela venda ou oneração de parte de seus bens. Conforme o artigo 104-A, § 1º, do CDC, com a redação dada pela Lei nº 14.181/2021, "O consumidor superendividado poderá requerer ao juiz a instauração de processo de repactuação de dívidas, com vistas à realização de audiência conciliatória, presidida por um juiz ou conciliador, com a presença de todos os credores, na qual será apresentada proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas." Contudo, a aplicação de tal dispositivo pressupõe a efetiva e comprovada situação de superendividamento que não pode ser superada pelo próprio devedor. No presente caso, a posse de imóvel urbano, imóvel rural e rebanho bovino denota uma capacidade financeira e patrimonial que destoa do alegado. Não se trata de negar o direito à repactuação, mas de reconhecer que as condições atuais do autor não o enquadram na hipótese de superendividamento que exige a intervenção judicial para a garantia do mínimo existencial, pois possui ativos que podem ser utilizados para reverter sua situação sem a necessidade de imposição judicial de um plano de pagamento que onere desproporcionalmente os credores. A proteção legal visa o consumidor de boa-fé que, em virtude de imprevistos ou excesso de endividamento, encontra-se em situação de insolvência que compromete sua subsistência, não aquele que possui patrimônio passível de liquidação. Além disso, apesar de ter o autor feito a adequada juntada de contratos, comprovação dos gastos e despesas, ainda assim, o critério objetivo supera a suscitação de mínimo existencial. Nesta senda, o Decreto n°. 11.150 de 26 de julho de 2022, ao regulamentar a matéria atinente ao superendividamento, dispõe: “Art. 1º Este Decreto regulamenta a preservação e o não comprometimento do mínimo existencial para fins de prevenção, tratamento e conciliação, administrativa ou judicial, de situações de superendividamento em dívidas de consumo, nos termos do disposto na Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 - Código de Defesa do Consumidor. (...) Art. 3º No âmbito da prevenção, do tratamento e da conciliação administrativa ou judicial das situações de superendividamento, considera-se mínimo existencial a renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do salário mínimo vigente na data de publicação deste Decreto. § 1º A apuração da preservação ou do não comprometimento do mínimo existencial de que trata o caput será realizada considerando a base mensal, por meio da contraposição entre a renda total mensal do consumidor e as parcelas das suas dívidas vencidas e a vencer no mesmo mês” . § 2º O reajustamento anual do salário mínimo não implicará a atualização do valor de que trata o caput. § 3ºCompete ao Conselho Monetário Nacional a atualização do valor de que trata o caput. No caso concreto, a parte autora que é devedora esclarece que os compromissos mensais atribuídos aos três empréstimos pactuados prejudicam sobremaneira a manutenção de vida digna e afetam o mínimo existencial. Ocorre que, a aferição da renda do autor, bem como de seu patrimônio e, a dedução dos débitos mensais, enseja na realidade a verificação de que resta valor superior ao mínimo existencial, de modo que não há que se falar em readequação dos empréstimos. Para melhor explicar, caracteriza-se o superendividamento como a impossibilidade de o consumidor pagar a totalidade das suas dívidas sem comprometer o mínimo existencial, considerando o mínimo existencial refere-se ao valor equivalente a renda mensal de R$ 600,00 (seiscentos reais), conforme art. 3º, caput, do Decreto 11.150/22, com redação dada pelo Decreto nº 11.567/2023, cuja norma segue com presunção de constitucionalidade. No caso dos autos, observa-se que o autor exerce as atividades de advogado e pecuarista, alegando auferir renda líquida mensal entre R$ 3.000,00 (três mil reais) a R$ 5.000,00 (cinco mil reais) apenas com o exercício da advocacia, desconsiderando-se, portanto, eventuais rendimentos provenientes da atividade agropecuária. Além disso, restou demonstrado que o autor é proprietário de bens de valor considerável, incluindo imóveis urbano e rural, bem como rebanho bovino, o que indica a existência de patrimônio relevante. Com base nas informações constantes dos autos, especialmente na documentação juntada com a inicial, é possível constatar, que os contratos firmados com as instituições rés não comprometem o chamado mínimo existencial, conforme previsto no art. 6º da Lei nº 14.181/2021, que alterou o Código de Defesa do Consumidor para dispor sobre o superendividamento. Nesse sentido, destaco entendimento sobre o tema: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. SUPERENDIVIDAMENTO. REQUISITOS OBJETIVOS NÃO ATENDIDOS. DECRETO Nº 11.150/22. NÃO CARACTERIZADO COMPROMETIMENTO DO MÍNIMO EXISTENCIAL DA DEVEDORA - RENDA MENSAL EQUIVALENTE A 25% DO SALÁRIO MÍNIMO. SENTENÇA MANTIDA. 1. A instauração do processo de repactuação de dívidas é uma faculdade do juiz e ocorrerá apenas quando o consumidor se encontrar superendividado em razão de dívidas de consumo. 2. Decreto 11.150/22, “Art. 3º No âmbito da prevenção, do tratamento e da conciliação administrativa ou judicial das situações de superendividamento, considera-se mínimo existencial a renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do salário mínimo vigente na data de publicação deste Decreto.”. 3. Assim, para a análise de eventual repactuação das dívidas do consumidor, nos termos das normas que regem o superendividamento, é necessário o preenchimento de requisitos objetivos, não verificados no presente caso. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.(TJ-PR 00480182320228160014 Londrina, Relator: Hayton Lee Swain Filho, Data de Julgamento: 05/06/2023, 15ª Câmara Cível, Data de Publicação: 05/06/2023). APELAÇÃO CÍVEL. CONSUMIDOR. SUPERENDIVIDAMENTO. PROCEDIMENTO ESPECIAL DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. REQUISITOS. AUSÊNCIA. 1. O fenômeno social do "superendividamento" ensejou a edição da Lei n. 14.181/2021, a qual busca aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento. 2. De acordo com novel legislação, ?entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação? (art. 54-A do CDC). 3. O regulamento específico atribui, por sua vez, ao ?mínimo existencial? o valor equivalente a renda mensal de R$ 600,00 (seiscentos reais), conforme art. 3º, caput, do Decreto 11.150/22, com redação dada pelo Decreto nº 11.567/2023, cuja norma segue com presunção de constitucionalidade. 4. Além disso, exclui da aferição da preservação e do comprometimento do mínimo existencial as parcelas oriundas de dívidas renegociadas, as decorrentes de operação de crédito consignado e de operações de crédito com antecipação, entre outras (art. 4º, parágrafo único, inc. I, alíneas ?f?, ?h? e ?i?, do Decreto 11.150/22). 5. Não há obrigatoriedade de instauração da segunda fase do procedimento especial de repactuação de dívidas (art. 104-B do CDC), se não preenchidos os pressupostos legais. 6. Inviável o prosseguimento do procedimento especial da Lei n. 14.181/2021, se não comprovado o superendividamento e os requisitos indispensáveis à revisão e integração dos contratos e a repactuação das dívidas, em especial, a conduta abusiva dos credores, mesmo porque a prevenção e o combate ao superendividamento, com vista à preservação do mínimo existencial do mutuário, não devem se dar por meio de uma indevida intervenção judicial na autonomia da vontade. 7. Negou-se provimento ao recurso. (TJ-DF 07368129320218070001 1719216, Relator: FABRÍCIO FONTOURA BEZERRA, Data de Julgamento: 28/06/2023, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 20/07/2023). APELAÇÃO CÍVEL. Ação de repactuação de dívidas. Superendividamento. Sentença de improcedência. Insurgência do requerente. PRELIMINAR, em contrarrazões, de violação ao princípio da dialeticidade recursal. Não ocorrência. Requerente suficientemente indica a razões de fato e de direito que, no abstrato, sustém a pretensão recursal. Atendimento o disposto no art. 1.010, III, do Código de Processo Civil. MÉRITO. Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial. Art. 54-A, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor. Não se sopesam, para fins de análise de violação ao mínimo existencial, as parcelas das dívidas decorrentes de operação de crédito consignado regido por lei específica, nos termos do art. 4º, parágrafo único, I, h, do Decreto nº 11.150/2022. A contraprestação mensal a que se submeteu o requerente, descontada do benefício previdenciário percebido por aquele, sem que considerados os descontos consignados, resulta em rendimento mensal superior ao mínimo existencial previsto na legislação de regência, a saber, R$600,00, conforme art. 3º do Decreto nº 11.150/2022. Não despontante, por razão da contratação de consumo controvertida, violação ao mínimo existencial. Sentença mantida. Recurso desprovido.(TJ-SP - Apelação Cível: 1002180-23.2022.8.26.0156 Cruzeiro, Relator: Márcio Teixeira Laranjo, Data de Julgamento: 08/02/2024, 13ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 08/02/2024). Imperioso aclarar que incumbe ao Poder Judiciário examinar demandas judiciais alusivas à tese de superendividamento com o necessário cuidado, porquanto, admitir isso significa a alteração do mercado financeiro. Não se está a dizer que não deve haver concessão do instituto, mas sim que devem ser aferidas as provas acostadas e os requisitos objetivos trazidos em lei, sob pena de generalização da aplicabilidade e até mesmo estímulo de atuação desenfreada de consumidores que possam antever esse “benefício”. Esse não é o caso do autor, já que claramente o desequilíbrio financeiro não foi intencional e aparenta estar dotado de boa fé. Além do que, apesar de trazer provas suficientes, ainda assim, com a própria declaração da Inicial revela-se incontinenti que sua receita (crédito) não compromete o mínimo existencial para própria mantença e da família onde está alicerçado. E, de qualquer modo o pedido improcede, de pleno direito. Para concluir, a liberdade contratual deve ser exercida nos limites da função social do contrato, observando-se o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual (CC, art. 421). Na hipótese dos autos, depois de efetivados os descontos dos valores devidos pelo consumidor, nota-se que não há comprometimento da totalidade de sua remuneração, de modo a assegurar o mínimo existencial. Seja como for, o estrito cumprimento do que fora livremente pactuado pelas partes contratantes não pode ser considerado violação aos direitos e garantias previstos na Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto São José da Costa Rica), no tocante ao respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade. Esclareço, em arremate, que é entendimento assente de nossa jurisprudência que o órgão judicial, para expressar a sua convicção, não precisa aduzir comentário sobre todos os argumentos levantados pelas partes. Sua fundamentação pode ser sucinta, pronunciando-se acerca do motivo que, por si só, achou suficiente para a composição do litígio, cumprindo-se os termos do artigo 489 do CPC, não infringindo o disposto no §1º, inciso IV, do aludido artigo. No mesmo sentido: “O juiz não está obrigado a responder todas as alegações das partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para fundamentar a decisão, nem se obriga a ater-se aos fundamentos indicados por elas e tampouco a responder um a um todos os seus argumentos” (STJ - 1ª Turma, AI 169.073 SPAgRg, Rel. Min. José Delgado, j. 4.6.98, negaram provimento, v. u., DJU 17.8.98, p. 44). O Código de Processo Civil previu que o julgador deve exercer o convencimento motivado e fundamentado, mantendo o entendimento de que nem todas as questões suscitadas pelas partes precisam ser enfrentadas, salvo se estiverem aptas para infirmar a conclusão do julgado. Prejudicadas ou irrelevantes as demais questões dos autos. POSTO ISTO, e considerando tudo que dos autos consta, JULGO IMPROCEDENTE o pedido inicial formulado por OSEAS DIAS DA SILVA resolvendo o mérito nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Custas pela parte autora. Pelo princípio da causalidade, condeno a parte autora, ainda, ao pagamento das despesas processuais e honorários de advogado, os quais fixo em 10% do valor da causa, com fulcro no artigo 85, § 2º, do CPC, cuja exigibilidade fica suspensa, por força do disposto no artigo 98, §3°, do mesmo diploma legal. Por fim, de modo a evitar o ajuizamento de embargos de declaração, registre-se que, ficam preteridas as demais alegações, por incompatíveis com a linha de raciocínio adotada, observando que o pedido foi apreciado e rejeitado nos limites em que foi formulado. Por consectário lógico, ficam as partes advertidas, desde logo, que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com postulação meramente infringente lhes sujeitará a imposição da multa prevista pelo artigo 1026, § 2º, do Novo Código de Processo Civil. Na hipótese de interposição de apelação, tendo em vista a nova sistemática estabelecida pelo CPC que extinguiu o juízo de admissibilidade a ser exercido pelo Juízo “a quo” (CPC, art. 1.010), sem nova conclusão, intime-se a parte contrária para que ofereça resposta no prazo de 15 (quinze) dias. Havendo recurso adesivo, também deve ser intimada a parte contrária para oferecer contrarrazões. Caso nada seja requerido após o trânsito em julgado desta, observadas as formalidades legais, arquive-se com as anotações de estilo. P.R.I.C., promovendo-se as baixas devidas no sistema. SERVIRÁ A PRESENTE SENTENÇA COMO OFÍCIO/ MANDADO DE INTIMAÇÃO/NOTIFICAÇÃO E/OU CARTA PRECATÓRIA. Ariquemes, 9 de julho de 2025 MARCUS VINICIUS DOS SANTOS DE OLIVEIRA Juiz de Direito

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Marisa Seli Lemke x Banco Agibank S.A e outros

ID: 330889974

Tribunal: TJRO Órgão: Ariquemes - 3ª Vara Cível Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 7021735-38.2024.8.22.0002

Data de Disponibilização: 22/07/2025

Polo Ativo:

MARISA SELI LEMKE

Polo Passivo:

BANCO AGIBANK S.A FERNANDA RAFAELLA OLIVEIRA DE CARVALHO FLAVIO NEVES COSTA LAZARO JOSE GOMES JUNIOR NU FINANCEIRA S.A. - SOCIEDADE DE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO

Sentença

Advogados:

MARIA DO PERPETUO SOCORRO MAIA GOMES

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LUIZ FLAVIANO VOLNISTEM

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ARTHUR SPONCHIADO DE AVILA

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LAZARO JOSE GOMES JUNIOR

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FERNANDA RAFAELLA OLIVEIRA DE CARVALHO

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FLAVIO NEVES COSTA

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ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO

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MATHEUS ARAUJO MEZZACAPA

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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA Tribunal de Justiça de Rondônia Ariquemes - 3ª Vara Cível Avenida Juscelino Kubitschek, nº 2365, Bairro Setor Institucional, CEP 76872-853, Ariquemes, central_a… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RONDÔNIA Tribunal de Justiça de Rondônia Ariquemes - 3ª Vara Cível Avenida Juscelino Kubitschek, nº 2365, Bairro Setor Institucional, CEP 76872-853, Ariquemes, central_ari@tjro.jus.br Processo n.: 7021735-38.2024.8.22.0002 Classe: Procedimento Comum Cível Valor da Causa:R$ 0,00 Última distribuição:18/12/2024 AUTOR: MARISA SELI LEMKE, RUA MONTEIRO LOBATO 4071, - DE 3757/3758 AO FIM SETOR 06 - 76873-628 - ARIQUEMES - RONDÔNIA Advogado do(a) AUTOR: MATHEUS ARAUJO MEZZACAPA, OAB nº SP446214 RÉU: BANCO SANTANDER (BRASIL) S/A, - 76801-000 - PORTO VELHO - RONDÔNIA, BANCO C6 CONSIGNADO S.A., AVENIDA JABAQUARA 2819, - DE 2263 AO FIM - LADO ÍMPAR MIRANDÓPOLIS - 04045-004 - SÃO PAULO - SÃO PAULO, CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, , INEXISTENTE - 76800-000 - PORTO VELHO - RONDÔNIA, NU FINANCEIRA S.A. - SOCIEDADE DE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, CAPOTE VALENTE 120, ANDAR 3 E 4 PINHEIROS - 05409-000 - SÃO PAULO - SÃO PAULO, BANCO AGIBANK S.A, AV. AGAMENON MAGALHÃES 4575, 7ª ANDAR PAISSANDU - 50070-160 - RECIFE - PERNAMBUCO, OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, - 76801-000 - PORTO VELHO - RONDÔNIA Advogado do(a) RÉU: LAZARO JOSE GOMES JUNIOR, OAB nº MS31757, MARIA DO PERPETUO SOCORRO MAIA GOMES, OAB nº PA24039, LUIZ FLAVIANO VOLNISTEM, OAB nº RO2609, ARTHUR SPONCHIADO DE AVILA, OAB nº PR63283, ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO, OAB nº PE23255, FLAVIO NEVES COSTA, OAB nº DF28317, FERNANDA RAFAELLA OLIVEIRA DE CARVALHO, OAB nº PE32766, PROCURADORIA BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A., PROCURADORIA DO BANCO C6 CONSIGNADO S/A, PROCURADORIA DA CREFISA S/A SENTENÇA Vistos. Trata-se de AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS proposta por MARISA SELI LEMKE em desfavor de BANCO SANTANDER (BRASIL) S/A, BANCO C6 CONSIGNADO S.A., CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, NU FINANCEIRA S.A. - SOCIEDADE DE CREDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, BANCO AGIBANK S.A, OMNI S/A CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO Narra a parte autora que é aposentada, recebendo e R$ 919,40 (novecentos e dezenove reais e quarenta centavos) mensais líquidos, e que sua situação financeira foi comprometida gradativamente devido a uma série de eventos adversos que impactaram sua estabilidade financeira, contratando empréstimo sobre empréstimo. Aponta que sua subsistência restou prejudicada, impossibilitando-a de pagar por bens essenciais como moradia, alimentação, gás, água, luz e telefone. Desta feita, a autora se vê na contingência de propor a presente demanda, com o objetivo de ver repactuadas as suas obrigações com as instituições qualificadas preambularmente e, assim, readquirir a sua dignidade e reabilitar-se nos mercados de consumo e de crédito, já que o comprometimento da renda causa-lhe transtornos. Enfatizou que procurou os requeridos visando renegociar tais empréstimos, entretanto apenas lhe foi fornecido opções com juros abusivos que lhe oneraria ainda mais. Desta feita, objetiva a repactuação das dívidas de modo que consiga solver tais débitos, assegurado o mínimo existencial, razão pela qual ofertou plano de pagamento dirigido aos credores que figuram no polo passivo da demanda. A inicial veio instruída de documentos. A antecipação de tutela restou indeferida (ID 115654354). O Banco C6 Consignado S.A., em sua manifestação defensiva (ID 116412019), impugnou os pedidos formulados pela parte autora sob o argumento de inexistência de superendividamento, alegando que os descontos dos empréstimos consignados estão em conformidade com a margem legal de 35% do benefício previdenciário. Em sede preliminar, requereu a extinção do feito sem julgamento do mérito, por ausência de interesse de agir e pela inexistência de tentativa prévia de solução administrativa. No mérito, sustentou a inaplicabilidade da Lei nº 14.181/2021 à espécie, por se tratar de contratos regidos por legislação específica e que não comprometem o mínimo existencial. Alegou, ainda, a ausência de comprovação de incapacidade financeira por parte da autora, impugnou o pedido de gratuidade da justiça e considerou abusivo o plano de pagamento proposto, pugnando, ao final, pela improcedência dos pedidos, pela não fixação de honorários sucumbenciais em razão do princípio da causalidade e pela manutenção do ônus probatório com a parte autora. Por sua vez, a instituição financeira Nu Financeira S.A. apresentou contestação em que, preliminarmente, suscitou a ausência de interesse de agir, ante a inexistência de pretensão resistida, bem como requereu o indeferimento do pedido de justiça gratuita, por ausência de comprovação da hipossuficiência econômica. No mérito, alegou que a autora não demonstrou os requisitos legais da Lei nº 14.181/2021, especialmente no que se refere ao comprometimento do mínimo existencial e à ausência de má-fé. Afirmou que os contratos foram firmados de forma consciente, digitalmente autorizados, com ciência da parte autora, que realizou compras, contratações de seguros e empréstimos voluntariamente. Rejeitou qualquer responsabilidade pelo superendividamento, imputando a situação à conduta exclusiva da demandante. Ao final, requereu a improcedência integral da demanda (ID 117824430). O Banco Agibank S.A., por sua vez, apresentou contestação (ID 117827724) na qual, preliminarmente, arguiu a inépcia da inicial, a ilegitimidade passiva, a impugnação ao valor da causa e a ausência de interesse processual, sustentando que a autora não comprovou sua condição de superendividada nem apresentou os documentos exigidos pela Lei nº 14.181/2021. No mérito, afirmou que os contratos são regulares, que não houve comprometimento do mínimo existencial e que a autora agiu com má gestão financeira ou má-fé. Requereu a improcedência dos pedidos, o indeferimento da liminar de suspensão dos descontos e da exclusão do nome da autora dos cadastros de inadimplentes. O Banco Crefisa S.A., em sua peça defensiva (ID 117841728), alegou, em preliminar, a ausência de interesse processual, pleiteando a extinção do processo sem resolução do mérito. Afirmou que os contratos foram firmados de forma regular, com autorização expressa para desconto em conta corrente, sendo a inadimplência decorrente da má administração financeira da autora. Defendeu a legalidade das taxas aplicadas, negou a ocorrência de superendividamento e refutou a aplicação da Lei nº 14.181/2021. Requereu a improcedência da ação, impugnou o pedido de limitação dos descontos e rejeitou a inversão do ônus da prova. A audiência de conciliação foi realizada, mas restou infrutífera. Na oportunidade, a autora requereu a exclusão do Banco Omni S.A. do polo passivo da demanda, diante da quitação do débito (ID 117873002). O Banco Omni S.A., por sua vez, apresentou contestação (ID 118629555), arguindo, em sede preliminar, sua ilegitimidade passiva, em razão da cessão do crédito à empresa Eletro JM, pleiteando sua exclusão do polo passivo ou, subsidiariamente, a citação da real credora. Sustentou a ausência de tentativa prévia de negociação pela autora, contrariando os princípios da Lei nº 14.181/2021. Requereu o indeferimento da tutela de urgência por ausência de comprovação do comprometimento do mínimo existencial. No mérito, defendeu a validade do contrato firmado, a inexistência de abusividade, e que eventual repactuação só pode ocorrer com anuência do credor. Requereu, ao final, a improcedência da ação. O Banco Santander Brasil S.A., em sua contestação (ID 118905772), alegou, preliminarmente, a impugnação ao pedido de justiça gratuita, sustentando a capacidade financeira da autora. Apontou inépcia da inicial pela ausência de plano de pagamento válido, bem como destacou a necessidade de realização de audiência de conciliação conforme o rito especial da Lei nº 14.181/2021. No mérito, sustentou a validade dos contratos e descontos, a inexistência de superendividamento e o uso inadequado dos recursos pela autora. Pleiteou a improcedência dos pedidos, a manutenção das condições contratuais e a rejeição da inversão do ônus da prova, requerendo, ainda, a produção de provas. Em réplica (ID 120716076), a autora refutou todas as preliminares levantadas, defendendo a regularidade da inicial e a aplicação da Lei nº 14.181/2021 ao caso. Sustentou a ausência de necessidade de esgotamento da via administrativa, com fundamento no princípio da inafastabilidade da jurisdição. Defendeu a correção do valor da causa, a concessão da gratuidade da justiça, e o reconhecimento de sua condição de superendividada, com comprometimento do mínimo existencial. Requereu a inversão do ônus da prova diante de sua hipossuficiência técnica e da verossimilhança das alegações, além de destacar a concessão irresponsável de crédito pelos réus. Ao final, pugnou pelo afastamento das preliminares e pela procedência integral da demanda. Instadas as partes acerca das provas que pretendiam produzir, nada requereram. Vieram-me os autos conclusos. É, em essência, o relatório. FUNDAMENTO e DECIDO. Do Julgamento Antecipado: O processo em questão comporta o julgamento antecipado, nos termos do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, haja vista que a questão controvertida nos autos é meramente de direito, mostrando-se, por outro lado, suficiente a prova documental produzida, para dirimir as questões de fato suscitadas, de modo que desnecessário se faz designar audiência de instrução e julgamento para a produção de novas provas. Ademais, o Excelso Supremo Tribunal Federal já de há muito se posicionou no sentido de que a necessidade de produção de prova em audiência há de ficar evidenciada para que o julgamento antecipado da lide implique em cerceamento de defesa. A antecipação é legítima se os aspectos decisivos da causa estão suficientemente líquidos para embasar o convencimento do magistrado (RTJ 115/789). As provas produzidas nos autos não necessitam de outras para o justo deslinde da questão, nem deixam margem de dúvida. Por outro lado, “o julgamento antecipado da lide, por si só, não caracteriza cerceamento de defesa, já que cabe ao magistrado apreciar livremente as provas dos autos, indeferindo aquelas que considere inúteis ou meramente protelatórias” (STJ - 3ª Turma, Resp 251.038/SP, j. 18.02.2003, Rel. Min. Castro Filho). Sobre o tema, já se manifestou inúmeras vezes o Colendo SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, no exercício de sua competência constitucional de Corte uniformizadora da interpretação de lei federal: “AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESOLUÇÃO DE CONTRATO. INEXECUÇÃO NÃO DEMONSTRADA. PROVA NÃO PRODUZIDA. DESNECESSIDADE. LIVRE CONVENCIMENTO DO JUIZ. CERCEAMENTO DE DEFESA. SÚMULA 07/STJ. 1. Não configura o cerceamento de defesa o julgamento da causa sem a produção de prova testemunhal ou pericial requerida. Hão de ser levados em consideração o princípio da livre admissibilidade da prova e do livre convencimento do juiz, que, nos termos do art. 130 do Código de Processo Civil, permitem ao julgador determinar as provas que entende necessárias à instrução do processo, bem como o indeferimento daquelas que considerar inúteis ou protelatórias. Revisão vedada pela Súmula 7 do STJ. 2. Tendo a Corte de origem firmado a compreensão no sentido de que existiriam nos autos provas suficientes para o deslinde da controvérsia, rever tal posicionamento demandaria o reexame do conjunto probatório dos autos. Incidência da Súmula 7/STJ. 3. Agravo regimental não provido.” (STJ: AgRg no Ag 1350955/DF, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 18/10/2011, DJe 04/11/2011). “PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS Á EXECUÇÃO DE TÍTULO CAMBIAL. JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE. INDEFERIMENTO DE PRODUÇÃO DE PROVA CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CARACTERIZADO. I - Para que se tenha por caracterizado o cerceamento de defesa, em decorrência do indeferimento de pedido de produção de prova, faz-se necessário que, confrontada a prova requerida com os demais elementos de convicção carreados aos autos, essa não só apresente capacidade potencial de demonstrar o fato alegado, como também o conhecimento desse fato se mostre indispensável à solução da controvérsia, sem o que fica legitimado o julgamento antecipado da lide, nos termos do artigo 330, I, do Código de Processo Civil.” (STJ: 3ª Turma, Resp 251.038 - Edcl no AgRg, Rel. Min. Castro Filho). Consoante os Julgados acima expostos, nos quais espelho meu convencimento da desnecessidade da produção de prova diante da suficiência de todas aquelas acostadas aos autos, passo ao julgamento da causa. Das Preliminares: Da inépcia da inicial e da falta de interesse de agir: Quanto à inépcia da inicial e falta de interesse de agir suscitadas pelas respectivas defesas, importa dizer que não merecem acolhimento tais preliminares. Explico. Alegam que a exordial não contém fundamentos jurídicos sólidos a embasar os pedidos e documentos indispensáveis à propositura da ação. Asseveram que não foram preenchidos os requisitos previstos pela Lei do Superendividamento (Lei n. 14.181/21), quais sejam, comprovação de renda, apresentação de plano detalhado de pagamento, quantificação do mínimo existencial. A Lei nº 14.181/2021, que alterou o Código de Defesa do Consumidor, disciplina a prevenção do superendividamento do consumidor, entendido como a impossibilidade manifesta de quitar a totalidade dos débitos sem comprometimento do seu mínimo existencial. No âmbito dos artigos 54-A e 104-A, ambos do CDC, o legislador optou por remeter à regulamentação infralegal a expressão mínimo existencial, contudo, a complementação legislativa resume-se exclusivamente à definição do termo, sem que tal impeça o processamento do requerimento de repactuação de dívidas antes da regulamentação. Desse modo, mesmo que não houvesse a regulamentação respectiva, não poderia o magistrado deixar de examinar os feitos porque ausente definição pontual do mínimo existencial nos casos concretos postos a julgamento. Neste ponto, em que pese as contestações façam alusão à ausência de regulamentação específica quanto ao mínimo existencial, recentemente, o Decreto nº 11.150, de 26 de Julho de 2022, em plena vigência, passou a regulamentar a preservação e o não comprometimento do mínimo existencial para fins de prevenção, tratamento e conciliação de situações de superendividamento em dívidas de consumo, nos termos do dispostos pelo Código de Defesa do Consumidor. Ademais, de acordo com o artigo 330, §1º, do Código de Processo Civil, considera-se inepta a petição inicial quando: (i) lhe faltar pedido ou causa de pedir; (ii) o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido genérico; (iii) da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão; (iv) contiver pedidos incompatíveis entre si. No caso em apreço, não se verifica quaisquer das hipóteses elencadas acima. Com efeito, constata-se que a pretensão deduzida na inicial foi embasada por argumentos congruentes, de modo a possibilitar sua adequada compreensão e exame pela via judicial eleita. Neste sentido, é a Jurisprudência: APELAÇÃO. CIVIL E CONSUMIDOR. REPACTUAÇÃO DE DÍVIDA. CONTRATOS BANCÁRIOS. SUPERENDIVIDAMENTO.LEI Nº 14.181/2021. MÍNIMO EXISTENCIAL. AUSÊNCIA DE REGULAMENTAÇÃO. ANÁLISE DAS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO CONCRETO. DIREITO DE PETIÇÃO. INTERESSE DE AGIR. PROTEÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. EXTINÇÃO. SENTENÇA CASSADA. 1. Apelação interposta contra sentença que indeferiu a petição inicial e extinguiu o processo sem resolução do mérito, nos termos dos artigos. 330, inciso III, e art. 485, I, ambos do CPC/2015, por entender ausência do interesse de agir da autora. 2.Considerando que o mínimo existencial está atrelado ao direito fundamental da dignidade da pessoa humana, insculpida no art. 5º, da Constituição Federal, razão pela qual tem aplicação imediata, a repactuação de dívidas, nos termos estabelecidos nos artigos 104-A e 104- B do código consumerista, permite que a demanda seja processada antes da regulamentação do aludido mínimo existencial. Portanto, a Lei 14.181/2021 é de aplicação imediata, inclusive em relação aos contratos anteriormente à sua vigência. 3. afigura-se incoerência do legislador criar determinado instituto com objetivo de garantir práticas de crédito responsável, prevenindo a pessoa do superendividamento, com possibilidades de revisão e repactuação de dívidas de forma justa e equilibrada, mas, ao mesmo tempo, impor obstáculos tais que impeçam ou retardam à visada proteção e o resultado útil da lei 4. Recurso conhecido e provido. Sentença Cassada. (Acórdão 1639194, 07041353420228070014, Relator: SANDOVAL OLIVEIRA, 2ª Turma Cível, data de julgamento: 8/11/2022, publicado no DJE: 24/11/2022. Pág.: Sem Página Cadastrada.) DIREITO CONSTITUCIONAL, CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. EMPRÉSTIMOS BANCÁRIOS. DESCONTOS. FOLHA DE PAGAMENTO E CONTA CORRENTE. SUPERENDIVIDAMENTO. REGRAMENTO CONSUMERISTA. ESTATUTO DO IDOSO. ALTERAÇÕES. MÍNIMO EXISTENCIAL. DIREITO À REPACTUAÇÃO DAS OBRIGAÇÕES. MÍNIMO EXISTENCIAL. CARÊNCIA DE BALIZAS. PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. LACUNA. ÓBICE. INEXISTÊNCIA. PROCESSO BIFÁSICO. ETAPAS CONCILIATÓRIA E JUDICIAL. INSTAURAÇÃO. INAFASTABILIDADE. 1. A promulgação da Lei 14.181/2021, regramento que promoveu significativas alterações no Código de Defesa do Consumidor (CDC) e no Estatuto do Idoso, instituiu medidas voltadas a garantir ao consumidor superendividado, pessoa natural e de boa-fé, o direito à repactuação de suas obrigações, sem comprometimento do seu mínimo existencial. 2. Em que pese o reconhecimento de que a atual carência de balizas legais e jurisprudenciais suficientemente uniformes comprometem o exato dimensionamento dos conceitos de mínimo existencial e superendividamento, afigura-se inadmissível, consoante os ditames do art. 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, que a aludida lacuna constitua óbice à prestação jurisdicional almejada. 3. Nos termos do art. 104-A da Lei 8.078/1990, incluído pela Lei 14.181/2021, a requerimento do devedor, faculta-se ao magistrado a realização de audiência conciliatória, presidida por ele ou por mediador credenciado e com a presença de todos os credores, para que o mutuário, desde que observadas as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas, venha a apresentar, naquela oportunidade, proposta de quitação das dívidas contraídas. 3.1. Caso fracassada a tentativa de conciliação, recai sobre o julgador, nos moldes do art. 104-B do aludido normativo, o dever de instauração do procedimento necessário à conformação do plano compulsório, ali expendido, de readequação dos parâmetros negociais ajustados entre os contendores. 4. Em se tratando de anseio amparado nos comandos da Lei 14.181/2021, enquanto norma de ordem pública e de aplicação imediata, inafastável a instauração do processo bifásico de repactuação de dívidas a que se referem os arts. 104-A e 104-B do CDC, sob pena de ofensa ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. 5. Recurso do réu parcialmente provido. Recurso do autor prejudicado.(Acórdão 1635914, 07424484020218070001, Relator: MARIO-ZAM BELMIRO, 8ª Turma Cível, data de julgamento: 10/11/2022, publicado no DJE: 24/11/2022. Pág.: Sem Página Cadastrada.) Logo, incabível o reconhecimento tanto da inépcia da inicial, quanto da suposta ausência de interesse de agir. Da Impugnação à Justiça Gratuita: Suscitaram alguns réus, preliminarmente, que a concessão do benefício da gratuidade de justiça foi indevida. Ocorre que há nos autos declaração de hipossuficiência assinada pela parte autora e pedido de concessão formulado nos termos do art. 99 do CPC. Embora a referida declaração não goze de presunção absoluta (entendimento do STJ), cabe à parte ré infirmar a alegação da beneficiária, colacionando aos autos elementos para tanto, ônus do qual não se desincumbiu. Os documentos juntados pela parte autora são verossímeis, não havendo qualquer elemento que evidencie a falta dos pressupostos para a concessão do benefício aludido (art. 99, §2º, do CPC). Especificamente, no caso em tela, o processo versa sobre repactuação de dívidas, em que cabe averiguação do mínimo existencial para aferição se a parte faz jus à alegativa de superendividamento a possibilitar a modificação dos contratos predispostos e suas condições. Desta feita, como a natureza da pretensão, inclusive, versa sobre a impossibilidade financeira da parte autora, há mais um fundamento para credibilizar a assertiva de hipossuficiência financeira. Assim, rejeito a preliminar suscitada. Da ausência de cumprimento dos requisitos para a repactuação de dívidas: Os requeridos alegaram que a exordial não contém fundamentos jurídicos sólidos a embasar os pedidos e documentos indispensáveis à propositura da ação. Acrescenta que não foram preenchidos os requisitos previstos pela Lei do Superendividamento (Lei n. 14.181/21), quais sejam, comprovação de renda, apresentação de plano detalhado de pagamento, quantificação do mínimo existencial. Em que pesa a Lei do Superendividamento trate os pontos acima aludidos como requisitos importantes para a caracterização da condição e autorização da aplicação dos benefícios, as preliminares arguidas se confundem com o mérito da demanda, devendo ser analisadas conjuntamente. Isto porque para que seja identificada a possibilidade ou não financeira da parte autora é necessária a análise das alegações e documentos trazidos, assim como a análise do quantum das dívidas discutidas nestes autos. Assim, não merece guarida. Da ausência de requisitos para a concessão de tutela de urgência: Os bancos requeridos sustentam que a parte autora não preenche os requisitos legais para a concessão da tutela de urgência pleiteada na petição inicial. Contudo, conforme já decidido nos autos, nos termos do ID 115654354, restou indeferido o pedido de antecipação dos efeitos da tutela. Assim sendo, por já ter sido objeto de deliberação judicial anterior, rejeito a preliminar arguida. Da impugnação do valor da causa: O requerido impugnou o valor atribuído à causa, requerendo sua retificação sob o argumento de controvérsia quanto à quantia indicada. Todavia, verifica-se que o valor indicado pela parte autora tem como referência o plano de pagamento por ela apresentado, o qual foi elaborado com base na soma dos contratos mencionados nos autos, permitindo, portanto, a análise estimada da média do montante em discussão. Diante disso, afasto a preliminar suscitada. Da ilegitimidade passiva do Banco AGIBANK: O banco requerido sustenta sua ilegitimidade para figurar no polo passivo da presente demanda, sob o argumento de que o contrato celebrado com a parte autora não foi responsável por colocá-la em condição de superendividamento. Com base nessa alegação, requer a extinção do feito sem resolução do mérito, em relação ao banco AGIBANK. No entanto, a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelo réu deve ser rejeitada, pois não encontra amparo na sistemática legal instituída pela Lei nº 14.181/2021. Ao contrário do que sustenta o banco, a legitimidade dos credores não está condicionada à demonstração individual de que seus contratos, isoladamente, causaram o superendividamento do consumidor. O procedimento previsto nos arts. 104-A e 104-B do Código de Defesa do Consumidor é de natureza coletiva e integrativa, voltado à repactuação global das dívidas do consumidor superendividado, de forma a permitir a reorganização de sua vida financeira e a preservação do mínimo existencial. O caput do art. 104-A do CDC é claro ao prever a presença de todos os credores cujos créditos estejam inseridos no rol das dívidas previstas no art. 54-A — o que abrange qualquer operação de crédito decorrente de relação de consumo, inclusive as que observam formalmente a margem consignável. Portanto, o banco Agibank é parte legítima para compor o polo passivo, pois é detentor de crédito que integra o passivo da autora. Diante disso, a preliminar deve ser rejeitada, com o regular prosseguimento da demanda em relação ao Banco AGIBANK. Do mérito: Trata-se de lide consumerista proposta por MARISA SELI LEMKE cuja causa de pedir é alusiva à temática do "SUPERENDIVIDAMENTO", objetivando o consumidor a repactuação de dívidas mediante plano judicial compulsório para pagamento em 5 anos (60 meses). A relação jurídica havida entre as partes é típica relação de consumo, nos termos do art. 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor, sujeitando-se, pois, à intervenção do Poder Judiciário sempre que seus contratos estabeleçam prestações desproporcionais ou excessivamente onerosas ao consumidor, conforme o disposto no art. 6º, inciso V, do CDC. No mesmo sentido é a Súmula 297 do STJ, segundo a qual “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. A tese autoral é no sentido de que detém renda bruta no quantitativo de R$ 919,40 (novencentos e dezenove reais e quarenta centavos), sendo que consignados e pessoais totalizam R$1.644,70 (mil, seiscentos e quarenta e quatro reais e setenta centavos) ao mês, e, assim, a dívida mensal do requerente compromete 116% da sua renda líquida. Em análise aos documentos, verifica-se que a autora possui um total de R$36.501,91 em empréstimos, sobrando portanto de seu salário apenas R$919,40, saldo este insuficiente para garantir o mínimo existencial de maneira digna. Disso se extrai da petição inicial e a planilha acostada ao ID 115180726 e 115180733. A celeuma refere-se, portanto, ao fenômeno social do “superendividamento”, que, diante da sua gravidade e dos impactos na vida das pessoas e na própria atividade econômica do país, ensejou a edição da Lei Federal 14.181 de 1 de julho de 2021, que, em síntese, objetiva aperfeiçoar a disciplina de crédito ao consumidor e para instituir dispositivos de prevenção e tratamento do superendividamento da pessoa física. Esta lei acarretou a modificação e acréscimos de dispositivos no Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/1990) e no Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003), conferindo instrumentos para que as partes interessadas, bem como o Poder Judiciário, possam lidar com essa questão da melhor maneira. De acordo com o art. 104-A do CDC, a repactuação de dívidas é um procedimento especial a ser instaurado pelo consumidor que não consegue mais pagar dívidas em geral e que, em razão disso, solicita a renegociação em bloco, com intermédio do Poder Judiciário em desfavor de todos os seus credores. A ação de repactuação de dívidas, por conta de superendividamento, pressupõe a apresentação prévia de plano de pagamento, sendo certo que a própria Lei prevê um rito a ser seguido em que o plano de pagamento deva incluir todos os seus credores, observar a atualização monetária e o prazo máximo de 5 anos, sendo que a primeira parcela será devida no prazo máximo de 180 dias, contados da homologação judicial, e o restante do saldo será devido em parcelas mensais iguais e sucessivas (art. 104-B, § 4º). Partindo do pressuposto de que a pessoa em situação de superendividamento necessita de proteção especial, a lei buscou garantir ao consumidor novos mecanismos de equalização e repactuação das dívidas por meio de um plano de pagamento que satisfaça o direito dos credores sem levar o devedor à humilhação e à indignidade. Inclusive o contraponto basilar para este instituto é a autonomia da vontade no que tange às disposições contratuais versus a dignidade da pessoa humana, sem olvidar é claro dos requisitos objetivos trazidos pela lei de superendividamento. Pois bem. Entende-se que o processo de superendividamento inaugura uma espécie de recuperação judicial da pessoa física junto ao Judiciário, no intuito de ser instituída uma forma de conciliação entre devedor e credores, na forma de plano de pagamento proposto pelo próprio devedor, que deve preservar o mínimo existencial e pode conter medidas de extensão dos prazos de pagamento e de redução dos juros da dívida ou da remuneração dos credores, entre outras medidas destinadas a facilitar o pagamento da dívida então existente. A lei estabelece objetivamente que na inexistência de conciliação entre devedor e seus credores, a pedido do credor, o juiz deverá instaurar processo de superendividamento, onde poderá proceder à revisão e repactuação das dívidas existentes por meio de plano judicial compulsório, o qual vinculará todos os credores, conforme dispõe o artigo 104-B do CDC, instituído pela Lei do Superendividamento. Entretanto, os planos de pagamentos importam na reunião de diferentes partes (de um lado o Devedor, e de outro, seus Credores) em um mesmo processo, e isso acarretará inevitavelmente na necessidade de ser concebido um juízo universal, que congrega a totalidade de credores, sob pena de imprestabilidade do instituto. Assim, deve ser conhecida a totalidade de credores, a limitação aplicada ao valor das parcelas e a duração dos respectivos pagamentos, caso contrário não há possibilidade de se analisar, por exemplo, se a parte tem condições de cumprir ou não o plano apresentado, o que se mostraria desde o início contrário à boa-fé processual. Importante dizer que a instauração do processo de repactuação de dívidas deve ocorrer apenas quando o consumidor se encontrar superendividado em razão de dívidas de consumo, não se incluindo neste contexto dívidas não decorrentes de relação de consumo. Neste ponto, o art. 2° do Decreto n°. 11.150/22, ao regulamentar a matéria atinente ao superendividamento, dispõe que entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial. Compreende-se como mínimo existencial, nos termos do art.° 3 do Decreto 11.150/22, a renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do salário mínimo vigente na data de publicação do Decreto. Feitos tais esclarecimentos, deve se apreciar no caso concreto se os requisitos objetivos estabelecidos em lei foram atendidos para homologação do pedido de repactuação de dívidas com fulcro no plano de pagamento OU se o pedido deve ser julgado improcedente. Pois bem. No caso concreto, o autor anexou plano de pagamento no bojo da inicial (ID 115180726 e 115180733), sendo que estipulou um total de 60 parcelas para honrar em 05 (cinco) anos o adimplemento dos contratos de empréstimos firmados com os Bancos/Financeiras que estão no polo passivo, desde que lhe concedida a carência de 180 dias, a partir da homologação do juízo, para quitar a primeira parcela. Além disso, a autora anexou documentos comprobatórios da sua renda total, como seu comprovante de renda e despesas que detém mensalmente, situações tais que são o motivo da atual condição de superendividamento da autora bem como anexou contratos alusivos aos empréstimos/financiamento. Indicou em suas manifestações que competiria aos réus em virtude de inversão do ônus probatório (artigo 6º, VIII do CDC), a apresentação dos contratos firmados que faltavam. Não bastasse isso, apesar de ter a autora feito a adequada juntada de contratos, comprovação dos gastos e despesas, ainda assim, o critério objetivo supera a suscitação de mínimo existencial. Nesta senda, o Decreto n°. 11.150 de 26 de julho de 2022, ao regulamentar a matéria atinente ao superendividamento, dispõe: “Art. 1º Este Decreto regulamenta a preservação e o não comprometimento do mínimo existencial para fins de prevenção, tratamento e conciliação, administrativa ou judicial, de situações de superendividamento em dívidas de consumo, nos termos do disposto na Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 - Código de Defesa do Consumidor. (...) Art. 3º No âmbito da prevenção, do tratamento e da conciliação administrativa ou judicial das situações de superendividamento, considera-se mínimo existencial a renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do salário mínimo vigente na data de publicação deste Decreto. § 1º A apuração da preservação ou do não comprometimento do mínimo existencial de que trata o caput será realizada considerando a base mensal, por meio da contraposição entre a renda total mensal do consumidor e as parcelas das suas dívidas vencidas e a vencer no mesmo mês” . § 2º O reajustamento anual do salário mínimo não implicará a atualização do valor de que trata o caput. § 3ºCompete ao Conselho Monetário Nacional a atualização do valor de que trata o caput. (grifo meu). No caso concreto, a parte autora que é devedora esclarece que os compromissos mensais atribuídos aos diversos empréstimos pactuados prejudicam sobremaneira a manutenção de vida digna, após os descontos das prestações dos empréstimos e afetam o mínimo existencial. Ocorre que, a aferição da renda da autora e, a dedução dos débitos mensais, enseja na realidade a verificação de que resta valor superior ao mínimo existencial, de modo que não há que se falar em limitação dos descontos e readequação dos empréstimos. Para melhor explicar, caracteriza-se o superendividamento como a impossibilidade de o consumidor pagar a totalidade das suas dívidas sem comprometer o mínimo existencial, considerando o mínimo existencial refere-se ao valor equivalente a renda mensal de R$ 600,00 (seiscentos reais), conforme art. 3º, caput, do Decreto 11.150/22, com redação dada pelo Decreto nº 11.567/2023, cuja norma segue com presunção de constitucionalidade. A autora, por sua vez, mesmo com os descontos consignados, percebe uma renda líquida de R$ 919,40. Verifica-se, a partir dos documentos constantes nos autos, que a parte autora realiza mensalmente o pagamento de empréstimos com desconto em conta corrente nos valores de R$ 218,17 (ID 115182059), R$ 60,31 (ID 115182057), R$ 50,31 (ID 115182054) e R$ 156,31 (ID 115182051), totalizando R$ 485,10. Após a dedução desses valores de sua renda líquida, remanesce o montante de R$ 434,30. Embora tal quantia seja inferior ao parâmetro de R$ 600,00 estabelecido como mínimo existencial pelo art. 3º do Decreto nº 11.150/2022, com redação dada pelo Decreto nº 11.567/2023, observa-se que os descontos realizados superam o percentual de 30% da renda da autora, cujo valor total é de R$ 1.412,00 — sendo 30% equivalente a R$ 423,60. Dessa forma, não restando demonstrado o comprometimento absoluto do mínimo existencial, e considerando que a renda remanescente não é incompatível com a subsistência digna nos termos definidos pela regulamentação vigente, não se reconhece, neste ponto, a configuração do superendividamento para fins de deferimento do pedido formulado. Assim, rejeita-se o pleito, dada a ausência de prova inequívoca da lesão ao mínimo existencial da parte autora. Nesse sentido, destaco entendimento sobre o tema: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. SUPERENDIVIDAMENTO. REQUISITOS OBJETIVOS NÃO ATENDIDOS. DECRETO Nº 11.150/22. NÃO CARACTERIZADO COMPROMETIMENTO DO MÍNIMO EXISTENCIAL DA DEVEDORA - RENDA MENSAL EQUIVALENTE A 25% DO SALÁRIO MÍNIMO. SENTENÇA MANTIDA. 1. A instauração do processo de repactuação de dívidas é uma faculdade do juiz e ocorrerá apenas quando o consumidor se encontrar superendividado em razão de dívidas de consumo. 2. Decreto 11.150/22, “Art. 3º No âmbito da prevenção, do tratamento e da conciliação administrativa ou judicial das situações de superendividamento, considera-se mínimo existencial a renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do salário mínimo vigente na data de publicação deste Decreto.”. 3. Assim, para a análise de eventual repactuação das dívidas do consumidor, nos termos das normas que regem o superendividamento, é necessário o preenchimento de requisitos objetivos, não verificados no presente caso. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.(TJ-PR 00480182320228160014 Londrina, Relator: Hayton Lee Swain Filho, Data de Julgamento: 05/06/2023, 15ª Câmara Cível, Data de Publicação: 05/06/2023). APELAÇÃO CÍVEL. CONSUMIDOR. SUPERENDIVIDAMENTO. PROCEDIMENTO ESPECIAL DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. REQUISITOS. AUSÊNCIA. 1. O fenômeno social do "superendividamento" ensejou a edição da Lei n. 14.181/2021, a qual busca aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento. 2. De acordo com novel legislação, ?entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação? (art. 54-A do CDC). 3. O regulamento específico atribui, por sua vez, ao ?mínimo existencial? o valor equivalente a renda mensal de R$ 600,00 (seiscentos reais), conforme art. 3º, caput, do Decreto 11.150/22, com redação dada pelo Decreto nº 11.567/2023, cuja norma segue com presunção de constitucionalidade. 4. Além disso, exclui da aferição da preservação e do comprometimento do mínimo existencial as parcelas oriundas de dívidas renegociadas, as decorrentes de operação de crédito consignado e de operações de crédito com antecipação, entre outras (art. 4º, parágrafo único, inc. I, alíneas ?f?, ?h? e ?i?, do Decreto 11.150/22). 5. Não há obrigatoriedade de instauração da segunda fase do procedimento especial de repactuação de dívidas (art. 104-B do CDC), se não preenchidos os pressupostos legais. 6. Inviável o prosseguimento do procedimento especial da Lei n. 14.181/2021, se não comprovado o superendividamento e os requisitos indispensáveis à revisão e integração dos contratos e a repactuação das dívidas, em especial, a conduta abusiva dos credores, mesmo porque a prevenção e o combate ao superendividamento, com vista à preservação do mínimo existencial do mutuário, não devem se dar por meio de uma indevida intervenção judicial na autonomia da vontade. 7. Negou-se provimento ao recurso. (TJ-DF 07368129320218070001 1719216, Relator: FABRÍCIO FONTOURA BEZERRA, Data de Julgamento: 28/06/2023, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 20/07/2023). APELAÇÃO CÍVEL. Ação de repactuação de dívidas. Superendividamento. Sentença de improcedência. Insurgência do requerente. PRELIMINAR, em contrarrazões, de violação ao princípio da dialeticidade recursal. Não ocorrência. Requerente suficientemente indica a razões de fato e de direito que, no abstrato, sustém a pretensão recursal. Atendimento o disposto no art. 1.010, III, do Código de Processo Civil. MÉRITO. Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial. Art. 54-A, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor. Não se sopesam, para fins de análise de violação ao mínimo existencial, as parcelas das dívidas decorrentes de operação de crédito consignado regido por lei específica, nos termos do art. 4º, parágrafo único, I, h, do Decreto nº 11.150/2022. A contraprestação mensal a que se submeteu o requerente, descontada do benefício previdenciário percebido por aquele, sem que considerados os descontos consignados, resulta em rendimento mensal superior ao mínimo existencial previsto na legislação de regência, a saber, R$600,00, conforme art. 3º do Decreto nº 11.150/2022. Não despontante, por razão da contratação de consumo controvertida, violação ao mínimo existencial. Sentença mantida. Recurso desprovido.(TJ-SP - Apelação Cível: 1002180-23.2022.8.26.0156 Cruzeiro, Relator: Márcio Teixeira Laranjo, Data de Julgamento: 08/02/2024, 13ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 08/02/2024). Imperioso aclarar que incumbe ao Poder Judiciário examinar demandas judiciais alusivas à tese de superendividamento com o necessário cuidado, porquanto, admitir isso significa a alteração do mercado financeiro. Não se está a dizer que não deve haver concessão do instituto, mas sim que devem ser aferidas as provas acostadas e os requisitos objetivos trazidos em lei, sob pena de generalização da aplicabilidade e até mesmo estímulo de atuação desenfreada de consumidores que possam antever esse “benefício”. Esse não é o caso da autora, já que claramente o desequilíbrio financeiro não foi intencional e aparenta estar dotado de boa fé. Além do que, apesar de trazer provas suficientes, ainda assim, com a própria declaração da Inicial revela-se incontinenti que sua receita (crédito) não compromete o mínimo existencial para própria mantença e da família onde está alicerçado. E, de qualquer modo o pedido improcede, de pleno direito. Para concluir, a liberdade contratual deve ser exercida nos limites da função social do contrato, observando-se o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual (CC, art. 421). Na hipótese dos autos, depois de efetivados os descontos dos valores devidos pelo consumidor, nota-se que não há comprometimento da totalidade de sua remuneração, de modo a assegurar o mínimo existencial. Seja como for, o estrito cumprimento do que fora livremente pactuado pelas partes contratantes não pode ser considerado violação aos direitos e garantias previstos na Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto São José da Costa Rica), no tocante ao respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade. Esclareço, em arremate, que é entendimento assente de nossa jurisprudência que o órgão judicial, para expressar a sua convicção, não precisa aduzir comentário sobre todos os argumentos levantados pelas partes. Sua fundamentação pode ser sucinta, pronunciando-se acerca do motivo que, por si só, achou suficiente para a composição do litígio, cumprindo-se os termos do artigo 489 do CPC, não infringindo o disposto no §1º, inciso IV, do aludido artigo. No mesmo sentido: “O juiz não está obrigado a responder todas as alegações das partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para fundamentar a decisão, nem se obriga a ater-se aos fundamentos indicados por elas e tampouco a responder um a um todos os seus argumentos” (STJ - 1ª Turma, AI 169.073 SPAgRg, Rel. Min. José Delgado, j. 4.6.98, negaram provimento, v. u., DJU 17.8.98, p. 44). O Código de Processo Civil previu que o julgador deve exercer o convencimento motivado e fundamentado, mantendo o entendimento de que nem todas as questões suscitadas pelas partes precisam ser enfrentadas, salvo se estiverem aptas para infirmar a conclusão do julgado. Prejudicadas ou irrelevantes as demais questões dos autos. POSTO ISTO, e considerando tudo que dos autos consta, JULGO IMPROCEDENTE o pedido inicial formulado por MARISA SELI LEMK resolvendo o mérito nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Pelo princípio da causalidade, condeno a parte autora, ainda, ao pagamento das despesas processuais e honorários de advogado, os quais fixo em 10% do valor da causa, com fulcro no artigo 85, § 2º, do CPC, cuja exigibilidade fica suspensa, por força do disposto no artigo 98, §3°, do mesmo diploma legal. Por fim, de modo a evitar o ajuizamento de embargos de declaração, registre-se que, ficam preteridas as demais alegações, por incompatíveis com a linha de raciocínio adotada, observando que o pedido foi apreciado e rejeitado nos limites em que foi formulado. Por consectário lógico, ficam as partes advertidas, desde logo, que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com postulação meramente infringente lhes sujeitará a imposição da multa prevista pelo artigo 1026, § 2º, do Novo Código de Processo Civil. Na hipótese de interposição de apelação, tendo em vista a nova sistemática estabelecida pelo CPC que extinguiu o juízo de admissibilidade a ser exercido pelo Juízo “a quo” (CPC, art. 1.010), sem nova conclusão, intime-se a parte contrária para que ofereça resposta no prazo de 15 (quinze) dias. Havendo recurso adesivo, também deve ser intimada a parte contrária para oferecer contrarrazões. Caso nada seja requerido após o trânsito em julgado desta, observadas as formalidades legais, arquive-se com as anotações de estilo. P.R.I.C., promovendo-se as baixas devidas no sistema. SERVIRÁ A PRESENTE SENTENÇA COMO OFÍCIO/ MANDADO DE INTIMAÇÃO/NOTIFICAÇÃO E/OU CARTA PRECATÓRIA. Ariquemes, 21 de julho de 2025 Marcus Vinicius dos Santos Oliveira Juiz de Direito

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