Processo nº 1000066-49.2025.8.11.0019
ID: 276738844
Tribunal: TJMT
Órgão: VARA ÚNICA DE PORTO DOS GAÚCHOS
Classe: EMBARGOS à EXECUçãO
Nº Processo: 1000066-49.2025.8.11.0019
Data de Disponibilização:
22/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
DOUGLAS MARCELO SCHMIDT
OAB/PR XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE PORTO DOS GAÚCHOS SENTENÇA Processo: 1000066-49.2025.8.11.0019. EMBARGANTE: ORILDE ROSA CECCHELE EMBARGADO: COOPERATIVA DE CREDITO DE LIVRE ADMISS…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE PORTO DOS GAÚCHOS SENTENÇA Processo: 1000066-49.2025.8.11.0019. EMBARGANTE: ORILDE ROSA CECCHELE EMBARGADO: COOPERATIVA DE CREDITO DE LIVRE ADMISSAO DO CENTRO SUL RONDONIENSE - SICOOB CREDIP Vistos. Trata-se de Embargos à Execução opostos por Orilde Rosa Cecchele, em face de Cooperativa de Crédito de Livre Admissão do Centro Sul Rondoniense – Sicoob Credip, partes devidamente qualificadas nos autos. A embargante aduz que a execução promovida pela instituição financeira tem por base a Cédula de Produto Rural – CPRF nº 4205812, no valor originário de R$ 155.000,30, cujo débito, segundo a parte exequente, teria evoluído para R$ 212.323,86 em virtude da inadimplência contratual. Sustenta, no entanto, que a dívida exequenda está inflada por encargos abusivos, com destaque para a capitalização indevida de juros superiores a 12% ao ano, cláusulas leoninas e a ausência de pactuação expressa quanto à capitalização (anatocismo), o que tornaria a dívida ilíquida. Alega ainda a existência de onerosidade excessiva, o que comprometeria a higidez do título executivo. Aduz, ainda, a necessidade de concessão de efeito suspensivo aos embargos, com fundamento no art. 919, §1º, do CPC, alegando que estão preenchidos os requisitos legais: (i) a execução está garantida por caução (imóvel avaliado em R$ 665.000,00), (ii) há probabilidade do direito diante das cláusulas abusivas apontadas e (iii) perigo de dano irreparável com eventual expropriação de bens essenciais à atividade produtiva da embargante, produtora agropecuária. Requer, também, a baixa das inscrições nos órgãos de proteção ao crédito e sistemas internos do Banco Central (SCR), alegando urgência em razão da necessidade de acesso ao crédito rural para continuidade da atividade produtiva. Alega também que o contrato sub judice, embora consubstanciado em Cédula de Produto Rural, configura relação de consumo, de modo que deve ser aplicada a legislação consumerista, inclusive com inversão do ônus da prova. Pugna, ainda, pela revisão dos encargos financeiros, especialmente dos juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, conforme entendimento consolidado na jurisprudência pátria sobre operações de crédito rural, apontando excesso na execução na ordem de R$ 39.232,34. Junta documentos. A decisão de Id. 189544267 que recebeu a inicial, não concedeu efeito suspensivo e determinou a intimação do embargado, o qual não se manifestou, tendo decorrido prazo em 15/05/2025, conforme registrado pelo sistema em 16/05/2025. É o relatório. Decido. Inicialmente, cumpre esclarecer que o feito comporta julgamento antecipado, na forma do artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, c.c art. 920, inc. II (primeira parte), do mesmo Diploma, uma vez que não há necessidade de produção de outras provas além daquelas constantes dos autos. Com efeito, o julgamento antecipado, quando cabível, constitui dever e não mera faculdade do Magistrado, o que se perfaz como forma de assegurar aos jurisdicionados a prestação da tutela jurisdicional de forma eficaz, garantindo, assim, o direito fundamental à razoável duração do processo, nos termos do artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição da República. Aliás, de se registrar que “(...) o juiz é o destinatário final da prova, cabendo a ele deferir ou determinar as provas que entender necessárias à instrução do processo, de ofício ou a requerimento da parte, bem como indeferir as diligências que considerar inúteis ou protelatórias, nos termos do que dispõe o art. 370 do CPC.Se o Julgador, a quem a prova é dirigida, entende que os elementos dos autos bastam para formação do seu convencimento, não há óbice ao julgamento antecipado da lide.” (TJ-MT00007569120188110035 MT, Relator: CLARICE CLAUDINO DA SILVA, Data de Julgamento: 26/01/2022, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 28/01/2022) (destaquei). No caso, os argumentos constantes dos Embargos fazem arguição de fatos alusivos à suposta inconsistência nos cálculos apresentados, decorrente da incidência de encargos abusivos e sobre a exequibilidade do título, ou seja, a insurgência é restrita a matéria de direito. A propósito: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO PARA CAPITAL DE GIRO. EXCESSO DE EXECUÇÃO. PERÍCIA CONTÁBIL. DESNECESSIDADE. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA AFASTADA. MÉRITO. APLICAÇÃO DO CDC. CONTRATO DE ADESÃO. IRRELEVÂNCIA. RELAÇÃO MERCANTIL CONFIGURADA. ABUSIVIDADE DOS JUROS REMUNERATÓRIOS E CONSECTÁRIOS DA MORA. INSUBSISTÊNCIA. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. INTELIGÊNCIA DO ENUNCIADO 381 DA SÚMULA DO STJ. 1. É despicienda a perícia técnico-contábil judicial quando as questões debatidas nos autos limitam-se à verificação do que foi firmado no contrato, não havendo falar em cerceamento de defesa em razão do julgamento antecipado da lide nessas hipóteses, caso vertente. [...] (TJ-GO - AC: 54132079620218090051 GOIÂNIA, Relator: Des(a). Jose Carlos Duarte, 11ª Câmara Cível, Data de Publicação: (S/R) DJ). (destaquei). Ainda que tenha alegado inconsistências nos cálculos apresentados, que poderia culminar em eventual excesso na execução, claramente decorre de atualização da dívida, por meio da incidência de juros, de modo que simples atualização das taxas incidentes, conforme o caso, soluciona o impasse, dispensando-se eventual perito contábil para o mister. Nesse sentido: CERCEAMENTO DE DEFESA – EMBARGOS À EXECUÇÃO – NOTA PROMISSÓRIA – Alegado cerceamento de defesa pelo julgamento antecipado da lide, sem a realização de prova pericial contábil - Cerceamento de defesa inocorrente - O Julgador, por ser o destinatário da prova, tem a possibilidade de averiguar sua conveniência e necessidade para o deslinde do feito – Controvérsia entre cálculos que envolve a mera atualização da dívida representada pela nota promissória exequenda – Desnecessidade de perícia técnica contábil - Pronto julgamento autorizado, sem qualquer nulidade – Preliminar repelida [...] (TJ-SP - AC: 10436398120198260100 SP 1043639-81.2019.8.26.0100, Relator: Mario de Oliveira, Data de Julgamento: 12/04/2022, 38ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 12/04/2022). (destaquei). O Egrégio Tribunal de Justiça de Mato Grosso não destoa desse entendimento, veja: RAI nº 1018573-23.2022.8.11.0000 AGRAVANTES: OSVALDO SCAPINI e OUTRO AGRAVADO: VILSON BIGUELINI E M E N T A RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA CONTRA DEVEDOR SOLVENTE – HOMOLOGAÇÃO DE CÁLCULO REALIZADO DE ACORDO COM PARÂMETRO FIXADO NO ACÓRDÃO JULGADO PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA MATO GROSSO – PERÍCIA JUDICIAL – PROVA PERICIAL – DESNECESSIDADE - OFENSA À DECISÃO DO PRÓPRIO TRIBUNAL – COMPENSAÇÃO DE VALORES – IMPOSSIBILIDADE - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – NÃO INCIDÊNCIA - MERA IMPUGNAÇÃO A CÁLCULOS – PROCEDIMENTO ROTINEIRO NAS AÇÕES QUE ENVOLVEM COBRANÇA DE VALORES – MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ – DESCABIMENTO – ARTIGOS 80 E 81, AMBOS DO CPC/15 - MULTA DO ARTIGO 1.026 DO CPC/15 – INAPLICÁVEL – SÚMULA 98/STJ - EMBARGOS REJEITADOS - RECURSO DESPROVIDO. Desnecessária prova pericial quanto os parâmetros e a metodologia para calcular o débito são bastante didáticos e de fácil compreensão, bastando um simples cálculo aritmético para chegar ao valor correto. [...] (TJ-MT 10185732320228110000 MT, Relator: MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Data de Julgamento: 23/11/2022, Segunda Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/11/2022). (destaquei). Portanto, é perfeitamente cabível o julgamento antecipado. Não havendo preliminares a serem analisadas, passo ao exame do mérito. Antes, porém, é imperioso esclarecer que o contrato havido entre as partes não é cédula de crédito rural, regida pelo Decreto-Lei n. 167/67, mas sim uma cédula de produto rural com liquidação financeira, regida pela Lei n.8.929/94, como podemos observar claramente pelo título juntado nos Ids. 174669156 e 174669158, da ação principal (1000757-97.2024.8.11.0019). Portanto, desde logo deve ficar registrado que as alegações da embargante fundamentadas nas disposições do Decreto-Lei 167/67 são incompatíveis com a hipótese dos autos. Sobre o tema: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CEDULA DE PRODUTO RURAL FINANCEIRA. PRELIMINARES DE INÉPCIA E AUSÊNCIA DE TÍTULO EXECUTIVO AFASTADAS. APLICAÇÃO DO CDC. JUROS DE MORA. LIMITAÇÃO. INAPLICABILIDADE DO DECRETO-LEI 167/1967. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. SUMULA 472 STJ. [...] As disposições do Decreto-lei nº 167/67 não se aplicam às Cédulas de Produtos Rural Financeiras, que possuem regramento próprio, qual seja: a Lei 8.929/94, que, por sua vez, não impõe limitação aos encargos incidentes sobre o débito. [...] (TJ-MG - AC: 10000200131266003 MG, Relator.: João Cancio, Data de Julgamento: 28/07/2020, Câmaras Cíveis / 18ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 28/07/2020) (destaquei) Antes ainda de analisar o mérito propriamente, é imperioso esclarecer também a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso. Como reconhecido pela própria embargante em sua petição inicial, o crédito discutido nos autos foi tomado para o fomento de atividade profissional no ramo agropecuário, não havendo espaço para considerá-la como destinatária final, nos termos da lei protetiva. Evidencia-se, ao revés, que a operação de crédito configura insumo da atividade econômica desenvolvida pela embargante, o que afasta a presunção de assimetria na relação contratual havida entre as partes. De fato a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, aplicando-se a teoria finalista aprofundada, autoriza, excepcionalmente, a aplicação do código consumerista ao produtor rural quando ficar demonstrada a hipossuficiência técnica, jurídica ou econômica. Entretanto, é pacífico na Corte Superior que não basta meramente a condição de produtor rural para que se reconheça a aplicação do CDC, ao contrário, a aplicabilidade é excepcional, em situações específicas e desde que evidente a vulnerabilidade alegada, imperando, portanto, a orientação de que a relação entre o produtor rural e o fornecedor de insumos não configura relação de consumo, porque o produtor não adquire os produtos como destinatário final, mas sim para fins de atividade econômica. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. DECISÃO DE SANEAMENTO DO PROCESSO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA . PRODUTORES RURAIS. COMPRA DE INSUMOS AGRÍCOLAS. INAPLICABILIDADE DO CDC. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM . AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. "Nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o Código de Defesa do Consumidor não se aplica no caso em que o produto ou serviço é contratado para implementação de atividade econômica, já que não estaria configurado o destinatário final da relação de consumo (teoria finalista ou subjetiva). Contudo, tem admitido o abrandamento da regra quando ficar demonstrada a condição de hipossuficiência técnica, jurídica ou econômica da pessoa jurídica, autorizando, excepcionalmente, a aplicação das normas do CDC (teoria finalista mitigada). Precedentes" (AgInt no AREsp 2.189.393/AL, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, Quarta Turma, julgado em 6/3/2023, DJe de 21/3/2023) . Incidência da Súmula 83 do STJ. 2. Na hipótese vertente, demonstrado que o critério para a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e a inversão do ônus da prova é objetivo, e diante das circunstâncias de o contrato envolver compra e venda de insumos agrícolas, sem terem sido demonstradas as razões pelas quais o produtor seria vulnerável e hipossuficiente em relação ao fornecedor, é o caso de se determinar o retorno dos autos à origem, para que se julgue a demanda à luz da jurisprudência do STJ. 3. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no REsp: 2076856 PR 2023/0194824-5, Relator.: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 13/11/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 21/11/2023). (destaquei) O E. Tribunal de Justiça de Mato Grosso não destoa deste entendimento, veja: E M E N T A AGRAVO DE INSTRUMENTO – EMBARGOS À EXECUÇÃO – INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA INDEFERIDO – AUSÊNCIA DOS REQUISITOS – AQUISIÇÃO DE INSUMOS AGRÍCOLAS PARA O FOMENTO DA ATIVIDADE ECONÔMICA – AUSÊNCIA DE VULNERABILIDADE TÉCNICA OU FINANCEIRA A RECOMENDAR A APLICAÇÃO DA TEORIA FINALISTA MITIGADA – INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE DE JUSTIÇA – INDEFERIMENTO DE PRODUÇÃO DE PROVA ORAL E PERICIAL – ALEGADA OCORRÊNCIA DE CERCEAMENTO DE DEFESA – INOCORRÊNCIA – JUIZ DESTINATÁRIO DAS PROVAS – DECISÃO MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. A inversão do ônus da prova não é um direito absoluto concedido ao consumidor. De acordo com o art. 6º, VIII do CDC, para o deferimento do pedido, além de estar submetido a um critério de avaliação do julgador, é preciso que esteja presente a verossimilhança das alegações ou comprovada a hipossuficiência do consumidor. Nos termos da jurisprudência consolidada do STJ, o produtor rural não deve ser considerado destinatário final no contrato de compra e venda de insumos agrícolas, motivo pelo qual não incide, nesses casos, o Código de Defesa do Consumidor. [...] (N.U 1004434-95.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, ANTONIA SIQUEIRA GONCALVES, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 17/04/2024, Publicado no DJE 22/04/2024). (destaquei) Como no caso a embargante não demonstrou concretamente as razões pelas quais seria vulnerável e hipossuficiente em relação ao embargado, apenas genericamente afirma ser vulnerável fático e juridicamente, afasto a aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Passando ao mérito propriamente, os Embargos são improcedentes. A cédula de produto rural com liquidação financeira acostada ao executivo (1000757-97.2024.8.11.0019) constitui título executivo extrajudicial, pois representa dívida líquida, certa e exigível, na data de seu vencimento, pelo resultado da multiplicação do preço praticado para o produto, aplicados eventuais índices de preços ou de conversão de moedas apurados pela quantidade do produto especificado, nos termos do §1º, do art. 4º-A, da Lei 8.929/94. Observo do título que foram contratados juros remuneratórios de 1,6917% a.m., juros de mora de 1,00% a.m. e multa de 2,00% sobre o montante inadimplido. Assim reconhecido, passo à análise da legalidade dos encargos acessórios incidentes no contrato e, por conseguinte, eventual existência de excesso de valores cobrados a serem restituídos. A revisão de cláusulas que contém taxas de juros abusivas é plenamente possível, desde que exista provas de sua ocorrência. Não é o caso. A Súmula 596, do Supremo Tribunal Federal dispõe que "As disposições do Decreto-Lei 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas que integram o sistema financeiro nacional". Por conseguinte, as instituições de crédito que integram o sistema financeiro nacional, como é o caso da Autora, não estão sujeitas às limitações das taxas de juros e encargos de que tratam o Decreto nº 22.626/33 e às normas que o modificaram. O Código Civil estabelece as taxas de juros a serem aplicadas para as hipóteses, dentre outras, de silêncio do contrato, o que não é o caso dos autos. Em soma, o dispositivo constitucional que limitava a taxa de juros (parágrafo terceiro do artigo 192 da Constituição Federal) não mais compõe o ordenamento jurídico, por força da Emenda Constitucional n.º 40 de 2003, razão pela qual não pode ser legitimamente invocada a escorar a pretensão do Embargante. Quanto a taxa de juros efetivamente aplicada, resta provado que o tomador tomou conhecimento dos encargos incidentes e, portanto, ficou a seu critério aceitá-la ou não. No ponto, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça de que é livre a pactuação da taxa de juros entre as partes, salvo em caso de prova da abusividade. Cito: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. DELIMITAÇÃO DO JULGAMENTO (...) I - JULGAMENTO DAS QUESTÕES IDÊNTICAS QUE CARACTERIZAM A MULTIPLICIDADE. ORIENTAÇÃO 1 - JUROS REMUNERATÓRIOS a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada (art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante às peculiaridades do julgamento em concreto. (...) (STJ - REsp: 1061530 RS 2008/0119992-4, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 22/10/2008, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 10/03/2009 RSSTJ vol. 34 p. 216 RSSTJ vol. 35 p. 48) (destaquei). Outrossim, nos termos da Súmula nº 382, do Superior Tribunal de Justiça: “A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade.”. Do mesmo modo, o Tribunal da Cidadania já decidiu pela possibilidade de capitalização mensal de juros em contratos firmados por instituição financeira após 31/03/2000, haja vista a permissão legal (AgRg no REsp 655858 - 3ªT, 18/11/2004). Em complemento, a redação da Súmula nº 541: "A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada". Sobre o tema: APELAÇÃO CÍVEL - INTEMPESTIVIDADE - CDC - NÃO INCIDÊNCIA - CEDULA DE PRODUTO RURAL - TÍTULO NÃO CAUSAL - DECRETO-LEI Nº 167/67 - INAPLICABILIDADE - ENCARGOS FINANCEIROS - BIS IN IDEM - LIMITAÇÃO DEVIDA. [...] "Há distinção entre a Cedula de Produto Rural e a Cédula de Crédito Rural (esta regida pelo art. 90 do Decreto-Lei n. 167/1967, como a"promessa de pagamento em dinheiro", enquanto aquela é "representativa de promessa de entrega de produtos rurais", conforme art. 10 da Lei n. 8.929, de 1994), cumprindo esclarecer que, para o título de crédito tratado neste recurso ( CPR-F), vigora o princípio da autonomia privada, de maneira que os juros moratórios não estão limitados à taxa de 1% ao ano". Precedentes (STJ . Aglnt no REsp 1787427/SP, ReI. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 2511112019, DJe 29111/2019). [...] (TJ-MG - AC: 00976259520078130569 Sacramento, Relator.: Des.(a) Manoel dos Reis Morais, Data de Julgamento: 30/11/2022, 20ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 01/12/2022) (destaquei) De seu turno, por parte da embargante, nenhuma prova, elemento ou indícios que possa indicar taxas acima da média de mercado fora feito, limitando-se a questionar a cobrança genericamente, mencionando cláusulas supostamente abusivas, mas sem especificar quais seriam e que foram cobrados encargos não pactuados. Não obstante, ainda que se considere a taxa acima da média de mercado, tem-se que os parâmetros estabelecidos pelo Banco Central - para cada segmento de crédito - é um referencial útil para o controle da abusividade, mas não um limite absoluto. Cito: AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. RECONVENÇÃO. REVISÃO DO CONTRATO. JUROS REMUNERATÓRIOS. LIMITAÇÃO. ABUSIVIDADE DA TAXA CONTRATADA. DEMONSTRAÇÃO CABAL. NÃO OCORRÊNCIA. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULAS N. 5 E 7 DO STJ. TARIFA DE CADASTRO. SÚMULA N. 83 DO STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. (...) 2. O fato de a taxa contratada de juros remuneratórios estar acima da taxa média de mercado, por si só, não configura abusividade, devendo ser observados, para a limitação dos referidos juros, fatores como o custo de captação dos recursos, o spread da operação, a análise de risco de crédito do contratante, ponderando-se a caracterização da relação de consumo e eventual desvantagem exagerada do consumidor. (...) 6. Para o reconhecimento da abusividade das tarifas administrativas, não se admitem a referência a conceitos jurídicos abstratos nem a convicção subjetiva do magistrado. 7. Agravo interno desprovido. (STJ - AgInt no REsp: 2007638 MS 2022/0174713-8, Relator: JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Data de Julgamento: 29/05/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/06/2023) (destaquei) AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS CONTRATADA. ABUSIVIDADE. AUSÊNCIA. ORIENTAÇÃO FIRMADA NO RESP N. 1.061.530/RS. 1. De acordo com a orientação adotada no julgamento do REsp. 1.061.530/RS, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, "é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto." 2. Prevaleceu o entendimento de que a taxa média de mercado apurada pelo Banco Central para cada segmento de crédito é referencial útil para o controle da abusividade, mas o simples fato de a taxa efetiva cobrada no contrato estar acima da taxa média de mercado não significa, por si só, abuso. Ao contrário, a média de mercado não pode ser considerada o limite, justamente porque é média; incorpora as menores e maiores taxas praticadas pelo mercado, em operações de diferentes níveis de risco. Foi expressamente rejeitada a possibilidade de o Poder Judiciário estabelecer aprioristicamente um teto para taxa de juros, adotando como parâmetro máximo o dobro ou qualquer outro percentual em relação à taxa média. 3. O caráter abusivo da taxa de juros contratada haverá de ser demonstrado de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto, levando-se em consideração circunstâncias como o custo da captação dos recursos no local e época do contrato, a análise do perfil de risco de crédito do tomador e o spread da operação. 4. A redução da taxa de juros contratada pelo Tribunal de origem, somente pelo fato de estar acima da média de mercado, em atenção às supostas "circunstâncias da causa" não descritas, e sequer referidas no acórdão - apenas cotejando, de um lado, a taxa contratada e, de outro, o limite aprioristicamente adotado pela Câmara em relação à taxa média divulgada pelo Bacen (no caso 30%) - está em confronto com a orientação firmada no REsp. 1.061.530/RS. 5. Agravo interno provido. (STJ - AgInt no AREsp: 1493171 RS 2019/0103983-1, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 17/11/2020, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/03/2021) (destaquei) No caso, como ressaltado anteriormente, não se está diante de operação de crédito rural, logo, caem por terra os argumentos da embargante relativos a tal operação, visto que inaplicáveis ao caso, como dito. Sobre o tema, cito ainda mais um julgado de Tribunal pátrio que corrobora o entendimento aqui adotado, confira: DIREITO CIVIL – OBRIGAÇÕES – CONTRATOS BANCÁRIOS – Embargos à execução – Sentença de rejeição – Cedula de Produto Rural com Liquidação Financeira firmada em 04/03/2022 – Apelo do embargado – Admissibilidade recursal – Recolhimento em valor insuficiente da taxa judiciária do preparo recursal – Não recolhimento do complemento no prazo concedido – Descumprimento do art. 1.007, § 2º, do CPC – Deserção decretada – Apelo dos embargantes – Preliminar de falta de interesse processual que se confunde com o mérito, de modo que as matérias comportam resolução conjunta – Preliminares de cerceamento de defesa e incompetência, rejeitadas – Preliminar de nulidade da sentença por ausência de fundamentação – Não configuração, haja vista que constam expressamente no decisum os motivos pelos quais os embargos foram rejeitados, inexistindo afronta à CF, art. 93, IX e NCPC, art . 489, § 1º – Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor – Recursos utilizados por produtor rural para insumo na produção (safra) agrícola – Relação de consumo não configurada – Cedula de Produto Rural com Liquidação Financeira – Lei n. 8.929/1994 – Autonomia privada – Inviabilidade de aplicação da taxa de juros e demais regras da legislação de crédito rural (DL 167/67)– Estipulação de taxa de juros efetiva anual superior ao duodécuplo da taxa mensal – Legalidade e regularidade (STJ, Súmula 541) – Contrato bancário que admite capitalização de juros quando expressamente pactuada – Contrato firmado após 31/03/2000, à égide da MP 1.963-17/2000, reeditada como MP 2 .170-36/2001, e ratificada na EC 32/2001, cujo artigo 5º também prevê capitalização de juros quando expressamente pactuada (STJ, Súmula 539) – Constitucionalidade da disposição assentada pelo C. STF no RE 566.397-RS, j. 04/02/2015 – Não há demonstração de abusividade da taxas de juros, prevalecendo sem ofensa à Lei nº 1 .521/51, Lei de Usura (Decreto 22.626/33), e Súmula STF 121, o entendimento assentado pelo C. STF na Súmula Vinculante 7, e Súmula 596, e pelo STJ, Súmula 382 – Inadimplência – Cláusula prevendo incidência de juros remuneratórios, juros moratórios de 1% a.m . e multa de 2% – Abusividade inexistente – Pedido de alongamento e prolongamento do contrato – Descabimento, por não se tratar de Cédula de Crédito Rural – Frustração de safra que, ademais, se trata de evento previsível no segmento agrícola – Teoria da imprevisão – Inaplicabilidade – Afastamento da mora – Não cabimento – A atualização monetária é devida independentemente de previsão contratual, pois se trata de recomposição do valor da moeda, não se tratando de acréscimo ao valor da dívida – Adoção do INPC/IBGE no cálculo – Índice que prevalece – Sentença mantida – Recurso dos embargantes desprovido, e recurso do embargado não conhecido, por deserto; e, majorados os honorários advocatícios devidos pelo polo ativo ( NCPC, art. 85, § 11). (TJ-SP - Apelação Cível: 11451672220238260100 São Paulo, Relator.: José Wagner de Oliveira Melatto Peixoto, Data de Julgamento: 02/12/2024, 37ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 02/12/2024). (destaquei) Assim, considerando que os termos do contrato foram aceitos pela embargante, não há que se falar em capitalização abusiva de juros ou irregularidades na adoção dos demais encargos aplicados, consequentemente, não há que se falar em excesso de execução. Não obstante a possibilidade de o princípio do pacta sunt servanda sofrer relativização, notadamente por normas de ordem pública e de caráter cogente, do que exposto acima, a força vinculante do pacto prevalece. Dessarte, subsiste o débito objeto da execução. Sendo esses os fundamentos jurídicos e fáticos aplicados ao caso, após análise minuciosa dos autos, considero refutadas as demais questões suscitada pela parte, vez que não são capazes de infirmar a conclusão adotada por este Julgador. Ante o exposto, com fulcro no art. 487, inciso I, do CPC, resolvo o mérito e julgo improcedentes os Embargos à Execução, determinando o prosseguimento da execução. Sucumbente, arcará a embargante com custas e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC. Neste ponto, é importante readequar o valor atribuído à causa pela embargante (R$ 39.232,34). Conforme pacífica jurisprudência o valor da causa em embargos à execução deve refletir o proveito econômico pretendido pelo embargante, ou seja, se alegado excesso o valor deve ser o montante do excesso alegado, se questionado a totalidade do crédito perseguido, o valor da causa deve ser o mesmo da execução. Sobre o tema: E M E N T A EMBARGOS À EXECUÇÃO – VALOR ATRIBUÍDO À CAUSA – AUSÊNCIA DE QUESTIONAMENTO DA TOTALIDADE DO TÍTULO EXECUTADO – DISCUSSÃO QUE SE RESTRINGE AO EXCESSO DE EXECUÇÃO – ART. 292, II, DO CPC – APLICABILIDADE – VALOR CORRESPONDENTE AO PROVEITO ECONÔMICO PRETENDIDO – RECURSO PROVIDO. É firme a jurisprudência do c. STJ no sentido de que o valor atribuído à causa, em sede de embargos à execução, deve ser igual ao valor atribuído ao processo executivo, salvo quando versarem os embargos apenas sobre parte da execução. [...] (N.U 1001468-96.2023.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, CARLOS ALBERTO ALVES DA ROCHA, Terceira Câmara de Direito Privado, Julgado em 14/06/2023, Publicado no DJE 17/06/2023). (destaquei) No caso, evidente que o embargante questionou a totalidade do crédito executado, não por outra razão requereu o reconhecimento da abusividade das cláusulas contratuais, a revisão do contrato com limitação dos encargos aos parâmetros legais e alegou iliquidez do título. A despeito de ter requerido a declaração de inexigibilidade parcial da dívida executada, indicando como excessivo o valor de R$ 39.232,34. A leitura atenta da inicial, não deixa dúvida de que, a bem da verdade, como dito, sua pretensão é de impugnar a totalidade do débito. Assim, nos termos do art. 292, §3º, do CPC, o qual permite ao juiz corrigir de ofício o valor da causa em tais casos, fixo o valor da causa correspondente ao da execução principal - R$ 212.323,86, devendo a secretaria do Juízo retificar a autuação. Nesse sentido: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APELAÇÃO. OMISSÃO OU CONTRADIÇÃO INEXISTENTES. ACÓRDÃO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADO. POSSIBILIDADE DE MODIFICAÇÃO, DE OFÍCIO, DO VALOR DA CAUSA. SÚMULA 83/STJ. INEXISTÊNCIA DE PRECLUSÃO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. [...] 2. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, em harmonia com o acórdão estadual, ao magistrado é possível determinar, de ofício, a correção do valor atribuído à causa, adequando-o ao proveito econômico pretendido, sem que isso configure reformatio in pejus. Precedentes [...] (STJ - AgInt no AREsp: 1972794 SP 2021/0264175-3, Data de Julgamento: 09/05/2022, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/05/2022). (destaquei) Acaso seja interposto recurso de Apelação, intime-se a parte apelada para apresentar contrarrazões no prazo de 15 (quinze) dias (art. 1.010, § 1º, CPC). Se o apelado interpuser apelação adesiva, intime-se o apelante para apresentar contrarrazões (art. 1.010, § 2º, CPC). Na sequência, com ou sem contrarrazões, remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal. Após o trânsito em julgado, traslade-se cópia desta sentença para os autos da execução principal. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Certificado o trânsito em julgado, e não havendo novos pedidos, arquive-se com as baixas e anotações de praxe. Porto dos Gaúchos/MT, datado e assinado digitalmente. Fabrício Savazzi Bertoncini Juiz Substituto
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