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Juliana Godoy De Castro x Lancheteria Guarulhos Eireli e outros

ID: 329144656

Tribunal: TRT2 Órgão: 12ª Turma Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 1000640-74.2024.5.02.0321

Data de Disponibilização: 18/07/2025

Polo Ativo:

JULIANA GODOY DE CASTRO

Polo Passivo:

LANCHETERIA GUARULHOS EIRELI LUCAS SEWAYBRICKER DE MELO RICARDO BALCONE PEREIRA RLR ALIMENTACAO LTDA

Notificação

Advogados:

GABRIELA DE AZEVEDO MOURA

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RAFAEL ORTEGA RODRIGUES GABRIEL

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CRISTIANE MARTINS POLI

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WAGNER APARECIDO SICSU DE MORAES

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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO 12ª TURMA Relatora: SORAYA GALASSI LAMBERT ROT 1000640-74.2024.5.02.0321 RECORRENTE: JULIANA GODOY DE CASTRO REC… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO 12ª TURMA Relatora: SORAYA GALASSI LAMBERT ROT 1000640-74.2024.5.02.0321 RECORRENTE: JULIANA GODOY DE CASTRO RECORRIDO: LANCHETERIA GUARULHOS EIRELI E OUTROS (3) INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimada do inteiro teor do v. Acórdão #id:67c94e3 proferido nos autos: PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO PROCESSO nº 1000640-74.2024.5.02.0321 (ROT) RECORRENTE: JULIANA GODOY DE CASTRO RECORRIDO: LANCHETERIA GUARULHOS EIRELI , LUCAS SEWAYBRICKER DE MELO, RICARDO BALCONE PEREIRA, RLR ALIMENTACAO LTDA RELATOR: SORAYA GALASSI LAMBERT JUÍZA PROLATORA DA SENTENÇA: CAROLINE CRUZ WALSH MONTEIRO EMENTA HORAS EXTRAS. REVELIA. AUSÊNCIA DE CONTROLES DE JORNADA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 338 DO TST. PROVA ORAL COERENTE. DEFERIMENTO. Comprovada a ausência injustificada de registros de jornada pela reclamada, incide a presunção relativa de veracidade da jornada descrita na petição inicial, nos termos da Súmula nº 338, I, do TST. Inexistindo prova robusta de exercício de cargo de confiança, inaplicável o art. 62, II, da CLT. Eventuais imprecisões em depoimentos não comprometem a credibilidade do conjunto probatório, que demonstrou a habitualidade do labor extraordinário e a supressão do intervalo intrajornada. Devido o pagamento das horas extras, adicional noturno e respectivos reflexos legais. Recurso ordinário provido, no particular. RELATÓRIO R. sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados. (ID. f45b5e8) Recurso ordinário da reclamante (ID. ), discutindo o seguinte: (i) formação de grupo econômico entre as rés; (ii) nulidade do pedido de demissão; (iii) horas extras e adicional noturno; (iv) acúmulo de funções; (v) indenização por danos morais. Regularmente intimada, as reclamadas não apresentaram contrarrazões. Dispensado o parecer ministerial, na forma do artigo 36 da Consolidação dos Provimentos da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho. É o relatório. FUNDAMENTAÇÃO CONHECIMENTO Tempestivo. Regular a representação processual. Sem condenação em custas a cargo da reclamante. Conheço, portanto. GRUPO ECONÔMICO A reclamante insurge-se contra a sentença que não reconheceu a existência de grupo econômico entre a primeira e a quarta reclamadas, Lanchonete Guarulhos EIRELI e RLR Alimentação Ltda., respectivamente, sustentando haver elementos nos autos que demonstram a atuação integrada entre as empresas. Alega que os atos constitutivos revelam vínculos objetivos entre as rés, destacando o uso comum do nome fantasia e o compartilhamento de sobrenome entre os sócios. Ressalta que "o nome fantasia da RLR Alimentação Ltda. corresponde à razão social da Lancheteria Guarulhos EIRELI", e que "Lucas Sewaybricker de Melo, sócio da RLR, possui o mesmo sobrenome da sócia da Lancheteria, Ana Maria Sewaybricker dos Passos". Afirma, ainda, que o preposto da quarta reclamada reconheceu, em audiência, que o Sr. Lucas atuava como "sócio de fato" da primeira reclamada, além de apontar que constam nos autos documentos que evidenciam pagamentos efetuados pela quarta reclamada diretamente à reclamante elementos demonstrariam confusão patrimonial e atuação coordenada entre as empresas, caracterizando grupo econômico por coordenação, nos termos do art. 2º, §§ 2º e 3º, da CLT. Razão lhe assiste. A Ficha Cadastral da primeira reclamada (ID e58556c) indica como única sócia a Sra. Ana Maria Sewaybricker, com objeto social voltado para atividades de alimentação e entretenimento, tais como: restaurantes e similares; fornecimento de alimentos preparados; lanchonetes, casas de chá, de sucos e similares; bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, com entretenimento. A Ficha Cadastral da quarta reclamada (ID d456fd7) revela objeto social idêntico, tendo como sócios os Srs. Lucas Sewaybricker de Melo e Rodrigo Moero da Mata. Ademais, conforme comprova o documento de inscrição no CNPJ (ID 1d8d6e3), a quarta reclamada utiliza o nome fantasia "Lancheteria Guarulhos", o mesmo da primeira ré. Os documentos acostados sob o ID 425444d registram diversas transferências bancárias realizadas pela quarta reclamada diretamente em favor da reclamante, o que corrobora a alegação de gestão compartilhada entre as rés. Ainda, o depoimento prestado pelo preposto da quarta reclamada em audiência (ID 29b5a2d) contém a seguinte afirmação: "que o depoente comprou em 2021 o nome da Lancheteria, sendo que antes a Lancheteria era da Sra. Ana Maria, sendo que o Sr. Lucas, segundo o reclamado, era um sócio de fato da 1ª reclamada". (Destaquei) No caso concreto, restou evidenciado que as reclamadas compartilham o mesmo nome fantasia, exploram a mesma atividade econômica, e possuem ligação familiar entre seus sócios - fato presumido verdadeiro diante da revelia das três primeiras reclamadas e não contestado pela quarta. Esses elementos corroboram de modo consistente a tese inicial quanto à configuração do grupo econômico. Diante disso, impõe-se o acolhimento do apelo para reconhecer o grupo econômico entre a primeira e a quarta reclamadas, declarando-se a responsabilidade solidária destas pelos créditos trabalhistas deferidos à autora, nos termos do art. 2º da CLT. NULIDADE DO PEDIDO DE DEMISSÃO. A reclamante requer a reforma da sentença no que tange ao indeferimento do pedido de reversão da modalidade da rescisão contratual. Sustenta, em síntese, que o pedido de demissão formulado por ela decorreu de vícios de consentimento, notadamente em razão da ausência de registro do vínculo empregatício, dos reiterados inadimplementos contratuais - especialmente o não recolhimento do FGTS - e das condições de trabalho consideradas degradantes. Aduz que, embora tenha formalizado o pedido de demissão, sua intenção teria sido unicamente cessar os prejuízos decorrentes da conduta patronal, asseverando que, não fosse a prática de tais irregularidades, a ruptura contratual não teria ocorrido por sua iniciativa. Alega, ainda, que tais circunstâncias justificariam a configuração de rescisão indireta, conforme previsão do art. 483, alínea "d", da CLT. Sem razão. A petição inicial veio instruída com o documento de ID. 05e99fe (pág. 9), consistente em pedido de demissão manuscrito e devidamente assinado pela autora, no qual esta expressamente declara sua intenção de rescindir o contrato de trabalho "por motivos pessoais", inclusive optando pelo não cumprimento do aviso prévio. O documento, de forma clara e objetiva, traduz manifestação inequívoca de vontade, sem qualquer indício de coação, erro substancial ou vício de consentimento. Nos termos do art. 408 do CPC, "as declarações constantes de documento particular escrito e assinado presumem-se verdadeiras em relação ao signatário". Assim, incumbia à reclamante, nos moldes do art. 818, I, da CLT, c/c art. 373, I, do CPC, o ônus de infirmar essa presunção de veracidade, demonstrando de forma concreta a existência de vício na manifestação de vontade, o que, no presente caso, não ocorreu. Ao contrário, a própria autora, em depoimento pessoal prestado em audiência, declarou expressamente: "que fez pedido de demissão" (ID. 29b5a2d, pág. 2), o que reforça ainda mais a espontaneidade da decisão de rescindir o contrato por sua iniciativa. Importa destacar que o simples desconforto com a dinâmica interna do ambiente de trabalho, a insatisfação com a gestão ou mesmo frustrações pontuais na relação empregatícia não configuram, por si só, causa legítima para descaracterizar pedido de demissão formalizado em consonância com os requisitos legais. A inexistência de elementos objetivos que indiquem pressão ilícita, ameaça ou qualquer outro fator que macule de forma grave a livre manifestação de vontade da reclamante impede o acolhimento do pleito. Mantenho a r. sentença, no aspecto. Nego provimento ao recurso. HORAS EXTRAS E REFLEXOS. A reclamante insurge-se contra a sentença que indeferiu o pedido de pagamento de horas extras, sob o fundamento de que não restou comprovada a jornada de trabalho alegada na petição inicial. Sustenta que o juízo a quo, para fins de convencimento, adotou a jornada descrita pela quarta reclamada em audiência, desconsiderando elementos probatórios relevantes constantes dos autos. Aduz que o preposto da reclamada confessou a existência de controle de ponto no período em que a autora atuava como auxiliar administrativo, mas que tais registros não foram apresentados, atraindo, assim, a aplicação da Súmula nº 338, I, do Colendo TST, que presume verdadeira a jornada declinada na inicial. Afirma, ainda, que a reclamada buscou afastar o direito ao pagamento de horas extraordinárias sob o argumento de que a autora exercia cargo de confiança. Contudo, assevera que não foram comprovados os requisitos legais para o enquadramento no art. 62, II, da CLT, pois a reclamante não detinha poderes de gestão nem autonomia funcional. Examina-se. A causa de pedir reporta que "a reclamante foi contratada para realizar a jornada de segunda a sexta-feira das 08h00 às 18h00, com 1 hora de almoço, ocorre que a obreira estendia o seu horário de segunda-feira para cobrir outra funcionária, ficando das 08h00 à 00h00, sem usufruir de 1 hora para descanso e refeição". A inicial prossegue, relatando que "durante todo o período contratual a obreira tinha que laborar aos sábados, mesmo sendo contratada apenas para atuar de segunda a sexta-feira, assim, também se ativava em regime de horas suplementares, tendo como jornada das 11h00 às 16h00" (ID ddbf3fc - p. 20/21). Por sua vez, a quarta reclamada, em contestação (item 12 - ID 0649728 - p. 17/21), impugnou genericamente os horários declinados e pugnou pela aplicação do art. 62, II, da CLT, sob o argumento de que a reclamante exerceu cargo de confiança no período em que atuou como gerente. Em depoimento pessoal, a autora informou ao Juízo que "trabalhava das 08h às 18h de segunda a sexta e das 11h às 16h aos sábados; não tirava intervalo [...] que, em janeiro de 2022, passou a atuar como gerente, trabalhando das 14h à 00h". A única testemunha ouvida asseverou que "foi funcionária da 4ª reclamada de agosto de 2021 a novembro de 2021; que era auxiliar de cozinha; que não via a autora fazer intervalo; que a autora trabalhava de segunda a sábado; que a depoente saía do trabalho às 14h no sábado e a autora ainda estava trabalhando; que a autora entrava às 08h no sábado; que a autora começava a trabalhar durante a semana às 08h da manhã". "Data venia" do entendimento exposto na r. sentença de origem, entendo que a prova dos autos autoriza a reforma do julgado. Destaque-se, inicialmente, que a confissão ficta aplicada às três primeiras reclamadas, em razão da revelia, atrai a presunção de veracidade dos fatos articulados na petição inicial, inclusive quanto à jornada de trabalho descrita. Outrossim, registre-se que o preposto da quarta reclamada confessou expressamente que "como gerente, a autora não tinha cartão de ponto, mas tinha como auxiliar administrativo". (g.n.) Não obstante, a reclamada não apresentou quaisquer registros de jornada relativos ao período em que a autora laborou como auxiliar administrativo, descumprindo dever legal previsto no art. 74, § 2º, da CLT. Diante dessa omissão, incide a presunção favorável prevista na Súmula nº 338, I, do C. TST, segundo a qual: "é ônus do empregador que conta com mais de 10 empregados o registro da jornada de trabalho, e a não apresentação injustificada dos controles de frequência gera presunção relativa de veracidade da jornada alegada na inicial". Ademais, com o devido respeito ao entendimento manifestado pelo juízo a quo, não se vislumbram, nos depoimentos colhidos, divergências substanciais que justifiquem a total desconsideração da prova oral. Com efeito, a única divergência apontada - relativa ao horário de início da jornada aos sábados - não possui relevância suficiente para comprometer a credibilidade do conjunto probatório. A petição inicial e o depoimento pessoal da autora indicam labor aos sábados, das 11h às 16h, ao passo que a testemunha afirmou que a autora "entrava às 08h no sábado". Tal imprecisão quanto ao horário de início, embora existente, não afasta a convergência sobre aspectos essenciais: o trabalho habitual aos sábados, a ausência de intervalo e a extensão da jornada. Cumpre salientar que eventuais imprecisões acerca de horários exatos, sobretudo na ausência de controle formal de jornada, não infirmam a credibilidade do depoimento testemunhal, desde que haja coerência quanto à dinâmica da prestação de serviços, como ocorre no presente caso. Por fim, registre-se que não houve qualquer prova apta a demonstrar a existência dos elementos caracterizadores do exercício de cargo de confiança, nos moldes do art. 62, II, da CLT. A reclamada não trouxe aos autos documentos que evidenciassem a fidúcia especial, tampouco poderes de mando e gestão outorgados à autora, ônus que lhe incumbia. Assim, impõe-se o reconhecimento da veracidade da jornada descrita na petição inicial: das 08h às 18h de segunda a sexta-feira, com prorrogação às segundas até as 00h, e das 11h às 16h aos sábados, sem fruição de intervalo intrajornada. Neste contexto, dou provimento ao recurso ordinário da reclamante, para reformar a sentença e condenar a reclamada ao pagamento de horas extras, assim consideradas aquelas excedentes da oitava diária e quadragésima quarta semanal, conforme a jornada acima reconhecida. Devido, ainda, o pagamento de uma hora extra por dia laborado, em razão da supressão do intervalo intrajornada. Em razão da habitualidade, condeno a parte reclamada ao pagamento dos reflexos das horas extras sobre: descansos semanais remunerados (Súmula 172 do C. TST), férias acrescidas de 1/3 (art. 142, § 5º, da CLT), 13º salários (Súmula 45 do C. TST), aviso prévio (art. 487, § 5º, da CLT) e depósitos do FGTS com a multa de 40%, observada a base de cálculo na forma da Súmula 63 do C. TST. Considerando a extinção do vínculo em 27/04/2022, inaplicável a nova redação da OJ nº 394 da SDI-I do C. TST, que somente incide sobre as horas extras laboradas a partir de 20/03/2023. Para o cálculo das horas extraordinárias, deverão ser observados: a evolução salarial da parte, o adicional legal de 50%, o divisor de 220, e a base de cálculo nos termos da Súmula 264 do C. TST. A supressão do intervalo intrajornada enseja o pagamento, de natureza indenizatória, correspondente ao período suprimido, com acréscimo de 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho. Por fim, considerando-se o reconhecimento de jornada em período noturno às segundas-feiras, condeno a reclamada ao pagamento do adicional noturno, no percentual de 20%, observada a hora noturna reduzida, para o trabalho prestado a partir das 22h00min, com reflexos sobre: descansos semanais remunerados, aviso prévio, gratificações natalinas, férias acrescidas de 1/3, depósitos do FGTS e multa de 40%. Reformo. ACÚMULO DE FUNÇÕES. A reclamante postula o reconhecimento de acúmulo de funções, sustentando que foi contratada para exercer a função de auxiliar administrativo financeiro, mas, além das atribuições do cargo inicialmente contratado, desempenhava também as funções de caixa, compras, gerência e financeiro. Sem razão. O acúmulo de função exige o acréscimo substancial de responsabilidades ou complexidade das tarefas, sem a devida contraprestação, o que não se verifica no caso. Nos termos do artigo 456, parágrafo único, da CLT, considera-se que o empregado se obriga a todo e qualquer serviço compatível com sua condição pessoal, salvo previsão contratual ou normativa em sentido contrário. Assim, a execução de tarefas correlatas à função contratada, ainda que diversificadas, insere-se no poder diretivo do empregador e na dinâmica natural da relação de trabalho, não ensejando direito a diferenças salariais. No caso, a ausência de qualquer prova acerca da existência de atribuições extraordinárias que extrapolassem, de forma relevante e habitual, as atividades compatíveis com o cargo exercido. Ademais, a inexistência de previsão legal ou norma coletiva que reconheça a tese sustentada pelo reclamante reforça a improcedência do pedido. O Poder Judiciário não pode criar direitos ou estabelecer reajustes salariais sem amparo normativo ou legal, sob pena de invasão da competência legislativa. Quanto ao tema, cito o seguinte precedente desta E. 12ª Turma: ACÚMULO DE FUNÇÃO. ART. 456 DA CLT. A execução de tarefas diversificadas, porém compatíveis com a atividade principal e com a condição pessoal da parte autora não configura o acúmulo de funções, inserindo-se, ao revés, dentro do poder diretivo do empregador e na máxima colaboração do empregado. À míngua de previsão contratual ou normativa em sentido contrário, presume-se que a reclamante se obrigou a todo e qualquer serviço compatível com sua condição pessoal, nos termos do parágrafo único do art. 456 da CLT e que, assim sendo, o salário pactuado por unidade de tempo remunera o período em que permaneceu à disposição do empregador, executando ou aguardando ordens, não ensejando direito a diferenças salariais. (Processo 1000997-60.2024.5.02.0707, Relatora Cíntia Táffari, Data de Julgamento 07/03/2025) Nego provimento. DANOS MORAIS A reclamante insiste no pedido de indenização por dano moral, sustentando que após trabalhar por meses sem o registro formal do vínculo de emprego, foi levada a pedir demissão devido às condições degradantes a que estava submetida e ao não recebimento das verbas rescisórias devidas.Entende que essa omissão por parte das recorridas, somada ao ambiente de trabalho humilhante e desrespeitoso, comprovado por áudios e mensagens anexados aos autos, configura claramente a violação dos direitos e da dignidade da trabalhadora, justificando a indenização por danos morais. Sem razão. O inadimplemento de obrigações trabalhistas, ainda que cause desconforto e dificuldades ao trabalhador, não configura, por si só, ofensa à honra, imagem ou dignidade do empregado. O entendimento predominante nesta E. 12ª Turma considera que o mero descumprimento contratual gera danos de ordem material, passíveis de reparação por meio da quitação das verbas devidas e aplicação das penalidades previstas na legislação trabalhista, mas não implica, automaticamente, direito à indenização por dano moral. Acerca do labor sem registro em CTPS e ainda que tenha havia a condenação ao pagamento de verbas salariais e rescisórias, a legislação já prevê mecanismos compensatórios, tais como a condenação ao pagamento das quantias devidas e a imposição das penalidades legais pelo atraso, medidas que são suficientes para reparar eventuais prejuízos presumidos decorrentes da mora. Ademais, os áudios juntados com a inicil não revelam em nenhum momento o alegado tratamento desrespeitoso por parte do empregador, sendo que a testemunha nada informou a este respeito. Dessa forma, ausente comprovação de ato ilícito ou abusivo do empregador que tenha causado prejuízo moral ao reclamante, não há fundamento para a condenação ao pagamento de indenização por dano moral. Nego provimento. Presidiu o julgamento a Excelentíssima Senhora Desembargadora Tania Bizarro Quirino de Morais. Tomaram parte no julgamento os Excelentíssimos Senhores Magistrados Federais do Trabalho Soraya Galassi Lambert (Relatora), Jorge Eduardo Assad (2º votante) e Cíntia Táffari. Votação: unânime. Ante o exposto, ACORDAM os Magistrados da 12ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região em CONHECER do recurso ordinário da reclamante, e, no mérito DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO, para reconhecer a existência de grupo econômico entre a primeira e a quarta reclamadas, declarando-se a responsabilidade solidária destas pelos créditos trabalhistas deferidos à autora, nos termos do art. 2º da CLT, condenando-as ao pagamento de: (i) horas extras, assim consideradas aquelas excedentes da oitava diária e quadragésima quarta semanal, fixando a jornada da reclamante como sendo das 08h às 18h de segunda a sexta-feira, com prorrogação às segundas até as 00h, e das 11h às 16h aos sábados, com reflexos em dsr´s , férias acrescidas de 1/3 (art. 142, § 5º, da CLT), 13º salários, aviso prévio e depósitos do FGTS com a multa de 40% (ii) uma hora extra por dia laborado, em razão da supressão do intervalo intrajornada, com adicional de 50% (cinquenta por cento), sem reflexos. Para o cálculo das horas extraordinárias, deverão ser observados: a evolução salarial da parte, o adicional legal de 50%, o divisor de 220, e a base de cálculo nos termos da Súmula 264 do C. TST e os demais parâmetros constantes na fundamentação do voto SORAYA GALASSI LAMBERT Juíza Relatora nel VOTOS SAO PAULO/SP, 17 de julho de 2025. RICARDO BORGES OLIVEIRA DE SOUZA Diretor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - LUCAS SEWAYBRICKER DE MELO

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Juliana Godoy De Castro x Lancheteria Guarulhos Eireli e outros

ID: 329144672

Tribunal: TRT2 Órgão: 12ª Turma Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 1000640-74.2024.5.02.0321

Data de Disponibilização: 18/07/2025

Polo Ativo:

JULIANA GODOY DE CASTRO

Polo Passivo:

LANCHETERIA GUARULHOS EIRELI LUCAS SEWAYBRICKER DE MELO RICARDO BALCONE PEREIRA RLR ALIMENTACAO LTDA

Notificação

Advogados:

GABRIELA DE AZEVEDO MOURA

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RAFAEL ORTEGA RODRIGUES GABRIEL

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CRISTIANE MARTINS POLI

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WAGNER APARECIDO SICSU DE MORAES

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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO 12ª TURMA Relatora: SORAYA GALASSI LAMBERT ROT 1000640-74.2024.5.02.0321 RECORRENTE: JULIANA GODOY DE CASTRO REC… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO 12ª TURMA Relatora: SORAYA GALASSI LAMBERT ROT 1000640-74.2024.5.02.0321 RECORRENTE: JULIANA GODOY DE CASTRO RECORRIDO: LANCHETERIA GUARULHOS EIRELI E OUTROS (3) INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimada do inteiro teor do v. Acórdão #id:67c94e3 proferido nos autos: PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO PROCESSO nº 1000640-74.2024.5.02.0321 (ROT) RECORRENTE: JULIANA GODOY DE CASTRO RECORRIDO: LANCHETERIA GUARULHOS EIRELI , LUCAS SEWAYBRICKER DE MELO, RICARDO BALCONE PEREIRA, RLR ALIMENTACAO LTDA RELATOR: SORAYA GALASSI LAMBERT JUÍZA PROLATORA DA SENTENÇA: CAROLINE CRUZ WALSH MONTEIRO EMENTA HORAS EXTRAS. REVELIA. AUSÊNCIA DE CONTROLES DE JORNADA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 338 DO TST. PROVA ORAL COERENTE. DEFERIMENTO. Comprovada a ausência injustificada de registros de jornada pela reclamada, incide a presunção relativa de veracidade da jornada descrita na petição inicial, nos termos da Súmula nº 338, I, do TST. Inexistindo prova robusta de exercício de cargo de confiança, inaplicável o art. 62, II, da CLT. Eventuais imprecisões em depoimentos não comprometem a credibilidade do conjunto probatório, que demonstrou a habitualidade do labor extraordinário e a supressão do intervalo intrajornada. Devido o pagamento das horas extras, adicional noturno e respectivos reflexos legais. Recurso ordinário provido, no particular. RELATÓRIO R. sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados. (ID. f45b5e8) Recurso ordinário da reclamante (ID. ), discutindo o seguinte: (i) formação de grupo econômico entre as rés; (ii) nulidade do pedido de demissão; (iii) horas extras e adicional noturno; (iv) acúmulo de funções; (v) indenização por danos morais. Regularmente intimada, as reclamadas não apresentaram contrarrazões. Dispensado o parecer ministerial, na forma do artigo 36 da Consolidação dos Provimentos da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho. É o relatório. FUNDAMENTAÇÃO CONHECIMENTO Tempestivo. Regular a representação processual. Sem condenação em custas a cargo da reclamante. Conheço, portanto. GRUPO ECONÔMICO A reclamante insurge-se contra a sentença que não reconheceu a existência de grupo econômico entre a primeira e a quarta reclamadas, Lanchonete Guarulhos EIRELI e RLR Alimentação Ltda., respectivamente, sustentando haver elementos nos autos que demonstram a atuação integrada entre as empresas. Alega que os atos constitutivos revelam vínculos objetivos entre as rés, destacando o uso comum do nome fantasia e o compartilhamento de sobrenome entre os sócios. Ressalta que "o nome fantasia da RLR Alimentação Ltda. corresponde à razão social da Lancheteria Guarulhos EIRELI", e que "Lucas Sewaybricker de Melo, sócio da RLR, possui o mesmo sobrenome da sócia da Lancheteria, Ana Maria Sewaybricker dos Passos". Afirma, ainda, que o preposto da quarta reclamada reconheceu, em audiência, que o Sr. Lucas atuava como "sócio de fato" da primeira reclamada, além de apontar que constam nos autos documentos que evidenciam pagamentos efetuados pela quarta reclamada diretamente à reclamante elementos demonstrariam confusão patrimonial e atuação coordenada entre as empresas, caracterizando grupo econômico por coordenação, nos termos do art. 2º, §§ 2º e 3º, da CLT. Razão lhe assiste. A Ficha Cadastral da primeira reclamada (ID e58556c) indica como única sócia a Sra. Ana Maria Sewaybricker, com objeto social voltado para atividades de alimentação e entretenimento, tais como: restaurantes e similares; fornecimento de alimentos preparados; lanchonetes, casas de chá, de sucos e similares; bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, com entretenimento. A Ficha Cadastral da quarta reclamada (ID d456fd7) revela objeto social idêntico, tendo como sócios os Srs. Lucas Sewaybricker de Melo e Rodrigo Moero da Mata. Ademais, conforme comprova o documento de inscrição no CNPJ (ID 1d8d6e3), a quarta reclamada utiliza o nome fantasia "Lancheteria Guarulhos", o mesmo da primeira ré. Os documentos acostados sob o ID 425444d registram diversas transferências bancárias realizadas pela quarta reclamada diretamente em favor da reclamante, o que corrobora a alegação de gestão compartilhada entre as rés. Ainda, o depoimento prestado pelo preposto da quarta reclamada em audiência (ID 29b5a2d) contém a seguinte afirmação: "que o depoente comprou em 2021 o nome da Lancheteria, sendo que antes a Lancheteria era da Sra. Ana Maria, sendo que o Sr. Lucas, segundo o reclamado, era um sócio de fato da 1ª reclamada". (Destaquei) No caso concreto, restou evidenciado que as reclamadas compartilham o mesmo nome fantasia, exploram a mesma atividade econômica, e possuem ligação familiar entre seus sócios - fato presumido verdadeiro diante da revelia das três primeiras reclamadas e não contestado pela quarta. Esses elementos corroboram de modo consistente a tese inicial quanto à configuração do grupo econômico. Diante disso, impõe-se o acolhimento do apelo para reconhecer o grupo econômico entre a primeira e a quarta reclamadas, declarando-se a responsabilidade solidária destas pelos créditos trabalhistas deferidos à autora, nos termos do art. 2º da CLT. NULIDADE DO PEDIDO DE DEMISSÃO. A reclamante requer a reforma da sentença no que tange ao indeferimento do pedido de reversão da modalidade da rescisão contratual. Sustenta, em síntese, que o pedido de demissão formulado por ela decorreu de vícios de consentimento, notadamente em razão da ausência de registro do vínculo empregatício, dos reiterados inadimplementos contratuais - especialmente o não recolhimento do FGTS - e das condições de trabalho consideradas degradantes. Aduz que, embora tenha formalizado o pedido de demissão, sua intenção teria sido unicamente cessar os prejuízos decorrentes da conduta patronal, asseverando que, não fosse a prática de tais irregularidades, a ruptura contratual não teria ocorrido por sua iniciativa. Alega, ainda, que tais circunstâncias justificariam a configuração de rescisão indireta, conforme previsão do art. 483, alínea "d", da CLT. Sem razão. A petição inicial veio instruída com o documento de ID. 05e99fe (pág. 9), consistente em pedido de demissão manuscrito e devidamente assinado pela autora, no qual esta expressamente declara sua intenção de rescindir o contrato de trabalho "por motivos pessoais", inclusive optando pelo não cumprimento do aviso prévio. O documento, de forma clara e objetiva, traduz manifestação inequívoca de vontade, sem qualquer indício de coação, erro substancial ou vício de consentimento. Nos termos do art. 408 do CPC, "as declarações constantes de documento particular escrito e assinado presumem-se verdadeiras em relação ao signatário". Assim, incumbia à reclamante, nos moldes do art. 818, I, da CLT, c/c art. 373, I, do CPC, o ônus de infirmar essa presunção de veracidade, demonstrando de forma concreta a existência de vício na manifestação de vontade, o que, no presente caso, não ocorreu. Ao contrário, a própria autora, em depoimento pessoal prestado em audiência, declarou expressamente: "que fez pedido de demissão" (ID. 29b5a2d, pág. 2), o que reforça ainda mais a espontaneidade da decisão de rescindir o contrato por sua iniciativa. Importa destacar que o simples desconforto com a dinâmica interna do ambiente de trabalho, a insatisfação com a gestão ou mesmo frustrações pontuais na relação empregatícia não configuram, por si só, causa legítima para descaracterizar pedido de demissão formalizado em consonância com os requisitos legais. A inexistência de elementos objetivos que indiquem pressão ilícita, ameaça ou qualquer outro fator que macule de forma grave a livre manifestação de vontade da reclamante impede o acolhimento do pleito. Mantenho a r. sentença, no aspecto. Nego provimento ao recurso. HORAS EXTRAS E REFLEXOS. A reclamante insurge-se contra a sentença que indeferiu o pedido de pagamento de horas extras, sob o fundamento de que não restou comprovada a jornada de trabalho alegada na petição inicial. Sustenta que o juízo a quo, para fins de convencimento, adotou a jornada descrita pela quarta reclamada em audiência, desconsiderando elementos probatórios relevantes constantes dos autos. Aduz que o preposto da reclamada confessou a existência de controle de ponto no período em que a autora atuava como auxiliar administrativo, mas que tais registros não foram apresentados, atraindo, assim, a aplicação da Súmula nº 338, I, do Colendo TST, que presume verdadeira a jornada declinada na inicial. Afirma, ainda, que a reclamada buscou afastar o direito ao pagamento de horas extraordinárias sob o argumento de que a autora exercia cargo de confiança. Contudo, assevera que não foram comprovados os requisitos legais para o enquadramento no art. 62, II, da CLT, pois a reclamante não detinha poderes de gestão nem autonomia funcional. Examina-se. A causa de pedir reporta que "a reclamante foi contratada para realizar a jornada de segunda a sexta-feira das 08h00 às 18h00, com 1 hora de almoço, ocorre que a obreira estendia o seu horário de segunda-feira para cobrir outra funcionária, ficando das 08h00 à 00h00, sem usufruir de 1 hora para descanso e refeição". A inicial prossegue, relatando que "durante todo o período contratual a obreira tinha que laborar aos sábados, mesmo sendo contratada apenas para atuar de segunda a sexta-feira, assim, também se ativava em regime de horas suplementares, tendo como jornada das 11h00 às 16h00" (ID ddbf3fc - p. 20/21). Por sua vez, a quarta reclamada, em contestação (item 12 - ID 0649728 - p. 17/21), impugnou genericamente os horários declinados e pugnou pela aplicação do art. 62, II, da CLT, sob o argumento de que a reclamante exerceu cargo de confiança no período em que atuou como gerente. Em depoimento pessoal, a autora informou ao Juízo que "trabalhava das 08h às 18h de segunda a sexta e das 11h às 16h aos sábados; não tirava intervalo [...] que, em janeiro de 2022, passou a atuar como gerente, trabalhando das 14h à 00h". A única testemunha ouvida asseverou que "foi funcionária da 4ª reclamada de agosto de 2021 a novembro de 2021; que era auxiliar de cozinha; que não via a autora fazer intervalo; que a autora trabalhava de segunda a sábado; que a depoente saía do trabalho às 14h no sábado e a autora ainda estava trabalhando; que a autora entrava às 08h no sábado; que a autora começava a trabalhar durante a semana às 08h da manhã". "Data venia" do entendimento exposto na r. sentença de origem, entendo que a prova dos autos autoriza a reforma do julgado. Destaque-se, inicialmente, que a confissão ficta aplicada às três primeiras reclamadas, em razão da revelia, atrai a presunção de veracidade dos fatos articulados na petição inicial, inclusive quanto à jornada de trabalho descrita. Outrossim, registre-se que o preposto da quarta reclamada confessou expressamente que "como gerente, a autora não tinha cartão de ponto, mas tinha como auxiliar administrativo". (g.n.) Não obstante, a reclamada não apresentou quaisquer registros de jornada relativos ao período em que a autora laborou como auxiliar administrativo, descumprindo dever legal previsto no art. 74, § 2º, da CLT. Diante dessa omissão, incide a presunção favorável prevista na Súmula nº 338, I, do C. TST, segundo a qual: "é ônus do empregador que conta com mais de 10 empregados o registro da jornada de trabalho, e a não apresentação injustificada dos controles de frequência gera presunção relativa de veracidade da jornada alegada na inicial". Ademais, com o devido respeito ao entendimento manifestado pelo juízo a quo, não se vislumbram, nos depoimentos colhidos, divergências substanciais que justifiquem a total desconsideração da prova oral. Com efeito, a única divergência apontada - relativa ao horário de início da jornada aos sábados - não possui relevância suficiente para comprometer a credibilidade do conjunto probatório. A petição inicial e o depoimento pessoal da autora indicam labor aos sábados, das 11h às 16h, ao passo que a testemunha afirmou que a autora "entrava às 08h no sábado". Tal imprecisão quanto ao horário de início, embora existente, não afasta a convergência sobre aspectos essenciais: o trabalho habitual aos sábados, a ausência de intervalo e a extensão da jornada. Cumpre salientar que eventuais imprecisões acerca de horários exatos, sobretudo na ausência de controle formal de jornada, não infirmam a credibilidade do depoimento testemunhal, desde que haja coerência quanto à dinâmica da prestação de serviços, como ocorre no presente caso. Por fim, registre-se que não houve qualquer prova apta a demonstrar a existência dos elementos caracterizadores do exercício de cargo de confiança, nos moldes do art. 62, II, da CLT. A reclamada não trouxe aos autos documentos que evidenciassem a fidúcia especial, tampouco poderes de mando e gestão outorgados à autora, ônus que lhe incumbia. Assim, impõe-se o reconhecimento da veracidade da jornada descrita na petição inicial: das 08h às 18h de segunda a sexta-feira, com prorrogação às segundas até as 00h, e das 11h às 16h aos sábados, sem fruição de intervalo intrajornada. Neste contexto, dou provimento ao recurso ordinário da reclamante, para reformar a sentença e condenar a reclamada ao pagamento de horas extras, assim consideradas aquelas excedentes da oitava diária e quadragésima quarta semanal, conforme a jornada acima reconhecida. Devido, ainda, o pagamento de uma hora extra por dia laborado, em razão da supressão do intervalo intrajornada. Em razão da habitualidade, condeno a parte reclamada ao pagamento dos reflexos das horas extras sobre: descansos semanais remunerados (Súmula 172 do C. TST), férias acrescidas de 1/3 (art. 142, § 5º, da CLT), 13º salários (Súmula 45 do C. TST), aviso prévio (art. 487, § 5º, da CLT) e depósitos do FGTS com a multa de 40%, observada a base de cálculo na forma da Súmula 63 do C. TST. Considerando a extinção do vínculo em 27/04/2022, inaplicável a nova redação da OJ nº 394 da SDI-I do C. TST, que somente incide sobre as horas extras laboradas a partir de 20/03/2023. Para o cálculo das horas extraordinárias, deverão ser observados: a evolução salarial da parte, o adicional legal de 50%, o divisor de 220, e a base de cálculo nos termos da Súmula 264 do C. TST. A supressão do intervalo intrajornada enseja o pagamento, de natureza indenizatória, correspondente ao período suprimido, com acréscimo de 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho. Por fim, considerando-se o reconhecimento de jornada em período noturno às segundas-feiras, condeno a reclamada ao pagamento do adicional noturno, no percentual de 20%, observada a hora noturna reduzida, para o trabalho prestado a partir das 22h00min, com reflexos sobre: descansos semanais remunerados, aviso prévio, gratificações natalinas, férias acrescidas de 1/3, depósitos do FGTS e multa de 40%. Reformo. ACÚMULO DE FUNÇÕES. A reclamante postula o reconhecimento de acúmulo de funções, sustentando que foi contratada para exercer a função de auxiliar administrativo financeiro, mas, além das atribuições do cargo inicialmente contratado, desempenhava também as funções de caixa, compras, gerência e financeiro. Sem razão. O acúmulo de função exige o acréscimo substancial de responsabilidades ou complexidade das tarefas, sem a devida contraprestação, o que não se verifica no caso. Nos termos do artigo 456, parágrafo único, da CLT, considera-se que o empregado se obriga a todo e qualquer serviço compatível com sua condição pessoal, salvo previsão contratual ou normativa em sentido contrário. Assim, a execução de tarefas correlatas à função contratada, ainda que diversificadas, insere-se no poder diretivo do empregador e na dinâmica natural da relação de trabalho, não ensejando direito a diferenças salariais. No caso, a ausência de qualquer prova acerca da existência de atribuições extraordinárias que extrapolassem, de forma relevante e habitual, as atividades compatíveis com o cargo exercido. Ademais, a inexistência de previsão legal ou norma coletiva que reconheça a tese sustentada pelo reclamante reforça a improcedência do pedido. O Poder Judiciário não pode criar direitos ou estabelecer reajustes salariais sem amparo normativo ou legal, sob pena de invasão da competência legislativa. Quanto ao tema, cito o seguinte precedente desta E. 12ª Turma: ACÚMULO DE FUNÇÃO. ART. 456 DA CLT. A execução de tarefas diversificadas, porém compatíveis com a atividade principal e com a condição pessoal da parte autora não configura o acúmulo de funções, inserindo-se, ao revés, dentro do poder diretivo do empregador e na máxima colaboração do empregado. À míngua de previsão contratual ou normativa em sentido contrário, presume-se que a reclamante se obrigou a todo e qualquer serviço compatível com sua condição pessoal, nos termos do parágrafo único do art. 456 da CLT e que, assim sendo, o salário pactuado por unidade de tempo remunera o período em que permaneceu à disposição do empregador, executando ou aguardando ordens, não ensejando direito a diferenças salariais. (Processo 1000997-60.2024.5.02.0707, Relatora Cíntia Táffari, Data de Julgamento 07/03/2025) Nego provimento. DANOS MORAIS A reclamante insiste no pedido de indenização por dano moral, sustentando que após trabalhar por meses sem o registro formal do vínculo de emprego, foi levada a pedir demissão devido às condições degradantes a que estava submetida e ao não recebimento das verbas rescisórias devidas.Entende que essa omissão por parte das recorridas, somada ao ambiente de trabalho humilhante e desrespeitoso, comprovado por áudios e mensagens anexados aos autos, configura claramente a violação dos direitos e da dignidade da trabalhadora, justificando a indenização por danos morais. Sem razão. O inadimplemento de obrigações trabalhistas, ainda que cause desconforto e dificuldades ao trabalhador, não configura, por si só, ofensa à honra, imagem ou dignidade do empregado. O entendimento predominante nesta E. 12ª Turma considera que o mero descumprimento contratual gera danos de ordem material, passíveis de reparação por meio da quitação das verbas devidas e aplicação das penalidades previstas na legislação trabalhista, mas não implica, automaticamente, direito à indenização por dano moral. Acerca do labor sem registro em CTPS e ainda que tenha havia a condenação ao pagamento de verbas salariais e rescisórias, a legislação já prevê mecanismos compensatórios, tais como a condenação ao pagamento das quantias devidas e a imposição das penalidades legais pelo atraso, medidas que são suficientes para reparar eventuais prejuízos presumidos decorrentes da mora. Ademais, os áudios juntados com a inicil não revelam em nenhum momento o alegado tratamento desrespeitoso por parte do empregador, sendo que a testemunha nada informou a este respeito. Dessa forma, ausente comprovação de ato ilícito ou abusivo do empregador que tenha causado prejuízo moral ao reclamante, não há fundamento para a condenação ao pagamento de indenização por dano moral. Nego provimento. Presidiu o julgamento a Excelentíssima Senhora Desembargadora Tania Bizarro Quirino de Morais. Tomaram parte no julgamento os Excelentíssimos Senhores Magistrados Federais do Trabalho Soraya Galassi Lambert (Relatora), Jorge Eduardo Assad (2º votante) e Cíntia Táffari. Votação: unânime. Ante o exposto, ACORDAM os Magistrados da 12ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região em CONHECER do recurso ordinário da reclamante, e, no mérito DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO, para reconhecer a existência de grupo econômico entre a primeira e a quarta reclamadas, declarando-se a responsabilidade solidária destas pelos créditos trabalhistas deferidos à autora, nos termos do art. 2º da CLT, condenando-as ao pagamento de: (i) horas extras, assim consideradas aquelas excedentes da oitava diária e quadragésima quarta semanal, fixando a jornada da reclamante como sendo das 08h às 18h de segunda a sexta-feira, com prorrogação às segundas até as 00h, e das 11h às 16h aos sábados, com reflexos em dsr´s , férias acrescidas de 1/3 (art. 142, § 5º, da CLT), 13º salários, aviso prévio e depósitos do FGTS com a multa de 40% (ii) uma hora extra por dia laborado, em razão da supressão do intervalo intrajornada, com adicional de 50% (cinquenta por cento), sem reflexos. Para o cálculo das horas extraordinárias, deverão ser observados: a evolução salarial da parte, o adicional legal de 50%, o divisor de 220, e a base de cálculo nos termos da Súmula 264 do C. TST e os demais parâmetros constantes na fundamentação do voto SORAYA GALASSI LAMBERT Juíza Relatora nel VOTOS SAO PAULO/SP, 17 de julho de 2025. RICARDO BORGES OLIVEIRA DE SOUZA Diretor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - RICARDO BALCONE PEREIRA

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Juliana Godoy De Castro x Lancheteria Guarulhos Eireli e outros

ID: 329144684

Tribunal: TRT2 Órgão: 12ª Turma Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 1000640-74.2024.5.02.0321

Data de Disponibilização: 18/07/2025

Polo Ativo:

JULIANA GODOY DE CASTRO

Polo Passivo:

LANCHETERIA GUARULHOS EIRELI LUCAS SEWAYBRICKER DE MELO RICARDO BALCONE PEREIRA RLR ALIMENTACAO LTDA

Notificação

Advogados:

GABRIELA DE AZEVEDO MOURA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

RAFAEL ORTEGA RODRIGUES GABRIEL

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

CRISTIANE MARTINS POLI

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

WAGNER APARECIDO SICSU DE MORAES

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO 12ª TURMA Relatora: SORAYA GALASSI LAMBERT ROT 1000640-74.2024.5.02.0321 RECORRENTE: JULIANA GODOY DE CASTRO REC… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO 12ª TURMA Relatora: SORAYA GALASSI LAMBERT ROT 1000640-74.2024.5.02.0321 RECORRENTE: JULIANA GODOY DE CASTRO RECORRIDO: LANCHETERIA GUARULHOS EIRELI E OUTROS (3) INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimada do inteiro teor do v. Acórdão #id:67c94e3 proferido nos autos: PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO PROCESSO nº 1000640-74.2024.5.02.0321 (ROT) RECORRENTE: JULIANA GODOY DE CASTRO RECORRIDO: LANCHETERIA GUARULHOS EIRELI , LUCAS SEWAYBRICKER DE MELO, RICARDO BALCONE PEREIRA, RLR ALIMENTACAO LTDA RELATOR: SORAYA GALASSI LAMBERT JUÍZA PROLATORA DA SENTENÇA: CAROLINE CRUZ WALSH MONTEIRO EMENTA HORAS EXTRAS. REVELIA. AUSÊNCIA DE CONTROLES DE JORNADA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 338 DO TST. PROVA ORAL COERENTE. DEFERIMENTO. Comprovada a ausência injustificada de registros de jornada pela reclamada, incide a presunção relativa de veracidade da jornada descrita na petição inicial, nos termos da Súmula nº 338, I, do TST. Inexistindo prova robusta de exercício de cargo de confiança, inaplicável o art. 62, II, da CLT. Eventuais imprecisões em depoimentos não comprometem a credibilidade do conjunto probatório, que demonstrou a habitualidade do labor extraordinário e a supressão do intervalo intrajornada. Devido o pagamento das horas extras, adicional noturno e respectivos reflexos legais. Recurso ordinário provido, no particular. RELATÓRIO R. sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados. (ID. f45b5e8) Recurso ordinário da reclamante (ID. ), discutindo o seguinte: (i) formação de grupo econômico entre as rés; (ii) nulidade do pedido de demissão; (iii) horas extras e adicional noturno; (iv) acúmulo de funções; (v) indenização por danos morais. Regularmente intimada, as reclamadas não apresentaram contrarrazões. Dispensado o parecer ministerial, na forma do artigo 36 da Consolidação dos Provimentos da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho. É o relatório. FUNDAMENTAÇÃO CONHECIMENTO Tempestivo. Regular a representação processual. Sem condenação em custas a cargo da reclamante. Conheço, portanto. GRUPO ECONÔMICO A reclamante insurge-se contra a sentença que não reconheceu a existência de grupo econômico entre a primeira e a quarta reclamadas, Lanchonete Guarulhos EIRELI e RLR Alimentação Ltda., respectivamente, sustentando haver elementos nos autos que demonstram a atuação integrada entre as empresas. Alega que os atos constitutivos revelam vínculos objetivos entre as rés, destacando o uso comum do nome fantasia e o compartilhamento de sobrenome entre os sócios. Ressalta que "o nome fantasia da RLR Alimentação Ltda. corresponde à razão social da Lancheteria Guarulhos EIRELI", e que "Lucas Sewaybricker de Melo, sócio da RLR, possui o mesmo sobrenome da sócia da Lancheteria, Ana Maria Sewaybricker dos Passos". Afirma, ainda, que o preposto da quarta reclamada reconheceu, em audiência, que o Sr. Lucas atuava como "sócio de fato" da primeira reclamada, além de apontar que constam nos autos documentos que evidenciam pagamentos efetuados pela quarta reclamada diretamente à reclamante elementos demonstrariam confusão patrimonial e atuação coordenada entre as empresas, caracterizando grupo econômico por coordenação, nos termos do art. 2º, §§ 2º e 3º, da CLT. Razão lhe assiste. A Ficha Cadastral da primeira reclamada (ID e58556c) indica como única sócia a Sra. Ana Maria Sewaybricker, com objeto social voltado para atividades de alimentação e entretenimento, tais como: restaurantes e similares; fornecimento de alimentos preparados; lanchonetes, casas de chá, de sucos e similares; bares e outros estabelecimentos especializados em servir bebidas, com entretenimento. A Ficha Cadastral da quarta reclamada (ID d456fd7) revela objeto social idêntico, tendo como sócios os Srs. Lucas Sewaybricker de Melo e Rodrigo Moero da Mata. Ademais, conforme comprova o documento de inscrição no CNPJ (ID 1d8d6e3), a quarta reclamada utiliza o nome fantasia "Lancheteria Guarulhos", o mesmo da primeira ré. Os documentos acostados sob o ID 425444d registram diversas transferências bancárias realizadas pela quarta reclamada diretamente em favor da reclamante, o que corrobora a alegação de gestão compartilhada entre as rés. Ainda, o depoimento prestado pelo preposto da quarta reclamada em audiência (ID 29b5a2d) contém a seguinte afirmação: "que o depoente comprou em 2021 o nome da Lancheteria, sendo que antes a Lancheteria era da Sra. Ana Maria, sendo que o Sr. Lucas, segundo o reclamado, era um sócio de fato da 1ª reclamada". (Destaquei) No caso concreto, restou evidenciado que as reclamadas compartilham o mesmo nome fantasia, exploram a mesma atividade econômica, e possuem ligação familiar entre seus sócios - fato presumido verdadeiro diante da revelia das três primeiras reclamadas e não contestado pela quarta. Esses elementos corroboram de modo consistente a tese inicial quanto à configuração do grupo econômico. Diante disso, impõe-se o acolhimento do apelo para reconhecer o grupo econômico entre a primeira e a quarta reclamadas, declarando-se a responsabilidade solidária destas pelos créditos trabalhistas deferidos à autora, nos termos do art. 2º da CLT. NULIDADE DO PEDIDO DE DEMISSÃO. A reclamante requer a reforma da sentença no que tange ao indeferimento do pedido de reversão da modalidade da rescisão contratual. Sustenta, em síntese, que o pedido de demissão formulado por ela decorreu de vícios de consentimento, notadamente em razão da ausência de registro do vínculo empregatício, dos reiterados inadimplementos contratuais - especialmente o não recolhimento do FGTS - e das condições de trabalho consideradas degradantes. Aduz que, embora tenha formalizado o pedido de demissão, sua intenção teria sido unicamente cessar os prejuízos decorrentes da conduta patronal, asseverando que, não fosse a prática de tais irregularidades, a ruptura contratual não teria ocorrido por sua iniciativa. Alega, ainda, que tais circunstâncias justificariam a configuração de rescisão indireta, conforme previsão do art. 483, alínea "d", da CLT. Sem razão. A petição inicial veio instruída com o documento de ID. 05e99fe (pág. 9), consistente em pedido de demissão manuscrito e devidamente assinado pela autora, no qual esta expressamente declara sua intenção de rescindir o contrato de trabalho "por motivos pessoais", inclusive optando pelo não cumprimento do aviso prévio. O documento, de forma clara e objetiva, traduz manifestação inequívoca de vontade, sem qualquer indício de coação, erro substancial ou vício de consentimento. Nos termos do art. 408 do CPC, "as declarações constantes de documento particular escrito e assinado presumem-se verdadeiras em relação ao signatário". Assim, incumbia à reclamante, nos moldes do art. 818, I, da CLT, c/c art. 373, I, do CPC, o ônus de infirmar essa presunção de veracidade, demonstrando de forma concreta a existência de vício na manifestação de vontade, o que, no presente caso, não ocorreu. Ao contrário, a própria autora, em depoimento pessoal prestado em audiência, declarou expressamente: "que fez pedido de demissão" (ID. 29b5a2d, pág. 2), o que reforça ainda mais a espontaneidade da decisão de rescindir o contrato por sua iniciativa. Importa destacar que o simples desconforto com a dinâmica interna do ambiente de trabalho, a insatisfação com a gestão ou mesmo frustrações pontuais na relação empregatícia não configuram, por si só, causa legítima para descaracterizar pedido de demissão formalizado em consonância com os requisitos legais. A inexistência de elementos objetivos que indiquem pressão ilícita, ameaça ou qualquer outro fator que macule de forma grave a livre manifestação de vontade da reclamante impede o acolhimento do pleito. Mantenho a r. sentença, no aspecto. Nego provimento ao recurso. HORAS EXTRAS E REFLEXOS. A reclamante insurge-se contra a sentença que indeferiu o pedido de pagamento de horas extras, sob o fundamento de que não restou comprovada a jornada de trabalho alegada na petição inicial. Sustenta que o juízo a quo, para fins de convencimento, adotou a jornada descrita pela quarta reclamada em audiência, desconsiderando elementos probatórios relevantes constantes dos autos. Aduz que o preposto da reclamada confessou a existência de controle de ponto no período em que a autora atuava como auxiliar administrativo, mas que tais registros não foram apresentados, atraindo, assim, a aplicação da Súmula nº 338, I, do Colendo TST, que presume verdadeira a jornada declinada na inicial. Afirma, ainda, que a reclamada buscou afastar o direito ao pagamento de horas extraordinárias sob o argumento de que a autora exercia cargo de confiança. Contudo, assevera que não foram comprovados os requisitos legais para o enquadramento no art. 62, II, da CLT, pois a reclamante não detinha poderes de gestão nem autonomia funcional. Examina-se. A causa de pedir reporta que "a reclamante foi contratada para realizar a jornada de segunda a sexta-feira das 08h00 às 18h00, com 1 hora de almoço, ocorre que a obreira estendia o seu horário de segunda-feira para cobrir outra funcionária, ficando das 08h00 à 00h00, sem usufruir de 1 hora para descanso e refeição". A inicial prossegue, relatando que "durante todo o período contratual a obreira tinha que laborar aos sábados, mesmo sendo contratada apenas para atuar de segunda a sexta-feira, assim, também se ativava em regime de horas suplementares, tendo como jornada das 11h00 às 16h00" (ID ddbf3fc - p. 20/21). Por sua vez, a quarta reclamada, em contestação (item 12 - ID 0649728 - p. 17/21), impugnou genericamente os horários declinados e pugnou pela aplicação do art. 62, II, da CLT, sob o argumento de que a reclamante exerceu cargo de confiança no período em que atuou como gerente. Em depoimento pessoal, a autora informou ao Juízo que "trabalhava das 08h às 18h de segunda a sexta e das 11h às 16h aos sábados; não tirava intervalo [...] que, em janeiro de 2022, passou a atuar como gerente, trabalhando das 14h à 00h". A única testemunha ouvida asseverou que "foi funcionária da 4ª reclamada de agosto de 2021 a novembro de 2021; que era auxiliar de cozinha; que não via a autora fazer intervalo; que a autora trabalhava de segunda a sábado; que a depoente saía do trabalho às 14h no sábado e a autora ainda estava trabalhando; que a autora entrava às 08h no sábado; que a autora começava a trabalhar durante a semana às 08h da manhã". "Data venia" do entendimento exposto na r. sentença de origem, entendo que a prova dos autos autoriza a reforma do julgado. Destaque-se, inicialmente, que a confissão ficta aplicada às três primeiras reclamadas, em razão da revelia, atrai a presunção de veracidade dos fatos articulados na petição inicial, inclusive quanto à jornada de trabalho descrita. Outrossim, registre-se que o preposto da quarta reclamada confessou expressamente que "como gerente, a autora não tinha cartão de ponto, mas tinha como auxiliar administrativo". (g.n.) Não obstante, a reclamada não apresentou quaisquer registros de jornada relativos ao período em que a autora laborou como auxiliar administrativo, descumprindo dever legal previsto no art. 74, § 2º, da CLT. Diante dessa omissão, incide a presunção favorável prevista na Súmula nº 338, I, do C. TST, segundo a qual: "é ônus do empregador que conta com mais de 10 empregados o registro da jornada de trabalho, e a não apresentação injustificada dos controles de frequência gera presunção relativa de veracidade da jornada alegada na inicial". Ademais, com o devido respeito ao entendimento manifestado pelo juízo a quo, não se vislumbram, nos depoimentos colhidos, divergências substanciais que justifiquem a total desconsideração da prova oral. Com efeito, a única divergência apontada - relativa ao horário de início da jornada aos sábados - não possui relevância suficiente para comprometer a credibilidade do conjunto probatório. A petição inicial e o depoimento pessoal da autora indicam labor aos sábados, das 11h às 16h, ao passo que a testemunha afirmou que a autora "entrava às 08h no sábado". Tal imprecisão quanto ao horário de início, embora existente, não afasta a convergência sobre aspectos essenciais: o trabalho habitual aos sábados, a ausência de intervalo e a extensão da jornada. Cumpre salientar que eventuais imprecisões acerca de horários exatos, sobretudo na ausência de controle formal de jornada, não infirmam a credibilidade do depoimento testemunhal, desde que haja coerência quanto à dinâmica da prestação de serviços, como ocorre no presente caso. Por fim, registre-se que não houve qualquer prova apta a demonstrar a existência dos elementos caracterizadores do exercício de cargo de confiança, nos moldes do art. 62, II, da CLT. A reclamada não trouxe aos autos documentos que evidenciassem a fidúcia especial, tampouco poderes de mando e gestão outorgados à autora, ônus que lhe incumbia. Assim, impõe-se o reconhecimento da veracidade da jornada descrita na petição inicial: das 08h às 18h de segunda a sexta-feira, com prorrogação às segundas até as 00h, e das 11h às 16h aos sábados, sem fruição de intervalo intrajornada. Neste contexto, dou provimento ao recurso ordinário da reclamante, para reformar a sentença e condenar a reclamada ao pagamento de horas extras, assim consideradas aquelas excedentes da oitava diária e quadragésima quarta semanal, conforme a jornada acima reconhecida. Devido, ainda, o pagamento de uma hora extra por dia laborado, em razão da supressão do intervalo intrajornada. Em razão da habitualidade, condeno a parte reclamada ao pagamento dos reflexos das horas extras sobre: descansos semanais remunerados (Súmula 172 do C. TST), férias acrescidas de 1/3 (art. 142, § 5º, da CLT), 13º salários (Súmula 45 do C. TST), aviso prévio (art. 487, § 5º, da CLT) e depósitos do FGTS com a multa de 40%, observada a base de cálculo na forma da Súmula 63 do C. TST. Considerando a extinção do vínculo em 27/04/2022, inaplicável a nova redação da OJ nº 394 da SDI-I do C. TST, que somente incide sobre as horas extras laboradas a partir de 20/03/2023. Para o cálculo das horas extraordinárias, deverão ser observados: a evolução salarial da parte, o adicional legal de 50%, o divisor de 220, e a base de cálculo nos termos da Súmula 264 do C. TST. A supressão do intervalo intrajornada enseja o pagamento, de natureza indenizatória, correspondente ao período suprimido, com acréscimo de 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho. Por fim, considerando-se o reconhecimento de jornada em período noturno às segundas-feiras, condeno a reclamada ao pagamento do adicional noturno, no percentual de 20%, observada a hora noturna reduzida, para o trabalho prestado a partir das 22h00min, com reflexos sobre: descansos semanais remunerados, aviso prévio, gratificações natalinas, férias acrescidas de 1/3, depósitos do FGTS e multa de 40%. Reformo. ACÚMULO DE FUNÇÕES. A reclamante postula o reconhecimento de acúmulo de funções, sustentando que foi contratada para exercer a função de auxiliar administrativo financeiro, mas, além das atribuições do cargo inicialmente contratado, desempenhava também as funções de caixa, compras, gerência e financeiro. Sem razão. O acúmulo de função exige o acréscimo substancial de responsabilidades ou complexidade das tarefas, sem a devida contraprestação, o que não se verifica no caso. Nos termos do artigo 456, parágrafo único, da CLT, considera-se que o empregado se obriga a todo e qualquer serviço compatível com sua condição pessoal, salvo previsão contratual ou normativa em sentido contrário. Assim, a execução de tarefas correlatas à função contratada, ainda que diversificadas, insere-se no poder diretivo do empregador e na dinâmica natural da relação de trabalho, não ensejando direito a diferenças salariais. No caso, a ausência de qualquer prova acerca da existência de atribuições extraordinárias que extrapolassem, de forma relevante e habitual, as atividades compatíveis com o cargo exercido. Ademais, a inexistência de previsão legal ou norma coletiva que reconheça a tese sustentada pelo reclamante reforça a improcedência do pedido. O Poder Judiciário não pode criar direitos ou estabelecer reajustes salariais sem amparo normativo ou legal, sob pena de invasão da competência legislativa. Quanto ao tema, cito o seguinte precedente desta E. 12ª Turma: ACÚMULO DE FUNÇÃO. ART. 456 DA CLT. A execução de tarefas diversificadas, porém compatíveis com a atividade principal e com a condição pessoal da parte autora não configura o acúmulo de funções, inserindo-se, ao revés, dentro do poder diretivo do empregador e na máxima colaboração do empregado. À míngua de previsão contratual ou normativa em sentido contrário, presume-se que a reclamante se obrigou a todo e qualquer serviço compatível com sua condição pessoal, nos termos do parágrafo único do art. 456 da CLT e que, assim sendo, o salário pactuado por unidade de tempo remunera o período em que permaneceu à disposição do empregador, executando ou aguardando ordens, não ensejando direito a diferenças salariais. (Processo 1000997-60.2024.5.02.0707, Relatora Cíntia Táffari, Data de Julgamento 07/03/2025) Nego provimento. DANOS MORAIS A reclamante insiste no pedido de indenização por dano moral, sustentando que após trabalhar por meses sem o registro formal do vínculo de emprego, foi levada a pedir demissão devido às condições degradantes a que estava submetida e ao não recebimento das verbas rescisórias devidas.Entende que essa omissão por parte das recorridas, somada ao ambiente de trabalho humilhante e desrespeitoso, comprovado por áudios e mensagens anexados aos autos, configura claramente a violação dos direitos e da dignidade da trabalhadora, justificando a indenização por danos morais. Sem razão. O inadimplemento de obrigações trabalhistas, ainda que cause desconforto e dificuldades ao trabalhador, não configura, por si só, ofensa à honra, imagem ou dignidade do empregado. O entendimento predominante nesta E. 12ª Turma considera que o mero descumprimento contratual gera danos de ordem material, passíveis de reparação por meio da quitação das verbas devidas e aplicação das penalidades previstas na legislação trabalhista, mas não implica, automaticamente, direito à indenização por dano moral. Acerca do labor sem registro em CTPS e ainda que tenha havia a condenação ao pagamento de verbas salariais e rescisórias, a legislação já prevê mecanismos compensatórios, tais como a condenação ao pagamento das quantias devidas e a imposição das penalidades legais pelo atraso, medidas que são suficientes para reparar eventuais prejuízos presumidos decorrentes da mora. Ademais, os áudios juntados com a inicil não revelam em nenhum momento o alegado tratamento desrespeitoso por parte do empregador, sendo que a testemunha nada informou a este respeito. Dessa forma, ausente comprovação de ato ilícito ou abusivo do empregador que tenha causado prejuízo moral ao reclamante, não há fundamento para a condenação ao pagamento de indenização por dano moral. Nego provimento. Presidiu o julgamento a Excelentíssima Senhora Desembargadora Tania Bizarro Quirino de Morais. Tomaram parte no julgamento os Excelentíssimos Senhores Magistrados Federais do Trabalho Soraya Galassi Lambert (Relatora), Jorge Eduardo Assad (2º votante) e Cíntia Táffari. Votação: unânime. Ante o exposto, ACORDAM os Magistrados da 12ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região em CONHECER do recurso ordinário da reclamante, e, no mérito DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO, para reconhecer a existência de grupo econômico entre a primeira e a quarta reclamadas, declarando-se a responsabilidade solidária destas pelos créditos trabalhistas deferidos à autora, nos termos do art. 2º da CLT, condenando-as ao pagamento de: (i) horas extras, assim consideradas aquelas excedentes da oitava diária e quadragésima quarta semanal, fixando a jornada da reclamante como sendo das 08h às 18h de segunda a sexta-feira, com prorrogação às segundas até as 00h, e das 11h às 16h aos sábados, com reflexos em dsr´s , férias acrescidas de 1/3 (art. 142, § 5º, da CLT), 13º salários, aviso prévio e depósitos do FGTS com a multa de 40% (ii) uma hora extra por dia laborado, em razão da supressão do intervalo intrajornada, com adicional de 50% (cinquenta por cento), sem reflexos. Para o cálculo das horas extraordinárias, deverão ser observados: a evolução salarial da parte, o adicional legal de 50%, o divisor de 220, e a base de cálculo nos termos da Súmula 264 do C. TST e os demais parâmetros constantes na fundamentação do voto SORAYA GALASSI LAMBERT Juíza Relatora nel VOTOS SAO PAULO/SP, 17 de julho de 2025. RICARDO BORGES OLIVEIRA DE SOUZA Diretor de Secretaria Intimado(s) / Citado(s) - RLR ALIMENTACAO LTDA

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Processo nº 1001076-84.2022.8.11.0100

ID: 331793344

Tribunal: TJMT Órgão: VARA ÚNICA DE BRASNORTE Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 1001076-84.2022.8.11.0100

Data de Disponibilização: 22/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

HUERIK ALVES FERNANDES

Sentença

Advogados:

ELISANGELA SANCHES FERREIRA DE ANDRADE

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JAQUELINE PERES LESSI

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE BRASNORTE SENTENÇA Processo: 1001076-84.2022.8.11.0100 Classe judicial: Ação Penal - Procedimento Ordinário Autor: Ministério Público do Estado de… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO VARA ÚNICA DE BRASNORTE SENTENÇA Processo: 1001076-84.2022.8.11.0100 Classe judicial: Ação Penal - Procedimento Ordinário Autor: Ministério Público do Estado de Mato Grosso Réu: Huerik Alves Fernandes I — RELATÓRIO O Ministério Público do Estado de Mato Grosso ofereceu denúncia em face de HUERIK ALVES FERNANDES, imputando-lhe a prática, em concurso material, dos delitos previstos no artigo 306 da Lei n.º 9.503/1997 (Código de Trânsito Brasileiro) e no artigo 243 da Lei n.º 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente). Narra a peça acusatória, em síntese, que: “Consta dos inclusos autos de inquérito policial que, no dia 17/09/2022, por volta das 02h, na Rua Cascavel, nº 792, deste Município de Brasnorte/MT, o denunciado HUERIK ALVES FERNANDES, com consciência e vontade, conduziu veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência, conforme teste de etilômetro de id. 100156339 (art. 306, CTB). Nas mesmas condições de tempo e local descritas no parágrafo anterior, o denunciado HUERIK ALVES FERNANDES, ciente da ilicitude e reprovabilidade de sua conduta, forneceu e entregou bebida alcoólica para o adolescente L. F. D. S. D. S. (12 anos) (art. 243 do ECA) [...]” . O acusado foi preso em flagrante, tendo-lhe sido posteriormente concedida liberdade provisória, condicionada ao cumprimento de medidas cautelares diversas da prisão, conforme registrado nos autos do processo n.º 1000997-08.2022.8.11.0100. A denúncia foi recebida em 08.08.2023, ocasião em que se determinou a citação do réu (id. 124884254). Citado, o denunciado apresentou resposta à acusação por intermédio de sua defesa constituída (id. 139966505). Designada audiência de instrução e julgamento (id. 176065750), o ato foi regularmente realizado (id. 189909597), ocasião em que foram ouvidos os informantes/testemunhas L. F. S. S., Fernando Ferreira da Crus e Ivone dos Santos, colhido o interrogatório do acusado e, ao final, apresentadas alegações finais orais pelas partes. O Ministério Público pugnou pela parcial procedência da denúncia, requerendo a condenação do acusado tão somente pelo delito previsto no artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, ao argumento de que a materialidade e a autoria restaram demonstradas quanto à infração de embriaguez ao volante, e, por outro lado, a absolvição quanto ao crime descrito no artigo 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente, diante da ausência de prova suficiente da materialidade delitiva. A Defesa, por sua vez, requereu a absolvição em relação a ambos os delitos, sustentando que, embora comprovado que o acusado ingeriu bebida alcoólica e assumiu a condução de veículo automotor, não se evidenciou risco concreto à segurança viária nem alteração da capacidade psicomotora, e que, no tocante ao crime previsto no artigo 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente, sequer houve prática delitiva, uma vez que o próprio adolescente declarou ter ingerido a bebida por iniciativa própria, sem qualquer participação do acusado. Vieram os autos conclusos para sentença. É o relatório. Passo a fundamentar e decidir. II— FUNDAMENTAÇÃO Inexistindo preliminares a serem enfrentadas, passo à apreciação do mérito, que será conduzida de forma individualizada por imputação, considerando que a prolação de decreto condenatório exige a formação de juízo de certeza quanto à existência do fato típico, sua autoria e a ausência de causas excludentes de ilicitude ou culpabilidade, com respaldo em elementos probatórios produzidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. II.1 — Do crime previsto no artigo 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente O artigo 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) tipifica a conduta de quem vende, fornece, serve, ministra ou entrega, ainda que gratuitamente, de qualquer forma, a criança ou adolescente, bebida alcoólica ou, sem justa causa, outros produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica, cominando pena de detenção de dois a quatro anos, além de multa, salvo se o fato constituir crime mais grave. A norma em questão visa tutelar não apenas a saúde e o desenvolvimento físico e psicológico de crianças e adolescentes, mas também resguardar a própria sociedade dos efeitos nocivos decorrentes da exposição precoce a substâncias psicoativas, cujo uso compromete tanto a integridade individual quanto o bem jurídico coletivo da saúde pública. No caso concreto, embora estejam inequivocamente demonstradas a condição de menor de idade de L. F. S. S. e a efetiva ingestão de bebida alcoólica, o conjunto probatório não fornece elementos aptos a permitir juízo de certeza quanto à prática, pelo acusado, de qualquer das condutas descritas no artigo 243 do ECA, cuja configuração exige ação dolosa direta e inequívoca no fornecimento da substância à criança ou ao adolescente, o que não se verifica nos autos. Em sentido oposto, o próprio adolescente, com 12 anos de idade à época dos fatos, declarou em juízo que, após participar de um jogo de futebol com o acusado e outras pessoas, pegou uma lata de cerveja por iniciativa própria e a ingeriu de forma clandestina, sem que o réu tivesse ciência ou qualquer participação no ato. Narrou, ainda, que viu o momento em que as bebidas foram entregues por um distribuidor, mas não soube informar quem as havia adquirido, tampouco apontou qualquer interferência do acusado na disponibilização ou no incentivo ao consumo. Nesse cenário, a prova colhida em juízo afasta a existência de conduta dolosa por parte do acusado, não havendo sequer indícios de que tenha fornecido ou mesmo facilitado o acesso do menor à bebida alcoólica. Destaca-se, ainda, a negativa do réu quanto à prática delitiva, a qual, longe de representar uma tentativa isolada de afastar sua responsabilidade penal, mostra-se compatível com o acervo probatório e não foi infirmada por qualquer outro elemento de convicção. Embora o policial Fernando Ferreira da Crus tenha declarado que o adolescente apresentava sinais de embriaguez no momento da abordagem, essa percepção, por si só, não é suficiente para comprovar que o consumo decorreu de ação do acusado, sobretudo diante do relato espontâneo da própria vítima, que afirmou ter se afastado do grupo para ingerir a bebida de forma autônoma. É certo que o adolescente se encontrava sob os cuidados do acusado naquele momento, circunstância que, em tese, impunha maior vigilância. No entanto, esse fator, isoladamente, não supre a ausência de prova de qualquer das condutas descritas no tipo penal, não sendo possível presumir o fornecimento com base unicamente na posição de responsabilidade atribuída ao réu no contexto fático. Dessa forma, não há nos autos elementos probatórios aptos a demonstrar a materialidade do delito, sendo inviável a condenação diante da ausência de prova segura e idônea da prática típica. Impõe-se, portanto, a absolvição do acusado quanto ao crime previsto no artigo 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente, com fundamento no artigo 386, inciso II, do Código de Processo Penal, por não haver prova da existência do fato típico. II.2 — Do crime previsto no 306 do Código de Trânsito Brasileiro O artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro tipifica a conduta de conduzir veículo automotor com a capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que cause dependência, prevendo, como sanções, pena de detenção de seis meses a três anos, cumulada com multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. A norma incriminadora em questão tutela a segurança viária, protegendo bens jurídicos de natureza difusa e individual, como a vida, a integridade física e o patrimônio das pessoas que transitam em vias públicas, diante da reconhecida periculosidade da condução veicular sob influência de substâncias psicoativas. No presente caso, a materialidade delitiva restou plenamente evidenciada no conjunto probatório constante dos autos, sobretudo pelo auto de constatação de embriaguez (id. 100156338), que descreve sinais clínicos e comportamentais compatíveis com alteração da capacidade psicomotora, e pelo teste de alcoolemia (id. 100156339), que aferiu a concentração de 0,64 miligrama de álcool por litro de ar alveolar, sendo tais provas técnicas corroboradas pelo boletim de ocorrência (id. 100156337), pelo auto de prisão em flagrante (id. 100156335), pelo laudo de exame de corpo de delito (id. 100155380) e pelos depoimentos colhidos na fase investigativa (ids. 100156340 e 100157894), cujos conteúdos foram integralmente confirmados em juízo. A autoria delitiva, por sua vez, encontra-se igualmente comprovada, na medida em que a condução do veículo automotor no momento da abordagem foi confirmada pelo acervo probatório produzido em juízo, com destaque para o depoimento do policial militar Fernando Ferreira da Crus, responsável pela ocorrência, que relatou ter identificado sinais inequívocos de embriaguez no acusado, como olhos avermelhados, fala pastosa e sonolência, além da própria admissão do consumo de bebida alcoólica, sendo tais circunstâncias plenamente compatíveis com os demais elementos constantes dos autos. O adolescente L. F. S. S., que acompanhava o acusado no momento da abordagem, confirmou que ambos estavam no interior do veículo quando foram abordados pelos policiais e relatou que, ao perceberem sinais de embriaguez no acusado, os agentes determinaram sua condução à delegacia, o que reforça a narrativa apresentada pelo policial responsável pela ocorrência. Diante desse contexto, cumpre destacar que é consolidado o entendimento jurisprudencial no sentido de que os depoimentos prestados por agentes públicos no exercício da função policial não podem ser desqualificados com base exclusivamente em sua condição funcional, devendo ser avaliados segundo critérios de coerência, credibilidade e compatibilidade com os demais elementos probatórios, sendo necessária a demonstração concreta de eventual má-fé, o que não se verifica na hipótese dos autos. Ademais, no tocante à valoração dos elementos informativos colhidos na fase inquisitorial, embora estes não sejam, por si sós, aptos a fundamentar decreto condenatório, sua utilização é juridicamente possível quando corroborados por provas produzidas sob o crivo do contraditório judicial, nos termos do artigo 155 do Código de Processo Penal, como ocorre na presente hipótese em relação ao auto de constatação e ao teste de alcoolemia, ambos devidamente ratificados em juízo. Ainda nesse compasso, destaca-se que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADI 6298, declarou a inconstitucionalidade parcial, com redução de texto, dos §§ 3º e 4º do artigo 3º-C do Código de Processo Penal, incluídos pela Lei n.º 13.964/2019, fixando, por interpretação conforme, que os autos relativos às matérias da competência do juiz das garantias devem ser encaminhados ao juízo da instrução. De todo modo, mesmo sob a redação original, o dispositivo já previa, expressamente, a admissibilidade das provas irrepetíveis, como o auto de constatação e o exame do etilômetro, cuja validade permanece incólume. Assim, à luz das provas analisadas, conclui-se que o acusado, ao conduzir veículo automotor sob a influência de álcool, incorreu na prática delitiva ora imputada. Quanto à tese defensiva de ausência de risco concreto à segurança viária, é necessário ponderar que, com o advento das Leis n.º 11.705/2008 e n.º 12.760/2012, o delito de embriaguez ao volante passou a ser classificado como crime de perigo abstrato, sendo desnecessária a demonstração de efetiva lesão ou exposição ao perigo, bastando, para a caracterização do tipo, a comprovação de três requisitos objetivos: (i) condução de veículo automotor; (ii) ingestão de álcool ou de substância psicoativa que cause dependência; e (iii) alteração da capacidade psicomotora. Sobre o tema, destaca-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: “[...] O crime previsto no art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro é de perigo abstrato, sendo suficiente, para a sua caracterização, que o condutor do veículo esteja com a capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou outra substância entorpecente, dispensada a demonstração da potencialidade lesiva da conduta. [...]” (STJ - AgRg no REsp: 1854277 SP 2019/0378459-0, Relator.: Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Data de Julgamento: 25/08/2020, T5 - Quinta Turma, Data de Publicação: DJe 31/08/2020) (g.n). No mesmo sentido, é o entendimento desta Corte Estadual: “[...] O crime de embriaguez ao volante (art. 306 do CTB) é de perigo abstrato e não exige comprovação de efetiva lesão para sua consumação. A alteração da capacidade psicomotora do condutor pode ser demonstrada por exame clínico, prova testemunhal ou outros meios idôneos. [...]” (TJ-MT - Apelação Criminal: 10032798420208110004, Relator.: Wesley Sanchez Lacerda, Data de Julgamento: 18/02/2025, Primeira Câmara Criminal, Data de Publicação: 21/02/2025) (g.n). Dessa forma, uma vez caracterizados os três elementos objetivos exigidos pelo tipo penal, sendo a condução do veículo automotor confirmada por prova oral produzida em juízo, a ingestão de álcool comprovada pelo teste de etilômetro e a alteração da capacidade psicomotora evidenciada pelo auto de constatação, não subsiste a alegação de ausência de risco concreto, porquanto, tratando-se de crime de perigo abstrato, a demonstração de efetiva exposição ao perigo é juridicamente dispensável, bastando a comprovação da conduta típica, o que se verifica de forma robusta no caso concreto. Por fim, no que se refere à alegação de que o estado físico do acusado, descrito pelo policial, decorreria de cansaço em virtude de um dia exaustivo de trabalho, essa versão não encontra respaldo nos autos, sendo objetivamente infirmada pelo conjunto probatório, especialmente pelo teste de alcoolemia, cuja concentração aferida supera o limite legal previsto no § 1º do artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro. O referido resultado, somado aos sinais clínicos descritos no auto de constatação, evidencia a alteração da normalidade psicomotora exigida para a configuração do tipo penal, sendo prescindível a demonstração de sintomas ostensivos de embriaguez, como cambaleios ou ausência de discernimento. Diante do conjunto probatório, reconhece-se que a conduta do acusado subsume-se ao tipo penal previsto no artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro, ausentes causas excludentes de ilicitude ou culpabilidade, razão pela qual o fato é típico, ilícito e culpável. III — DISPOSITIVO Em razão do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido da denúncia para: a) ABSOLVER o acusado HUERIK ALVES FERNANDES da imputação relativa ao crime previsto no artigo 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente, com fundamento no artigo 386, inciso II, do Código de Processo Penal, por não haver prova da existência do fato típico. b) CONDENAR o acusado HUERIK ALVES FERNANDES pela prática do crime de embriaguez ao volante, tipificado no artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro. Passo, então, à fixação da pena, procedendo à análise da dosimetria, nos termos do artigo 68, caput, do Código Penal. IV — DOSIMETRIA Na primeira fase da dosimetria, nos termos do artigo 59 do Código Penal, ao analisar as circunstâncias judiciais em relação ao réu, verifico que: (i) a culpabilidade é inerente ao tipo penal, não havendo elementos que a exasperem; (ii) o réu é tecnicamente primário e não possui condenação definitiva que caracterize maus antecedentes, circunstância que lhe favorece; (iii) as circunstâncias relativas à conduta social e à personalidade do réu não podem ser avaliadas por ausência de elementos nos autos, razão pela qual serão consideradas neutras; (iv) os motivos do crime são inerentes ao tipo penal e não comportam valoração negativa; (v) as circunstâncias e consequências do delito foram normais à espécie, sem elementos que justifiquem sua exasperação; e (vi) o comportamento da vítima não pode ser valorado para fins de dosimetria, pois inexiste nos autos qualquer fator que o justifique. Diante da ausência de vetoriais desfavoráveis, fixo a pena-base em 06 (seis) meses de detenção, 10 (dez) dias-multa e 06 (seis) meses de suspensão do direito de obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. Na segunda fase, ausentes circunstâncias agravantes ou atenuantes, mantenho a pena intermediária 06 (seis) meses de detenção, 10 (dez) dias-multa e 06 (seis) meses de suspensão do direito de obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. Na terceira fase, não se verificando causas de aumento ou diminuição, TORNO DEFINITIVA a pena em 06 (seis) meses de detenção, 10 (dez) dias-multa e 06 (seis) meses de suspensão do direito de obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. V — DISPOSIÇÕES FINAIS V.1 — Do regime inicial de cumprimento da pena Considerando a pena aplicada, nos termos do artigo 33, § 2º, alínea “c”, do Código Penal, FIXO O REGIME ABERTO para o início do cumprimento da pena, medida compatível com as circunstâncias do caso. V.2 — Do valor do dia-multa Diante da ausência de elementos que permitam aferir a condição financeira do réu com maior precisão, FIXO o valor do dia-multa em 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo vigente à época dos fatos, devidamente atualizado até o efetivo pagamento. V.3 — Da substituição da pena privativa de liberdade Atendidos os requisitos legais do artigo 44 do Código Penal, SUBSTITUO a pena privativa de liberdade por duas penas restritivas de direitos, cuja espécie será oportunamente fixada pelo Juízo da Execução Penal. V.4 — Do SURSIS Em razão da substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, DEIXO de aplicar a suspensão condicional da pena, nos termos do artigo 77, inciso III, do Código Penal. V.5 — Dos efeitos da condenação Considerando os valores depositados a título de fiança, DETERMINO sua destinação nos termos do artigo 336 do Código de Processo Penal, observando-se a ordem de preferência ali prevista. V.6 — Da fixação de valor mínimo de indenização Quanto ao pedido de fixação de valor mínimo de indenização por danos morais coletivos, INDEFIRO o pleito formulado, com fundamento no artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal, ante a inexistência de prejuízo concreto à coletividade decorrente da conduta praticada, não se justificando, portanto, a imposição de reparação civil de natureza difusa. V.7 — Do direito de recorrer em liberdade Diante do regime prisional fixado e da ausência, no momento, dos pressupostos e requisitos da prisão preventiva, CONCEDO ao réu o direito de apelar em liberdade. V.8 — Das custas processuais Nos termos do artigo 804 do Código de Processo Penal, CONDENO ao réu ao pagamento das custas processuais, nos valores fixados ex lege. VI — PROVIDÊNCIAS PELA SECRETARIA VI.1 — Providências antes do trânsito em julgado 1. INTIMEM-SE o Ministério Público e a Defesa pelo sistema PJe. 2. INTIME-SE o acusado exclusivamente por Diário da Justiça Eletrônico, considerando tratar-se de réu solto com advogado constituído. 3. Em caso de interposição de recurso: a) CERTIFIQUE-SE a tempestividade do recurso; b) INTIME-SE a parte recorrida para apresentação de contrarrazões; c) RETORNEM os autos conclusos para análise. 4. Decorrido o prazo recursal sem interposição de recurso, CERTIFIQUE-SE o trânsito em julgado. VI.2 — Providências após o trânsito em julgado 1. OFICIE-SE à Justiça Eleitoral para a suspensão dos direitos políticos do condenado, nos termos do artigo 15, inciso III, da Constituição Federal. 2. OFICIE-SE ao Departamento Estadual de Trânsito (DETRAN) do Estado de domicílio do réu e ao Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN), comunicando a penalidade imposta de suspensão do direito de obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor, nos termos do artigo 293 e em cumprimento ao artigo 295 do Código de Trânsito Brasileiro. 3. OFICIE-SE ao órgão responsável pelo registro de antecedentes criminais, informando a condenação do réu. 4. REMETAM-SE os autos ao setor de contadoria para o cálculo das custas processuais. 5. EXPEÇA-SE guia de execução penal, procedendo-se à devida distribuição no Sistema SEEU, com as peças necessárias. 5. Cumpridas as determinações, ARQUIVEM-SE os autos. P.I.C. Servirá a presente, por cópia digitalizada, como Mandado de intimação/Ofício. Brasnorte/MT, documento datado e assinado eletronicamente. ROMEU DA CUNHA GOMES Juiz Substituto

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Processo nº 1000997-78.2023.8.11.0033

ID: 291356322

Tribunal: TJMT Órgão: 1ª VARA DE SÃO JOSÉ DO RIO CLARO Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 1000997-78.2023.8.11.0033

Data de Disponibilização: 06/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

CESAR ANSELMO SCHMULER

Intimação

Advogados:

ANA CAROLINA DE LIMA RODRIGUES REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO ANA CAROLINA DE LIMA RODRIGUES

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO CORREGEDORIA GERAL DE JUSTIÇA NÚCLEO DE ATUAÇÃO ESTRATÉGICA - NAE Processo: 1000997-78.2023.8.11.0033. Visto. 1. Relatório O Ministério Público do ESTADO DE MAT… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO CORREGEDORIA GERAL DE JUSTIÇA NÚCLEO DE ATUAÇÃO ESTRATÉGICA - NAE Processo: 1000997-78.2023.8.11.0033. Visto. 1. Relatório O Ministério Público do ESTADO DE MATO GROSSO ofereceu denúncia em face de CÉSAR ANSELMO SCHMULER, qualificado, como incurso nas disposições do artigo 129, §13, do Código Penal e art. 12 da Lei 10.826/03. Narra a denúncia em síntese: “(...) Consta do incluso inquérito policial que, iniciando-se em data não especificada, porém, até o dia 22 de março de 2023, CÉSAR ANSELMO SCHMULER possuía, no interior de sua residência, situada na Avenida Domingos Briante, distrito de Brianorte, em Nova Maringá/MT, arma de fogo de uso permitido [revólver Taurus calibre 22] apta a efetuar disparos, assim como um estojo de cartuchos e cinco munições intactas do mesmo calibre, tudo sem autorização e em desacordo com as disposições legais e regulamentares. Também é produto dos informes colhidos que, no dia 22 de março de 2023, por volta das 18h00, nas dependências do imóvel retrocitado, CÉSAR ANSELMO SCHMULER, assumindo o risco, ofendeu a integridade corporal de sua convivente, Sandra Regina Bezerra da Costa, causando-lhe as lesões descritas no Prontuário Médico de ID 120688623, por razões da condição do sexo feminino. Fazem esclarecer as investigações policiais que, na data acima mencionada, o denunciado e a vítima estavam na residência comum do casal quando, então, passaram a discutir por motivos de somenos importância. Apurou-se que, não satisfeito com o entrevero verbal, o acusado sacou a arma de fogo que carregava em sua cintura e, assumindo o risco de lesionar sua companheira, passou a apontar o objeto para ela, entretanto, no intuito de se defender da eminente ameaça, a ofendida entrou em luta corporal com o increpado, momento no qual o revólver foi disparado, tendo sido ela atingida na perna. No desdobramento dos fatos, a Polícia Militar foi acionada e, ao chegarem no local, apreenderam a arma utilizada no delito e lograram êxito em encontrar dentro do imóvel um estojo de cartuchos e cinco unidades de munições, todos de calibre 22, itens estes que estavam em perfeitas condições de uso [ID 120688636].. A denúncia foi devidamente recebida em 26 de julho de 2023 (Id. 124262547). Citado, o acusado apresentou resposta à acusação (Id. 128957451). O feito foi incluído em pauta (Id. 129107469). Durante a instrução processual inquiriu-se a vítima Sandra Regina Bezerra da Costa, bem como a testemunha Aguinaldo da Silva e, ao final, o acusado foi interrogado (Id. 148469143). O Ministério Público apresentou alegações finais, no qual postulou pela procedência da exordial (Id. 149572829). Ao seu turno, a Defesa apresentou memorial no Id. 152570849, requerendo absolvição do acusado quanto ao crime de lesão corporal e, alternativamente, postulou pela desclassificação do crime para o previsto no art. 129, § 6º do CP, além do reconhecimento da confissão quanto ao crime de posse irregular de arma de fogo. Os autos vieram conclusos. É a síntese do necessário. Fundamento e decido. 2. Fundamentação O processo está formalmente em ordem, inexistindo nulidades ou vícios a sanar. As provas foram coligidas sob o crivo dos princípios norteadores do devido processo legal, mormente o contraditório e a ampla defesa, nos termos constitucionais e processuais. Presentes às condições necessárias ao exercício do direito de ação, bem como os pressupostos legalmente exigidos. Não existem matérias preliminares pendentes a serem apreciadas. Passo doravante à análise do mérito. 2.1. Do crime de lesão corporal (CP, art. 129, § 13) A materialidade do delito está devidamente comprovada pelo auto de prisão em flagrante (id.120688611), Boletim de ocorrência nº 2023.79415 (id.120688612), Auto de apreensão (id. 120688614), Relatório policial (id. 120689392), bem como pelos depoimentos colhidos em juízo. A autoria, de igual modo, encontra-se perfeitamente delineada nos autos na pessoa do acusado. O acusado Celso, em interrogatório judicial, negou ter sido o autor da lesão corporal sofrida pela vítima. Afirmou que, em razão de um desentendimento verbal entre ambos, a ofendida teria se apossado de uma arma de fogo que se encontrava guardada em uma cozinha situada na área externa e aberta da residência. Declarou que, temendo as atitudes da companheira, tentou retirar o armamento de sua posse, momento em que a arma teria caído no chão, disparando de forma acidental e atingindo a vítima. A ofendida Sandra Regina Bezerra da Costa afirmou, em juízo, que a arma de fogo ficava guardada em um armário na casa onde residia com o acusado. Relatou que, no dia dos fatos, percebeu que o réu havia ingerido bebida alcoólica e, sabendo que em tais circunstâncias ele costumava se mostrar agitado, decidiu retirar a arma do armário para guardá-la em outro local. Declarou que, nesse momento, o acusado investiu contra ela, resultando em luta corporal entre ambos pela posse da arma. Afirmou que, durante o embate, houve um disparo que atingiu sua perna, o que a levou a gritar por socorro até que um vizinho compareceu ao local. Informou que o réu possuía o referido armamento há pelo menos onze anos. Ao seu turno, Aguinaldo da Silva declarou, em juízo, que é vizinho da vítima Sandra Regina Bezerra da Costa e do acusado Celso. Informou que, na data dos fatos, encontrava-se em seu estabelecimento comercial, situado ao lado da residência dos envolvidos, quando escutou um barulho semelhante a um estouro, seguido por gritos de socorro provenientes da casa vizinha. Afirmou que os gritos pareciam ser de uma voz feminina que clamava por seu nome repetidamente, razão pela qual decidiu se dirigir ao local. Ao chegar à residência, observou, pela janela, que o chão estava coberto de sangue e notou que a vítima havia sido atingida na região da perna. Declarou que, por receio, deixou o local naquele momento, mas retornou em seguida a pedido do filho do casal, que solicitou sua ajuda informando que a mãe estava ferida. Narrou que, ao retornar à residência, encontrou a vítima e o acusado em luta corporal, disputando a posse de uma arma de fogo. Relatou que, em determinado momento, conseguiu tomar a arma das mãos de ambos e, ao sair da residência, solicitou a terceiros que acionassem a polícia e o serviço de emergência, permanecendo de posse do armamento até a chegada dos policiais. Pois bem. A autoria do delito emerge claramente dos elementos probatórios colhidos, mormente considerando que, embora o réu tenha negado a intenção de causar a lesão, admitiu sua participação na disputa pela arma de fogo que culminou no disparo. O dolo, ainda que eventual, configura-se pela assunção do risco de produzir o resultado lesivo, uma vez que o agente, ao engajar-se em luta corporal envolvendo arma de fogo, no mínimo, assumiu conscientemente a possibilidade de causar ferimentos à vítima. Ademais, o depoimento da testemunha Aguinaldo da Silva reveste-se de especial relevância probatória, porquanto se trata de pessoa que presenciou diretamente os fatos delituosos e teve contato imediato com a situação criminosa. A narrativa testemunhal apresenta-se coerente, detalhada e verossímil, descrevendo de forma precisa a sequência dos acontecimentos. O depoente relatou que, enquanto trabalhava em seu estabelecimento comercial vizinho à residência dos envolvidos, escutou "um estouro, seguido por gritos de socorro", que identificou como sendo "de uma voz feminina chamando por seu nome várias vezes". Particularmente relevante é o relato da testemunha sobre sua segunda intervenção no local, quando "tentou separar a vítima e o réu que se encontravam em disputa pela arma de fogo", conseguindo "retirar o objeto das mãos de ambos". Esta narrativa evidencia de forma cristalina a participação ativa do réu na disputa pela arma, contradizendo frontalmente sua versão defensiva e confirmando seu envolvimento direto na dinâmica delituosa. Por conseguinte, descabida a alegação de legítima defesa, eis que não restaram demonstrados nos autos a incidência dos requisitos autorizadores para aplicação de referida benesse, conforme fundamentos expostos acima. A qualificadora prevista no § 13º do artigo 129 do Código Penal encontra-se plenamente caracterizada, porquanto o delito foi perpetrado contra mulher por razões da condição do sexo feminino, no contexto de violência doméstica, envolvendo menosprezo ou discriminação à condição de mulher, conforme se depreende das circunstâncias fáticas narradas, em que o réu, em estado de embriaguez alcoólica, demonstrou comportamento agressivo e controlador em relação à companheira. O conjunto probatório demonstra inequivocamente que as agressões praticadas decorreram de questões relacionadas ao gênero da vítima, caracterizando violência baseada na condição de mulher, não se limitando apenas ao parentesco existente entre as partes, a convivência cotidiana entre acusado e vítima ou circunstâncias específicas do contexto familiar. Desta feita, a Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) constitui ação afirmativa destinada especificamente aos casos de violência de gênero, buscando restabelecer a igualdade material entre eles. Nesse sentido, o presente caso enquadra-se perfeitamente naqueles em que a violência é praticada em função do gênero, inserindo-se no escopo da referida lei. A jurisprudência pátria tem reconhecido a importância de se identificar corretamente os casos de violência de gênero, aplicando-se a qualificadora do § 13º quando presentes os elementos caracterizadores da violência baseada na condição de mulher. A correta tipificação deve observar não apenas as relações de parentesco ou convivência, mas fundamentalmente a motivação discriminatória de gênero que permeia a conduta delitiva. Nesse sentido: PENAL. APELAÇÃO. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. LESÃO CORPORAL (art. 129, § 13 do CP). CONDENAÇÃO. RECURSO DA DEFESA. Pretendida a desclassificação do crime elencado na denúncia (art. 129, § 13º, CP) para o crime tipificado no artigo 129, § 9º, CP, com pena mais branda e, via de consequência, a adequação da pena. Impertinência. Desclassificação. Impossibilidade. Materialidade e autoria que restaram demonstradas pelas palavras tanto da vítima como do réu, corroboradas pelo laudo de lesão corporal, que evidenciou as lesões conforme descritas por ela, ficando plenamente caracterizado o ocorrido, conforme exposto na denúncia. Impossível à desclassificação da conduta para o art. 129, § 9º, do CP, quando restou devidamente comprovado que o agente lesionou a vítima por razões da condição de sexo feminino, em contexto de prévia relação de afeto e convivência, amoldando-se a conduta ao tipo previsto no § 13 do artigo, que deve prevalecer. Aplicação do § 9º, do art. 129 do Código Penal reservada a outras vítimas nas relações domésticas após a edição da Lei nº 14.188/21, já que a mulher é protegida pelo § 13º do referido dispositivo. Precedentes do E. TJSP. Condenação mantida na integralidade. Negado provimento. (TJ-SP - Apelação Criminal: 15065751020218260132 Catanduva, Relator.: Alcides Malossi Junior, Data de Julgamento: 11/12/2024, 9ª Câmara de Direito Criminal, Data de Publicação: 11/12/2024) APELAÇÃO CRIMINAL. LESÃO CORPORAL E AMEAÇA. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA (arts. 129, § 13º e 147, CP). Materialidade e autoria delitivas suficientemente comprovadas no decorrer da instrução, tanto que sequer foram objeto de insurgência defensiva. Pretendida desclassificação do crime previsto no art. 129, § 13º, para a conduta descrita no art. 129, § 9º, ambos do CP. Impossibilidade. Crime cometido sob a égide da Lei nº 14.188/21, que criou nova qualificadora quando a lesão corporal for praticada contra mulher, por razões da condição do sexo feminino e no contexto de violência doméstica e familiar, como é a hipótese dos autos. Condenação mantida. Pena, regime e 'sursis' corretamente impostos. Aplicação da detração penal. Descabimento. Matéria afeta ao Juízo da Execução, o qual dispõe de elementos hábeis para aferir o preenchimento dos requisitos objetivo e subjetivo para o deferimento do benefício. Recurso desprovido. (TJ-SP - APR: 15007560420228260441 Peruíbe, Relator.: Alcides Leopoldo, Data de Julgamento: 13/09/2023, 4ª Câmara de Direito Criminal, Data de Publicação: 13/09/2023) Portanto, o conjunto probatório existente autoriza a conclusão de que o réu ofendeu a integridade física da vítima, conduta que se amolda perfeitamente àquela prevista no art. 129, § 13.º, do Código Penal. 2.2. Do crime de posse de arma Analisando o conjunto probatório trazido aos autos, fica demonstrada de forma segura e indene de dúvidas, que o réu praticou o delito de posse ilegal de arma de fogo e munições de uso permitido, conduta incriminada pelo art. 12, da Lei nº 10.826/03. O tipo penal dispõe: “Art. 12. Possuir ou manter sob sua guarda arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, no interior de sua residência ou dependência desta, ou, ainda no seu local de trabalho, desde que seja o titular ou responsável legal do estabelecimento ou empresa. Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.” Trata-se de crime de perigo presumido, de ação múltipla ou conteúdo variado, exigindo-se o dolo do agente em praticar um ou mais dos verbos do tipo. Assim, não há o elemento subjetivo do injusto, exigindo-se somente à vontade de possuir arma de fogo e munição sem autorização e em desacordo com o ordenamento jurídico vigente, para que configurado esteja o crime em estudo. Pois bem, no caso em julgamento os autos revelam que a conduta do réu se amolda com perfeição ao tipo penal descrito alhures. A materialidade e autoria do delito se encontram demonstradas pelos depoimentos constantes dos autos, bem como, Auto de eficiência de arma de fogo e Laudo nº 545.2.13.9937.109212-A01 (ids. 120688616 e 120688636). O réu, ao ser interrogado em Juízo, confessou a prática delitiva, sustentando que a aquisição do armamento se deu em época em que residia em uma fazenda localizada em local de difícil acesso, justificando a necessidade do objeto para fins de segurança. Afirmou que o revólver era de calibre simples e que sua compra se deu também pelo caráter exótico do objeto. Asseverou que tentou regularizar o armamento junto aos órgãos competentes, mas que, por motivos alheios à sua vontade, não conseguiu concluir o procedimento de registro. A confissão ganha contornos ainda mais relevantes quando o réu revela a extensão temporal da conduta delituosa, pois a vítima "informou que o réu possuía o a arma de fogo há pelo menos 11 anos". Esta circunstância temporal demonstra não se tratar de situação transitória ou recente, mas de conduta delituosa mantida de forma permanente e prolongada, evidenciando o desprezo pela legislação vigente. Deste modo, diante das provas angariadas aos autos, pelo depoimento do policial e, em especial pela própria confissão do réu, bem como, pelo contido no laudo pericial de acostado nos autos, fica claro e evidente que o acusado praticou o crime de posse ilegal de arma de fogo e munições de uso permitido, sendo induvidosa a autoria e a materialidade do citado delito, já que possuía no interior de sua residência revólver Taurus calibre22, acompanhada de 5 (cinco) cartuchos de munição do mesmo calibre, sem amparo legal para tal conduta, portanto, todas as provas apontam para a procedência da presente demanda penal, não havendo o que se falar em absolvição. Em situação semelhante já foi decidido. APELAÇÃO CRIMINAL. POSSE DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO (ART. 12 DA LEI Nº 10.826/2003). CONDENAÇÃO. RECONHECIMENTO E APLICAÇÃO DA ATENUANTE DA CONFISSÃO. IMPOSSIBILIDADE. PENA-BASE NO MÍNIMO LEGAL. SÚMULA Nº 231 DO STJ. CONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO STF. RECURSO DESPROVIDO EM CONSONÂNCIA COM O PARECER. Se na primeira fase da dosimetria penal, a sanção privativa de liberdade é estabelecida no mínimo legal, deve ser desconsiderada a atenuante da confissão, na segunda fase da dosimetria penal, embora reconhecida, pois, não se admite o estabelecimento respectivo em quantum aquém do mínimo legal, conforme entendimento já consolidado na Súmula nº 231 do STJ que inclusive, já foi considerada constitucional pelo STF. (TJMT; APL 36774/2018; Sinop; Rel. Des. Rondon Bassil Dower Filho; Julg. 04/07/2018; DJMT 09/07/2018; Pág. 114) Portanto, restou comprovado que o acusado praticou o crime de posse ilegal de arma de fogo e munições de uso permitido, devendo responder pelas consequências penais de sua conduta delituosa. 3. Dispositivo Diante o exposto, com arrimo nos fundamentos acima expostos, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal, consubstanciada pela denúncia para CONDENAR o réu CÉSAR ANSELMO SCHMULER qualificado nos autos, como incurso na prática do crime descrito no artigo 129, §13 do Código Penal, c/c art. 12 da Lei 10.823/06 em concurso material de delitos, c/c Lei 11.340/2006. 4. Dosimetria Passo, por conseguinte, e destacadamente, à dosimetria da reprimenda penal do acusado, em obséquio ao princípio constitucional da individualização da pena (CF, art. 5º, inc. XLVI) e ao critério trifásico estabelecido no artigo 68 do Estatuto Repressivo. Verificando as condições do acusado e do crime, passo a dosimetria da pena atenta as circunstâncias judiciais previstas no art. 59, do Código Penal. 4.1 Do crime de lesão corporal O Código Penal atribui para o citado delito a pena de reclusão de 02 (dois) a 05 (cinco) anos. 1ª Fase: Circunstâncias Judiciais Culpabilidade – Entendo que não se desgarrou da normalidade. O réu não ostenta antecedentes criminais. Conduta Social – Não restou demonstrada. Personalidade da Agente – Não há elementos para se aquilatar. Motivos – Não ficaram esclarecidos. Circunstâncias e Consequências – inerentes ao tipo penal. Comportamento da Vítima – Os autos não demonstram que tenha contribuído para o crime. Após análise das circunstâncias judiciais, fixo a pena base do delito definido em 2 (dois) anos de reclusão. 2º Fase: Circunstâncias agravantes e atenuantes Inexistem no caso circunstâncias atenuante e agravantes a serem consideradas. 3ª Fase: Causas de aumento e diminuição Por fim, verifica-se que não há causas de aumento ou de diminuição de pena a serem consideradas, razão pela qual torno definitiva a pena em 2 (dois) anos de reclusão. 4.2 Do crime de posse de arma O Código Penal atribui para o citado delito a pena de detenção de 01 (um) a 03 (três) anos e multa. 1ª Fase: Circunstâncias Judiciais Culpabilidade – Entendo que não se desgarrou da normalidade. O réu não ostenta antecedentes criminais. Conduta Social – Não restou demonstrada. Personalidade da Agente – Não há elementos para se aquilatar. Motivos – Não ficaram esclarecidos. Circunstâncias e Consequências – inerentes ao tipo penal. Comportamento da Vítima – Os autos não demonstram que tenha contribuído para o crime. Após análise das circunstâncias judiciais, fixo a pena base do delito definido em 1 (um) ano de detenção e 10 (dez) dias multas. 2º Fase: Circunstâncias agravantes e atenuantes Inexistem no caso circunstâncias atenuante e agravantes a serem consideradas. 3ª Fase: Causas de aumento e diminuição Por fim, verifica-se que não há causas de aumento ou de diminuição de pena a serem consideradas, razão pela qual torno definitiva a pena em 1 (um) ano de detenção e 10 (dez) dias multas. Pena de multa: Em atenção aos parâmetros já apreciados do artigo 59 do Código Penal, delimito a pena de multa em 10 dias-multa, de acordo com as balizas do artigo 49 do Código Penal. Considerando a ausência nos autos de provas no sentido de que o condenado desfrute de situação econômica confortável, o valor unitário do dia-multa vai fixado em 1/30 do valor do salário mínimo vigente à data do fato. PENA DEFINITIVA Portanto, à míngua de outras causas a serem analisadas e após considerar todas as circunstâncias cabíveis, aplicando-se o concurso material, fixa-se à pena definitiva de 2 (dois) anos de reclusão e 1(um) ano de detenção, bem como ao pagamento de 10 (dez) dias multas à 1/30 do valor do salário mínimo vigente à data do fato. Do regime de Pena Nos termos do artigo 33, § 2º, alínea “b”, do Código Penal, fixo o regime inicial aberto. Benefícios Legais [Substituição de Pena, Suspensão Condicional da Penal] Não há possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por qualquer modalidade de pena restritiva de direitos em crimes praticados em contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher, caso dos autos. [AgRg no HC n. 735.437/PR, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 7/6/2022, DJe de 10/6/2022]. Manutenção ou Imposição de Prisão Preventiva ou outra Medida Cautelar: Observando o quantum e o regime inicial diverso do fechado aplicado para o cumprimento da reprimenda, e em observância ao disposto no artigo 387, § 1º, do Código de Processo Penal, em caso de recurso, DEFIRO ao réu o direito de recorrer em liberdade. Custas e Despesas Processuais e Honorários Advocatícios: Condeno o réu ainda ao pagamento das custas e despesas processuais, conforme dispõe o art. 804, do CPP, salientando que eventual pleito de Justiça gratuita poderá ser concedido na fase de execução e pelo juízo competente, porquanto este é o momento adequado para aferir a sua real situação financeira, uma vez que existe a possibilidade de alteração desta, após a data da condenação. 5. Disposições finais Cumpra a Secretaria Judicial às seguintes providências: a) Desnecessária a intimação (pessoal ou ficta) do réu solto, conforme regra prevista no artigo 392, inciso II, do CPP e o entendimento jurisprudencial do STJ [em se tratando de réu solto, a intimação da sentença condenatória pode se dar apenas na pessoa do advogado constituído, ou mesmo do defensor público designado (...)].[1] b) Cientifique(m)-se o(a) Representante Ministerial e a Defesa do(a/s) acusado(a/s). Após o trânsito em julgado desta sentença: a) INSIRA-SE no sistema conveniado ao TRE-MT (SIEL), o teor desta condenação (CF, art. 15, inc. III; CE, art. 71, §2º). b) OFICIEM-SE aos Institutos de Identificação Criminal, bem como ao Cartório Distribuidor desta Comarca e de residência e nascimento do réu, para as anotações pertinentes. c) EXPEÇA-SE Guia de Execução Penal Definitiva, encaminhando-se à Vara de Execuções Penais competente. d) Cumpridas todas essas providências, arquivem-se os autos, com as anotações e baixas de estilo, inclusive, com baixa na distribuição. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se, expedindo-se o necessário. SÃO JOSÉ DO RIO CLARO, data e hora da assinatura eletrônica. Cristhiane Trombini Puia Baggio Juíza de Direito Designada para o NAE Portaria TJMT/CM N. 103 DE 08/JANEIRO/2025 [1] STJ: AgRg nos EDcl no HC n. 680.575/SC; AgRg no HC n. 844.848/RO; AgRg no RHC 156.273/PB; TJMT: N.U 1007049-58.2024.8.11.0000 e N.U 1002000-36.2024.8.11.0000.

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Processo nº 1000997-78.2023.8.11.0033

ID: 291314400

Tribunal: TJMT Órgão: 1ª VARA DE SÃO JOSÉ DO RIO CLARO Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 1000997-78.2023.8.11.0033

Data de Disponibilização: 06/06/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

CESAR ANSELMO SCHMULER

Sentença

Advogados:

ANA CAROLINA DE LIMA RODRIGUES REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO ANA CAROLINA DE LIMA RODRIGUES

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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO CORREGEDORIA GERAL DE JUSTIÇA NÚCLEO DE ATUAÇÃO ESTRATÉGICA - NAE Processo: 1000997-78.2023.8.11.0033. Visto. 1. Relatório O Ministério Público do ESTADO DE MAT… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO CORREGEDORIA GERAL DE JUSTIÇA NÚCLEO DE ATUAÇÃO ESTRATÉGICA - NAE Processo: 1000997-78.2023.8.11.0033. Visto. 1. Relatório O Ministério Público do ESTADO DE MATO GROSSO ofereceu denúncia em face de CÉSAR ANSELMO SCHMULER, qualificado, como incurso nas disposições do artigo 129, §13, do Código Penal e art. 12 da Lei 10.826/03. Narra a denúncia em síntese: “(...) Consta do incluso inquérito policial que, iniciando-se em data não especificada, porém, até o dia 22 de março de 2023, CÉSAR ANSELMO SCHMULER possuía, no interior de sua residência, situada na Avenida Domingos Briante, distrito de Brianorte, em Nova Maringá/MT, arma de fogo de uso permitido [revólver Taurus calibre 22] apta a efetuar disparos, assim como um estojo de cartuchos e cinco munições intactas do mesmo calibre, tudo sem autorização e em desacordo com as disposições legais e regulamentares. Também é produto dos informes colhidos que, no dia 22 de março de 2023, por volta das 18h00, nas dependências do imóvel retrocitado, CÉSAR ANSELMO SCHMULER, assumindo o risco, ofendeu a integridade corporal de sua convivente, Sandra Regina Bezerra da Costa, causando-lhe as lesões descritas no Prontuário Médico de ID 120688623, por razões da condição do sexo feminino. Fazem esclarecer as investigações policiais que, na data acima mencionada, o denunciado e a vítima estavam na residência comum do casal quando, então, passaram a discutir por motivos de somenos importância. Apurou-se que, não satisfeito com o entrevero verbal, o acusado sacou a arma de fogo que carregava em sua cintura e, assumindo o risco de lesionar sua companheira, passou a apontar o objeto para ela, entretanto, no intuito de se defender da eminente ameaça, a ofendida entrou em luta corporal com o increpado, momento no qual o revólver foi disparado, tendo sido ela atingida na perna. No desdobramento dos fatos, a Polícia Militar foi acionada e, ao chegarem no local, apreenderam a arma utilizada no delito e lograram êxito em encontrar dentro do imóvel um estojo de cartuchos e cinco unidades de munições, todos de calibre 22, itens estes que estavam em perfeitas condições de uso [ID 120688636].. A denúncia foi devidamente recebida em 26 de julho de 2023 (Id. 124262547). Citado, o acusado apresentou resposta à acusação (Id. 128957451). O feito foi incluído em pauta (Id. 129107469). Durante a instrução processual inquiriu-se a vítima Sandra Regina Bezerra da Costa, bem como a testemunha Aguinaldo da Silva e, ao final, o acusado foi interrogado (Id. 148469143). O Ministério Público apresentou alegações finais, no qual postulou pela procedência da exordial (Id. 149572829). Ao seu turno, a Defesa apresentou memorial no Id. 152570849, requerendo absolvição do acusado quanto ao crime de lesão corporal e, alternativamente, postulou pela desclassificação do crime para o previsto no art. 129, § 6º do CP, além do reconhecimento da confissão quanto ao crime de posse irregular de arma de fogo. Os autos vieram conclusos. É a síntese do necessário. Fundamento e decido. 2. Fundamentação O processo está formalmente em ordem, inexistindo nulidades ou vícios a sanar. As provas foram coligidas sob o crivo dos princípios norteadores do devido processo legal, mormente o contraditório e a ampla defesa, nos termos constitucionais e processuais. Presentes às condições necessárias ao exercício do direito de ação, bem como os pressupostos legalmente exigidos. Não existem matérias preliminares pendentes a serem apreciadas. Passo doravante à análise do mérito. 2.1. Do crime de lesão corporal (CP, art. 129, § 13) A materialidade do delito está devidamente comprovada pelo auto de prisão em flagrante (id.120688611), Boletim de ocorrência nº 2023.79415 (id.120688612), Auto de apreensão (id. 120688614), Relatório policial (id. 120689392), bem como pelos depoimentos colhidos em juízo. A autoria, de igual modo, encontra-se perfeitamente delineada nos autos na pessoa do acusado. O acusado Celso, em interrogatório judicial, negou ter sido o autor da lesão corporal sofrida pela vítima. Afirmou que, em razão de um desentendimento verbal entre ambos, a ofendida teria se apossado de uma arma de fogo que se encontrava guardada em uma cozinha situada na área externa e aberta da residência. Declarou que, temendo as atitudes da companheira, tentou retirar o armamento de sua posse, momento em que a arma teria caído no chão, disparando de forma acidental e atingindo a vítima. A ofendida Sandra Regina Bezerra da Costa afirmou, em juízo, que a arma de fogo ficava guardada em um armário na casa onde residia com o acusado. Relatou que, no dia dos fatos, percebeu que o réu havia ingerido bebida alcoólica e, sabendo que em tais circunstâncias ele costumava se mostrar agitado, decidiu retirar a arma do armário para guardá-la em outro local. Declarou que, nesse momento, o acusado investiu contra ela, resultando em luta corporal entre ambos pela posse da arma. Afirmou que, durante o embate, houve um disparo que atingiu sua perna, o que a levou a gritar por socorro até que um vizinho compareceu ao local. Informou que o réu possuía o referido armamento há pelo menos onze anos. Ao seu turno, Aguinaldo da Silva declarou, em juízo, que é vizinho da vítima Sandra Regina Bezerra da Costa e do acusado Celso. Informou que, na data dos fatos, encontrava-se em seu estabelecimento comercial, situado ao lado da residência dos envolvidos, quando escutou um barulho semelhante a um estouro, seguido por gritos de socorro provenientes da casa vizinha. Afirmou que os gritos pareciam ser de uma voz feminina que clamava por seu nome repetidamente, razão pela qual decidiu se dirigir ao local. Ao chegar à residência, observou, pela janela, que o chão estava coberto de sangue e notou que a vítima havia sido atingida na região da perna. Declarou que, por receio, deixou o local naquele momento, mas retornou em seguida a pedido do filho do casal, que solicitou sua ajuda informando que a mãe estava ferida. Narrou que, ao retornar à residência, encontrou a vítima e o acusado em luta corporal, disputando a posse de uma arma de fogo. Relatou que, em determinado momento, conseguiu tomar a arma das mãos de ambos e, ao sair da residência, solicitou a terceiros que acionassem a polícia e o serviço de emergência, permanecendo de posse do armamento até a chegada dos policiais. Pois bem. A autoria do delito emerge claramente dos elementos probatórios colhidos, mormente considerando que, embora o réu tenha negado a intenção de causar a lesão, admitiu sua participação na disputa pela arma de fogo que culminou no disparo. O dolo, ainda que eventual, configura-se pela assunção do risco de produzir o resultado lesivo, uma vez que o agente, ao engajar-se em luta corporal envolvendo arma de fogo, no mínimo, assumiu conscientemente a possibilidade de causar ferimentos à vítima. Ademais, o depoimento da testemunha Aguinaldo da Silva reveste-se de especial relevância probatória, porquanto se trata de pessoa que presenciou diretamente os fatos delituosos e teve contato imediato com a situação criminosa. A narrativa testemunhal apresenta-se coerente, detalhada e verossímil, descrevendo de forma precisa a sequência dos acontecimentos. O depoente relatou que, enquanto trabalhava em seu estabelecimento comercial vizinho à residência dos envolvidos, escutou "um estouro, seguido por gritos de socorro", que identificou como sendo "de uma voz feminina chamando por seu nome várias vezes". Particularmente relevante é o relato da testemunha sobre sua segunda intervenção no local, quando "tentou separar a vítima e o réu que se encontravam em disputa pela arma de fogo", conseguindo "retirar o objeto das mãos de ambos". Esta narrativa evidencia de forma cristalina a participação ativa do réu na disputa pela arma, contradizendo frontalmente sua versão defensiva e confirmando seu envolvimento direto na dinâmica delituosa. Por conseguinte, descabida a alegação de legítima defesa, eis que não restaram demonstrados nos autos a incidência dos requisitos autorizadores para aplicação de referida benesse, conforme fundamentos expostos acima. A qualificadora prevista no § 13º do artigo 129 do Código Penal encontra-se plenamente caracterizada, porquanto o delito foi perpetrado contra mulher por razões da condição do sexo feminino, no contexto de violência doméstica, envolvendo menosprezo ou discriminação à condição de mulher, conforme se depreende das circunstâncias fáticas narradas, em que o réu, em estado de embriaguez alcoólica, demonstrou comportamento agressivo e controlador em relação à companheira. O conjunto probatório demonstra inequivocamente que as agressões praticadas decorreram de questões relacionadas ao gênero da vítima, caracterizando violência baseada na condição de mulher, não se limitando apenas ao parentesco existente entre as partes, a convivência cotidiana entre acusado e vítima ou circunstâncias específicas do contexto familiar. Desta feita, a Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha) constitui ação afirmativa destinada especificamente aos casos de violência de gênero, buscando restabelecer a igualdade material entre eles. Nesse sentido, o presente caso enquadra-se perfeitamente naqueles em que a violência é praticada em função do gênero, inserindo-se no escopo da referida lei. A jurisprudência pátria tem reconhecido a importância de se identificar corretamente os casos de violência de gênero, aplicando-se a qualificadora do § 13º quando presentes os elementos caracterizadores da violência baseada na condição de mulher. A correta tipificação deve observar não apenas as relações de parentesco ou convivência, mas fundamentalmente a motivação discriminatória de gênero que permeia a conduta delitiva. Nesse sentido: PENAL. APELAÇÃO. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. LESÃO CORPORAL (art. 129, § 13 do CP). CONDENAÇÃO. RECURSO DA DEFESA. Pretendida a desclassificação do crime elencado na denúncia (art. 129, § 13º, CP) para o crime tipificado no artigo 129, § 9º, CP, com pena mais branda e, via de consequência, a adequação da pena. Impertinência. Desclassificação. Impossibilidade. Materialidade e autoria que restaram demonstradas pelas palavras tanto da vítima como do réu, corroboradas pelo laudo de lesão corporal, que evidenciou as lesões conforme descritas por ela, ficando plenamente caracterizado o ocorrido, conforme exposto na denúncia. Impossível à desclassificação da conduta para o art. 129, § 9º, do CP, quando restou devidamente comprovado que o agente lesionou a vítima por razões da condição de sexo feminino, em contexto de prévia relação de afeto e convivência, amoldando-se a conduta ao tipo previsto no § 13 do artigo, que deve prevalecer. Aplicação do § 9º, do art. 129 do Código Penal reservada a outras vítimas nas relações domésticas após a edição da Lei nº 14.188/21, já que a mulher é protegida pelo § 13º do referido dispositivo. Precedentes do E. TJSP. Condenação mantida na integralidade. Negado provimento. (TJ-SP - Apelação Criminal: 15065751020218260132 Catanduva, Relator.: Alcides Malossi Junior, Data de Julgamento: 11/12/2024, 9ª Câmara de Direito Criminal, Data de Publicação: 11/12/2024) APELAÇÃO CRIMINAL. LESÃO CORPORAL E AMEAÇA. VIOLÊNCIA DOMÉSTICA (arts. 129, § 13º e 147, CP). Materialidade e autoria delitivas suficientemente comprovadas no decorrer da instrução, tanto que sequer foram objeto de insurgência defensiva. Pretendida desclassificação do crime previsto no art. 129, § 13º, para a conduta descrita no art. 129, § 9º, ambos do CP. Impossibilidade. Crime cometido sob a égide da Lei nº 14.188/21, que criou nova qualificadora quando a lesão corporal for praticada contra mulher, por razões da condição do sexo feminino e no contexto de violência doméstica e familiar, como é a hipótese dos autos. Condenação mantida. Pena, regime e 'sursis' corretamente impostos. Aplicação da detração penal. Descabimento. Matéria afeta ao Juízo da Execução, o qual dispõe de elementos hábeis para aferir o preenchimento dos requisitos objetivo e subjetivo para o deferimento do benefício. Recurso desprovido. (TJ-SP - APR: 15007560420228260441 Peruíbe, Relator.: Alcides Leopoldo, Data de Julgamento: 13/09/2023, 4ª Câmara de Direito Criminal, Data de Publicação: 13/09/2023) Portanto, o conjunto probatório existente autoriza a conclusão de que o réu ofendeu a integridade física da vítima, conduta que se amolda perfeitamente àquela prevista no art. 129, § 13.º, do Código Penal. 2.2. Do crime de posse de arma Analisando o conjunto probatório trazido aos autos, fica demonstrada de forma segura e indene de dúvidas, que o réu praticou o delito de posse ilegal de arma de fogo e munições de uso permitido, conduta incriminada pelo art. 12, da Lei nº 10.826/03. O tipo penal dispõe: “Art. 12. Possuir ou manter sob sua guarda arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, no interior de sua residência ou dependência desta, ou, ainda no seu local de trabalho, desde que seja o titular ou responsável legal do estabelecimento ou empresa. Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.” Trata-se de crime de perigo presumido, de ação múltipla ou conteúdo variado, exigindo-se o dolo do agente em praticar um ou mais dos verbos do tipo. Assim, não há o elemento subjetivo do injusto, exigindo-se somente à vontade de possuir arma de fogo e munição sem autorização e em desacordo com o ordenamento jurídico vigente, para que configurado esteja o crime em estudo. Pois bem, no caso em julgamento os autos revelam que a conduta do réu se amolda com perfeição ao tipo penal descrito alhures. A materialidade e autoria do delito se encontram demonstradas pelos depoimentos constantes dos autos, bem como, Auto de eficiência de arma de fogo e Laudo nº 545.2.13.9937.109212-A01 (ids. 120688616 e 120688636). O réu, ao ser interrogado em Juízo, confessou a prática delitiva, sustentando que a aquisição do armamento se deu em época em que residia em uma fazenda localizada em local de difícil acesso, justificando a necessidade do objeto para fins de segurança. Afirmou que o revólver era de calibre simples e que sua compra se deu também pelo caráter exótico do objeto. Asseverou que tentou regularizar o armamento junto aos órgãos competentes, mas que, por motivos alheios à sua vontade, não conseguiu concluir o procedimento de registro. A confissão ganha contornos ainda mais relevantes quando o réu revela a extensão temporal da conduta delituosa, pois a vítima "informou que o réu possuía o a arma de fogo há pelo menos 11 anos". Esta circunstância temporal demonstra não se tratar de situação transitória ou recente, mas de conduta delituosa mantida de forma permanente e prolongada, evidenciando o desprezo pela legislação vigente. Deste modo, diante das provas angariadas aos autos, pelo depoimento do policial e, em especial pela própria confissão do réu, bem como, pelo contido no laudo pericial de acostado nos autos, fica claro e evidente que o acusado praticou o crime de posse ilegal de arma de fogo e munições de uso permitido, sendo induvidosa a autoria e a materialidade do citado delito, já que possuía no interior de sua residência revólver Taurus calibre22, acompanhada de 5 (cinco) cartuchos de munição do mesmo calibre, sem amparo legal para tal conduta, portanto, todas as provas apontam para a procedência da presente demanda penal, não havendo o que se falar em absolvição. Em situação semelhante já foi decidido. APELAÇÃO CRIMINAL. POSSE DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO (ART. 12 DA LEI Nº 10.826/2003). CONDENAÇÃO. RECONHECIMENTO E APLICAÇÃO DA ATENUANTE DA CONFISSÃO. IMPOSSIBILIDADE. PENA-BASE NO MÍNIMO LEGAL. SÚMULA Nº 231 DO STJ. CONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO STF. RECURSO DESPROVIDO EM CONSONÂNCIA COM O PARECER. Se na primeira fase da dosimetria penal, a sanção privativa de liberdade é estabelecida no mínimo legal, deve ser desconsiderada a atenuante da confissão, na segunda fase da dosimetria penal, embora reconhecida, pois, não se admite o estabelecimento respectivo em quantum aquém do mínimo legal, conforme entendimento já consolidado na Súmula nº 231 do STJ que inclusive, já foi considerada constitucional pelo STF. (TJMT; APL 36774/2018; Sinop; Rel. Des. Rondon Bassil Dower Filho; Julg. 04/07/2018; DJMT 09/07/2018; Pág. 114) Portanto, restou comprovado que o acusado praticou o crime de posse ilegal de arma de fogo e munições de uso permitido, devendo responder pelas consequências penais de sua conduta delituosa. 3. Dispositivo Diante o exposto, com arrimo nos fundamentos acima expostos, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal, consubstanciada pela denúncia para CONDENAR o réu CÉSAR ANSELMO SCHMULER qualificado nos autos, como incurso na prática do crime descrito no artigo 129, §13 do Código Penal, c/c art. 12 da Lei 10.823/06 em concurso material de delitos, c/c Lei 11.340/2006. 4. Dosimetria Passo, por conseguinte, e destacadamente, à dosimetria da reprimenda penal do acusado, em obséquio ao princípio constitucional da individualização da pena (CF, art. 5º, inc. XLVI) e ao critério trifásico estabelecido no artigo 68 do Estatuto Repressivo. Verificando as condições do acusado e do crime, passo a dosimetria da pena atenta as circunstâncias judiciais previstas no art. 59, do Código Penal. 4.1 Do crime de lesão corporal O Código Penal atribui para o citado delito a pena de reclusão de 02 (dois) a 05 (cinco) anos. 1ª Fase: Circunstâncias Judiciais Culpabilidade – Entendo que não se desgarrou da normalidade. O réu não ostenta antecedentes criminais. Conduta Social – Não restou demonstrada. Personalidade da Agente – Não há elementos para se aquilatar. Motivos – Não ficaram esclarecidos. Circunstâncias e Consequências – inerentes ao tipo penal. Comportamento da Vítima – Os autos não demonstram que tenha contribuído para o crime. Após análise das circunstâncias judiciais, fixo a pena base do delito definido em 2 (dois) anos de reclusão. 2º Fase: Circunstâncias agravantes e atenuantes Inexistem no caso circunstâncias atenuante e agravantes a serem consideradas. 3ª Fase: Causas de aumento e diminuição Por fim, verifica-se que não há causas de aumento ou de diminuição de pena a serem consideradas, razão pela qual torno definitiva a pena em 2 (dois) anos de reclusão. 4.2 Do crime de posse de arma O Código Penal atribui para o citado delito a pena de detenção de 01 (um) a 03 (três) anos e multa. 1ª Fase: Circunstâncias Judiciais Culpabilidade – Entendo que não se desgarrou da normalidade. O réu não ostenta antecedentes criminais. Conduta Social – Não restou demonstrada. Personalidade da Agente – Não há elementos para se aquilatar. Motivos – Não ficaram esclarecidos. Circunstâncias e Consequências – inerentes ao tipo penal. Comportamento da Vítima – Os autos não demonstram que tenha contribuído para o crime. Após análise das circunstâncias judiciais, fixo a pena base do delito definido em 1 (um) ano de detenção e 10 (dez) dias multas. 2º Fase: Circunstâncias agravantes e atenuantes Inexistem no caso circunstâncias atenuante e agravantes a serem consideradas. 3ª Fase: Causas de aumento e diminuição Por fim, verifica-se que não há causas de aumento ou de diminuição de pena a serem consideradas, razão pela qual torno definitiva a pena em 1 (um) ano de detenção e 10 (dez) dias multas. Pena de multa: Em atenção aos parâmetros já apreciados do artigo 59 do Código Penal, delimito a pena de multa em 10 dias-multa, de acordo com as balizas do artigo 49 do Código Penal. Considerando a ausência nos autos de provas no sentido de que o condenado desfrute de situação econômica confortável, o valor unitário do dia-multa vai fixado em 1/30 do valor do salário mínimo vigente à data do fato. PENA DEFINITIVA Portanto, à míngua de outras causas a serem analisadas e após considerar todas as circunstâncias cabíveis, aplicando-se o concurso material, fixa-se à pena definitiva de 2 (dois) anos de reclusão e 1(um) ano de detenção, bem como ao pagamento de 10 (dez) dias multas à 1/30 do valor do salário mínimo vigente à data do fato. Do regime de Pena Nos termos do artigo 33, § 2º, alínea “b”, do Código Penal, fixo o regime inicial aberto. Benefícios Legais [Substituição de Pena, Suspensão Condicional da Penal] Não há possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por qualquer modalidade de pena restritiva de direitos em crimes praticados em contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher, caso dos autos. [AgRg no HC n. 735.437/PR, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 7/6/2022, DJe de 10/6/2022]. Manutenção ou Imposição de Prisão Preventiva ou outra Medida Cautelar: Observando o quantum e o regime inicial diverso do fechado aplicado para o cumprimento da reprimenda, e em observância ao disposto no artigo 387, § 1º, do Código de Processo Penal, em caso de recurso, DEFIRO ao réu o direito de recorrer em liberdade. Custas e Despesas Processuais e Honorários Advocatícios: Condeno o réu ainda ao pagamento das custas e despesas processuais, conforme dispõe o art. 804, do CPP, salientando que eventual pleito de Justiça gratuita poderá ser concedido na fase de execução e pelo juízo competente, porquanto este é o momento adequado para aferir a sua real situação financeira, uma vez que existe a possibilidade de alteração desta, após a data da condenação. 5. Disposições finais Cumpra a Secretaria Judicial às seguintes providências: a) Desnecessária a intimação (pessoal ou ficta) do réu solto, conforme regra prevista no artigo 392, inciso II, do CPP e o entendimento jurisprudencial do STJ [em se tratando de réu solto, a intimação da sentença condenatória pode se dar apenas na pessoa do advogado constituído, ou mesmo do defensor público designado (...)].[1] b) Cientifique(m)-se o(a) Representante Ministerial e a Defesa do(a/s) acusado(a/s). Após o trânsito em julgado desta sentença: a) INSIRA-SE no sistema conveniado ao TRE-MT (SIEL), o teor desta condenação (CF, art. 15, inc. III; CE, art. 71, §2º). b) OFICIEM-SE aos Institutos de Identificação Criminal, bem como ao Cartório Distribuidor desta Comarca e de residência e nascimento do réu, para as anotações pertinentes. c) EXPEÇA-SE Guia de Execução Penal Definitiva, encaminhando-se à Vara de Execuções Penais competente. d) Cumpridas todas essas providências, arquivem-se os autos, com as anotações e baixas de estilo, inclusive, com baixa na distribuição. Publique-se. Intimem-se. Cumpra-se, expedindo-se o necessário. SÃO JOSÉ DO RIO CLARO, data e hora da assinatura eletrônica. Cristhiane Trombini Puia Baggio Juíza de Direito Designada para o NAE Portaria TJMT/CM N. 103 DE 08/JANEIRO/2025 [1] STJ: AgRg nos EDcl no HC n. 680.575/SC; AgRg no HC n. 844.848/RO; AgRg no RHC 156.273/PB; TJMT: N.U 1007049-58.2024.8.11.0000 e N.U 1002000-36.2024.8.11.0000.

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Processo nº 1000997-75.2024.8.11.0055

ID: 334978065

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000997-75.2024.8.11.0055

Data de Disponibilização: 25/07/2025

Polo Ativo:

EUTEMISTO NUNES DE ALMEIDA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

LUCIANO HENRIQUE SOARES DE OLIVEIRA AIRES

OAB/TO XXXXXX Desbloquear

GEORGE HIDASI FILHO

OAB/GO XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000997-75.2024.8.11.0055 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Indenização por Dano Moral, I… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000997-75.2024.8.11.0055 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [EUTEMISTO NUNES DE ALMEIDA - CPF: 471.765.047-68 (APELANTE), LUCIANO HENRIQUE SOARES DE OLIVEIRA AIRES - CPF: 004.183.641-33 (ADVOGADO), GEORGE HIDASI FILHO - CPF: 021.887.111-22 (ADVOGADO), BANCO CETELEM S/A - CNPJ: 00.558.456/0001-71 (APELADO), BANCO BNP PARIBAS BRASIL S.A. - CNPJ: 01.522.368/0001-82 (APELADO), BREINER RICARDO DINIZ RESENDE MACHADO - CPF: 037.193.746-96 (ADVOGADO), BANCO CETELEM S/A - CNPJ: 00.558.456/0001-71 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A DIREITO DO CONSUMIDOR E BANCÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. CARTÃO DE CRÉDITO CONSINGADO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. IDOSO HIPERVULNERÁVEL. AUSÊNCIA DE TERMO DE CONSENTIMENTO ESCLARECIDO E COMPROVANTE DE TED. VÍCIO DE CONSENTIMENTO. NULIDADE CONTRATUAL. RESTITUIÇÃO SIMPLES DOS DESCONTOS. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação cível interposta por EUTEMISTO NUNES DE ALMEIDA contra sentença da 3ª Vara Cível de Tangará da Serra/MT que, em ação declaratória de nulidade de contrato de cartão de crédito consignado com RMC cumulada com restituição de valores e danos morais ajuizada em face do BANCO CETELEM S.A. (incorporado pelo BANCO BNP PARIBAS BRASIL S.A.), julgou improcedentes todos os pedidos. II. Questão em discussão 2. Há três questões em discussão: (i) definir se houve consentimento válido para a contratação do cartão de crédito consignado com RMC; (ii) estabelecer as consequências jurídicas da nulidade quanto à restituição dos valores descontados; (iii) determinar a existência de dano moral indenizável. III. Razões de decidir 3. Incide o Código de Defesa do Consumidor (Súm. 297/STJ); a condição de idoso torna o consumidor hipervulnerável, impondo dever de informação reforçado (Estatuto do Idoso). 4. Opera-se a inversão do ônus da prova (CDC, art. 6º, VIII); compete ao banco comprovar a regularidade da contratação. 5. O banco não comprova a efetiva disponibilização dos valores mediante TED, falhando na demonstração da contrapartida financeira indispensável à validade do negócio. 6. A ausência do Termo de Consentimento Esclarecido – TCE (IN INSS 28/2008, art. 21-A) viola deveres de informação e transparência, tornando inválido o consentimento. 7. A inexistência de utilização do cartão para compras e a realização exclusiva de saques evidenciam erro substancial do consumidor quanto à natureza do negócio, configurando vício de consentimento (CC, art. 171, II). 8. A prática é abusiva, violando os princípios da transparência e boa-fé (CDC, art. 6º, III), impondo a nulidade do contrato e a cessação dos descontos. 9. A restituição deve ser simples, porque não demonstrado dolo específico que autorize a devolução em dobro (CDC, art. 42, par. ún.). 10. Os descontos prolongados sobre verba alimentar de idoso configuram dano moral in re ipsa, fixado em R$ 10.000,00, corrigidos pelo INPC e acrescidos de juros moratórios (CC, art. 405; Súm. 362/STJ; Lei 14.905/2024). IV. Dispositivo e tese 11. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: 1. A ausência do Termo de Consentimento Esclarecido e de comprovante de transferência dos valores descaracteriza o consentimento válido do consumidor idoso em contrato de cartão de crédito consignado com RMC. 2. Verificado o vício de consentimento, o contrato é nulo, cessam-se os descontos e impõe-se a restituição simples dos valores descontados, corrigidos e acrescidos de juros. 3. Descontos reiterados sobre benefício previdenciário de pessoa idosa configuram dano moral presumido, passível de indenização. Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, III e VIII, e 42, par. ún.; Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003); IN INSS 28/2008, art. 21-A; CC, art. 405; CPC, art. 86; Súmulas 297 e 362/STJ; Lei 14.905/2024. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.995.458/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, 09.08.2022; TJ/MT, RAC 1022486-50.2023.8.11.0041, Rel. Des. Carlos Alberto A. da Rocha, 27.11.2024; TJ/MG, RAC 5001747-97.2023.8.13.0407, Rel. Des. João Cancio, 14.05.2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação interposto por EUTEMISTO NUNES DE ALMEIDA contra a sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Tangará da Serra/MT, Dr. Anderson Gomes Junqueira, nos autos da Ação Declaratória de Nulidade de Contrato de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável (RMC) e Inexistência de Débito cumulada com Restituição de Valores em Dobro e Indenização por Dano Moral ajuizada contra BANCO CETELEM S.A. (incorporado por BANCO BNP PARIBAS BRASIL S.A.), que julgou improcedentes todos os pedidos formulados na inicial (vide ID. 297654892). Em suas razões de ID. 297654894, o Autor/Apelante reitera os argumentos da inicial, sustentando que o contrato é nulo por não ter observado as formalidades legais exigidas para contratação com pessoa analfabeta, ausência do Termo de Consentimento Esclarecido, divergência entre o contrato juntado e o efetivamente discutido, e falta de comprovação da transferência dos valores via TED. Pugna pela reforma da sentença para que sejam julgados procedentes os pedidos de nulidade contratual, cessação dos descontos, restituição dos valores em dobro e condenação em danos morais. Recurso tempestivo (ID. 297654895) e dispensado do preparado (ID. 298880375). Intimado, o Apelado deixou transcorrer in albis o prazo para apresentação de contrarrazões. É o relatório. Inclua-se em pauta de julgamento. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Colenda Câmara: Presentes os requisitos de admissibilidade recursal, conheço do recurso e adentro no seu mérito. Ressai dos autos que EUTEMISTO NUNES DE ALMEIDA, pessoa idosa (79 anos) e aposentado, alegou que procurou a instituição financeira requerida para contratar empréstimo consignado, mas descobriu posteriormente ter sido contratado cartão de crédito consignado com reserva de margem consignável (RMC) n. 97-820368239/16, com descontos mensais de R$ 44,00 que perduraram por extenso período, totalizando 308 parcelas e perfazendo o montante de R$ 13.552,00. Sustentou que nunca teve a intenção de contratar cartão de crédito e que foi induzido a erro pela requerida, sendo pessoa hipervulnerável, e que sua renda mensal de R$ 1.320,00 (um salário mínimo) restou significativamente comprometida por descontos sem prazo definido para término. Assim, requereu a anulação do contrato, a suspensão dos descontos, a restituição em dobro dos valores descontados, além de indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00. Em sede de contestação, o BANCO CETELEM S.A. (incorporado pelo Grupo BNP PARIBAS S.A.), suscitou prejudiciais de mérito de prescrição e decadência e, no mérito, alegou a regularidade da contratação, juntando contrato e documentos correlatos (ID. 297654861). Após regular instrução processual, o Juízo a quo prolatou sentença, em que afastou as prejudiciais de mérito, mas julgou improcedentes, cujos termos peço licença para me reportar, em homenagem ao princípio da dialeticidade: “Vistos, Trata-se de ação declaratória de nulidade de contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC) e inexistência de débito cumulada com restituição de valores em dobro e indenização por dano moral ajuizada em 07 de fevereiro de 2024 por Eutemisto Nunes de Almeida em desfavor de Banco Cetelem S.A., ambos devidamente qualificados. Alegou a parte autora, em resumo, que é aposentado e que diante das dificuldades financeiras procurou a parte requerida a fim de adquirir um empréstimo consignado, tendo acreditado ter contratado referida modalidade. Seguiu narrando que ao analisar o extrato de pagamento do seu benefício, notou um desconto sob a rubrica de uma Reserva de Margem Consignável (RMC), cujo contrato foi autuado sob o nº 97-820368239/16, com parcelas mensais no valor de R$ 44,00 cada, sendo descontadas 07 parcelas, perfazendo o montante total de R$ 308,00. Relatou que entrou em contato com a parte requerida para obter informações, oportunidade em que foi informada que o contrato firmado foi de cartão de crédito consignado, diferente do que acreditava e queria ter contratado. Diante desses fatos, requereu a anulação do contrato de cartão de crédito consignado nº 97-820368239/16, com a suspensão de todos os descontos. Subsidiariamente pugnou pela conversão do empréstimo feito via cartão de crédito para a modalidade de empréstimo consignado comum, com a aplicação dos juros praticados para essa espécie de negociação na data da assinatura do contrato, além do abatimento valores já descontados. Requereu ainda a condenação da parte requerida a restituição em dobro do valor de R$ 616,00, indevidamente descontados do benefício da parte autora, bem como ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00. Requereu ainda a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, a inversão do ônus da prova e a concessão da gratuidade judiciária. No id 140974889 a inicial foi recebida, oportunidade em que foi concedida a gratuidade da justiça à parte autora, determinada a realização de audiência de conciliação, deferido o pedido de aplicação do CDC e indeferida a inversão do ônus da prova. No id 141239663 a parte requerida foi citada por meio eletrônico. No id 143766891 a parte requerida apresentou contestação requerendo, em preliminar, a retificação do polo passivo em virtude da incorporação do Banco Cetelem S/A pelo Banco BNP Paribas Brasil S/A. Alegou, ainda, em prejudicial de mérito a ocorrência da decadência e prescrição. No mérito, sustentou, em síntese, a regularidade da contratação, a ausência de falha na prestação do serviço e a inexistência de danos morais. Assim, requereu a improcedência da ação, com a manutenção da modalidade contratada e a rejeição dos pedidos de restituição de valores e pagamento de indenização por danos morais. No id 147647813 a parte requerida pugnou pela juntada dos TED’s dos saques complementares realizados pela parte autora. No id 147686620 a conciliação restou infrutífera. No id 157934470 a parte autora apresentou impugnação à contestação. Determinada a especificação das provas pelas partes, no id 166485846 a parte requerida requereu a designação de audiência de conciliação, enquanto que no id 167823193 a parte autora requereu a intimação da parte requerida para juntar aos autos o comprovante de entrega do cartão de crédito, bem como a produção de prova documental. No id 167823193 a parte requerida apresentou proposta de acordo. Intimada para se manifestar acerca da proposta de acordo, no id 182130171 a parte autora manifestou desinteresse na conciliação. É o relatório. D E C I D O. Analisando os autos, verifico que os elementos necessários à formação de minha convicção já se encontram coligidos ao feito, estando, então, a causa madura e apta para ser julgada, com fulcro no art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, conheço diretamente do pedido, proferindo sentença. Isso porque, não há razão para se instaurar a fase probatória para produção da prova documental postulada pela parte autora, consistente na juntada do comprovante de entrega do cartão de crédito, tendo em vista que a contratação de cartão de crédito com reserva de margem consignável possui regramento próprio, onde a liberação dos saques, ou seja, dos valores emprestados, não está condicionada a utilização do cartão de plástico pelo contratante, visto que para tanto, basta a disponibilidade de margem consignável pelo órgão empregatício e a autorização para a instituição financeira. Assim, pelas razões acima expostas e com fundamento no parágrafo único do art. 370 do Código de Processo Civil, indefiro o pedido de produção de prova postulada pela parte autora. Justificada a possibilidade de julgamento antecipado, passo a analisar o pedido de retificação do polo passivo. Analisando os autos, verifico que restou demonstrado pelo documento de id 143766894, a incorporação do Banco Cetelem pelo Banco BNP Peribas Brasil S/A. Diante disso e considerando que não houve impugnação pela parte autora, a medida que se impõe é a retificação do polo passivo, tendo em vista que o instituto da incorporação empresarial resulta na extinção da pessoa jurídica incorporada com a transmissão de todos os direitos e obrigações à incorporadora, consoante dispõe os arts. 1.116 e 1.118, ambos do Código Civil, in verbis: (...) Assim, defiro o pedido de retificação do polo passivo da ação, para constar Banco BNP Paribas Brasil S/A (CNPJ 01.522.368/0001-82), devendo ser providenciado as alterações necessárias junto ao distribuidor e capa dos autos. (...) Não havendo outras questões prejudiciais a ser decididas, passo a analisar o mérito da presente ação, expondo as razões de meu convencimento, conforme exigência esculpida no art. 93, inciso IX, da Constituição de 1988. A parte autora pretende a anulação do contrato nº 97-820368239/16, com a suspensão de todos os descontos. Subsidiariamente pugnou pela conversão do empréstimo feito via cartão de crédito para a modalidade de empréstimo consignado comum, com a aplicação dos juros praticados para essa espécie de negociação na data da assinatura do contrato, além do abatimento valores já descontados. Requereu ainda a condenação da parte requerida a restituição em dobro do valor de R$ 616,00, indevidamente descontados do benefício da parte autora, bem como ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00. No entanto, a pretensão da parte autora não merece ser acolhida, uma vez que a parte requerida comprovou por meio do contrato nº 97-820368239/16, juntado no id 143766893, a contratação do cartão de crédito consignado no dia 14/09/2016 no qual consta expressamente que se trata de “Proposta de Adesão – Cartão de Crédito Consignado”. Assim, em que pese as alegações da parte autora, no contrato há expressa menção acerca da espécie do contrato, qual seja, contratação de saque mediante a utilização do cartão de crédito consignado, restando claro que a parte requerida observou o dever de informação, conforme o disposto no art. 6º, III, e no art. 52 do Código de Defesa do Consumidor. Além disso, conforme acima já consignado esta modalidade de empréstimo possui regramento próprio, onde a liberação dos saques, ou seja, dos valores emprestados, não está condicionada a utilização do cartão de plástico pelo contratante, visto que para tanto, basta a disponibilidade de margem consignável pelo órgão empregatício e a autorização para a instituição financeira. Também não foi demonstrado qualquer vício de consentimento no momento da celebração do negócio jurídico ou situação de vulnerabilidade excepcional que comprometa a validade do contrato. Portanto, não restando demonstrada a baixa instrução e nem a dificuldade de compreensão pela parte autora, inexistindo qualquer vício de consentimento e falha no dever de informação, o pedido de nulidade do contrato, bem como o de conversão da modalidade cartão de crédito consignado para empréstimo pessoal consignado, devem ser julgados improcedentes, pois, inexistente qualquer ilegalidade. Nesse sentido, é o entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso nos julgados ora colacionados: (...) Por fim, com relação ao pedido de condenação por danos morais, inexistindo ilicitude, nem verificada a má-fé da parte requerida na contratação, não há que se falar em indenização por danos morais, pois, inexistente lesão aos direitos extrapatrimoniais da parte autora. (...) Ante o exposto, julgo improcedentes os pedidos formulados na inicial. A título de sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, com fundamento no art. 85, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil, ficando esta condenação com a exigibilidade suspensa, em razão da concessão da gratuidade de justiça (id 140974889). Por fim, julgo extinto o processo, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil.” Inconformado com a decisão, EUTEMISTO NUNES DE ALMEIDA interpôs Recurso de Apelação requerendo a integral reforma da sentença e a procedência de seus pedidos. Pois bem. Extrai-se dos autos que a controvérsia cinge-se, essencialmente, à verificação da existência de consentimento válido do Autor/Apelante para a contratação de cartão de crédito consignado com reserva de margem consignável (RMC), bem como seus consectários quanto à anulação contratual, devolução de valores e indenização por danos morais. Antecedendo ao exame de mérito propriamente dito, destaco que a relação jurídica estabelecida entre as partes se caracteriza como de consumo, submetendo-se aos ditames do Código de Defesa do Consumidor, nos termos do enunciado da Súmula n. 297 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. No caso em tela, é imperioso reconhecer a condição de hipervulnerabilidade do Apelante EUTEMISTO NUNES DE ALMEIDA, pessoa idosa com 79 anos de idade, que percebe mensalmente benefício previdenciário de R$ 1.320,00 (Cf. IDs. 297653898 e 297654851). Tal condição impõe às instituições financeiras dever de informação e transparência ainda mais rigoroso, em consonância com as disposições protetivas do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/2003). Conforme pacífica jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. A conferir: “PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. [...] Na hipótese, contudo, verifica-se que o consumidor é pessoa idosa, razão pela qual a imputação de responsabilidade há de ser feita sob as luzes do Estatuto do Idoso e da Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos, sempre considerando a sua peculiar situação de consumidor hipervulnerável. [...].” (STJ. REsp 1.995.458/SP. Relatora Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma. Julgamento: 09/08/2022, DJe: 18/08/2022; destaquei). Nesse contexto, mostra-se cabível a inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC, considerando a verossimilhança das alegações da consumidora, notadamente em razão de sua condição de hipossuficiência técnica e informacional, agravada por se tratar de pessoa idosa. Ressalto que a inversão do ônus da prova não significa a isenção do consumidor de comprovar minimamente os fatos constitutivos de seu direito, mas sim que, em havendo dúvida, a solução deve ser em seu favor, especialmente quando se trata da comprovação de fato negativo, qual seja, a não contratação de serviço de cartão de crédito. Nessa ordem de ideias, o cerne da questão deslocar-se-á para a averiguação se houve o consentimento válido da Parte Apelante para a contratação de cartão de crédito consignado com reserva de margem consignável, ou se esta contratou apenas empréstimo consignado, como sustenta. No caso dos autos, embora tenha sido juntado instrumento contratual, verifica-se a ausência de elementos probatórios fundamentais que deveriam acompanhar a demonstração da legitimidade da operação questionada. Primeiramente, constata-se que o Apelado não comprovou adequadamente a transferência dos valores alegadamente disponibilizados ao Apelante, sendo que a ausência do comprovante de TED (Transferência Eletrônica Disponível) constitui falha probatória significativa, impedindo a verificação da efetiva liberação dos recursos e do quantum transferido para a conta do consumidor. Tal prova se revela essencial para demonstrar que houve, de fato, a contrapartida da instituição financeira na relação contratual, ou seja, a efetiva disponibilização dos valores que justificariam os descontos posteriores. Ademais, verifica-se a ausência do Termo de Consentimento Esclarecido (TCE), documento obrigatório para contratações de cartão de crédito consignado, conforme estabelece o art. 21-A da Instrução Normativa INSS n. 28/2008, in verbis: “Art. 21-A Sem prejuízo das informações do art. 21, nas autorizações de descontos decorrentes da celebração de contratos de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável, o contrato firmado entre o beneficiário do INSS e a instituição consignatária deverá, obrigatoriamente, nos termos da decisão homologatória de acordo firmado na Ação Civil Pública nº 0106890-28.2015.4.01.3700, ser acompanhado de Termo de Consentimento Esclarecido – TCE, que constará de página única, reservada exclusivamente para tal documento, constituindo-se instrumento apartado de outros que formalizem a contratação do Cartão de Crédito Consignado, e conterá, necessariamente: (...)”. Em verdade, o Termo de Consentimento Esclarecido (TCE) documento constitui requisito essencial para validar o contrato, devendo constar em página única, reservada exclusivamente para tal finalidade, constituindo-se instrumento apartado de outros que formalizem a contratação, de modo que a ausência deste termo compromete fundamentalmente a higidez da contratação, uma vez que sua finalidade específica é assegurar que o consumidor tenha plena ciência das características e consequências do produto contratado. Outrossim, a análise detida dos autos revela que, embora exista contrato assinado pela Parte Apelante, não há evidência clara de que esta foi devidamente informada sobre a natureza jurídica da contratação realizada, especialmente quanto à distinção entre empréstimo consignado e cartão de crédito consignado com RMC. Para além disso, verifica-se dos autos que não há comprovação da efetiva utilização do cartão de crédito pelo consumidor para compras em estabelecimentos comerciais, tendo ocorrido apenas operações de saque, o que corrobora a tese de que o Apelante acreditava estar contratando empréstimo consignado tradicional. Conforme já decidiu este Tribunal de Justiça: “DIREITO DO CONSUMIDOR - APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO (RMC) – VÍCIO DE CONSENTIMENTO - ONEROSIDADE EXCESSIVA – AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA INFORMAÇÃO E TRANSPARÊNCIA - CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – REPETIÇÃO DO INDÉBITO NA FORMA SIMPLES – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. [...] III. Razões de decidir Configura-se prática abusiva o contrato de cartão de crédito consignado quando o consumidor acredita tratar-se de empréstimo consignado, evidenciado pelo crédito via TED e ausência de uso do cartão, violando os princípios da boa-fé e transparência (CDC, art. 6º, III). Reconhecida a necessidade de conversão da operação em contrato de empréstimo consignado, aplicando-se a taxa média de juros de mercado, nos termos do art. 170 do CC. Não se verifica dano moral indenizável, considerando que o transtorno gerado não excede o mero aborrecimento, à míngua de negativação ou exposição vexatória. [...].” (TJ/MT. RAC 1022486-50.2023.8.11.0041. Relator Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, Terceira Câmara de Direito Privado. Julgamento: 27/11/2024, DJe: 29/11/2024; g. n.). É fato relevante que o Apelante nunca utilizou o cartão de crédito para efetuar compras, circunstância que reforça a alegação de que sua verdadeira intenção era contratar empréstimo consignado, não sendo coerente que uma pessoa solicitasse cartão de crédito e durante anos não o utilizasse para sua finalidade precípua. A jurisprudência tem reconhecido que a prática de vincular empréstimos consignados a cartões de crédito, sem a expressa e inequívoca ciência do consumidor, configura conduta abusiva por parte das instituições financeiras, especialmente quando evidenciada pela ausência de uso efetivo do cartão como meio de pagamento. Nesse sentido: “APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE CANCELAMENTO DE CONTRATO C/C DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA, RESTITUIÇÃO EM DOBRO E CONDENAÇÃO EM DANOS MORAIS - CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO - ERRO SUBSTANCIAL QUANTO À NATUREZA DO CONTRATO - CONFIGURAÇÃO - IRDR TEMA 73 - NULIDADE DO CONTRATO - DANO MORAL - DEVIDO - "QUANTUM" INDENIZATÓRIO. I- Nos termos do art. 171, II, do Código Civil, além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico por vício resultante de "erro substancial", caracterizado como um vício no ato de vontade do emissor da declaração constante do negócio jurídico. II- Conforme restou pacificado por este E . Tribunal de Justiça no julgamento do IRDR Tema 73, deve ser considerado configurado o "erro substancial" na contratação de "cartão de crédito consignado" quando a Instituição Financeira oculta as reais características mais onerosas do negócio, deixando de informar, clara e expressamente, sobre a existência de valor remanescente a ser pago à parte pela contratante através de fatura, induzindo o consumidor a pensar que está contratando empréstimo consignado usualmente conhecido, sobretudo quando o consumidor sequer fez uso efetivo do cartão de crédito como tal, mas apenas da função "saque", e o crédito contratado foi disponibilizado ao consumidor por meio da transferência do crédito para sua conta bancária - e não como "saque". III- Nesses casos de erro substancial, "fica evidenciado o dano moral, pois tal atitude atingiu a honra e a integridade psicológica do consumidor, que se viu profundamente desrespeitado e enganado pela instituição financeira, o que é causa de extrema angústia e apreensão" (TJMG - IRDR Tema 73).” (TJ/MG. RAC 50017479720238130407. Relator Des. João Cancio, 18ª Câmara Cível. Julgamento: 14/05/2024, DJe: 14/05/2024; g. n.). Diante da constatação de vícios na formação do consentimento do Apelante, das irregularidades documentais identificadas e da violação aos deveres de informação e transparência, impõe-se a declaração de nulidade do contrato de cartão de crédito consignado, com a consequente cessação dos descontos no benefício previdenciário. Considerando que houve longos descontos no benefício do Apelante (308 parcelas de R$ 44,00, totalizando R$ 13.552,00) e a ausência de comprovação da efetiva transferência de valores correspondentes, bem como os vícios contratuais identificados, deve-se proceder à restituição integral dos valores descontados, devidamente corrigidos, os quais deverão ser apurados em liquidação de sentença. Inobstante, a restituição deverá se dar de forma simples, considerando que, embora tenha havido falha na prestação do serviço e vícios contratuais, não restou demonstrada conduta dolosa específica que justifique a aplicação da repetição em dobro prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC. No que tange ao pedido de indenização por danos morais, entendo que a conduta da instituição financeira ultrapassa os limites do mero aborrecimento, configurando dano moral indenizável, especialmente considerando sua condição de vulnerabilidade acentuada em razão da idade avançada e limitação financeira. Isso porque, o Apelante, pessoa idosa de 79 anos, percebedor de benefício previdenciário de valor limitado (um salário mínimo), viu-se envolvido em contratação viciada que perdurou por anos, com descontos sucessivos em sua verba de natureza alimentar, comprometendo significativamente sua subsistência, circunstâncias que configuram dano in re ipsa, dispensando prova específica do abalo moral. Assim sendo, considerando os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, a condição socioeconômica das partes, a gravidade da ofensa, o tempo de duração dos descontos e a extensão do dano causado, compreendo que o quantum indenizatório deve ser fixado em R$ 10.000,00 (dez mil reais), montante adequado para compensar o dano sofrido e atender à finalidade pedagógica da condenação. Por todo o exposto, conheço e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao Recurso de Apelação de EUTEMISTO NUNES DE ALMEIDA para: 1) Declarar a nulidade do contrato de cartão de crédito consignado nº 97-820368239/16, por vícios de consentimento e irregularidades contratuais; 2) Determinar a cessação imediata dos descontos no benefício previdenciário do Apelante referentes ao mencionado contrato; 3) Condenar o Apelado à restituição integral dos valores descontados do benefício do Apelante, na forma simples, acrescidos de correção monetária pela variação do INPC desde a data de cada desconto e juros de mora de 1% ao mês desde a citação; 4) Condenar o Apelado ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), corrigidos monetariamente pela variação do INPC desde a data deste julgamento (Súmula 362 do STJ) e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês desde a citação (art. 405 do CC), sendo que, a partir de 30/08/2024, com a entrada em vigor da Lei n. 14.905/2024, deve incidir exclusivamente a taxa SELIC, sem cumulação com outros índices; 5) Determinar ao Apelado que proceda à exclusão definitiva da reserva de margem consignável (RMC) vinculada ao benefício previdenciário do Apelante, no prazo de 10 (dez) dias, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais), limitada a R$ 1.000,00 (mil reais). Por corolário lógico, considerando a reforma da sentença e o êxito da Autora/Apelante na maior parte de suas pretensões, inverto o ônus sucumbencial e condeno a Parte Requerida/Apelada integralmente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios outrora fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do parágrafo único do art. 86 do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 22/07/2025

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Processo nº 1000997-75.2024.8.11.0055

ID: 334978074

Tribunal: TJMT Órgão: Quinta Câmara de Direito Privado Classe: APELAçãO CíVEL Nº Processo: 1000997-75.2024.8.11.0055

Data de Disponibilização: 25/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

BANCO BNP PARIBAS BRASIL S.A.

Acórdão

Advogados:

BREINER RICARDO DINIZ RESENDE MACHADO

OAB/MG XXXXXX Desbloquear

ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000997-75.2024.8.11.0055 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Indenização por Dano Moral, I… ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO Número Único: 1000997-75.2024.8.11.0055 Classe: APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Cartão de Crédito, Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material] Relator: Des(a). MARCOS REGENOLD FERNANDES Turma Julgadora: [DES(A). MARCOS REGENOLD FERNANDES, DES(A). LUIZ OCTAVIO OLIVEIRA SABOIA RIBEIRO, DES(A). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA] Parte(s): [EUTEMISTO NUNES DE ALMEIDA - CPF: 471.765.047-68 (APELANTE), LUCIANO HENRIQUE SOARES DE OLIVEIRA AIRES - CPF: 004.183.641-33 (ADVOGADO), GEORGE HIDASI FILHO - CPF: 021.887.111-22 (ADVOGADO), BANCO CETELEM S/A - CNPJ: 00.558.456/0001-71 (APELADO), BANCO BNP PARIBAS BRASIL S.A. - CNPJ: 01.522.368/0001-82 (APELADO), BREINER RICARDO DINIZ RESENDE MACHADO - CPF: 037.193.746-96 (ADVOGADO), BANCO CETELEM S/A - CNPJ: 00.558.456/0001-71 (TERCEIRO INTERESSADO)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUINTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). SEBASTIAO DE ARRUDA ALMEIDA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, PROVEU PARCIALMENTE O RECURSO. E M E N T A DIREITO DO CONSUMIDOR E BANCÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. CARTÃO DE CRÉDITO CONSINGADO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. IDOSO HIPERVULNERÁVEL. AUSÊNCIA DE TERMO DE CONSENTIMENTO ESCLARECIDO E COMPROVANTE DE TED. VÍCIO DE CONSENTIMENTO. NULIDADE CONTRATUAL. RESTITUIÇÃO SIMPLES DOS DESCONTOS. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. Caso em exame 1. Apelação cível interposta por EUTEMISTO NUNES DE ALMEIDA contra sentença da 3ª Vara Cível de Tangará da Serra/MT que, em ação declaratória de nulidade de contrato de cartão de crédito consignado com RMC cumulada com restituição de valores e danos morais ajuizada em face do BANCO CETELEM S.A. (incorporado pelo BANCO BNP PARIBAS BRASIL S.A.), julgou improcedentes todos os pedidos. II. Questão em discussão 2. Há três questões em discussão: (i) definir se houve consentimento válido para a contratação do cartão de crédito consignado com RMC; (ii) estabelecer as consequências jurídicas da nulidade quanto à restituição dos valores descontados; (iii) determinar a existência de dano moral indenizável. III. Razões de decidir 3. Incide o Código de Defesa do Consumidor (Súm. 297/STJ); a condição de idoso torna o consumidor hipervulnerável, impondo dever de informação reforçado (Estatuto do Idoso). 4. Opera-se a inversão do ônus da prova (CDC, art. 6º, VIII); compete ao banco comprovar a regularidade da contratação. 5. O banco não comprova a efetiva disponibilização dos valores mediante TED, falhando na demonstração da contrapartida financeira indispensável à validade do negócio. 6. A ausência do Termo de Consentimento Esclarecido – TCE (IN INSS 28/2008, art. 21-A) viola deveres de informação e transparência, tornando inválido o consentimento. 7. A inexistência de utilização do cartão para compras e a realização exclusiva de saques evidenciam erro substancial do consumidor quanto à natureza do negócio, configurando vício de consentimento (CC, art. 171, II). 8. A prática é abusiva, violando os princípios da transparência e boa-fé (CDC, art. 6º, III), impondo a nulidade do contrato e a cessação dos descontos. 9. A restituição deve ser simples, porque não demonstrado dolo específico que autorize a devolução em dobro (CDC, art. 42, par. ún.). 10. Os descontos prolongados sobre verba alimentar de idoso configuram dano moral in re ipsa, fixado em R$ 10.000,00, corrigidos pelo INPC e acrescidos de juros moratórios (CC, art. 405; Súm. 362/STJ; Lei 14.905/2024). IV. Dispositivo e tese 11. Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: 1. A ausência do Termo de Consentimento Esclarecido e de comprovante de transferência dos valores descaracteriza o consentimento válido do consumidor idoso em contrato de cartão de crédito consignado com RMC. 2. Verificado o vício de consentimento, o contrato é nulo, cessam-se os descontos e impõe-se a restituição simples dos valores descontados, corrigidos e acrescidos de juros. 3. Descontos reiterados sobre benefício previdenciário de pessoa idosa configuram dano moral presumido, passível de indenização. Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, III e VIII, e 42, par. ún.; Estatuto do Idoso (Lei 10.741/2003); IN INSS 28/2008, art. 21-A; CC, art. 405; CPC, art. 86; Súmulas 297 e 362/STJ; Lei 14.905/2024. Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1.995.458/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, 09.08.2022; TJ/MT, RAC 1022486-50.2023.8.11.0041, Rel. Des. Carlos Alberto A. da Rocha, 27.11.2024; TJ/MG, RAC 5001747-97.2023.8.13.0407, Rel. Des. João Cancio, 14.05.2024. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES Egrégia Câmara: Trata-se de Recurso de Apelação interposto por EUTEMISTO NUNES DE ALMEIDA contra a sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Tangará da Serra/MT, Dr. Anderson Gomes Junqueira, nos autos da Ação Declaratória de Nulidade de Contrato de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável (RMC) e Inexistência de Débito cumulada com Restituição de Valores em Dobro e Indenização por Dano Moral ajuizada contra BANCO CETELEM S.A. (incorporado por BANCO BNP PARIBAS BRASIL S.A.), que julgou improcedentes todos os pedidos formulados na inicial (vide ID. 297654892). Em suas razões de ID. 297654894, o Autor/Apelante reitera os argumentos da inicial, sustentando que o contrato é nulo por não ter observado as formalidades legais exigidas para contratação com pessoa analfabeta, ausência do Termo de Consentimento Esclarecido, divergência entre o contrato juntado e o efetivamente discutido, e falta de comprovação da transferência dos valores via TED. Pugna pela reforma da sentença para que sejam julgados procedentes os pedidos de nulidade contratual, cessação dos descontos, restituição dos valores em dobro e condenação em danos morais. Recurso tempestivo (ID. 297654895) e dispensado do preparado (ID. 298880375). Intimado, o Apelado deixou transcorrer in albis o prazo para apresentação de contrarrazões. É o relatório. Inclua-se em pauta de julgamento. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. MARCOS REGENOLD FERNANDES (RELATOR) Colenda Câmara: Presentes os requisitos de admissibilidade recursal, conheço do recurso e adentro no seu mérito. Ressai dos autos que EUTEMISTO NUNES DE ALMEIDA, pessoa idosa (79 anos) e aposentado, alegou que procurou a instituição financeira requerida para contratar empréstimo consignado, mas descobriu posteriormente ter sido contratado cartão de crédito consignado com reserva de margem consignável (RMC) n. 97-820368239/16, com descontos mensais de R$ 44,00 que perduraram por extenso período, totalizando 308 parcelas e perfazendo o montante de R$ 13.552,00. Sustentou que nunca teve a intenção de contratar cartão de crédito e que foi induzido a erro pela requerida, sendo pessoa hipervulnerável, e que sua renda mensal de R$ 1.320,00 (um salário mínimo) restou significativamente comprometida por descontos sem prazo definido para término. Assim, requereu a anulação do contrato, a suspensão dos descontos, a restituição em dobro dos valores descontados, além de indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00. Em sede de contestação, o BANCO CETELEM S.A. (incorporado pelo Grupo BNP PARIBAS S.A.), suscitou prejudiciais de mérito de prescrição e decadência e, no mérito, alegou a regularidade da contratação, juntando contrato e documentos correlatos (ID. 297654861). Após regular instrução processual, o Juízo a quo prolatou sentença, em que afastou as prejudiciais de mérito, mas julgou improcedentes, cujos termos peço licença para me reportar, em homenagem ao princípio da dialeticidade: “Vistos, Trata-se de ação declaratória de nulidade de contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC) e inexistência de débito cumulada com restituição de valores em dobro e indenização por dano moral ajuizada em 07 de fevereiro de 2024 por Eutemisto Nunes de Almeida em desfavor de Banco Cetelem S.A., ambos devidamente qualificados. Alegou a parte autora, em resumo, que é aposentado e que diante das dificuldades financeiras procurou a parte requerida a fim de adquirir um empréstimo consignado, tendo acreditado ter contratado referida modalidade. Seguiu narrando que ao analisar o extrato de pagamento do seu benefício, notou um desconto sob a rubrica de uma Reserva de Margem Consignável (RMC), cujo contrato foi autuado sob o nº 97-820368239/16, com parcelas mensais no valor de R$ 44,00 cada, sendo descontadas 07 parcelas, perfazendo o montante total de R$ 308,00. Relatou que entrou em contato com a parte requerida para obter informações, oportunidade em que foi informada que o contrato firmado foi de cartão de crédito consignado, diferente do que acreditava e queria ter contratado. Diante desses fatos, requereu a anulação do contrato de cartão de crédito consignado nº 97-820368239/16, com a suspensão de todos os descontos. Subsidiariamente pugnou pela conversão do empréstimo feito via cartão de crédito para a modalidade de empréstimo consignado comum, com a aplicação dos juros praticados para essa espécie de negociação na data da assinatura do contrato, além do abatimento valores já descontados. Requereu ainda a condenação da parte requerida a restituição em dobro do valor de R$ 616,00, indevidamente descontados do benefício da parte autora, bem como ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00. Requereu ainda a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, a inversão do ônus da prova e a concessão da gratuidade judiciária. No id 140974889 a inicial foi recebida, oportunidade em que foi concedida a gratuidade da justiça à parte autora, determinada a realização de audiência de conciliação, deferido o pedido de aplicação do CDC e indeferida a inversão do ônus da prova. No id 141239663 a parte requerida foi citada por meio eletrônico. No id 143766891 a parte requerida apresentou contestação requerendo, em preliminar, a retificação do polo passivo em virtude da incorporação do Banco Cetelem S/A pelo Banco BNP Paribas Brasil S/A. Alegou, ainda, em prejudicial de mérito a ocorrência da decadência e prescrição. No mérito, sustentou, em síntese, a regularidade da contratação, a ausência de falha na prestação do serviço e a inexistência de danos morais. Assim, requereu a improcedência da ação, com a manutenção da modalidade contratada e a rejeição dos pedidos de restituição de valores e pagamento de indenização por danos morais. No id 147647813 a parte requerida pugnou pela juntada dos TED’s dos saques complementares realizados pela parte autora. No id 147686620 a conciliação restou infrutífera. No id 157934470 a parte autora apresentou impugnação à contestação. Determinada a especificação das provas pelas partes, no id 166485846 a parte requerida requereu a designação de audiência de conciliação, enquanto que no id 167823193 a parte autora requereu a intimação da parte requerida para juntar aos autos o comprovante de entrega do cartão de crédito, bem como a produção de prova documental. No id 167823193 a parte requerida apresentou proposta de acordo. Intimada para se manifestar acerca da proposta de acordo, no id 182130171 a parte autora manifestou desinteresse na conciliação. É o relatório. D E C I D O. Analisando os autos, verifico que os elementos necessários à formação de minha convicção já se encontram coligidos ao feito, estando, então, a causa madura e apta para ser julgada, com fulcro no art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, conheço diretamente do pedido, proferindo sentença. Isso porque, não há razão para se instaurar a fase probatória para produção da prova documental postulada pela parte autora, consistente na juntada do comprovante de entrega do cartão de crédito, tendo em vista que a contratação de cartão de crédito com reserva de margem consignável possui regramento próprio, onde a liberação dos saques, ou seja, dos valores emprestados, não está condicionada a utilização do cartão de plástico pelo contratante, visto que para tanto, basta a disponibilidade de margem consignável pelo órgão empregatício e a autorização para a instituição financeira. Assim, pelas razões acima expostas e com fundamento no parágrafo único do art. 370 do Código de Processo Civil, indefiro o pedido de produção de prova postulada pela parte autora. Justificada a possibilidade de julgamento antecipado, passo a analisar o pedido de retificação do polo passivo. Analisando os autos, verifico que restou demonstrado pelo documento de id 143766894, a incorporação do Banco Cetelem pelo Banco BNP Peribas Brasil S/A. Diante disso e considerando que não houve impugnação pela parte autora, a medida que se impõe é a retificação do polo passivo, tendo em vista que o instituto da incorporação empresarial resulta na extinção da pessoa jurídica incorporada com a transmissão de todos os direitos e obrigações à incorporadora, consoante dispõe os arts. 1.116 e 1.118, ambos do Código Civil, in verbis: (...) Assim, defiro o pedido de retificação do polo passivo da ação, para constar Banco BNP Paribas Brasil S/A (CNPJ 01.522.368/0001-82), devendo ser providenciado as alterações necessárias junto ao distribuidor e capa dos autos. (...) Não havendo outras questões prejudiciais a ser decididas, passo a analisar o mérito da presente ação, expondo as razões de meu convencimento, conforme exigência esculpida no art. 93, inciso IX, da Constituição de 1988. A parte autora pretende a anulação do contrato nº 97-820368239/16, com a suspensão de todos os descontos. Subsidiariamente pugnou pela conversão do empréstimo feito via cartão de crédito para a modalidade de empréstimo consignado comum, com a aplicação dos juros praticados para essa espécie de negociação na data da assinatura do contrato, além do abatimento valores já descontados. Requereu ainda a condenação da parte requerida a restituição em dobro do valor de R$ 616,00, indevidamente descontados do benefício da parte autora, bem como ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 15.000,00. No entanto, a pretensão da parte autora não merece ser acolhida, uma vez que a parte requerida comprovou por meio do contrato nº 97-820368239/16, juntado no id 143766893, a contratação do cartão de crédito consignado no dia 14/09/2016 no qual consta expressamente que se trata de “Proposta de Adesão – Cartão de Crédito Consignado”. Assim, em que pese as alegações da parte autora, no contrato há expressa menção acerca da espécie do contrato, qual seja, contratação de saque mediante a utilização do cartão de crédito consignado, restando claro que a parte requerida observou o dever de informação, conforme o disposto no art. 6º, III, e no art. 52 do Código de Defesa do Consumidor. Além disso, conforme acima já consignado esta modalidade de empréstimo possui regramento próprio, onde a liberação dos saques, ou seja, dos valores emprestados, não está condicionada a utilização do cartão de plástico pelo contratante, visto que para tanto, basta a disponibilidade de margem consignável pelo órgão empregatício e a autorização para a instituição financeira. Também não foi demonstrado qualquer vício de consentimento no momento da celebração do negócio jurídico ou situação de vulnerabilidade excepcional que comprometa a validade do contrato. Portanto, não restando demonstrada a baixa instrução e nem a dificuldade de compreensão pela parte autora, inexistindo qualquer vício de consentimento e falha no dever de informação, o pedido de nulidade do contrato, bem como o de conversão da modalidade cartão de crédito consignado para empréstimo pessoal consignado, devem ser julgados improcedentes, pois, inexistente qualquer ilegalidade. Nesse sentido, é o entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso nos julgados ora colacionados: (...) Por fim, com relação ao pedido de condenação por danos morais, inexistindo ilicitude, nem verificada a má-fé da parte requerida na contratação, não há que se falar em indenização por danos morais, pois, inexistente lesão aos direitos extrapatrimoniais da parte autora. (...) Ante o exposto, julgo improcedentes os pedidos formulados na inicial. A título de sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento das custas e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, com fundamento no art. 85, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil, ficando esta condenação com a exigibilidade suspensa, em razão da concessão da gratuidade de justiça (id 140974889). Por fim, julgo extinto o processo, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil.” Inconformado com a decisão, EUTEMISTO NUNES DE ALMEIDA interpôs Recurso de Apelação requerendo a integral reforma da sentença e a procedência de seus pedidos. Pois bem. Extrai-se dos autos que a controvérsia cinge-se, essencialmente, à verificação da existência de consentimento válido do Autor/Apelante para a contratação de cartão de crédito consignado com reserva de margem consignável (RMC), bem como seus consectários quanto à anulação contratual, devolução de valores e indenização por danos morais. Antecedendo ao exame de mérito propriamente dito, destaco que a relação jurídica estabelecida entre as partes se caracteriza como de consumo, submetendo-se aos ditames do Código de Defesa do Consumidor, nos termos do enunciado da Súmula n. 297 do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. No caso em tela, é imperioso reconhecer a condição de hipervulnerabilidade do Apelante EUTEMISTO NUNES DE ALMEIDA, pessoa idosa com 79 anos de idade, que percebe mensalmente benefício previdenciário de R$ 1.320,00 (Cf. IDs. 297653898 e 297654851). Tal condição impõe às instituições financeiras dever de informação e transparência ainda mais rigoroso, em consonância com as disposições protetivas do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/2003). Conforme pacífica jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. A conferir: “PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. [...] Na hipótese, contudo, verifica-se que o consumidor é pessoa idosa, razão pela qual a imputação de responsabilidade há de ser feita sob as luzes do Estatuto do Idoso e da Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos, sempre considerando a sua peculiar situação de consumidor hipervulnerável. [...].” (STJ. REsp 1.995.458/SP. Relatora Min. Nancy Andrighi, Terceira Turma. Julgamento: 09/08/2022, DJe: 18/08/2022; destaquei). Nesse contexto, mostra-se cabível a inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC, considerando a verossimilhança das alegações da consumidora, notadamente em razão de sua condição de hipossuficiência técnica e informacional, agravada por se tratar de pessoa idosa. Ressalto que a inversão do ônus da prova não significa a isenção do consumidor de comprovar minimamente os fatos constitutivos de seu direito, mas sim que, em havendo dúvida, a solução deve ser em seu favor, especialmente quando se trata da comprovação de fato negativo, qual seja, a não contratação de serviço de cartão de crédito. Nessa ordem de ideias, o cerne da questão deslocar-se-á para a averiguação se houve o consentimento válido da Parte Apelante para a contratação de cartão de crédito consignado com reserva de margem consignável, ou se esta contratou apenas empréstimo consignado, como sustenta. No caso dos autos, embora tenha sido juntado instrumento contratual, verifica-se a ausência de elementos probatórios fundamentais que deveriam acompanhar a demonstração da legitimidade da operação questionada. Primeiramente, constata-se que o Apelado não comprovou adequadamente a transferência dos valores alegadamente disponibilizados ao Apelante, sendo que a ausência do comprovante de TED (Transferência Eletrônica Disponível) constitui falha probatória significativa, impedindo a verificação da efetiva liberação dos recursos e do quantum transferido para a conta do consumidor. Tal prova se revela essencial para demonstrar que houve, de fato, a contrapartida da instituição financeira na relação contratual, ou seja, a efetiva disponibilização dos valores que justificariam os descontos posteriores. Ademais, verifica-se a ausência do Termo de Consentimento Esclarecido (TCE), documento obrigatório para contratações de cartão de crédito consignado, conforme estabelece o art. 21-A da Instrução Normativa INSS n. 28/2008, in verbis: “Art. 21-A Sem prejuízo das informações do art. 21, nas autorizações de descontos decorrentes da celebração de contratos de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável, o contrato firmado entre o beneficiário do INSS e a instituição consignatária deverá, obrigatoriamente, nos termos da decisão homologatória de acordo firmado na Ação Civil Pública nº 0106890-28.2015.4.01.3700, ser acompanhado de Termo de Consentimento Esclarecido – TCE, que constará de página única, reservada exclusivamente para tal documento, constituindo-se instrumento apartado de outros que formalizem a contratação do Cartão de Crédito Consignado, e conterá, necessariamente: (...)”. Em verdade, o Termo de Consentimento Esclarecido (TCE) documento constitui requisito essencial para validar o contrato, devendo constar em página única, reservada exclusivamente para tal finalidade, constituindo-se instrumento apartado de outros que formalizem a contratação, de modo que a ausência deste termo compromete fundamentalmente a higidez da contratação, uma vez que sua finalidade específica é assegurar que o consumidor tenha plena ciência das características e consequências do produto contratado. Outrossim, a análise detida dos autos revela que, embora exista contrato assinado pela Parte Apelante, não há evidência clara de que esta foi devidamente informada sobre a natureza jurídica da contratação realizada, especialmente quanto à distinção entre empréstimo consignado e cartão de crédito consignado com RMC. Para além disso, verifica-se dos autos que não há comprovação da efetiva utilização do cartão de crédito pelo consumidor para compras em estabelecimentos comerciais, tendo ocorrido apenas operações de saque, o que corrobora a tese de que o Apelante acreditava estar contratando empréstimo consignado tradicional. Conforme já decidiu este Tribunal de Justiça: “DIREITO DO CONSUMIDOR - APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C NULIDADE CONTRATUAL, RESTITUIÇÃO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO (RMC) – VÍCIO DE CONSENTIMENTO - ONEROSIDADE EXCESSIVA – AFRONTA AOS PRINCÍPIOS DA INFORMAÇÃO E TRANSPARÊNCIA - CONVERSÃO PARA EMPRÉSTIMO CONSIGNADO – REPETIÇÃO DO INDÉBITO NA FORMA SIMPLES – DANO MORAL NÃO CONFIGURADO – SENTENÇA REFORMADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. [...] III. Razões de decidir Configura-se prática abusiva o contrato de cartão de crédito consignado quando o consumidor acredita tratar-se de empréstimo consignado, evidenciado pelo crédito via TED e ausência de uso do cartão, violando os princípios da boa-fé e transparência (CDC, art. 6º, III). Reconhecida a necessidade de conversão da operação em contrato de empréstimo consignado, aplicando-se a taxa média de juros de mercado, nos termos do art. 170 do CC. Não se verifica dano moral indenizável, considerando que o transtorno gerado não excede o mero aborrecimento, à míngua de negativação ou exposição vexatória. [...].” (TJ/MT. RAC 1022486-50.2023.8.11.0041. Relator Des. Carlos Alberto Alves da Rocha, Terceira Câmara de Direito Privado. Julgamento: 27/11/2024, DJe: 29/11/2024; g. n.). É fato relevante que o Apelante nunca utilizou o cartão de crédito para efetuar compras, circunstância que reforça a alegação de que sua verdadeira intenção era contratar empréstimo consignado, não sendo coerente que uma pessoa solicitasse cartão de crédito e durante anos não o utilizasse para sua finalidade precípua. A jurisprudência tem reconhecido que a prática de vincular empréstimos consignados a cartões de crédito, sem a expressa e inequívoca ciência do consumidor, configura conduta abusiva por parte das instituições financeiras, especialmente quando evidenciada pela ausência de uso efetivo do cartão como meio de pagamento. Nesse sentido: “APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE CANCELAMENTO DE CONTRATO C/C DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA, RESTITUIÇÃO EM DOBRO E CONDENAÇÃO EM DANOS MORAIS - CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO - ERRO SUBSTANCIAL QUANTO À NATUREZA DO CONTRATO - CONFIGURAÇÃO - IRDR TEMA 73 - NULIDADE DO CONTRATO - DANO MORAL - DEVIDO - "QUANTUM" INDENIZATÓRIO. I- Nos termos do art. 171, II, do Código Civil, além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico por vício resultante de "erro substancial", caracterizado como um vício no ato de vontade do emissor da declaração constante do negócio jurídico. II- Conforme restou pacificado por este E . Tribunal de Justiça no julgamento do IRDR Tema 73, deve ser considerado configurado o "erro substancial" na contratação de "cartão de crédito consignado" quando a Instituição Financeira oculta as reais características mais onerosas do negócio, deixando de informar, clara e expressamente, sobre a existência de valor remanescente a ser pago à parte pela contratante através de fatura, induzindo o consumidor a pensar que está contratando empréstimo consignado usualmente conhecido, sobretudo quando o consumidor sequer fez uso efetivo do cartão de crédito como tal, mas apenas da função "saque", e o crédito contratado foi disponibilizado ao consumidor por meio da transferência do crédito para sua conta bancária - e não como "saque". III- Nesses casos de erro substancial, "fica evidenciado o dano moral, pois tal atitude atingiu a honra e a integridade psicológica do consumidor, que se viu profundamente desrespeitado e enganado pela instituição financeira, o que é causa de extrema angústia e apreensão" (TJMG - IRDR Tema 73).” (TJ/MG. RAC 50017479720238130407. Relator Des. João Cancio, 18ª Câmara Cível. Julgamento: 14/05/2024, DJe: 14/05/2024; g. n.). Diante da constatação de vícios na formação do consentimento do Apelante, das irregularidades documentais identificadas e da violação aos deveres de informação e transparência, impõe-se a declaração de nulidade do contrato de cartão de crédito consignado, com a consequente cessação dos descontos no benefício previdenciário. Considerando que houve longos descontos no benefício do Apelante (308 parcelas de R$ 44,00, totalizando R$ 13.552,00) e a ausência de comprovação da efetiva transferência de valores correspondentes, bem como os vícios contratuais identificados, deve-se proceder à restituição integral dos valores descontados, devidamente corrigidos, os quais deverão ser apurados em liquidação de sentença. Inobstante, a restituição deverá se dar de forma simples, considerando que, embora tenha havido falha na prestação do serviço e vícios contratuais, não restou demonstrada conduta dolosa específica que justifique a aplicação da repetição em dobro prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC. No que tange ao pedido de indenização por danos morais, entendo que a conduta da instituição financeira ultrapassa os limites do mero aborrecimento, configurando dano moral indenizável, especialmente considerando sua condição de vulnerabilidade acentuada em razão da idade avançada e limitação financeira. Isso porque, o Apelante, pessoa idosa de 79 anos, percebedor de benefício previdenciário de valor limitado (um salário mínimo), viu-se envolvido em contratação viciada que perdurou por anos, com descontos sucessivos em sua verba de natureza alimentar, comprometendo significativamente sua subsistência, circunstâncias que configuram dano in re ipsa, dispensando prova específica do abalo moral. Assim sendo, considerando os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, a condição socioeconômica das partes, a gravidade da ofensa, o tempo de duração dos descontos e a extensão do dano causado, compreendo que o quantum indenizatório deve ser fixado em R$ 10.000,00 (dez mil reais), montante adequado para compensar o dano sofrido e atender à finalidade pedagógica da condenação. Por todo o exposto, conheço e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao Recurso de Apelação de EUTEMISTO NUNES DE ALMEIDA para: 1) Declarar a nulidade do contrato de cartão de crédito consignado nº 97-820368239/16, por vícios de consentimento e irregularidades contratuais; 2) Determinar a cessação imediata dos descontos no benefício previdenciário do Apelante referentes ao mencionado contrato; 3) Condenar o Apelado à restituição integral dos valores descontados do benefício do Apelante, na forma simples, acrescidos de correção monetária pela variação do INPC desde a data de cada desconto e juros de mora de 1% ao mês desde a citação; 4) Condenar o Apelado ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), corrigidos monetariamente pela variação do INPC desde a data deste julgamento (Súmula 362 do STJ) e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês desde a citação (art. 405 do CC), sendo que, a partir de 30/08/2024, com a entrada em vigor da Lei n. 14.905/2024, deve incidir exclusivamente a taxa SELIC, sem cumulação com outros índices; 5) Determinar ao Apelado que proceda à exclusão definitiva da reserva de margem consignável (RMC) vinculada ao benefício previdenciário do Apelante, no prazo de 10 (dez) dias, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais), limitada a R$ 1.000,00 (mil reais). Por corolário lógico, considerando a reforma da sentença e o êxito da Autora/Apelante na maior parte de suas pretensões, inverto o ônus sucumbencial e condeno a Parte Requerida/Apelada integralmente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios outrora fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do parágrafo único do art. 86 do CPC. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 22/07/2025

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Catia Adriana Oliviecki e outros x Catia Adriana Oliviecki e outros

ID: 261495640

Tribunal: TRT4 Órgão: OJ de Análise de Recurso Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0020136-36.2021.5.04.0522

Data de Disponibilização: 28/04/2025

Polo Ativo:

CATIA ADRIANA OLIVIECKI ITAU UNIBANCO S.A.

Polo Passivo:

CATIA ADRIANA OLIVIECKI ITAU UNIBANCO S.A.

Notificação

Advogados:

MANOEL ANTONIO GOMES

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MARISSOL JESUS FILLA

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MARCOS HUGO DELLA LATTA

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LUIS ALBERTO ESPOSITO

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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relatora: ANGELA ROSI ALMEIDA CHAPPER 0020136-36.2021.5.04.0522 : CATIA ADRIANA OLIVIE… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relatora: ANGELA ROSI ALMEIDA CHAPPER 0020136-36.2021.5.04.0522 : CATIA ADRIANA OLIVIECKI E OUTROS (1) : CATIA ADRIANA OLIVIECKI E OUTROS (1) INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Decisão ID 26c94dc proferida nos autos. RECURSO DE REVISTA ROT-0020136-36.2021.5.04.0522 - OJC Análise de Recursos Recorrente(s): CATIA ADRIANA OLIVIECKI Advogado(a)(s): MARCOS HUGO DELLA LATTA (RS - 31698) LUIS ALBERTO ESPOSITO (RS - 27122) MANOEL ANTONIO GOMES (RS - 36492) Recorrido(a)(s): ITAU UNIBANCO S.A. Advogado(a)(s): MARISSOL JESUS FILLA (PR - 17245) PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS Superada a apreciação dos pressupostos extrínsecos, passo à análise do recurso. PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO / Atos Processuais / Nulidade / Negativa de Prestação Jurisdicional. O trecho do acórdão principal transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: A mera divulgação de desempenho da agência (ID 03be1d5) não caracteriza, por si só, dano moral. A parte autora opôs embargos de declaração, conforme trecho transcrito: Os e-mails dos IDs. ab5c2b4e 03be1d5 comprovam a indevida exposição da reclamante em ranking de produção. No tocante a exposição do empregado em ranking de produção, tal conduta é conduta vedada nas Convenções Coletivas de Trabalho 2014/2015 do ID. 3f5081b; 2015/2016 (ID. ee9eee4, ad162d6); 2016/2018 (ID. f13977e, 5bd4986, 1c3f70c); 2018/2020 (ID. e411ba5, 0b7b0b3);2020/2022 (ID. 7d1b77e), conforme se infere na seguinte cláusula normativa: CLÁUSULA 39 - MONITORAMENTO DE RESULTADOS No monitoramento de resultados, os bancos não exporão, publicamente, o ranking individual de seus empregados. Parágrafo primeiro - É vedada, ao gestor, a cobrança de cumprimento de resultados por mensagens, no telefone particular do empregado. Parágrafo segundo - Em caso de eventual dúvida quanto ao fiel cumprimento de regras referentes à presente cláusula, as partes estabelecem que a judicialização seja precedida, obrigatoriamente, de negociação coletiva. E nesse sentido, a primeira testemunha da autora, Ana Helena Giotto de Andrade, relata: "que havia uma ranqueamento regional por pessoa; que esse ranking era divulgado por e-mail, para o quadro de funcionários e nas reuniões eram expostos em projeções". A segunda testemunha da reclamante, Francieli Gollo Casal,também refere: "que recebiam um ranking classificando por cores o desempenho de cada um" Por outro lado,éfato notório que o banco é reincidente na prática dessesatos danosos(art. 374, I, do CPC). Portanto, não se trata apenas da exposição de dados de desempenho da agência, mas do próprio trabalhador, o que é vedado pela norma coletiva, e este argumento não foi analisado no acórdão". O trecho do acórdão dos embargos de declaração é o seguinte: No caso, pelos próprios termos dos embargos de declaração opostos, a pretensão da embargante revela apenas sua inconformidade com o mérito da ação, pretendendo o reexame da prova ou rediscussão do direito, o que não é cabível pela via dos embargos de declaração, devendo a reclamante valer-se do recurso próprio para tanto. Admito, em parte, o recurso de revista no item. Alega a parte recorrente nulidade por negativa de prestação jurisdicional, em relação aos seguintes tópicos: horas extras e compensação com a gratificação de função; participação nos lucros e resultados e parcela adicional; agir mensal e reflexos em 13º salário; danos morais; e interrupção da prescrição. Em relação às horas extras com compensação da gratificação de função, à participação nos lucros e resultados - parcela adicional, à parcela agir mensal com reflexos em 13º salário e à interrupção da prescrição, observo, da leitura do acórdão, que a Turma trouxe fundamentação clara e suficiente ao deslinde da controvérsia, não havendo falar em nulidade do julgado por negativa de prestação jurisdicional. Desta forma, não verifico afronta ao art. 93, inciso IX, da Constituição Federal, art. 489 do CPC e art. 832 da CLT. Em relação à arguição de nulidade do julgado por negativa de prestação jurisdicional, no tópico pertinente ao pedido de indenização por danos morais, admito o recurso, por possível violação ao disposto no artigo 93, IX, da Constituição Federal, com fulcro na alínea "c" do artigo 896 da CLT, diante da possibilidade de não ter sido enfrentada as alegações da recorrente, no sentido de que havia exposição da reclamante em razão da divulgação, por e-mails, de ranking de produção. Prescrição e Decadência no Direito do Trabalho / Prescrição / Interrupção. O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: No caso, o julgador da origem deixou de acolher o protesto interruptivo da prescrição de nº 0021737-12.2017.5.04.0007, por não ter a reclamante o referido na inicial ou no primeiro aditamento (ID 8b04742 e ID c4d7139), somente o fazendo após efetivada a citação e apresentada defesa pelo reclamado, nos seguintes termos: "No caso dos autos, a inicial foi aditada após a notificação da reclamada e sem o seu consentimento, conforme manifestação juntada no ID. 9fdb91e, razão pela qual a emenda não deve ser admitida.Ademais, não há pedido de interrupção da prescrição na petição inicial, o que significa que o acolhimento da pretensão implicaria julgamento extrapetita (art. 492 do CPC) e violaria os princípios do contraditório e ampla defesa. (...) Ressalto que sequer há como entender que tal documento e pleito teria ocorrido em réplica a pedido defensivo de pronúncia da prescrição, pois foi juntado e referido pela reclamante somente em 29/08/2022 (ID 7e107a2 e ID 308c582), após a manifestação sobre defesa e documentos apresentada em 21/05/2021, oportunidade em que se limitou a alegar a inexistência de prescrição a ser pronunciada (ID f01fc45, fl. 2082 do PDF). A emenda da inicial somente pode ser efetuada até a apresentação de defesa para parte reclamada, dependendo depois disso do consentimento da parte contrária, o que não ocorreu no caso, visto que o reclamado impugnou expressamente o aditamento extemporâneo (ID 9fdb91e). É certo que a prescrição, cujo prazo está previsto em lei, é questão que pode ser invocada a qualquer tempo; mas seu elastecimento, por interposição de protesto antipreclusivo, demanda o exame acerca da validade do instrumento e discussão acerca da legitimidade da parte que o interpõe. Assim, ainda que tenha o reclamado acostado documentação que abarca o período prescricional elastecido pelo protesto interruptivo da prescrição de nº 0021737-12.2017.5.04.0007, houve prejuízo do contraditório e ampla defesa por ter sido impedida de apresentar defesa acerca do cabimento e validade do referido protesto. Assim, correta a sentença que não acolhe o protesto interruptivo da prescrição invocado em extemporâneo aditamento da inicial e sem concordância da parte adversa, tendo pronunciado a prescrição quinquenal quanto aos créditos vencidos até 05/04/2016, pois ajuizada a presente ação em 05/04/2021. A parte autora opôs embargos de declaração, expondo: No caso, o requerimento formulado pela autora no ID. 7e107a2 -Pág. 1/3 não é de aditamento da inicial, e o Juízoprimevo determinou a intimação do reclamado para que se manifestasse sobre o mesmo (ID. 813fb1d), o que ocorreu com a petição protocolada no ID. 9fdb91e, e com a juntada dos documentos mencionados no acórdão, comprovando não ter havido qualquer prejuízoà defesa. Não bastasse isso, o reclamado foi parte na ação de protesto e, portanto, tinha plena ciência da interrupção da prescrição". O acórdão de embargos consignou: No caso, pelos próprios termos dos embargos de declaração opostos, a pretensão da embargante revela apenas sua inconformidade com o mérito da ação, pretendendo o reexame da prova ou rediscussão do direito, o que não é cabível pela via dos embargos de declaração, devendo a reclamante valer-se do recurso próprio para tanto. Admito o recurso de revista no item. Entendo demonstrada a divergência jurisprudencial pelo aresto oriundo da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais: "ARGUIÇÃO DE PRESCRIÇÃO NA INSTÂNCIA ORDINÁRIA -JUNTADA DE DOCUMENTOS PARA COMPROVÁ-LA EM GRAU RECURSAL -SÚMULAS Nos 8 E 153 DO TST. O autor tem o direito de comprovar a inexistência da prescrição, por meio de documento juntado ao seu recurso ordinário, tendo em vista que essa pode ser arguida até a fase ordinária. No contraponto à arguição da prescrição, há a garantia constitucional que a outra parte possui de se defender, ou seja, de demonstrar, também até a fase ordinária, a não ocorrência da prescrição arguida. Esse é o equilíbrio entre as partes que se exige no processo, daí por que não se discute a juntada de documento novo. De outra forma, estar-se-ia conferindo privilégio à parte que tem a possibilidade de arguir questão de mérito capaz de ensejar a extinção do processo, com apreciação do mérito, até a fase ordinária, em detrimento daquela que deveria defender o próprio direito pleiteado. Embargos não conhecidos" (E-RR-69000-55.1999.5.16.0001, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DEJT 19/12/2014). Admito o recurso, no item "INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO-VIOLAÇÃO DOS ARTS. 489, 507, 1.022 DO CPC; 832, 893, 897-A DA CLT; E 93, IX, DA CF ARTS. 193, 202, I E II, DO CÓDIGO CIVIL E ART. 11, § 3º, DA CLT-CONTRARIEDADE À SÚMULA 153 DO TST-MÁ APLICAÇÃO DO ART. 5º, LV, DA CF ", com base no artigo 896, alínea "a", da CLT. DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO / Atos Processuais / Nulidade / Julgamento Extra / Ultra / Citra Petita. O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: Por fim, esclareço que os deslocamentos realizados pela reclamante em transporte público ou particular para ir de sua residência para o trabalho, de forma ordinária, como ocorria quando ia atender agências da região, não devem ser computados na jornada, pois não se trata de situação enquadrável como horas "in itinere". Não admito o recurso de revista no item. Não se recebe recurso de revista que deixar de indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto de inconformidade; que deixar de indicar, de forma explícita e fundamentada, contrariedade a dispositivo de lei, súmula ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho que conflite com a decisão regional, bem como que deixar de expor as razões do pedido de reforma, impugnando todos os fundamentos jurídicos da decisão recorrida, inclusive mediante demonstração analítica de cada dispositivo de lei, da Constituição Federal, de súmula ou orientação jurisprudencial cuja contrariedade aponte (art. 896, § 1º-A, CLT). Na análise do recurso, evidencia-se que a parte não observou o ônus que lhe foi atribuído pela lei, na medida em que não estabeleceu o confronto analítico em relação aos dispositivos de lei invocados. O entendimento pacífico no âmbito do TST é de que é imperioso que as razões recursais demonstrem de maneira explícita, fundamentada e analítica a divergência jurisprudencial ou a violação legal. Dessa forma, recursos com fundamentações genéricas, baseadas em meros apontamentos de dispositivos tidos como violados, e sem a indicação do ponto/trecho da decisão recorrida que a parte entende ser ofensivo à ordem legal ou divergente de outro julgado, não merecem seguimento. (Ag-AIRR-1857-42.2014.5.01.0421, 1ª Turma, Relator Ministro Luiz José Dezena da Silva, DEJT 16/03/2020; AIRR-554-27.2015.5.23.0071, 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 21/02/2020; Ag-AIRR-11305-82.2017.5.15.0085, 3ª Turma, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 13/03/2020; Ag-AIRR-187-92.2017.5.17.0008, 4ª Turma, Relator Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, DEJT 13/03/2020; Ag-AIRR-101372-41.2016.5.01.0078, 5ª Turma, Relator Desembargador Convocado João Pedro Silvestrin, DEJT 13/03/2020; Ag-AIRR-12364-39.2015.5.01.0482, 6ª Turma, Relatora Ministra Kátia Magalhães Arruda, DEJT 13/03/2020; RR-1246-80.2010.5.04.0701, 7ª Turma, Relator Ministro Cláudio Mascarenhas Brandão, DEJT 08/11/2019; Ag-AIRR-10026-97.2016.5.15.0052, 7ª Turma, Relator Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DEJT 21/02/2020; RR-2410-96.2013.5.03.0024, 8ª Turma, Relator Ministro Márcio Eurico Vitral Amaro, DEJT 12/04/2019). Nestes termos, nego seguimento ao recurso quanto ao tópico "DESLOCAMENTOS EM VIAGEM-VIOLAÇÃO DO ART. 4º, DA CLT -JULGAMENTO CITRA PETITA-VIOLAÇÃO DOS ARTS. 141 E 492 do CPC ". Direito Individual do Trabalho / Verbas Remuneratórias, Indenizatórias e Benefícios / Prêmio. O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: O Programa Ação Gerencial Itaú para Resultados (AGIR) é previsto em norma interna do empregador, a qual demonstra que a parcela decorre de um programa de incentivo baseado em metas individuais e de equipe. (...) Ainda, assegura o pagamento da PCR (complementação da PLR) sem compensação com valores pagos a título de PLR de qualquer plano, quando atingida metas da empresa, bem como vincula esse pagamento a resultados do programa AGIR, o que foi devidamente esclarecido no laudo contábil (ID 7240116). (...) Não verifico nos documentos do programa AGIR vinculação do seu pagamento ao resultado da empresa. Assim, entendo pela sua natureza salarial, de comissão, pois baseado na produtividade individual dos trabalhadores. Portanto, tendo a PR e/ou PCR sido paga com base nos resultados desse programa, ainda que instituída por acordo coletivo e também levando em consideração os resultados da empresa, entendo que também foi paga em decorrência do atingimento de metas individuais, tendo natureza salarial e devendo ser integrada nas demais parcelas remuneratórias. (...) Friso que a existência ou não de acordo coletivo validando o programa de pagamento da PR ou PCR com base no programa AGIR não altera esse entendimento, uma vez que a norma coletiva não altera a natureza jurídica da parcela. De outro lado, considerando que não resta demonstrada vinculação de metas individuais para o pagamento das parcelas PLR, PLR CCT e PLR Adicional, não há falar em natureza salarial dessas, estando elas em conformidade com o disposto no art. 7º, XI, da CF e lei nº 10.101/2000, na forma em que prevista nos ajustes coletivos acostados. (...) Nesta toada, tal como decidido na origem, reconheço a natureza salarial das parcelas pagas sob as rubricas "PCR ou participação complementar nos resultados" e "PR ou Participação nos Resultados". (...) Estando expressamente previsto no acordo coletivo que instituí a PR a sua compensação com a PLR convencional, entendo indevido pagamento da PLR convencional apenas em razão do reconhecimento da natureza salarial da PR. Isso porque, a toda evidência, o pagamento da PR em valores superiores aos da PLR convencional e com natureza salarial se mostra mais benéfico ao trabalhador, devendo prevalecer o ajuste coletivo neste aspecto. (...) Quanto às diferenças de PLR, conforme exposto acima, não são devidas em razão do abatimento efetuado com a parcela PR, uma vez que foi essa compensação autorizada por acordo coletivo. Não admito o recurso de revista no item. Se infere das razões do acórdão e das alegações recursais que seria necessária a incursão do julgador no contexto fático probatório para alcançar solução diversa daquela obtida pelo Colegiado, soberano do exame das circunstâncias fáticas, o que não é admissível no âmbito do recurso de revista, à luz do entendimento contido na Súmula 126 do TST. Ainda, não há falar em afronta direta e literal a preceitos da Constituição Federal, tampouco em violação literal a dispositivos de lei, circunstância que obsta a admissão do recurso pelo critério previsto na alínea "c" do art. 896 da CLT. Não há falar, ainda, em contrariedade à súmula mencionada. Aresto proveniente de Turma do TST não serve ao confronto de teses (art. 896 da CLT e OJ 111 da SDI-1/TST). Nego seguimento ao recurso no tópico "AGIR SEMESTRAL - COMPENSAÇÃO COM A PLR - Contrariedade à Súmula 18 do TST, violação dos arts. 373, II e 1.707 do Código Civil e art. 7º, XXVI, da CF". Direito Individual do Trabalho / Verbas Remuneratórias, Indenizatórias e Benefícios / Participação nos Lucros e Resultados - PLR. Direito Individual do Trabalho / Rescisão do Contrato de Trabalho / Verbas Rescisórias / Aviso Prévio O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: Quanto à PLR proporcional de 2021, não merece reforma a sentença. Isso porque as normas coletivas estipulam seu pagamento conforme o período de efetivo trabalho no exercício; constando expressamente que os empregados dispensados no primeiro semestre do exercício (antes de 02/08/) não são elegíveis para o recebimento da verba (cláusula primeira, parágrafos terceiro e quarto, combinada com cláusula terceira - ID 7c8ce5e). Logo, tendo ocorrido a rescisão do contrato de trabalho da autora em 14/01/2021, o fato de ter o contrato sido projetado pelo aviso prévio indenizado não autoriza o deferimento da verba. Admito o recurso de revista no item. A decisão recorrida, conforme se observa no trecho do acórdão transcrito nas razões recursais, discute a possibilidade de haver previsão em norma de coletiva do pagamento de participação nos lucros e resultados da empresa "conforme o período de efetivo trabalho no exercício; constando expressamente que os empregados dispensados no primeiro semestre do exercício (antes de 02/08/) não são elegíveis para o recebimento da verba (cláusula primeira, parágrafos terceiro e quarto, combinada com cláusula terceira - ID 7c8ce5e) ". Sobre o tema, a Súmula 451 do TST dispõe que "Fere o princípio da isonomia instituir vantagem mediante acordo coletivo ou norma regulamentar que condiciona a percepção da parcela participação nos lucros e resultados ao fato de estar o contrato de trabalho em vigor na data prevista para a distribuição dos lucros. Assim, inclusive na rescisão contratual antecipada, é devido o pagamento da parcela de forma proporcional aos meses trabalhados, pois o ex-empregado concorreu para os resultados positivos da empresa ." Entretanto, no julgamento do ARE 1.121.633 o STF, o STF editou o Tema 1046, que assim definiu:, "são constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis". Desde então, o TST vem se manifestando sobre o aparente conflito entre a Súmula 451 do TST e o precedente qualificado editado pelo Supremo Tribunal Federal, de maneira que atualmente se verificam duas correntes jurisprudenciais sobre a matéria. No sentido de que prevalece a disposição contida na Súmula 451 do TST, baseada no princípio da isonomia, o seguinte acórdão: AGRAVO INTERNO. RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017. PLR PROPORCIONAL - NORMA COLETICA - TEMA 1.046 DO STF. Cinge-se a controvérsia sobre a possibilidade de norma coletiva condicionar o pagamento da PLR do ano de 2018 ao fato de o empregado encontrar-se em efetivo exercício em 31/12/2018. O Supremo Tribunal Federal, em julgamento realizado em 02/06/2022, analisou a questão relacionada à validade de normas coletivas que limitam ou restringem direitos não assegurados constitucionalmente, tendo o Plenário da Excelsa Corte, quando da apreciação do Recurso Extraordinário com Agravo n.º 1.121.633/GO, fixado a tese jurídica no Tema 1.046 de sua Tabela de Repercussão Geral, no sentido de que "são constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis".O acórdão do Tema 1046 foi publicado no dia 28/04/2023, no qual restou esclarecido que "a redução ou a limitação dos direitos trabalhistas por acordos coletivos deve, em qualquer caso, respeito aos direitos absolutamente indisponíveis, constitucionalmente assegurados" e que, "Por força do princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas, as convenções coletivas não podem diminuir ou esvaziar o padrão geral de direitos trabalhistas previstos na legislação aplicável, salvo quando houver autorização legal ou constitucional expressa" e que "Isso significa que acordos e convenções coletivas apenas podem tratar de parcelas justrabalhistas de indisponibilidade relativa". Em seguida, constou da decisão publicada que "A jurisprudência do TST tem considerado que, estando determinado direito plenamente assegurado por norma imperativa estatal (Constituição, Leis Federais, Tratados e Convenções Internacionais ratificados), tal norma não poderá ser suprimida ou restringida pela negociação coletiva trabalhista, a menos que haja autorização legal ou constitucional expressa" e que, "Portanto, são excepcionais as hipóteses em que acordo ou convenção coletivos de trabalho podem reduzir garantias previstas no padrão geral heterônomo justrabalhista", concluindo a Suprema Corte que "Isso ocorre somente nos casos em que a lei ou a própria Constituição Federal expressamente autoriza a restrição ou supressão do direto do trabalhador" e que "É o que se vislumbra, por exemplo, na redação dos incisos VI, XIII e XIV do art. 7º da Constituição Federal de 1988, os quais estabelecem que são passíveis de restrição, por convenção ou acordo coletivo, questões relacionadas a redutibilidade salarial, duração, compensação e jornada de trabalho". Pois bem. De início, há de se destacar que o direito à participação aos lucros e resultados da empresa é direito constitucional, previsto no artigo 7º, XI, da Lei Maior, sem qualquer alusão à possibilidade de restrição por norma coletiva. Ainda, a Súmula 451 do TST consolidou o entendimento desta Corte Superior no sentido de que condicionar a percepção da parcela participação nos lucros e resultados ao fato de estar o contrato de trabalho em vigor na data prevista para a distribuição dos lucros fere o princípio da isonomia, pois o empregado contribuiu, proporcionalmente, com o resultado e lucros auferidos. Logo, no caso concreto, o entendimento desta Corte Superior exposto no citado verbete trata de aplicação do princípio da isonomia, previsto no art. 5º, "caput", da CF. Ou seja, ao condicionar o recebimento da parcela PLR à vigência do contrato de trabalho, a norma coletiva afronta a própria Constituição Federal e sua eficácia deve ser repelida pelo Poder Judiciário. Precedentes. Agravo interno não provido (AIRR-0000449-15.2020.5.23.0026, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 21/11/2024). E também: RRAg-0000371-88.2022.5.09.0010, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 19/12/2024; Ag-AIRR-1000997-51.2020.5.02.0044, 6ª Turma, Relator Desembargador Convocado Jose Pedro de Camargo Rodrigues de Souza, DEJT 07/06/2024; RRAg-20073-75.2012.5.20.0006, 7ª Turma, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 17/05/2024. Em sentido diverso, de que o pagamento da participação nos lucros condiciona-se a estar o empregado com vínculo de emprego ativo na data prevista para a distribuição dos lucros, o seguinte acórdão: RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/2017. PLR PROPORCIONAL DE 2015. CRITÉRIOS ESTABELECIDOS EM INSTRUMENTO COLETIVO. TEMA 1046 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL DO STF. TRANSCENDÊNCIA RECONHECIDA. Por não se tratar de direito com feição de indisponibilidade absoluta, a negociação coletiva entabulada sobre os critérios para o requerimento da parcela PLR deve prevalecer, suplantando a orientação da Súmula n.º 451 do TST, tudo em respeito à tese fixada no Tema 1.046 da Tabela de Repercussão Geral do STF. Assim, o Recurso de Revista da reclamada, no tema, merece ser acolhido para, reconhecida a validade da norma, excluir da condenação o pagamento da diferença da PLR proporcional de 2015 . Recurso de Revista conhecido e provido (RRAg-10158-14.2016.5.03.0142, 1ª Turma, Relator Ministro Luiz Jose Dezena da Silva, DEJT 12/08/2024). Na mesma linha: RRAg-0020669-89.2020.5.04.0211, 4ª Turma, Relator Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, DEJT 29/11/2024; RR-Ag-AIRR-10938-03.2021.5.03.0069, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 08/11/2024; RR-Ag-AIRR-101035-07.2022.5.01.0025, 8ª Turma, Relator Desembargador Convocado Jose Pedro de Camargo Rodrigues de Souza, DEJT 02/12/2024. Nesse contexto, considerando não estar a matéria consolidada no âmbito do TST, admite-se o recurso de revista, no tópico "PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS E RESULTADOS-INTEGRAÇÃO DO PRAZO DO AVISO PRÉVIO-CONTRARIEDADEÀSÚMULA 451 DO TST", por possível má aplicação da Súmula 451 do TST, visando a estimular a discussão interna naquele Tribunal. Direito Individual do Trabalho / Verbas Remuneratórias, Indenizatórias e Benefícios / Gratificação / Gratificação Semestral. O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: Doutro lado, de acordo com o disposto no art. 7º, inciso XI da CF, a Participação nos Lucros e Resultados é parcela paga conforme a lucratividade da empresa e não vinculada à remuneração. Na hipótese presente, as CCT sobre o item preceituam que a PLR equivale a 90% do salário-base do empregado, ", e.g. cláusula 1ª, da "acrescido das verbas fixas de natureza salarial CCT sobre PLR 2016, ID b0df165 -Pág. 3. O trecho transcrito dos embargos de declaração é o seguinte: Ainda, a decisão é expressa em afirmar a que a PLR é verba a ser paga com base na lucratividade da empresa e que o acordo de PLR estipula seu pagamento considerando o salário base do empregado, o que, por óbvio, afasta a pretensão de integração das gratificações semestrais em sua base de cálculo. De todo o exposto, não verifico as omissões e contradições alegadas, sim inconformidade da reclamante com o mérito da decisão nos aspectos abordados nos embargos de declaração. Admito o recurso de revista no item. A decisão está em desacordo com a iterativa, notória e atual jurisprudência do TST no sentido de que "a gratificação semestral possui natureza salarial e é verba fixa, ainda que possua periodicidade semestral, uma vez que é parcela paga com habitualidade, devendo, assim, integrar a PLR, conforme determinam as normas coletivas que fixam a sua base de cálculo " ( RR-21244-12.2015.5.04.0005, 3ª Turma, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 19/06/2020). Nesse sentido: (...) II . Agravo interno de que se conhece e a que se nega provimento. 4. INTEGRAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO SEMESTRAL NA PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS E RESULTADOS. JURISPRUDÊNCIA ASSENTE NO TST. ACÓRDÃO REGIONAL. CONFORMIDADE. SÚMULA Nº 333 DO TST. INCIDÊNCIA. I . Este Tribunal Superior do Trabalho adota o posicionamento de que a gratificação semestral, apesar de ter periodicidade semestral, detém natureza salarial e é verba fixa, de sorte que deve integrar o cálculo da PLR, consoante a determinação das normas coletivas de inclusão das verbas fixas de natureza salarial na PLR. II . No caso vertente, o Tribunal Regional constatou que "As normas coletivas juntadas aos autos, a exemplo da Cláusula Primeira, item I, da CCT sobre a Participação nos Lucros ou Resultados 2009 (Id 1096047 - Pág. 3), dispõem que a base de cálculo do PLR será o salário-base acrescido das verbas fixas de natureza salarial." e entendeu que "A gratificação semestral possui natureza jurídica salarial (habitualidade, continuidade e periodicidade dos pagamentos efetuados), nos termos do artigo 457, parágrafo 1º, da CLT, inserindo-se no conceito de verba fixa, apenas possuindo periodicidade distinta do salário. No aspecto, registro que não é a variação do valor ou a periodicidade superior à mensal que estabelece o enquadramento de uma parcela na definição de verba fixa, mas sim a sua habitualidade.", concluindo que "Nessa senda, a gratificação semestral, que é parcela salarial de natureza fixa, integra o cálculo da participação nos lucros e resultados, na forma prevista nas normas coletivas." (fl. 556 - Visualização Todos PDF). III . Logo, o acórdão regional está em plena conformidade com a jurisprudência assente do TST, pelo que incidem o disposto no art . 896, § 7º, da CLT e o teor da Súmula nº 333 do TST. IV . Agravo interno de que se conhece e a que se nega provimento. (...) (Ag-AIRR-20211-37.2013.5.04.0011, 7ª Turma, Relator Ministro Evandro Pereira Valadao Lopes, DEJT 23/08/2024). Nesse mesmo sentido, são os seguintes precedentes de todas as Turmas: Ag-AIRR-396-10.2019.5.13.0006, 1ª Turma, Relator Ministro Hugo Carlos Scheuermann, DEJT 07/10/2022; Ag-AIRR-886-73.2021.5.13.0002, 2ª Turma, Relatora Desembargadora Convocada Margareth Rodrigues Costa, DEJT 28/06/2024; RR-21244-12.2015.5.04.0005, 3ª Turma, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 19/06/2020; Ag-RRAg-20026-29.2014.5.04.0701, 4ª Turma, Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 20/10/2023; Ag-ARR-1391-74.2014.5.04.0741, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 31/05/2019; RRAg-1217-95.2013.5.12.0056, 6ª Turma, Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 16/09/2022; Ag-RR-1202-18.2015.5.05.0003, 7ª Turma, Relator Ministro Evandro Pereira Valadao Lopes, DEJT 02/08/2024; RRAg-21014-12.2016.5.04.0012, 8ª Turma, Relator Ministro Aloysio Correa da Veiga, DEJT 26/08/2022. Admito o recurso, quanto ao tópico "INTEGRAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO SEMESTRAL NA PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS E RESULTADOS - VIOLAÇAO DOS ARTS. 457, § 1º, DA CLT, E 7º, XXVI, DA CF", por possível violação ao disposto no artigo 457, § 1º, da CLT, com fulcro na alínea "c" do artigo 896 da CLT. CONCLUSÃO Admito parcialmente o recurso. Intimem-se, inclusive a parte recorrida, para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo legal quanto aos tópicos admitidos. ALEXANDRE CORRÊA DA CRUZ Vice-Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região /bcm PORTO ALEGRE/RS, 25 de abril de 2025. ALEXANDRE CORREA DA CRUZ Desembargador Federal do Trabalho Intimado(s) / Citado(s) - CATIA ADRIANA OLIVIECKI - ITAU UNIBANCO S.A.

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Catia Adriana Oliviecki e outros x Catia Adriana Oliviecki e outros

ID: 261495626

Tribunal: TRT4 Órgão: OJ de Análise de Recurso Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA Nº Processo: 0020136-36.2021.5.04.0522

Data de Disponibilização: 28/04/2025

Polo Ativo:

CATIA ADRIANA OLIVIECKI ITAU UNIBANCO S.A.

Polo Passivo:

CATIA ADRIANA OLIVIECKI ITAU UNIBANCO S.A.

Notificação

Advogados:

MANOEL ANTONIO GOMES

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MARISSOL JESUS FILLA

OAB/PR XXXXXX Desbloquear

MARCOS HUGO DELLA LATTA

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LUIS ALBERTO ESPOSITO

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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relatora: ANGELA ROSI ALMEIDA CHAPPER 0020136-36.2021.5.04.0522 : CATIA ADRIANA OLIVIE… PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 4ª REGIÃO OJC DE ANÁLISE DE RECURSO Relatora: ANGELA ROSI ALMEIDA CHAPPER 0020136-36.2021.5.04.0522 : CATIA ADRIANA OLIVIECKI E OUTROS (1) : CATIA ADRIANA OLIVIECKI E OUTROS (1) INTIMAÇÃO Fica V. Sa. intimado para tomar ciência da Decisão ID 26c94dc proferida nos autos. RECURSO DE REVISTA ROT-0020136-36.2021.5.04.0522 - OJC Análise de Recursos Recorrente(s): CATIA ADRIANA OLIVIECKI Advogado(a)(s): MARCOS HUGO DELLA LATTA (RS - 31698) LUIS ALBERTO ESPOSITO (RS - 27122) MANOEL ANTONIO GOMES (RS - 36492) Recorrido(a)(s): ITAU UNIBANCO S.A. Advogado(a)(s): MARISSOL JESUS FILLA (PR - 17245) PRESSUPOSTOS EXTRÍNSECOS Superada a apreciação dos pressupostos extrínsecos, passo à análise do recurso. PRESSUPOSTOS INTRÍNSECOS DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO / Atos Processuais / Nulidade / Negativa de Prestação Jurisdicional. O trecho do acórdão principal transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: A mera divulgação de desempenho da agência (ID 03be1d5) não caracteriza, por si só, dano moral. A parte autora opôs embargos de declaração, conforme trecho transcrito: Os e-mails dos IDs. ab5c2b4e 03be1d5 comprovam a indevida exposição da reclamante em ranking de produção. No tocante a exposição do empregado em ranking de produção, tal conduta é conduta vedada nas Convenções Coletivas de Trabalho 2014/2015 do ID. 3f5081b; 2015/2016 (ID. ee9eee4, ad162d6); 2016/2018 (ID. f13977e, 5bd4986, 1c3f70c); 2018/2020 (ID. e411ba5, 0b7b0b3);2020/2022 (ID. 7d1b77e), conforme se infere na seguinte cláusula normativa: CLÁUSULA 39 - MONITORAMENTO DE RESULTADOS No monitoramento de resultados, os bancos não exporão, publicamente, o ranking individual de seus empregados. Parágrafo primeiro - É vedada, ao gestor, a cobrança de cumprimento de resultados por mensagens, no telefone particular do empregado. Parágrafo segundo - Em caso de eventual dúvida quanto ao fiel cumprimento de regras referentes à presente cláusula, as partes estabelecem que a judicialização seja precedida, obrigatoriamente, de negociação coletiva. E nesse sentido, a primeira testemunha da autora, Ana Helena Giotto de Andrade, relata: "que havia uma ranqueamento regional por pessoa; que esse ranking era divulgado por e-mail, para o quadro de funcionários e nas reuniões eram expostos em projeções". A segunda testemunha da reclamante, Francieli Gollo Casal,também refere: "que recebiam um ranking classificando por cores o desempenho de cada um" Por outro lado,éfato notório que o banco é reincidente na prática dessesatos danosos(art. 374, I, do CPC). Portanto, não se trata apenas da exposição de dados de desempenho da agência, mas do próprio trabalhador, o que é vedado pela norma coletiva, e este argumento não foi analisado no acórdão". O trecho do acórdão dos embargos de declaração é o seguinte: No caso, pelos próprios termos dos embargos de declaração opostos, a pretensão da embargante revela apenas sua inconformidade com o mérito da ação, pretendendo o reexame da prova ou rediscussão do direito, o que não é cabível pela via dos embargos de declaração, devendo a reclamante valer-se do recurso próprio para tanto. Admito, em parte, o recurso de revista no item. Alega a parte recorrente nulidade por negativa de prestação jurisdicional, em relação aos seguintes tópicos: horas extras e compensação com a gratificação de função; participação nos lucros e resultados e parcela adicional; agir mensal e reflexos em 13º salário; danos morais; e interrupção da prescrição. Em relação às horas extras com compensação da gratificação de função, à participação nos lucros e resultados - parcela adicional, à parcela agir mensal com reflexos em 13º salário e à interrupção da prescrição, observo, da leitura do acórdão, que a Turma trouxe fundamentação clara e suficiente ao deslinde da controvérsia, não havendo falar em nulidade do julgado por negativa de prestação jurisdicional. Desta forma, não verifico afronta ao art. 93, inciso IX, da Constituição Federal, art. 489 do CPC e art. 832 da CLT. Em relação à arguição de nulidade do julgado por negativa de prestação jurisdicional, no tópico pertinente ao pedido de indenização por danos morais, admito o recurso, por possível violação ao disposto no artigo 93, IX, da Constituição Federal, com fulcro na alínea "c" do artigo 896 da CLT, diante da possibilidade de não ter sido enfrentada as alegações da recorrente, no sentido de que havia exposição da reclamante em razão da divulgação, por e-mails, de ranking de produção. Prescrição e Decadência no Direito do Trabalho / Prescrição / Interrupção. O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: No caso, o julgador da origem deixou de acolher o protesto interruptivo da prescrição de nº 0021737-12.2017.5.04.0007, por não ter a reclamante o referido na inicial ou no primeiro aditamento (ID 8b04742 e ID c4d7139), somente o fazendo após efetivada a citação e apresentada defesa pelo reclamado, nos seguintes termos: "No caso dos autos, a inicial foi aditada após a notificação da reclamada e sem o seu consentimento, conforme manifestação juntada no ID. 9fdb91e, razão pela qual a emenda não deve ser admitida.Ademais, não há pedido de interrupção da prescrição na petição inicial, o que significa que o acolhimento da pretensão implicaria julgamento extrapetita (art. 492 do CPC) e violaria os princípios do contraditório e ampla defesa. (...) Ressalto que sequer há como entender que tal documento e pleito teria ocorrido em réplica a pedido defensivo de pronúncia da prescrição, pois foi juntado e referido pela reclamante somente em 29/08/2022 (ID 7e107a2 e ID 308c582), após a manifestação sobre defesa e documentos apresentada em 21/05/2021, oportunidade em que se limitou a alegar a inexistência de prescrição a ser pronunciada (ID f01fc45, fl. 2082 do PDF). A emenda da inicial somente pode ser efetuada até a apresentação de defesa para parte reclamada, dependendo depois disso do consentimento da parte contrária, o que não ocorreu no caso, visto que o reclamado impugnou expressamente o aditamento extemporâneo (ID 9fdb91e). É certo que a prescrição, cujo prazo está previsto em lei, é questão que pode ser invocada a qualquer tempo; mas seu elastecimento, por interposição de protesto antipreclusivo, demanda o exame acerca da validade do instrumento e discussão acerca da legitimidade da parte que o interpõe. Assim, ainda que tenha o reclamado acostado documentação que abarca o período prescricional elastecido pelo protesto interruptivo da prescrição de nº 0021737-12.2017.5.04.0007, houve prejuízo do contraditório e ampla defesa por ter sido impedida de apresentar defesa acerca do cabimento e validade do referido protesto. Assim, correta a sentença que não acolhe o protesto interruptivo da prescrição invocado em extemporâneo aditamento da inicial e sem concordância da parte adversa, tendo pronunciado a prescrição quinquenal quanto aos créditos vencidos até 05/04/2016, pois ajuizada a presente ação em 05/04/2021. A parte autora opôs embargos de declaração, expondo: No caso, o requerimento formulado pela autora no ID. 7e107a2 -Pág. 1/3 não é de aditamento da inicial, e o Juízoprimevo determinou a intimação do reclamado para que se manifestasse sobre o mesmo (ID. 813fb1d), o que ocorreu com a petição protocolada no ID. 9fdb91e, e com a juntada dos documentos mencionados no acórdão, comprovando não ter havido qualquer prejuízoà defesa. Não bastasse isso, o reclamado foi parte na ação de protesto e, portanto, tinha plena ciência da interrupção da prescrição". O acórdão de embargos consignou: No caso, pelos próprios termos dos embargos de declaração opostos, a pretensão da embargante revela apenas sua inconformidade com o mérito da ação, pretendendo o reexame da prova ou rediscussão do direito, o que não é cabível pela via dos embargos de declaração, devendo a reclamante valer-se do recurso próprio para tanto. Admito o recurso de revista no item. Entendo demonstrada a divergência jurisprudencial pelo aresto oriundo da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais: "ARGUIÇÃO DE PRESCRIÇÃO NA INSTÂNCIA ORDINÁRIA -JUNTADA DE DOCUMENTOS PARA COMPROVÁ-LA EM GRAU RECURSAL -SÚMULAS Nos 8 E 153 DO TST. O autor tem o direito de comprovar a inexistência da prescrição, por meio de documento juntado ao seu recurso ordinário, tendo em vista que essa pode ser arguida até a fase ordinária. No contraponto à arguição da prescrição, há a garantia constitucional que a outra parte possui de se defender, ou seja, de demonstrar, também até a fase ordinária, a não ocorrência da prescrição arguida. Esse é o equilíbrio entre as partes que se exige no processo, daí por que não se discute a juntada de documento novo. De outra forma, estar-se-ia conferindo privilégio à parte que tem a possibilidade de arguir questão de mérito capaz de ensejar a extinção do processo, com apreciação do mérito, até a fase ordinária, em detrimento daquela que deveria defender o próprio direito pleiteado. Embargos não conhecidos" (E-RR-69000-55.1999.5.16.0001, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DEJT 19/12/2014). Admito o recurso, no item "INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO-VIOLAÇÃO DOS ARTS. 489, 507, 1.022 DO CPC; 832, 893, 897-A DA CLT; E 93, IX, DA CF ARTS. 193, 202, I E II, DO CÓDIGO CIVIL E ART. 11, § 3º, DA CLT-CONTRARIEDADE À SÚMULA 153 DO TST-MÁ APLICAÇÃO DO ART. 5º, LV, DA CF ", com base no artigo 896, alínea "a", da CLT. DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO TRABALHO / Atos Processuais / Nulidade / Julgamento Extra / Ultra / Citra Petita. O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: Por fim, esclareço que os deslocamentos realizados pela reclamante em transporte público ou particular para ir de sua residência para o trabalho, de forma ordinária, como ocorria quando ia atender agências da região, não devem ser computados na jornada, pois não se trata de situação enquadrável como horas "in itinere". Não admito o recurso de revista no item. Não se recebe recurso de revista que deixar de indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto de inconformidade; que deixar de indicar, de forma explícita e fundamentada, contrariedade a dispositivo de lei, súmula ou orientação jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho que conflite com a decisão regional, bem como que deixar de expor as razões do pedido de reforma, impugnando todos os fundamentos jurídicos da decisão recorrida, inclusive mediante demonstração analítica de cada dispositivo de lei, da Constituição Federal, de súmula ou orientação jurisprudencial cuja contrariedade aponte (art. 896, § 1º-A, CLT). Na análise do recurso, evidencia-se que a parte não observou o ônus que lhe foi atribuído pela lei, na medida em que não estabeleceu o confronto analítico em relação aos dispositivos de lei invocados. O entendimento pacífico no âmbito do TST é de que é imperioso que as razões recursais demonstrem de maneira explícita, fundamentada e analítica a divergência jurisprudencial ou a violação legal. Dessa forma, recursos com fundamentações genéricas, baseadas em meros apontamentos de dispositivos tidos como violados, e sem a indicação do ponto/trecho da decisão recorrida que a parte entende ser ofensivo à ordem legal ou divergente de outro julgado, não merecem seguimento. (Ag-AIRR-1857-42.2014.5.01.0421, 1ª Turma, Relator Ministro Luiz José Dezena da Silva, DEJT 16/03/2020; AIRR-554-27.2015.5.23.0071, 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 21/02/2020; Ag-AIRR-11305-82.2017.5.15.0085, 3ª Turma, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 13/03/2020; Ag-AIRR-187-92.2017.5.17.0008, 4ª Turma, Relator Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, DEJT 13/03/2020; Ag-AIRR-101372-41.2016.5.01.0078, 5ª Turma, Relator Desembargador Convocado João Pedro Silvestrin, DEJT 13/03/2020; Ag-AIRR-12364-39.2015.5.01.0482, 6ª Turma, Relatora Ministra Kátia Magalhães Arruda, DEJT 13/03/2020; RR-1246-80.2010.5.04.0701, 7ª Turma, Relator Ministro Cláudio Mascarenhas Brandão, DEJT 08/11/2019; Ag-AIRR-10026-97.2016.5.15.0052, 7ª Turma, Relator Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, DEJT 21/02/2020; RR-2410-96.2013.5.03.0024, 8ª Turma, Relator Ministro Márcio Eurico Vitral Amaro, DEJT 12/04/2019). Nestes termos, nego seguimento ao recurso quanto ao tópico "DESLOCAMENTOS EM VIAGEM-VIOLAÇÃO DO ART. 4º, DA CLT -JULGAMENTO CITRA PETITA-VIOLAÇÃO DOS ARTS. 141 E 492 do CPC ". Direito Individual do Trabalho / Verbas Remuneratórias, Indenizatórias e Benefícios / Prêmio. O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: O Programa Ação Gerencial Itaú para Resultados (AGIR) é previsto em norma interna do empregador, a qual demonstra que a parcela decorre de um programa de incentivo baseado em metas individuais e de equipe. (...) Ainda, assegura o pagamento da PCR (complementação da PLR) sem compensação com valores pagos a título de PLR de qualquer plano, quando atingida metas da empresa, bem como vincula esse pagamento a resultados do programa AGIR, o que foi devidamente esclarecido no laudo contábil (ID 7240116). (...) Não verifico nos documentos do programa AGIR vinculação do seu pagamento ao resultado da empresa. Assim, entendo pela sua natureza salarial, de comissão, pois baseado na produtividade individual dos trabalhadores. Portanto, tendo a PR e/ou PCR sido paga com base nos resultados desse programa, ainda que instituída por acordo coletivo e também levando em consideração os resultados da empresa, entendo que também foi paga em decorrência do atingimento de metas individuais, tendo natureza salarial e devendo ser integrada nas demais parcelas remuneratórias. (...) Friso que a existência ou não de acordo coletivo validando o programa de pagamento da PR ou PCR com base no programa AGIR não altera esse entendimento, uma vez que a norma coletiva não altera a natureza jurídica da parcela. De outro lado, considerando que não resta demonstrada vinculação de metas individuais para o pagamento das parcelas PLR, PLR CCT e PLR Adicional, não há falar em natureza salarial dessas, estando elas em conformidade com o disposto no art. 7º, XI, da CF e lei nº 10.101/2000, na forma em que prevista nos ajustes coletivos acostados. (...) Nesta toada, tal como decidido na origem, reconheço a natureza salarial das parcelas pagas sob as rubricas "PCR ou participação complementar nos resultados" e "PR ou Participação nos Resultados". (...) Estando expressamente previsto no acordo coletivo que instituí a PR a sua compensação com a PLR convencional, entendo indevido pagamento da PLR convencional apenas em razão do reconhecimento da natureza salarial da PR. Isso porque, a toda evidência, o pagamento da PR em valores superiores aos da PLR convencional e com natureza salarial se mostra mais benéfico ao trabalhador, devendo prevalecer o ajuste coletivo neste aspecto. (...) Quanto às diferenças de PLR, conforme exposto acima, não são devidas em razão do abatimento efetuado com a parcela PR, uma vez que foi essa compensação autorizada por acordo coletivo. Não admito o recurso de revista no item. Se infere das razões do acórdão e das alegações recursais que seria necessária a incursão do julgador no contexto fático probatório para alcançar solução diversa daquela obtida pelo Colegiado, soberano do exame das circunstâncias fáticas, o que não é admissível no âmbito do recurso de revista, à luz do entendimento contido na Súmula 126 do TST. Ainda, não há falar em afronta direta e literal a preceitos da Constituição Federal, tampouco em violação literal a dispositivos de lei, circunstância que obsta a admissão do recurso pelo critério previsto na alínea "c" do art. 896 da CLT. Não há falar, ainda, em contrariedade à súmula mencionada. Aresto proveniente de Turma do TST não serve ao confronto de teses (art. 896 da CLT e OJ 111 da SDI-1/TST). Nego seguimento ao recurso no tópico "AGIR SEMESTRAL - COMPENSAÇÃO COM A PLR - Contrariedade à Súmula 18 do TST, violação dos arts. 373, II e 1.707 do Código Civil e art. 7º, XXVI, da CF". Direito Individual do Trabalho / Verbas Remuneratórias, Indenizatórias e Benefícios / Participação nos Lucros e Resultados - PLR. Direito Individual do Trabalho / Rescisão do Contrato de Trabalho / Verbas Rescisórias / Aviso Prévio O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: Quanto à PLR proporcional de 2021, não merece reforma a sentença. Isso porque as normas coletivas estipulam seu pagamento conforme o período de efetivo trabalho no exercício; constando expressamente que os empregados dispensados no primeiro semestre do exercício (antes de 02/08/) não são elegíveis para o recebimento da verba (cláusula primeira, parágrafos terceiro e quarto, combinada com cláusula terceira - ID 7c8ce5e). Logo, tendo ocorrido a rescisão do contrato de trabalho da autora em 14/01/2021, o fato de ter o contrato sido projetado pelo aviso prévio indenizado não autoriza o deferimento da verba. Admito o recurso de revista no item. A decisão recorrida, conforme se observa no trecho do acórdão transcrito nas razões recursais, discute a possibilidade de haver previsão em norma de coletiva do pagamento de participação nos lucros e resultados da empresa "conforme o período de efetivo trabalho no exercício; constando expressamente que os empregados dispensados no primeiro semestre do exercício (antes de 02/08/) não são elegíveis para o recebimento da verba (cláusula primeira, parágrafos terceiro e quarto, combinada com cláusula terceira - ID 7c8ce5e) ". Sobre o tema, a Súmula 451 do TST dispõe que "Fere o princípio da isonomia instituir vantagem mediante acordo coletivo ou norma regulamentar que condiciona a percepção da parcela participação nos lucros e resultados ao fato de estar o contrato de trabalho em vigor na data prevista para a distribuição dos lucros. Assim, inclusive na rescisão contratual antecipada, é devido o pagamento da parcela de forma proporcional aos meses trabalhados, pois o ex-empregado concorreu para os resultados positivos da empresa ." Entretanto, no julgamento do ARE 1.121.633 o STF, o STF editou o Tema 1046, que assim definiu:, "são constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis". Desde então, o TST vem se manifestando sobre o aparente conflito entre a Súmula 451 do TST e o precedente qualificado editado pelo Supremo Tribunal Federal, de maneira que atualmente se verificam duas correntes jurisprudenciais sobre a matéria. No sentido de que prevalece a disposição contida na Súmula 451 do TST, baseada no princípio da isonomia, o seguinte acórdão: AGRAVO INTERNO. RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017. PLR PROPORCIONAL - NORMA COLETICA - TEMA 1.046 DO STF. Cinge-se a controvérsia sobre a possibilidade de norma coletiva condicionar o pagamento da PLR do ano de 2018 ao fato de o empregado encontrar-se em efetivo exercício em 31/12/2018. O Supremo Tribunal Federal, em julgamento realizado em 02/06/2022, analisou a questão relacionada à validade de normas coletivas que limitam ou restringem direitos não assegurados constitucionalmente, tendo o Plenário da Excelsa Corte, quando da apreciação do Recurso Extraordinário com Agravo n.º 1.121.633/GO, fixado a tese jurídica no Tema 1.046 de sua Tabela de Repercussão Geral, no sentido de que "são constitucionais os acordos e as convenções coletivos que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis".O acórdão do Tema 1046 foi publicado no dia 28/04/2023, no qual restou esclarecido que "a redução ou a limitação dos direitos trabalhistas por acordos coletivos deve, em qualquer caso, respeito aos direitos absolutamente indisponíveis, constitucionalmente assegurados" e que, "Por força do princípio da indisponibilidade dos direitos trabalhistas, as convenções coletivas não podem diminuir ou esvaziar o padrão geral de direitos trabalhistas previstos na legislação aplicável, salvo quando houver autorização legal ou constitucional expressa" e que "Isso significa que acordos e convenções coletivas apenas podem tratar de parcelas justrabalhistas de indisponibilidade relativa". Em seguida, constou da decisão publicada que "A jurisprudência do TST tem considerado que, estando determinado direito plenamente assegurado por norma imperativa estatal (Constituição, Leis Federais, Tratados e Convenções Internacionais ratificados), tal norma não poderá ser suprimida ou restringida pela negociação coletiva trabalhista, a menos que haja autorização legal ou constitucional expressa" e que, "Portanto, são excepcionais as hipóteses em que acordo ou convenção coletivos de trabalho podem reduzir garantias previstas no padrão geral heterônomo justrabalhista", concluindo a Suprema Corte que "Isso ocorre somente nos casos em que a lei ou a própria Constituição Federal expressamente autoriza a restrição ou supressão do direto do trabalhador" e que "É o que se vislumbra, por exemplo, na redação dos incisos VI, XIII e XIV do art. 7º da Constituição Federal de 1988, os quais estabelecem que são passíveis de restrição, por convenção ou acordo coletivo, questões relacionadas a redutibilidade salarial, duração, compensação e jornada de trabalho". Pois bem. De início, há de se destacar que o direito à participação aos lucros e resultados da empresa é direito constitucional, previsto no artigo 7º, XI, da Lei Maior, sem qualquer alusão à possibilidade de restrição por norma coletiva. Ainda, a Súmula 451 do TST consolidou o entendimento desta Corte Superior no sentido de que condicionar a percepção da parcela participação nos lucros e resultados ao fato de estar o contrato de trabalho em vigor na data prevista para a distribuição dos lucros fere o princípio da isonomia, pois o empregado contribuiu, proporcionalmente, com o resultado e lucros auferidos. Logo, no caso concreto, o entendimento desta Corte Superior exposto no citado verbete trata de aplicação do princípio da isonomia, previsto no art. 5º, "caput", da CF. Ou seja, ao condicionar o recebimento da parcela PLR à vigência do contrato de trabalho, a norma coletiva afronta a própria Constituição Federal e sua eficácia deve ser repelida pelo Poder Judiciário. Precedentes. Agravo interno não provido (AIRR-0000449-15.2020.5.23.0026, 2ª Turma, Relatora Ministra Liana Chaib, DEJT 21/11/2024). E também: RRAg-0000371-88.2022.5.09.0010, 3ª Turma, Relator Ministro Alberto Bastos Balazeiro, DEJT 19/12/2024; Ag-AIRR-1000997-51.2020.5.02.0044, 6ª Turma, Relator Desembargador Convocado Jose Pedro de Camargo Rodrigues de Souza, DEJT 07/06/2024; RRAg-20073-75.2012.5.20.0006, 7ª Turma, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 17/05/2024. Em sentido diverso, de que o pagamento da participação nos lucros condiciona-se a estar o empregado com vínculo de emprego ativo na data prevista para a distribuição dos lucros, o seguinte acórdão: RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.467/2017. PLR PROPORCIONAL DE 2015. CRITÉRIOS ESTABELECIDOS EM INSTRUMENTO COLETIVO. TEMA 1046 DA TABELA DE REPERCUSSÃO GERAL DO STF. TRANSCENDÊNCIA RECONHECIDA. Por não se tratar de direito com feição de indisponibilidade absoluta, a negociação coletiva entabulada sobre os critérios para o requerimento da parcela PLR deve prevalecer, suplantando a orientação da Súmula n.º 451 do TST, tudo em respeito à tese fixada no Tema 1.046 da Tabela de Repercussão Geral do STF. Assim, o Recurso de Revista da reclamada, no tema, merece ser acolhido para, reconhecida a validade da norma, excluir da condenação o pagamento da diferença da PLR proporcional de 2015 . Recurso de Revista conhecido e provido (RRAg-10158-14.2016.5.03.0142, 1ª Turma, Relator Ministro Luiz Jose Dezena da Silva, DEJT 12/08/2024). Na mesma linha: RRAg-0020669-89.2020.5.04.0211, 4ª Turma, Relator Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, DEJT 29/11/2024; RR-Ag-AIRR-10938-03.2021.5.03.0069, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 08/11/2024; RR-Ag-AIRR-101035-07.2022.5.01.0025, 8ª Turma, Relator Desembargador Convocado Jose Pedro de Camargo Rodrigues de Souza, DEJT 02/12/2024. Nesse contexto, considerando não estar a matéria consolidada no âmbito do TST, admite-se o recurso de revista, no tópico "PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS E RESULTADOS-INTEGRAÇÃO DO PRAZO DO AVISO PRÉVIO-CONTRARIEDADEÀSÚMULA 451 DO TST", por possível má aplicação da Súmula 451 do TST, visando a estimular a discussão interna naquele Tribunal. Direito Individual do Trabalho / Verbas Remuneratórias, Indenizatórias e Benefícios / Gratificação / Gratificação Semestral. O trecho transcrito nas razões recursais para demonstrar o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista é o seguinte: Doutro lado, de acordo com o disposto no art. 7º, inciso XI da CF, a Participação nos Lucros e Resultados é parcela paga conforme a lucratividade da empresa e não vinculada à remuneração. Na hipótese presente, as CCT sobre o item preceituam que a PLR equivale a 90% do salário-base do empregado, ", e.g. cláusula 1ª, da "acrescido das verbas fixas de natureza salarial CCT sobre PLR 2016, ID b0df165 -Pág. 3. O trecho transcrito dos embargos de declaração é o seguinte: Ainda, a decisão é expressa em afirmar a que a PLR é verba a ser paga com base na lucratividade da empresa e que o acordo de PLR estipula seu pagamento considerando o salário base do empregado, o que, por óbvio, afasta a pretensão de integração das gratificações semestrais em sua base de cálculo. De todo o exposto, não verifico as omissões e contradições alegadas, sim inconformidade da reclamante com o mérito da decisão nos aspectos abordados nos embargos de declaração. Admito o recurso de revista no item. A decisão está em desacordo com a iterativa, notória e atual jurisprudência do TST no sentido de que "a gratificação semestral possui natureza salarial e é verba fixa, ainda que possua periodicidade semestral, uma vez que é parcela paga com habitualidade, devendo, assim, integrar a PLR, conforme determinam as normas coletivas que fixam a sua base de cálculo " ( RR-21244-12.2015.5.04.0005, 3ª Turma, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 19/06/2020). Nesse sentido: (...) II . Agravo interno de que se conhece e a que se nega provimento. 4. INTEGRAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO SEMESTRAL NA PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS E RESULTADOS. JURISPRUDÊNCIA ASSENTE NO TST. ACÓRDÃO REGIONAL. CONFORMIDADE. SÚMULA Nº 333 DO TST. INCIDÊNCIA. I . Este Tribunal Superior do Trabalho adota o posicionamento de que a gratificação semestral, apesar de ter periodicidade semestral, detém natureza salarial e é verba fixa, de sorte que deve integrar o cálculo da PLR, consoante a determinação das normas coletivas de inclusão das verbas fixas de natureza salarial na PLR. II . No caso vertente, o Tribunal Regional constatou que "As normas coletivas juntadas aos autos, a exemplo da Cláusula Primeira, item I, da CCT sobre a Participação nos Lucros ou Resultados 2009 (Id 1096047 - Pág. 3), dispõem que a base de cálculo do PLR será o salário-base acrescido das verbas fixas de natureza salarial." e entendeu que "A gratificação semestral possui natureza jurídica salarial (habitualidade, continuidade e periodicidade dos pagamentos efetuados), nos termos do artigo 457, parágrafo 1º, da CLT, inserindo-se no conceito de verba fixa, apenas possuindo periodicidade distinta do salário. No aspecto, registro que não é a variação do valor ou a periodicidade superior à mensal que estabelece o enquadramento de uma parcela na definição de verba fixa, mas sim a sua habitualidade.", concluindo que "Nessa senda, a gratificação semestral, que é parcela salarial de natureza fixa, integra o cálculo da participação nos lucros e resultados, na forma prevista nas normas coletivas." (fl. 556 - Visualização Todos PDF). III . Logo, o acórdão regional está em plena conformidade com a jurisprudência assente do TST, pelo que incidem o disposto no art . 896, § 7º, da CLT e o teor da Súmula nº 333 do TST. IV . Agravo interno de que se conhece e a que se nega provimento. (...) (Ag-AIRR-20211-37.2013.5.04.0011, 7ª Turma, Relator Ministro Evandro Pereira Valadao Lopes, DEJT 23/08/2024). Nesse mesmo sentido, são os seguintes precedentes de todas as Turmas: Ag-AIRR-396-10.2019.5.13.0006, 1ª Turma, Relator Ministro Hugo Carlos Scheuermann, DEJT 07/10/2022; Ag-AIRR-886-73.2021.5.13.0002, 2ª Turma, Relatora Desembargadora Convocada Margareth Rodrigues Costa, DEJT 28/06/2024; RR-21244-12.2015.5.04.0005, 3ª Turma, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 19/06/2020; Ag-RRAg-20026-29.2014.5.04.0701, 4ª Turma, Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 20/10/2023; Ag-ARR-1391-74.2014.5.04.0741, 5ª Turma, Relator Ministro Breno Medeiros, DEJT 31/05/2019; RRAg-1217-95.2013.5.12.0056, 6ª Turma, Relator Ministro Augusto Cesar Leite de Carvalho, DEJT 16/09/2022; Ag-RR-1202-18.2015.5.05.0003, 7ª Turma, Relator Ministro Evandro Pereira Valadao Lopes, DEJT 02/08/2024; RRAg-21014-12.2016.5.04.0012, 8ª Turma, Relator Ministro Aloysio Correa da Veiga, DEJT 26/08/2022. Admito o recurso, quanto ao tópico "INTEGRAÇÃO DA GRATIFICAÇÃO SEMESTRAL NA PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS E RESULTADOS - VIOLAÇAO DOS ARTS. 457, § 1º, DA CLT, E 7º, XXVI, DA CF", por possível violação ao disposto no artigo 457, § 1º, da CLT, com fulcro na alínea "c" do artigo 896 da CLT. CONCLUSÃO Admito parcialmente o recurso. Intimem-se, inclusive a parte recorrida, para, querendo, apresentar contrarrazões no prazo legal quanto aos tópicos admitidos. ALEXANDRE CORRÊA DA CRUZ Vice-Presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região /bcm PORTO ALEGRE/RS, 25 de abril de 2025. ALEXANDRE CORREA DA CRUZ Desembargador Federal do Trabalho Intimado(s) / Citado(s) - CATIA ADRIANA OLIVIECKI - ITAU UNIBANCO S.A.

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