Processo nº 0003179-37.2024.4.05.8402
ID: 297779221
Tribunal: TRF5
Órgão: 9ª Vara Federal RN
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 0003179-37.2024.4.05.8402
Data de Disponibilização:
13/06/2025
Polo Ativo:
Advogados:
PEDRO OLIVEIRA DE QUEIROZ
OAB/CE XXXXXX
Desbloquear
JUSTIÇA FEDERAL DA 5ª REGIÃO SEÇÃO JUDICIÁRIA DO RIO GRANDE DO NORTE JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CAICÓ - 9ª VARA Av. Dom Adelino Dantas, Complexo Judiciário, bairro Maynar…
JUSTIÇA FEDERAL DA 5ª REGIÃO SEÇÃO JUDICIÁRIA DO RIO GRANDE DO NORTE JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE CAICÓ - 9ª VARA Av. Dom Adelino Dantas, Complexo Judiciário, bairro Maynard - Caicó/RN - CEP 59300-000 Telefones (084) 99144-2047 / (084) 3421-2595 / (084) 3421-2048 e-mail: juizado9vara@jfrn.jus.br Atendimento de segunda a sexta das 8 às 14 horas PROCESSO: 0003179-37.2024.4.05.8402 AUTOR(A): AUTOR: RAIMUNDA AMARO DA SILVA ARAUJO RÉU(S): CAIXA DE ASSISTENCIA AOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS - CAAP e outros SENTENÇA I - RELATÓRIO Trata-se de ação especial cível movida em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS e da CAIXA DE ASSISTENCIA AOS APOSENTADOS E PENSIONISTAS - CAAP, objetivando a condenação dos demandados em repetição de indébito e dano moral. É o sucinto relatório, que seria até dispensado, nos termos do parágrafo único do art. 38 da Lei nº 9.099/1995, aplicável subsidiariamente aos Juizados Especiais Federais, em consonância com o art. 1º da Lei nº 10.259/2001. Passo, pois, à fundamentação. II - FUNDAMENTAÇÃO Inicialmente, não há que se cogitar suspensão do processo em razão do julgamento do Tema 326, da TNU, uma vez que não há determinação nesse sentido na decisão de afetação do tema pela TNU. Debruço-me, portanto, sobre as preliminares. No tocante à ilegitimidade passiva levantada pelo INSS, deve-se salientar que a autarquia é parte legítima na demanda. Com efeito, a causa de pedir refere-se a ato praticado pelo INSS (efetuar descontos em benefício previdenciário/proventos de seus servidores/pensionistas), além do que, após a consignatária informar os débitos, o INSS procede à gestão dos descontos que são solicitados pela entidade privada. No sentido da legitimidade do INSS, confira-se o seguinte julgado: ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FRAUDULENTO. INDENIZAÇÃO. LEGITIMIDADE E RESPONSABILIDADE DO INSS. REEXAME DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1. O INSS é responsável pelo repasse às instituições financeiras das parcelas descontadas dos proventos de aposentadoria por força de contratação de empréstimo consignado, ainda que o banco contratado seja diverso daquele em que o aposentado recebe o benefício. 2. O Tribunal de origem, com arrimo no conjunto probatório dos autos, consignou que a autarquia previdenciária não procedeu de forma diligente, a fim de se certificar sobre a existência da fraude, de maneira que restou caracterizada a responsabilidade do INSS pela produção do evento danoso. A alteração dessa conclusão, tal como colocada a questão nas razões recursais, demandaria, necessariamente, novo exame dos elementos fáticos constante dos autos, providência vedada em recurso especial, conforme o óbice previsto na Súmula 7/STJ. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ, AGRESP 201300643741, Relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJE 12/09/2013, unânime.) Grifos acrescidos Ademais, a Turma Nacional de Uniformização reiteradamente tem decidido pela legitimidade da autarquia para figurar no polo passivo deste tipo de demanda. Por ocasião do julgamento do PEDILEF 0020817-79.2008.4.01.3900, em março de 2014, restou assentado que, sendo a autarquia previdenciária responsável pela administração do pagamento dos benefícios, efetivando os descontos referentes aos empréstimos, há nexo de causalidade entre sua conduta e a produção do dano alegado. Assim sendo, reconhece-se a legitimidade passiva do INSS e, por conseguinte, a competência da Justiça Federal para julgar o feito. Já no que concerne à prescrição, em regra, tem-se que o prazo prescricional quanto à Fazenda Pública é quinquenal, conforme previsto no art. 1º do Decreto n. 20.910/32, bem como também será de cinco anos aquele aplicável à instituição financeira, por força do art. 27 da Lei n. 8.078/90. Todavia, a prescrição que envolva relação que não a de consumo, como o caso de associação e cuja causa de pedir respeite à inexistência de relação entre o vitimado pelo desconto dito indevido e a entidade associativa não será regida pela Lei n. 8.078/90, mas, sim, pelo art. 206, § 3º, V do Código Civil, por se tratar de responsabilidade aquiliana ou extracontratual. Vejamos: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC INEXISTENTE. MERO INCONFORMISMO. INTERESSE DE AGIR. INVIABILIDADE DE ANÁLISE CONTRATUAL. SÚMULA 5/STJ. RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL. INAPLICABILIDADE DO ART. 206, § 3º, V, DO CÓDIGO CIVIL. SUBSUNÇÃO À REGRA GERAL DO ART. 205 DO CÓDIGO CIVIL. ENTENDIMENTO PACIFICADO NO ERESP 1.281.594/SP. SÚMULA 568/STJ. APURAÇÃO CONTÁBIL DE VALORES DEVIDOS. REVISÃO. SÚMULAS 5/STJ E 7/STJ. 1. Inexiste a alegada violação do art. 1.022 do CPC, visto que o Tribunal de origem efetivamente enfrentou a questão levada ao seu conhecimento, qual seja, se era devido por parte das recorrentes, ora agravantes, o pagamento por serviços prestados que ultrapassaram os termos entabulados em contrato de serviço para tratamento de arquivos que seriam entregues ao Fisco. 2. A propósito do contexto recursal, destacou a origem que as preliminares de falta de interesse e de prescrição não prosperavam, enquanto, no mérito em si, a sentença não comportaria alteração, visto que, à luz de todo o contexto probatório dos autos, em especial da perícia judicial feita, ficou comprovado que a autora prestou serviço além do contratado, sendo devido, consequentemente, o pagamento por aquilo que ultrapassou as disposições contratuais. 3. Quanto ao interesse de agir, o Tribunal foi categórico ao concluir que "A arguição de ausência de interesse de agir é de todo descabida, diante da inquestionável necessidade do provimento jurisdicional", cuja alteração, nos moldes delineados pela recorrente nas razões de seu apelo, porquanto baseada essencialmente em alegação de que a análise de cláusula contratual levaria à conclusão de ausência de interesse de agir, encontra intransponível óbice nos preceitos da Súmula n. 5/STJ: "A simples interpretação de cláusula contratual não enseja Recurso Especial". 4. Sem amparo a pretensão da parte de que seja aplicado o prazo trienal previsto no art. 206, § 3º, V, do CC, pois a Corte Especial do STJ há muito já consagrou que a "reparação civil" empregada nos termos do citado dispositivo se refere unicamente à responsabilidade civil aquiliana ou extracontratual (EREsp n. 1.281.594/SP, relator Ministro Benedito Gonçalves, relator para acórdão Ministro Felix Fischer, Corte Especial, DJe de 23/5/2019), o que nem de perto é a hipótese dos autos, visto que toda a questão jurídica dos autos circunda questão contratual firmada entre as partes. Súmula n. 568/STJ. 5. O acolhimento das alegações relativas à afronta aos arts. 112, 113 e 422 do CC e 373, I, do CPC e o argumento de que nada é devido à parte autora, em contraposição ao que assentaram as instâncias de origem, em especial após a realização de perícia judicial que concluíra que ocorrera serviço adicional ao contratualmente estipulado, demandaria reexame de disposições contratuais e de todo o acervo fático-probatório dos autos, o que esbarra nos óbices das Súmulas n. 5/STJ e 7/STJ. Agravo interno improvido. (AgInt no REsp n. 2.027.920/RJ, relator Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, julgado em 16/10/2023, DJe de 18/10/2023.) Por outro lado, a prescrição permanece com o prazo quinquenal em relação ao ente público, consoante o art. 1º do Decreto n. 20.910/32, dada a especialidade da norma, bem como consta no Tema 553 do STJ. Em síntese, nas demandas relacionadas a descontos não contratados em benefícios previdenciários/assistenciais, o prazo será quinquenal quando envolvidos o INSS e instituição financeira, ao passo que será trienal no que diz respeito às relações que não envolvam instituições financeiras, como associações ou entidades semelhantes, preservado o lapso quinquenal quanto ao INSS, conforme posicionamento presente no AgInt no REsp 1799862/MS, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 29/06/2020, DJe 05/08/2020. Outrossim, afasto a preliminar de ausência de interesse de agir, uma vez que a parte autora não está obrigada a formular prévio requerimento administrativo como condição ao ajuizamento da presente demanda. Rejeito também a alegação de inépcia da inicial por ter o autor comprovado os descontos em seu benefício. Igualmente, rejeito a impugnação à procuração, já que esta é regular. Apreciadas as preliminares, passo, pois, a análise do mérito. No caso ora sob apreciação, pretende a parte autora a anulação do negócio jurídico entabulado entre as partes, referente a desconto em folha, uma vez que alega não ter autorizado o aludido desconto. Sobre a natureza jurídica da referida contribuição, em uma primeira análise, nota-se que o valor descontado se assemelha a uma contribuição sindical, que corresponde ao antigo "imposto sindical", criado em 1940, pelo Decreto nº 2.377. A Constituição Federal de 1988 recepcionou esta exação, a ela fazendo menção em seu art. 8º, IV, in fine, o qual prediz que: É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte: (...) IV - a assembleia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei. A CLT, por sua vez, é o diploma infraconstitucional que regulamenta a contribuição sindical, prescrevendo normas a ela atinentes entre os artigos 578 e 610. É importante que se diga que com a reforma trabalhista promovida pela Lei 13.467/2017, a cobrança da contribuição sindical depende de prévia e expressa autorização do trabalhador (art. 578 da CLT), sendo cobrada de maneira anual, tal como previsto pelo art. 580 da CLT. Ademais, cumpre anotar que o STF reconheceu a constitucionalidade da cobrança facultativa ao julgar a ADI 5794 e a ADC 55 (Tribunal Pleno, Red. p/ o acórdão Min. Luiz Fux, j. 29/6/2018). Além disso, é importante que se diga que as mesmas restrições relativas à prévia autorização dos beneficiários do RGPS se aplicam às demais mensalidades e contribuições voluntárias, tal como se observa da norma constante do art. 115, V, da Lei 8.213/91: Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios: [...] V - mensalidades de associações e demais entidades de aposentados legalmente reconhecidas, desde que autorizadas por seus filiados. Sendo assim, a conclusão a que se chega é que independentemente da natureza jurídica do desconto, seja contribuição sindical ou mensalidade voluntária, a ausência de prévia autorização constitui ato ilícito e lesivo ao patrimônio da parte autora. Da análise dos extratos do benefício juntados aos autos pela parte autora, verifica-se que, de fato, está havendo desconto vergastado no seu benefício 03/2024 a 04/2024 (id. 50816214). O INSS apresentou contestação e pugnou pela improcedência do pedido por alegar não haver conduta ilícita. Por outro lado, a Associação corré, apresentou suposto termo de adesão eletrônico mediante assinatura eletrônica, através de sistema com geração de código hash, cuja autenticidade foi impugnada pela parte autora. Nesse ponto, cabe destacar que a MP 2.200-2/2001 instituiu a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, para garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos em forma eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações habilitadas que utilizem certificados digitais, bem como a realização de transações eletrônicas seguras, cuja autoridade certificadora raiz é o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação – IT. De acordo com art. 10 da referida medida provisória, os documentos em forma eletrônica produzidos com a utilização de processo de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil presumem-se verdadeiros em relação aos signatários. Possibilita, ainda, que a autoria e integridade do documento eletrônico seja auferida por outro meio de comprovação, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento: Art. 10. Consideram-se documentos públicos ou particulares, para todos os fins legais, os documentos eletrônicos de que trata esta Medida Provisória. § 1° As declarações constantes dos documentos em forma eletrônica produzidos com a utilização de processo de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil presumem-se verdadeiros em relação aos signatários, na forma do art. 131 da Lei no 3.071, de 1o de janeiro de 1916 - Código Civil. § 2º O disposto nesta Medida Provisória não obsta a utilização de outro meio de comprovação da autoria e integridade de documentos em forma eletrônica, inclusive os que utilizem certificados não emitidos pela ICP-Brasil, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento. No caso, analisando a documentação apresentada pela ré, verifico não haver provas aptas a demonstrar que tal contrato foi efetivamente celebrado pela parte demandante, pois na “Ficha de Filiação” consta que os documentos foram assinados eletronicamente, mediante assinatura eletrônica, através de sistema com geração de código hash. Contudo, não há como se comprovar a autenticidade/veracidade da assinatura eletrônica, especialmente quanto a sua autoria, uma vez que não prova de que fora produzido com a utilização de processo de certificação disponibilizado pela ICP-Brasil, que pudesse confirmar que a assinatura eletrônica é da parte autora. Desse modo, reputo que inexistem quaisquer provas no feito de que houve prévia solicitação ou consentimento da parte autora na contratação do negócio jurídico discutido. Devem, pois, os réus cancelarem os descontos realizados mediante fraude, e ainda, compete à Associação ré restituir os valores indevidamente deduzidos do benefício objeto dos autos. Sendo assim, outra solução não há senão declarar a inexistência de relação entre a parte autora e a Associação ré e a consequente suspensão dos descontos questionados. Em vista disso, nos termos do art. 927 do Código Civil de 2002, “aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”, sendo independentemente de culpa nos casos especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar por sua natureza risco para os direitos de outrem (parágrafo único). A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público e das de direito privado prestadoras de serviços públicos é objetiva, independentemente de culpa, e está prevista no art. 37, § 6º, da Constituição Federal: "As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa". Assim, são pressupostos da responsabilidade civil: a) a prática de uma ação ou omissão ilícita (ato ilícito); b) a ocorrência de um efetivo dano moral ou patrimonial; c) o nexo de causalidade entre o ato praticado - comissivo ou omissivo. Importa ressaltar que quando se tratar de responsabilidade subjetiva impere ainda verificar a existência de culpa. O ato ilícito que causou o dano moral já restou devidamente demonstrado com a ocorrência dos descontos indevidos. Já o dano moral decorre da gravidade do ato ilícito em si, ou seja, está ínsito na própria ofensa, não havendo necessidade da parte autora comprovar a dor, tristeza ou humilhação. Diante disso, vislumbro a notória responsabilidade da associação ré por ausência de controle eficaz quanto à fraude existente no caso em apreço, haja vista que os elementos analisados são suficientes para firmar a certeza que o débito questionado não é legítimo, pois não foram observados os critérios de segurança que uma inscrição ensejadora de desconto exige, tais como confirmação dos dados com outras entidades e conferência da documentação apresentada com a pessoa que se apresentava diante do contratado. Não obstante, no tocante à responsabilidade civil do INSS, é cediço que o art. 115 da Lei nº 8.213/91 estabelece as hipóteses em que podem ser realizados descontos, pela autarquia, nos benefícios previdenciários. Por outro lado, o art. 6º da Lei nº 10.820/03 impõe como condição para a realização da retenção/consignação a existência de contrato escrito entre a associação e o aposentado/pensionista, ao passo que o art. 5º da IN INSS/PRES nº 28/08 prevê que os descontos só devem ser efetuados caso conste a assinatura do segurado contratante, ainda que realizada por meio eletrônico. Há de se observar que, por se encontrar adstrita ao princípio da legalidade estrita (art. 37, caput, da CR), a Administração Pública tem o poder-dever de verificar as autorizações que lhe são encaminhadas para fins de descontos em folhas de pagamento de servidores, proventos de aposentadoria e benefícios previdenciários (art. 115, inc. VI, da Lei nº 8.213/91; art. 154 do Decreto nº 3.048/99; art. 6º da Lei Federal nº 10.820/2003). Em outras palavras, não pode o INSS, sendo uma autarquia e, portanto, gozando do atributo de presunção de legitimidade dos seus atos, permitir o desvio de recursos em favor de terceiro que simplesmente alega ser credor, sem exigir qualquer prova do alegado crédito ou da autorização do segurado. De modo geral, em que pese o art. 6º da Lei n. 10.820/2003 permitir ao INSS realizar descontos autorizados pelos titulares do benefício, para pagamento de empréstimos, a efetivação dos descontos é ato praticado pela autarquia previdenciária, não havendo meios materiais das instituições financeiras se apropriarem de parcela de benefícios sem a autorização do INSS (PEDILEF 05126334620084058013, relator juiz federal Adel Américo De Oliveira, DJ 30/11/2012). Logo, demonstrado o nexo de causalidade, a autarquia previdenciária, por sua vez, deve ser responsabilizada pela sua atuação negligente ao autorizar descontos em benefícios previdenciários decorrentes de contratos ou autorizações inexistentes, violando o seu dever de cautela e vigilância em relação ao direito do segurado. Nesse ínterim, dispõe o Tema 183 da TNU, de relatoria do Juiz Federal Fábio Cesar Oliveira, DJE 18/09/2018, ipsi litteris: I - O INSS não tem responsabilidade civil pelos danos patrimoniais ou extrapatrimoniais decorrentes de “empréstimo consignado”, concedido mediante fraude, se a instituição financeira credora é a mesma responsável pelo pagamento do benefício previdenciário, nos termos do art. 6º, da Lei n. 10.820/03; II – O INSS pode ser civilmente responsabilizado por danos patrimoniais ou extrapatrimoniais, se demonstrada negligência, por omissão injustificada no desempenho do dever de fiscalização, se os “empréstimos consignados” forem concedidos, de forma fraudulenta, por instituições financeiras distintas daquelas responsáveis pelo pagamento dos benefícios previdenciários. A responsabilidade do INSS, nessa hipótese, é subsidiária em relação à responsabilidade civil da instituição financeira. Destaque-se que a responsabilidade do INSS deve ser aferida sob duas perspectivas distintas, quais sejam: a) inexiste responsabilidade civil da autarquia nas hipóteses em que a instituição credora do contrato impugnado é a mesma daquela responsável pelo pagamento do benefício previdenciário; b) há responsabilidade da autarquia, de natureza subjetiva e subsidiária, nos casos em que a instituição financeira credora do contrato impugnado é distinta daquela responsável pelo pagamento do benefício previdenciário. Registre-se, neste ponto, que a demanda tem por objeto suposta relação associativa, e não contrato de empréstimo consignado; todavia, mutatis mutandis, aplica-se, por óbvio, o mesmo entendimento consagrado na Turma Nacional de Uniformização, ao julgar o PEDILEF 0500796-67.2017.4.05.8307(TEMA 183), no sentido de admitir da responsabilidade subsidiária do INSS quando demonstrado que não agiu com a cautela devida, autorizando desconto em benefício sem a prova da contratação. Logo, observando que a instituição financeira, ora demandada, é distinta da responsável pelo pagamento, além de que há notória omissão injustificada no tocante ao dever de fiscalização titularizado à autarquia, resta demonstrado, inequivocamente, a responsabilidade civil do INSS. Nesse pórtico, mister frisar que os descontos persistem de 03/2024 a 04/2024. Desta forma, a restituição pelos danos materiais causados deve ficar adstrita a quantia correspondente aos descontos efetuados, devendo se dar em dobro. De fato, o STJ ao julgar o EAREsp 676.608 (paradigma), bem como os EAREsp 664.888, EAREsp 600.663, EREsp 1.413.542, EAREsp 676.608 e EAREsp 622.697, em data de 21/10/2020 definiu: 1. A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que cobrou valor indevido, revelando-se cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva. 2. A repetição de indébito por cobrança indevida de valores referentes a serviços não contratados promovida por empresa de telefonia deve seguir a norma geral do lapso prescricional (10 anos, artigo 205 do Código Civil) a exemplo do que decidido e sumulado (Súmula 412/STJ) no que diz respeito ao lapso prescricional para repetição de medida de tarifas de água e esgoto. 3. Modular os efeitos da presente decisão para que o entendimento aqui fixado seja aplicado aos indébitos não-decorrentes da prestação de serviço público a partir da publicação do acórdão. Nesse pórtico, quanto à indenização por danos à esfera psíquica, deve-se salientar que o dano moral é caracterizado por uma lesão aos direitos da personalidade, estipulando-se um quantitativo pecuniário a título de lenitivo pelo sofrimento causado a uma determinada pessoa, nunca como um “preço” pela ofensa perpetrada. Em relação às pessoas naturais, consiste na ofensa à sua integridade física, psíquica ou moral (honra subjetiva). O direito subjetivo de exigir a reparação do prejuízo extrapatrimonial pressupõe, dessa forma, a ocorrência de uma ofensa anormal à personalidade. Ademais, tem-se que o ato ilícito praticado pelos réus, consistente no desconto de verba alimentar, ensejou dano à esfera psicológica da parte autora, na medida em que impossibilitou o recebimento dos valores. Da análise dos autos, está claro o desgaste psicológico da demandante em razão dos transtornos provocados pelas condutas dos réus. Ora, a parte autora foi vítima de descontos em seus vencimentos sem que houvesse manifestado sua anuência, valores este que possuem inclusive caráter alimentar. Desse modo, o desconto de qualquer quantia em seu benefício ocasiona dano na medida em que a parte tem reduzidos os proventos com os quais conta para a sua sobrevivência, o que se acentua na espécie, por aparte requerente ser pessoa idosa. Com respaldo nos relatos e nas próprias circunstâncias dos descontos, pode-se afirmar, com segurança, a configuração do dano moral na espécie, na medida em que há nítido nexo causal entre o ato administrativo de realização dos descontos indevidos e o sofrimento a que foi submetida a parte autora. Não se trata, decerto, de mero dissabor ou aborrecimento, mas sim de grave abalo psíquico, consubstanciado nos sentimentos de angústia, ansiedade, incerteza e desequilíbrio no estado emocional vivenciados pela parte autora. A estipulação do quantum a ser pago como indenização pelo abalo moral sofrido deve considerar o grau de culpa para a ocorrência do evento danoso, a extensão do dano e as condições pessoais das partes envolvidas. Ao mesmo tempo, o montante da indenização não pode servir como fonte de enriquecimento indevido, devendo o magistrado pautar-se nos parâmetros da razoabilidade e da proporcionalidade para, analisadas as circunstâncias do caso concreto, fixar o valor que se afigure equânime. De outro modo, ao estabelecer a quantia a ser paga a título de indenização, o juiz deve fazê-lo em níveis razoáveis, ponderando fatores como o grau de culpa e o porte econômico das partes e mantendo a coerência com a realidade, de maneira que o valor estabelecido nem poderá ser de tal forma inexpressivo, que em nada compense o ofendido ou não signifique desestímulo para o ofensor, tampouco excessivamente oneroso. Sendo assim, levando-se em consideração que os descontos na verba alimentar ocorreram por curto período, entendo devida a quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais) , que deverá sofrer a incidência de correção monetária e juros. Em suma, reconheço a responsabilidade civil da instituição demandada e do INSS, quanto a este último de caráter subsidiária, condenando os demandados à restituição dobrada dos valores indevidamente descontados do benefício previdenciário da parte autora (artigo 940 do Código Civil), conforme entendimento da Turma Recursal do RN, senão vejamos: Autos nº 0000320-42.2024.4.05.8404 EMENTA: ADMINISTRATIVO. CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DESCONTO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO. DANO MORAL. MAJORAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. POSSIBILIDADE. PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. DEMANDAS EM MASSA, A INDICAREM UM PADRÃO DE, NO MÍNIMO, NEGLIGÊNCIA, POR PARTE DO INSS, SEM PREJUÍZO DE APURAÇÃO DE RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA, CÍVEL E PENAL DE QUEM DE DIREITO. PROVIDÊNCIAS NECESSÁRIAS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO AUTORAL PROVIDO. RECURSO DO INSS IMPROVIDO. RECURSO DA ASSOCIAÇÃO IMPROVIDO. [...] Francisco Glauber Pessoa Alves Juiz Federal da 3ª. Relatoria III – DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE a pretensão autoral, para: a) declarar a inexistência de contratação e condenar as rés na repetição do indébito sobre o valor indevidamente descontado (03/2024 e 04/2024), em dobro, quantia sobre a qual deve incidir correção monetária a partir da data do efetivo prejuízo (Súmula 43/STJ) e juros de mora a partir do evento danoso (Súmula 54/STJ); b) condenar a CAAP ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) em favor da parte autora, quantia sobre a qual deve incidir correção monetária a partir do arbitramento (Súmula 362/STJ) e juros de mora a partir do evento danoso (Súmula 54/STJ), calculados segundo os indexadores e percentuais presentes no Manual de Cálculos da Justiça Federal; c) condenar o INSS, de forma subsidiária, ao pagamento dos danos materiais e morais reconhecidos nos itens anteriores. Defiro a concessão dos benefícios da gratuidade judiciária à autora. Sem condenação em honorários advocatícios e custas processuais, por força do delineado nos arts. 1º, da Lei nº 10.259/01, e 55, da Lei nº 9.099/95. Publicação e registro decorrem da validação da sentença no sistema eletrônico. Intimem-se. Caicó/RN, data da assinatura no sistema. CAIO DINIZ FONSECA Juiz Federal Substituto na 9ª Vara/SJRN
Conteúdo completo bloqueado
Desbloquear