Processo nº 3000082-19.2025.8.06.0112
ID: 276554635
Tribunal: TJCE
Órgão: 3ª Vara Cível da Comarca de Juazeiro do Norte
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 3000082-19.2025.8.06.0112
Data de Disponibilização:
22/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MARCONE MENDES DA SILVA
OAB/CE XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ Comarca de Juazeiro do Norte - 3ª Vara Cível da Comarca de Juazeiro do Norte Rua Maria Marcionilia Pessoa Silva, Lagoa Seca - CEP 63046-550, Fone: (85) 98108-8533,…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ Comarca de Juazeiro do Norte - 3ª Vara Cível da Comarca de Juazeiro do Norte Rua Maria Marcionilia Pessoa Silva, Lagoa Seca - CEP 63046-550, Fone: (85) 98108-8533, Juazeiro do Norte-CE - E-mail: juazeiro.3civel@tjce.jus.br Processo nº: 3000082-19.2025.8.06.0112 Classe: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Assunto: [Indenização por Dano Moral] Parte Autora: AUTOR: AZENI MARTINS PEREIRA Parte Promovida: REU: ABRASPREV ASSOCIACAO BRASILEIRA DOS CONTRIBUINTES DO REGIME GERAL DA PREVIDENCIA SOCIAL SENTENÇA I - RELATÓRIO. Vistos etc. Trata-se de ação ajuizada por AZENI MARTINS PEREIRA em desfavor de ABRASPREV - ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DOS CONTRIBUINTES DO REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL, por meio da qual tenciona provimento jurisdicional que: (i) declare a inexistência da relação contratual, (ii) condene a Parte Promovida (ii.1) à devolução em dobro dos valores indevidamente descontados, e (ii.2) ao pagamento de indenização por danos morais. Para tanto, argui a Parte Autora, em estreita síntese, que: É beneficiária do INSS sob o nº 156.544.312-5, por meio do qual recebe aposentadoria por idade; Percebeu uma diminuição no valor do seu benefício e, ao analisar os seus extratos, verificou a ocorrência de desconto, iniciado no mês de junho de 2024, no valor de R$57,60, sob a rubrica "CONTRIB. ABRASPREV - 0800 359 0021", em nome da Entidade Promovida; Desconhece a natureza dos débitos, pois nunca contratou quaisquer serviços da Promovida, assim como não autorizou qualquer desconto. Inicial instruída com os documentos de id's 132163817 a 132163820. Em id 132418208 repousa decisão interlocutória deferindo a gratuidade da justiça requerida. Citada, a Parte Promovida apresentou contestação de id 142433754, por meio da qual requereu a gratuidade da justiça e veiculou as seguintes teses: (i) ausência do interesse de agir; (ii) impugnação a gratuidade da justiça; (iii) inaplicabilidade do Código de defesa do consumidor e regularidade do contrato pactuado; (iv) ausência de dever referente a devolução dos valores descontados; (v) inexistência de abalo moral passível de indenização. Audiência conciliatória infrutífera (id 152421942). É o breve relatório. Decido. II. FUNDAMENTAÇÃO Antes de adentrar ao mérito, imperioso examinar as preliminares arguidas pela Parte Promovida. II.1) DA PRELIMINAR DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR A Parte Promovida pleiteou a extinção do processo por ausência de interesse processual. Compulsando os autos, não há de prevalecer o argumento trazido pela Parte Promovida, uma vez que a ausência de reclamação administrativa não impede o acesso à jurisdição. Portanto, verifica-se facilmente a existência do interesse de agir quando do protocolo da presente ação. Por conseguinte, rejeito a preliminar alegada pela Parte Promovida. II.2 - DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA REQUERIDA PELA PARTE PROMOVIDA Inicialmente, percebo que a Parte Promovida pugna pelos benefícios da justiça gratuita na Contestação, sob o argumento de que não pode arcar com as custas processuais e honorários advocatícios, pedido nunca antes apreciado. Embora informe não dispor de recursos para custear as despesas processuais, limita-se o Promovido a requerer a gratuidade sem apresentar documentos suficientes para comprovar a impossibilidade do pagamento das custas e despesas processuais. Havendo fundadas razões, colhidas das provas dos autos e das circunstâncias do caso, o Magistrado poderá afastar a presunção de veracidade da declaração de hipossuficiência e indeferir o pleito de gratuidade da justiça. Nesse sentido, colaciono ementa de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Ceará: "PROCESSO CIVIL E DIREITO CIVIL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C ANTECIPAÇÃO DE TUTELA E DANOS MORAIS. PEDIDO RECURSAL DE JUSTIÇA GRATUITA. PESSOA JURÍDICA. ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE DE AUXÍLIO MÚTUO DOS SERVIDORES PÚBLICOS ABAMSP. INDEFERIMENTO. HIPOSSUFICIÊNCIA NÃO COMPROVADA. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA 481, DO STJ. DESCONTOS INDEVIDOS EM PROVENTOS DE PENSÃO DA AUTORA. AUSÊNCIA DE VÍNCULO COM A INSTITUIÇÃO PROMOVIDA. DANO MORAL. CARACTERIZAÇÃO. MINORAÇÃO DO QUANTUM ARBITRADO. DESCABIMENTO. INDENIZAÇÃO FIXADA COM PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. SENTENÇA A QUO MANTIDA. 1. DA JUSTIÇA GRATUITA. Encontra-se pacificada a jurisprudência no sentido de que as pessoas jurídicas, embora possam gozar dos benefícios da Justiça Gratuita, devem comprovar, de forma consistente, que não possuem recursos para arcar com os encargos processuais. 2. O entendimento foi sedimentado na Súmula 481 do STJ: "Faz jus ao benefício da justiça gratuita a pessoa jurídica com ou sem fins lucrativos que demonstrar sua impossibilidade de arcar com os encargos processuais." 3. Na espécie, a associação recorrente não juntou documentos que comprovassem efetivamente sua alegada falta de recursos, apenas trouxe aos autos Declaração de hipossuficiência (fl. 75), relação de rescisões (fl 76) e cópia de informação de cobrança de mensalidades do Banco Icatu (fl. 77), não havendo pois prova efetiva da alegada impossibilidade do pagamento das custas e despesas processuais. Anota-se que alegativa de não possuir "recursos financeiros para arcar com o preparo recursal" (sic fl. 68), por si só, não é apta a ensejar a concessão do benefício pretendido, razão pela qual indefere-se o pedido de concessão de justiça gratuita. 4. DO MÉRITO. Trata-se de Apelação Cível visando a reforma da sentença que julgou parcialmente procedente o pedido exordial, arbitrando a indenização a título de danos morais no importe de R$3.000,00 (três mil reais). Em suas razões, a demandada requer a reforma da decisão a quo no que pertine a minoração do quantum indenizatório. 5. Em se tratando de descontos de pensão, cujos valores são comumente reduzidos e restringem-se à estrita manutenção do recebedor, qualquer desconto indevido causa sentimentos de angústia, preocupação e frustração acima da normalidade, a causar o prejuízo moral invocado. Indenização que deve ser arbitrada com proporcionalidade e razoabilidade. 6. Assim, considerando as particularidades do caso concreto, é de se concluir que a quantia de R$3.000,00 (três mil reais) arbitrada na r. sentença bem indeniza o prejuízo da autora sem causar enriquecimento indevido, razão pela qual afasta-se o pedido de minoração do quantum fixado, uma vez que não se mostra irrisório e nem excessivo, ante a grave conduta da empresa ré. 7. Recurso conhecido e improvido. Sentença mantida." (TJ-CE - AC: 01087993420198060001 CE 0108799-34.2019.8.06.0001, Relator: MARIA DE FÁTIMA DE MELO LOUREIRO, Data de Julgamento: 24/11/2021, 2ª Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 24/11/2021) Saliento que este também é o entendimento sedimentado na Súmula 481 do STJ: "Faz jus ao benefício da justiça gratuita a pessoa jurídica com ou sem fins lucrativos que demonstrar sua impossibilidade de arcar com os encargos processuais." Ante o exposto, INDEFIRO o pedido de concessão de gratuidade processual à Parte Promovida. II.3) DA IMPUGNAÇÃO AO PEDIDO DE GRATUIDADE DA JUSTIÇA FORMULADO PELA PARTE AUTORA. A Parte Promovida apresentou Impugnação ao pedido de gratuidade da justiça formulado pela Parte Autora, sob o argumento de que a parte Autora não demonstrou hipossuficiência para arcar com as custas do processo. Analisando os autos com acuidade, não vislumbro elementos suficientes ao acolhimento da impugnação. Explico. É ônus da Parte Impugnante a prova de que a Parte Impugnada não faz jus ao benefício da assistência judiciária gratuita. Não trazendo essa prova, não há como ser deferido o pedido. O fato de a Parte Autora haver celebrado contrato de financiamento de veículo ou por ter apresentado provas de sua hipossuficiência, por si só, não é suficiente a lhe afastar a possibilidade de concessão dos benefícios gratuidade da justiça, especialmente quando se tem em mira o estado de inadimplência contratual, a indicar possível incapacidade de arcar com as despesas do processo. Não se divisa dos cadernos processuais qualquer prova de que a Parte Autora possua condições financeiras suficientes para arcar com as despesas do processo sem gerar qualquer prejuízo para os sustentos próprio e de sua família. Nesse contexto, impõe-se privilegiar a presunção relativa de veracidade da declaração de hipossuficiência econômica da Parte Autora (id 132163817), conforme previsão do art. 99, §3º, do Código de Processo Civil, verbis: §3º. Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural. Em situação paradigmática, assim decidiu o Egrégio Tribunal de Justiça da Bahia: "APELAÇÃO CÍVEL. IMPUGNAÇÃO À ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. ÔNUS DA PROVA DA IMPUGNANTE. Documentos que não se prestam para afastar a presunção de necessidade. A pura existência de bens em nome da parte impugnada não enseja de pronto o indeferimento do pedido de assistência judiciária gratuita haja vista que o que tem que ser levado em consideração é se, no momento da propositura da ação, a parte possuía ou não condições financeiras de arcar com as despesas do processo, sem prejuízo do seu próprio sustento e de sua família. RECURSO IMPROVIDO. (TJ/BA - Apelação Cível nº. 0381622-93.2012.8.05.0001, Quarta Câmara Cível, Rel. Des. José Olegário Monção Caldas, DJ 27/04/2018 ). Nesse contexto, à luz das circunstâncias fáticas e dos ensinamentos legal e jurisprudencial trazidos à baila, impõe-se rejeitar a Impugnação à Gratuidade da Justiça e, de ricochete, manter o benefício concedido à Parte Autora. II.2) MÉRITO. O feito se encontra apto a receber julgamento de mérito, porquanto reúne as condições da ação e os pressupostos processuais de existência e de validade, assim como inexistem questões processuais pendentes de apreciação e desnecessária a produção de outras provas senão a documental, possibilitando assim o julgamento antecipado da lide, por versar os autos de matéria unicamente de direito e ser desnecessária a produção de prova oral. Assim, anuncio o julgamento antecipado do mérito nos termos do art. 355, I, do Código de Processo Civil. Por razões didáticas, passo a enfrentar o mérito da presente ação em tópicos específicos conforme cada argumento ventilado na peça vestibular. II.2.1) DA DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DO CONTRATO. Objetiva a Parte Autora a declaração de inexistência do contrato de associação, bem como a devolução do valor dos descontos dele decorrentes realizados em seu benefício previdenciário, sob o argumento de que não realizou as contratações e nem utilizou os serviços da Parte Promovida. De início, registro a incidência ao caso das normas estatuídas no Código de Defesa do Consumidor (Lei nº. 8.078/90), porquanto a avença supostamente celebrada entre as Partes ser tipicamente de consumo, figurando-se a Parte Autora como adquirente de serviços e a Parte Promovida como prestador de serviços. O reconhecimento de tal circunstância impõe a aplicação dos artigos 6º, "VI" e "VIII" do Código de Defesa do Consumidor. No caso concreto, a hipossuficiência está presente no campo técnico, uma vez que o consumidor não possui capacidade de produzir a prova de que não realizou a contratação dos serviços, devendo a Parte Promovida arcar com o respectivo onus probandi. O cerne da quizila orbita em torno da legalidade do contrato supostamente firmado entre as Partes e consequente legalidade dos descontos. Da análise dos documentos juntados aos autos, conclui-se que a Parte Autora teve valores descontados de seu benefício previdenciário, decorrente de contratação junto à Parte Ré. O documento de id 132163818 demonstra que foram descontadas parcelas mensais de R$57,60, sob a rubrica "CONTRIB. ABRASPREV", tendo os descontos mensais se iniciado em junho de 2024. Considerando a comprovação da realização dos descontos, entendo que caberia à Parte Promovida trazer aos autos prova de que o negócio de fato existiu, apresentando qualquer documento que pudesse atribuir a realização da contratação pela Parte Autora. Entretanto, verifica-se que a Parte Promovida não apresentou o contrato pactuado devidamente assinado, nem cópias dos documentos pessoais da Parte Autora utilizados para a suposta contratação. Portanto, a Parte Promovida não fez prova da regularidade do contrato impugnado e nem do débito dele decorrente. Em tais casos, a jurisprudência pátria entende pela inexistência da relação jurídica. A respeito do tema, colaciono ementa de acórdão oriundo do Egrégio Tribunal de Justiça do Ceará: "CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. DESCONTO INDEVIDO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO IMPROVIDO. 1. Cuidam os presentes autos de apelação cível interposta pela Associação Nacional de Aposentados e Pensionistas da Previdência Social - ANAPPS, contra sentença oriunda do Juízo da 4ª Vara Cível da Comarca de Fortaleza/CE que julgou a lide procedente para condenar a recorrente a cessar os descontos no benefício previdenciário da autora, ora apelada, bem condenar a recorrente ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), acrescido de correção monetária, desde a presente data até o efetivo pagamento (Súmula 362 do STJ), e de juros moratórios de 1% ao mês, desde a citação. 2. Como ficou constatado em primeira instância, a parte ré/apelante não colacionou documento que comprovasse a efetiva associação ou filiação da parte autora/recorrida perante a respectiva associação. Dessa forma, conclui-se que a recorrente não cumpriu com o seu ônus de provar fato modificativo, extintivo ou impeditivo do direito do autor (art. 373, II, do NCPC). 3. In casu, remanesce incontroverso nos autos que a recorrente efetuou descontos mensais indevidos no benefício previdenciário da parte apelada, situação que extrapola a esfera do mero aborrecimento e configura dano moral. 4. APELAÇÃO CÍVEL. DESCONTOS INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. CONTRIBUIÇÃO DE ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE DE AUXÍLIO MÚTUO DOS SERVIDORES PÚBLICOS - ABAMSP. INEXISTÊNCIA DE PROVA DE ANUÊNCIA DA AUTORA. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO DOS DESCONTOS. ATO FRAUDULENTO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES EM DOBRO. MÁ-FÉ AFERIDA. DANO MORAL IN RE IPSA. CONFIGURADO. VERBA DE NATUREZA ALIMENTAR. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. (Relator (a): FRANCISCO BEZERRA CAVALCANTE; Comarca: Fortaleza; Órgão julgador: 13ª Vara Cível; Data do julgamento: 07/07/2020; Data de registro: 07/07/2020). 5. Seguindo precedentes desta Câmara e do STJ, entende-se que o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) atende às circunstâncias do caso, considerando a natureza da conduta e as consequências do ato. 6. Apelação conhecida, mas para negar-lhe provimento." (TJ-CE - AC: 01624813520188060001 CE, Relator: CARLOS ALBERTO MENDES FORTE, Data de Julgamento: 24/03/2021, 2ª Câmara Direito Privado) "APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. DESCONTO INDEVIDO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. AUSÊNCIA DE PROVA DA ANUÊNCIA. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO IMPROVIDO. 1. Como ficou constatado em primeira instância, a parte ré/apelante não colacionou documento que comprovasse a efetiva associação ou filiação da parte autora/recorrida perante a respectiva associação. Dessa forma, conclui-se que a recorrente não cumpriu com o seu ônus de provar fato modificativo, extintivo ou impeditivo do direito do autor (art. 373, II, do NCPC). 2. In casu, remanesce incontroverso nos autos que a recorrente efetuou descontos mensais indevidos no benefício previdenciário da parte apelada, situação que extrapola a esfera do mero aborrecimento e configura dano moral. 3. Seguindo precedentes desta Câmara e do STJ, entende-se que o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) atende às circunstâncias do caso, considerando a natureza da conduta e as consequências do ato. 4. Recurso improvido." (TJ-CE - AC: 00101166420198060064 Caucaia, Relator: CARLOS ALBERTO MENDES FORTE, Data de Julgamento: 08/06/2022, 2ª Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 08/06/2022) No caso, enquanto a Parte Autora apresentou os documentos de id 132163818, indicando a realização de descontos de parcelas com a rubrica "CONTRIB. ABRASPREV", a Parte Ré não impugnou de forma específica tal informação, não tendo apresentado cópia do contrato que legitimasse o negócio ou justificasse os descontos realizados. Cabendo, pois, à Parte Promovida o ônus de provar a regularidade do débito negado pela Parte Autora ou à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito, não tendo ela se desonerado de tal mister, atraiu em seu prejuízo a presunção de veracidade dos fatos alegados na inicial, conforme dispõe o Código de Processo Civil, nos termos do artigo 373, "II". Nessa quadra, impõe-se reconhecer a irregularidade e declarar a inexistência do contrato de associação ou filiação da parte autora perante a associação promovida, que gerou as cobranças denominadas "CONTRIB. ABRASPREV", bem como a nulidade de todos os descontos dele decorrentes. Uma vez demonstrada a ilegalidade dos descontos realizados, passo a análise do pedido de repetição de indébito em dobro trazido na inicial. II.2.2) DA REPETIÇÃO DE INDÉBITO. A Parte Autora requer a condenação da Promovida a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados. Tal requerimento encontra amparo legal no art. 940, do Código Civil e no art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, cuja reprodução literal é forçosa: Art. 940. Aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição. (art. 940, CC). Art. 42. (...) Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. (art. 42, p. único, CDC). A repetição de indébito, na forma preceituada pelos dispositivos legais citados, mostra-se cabível quando a cobrança representar conduta contrária à boa-fé objetiva. Este também é o entendimento atual do Colendo Superior Tribunal de Justiça, conforme tese firmada no julgamento do EARESP nº. 676.608/RS: "DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. HERMENÊUTICA DAS NORMAS DE PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC. REQUISITO SUBJETIVO. DOLO/MÁ-FÉ OU CULPA. IRRELEVÂNCIA. PREVALÊNCIA DO CRITÉRIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. MODULAÇÃO DE EFEITOS PARCIALMENTE APLICADA. ART. 927, § 3º, DO CPC/2015. […] 13. A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida, revelando-se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva. (...) Modulação dos efeitos: Modulam-se os efeitos da presente decisão - somente com relação à primeira tese - para que o entendimento aqui fixado quanto à restituição em dobro do indébito seja aplicado apenas a partir da publicação do presente acórdão. A modulação incide unicamente em relação às cobranças indevidas em contratos de consumo que não envolvam prestação de serviços públicos pelo Estado ou por concessionárias, as quais apenas serão atingidas pelo novo entendimento quando pagas após a data da publicação do acórdão" […] (STJ, EAREsp 676.608/RS, Rel. para Acórdão Min. Herman Benjamin, CORTE ESPECIAL, julgamento em 21/10/2020, publicação DJe: 30/03/2021) Tal entendimento contrapõe-se à tese anteriormente defendida, que exigia a comprovação da má-fé da cobrança para que fosse cabível a repetição em dobro. Todavia, a tese ao norte colacionada também determinou a modulação dos seus efeitos, aplicando-se somente em relação às cobranças realizadas após a publicação do acórdão paradigma, ou seja, após 30/03/2021. Assim, considerando que o presente processo foi ajuizado no ano de 2024, comprovados os descontos a partir de 06/2024 e não tendo a Parte Ré comprovado qualquer restituição administrativa, cabível a repetição do indébito em dobro. Neste sentido, deve a Parte Autora ser restituída no valor referente a todas as parcelas descontadas indevidamente do seu benefício previdenciário sob a rubrica "CONTRIB. ABRASPREV", em dobro, tudo a ser apurado oportunamente em sede de liquidação de sentença, devendo ser o valor corrigido monetariamente pelo IPCA (art. 389, parágrafo único, CC) desde a data de cada desembolso até a data citação, momento a partir do qual incidirá apenas a Taxa Selic de forma integral (art. 406, §1º, CC), a qual já engloba a correção monetária e os juros devidos a partir de então. II.2.3) DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. Noutro ponto, a Parte Autora persegue a condenação da Parte Promovida ao pagamento de indenização por danos morais pela realização de descontos oriundos do contrato cuja celebração desconhece. O dever de indenizar imprescinde da reunião dos pressupostos da responsabilidade civil, quais sejam: a) Ato ilícito; b) Conduta culposa (dolo ou culpa); c) Dano; e d) Nexo causal. A ausência de quaisquer destes pressupostos impõe a rejeição da pretensão indenizatória. A controvérsia recursal cinge-se em perquirir a legalidade dos descontos efetuados no benefício previdenciário da parte autora, decorrentes de suposta filiação à Parte Promovida. Consoante explanado no tópico pretérito, restou demonstrada a declaração de inexistência de pacto firmado entre as Partes, referente a contratação questionada nos autos e a nulidade dos descontos dela decorrentes. Neste sentido, remanesce incontroverso nos autos que a Parte Promovida efetuou descontos mensais indevidos no benefício previdenciário da Parte Autora. Por conseguinte, fácil é concluir pela ilicitude dos descontos realizados. Evidenciada a falha na prestação de serviços, impõe-se registrar a responsabilidade objetiva da Parte Promovida, consoante se extrai do Código de Defesa do Consumidor, art. 14, caput, que estabelece: "O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos". É cediço que a responsabilidade objetiva dispensa comprovação de culpa ou dolo por parte do prestador de serviço, somente podendo ser ilidida mediante a comprovação de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros, não verificada no caso em desate. Não se pode olvidar que os descontos realizados incidiram sobre verba de caráter alimentar. Em derredor do tema, colaciono ementa de acórdãos proferidos pelos Egrégios Tribunais de Justiça Pátrios em casos semelhantes: "DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. DESCONTOS INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE DE AUXÍLIO MÚTUO DOS SERVIDORES PÚBLICOS - ABAMSP. INEXISTÊNCIA DE PROVA DA FILIAÇÃO. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO PARA A DEDUÇÃO DAS QUANTIAS. DEVER DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES. DANO MORAL IN RE IPSA CONFIGURADO. PROPORCIONALIDADE DA IMPORTÂNCIA PROCLAMADA NA DECISÃO RECORRIDA. RECURSO CONHECIDO, MAS DESPROVIDO. 1. A controvérsia recursal cinge-se em perquirir a legalidade dos descontos efetuados no benefício previdenciário da parte autora/apelada, decorrentes de suposta filiação à ABAMSP - Associação Beneficente de Auxílio Mútuo ao Servidor Público, ora apelante, além da pertinência da adequação e do valor dos danos morais fixados na sentença. 2. Com efeito, restaram comprovados os descontos no benefício previdenciário da parte autora a título de contribuição à Associação. Por outro lado, a recorrente não demonstrou a licitude das deduções, porquanto não anexou qualquer documento para comprovar a associação da recorrida. Por consectário, a apelante não se desincumbindo do seu ônus probatório (art. 373, II do CPC). 3. Portanto, subsistem as condições para a responsabilização da associação demandada, por ato desprovido de licitude, na respectiva relação jurídica. Ademais, o prejuízo material experimentado pela demandante, conforme inteligência do art. 186 c/c art. 927 do Código Civil, encontra-se demonstrado no caderno processual. Por consequência, a determinação de restituição dos valores é escorreita. 4. Por outro vezo, a retenção indevida de parte do benefício previdenciário da idosa, a título de cobrança referente à ABAMSP, sem a comprovação da regular filiação/contratação, representa lesão ao patrimônio ideal. Isso, porque, reduz ainda mais o parco provento recebido pela inativa, que, sem dúvida, é absolutamente necessário ao seu sustento. Essa situação ultrapassa a esfera do mero dissabor do cotidiano. No ponto, a construção pretoriana proclama que, nestes casos, o dano moral é presumido. Precedentes. 5. E mais, a procedência do pedido, em decorrência da ilegitimidade dos descontos realizados no benefício previdenciário da parte apelada, cuja dedução recaiu sobre verba alimentar, malfere direitos da personalidade. Assim, considerando o caráter pedagógico da condenação, com o objetivo de evitar novas infrações pelo (a) apelante, mas também, sob outra perspectiva, obstar o enriquecimento sem causa da consumidora e um desequilíbrio financeiro da contraparte, mantenho o valor arbitrado da condenação por danos morais, em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), pois encontra-se dentro do razoável e do proporcional para reparar o constrangimento suportado. 6. Recurso conhecido, mas para não se prover." (TJ-CE - AC: 00013407520198060161 Santana do Acaraú, Relator: FRANCISCO DARIVAL BESERRA PRIMO, Data de Julgamento: 11/10/2022, 4ª Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 11/10/2022) "ASSOCIAÇÃO DE APOSENTADOS. DESCONTOS INDEVIDOS REALIZADOS EM PROVENTOS DE APOSENTADORIA DA AUTORA. AUSÊNCIA DE FILIAÇÃO À ENTIDADE. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO PARA OS DESCONTOS. PEDIDO DECLARATÓRIO PROCEDENTE. A sentença reconheceu a inexigibilidade dos descontos providenciados pelo réu nos proventos de aposentadoria da autora. Ausência de vinculação à entidade e de autorização para cobrança perpetrada. ASSOCIAÇÃO DE APOSENTADOS. DESCONTOS INDEVIDOS REALIZADOS EM PROVENTOS DE APOSENTADORIA DA AUTORA. DEVOLUÇÃO NA FORMA DOBRADA. MÁ-FÉ DO RÉU AO REALIZAR OS DESCONTOS SABIDAMENTE INDEVIDOS. O réu efetuou descontos indevidos em proventos de aposentadoria da autora. Fraude evidenciada, porquanto não houve qualquer contratação a justificar a cobrança. Perícia. Má-fé caracterizada. Cabimento da devolução na forma dobrada (art. 42, CDC; art. 940, CC). DANO MORAL. CARACTERIZAÇÃO. INDENIZAÇÃO FIXADA COM PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE. RECURSO DO RÉU NÃO PROVIDO. APELO ADESIVO DA AUTORA PROVIDO EM PARTE. Dano moral caracterizado. Em se tratando de descontos de aposentadoria, cujos valores são comumente reduzidos e restringem-se à estrita manutenção do recebedor, qualquer desconto indevido causa sentimentos de angústia, preocupação e frustração acima da normalidade, a causar o prejuízo moral invocado. Indenização que deve ser arbitrada com proporcionalidade e razoabilidade. Majoração (R$ 6.000,00) Recurso do réu não provido. Apelo adesivo da autora provido em parte." (TJ-SP - AC: 10367703220198260576 SP 1036770-32.2019.8.26.0576, Relator: J.B. Paula Lima, Data de Julgamento: 21/06/2022, 10ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 21/06/2022) Assim, resta caracterizado o dever da Parte Ré de indenizar a Parte Autora pelos danos morais causados, mormente por se tratar de responsabilidade civil objetiva e de hipótese em que o dano é presumido (in re ipsa), em virtude dos transtornos causados pelos descontos indevidos em seu benefício previdenciário, onde desnecessária se faz a comprovação de qualquer prejuízo. O nexo causal entre o dano experimentado pela Parte Autora e a conduta da Parte Promovida decorre dos próprios fatos. Presentes os pressupostos legais e ausente a incidência de causa excludente da responsabilidade civil, impõe-se a condenação da Parte Promovida ao pagamento de indenização por danos morais à Parte Autora. Na esteira do raciocínio supra, passo a fazer a fixação do valor da reparação moral, consideradas as regras doutrinárias e jurisprudenciais existentes e, ainda, as circunstâncias gerais e específicas do caso concreto. Nesta tarefa há que se considerar que o valor fixado deve se harmonizar, ainda, com a teoria do desestímulo - pela qual a indenização por dano moral deve ser reparatória, proporcionalmente ao dano sofrido, bem como penalizante, de forma a repercutir no patrimônio do ofensor, que deve ser desencorajado a praticar condutas semelhantes. Nessa ordem de ideias, considerando a peculiar situação da Parte Autora, que sofreu desfalque em sua verba alimentar, reputo satisfatório estipular o montante devido, a título de indenização pelo dano moral, o valor correspondente a R$5.000,00 (cinco mil reais). Desnecessárias outras considerações, procede a pretensão autoral. III - DISPOSITIVO. Por todo o exposto, e considerando o mais que consta dos fólios, JULGO PROCEDENTE A PRETENSÃO AUTORAL, para: (i) DECLARAR A INEXISTÊNCIA DO CONTRATO de associação ou filiação entre as Partes, que gerou as cobranças denominadas "CONTRIB. ABRASPREV", assim como a NULIDADE DOS DESCONTOS dele decorrentes, realizados em benefício previdenciário da Parte Autora sob a rubrica "CONTRIB. ABRASPREV"; (ii) CONDENAR A PARTE PROMOVIDA na obrigação de pagar quantia certa, consistente na devolução do valor referente a soma de todas as parcelas descontadas indevidamente do benefício previdenciário da Parte Autora sob a rubrica "CONTRIB. ABRASPREV", em dobro, tudo a ser apurado oportunamente em sede de liquidação de sentença, devendo ser o valor corrigido monetariamente pelo IPCA (art. 389, parágrafo único, CC) desde a data de cada desembolso até a data citação, momento a partir do qual incidirá apenas a Taxa Selic de forma integral (art. 406, §1º, CC), a qual já engloba a correção monetária e os juros devidos a partir de então e; (iii) CONDENAR A PARTE PROMOVIDA AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS EM FAVOR DA PARTE AUTORA NO VALOR DE R$ 5.000,00 (cinco mil reais), acrescido de juros de mora de 1% de acordo com a Taxa Selic deduzido o IPCA (art. 406, §1°, CC) a partir do evento danoso (art. 398 do CC e Súmula 54 do STJ) até a data da sentença (arbitramento), momento a partir do qual incidirá apenas a Taxa Selic de forma integral, pois já engloba os juros e a correção monetária devida a partir do arbitramento (Súmula 362, STJ). Condeno a Instituição Promovida ao pagamento das custas processuais e de honorários de sucumbência, que arbitro em 10% do valor da condenação (art. 85, §2º, CPC/15). P. R. I. Juazeiro do Norte, Ceará, 19 de maio de 2025. MATHEUS PEREIRA JUNIOR Juiz de Direito
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