1. Rafael Gomes Da Silva (Recorrente) x 2. Ministério Público Do Estado Do Paraná (Recorrido)
ID: 331636461
Tribunal: STJ
Órgão: SPF COORDENADORIA DE PROCESSAMENTO DE FEITOS DE DIREITO PENAL
Classe: RECURSO ORDINáRIO EM HABEAS CORPUS
Nº Processo: 0007643-17.2025.8.16.0000
Data de Disponibilização:
22/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
TIEMI SAITO
OAB/PR XXXXXX
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CASSIUS MARCELLUS GOBBO SECCO
OAB/PR XXXXXX
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RHC 218589/PR (2025/0234925-0)
RELATOR
:
MINISTRO CARLOS CINI MARCHIONATTI (DESEMBARGADOR CONVOCADO TJRS)
RECORRENTE
:
RAFAEL GOMES DA SILVA
ADVOGADOS
:
CASSIUS MARCELLUS GOBBO SECCO - PR061371
TIEMI…
RHC 218589/PR (2025/0234925-0)
RELATOR
:
MINISTRO CARLOS CINI MARCHIONATTI (DESEMBARGADOR CONVOCADO TJRS)
RECORRENTE
:
RAFAEL GOMES DA SILVA
ADVOGADOS
:
CASSIUS MARCELLUS GOBBO SECCO - PR061371
TIEMI SAITO - PR071911
RECORRIDO
:
MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ
DECISÃO
Trata-se de recurso ordinário em habeas corpus interposto por RAFAEL GOMES DA SILVA contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (Habeas Corpus nº N.º 0007643-17.2025.8.16.0000), que denegou a ordem na origem (e-STJ fls. 1004-1019).
Consta dos autos que o recorrente foi preso preventivamente e denunciado por associação criminosa e múltiplos estelionatos (infração aos artigos 288, caput, do Código Penal, art. 171, caput , c/c art. 61, II, alínea ‘b’ (para facilitar ou assegurar a execução de outro crime), do Código Penal, por cinco vezes; 171, §4º, c/c artigo 61, inciso II, alínea ‘h’ (enfermo), do Código Penal, por quinze vezes, e 171, caput, c/c art. 14, ambos do Código Penal, todos em concurso de agentes e em concurso material de crimes (art. 69, CP).
Impetrado habeas corpus no Tribunal de origem, a ordem foi denegada (e-STJ fls. 1004-1019 e 1041-1043).
A defesa interpôs recurso ordinário em habeas corpus sem pedido liminar (e-STJ fls.1051-1078).
O Ministério Público Federal se manifestou pelo não provimento recurso (e-STJ fls. 1091-1094),
É o relatório.
Decido.
Analisando-se o conteúdo da documentação colacionada aos autos, não se verifica de plano qualquer violação ao ordenamento jurídico ou flagrante constrangimento ilegal, que implique ameaça de violência ou coação na liberdade de locomoção do paciente, nos termos da Lei nº 14.836, de 8/4/2024, a justificar a concessão da ordem.
Insurge-se o recorrente contra a manutenção da prisão preventiva decretada pelo Juízo da 3ª Vara Criminal do Foro Central da Comarca de Londrina nos autos de Cautelar Inominada Criminal n.º 0075085- 89.2024.8.16.0014. O paciente está preso desde 16.01.2025. Sustenta a defesa que não estão presentes os demais requisitos para a decretação da segregação cautelar. Afirma que em caso de condenação possivelmente será apenado com o regime inicial semi-aberto. Alternativamente à revogação, pleiteia a concessão da prisão na modalidade domiciliar, pois o paciente é imprescindível para o cuidado de pessoa menor de 6 anos - é pai de duas crianças nesta faixa etária, sendo que uma delas encontra-se em tratamento psicológico e psiquiátrico.
O acórdão não conheceu o pedido em relação a alegada violação ao princípio da homogeneidade, reputando inadequado o manejo do habeas corpus para tal exame (e-STJ fls. 1006-1007).
Na extensão conhecida, a fundamentação para a manutenção da prisão preventiva foi analisada pelo tribunal de origem, concluindo pela existência de risco concreto de reiteração delitiva, haja vista as evidências de prática do delito na forma continuada. Além disso, a movimentação de vultosas quantias nas contas da organização – mais de 20 milhões de reais -, com esquema de atuação organizado e “profissional” em várias cidades do Paraná para lesar idosos, representa gravidade em concreto da conduta que justifica a manutenção da prisão preventiva.
Na completa e extensa fundamentação adotada pelo acórdão que denegou a ordem, consta, inicialmente, trecho da decisão do juízo competente que decretou a prisão preventiva: (e-STJ fls. 1007-
“(...)
Consoante se verifica dos elementos até agora coligidos, em meados de outubro de 2022, a empresa Trading Consultoria e Assessoria Financeira (razão social C K POMPEU COBRANÇAS), de propriedade de CAMILE KNAKIEVICZ POMPEU, instalou-se na avenida Rio de Janeiro, nº 221, Sala Comercial nº 11, nesta cidade e comarca.
Segundo os relatos dos empregados, o proprietário da empresa era WILLIAN LOHAN BATISTA DE DEUS, não obstante ser RAFAEL GOMES DA SILVA quem realmente administrava o negócio e atuava como gerente. Sob a direção de RAFAEL, foram contratados vendedores para trabalhar na firma, com a tarefa de captar clientes aposentados e pensionistas do INSS que possuíam empréstimos consignados em instituições financeiras. A oferta consistia em reduzir em 20% o valor das parcelas dos empréstimos, além de oferecer uma bonificação que variava de R$ 100,00 a R$ 1.000,00.
De acordo com o Ministério Público, quando as vítimas demonstravam interesse na proposta, eram persuadidas a comparecerem ao escritório, ou, em alguns casos, RAFAEL ia até a residência delas. Em tais ocasiões, elas eram informadas de que precisavam transferir um valor para a conta indicada por RAFAEL (que correspondia a um percentual da dívida do empréstimo consignado anteriormente contraído), a fim de viabilizar as transações financeiras que garantiriam os descontos e a bonificação prometidos. O acordo era formalizado com a assinatura de um “instrumento particular de assunção de dívida e outras avenças”, e as vítimas entregavam cópias dos seus documentos pessoais, além de tirarem uma selfie na empresa.
Após, os idosos se dirigiam ao banco, acompanhados por RAFAEL ou pelos funcionários, e transferiam o valor da dívida do empréstimo, e todas as quantias, que variavam de R$ 4.000,00 a R$ 30.000,00, constavam previamente do contrato assinado. Assim, constatou-se que o representado ou os funcionários da empresa auxiliavam as vítimas nas transferências das somas que eram feitas no caixa eletrônico, por PIX ou até mesmo por meio de uma “ordem de pagamento” feita no próprio banco.
De acordo com os comprovantes acostados aos autos, alguns depósitos foram feitos para contas bancárias vinculadas ao CNPJ da empresa Trading Consultoria e Assessoria Financeira, cuja razão social é C K POMPEU COBRANÇAS, de propriedade de CAMILE KNAKIEVICZ POMPEU, e outros depósitos foram direcionados para a conta de GESSÔNIA GOMES DA SILVA, mãe de RAFAEL.
Um mês após a assinatura dos contratos e as transferências, as vítimas foram surpreendidas ao receberem seus extratos bancários e perceberem que não haviam recebido o desconto ou bonificação prometidos por RAFAEL. Pelo contrário, foram descontadas parcelas de novos empréstimos consignados contratados sem sua autorização.
As vítimas entraram em contato com o escritório, e RAFAEL se esquivava das reclamações de modo que os funcionários começaram a suspeitar da situação, pois também não entendiam a lógica dos descontos oferecidos e estavam sem receber seus salários. Perceberam que o esquema de RAFAEL consistia, na verdade, em contratar novos empréstimos em nome das vítimas, que acreditavam que o valor transferido era alusivo ao empréstimo anterior e que a empresa faria algum tipo de investimento para reduzir os juros do consignado, o que não era verdade. Assim, perceberam que haviam sido vítimas de um golpe.
Posteriormente, no dia 8 de março de 2023, RAFAEL foi preso em flagrante por estelionato em Arapongas (PR), pois concluía mais um contrato em nome da Trading Consultoria e Assessoria Financeira, quando a vítima percebeu que se tratava de um golpe e acionou a polícia.
(...)
Por seu turno, RAFAEL informou ter trabalhado com WILLIAN em outra empresa de assessoria financeira em Curitiba, além de ter experiência em contratação de empréstimos consignados, pois era proprietário da KRB SOLUÇÕES FINANCEIRAS, que estava registrada em seu nome, mas sem movimentações. Esclareceu que sua mãe GESSÔNIA ajudava na limpeza da sala comercial e fora dona da empresa "Bless Soluções Financeiras", vendida havia cerca de dois anos, agora chamada Budeli Soluções Capital LTDA.
A indicar a possibilidade de reiteração delitiva, RAFAEL e sua mulher Aline Stephani Kopeski, além de outros indivíduos, foram indiciados no Inquérito Policial nº 0010004-92.2021.8.16.001716, em trâmite em Maringá/PR, pelo crime de estelionato contra idosos, cujo modus operandi é semelhante ao que ora se apura, não obstante naqueles autos tenha se utilizado da empresa KRB SOLUÇÕES FINANCEIRAS LTDA (CNPJ nº 33.549.026/0001-42).
Posteriormente, em 24 de maio de 2024, foi deferida, por este juízo, a quebra do sigilo fiscal dos investigados (...)
Nesse contexto, os relatórios de análise técnica acostados às movs. 18.6 e 18.7 confirmaram a associação dos investigados que, de 1º de janeiro de 2020 a 15 de março de 2023, resultou na movimentação de mais de R$ 20.000.000,00 (vinte milhões de reais).
(...)
Destarte, são bastantes os elementos dos autos para demonstrar a prova da materialidade e a existência de indícios suficientes da autoria dos delitos de associação criminosa e estelionato, que recai nas pessoas de CAMILE KNAKIEVICZ POMPEU, THIAGO KAISER e RAFAEL GOMES DA SILVA, WILLIAN LOHAN BATISTA DE DEUS.
Ao mesmo tempo, está presente o requisito da prisão preventiva, isto é, o periculum libertatis, no que tange à imprescindibilidade da garantia da ordem pública, nos termos do artigo 312 do Código de Processo Penal, o que se denota facilmente diante da suposta reiteração delitiva dos representados, os quais estão sendo investigados por diversos delitos, com o mesmo modus operandi, inclusive em diversas cidades do Paraná;
Com efeito, os fatos acima ressaltados – elementos extraídos dos autos – revelam de forma clara a periculosidade das condutas, a priori, imputadas aos representados, haja vista o modus operandi adotado na empreitada delituosa, fazendo-se mister, nesta fase, garantir a ordem pública concreta ante a possibilidade de reiteração criminosa.
A par da gravidade concreta dos fatos em si mesmo considerados, verifica-se que as condições pessoais dos representados são também desfavoráveis e reforçam, de forma latente, que, em liberdade, incidem em grande possibilidade de reiteração criminosa, haja vista a possível perpetração, por eles, de delitos de forma continuada.
São fatos concretos, como não poderiam deixar de ser, que determinam custódia preventiva dos representados, e, ao mesmo tempo, revelam a inadequação e insuficiência das medidas cautelares diversas da prisão”. (grifei)
O Tribunal de origem reforçou a gravidade em concreto da conduta e o risco de reiteração delitiva, mencionando que o paciente responde a outros processos/investigações pelos mesmos crimes com o mesmo modus operandi (ação penal 0012359-16.2023.8.16.0014, em trâmite na 3º Vara Criminal de Londrina, e existência de vítimas em Curitiba /PR, Maringá/PR, Londrina/PR, Apucarana/PR e Arapongas/PR, com investigações em curso em relação ao paciente e/ou as demais co-réus: nº 0010004- 92.2021.8.16.0017, nº 0020302-24.2022.8.16.0013, nº 0011536- 04.2021.8.16.0017, nº 0006677- 54.2021.8.16.0013, nº 0001616-81.2022.8.16.0013, nº 0026709-12.2023.8.16.0013 e nº 0028939- 27.2023.8.16.0013). Confira-se (e-STJ fls. 1014-1015):
(...)
No caso dos autos, o paciente está sendo acusado de praticar diversos estelionatos em coautoria com outros três indivíduos, de forma a caracterizar, também, o crime de associação criminosa.
E as investigações aparentemente demonstram práticas de crimes de estelionatos praticados contra idosos desde o ano de 2020 e em diversas cidades, utilizando-se de empresas para ludibriá-los, visando obter empréstimos consignados que rendiam lucros ilícitos aos envolvidos e desfalque nas aposentadorias das vítimas. As investigações envolveram, inclusive, quebra de sigilo bancário do paciente e de outros acusados, sendo que o relatório de análise técnica correspondente, elaborado pela polícia judiciária, aponta movimentação de aproximadamente 20 milhões de reais com o esquema criminoso.
Neste contexto, o paciente teve postura ativa no induzimento dos idosos em erro.
(...)
Assim, ao menos em cognição sumária, entendo que o modus operandi demonstra gravidade concreta e a dimensão dos crimes praticados, em tese, pelo paciente, que evidenciam risco de reiteração delitiva”.
Além da fundamentação robusta para justificar a necessidade de manutenção da prisão preventiva, o acórdão expôs claramente os indícios de autoria em relação ao paciente. Adentrar nas teses alegadas pela defesa, apresentadas na petição do recurso ordinário (de que o paciente era “mero funcionário da empresa, que não tinha conhecimento da ilegalidade praticada pelos donos desta e que somente seguia as orientações desta” e que tinha papel meramente operacional) é matéria relacionada à instrução probatória, e não passível de análise em habeas corpus. Aliás, para a decretação da prisão preventiva, suficientes indícios consistentes de autoria, o que se verifica no caso em tela (e-STJ fls. 1013-1014).
Não bastasse, em se tratando de organização criminosa, a necessidade de ser interrompida ou mitigada a ação de integrantes de organização criminosa, está enquadrada no conceito de garantia da ordem pública:
PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO E ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO INTERNACIONAL DE DROGAS. RECURSO ORDINÁRIO DESPROVIDO MONOCRATICAMENTE PELO RELATOR. PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. AUSÊNCIA DE OFENSA. DECISÃO PROFERIDA COM OBSERVÂNCIA DO RISTJ E DO CPC. FUNDAMENTOS DA PRISÃO CAUTELAR. GRAVIDADE CONCRETA (MODUS OPERANDI). GRANDE QUANTIDADE DE DROGA APREENDIDA. FAZER CESSAR ATIVIDADE CRIMINOSA ORGANIZADA. CONTEMPORANEIDADE PRESENTE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. Esta Corte Superior possui pacífica jurisprudência no sentido de não ser cabível prévia intimação para sessão de julgamento de agravo regimental, uma vez que esse recurso interno independe de inclusão em pauta (art. 258 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça). Há, ainda, disposição expressa quanto ao não cabimento de sustentação oral nos julgamentos de recursos internos (art. 159 do Regimento Interno desta Corte e arts. 937 c.c 1021, ambos do Código de Processo Civil). Precedentes.
2. Importante gizar que a prolação de decisão monocrática pelo Ministro relator está autorizada não apenas pelo Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, mas também pelo art. 932 do Código de Processo Civil de 2015. Nada obstante, como é cediço, os temas decididos monocraticamente sempre poderão ser levados ao colegiado, por meio do controle recursal, o qual foi efetivamente utilizado no caso dos autos, com a interposição do presente agravo regimental.
Ademais, este Superior Tribunal de Justiça, em tempos de PANDEMIA (COVID-19), tem adotado diversas medidas para garantir a efetiva prestação jurisdicional e o respeito ao princípio da celeridade processual, sem que isso implique violação ao devido processo legal ou cause prejuízo a qualquer das partes.
3. O relator no Superior Tribunal de Justiça está autorizado a proferir decisão monocrática, que fica sujeita à apreciação do respectivo órgão colegiado mediante a interposição de agravo regimental, não havendo violação do princípio da colegialidade (arts. 932, III, do CPC e 34, XVIII, a e b, do RISTJ). (AgRg no HC 594.635/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUINTA TURMA, julgado em 16/03/2021, DJe 19/03/2021) .
4. De outro vértice, é da jurisprudência pátria a impossibilidade de se recolher alguém ao cárcere se inexistentes os pressupostos autorizadores da medida extrema, previstos na legislação processual penal. No ordenamento jurídico vigente, a liberdade é a regra. A prisão antes do trânsito em julgado, cabível excepcionalmente e apenas quando concretamente comprovada a Existência do periculum libertatis, deve vir sempre baseada em fundamentação concreta, não em meras conjecturas.
5. No caso em comento, o decreto de prisão cautelar encontra-se devidamente fundamentado, tal qual exige a legislação vigente. Foi evidenciada a periculosidade do recorrente diante do modus operandi das condutas, da grande quantidade de droga apreendida (150 kg de cocaína dos quais 80 kg resultado de condutas diretas do ora agravante) e para fazer cessar atividade criminosa organizada.
6. A gravidade concreta crime como fundamento para a decretação ou manutenção da prisão preventiva deve ser aferida, como no caso, a partir de dados colhidos da conduta delituosa praticada pelo agente, que revelem uma periculosidade acentuada a ensejar uma atuação do Estado cerceando sua liberdade para garantia da ordem pública, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal.
7. Lado outro, as circunstâncias fáticas do crime, como a grande quantidade apreendida, a natureza nociva dos entorpecentes, a forma de acondicionamento, entre outros aspectos podem servir de fundamentos para o decreto prisional quando evidenciarem a periculosidade do agente e o efetivo risco à ordem pública, caso permaneça em liberdade.
8 Por outro vértice, a jurisprudência desta Corte é assente no sentido de que se justifica a decretação de prisão de membros de grupo criminoso como forma de interromper suas atividades.
9. Em relação a contemporaneidade da decretação da prisão preventiva, não se desconhece que pacífico é o entendimento de que a urgência intrínseca às cautelares, notadamente à prisão processual, exige a contemporaneidade dos fatos justificadores dos riscos que se pretende com a prisão evitar. A falta de contemporaneidade do delito imputado ao paciente e a não ocorrência de fatos novos a justificarem a necessidade de segregação tornam a prisão preventiva ilegal, por não atenderem ao requisito essencial da cautelaridade.
(HC n. 493.463/PR, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, Sexta Turma, julgado em 11/6/2019, DJe 25/6/2019).
10. Contudo, não há falar em ausência de contemporaneidade dos fatos que lastrearam a ordem de custódia, porquanto o decreto prisional narra ações criminosas ligadas ao acusado até a data de sua prisão (RHC 138.727/MS, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 06/04/2021, DJe 15/04/2021), como ocorrido na presente hipótese.
11. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no RHC n. 145.812/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 4/5/2021, DJe de 7/5/2021.) (grifei)
DIREITO PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. PRISÃO PREVENTIVA. REITERAÇÃO DELITIVA. PEDIDO IMPROCEDENTE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
I. Caso em exame
1. Agravo regimental interposto contra decisão que denegou ordem de habeas corpus impetrado contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, que manteve a prisão preventiva do agravante pela suposta prática do crime de associação criminosa.
2. A prisão preventiva foi decretada para garantir a ordem pública, em razão do fundado receio de reiteração delitiva, considerando a gravidade concreta das condutas atribuídas ao agravante, integrante de organização criminosa voltada para crimes financeiros cibernéticos, tráfico ilícito de entorpecentes, lavagem de dinheiro e porte ilegal de armas de fogo.
3. A defesa alegou constrangimento ilegal pela ausência de fundamentação concreta para a segregação cautelar e violação do princípio da isonomia, uma vez que outros corréus obtiveram liberdade sob os mesmos fundamentos.
II. Questão em discussão
4. A questão em discussão consiste em saber se a prisão preventiva do agravante está devidamente fundamentada para a garantia da ordem pública, considerando a gravidade das condutas e o risco de reiteração delitiva.
5. Outra questão é saber se há identidade fático-processual entre o agravante e os demais corréus que obtiveram liberdade, de modo a justificar a extensão dos efeitos da decisão benéfica, conforme o art. 580 do Código de Processo Penal.
III. Razões de decidir
6. A prisão preventiva está fundamentada na necessidade de garantir a ordem pública, devido à periculosidade do agravante e à gravidade concreta das condutas atribuídas, sendo inviável a substituição por medidas cautelares diversas.
7. A reincidência do agravante e a ausência de identidade fático-processual com os demais corréus justificam a manutenção da prisão preventiva, não se aplicando o efeito extensivo do art. 580 do Código de Processo Penal.
8. A defesa não apresentou novos argumentos capazes de alterar o entendimento firmado na decisão monocrática, mantendo-se a decisão agravada por seus próprios fundamentos.
IV. Dispositivo e tese
9. Agravo regimental desprovido.
Tese de julgamento: "1. A prisão preventiva pode ser mantida para garantir a ordem pública quando há risco de reiteração delitiva e gravidade concreta das condutas. 2. A inexistência de identidade fático-processual entre corréus impede a aplicação do efeito extensivo do art. 580 do Código de Processo Penal".
Dispositivos relevantes citados: CPP, art. 580.Jurisprudência relevante citada: STJ, AgRg no HC 917.903/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 23/9/2024, DJe de 30/9/2024; STJ, AgRg no RHC 209.106/PR, Rel. Min. Daniela Teixeira, Quinta Turma, DJEN de 5/3/2025.
(AgRg no HC n. 985.879/RS, relator Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, julgado em 6/5/2025, DJEN de 13/5/2025.) (grifei)
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO E HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. GRAVIDADE CONCRETA DA CONDUTA. MODUS OPERANDI. RISCO DE REITERAÇÃO DELITIVA. AUSÊNCIA DE CONTEMPORANEIDADE. NÃO OCORÊNCIA. CIRCUSNTÂNCIAS PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS. INSUFICIÊNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. Para a decretação da prisão preventiva, é indispensável a demonstração da existência da prova da materialidade do crime e a presença de indícios suficientes da autoria. Exige-se, mesmo que a decisão esteja pautada em lastro probatório, que se ajuste às hipóteses excepcionais da norma em abstrato (art. 312 do CPP), demonstrada, ainda, a imprescindibilidade da medida. Precedentes do STF e STJ.
2. No caso, a prisão preventiva está devidamente justificada pela necessidade de garantir a ordem pública, em razão da gravidade concreta da conduta, evidenciada pelo modus operandi empregado.
Conforme salientado pelas instâncias ordinárias, o agravante e a vítima terminaram o seu relacionamento pois esta descobriu que o acusado a traiu com a corré. Assim, receoso com a possibilidade de que a vítima o denunciasse - tendo em vista que ambos estavam envolvidos na aplicação de golpes de cartão de crédito, empréstimos bancários, acionamento de seguradores de veículos, utilização de documento falso e adulteração de veículos -, o acusado e a denunciada foram até a sua residência e a mataram mediante inúmeros disparos de arma de fogo. Os réus ainda efetuaram disparos contra a genitora da vítima, no entanto, nenhum tiro a atingiu.
3. A propósito, este Superior Tribunal de Justiça possui jurisprudência consolidada no sentido de que "a gravidade concreta da conduta, reveladora do potencial elevado grau de periculosidade do Agente e consubstanciada na alta reprovabilidade do modus operandi empregado na empreitada delitiva, é fundamento idôneo a lastrear a prisão preventiva, com o intuito de preservar a ordem pública" (AgRg no HC n. 687.840/MS, Relatora Ministra LAURITA VAZ, Sexta Turma, julgado em 13/12/2022, DJe de 19/12/2022).
4. Ademais, ressaltou-se que a segregação cautelar é fundamental para evitar a reiteração delitiva, tendo em vista que o agravante possui registros pelos delitos previstos no art. 294 e 297 do CP, bem como no art. 244-B do ECA e responde a ação penal na qual se apuram crimes de organização criminosa e lavagem de dinheiro.
5. Sobre o tema, esta Corte Superior entende que "a existência de inquéritos, ações penais em curso, anotações pela prática de atos infracionais ou condenações definitivas denotam o risco de reiteração delitiva e, assim, constituem fundamentação idônea a justificar a segregação cautelar Precedentes do STJ" (RHC n. 106.326/MG, Sexta Turma, Relatora Ministra LAURITA VAZ, DJe de 24/4/2019).
6. O acórdão impugnado também enfatizou que, de acordo com as informações prestadas pelo juízo de primeiro grau, o mandado de prisão do agravante ainda não foi cumprido. Tal fato reforça a imprescindibilidade da custódia para aplicação da lei penal.
7. De outro vértice, não há que se falar em ausência de contemporaneidade do decreto preventivo. Conforme salientado pelo Tribunal a quo, "De fato, conforme entendimento jurisprudencial dos Tribunais Superiores, a contemporaneidade da prisão preventiva diz respeito aos motivos ensejadores da prisão e não ao momento da prática do fato ilícito. E, in casu, a prisão preventiva foi decretada tão logo apurados os indícios de autoria em desfavor do Paciente".
8. Nesse sentido, "segundo a jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, não há ilegalidade, por ausência de contemporaneidade do decreto cautelar, nas hipóteses em que o transcurso do tempo entre a sua decretação e o fato criminoso decorre das dificuldades encontradas no decorrer das investigações, exatamente a hipótese dos autos. Precedentes" (RHC n. 137.591/MG, Relator Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma, julgado em 18/5/2021, DJe 26/5/2021).
9. Eventuais condições subjetivas favoráveis, tais como primariedade, residência fixa e trabalho lícito, por si sós, não obstam a segregação cautelar, quando presentes os requisitos legais para a decretação da prisão preventiva.
10. Ademais, as circunstâncias que envolvem o fato demonstram que outras medidas previstas no art. 319 do Código de Processo Penal são insuficientes para a consecução do efeito almejado. Ou seja, tendo sido exposta de forma fundamentada e concreta a necessidade da prisão, revela-se incabível sua substituição por outras medidas cautelares mais brandas.
11. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no RHC n. 180.111/MG, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 5/6/2023, DJe de 7/6/2023) (grifei)
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. EXTORSÃO E PARTICIPAÇÃO EM ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. PERICULOSIDADE DO RECORRENTE. MODUS OPERANDI. DELITO COMETIDO EM ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. AGIOTAGEM. EXTORSÃO DAS VÍTIMAS MESMO APÓS O PAGAMENTO DO EMPRÉSTIMO. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. TESTEMUNHAS AMEAÇADAS. GARANTIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS. INSUFICIÊNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. RECURSO DESPROVIDO.
1. O Superior Tribunal de Justiça - STJ firmou posicionamento segundo o qual, considerando a natureza excepcional da prisão preventiva, somente se verifica a possibilidade da sua imposição e manutenção quando evidenciado, de forma fundamentada em dados concretos, o preenchimento dos pressupostos e requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal - CPP. A custódia cautelar somente deve persistir em casos em que não for possível a aplicação de medida cautelar diversa, de que cuida o art. 319 do CPP.
2.Verifico que a prisão preventiva foi adequadamente motivada, tendo sido demonstrada pelas instâncias ordinárias, com base em elementos extraídos dos autos, a gravidade concreta das condutas e a alta periculosidade do recorrente, evidenciadas pelo modus operandi das condutas delituosas, com participação de várias pessoas, envolvidas em suposto esquema de agiotagem, cujas vítimas, sob grave ameaça, eram extorquidas mesmo após o pagamento da dívida, tendo o recorrente fornecido sua conta bancária par recebimento dos valores.
3. O decreto prisional noticia, também, que algumas testemunhas ainda não foram ouvidas em juízo e relataram ameaças e temor em prestar depoimento, condição que coloca em risco a instrução criminal. Tais circunstâncias denotam risco ao meio social e ao próprio deslinde da ação penal, de modo que se mostra imperiosa a manutenção da custódia cautelar. 4. Esta Corte Superior possui entendimento firme no sentido de que a presença de condições pessoais favoráveis do agente, como primariedade, não representa óbice, por si só, à decretação da prisão preventiva, quando identificados os requisitos legais da cautela.
5. Inaplicável medida cautelar alternativa quando as circunstâncias evidenciam que as providências menos gravosas seriam insuficientes para manutenção da ordem pública.
6. Recurso ordinário em habeas corpus desprovido.
(RHC n. 95.408/RJ, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 7/2/2019, DJe de 14/2/2019.) (grifei)
Das decisões proferidas nas instâncias comuns, verifica-se que os requisitos da prisão preventiva estão devidamente fundamentos, em consonância com a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tendo a acórdão recorrido expressamente afastado a suficiência das medidas cautelares diversas da prisão e os predicados pessoais do paciente (como a primariedade) como justificativa para a revogação da prisão cautelar, ante a gravidade em concreto dos fatos. Nesse sentido:
PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. INEXISTÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. DECISÃO MANTIDA. ESTELIONATO MAJORADO (CONTRA IDOSO) E ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO CORROBORADO POR OUTRAS PROVAS NA FASE JUDICIAL. LEGALIDADE. PRISÃO PREVENTIVA MANTIDA NA SENTENÇA CONDENATÓRIA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. RÉU QUE PERMANECEU PRESO DURANTE TODO O PROCESSO. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS. INSUFICIÊNCIA. AGRAVO DESPROVIDO.
1. O reconhecimento de pessoa, presencialmente ou por fotografia, realizado na fase do inquérito policial, apenas é apto, para identificar o réu e fixar a autoria delitiva, quando observadas as formalidades previstas no art. 226 do Código de Processo Penal - CPP e quando corroborado por outras provas colhidas na fase judicial, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa.
No caso, o decreto condenatório está lastreado em fundamentação concreta a qual, aliada ao reconhecimento coerente da vítima Almir Guedes e de dois policiais civis, em juízo, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, ressalta não haver qualquer dúvida sobre a participação do agravante nos delitos em questão. Asseverou o MM. Juiz sentenciante que "o depoimento do lesado, que foi coerente e seguro, merece total credibilidade" (fl. 166). A vítima, um senhor de 80 anos de idade, afirmou que o réu V S C DE C, ora agravante, se apresentava como "Rafael Pina", tendo o visto pessoalmente quando das negociações; garantindo que só para o agravante fez em transferências bancárias mais de R$ 746.000,00 (setecentos e quarenta e seis mil reais). Os policiais afirmaram que a investigação se iniciou em julho ou agosto de 2019, com um senhor chamado Leonel, que perdeu em dois meses, para essa mesma associação criminosa, quase R$ 800.000,00 (oitocentos mil reais) com o mesmo modus operandi, já tendo trabalhado em 7 inquéritos envolvendo o mesmo grupo criminoso.
Assim, não há falar em nulidade, tendo em vista que a autoria delitiva não tem como único elemento de prova, o reconhecimento fotográfico.
2. Em vista da natureza excepcional da prisão preventiva, somente se verifica a possibilidade da sua imposição quando evidenciado, de forma fundamentada e com base em dados concretos, o preenchimento dos pressupostos e requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal - CPP. Deve, ainda, ser mantida a prisão antecipada apenas quando não for possível a aplicação de medida cautelar diversa, nos termos do previsto no art. 319 do CPP.
No caso dos autos, verifico que a prisão preventiva foi adequadamente motivada, tendo as instâncias ordinárias demonstrado, com base em elementos extraídos dos autos, a gravidade concreta da conduta e a periculosidade do agravante, evidenciadas pelas circunstâncias do delito, pois o recorrente e os corréus se associaram para com a finalidade de cometer inúmeros crimes de estelionato, ao induzirem e manterem em erro pessoas idosas que, acreditando que estariam negociando cotas bonificadas do clube de vantagens "Motel Clube do Brasil", efetuaram diversas transferências bancárias, totalizando a quantia de R$ 799.923,50 (setecentos e noventa e nove mil novecentos e vinte e três reais e cinquenta centavos), o que demonstra concreto risco ao meio social.
Nesse contexto, forçoso concluir que a prisão processual está devidamente fundamentada na garantia da ordem pública, não havendo falar, portanto, em existência de evidente flagrante ilegalidade capaz de justificar a sua revogação.
3. Tendo o réu permanecido preso durante todo o processo, não deve ser permitido o recurso em liberdade, especialmente porque, inalteradas as circunstâncias que justificaram a custódia, não se mostra adequada a soltura dele depois da condenação em primeiro grau.
4. As condições favoráveis do agente, por si sós, não impedem a manutenção da prisão cautelar quando devidamente fundamentada, conforme a jurisprudência desta Corte Superior de Justiça.
5. São inaplicáveis quaisquer medidas cautelares alternativas previstas no art. 319 do CPP, uma vez que as circunstâncias do delito evidenciam a insuficiência das providências menos graves.
6. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no RHC n. 165.718/RJ, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 24/10/2022, DJe de 3/11/2022.) (grifei)
AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. WRIT IMPETRADO CONTRA DECISÃO LIMINAR DO TRIBUNAL DE ORIGEM. SÚMULA N. 691/STF. TENTATIVA DE FEMINICÍDIO E CÁRCERE PRIVADO. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. NECESSIDADE DE GARANTIR A ORDEM PÚBLICA E PROTEGER A INTEGRIDADE FÍSICA E PSICOLÓGICA DA VÍTIMA. GRAVIDADE CONCRETA DA CONDUTA. AUSÊNCIA DE CONTEMPORANEIDADE. NÃO VERIFICADA. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS. INSUFICIÊNCIA. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. Trata-se de agravo regimental interposto contra decisão da Presidência deste STJ, que indeferiu liminarmente habeas corpus impetrado contra decisão liminar do TJRS, mantendo a prisão preventiva do agravante, acusado da prática dos crimes de feminicídio tentado e cárcere privado.
2. O Superior Tribunal de Justiça tem jurisprudência firmada no sentido de não caber habeas corpus contra decisão que indefere liminar, a menos que fique demonstrada flagrante ilegalidade, nos termos do enunciado n. 691 da Súmula do STF, segundo o qual "não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar".
3. No caso, a custódia foi mantida em caráter liminar em razão da necessidade de garantir a ordem pública e de proteger a integridade física e psicológica da vítima, tendo em vista a gravidade concreta da conduta imputada ao agravante, que, inconformado com o término do relacionamento, foi até a casa da mãe da sua ex-companheira, onde ela se encontrava, e a levou para o apartamento do casal, tendo a agredido por cerca de 4h, com socos, chutes e golpes de faca, e a ameaçado de morte.
4. A propósito, "A gravidade em concreto do crime e a periculosidade do agente, evidenciada pelo modus operandi, constituem fundamentação idônea para a decretação da custódia preventiva" (HC 212647 AgR, Relator Ministro ANDRÉ MENDONÇA, Segunda Turma, julgado em 05/12/2022, DJe 10/01/2023).
5. Além disso, conquanto a defesa argumente que os fatos ocorreram há mais de 3 anos, esta Corte já decidiu que "quanto à alegação de ausência de contemporaneidade, embora não seja irrelevante o lapso temporal entre a data dos fatos e o decreto preventivo, a gravidade concreta do delito obstaculiza o esgotamento do periculum libertatis apenas pelo decurso do tempo" (AgRg no HC n. 564.852/MG, Relator Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 12/05/2020, DJe 18/05/2020).
6. Eventuais condições subjetivas favoráveis, tais como primariedade, residência fixa e trabalho lícito, por si sós, não obstam a segregação cautelar, quando presentes os requisitos legais para a decretação da prisão preventiva.
7. Ademais, as circunstâncias que envolvem o fato demonstram que outras medidas previstas no art. 319 do Código de Processo Penal são insuficientes para a consecução do efeito almejado. Ou seja, tendo sido exposta de forma fundamentada e concreta a necessidade da prisão, revela-se incabível sua substituição por outras medidas cautelares mais brandas.
8. Ausência de flagrante ilegalidade apta a justificar a superação da Súmula n. 691/STF.
9. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no HC n. 951.170/RS, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 19/11/2024, DJe de 26/11/2024.) (grifei)
Por fim, o pedido subsidiário de prisão domiciliar foi devidamente afastado, não havendo ilegalidade, pois o acórdão recorrido apontou que não houve comprovação da imprescindibilidade do paciente nos cuidados com os infantes, não havendo que se falar em presunção. Nesse sentido:
DIREITO PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO. PRISÃO DOMICILIAR. REQUISITOS NÃO COMPROVADOS. AGRAVO IMPROVIDO.
I. Caso em exame
1. Agravo regimental interposto contra decisão que negou provimento ao recurso ordinário em habeas corpus, no qual se pleiteava a substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar.
2. O agravante alega ser o único responsável pelos cuidados de dois filhos menores de 12 anos e pela esposa em gravidez de risco, além de ser o provedor da família residente em zona rural.
II. Questão em discussão
3. A questão em discussão consiste em saber se o agravante faz jus à prisão domiciliar, nos termos do art. 318, VI, do Código de Processo Penal, ao alegar ser o único responsável pelos cuidados dos filhos menores e da esposa em gravidez de risco.
III. Razões de decidir
4. A concessão da prisão domiciliar exige a comprovação inequívoca da imprescindibilidade da soltura do acusado.
IV. Dispositivo e tese
5. Agravo improvido.
Tese de julgamento: "1. A concessão de prisão domiciliar ao pai de filhos menores de 12 anos exige comprovação de que ele é o único responsável pelos cuidados das crianças".
Dispositivos relevantes citados: CPP, art. 318, VI. Jurisprudência relevante citada: STJ, EDcl no HC n. 852.999/MS, Rel. Min. Jesuíno Rissato (Desembargador Convocado do TJDFT), Sexta Turma, julgado em 11/3/2024; STJ, AgRg no HC 875.911/BA, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 18/03/2024.
(AgRg no RHC n. 212.129/SP, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 14/5/2025, DJEN de 19/5/2025.) (grifei)
AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. CRIMES DE HOMICÍDIO QUALIFICADO, OCULTAÇÃO DE CADÁVER E FRAUDE PROCESSUAL. PEDIDO DE RESTABELECIMENTO DE PRISÃO DOMICILIAR. ART. 318, VI, DO CPP. ALEGAÇÃO DE GUARDA EXCLUSIVA DE FILHA MENOR. CRIME COMETIDO COM GRAVE VIOLÊNCIA. IMPRESCINDIBILIDADE AOS CUIDADOS DA CRIANÇA NÃO DEMONSTRADA. EXISTÊNCIA DE REDE DE APOIO FAMILIAR. RISCO À INSTRUÇÃO E À APLICAÇÃO DA LEI PENAL. GRAVIDADE CONCRETA DOS FATOS. JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE SUPERIOR.
1. Trata-se de agravo regimental interposto contra decisão desta relatoria que não conheceu do habeas corpus, mantendo a prisão preventiva do agravante, acusado da suposta prática dos crimes homicídio qualificado, por duas vezes, ocultação de cadáver e fraude processual.
2. "De acordo com entendimento consolidado na Suprema Corte, mães e pais possuem requisitos distintos para a concessão do benefício, sendo que estes últimos precisam comprovar que são os únicos responsáveis pelos filhos, o que não restou evidenciado em análise aos documentos que instruem a inicial (HC n. 165.704/STF)". (AgRg no HC n. 895.353/SP, relator Ministro Otávio de Almeida Toledo (Desembargador Convocado do Tjsp), Sexta Turma, julgado em 9/9/2024, DJe de 11/9/2024).
3. Segundo consta dos autos, o agravante teria participado da execução de duas vítimas mediante emboscada, com emprego de recurso que dificultou a defesa dos ofendidos, resultando em sua morte. Após a prática dos homicídios, teria determinado a ocultação dos cadáveres, o transporte dos corpos até área de mata, onde foram desovados, e a queima do automóvel das vítimas.
4. Além disso, há elementos nos autos que indicam que o agravante teria orientado os demais partícipes a efetuarem a limpeza do local do crime e a destruição de objetos que pudessem comprometer a investigação, como peças de roupa com vestígios de sangue e aparelhos celulares de diversas pessoas envolvidas, inclusive o seu próprio. Tais circunstâncias denotam não apenas a extrema gravidade dos fatos, mas também o risco concreto de reiteração delitiva e de prejuízo à instrução criminal e à aplicação da lei penal.
5. Ainda que a vedação à prisão domiciliar nos casos de crimes praticados com violência ou grave ameaça prevista no artigo 318-A do Código de Processo Penal dirija-se especificamente às mulheres gestantes, mães ou responsáveis por crianças ou pessoas com deficiência, a jurisprudência desta Corte Superior é firme no sentido de que "não é possível a substituição da prisão preventiva pela domiciliar de pai de criança com idade inferior a 12 anos se há imputação de crime cometido com grave violência contra pessoa, especialmente quando não há comprovação da imprescindibilidade do genitor aos cuidados da criança, como é o caso dos autos" (AgRg no RHC n. 162.377/CE, Relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 13/9/2022, DJe de 19/9/2022).
6. O fato de a instrução criminal ter sido encerrada não descaracteriza, no caso, a contemporaneidade do risco à instrução, uma vez que o agravante foi pronunciado e será submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri, oportunidade na qual eventual influência sobre testemunhas ou sobre a dinâmica probatória ainda poderá se materializar, conforme bem destacado no acórdão recorrido.
7. Assim, "[n]a hipótese, além de não ter sido comprovada a imprescindibilidade do pai para os cuidados com os filhos, os crimes que envolvem violência ou grave ameaça contra terceiros mostram-se como impeditivos para a concessão da prisão domiciliar" (AgRg no RHC n. 176.590/ES, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 21/8/2023, DJe de 24/8/2023).
8. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no HC n. 992.969/SC, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 13/5/2025, DJEN de 21/5/2025.) (grifei)
Ante o exposto, nego provimento ao recurso ordinário em habeas corpus.
Relator
CARLOS CINI MARCHIONATTI (DESEMBARGADOR CONVOCADO TJRS)
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