Processo nº 1017582-42.2025.8.11.0000
ID: 316836263
Tribunal: TJMT
Órgão: Quarta Câmara Criminal
Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL
Nº Processo: 1017582-42.2025.8.11.0000
Data de Disponibilização:
04/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RUY BARBOSA MARINHO FERREIRA
OAB/MT XXXXXX
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ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1017582-42.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Crimes do Sistema Nacional de Armas, Habeas Corpus…
ESTADO DE MATO GROSSO PODER JUDICIÁRIO QUARTA CÂMARA CRIMINAL Número Único: 1017582-42.2025.8.11.0000 Classe: HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) Assunto: [Crimes do Sistema Nacional de Armas, Habeas Corpus - Cabimento] Relator: Des(a). LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO Turma Julgadora: [DES(A). LIDIO MODESTO DA SILVA FILHO, DES(A). HELIO NISHIYAMA, DES(A). JUVENAL PEREIRA DA SILVA] Parte(s): [RUY BARBOSA MARINHO FERREIRA - CPF: 326.360.409-00 (ADVOGADO), CLEITON DEVAIR DA SILVA - CPF: 063.963.951-85 (PACIENTE), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (IMPETRADO), Douto juizo de Direito da comarca de Guarantã do Norte-MT (IMPETRADO), MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO - CNPJ: 14.921.092/0001-57 (TERCEIRO INTERESSADO), ALINE LIMA DA COSTA SIEBRA - CPF: 018.612.341-80 (TERCEIRO INTERESSADO), JUIZO DA VARA UNICA DA COMARCA DE GUARANTA DO NORTE (IMPETRADO), RUY BARBOSA MARINHO FERREIRA - CPF: 326.360.409-00 (IMPETRANTE)] A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a QUARTA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência Des(a). JUVENAL PEREIRA DA SILVA, por meio da Turma Julgadora, proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE CONCEDEU A ORDEM, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. E M E N T A DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. COMÉRCIO ILEGAL DE ARMAS DE FOGO. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. SUBSTITUIÇÃO POR MEDIDAS CAUTELARES DIVERSAS. ORDEM CONCEDIDA. I. Caso em exame: Habeas corpus impetrado contra decisão do Juízo da Vara Única de Guarantã do Norte que indeferiu o pedido de revogação da prisão preventiva decretada em desfavor do paciente, acusado da prática do delito previsto no art. 17, da Lei n. 10.826/2003. A defesa sustenta ausência dos requisitos do art. 312, do CPP, excesso de prazo na conclusão do inquérito, condições pessoais favoráveis, apresentação espontânea à autoridade policial e disparidade de tratamento em relação a outros corréus. II. Questão em discussão: A questão em discussão consiste em saber se estão presentes os requisitos legais para a manutenção da prisão preventiva do paciente, à luz das condições pessoais favoráveis, da alegada ausência de periculum libertatis, da desnecessidade da medida extrema e da possibilidade de substituição por cautelares diversas da prisão. III. Razões de decidir: 1. O paciente ostenta condições pessoais favoráveis: é primário, possui bons antecedentes, residência fixa e atividade laboral lícita. 2. A fundamentação da prisão preventiva pautada na gravidade abstrata do delito e em suposta fuga não mais se sustenta diante da apresentação espontânea do paciente e da inexistência de fatos novos que indiquem risco à ordem pública, à instrução criminal ou à aplicação da lei penal. 3. Há flagrante disparidade de tratamento em relação aos demais investigados no mesmo contexto, os quais estão em liberdade, sem justificativa concreta para a segregação cautelar exclusiva do paciente. 4. Medidas cautelares diversas da prisão mostram-se adequadas e suficientes para os fins legais, nos termos do art. 319, do CPP. Dispositivo e tese: Ordem Concedida. Tese de julgamento: “1. A prisão preventiva exige fundamentação concreta e atual que demonstre a imprescindibilidade da medida extrema. 2. A presença de condições pessoais favoráveis, aliada à ausência de periculum libertatis, autoriza a substituição da prisão por medidas cautelares diversas”. Dispositivos legais citados: CPP, arts. 282, § 6º, 312 e 319; Lei n. 10.826/2003, art. 17. Jurisprudência relevante: STJ, HC 333.330/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, 6ª Turma, j. 06.11.2015; TJMT, HC 1018716-75.2023, Rel. Des. Gilberto Giraldelli, j. 27.09.2023. R E L A T Ó R I O EXMO. SR. DES. LÍDIO MODESTO DA SILVA FILHO Egrégia Câmara: Trata-se de Habeas Corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de CLEITON DEVAIR DA SILVA, apontando como autoridade coatora o Juízo da Vara Única da Comarca de Guarantã do Norte, nos autos da representação de prisão preventiva n. 1001052-90.2025.8.11.0087, que indeferiu a o pedido de revogação da prisão preventiva em desfavor do paciente, com base na suposta prática do delito previsto no art. 17, da Lei n. 10.826/2003 (comercialização ilegal de armas de fogo). O impetrante sustenta que a segregação cautelar não se justifica, ante à ausência dos requisitos autorizadores do art. 312, do Código de Processo Penal. Aduz, em síntese, que o paciente é primário, possui bons antecedentes, possui residência fixa e trabalho lícito, exercido em oficina mecânica devidamente registrada, além de ser responsável por filhos menores, circunstâncias que demonstram seu vínculo com o distrito da culpa e a desnecessidade da prisão. Destaca, ainda, que o paciente se apresentou espontaneamente à autoridade policial em 19 de maio de 2025, colaborando com as investigações, fato que, segundo a defesa, foi desconsiderado pelo juízo singular. Sustenta a ocorrência de flagrante ilegalidade, consubstanciada no excesso de prazo para a conclusão do inquérito policial, que, mesmo após mais de 10 dias da prisão, não foi finalizado. Alega, por fim, violação ao princípio da isonomia, considerando que Aline Lima da Costa Siebra, também investigada no mesmo esquema e apontada como autora do furto das armas da delegacia, foi beneficiada com liberdade provisória, diferentemente do paciente. Pautado nesses argumentos, requer a concessão da medida liminar para determinar a revogação da prisão preventiva do paciente, expedindo-se imediatamente seu alvará de soltura ou, não sendo o caso, a substituição da prisão preventiva pela medida cautelar do uso de tornozeleira eletrônica. Documentação juntada (Id. 290138863, 290138864, 290138865, 290138874, 290138875, 290138878, 290144858, 290144857, 290144864 e 290144860). Liminar indeferida (Id. 290326862). Informações prestadas pelo Juízo a quo (Id. 291331365). Instada a se manifestar, a douta Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da lavra da d. Procuradora Rosana Marra, opinou pela denegação da ordem (Id. 295575379). É o relatório. V O T O R E L A T O R EXMO. SR. DES. LÍDIO MODESTO DA SILVA FILHO Egrégia Câmara: Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos para sua constituição válida e regular e uma vez identificadas as condições da ação, o presente Habeas Corpus há que ser submetido a julgamento. No caso versando verifico que na decisão que indeferiu a revogação da prisão preventiva, o Juízo de primeiro grau baseou-se na garantia da ordem pública, sob o seguinte fundamento: A prisão preventiva do requerente CLEITON DEVAIR DA SILVA foi decretada por este Juízo em 03 de abril de 2025, em razão da suposta prática do delito de comércio ilegal de arma de fogo, oportunidade em que restou consignado a necessidade de assegurar a ordem pública, fator a justificar a decretação da prisão preventiva e, via de consequência, sua manutenção. Compulsando detidamente o pedido elaborado pela defesa, constato que não há menção de qualquer fato novo que corrobore com a revogação requerida, tampouco foram colacionados documentos idôneos a comprovarem as alegações aduzidas. Outrossim, convém destacar que os indícios de materialidade e autoria delitiva ficaram devidamente comprovados, por meio do interrogatório dos representados GEOVANI SILVA DE ALCANTARA e ALINE LIMA DA COSTA SIEBRA BREITENBACH. Nesse sentido, transcrevo o interrogatório de GEOVANI SILVA DE ALCANTARA: “QUE há cerca de 20 dias, encontrou-se com o indivíduo de nome DEVAIR CLEITON e este passou a lhe narrar que estava conseguindo algumas armas de fogo para vender; QUE CLEITON não contou a origem de tais armas, mas ficou evidente que eram armas ilegais; QUE por já conhecê-lo há cerca de 7 anos, interessou-se por tais armas e chegou a ver algumas fotografias no celular de CLEITON; QUE dentre as armas haviam, revólveres cal. 32, revólveres cal. 38, pistolas das marcas Glock e Taurus de calibres diversos e, além destas, uma espingarda cal. 12; QUE passados alguns dias, após este primeiro encontro com CLEITON, foi até a Mecânica onde CLEITON trabalha e chegou a ver, presencialmente, algumas das armas outrora vistas apenas por fotografias; QUE ficou acordado com CLEITON que caso o interrogado achasse algum interessado em comprar as armas, voltariam a conversar; QUE passados alguns dias, encontrou um primeiro comprador para um revólver Taurus, cal. 38; QUE tal comprador era um homem que não se recorda o nome, mas é morador da E-60; QUE, então, foi até a Mecânica de CLEITON, pegou o mencionado revólver e entregou para tal homem; QUE a segunda arma que foi comercializada tratava-se de um revólver de cal. 38; QUE tal revólver foi comercializado, dentro de Guarantã, para um indivíduo que o interrogado prefere não citar o nome, pois trata-se de homem simples, religioso e trabalhador; QUE a terceira arma a ser comercializada foi um revólver cal. 32, sem marca aparente; QUE está arma foi vendida para um homem, provavelmente de nome Sebastião; QUE, por fim, conseguiu comercializar a Pistola Taurus, modelo G2C, cal. 9mm; QUE esta arma foi vendida para um homem que tem um nome em "alemão"; QUE, portanto, o interrogado pegou 4 (quatro) armas de fogo na Mecânica de CLEITON e negociou tais armas com pessoas diversas; QUE afirma, veementemente, que não tinha conhecimento da origem de tais armas e, muito menos, que haviam sido levadas de um órgão público; QUE dias antes de iniciar a comercialização da armas, viu no celular de CLEITON mensagens trocadas entre ele e ALINE LIMA DA COSTA SIEBRA BREITENBACH; QUE ALINE era quem oferecia as armas para CLEITON; QUE, portanto, ficou evidente para o interrogado que ALINE era e mentora da comercialização criminosa de armas; QUE em tais mensagens trocadas entre CLEITON e ALINE, esta oferecia as armas e, provavelmente, também lhe enviava fotografias dos armamentos; QUE compromete-se a prestar qualquer novo esclarecimento necessário;” Além disso, a investigada ALINE confessou que as armas subtraídas eram repassadas para CLEITON DEVAIR, o que reforça os indícios de uma atuação estruturada. Nesse contexto, supostamente, o investigado, juntamente com outros envolvidos, integra organização criminosa armada, responsável por diversos delitos que ainda estão sendo apurados no inquérito policial. Os elementos constantes dos autos indicam uma atuação coordenada e estruturada, com o uso de armamento e divisão de tarefas, o que evidencia a periculosidade do grupo e a gravidade concreta dos fatos investigados. Ademais, o fato do acusado possuir predicados pessoais favoráveis, por si só, não afasta a necessidade de sua custódia, quando presentes os pressupostos e fundamentos autorizadores da prisão preventiva, como no caso dos autos. Vejamos: “HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. ROUBO MAJORADO. CONCURSO DE PESSOAS E EMPREGO DE ARMA DE FOGO. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. 1. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA NÃO REALIZADA. IRRELEVÂNCIA. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. DIREITOS E GARANTIAS DO PRESO ASSEGURADOS. 2. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA DO DECRETO CAUTELAR. IMPROCEDÊNCIA. PROVA DA EXISTÊNCIA DOS CRIMES. INDÍCIOS DE AUTORIA DEMONSTRADOS. PERICULOSIDADE SOCIAL DO AGENTE. GRAVIDADE CONCRETA DA CONDUTA. NECESSIDADE DE GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. 3. CONDIÇÕES SUBJETIVAS FAVORÁVEIS. IRRELEVÂNCIA NO CASO. PREDICADOS PESSOAIS POR SI SÓS INCAPAZES DE OBSTAR A MANUTENÇÃO DA CUSTÓDIA. 4. NEGATIVA DE AUTORIA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. 5. OFENSA AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. IMPERTINÊNCIA. LEGITIMIDADE DA SEGREGAÇÃO DE NATUREZA PROCESSUAL. 6. EXCESSO DE PRAZO PARA FORMAÇÃO DA CULPA. INOCORRÊNCIA. DELONGA JUSTIFICADA. COMPLEXIDADE DO FEITO. PLURALIDADE DE RÉUS. NECESSIDADE DE EXPEDIÇÃO DE CARTAS PRECATÓRIAS. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO VERIFICADO. ORDEM DENEGADA EM CONSONÂNCIA COM O PARECER. 1. Desde que os direitos e garantias do preso sejam observados, a falta de realização de Audiência de Custódia não torna ilegal a prisão preventiva mais tarde decretada. Além do mais, é certo que “a conversão do flagrante em prisão preventiva torna superada a alegação de nulidade, relativamente à falta de audiência de custódia” (STJ, HC 374.834/SC, Rel. Min. Ribeiro Dantas, 5ª Turma, DJe 7.4.2017). 2. A periculosidade social apresentada pelo paciente e a gravidade concreta da conduta, extraídas da pluralidade de agentes envolvidos na trama delituosa, da extrema violência utilizada contra a vítima, da sua condição de pessoa idosa e do longo período em que teve a sua liberdade cerceada, justificam a prisão antecipada com vistas a acautelar a ordem pública e inibir a reprodução de fatos de igual natureza e gravidade, nos termos do disposto no art. 312, caput, do CPP. 3. Embora apreciáveis, residência fixa e outras condições subjetivas favoráveis são insuficientes para impedir, por si sós, a custódia provisória, notadamente quando identificados os requisitos e pressupostos legais da medida extrema. Inteligência do Enunciado nº. 43 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas. 4. Por demandar o reexame do conjunto fáticoprobatório, não é possível analisar a tese de negativa de autoria em sede de Habeas corpus, como bem ilustra o Enunciado nº. 42 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas: “Não se revela cabível na via estreita do habeas corpus discussão acerca da autoria do delito”. 5. A prisão processual decorre de mero juízo de cautelaridade e por isso, não se confunde com a prisãopena, fruto de juízo de culpabilidade aferido por ocasião da sentença condenatória. Nessa ordem de ideias, a prisão preventiva decretada no curso do processo, mediante ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, não afronta o princípio constitucional da presunção de inocência ou de não culpabilidade (art. 5º, inc. LVII e LXI, da CF). 6. A tese de excesso de prazo para encerramento da etapa de produção de provas deve ser analisada à luz do princípio da razoabilidade e das peculiaridades do caso concreto, não com base em critérios meramente aritméticos (matemáticos). Assim, quando demonstrado que o prolongamento da marcha processual está apoiado em elementos legítimos (complexidade do feito, pluralidade de réus e necessidade de expedição de Cartas Precatórias), descabe falar-se em segregação eivada de coação ilegal decorrente do excesso de prazo para formação da culpa.” (N.U 1019618- 67.2019.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, RONDON BASSIL DOWER FILHO, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 04/03/2020, Publicado no DJE 24/03/2020). Destaca-se o Enunciado Orientativo n.º 43 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas: “As condições pessoais favoráveis não justificam a revogação, tampouco impedem a decretação da custódia cautelar, quando presente o periculum libertatis.” Ainda que a defesa alegue a possibilidade de concessão de fiança, importa destacar que o crime previsto no art. 17 da Lei nº 10.826/03, comércio ilegal de arma de fogo, é expressamente classificado como inafiançável, nos termos da própria norma legal. Tal vedação legal reflete a gravidade objetiva da conduta, que representa séria ameaça à segurança pública. Diante disso, e considerando a periculosidade da conduta imputada, resta justificada a manutenção da prisão preventiva como medida necessária e adequada, sendo incabível sua substituição por medidas menos gravosas. Como se não bastasse, o representado evadiu-se do local dos fatos, tomando rumo ignorado, sendo detido apenas em 19/05/2025, ou seja, mais de um mês após os acontecimentos, o que inviabiliza, por ora, a substituição da medida extrema por outra de menor gravidade. Nesse sentido, destaca-se o Enunciado Orientativo n.º 26 da Turma de Câmaras Criminais Reunidas: “A fuga do agente, assim entendida como evasão do cárcere ou ausência deliberada de seu domicílio, autoriza a decretação da prisão preventiva, para fins de assegurar a aplicação da lei penal.” No mais, a alegação defensiva de que a investigada Aline foi colocada em liberdade, mesmo supostamente envolvida em delito de maior gravidade, não é suficiente, por si só, para justificar a concessão de liberdade ao requerente. A análise da necessidade da prisão preventiva deve ser realizada de forma individualizada, à luz das circunstâncias concretas de cada investigado. A revogação da prisão de outro investigado, fundamentada em aspectos pessoais e processuais específicos, não impõe a extensão automática do benefício aos demais. No presente caso, os fundamentos que justificaram a custódia cautelar do requerente permanecem válidos, não havendo motivo concreto que justifique a modificação da medida. No que tange ao pedido de substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar, com fundamento na existência de filhos menores e na condição do requerente como único responsável pelo sustento do lar, não há elementos suficientes nos autos que demonstrem situação excepcional ou de absoluta imprescindibilidade da presença do investigado no ambiente familiar, nos termos do art. 318, inciso VI, do CPP. A mera existência de filhos pequenos, por mais relevante que seja do ponto de vista social e pessoal, não constitui, por si só, motivo suficiente para concessão da prisão domiciliar, especialmente quando presentes os pressupostos e fundamentos que justificam a segregação cautelar, como no caso dos autos. Logo, permanecendo incólumes os fundamentos que ensejaram a decretação da prisão preventiva, e não sendo suficientes as medidas cautelares diversas da prisão, em razão da gravidade concreta do delito, INDEFIRO o pedido de revogação formulado pela defesa do autuado CLEITON DEVAIR DA SILVA. INDEFIRO, ainda, o pedido de substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar. (grifos meus) (Id. 283603899). No caso em apreço, a defesa sustenta a necessidade de revogação da prisão preventiva do paciente em razão do excesso de prazo para a conclusão do inquérito policial, ao argumento de que em se tratando de réu preso, a legislação processual penal estabelece um prazo máximo de 10 dias para a conclusão do inquérito. Todavia, ao serem requisitadas informações à autoridade judiciária de primeiro grau, esta consignou expressamente (Id. 291331365) que a suposta mora na conclusão do inquérito policial não fora objeto de suscitação anterior por parte da defesa, razão pela qual a matéria não foi objeto de deliberação naquele juízo. Diante disso, cumpre observar que a análise do alegado excesso de prazo, em sede recursal, esbarraria na vedação à supressão de instância, pois implica exame originário de matéria que não foi submetida à apreciação do juízo de primeiro grau. Trata-se de tema que, para ser validamente enfrentado nesta instância superior, deveria ter sido previamente arguido e enfrentado no juízo competente. Passa-se, pois, à apreciação das alegações deduzidas pela defesa técnica do paciente. O impetrante sustenta, em suma, a inexistência dos requisitos autorizadores da prisão preventiva, conforme delineados no art. 312 do Código de Processo Penal. Argumenta que a medida extrema de segregação cautelar carece de fundamentação concreta e que, no caso vertente, não estão presentes os pressupostos legais que a legitimem. Defende que o paciente ostenta condições pessoais favoráveis, porquanto é primário, possui bons antecedentes, mantém residência fixa e exerce atividade laborativa lícita em oficina mecânica devidamente registrada, além de ser responsável pelo sustento de filhos menores. Tais elementos, no entender da defesa, evidenciam o enraizamento do paciente no distrito da culpa e sua presumida submissão às ordens judiciais, revelando-se desnecessária a manutenção da prisão como medida de garantia da instrução criminal ou da aplicação da lei penal. Acrescenta que o paciente se apresentou espontaneamente à autoridade policial em 19 de maio de 2025, oportunidade em que teria colaborado com as investigações em curso, conduta que, na visão do impetrante, deveria ter sido valorada positivamente pelo juízo de origem e, no entanto, foi desconsiderada na decisão que decretou ou manteve a custódia cautelar. Por fim, invoca o princípio constitucional da isonomia, sob o argumento de que, embora Aline Lima da Costa Siebra — também investigada no mesmo contexto fático e apontada como autora do furto das armas de fogo da delegacia — tenha obtido a concessão de liberdade provisória, o mesmo tratamento jurídico não foi conferido ao paciente, criando-se, assim, uma disparidade injustificada no tratamento entre os investigados. No tocante ao pedido de revogação da prisão preventiva, entendo que assiste razão ao impetrante. Não obstante o indeferimento da liminar, a análise detalhada em sede de mérito revela que a prisão preventiva do paciente deve ser revista, uma vez que os elementos constantes nos autos evidenciam condições pessoais favoráveis que, embora não sejam garantias absolutas ao direito de liberdade, devem ser sopesadas conjuntamente com a inexistência de fundamentos concretos a justificar a necessidade da custódia cautelar. Não obstante o indeferimento da liminar, a análise detalhada em sede de mérito revela que a prisão preventiva do paciente deve ser revista, uma vez que os elementos constantes nos autos evidenciam condições pessoais favoráveis que, embora não sejam garantias absolutas ao direito de liberdade, devem ser sopesadas conjuntamente com a inexistência de fundamentos concretos a justificar a necessidade da custódia cautelar. Com efeito, muito embora o Juízo de origem tenha fundamentado a segregação cautelar do paciente na necessidade de garantir a ordem pública, à vista da gravidade do delito imputado e da suposta fuga do paciente, entendo que, à luz das peculiaridades do caso concreto e dos princípios constitucionais que regem a medida excepcional da prisão preventiva, não mais subsistem os requisitos autorizadores da custódia extrema, nos termos do art. 312, do Código de Processo Penal. É incontroverso nos autos que o paciente é tecnicamente primário e, à exceção do presente feito, responde apenas a outra ação penal de procedimento sumário (Processo n. 1000609-13.2023.8.11.0087), este ainda em fase de instrução. Ressalte-se, ainda, que o delito imputado ao paciente — comércio ilegal de arma de fogo, tipificado no art. 17, da Lei n. 10.826/03 — embora repute-se grave sob o aspecto abstrato, não se configura como crime praticado com violência ou grave ameaça à pessoa. Ademais, a justificativa utilizada na decisão que decretou a custódia cautelar — suposta fuga do paciente após os fatos — revela-se superada, considerando que CLEITON DEVAIR se apresentou à autoridade policial em 19 de maio de 2025. Desde então, permanece preso, completando-se período superior a um mês de segregação até o presente momento. A par disso, todos os demais investigados no mesmo contexto fático encontram-se em liberdade. GEOVANI SILVA DE ALCANTARA, que admitiu ter intermediado diversas vendas de armas e entregou o paciente, sequer teve sua prisão preventiva decretada. ALINE LIMA DA COSTA SIEBRA (escrivã da delegacia), apontada nos autos como responsável pela subtração inicial das armas de fogo da delegacia, teve sua prisão substituída por medidas cautelares diversas. Não obstante a individualização das medidas cautelares seja imperativo jurídico insculpido no ordenamento processual penal, não se vislumbra, no caso concreto, a existência de fundamentos fáticos ou jurídicos específicos e robustos que justifiquem, de forma isolada e diferenciada, a manutenção da custódia cautelar exclusivamente em relação ao paciente. Ao revés, constata-se um desequilíbrio no tratamento conferido aos corréus, o qual, desprovido de motivação substancial, acaba por afrontar o princípio da isonomia processual e comprometer a razoabilidade da segregação ora imposta. Não se vislumbra, igualmente, risco atual e concreto à ordem pública, à conveniência da instrução criminal ou à aplicação da lei penal. Não há nos autos qualquer elemento que indique que o paciente possa destruir provas, intimidar testemunhas ou reincidir em práticas delitivas. Seu comparecimento perante a autoridade, aliado à ausência de conduta posterior que denote desvio de comportamento, reforça o esvaziamento do periculum libertatis. Entendo, portanto, que no caso em tela a imposição das cautelares diversas da prisão se revelam suficientes para tutelar a ordem pública, sobretudo porque em termos de medidas cautelares pessoais, o Juiz deve sempre que possível optar pelas menos onerosas à liberdade do indiciado ou acusado. O paciente é tecnicamente primário e juntou documentos que comprovam que possui emprego e residência fixa, sendo assim as condições pessoais favoráveis, mesmo não sendo garantidoras de eventual direito à soltura, merecem ser devidamente valoradas, quando demonstrada a possibilidade de substituição da prisão por medidas diversas, adequadas e suficientes aos fins a que se propõem. (HC 333.330/SP -Relator: Min. Jorge Mussi – 6.11.2015). Com efeito dispõe o art. 282, do CPP que: Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: I - necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; II - adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado. (...) § 6º. A prisão preventiva somente será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar, observado o art. 319 deste Código, e o não cabimento da substituição por outra medida cautelar deverá ser justificado de forma fundamentada nos elementos presentes do caso concreto, de forma individualizada (grifos meus). Em contexto análogo, este Sodalício já reconheceu a desproporcionalidade da medida segregatória em crime sem grave ameaça, considerando justamente os predicados pessoais favoráveis do paciente para determinar a revogação da prisão preventiva. Vejamos: HABEAS CORPUS – EXTORSÃO – PRETENDIDA A REVOGAÇÃO DA CUSTÓDIA CAUTELAR – ALEGADA INIDONEIDADE DA DECISÃO CONSTRITIVA E AUSÊNCIA DOS REQUISITOS QUE AUTORIZAM A PRISÃO PREVENTIVA – DISCUSSÃO ACERCA DO MÉRITO DA AÇÃO PENAL QUE NÃO COMPORTA APRECIAÇÃO EM SEDE DE HABEAS CORPUS – ARGUIÇÕES QUE DEVERÃO SER DEDUZIDAS NOS AUTOS DA AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA – IDENTIFICADOS INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA E PROVA DA MATERIALIDADE DELITIVA – PRISÃO IMPOSTA PARA ACAUTELAR A ORDEM PÚBLICA E RESGUARDAR A INSTRUÇÃO CRIMINAL – PACIENTE QUE OSTENTA PREDICADOS PESSOAIS FAVORÁVEIS – APARENTE AUSÊNCIA DE PERICULOSIDADE SOCIAL – DESPROPORCIONALIDADE DA PRISÃO – SUFICIÊNCIA DAS MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS – CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO – ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. 1. Constatando-se que a ordem pública pode ser assegurada, neste momento, mediante a imposição de cautelares menos onerosas, convém a substituição do isolamento por outras medidas, especialmente em face dos predicados pessoais favoráveis ostentados pelo paciente e da aparente ausência de risco à coletividade, tudo a corroborar a desproporcionalidade da segregação cautelar, mostrando-se suficientes e mais adequadas à hipótese a fixação de providências cautelares diversas do cárcere, previstas no art. 319 do Código de Processo Penal. 2. Ordem parcialmente concedida, para substituir a prisão preventiva do paciente por medidas cautelares alternativas. (N.U 1018716-75.2023.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, GILBERTO GIRALDELLI, Terceira Câmara Criminal, Julgado em 27/09/2023, publicado no DJE 28/09/2023) (grifos meus). Diante desse quadro, não verifico na decisão hostilizada qualquer evidência concreta que justifique a manutenção da prisão preventiva do paciente, pois ausentes as circunstâncias que demonstrem de forma efetiva a periculosidade deste para a sociedade, que possa obstruir a continuidade do processo penal ou que dificulte sua localização. É pertinente mencionar o que disse o Ministro Rogério Schietti, porque calha ao presente caso, acerca de alternativas à segregação: Dentro do Direito Penal nós temos escolhas melhores que a prisão (obiter dictum em palestra proferida na Escola da Magistratura de Mato Grosso - ESMAGIS, em 19.07.2024). Ante o exposto, em dissonância com o parecer ministerial, CONCEDO A ORDEM em favor de Cleiton Devair Da Silva, para fins de substituir a prisão preventiva por medidas cautelares diversas (artigo319,doCPP), dentre as quais estabeleço as seguintes, sem embargo de o Juízo da origem fixar outras que, porventura, entenda necessárias, tudo com o objetivo de garantir a instrução e propiciar eventual aplicação da lei penal: I) Comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas na origem, para informar e justificar suas atividades; II) Proibição de ausentar-se da Comarca sem autorização judicial; III) Proibição de portar quaisquer instrumentos que representem risco à integridade física de outrem, tais como arma de fogo, faca, canivete, estilete e outros congêneres; III) Ingressar e submeter ao sistema de monitoramento eletrônico, mediante o uso de tornozeleira eletrônica. COMUNIQUE-SE o Juízo de origem para fins de expedição do Alvará de Soltura, observadas as medidas cautelares impostas, salvo se o paciente estiver preso por outro motivo. É como voto. Data da sessão: Cuiabá-MT, 01/07/2025
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