Instituto Nordeste Cidadania e outros x Instituto Nordeste Cidadania e outros
ID: 328594892
Tribunal: TRT21
Órgão: Primeira Turma de Julgamento
Classe: RECURSO ORDINáRIO TRABALHISTA
Nº Processo: 0000907-89.2024.5.21.0012
Data de Disponibilização:
18/07/2025
Polo Passivo:
Advogados:
DANIEL CARLOS MARIZ SANTOS
OAB/CE XXXXXX
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SAVIO DINIZ FALCAO SILVA
OAB/PB XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 21ª REGIÃO PRIMEIRA TURMA DE JULGAMENTO Relator: BENTO HERCULANO DUARTE NETO ROT 0000907-89.2024.5.21.0012 RECORRENTE: INST…
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 21ª REGIÃO PRIMEIRA TURMA DE JULGAMENTO Relator: BENTO HERCULANO DUARTE NETO ROT 0000907-89.2024.5.21.0012 RECORRENTE: INSTITUTO NORDESTE CIDADANIA E OUTROS (1) RECORRIDO: MARIANA MYRTES DA COSTA SOUZA E OUTROS (1) Acórdão RECURSO ORDINÁRIO TRABALHISTA Nº 0000907-89.2024.5.21.0012 DESEMBARGADOR REDATOR: BENTO HERCULANO DUARTE NETO 1º RECORRENTE: INSTITUTO NORDESTE CIDADANIA ADVOGADO: DANIEL CARLOS MARIZ SANTOS - CE0014623 2ª RECORRENTE: MARIANA MYRTES DA COSTA SOUZA ADVOGADO: SAVIO DINIZ FALCÃO SILVA - PB0020885 RECORRIDAS: AS PARTES ORIGEM: POSTO AVANÇADO DE PAU DOS FERROS EMENTA Recurso ordinário do reclamante DIREITO DO TRABALHO. RECURSO ORDINÁRIO. (I) COMISSÕES. REMUNERAÇÃO VARIÁVEL. DIFERENÇAS SALARIAIS. REFORMA DA SENTENÇA. (II) HORAS EXTRAS. VALIDADE DOS REGISTROS DE PONTO. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS CAPAZES DE INFIRMAR A PROVA DOCUMENTAL. (III) ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. USO DE MOTOCICLETA. (IV) INDENIZAÇÃO PELO USO DE VEÍCULO PARTICULAR. ADEQUAÇÃO DO VALOR FIXADO. I. Caso em exame 1. Recurso ordinário em que o reclamante busca a reforma da sentença para aumentar o valor da indenização pelo uso de veículo particular, bem como para condenar o reclamado ao pagamento de horas extras, diferenças de comissões e adicional de periculosidade. II. Questões em discussão 2. As questões em discussão consistem em saber: (i) se o reclamante faz jus ao reconhecimento da jornada declinada na petição inicial e, por conseguinte, ao pagamento de horas extras; (ii) se é devido o adicional de periculosidade em razão do uso habitual de motocicleta no desempenho das atividades profissionais; (iii) se houve repasse indevido do risco do empreendimento ao empregado, em decorrência da vinculação da remuneração variável à inadimplência de clientes; (iv) se o valor arbitrado em primeira instância a título de indenização pelo uso de veículo particular mostra-se adequado. III. Razões de decidir 3. A estipulação de critérios relacionados à inadimplência de clientes como base para o cálculo da remuneração variável caracteriza repasse do risco da atividade econômica ao empregado, prática vedada pelos artigos 2º e 462 da CLT. 4. Restando comprovado que o reclamante utilizava motocicleta de forma habitual no exercício de suas funções, e não havendo medida judicial que suspenda os efeitos da Portaria nº 1.565/2014 em benefício do reclamado, incide a norma do artigo 193, § 4º, da CLT, de aplicação imediata, impondo-se a condenação ao pagamento do adicional de periculosidade. 5. Inexistindo elementos nos autos capazes de invalidar os cartões de ponto apresentados pelo reclamado, os quais atendem às exigências do artigo 74, § 2º, da CLT, e apresentam horários variáveis e pagamento ou compensação de eventuais horas extras prestadas, não há como condenar o reclamado ao pagamento das horas suplementares vindicadas, decorrentes do alegado trabalho em sobrejornada e do intervalo intrajornada, motivo pelo qual deve ser mantida a sentença que indeferiu as referidas parcelas. 6. O valor de R$ 100,00 mensais, arbitrado na origem a título de indenização pela utilização de veículo próprio, revela-se proporcional e suficiente para compensar a depreciação decorrente do uso do bem particular em atividade laboral, não havendo elementos que justifiquem sua majoração. IV. Dispositivo 7. Recurso ordinário conhecido e parcialmente providopara acrescentar à condenação a obrigação de pagar: 1) diferenças de comissões, durante todo o contrato de trabalho, entre o que foi recebido pela autora e o valor de R$752,00, com reflexos em férias acrescidas de um terço, 13ºs salários e FGTS, deduzindo o valor pago sob mesma rubrica (95.2 remuneração variável/comissões) no TRCT (fl. 994); e 2) adicional de periculosidade, à razão de 30% sobre o salário fixo acrescido das comissões recebidas, durante todo o contrato de trabalho, observada a prescrição declarada em sentença (02/12/2019), com repercussão em 13º salário, férias mais um terço, aviso prévio e FGTS mais 40%. __________________________ Tese de julgamento: 1. É devido o adicional de periculosidade ao empregado que utiliza motocicleta de forma habitual para a prestação de serviços externos. 2. A vinculação das comissões à inadimplência dos clientes configura transferência do risco do empreendimento ao trabalhador, sendo devidas as diferenças salariais __________________________ Dispositivos relevantes citados: CLT, arts. 2º, 62, I, 74, § 2º, 193, § 4º, e 457, § 4º; CPC, arts. 373, I, e 374, I. Jurisprudência relevante citada: TRT-21, ROT 0000789-14.2023.5.21.0024, Rel. Des. Ronaldo Medeiros de Souza, 2ª Turma, j. 21.04.2024; TRT-7, ROT 0000665-13.2022.5.07.0038, Rel. Des. Carlos Alberto Rebonatto, 3ª Turma, j. 20.06.2023. Recurso ordinário do reclamado DIREITO DO TRABALHO. PROCESSO DO TRABALHO. RECURSO ORDINÁRIO. (I) (I) JUSTIÇA GRATUITA. DEFERIMENTO MANTIDO. (II) INDENIZAÇÃO PELO USO DE VEÍCULO PARTICULAR. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. I. Caso em exame 1.Recurso ordinário interposto pela reclamada contra sentença que: (i) concedeu à reclamante os benefícios da justiça gratuita; e (ii) condenou a parte ré ao pagamento de indenização pelos gastos com manutenção e depreciação de veículo próprio utilizado na prestação dos serviços, no valor de R$ 100,00 por mês trabalhado, durante o período não alcançado pela prescrição contratual. II. Questões em discussão 2. Em discussão: (i) a possibilidade de concessão da justiça gratuita à reclamante; (ii) a legitimidade da condenação ao pagamento de indenização pelo uso habitual de veículo próprio na execução dos serviços. III. Razões de decidir 3. A norma celetista em vigência autoriza o juiz a deferir o benefício da justiça gratuita, inclusive de ofício, àqueles que percebem salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, e dispõe que apenas as pessoas físicas que, ao ajuizarem a ação, estão auferindo renda superior a 40% do maior benefício pago pela Previdência Social, necessitam comprovar a insuficiência de recursos, para a concessão da gratuidade de justiça. Assim, considerando-se que a reclamante declarou na inicial que estava desempregada e não tinha condições de arcar com as despesas processuais, sob pena de prejuízo próprio ou de seus familiares, além de ter juntado aos autos Declaração de Hipossuficiência, e que a recorrente não trouxe nenhum elemento apto a desconstituir o seu estado financeiro deficitário, deve ser mantido o deferimento do benefício da justiça gratuita à reclamante. 4. É ônus do empregador suportar os custos da atividade econômica, nos termos dos artigos 2º e 3º da CLT. Desse modo, os gastos com a manutenção e a depreciação do veículo próprio utilizado pela empregada no desempenho habitual de suas funções devem ser reembolsados, sob pena de transferência indevida do risco do negócio à trabalhadora. Mostra-se adequada, portanto, a indenização fixada na sentença no valor de R$ 100,00 mensais. IV. Dispositivo 5. Recurso ordinário conhecido e desprovido. __________________________ Tese de julgamento: 1. A declaração de hipossuficiência econômica é suficiente para a concessão da justiça gratuita, salvo prova em contrário. 2. É devida a indenização pela depreciação de veículo próprio utilizado de forma habitual pelo empregado para fins laborais. __________________________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, LXXIV; CLT, arts. 2º e 790, §§ 3º e 4º; CPC, art. 374, I. RELATÓRIO Adoto o relatório elaborado pela Excelentíssima Desembargadora Relatora: "Trata-se de recurso ordinário interposto por INSTITUTO NORDESTE CIDADANIA e MARIANA MYRTES DA COSTA SOUZA contra a sentença prolatada pelo Exmo. Juiz Felipe Marinho Amaral, em atuação no Posto Avançado de Pau dos Ferros. O juízo de origem julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados para condenar o reclamado ao pagamento de "Indenização com gastos de manutenção e depreciação de veículo próprio utilizado na prestação dos serviços, no valor de R$ 100,00 por mês trabalhado, durante o período não prescrito do contrato de trabalho" (Id. e99aa85). Em razões recursais (Id. 1664092), o reclamado interpõe recurso ordinário impugnando a concessão dos benefícios da justiça gratuita à reclamante, sustentando que ela não teria comprovado a insuficiência econômica, conforme exige o §4º do artigo 790 da CLT. No mérito, insurge-se contra a condenação ao pagamento de indenização pelo uso do veículo particular, sustentando que a utilização do automóvel pela reclamante era facultativa, não tendo a empresa exigido o seu uso para execução das atividades laborais. Destaca que sempre forneceu antecipadamente os valores referentes ao deslocamento e manutenção aos empregados que optaram por utilizar veículo próprio. Alega ainda que inexiste prova documental dos gastos com manutenção ou da obrigatoriedade do uso do veículo particular, citando jurisprudências que afastam o direito à indenização em tais situações. O reclamado apresentou razões recursais repetidas ao Id. bff8ca7. A reclamante apresenta recurso ordinário buscando a reforma da decisão em epígrafe. Renova o pedido de pagamento de horas extras, sustentando que houve erro na análise das provas, porquanto o controle da jornada era plenamente viável através de meios telemáticos, tais como GPS instalado em tablets fornecidos pela empresa e contatos diários com os coordenadores, tornando inaplicável a exceção do artigo 62, inciso I da CLT. Destaca que os registros de ponto apresentados eram fraudulentos e manipulados, situação reconhecida em diversos processos análogos, inclusive com depoimentos confirmando o labor das 7h30 às 19h30 ou até mais tarde, com intervalo intrajornada insuficiente de apenas 30 minutos. Quanto às comissões, sustenta serem indevidos os descontos por inadimplência dos clientes, ressaltando que a empresa ilegalmente transfere os riscos do negócio ao trabalhador, violando o princípio da alteridade, e pleiteia as diferenças no pagamento das comissões com seus respectivos reflexos. Reitera o pedido do adicional de periculosidade em razão da utilização de motocicleta para o desempenho de suas atividades, defendendo que a norma prevista no artigo 193, § 4º da CLT é autoaplicável. Por fim, pede a majoração da indenização pelo uso do veículo particular, sustentando que os valores pagos pela empresa são insuficientes para cobrir os custos de manutenção, depreciação e combustível. As partes apresentaram contrarrazões (Ids. b96e359 e e9e9243). Em despacho de Id.d28f7ba, esta Relatora determinou que o reclamado procedesse à regularização da representação processual, no prazo de 5 dias, sob pena de não conhecimento do recurso interposto por defeito de representação. O reclamado juntou nova procuração ao Id. fa628a5. Desnecessária a remessa dos autos ao Ministério Público do Trabalho, por não se tratar de matérias previstas no art. 81 do Regimento Interno deste Regional. É o relatório." FUNDAMENTAÇÃO ADMISSIBILIDADE Adoto a admissibilidade realizada pela Excelentíssima Desembargadora Relatora: "Recurso ordinário do reclamado interposto tempestivamente. Representação regular (Id. fa628a5). Preparo recolhido. Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso ordinário. Deixo de conhecer razões recursais repetidas apresentadas pelo reclamado, presentes ao Id. bff8ca7, em razão da preclusão consumativa. Recurso ordinário da reclamante interposto tempestivamente. Representação regular. Preparo inexigível. Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso ordinário. Será primeiramente analisado o recurso ordinário da reclamante." PRELIMINAR JUSTIÇA GRATUITA Adoto a apreciação da preliminar de Justiça Gratuita realizada pela Excelentíssima Desembargadora Relatora: "O reclamado impugna a concessão dos benefícios da justiça gratuita à reclamante, sustentando que ela não teria comprovado a insuficiência econômica, conforme exige o §4º do artigo 790 da CLT. Sabe-se que o direito fundamental à assistência jurídica integral e gratuita depende da comprovação de insuficiência de recursos, consoante o disposto no art. 5º, LXXIV, da Constituição Federal. No mesmo sentido, o §4º do art. 790 da CLT, incluído pela Lei nº 13.467/2017, vaticina que "o benefício da justiça gratuita será concedido à parte que comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo". Contudo, o §3º do art. 790 da CLT, alterado pela Lei n. 13.467/2017, estabelece que poderão ser concedidos os benefícios da justiça gratuita às partes que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, in verbis: § 3º É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. Na petição inicial, a reclamante declarou estar desempregada e não possuir condições de arcar com as despesas processuais, sob pena de prejuízo próprio ou de seus familiares, além de ter juntado aos autos declaração de hipossuficiência econômica (Id. cec6239), e que a recorrente não trouxe nenhum elemento apto a desconstituir o seu estado financeiro deficitário, deve ser mantido o deferimento do benefício da justiça gratuita à reclamante. Desta forma, a reclamante faz jus aos benefícios da justiça gratuita já deferidos. O recurso ordinário não merece provimento sob este aspecto. Nego provimento." MÉRITO RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE DIFERENÇAS DE COMISSÕES Adoto a parte inicial da redação do presente capítulo elaborada pela Excelentíssima Desembargadora Relatora: "A reclamante sustenta serem indevidos os descontos por inadimplência dos clientes, ressaltando que a empresa ilegalmente transfere os riscos do negócio ao trabalhador, violando o princípio da alteridade, e pleiteia as diferenças no pagamento das comissões com seus respectivos reflexos. O d. Magistrado sentenciante indeferiu o pedido sob os seguintes fundamentos: 2.2 - Diferenças salariais - Remuneração variável A reclamante afirma que sua remuneração era composta por uma parte fixa e outra variável, sendo que a parte variável correspondia a uma comissão pela produtividade, que era paga sempre que as metas e objetivos estipulados pela empresa, em regulamento interno (Cartilha de Remuneração Variável), eram atingidos. Sustenta, contudo, que a reclamada desenvolveu atos fraudulentos que causavam prejuízos na Remuneração Variável da autora, uma vez que, embora apresentasse uma planilha contendo o valor a ser recebido, no contracheque, realizava o registro e pagamento de uma quantia inferior, justificando que a diferença correspondia à incidência de um fator de risco de clientes inadimplentes. Aduz que as deduções de inadimplências era ilegais, por representar a transferência do risco da atividade empresarial ao empregado, requerendo a condenação da reclamada ao pagamento de diferenças salariais, com reflexos sobre aviso prévio, 13° salário, férias + 1/3, FGTS + 40%. Em sua contestação, a reclamada alegou que inexistem diferenças de comissões a serem pagas, sendo que jamais foram realizados descontos em comissão. Aduz que a reclamada busca, na realidade, interferir no modo de cálculo da remuneração variável estabelecida pela empresa, inerente ao poder diretivo do empregador. Sustenta que, diferentemente do alegado pelo reclamante, o empregado não responde pela inadimplência dos clientes, bem como não sofre descontos na sua remuneração, deixando apenas de receber a comissão por não ter atingido a meta específica. Decido. O cerne da presente questão encontra-se na suposta realização de descontos ou pagamento incompleto das comissões devidas à reclamante, por parte da reclamada. Em que pese a matéria possa ser objeto de distribuição dinâmica do ônus da prova, considerando a aptidão para as respectivas provas, à princípio, tratando-se de fato constitutivo de seu direito, cabe à parte autora, que alega a existência de diferenças salariais a serem pagas, demonstrar a ocorrência dos alegados descontos nas comissões, nos termos do art. 818, inc. I, d CLT. Na cartilha de Remuneração Variável anexada pela reclamada (Id. c333cd6), é possível verificar a metodologia estabelecida para o cálculo desta remuneração, que é determinada a partir do produto do Desempenho (DES) do reclamante pelo Valor de Referência do Cargo (VRC). Para o cálculo do DES, são utilizados três indicadores: Incremento de Clientes, Carteira Ativa e Carteira de Risco Médio, cada um com seu respectivo peso. Além disso, são consideradas variáveis como: Contratação Crescer, Contratação Mais, Renovação, Recuperação de Crédito, Reembolso Efetivo e Acompanhamento. Cabe destacar que o indicador relacionado à Carteira de Risco Médio representa a qualidade na gestão dos créditos desembolsados, sendo apurado pelo valor médio das parcelas com atraso. Com base nas referidas informações, observo que as diferenças apontadas pelo reclamante decorrem exatamente de um desconto no valor da Remuneração Variável com base na inadimplência dos contratos que ele negociou. Na realidade, a adimplência/inadimplência repercutem no cálculo da RV a ser recebida pelo obreiro, por ser considerada nos cálculos das metas (Fatores Variáveis), o que poderia ser interpretado, em um primeiro momento, como uma transferência dos riscos da atividade econômica para o empregado. Entretanto, esse não é o melhor entendimento a ser aplicado no presente caso. Isso porque, tratando-se a remuneração variável de um benefício estabelecido por regulamentações internas da empresa, não há dúvidas que caracteriza-se como um benefício não previsto em lei, sendo oriundo do poder diretivo do empregador, pelo que não pode o judiciário interferir na metodologia por ele adotada para conferir o referido plus a seus empregados. Nesse cenário, ao contrário do alegado pelo reclamante na peça inicial, não há que se falar em descontos indevidos na remuneração do obreiro (seja na parte fixa ou variável) em razão de inadimplência posterior dos contratos por ele firmados. O que existe, de fato, é um modelo objetivo e pré-determinado para calcular o valor devido a título de Remuneração Variável, com base em vários indicadores e fatores variáveis, sendo que um deles considera a adimplência/inadimplência dos clientes contratantes. Dessa forma, tendo a Reclamada apresentado a metodologia de cálculo da remuneração variável de forma detalhada, demonstrando os indicadores utilizados e a forma de cálculo, tem-se que, de fato, a remuneração variável era calculada com base em indicadores objetivos e previamente estabelecidos, de forma que, considerando a clareza da metodologia apresentada, não há elementos para acolher a alegação da parte Reclamante de que a remuneração variável era paga de forma obscura ou fraudulenta. Vale destacar, ainda, que, embora exista uma certa divergência, à luz de recentes julgados, é possível verificar que o TRT-21ª região tem inclinado-se a adotar o entendimento de que inexiste óbice legal para que a taxa de adimplência da carteira figure como um dos indicadores do cálculo da remuneração variável, em especial quando o referido indicador promove e incentiva a qualidade na atuação do empregado, não havendo falar em violação de regramento trabalhista. Nesse sentido, vejamos ementas de recentes julgados deste tribunal acerca da matéria: (...) Ante todo o exposto, não restando comprovado qualquer desconto salarial indevido em desfavor do reclamante, bem como reconhecida a regularidade da metodologia adotada pela empresa, julgo improcedente o pedido de condenação das reclamadas ao pagamento de diferenças salariais. Pois bem." De início, cumpre registrar que este Relator já havia se posicionado, em casos anteriores, no sentido de que não haveria propriamente um desconto na remuneração variável percebida pelo autor em razão da inadimplência dos contratos por ele negociados, mas sim uma influência da inadimplência no cálculo dessa parcela, o que seria admissível, diante da ausência de vedação legal. Ocorre que, após análise detida e ponderação dos argumentos apresentados em outros processos submetidos a julgamento, este Relator decidiu revisitar a questão. Assinalo, desde logo, que a verba em discussão não possui natureza de prêmio. O prêmio, nos termos do § 4º do art. 457 da CLT, configura liberalidade do empregador e possui natureza indenizatória. Trata-se de parcela paga em razão de desempenho extraordinário do empregado, o que não se coaduna com a situação em exame, na qual a remuneração variável era paga com base na produtividade e em critérios previamente definidos pelo empregador. Trata-se, portanto, de comissão, de natureza eminentemente salarial. Quanto à realização de descontos nas comissões, o INEC afirmou, na contestação, o seguinte (ID bca5f2d): "(...) que o reclamante não sofria descontos de suas comissões. Assim, a controvérsia passa ao largo do instituto jurídico fixado no artigo 462 da CLT. (...) O valor da RV depende diretamente do desempenho alcançado no mês, medido em conformidade com os parâmetros esperados por meio de indicadores pré-estabelecidos. (...)" Aduziu, ainda, que a remuneração variável complementa a remuneração da empregada, sendo o seu valor condicionado ao atingimento de metas e à produtividade mensal. De fato, a oscilação no valor das comissões de um mês para outro, por si só, não configura irregularidade, pois é inerente à própria natureza dessa parcela remuneratória. O que se analisa, contudo, é a alegação de supressão do pagamento de comissões em decorrência da inadimplência dos clientes - circunstância que, se comprovada, pode configurar transferência indevida dos riscos da atividade econômica ao empregado, conduta vedada pelo ordenamento jurídico. Embora o INEC negue a prática de descontos na remuneração variável, juntou aos autos documentos que demonstram a apuração dos valores devidos à autora mês a mês, inclusive relatórios e demonstrativos que detalham o desempenho e a metodologia de cálculo da parcela variável. Destacam-se, ainda, os documentos intitulados "Cartilha de Remuneração Variável"(IDs fc73e98 e seguintes), os quais apresentam orientações fornecidas aos empregados sobre a composição da remuneração variável. Dessa cartilha, extraem-se trechos relevantes para o deslinde da controvérsia: "Quais são os indicadores usados para calcular a RV? No cálculo da RV são utilizados indicadores de desempenho e sustentabilidade, que tem como objetivo principal o alcance das metas estabelecidas, aliados a qualidade da carteira e sustentabilidade do programa. São eles: - Incremento de Clientes - Carteira Ativa (360 dias) - Carteira de Risco Médio (360 dias) (...) Como calcular o indicador Carteira de Risco? A Carteira de Risco representa a qualidade na gestão dos créditos desembolsados, sendo apurado pelo o valor médio das parcelas com atraso, conforme cálculo abaixo. (...) Importante! A Carteira de Risco superior a 5%, a RV é ZERADA. (...)" Portanto, um dos critérios estabelecidos para o pagamento da remuneração variável - denominado "Carteira de Risco"- implica indevida transferência do risco do empreendimento ao trabalhador, na medida em que condiciona o ganho mensal da empregada à eventual inadimplência dos clientes. Trata-se de critério que restringe a percepção da parcela remuneratória em análise, uma vez que, ainda que a empregada alcance bom desempenho nos demais indicadores utilizados no cálculo da remuneração variável, esta poderá resultar em valor zero, caso o índice de inadimplência supere o limite fixado pela empregadora. Nessa linha, a testemunha arrolada pela reclamante declarou: "(...) que não foi informado que a inadimplência interferia na remuneração variável; no ato da contratação; que o agente não pode aprovar créditos; que existe um teto de remuneração variável de 2.010 reais para gente de crédito e 730 para administrativo; que nunca recebeu o teto; por conta da inadimplência, que a inadimplência tem como zerar toda a remuneração variável; (...) que só recebe remuneração variável após receber carteira de clientes; que já teve a remuneração variável zerada" (ID cbc9622). Assim, evidenciada a transferência do risco do negócio para a empregada, é devido o pagamento de diferenças de comissões. Colaciono jurisprudência deste e de outro Regional: ANÁLISE CONJUNTA DOS RECURSOS DAS RECLAMADAS. REMUNERAÇÃO VARIÁVEL. DIFERENÇAS SALARIAIS. MANUTENÇÃO DA CONDENAÇÃO. Os demonstrativos de remuneração variável anexados aos autos referentes ao período não prescrito evidenciam que, dentre os vários indicadores utilizados pela reclamada principal para calcular a remuneração variável da reclamante, estavam alguns fatores que realmente não dependiam da sua atuação profissional, como por exemplo, o número de clientes inadimplentes. Assim, conforme bem afirmou o Juízo de origem, apesar de não haver efetivo desconto em contracheque, este ônus era camuflado através da remuneração variável, resultando, ao final, na diminuição do valor da remuneração variável a ser recebida quando houvesse inadimplência dos clientes. Por fim, à luz da jurisprudência do TST, reputa-se que a remuneração variável, em razão de sua natureza de comissão, possui natureza salarial. Não provido. (...) (TRT da 21ª Região; Processo: 0000789-14.2023.5.21.0024; Data de assinatura: 21-04-2024; Órgão Julgador: Gabinete do Desembargador Ronaldo Medeiros de Souza - Segunda Turma de Julgamento; Relator(a): Ronaldo Medeiros de Souza) (...) RECURSO ORDINÁRIO DO PRIMEIRO RECLAMADO INSTITUTO NORDESTE CIDADANIA - INEC. REMUNERAÇÃO VARIÁVEL (RV). DESCONTOS INDEVIDOS. RISCO DA ATIVIDADE ECONÔMICA REPASSADO PARA O EMPREGADO. ÓBICE ART. 2º DA CLT. Na prova emprestada constata-se que o INEC procedia descontos na remuneração variável (RV) por inadimplência dos clientes, chegando mesmo a zerar. Resta provado que o risco da atividade econômica era repassado ao recorrido bem como aos demais agentes de microcrédito, o que vedado pela legislação trabalhista (art. 2º da CLT). Sentença mantida. Recurso conhecido e improvido. (TRT-7 - ROT: 00006651320225070038, Relator: Carlos Alberto Trindade Rebonatto, 3ª Turma, Data de Publicação: 20/06/2023) Dessa forma, dou provimento parcial ao recurso da autora, para acrescer à condenação a obrigação de pagar diferenças de comissões, durante todo o contrato de trabalho, entre o que foi recebido pela autora e o valor de R$ 752,00, com reflexos em férias acrescidas de um terço, 13ºs salários e FGTS, deduzindo o valor pago sob mesma rubrica (95.2 remuneração variável/comissões) no TRCT (ID 3901e1a). ADICIONAL DE PERICULOSIDADE Adoto a parte inicial da redação do presente capítulo elaborada pela Excelentíssima Desembargadora Relatora: "A reclamante reitera o pedido do adicional de periculosidade em razão da utilização de motocicleta para o desempenho de suas atividades, defendendo que a norma prevista no artigo 193, § 4º da CLT é autoaplicável. Ao exame. Compulsando-se os autos, verifica-se ser incontroverso que a parte reclamante, a partir de 01.10.2021, passou a exercer a função de agente de microcrédito, tendo permanecido na função até 07.12.2022, quando da rescisão, e que utilizava motocicleta no exercício da atividade laboral." Constatou-se, ainda, que a reclamada realizava o controle da quilometragem percorrida e ressarcia os gastos com combustível. A natureza da atividade - que envolvia deslocamentos constantes e visitas a diversos clientes - evidencia que o uso da motocicleta não era facultativo, mas sim condição necessária ao exercício da função. Com efeito, a testemunha indicada pela reclamante declarou, em audiência (ID cbc9622), o seguinte: "(...) que utilizava moto para trabalhar, assim como a reclamante; (...) que a reclamante rodava em média 170km por dia; que já fez rota junto com o reclamante". Não subsiste, pois, a tese defensiva de que o uso da motocicleta não era habitual ou que se dava por tempo reduzido. Importa registrar, ademais, que a reclamada não comprovou a existência de decisão judicial que suspendesse os efeitos da Portaria MTE nº 1.565/2014 em seu favor. Especificamente, embora o Tribunal Regional Federal da 1ª Região tenha declarado a nulidade da referida Portaria no processo nº 0018311-63.2017.4.01.3400, tal decisão não a beneficia, uma vez que a reclamada não figura como parte naquele feito, tampouco em quaisquer dos processos que determinaram a suspensão de seus efeitos. Ressalte-se, ainda, que a própria recorrente não apresentou qualquer alegação ou comprovação nesse sentido. Dessa forma, comprovada a utilização habitual de motocicleta pela reclamante no exercício da função de agente de microcrédito, é devido o adicional de periculosidade, conforme dispõe o art. 193, § 4º, da CLT e a Portaria MTE nº 1.565/2014. Dessa forma, dou provimento ao recurso da autora, para acrescentar à condenação a obrigação de pagar adicional de periculosidade, à razão de 30% sobre o salário fixo acrescido das comissões recebidas, durante todo o contrato de trabalho, observada a prescrição declarada em sentença (02/12/2019), com repercussão em 13º salário, férias mais um terço, aviso prévio e FGTS mais 40%. HORAS EXTRAS E INTERVALO INTRAJORNADA Adoto, como razões de decidir, a fundamentação exposta neste capítulo, tal como redigida pela Excelentíssima Desembargadora Relatora. "A reclamante reitera o pedido de pagamento de horas extras, sustentando que houve erro na análise das provas, porquanto o controle da jornada era plenamente viável através de meios telemáticos, tais como GPS instalado em tablets fornecidos pela empresa e contatos diários com os coordenadores, tornando inaplicável a exceção do artigo 62, inciso I da CLT. Destaca que os registros de ponto apresentados eram fraudulentos e manipulados, situação reconhecida em diversos processos análogos, inclusive com depoimentos confirmando o labor das 7h30 às 19h30 ou até mais tarde, com intervalo intrajornada insuficiente de apenas 30 minutos. O d. Magistrado de origem indeferiu o pedido de horas extras sob os seguintes fundamentos: 2.1 - Das horas extras A reclamante afirma que foi contratada para trabalhar como Agente Administrativa, bem como que, a partir de novembro/2021 passou a exercer a função de Agente de Microcrédito. Alega que cumpri jornada interna e externa, de segunda a sexta, das 07h:30min às 19h:30min, com intervalo intrajornada de apenas 30 minutos. Desde sua petição inicial, a reclamante já impugnou os cartões de ponto da reclamada, afirmando que estes não refletem a realidade laboral vivenciada pelo autor, uma vez que a reclamada determinava que os preenchimentos fossem feitos com os horários pré-determinados, ou seja, não ultrapassando 08 horas diárias e sempre com variações de minutos. Aduz, ainda, que mesmo com a adoção do ponto eletrônico, a referida realidade não foi alterada, uma vez que os referidos cartões eram editados pelo coordenador. Pleiteia a condenação da reclamada ao pagamento de horas extras e intervalo intrajornada suprimido, com adicional de 50%, divisor de 200, com reflexos sobre aviso prévio, 13° salário, férias + 1/3, DSR's, FGTS + 40%, Gratificação porte de mercado, situacional por função, situacional reflexos DSR, Repouso Remunerado, Remuneração Variável e Verbas de Caráter Pessoal. A reclamada, em sua contestação, impugnou o pleito de horas extras, afirmando que, no exercício da função de Agente de Microcrédito, o reclamante exercia jornada externa, atraindo a aplicação do art. 62, inc. I, da CLT. Alega que a partir de março/2020, em razão da Pandemia do Covid-19, houve uma grande alteração na rotina de trabalho do reclamante, que passou a trabalhar no regime de Home Office, sendo realizadas reuniões de forma virtual, além de reduzidas as metas de trabalho. Sustenta que o ponto eletrônico foi implementado somente em abril/2021, sendo inverídica a jornada de trabalho alegada pela autora, bem como que sempre concedeu integralmente a hora de repouso e alimentação, conforme controles de frequência e contracheques anexados aos autos. Impugnou, ainda, o pleito de aplicação do divisor 200, afirmando que a reclamante não anexou nenhuma norma coletiva estabelecendo a jornada de 40 horas semanais. Decido. Uma vez que a reclamada possui em seus quadros mais de 20 (vinte) funcionários, cabe a esta o dever de proceder o registro de jornadas. Ademais, a não apresentação injustificada deste gera presunção relativa de veracidade da jornada de trabalho alegada pelo autor na exordial, nos termos do art. 74, §2, da CLT c/c a Súmula 338 do TST. No caso dos autos, a reclamada apresentou os registros de frequência do reclamante até março/2021 (id. 00db4e2), bem como os registros do ponto eletrônico do reclamante a partir da data de 21/04/2021 (id. ab7c389), em que teria ocorrido a implementação do controle de jornada eletrônico, não sendo identificado nenhum vício relativo ao registro de horário invariável. Conforme mencionado, desde sua inicial, o reclamante impugnou os cartões de ponto, alegando que estes não refletem a realidade laboral vivenciada pelo autor, uma vez que a reclamada determinava que os preenchimentos fossem feitos com os horários pré-determinados, ou seja, não ultrapassando 08 horas diárias e sempre com variações de minutos. Impugnando os cartões de ponto, o reclamante atraiu para si o ônus de demonstrar sua invalidade, tendo em vista tratar-se de fato constitutivo de seu direito (art. 818, inc. I, da CLT). Além da validade dos cartões, discute-se no feito a incidência do art. 62, inc. I, da CLT, que trata da exceção ao controle de jornada dos funcionários que trabalhem externamente. À luz do entendimento do TST, pela aplicação do art. 62, inc. I, da CLT, não haverá necessidade da comprovação do controle de jornada pela empresa somente se demonstrada a efetiva impossibilidade de realização deste controle. Documentalmente, a reclamante anexou inúmeros provas emprestadas, consistentes em atas de audiências de instrução em processos que tinha o Instituto Nordeste Cidadania como reclamado, alegando a autora que vivenciava a mesma realidade laboral. A reclamada, por sua vez, também anexou atas de audiência, sentenças e acórdãos proferidos em casos análogos. Foi realizada audiência de instrução no dia 13/02/2025 (id. cbc9622), sendo colhido o depoimento do sr. Luiz de Oliveira Lopes, testemunha apresentada pela parte autora, o qual afirmou que: (...) É interessante observar que em se tratando de credibilidade de depoimentos, ninguém melhor que o condutor do feito para aferir o peso e seu valor, pois é ele quem mantém o vivo contato, direto e pessoal com os depoentes, medindo-lhe as reações, a (in) segurança, a (in) sinceridade, a postura. Aspectos, aliás, que não se exprimem, que a comunicação escrita, dados os seus acanhados limites, nem sempre permite traduzir, encontrando-se em privilegiada condição que deve ser considerada na esfera recursal. Trata-se do princípio da persuasão racional, consagrado no artigo 371 do Código de Processo Civil, mediante o qual o julgador é livre para, diante dos elementos dos autos, formar seu convencimento. No caso concreto, restou incontroverso o fato de que, no exercício da função de Agente de Microcrédito, a jornada de trabalho do reclamante era exercida, predominantemente, de forma externa, principalmente a partir de março/2020, por ocasião da Pandemia do Covid-19. Embora tenha implementado o ponto eletrônico somente em 21/04/2021, a reclamada apresentou folhas de ponto da reclamante referentes ao período compreendido entre a sua admissão e a efetiva implementação do ponto eletrônico, de modo que não há como reconhecer a efetiva impossibilidade de realização deste controle, afastando-se a aplicação da exceção contida no art. 62, inc. I, da CLT. Buscando impugnar os registros apresentados pela reclamada, a reclamante produziu prova testemunhal que afirmou que trabalhava das 7h30 às 19h30, mas colocava no ponto das 8h às 17h, bem como que a folha de ponto ficava com a reclamada e era preenchida de uma só vez pelos funcionários, ou seja, que esta não refletiam a jornada de trabalho efetivamente prestada pelo funcionário, mas uma mera formalidade. Com relação ao ponto eletrônico, a testemunha apresentada pela autora afirmou que as determinações eram as mesmas, que não havia banco de horas, bem como que o coordenador conseguia editar os horários, sendo que já teve época que conseguia registrar o ponto mais tarde e o coordenador editava. Conforme autorizado em audiência, em sede de razões finais, a reclamada impugnou o depoimento da testemunha apresentada pela autora, apresentando os registros do seu ponto eletrônico (id. b2c6ab5), alegando que os registros era realizados de forma variada. Analisando os referidos registros, é possível constatar a presença de anotações variáveis dos horários laborados, com registros anteriores às 08h e posteriores às 17h, além da efetiva contabilização das horas extras em banco de horas. Além disso, realizando uma análise dos depoimentos contidos nas inúmeras provas emprestadas apresentadas nos autos, bem como os fatos contidos na própria petição inicial, é possível notar que, embora a reclamante atuasse de forma externa, os funcionários passavam frequentemente na unidade empresarial, tanto no início quanto no fim da jornada, de modo que entendo inverossímil a alegação de que a folha era preenchida de uma só vez. Nesse contexto, entendo que o depoimento da testemunha autoral não possui força probante suficiente para desconstituir os controles de ponto juntados aos autos pela reclamada. Em reforço, destaco que este entendimento foi confirmado pelo Eg. TRT-21, em caso análogo recentemente julgado, senão vejamos: (...) Outrossim, com relação ao intervalo intrajornada, não havendo qualquer prova da ingerência das reclamadas na jornada externa exercida pelos funcionários, entendo que, exercendo atividades externas, o tempo de intervalo estava à disposição destes, não havendo falar em supressão de 30 (trinta) minutos pela empresa. Diante do exposto, entendo que o reclamante não se desvencilhou do seu ônus probatório, não produzindo provas capazes de desconstituir os controles de jornada apresentados pela reclamada, razão pela qual julgo improcedente o presente pleito. Pois bem. A empregadora por contar com mais de 20 funcionários estava obrigada a apresentar os controles de jornada de toda a contratualidade, conforme disciplina do art. 74, §2º, da CLT. E, de tal encargo se desincumbiu, vez que juntou os cartões de ponto de quase a totalidade período contratual da reclamante com horários variáveis, sendo da contratação até abril de 2021 de forma manual e no período subsequente a marcação eletrônica (Ids. 00db4e2 e ab7c389). Assim, efetivado o controle de jornada , prescindível a argumentação quanto ao enquadramento no art. 62, I, da CLT. Ademais, competia à reclamante desconstituir os controles de jornada e comprovar a jornada de trabalho alegada na inicial, nos moldes do art. 818, I, da CLT, e do art. 373, I, do CPC. A testemunha ouvida nos autos, arrolada pela reclamante, declarou que trabalhava das 7h30min às 19h30min, mas que os funcionários eram obrigados a registrar o ponto das 8h às 17h (Id. cbc9622). Contudo, analisando os cartões de ponto presentes nos autos, observa-se que a reclamante detinha liberdade para assinalar as horas extras efetivamente prestadas, como se observa no cartão de ponto do mês de setembro/2020 (Id. 00db4e2 / fl. 957), no qual consta o registro de duas horas extras diárias em 10 dias naquele mês e registro de labor extraordinário em dois sábados. De igual modo, em janeiro/2021 foram registradas duas horas extras diárias em 7 dias (Id. 00db4e2 / fl 963). A partir da adoção do ponto eletrônico, também se observa a variação de horários e o registro de débito e crédito no banco de horas. Inservíveis ao caso as declarações contidas nas atas de audiências juntadas pela parte reclamante como prova emprestada, porquanto nos presentes autos foi verificado que a reclamante detinha liberdade na marcação de seus horários. Quanto ao intervalo intrajornada, é inverossímil a alegação de que a trabalhadora não conseguia usufruir a pausa, notadamente porque, ao desenvolver atividade externa, ela não estava sob a fiscalização direta do reclamado durante o período de descanso, bem como inexiste provas de que o reclamado determinava o usufruto do intervalo apenas de forma parcial. Conclui-se, portanto, que a reclamante não logrou êxito em desconstituir os cartões de ponto, que detém presunção relativa de veracidade, e devem ser reputados verazes e válidos os registros existentes no controle de jornada, prevalecendo, pois, a jornada deles constantes, uma vez que foram realizados diretamente pela empregada e consignam horários variáveis, compatíveis com os de início e término da jornada contratual, inclusive com observações quanto à compensação de eventuais horas extras prestadas. Os contracheques presentes nos autos demonstram o pagamento de horas extras (Id. fe326ca), mas a reclamante não apontou diferenças a tal título. Assim, não comprovada a existência de horas extras inadimplidas ou a supressão irregular do intervalo intrajornada por meio de prova robusta, não faz jus a autora aos respectivos pagamentos. Nego provimento." MATÉRIA COMUM AOS RECURSOS RESSARCIMENTO DE DESPESAS DECORRENTES DA UTILIZAÇÃO E DEPRECIAÇÃO DE VEÍCULO PARTICULAR Adoto a parte inicial da redação do presente capítulo elaborada pela Excelentíssima Desembargadora Relatora: "O d. Juízo sentenciante deferiu o pedido sob os seguintes fundamentos: 2.3 - Indenização por danos materiais: uso de veículo próprio A reclamante argumenta que foi obrigado a usar sua motocicleta própria para as atividades laborais, recebendo apenas um reembolso irrisório por combustível, não cobrindo os custos com a depreciação do veículo e demais despesas. Alega violação do artigo 2º da CLT (riscos da atividade econômica) e requer indenização pelos danos materiais correspondentes a 30% do valor do veículo utilizado, além de ressarcimento de valores mensais relativos à manutenção e combustível. A reclamada argumenta que o uso da motocicleta foi opcional por parte do reclamante. Afirma que a empresa antecipava os custos com combustível e manutenção para aqueles que optavam por usar veículo próprio, de acordo com a solicitação do colaborador. Nega a obrigação de ressarcir a depreciação do veículo e demais despesas. Decido. Nos termos do art. 2 da CLT, considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço. O referido dispositivo consagra o princípio da alteridade, dispondo que os riscos da atividade econômica devem ser suportados pelo empregador, não podendo ser transferidos aos empregados. Conforme mencionado no item 2.2 desta sentença, o reclamante atuava como agente de microcrédito, realizando visitas e atendimentos nas zonas rurais e urbanas dos municípios próximos a Pau dos Ferros, chegando a percorrer, conforme depoimento do preposto da reclamada, cerca de 100 a 130 km por dia, sendo, por óbvio, necessário a utilização de veículo para o seu deslocamento, afinal, não há como entender razoável a realização das referidas atividades a pé. Além disso, nas cidades do interior do Rio Grande do Norte não há um serviço de transporte público regular, capaz de atender as rotas de clientes que a reclamante visitada. Dessa forma, ao colaborarem com a atividade econômica do empregador, utilizando veículo próprio para realização de suas atribuições, devem os empregados serem ressarcidos pela utilização do combustível e a manutenção/desgaste do seu bem material. Diante da ausência de um parâmetro determinado, o valor da indenização para cobrir gastos com deslocamento, desgaste e manutenção, em razão da utilização de veículo próprio, por óbvio, deve ser avaliado de acordo com a razoabilidade e a proporcionalidade, levando em consideração principalmente a frequência da utilização e o deslocamento diário. No caso dos autos, o reclamante reconhece que a reclamada realizava o pagamento de uma ajuda de custo equivalente, em média, a R$ 650,00, contudo, alega que o referido valor não era suficiente para arcar, sequer, com os gastos com combustível. Analisando os autos, verifico que, por meio dos contracheques do reclamante, que a reclamada, de fato, realizava o pagamento de uma quantia denominada como deslocamento. O valor da referida verba era bastante variável, partindo de R$ 180,00 e chegando até R$ 860,00. Ocorre que, conforme informações contidas na própria contestação, o reembolso realizado pela reclamada levava em conta apenas o número de quilômetros rodados, desconsiderando-se outros gastos como manutenção e depreciação. Nesse contexto, entendo que o reclamante faz jus à percepção de indenização relativa aos custos com manutenção e depreciação do veículo próprio utilizado no exercício de suas atividades laborais. Em caso análogo, verifico que o Tribunal Regional do Trabalho da 21ª região reconheceu que a referida verba indenizava apenas o deslocamento, deferindo a indenização pelo desgaste e manutenção do veículo, contudo, senão vejamos: (...) Contudo, no tocante ao valor do reembolso/indenização à luz dos precedentes do E. TRT-21ª região, decido fixar o pagamento da quantia de R$ 100,00, por cada mês laborado pelo reclamante, demonstrando-se desproporcionais as quantias pleiteadas pela autora, com base no valor do veículo e nos gastos mensais de manutenção e combustível, que desconsideram, inclusive, o valor pago pela reclamada. Assim, condeno a reclamada ao pagamento de indenização pelo uso de veículo próprio, no valor de R$ 100,00 mensais. O reclamado insurge-se contra a condenação ao pagamento de indenização pelo uso do veículo particular, sustentando que a utilização do automóvel pela reclamante era facultativa, não tendo a empresa exigido o seu uso para execução das atividades laborais. Destaca que sempre forneceu antecipadamente os valores referentes ao deslocamento e manutenção aos empregados que optaram por utilizar veículo próprio. Alega ainda que inexiste prova documental dos gastos com manutenção ou da obrigatoriedade do uso do veículo particular, citando jurisprudências que afastam o direito à indenização em tais situações. De outro lado, a reclamante também recorre ordinariamente pleiteando a majoração da indenização pelo uso do veículo particular, sustentando que os valores pagos pela empresa eram insuficientes para cobrir os custos de manutenção, depreciação e combustível. Ao exame." Inicialmente, não há dúvidas de que o uso diário de motocicleta para o desempenho das atividades laborais acarreta, necessariamente, a depreciação do bem, bem como custos com manutenção, o que prescinde de prova por se tratar de fato notório, nos termos do art. 374, I, do CPC. É certo, ainda, que os riscos da atividade econômica competem ao empregador, conforme dispõe o art. 2º da CLT, cabendo-lhe fornecer os meios necessários ao regular desempenho das atividades profissionais por parte do empregado. Nesse contexto, a utilização de veículo particular pelo trabalhador para a execução de tarefas inerentes à função que exercia configura indevida transferência dos riscos e custos da atividade econômica ao hipossuficiente da relação. Convém registrar, por oportuno, que a depreciação de bens móveis pertencentes à empresa, como veículos, constitui item regularmente previsto na contabilidade empresarial, o que evidencia, ainda mais, que a transferência de tais encargos ao empregado representa forma de desoneração do empregador à custa do patrimônio pessoal do trabalhador. Ademais, observa-se que a utilização de automóvel não era uma faculdade do empregado, mas condição indispensável ao exercício da função. No caso concreto, entendo que os valores registrados nos contracheques sob a rubrica "Deslocamento" se mostram compatíveis com o ressarcimento dos gastos com combustível, tendo em vista que refletem quantias proporcionais à prestação dos serviços e condizentes com a realidade do período. Destaca-se, ainda, que a reclamante não produziu prova capaz de infirmar essa conclusão. Conforme consignado na sentença, restou evidenciado que a reclamada ressarcia tão somente os valores relativos ao combustível, deixando de cobrir outras despesas inerentes ao uso contínuo do veículo, como depreciação, manutenção, emplacamento, seguro, entre outros. Tal circunstância revela evidente benefício financeiro obtido pela ré, que não precisou imobilizar capital para a aquisição do bem nem suportar os custos decorrentes de seu uso. Não obstante, não é possível imputar à empregadora a totalidade dos custos com a depreciação do veículo, uma vez que o bem também era utilizado pelo empregado em suas atividades particulares. Nessa perspectiva, o valor fixado pelo juízo de origem, correspondente a R$ 100,00 mensais, revela-se razoável e proporcional para compensar a depreciação efetivamente suportada pelo trabalhador no exercício de suas funções. Por conseguinte, nego provimento aos recursos, quanto ao tópico, mantendo a condenação ao pagamento de indenização pelo uso de veículo próprio nos moldes da sentença recorrida. PREQUESTIONAMENTO "Declara-se a observância do artigo 489, § 1º, do CPC para fins de fundamentação do presente julgado, e têm-se por prequestionados todos os dispositivos constitucionais, legais e jurisprudenciais suscitados pelas partes, independente de expressa referência, já que adotada tese explícita acerca da matéria impugnada, nos termos do item I da Súmula n. 297 do c. TST e da OJ nº 118 da SBDI-1 do TST. Ressalta-se que, nos termos do art. 6º, do CPC, todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva. Assim, as partes integrantes da relação processual têm o dever de cooperação, nele imbuída a obrigação de não apresentar recurso infundado, que, a toda evidência, prejudica a marcha da prestação jurisdicional e, ao fim, compromete a razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII, CF e art. 6º, CPC). Por fim, ficam as partes advertidas de que a oposição de embargos declaratórios fora das hipóteses legais, com intuito de protelar o feito e de obter manifestação sobre aspectos já enfrentados por esta Turma, será passível da pena estabelecida no art. 793-C, caput, da CLT." CONCLUSÃO Ante o exposto, nego provimento ao recurso da ré; e dou provimento parcial ao recurso da autora, para acrescentar à condenação a obrigação de pagar: 1) diferenças de comissões, durante todo o contrato de trabalho, entre o que foi recebido pela autora e o valor de R$752,00, com reflexos em férias acrescidas de um terço, 13ºs salários e FGTS, deduzindo o valor pago sob mesma rubrica (95.2 remuneração variável/comissões) no TRCT (fl. 994); e 2) adicional de periculosidade, à razão de 30% sobre o salário fixo acrescido das comissões recebidas, durante todo o contrato de trabalho, observada a prescrição declarada em sentença (02/12/2019), com repercussão em 13º salário, férias mais um terço, aviso prévio e FGTS mais 40%. Arbitro à condenação o valor de R$ 60.000,00, custas processuais majoradas para R$ 1.200,00. É como voto. ACÓRDÃO Isto posto, em Sessão Ordinária de Julgamento realizada nesta data, sob a Presidência do Excelentíssimo Senhor Desembargador Eridson João Fernandes Medeiros, com a presença dos Excelentíssimos Senhores Desembargadores Ricardo Luís Espíndola Borges, Bento Herculano Duarte Neto e Maria Auxiliadora Barros de Medeiros Rodrigues (Relatora), e do(a) Representante da Procuradoria Regional do Trabalho da 21ª Região, Dra. Maria Edlene Lins Felizardo, ACORDAM os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Federais da Primeira Turma de Julgamento do Tribunal Regional do Trabalho da Vigésima Primeira Região, por unanimidade, conhecer dos recursos ordinários interpostos por INSTITUTO NORDESTE CIDADANIA e MARIANA MYRTES DA COSTA SOUZA. Por unanimidade, não conhecer das razões recursais repetidas apresentadas por INSTITUTO NORDESTE CIDADANIA, presentes ao Id. bff8ca7, em razão da preclusão consumativa. Mérito: por maioria, dar provimento parcial ao recurso da autora, para acrescentar à condenação a obrigação de pagar: 1) diferenças de comissões, durante todo o contrato de trabalho, entre o que foi recebido pela autora e o valor de R$752,00, com reflexos em férias acrescidas de um terço, 13ºs salários e FGTS, deduzindo o valor pago sob mesma rubrica (95.2 remuneração variável/comissões) no TRCT (fl. 994); e 2) adicional de periculosidade, à razão de 30% sobre o salário fixo acrescido das comissões recebidas, durante todo o contrato de trabalho, observada a prescrição declarada em sentença (02/12/2019), com repercussão em 13º salário, férias mais um terço, aviso prévio e FGTS mais 40%; vencida a Desembargadora Maria Auxiliadora Barros de Medeiros Rodrigues, que negava provimento ao recurso ordinário da reclamante. Por maioria, negar provimento ao recurso da ré; vencida a Desembargadora Maria Auxiliadora Barros de Medeiros Rodrigues, que dava parcial provimento ao recurso do reclamado para excluir a indenização com gastos de manutenção e depreciação de veículo próprio utilizado na prestação dos serviços e os honorários advocatícios sucumbenciais devidos pelo reclamado, julgando improcedentes os pedidos da reclamação trabalhista. Arbitrar à condenação o valor de R$ 60.000,00, custas processuais majoradas para R$ 1.200,00. Obs: Acórdão pelo Desembargador Bento Herculano Duarte Neto. Justificativa de voto vencido pela Desembargadora Maria Auxiliadora Barros de Medeiros Rodrigues. Natal/RN, 24 de junho de 2025. BENTO HERCULANO DUARTE NETO Desembargador Redator Voto do(a) Des(a). MARIA AUXILIADORA BARROS DE MEDEIROS RODRIGUES / Gabinete da Desembargadora Auxiliadora Rodrigues JUSTIFICATIVA DE VOTO VENCIDO RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMANTE DIFERENÇAS DE COMISSÕES A reclamante sustenta serem indevidos os descontos por inadimplência dos clientes, ressaltando que a empresa ilegalmente transfere os riscos do negócio ao trabalhador, violando o princípio da alteridade, e pleiteia as diferenças no pagamento das comissões com seus respectivos reflexos. O d. Magistrado sentenciante indeferiu o pedido sob os seguintes fundamentos: 2.2 - Diferenças salariais - Remuneração variável A reclamante afirma que sua remuneração era composta por uma parte fixa e outra variável, sendo que a parte variável correspondia a uma comissão pela produtividade, que era paga sempre que as metas e objetivos estipulados pela empresa, em regulamento interno (Cartilha de Remuneração Variável), eram atingidos. Sustenta, contudo, que a reclamada desenvolveu atos fraudulentos que causavam prejuízos na Remuneração Variável da autora, uma vez que, embora apresentasse uma planilha contendo o valor a ser recebido, no contracheque, realizava o registro e pagamento de uma quantia inferior, justificando que a diferença correspondia à incidência de um fator de risco de clientes inadimplentes. Aduz que as deduções de inadimplências era ilegais, por representar a transferência do risco da atividade empresarial ao empregado, requerendo a condenação da reclamada ao pagamento de diferenças salariais, com reflexos sobre aviso prévio, 13° salário, férias + 1/3, FGTS + 40%. Em sua contestação, a reclamada alegou que inexistem diferenças de comissões a serem pagas, sendo que jamais foram realizados descontos em comissão. Aduz que a reclamada busca, na realidade, interferir no modo de cálculo da remuneração variável estabelecida pela empresa, inerente ao poder diretivo do empregador. Sustenta que, diferentemente do alegado pelo reclamante, o empregado não responde pela inadimplência dos clientes, bem como não sofre descontos na sua remuneração, deixando apenas de receber a comissão por não ter atingido a meta específica. Decido. O cerne da presente questão encontra-se na suposta realização de descontos ou pagamento incompleto das comissões devidas à reclamante, por parte da reclamada. Em que pese a matéria possa ser objeto de distribuição dinâmica do ônus da prova, considerando a aptidão para as respectivas provas, à princípio, tratando-se de fato constitutivo de seu direito, cabe à parte autora, que alega a existência de diferenças salariais a serem pagas, demonstrar a ocorrência dos alegados descontos nas comissões, nos termos do art. 818, inc. I, d CLT. Na cartilha de Remuneração Variável anexada pela reclamada (Id. c333cd6), é possível verificar a metodologia estabelecida para o cálculo desta remuneração, que é determinada a partir do produto do Desempenho (DES) do reclamante pelo Valor de Referência do Cargo (VRC). Para o cálculo do DES, são utilizados três indicadores: Incremento de Clientes, Carteira Ativa e Carteira de Risco Médio, cada um com seu respectivo peso. Além disso, são consideradas variáveis como: Contratação Crescer, Contratação Mais, Renovação, Recuperação de Crédito, Reembolso Efetivo e Acompanhamento. Cabe destacar que o indicador relacionado à Carteira de Risco Médio representa a qualidade na gestão dos créditos desembolsados, sendo apurado pelo valor médio das parcelas com atraso. Com base nas referidas informações, observo que as diferenças apontadas pelo reclamante decorrem exatamente de um desconto no valor da Remuneração Variável com base na inadimplência dos contratos que ele negociou. Na realidade, a adimplência/inadimplência repercutem no cálculo da RV a ser recebida pelo obreiro, por ser considerada nos cálculos das metas (Fatores Variáveis), o que poderia ser interpretado, em um primeiro momento, como uma transferência dos riscos da atividade econômica para o empregado. Entretanto, esse não é o melhor entendimento a ser aplicado no presente caso. Isso porque, tratando-se a remuneração variável de um benefício estabelecido por regulamentações internas da empresa, não há dúvidas que caracteriza-se como um benefício não previsto em lei, sendo oriundo do poder diretivo do empregador, pelo que não pode o judiciário interferir na metodologia por ele adotada para conferir o referido plus a seus empregados. Nesse cenário, ao contrário do alegado pelo reclamante na peça inicial, não há que se falar em descontos indevidos na remuneração do obreiro (seja na parte fixa ou variável) em razão de inadimplência posterior dos contratos por ele firmados. O que existe, de fato, é um modelo objetivo e pré-determinado para calcular o valor devido a título de Remuneração Variável, com base em vários indicadores e fatores variáveis, sendo que um deles considera a adimplência/inadimplência dos clientes contratantes. Dessa forma, tendo a Reclamada apresentado a metodologia de cálculo da remuneração variável de forma detalhada, demonstrando os indicadores utilizados e a forma de cálculo, tem-se que, de fato, a remuneração variável era calculada com base em indicadores objetivos e previamente estabelecidos, de forma que, considerando a clareza da metodologia apresentada, não há elementos para acolher a alegação da parte Reclamante de que a remuneração variável era paga de forma obscura ou fraudulenta. Vale destacar, ainda, que, embora exista uma certa divergência, à luz de recentes julgados, é possível verificar que o TRT-21ª região tem inclinado-se a adotar o entendimento de que inexiste óbice legal para que a taxa de adimplência da carteira figure como um dos indicadores do cálculo da remuneração variável, em especial quando o referido indicador promove e incentiva a qualidade na atuação do empregado, não havendo falar em violação de regramento trabalhista. Nesse sentido, vejamos ementas de recentes julgados deste tribunal acerca da matéria: (...) Ante todo o exposto, não restando comprovado qualquer desconto salarial indevido em desfavor do reclamante, bem como reconhecida a regularidade da metodologia adotada pela empresa, julgo improcedente o pedido de condenação das reclamadas ao pagamento de diferenças salariais. Pois bem. O reclamado apresentou o normativo da remuneração variável (Id.fc73e98), o Demonstrativo de Remuneração Variável, de forma mensal, com os indicadores para o cálculo da parcela (Id. 0610571) e os contracheques do período contratual (Id. fe326ca). Da análise de tais documentos, em especial, os contracheques e o demonstrativo da remuneração variável, não se observa que o reclamado tenha promovido descontos no valor da remuneração variável devida. De outro lado, restou verificado, tanto através da prova testemunhal (Id. cbc9622), quanto dos documentos que regulam a parcela, que a taxa de adimplência da carteira do agente de microcrédito figura como um dos indicadores no cálculo da remuneração variável. O empregador, no uso do poder diretivo, pode fixar os parâmetros objetivos que entende adequados para o pagamento das comissões, por se tratar de plus salarial, inexistindo óbice legal para que a taxa de adimplência da carteira figure como um dos indicadores. O referido indicador promove e incentiva a qualidade na atuação do empregado, que detém contato direto com o cliente solicitante e possui condições de verificar as particularidades do crédito solicitado, em especial porque, tratando-se de empresa de fornecimento de crédito, é essencial que todos prezem pela saúde financeira das operações. A hipótese não se equipara à transferência de risco do empregador, mas sim de mecanismo que bonifica a eficiência na análise de perfis beneficiários e, por consequência, a saúde financeira das operações, em especial quando se trata de recursos de origem pública, inclusive do orçamento da União e do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Lei n. 13.636/2018, art. 2º, norma que revogou as disposições da Lei n. 11.110/2005, citada nos autos, sobre o Programa Nacional de Microcrédito, passando a regulamentá-lo). Entendimento em sentido contrário privilegia a concessão indiscriminada de crédito a clientes que sabidamente não são capazes de arcar com o parcelamento e prejudica, não só o empregador, mas toda a sociedade. De todo modo, o pedido de recebimento de R$ 752,00, quando ocupava a função de agente administrativo, e de R$ 2.107,00, quando desempenhava a função de agente de microcrédito, mensais descrito na petição inicial (Id. fdd0878) destoa, e muito, da realidade contratual da reclamante, que recebia ao final do seu contrato o salário base de R$1.487,56. O deferimento do pleito resultaria em enriquecimento sem causa à parte autora. Acerca da matéria, seguem os seguintes precedentes deste Regional: DIFERENÇAS DE COMISSÕES. AGENTE DE MICROCRÉDITO. METODOLOGIA. TAXA DE ADIMPLÊNCIA. DESCONTOS NÃO VERIFICADOS. PODER DIRETIVO. LEGALIDADE. REFORMA. O empregador, no uso do poder diretivo, pode fixar os parâmetros objetivos que entende adequados para o pagamento das comissões, por se tratar de plus salarial, inexistindo óbice legal para que a taxa de adimplência da carteira figure como um dos indicadores, em especial quando o referido indicador promove e incentiva a qualidade na atuação do empregado, que detém o contato direto com o cliente solicitante e possui condições de verificar as particularidades do crédito solicitado. A hipótese não se equipara à transferência de risco do empregador, mas sim de mecanismo que bonifica a eficiência na análise de perfis beneficiários e, por consequência, a saúde financeira das operações, em especial quando se trata de concessão de crédito de origem pública, inclusive do orçamento da União e do Fundo de Amparo ao Trabalhador, fornecidos através de parceria com o Banco do Nordeste. Assim, impõe-se a reforma da r. sentença para excluir as diferenças de comissões. (TRT21 - 1ª Turma. ROT 0000239-65.2022.5.21.0020. Relatora: Desembargadora Auxiliadora Rodrigues. DEJT: 05.12.2023) REMUNERAÇÃO VARIÁVEL - AUSÊNCIA DE DESCONTOS DECORRENTES DE INADIMPLEMENTO - DIFERENÇAS INDEVIDAS. O conjunto probatório evidencia que não houve estorno de comissões em virtude de inadimplemento, mas oscilação do valor da remuneração variável em decorrência do desempenho do empregado no atingimento de metas previamente estabelecidas pelo empregador, entre as quais, as metas relativas à recuperação de crédito. Ou seja, o INEC, no exercício do poder diretivo, criou uma política de pagamento de remuneração variável, elegendo diversos critérios de apuração, entre os quais o desempenho do empregado na recuperação de crédito, não havendo nenhuma ilegalidade em tal conduta. (TRT21 - 1ª Turma. ROT 0000230-12.2022.5.21.0018. Relator: Desembargador José Barbosa Filho. DEJT 01.06.2023) DIFERENÇAS DE COMISSÃO. AGENTE DE MICROCRÉDITO. INFLUÊNCIA DA TAXA DE INADIMPLÊNCIA NAS COMISSÕES. POSSIBILIDADE. A previsão de decréscimo da comissão decorrente de inadimplência abaixo da meta estabelecida previamente pela empregadora não viola qualquer regramento trabalhista, uma vez que não se cuida de transferência dos riscos do negócio, posto que não se comprovou a realização de estornos de comissões do trabalhador. Na verdade, trata-se de mecanismo que premia a eficiência da carteira ativa de cada agente, de modo a preservar a saúde financeira de toda a instituição. (TRT21. 2ª Turma. ROT 0000379-29.2022.5.21.0011. Relator: Desembargador Bento Herculano Duarte Neto. DEJT 24.08.2023) Ante o exposto, nego provimento ao recurso da reclamante, no particular. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE A reclamante reitera o pedido do adicional de periculosidade em razão da utilização de motocicleta para o desempenho de suas atividades, defendendo que a norma prevista no artigo 193, § 4º da CLT é autoaplicável. Ao exame. Compulsando-se os autos, verifica-se ser incontroverso que a parte reclamante, a partir de 01.10.2021, passou a exercer a função de agente de microcrédito, tendo permanecido na função até 07.12.2022, quando da rescisão, e que utilizava motocicleta no exercício da atividade laboral. Acerca do adicional de periculosidade para trabalhadores no uso de motocicleta, assim dispõe a Lei n. 12.997/1994, que inseriu o § 4º ao artigo 193 da CLT, in litteris: Art. 193. São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a: [...] § 4º São também consideradas perigosas as atividades de trabalhador em motocicleta. Veja-se que, a teor do que preceitua o caput da norma acima mencionada, a caracterização das atividades perigosas dar-se-á "na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego". Ademais, quanto ao termo inicial do direito à percepção do adicional de periculosidade, determina o art. 196 da CLT: "Os efeitos pecuniários decorrentes do trabalho em condições de insalubridade ou periculosidade serão devidos a contar da data da inclusão da respectiva atividade nos quadros aprovados pelo Ministro do Trabalho, respeitadas as normas do artigo 11". Trata-se, pois, de norma de eficácia limitada, que, para produzir qualquer efeito no mundo jurídico, carece de expressa e efetiva regulamentação pelo Ministério do Trabalho e Emprego. No intuito de proceder à devida regulamentação do § 4º do art. 193 da CLT, foi editada a Portaria MTE n. 1.565/2014, que aprovou o Anexo 5 da Norma Regulamentadora n. 16 do MTE, onde estão descritas as hipóteses de incidência do adicional de periculosidade decorrente do trabalho em motocicleta, sendo expressa no item "1" que "As atividades laborais com utilização de motocicleta ou motoneta no deslocamento de trabalhador em vias públicas são consideradas perigosas" e no item "2" "d" que não são consideradas perigosas "as atividades com uso de motocicleta ou motoneta de forma eventual, assim considerado o fortuito, ou o que, sendo habitual, dá-se por tempo extremamente reduzido". Por outro lado, foi declarada a nulidade da Portaria MTE n. 1.565/2014, pelo TRF da 1ª Região, no âmbito do processo judicial de n. 0018311-63.2017.4.01.3400, em decisão transitada em julgado em 24.09.2021, cuja ementa está assim redigida: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. SEGURANÇA E MEDICINA DO TRABALHO. PORTARIAS N.º 1.565/2014 e 1.127/2003. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE AOS MOTOCICLISTAS. ELABORAÇÃO DE NORMA REGULAMENTADORA EM DESRESPEITO AO DEVIDO PROCESSO LEGAL. NECESSIDADE DE ATUAÇÃO CONJUNTA DA REGULAMENTAÇÃO DA MATÉRIA ENTRE GOVERNO, A CLASSE DE EMPREGADOS E A CLASSE DOS EMPREGADORES. DECLARAÇÃO DE NULIDADE DA PORTARIA N.º 1.565/2014. SENTENÇA MANTIDA. 1. Trata-se de ação ajuizada contra a União, objetivando a declaração de nulidade da Portaria n.º 1.565/2014, expedida pelo então Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que teria concedido adicional de periculosidade aos motociclistas, sem observar os ditames da Portaria n.º 1.127/2003, que regulamenta as normas relacionadas à saúde, segurança e condições gerais para o trabalho. 2. A Portaria n° 1.127/2003 do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) adotou, na forma determina na Convenção 144 da OIT, o sistema Tripartite Paritário, com o intuito de obter legitimação democrática de suas decisões, mediante deliberação conjunta e participativa entre o governo, a classe de empregados e a classe dos empregadores. Assim, impõem-se realização de audiências públicas, seminários, debates, conferências e outros eventos, permitindo-se o amplo debate e a oportunidade de participação de todos os envolvidos, nos termos do normativo, para a construção do devido processo legal administrativo. 3. Na hipótese em apreço, o tema a ser regulamentado, relacionado ao direito à percepção de adicional de periculosidade aos trabalhadores motociclistas, deve observância aos procedimentos vigentes, no caso, constantes na Portaria n.º 1.127/2003, emitida pelo MTE. 4. Em razão da condução do processo de regulamentação sem a devida observância ao processo legal previsto, a ser matizado por deliberação ampla e participativa dos segmentos envolvidos, e diante de evidentes atropelos nos prazos, sem a realização de eventos previstos para o amplo debate público, correta a declaração de nulidade da Portaria MTE n.º 1.565/2014, a fim de que seja determinado o reinício do procedimento de regulamentação, com o cumprimento dos procedimentos previstos expressamente na Portaria 1.127/2003, emitida pelo MTE, em especial com a participação efetiva de todos os interessados, propiciando o debate entre os integrantes do Governo, da classe de trabalhadores e da classe de empregadores, bem como com a observância dos prazos fixados, a partir de seu artigo 3º. 5. Apelação da União Federal e remessa oficial desprovidas. (Apelação/Remessa necessária n. 0018311-63.2017.4.01.3400, 5ª Turma - TRF 1ª Região, Relator Desembargador Carlos Augusto Pires Brandão, Publicado em 24/10/2020) (grifos acrescidos). Acrescente-se que a declaração de nulidade da Portaria n. 1.565/2014 está inserida no texto atualizado da NR-16 do MTE, constando em seu Anexo 5 um destaque de que "Em virtude de decisão judicial, proferida por meio de acórdão da 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, transitado em julgado, proferido em sede da ação 0018311-63.2017.4.01.3400, foi declarada a nulidade da Portaria n.º 1.565/2014, a fim de que seja determinado o reinício do procedimento de regulamentação". Logo, uma vez que não há base regulamentar para o deferimento do adicional de periculosidade aos motociclistas, a nulidade da Portaria n. 1.565/2014, reconhecida pelo referido acórdão da Justiça Federal, tem efeitos erga omnes. Nesse sentido, julgados do C. TST e de alguns Regionais, conforme ementas a seguir: [...] AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. PROVIMENTO. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. ATIVIDADES DESEMPENHADAS COM USO DE MOTOCICLETAS. ART. 193, "CAPUT", DA CLT. NECESSIDADE DE REGULAMENTAÇÃO PELO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. PORTARIA N.º 1.565/2014. NULIDADE DECLARADA. A fim de afastar a violação do art. 193," caput", e § 4º, da CLT, dá-se provimento ao agravo de instrumento para o processamento do recurso de revista. Agravo de instrumento conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. ATIVIDADES DESEMPENHADAS COM USO DE MOTOCICLETAS. ART. 193, "CAPUT", DA CLT. NECESSIDADE DE REGULAMENTAÇÃO PELO MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. PORTARIA N.º 1.565/2014. NULIDADE DECLARADA. TRANSCENDÊNCIA RECONHECIDA. 1. O art. 193, "caput", da CLT condicionou a sua validade à regulamentação do Ministério do Trabalho e Emprego, sem a qual os empregados não fazem jus à percepção do adicional de periculosidade. 2. A Portaria MTE nº 1.565/2014 (ATIVIDADES PERIGOSAS EM MOTOCICLETA) foi recentemente declarada nula, de forma que a referida regulamentação do art. 193, em relação à categoria na qual se insere a ré, deixou de existir. Nessa toada, desapareceu o indispensável fundamento jurídico para sua condenação ao pagamento do adicional pleiteado. 3. Assim, a Corte Regional, ao manter a condenação da ré ao pagamento do adicional de periculosidade, incorreu em violação do art. 193," caput", e § 4º, da CLT. Precedente desta Primeira Turma. Recurso de revista conhecido e provido. (TST - RR: 0000123-86.2021.5.08.0010, 1ª Turma, Relator Ministro Amaury Rodrigues Pinto Junior, Data de Julgamento: 03.05.2023, Data de Publicação: 05.05.2023). ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. USO DE MOTOCICLETA. REGULAMENTAÇÃO. DECISÃO JUDICIAL. NULIDADE DA PORTARIA 1.565/2014 DO MTE. A utilização de motocicleta para possibilitar o deslocamento do empregado, no exercício de suas atividades laborativas, constitui situação prevista no art. 193, § 4º, da CLT, que versa sobre a concessão de adicional de periculosidade. Não obstante tal previsão legal, o caput do art. 193 da CLT expressamente afirma que uma atividade somente será considerada como perigosa "na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego". A matéria encontrava-se devidamente regulamentada pela Portaria n. 1.565/2014 do MTE, no entanto, houve a declaração de sua nulidade, em decisão judicial do TRF da 1ª Região transitada em julgado, obstando o deferimento do referido adicional. (...) (TRT 21ª R., 2ª T., RORSum 0000213-85.2022.5.21.0014, Rel. Des. Bento Herculano Duarte Neto, DEJT 21.07.2023). ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. USO DE MOTOCICLETA. IMPROCEDÊNCIA. SUSPENSÃO DA PORTARIA Nº 1.565/14 DO MTE. Não há regulamentação exigida pelo art. 193, § 4º, da CLT, para a atividade em motocicleta. Na Apelação Cível nos autos do processo nº 0031822-02.2015.4.01.3400, a Quinta Turma do TRF1 declarou a nulidade da Portaria MTE nº 1.565/2014, a fim de que seja determinado o reinício do procedimento de regulamentação das atividades laborais que utilizam motocicletas, com a observância das regras e procedimentos previstos na Portaria MTE nº 1.127/2003, propiciando o debate entre os integrantes do Grupo de Trabalho Tripartite (GTT). Recurso do autor não provido. (TRT 8ª R; 3ª Turma; ROT 0000604-12.2022.5.08.0205; Rel. Des. Luis José de Jesus Ribeiro Data de Publicação: 08.02.2023). ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. USO DE MOTOCICLETA. O artigo 193, § 4º, da CLT, com a redação dada pela Lei nº 12.997, de 20/6/2014, dispõe que: "São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a: (...) § 4o São também consideradas perigosas as atividades de trabalhador em motocicleta .". Contudo, não é devido o pagamento do adicional de periculosidade à reclamante, nos termos vindicados, tendo em vista que a Portaria 1.565/2014 do MTE, que regulamentava a matéria, foi declarada nula por decisão da Justiça Federal, estando pendente a regulamentação do Anexo 5 da norma regulamentadora nº 16, que disporá sobre a periculosidade às atividades laborais que utilizam motocicletas.(TRT 3ª R., 11ª T., ROT 0010650-31.2022.5,03,0001, Rel. Juiz Conv. Leonardo Passos Ferreira, Data de Julgamento: 01.02.2023, Data de Publicação: 02.02.2023.) Assim, independente de qualquer argumentação acerca da exigência ou não pelo recorrido do uso de motocicleta por seus empregados, é indevido o pleito de adicional de periculosidade durante todo o período vindicado. Ante o exposto, nego provimento ao recurso da reclamante. MATÉRIA COMUM A AMBOS OS RECURSOS RESSARCIMENTO DE DESPESAS DECORRENTES DA UTILIZAÇÃO E DEPRECIAÇÃO DE VEÍCULO PARTICULAR O d. Juízo sentenciante deferiu o pedido sob os seguintes fundamentos: 2.3 - Indenização por danos materiais: uso de veículo próprio A reclamante argumenta que foi obrigado a usar sua motocicleta própria para as atividades laborais, recebendo apenas um reembolso irrisório por combustível, não cobrindo os custos com a depreciação do veículo e demais despesas. Alega violação do artigo 2º da CLT (riscos da atividade econômica) e requer indenização pelos danos materiais correspondentes a 30% do valor do veículo utilizado, além de ressarcimento de valores mensais relativos à manutenção e combustível. A reclamada argumenta que o uso da motocicleta foi opcional por parte do reclamante. Afirma que a empresa antecipava os custos com combustível e manutenção para aqueles que optavam por usar veículo próprio, de acordo com a solicitação do colaborador. Nega a obrigação de ressarcir a depreciação do veículo e demais despesas. Decido. Nos termos do art. 2 da CLT, considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço. O referido dispositivo consagra o princípio da alteridade, dispondo que os riscos da atividade econômica devem ser suportados pelo empregador, não podendo ser transferidos aos empregados. Conforme mencionado no item 2.2 desta sentença, o reclamante atuava como agente de microcrédito, realizando visitas e atendimentos nas zonas rurais e urbanas dos municípios próximos a Pau dos Ferros, chegando a percorrer, conforme depoimento do preposto da reclamada, cerca de 100 a 130 km por dia, sendo, por óbvio, necessário a utilização de veículo para o seu deslocamento, afinal, não há como entender razoável a realização das referidas atividades a pé. Além disso, nas cidades do interior do Rio Grande do Norte não há um serviço de transporte público regular, capaz de atender as rotas de clientes que a reclamante visitada. Dessa forma, ao colaborarem com a atividade econômica do empregador, utilizando veículo próprio para realização de suas atribuições, devem os empregados serem ressarcidos pela utilização do combustível e a manutenção/desgaste do seu bem material. Diante da ausência de um parâmetro determinado, o valor da indenização para cobrir gastos com deslocamento, desgaste e manutenção, em razão da utilização de veículo próprio, por óbvio, deve ser avaliado de acordo com a razoabilidade e a proporcionalidade, levando em consideração principalmente a frequência da utilização e o deslocamento diário. No caso dos autos, o reclamante reconhece que a reclamada realizava o pagamento de uma ajuda de custo equivalente, em média, a R$ 650,00, contudo, alega que o referido valor não era suficiente para arcar, sequer, com os gastos com combustível. Analisando os autos, verifico que, por meio dos contracheques do reclamante, que a reclamada, de fato, realizava o pagamento de uma quantia denominada como deslocamento. O valor da referida verba era bastante variável, partindo de R$ 180,00 e chegando até R$ 860,00. Ocorre que, conforme informações contidas na própria contestação, o reembolso realizado pela reclamada levava em conta apenas o número de quilômetros rodados, desconsiderando-se outros gastos como manutenção e depreciação. Nesse contexto, entendo que o reclamante faz jus à percepção de indenização relativa aos custos com manutenção e depreciação do veículo próprio utilizado no exercício de suas atividades laborais. Em caso análogo, verifico que o Tribunal Regional do Trabalho da 21ª região reconheceu que a referida verba indenizava apenas o deslocamento, deferindo a indenização pelo desgaste e manutenção do veículo, contudo, senão vejamos: (...) Contudo, no tocante ao valor do reembolso/indenização à luz dos precedentes do E. TRT-21ª região, decido fixar o pagamento da quantia de R$ 100,00, por cada mês laborado pelo reclamante, demonstrando-se desproporcionais as quantias pleiteadas pela autora, com base no valor do veículo e nos gastos mensais de manutenção e combustível, que desconsideram, inclusive, o valor pago pela reclamada. Assim, condeno a reclamada ao pagamento de indenização pelo uso de veículo próprio, no valor de R$ 100,00 mensais. O reclamado insurge-se contra a condenação ao pagamento de indenização pelo uso do veículo particular, sustentando que a utilização do automóvel pela reclamante era facultativa, não tendo a empresa exigido o seu uso para execução das atividades laborais. Destaca que sempre forneceu antecipadamente os valores referentes ao deslocamento e manutenção aos empregados que optaram por utilizar veículo próprio. Alega ainda que inexiste prova documental dos gastos com manutenção ou da obrigatoriedade do uso do veículo particular, citando jurisprudências que afastam o direito à indenização em tais situações. De outro lado, a reclamante também recorre ordinariamente pleiteando a majoração da indenização pelo uso do veículo particular, sustentando que os valores pagos pela empresa eram insuficientes para cobrir os custos de manutenção, depreciação e combustível. Ao exame. Primeiramente, frise-se ser incontroverso que, a partir de 01.01.2022, a reclamante trabalhou, externamente, na função de agente de microcrédito, ocasião em que utilizou de motocicleta própria para a consecução de suas atividades laborais. Sabe-se que é do empregador a obrigação de arcar com os custos da atividade econômica, incluídas as despesas com o deslocamento do trabalhador para o desenvolvimento de suas funções, inclusive os custos com a manutenção do veículo particular utilizado, nos termos do art. 2º da CLT. Na petição inicial, a reclamante narrou que recebia o valor de R$650,00 em razão de utilização de veículo próprio - motocicleta - para o desenvolvimento de atividades em favor do reclamado. Alega, contudo, que tal montante não era suficiente para arcar com as despesas de combustível e que não recebia nenhum valor relativo ao desgaste e manutenções do veículo. Em consequência, requereu indenização de 30% do valor da tabela FIPE correspondente a R$15.745,00. Nesse cenário, incumbia à parte reclamante comprovar que os valores pagos a título de combustível e de manutenção do veículo eram insuficientes para custear as despesas, porquanto compete-lhe fazer provar os fatos constitutivos do seu direito, a teor do disposto no artigo 818, I, da CLT. Contudo, a reclamante não produziu prova documental apta a demonstrar que os custos com a utilização do veículo próprio ultrapassavam a ajuda de custo que recebia, ônus que lhe incumbia. Assim, não há como se manter a indenização deferida a tal título. No tocante ao ressarcimento pela depreciação natural e desvalorização do veículo, merece registro o fato de que o bem não era exclusivamente utilizado para o exercício das atribuições da empregada, constituindo, assim, onerosidade excessiva a responsabilização da recorrente pelo desgaste natural da motocicleta até mesmo em decorrência do seu uso para finalidades extracontratuais, e em benefício exclusivo e pessoal da recorrida e de sua família. Vale frisar que as condições contratuais estipuladas pela reclamada quanto ao uso do veículo particular, mediante ressarcimento das despesas com combustíveis, são legítimas e consonantes com a CLT e a legislação trabalhista, não havendo que se falar em responsabilidade da empresa pela depreciação natural e desvalorização de veículos de seus empregados, tendo em vista a ausência de previsão legal e/ou normativa sobre a questão. A desvalorização do valor de mercado do veículo é decorrente de fatores mercadológicos e naturais, consequência do tempo de uso do bem, independentemente da utilização para fins contratuais, e seu ônus deve ser suportado pelo proprietário, e não pelo empregador, o qual, repise-se, responde somente pelas despesas materiais efetivamente suportadas pela obreira durante a vigência do contrato de trabalho e causadas pela utilização do bem em benefício da atividade econômica desenvolvida. Nesse sentido: "I - AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. LEI N . º 13.015/2014. [...] RESSARCIMENTO DE DESPESAS PELO USO DE VEÍCULO PRÓPRIO. Consta do acórdão recorrido ser incontroverso que a reclamante percebia valores a título de uso de seu veículo particular, e que incumbia à autora demonstrar que os pagamentos eram insuficientes para custear as despesas mensais, ônus do qual não se desincumbiu. Segundo se extrai do acórdão regional, não foram apresentados demonstrativo de despesas ou cálculos decorrentes do que a reclamante entende devido como depreciação, desgaste e manutenção do veículo, ou mesmo diferenças a título de combustível. Acrescentou, ainda, a Corte de origem que, segundo a prova testemunhal, os valores efetivamente eram ressarcidos ao trabalhador, bastando apresentação dos comprovantes de despesas. Diante do contexto delineado, não se constata violação literal do art. 2º da CLT. Por outro lado, verifica-se que o Regional dirimiu a controvérsia com base nas provas efetivamente produzidas e valoradas nos autos, e não somente pela ótica da distribuição do ônus da prova. Assim, incólumes os arts. 818 da CLT e 373 do CPC. Agravo de instrumento a que se nega provimento. [...] (RRAg-3915900-49.2009.5.09.0003, 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 16/04/2021). "RECURSO DE REVISTA. UTILIZAÇÃO DE VEÍCULO DE TERCEIRO. MANUTENÇÃO E IMPOSTOS. RESSARCIMENTO. DESPESAS . No caso, a controvérsia tem contornos nitidamente fáticos. Com efeito, o Tribunal Regional manteve a sentença em que se indeferiu o pedido de ressarcimento de despesas com veículo. Para tanto, consignou que a reclamante admitiu que o veículo não era de sua propriedade, mas de seu esposo, "o que induz à conclusão de que o veículo poderia ser utilizado para outras finalidades, que não o labor na reclamada" (fls. 658); não juntou aos autos comprovante de abastecimento, estacionamento ou eventual gasto com manutenção do veículo, assim como não provou que quitou o IPVA e que contratou seguro para o carro. Registrou, ainda, que a reclamante trabalhou para a reclamada por período inferior a um ano, "entretanto, ao elencar as despesas, constou "substituição de pneus a cada doze meses" e "troca de óleo a cada dois meses", o que não condiz com a realidade" (fls. 658). Ainda, o TRT julgou prejudicada a pretensão quanto à suposta depreciação do veículo, sob o fundamento de que, em caso de venda do bem por valor inferior, o prejuízo seria suportado apenas pelo real proprietário. Nesse contexto, somente pelo reexame das provas é que se poderia reapreciar a questão, procedimento vedado nesta fase recursal, a teor da diretriz contida na Súmula 126 desta Corte. A incidência da Súmula 126 desta Corte, por si só, impede o exame do Recurso de Revista tanto por violação a disposição da Constituição da República e de lei ordinária, quanto por divergência jurisprudencial. Recurso de Revista de que não se conhece " (RR-511-22.2016.5.09.0661, 8ª Turma, Relator Ministro Joao Batista Brito Pereira, DEJT 30/03/2021). EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO DA RECLAMADA. TRABALHO EXTERNO. INDENIZAÇÃO PELO USO E DEPRECIAÇÃO DE VEÍCULO PRÓPRIO. NÃO CABÍVEL. Embora a depreciação do bem seja um fato notório, tal desgaste (inclusive, dos componentes do bem, como pneu), ocorre em qualquer veículo, seja usado, ou não, para fins profissionais. Dessa forma, segundo entendimento prevalente na Terceira Turma, caberia ao autor demonstrar a desvalorização causada, especificamente, pelo uso do bem no desempenho de suas atividades laborais, na medida em que o título está atrelado, intrinsecamente, à demonstração, clara e indubitável, do prejuízo, fato que não ocorreu nestes fólios. Recurso provido em parte. (Processo: ROT - 0001040-71.2017.5.06.0020, Redator: Virginia Malta Canavarro, Data de julgamento: 01/07/2021, Terceira Turma, Data da assinatura: 02/07/2021) EMENTA: INDENIZAÇÃO POR DEPRECIAÇÃO DE VEÍCULO, NÃO COMPROVAÇÃO DA DEPRECIAÇÃO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. Para o ressarcimento pela depreciação do veículo, como a pretensão do autor está ligada ao ressarcimento de danos materiais, a ele cabe demonstrar, com prova documental, as despesas supostamente despendidas de modo a embasar a tese descrita na inicial no respectivo ponto. Por outro lado, inexiste no ordenamento jurídico qualquer obrigação do empregador reparar as despesas por depreciação suportadas pelo empregado em razão da utilização de veículo próprio no desempenho de sua atividade laborativa, até porque o autor utiliza-se do veiculo também para fins particulares, não se podendo atribuir tão somente ao reclamado o ônus pela sua depreciação. Recurso do reclamado provido, no aspecto. (Processo: ROT - 0000622-55.2016.5.06.0122, Redator: Maria das Gracas de Arruda Franca, Data de julgamento: 21/01/2018, Terceira Turma, Data da assinatura: 23/01/2018) Nesse prisma, indefere-se a indenização em razão da depreciação de veículo. Por todo o exposto, nego provimento ao recurso ordinário da reclamante e dou provimento ao recurso ordinário do reclamado para excluir a indenização pela utilização de veículo particular, julgando improcedentes os pedidos da reclamação trabalhista. Invertido o ônus da sucumbência, impõe-se a exclusão dos honorários advocatícios sucumbenciais devidos pelo reclamado. NATAL/RN, 17 de julho de 2025. ROBERTO DE BRITO CALABRIA Diretor de Secretaria
Intimado(s) / Citado(s)
- INSTITUTO NORDESTE CIDADANIA
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