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Maria Aparecida De Macedo x Instituto Nacional Do Seguro Social - Inss

ID: 274904190

Tribunal: TJPR Órgão: Competência Delegada de Colorado Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL Nº Processo: 0003268-82.2024.8.16.0072

Data de Disponibilização: 21/05/2025

Polo Ativo:

MARIA APARECIDA DE MACEDO

Polo Passivo:

INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Conclusão

Advogados:

ROSIMAR WEBBER VALDOVINO

OAB/RS XXXXXX Desbloquear

CINTIA REGINA DE LIMA VIEIRA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE COLORADO COMPETÊNCIA DELEGADA DE COLORADO - PROJUDI Travessa Rafaini Pedro, 41 - Centro - Colorado/PR - CEP: 86.690-000 - Fone: (44) 999253007 - Celula… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PARANÁ COMARCA DE COLORADO COMPETÊNCIA DELEGADA DE COLORADO - PROJUDI Travessa Rafaini Pedro, 41 - Centro - Colorado/PR - CEP: 86.690-000 - Fone: (44) 999253007 - Celular: (44) 99925-3007 - E-mail: diariojcolorado@gmail.com Autos nº. 0003268-82.2024.8.16.0072 Processo: 0003268-82.2024.8.16.0072 Classe Processual: Procedimento Comum Cível Assunto Principal: Híbrida (Art. 48/106) Valor da Causa: R$36.712,00 Autor(s): MARIA APARECIDA DE MACEDO Réu(s): INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS SENTENÇA 1. RELATÓRIO MARIA APARECIDA DE MACEDO, já qualificada, ajuizou ação declaratória de tempo de serviço rural c/c concessão de aposentadoria por idade híbrida, em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), também já qualificado. Narra a parte autora que nasceu em 18/02/1950 e iniciou sua vida laboral na lavoura aos sete anos, acompanhando sua mãe no cultivo e na colheita de diversas culturas. Após o casamento com o Sr. José Luiz de Macedo, continuou a exercer atividades rurais intercaladas com urbanas, sendo frequentemente contratada por intermédio de um conhecido “gato” chamado Alcides, que a levava para trabalhar em lavouras de café, algodão e amendoim em diversas localidades do interior do Paraná. Embora tenha exercido por breve período trabalho como empregada doméstica, a Autora precisou se afastar de toda atividade laboral devido a problemas de saúde, passando então a receber o Benefício Assistencial à Pessoa com Deficiência a partir de 01/01/2006. Após o falecimento do esposo, e em razão de dificuldades financeiras, alega que retorno à atividade rural por mais sete anos, até os 65 anos de idade, quando cessou definitivamente a labuta no campo. Relata a parte autora que ajuizou demanda visando a concessão de aposentadoria por idade rural, entretanto, sobreveio acórdão que extinguiu o feito sem resolução do mérito (processo nº 0005467-53.2019.8.16.0072). Pugna pela utilização de prova emprestada dos referidos autos e do processo nº 0005447-62.2019.8.16.0072, nos quais constam depoimentos do seu irmão que comprovam a atividade rural. Sustenta ter postulado junto ao INSS o benefício da aposentadoria por idade híbrida (DER – 14.11.2022), NB nº 41/196.335.700-8, que lhe foi negado ao argumento de “falta dos requisitos previstos na EC 103/2019 ou de direito adquirido até 13/11/2019”. Assim, discordando da decisão administrativa, requereu: o reconhecimento do período de atividade rural desempenhada de 18.02.1957 a 31.05.1978; 01.04.1978 a 31.01.2004 e de 01.01.2012 a 31.12.2015; a ratificação do período de recolhimento entre 01.07.2022 a 31.10.2022; a concessão de aposentadoria por idade híbrida e o pagamento das parcelas vencidas e vincendas desde a data do requerimento administrativo. Recebida a inicial, foi deferido à parte requerente o benefício da assistência judiciária gratuita, bem como determinada a citação do Instituto Nacional de Seguro Social – INSS (mov. 9.1). O INSS deixou de apresentar contestação (mov. 17). Prolatada decisão saneadora que ressaltou a impossibilidade de reconhecimento dos efeitos da revelia em desfavor da autarquia previdenciária por se tratar de direito indisponível. Além disso, fixou os seguintes pontos controvertidos: a) Exercício de atividade rural no(s) seguinte(s) período(s): 18.02.1957 a 31.05.1978; 01.04.1978 a 31.01.2004 e de 01.01.2012 a 31.12.2015; b) verificação do preenchimento dos requisitos para a concessão de aposentadoria por idade híbrida, conforme o art. 48, § 3º, da Lei 8.213/91. Para tanto, foi determinada a produção de prova testemunhal. Realizada a audiência de instrução, foram ouvidas a autora e três testemunhas. Também restou deferida a utilização da prova emprestada requerida pela autora, determinando-se a juntada dos depoimentos no presente feito (mov. 30.1 a 30.6). A prova oral do processo 0005467-53.2019.8.16.0072 foi juntada no mov. 32. Vieram os autos. É a breve exposição. Passo a fundamentar e decidir. 2. FUNDAMENTOS MARIA APARECIDA DE MACEDO pretende a concessão de aposentadoria por idade híbrida mediante o reconhecimento de sua qualidade de segurado especial (trabalhador rural) no período compreendido entre 18.02.1957 a 31.03.1978, 01.04.1978 a 31.01.2004 e de 01.01.2012 a 31.12.2015, bem como o cômputo do período de 01.07.2022 a 31.10.2022. As partes são legítimas e estão bem representadas. O devido processo legal está sendo observado, com estrita ressalva à ampla defesa e ao contraditório. Não havendo outras preliminares ou prejudiciais de mérito a serem analisadas, passo ao julgamento do feito. 2.1. DA ATIVIDADE RURAL O trabalho rural, na condição de segurado especial, encontra previsão no art. 11, VII, e § 1º da Lei 8.213/91, in verbis: Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas: (...) VII- como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em algomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de : a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividades: 1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais; 2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2º da Lei nº 9.985 de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida; b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e c) cônjugue ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo. § 1º Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes. Portanto, para a comprovação da condição de segurado especial, a Lei 8.213/91 exige o desempenho de trabalho rural, individualmente ou em regime de economia familiar, assim entendido aquele em que o trabalho dos membros da família se mostra indispensável à própria subsistência e seja exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sendo exigido, para o cônjuge, companheiro e filhos, comprovação do efetivo trabalho junto com o grupo. No que concerne ao “fato probando”, equivale dizer, o objeto da prova, em casos tais, pode ser demonstrado a partir dos diversos meios legítimos admitidos normativamente e será através deles que se colherá a verdade sobre os fatos alegados. A este respeito, há que se observar o disposto no art. 55 §3º da Lei de Benefícios que prevê: “Art. 55... § 3º- A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no regulamento”. Ainda sobre a prova, acrescenta-se que nos termos da Súmula 149 do STJ não se admite prova exclusivamente testemunhal para comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção de benefício previdenciário: “A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário”. Embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de o segurado valer-se de provas diversas das ali elencadas. Desse modo, o que importa é a apresentação de documentos que se prestem como indício do exercício de atividade rural (como notas fiscais, talonários de produtor, comprovantes de pagamento do ITR, prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, cadastros em lojas, escolas, hospitais, etc.), os quais podem se referir a terceiros, pois não há na lei exigência de apresentação de documentos em nome próprio. Ademais, geralmente, nas famílias dedicadas à atividade rural, os atos negociais são efetivados em nome do chefe do grupo, geralmente o genitor (Nesse sentido: EDRESP 297.823/SP, STJ, 5ª T, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ 26/08/2002, p. 283; AMS 2001.72.06.001187-6/SC, TRF4ªR, 5ªT, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum, DJ 05/06/2002, p. 293). Relativamente à idade mínima, mesmo que a jurisprudência aceite o reconhecimento do trabalho rural inclusive antes dos doze anos de idade, para tanto deve ficar comprovado que as atividades desenvolvidas pelas crianças e adolescentes dentro do grupo familiar iam além de um mero auxílio nas atividades cotidianas, mas que elas exerciam um trabalho indispensável e de dependência em relação aos demais membros da família, como exige a lei da previdência. Nesse sentido seguem recentes julgados: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS. TEMPO RURAL. CÔMPUTO PERÍODO ANTERIOR A 12 ANOS DE IDADE [...] 3. Para a comprovação do tempo de atividade rural é preciso existir início de prova material, não sendo admitida, em regra, prova exclusivamente testemunhal. A admissão de trabalho rural antes dos doze anos exige, de acordo com a jurisprudência dos tribunais superiores, prova robusta e detalhada acerca da efetiva contribuição do menor para a subsistência da família e especificada quanto à(s) tarefa (s) desenvolvida (s) por ele, além do período de tempo diário despendido no trabalho. [...] (TRF4, AC nº 5023385-20.2017.4.04.9999, Turma Regional Suplementar do Paraná, Rel. Des. Federal Márcio Antonio Rocha, 21/05/2020). PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REVISÃO. IDADE MÍNIMA PARA O TRABALHO RURAL. REQUISITOS LEGAIS. CONSECTÁRIOS LEGAIS. 1. Relativamente à idade mínima, a limitação constitucional ao labor do menor de dezesseis anos de idade deve ser interpretada em favor do protegido, não lhe impedindo o reconhecimento de direitos trabalhistas/previdenciários quando tenha prova de que efetivamente desenvolveu tal atividade. Entretanto, essa atividade deve ir além de um mero auxílio, ou seja, o menor deve exercer um trabalho indispensável e de dependência em relação aos demais membros da família, como exige a lei da previdência.2. Consectários legais fixados nos termos do decidido pelo STF (Tema 810) e pelo STJ (Tema 905). (AC nº 5060204-92.2018.4.04.7000, Relator Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, un., juntado aos autos em 16/03/2022). Por fim, no que diz respeito aos denominados boias-frias (trabalhadores informais), diante da dificuldade de obtenção de documentos, o STJ, no julgamento do REsp. 1.321.493/PR, em regime de recurso repetitivo, firmou o entendimento de que a prova documental do tempo de serviço é indispensável, inclusive para esses trabalhadores, mas, por estarem totalmente à margem da formalidade, a exigência resulta mitigada, podendo-se admitir o uso de quaisquer documentos que indiquem o vínculo ao meio rural, desde que a prova testemunhal complemente de forma robusta a instrução e dê consistência às alegações. Dito isso, passo à análise do caso concreto. No caso dos autos, a autora, nascida em 18/02/1950, busca o reconhecimento e a averbação do período de atividade rural compreendido entre 18.02.1957 a 31.03.1978, 01.04.1978 a 31.01.2004 e de 01.01.2012 a 31.12.2015, para fins de contagem de tempo de serviço. Para comprovar suas alegações, juntou aos autos diversos documentos que, segundo sustenta, configurariam início de prova material de sua condição de trabalhador rural. Dentre os documentos apresentados, destacam-se: - 1951 - certidão de casamento dos pais da autora, constando a profissão do genitor como lavrador; - 1978 - certidão de casamento da autora, onde consta a profissão do marido como operário e a autora “do lar”; - 2001 - ficha de cadastro de cliente em nome da autora constando sua profissão como 'rural'; - 2002 - ficha de cadastro de cliente em nome da autora constando como profissão 'lavradora'; - 2003 - ficha de cadastro de cliente em nome da autora constando como profissão 'trabalhadora rural'; - 2011 - ficha de cadastro de cliente em nome da autora constando como profissão 'trabalhadora rural'; - 2010 - ficha de cadastro de cliente em nome da autora constando como profissão 'trabalhadora rural'; - 2019 - certidão emitida pela Justiça Eleitoral do Paraná, em nome da autora, constando sua ocupação como 'trabalhador rural'. - 2013 e 2016 - Prontuários de atendimentos médicos expedidos pelo Hospital e Maternidade Santa Clara, apontando o irmão da autora como lavrador; - 2018 - Prontuário de atendimento médico realizado no Hospital e Maternidade Santa Clara, na qual refere a profissão irmão da autora como lavrador; - 2019 - Certidão emitida pela 95ª Zona Eleitoral de Colorado- PR, na qual consta o irmão da autora como trabalhador rural; Além da prova documental, foram colhidos os depoimentos de duas testemunhas e duas informantes: JULIA FIRMINO F. LUCIO (testemunha) – “Não me recordo exatamente o ano que conheci a autora. A gente morava no Lobato. Não trabalhamos juntas, mas sei que ela trabalhou em algumas das minhas propriedades. Ela trabalhou na colheita de algodão, amendoim, dependia da safra. Ela trabalhou para outras pessoas na lavoura. Conheci a autora quando era solteira e a vi trabalhando por mais de cinco anos.” FRANCISCA DE OLIVEIRA SILVA (informante) – “Conheço a autora há uns 60 anos. Conheci lá em Lobato. Ela trabalhava na lavoura, catava algodão e carpia na roça, nós éramos companheiras. Não lembro nomes, porque cada dia era um gato, porque a gente não tinha patrão. Nós íamos de caminhão, trator, caminhonete. Quando ela veio pra cá, ela tocava uma sorveteria. E lá em Lobato ela trabalhou na rodoviária com o marido dela que é falecido depois que acabou os serviços da roça. Quando a gente trabalhava na roça não tinha registro na carteira, eu só vim ter na usina. A gente recebia por semana. Quando eu conheci a autora ela era solteira, demorou muito pra ela casar”. CONCEIÇÃO APARECIDA AUGUSTA (informante) – “Conheço a autora há uns 50 anos, nós éramos vizinhas no Lobato. Ela sempre trabalhou na roça, colhendo amendoim, algodão, carpino. Trabalhamos juntas. Um dos proprietários que trabalhamos juntas era o do Armano no cultivo de amendoim, algodão, milho. Depois que ela mudou pro Colorado eu não sei o que ela fez mais não. Lá em Lobato ela trabalhava na roça. Eu trabalhei na roça uns 30 anos ou mais. Depois eu fui trabalhar de doméstica. Nesse período nós trabalhamos juntas na roça. Não tinha registro. A gente recebia por dia.” GENY CONCEIÇÃO AUGUSTA (testemunha) – “Não me recordo de datas. Conheci a autora mais ou menos quando tinha uns 18, 19 anos, por aí. Ela morava na mesma rua que eu. Ela trabalhava na roça naquela época, não tinha filho. E é isso, pobre trabalha na roça, não tem outra coisa. Eu também trabalhei na roça, depois que fiz um concurso, passei e vim trabalhar na prefeitura. Trabalhei com ela na roça na lavoura de algodão, mandioca, amendoim. Nós íamos de caminhão ou trator para essas propriedades. Enquanto ela morava no Lobato, ela trabalhava na roça. Depois que ela mudou, não sei mais o que ela fez.” Realizado o translado da prova emprestada do processo nº 5467-53.2019.8.16.0072, foram colhidos depoimentos da parte autora e de mais três testemunhas a seguir transcritos: MARIA APARECIDA DE MACEDO (autora) – “Tenho 71 anos. Sou viúva há 12 anos. Meu marido tinha uma sorveteria, que se chamava “Beija-Flor”. Tivemos a sorveteria por cinco anos e meio. Ele pagava INSS. Quando ele morreu, não era aposentado. Recebi auxílio-doença por cinco anos e meio. Eu trabalhava como empregada doméstica. Parei de receber o auxílio-doença logo depois que meu marido morreu. Tenho problema de saúde. Nunca tive a carteira assinada. Trabalho na roça desde os sete anos. Fiz todo tipo de serviço. Sei fazer de tudo. Parei com 61 anos de trabalhar na roça. Eu desmaiava, mas não sabia o que era. O médico me internava com pneumonia. Até que uma médica fez vários exames e descobriu que meu pulmão já não funcionava direito. Faz 13 anos que perdi o pulmão e o rim esquerdo. Não voltam mais a funcionar. Esse trabalho na roça era como boia-fria. Quando tinha uns 16 anos, minha mãe tocou uma roça por uns quatro anos. Eu que ajudava ela. Meu marido fazia de tudo, na cidade e na roça. Ele foi criado na roça. As testemunhas que eu trouxe já trabalhavam comigo. Estudei muito pouco. Quem me contratava era o seu Alcides, que era gato. Ele era o que mais dava serviço. Tinha serviço todo dia. A gente ia de Kombi. Dava duas viagens. Na época era café, algodão e amendoim, lá na Água Bandeirantes e em outras águas. Na cidade, fui empregada doméstica, ajudava na sorveteria e vendia pipoca na praça.” JOSÉ RAMOS (testemunha) – “Conheci a autora nos anos 70. Ela trabalhou colhendo café até a década de 80. Eu era percenteira de café e, na colheita, ela ia me ajudar. Depois disso, não trabalhei mais com ela. Não tive mais contato com ela depois disso. Mais recentemente, voltei a ter contato quando ela tinha uma sorveteria com o marido. Não lembro quando foi. O marido já faleceu.” ANTONIA BEZERRA (testemunha) – “Conheci a autora há 40 anos. Nessa época, ela trabalhava na roça. Nunca trabalhamos juntas na roça. Moramos perto por um tempo, quando jovens. Não sei dizer até quando ela trabalhou na roça. No período em que conheci ela, foi somente na roça que ela trabalhou. Na cidade, não sei dizer se ela trabalhou.” CÉLIA HENRIQUE DOS SANTOS FERREIRA (testemunha) – “Conheci a autora em 2012, quando me mudei para Colorado. Morava ela, um filho e um irmão. Ela ia para a roça e pediu para eu limpar a casa. Ela parou de ir para a roça porque tinha tremedeira, e o povo ficou com medo dela continuar. Mesmo sendo de idade, ela ia para a roça. Pelo que ela me falou, sempre foi da roça. A autora nunca me contou que teve sorveteria ou que trabalhou como empregada doméstica. Acredito que ela ficou uns sete anos indo para a roça, depois que a conheci em 2012.” Da análise do conjunto probatório apresentado, verifica-se que não restou demonstrado, de forma suficiente, o exercício da atividade rural pela parte autora nos períodos pleiteados, inclusive no intervalo compreendido entre 18/02/1972 e 31/03/1978, anterior à celebração do casamento. A autora sustenta o início do labor rural desde os sete anos de idade, em regime de economia familiar. Contudo, é firme a jurisprudência no sentido de que não se reconhece atividade rural antes dos 12 anos de idade, salvo em situações excepcionais devidamente comprovadas, o que não se observa nos autos. Ainda que se considerasse o reconhecimento do labor a partir dos 12 anos, a única prova material correspondente ao período anterior ao casamento consiste na certidão de casamento dos pais, de 1951, que qualifica o genitor como lavrador. Tal documento, embora gere presunção de vínculo com o meio rural, é insuficiente por si só para caracterizar início de prova material, na forma do art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/91 e da Súmula 149 do STJ. Assim, embora os relatos tenham sido no sentido de que a autora trabalhava na lavoura desde muito jovem, quando ainda era solteira e residia na zona rural de Lobato, na colheita de algodão, amendoim e outros cultivos, geralmente por meio de “gatos” e em propriedades da região, a ausência de outros documentos contemporâneos ao período pleiteado — como comprovantes de matrícula em escola rural, anotações em cadernetas de vacinação ou sindicalização do responsável familiar junto ao sindicato rural — inviabiliza o reconhecimento da condição de segurada especial da autora, mesmo para o período anterior ao casamento. Além disso, segundo as regras da experiência comum, é sabido que, em tenra idade, a criança geralmente apenas acompanhava seus pais ao campo para não permanecer sozinha em casa, prestando eventual auxílio de natureza leve, não equiparável ao trabalho efetivo desenvolvido por adultos. A mera presença no ambiente rural ou a realização de tarefas esporádicas e de menor esforço físico não configura, por si só, o exercício de atividade laboral nos moldes exigidos pela legislação previdenciária. Assim, para fins de averbação de tempo rural anterior aos 12 anos de idade, exige-se a apresentação de prova robusta e inequívoca acerca do efetivo desempenho de atividade produtiva relevante, no regime de economia familiar, o que não se verificou no caso em análise. A prova testemunhal, ainda que demonstre convivência e ajuda esporádica no meio rural, não afasta a presunção de que o trabalho consistia apenas em colaboração eventual, sem habitualidade, onerosidade ou intensidade compatíveis com a configuração do trabalho rural reconhecido pelo RGPS, sobretudo por ocorrer em apenas parte do dia. Nesse sentido, colacionam-se os seguintes julgados: "[...] é admitido, em regra, o cômputo do labor rural prestado em regime de economia familiar a partir dos 12 anos de idade. [...] Não é possível o deferimento do pedido de reconhecimento de labor anterior a essa idade quando as provas indicam apenas eventual ajuda aos pais, em contexto de convívio familiar, sem os requisitos exigidos pela legislação previdenciária."(TRF4, AC 5019497-72.2019.4.04.9999, TRS/PR, Rel. Des. Fed. Márcio Antônio Rocha, julgado em 22/11/2021). Quanto aos demais períodos pleiteados (01/04/1978 a 31/01/2004 e 01/01/2012 a 31/12/2015), inexiste qualquer documento em nome da autora que possa ser considerado como início de prova material. Os documentos apresentados em nome do irmão — ainda que se refiram ao meio rural — não comprovam co-participação em regime de economia familiar, tampouco demonstram vínculo direto entre as atividades do irmão e eventual labor da autora. Consoante entendimento pacífico, com a constituição de novo núcleo familiar após o casamento, exige-se que o início de prova material esteja em nome da própria autora ou de membro do novo grupo, não sendo admissível a extensão automática de documentos antigos ou de parentes com os quais não há comprovação de coabitação e interdependência econômica. A jurisprudência reforça esse entendimento: “Com a celebração do casamento, a parte passa a integrar grupo familiar distinto daquele que compunha junto com seus pais e irmão, motivo pelo qual a prova material do período pregresso não se aproveita para esta nova realidade fática, impondo-se acostar prova material em seu nome ou de componente do novo núcleo familiar para comprovar o labor rural a partir de então.” (TRF4, AC 5000080-83.2014.4.04.7130, 5ª Turma, Rel. Gisele Lemke, julgado em 25/07/2019). No caso, além da prova documental não ser em nome da autora, a certidão de casamento apresentada, do ano de 1978, consta a profissão do marido como operário. Ou seja, a atividade do arrimo da família (marido da autora) era de natureza urbana. No que tange às fichas cadastrais apresentadas, a jurisprudência tem reconhecido que documentos resultantes de declarações unilaterais, como fichas de atendimento médico, cadastros em lojas comerciais e registros eleitorais, possuem limitações significativas que desaconselham sua aceitação como início de prova material idôneo, especialmente quando desacompanhados de outros documentos contemporâneos e objetivos. A propósito: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CADASTRO DE LOJAS. NÃO CONFIGURAÇÃO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. A juntada de documento consistente em cadastro de loja, no qual constam datas e dados pessoais genéricos, equivale a mera declaração unilateral, insuficiente a configurar início de prova material. Não havendo início de prova material contemporânea e idônea para comprovação do período rural no período de carência, inviável conceder o benefício de aposentadoria rural à parte autora. (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0015034-51.2014.404.9999, 6ª TURMA, Rel. VÂNIA HACK DE ALMEIDA, D.E. 27/05/2015). Destaquei. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. ATIVIDADE RURAL. BOIA-FRIA. REQUISITOS LEGAIS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL INSUFICIENTE. APLICAÇÃO DA SÚMULA 149 DO STJ. [...] 2. Informações de profissão recentemente preenchidas em fichas de cadastro pessoal em estabelecimentos comerciais constituem declarações unilaterais em documentos particulares, sem força de prova material. [...] (TRF4, 5029229-82.2016.4.04.9999, DÉCIMA TURMA, Rel. MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 21/08/2018). Assim, mesmo com o reconhecimento da informalidade que permeia o trabalho rural, não é possível aceitar exclusivamente registros declaratórios como fundamento para reconhecimento de tempo de serviço, especialmente na ausência de comprovação objetiva de atividade agrícola regular e contínua. Diante disso, a ausência de início de prova material contemporânea, idônea e vinculada à autora, torna inviável o reconhecimento do labor rural em qualquer dos períodos pleiteados, sendo insuficiente, para tanto, a prova exclusivamente testemunhal. 2.2. DA APOSENTADORIA HÍBRIDA A aposentadoria por idade híbrida, pleiteada no presente caso, está prevista no art. 48, § 3º, da Lei nº 8.213/91: "Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. § 3º Os trabalhadores rurais de que trata o § 1º deste artigo que não atendam ao disposto no § 2º deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher." Assim, pelo § 3º do artigo 48 da Lei nº 8.213/1991, incluído pela Lei nº 11.718/2008, para tal benefício, os requisitos são: a) idade mínima de 60 (sessenta) anos para mulheres e 65 (sessenta e cinco) anos para homens; e b) cumprimento da carência de 180 contribuições. Com a Reforma da Previdência, implementada pela Emenda Constitucional nº 103/2019, ocorreram alterações relevantes. A idade mínima para mulheres foi elevada para 62 anos, observando a regra de transição, e a carência para homens que se filiarem ao Regime Geral de Previdência Social após a vigência da emenda foi modificada: "Art. 18. O segurado de que trata o inciso I do § 7º do art. 201 da Constituição Federal filiado ao Regime Geral de Previdência Social até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional poderá aposentar-se quando preencher, cumulativamente, os seguintes requisitos: I - 60 (sessenta) anos de idade, se mulher, e 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem; e II - 15 (quinze) anos de contribuição, para ambos os sexos." No entanto, para os segurados filiados antes da EC nº 103/2019, permanece aplicável a regra de transição disposta no art. 142 da Lei de Benefícios, especialmente no que tange à carência. Ademais, quanto à possibilidade de concessão da aposentadoria híbrida mediante cômputo de períodos de trabalho rural remoto, exercido antes de 1991, sem a necessidade de recolhimento de contribuições, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Tema 1007, firmou o seguinte entendimento: "O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do art. 48, § 3º, da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo." Dessa forma, para a concessão da aposentadoria na modalidade híbrida, é possível considerar o tempo de serviço rural prestado antes da vigência da Lei nº 8.213/1991, independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias. Isso é aplicável independentemente da predominância do trabalho urbano ou rural durante o período de carência ou do tipo de trabalho exercido no momento da implementação da idade mínima ou da Data de Entrada do Requerimento (DER). No que tange à qualidade de segurado na data do requerimento administrativo, aplica-se à aposentadoria por idade híbrida o mesmo entendimento válido para a aposentadoria por idade urbana. Assim, o preenchimento dos requisitos de idade e carência não precisa ser simultâneo. A implementação da carência antes do cumprimento do requisito etário não impede o deferimento do benefício, assim como a eventual perda da condição de segurado. Este entendimento é consolidado na Súmula nº 103 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que dispõe: "A concessão da aposentadoria híbrida ou mista, prevista no art. 48, § 3º, da Lei nº 8.213/91, não está condicionada ao desempenho de atividade rurícola pelo segurado no momento imediatamente anterior ao requerimento administrativo, sendo, pois, irrelevante a natureza do trabalho exercido neste período." Desse modo, o segurado tem direito à aposentadoria híbrida, prevista no § 3º do art. 48 da Lei nº 8.213/1991, desde que cumpridos os requisitos de idade mínima e carência, utilizando-se períodos de trabalho tanto rural quanto urbano. Dito isso, passo à análise dos requisitos necessários para a concessão do benefício. a) DO REQUISITO ETÁRIO A autora completou 75 anos em 18/02/2025, cumprindo o requisito etário necessário à concessão do benefício, conforme as disposições da Emenda Constitucional nº 103/2019. b) DA CARÊNCIA EXIGIDA Com base nos dados fornecidos no processo administrativo, a parte autora teve reconhecido administrativamente apenas 04 meses de tempo de contribuição urbana, conforme extrato no mov. 1.13. Os períodos de atividade rural não puderam ser reconhecidos. Logo, não é suficiente para completar os 15 anos de carência exigidos para a aposentadoria híbrida. Consequentemente, ante a inexistência de labor urbano e rural suficiente a completar a carência necessária, resta incabível a concessão de aposentadoria por idade híbrida a autora. 3. DISPOSITIVO Diante do exposto, com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE o pedido de aposentadoria por idade híbrida formulado pela parte autora MARIA APARECIDA DE MACEDO, em face do INSS, extinguindo o feito com resolução do mérito. Condeno a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios da parte adversa que arbitro em R$ 500,00 (quinhentos reais), tendo em vista o grau de zelo do profissional, o lugar da prestação do serviço, a natureza e importância da causa, trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço, em conformidade com o artigo 85, § 8º do Código de Processo Civil. Considerando a gratuidade da justiça concedida à autora, nos termos art. 98, §3º do CPC, determino a suspensão da exigibilidade da cobrança das custas até a fluência do prazo de cinco (05) anos, a contar da sentença final; se até lá não houver alteração na situação de necessidade, ficará só então extinta a obrigação. Oportunamente, arquive-se. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Diligências necessárias. Colorado, assinado e datado de forma eletrônica. Gustavo Adolpho Perioto Juiz de Direito

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Processo nº 0005467-30.2025.4.05.8108

ID: 323615513

Tribunal: TRF5 Órgão: 27ª Vara Federal CE Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL Nº Processo: 0005467-30.2025.4.05.8108

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

ANA CECILIA DO CARMO BARBOSA

Polo Passivo:

Sentença

Advogados:

INES VERA SANTOS DO NASCIMENTO

OAB/CE XXXXXX Desbloquear

PROCESSO: 0005467-30.2025.4.05.8108 CLASSE: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) AUTOR(A): ANA CECILIA DO CARMO BARBOSA RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS 27ª VARA FEDERAL CE SEN… PROCESSO: 0005467-30.2025.4.05.8108 CLASSE: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) AUTOR(A): ANA CECILIA DO CARMO BARBOSA RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS 27ª VARA FEDERAL CE SENTENÇA – TIPO A 1. RELATÓRIO Trata-se de ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS, por meio da qual a parte autora almeja a concessão de SALÁRIO-MATERNIDADE, mediante o pagamento das parcelas do benefício, corrigidas monetariamente. A autarquia previdenciária contestou alegando o não preenchimento dos requisitos legais. É o resumo dos fatos. Passo a decidir. 2. FUNDAMENTAÇÃO Do pedido de justiça gratuita Preambularmente, defiro o pedido de gratuidade judiciária ante a presunção de ser a parte pobre na forma da lei e não possuir condições de arcar com as despesas inerentes ao processo sem prejuízo de seu sustento e de sua família. Mérito Em se tratando do tema salário-maternidade, indispensável fazer referência ao art. 7º da Constituição Federal de 1988, que assim determina: “Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: (...) XVIII – licença à gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias”. Referido benefício previdenciário encontra guarida, ainda, no artigo 71 e seguintes da Lei n. º 8.213/91, senão vejamos: Art. 71. O salário-maternidade é devido à segurada da Previdência Social, durante 120 (cento e vinte) dias, com início no período entre 28 (vinte e oito) dias antes do parto e a data de ocorrência deste, observadas as situações e condições previstas na legislação no que concerne à proteção à maternidade. (Redação dada pala Lei nº 10.710, de 5.8.2003) (...) Art. 72. O salário-maternidade para a segurada empregada ou trabalhadora avulsa consistirá numa renda mensal igual a sua remuneração integral. (Redação Dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99) § 1º Cabe à empresa pagar o salário-maternidade devido à respectiva empregada gestante, efetivando-se a compensação, observado o disposto no art. 248 da Constituição Federal, quando do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço. (Incluído pela Lei nº 10.710, de 5.8.2003) § 2º A empresa deverá conservar durante 10 (dez) anos os comprovantes dos pagamentos e os atestados correspondentes para exame pela fiscalização da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 10.710, de 5.8.2003) § 3º O salário-maternidade devido à trabalhadora avulsa e à empregada do microempreendedor individual de que trata o art. 18-A da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, será pago diretamente pela Previdência Social. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011) Dos dispositivos acima destacados, extrai-se que, para ter acesso ao salário-maternidade, a requerente deve comprovar sua condição de segurada pelo Regime Geral da Previdência Social, assim como a ocorrência do fato gerador do benefício, qual seja, o nascimento da criança. No que toca ao requisito da carência, importa observar que, desde a redação dada pela Lei n.º 9.876/99 ao art. 25, III, da Lei n.º 8.213/91, há previsão de sua exigência apenas para o(a) contribuinte individual, o(a) segurado(a) especial e o(a) segurado(a) facultativo(a). Acontece que a Suprema Corte, reconhecendo a violação do princípio da isonomia, declarou recentemente a inconstitucionalidade da exigência de carência para a fruição de salário-maternidade, prevista no art. 25, III, da Lei n.º 8.213/91, na redação dada pelo art. 2º da Lei n.º 9.876/99. Pela pertinência, vejamos a ementa do julgado: “AÇÕES DIRETAS DE INCONSTITUCIONALIDADE. PRIMEIRA REFORMA DA PREVIDÊNCIA (EMENDA CONSTITUCIONAL N. 20/1998 E LEI N. 9.876/1999). JULGAMENTO CONJUNTO. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL DA LEI N. 9.876/1999. REJEIÇÃO. SALÁRIO-MATERNIDADE. CARÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. FATOR PREVIDENCIÁRIO E AMPLIAÇÃO DO PERÍODO BÁSICO DE CÁLCULO (PBC) DOS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. CONSTITUCIONALIDADE. ATESTADO DE VACINAÇÃO E FREQUÊNCIA ESCOLAR PARA RECEBER SALÁRIO-FAMÍLIA. EXIGÊNCIA LEGÍTIMA. REVOGAÇÃO DA LEI COMPLEMENTAR N. 84/1996 PELA LEI N. 9.876/1999. POSSIBILIDADE. AÇÕES DIRETAS CONHECIDAS EM PARTE. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO EM RELAÇÃO AOS ARTS. 25 E 26 DA LEI N. 8.213/1991, NA REDAÇÃO DA LEI N. 9.876/1999. IMPROCEDÊNCIA DOS DEMAIS PEDIDOS. 1. É juridicamente possível e conveniente o julgamento conjunto de ações diretas de inconstitucionalidade que foram ajuizadas contra dispositivos das mesmas leis (Leis n. 8.213/1991 e n. 9.876/1999) e tramitaram simultaneamente, estando no mesmo estado de amadurecimento processual. A apreciação em conjunto, por lógica, induz resultados homogêneos, mas não estabelece prejudicialidade entre as demandas, propostas por legitimados diferentes. 2. A alegação de inconstitucionalidade formal por descumprimento do disposto no art. 65, parágrafo único, da Constituição Federal (não retorno do projeto de lei para a Casa iniciadora, após mudanças implementadas na Casa revisora), para ser conhecida, deve vir acompanhada de demonstração analítica das alterações de redação ocorridas. 3. A exigência legal de carência para a percepção do benefício de salário-maternidade pelas seguradas contribuintes individuais e seguradas especiais (caso contribuam e requeiram benefício maior que o valor mínimo) foi reformulada, desde a propositura das ações diretas em julgamento, pela Medida Provisória n. 871/2019 e pela Lei n. 13.846/2019, remanescendo, porém, o período mínimo de 10 (dez) meses para a concessão do benefício. 4. Viola o princípio da isonomia a imposição de carência para a concessão do salário-maternidade, tendo em vista que (i) revela presunção, pelo legislador previdenciário, de má-fé das trabalhadoras autônomas; (ii) é devido às contribuintes individuais o mesmo tratamento dispensado às seguradas empregadas, em homenagem ao direito da mulher de acessar o mercado de trabalho, e observado, ainda, o direito da criança de ser cuidada, nos primeiros meses de vida, pela mãe; e (iii) há um dever constitucional de proteção à maternidade e à criança, nos termos do art. 227 da Constituição de 1988, como sublinhou o Supremo no julgamento da ADI 1.946. 5. A Constituição Federal, a partir da Emenda de n. 20/1998, não mais prevê a forma de cálculo do valor dos benefícios previdenciários, tendo a disciplina da matéria ficado a cargo de lei ordinária. A EC n. 20/1998 também estipulou a utilização do cálculo atuarial como fundamento para a disciplina legal dos benefícios previdenciários. O fator previdenciário, da maneira como estabelecido pela Lei n. 9.876/1999, está em linha com grandezas próprias do cálculo atuarial, de sorte que não interfere na concessão, ou não, do benefício e, por isso, não viola premissas constitucionais. Em verdade, o fator previdenciário apenas pondera o valor do salário de benefício de duas benesses programáveis (aposentadoria por idade e aposentadoria por tempo de contribuição, essa última agora sem status constitucional) em face de algumas grandezas matematicamente relacionadas à higidez financeira do sistema previdenciário. 6. A ampliação, mediante lei, do período básico de cálculo (PBC) dos benefícios, isto é, do conjunto dos salários de contribuição usados no cálculo do salário de benefício, está dentro do raio de atuação legítima do legislador e confere maior fidedignidade à média das contribuições, pois, quanto maior a amostra tomada de um conjunto para estabelecer a média, maior a representatividade desta. A criação de regra de transição para os segurados já filiados ao Regime Geral de Previdência Social (Lei n. 9.876/1999, art. 3º) é constitucional, visto que não viola direitos adquiridos, expressamente ressalvados pela legislação, e possui força cogente, não havendo opção aos contribuintes quanto à regra mais favorável, para efeito de cálculo do salário de benefício. 7. A Lei n. 8.213/1991, no art. 67, consideradas tanto a redação original como a versão modificada pela Lei n. 9.876/1999, instituiu forma indireta de fiscalização de deveres dos pais para com os filhos menores: o de vaciná-los e o de matriculá-los em escola e acompanhar a frequência escolar, o que se incluía naquilo que o art. 384 do Código Civil de 1916, então vigente, chamava de “pátrio poder”. Esses deveres paternos colaboram para a concretização de dois importantes direitos constitucionalmente assegurados às crianças: o direito à saúde e o direito à educação (CF, art. 227, caput). 8. Com a edição da EC n. 20/1998, deixou de ser necessária lei complementar para instituir contribuição sobre valores pagos a autônomos, administradores e avulsos. A Lei Complementar n. 84/1996 perdeu, assim, o status de lei complementar, de modo que poderia ser revogada por lei ordinária, como de fato foi pela Lei n. 9.876/1999. 9. Ações parcialmente conhecidas, e, na parte conhecida, pedido julgado parcialmente procedente, quanto à alegada inconstitucionalidade dos arts. 25 e 26 da Lei n. 8.213/1991, na redação da Lei n. 9.876/1999, conforme postulado na ADI 2.110, e improcedente em relação às demais pretensões, declarando-se a constitucionalidade dos dispositivos impugnados.” (STF, ADI 2110, Tribunal Pleno, DJe em 24/5/2024, Relator Min. Nunes Marques, por maioria). A decisão que declara a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade da lei ou do ato normativo em ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) ou em ADC (Ação Declaratória de Constitucionalidade) é irrecorrível, ressalvada a interposição de embargos declaratórios, não podendo, igualmente, ser objeto de ação rescisória. E tem eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal (v. artigos 26 e 28 da Lei n.º 9.868/99[1]). Além disso, a declaração de inconstitucionalidade no controle concentrado gera, em regra, efeitos retroativos (“ex tunc”), significando dizer que o dispositivo da lei ou do ato normativo é considerado inválido desde o seu nascedouro. Excepcionalmente, por motivo de segurança jurídica ou de excepcional interesse social, o STF (Supremo Tribunal Federal), por maioria de dois terços de seus membros, pode restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado (v. art. 27 da Lei n.º 9.868/99). Para reforço, transcrevo ementa de decisão do STF: “Embargos de declaração. Pretensão de atribuição de efeito ex nunc a pronúncia de inconstitucionalidade do art. 29-C da Lei nº 8.036, de 1990. Inadmissibilidade. Clareza quanto à eficácia ex tunc do acórdão que julgou procedente a ADI nº 2.736. Omissão, contradição ou obscuridade. Inexistência. Recurso com caráter ostensivamente infringente. Embargos rejeitados. São de rejeitar embargos de declaração opostos a acórdão em que não há omissão, contradição, nem obscuridade.” (STF, ADI 2736 ED, Tribunal Pleno, DJe-158 em 13/8/2012, Relator Min. Ayres Britto, g. n.). Cabe mencionar que, ao apreciar os embargos de declaração opostos pelo Instituto de Estudos Previdenciários (IEPREV) na ADI 2.110, o Ministro Dias Toffoli, que votou pela modulação de ofício (“ex officio”) do acórdão proferido nas ADIs 2.110 e 2.111, com a adesão dos Ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin e André Mendonça, restou vencido nas sessões (virtuais) de 20/9/2024 a 27/9/2024. Assim, os efeitos da inconstitucionalidade declarada na ADI 2.110 retroagem à data de publicação da Lei n.º 9.876/99, aos 29/11/1999, quando foi incluída na Lei n.º 8.213/91 a exigência de carência para concessão de salário maternidade no caso de contribuinte individual, segurado(a) especial e segurado(a) facultativo(a). Conquanto a redação atualmente em vigor do art. 25, III, da Lei n.º 8.213/9 seja dada pela Lei n.º 13.846/2019, que foi publicada quase 20 anos depois do ajuizamento da ADI 2.110, nota-se que o seu teor é o mesmo, no sentido de impor o cumprimento da carência aos supracitados segurados. Por conseguinte, trata-se de disposição normativa igualmente inconstitucional. Em síntese, não há mais a exigência de período de carência para a concessão do salário maternidade. Para ter acesso ao benefício, é necessário comprovar a condição de segurado(a) do Regime Geral da Previdência Social - RGPS e a ocorrência do fato gerador do benefício, qual seja, o nascimento, a adoção ou a obtenção da guarda judicial da criança. No caso concreto, a autora busca a concessão do salário-maternidade pelo nascimento de sua filha Maria Serena do Carmo Barbosa, ocorrido em 22/03/2025, comprovado por meio da juntada da respectiva certidão de nascimento (ID. 75930836). Consoante a carta de indeferimento, o INSS negou o benefício pelo seguinte motivo: “Falta de período de carência anterior ao nascimento” (ID. 75932091). O INSS, devidamente citado, apresentou contestação genérica (ID. 77241157). Pois bem. A controvérsia dos autos consiste em saber se a autora mantinha (ou não) a condição de segurada ao tempo do nascimento de sua filha. Examinando o extrato do CNIS (ID. 75932090), verifico que a parte autora verteu contribuições previdenciárias, no período de 01/02/2025 a 28/02/2025, paga em 10/03/2025, na qualidade de segurado(a) facultativo(a). Portanto, reconheço que a autora ostentava a qualidade de segurada na data do fato gerador (22/03/2025), nos termos do art. 11, §3, do Decreto 3.048/99 e art. 15, inciso VI, da Lei 8.213/91, e preenchia os requisitos legais, pelo que concluo que ela faz jus ao salário-maternidade em relação ao nascimento de sua filha, Maria Serena do Carmo Barbosa, ocorrido em 22/03/2025. 3. DISPOSITIVO Diante do exposto, DEFIRO o pedido de gratuidade judiciária e, no mais, JULGO PROCEDENTE o pedido, resolvendo o feito com exame de mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC, para CONDENAR o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS a PAGAR o benefício de SALÁRIO-MATERNIDADE em favor da parte autora, considerando a data do parto o dia 22/03/2025 (nascimento de Maria Serena do Carmo Barbosa – ID. 75930836). As parcelas atrasadas devem corrigidas monetariamente pelo INPC (art. 41-A da Lei n.º 8.213/91) e com os juros aplicáveis à caderneta de poupança desde a citação (art. 1.º-F da Lei n.° 9.494/97), sendo que, a partir de 09/12/2021, aplica-se o índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic) “para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora”, nos termos do art. 3º da EC n.º 113/21 e do Manual de Cálculos da Justiça Federal. Após o trânsito em julgado, EXPEÇA-SE a Requisição de Pequeno Valor – RPV em favor da parte demandante, nos termos do art. 17 da Lei nº 10.259/01, observando-se o teto de 60 (sessenta) salários-mínimos na data da sua expedição. Ultrapassado o referido valor e não havendo renúncia ao excedente, expeça-se precatório. Sem custas. Sem honorários. Sem reexame necessário. Interposto recurso voluntário, intime-se a parte contrária para apresentar contrarrazões e encaminhem-se os autos para a Turma Recursal. Do contrário, cumpridas as condenações/obrigações desta sentença, arquivem-se os autos. Publicação e registro eletrônicos. Intimem-se. Itapipoca - CE, data da assinatura eletrônica. JUIZ FEDERAL Juiz Federal da 27ª Vara/SJCE documento assinado eletronicamente /rmm

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Processo nº 0801535-92.2022.8.10.0037

ID: 311837734

Tribunal: TJMA Órgão: 2ª Vara de Grajaú Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 0801535-92.2022.8.10.0037

Data de Disponibilização: 01/07/2025

Polo Ativo:

MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO MARANHAO

Polo Passivo:

Sentença (expediente)

PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO NAUJ - NÚCLEO DE APOIO ÀS UNIDADES JUDICIAIS Processo: 0801535-92.2022.8.10.0037 Classe: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Requerent… PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO NAUJ - NÚCLEO DE APOIO ÀS UNIDADES JUDICIAIS Processo: 0801535-92.2022.8.10.0037 Classe: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283) Requerente (a): M. P. D. E. D. M. Requerido (a): R. D. S. S. SENTENÇA O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, ofereceu denúncia em desfavor de R. D. S. S., qualificado no ID 65798724, pela prática dos crimes previstos no art. 147, art. 150 e art. 163, parágrafo único, I, todos do Código Penal c/c Lei nº 11.340/2006. Noticia o Parquet que, no dia 11/04/2022, por volta das 8h, na Rua Bacuri, Vila Milton Gomes, nesta urbe, o denunciado violou o domicílio e ameaçou de morte sua ex-companheira, K. C. B. D. S., em contexto de violência doméstica, além de ter causado danos ao seu patrimônio mediante grave ameaça à pessoa. Afirma constar do caderno investigativo incluso que, no dia e horário dos fatos, enquanto a vítima estava fora da sua residência, o denunciado adentrou no local, revirou a casa e quebrou uma televisão da marca AOC de 32 polegadas, bem como alguns outros objetos, por não aceitar o término da relação. Informa que, n o mesmo contexto, quando a vítima chegou ao local, o denunciado a ameaçou de morte e correu em sua direção para agredi-la, sendo impedido por vizinhos, razão pela qual foi acionada a guarda municipal. Narra que ao diligenciar no local, a guarda municipal verificou a veracidade das informações e efetivou a prisão em flagrante de ROBSON, que estava visivelmente embriagado e agressivo, sendo necessário o uso de algemas. Assim, entendendo comprovadas a autoria e materialidade delitivas, pleiteou o Ministério Público a condenação do acusado nos termos dos tipos penais acima citados. A denúncia foi recebida no dia 05 de maio de 2022 (ID 65955251). Citado, o acusado apresentou Resposta à acusação, conforme petição de ID 69793567. Realizada audiência de instrução, foram ouvidas a vítima, testemunhas de acusação e interrogado o acusado. Ao final, foram apresentadas alegações finais orais pelo Ministério Público, que pugnou a procedência parcial da denúncia, com a condenação do acusado pelos crimes de ameaça e violação de domicílio (ID 73830524). A defesa apresentou alegações finais escritas pugnando a absolvição do acusado e, em caso de condenação, a aplicação da pena mínima, fixação do regime aberto e concessão do direito de recorrer em liberdade (ID 76539233). Vieram os autos conclusos. É o relatório. DECIDO. Trata-se, in casu, de ação penal movida pelo Ministério Público em face de de R. D. S. S., em que este é acusado da prática dos crimes capitulados no art. 147, art. 150 e art. 163, parágrafo único, I, todos do Código Penal c/c Lei nº 11.340/2006. Para a condenação do acusado faz-se necessário que exista prova cristalina e conclusiva da materialidade e autoria dos delitos. Assim, passo a verificar esses aspectos. A vítima, K. C. B. D. S., declarou o seguinte em Juízo: “que um pouco antes do acontecido, a depoente decidiu que queria se separar do acusado; que já estavam há 3 meses separados; que discutiam e a depoente dizia ao acusado que não dava mais certo o relacionamento; que no dia do fato, a depoente saiu de casa as 6h para cadastrar o cartão do bolsa família, juntamente com um rapaz, que está namorando, e a prima do acusado; que o acusado estava bêbado neste dia; que a depoente tinha deixado as filhas em casa dormindo, com a porta destrancada, e quando elas acordaram, viram a casa revirada; que quando a depoente retornou para casa e viu a situação, imaginou que teria sido o acusado; que a depoente foi tirar satisfação com o acusado e depois foi para a delegacia; que desde a separação, o acusado não aceita o fim do relacionamento; que a depoente não deseja mais viver com o acusado; que a depoente teve paz somente esse período que o acusado esteve preso; que o acusado quis bater na depoente, mas os amigos dele seguraram ele e não permitiram; que quando o acusado foi para cima da depoente, ele disse que iria lhe bater; que o acusado não tinha as chaves da casa da depoente; que o acusado entrou na casa da depoente porque a porta não estava trancada; que algumas vezes, o acusado bêbado, disse a depoente que lhe mataria; que o conserto da televisão foi R$ 400,00; que as outras coisas que ele levou foram coisas simples; que a depoente tinha uma medida protetiva antes desse fato e depois pediu outra; que a depoente tem medo do acusado quando este está sob efeito de álcool; que a ameaça que o acusado fez, foi que iria bater na depoente e ainda partiu para cima dela, mas foi segurado pelos amigos; que a depoente deseja renovar a medida protetiva”. A testemunha Mardônio Júnior Freitas Coelho informou: “que o depoente prendeu em flagrante o acusado; que a vítima relatou que tinha sido ameaçada pelo acusado e quando chegaram ao local, ele tinha se evadido; que depois foram chamados novamente pela vítima, informando que o acusado estava na residencia e foram lá; que nao sabe se a residencia era da vítima; que o acusado tentou se evadir novamente, mas foi capturado; que segundo a denúncia, o acusado estava agredindo a vítima e tinha quebrado alguns pertences da casa dela; que o acusado estava sob efeito de álcool; que nao conhecia o acusado; que quando chegaram ao local, apenas algemaram o acusado e o conduziram”. A testemunha João Paulo da Silva Oliveira relatou: “que o depoente efetuou a prisao do acusado; que a denúncia feita pela vítima, ela relatou que o acusado quebrou os pertences de sua casa, bem como teria lhe agredido e estava lhe ameaçando; que ao chegarem ao local, o acusado tentou se evadir; que o depoente nao viu os bens que o acusado quebrou da vítima; que a vítima relatou que o acusado já tinha feito essas coisas; que o acusado aparentava estar sob efeito de álcool”. O acusado, por sua vez, no momento do seu interrogatório, optou por exercer o seu direito constitucional ao silencio. Pois bem. Quanto ao crime de ameaça, não há dúvidas de sua ocorrência. Em relação a este delito, sabe se tratar de delito de natureza formal, bastando para sua consumação que a intimidação seja suficiente para causar temor à vítima no momento em que praticado, o que restou comprovado nos autos. A vítima relatou em seu depoimento judicial que o acusado, sob efeito de álcool, lhe disse que iria agredi-la e, ainda partiu para cima dela com este intuito, no entanto, fora impedido por alguns amigos, sendo segurado por estes. Outrossim, a vítima foi contundente ao afirmar que tem medo do acusado, especialmente quando este encontra-se sob efeito de bebida alcoólica, tanto que solicitou a concessão de medidas protetivas, de modo que se sente mais segura com a determinação de que ele não se aproxime dela. Portanto, não resta dúvida que a vítima sofreu ameaça provocada pelo acusado, pois as provas coletadas são robustas e convergentes apontando o réu como autor do crime, impondo, dessa forma, a sua condenação. No mais, não se vislumbra a existência de qualquer causa excludente da tipicidade ou da antijuridicidade da conduta do réu. Também não há nos autos qualquer indício de algum evento que pudesse afastar a sua culpabilidade, de forma que a condenação é a medida que se impõe. No que tange ao delito de invasão de domicílio, este se configura quando o indivíduo entra ou permanece, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências. (CP, art. 150), in verbis: Art. 150 - Entrar ou permanecer, clandestina ou astuciosamente, ou contra a vontade expressa ou tácita de quem de direito, em casa alheia ou em suas dependências: Pena - detenção, de um a três meses, ou multa. Pena - detenção, de seis meses a dois anos, além da pena correspondente à violência. A Constituição Federal, em seu art. 5°, XI, de modo específico, garante a inviolabilidade do domicílio, salvo se houver consentimento do morador, flagrante delito, desastre ou necessidade de prestar socorro, ou ainda, durante o dia, por determinação judicial. Trata-se de crime que tem por elemento subjetivo o dolo, não tendo a previsão da forma culposa e, como há a expressão “contra a vontade de quem de direito”, também não se admite que esse tipo penal seja praticado através de dolo eventual, pois não se pode assumir o risco de estar ingressando no lar alheio contra a vontade do morador, pois quem ingressa sabe que não pode fazê-lo, ou tem dúvida, o que já é suficiente para a afastar o dolo. É dizer ainda que deve-se conceituar o elemento casa para se entender melhor o tipo penal. Os §§ 4° e 5° do art. 150 em comento elucidam esse aspecto quando especificam que casa é qualquer lugar onde alguém habite, que, em regra, não é um local público. Com amparo nessas assertivas, tenho que a prática do crime imputado na denúncia foi devidamente comprovado, eis que a vítima relatou que o acusado, aproveitando-se do momento em que esta não se encontrava em sua residência, adentrou a mesma sem sua permissão e, ainda, revirou diversos objetos, quebrando, ainda, uma televisão, causando-lhe danos patrimoniais. Dessa forma, verifico haver elementos suficientes para embasar um decreto condenatório em desfavor do réu pelo crime de invasão de domicílio. Cumpre destacar, conforme ressaltou o representante ministerial em suas derradeiras alegações, que o fato do acusado ter direito a partilha do imóvel, não o autorizaria a adentrar no local sem consentimento da vítima, posto que já não encontrava-se mais residindo no mesmo. Por fim, em relação ao pedido de condenação do réu pelo crime de dano qualificado (art. 163, parágrafo único, I, do CPB), verifica-se que não merece prosperar. Conforme ensina a doutrina, o referido tipo penal trata-se de crime pluriofensivo, uma vez que atinge dois bens jurídicos, no caso, o patrimônio, no tocante ao dano, e a integridade física ou a liberdade individual, relativamente à qualificadora. Além disso, a grave ameaça ou violência à pessoa deve ser anterior ou concomitante ao dano (Masson, Cleber. Direito penal : parte especial (arts. 121 a 212) / Cleber Masson. - 16. ed. - Rio de Janeiro : Método, 2023.) Nesse sentido, é o entendimento jurisprudencial: EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - VIOLÊNCIA DOMÉSTICA - AMEAÇA, LESÃO CORPORAL EM CONTEXTO DOMÉTICO E DANO QUALIFICADO - ABSOLVIÇÃO - AUSÊNCIA DE PROVAS - IMPOSSIBILIDADE - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - PALAVRA DA VÍTIMA CORROBORADA POR OUTROS ELEMENTOS DE PROVA - ESPECIAL RELEVÂNCIA - CRIME DE DANO - DESCLASSIFICAÇÃO NECESSÁRIA - AUSÊNCIA DE EMPREGO DE VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA PARA ASSEGURAR O CRIME DE DANO - DESCLASSIFICAÇÃO PARA DANO SIMPLES - PROCESSAMENTO MEDIANTE QUEIXA - EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE NECESSÁRIA - REDIMENSIONAMENTO PROPORCIONAL DA PENA - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE - PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE INFERIOR A SEIS MESES - DECOTE NECESSÁRIO. - Incabível a absolvição quando fartamente comprovadas a autoria e materialidade delitiva, tanto pelas provas orais colhidas, quanto pelo contexto probatório que as corrobora - A palavra da vítima possui especial relevância probatória nos crimes praticados no contexto de violência doméstica, sobretudo quando corroborada pelos demais elementos colhidos durante a fase policial e judicial - Nos termos do art. 163, parágrafo único, inciso I, do Código Penal, configura-se o dano qualificado quando o crime é cometido "com violência à pessoa ou grave ameaça". Desse modo, referida violência ou grave ameaça deve ser praticada com a finalidade de assegurar o resultado do dano - Nos termos do art . 46 do Código Penal, a prestação de serviços à comunidade não pode ser aplicada como condição da suspensão da execução da pena inferior a seis meses. (TJ-MG - Apelação Criminal: 0005467-83.2020.8 .13.0110 1.0000.23 .344009-8/001, Relator.: Des.(a) Maria das Graças Rocha Santos, Data de Julgamento: 08/05/2024, 9ª Câmara Criminal Especializa, Data de Publicação: 08/05/2024) Conforme relata a vítima, o acusado, quando adentrou o imóvel desta, apenas causou-lhe danos patrimoniais. Além disso, a vítima não se encontrava em casa no momento em questão. Não houve, assim, qualquer tipo de violência ou ameaça direcionada à sua pessoa no momento em que o acusado praticou o referido ato. Assim, deve ser desclassificado o crime de dano qualificado para dano simples. Uma vez desclassificada a conduta, observa-se a alteração da legitimidade para a propositura da ação penal, já que, ao crime de dano qualificado, se aplica a regra geral da ação penal pública incondicionada, enquanto o delito de dano simples se processa mediante ação penal privada, por força de disposição expressa do artigo 167 do Código Penal. O Ministério Público não possui legitimidade para ajuizar a ação penal em que se apura a prática do crime de dano simples, porquanto se trata de ação penal privada, sujeita à iniciativa da vítima. Dessa forma, reconheço a ilegitimidade ativa do Ministério Público e constatado o decurso do prazo de 06 seis meses para o ajuizamento da ação penal privada, deve ser declarada extinta a punibilidade do acusado pela decadência em relação a este delito. Por fim, em que pese a fundamentação acima, verifica-se a ocorrência das prescrição da pretensão punitiva do acusado em relação aos delitos de ameaça e violação de domicílio. Como se sabe, da prática de ilícitos penais nasce para o Estado o direito de punir. No entanto, este direito deve ser exercido dentro de prazos legais determinados, sob pena de, em havendo inércia do Estado, ocorrer a perda de tal direito, caracterizando-se a prescrição. A lei penal prevê duas espécies de prescrição: a prescrição da pretensão punitiva e a prescrição da pretensão executória. A primeira se refere à perda do direito do Estado de formar um título executivo judicial (Prescrição antes do trânsito em julgado). Já a segunda, extingue o direito do estado de executar sua decisão, também em razão do decurso do tempo (Prescrição depois do trânsito em julgado). Importante frisar que a prescrição antes de transitada em julgado a sentença condenatória, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime. O artigo 147 do Código Penal prevê uma pena de detenção, de um a seis meses, ou multa e ao art. 150, do mesmo código, é cominada pena de detenção, de um a três meses, ou multa. Nos termos do art. 109, VI, do Código Penal, “a prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1o do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: VI - em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano”. Destarte, considerando que desde a data do recebimento da denúncia (05/05/2022) já se passaram mais de três anos, sem ter havido outra causa interruptiva, a declaração de extinção da punibilidade torna-se absolutamente necessária, por se tratar de disposição cogente. O art. 107, IV, do CP normatiza que “extingue-se a punibilidade: (....) IV – pela prescrição, decadência e perempção”. Ademais, vale ressaltar por oportuno que, na espécie, a extinção da punibilidade, consubstanciada na prescrição, pode também ser declarada de ofício pelo Juiz, por constituir-se matéria de ordem pública, nos termos do artigo 61 do Código de Processo Penal. Ex positis, nos termos do art. 107, inc. IV c/c art. 109, inciso VI, ambos do Código Penal Brasileiro, DECLARO EXTINTA A PUNIBILIDADE DE R. D. S. S., em razão da prescrição da pretensão punitiva por parte do Estado em relação aos delitos tipificados nos arts. 147 e 150, ambos do Código Penal. Por fim, com apoio no art. 38 e art. 44 do Código de Processo Penal c/c art. 107, IV, do Código Penal, DECLARO EXTINTA A PUNIBILIDADE DE R. D. S. S. quanto ao crime de dano (art. 163, caput, do CPB), diante da decadência do direito de querelar. P.R.I. Cientifique-se o Ministério Público. Sem custas. Transitada em julgado, arquivem-se os autos com baixa na distribuição e demais cautelas legais. Proceda a Secretaria Judicial as baixas necessárias nos registros, conforme determina o artigo 202 da LEP. Grajaú/MA, data do sistema. PEDRO HENRIQUE HOLANDA PASCOAL Juiz de Direito Auxiliar NAUJ – Núcleo de Apoio às Unidades Judiciais Portaria CGJ n.º 3730/2024

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Processo nº 0800734-61.2024.8.10.0085

ID: 322626400

Tribunal: TJMA Órgão: VARA ÚNICA DE DOM PEDRO Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 0800734-61.2024.8.10.0085

Data de Disponibilização: 11/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

WALLISON DA SILVA GOMES

Sentença (expediente)

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO MARANHÃO NAUJ - NÚCLEO DE APOIO ÀS UNIDADES JUDICIAIS Processo Judicial Eletrônico – PJe Processo nº.: 0800734-61.2024.8.10.0085 AUTOR: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO M… PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO MARANHÃO NAUJ - NÚCLEO DE APOIO ÀS UNIDADES JUDICIAIS Processo Judicial Eletrônico – PJe Processo nº.: 0800734-61.2024.8.10.0085 AUTOR: MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO MARANHAO REU: WALLISON DA SILVA GOMES SENTENÇA O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, ofereceu denúncia em desfavor de WALLISON DA SILVA GOMES, conhecido como “Neguinho borracheiro”, qualificado no ID 120104628, pela prática da contravenção penal tipificada no art. 21 da lei nº 3.688/1941 e do crime de dano qualificado previsto no art. 163, parágrafo único, inciso I, do Código Penal c/c art. 7º, da Lei 11.340/2006, tudo na forma do art. 69, do Código Penal. Segundo a inicial acusatória, no dia 23 de março de 2024, por volta das 22h00, na residência da vítima, localizada à Rua Pedro Branco, Vila Roseana, cidade de Dom Pedro /MA, o denunciado praticou a contravenção penal de vias de fato e o crime dano qualificado em desfavor de sua ex-companheira Gislani Diniz Barbosa. Relata que, segundo se infere dos autos inquisitoriais, o denunciado e Gislani Diniz Barbosa mantiveram um relacionamento amoroso por aproximadamente 07 (sete) anos, oportunidade em que tiveram uma filha, todavia, em razão do denunciado ser uma pessoa violenta, a vítima decidiu romper o relacionamento e alugou uma residência. Narra que, no local e horário supramencionados, o denunciado foi até a residência da vítima, ocasião em que houve uma discussão. Na oportunidade, o denunciado passou a agredir a vítima com tapas, bem como a jogou contra parede, ocasião em que iniciou uma luta corporal. Afirma que, durante a briga, o denunciado danificou totalmente o aparelho celular da vítima da marca Samsung, de cor azul, objeto ao qual o denunciado havia presenteado a ofendida no período em que ainda estavam juntos. Assim, entendendo presentes os indícios de autoria e materialidade dos crimes narrados, pleiteou o Ministério Público a condenação do acusado nas sanções a eles cominadas. A denúncia foi recebida no dia 05 de junho de 2024 (ID 120325083). Citado, o acusado apresentou Resposta à acusação, conforme petição de ID 129947809. Realizada audiência de instrução, foram ouvidas a vítima, uma testemunha de acusação e interrogado o acusado. Ao final, o Ministério Público apresentou alegações finais orais reiterando os termos da denúncia; quanto a defesa, apresentou alegações finais pugnando a absolvição do acusado no que tange a contravenção pela de vias de fato e o reconhecimento da legitima defesa em relação ao crime de dano qualificado (ID 146932433). Vieram os autos conclusos. É o relatório. Decido. Trata-se, in casu, de ação penal movida pelo Ministério Público em face de WALLISON DA SILVA GOMES, conhecido como “Neguinho borracheiro”, em que este é acusado da prática da contravenção penal tipificada no art. 21 da lei nº 3.688/1941 e do crime de dano qualificado previsto no art. 163, parágrafo único, inciso I, do Código Penal c/c art. 7º, da Lei 11.340/2006, tudo na forma do art. 69, do Código Penal. Para a condenação do acusado faz-se necessário que exista prova cristalina e conclusiva da materialidade e autoria dos delitos. Assim, passo a verificar esses aspectos. Realizada a instrução processual, observa-se os depoimentos da vítima e uma testemunha de acusação e, ainda, o interrogatório do acusado. A vítima, GISLANI DINIZ BARBOSA, declarou o seguinte: “que no dia dos fatos a depoente e o acusado discutiram por causa da filha em comum; que o acusado se zangou porque a depoente deixou a filha com uma amiga e lhe deu um tapa; que o acusado quebrou o celular da depoente; que a depoente não quebrou o celular do acusado; que atualmente a depoente só fala o necessário com o acusado; que não teve mais confusão entre a depoente e o acusado depois desse dia; que o acusado jogou o celular da depoente no chão”. A testemunha MARIA CLARA GOMES MELO relatou: “que a depoente não estava presente no momento dos fatos; que uma amiga da depoente ligou dizendo que estava havendo um atrito entre o acusado e a vítima; que quando chegaram lá, a vítima e o acusado estavam somente discutindo; que a depoente viu o celular da vítima quebrado; que a depoente não viu sinal de agressão na vítima; que chegou após a confusão; que não viu agressão, mas a vítima fala que teve; que atualmente a vítima e o acusado se dão bem, não brigaram mais”. O réu, por sua vez, ao ser interrogado, disse: “que o interrogado quebrou o celular da vítima; que a vítima quebrou o celular do interrogado antes; que não teve agressão, somente discussão e o celular”. Pois bem. Conforme se verifica da oitiva da vítima e testemunha, não há dúvidas quanto a autoria e materialidade delitivas em relação a contravenção penal de vias de fato. Quanto a vítima, esta reiterou o depoimento prestado em sede policial, afirmando que, após discussão com o acusado, este lhe agrediu com tapas no rosto. Tal relato é corroborado pelo depoimento da testemunha ouvida, a qual declarou que, embora não tenha presenciado a referida agressão, a vítima relatou que o acusado lhe desferiu um tapa no rosto. Depreende-se que os depoimentos da vítima e testemunha são harmônicos entre si, relatando da mesma forma como os fatos ocorreram, não visualizando contradição em suas afirmações. Outrossim, sabe-se que nos delitos perpetrados sob a égide da Lei Maria da Penha, a palavra da vítima sempre foi reputada de grande relevância, mas desde que se apresente de forma lógica e coerente. E, no presente caso, entendo que encontra-se em harmonia com os demais elementos presentes nos autos, como as provas colhidas em sede inquisitorial e judicial. Nesse sentido, é o entendimento jurisprudencial: EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - LESÃO CORPORAL EM ÂMBITO DOMÉSTICO - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - DEPOIMENTO DOS POLICIAIS - VALIDADE. Comprovada a autoria e a materialidade, sobretudo pelo depoimento da vítima e dos militares que atenderam a ocorrência, de rigor a manutenção da condenação do acusado pela infração a que denunciado. Os depoimentos dos policiais gozam de presunção de veracidade, sobretudo quando corroborados pelos demais documentos trazidos aos autos, não sendo sua condição funcional, por si só, elemento suficiente pra afastar a validade de suas declarações. (TJ-MG - APR: 10621200002619001 São Gotardo, Relator: Maria das Graças Rocha Santos, Data de Julgamento: 26/10/2022, Câmaras Especializadas Crimina / 9ª Câmara Criminal Especializa, Data de Publicação: 28/10/2022) Violência doméstica. Lesão corporal. Provas. 1 - Nos crimes cometidos em situação de violência doméstica e familiar, a palavra da vítima tem especial relevância, sobretudo quando corroborada pelas demais provas dos autos - laudo de exame de corpo de delito e depoimentos de testemunha que presenciou os fatos e policial militar que atendeu a ocorrência. 2 - Se não há dúvidas de que o réu agrediu a vítima e da agressão resultou lesão corporal, pequenas divergências quanto à dinâmica dos fatos não são capazes de enfraquecer o depoimento da vítima e eximir o réu da responsabilidade penal. 3 - Apelação não provida. (TJ-DF 00003925420178070007 DF 0000392-54.2017.8.07.0007, Relator: JAIR SOARES, Data de Julgamento: 04/06/2020, 2ª Turma Criminal, Data de Publicação: Publicado no PJe : 23/06/2020 . Pág.: Sem Página Cadastrada.). Cumpre destacar que as vias de fato consistem em agressões que não chegam a deixar vestígios, sendo dispensável, portanto, o exame de corpo de delito. Segundo MARCELLO JARDIM LINHARES, “conceituam-se as vias de fato como a briga ou a luta quando delas não resulta crime; como a violência empregada contra a pessoa, de que não decorre ofensa à sua integridade física. Em síntese, vias de fato são a prática de perigo menor, atos de provocação exercitados materialmente sobre a pessoa, ou contra a pessoa. Assim, empurrá-la sem razão, sacudi-la, rasgar-lhe a roupa, agredi-la a tapas, a socos ou a pontapés, arrebatar-lhe qualquer objeto das mãos ou arrancar-lhe alguma peça do vestuário, puxar-lhe os cabelos, molestando-a ” (LINHARES, Marcello Jardim. Contravenções penais: comentários ao Decreto-lei 3.688, de 03.10.1941, e às contravenções previstas em leis especiais. São Paulo: Saraiva, 1980. vol. 1, p. 164, citado por NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. Rio de Janeiro: Ed. Forense, 2014, 8ª ed.) (destaquei). Diante da prova oral acima resumida, resta demonstrada, de maneira inequívoca, a prática de vias de fato contra a vítima, consistente em um tapa no rosto, devendo o acusado ser condenado nas penas cominadas ao referido delito. Em relação ao delito de dano, verifica-se que também devidamente comprovadas a autoria e a materialidade delitivas, tanto pelo depoimento da vítima, quanto pela fotografia anexa no ID 120000637, página 24. Cumpre destacar que, conforme ensina a doutrina, o referido tipo penal trata-se de crime pluriofensivo, uma vez que atinge dois bens jurídicos, no caso, o patrimônio, no tocante ao dano, e a integridade física ou a liberdade individual, relativamente à qualificadora. Além disso, a grave ameaça ou violência à pessoa deve ser anterior ou concomitante ao dano (Masson, Cleber. Direito penal : parte especial (arts. 121 a 212) / Cleber Masson. - 16. ed. - Rio de Janeiro : Método, 2023.) Nesse sentido, é o entendimento jurisprudencial: EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - VIOLÊNCIA DOMÉSTICA - AMEAÇA, LESÃO CORPORAL EM CONTEXTO DOMÉTICO E DANO QUALIFICADO - ABSOLVIÇÃO - AUSÊNCIA DE PROVAS - IMPOSSIBILIDADE - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - PALAVRA DA VÍTIMA CORROBORADA POR OUTROS ELEMENTOS DE PROVA - ESPECIAL RELEVÂNCIA - CRIME DE DANO - DESCLASSIFICAÇÃO NECESSÁRIA - AUSÊNCIA DE EMPREGO DE VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA PARA ASSEGURAR O CRIME DE DANO - DESCLASSIFICAÇÃO PARA DANO SIMPLES - PROCESSAMENTO MEDIANTE QUEIXA - EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE NECESSÁRIA - REDIMENSIONAMENTO PROPORCIONAL DA PENA - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE - PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE INFERIOR A SEIS MESES - DECOTE NECESSÁRIO. - Incabível a absolvição quando fartamente comprovadas a autoria e materialidade delitiva, tanto pelas provas orais colhidas, quanto pelo contexto probatório que as corrobora - A palavra da vítima possui especial relevância probatória nos crimes praticados no contexto de violência doméstica, sobretudo quando corroborada pelos demais elementos colhidos durante a fase policial e judicial - Nos termos do art. 163, parágrafo único, inciso I, do Código Penal, configura-se o dano qualificado quando o crime é cometido "com violência à pessoa ou grave ameaça". Desse modo, referida violência ou grave ameaça deve ser praticada com a finalidade de assegurar o resultado do dano - Nos termos do art . 46 do Código Penal, a prestação de serviços à comunidade não pode ser aplicada como condição da suspensão da execução da pena inferior a seis meses. (TJ-MG - Apelação Criminal: 0005467-83.2020.8 .13.0110 1.0000.23 .344009-8/001, Relator.: Des.(a) Maria das Graças Rocha Santos, Data de Julgamento: 08/05/2024, 9ª Câmara Criminal Especializa, Data de Publicação: 08/05/2024) Conforme relata a vítima, após desentendimento com o acusado, este passou a agredi-la com tapas no rosto e também destruiu seu aparelho celular, jogando-o ao chão, o que é corroborado, conforme mencionado acima, pela fotografia anexa aos autos e, ainda, o depoimento da testemunha de acusação, que confirmou ter visto o celular da vítima quebrado. Assim, de rigor a condenação do acusado às penas deste delito. Cumpre registrar que não merece acolhimento a tese da defesa no sentido de que o acusado teria agido em legítima defesa pois, anteriormente, a vítima teria quebrado o aparelho celular do acusado. Isto porque não consta nenhum elemento probatório confirmando tal alegação. Conforme já ressaltado, consta nos autos fotografia do celular da vítima demonstrando o dano material sofrido pela mesma. Por outro lado, não consta nenhuma fotografia ou qualquer outra prova capaz de corroborar a defesa do réu. Além disso, a vítima disse que não quebrou o aparelho celular do acusado. No mais, inaplicável os benefícios da Lei nº 9099/95, em face da vedação expressa da Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) no art. 41. Verificando que a contravenção penal de vias de fato foi praticada em data anterior a vigência da Lei n.º 14.994/2024, aplica-se ao caso a pena vigente à época dos fatos, em observância ao princípio da retroatividade benéfica, consagrado no art. 5º, XL, da CF. Por fim, presente a agravante prevista no art. 61, II, “f”, do CPB, ressaltando que não se trata de bis in idem a sua incidência ao presente caso, nos termos do Tema Repetitivo 1197 do STJ. Milita em favor do acusado a atenuante da confissão espontânea em relação ao crime de dano qualificado. Diante do exposto, em face das razões apontadas, e pelo que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE A DENÚNCIA para condenar o acusado WALLISON DA SILVA GOMES, conhecido como “Neguinho borracheiro”, nas penas do art. 21, do Decreto-Lei n.º 3.688/41 e art. 163, parágrafo único, inciso I, do CPB c/c Lei n.º 11.340/2006. Passo a dosar a pena a ser-lhe aplicada, nos termos do art. 68 do CPB. DOSIMETRIA DA PENA - DA CONTRAVENÇÃO PENAL DE VIAS DE FATO Pela análise das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, constata-se que o grau de culpabilidade é normal à espécie, nada havendo a valorar. No tocante aos antecedentes, verifica-se que o réu não possui condenação por crime anterior. No que respeita à conduta social, nada fora colhido nos autos, pelo que deve ser considerada neutra. Em relação à personalidade, inexistem elementos suficientes para avaliá-la. Quanto aos motivos, as lesões decorreram de contexto de violência no âmbito doméstico e familiar, porém, por já integrar a elementar do tipo, deixo de valorá-la. No que se refere às circunstâncias, nada a considerar. As conseqüências não são desfavoráveis, posto que não foram além da consumação. Por fim, inexistiu participação da vítima para o cometimento do ilícito. Desse modo, fixo a pena-base em 15 (quinze) dias de prisão simples. Na segunda fase da dosimetria da pena, deixo de aplicar qualquer circunstância atenuante, pois inexiste no caso. Presente a agravante prevista no art. 61, inciso II, alínea “f”, do Código Penal (Tema Repetitivo 1197). Portanto, fixo, em segunda fase, a pena em 17 (dezessete) dias de prisão simples. Por fim, na terceira fase, não percebo a presença de quaisquer causas de aumento ou diminuição de pena, seja da parte geral ou especial. Assim, FIXO A PENA DEFINITIVA EM PRISÃO SIMPLES DE 17 (DEZESSETE) DIAS. - QUANTO AO CRIME DO ART. 163, PARÁGRAFO ÚNICO, I, DO CPB Pela análise das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, constata-se que o grau de culpabilidade é normal à espécie, nada havendo a valorar. No tocante aos antecedentes, verifica-se que o réu não possui condenação por crime anterior. No que respeita à conduta social, nada fora colhido nos autos, pelo que deve ser considerada neutra. Em relação à personalidade, inexistem elementos suficientes para avaliá-la. Quanto aos motivos, nada a valorar. No que se refere às circunstâncias, também não há o que valorar. As consequências são desfavoráveis, diante do evidente prejuízo material sofrido pela vítima. Por fim, inexistiu participação da vítima para o cometimento do ilícito. Desse modo, fixo a pena-base em 06 (seis) meses e 22 (vinte e dois) dias de detenção e 11 (onze) dias-multa. No concurso entre atenuantes e agravantes, constato que presente a atenuante de confissão espontânea e agravante prevista no art. 61, inciso II, alínea “f”, do Código Penal (Tema Repetitivo 1197), sendo estas igualmente preponderantes, pelo que devem ser compensadas. Assim, mantenho a pena de 06 (seis) meses e 22 (vinte e dois) dias de detenção e 11 (onze) dias-multa. Inexistem causas de diminuição e de aumento, seja da parte especial ou geral. Assim, FIXO A PENA DEFINITIVA EM DETENÇÃO DE 06 (SEIS) MESES E 22 (VINTE E DOIS) DIAS E 11 (ONZE) DIAS-MULTA. O REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DAS PENAS É O ABERTO, NOS TERMOS DO ART. 33, § 2º, “C”, DO CPB. Deixo de substituir as penas privativas de liberdade por restritiva de direitos, ante a vedação do art. 17 da lei 11.340/2006 e Súmula 588 do STJ. Por outro lado, preenchidos os requisitos do art. 77 do CPB, concedo a suspensão condicional das penas, ficando o acusado obrigado, nos termos do art. 78, § 2º do CPB, a: (1) proibido de frequentar determinados lugares, como bares, festas dançantes e casas do gênero; (2) proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização judicial; (3) comparecimento pessoal e mensal em juízo, para justificar suas atividades, tudo no período das penas fixadas. Asseguro ao réu o direito de recorrer em liberdade, em face da natureza da sanção imposta, considerando ainda que inexistem requisitos para a prisão cautelar. Sem custas processuais. Após o trânsito em julgado da sentença: a) lance-se o nome do réu no rol dos culpados (art. 694 do CPP); b) oficie-se ao Tribunal Regional Eleitoral, comunicando a condenação do acusado, com sua devida identificação, acompanhada de cópia da presente decisão, para cumprimento do disposto nos artigos 71, § 2º, do Código Eleitoral e 15, III, da Constituição Federal; c) oficie-se ao setor de identificação da Secretaria de Segurança deste Estado, noticiando a condenação do acusado para que sejam efetuados os respectivos registros; d) forme-se a guia de execução definitiva no SEEU (arts. 105/106 da LEP), inclusive com oportuna abertura de vista ao Ministério Público nos referidos autos. Deixo de determinar a reparação do dano, face ausência de comprovação da extensão da lesão patrimonial. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se. SERVE A PRESENTE SENTENÇA COMO MANDADO. Dom Pedro/MA, data do sistema. PEDRO HENRIQUE HOLANDA PASCOAL Juiz de Direito Auxiliar NAUJ – Núcleo de Apoio às Unidades Judiciais (Portaria nº 3730/2024-CGJ)

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Processo nº 0003503-87.2017.8.10.0031

ID: 283693184

Tribunal: TJMA Órgão: 2ª Vara de Chapadinha Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 0003503-87.2017.8.10.0031

Data de Disponibilização: 29/05/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

CLEITO DA SILVA FREITAS

Sentença (expediente)

PODER JUDICIÁRIO ESTADO DO MARANHÃO NAUJ - NÚCLEO DE APOIO ÀS UNIDADES JUDICIAIS Processo nº 0003503-87.2017.8.10.0031 Parte Requerente: CARLA PATRICIA TEIXEIRA DE CARVALHO Parte Requerida: CLEITO DA… PODER JUDICIÁRIO ESTADO DO MARANHÃO NAUJ - NÚCLEO DE APOIO ÀS UNIDADES JUDICIAIS Processo nº 0003503-87.2017.8.10.0031 Parte Requerente: CARLA PATRICIA TEIXEIRA DE CARVALHO Parte Requerida: CLEITO DA SILVA FREITAS S E N T E N Ç A O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, ofereceu denúncia em desfavor de GLEYTON DA SILVA FREIRE, qualificado no ID 80392366, página 03, pela prática dos crimes capitulados no art. 129, § 9º, art. 147 e art. 163, parágrafo único, I, todos do CPB, c/c Lei n.° 11.340/06. Segundo a inicial acusatória, no dia 07 de agosto de 2017, por volta das 06h00min, a vitimada, CARLA PATRÍCIA TEIXEIRA CARVALHO, companheira do réu, se negou a ter relações sexuais com o mesmo. Informa que, em razão disso, o inculpado passou a lhe proferir ameaças de morte, suspeitando que a companheira estivesse o traindo. Consta que o incriminado, então, saiu do quarto e após alguns instantes, uma das filhas do casal se dirigiu à genitora chorando e reclamando que o indiciado havia lhe agredido. Narra que a vítima seguiu relatando que indagou ao companheiro acerca do motivo pelo qual ele agrediu a filha, momento em que o inculpado pegou o aparelho celular da ofendida e o arremessou contra um pilão e, após, o denunciado se armou com um pedaço de madeira e desferiu alguns golpes nas pernas da vitimada. Em seguida, o incriminado se muniu de um machado e quebrou diversos objetos, como a antena parabólica, o fogão e a cama. Relata ainda que o inculpado então pegou as partes da cama quebrada e levou até o quintal, no intuito de atear fogo. Nesse momento, a Polícia Militar chegou ao local e prendeu em flagrante o denunciado. Assim, entendendo presentes os indícios de autoria e materialidade dos crimes narrados, pleiteou o Ministério Público a condenação do acusado nas sanções a eles cominadas. A denúncia foi recebida no dia 25 de agosto de 2017 (ID 80392366, página 55). Citado, o acusado apresentou Resposta à acusação, conforme petição de ID 80392366, páginas 64/65. Realizada audiência de instrução, foram ouvidas as testemunhas de acusação. Quanto ao acusado, foi decretada a sua revelia (ID 80392366, páginas 92 e 103). Em alegações finais, o Ministério Público pleiteou a condenação do acusado nos termos da denúncia (ID 97403202). A defesa apresentou alegações finais pleiteando a aplicação da pena no mínimo legal, suspensão condicional da pena ou substituição da pena privativa de liberdade por outra(s) prevista (s) em lei; e/ou ainda o regime inicial menos gravoso para o cumprimento da eventual pena, assim como a suspensão condicional da pena (ID 106565378). Vieram os autos conclusos. É o relatório. Decido. Trata-se, in casu, de ação penal movida pelo Ministério Público em face de GLEYTON DA SILVA FREIRE, em que este é acusado da prática dos crimes capitulados no art. 129, § 9º, art. 147 e art. 163, parágrafo único, I, todos do CP c/c Lei Maria da Penha. Para a condenação do acusado faz-se necessário que exista prova cristalina e conclusiva da materialidade e autoria do delito. Assim, passo a verificar esses aspectos. Realizada a instrução processual, verifica-se a oitiva da vítima e três testemunhas de acusação. A testemunha Mario Lima da Costa Filho relatou não se recordar dos fatos em questão. A testemunha Itamar Macedo informou: “que não lembra da situação em si, mas confirma o que disse no depoimento que está nos autos”. A vítima Carla Patrícia Teixeira de Carvalho declarou: “que o acusado agrediu a depoente; que o motivo foi porque a depoente se recusou a ter relação sexual com o acusado e ele passou a quebrar objetos de dentro da residência; que nesse dia o acusado acordou a depoente, querendo relação sexual e ela disse que não queria, então o acusado se zangou e começou a brigar com a filha; que a depoente e o acusado passaram a discutir por causa da filha e ele pegou um pedaço de pau, derrubou a antena, pegou um facão e quebrou a cama e por ultimo a televisão; que o outro filho do casal e a depoente entraram no meio para impedir o acusado de continuar quebrando as coisas; que o acusado bateu com uma ripa na canela da depoente e no braço; que essa foi a ultima vez pois deu parte dele; que a depoente morou com o acusado por 13 anos e ele já tinha lhe agredido algumas vezes; que depois desse dia a depoente se separou do acusado; que o acusado passou dois meses preso e não teve mais noticia dele”. A testemunha José Francisco de Araújo Dias narrou: “que a vítima é vizinha do depoente; que no dia dos fatos, o acusado e a vítima brigaram e a vítima saiu correndo para a casa do depoente; que o acusado bateu na vítima e quem socorreu ela foi a irmã do depoente; que o acusado bateu com uma ripa na cabeça da vítima”. Pois bem. No que tange a materialidade do delito de lesão corporal, encontra-se comprovada por meio do exame de corpo de delito de ID 80392366, página 15, onde se verifica a descrição de lesões na vítima constatadas na data do fato. Os depoimentos colhidos em Juízo atestam a autoria do crime. Isto porque a vítima confirmou os fatos narrados na denúncia, relatando que, após negar-se a ter relação sexual com o acusado, este lhe agrediu atingindo sua perna e braço. Os policiais ouvidos, embora não tenham se recordado do fato em questão, verifica-se constar o depoimento da testemunha José Francisco, vizinho da vítima, o qual narrou que, após a briga entre o acusado e a vítima, esta pediu ajuda em sua casa, sendo, inclusive, socorrida por sua irmã e confirmou que viu a vítima machucada. Sabe-se que nos delitos perpetrados sob a égide da Lei Maria da Penha, a palavra da vítima sempre foi reputada de grande relevância, mas desde que se apresente de forma lógica e coerente. E, no presente caso, entendo que encontra-se em harmonia com os demais elementos presentes nos autos, como as provas colhidas em sede inquisitorial e judicial. Nesse sentido, é o entendimento jurisprudencial: EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - LESÃO CORPORAL EM ÂMBITO DOMÉSTICO - ABSOLVIÇÃO - IMPOSSIBILIDADE - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - DEPOIMENTO DOS POLICIAIS - VALIDADE. Comprovada a autoria e a materialidade, sobretudo pelo depoimento da vítima e dos militares que atenderam a ocorrência, de rigor a manutenção da condenação do acusado pela infração a que denunciado. Os depoimentos dos policiais gozam de presunção de veracidade, sobretudo quando corroborados pelos demais documentos trazidos aos autos, não sendo sua condição funcional, por si só, elemento suficiente pra afastar a validade de suas declarações. (TJ-MG - APR: 10621200002619001 São Gotardo, Relator: Maria das Graças Rocha Santos, Data de Julgamento: 26/10/2022, Câmaras Especializadas Crimina / 9ª Câmara Criminal Especializa, Data de Publicação: 28/10/2022) Violência doméstica. Lesão corporal. Provas. 1 - Nos crimes cometidos em situação de violência doméstica e familiar, a palavra da vítima tem especial relevância, sobretudo quando corroborada pelas demais provas dos autos - laudo de exame de corpo de delito e depoimentos de testemunha que presenciou os fatos e policial militar que atendeu a ocorrência. 2 - Se não há dúvidas de que o réu agrediu a vítima e da agressão resultou lesão corporal, pequenas divergências quanto à dinâmica dos fatos não são capazes de enfraquecer o depoimento da vítima e eximir o réu da responsabilidade penal. 3 - Apelação não provida. (TJ-DF 00003925420178070007 DF 0000392-54.2017.8.07.0007, Relator: JAIR SOARES, Data de Julgamento: 04/06/2020, 2ª Turma Criminal, Data de Publicação: Publicado no PJe : 23/06/2020 . Pág.: Sem Página Cadastrada.). Frisa-se, ainda, a existência do dolo na ação do acusado, que é o elemento subjetivo da conduta, in casu, a vontade livre e consciente de lesionar a vítima (animus laedendi). Logo, inconteste a autoria, a materialidade delitiva e o elemento subjetivo, da conduta, incorrendo o réu na conduta do art. 129, § 9° do CPB, cumulada com Lei n° 11.340/2006. No que tange ao crime de ameaça, verifica-se a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva. Como se sabe, da prática de ilícitos penais nasce para o Estado o direito de punir. No entanto, este direito deve ser exercido dentro de prazos legais determinados, sob pena de, em havendo inércia do Estado, ocorrer a perda de tal direito, caracterizando-se a prescrição. A lei penal prevê duas espécies de prescrição: a prescrição da pretensão punitiva e a prescrição da pretensão executória. A primeira se refere à perda do direito do Estado de formar um título executivo judicial (Prescrição antes do trânsito em julgado). Já a segunda, extingue o direito do estado de executar sua decisão, também em razão do decurso do tempo (Prescrição depois do trânsito em julgado). Importante frisar que a prescrição antes de transitada em julgado a sentença condenatória, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime. O artigo 147 do Código Penal normatiza que a pena para o crime em comento é de detenção, de 01 (um) a 06 (seis) meses, ou multa. Nos termos do art. 109, VI, do Código Penal, a prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1o do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: VI - em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano. Destarte, considerando que desde a data do recebimento da denúncia (25/08/2017) já se passaram mais de três anos, sem ter havido outra causa interruptiva, a declaração de extinção da punibilidade torna-se absolutamente necessária, por se tratar de disposição cogente. O art. 107, IV, do CP normatiza que “extingue-se a punibilidade: (....) IV – pela prescrição, decadência e perempção”. Ademais, vale ressaltar por oportuno que, na espécie, a extinção da punibilidade, consubstanciada na prescrição, pode também ser declarada de ofício pelo Juiz, por constituir-se matéria de ordem pública, nos termos do artigo 61 do Código de Processo Penal. Assim, deve ser declarada extinta a punibilidade do acusado em razão da prescrição da pretensão punitiva por parte do Estado em relação ao delito tipificado no art. 147, do Código Penal. Já em relação ao delito de dano, verifica-se que devidamente comprovadas a autoria e a materialidade, tanto pelo depoimento da vítima, quanto pelo laudo e fotografias anexas no ID 80392366, páginas 29/33. Cumpre destacar que, conforme ensina a doutrina, o referido tipo penal trata-se de crime pluriofensivo, uma vez que atinge dois bens jurídicos, no caso, o patrimônio, no tocante ao dano, e a integridade física ou a liberdade individual, relativamente à qualificadora. Além disso, a grave ameaça ou violência à pessoa deve ser anterior ou concomitante ao dano (Masson, Cleber. Direito penal : parte especial (arts. 121 a 212) / Cleber Masson. - 16. ed. - Rio de Janeiro : Método, 2023.) Nesse sentido, é o entendimento jurisprudencial: EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - VIOLÊNCIA DOMÉSTICA - AMEAÇA, LESÃO CORPORAL EM CONTEXTO DOMÉTICO E DANO QUALIFICADO - ABSOLVIÇÃO - AUSÊNCIA DE PROVAS - IMPOSSIBILIDADE - AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS - PALAVRA DA VÍTIMA CORROBORADA POR OUTROS ELEMENTOS DE PROVA - ESPECIAL RELEVÂNCIA - CRIME DE DANO - DESCLASSIFICAÇÃO NECESSÁRIA - AUSÊNCIA DE EMPREGO DE VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA PARA ASSEGURAR O CRIME DE DANO - DESCLASSIFICAÇÃO PARA DANO SIMPLES - PROCESSAMENTO MEDIANTE QUEIXA - EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE NECESSÁRIA - REDIMENSIONAMENTO PROPORCIONAL DA PENA - PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE - PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE INFERIOR A SEIS MESES - DECOTE NECESSÁRIO. - Incabível a absolvição quando fartamente comprovadas a autoria e materialidade delitiva, tanto pelas provas orais colhidas, quanto pelo contexto probatório que as corrobora - A palavra da vítima possui especial relevância probatória nos crimes praticados no contexto de violência doméstica, sobretudo quando corroborada pelos demais elementos colhidos durante a fase policial e judicial - Nos termos do art. 163, parágrafo único, inciso I, do Código Penal, configura-se o dano qualificado quando o crime é cometido "com violência à pessoa ou grave ameaça". Desse modo, referida violência ou grave ameaça deve ser praticada com a finalidade de assegurar o resultado do dano - Nos termos do art . 46 do Código Penal, a prestação de serviços à comunidade não pode ser aplicada como condição da suspensão da execução da pena inferior a seis meses. (TJ-MG - Apelação Criminal: 0005467-83.2020.8 .13.0110 1.0000.23 .344009-8/001, Relator.: Des.(a) Maria das Graças Rocha Santos, Data de Julgamento: 08/05/2024, 9ª Câmara Criminal Especializa, Data de Publicação: 08/05/2024) Conforme relata a vítima, após desentendimento com o acusado, este passou a agredi-la e também destruir diversos objetos da residência, o que é corroborado, conforme mencionado acima, pelo laudo elaborado pela polícia civil. Assim, de rigor a condenação do acusado às penas deste delito. No mais, inaplicável os benefícios da Lei nº 9099/95, em face da vedação expressa da Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) no art. 41. Verificando que o crime de lesão corporal foi praticado em data anterior a vigência da Lei n.º 14.994/2024, aplica-se ao caso a pena vigente à época dos fatos, em observância ao princípio da retroatividade benéfica, consagrado no art. 5º, XL, da CF. Por fim, presente a agravante prevista no art. 61, II, “f”, do CPB, ressaltando que não se trata de bis in idem a sua incidência ao presente caso, nos termos do Tema Repetitivo 1197 do STJ. Diante do exposto, em face das razões apontadas, e pelo que dos autos consta, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE A DENÚNCIA para CONDENAR o acusado GLEYTON DA SILVA FREIRE, nas penas do art. 129, § 9º e art. 163, parágrafo único, I, ambos do Código Penal Brasileiro, na forma da lei nº 11.340/2006. Por fim, nos termos do art. 107, inc. IV c/c art. 109, inciso VI, ambos do Código Penal Brasileiro, DECLARO EXTINTA A PUNIBILIDADE DE GLEYTON DA SILVA FREIRE, em razão da prescrição da pretensão punitiva por parte do Estado em relação ao delito tipificado no art. 147, do CPB. Passo, assim, a dosar a pena a ser-lhe aplicada, nos termos do art. 68, do CPB. DOSIMETRIA DA PENA - QUANTO AO CRIME DO ART. 129, § 9º DO CPB Pela análise das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, constata-se que o grau de culpabilidade é normal à espécie, nada havendo a valorar. No tocante aos antecedentes, verifica-se que o réu não possui condenação por crime anterior. No que respeita à conduta social, nada fora colhido nos autos, pelo que deve ser considerada neutra. Em relação à personalidade, inexistem elementos suficientes para avaliá-la. Quanto aos motivos, verifica-se que as lesões decorreram após recusa da vítima em ter relação sexual com o acusado, o que deve ser desfavorável ao mesmo, diante do sentimento egoístico imposto em face de sua companheira. No que se refere às circunstâncias, nada a considerar. As conseqüências não são desfavoráveis, posto que não foram além da consumação. Por fim, inexistiu participação da vítima para o cometimento do ilícito. Desse modo, fixo a pena-base em 03 (três) meses e 15 (quinze) dias de detenção. Na segunda fase da dosimetria, deixo de aplicar qualquer circunstância atenuante, pois inexiste no caso. Presente a agravante prevista no art. 61, inciso II, alínea “f”, do Código Penal (Tema Repetitivo 1197). Portanto, fixo, em segunda fase, a pena em 04 (quatro) meses e 02 (dois) dias de detenção. Inexistem causas de diminuição e de aumento, seja da parte especial ou geral. Assim, FIXO A PENA EM TERCEIRA FASE EM DETENÇÃO DE 04 (QUATRO) MESES E 02 (DOIS) DIAS. - QUANTO AO CRIME DO ART. 163, PARÁGRAFO ÚNICO, I, DO CPB Pela análise das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP, constata-se que o grau de culpabilidade é normal à espécie, nada havendo a valorar. No tocante aos antecedentes, verifica-se que o réu não possui condenação por crime anterior. No que respeita à conduta social, nada fora colhido nos autos, pelo que deve ser considerada neutra. Em relação à personalidade, inexistem elementos suficientes para avaliá-la. Quanto aos motivos, verifica-se que os danos decorreram após recusa da vítima em ter relação sexual com o acusado, o que deve ser desfavorável ao mesmo, diante do sentimento egoístico imposto em face de sua companheira. No que se refere às circunstâncias, não há o que valorar. As consequências são desfavoráveis, diante do evidente prejuízo material sofrido pela vítima. Por fim, inexistiu participação da vítima para o cometimento do ilícito. Desse modo, fixo a pena-base em 07 (sete) meses e 15 (quinze) dias de detenção e 13 (treze) dias-multa. Na segunda fase da dosimetria, deixo de aplicar qualquer circunstância atenuante, pois inexiste no caso. Presente a agravante prevista no art. 61, inciso II, alínea “f”, do Código Penal (Tema Repetitivo 1197). Portanto, fixo, em segunda fase, a pena em 08 (oito) meses e 22 (vinte e dois) dias de detenção e 15 (quinze) dias-multa. Inexistem causas de diminuição e de aumento, seja da parte especial ou geral. Assim, FIXO A PENA EM TERCEIRA FASE EM DETENÇÃO DE 08 (OITO) MESES E 22 (VINTE E DOIS) DIAS E 15 (QUINZE) DIAS-MULTA. - DO SOMATÓRIO Considerando o concurso de crimes, reconheço o concurso material do art. 69 do Código Penal e somo as penas fixadas, tornando-a em definitivo em 01 (UM) ANO E 04 (QUATRO) DIAS DE DETENÇÃO E 15 (QUINZE) DIAS-MULTA. O REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DA PENA É O ABERTO, NOS TERMOS DO ART. 33, § 2º, “C”, DO CPB. Deixo de substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, ante a vedação do art. 17 da lei 11.340/2006 e Súmula 588 do STJ. Por outro lado, preenchidos os requisitos do art. 77 do CPB, concedo a suspensão condicional da pena, ficando o acusado obrigado, nos termos do art. 78, § 2º do CPB, a: (1) proibido de frequentar determinados lugares, como bares, festas dançantes e casas do gênero; (2) proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização judicial; (3) comparecimento pessoal e mensal em juízo, para justificar suas atividades, tudo no período da pena fixada. Asseguro ao réu o direito de recorrer em liberdade, em face da natureza da sanção imposta, considerando ainda que inexistem requisitos para a prisão cautelar. Sem custas processuais. Após o trânsito em julgado da sentença: a) lance-se o nome do réu no rol dos culpados (art. 694 do CPP); b) oficie-se ao Tribunal Regional Eleitoral, comunicando a condenação do acusado, com sua devida identificação, acompanhada de cópia da presente decisão, para cumprimento do disposto nos artigos 71, § 2º, do Código Eleitoral e 15, III, da Constituição Federal; c) oficie-se ao setor de identificação da Secretaria de Segurança deste Estado, noticiando a condenação do acusado para que sejam efetuados os respectivos registros; d) forme-se a guia de execução definitiva no SEEU (arts. 105/106 da LEP), inclusive com oportuna abertura de vista ao Ministério Público nos referidos autos. Deixo de determinar a reparação do dano, face ausência de lesão patrimonial. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se. SERVE A PRESENTE SENTENÇA COMO MANDADO. Chapadinha/MA, data do sistema. PEDRO HENRIQUE HOLANDA PASCOAL Juiz de Direito Auxiliar NAUJ – Núcleo de Apoio às Unidades Judiciais (Portaria nº 3730/2024-CGJ)

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Processo nº 5004083-33.2021.4.03.6332

ID: 262242865

Tribunal: TRF3 Órgão: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP Classe: RECURSO INOMINADO CíVEL Nº Processo: 5004083-33.2021.4.03.6332

Data de Disponibilização: 29/04/2025

Polo Ativo:

INTEGRAçãO DJEN-TRF3

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

FABIO MOLEIRO FRANCI

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ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo 4ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5004083-33.2021.4.0… PODER JUDICIÁRIO Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo 4ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5004083-33.2021.4.03.6332 RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP RECORRENTE: ALISON SANTOS VIANA Advogados do(a) RECORRENTE: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A RECORRIDO: ALISON SANTOS VIANA, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogados do(a) RECORRIDO: ISRAEL DE SOUZA FERIANE - ES20162-A, PAULO ROBERTO VIGNA - SP173477-A Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5004083-33.2021.4.03.6332 RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP RECORRENTE: ALISON SANTOS VIANA Advogados do(a) RECORRENTE: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A RECORRIDO: ALISON SANTOS VIANA, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogados do(a) RECORRIDO: ISRAEL DE SOUZA FERIANE - ES20162-A, PAULO ROBERTO VIGNA - SP173477-A Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recursos interpostos por ambas as partes em face da r. sentença que julgou parcialmente os pedidos para condenar a Caixa Econômica Federal a: a) pagar à parte autora indenização pelos danos materiais comprovados nos autos, conforme orçamento fixado no laudo pericial, no total de R$ 10.109,15, que deverá ser devidamente atualizado desde a data da juntada do laudo pericial e acrescido de juros de mora desde a data da citação, segundo os critérios e índices constantes do Manual de Cálculos da Justiça Federal atualmente em vigor; b) ante o princípio da sucumbência (mais significativa para a ré), CONDENOU a CEF, ainda, a ressarcir o sistema da assistência judiciária gratuita da Justiça Federal (AJG) pela despesa com os honorários periciais, no valor de R$ 600,00 que deverá ser devidamente atualizado desde a data da requisição via Sistema AJG e recolhido na forma própria. A parte autora recorreu. Requer “o reconhecimento da existência de dano moral e que seja fixado ao patamar de R$10.000,00.” A CEF, por sua vez, postula “a reforma a sentença de piso no que concerne a não condenação em danos morais, materiais e honorários periciais”. Subsidiariamente, requer a conversão da obrigação de pagar em obrigação de fazer. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5004083-33.2021.4.03.6332 RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP RECORRENTE: ALISON SANTOS VIANA Advogados do(a) RECORRENTE: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A RECORRIDO: ALISON SANTOS VIANA, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogados do(a) RECORRIDO: ISRAEL DE SOUZA FERIANE - ES20162-A, PAULO ROBERTO VIGNA - SP173477-A Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Preliminarmente, quanto à alegação de ilegitimidade passiva, conforme já constou da r. sentença, a controvérsia trazida aos autos é semelhante a várias ações em tramitação nas Turmas Recursais do JEF/SP. A título de exemplo 0004718-66.2020.4.03.6322 (2ª TR/SP); 0005244-33.2020.4.03.6322 (15ª TR/SP); 0005467-83.2020.4.03.6322 (13º TR/SP). Peço vênia para transcrever minuciosa fundamentação, que adoto como razão de decidir: “Segundo a mais recente interpretação do Superior Tribunal de Justiça sobre a questão da legitimidade passiva para a causa da Caixa Econômica Federal para responder pela reparação de vícios de construção de imóvel objeto de contrato de compra e venda e outros ajustes, por ela financiado, a partir do julgamento do RECURSO ESPECIAL Nº 1.163.228 – AM, RELATORA A EXCELENTÍSSIMA MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI, a Caixa Econômica Federal é a responsável pela reparação dos danos causados se atuar como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda, quando tiver escolhido a construtora ou tiver qualquer responsabilidade concreta relativa à elaboração e execução do projeto construtivo. Nessa mesma linha, segundo o voto proferido pela EXCELENTÍSSIMA MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI, no RECURSO ESPECIAL Nº 897.045 – RS, “(...) diversamente do que ocorre quando atua como agente financeiro em sentido estrito, considero, em princípio, ter a CEF legitimidade para responder por vícios de construção nos casos em que promoveu o empreendimento, teve responsabilidade na elaboração do projeto com suas especificações, escolheu a construtora e/ou negociou os imóveis, ou seja, quando realiza atividade distinta daquela própria de agente financeiro estrito senso (cf. voto-vista proferido no Recurso Especial nº 738.071- SC, julgado em 9.8.2011, Quarta Turma, relator Min. Luis Felipe Salomão)”. Ainda no mesmo sentido, também do STJ, se a CEF participou do contrato apenas na qualidade de agente financeiro, tomando o imóvel como garantia fiduciária do valor mutuado, suas responsabilidades contratuais dizem respeito apenas à atividade financeira, sem nenhuma vinculação com outras responsabilidades referentes à concepção do empreendimento ou à negociação do imóvel, não tem ela legitimidade passiva para a causa (AgInt no AREsp n. 1.708.217/PR, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 16/5/2022, DJe de 17/6/2022). No caso concreto, a Caixa Econômica Federal, através do FAR – Fundo de Arrendamento Residencial, negociou diretamente o imóvel com a parte autora, assinando o contrato na qualidade de “vendedor/cedente/doador”. O contrato foi firmado exclusivamente entre a CEF e a parte autora, sem nenhuma intervenção da construtora. O contrato não contém nenhuma cláusula atribuindo à construtora a responsabilidade pela reparação de vícios de construção; aliás, nem sequer poderia conter cláusula impondo obrigações a quem não figura no contrato, porque a construtora não o firmou, sem prejuízo de eventual demanda judicial de regresso da CEF em face da construtora que crie essa obrigação, ou de demanda do mutuário em face da construtora, na Justiça Estadual. Portanto, a CEF não atuou apenas como agente financeiro, e sim como agente executora de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda, ao conduzir o empreendimento e negociar diretamente o imóvel em contrato de compra e venda entre ela e a parte autora, sem a intervenção da construtora. Presente essa realidade, detém a CEF, exclusivamente, na Justiça Federal, legitimidade passiva para a causa em que se pede reparação de danos decorrentes de vícios de construção, na linha da interpretação adotada pelo STJ, segundo a qual, entre outros atos concretos que geram tal responsabilidade, destaca-se a negociação direta dos imóveis pela CEF (Recurso Especial nº 738.071- SC, julgado em 9.8.2011, Quarta Turma, relator Min. Luis Felipe Salomão).” No mérito, a r. sentença analisou minuciosamente os pedidos formulados, sendo irretocável, no seguinte sentido: “Da impugnação da CEF ao laudo Como se vê da impugnação apresentada pela CEF ao laudo pericial, boa parte das razões veicula mera divergência quanto às conclusões do perito judicial, o que se resolve no campo do mérito da causa, que será analisado abaixo. Mesmo no que de específico conteria a impugnação, também aqui se reproduzem alegações genéricas veiculadas de forma idêntica em outros processos, circunstância que por si só já desqualifica as alegações, vez que despregadas do laudo pericial juntado aos autos. Nada obstante, cabe registrar que o trabalho pericial se limitou ao preciso escopo fixado pelo juízo no despacho de designação, qual seja, a verificação da alegada existência de danos decorrentes de vícios construtivos no imóvel descrito na petição inicial. Para tanto – como se verá com mais vagar abaixo – o perito judicial identificou e diferenciou de forma clara os danos decorrentes de “vícios de construção” (falha na execução da obra) e de mau uso/falta de conservação, apresentando o orçamento para reparos apenas dos danos decorrentes de vícios de construção, com base em critérios objetivos de avaliação. Por estas razões, REJEITO a impugnação da CEF. 2. No mérito Superada a matéria preliminar, passo à análise do mérito da causa. E, ao fazê-lo, constato a procedência parcial do pedido. 2.1. Dos alegados danos materiais O art. 186 do Código Civil preceitua que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. No caso de que se cuida (em que a parte autora alega a existência de danos decorrentes de vícios de construção em seu imóvel do PMCMV), o exame pericial realizado na unidade habitacional da parte autora detectou defeitos oriundos de vícios de construção (isto é, não decorrentes de mau uso ou falta de conservação do imóvel) e, à luz de critérios objetivos de avaliação, estimou o quanto seria necessário despender para os reparos necessários. Tratando-se de vícios de construção, a responsabilidade pelos reparos é indiscutivelmente da CEF, ora ré, banco público que - como já assinalado na decisão de saneamento do processo - atua no ambiente do PMCMV como verdadeira executora/gestora do programa governamental de habitação (fiscalizando prazos e qualidade das obras e interferindo diretamente na execução do projeto junto à incorporadora/construtora), e não como mero agente financeiro. Tal circunstância, note-se, impõe à CEF o dever de indenizar mesmo os danos decorrentes de vícios ocultos ocasionados pela má execução da obra, sem prejuízo de seu eventual direito de regresso diante do responsável técnico e da construtora. Registre-se que o perito identificou e diferenciou de forma clara os danos decorrentes de “vícios de construção” (falha na execução da obra, de responsabilidade da ré) e de mau uso/falta de conservação (de responsabilidade da parte autora). Anote-se, ainda, que o perito judicial teve o cuidado de orçar detalhadamente os valores de mão de obra e material apenas para conserto dos danos decorrentes de vícios de construção, utilizando-se da Tabela SINAPI (Sistema Nacional de Preços e Índices para a Construção Civil - parâmetro de preços da construção civil observado nas contratações públicas), excluindo os danos derivados de mau uso ou falta de conservação/manutenção (que são, claramente, de responsabilidade da parte autora). O laudo, assim, atende aos requisitos legais dos arts. 473 do CPC e 12 da Lei nº 10.259/2001, apresentando fundamentação clara, simples e logicamente coerente, com exposição dos detalhes técnicos que levaram às suas conclusões. Posta a questão nestes termos, resta plenamente caracterizada a responsabilidade civil da ré no caso concreto, consubstanciando seu dever de indenizar, uma vez que as normas técnicas necessárias para a construção do imóvel deixaram de ser observadas, ocasionando os vícios constatados pela prova pericial, que a ré tinha o dever legal de evitar que existissem. Ressalte-se, porém, que tendo a parte autora optado por pedir em juízo apenas a “indenização” pelos danos detectados (e não seu reparo diretamente pela CEF), tais danos não poderão ser novamente discutidos ou reclamados no futuro, ainda que se agravem em razão da não utilização do valor da indenização para o seu efetivo reparo. 2.2. Dos alegados danos morais O pedido de indenização por danos morais não merece acolhimento. O laudo pericial deixa claro que os vícios encontrados são pontuais e de simples conserto, não se revestindo de gravidade que pudesse, por exemplo, colocar em risco a saúde ou a vida dos moradores do imóvel. Não há defeito estrutural, risco de desmoronamento ou necessidade de desocupação completa para reparos, de maneira a causar interferência intensa no estado psicológico da parte autora, nem mesmo constrangimento ou vexame. Trata-se de percalço que, embora desgastante para a parte autora, reveste-se de absoluta normalidade, sendo mesmo inerente à vida nos grandes centros urbanos e, por isso mesmo, incapaz de causar dano moral. Como reiteradamente afirmado pela jurisprudência, “só se deve reputar como dano moral a dor, o vexame, o sofrimento ou mesmo a humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, chegando a causar-lhe aflição, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Precedentes” (STJ, AgRg no REsp 1269246/RS, DJe 27/05/2014). Lembre-se, ainda, que as ações patrocinadas pelos advogados que representam a parte autora e outras centenas de outros proprietários de imóveis do PMCMV (em milhares de ações idênticas em Guarulhos e em outras localidades do país) trazem petições iniciais absolutamente genéricas e padronizadas, sequer se dando ao trabalho de detalhar e explicar, morador a morador, quais poderiam ser as circunstâncias pessoais excepcionais que, de fato, caracterizariam um dano moral juridicamente apreciável. Inexiste, pois, direito a indenização por danos morais.” No mérito, à vista do teor do laudo pericial elaborado nestes autos (id 313093084), entendo devida a reparação dos danos materiais nos exatos termos fixados na r. sentença. Peço vênia para transcrever a fundamentação do laudo, que adoto como razão de decidir: “IV – DESENVOLVIMENTO DO LAUDO A seguir vamos descrever os danos/constatações encontrados no objeto da lide: 1) Fotos 01, 18, 19 e 22 – Fissura em alvenaria da sala e dormitórios 1 e 2; 2) Fotos 02, 14 e 21 – Fissura na laje da sala, cozinha e dormitório 1; 3) Foto 03 – Mau uso do interruptor da cozinha; 4) Fotos 04, 11, 12, 15, 20 e 23 – Pisos quebrado e com som cavo (oco) na sala, banheiro, cozinha, área de serviço e dormitórios 1 e 2; 5) Fotos 05, 06, 07, 08, 09, 10, 13 e 16 – Azulejos com som cavo (oco) no banheiro, cozinha e área de serviço e 6) Foto 17 – Infiltração da fachada externa atingindo laje e alvenarias do dormitório 2. IV.1 - CLASSIFICAÇÃO DOS DANOS ENCONTRADOS Os danos encontrados são irregularidades, anormalidades e exceções à regra que ocasionam a perda de desempenho da edificação ou suas partes, oriundas da fase de projeto, execução ou final de vida útil, além de fatores externos. A seguir teremos uma tabela com todos os nossos danos, reportando a constatação de cada um deles: A seguir teremos uma tabela com a descrição de cada dano e sua respectiva correção: V – ORÇAMENTO PARA CORREÇÕES DOS DANOS] Frente às anomalias descritas anteriormente, apresentamos agora o respectivo orçamento, lembrando que os custos foram baseados na tabela Sinapi. O orçamento a seguir se refere exclusivamente aos custos de reparação dos danos de vícios de construção oriundos de falhas executivas, sendo que os vícios devido ao mau uso, falta de conservação ou manutenção não serão abordados aqui pois são de responsabilidade da autora. Os preços a seguir já compreendem o valor da mão de obra e material: Outrossim, no que concerne pedido para condenação da ré ao pagamento de danos morais, a parte não especificou nenhum fato em concreto para a caracterização do dano moral. Os argumentos utilizados foram genéricos tais como "a frustração da legítima expectativa decorrente de promessa realizada por programa social de moradia digna.” Quando isso acontece, vale dizer, quando o pedido de dano moral pode ser deduzido para qualquer situação indistintamente, sem a demonstração de particularidades concretas do caso específico, ele é considerado in re ipsa. Conforme já mencionado na r. sentença, o Superior Tribunal de Justiça tem entendido que o dano moral para as hipóteses de vícios na construção deve ser comprovado, extraordinário, devem suplantar o mero descumprimento contratual. Vejamos: AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. VÍCIOS CONSTRUTIVOS. RESPONSABILIDADE CIVIL. CONSTRUTORA. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. INCIDÊNCIA. DANOS MORAIS. CARACTERIZAÇÃO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Consoante a jurisprudência desta Corte, "o dano moral, na ocorrência de vícios de construção, não se presume, configurando-se apenas quando houver circunstâncias excepcionais que, devidamente comprovadas, importem em significativa e anormal violação de direito da personalidade dos proprietários do imóvel" (AgInt no AREsp 1.288.145/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, DJe de 16/11/2018). 2. Na hipótese, a alteração das premissas fáticas adotadas pelo Tribunal a quo, no tocante à presença dos elementos caracterizadores da responsabilidade civil e do dever de indenizar, diante da existência de defeitos no imóvel decorrentes de problemas na construção, assim como acerca da caracterização do dano moral, demandaria, necessariamente, o reexame de matéria fática e probatória dos autos. 3. Agravo interno desprovido. AgInt nos EDcl no AREsp 1693983 / SC AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. DEFEITOS NO IMÓVEL. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS. MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA CONHECER DO AGRAVO E DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. 1. Agravo interno contra decisão da Presidência que conheceu do agravo para não conhecer do recurso especial, em razão da incidência da Súmula 7 do STJ. Reconsideração. 2. O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que o mero descumprimento contratual não acarreta, por si só, danos morais. Precedentes. 3. No caso, não foram apontadas particularidades concretas, que suplantaram o mero descumprimento contratual, para se concluir pela caracterização do dano moral. 4. Agravo interno provido para conhecer do agravo e dar provimento ao recurso especial, a fim de excluir da condenação a indenização por danos morais. AgInt no AREsp 1505492 / GO Some-se a isso o fato de que embora a Caixa deva fiscalizar o andamento da obra a sua culpa é leve dada a dificuldade no controle da fiscalização de todas as etapas do processo construtivo. Evidentemente o grande responsável pelos vícios é a construtora a quem cabia comprar os materiais adequados e empregar todos os esforços para a adequada concretização da obra. É pacífico o caráter compensatório da indenização pelo dano moral; embora não haja consenso acerca da função punitiva, entendo que a caracterização do dano moral também auxilia no desestímulo à prática de novas condutas lesiva. A condenação da CEF na hipótese concreta não teria qualquer função de desestímulo à prática de novas condutas dada a extrema dificuldade, como já exposto, de se fiscalizar todas as etapas da obra. Por tais razões, na esteira da jurisprudência do STJ, não se presume o dano moral, configurando-se apenas quando houver circunstâncias excepcionais que, devidamente comprovadas, importem em significativa e anormal violação de direito da personalidade dos proprietários do imóvel, o que não ocorreu. Por fim, mantenho os termos da r. sentença no tocante à condenação da CEF ao pagamento dos custos dos honorários periciais, ante o princípio da sucumbência (mais significativa para a ré) e o fato de a parte autora ser beneficiária da assistência judiciária gratuita. Também não há que se falar na substituição da obrigação de pagar em obrigação de fazer, tendo em vista que o juiz está adstrito ao pedido formulado na inicial. Ante o exposto nego provimento aos recursos de ambas as partes. Sem honorários, nos termos do art. 55 da Lei 9099/95. É o voto. E M E N T A VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO. CEF. PERÍCIA JUDICIAL CONSTATOU A PRESENÇA DE DANOS MATERIAIS. CEF ALEGA ILEGITIMIDADE PASSIVA, E IMPUGNA CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DO DANO MATERIAL APURADO PELO PERITO E DO RESSARCIMENTO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS. PARTE AUTORA POSTULA A CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE DANO MORAL. RECURSOS DE AMBAS AS PARTES AOS QUAIS SE NEGA PROVIMENTO. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma Recursal do Juizado Especial Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento a ambos os recursos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. FLAVIA PELLEGRINO SOARES MILLANI Juíza Federal

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Processo nº 5004083-33.2021.4.03.6332

ID: 262242855

Tribunal: TRF3 Órgão: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP Classe: RECURSO INOMINADO CíVEL Nº Processo: 5004083-33.2021.4.03.6332

Data de Disponibilização: 29/04/2025

Polo Ativo:

ALISON SANTOS VIANA

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

FABIO MOLEIRO FRANCI

OAB/SP XXXXXX Desbloquear

PODER JUDICIÁRIO Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo 4ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5004083-33.2021.4.0… PODER JUDICIÁRIO Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo 4ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5004083-33.2021.4.03.6332 RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP RECORRENTE: ALISON SANTOS VIANA Advogados do(a) RECORRENTE: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A RECORRIDO: ALISON SANTOS VIANA, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogados do(a) RECORRIDO: ISRAEL DE SOUZA FERIANE - ES20162-A, PAULO ROBERTO VIGNA - SP173477-A Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5004083-33.2021.4.03.6332 RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP RECORRENTE: ALISON SANTOS VIANA Advogados do(a) RECORRENTE: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A RECORRIDO: ALISON SANTOS VIANA, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogados do(a) RECORRIDO: ISRAEL DE SOUZA FERIANE - ES20162-A, PAULO ROBERTO VIGNA - SP173477-A Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recursos interpostos por ambas as partes em face da r. sentença que julgou parcialmente os pedidos para condenar a Caixa Econômica Federal a: a) pagar à parte autora indenização pelos danos materiais comprovados nos autos, conforme orçamento fixado no laudo pericial, no total de R$ 10.109,15, que deverá ser devidamente atualizado desde a data da juntada do laudo pericial e acrescido de juros de mora desde a data da citação, segundo os critérios e índices constantes do Manual de Cálculos da Justiça Federal atualmente em vigor; b) ante o princípio da sucumbência (mais significativa para a ré), CONDENOU a CEF, ainda, a ressarcir o sistema da assistência judiciária gratuita da Justiça Federal (AJG) pela despesa com os honorários periciais, no valor de R$ 600,00 que deverá ser devidamente atualizado desde a data da requisição via Sistema AJG e recolhido na forma própria. A parte autora recorreu. Requer “o reconhecimento da existência de dano moral e que seja fixado ao patamar de R$10.000,00.” A CEF, por sua vez, postula “a reforma a sentença de piso no que concerne a não condenação em danos morais, materiais e honorários periciais”. Subsidiariamente, requer a conversão da obrigação de pagar em obrigação de fazer. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5004083-33.2021.4.03.6332 RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP RECORRENTE: ALISON SANTOS VIANA Advogados do(a) RECORRENTE: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A RECORRIDO: ALISON SANTOS VIANA, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogados do(a) RECORRIDO: ISRAEL DE SOUZA FERIANE - ES20162-A, PAULO ROBERTO VIGNA - SP173477-A Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Preliminarmente, quanto à alegação de ilegitimidade passiva, conforme já constou da r. sentença, a controvérsia trazida aos autos é semelhante a várias ações em tramitação nas Turmas Recursais do JEF/SP. A título de exemplo 0004718-66.2020.4.03.6322 (2ª TR/SP); 0005244-33.2020.4.03.6322 (15ª TR/SP); 0005467-83.2020.4.03.6322 (13º TR/SP). Peço vênia para transcrever minuciosa fundamentação, que adoto como razão de decidir: “Segundo a mais recente interpretação do Superior Tribunal de Justiça sobre a questão da legitimidade passiva para a causa da Caixa Econômica Federal para responder pela reparação de vícios de construção de imóvel objeto de contrato de compra e venda e outros ajustes, por ela financiado, a partir do julgamento do RECURSO ESPECIAL Nº 1.163.228 – AM, RELATORA A EXCELENTÍSSIMA MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI, a Caixa Econômica Federal é a responsável pela reparação dos danos causados se atuar como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda, quando tiver escolhido a construtora ou tiver qualquer responsabilidade concreta relativa à elaboração e execução do projeto construtivo. Nessa mesma linha, segundo o voto proferido pela EXCELENTÍSSIMA MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI, no RECURSO ESPECIAL Nº 897.045 – RS, “(...) diversamente do que ocorre quando atua como agente financeiro em sentido estrito, considero, em princípio, ter a CEF legitimidade para responder por vícios de construção nos casos em que promoveu o empreendimento, teve responsabilidade na elaboração do projeto com suas especificações, escolheu a construtora e/ou negociou os imóveis, ou seja, quando realiza atividade distinta daquela própria de agente financeiro estrito senso (cf. voto-vista proferido no Recurso Especial nº 738.071- SC, julgado em 9.8.2011, Quarta Turma, relator Min. Luis Felipe Salomão)”. Ainda no mesmo sentido, também do STJ, se a CEF participou do contrato apenas na qualidade de agente financeiro, tomando o imóvel como garantia fiduciária do valor mutuado, suas responsabilidades contratuais dizem respeito apenas à atividade financeira, sem nenhuma vinculação com outras responsabilidades referentes à concepção do empreendimento ou à negociação do imóvel, não tem ela legitimidade passiva para a causa (AgInt no AREsp n. 1.708.217/PR, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 16/5/2022, DJe de 17/6/2022). No caso concreto, a Caixa Econômica Federal, através do FAR – Fundo de Arrendamento Residencial, negociou diretamente o imóvel com a parte autora, assinando o contrato na qualidade de “vendedor/cedente/doador”. O contrato foi firmado exclusivamente entre a CEF e a parte autora, sem nenhuma intervenção da construtora. O contrato não contém nenhuma cláusula atribuindo à construtora a responsabilidade pela reparação de vícios de construção; aliás, nem sequer poderia conter cláusula impondo obrigações a quem não figura no contrato, porque a construtora não o firmou, sem prejuízo de eventual demanda judicial de regresso da CEF em face da construtora que crie essa obrigação, ou de demanda do mutuário em face da construtora, na Justiça Estadual. Portanto, a CEF não atuou apenas como agente financeiro, e sim como agente executora de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda, ao conduzir o empreendimento e negociar diretamente o imóvel em contrato de compra e venda entre ela e a parte autora, sem a intervenção da construtora. Presente essa realidade, detém a CEF, exclusivamente, na Justiça Federal, legitimidade passiva para a causa em que se pede reparação de danos decorrentes de vícios de construção, na linha da interpretação adotada pelo STJ, segundo a qual, entre outros atos concretos que geram tal responsabilidade, destaca-se a negociação direta dos imóveis pela CEF (Recurso Especial nº 738.071- SC, julgado em 9.8.2011, Quarta Turma, relator Min. Luis Felipe Salomão).” No mérito, a r. sentença analisou minuciosamente os pedidos formulados, sendo irretocável, no seguinte sentido: “Da impugnação da CEF ao laudo Como se vê da impugnação apresentada pela CEF ao laudo pericial, boa parte das razões veicula mera divergência quanto às conclusões do perito judicial, o que se resolve no campo do mérito da causa, que será analisado abaixo. Mesmo no que de específico conteria a impugnação, também aqui se reproduzem alegações genéricas veiculadas de forma idêntica em outros processos, circunstância que por si só já desqualifica as alegações, vez que despregadas do laudo pericial juntado aos autos. Nada obstante, cabe registrar que o trabalho pericial se limitou ao preciso escopo fixado pelo juízo no despacho de designação, qual seja, a verificação da alegada existência de danos decorrentes de vícios construtivos no imóvel descrito na petição inicial. Para tanto – como se verá com mais vagar abaixo – o perito judicial identificou e diferenciou de forma clara os danos decorrentes de “vícios de construção” (falha na execução da obra) e de mau uso/falta de conservação, apresentando o orçamento para reparos apenas dos danos decorrentes de vícios de construção, com base em critérios objetivos de avaliação. Por estas razões, REJEITO a impugnação da CEF. 2. No mérito Superada a matéria preliminar, passo à análise do mérito da causa. E, ao fazê-lo, constato a procedência parcial do pedido. 2.1. Dos alegados danos materiais O art. 186 do Código Civil preceitua que “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. No caso de que se cuida (em que a parte autora alega a existência de danos decorrentes de vícios de construção em seu imóvel do PMCMV), o exame pericial realizado na unidade habitacional da parte autora detectou defeitos oriundos de vícios de construção (isto é, não decorrentes de mau uso ou falta de conservação do imóvel) e, à luz de critérios objetivos de avaliação, estimou o quanto seria necessário despender para os reparos necessários. Tratando-se de vícios de construção, a responsabilidade pelos reparos é indiscutivelmente da CEF, ora ré, banco público que - como já assinalado na decisão de saneamento do processo - atua no ambiente do PMCMV como verdadeira executora/gestora do programa governamental de habitação (fiscalizando prazos e qualidade das obras e interferindo diretamente na execução do projeto junto à incorporadora/construtora), e não como mero agente financeiro. Tal circunstância, note-se, impõe à CEF o dever de indenizar mesmo os danos decorrentes de vícios ocultos ocasionados pela má execução da obra, sem prejuízo de seu eventual direito de regresso diante do responsável técnico e da construtora. Registre-se que o perito identificou e diferenciou de forma clara os danos decorrentes de “vícios de construção” (falha na execução da obra, de responsabilidade da ré) e de mau uso/falta de conservação (de responsabilidade da parte autora). Anote-se, ainda, que o perito judicial teve o cuidado de orçar detalhadamente os valores de mão de obra e material apenas para conserto dos danos decorrentes de vícios de construção, utilizando-se da Tabela SINAPI (Sistema Nacional de Preços e Índices para a Construção Civil - parâmetro de preços da construção civil observado nas contratações públicas), excluindo os danos derivados de mau uso ou falta de conservação/manutenção (que são, claramente, de responsabilidade da parte autora). O laudo, assim, atende aos requisitos legais dos arts. 473 do CPC e 12 da Lei nº 10.259/2001, apresentando fundamentação clara, simples e logicamente coerente, com exposição dos detalhes técnicos que levaram às suas conclusões. Posta a questão nestes termos, resta plenamente caracterizada a responsabilidade civil da ré no caso concreto, consubstanciando seu dever de indenizar, uma vez que as normas técnicas necessárias para a construção do imóvel deixaram de ser observadas, ocasionando os vícios constatados pela prova pericial, que a ré tinha o dever legal de evitar que existissem. Ressalte-se, porém, que tendo a parte autora optado por pedir em juízo apenas a “indenização” pelos danos detectados (e não seu reparo diretamente pela CEF), tais danos não poderão ser novamente discutidos ou reclamados no futuro, ainda que se agravem em razão da não utilização do valor da indenização para o seu efetivo reparo. 2.2. Dos alegados danos morais O pedido de indenização por danos morais não merece acolhimento. O laudo pericial deixa claro que os vícios encontrados são pontuais e de simples conserto, não se revestindo de gravidade que pudesse, por exemplo, colocar em risco a saúde ou a vida dos moradores do imóvel. Não há defeito estrutural, risco de desmoronamento ou necessidade de desocupação completa para reparos, de maneira a causar interferência intensa no estado psicológico da parte autora, nem mesmo constrangimento ou vexame. Trata-se de percalço que, embora desgastante para a parte autora, reveste-se de absoluta normalidade, sendo mesmo inerente à vida nos grandes centros urbanos e, por isso mesmo, incapaz de causar dano moral. Como reiteradamente afirmado pela jurisprudência, “só se deve reputar como dano moral a dor, o vexame, o sofrimento ou mesmo a humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, chegando a causar-lhe aflição, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Precedentes” (STJ, AgRg no REsp 1269246/RS, DJe 27/05/2014). Lembre-se, ainda, que as ações patrocinadas pelos advogados que representam a parte autora e outras centenas de outros proprietários de imóveis do PMCMV (em milhares de ações idênticas em Guarulhos e em outras localidades do país) trazem petições iniciais absolutamente genéricas e padronizadas, sequer se dando ao trabalho de detalhar e explicar, morador a morador, quais poderiam ser as circunstâncias pessoais excepcionais que, de fato, caracterizariam um dano moral juridicamente apreciável. Inexiste, pois, direito a indenização por danos morais.” No mérito, à vista do teor do laudo pericial elaborado nestes autos (id 313093084), entendo devida a reparação dos danos materiais nos exatos termos fixados na r. sentença. Peço vênia para transcrever a fundamentação do laudo, que adoto como razão de decidir: “IV – DESENVOLVIMENTO DO LAUDO A seguir vamos descrever os danos/constatações encontrados no objeto da lide: 1) Fotos 01, 18, 19 e 22 – Fissura em alvenaria da sala e dormitórios 1 e 2; 2) Fotos 02, 14 e 21 – Fissura na laje da sala, cozinha e dormitório 1; 3) Foto 03 – Mau uso do interruptor da cozinha; 4) Fotos 04, 11, 12, 15, 20 e 23 – Pisos quebrado e com som cavo (oco) na sala, banheiro, cozinha, área de serviço e dormitórios 1 e 2; 5) Fotos 05, 06, 07, 08, 09, 10, 13 e 16 – Azulejos com som cavo (oco) no banheiro, cozinha e área de serviço e 6) Foto 17 – Infiltração da fachada externa atingindo laje e alvenarias do dormitório 2. IV.1 - CLASSIFICAÇÃO DOS DANOS ENCONTRADOS Os danos encontrados são irregularidades, anormalidades e exceções à regra que ocasionam a perda de desempenho da edificação ou suas partes, oriundas da fase de projeto, execução ou final de vida útil, além de fatores externos. A seguir teremos uma tabela com todos os nossos danos, reportando a constatação de cada um deles: A seguir teremos uma tabela com a descrição de cada dano e sua respectiva correção: V – ORÇAMENTO PARA CORREÇÕES DOS DANOS] Frente às anomalias descritas anteriormente, apresentamos agora o respectivo orçamento, lembrando que os custos foram baseados na tabela Sinapi. O orçamento a seguir se refere exclusivamente aos custos de reparação dos danos de vícios de construção oriundos de falhas executivas, sendo que os vícios devido ao mau uso, falta de conservação ou manutenção não serão abordados aqui pois são de responsabilidade da autora. Os preços a seguir já compreendem o valor da mão de obra e material: Outrossim, no que concerne pedido para condenação da ré ao pagamento de danos morais, a parte não especificou nenhum fato em concreto para a caracterização do dano moral. Os argumentos utilizados foram genéricos tais como "a frustração da legítima expectativa decorrente de promessa realizada por programa social de moradia digna.” Quando isso acontece, vale dizer, quando o pedido de dano moral pode ser deduzido para qualquer situação indistintamente, sem a demonstração de particularidades concretas do caso específico, ele é considerado in re ipsa. Conforme já mencionado na r. sentença, o Superior Tribunal de Justiça tem entendido que o dano moral para as hipóteses de vícios na construção deve ser comprovado, extraordinário, devem suplantar o mero descumprimento contratual. Vejamos: AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. VÍCIOS CONSTRUTIVOS. RESPONSABILIDADE CIVIL. CONSTRUTORA. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. INCIDÊNCIA. DANOS MORAIS. CARACTERIZAÇÃO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Consoante a jurisprudência desta Corte, "o dano moral, na ocorrência de vícios de construção, não se presume, configurando-se apenas quando houver circunstâncias excepcionais que, devidamente comprovadas, importem em significativa e anormal violação de direito da personalidade dos proprietários do imóvel" (AgInt no AREsp 1.288.145/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, DJe de 16/11/2018). 2. Na hipótese, a alteração das premissas fáticas adotadas pelo Tribunal a quo, no tocante à presença dos elementos caracterizadores da responsabilidade civil e do dever de indenizar, diante da existência de defeitos no imóvel decorrentes de problemas na construção, assim como acerca da caracterização do dano moral, demandaria, necessariamente, o reexame de matéria fática e probatória dos autos. 3. Agravo interno desprovido. AgInt nos EDcl no AREsp 1693983 / SC AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. DEFEITOS NO IMÓVEL. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS. MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA CONHECER DO AGRAVO E DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. 1. Agravo interno contra decisão da Presidência que conheceu do agravo para não conhecer do recurso especial, em razão da incidência da Súmula 7 do STJ. Reconsideração. 2. O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que o mero descumprimento contratual não acarreta, por si só, danos morais. Precedentes. 3. No caso, não foram apontadas particularidades concretas, que suplantaram o mero descumprimento contratual, para se concluir pela caracterização do dano moral. 4. Agravo interno provido para conhecer do agravo e dar provimento ao recurso especial, a fim de excluir da condenação a indenização por danos morais. AgInt no AREsp 1505492 / GO Some-se a isso o fato de que embora a Caixa deva fiscalizar o andamento da obra a sua culpa é leve dada a dificuldade no controle da fiscalização de todas as etapas do processo construtivo. Evidentemente o grande responsável pelos vícios é a construtora a quem cabia comprar os materiais adequados e empregar todos os esforços para a adequada concretização da obra. É pacífico o caráter compensatório da indenização pelo dano moral; embora não haja consenso acerca da função punitiva, entendo que a caracterização do dano moral também auxilia no desestímulo à prática de novas condutas lesiva. A condenação da CEF na hipótese concreta não teria qualquer função de desestímulo à prática de novas condutas dada a extrema dificuldade, como já exposto, de se fiscalizar todas as etapas da obra. Por tais razões, na esteira da jurisprudência do STJ, não se presume o dano moral, configurando-se apenas quando houver circunstâncias excepcionais que, devidamente comprovadas, importem em significativa e anormal violação de direito da personalidade dos proprietários do imóvel, o que não ocorreu. Por fim, mantenho os termos da r. sentença no tocante à condenação da CEF ao pagamento dos custos dos honorários periciais, ante o princípio da sucumbência (mais significativa para a ré) e o fato de a parte autora ser beneficiária da assistência judiciária gratuita. Também não há que se falar na substituição da obrigação de pagar em obrigação de fazer, tendo em vista que o juiz está adstrito ao pedido formulado na inicial. Ante o exposto nego provimento aos recursos de ambas as partes. Sem honorários, nos termos do art. 55 da Lei 9099/95. É o voto. E M E N T A VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO. CEF. PERÍCIA JUDICIAL CONSTATOU A PRESENÇA DE DANOS MATERIAIS. CEF ALEGA ILEGITIMIDADE PASSIVA, E IMPUGNA CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DO DANO MATERIAL APURADO PELO PERITO E DO RESSARCIMENTO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS. PARTE AUTORA POSTULA A CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE DANO MORAL. RECURSOS DE AMBAS AS PARTES AOS QUAIS SE NEGA PROVIMENTO. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma Recursal do Juizado Especial Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento a ambos os recursos, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. FLAVIA PELLEGRINO SOARES MILLANI Juíza Federal

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Processo nº 0005467-50.2018.8.05.0248

ID: 322855743

Tribunal: TJBA Órgão: 2ª VARA DOS FEITOS CRIMINAIS E INFÂNCIA E JUVENTUDE DA COMARCA DE SERRINHA Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO Nº Processo: 0005467-50.2018.8.05.0248

Data de Disponibilização: 11/07/2025

Polo Ativo:

Polo Passivo:

RAFAEL LUIZ DE JESUS

Sentença

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA COMARCA DE SERRINHA 2ª Vara dos Feitos Criminais, Infância e Juventude Av. Josias Alves Santiago, Lot. Parque Maravilha, Cidade Nova - Tel(s): (75) 3273-2900 / … TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA COMARCA DE SERRINHA 2ª Vara dos Feitos Criminais, Infância e Juventude Av. Josias Alves Santiago, Lot. Parque Maravilha, Cidade Nova - Tel(s): (75) 3273-2900 / 2915 / Serrinha-BA - E-mail: serrinha2vcrime@tjba.jus.br SENTENÇA Processo n. 0005467-50.2018.8.05.0248 Assunto: [Roubo] Parte Autora: Ministério Público do Estado da Bahia Parte ré: RAFAEL LUIZ DE JESUS Vistos. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA, por intermédio da douta Promotora de Justiça, no exercício de suas atribuições legais, lastreado pelo incluso Inquérito Policial nº 68/2018, propôs Ação Penal Pública, oferecendo DENÚNCIA em desfavor de RAFAEL LUIZ DE JESUS, já qualificado nos autos, por concluir que a conduta do denunciado se enquadra na figura descrita no art. 157, caput, do Código Penal, logo incurso nas sanções ali anunciadas. Com os autos conclusos, este Juízo recebeu a denúncia em 29/08/2018 (ID. 132155601). Na decisão, determinou a citação do réu para responder à acusação no prazo legal e, ainda, que juntassem aos autos os antecedentes criminais. A Secretaria juntou certidão de antecedentes criminais oriunda do sistema de processos judiciais eletrônicos (ID. 132155600), bem como do CDEP (ID. 275580742). Devidamente citado (ID. 132155603), apresentou resposta à acusação (ID. 132155607), assistido pela Defensoria Pública, na qual não foram arguidas preliminares nem suscitados incidentes prejudiciais à instrução do feito. Com os autos conclusos para decisão de saneamento, restou ausente a ocorrência das hipóteses previstas nos incisos I a IV do art. 397 do CPP. Assim, e observado o disposto no art. 400 do Código de Processo Penal, este Juízo designou a audiência de instrução para o dia 04/07/2022 e, tendo em vista o adiantado da hora, restou prejudicada a realização daquela assentada, conforme termo de audiência (ID. 211836948). Designada audiência para o dia 27/11/2023, oportunidade em que foram ouvidas as testemunhas da acusação, os policiais militares, Ivanildo de Jesus Teixeira e Elmer Rodrigues de Oliveira, restando prejudicada a continuação, tendo em vista a ausência da vítima, conforme termo de audiência (ID. 422114159). Audiência do dia 11/07/2024, restou prejudicada sua realização, tendo em vista que a diligência para intimar a vítima se tornou infrutífera pelo fato desta estar viajando (ID. 452747027). Em audiência do dia 28/04/2025, ausente a vítima Everaldo Souza Anjos, pois a diligência policial para realizar sua condução coercitiva logrou-se infrutífera, conforme certidão de ID. 498222603, tendo o Ministério Público se manifestado pela desistência da oitiva da vítima ausente e requereu prazo para apresentar suas alegações finais por escrito, que foi deferido por este Juízo, conforme termo de audiência de ID. 498230583. Encerrada a instrução, não havendo pedido de diligências complementares, foi dada a palavra às partes para apresentarem suas alegações finais. O Ministério Público, em alegações finais de ID. 501054922, requereu a condenação do réu nos termos da denúncia. Enquanto a defesa, realizada pela Defensoria Pública, em alegações finais de ID. 507260492, requereu a absolvição em respeito ao princípio da congruência ou insuficiência de provas e, em caso de condenação, a desclassificação para o crime de furto. É o breve relatório. Fundamento e Decido. Devidamente preenchidos os pressupostos processuais e condições da ação e, tendo em vista que não foram apresentadas preliminares a serem enfrentadas, passo à análise do mérito. Compulsando os autos, evidencia-se que deverá prosperar a pretensão punitiva deduzida na peça vestibular. Relata o órgão ministerial que, no dia 11 de março de 2018, por volta das 01h50min, na Rua Reginaldo Ribeiro, Serrinha/BA, o denunciado, mediante violência, subtraiu o celular de EVERALDO SOUZA ANJOS, que chegava em sua residência, quando de surpresa, recebeu um soco no rosto do denunciado, que pegou seu celular e saiu correndo. Em seguida, o ofendido avistou um rapaz de motocicleta e pediu ajuda dizendo que foi roubado. Então saíram em perseguição ao Acusado. A polícia militar foi acionada pela vítima, que descreveu as características do autor, então foram promovidas diligências, e o acusado foi localizado e informou onde jogou o celular subtraído, sendo localizado no local indicado, um terreno baldio. Com efeito, o conjunto probatório carreado ao processo demonstrou que, efetivamente, após atenta análise destes autos, vislumbra-se claramente a procedência da ação, posto que, inicialmente, pelo coeso e uníssono teor da prova oral colhida na fase instrutória, a autoria delitiva do crime restou satisfatoriamente demonstrada. Vejamos. A testemunha de acusação, SD/PM IVONILDO DE JESUS TEIXEIRA, em seu depoimento judicial, disse que foram acionados via 190 com a informação de que um indivíduo havia agredido uma vítima com um soco e subtraído seu aparelho celular no momento em que ela chegava à sua residência. Como a ocorrência se deu nas proximidades da casa de sua mãe, a equipe chegou rapidamente ao local. A vítima relatou que fora abordada por um homem que a agrediu fisicamente com um soco no rosto, subtraiu seu celular e fugiu em seguida. Diante das informações fornecidas, os policiais realizaram buscas na área e conseguiram localizar e interceptar o suspeito, que foi prontamente reconhecido pela vítima. O acusado indicou o local onde havia deixado o celular, o qual foi encontrado pelos policiais. Em seguida, todos os envolvidos foram conduzidos à Delegacia para os devidos procedimentos. A vítima afirmou que, na noite dos fatos, estava comemorando seu aniversário na Praça Morena Bela e, ao retornar para casa sozinho, foi surpreendida pelo acusado, que o agrediu e roubou seu celular. Contudo, o acusado apresentou uma versão diferente, alegando que esteve com a vítima desde o início da noite e que, em razão de uma dívida não quitada, decidiu tomar-lhe o aparelho celular e fugir. Segundo o acusado, a dívida teria origem no pagamento de uma "carreira de cocaína" feita pela vítima na praça. Ele relatou ainda que a vítima o convidou para ir até sua casa, oferecendo R$ 150,00 em troca de relações sexuais e de mais droga que estaria guardada no local. Ambos teriam ido juntos para a residência da vítima, onde iriam consumir cocaína. Entretanto, como o acusado não conseguiu manter relações sexuais, a vítima se recusou a pagar o valor combinado, o que teria dado início a uma briga, culminando na agressão e subtração do celular. O policial que registrou os fatos informou que, apesar de não haver sangramento visível na vítima, seu rosto apresentava inchaço próximo ao olho. A vítima alegava ser professor da UNEB e aparentava estar um pouco embriagada no momento do atendimento. Posteriormente, teve acesso às imagens de câmeras de segurança da vizinhança, que mostravam os dois chegando juntos à residência da vítima. As imagens também confirmaram que a briga ocorreu no momento em que o acusado estava deixando o local, após o desentendimento, momento em que agrediu a vítima, pegou o celular e saiu correndo. Tais imagens indicaram maior veracidade na versão apresentada pelo acusado. Informou que conhecia o acusado por ser usuário de drogas e por frequentemente pedir dinheiro nas ruas, mas que, até aquele momento, não tinha conhecimento de envolvimento anterior com crimes como roubo. A testemunha de acusação, SD/PM ELMER RODRIGUES DE OLIVEIRA, afirmou em Juízo que o acusado era conhecido por ser usuário de drogas e, segundo relato do próprio acusado, teria sido convidado pela vítima para praticar atos libidinosos em um local mais afastado. Nesse local, o acusado teria subtraído o aparelho celular da vítima. Declarando que não se recordava se a vítima apresentava marcas visíveis de lesões físicas. Segundo ele, a vítima não confirmou a versão apresentada pelo acusado, o que pode ter ocorrido em razão de constrangimento. Afirmou não se lembrar com precisão dos relatos prestados à época na delegacia, embora tenha se recordado da versão apresentada pelo acusado no momento da ocorrência. A versão da vítima, por sua vez, também não foi lembrada com exatidão. O celular foi localizado após o colega de guarnição perseguir o acusado, que, após algum tempo de fuga, se entregou por exaustão. Em seguida, os policiais retornaram ao local onde estavam anteriormente, e o acusado indicou que o aparelho estava escondido dentro de uma área de mato, onde de fato foi encontrado. Ainda, afirmou que nunca havia visto o acusado antes da ocorrência e que não possui informações sobre sua vida pregressa. Também não se recorda de que forma a guarnição foi acionada naquele momento. A identificação do acusado se deu pelo fato de ele ter empreendido fuga, o que motivou a perseguição. Após sua captura, a vítima reconheceu o indivíduo como sendo o autor da agressão e subtração do celular. Mister ressaltar que o valor do depoimento testemunhal de servidores policiais, especialmente quando prestado em juízo, sob a garantia do contraditório, reveste-se de inquestionável eficácia probatória, não se podendo desqualificá-lo pelo só fato de emanar de agentes estatais incumbidos, por dever de ofício, da repressão penal. Neste sentido, é pacífico o entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que "os depoimentos prestados por policiais têm valor probante, na medida em que seus atos são revestidos de fé pública, sobretudo quando se mostram coerentes e compatíveis com os demais elementos de prova dos autos, e ausentes quaisquer indícios de motivos pessoais para a incriminação injustificada do investigado" (AgRg no AREsp 1997048/ES, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 15/02/2022, DJe 21/02/2022). O réu não compareceu à audiência, razão pela qual fora decretada a sua revelia (ID. 422114159) e, quanto à vítima, o Ministério Público desistiu da sua oitiva (ID. 498230583). Nesse sentido, é forçoso trazer a esta decisão o interrogatório extrajudicial do denunciado, que confessa a prática delituosa de forma detalhada: "QUE no dia de hoje foi preso injustamente; QUE estava bebendo em um bar na praça morena bela; QUE estava sozinho; QUE conheceu um homem lá na praça; QUE o homem pagou duas cervejas para o interrogado; QUE percebeu que o homem tinha jeito de "bicha"; QUE o homem começou a apresentou outros homens como sendo primo dele; QUE não demoraram muito praça; QUE o homem mandou o interrogado esperar; QUE sentiu que o homem já estava marcando para sair com outros homens; QUE percebeu que o homem queria lhe enganar e sair com outro; QUE enquadrou o homem e o mesmo então decidiu sair com o interrogado; QUE saíram da praça morena bela juntos e durante ao percurso o homem começou a pegar no pênis do interrogado; QUE homem disse que daria de R$100,00(cem reais ) para transarem; QUE aceitou pois queria o dinheiro; QUE andaram mais um pouco e pararam em um terreno baldio e lá o homem começou a fazer sexo oral no interrogado o chamado "boquete"; QUE o homem desceu as calças dele e queria o sexo anal porem outros homem se aproximaram pois já sabiam que o homem era "gay"; QUE não conseguiram manter relação sexual; QUE o interrogado cobrou o dinheiro e o homem disse que estava esperando outros amigos chegar; QUE o homem pegou o celular para fazer uma ligação e um outro homem apareceu e disse para ele "você está me traindo" e deu um murro nele; QUE aproveitou que o homem tinha sido agredido e então pegou o celular e saiu correndo e o mesmo homem que agrediu a vítima correu atrás do interrogado, que continuou correndo porem foi logo capturado pela PM e com o interrogado não foi encontrado nada; QUE mostrou o local onde se livrou do celular e então foram até o local e lá encontraram o aparelho da vítima; QUE logo depois foi apresentado na delegacia juntamente com o homem; QUE já tinha visto o homem e não saber dizer o nome dele: QUE já foi preso por roubo; QUE é usuário de drogas do tipo maconha (...)" (ID. 132155592, fl. 11). Ademais, em sede policial, a vítima disse que: "(...) no dia de hoje por volta das 01:50 estava transitando a pé e sozinho pela rua Reginaldo Ribeiro; QUE estava indo para sua residência; QUE ao parar na frente do porta de sua residência sentiu de imediato um murro no rosto do lado esquerdo e também sentiu o se aparelho celular sendo subtraído do seu bolso do lado direito da parte de trás da calça jeans; QUE um rapaz estava passando de moto pelo local e então o declarante pediu socorro e disse ter sido roubado; QUE o rapaz deu carona ao declarante para ir atrás do ladrão; QUE o rapaz parou a moto c declarante desceu e o rapaz foi para o batalhão da PM pedir ajuda; QUE o declarante foi no sentido praça morena bela quando avistou uma viatura da PM; QUE o declarante narrou o fato para os policiais e os mesmos saíram na busca do homem que tinha praticado o roubo; QUE a viatura seguiu na direção dada pelo declarante e o declarante seguiu a pé; QUE logo em seguida a viatura estava vindo na direção do declarante e apresentou o homem de nome RAFAEL e o declarante o reconheceu como sendo o autor do roubo e os policiais também apresentou o aparelho celular que o declarante também o reconheceu como seu; QUE logo depois foi conduzido juntamente com o autor do roubo para a delegacia (...) " (ID. 132155592, fl. 7). Destaca-se que a lei penal veda a fundamentação da decisão do juiz exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas, nos termos do art. 155 do Código de Processo Penal - Contudo, este Juízo utiliza-se dos depoimentos realizados em sede policial apenas para contextualizar e sedimentar as demais provas apresentadas nestes autos. Assim, confirma-se incontestável a autoria do delito, haja vista que ainda que houvesse a negativa de prática do crime em sede judicial, não seria suficiente para impedir a responsabilização penal pela ação praticada, pois não há o que se falar em míngua probatória capaz de implicar absolvição por aplicação do princípio in dubio pro reo. Não obstante à prova oral colhida em fase judicial que sedimentou a correta atribuição da autoria do delito, também corrobora com as demais provas que demonstram a materialidade do crime de roubo, conforme as provas judicializadas nos autos. Inicialmente, o auto de exibição e apreensão (ID. 132155592, fl. 5), que foi apresentado o aparelho da marca Positivo, cor prata, em uma capa de cor preta, que foi apreendido em posse do réu. Ademais, não é possível tratar de desclassificação para furto, tendo em vista que o laudo n. 2018 15 PV 000626-01 que procedeu ao exame de lesões corporais da vítima (ID. 132155598) concluiu que havia "edema e hematoma arroxeado com 5 cm de diâmetro em região, periorbitária esquerda" que foi realizado por meio de ação contundente, demonstrando ter havido, efetivamente, uso de violência para subtrair o bem da vítima. No caso em tela, haja vista que apresentado o laudo pericial em tempo hábil, este possui o condão para conduzir à conclusão da existência da materialidade do crime apresentado. Nesse sentido, compreende a respeito, de forma semelhante, o Superior Tribunal de Justiça: RECURSO ESPECIAL. PENAL. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. DESCLASSIFICAÇÃO DO CRIME DE ROUBO PARA FURTO. EMPREGO DE VIOLÊNCIA. CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE ROUBO. RECURSO PROVIDO. 1. Configura-se crime de roubo quando há o emprego de grave ameaça ou violência contra a vítima. Não se exige, para a caracterização do tipo penal, que a violência cause lesão corporal leve, restando tipificado o crime se houver vias de fato. Precedentes. 2. Recurso provido. (STJ - REsp: 1158851 MG 2009/0194459-0, Relator.: Ministra LAURITA VAZ, Data de Julgamento: 26/10/2010, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 22/11/2010) Ocorre que, no âmbito da culpabilidade, é necessário estabelecer quando será atribuível ao agente a prática do ilícito, a fim de tornar censurável a sua conduta típica e antijurídica. Desta forma, compreende-se que as provas dos autos formam conjunto de elementos que, analisados em sua totalidade, conduzem este Juízo à livre convicção para fundamentar sua decisão, conforme determina o art. 155 do Código de Processo Penal. A pretensão acusatória comporta integral acolhida, uma vez que a prova dos autos demonstra com clareza a materialidade, pela confluência de todas as elementares do delito, que se configurou consumado restando clara a tipicidade da conduta, não havendo dúvida quanto à autoria, sendo correta a classificação dada à conduta, não somente nas declarações colhidas em juízo, mas também no laudo apontado nestes autos. Portanto, restou devidamente comprovada a prática do crime de roubo. Ante o exposto e por tudo mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva estatal exposta na denúncia inicial para CONDENAR o réu RAFAEL LUIZ DE JESUS, já qualificado na exordial acusatória, em razão da prática do crime previsto art. 157, caput, do Código Penal. Passo, doravante, à dosimetria da pena. Considerando as circunstâncias judiciais estampadas no artigo 59 do Código Penal, tem-se que o réu possuía culpabilidade normal à espécie. Vê-se que o acusado é primário, na forma da Súmula 444 do STJ. Sua conduta social e personalidade não foram apuradas. Os motivos são comuns à espécie. As circunstâncias tratam-se de elementos que não compõem o tipo penal, mas que denotam o modo de execução do delito e influenciam na gravidade Normais à espécie. A esse respeito, não há nada a valorar. Nada há para valorar quanto às consequências do crime. A vítima não colaborou para a execução do crime. Sopesadas individualmente cada uma das circunstâncias judiciais do art. 59 do Código Penal, sem que fosse valorada negativamente, fixo-lhe a pena-base em 04 (quatro) anos de reclusão e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa. Na segunda fase da dosimetria, não há circunstâncias agravantes ou atenuantes, razão pela qual mantenho a pena em 04 (quatro) anos de reclusão e ao pagamento de 10 (dez) dias-multa. Na terceira fase da dosimetria, estão ausentes causas de aumento e diminuição. Assim, por compreender suficiente à reprovação e prevenção do crime, fixo a pena DEFINITIVA em 04 (quatro) anos de reclusão e 10 (dez) dias-multa, à base de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época do delito. Tendo em vista a disposição do art. 33 do Código Penal, verifica-se que a pena de reclusão deve ser cumprida em regime aberto, semiaberto ou fechado e, por tratar-se de réu não reincidente condenado à pena privativa de liberdade de reclusão igual a 04 (quatro) anos, o regime adotado deverá ser o aberto. Deixo de substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos eis que o réu não preenche os requisitos insertos no art. 44 do CP. Contudo, há que se falar em suspensão condicional da pena, eis que preenchidos os requisitos do art. 77 do CP - assim, pelo período de 02 (dois) anos, estará obrigado: a) No primeiro ano do prazo, à prestação de serviços à comunidade na forma do § 1º do art. 78 do CP, em entidade pública ou social a ser definida pelo Juízo da Execução Penal, e b) Com fulcro no art. 79 do CP, ao recolhimento domiciliar noturno de 20:00h às 05:00h, inclusive aos finais de semana, exceto se estiver trabalhando nesse período. Repise-se que o descumprimento das condições estabelecidas poderá ensejar na revogação do benefício. Demais diligências acerca do cumprimento da pena Concedo ao réu o direito de recorrer em liberdade. Não fixo valor a título de indenização mínima a que se refere o inciso IV, do art. 387, do Código de Processo Penal, por inexistir pedido do Ministério Público e por não haver provas hábeis a embasá-lo nem discutido durante a instrução. Deixo de condenar o réu ao pagamento das custas processuais, uma vez que demonstrada sua hipossuficiência financeira ao ser assistido pela Defensoria Pública. Somente após o trânsito em julgado, determino a Secretaria a adoção das seguintes providências: Oficie-se à Justiça Eleitoral (art. 71, §2º, do Código Eleitoral - para os fins do artigo 15, inciso III, da CF/88); Oficie-se ao CEDEP, para os fins estatísticos próprios; Apliquem-se os arts. 686 a 688 do CPP, desde que ultrapassado o prazo de 10 (dez) dias, sem cumprimento da pena de multa; Ciência ao Ministério Público e à Defesa. Intime-se o réu e a vítima por edital. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Cumpra-se. Após cumpridas as diligências, arquivem-se os autos com a devida baixa processual. Serrinha/BA, data registrada no sistema. (assinado digitalmente) LETICIA FERNANDES SILVA FREITAS Juíza de Direito

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Processo nº 0020158-31.2021.4.03.6302

ID: 324317335

Tribunal: TRF3 Órgão: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP Classe: RECURSO INOMINADO CíVEL Nº Processo: 0020158-31.2021.4.03.6302

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

INTEGRAçãO DJEN-TRF3

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

FABIO MOLEIRO FRANCI

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ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA

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FERNANDO APARECIDO BALDAN

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PODER JUDICIÁRIO Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo 4ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0020158-31.2021.4.0… PODER JUDICIÁRIO Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo 4ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0020158-31.2021.4.03.6302 RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP RECORRENTE: GISELE FERREIRA MORAIS Advogados do(a) RECORRENTE: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A, FERNANDO APARECIDO BALDAN - SP58417-N RECORRIDO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, GISELE FERREIRA MORAIS Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A, FERNANDO APARECIDO BALDAN - SP58417-N Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE BRAZAO CREAO - PA28386-A, ITALO SCARAMUSSA LUZ - ES9173-A OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo 4ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0020158-31.2021.4.03.6302 RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP RECORRENTE: GISELE FERREIRA MORAIS Advogados do(a) RECORRENTE: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A, FERNANDO APARECIDO BALDAN - SP58417-N RECORRIDO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, GISELE FERREIRA MORAIS Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A, FERNANDO APARECIDO BALDAN - SP58417-N Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE BRAZAO CREAO - PA28386-A, ITALO SCARAMUSSA LUZ - ES9173-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recursos interpostos por ambas as partes em face da r. sentença que julgou parcialmente os pedidos para condenar a Caixa Econômica Federal a indenizar os danos materiais quantificados pelo perito judicial em R$ 4.128,82 e a compensar os danos morais fixados em R$ 3.000,00. A autora recorreu postulando: A. a correta indenização pelo revestimento cerâmico no valor de R$7.187,98 (sete mil, cento e oitenta e sete reais e noventa e oito centavos); B. a indenização pelos prejuízos acessórios (pintura, limpeza e destinação do entulho, aluguel e revestimento argamassado) no valor de R$1.675,85 (um mil, seiscentos e setenta e cinco reais e oitenta e cinco centavos); C. a majoração do dano moral ao patamar de R$10.000,00; D. a consequente condenação da Caixa Econômica Federal ao pagamento do montante referente à integralidade dos pedidos. A CEF aduz litisconsórcio passivo necessário. No mérito, postula seja julgada improcedente a demanda, impugnando o valor imputado na perícia. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo 4ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0020158-31.2021.4.03.6302 RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP RECORRENTE: GISELE FERREIRA MORAIS Advogados do(a) RECORRENTE: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A, FERNANDO APARECIDO BALDAN - SP58417-N RECORRIDO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, GISELE FERREIRA MORAIS Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A, FERNANDO APARECIDO BALDAN - SP58417-N Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE BRAZAO CREAO - PA28386-A, ITALO SCARAMUSSA LUZ - ES9173-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O artigo 46 c/c § 5º do art. 82, ambos da Lei 9099/95, facultam à Turma Recursal dos Juizados especiais a remissão aos fundamentos adotados na sentença. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que a adoção dos fundamentos contidos na sentença pela Turma Recursal não contraria o art. 93, inciso IX, da Constituição Federal (AI 726.283-7-AgR, Rel. Min. Eros Grau, 2ª Turma, DJe nº 227, Publicação 28/11/2008). Preliminarmente, quanto à alegação de ilegitimidade passiva, conforme já constou da r. sentença, a controvérsia trazida aos autos é semelhante a várias ações em tramitação nas Turmas Recursais do JEF/SP. A título de exemplo 0004718-66.2020.4.03.6322 (2ª TR/SP); 0005244-33.2020.4.03.6322 (15ª TR/SP); 0005467-83.2020.4.03.6322 (13º TR/SP). Peço vênia para transcrever minuciosa fundamentação, que adoto como razão de decidir: “Segundo a mais recente interpretação do Superior Tribunal de Justiça sobre a questão da legitimidade passiva para a causa da Caixa Econômica Federal para responder pela reparação de vícios de construção de imóvel objeto de contrato de compra e venda e outros ajustes, por ela financiado, a partir do julgamento do RECURSO ESPECIAL Nº 1.163.228 – AM, RELATORA A EXCELENTÍSSIMA MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI, a Caixa Econômica Federal é a responsável pela reparação dos danos causados se atuar como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda, quando tiver escolhido a construtora ou tiver qualquer responsabilidade concreta relativa à elaboração e execução do projeto construtivo. Nessa mesma linha, segundo o voto proferido pela EXCELENTÍSSIMA MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI, no RECURSO ESPECIAL Nº 897.045 – RS, “(...) diversamente do que ocorre quando atua como agente financeiro em sentido estrito, considero, em princípio, ter a CEF legitimidade para responder por vícios de construção nos casos em que promoveu o empreendimento, teve responsabilidade na elaboração do projeto com suas especificações, escolheu a construtora e/ou negociou os imóveis, ou seja, quando realiza atividade distinta daquela própria de agente financeiro estrito senso (cf. voto-vista proferido no Recurso Especial nº 738.071- SC, julgado em 9.8.2011, Quarta Turma, relator Min. Luis Felipe Salomão)”. Ainda no mesmo sentido, também do STJ, se a CEF participou do contrato apenas na qualidade de agente financeiro, tomando o imóvel como garantia fiduciária do valor mutuado, suas responsabilidades contratuais dizem respeito apenas à atividade financeira, sem nenhuma vinculação com outras responsabilidades referentes à concepção do empreendimento ou à negociação do imóvel, não tem ela legitimidade passiva para a causa (AgInt no AREsp n. 1.708.217/PR, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 16/5/2022, DJe de 17/6/2022). Ausente também o litisconsórcio passivo necessário. Pode a ré, evidentemente, se assim entender, demandar contra a construtora do imóvel, exercendo possível direito de regresso. No caso concreto, a Caixa Econômica Federal, através do FAR – Fundo de Arrendamento Residencial, negociou diretamente o imóvel com a parte autora, assinando o contrato na qualidade de “vendedor/cedente/doador”. O contrato foi firmado exclusivamente entre a CEF e a parte autora, sem nenhuma intervenção da construtora. O contrato não contém nenhuma cláusula atribuindo à construtora a responsabilidade pela reparação de vícios de construção; aliás, nem sequer poderia conter cláusula impondo obrigações a quem não figura no contrato, porque a construtora não o firmou, sem prejuízo de eventual demanda judicial de regresso da CEF em face da construtora que crie essa obrigação, ou de demanda do mutuário em face da construtora, na Justiça Estadual. Portanto, a CEF não atuou apenas como agente financeiro, e sim como agente executora de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda, ao conduzir o empreendimento e negociar diretamente o imóvel em contrato de compra e venda entre ela e a parte autora, sem a intervenção da construtora. Presente essa realidade, detém a CEF, exclusivamente, na Justiça Federal, legitimidade passiva para a causa em que se pede reparação de danos decorrentes de vícios de construção, na linha da interpretação adotada pelo STJ, segundo a qual, entre outros atos concretos que geram tal responsabilidade, destaca-se a negociação direta dos imóveis pela CEF (Recurso Especial nº 738.071- SC, julgado em 9.8.2011, Quarta Turma, relator Min. Luis Felipe Salomão).” A r. sentença analisou os pedidos formulados no seguinte sentido: “Passo a analisar as preliminares: a) legitimidade passiva: no caso concreto, o imóvel que é objeto de discussão foi adquirido pela parte autora em contrato de venda e compra direta com parcelamento e alienação fiduciária no programa minha casa minha vida, com recursos do FAR (fls. 34 e seguintes do ID 159717896). A parte autora atribui à CEF a condição de responsável pela construção do imóvel, tendo em vista que a requerida não financiou a construção do empreendimento/condomínio como mero agente financeiro, mas sim, como agente executora de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda. Pois bem. A análise inicial dos autos revela que, de fato, a construção do empreendimento/ condomínio, no qual o imóvel que é objeto da demanda está inserido, foi financiado pela CEF como agente executora de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda, conforme contrato anexado na maioria dos processos referentes ao condomínio em questão. Ademais, a parte autora não firmou qualquer contrato com a construtora, mas apenas com a CEF (fls. 34 e seguintes do ID 159717896). Desta forma, não há litisconsórcio necessário a demandar a presença da construtora no polo passivo. Logo, a legitimidade passiva é da CEF, conforme já decidiu o STJ no REsp 1.163.228. b) interesse de agir: a alegação da CEF, de que a parte autora não teria interesse de agir em razão da falta de registro de chamada de vistoria e reparos para a unidade habitacional que é objeto da demanda, não prospera, eis que tal documento não constitui medida indispensável para o ajuizamento da ação. Ademais, a CEF apresentou defesa de mérito, de modo a reforçar o interesse de agir da parte autora. c) aplicação do CDC: o simples fato de se tratar de financiamento com recursos do FAR não afasta a aplicação do CDC. Rejeitado, assim, as preliminares levantadas pela CEF. d) Valor da causa: a CEF afirma que a parte autora atribuiu à causa o valor de R$ 15.495,14 “... sem ao menos justificar tal pleito”. (fl. 4 do ID 159719405). A preliminar foi alegada de forma genérica, sem demonstração de qualquer irregularidade na atribuição do valor da causa. Ressalto que o autor atribuiu à causa o valor de R$ 20.471,07, o que corresponde à soma do pedido de indenização por danos morais, no valor de R$ 10.000,00, mais o valor que se pretende a título de indenização por danos materiais, no montante de R$ 10.471,07, conforme consta de orçamento anexado aos autos. Assim, ao atribuir valor à causa, a parte autora observou o disposto no art. 292, V, do CPC. Por conseguinte, rejeito a preliminar, ficando mantido o valor atribuído à causa pela parte autora. Mérito Cumpre assinalar inicialmente que as instituições financeiras estão sujeitas ao CDC, conforme súmula 297 do STJ, in verbis: Súmula 297 - “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Tal fato dá ensejo à responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços, conforme artigo 14 do Estatuto do Consumidor (Lei 8.078/90): “Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.” Ao contrário da responsabilidade subjetiva que se assenta na teoria da culpa, a responsabilidade objetiva tem como fundamento a teoria do risco. Vale dizer: nas relações de consumo, o fornecedor de produtos e serviços responde pelos riscos de sua atividade econômica, independente de culpa. É necessário consignar, entretanto, que a responsabilidade do fornecedor pode ser excluída nas hipóteses previstas no § 3º do artigo 14 da Lei 8.078/90, in verbis: “§ 3º. O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.” Cuida-se, pois, de norma com conteúdo ético e econômico relevante. Ético, porque não se pode compreender um sistema de responsabilidade, onde o fornecedor estaria sempre obrigado a promover indenizações, ainda que o dano não guarde qualquer relação de causa e efeito com o serviço fornecido. Econômico, porque o risco exacerbado da atividade econômica, sem limites, certamente seria repassado para o preço de produtos e serviços, com prejuízo para a própria sociedade que se pretende proteger. Uma das consequências da responsabilidade objetiva é a melhor distribuição do ônus da prova, equiparando as forças entre o consumidor (parte mais vulnerável) e aquele que explora uma atividade lucrativa. Neste compasso, cabe ao consumidor apenas comprovar a ocorrência de um dano (material ou moral) e o seu nexo de causalidade com o serviço fornecido. Superada esta fase, o fornecedor somente afastará a sua responsabilidade civil, caso prove que: a) embora tenha prestado o serviço, o defeito inexiste; b) a culpa é exclusiva do consumidor; ou c) a culpa é exclusiva de terceiro. Cumpre verificar, portanto, se a parte autora comprovou ter experimentado algum dano e, em caso positivo, se há nexo de causalidade entre o dano e o serviço bancário prestado. No caso concreto, a parte autora possui contrato de financiamento habitacional firmado com a CEF, pelo Programa Minha Casa Minha Vida (fls. 34 e seguintes do ID 159717896). Por seu turno, o empreendimento no qual está inserido o imóvel da parte autora foi construído pela CEF, com recursos, do FAR, na condição de gestora de políticas públicas, que contratou a construtora. Desta forma, a responsabilidade por eventuais vícios de construção é da CEF. No caso em questão, a relação entre as partes é nitidamente de consumo, o que impõe a aplicação do CDC, a desaguar na responsabilidade objetiva da CEF, tal como já decidi ao apreciar as preliminares apresentadas pela CEF. Tendo em vista a necessidade de dados técnicos para a solução da lide, a fim de verificar se houve ou não vícios de construção, foi deferida a produção de prova pericial, que foi realizada por engenheiro civil de confiança deste juízo. Pois bem. O perito judicial apresentou laudo devidamente detalhado, ilustrado por fotos, com descrição dos problemas evidenciados, das medidas corretivas necessárias e do orçamento respectivo, concluindo expressamente que “as manifestações patológicas se tratam de vícios construtivos pela utilização de material de qualidade não recomendada.” (ID 338348220). Não prospera, portanto, a alegação da CEF, de que os vícios encontrados teriam origem no mau uso do imóvel (e não por falhas na construção). Assim, acolhendo o laudo pericial, concluo que o imóvel financiado apresenta vícios construtivos, cuja correção demandava um orçamento de R$ 4.128,82, em setembro de 2024. Por conseguinte, a parte autora faz jus ao recebimento de uma indenização por danos materiais no valor de R$ 4.128,82, valor este posicionado para setembro de 2024. Quanto ao pedido de indenização por dano moral, não se desconhece aqui a decisão da TNU, de que o dano moral, em questão de vícios de construção, não é presumido (in re ipsa), devendo ser provada a sua ocorrência. No caso concreto, o dano moral sofrido pela parte autora está devidamente provado no laudo pericial, onde o perito judicial destacou, em sua conclusão, que o imóvel oferece risco à saúde dos moradores (item 9 do laudo do ID 338348220), o que demonstra que os vícios de construção apurados afetam significativamente as condições de habitabilidade do imóvel. Passo, assim, à fixação do valor da indenização, o qual deve ser apto a desestimular a reincidência do evento danoso, compensar a vítima pela lesão sofrida e servir de exemplo à sociedade. Logo, não poderá ser fixado em quantia ínfima, sob pena de descaracterização da função repressiva da indenização, mas também não poderá atingir expressão exorbitante, a fim de não gerar um enriquecimento sem causa. Assim, fixo o valor da indenização, moderadamente, em R$ 3.000,00. Esta cifra, no que tange à CEF, parece-me suficiente para atuar, ao mesmo tempo, como retribuição do serviço mal prestado e como importante fator de inibição à sua repetição, estimulando a adoção de medidas corretivas. Quanto à parte autora, o valor fixado certamente é substancial, eis que cerca de dois salários mínimos atuais.” No mérito, à vista do teor do laudo pericial elaborado nestes autos (id 319172094), entendo devida a reparação dos danos materiais nos exatos termos fixados na r. sentença. Quanto ao recurso interposto pela parte autora por meio do qual requer: A. a correta indenização pelo revestimento cerâmico no valor de R$7.187,98 (sete mil, cento e oitenta e sete reais e noventa e oito centavos); B. a indenização pelos prejuízos acessórios (pintura, limpeza e destinação do entulho, aluguel e revestimento argamassado) no valor de R$1.675,85 (um mil, seiscentos e setenta e cinco reais e oitenta e cinco centavos); C. a majoração do dano moral ao patamar de R$10.000,00; D. a consequente condenação da Caixa Econômica Federal ao pagamento do montante referente à integralidade dos pedidos.”, verifico que já houve inclusão de gastos com limpeza, destinação do entulho, e anomalia em revestimentos cerâmicos, totalizando o gasto de R$ 4.128,82, conforme parecer supratranscrito, pelo que a r. sentença também não merece reparos neste ponto. Outrossim, no que concerne pedido para condenação da ré ao pagamento de danos morais, a parte não especificou nenhum fato em concreto para a caracterização do dano moral. Os argumentos utilizados foram genéricos tais como "que a Ré ultrapassou os limites razoáveis do exercício de seu direito, afetando seriamente a dignidade dos Autores, abalando sua estabilidade emocional, devida a majoração da indenização por danos morais, especialmente pelas peculiaridades do caso concreto” Quando isso acontece, vale dizer, quando o pedido de dano moral pode ser deduzido para qualquer situação indistintamente, sem a demonstração de particularidades concretas do caso específico, ele é considerado in re ipsa. Conforme já mencionado na r. sentença, o Superior Tribunal de Justiça tem entendido que o dano moral para as hipóteses de vícios na construção deve ser comprovado, extraordinário, devem suplantar o mero descumprimento contratual. Vejamos: AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. VÍCIOS CONSTRUTIVOS. RESPONSABILIDADE CIVIL. CONSTRUTORA. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. INCIDÊNCIA. DANOS MORAIS. CARACTERIZAÇÃO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Consoante a jurisprudência desta Corte, "o dano moral, na ocorrência de vícios de construção, não se presume, configurando-se apenas quando houver circunstâncias excepcionais que, devidamente comprovadas, importem em significativa e anormal violação de direito da personalidade dos proprietários do imóvel" (AgInt no AREsp 1.288.145/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, DJe de 16/11/2018). 2. Na hipótese, a alteração das premissas fáticas adotadas pelo Tribunal a quo, no tocante à presença dos elementos caracterizadores da responsabilidade civil e do dever de indenizar, diante da existência de defeitos no imóvel decorrentes de problemas na construção, assim como acerca da caracterização do dano moral, demandaria, necessariamente, o reexame de matéria fática e probatória dos autos. 3. Agravo interno desprovido. AgInt nos EDcl no AREsp 1693983 / SC AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. DEFEITOS NO IMÓVEL. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS. MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA CONHECER DO AGRAVO E DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. 1. Agravo interno contra decisão da Presidência que conheceu do agravo para não conhecer do recurso especial, em razão da incidência da Súmula 7 do STJ. Reconsideração. 2. O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que o mero descumprimento contratual não acarreta, por si só, danos morais. Precedentes. 3. No caso, não foram apontadas particularidades concretas, que suplantaram o mero descumprimento contratual, para se concluir pela caracterização do dano moral. 4. Agravo interno provido para conhecer do agravo e dar provimento ao recurso especial, a fim de excluir da condenação a indenização por danos morais. AgInt no AREsp 1505492 / GO Some-se a isso o fato de que embora a Caixa deva fiscalizar o andamento da obra a sua culpa é leve dada a dificuldade no controle da fiscalização de todas as etapas do processo construtivo. Evidentemente o grande responsável pelos vícios é a construtora a quem cabia comprar os materiais adequados e empregar todos os esforços para a adequada concretização da obra. É pacífico o caráter compensatório da indenização pelo dano moral; embora não haja consenso acerca da função punitiva, entendo que a caracterização do dano moral também auxilia no desestímulo à prática de novas condutas lesiva. A condenação da CEF na hipótese concreta não teria qualquer função de desestímulo à prática de novas condutas dada a extrema dificuldade, como já exposto, de se fiscalizar todas as etapas da obra. Por tais razões, na esteira da jurisprudência do STJ, não se presume o dano moral, configurando-se apenas quando houver circunstâncias excepcionais que, devidamente comprovadas, importem em significativa e anormal violação de direito da personalidade dos proprietários do imóvel, o que não ocorreu. Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso da CEF para excluir a condenação ao pagamento de danos morais, bem como nego provimento ao recurso da parte autora. Condeno a parte autora em honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa atualizado, nos termos do art. 85, §4º, III, do CPC. Considerando que a parte autora é beneficiária da gratuidade da justiça, deverá ser observado o disposto no §3º do art. 98 do CPC, ficando a obrigação decorrente da sucumbência sob condição suspensiva de exigibilidade. É o voto. E M E N T A VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO. CEF. PERÍCIA JUDICIAL CONSTATOU A PRESENÇA DE DANOS MATERIAIS. CEF ALEGA ILEGITIMIDADE PASSIVA, IMPUGNA O VALOR DO DANO MATERIAL APURADO PELO PERITO E REQUER A EXCLUSÃO DOS DANOS MORAIS. PARTE AUTORA POSTULA A MAJORAÇÃO DOS DANOS MATERIAIS E DO DANO MORAL. DANO MORAL NÃO COMPROVADO. CONFORME JURISPRUDÊNCIA DO STJ O DANO MORAL NÃO SE PRESUME. PRESENÇA DE CIRCUNSTÂNCIAS EXCEPCIONAIS QUE, DEVIDAMENTE COMPROVADAS, IMPORTEM EM SIGNIFICATIVA E ANORMAL VIOLAÇÃO DE DIREITO DA PERSONALIDADE DA PROPRIETÁRIA DO IMÓVEL, O QUE NÃO OCORREU. RECURSO DA CEF A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO PARA EXCLUIR DANOS MORAIS. RECURSO DA PARTE AUTORA A QUE SE NEGA PROVIMENTO ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decidiu a Quarta Turma Recursal do Juizado Especial Federal de São Paulo, por unanimidade, negar provimento ao recurso da parte autora e dar parcial provimento ao recurso da CEF, nos termos do voto da Juíza Federal Relatora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. FLAVIA PELLEGRINO SOARES MILLANI Juíza Federal

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Processo nº 0020158-31.2021.4.03.6302

ID: 324317303

Tribunal: TRF3 Órgão: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP Classe: RECURSO INOMINADO CíVEL Nº Processo: 0020158-31.2021.4.03.6302

Data de Disponibilização: 14/07/2025

Polo Ativo:

GISELE FERREIRA MORAIS

Polo Passivo:

Acórdão

Advogados:

FABIO MOLEIRO FRANCI

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ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA

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FERNANDO APARECIDO BALDAN

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PODER JUDICIÁRIO Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo 4ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0020158-31.2021.4.0… PODER JUDICIÁRIO Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo 4ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0020158-31.2021.4.03.6302 RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP RECORRENTE: GISELE FERREIRA MORAIS Advogados do(a) RECORRENTE: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A, FERNANDO APARECIDO BALDAN - SP58417-N RECORRIDO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, GISELE FERREIRA MORAIS Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A, FERNANDO APARECIDO BALDAN - SP58417-N Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE BRAZAO CREAO - PA28386-A, ITALO SCARAMUSSA LUZ - ES9173-A OUTROS PARTICIPANTES: PODER JUDICIÁRIO Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo 4ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0020158-31.2021.4.03.6302 RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP RECORRENTE: GISELE FERREIRA MORAIS Advogados do(a) RECORRENTE: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A, FERNANDO APARECIDO BALDAN - SP58417-N RECORRIDO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, GISELE FERREIRA MORAIS Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A, FERNANDO APARECIDO BALDAN - SP58417-N Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE BRAZAO CREAO - PA28386-A, ITALO SCARAMUSSA LUZ - ES9173-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recursos interpostos por ambas as partes em face da r. sentença que julgou parcialmente os pedidos para condenar a Caixa Econômica Federal a indenizar os danos materiais quantificados pelo perito judicial em R$ 4.128,82 e a compensar os danos morais fixados em R$ 3.000,00. A autora recorreu postulando: A. a correta indenização pelo revestimento cerâmico no valor de R$7.187,98 (sete mil, cento e oitenta e sete reais e noventa e oito centavos); B. a indenização pelos prejuízos acessórios (pintura, limpeza e destinação do entulho, aluguel e revestimento argamassado) no valor de R$1.675,85 (um mil, seiscentos e setenta e cinco reais e oitenta e cinco centavos); C. a majoração do dano moral ao patamar de R$10.000,00; D. a consequente condenação da Caixa Econômica Federal ao pagamento do montante referente à integralidade dos pedidos. A CEF aduz litisconsórcio passivo necessário. No mérito, postula seja julgada improcedente a demanda, impugnando o valor imputado na perícia. É o relatório. PODER JUDICIÁRIO Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo 4ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0020158-31.2021.4.03.6302 RELATOR: 11º Juiz Federal da 4ª TR SP RECORRENTE: GISELE FERREIRA MORAIS Advogados do(a) RECORRENTE: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A, FERNANDO APARECIDO BALDAN - SP58417-N RECORRIDO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, GISELE FERREIRA MORAIS Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE AUGUSTO FORCINITTI VALERA - SP140741-N, FABIO MOLEIRO FRANCI - SP370252-A, FERNANDO APARECIDO BALDAN - SP58417-N Advogados do(a) RECORRIDO: ALEXANDRE BRAZAO CREAO - PA28386-A, ITALO SCARAMUSSA LUZ - ES9173-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O artigo 46 c/c § 5º do art. 82, ambos da Lei 9099/95, facultam à Turma Recursal dos Juizados especiais a remissão aos fundamentos adotados na sentença. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que a adoção dos fundamentos contidos na sentença pela Turma Recursal não contraria o art. 93, inciso IX, da Constituição Federal (AI 726.283-7-AgR, Rel. Min. Eros Grau, 2ª Turma, DJe nº 227, Publicação 28/11/2008). Preliminarmente, quanto à alegação de ilegitimidade passiva, conforme já constou da r. sentença, a controvérsia trazida aos autos é semelhante a várias ações em tramitação nas Turmas Recursais do JEF/SP. A título de exemplo 0004718-66.2020.4.03.6322 (2ª TR/SP); 0005244-33.2020.4.03.6322 (15ª TR/SP); 0005467-83.2020.4.03.6322 (13º TR/SP). Peço vênia para transcrever minuciosa fundamentação, que adoto como razão de decidir: “Segundo a mais recente interpretação do Superior Tribunal de Justiça sobre a questão da legitimidade passiva para a causa da Caixa Econômica Federal para responder pela reparação de vícios de construção de imóvel objeto de contrato de compra e venda e outros ajustes, por ela financiado, a partir do julgamento do RECURSO ESPECIAL Nº 1.163.228 – AM, RELATORA A EXCELENTÍSSIMA MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI, a Caixa Econômica Federal é a responsável pela reparação dos danos causados se atuar como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda, quando tiver escolhido a construtora ou tiver qualquer responsabilidade concreta relativa à elaboração e execução do projeto construtivo. Nessa mesma linha, segundo o voto proferido pela EXCELENTÍSSIMA MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI, no RECURSO ESPECIAL Nº 897.045 – RS, “(...) diversamente do que ocorre quando atua como agente financeiro em sentido estrito, considero, em princípio, ter a CEF legitimidade para responder por vícios de construção nos casos em que promoveu o empreendimento, teve responsabilidade na elaboração do projeto com suas especificações, escolheu a construtora e/ou negociou os imóveis, ou seja, quando realiza atividade distinta daquela própria de agente financeiro estrito senso (cf. voto-vista proferido no Recurso Especial nº 738.071- SC, julgado em 9.8.2011, Quarta Turma, relator Min. Luis Felipe Salomão)”. Ainda no mesmo sentido, também do STJ, se a CEF participou do contrato apenas na qualidade de agente financeiro, tomando o imóvel como garantia fiduciária do valor mutuado, suas responsabilidades contratuais dizem respeito apenas à atividade financeira, sem nenhuma vinculação com outras responsabilidades referentes à concepção do empreendimento ou à negociação do imóvel, não tem ela legitimidade passiva para a causa (AgInt no AREsp n. 1.708.217/PR, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 16/5/2022, DJe de 17/6/2022). Ausente também o litisconsórcio passivo necessário. Pode a ré, evidentemente, se assim entender, demandar contra a construtora do imóvel, exercendo possível direito de regresso. No caso concreto, a Caixa Econômica Federal, através do FAR – Fundo de Arrendamento Residencial, negociou diretamente o imóvel com a parte autora, assinando o contrato na qualidade de “vendedor/cedente/doador”. O contrato foi firmado exclusivamente entre a CEF e a parte autora, sem nenhuma intervenção da construtora. O contrato não contém nenhuma cláusula atribuindo à construtora a responsabilidade pela reparação de vícios de construção; aliás, nem sequer poderia conter cláusula impondo obrigações a quem não figura no contrato, porque a construtora não o firmou, sem prejuízo de eventual demanda judicial de regresso da CEF em face da construtora que crie essa obrigação, ou de demanda do mutuário em face da construtora, na Justiça Estadual. Portanto, a CEF não atuou apenas como agente financeiro, e sim como agente executora de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda, ao conduzir o empreendimento e negociar diretamente o imóvel em contrato de compra e venda entre ela e a parte autora, sem a intervenção da construtora. Presente essa realidade, detém a CEF, exclusivamente, na Justiça Federal, legitimidade passiva para a causa em que se pede reparação de danos decorrentes de vícios de construção, na linha da interpretação adotada pelo STJ, segundo a qual, entre outros atos concretos que geram tal responsabilidade, destaca-se a negociação direta dos imóveis pela CEF (Recurso Especial nº 738.071- SC, julgado em 9.8.2011, Quarta Turma, relator Min. Luis Felipe Salomão).” A r. sentença analisou os pedidos formulados no seguinte sentido: “Passo a analisar as preliminares: a) legitimidade passiva: no caso concreto, o imóvel que é objeto de discussão foi adquirido pela parte autora em contrato de venda e compra direta com parcelamento e alienação fiduciária no programa minha casa minha vida, com recursos do FAR (fls. 34 e seguintes do ID 159717896). A parte autora atribui à CEF a condição de responsável pela construção do imóvel, tendo em vista que a requerida não financiou a construção do empreendimento/condomínio como mero agente financeiro, mas sim, como agente executora de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda. Pois bem. A análise inicial dos autos revela que, de fato, a construção do empreendimento/ condomínio, no qual o imóvel que é objeto da demanda está inserido, foi financiado pela CEF como agente executora de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa renda, conforme contrato anexado na maioria dos processos referentes ao condomínio em questão. Ademais, a parte autora não firmou qualquer contrato com a construtora, mas apenas com a CEF (fls. 34 e seguintes do ID 159717896). Desta forma, não há litisconsórcio necessário a demandar a presença da construtora no polo passivo. Logo, a legitimidade passiva é da CEF, conforme já decidiu o STJ no REsp 1.163.228. b) interesse de agir: a alegação da CEF, de que a parte autora não teria interesse de agir em razão da falta de registro de chamada de vistoria e reparos para a unidade habitacional que é objeto da demanda, não prospera, eis que tal documento não constitui medida indispensável para o ajuizamento da ação. Ademais, a CEF apresentou defesa de mérito, de modo a reforçar o interesse de agir da parte autora. c) aplicação do CDC: o simples fato de se tratar de financiamento com recursos do FAR não afasta a aplicação do CDC. Rejeitado, assim, as preliminares levantadas pela CEF. d) Valor da causa: a CEF afirma que a parte autora atribuiu à causa o valor de R$ 15.495,14 “... sem ao menos justificar tal pleito”. (fl. 4 do ID 159719405). A preliminar foi alegada de forma genérica, sem demonstração de qualquer irregularidade na atribuição do valor da causa. Ressalto que o autor atribuiu à causa o valor de R$ 20.471,07, o que corresponde à soma do pedido de indenização por danos morais, no valor de R$ 10.000,00, mais o valor que se pretende a título de indenização por danos materiais, no montante de R$ 10.471,07, conforme consta de orçamento anexado aos autos. Assim, ao atribuir valor à causa, a parte autora observou o disposto no art. 292, V, do CPC. Por conseguinte, rejeito a preliminar, ficando mantido o valor atribuído à causa pela parte autora. Mérito Cumpre assinalar inicialmente que as instituições financeiras estão sujeitas ao CDC, conforme súmula 297 do STJ, in verbis: Súmula 297 - “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Tal fato dá ensejo à responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços, conforme artigo 14 do Estatuto do Consumidor (Lei 8.078/90): “Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.” Ao contrário da responsabilidade subjetiva que se assenta na teoria da culpa, a responsabilidade objetiva tem como fundamento a teoria do risco. Vale dizer: nas relações de consumo, o fornecedor de produtos e serviços responde pelos riscos de sua atividade econômica, independente de culpa. É necessário consignar, entretanto, que a responsabilidade do fornecedor pode ser excluída nas hipóteses previstas no § 3º do artigo 14 da Lei 8.078/90, in verbis: “§ 3º. O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.” Cuida-se, pois, de norma com conteúdo ético e econômico relevante. Ético, porque não se pode compreender um sistema de responsabilidade, onde o fornecedor estaria sempre obrigado a promover indenizações, ainda que o dano não guarde qualquer relação de causa e efeito com o serviço fornecido. Econômico, porque o risco exacerbado da atividade econômica, sem limites, certamente seria repassado para o preço de produtos e serviços, com prejuízo para a própria sociedade que se pretende proteger. Uma das consequências da responsabilidade objetiva é a melhor distribuição do ônus da prova, equiparando as forças entre o consumidor (parte mais vulnerável) e aquele que explora uma atividade lucrativa. Neste compasso, cabe ao consumidor apenas comprovar a ocorrência de um dano (material ou moral) e o seu nexo de causalidade com o serviço fornecido. Superada esta fase, o fornecedor somente afastará a sua responsabilidade civil, caso prove que: a) embora tenha prestado o serviço, o defeito inexiste; b) a culpa é exclusiva do consumidor; ou c) a culpa é exclusiva de terceiro. Cumpre verificar, portanto, se a parte autora comprovou ter experimentado algum dano e, em caso positivo, se há nexo de causalidade entre o dano e o serviço bancário prestado. No caso concreto, a parte autora possui contrato de financiamento habitacional firmado com a CEF, pelo Programa Minha Casa Minha Vida (fls. 34 e seguintes do ID 159717896). Por seu turno, o empreendimento no qual está inserido o imóvel da parte autora foi construído pela CEF, com recursos, do FAR, na condição de gestora de políticas públicas, que contratou a construtora. Desta forma, a responsabilidade por eventuais vícios de construção é da CEF. No caso em questão, a relação entre as partes é nitidamente de consumo, o que impõe a aplicação do CDC, a desaguar na responsabilidade objetiva da CEF, tal como já decidi ao apreciar as preliminares apresentadas pela CEF. Tendo em vista a necessidade de dados técnicos para a solução da lide, a fim de verificar se houve ou não vícios de construção, foi deferida a produção de prova pericial, que foi realizada por engenheiro civil de confiança deste juízo. Pois bem. O perito judicial apresentou laudo devidamente detalhado, ilustrado por fotos, com descrição dos problemas evidenciados, das medidas corretivas necessárias e do orçamento respectivo, concluindo expressamente que “as manifestações patológicas se tratam de vícios construtivos pela utilização de material de qualidade não recomendada.” (ID 338348220). Não prospera, portanto, a alegação da CEF, de que os vícios encontrados teriam origem no mau uso do imóvel (e não por falhas na construção). Assim, acolhendo o laudo pericial, concluo que o imóvel financiado apresenta vícios construtivos, cuja correção demandava um orçamento de R$ 4.128,82, em setembro de 2024. Por conseguinte, a parte autora faz jus ao recebimento de uma indenização por danos materiais no valor de R$ 4.128,82, valor este posicionado para setembro de 2024. Quanto ao pedido de indenização por dano moral, não se desconhece aqui a decisão da TNU, de que o dano moral, em questão de vícios de construção, não é presumido (in re ipsa), devendo ser provada a sua ocorrência. No caso concreto, o dano moral sofrido pela parte autora está devidamente provado no laudo pericial, onde o perito judicial destacou, em sua conclusão, que o imóvel oferece risco à saúde dos moradores (item 9 do laudo do ID 338348220), o que demonstra que os vícios de construção apurados afetam significativamente as condições de habitabilidade do imóvel. Passo, assim, à fixação do valor da indenização, o qual deve ser apto a desestimular a reincidência do evento danoso, compensar a vítima pela lesão sofrida e servir de exemplo à sociedade. Logo, não poderá ser fixado em quantia ínfima, sob pena de descaracterização da função repressiva da indenização, mas também não poderá atingir expressão exorbitante, a fim de não gerar um enriquecimento sem causa. Assim, fixo o valor da indenização, moderadamente, em R$ 3.000,00. Esta cifra, no que tange à CEF, parece-me suficiente para atuar, ao mesmo tempo, como retribuição do serviço mal prestado e como importante fator de inibição à sua repetição, estimulando a adoção de medidas corretivas. Quanto à parte autora, o valor fixado certamente é substancial, eis que cerca de dois salários mínimos atuais.” No mérito, à vista do teor do laudo pericial elaborado nestes autos (id 319172094), entendo devida a reparação dos danos materiais nos exatos termos fixados na r. sentença. Quanto ao recurso interposto pela parte autora por meio do qual requer: A. a correta indenização pelo revestimento cerâmico no valor de R$7.187,98 (sete mil, cento e oitenta e sete reais e noventa e oito centavos); B. a indenização pelos prejuízos acessórios (pintura, limpeza e destinação do entulho, aluguel e revestimento argamassado) no valor de R$1.675,85 (um mil, seiscentos e setenta e cinco reais e oitenta e cinco centavos); C. a majoração do dano moral ao patamar de R$10.000,00; D. a consequente condenação da Caixa Econômica Federal ao pagamento do montante referente à integralidade dos pedidos.”, verifico que já houve inclusão de gastos com limpeza, destinação do entulho, e anomalia em revestimentos cerâmicos, totalizando o gasto de R$ 4.128,82, conforme parecer supratranscrito, pelo que a r. sentença também não merece reparos neste ponto. Outrossim, no que concerne pedido para condenação da ré ao pagamento de danos morais, a parte não especificou nenhum fato em concreto para a caracterização do dano moral. Os argumentos utilizados foram genéricos tais como "que a Ré ultrapassou os limites razoáveis do exercício de seu direito, afetando seriamente a dignidade dos Autores, abalando sua estabilidade emocional, devida a majoração da indenização por danos morais, especialmente pelas peculiaridades do caso concreto” Quando isso acontece, vale dizer, quando o pedido de dano moral pode ser deduzido para qualquer situação indistintamente, sem a demonstração de particularidades concretas do caso específico, ele é considerado in re ipsa. Conforme já mencionado na r. sentença, o Superior Tribunal de Justiça tem entendido que o dano moral para as hipóteses de vícios na construção deve ser comprovado, extraordinário, devem suplantar o mero descumprimento contratual. Vejamos: AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. VÍCIOS CONSTRUTIVOS. RESPONSABILIDADE CIVIL. CONSTRUTORA. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. INCIDÊNCIA. DANOS MORAIS. CARACTERIZAÇÃO. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Consoante a jurisprudência desta Corte, "o dano moral, na ocorrência de vícios de construção, não se presume, configurando-se apenas quando houver circunstâncias excepcionais que, devidamente comprovadas, importem em significativa e anormal violação de direito da personalidade dos proprietários do imóvel" (AgInt no AREsp 1.288.145/DF, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, DJe de 16/11/2018). 2. Na hipótese, a alteração das premissas fáticas adotadas pelo Tribunal a quo, no tocante à presença dos elementos caracterizadores da responsabilidade civil e do dever de indenizar, diante da existência de defeitos no imóvel decorrentes de problemas na construção, assim como acerca da caracterização do dano moral, demandaria, necessariamente, o reexame de matéria fática e probatória dos autos. 3. Agravo interno desprovido. AgInt nos EDcl no AREsp 1693983 / SC AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DECISÃO DA PRESIDÊNCIA. RECONSIDERAÇÃO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. PROGRAMA MINHA CASA MINHA VIDA. DEFEITOS NO IMÓVEL. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS. MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. AGRAVO INTERNO PROVIDO PARA CONHECER DO AGRAVO E DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. 1. Agravo interno contra decisão da Presidência que conheceu do agravo para não conhecer do recurso especial, em razão da incidência da Súmula 7 do STJ. Reconsideração. 2. O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que o mero descumprimento contratual não acarreta, por si só, danos morais. Precedentes. 3. No caso, não foram apontadas particularidades concretas, que suplantaram o mero descumprimento contratual, para se concluir pela caracterização do dano moral. 4. Agravo interno provido para conhecer do agravo e dar provimento ao recurso especial, a fim de excluir da condenação a indenização por danos morais. AgInt no AREsp 1505492 / GO Some-se a isso o fato de que embora a Caixa deva fiscalizar o andamento da obra a sua culpa é leve dada a dificuldade no controle da fiscalização de todas as etapas do processo construtivo. Evidentemente o grande responsável pelos vícios é a construtora a quem cabia comprar os materiais adequados e empregar todos os esforços para a adequada concretização da obra. É pacífico o caráter compensatório da indenização pelo dano moral; embora não haja consenso acerca da função punitiva, entendo que a caracterização do dano moral também auxilia no desestímulo à prática de novas condutas lesiva. A condenação da CEF na hipótese concreta não teria qualquer função de desestímulo à prática de novas condutas dada a extrema dificuldade, como já exposto, de se fiscalizar todas as etapas da obra. Por tais razões, na esteira da jurisprudência do STJ, não se presume o dano moral, configurando-se apenas quando houver circunstâncias excepcionais que, devidamente comprovadas, importem em significativa e anormal violação de direito da personalidade dos proprietários do imóvel, o que não ocorreu. Ante o exposto, dou parcial provimento ao recurso da CEF para excluir a condenação ao pagamento de danos morais, bem como nego provimento ao recurso da parte autora. Condeno a parte autora em honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa atualizado, nos termos do art. 85, §4º, III, do CPC. Considerando que a parte autora é beneficiária da gratuidade da justiça, deverá ser observado o disposto no §3º do art. 98 do CPC, ficando a obrigação decorrente da sucumbência sob condição suspensiva de exigibilidade. É o voto. E M E N T A VÍCIOS DE CONSTRUÇÃO. CEF. PERÍCIA JUDICIAL CONSTATOU A PRESENÇA DE DANOS MATERIAIS. CEF ALEGA ILEGITIMIDADE PASSIVA, IMPUGNA O VALOR DO DANO MATERIAL APURADO PELO PERITO E REQUER A EXCLUSÃO DOS DANOS MORAIS. PARTE AUTORA POSTULA A MAJORAÇÃO DOS DANOS MATERIAIS E DO DANO MORAL. DANO MORAL NÃO COMPROVADO. CONFORME JURISPRUDÊNCIA DO STJ O DANO MORAL NÃO SE PRESUME. PRESENÇA DE CIRCUNSTÂNCIAS EXCEPCIONAIS QUE, DEVIDAMENTE COMPROVADAS, IMPORTEM EM SIGNIFICATIVA E ANORMAL VIOLAÇÃO DE DIREITO DA PERSONALIDADE DA PROPRIETÁRIA DO IMÓVEL, O QUE NÃO OCORREU. RECURSO DA CEF A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO PARA EXCLUIR DANOS MORAIS. RECURSO DA PARTE AUTORA A QUE SE NEGA PROVIMENTO ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decidiu a Quarta Turma Recursal do Juizado Especial Federal de São Paulo, por unanimidade, negar provimento ao recurso da parte autora e dar parcial provimento ao recurso da CEF, nos termos do voto da Juíza Federal Relatora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. FLAVIA PELLEGRINO SOARES MILLANI Juíza Federal

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