Processo nº 0814278-90.2024.8.10.0029
ID: 262006296
Tribunal: TJMA
Órgão: 1ª VARA CRIMINAL DE CAXIAS
Classe: AçãO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINáRIO
Nº Processo: 0814278-90.2024.8.10.0029
Data de Disponibilização:
29/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
AÇÃO PENAL Nº 0814278-90.2024.8.10.0029 AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL ACUSADO: ANTONIO JOSE PEREIRA DA SILVA DELITO: Tráfico de Drogas e Porte Irregular de Arma de Fogo de Uso Proibido (numeraçã…
AÇÃO PENAL Nº 0814278-90.2024.8.10.0029 AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL ACUSADO: ANTONIO JOSE PEREIRA DA SILVA DELITO: Tráfico de Drogas e Porte Irregular de Arma de Fogo de Uso Proibido (numeração raspada/suprimida) SENTENÇA O REPRESENTANTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL que oficia perante este Juízo, escudado em regular inquérito policial, ofertou DENÚNCIA (ID 133901677) em desfavor de ANTONIO JOSE PEREIRA DA SILVA, devidamente qualificado, dizendo, in litteris que: "Consta no inquérito policial que, em 26 de setembro de 2024, por volta das 20h00min, na Avenida Central, bairro Refinaria, nesta cidade, o denunciado ANTÔNIO JOSÉ PEREIRA DA SILVA foi preso em flagrante delito em razão de trazer consigo expressiva quantidade de drogas (maconha), com fortes indícios de que seriam destinadas ao narcotráfico, além de portar armas de fogo e munições, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Por ocasião dos fatos, uma equipe do Esquadrão Águia da Polícia Militar realizava rondas ostensivas no local mencionado, quando avistou o denunciado ANTÔNIO JOSÉ PEREIRA DA SILVA trafegando a pé, com um volume aparente em sua cintura. Esse volume chamou a atenção dos policiais, levando-os a acreditar que pudesse se tratar de uma arma de fogo, o que motivou a abordagem policial. Ao ser dada voz de parada, o denunciado ignorou a ordem policial e tentou empreender fuga, correndo cerca de 15 metros e adentrando em um galpão nas proximidades. Os policiais prontamente o interceptaram no local, onde realizaram busca pessoal e encontraram em sua cintura 01 (uma) pistola calibre .357. Ao lado do denunciado, os policiais localizaram ainda uma mochila preta aberta, contendo 44 (quarenta e quatro) tabletes de substância análoga à maconha, 01 (uma) submetralhadora artesanal calibre .40 (conhecida como “macaquinha”) com carregador alongado, 02 (dois) carregadores de pistola Glock, 05 (cinco) munições intactas calibre .40, 05 (cinco) munições deflagradas calibre .38, 05 (cinco) munições deflagradas calibre .32 e 01 (uma) balança de precisão." Finalizando, enquadra o denunciado nas sanções dos arts. 33, caput e §1º, inciso I, da Lei n.º 11.343/06 (tráfico ilícito de drogas) e art. 16, §1º, inciso II, da Lei n.º 10.826/03 (porte ilegal de arma de fogo de uso restrito). Inquérito Policial, ID 132883383/132883412. Laudos Periciais, ID 135480886 (artefatos bélicos) e ID 135480887 (entorpecentes). Determinada a notificação do denunciado para apresentar resposta, ID 133920548. Acusado devidamente notificado, tendo apresentado Defesa Preliminar, ID 139895129, por intermédio da DPE-MA. Denúncia recebida (ID 140922870), sendo designada audiência de instrução e julgamento. Instrução realizada no dia 27/02/2025, ocasião em que foram ouvidas as testemunhas de Acusação: PMMA DANIEL JORGE DE CARVALHO, PMMA FRANCISCO YTHALLO GRAÇA FIGUEIREDO e PMMA LAELITON GOMES SOARES JÚNIOR, ID 142551355. Ao final, as partes nada requereram, tendo sido declarada encerrrada a instrução do feito. Em alegações finais orais, o Órgão do Ministério Público pugnou pela procedência da denúncia em seus exatos termos. A Defesa, por seu turno, reclamou, preliminarmente, a ILEGALIDADE DA BUSCA PESSOAL, requerendo a NULIDADE DAS PROVAS obtidas no processo e, no mérito, a ABSOLVIÇÃO por NEGATIVA DE AUTORIA e AUSÊNCIA DE PROVAS a embasar um édito condenatório. É o relatório do processado nos autos. D E C I D O. Objetiva o ESTADO, via MINISTÉRIO PÚBLICO, legítimo titular da ação penal pública incondicionada, como no caso, aplicar ao acusado, ANTONIO JOSE PEREIRA DA SILVA, os preceitos secundários da norma penal contida nos artigos arts. 33, caput e §1º, inciso I, da Lei n.º 11.343/06 (tráfico ilícito de drogas) e art. 16, §1º, inciso II, da Lei n.º 10.826/03 (porte ilegal de arma de fogo de uso restrito). Antes de adentrar no mérito, entanto, necessário de faz enfrentar a preliminar suscitada pela Defesa de ilicitude da prova a qual, a meu ver se vincula diretamente ao mérito, mas o aprecio na qualidade suscitada para, sem demoras, indeferir o pleito, pois consoante se extrai dos depoimentos colhidos em sede judicial havia, sim, fundada suspeita para ação policial, pois o denunciado estava na rua e quando os policiais o viram o mesmo correu em direção a um galpão abandonado, sendo antes notado pelos policiais responsáveis pela diligência, um suspeito volume na cintura do acusado, de sorte que quando o abordaram, já dentro do citado galpão abandonado, constataram se tratar, aquele volume visto em sua cintura, de uma arma de fogo com numeração raspada. Assim, havia, sim, uma fundadas suspeita para abordagem e nessa toada, indefiro o pleito formulado em sede de preliminar pela nobre Defensoria Pública Estadual. Enfrentada a questão prejudicial de mérito, passemos à análise do mérito da ação penal: Dispõe, outrossim, o artigo 33 da lei de tóxicos que: ART. 33 – IMPORTAR, EXPORTAR, REMETER, PREPARAR, PRODUZIR, FABRICAR, ADQUIRIR, VENDER, EXPOR À VENDA, OFERECER, TER EM DEPÓSITO, TRANSPORTAR, TRAZER CONSIGO, GUARDAR, PRESCREVER, MINISTRAR, ENTREGAR A CONSUMO OU FORNECER DROGAS, AINDA QUE GRATUITAMENTE, SEM AUTORIZAÇÃO OU EM DESACORDO COM DETERMINAÇÃO LEGAL OU REGULAMENTAR. Com tal fórmula, expressas em diversos núcleos, teve o legislador a intenção de ampliar o campo das incriminações e, obviamente, conferir maior raio de efetiva proteção ao bem jurídico visado pela norma, diga-se de passagem, no caso do tráfico, norma penal em branco heterogênea. Os dispositivos que hipotizam diversos núcleos ou condutas humanas, como na espécie, foram chamados na doutrina alemã de Mischgesetze (LEIS MISTURADAS). DELOGU e SANTORO usam a expressão normas penais conjuntas. MAGALHÃES NORONHA, por sua vez, os considera crimes de ação múltipla. Patenteio, neste momento, que o artigo 28 da referida lei também foi estruturado com múltiplos núcleos, guardadores de identidade com os correspondentes núcleos verbais do tráfico, na sua modalidade de adquirir, guardar, ter em depósito, transportar ou trazer consigo, sendo diferenciados pela finalidade de ser para uso próprio. No caso de tráfico, pois, o tipo subjetivo se esgota no simples dolo, não se exigindo qualquer finalidade especial, nem mesmo a finalidade de lucro ou do comércio da droga, ficando tal mais evidente, ainda, quando se vê que o legislador também pune o fornecer ainda que gratuitamente ou entregar, de qualquer forma, substância entorpecente a consumo. Ao contrário, a conduta do usuário exige uma finalidade especial – consumo próprio - daí porque chamado doutrinariamente de congruente assimétrico, diverso do anterior chamado congruente simétrico. É o chamado dolo específico, seguindo-se a doutrina italiana, ou elemento subjetivo do injusto, seguindo-se a alemã, mas faço menção a isto apenas por deleite, vez que, no caso, impossível se faz afirmar ser para uso, hipótese sequer levantada pelo acusado ou por sua Defesa, mormente diante da quantidade de entorpecentes apreendida nos autos, consoante atesta o laudo pericial do entorpecente apreendido colacionado ao feito (ID 135480887). Dito isso, verifica-se a absolvição do réu por ausência de provas suficientes para uma condenação é medida que se impõe, como bem asseverou a nobre Defensoria Pública em suas alegações derradeiras. Explico: A prova judicializada não me restou suficientemente convincente a ponto de embasar um édito condenatório, diante dos depoimentos contraditórios e díspares das testemunhas policiais militares responsáveis pela prisão em flagrante do acusado no tocante ao pretenso delito de tráfico de drogas (art. 33 da Lei Federal nº 11.343/2006). Vejamos os depoimentos das três testemunhas policiais: TESTEMUNHA FRANCISCO YTHALLO: "(...) Que o acusado correu com a bolsa de viagem que estava com ele... (...)". TESTEMUNHA DANIEL JORGE: "(...) Que dentro do galpão estava a droga, dentro de uma mochila preta (...) mais precisamente no canto do galpão (...) Que o portão do galpão estava aberto (...) Que o acusado não estava com a mochila nas costas (...)". TESTEMUNHA LAELITON JÚNIOR: (...) Que o acusado pegou a bolsa já na parte de dentro do galpão (...) Que quando ele viu a gente ele tava sem nada na mão (...) Que ele entrou no galpão e o fechou com ferrolho e subiu a escada em seguida (...) Que a bolsa estava dentro da área do galpão. Verifica-se, portanto, incoerências entre tais depoimentos, não só acerca de onde estava acondicionada a droga, ora uma mochila, ora uma bolsa de viagem, como também se o réu já portava a referida bolsa quando fora avistado pela guarnição policial, tendo corrido com a mesma ou se ele só fora encontrada dentro do referido galpão, em uma área ou no canto, bem assim no tocante a estar aberto ou trancado com ferrolho o citado galpão, destoando também acerca do narrado na denúncia ministerial (ID 133901677), a qual narra que: "(...) Os policiais prontamente o interceptaram no local, onde realizaram busca pessoal e encontraram em sua cintura 01 (uma) pistola calibre .357. Ao lado do denunciado, os policiais localizaram ainda uma mochila preta aberta, contendo 44 (quarenta e quatro) tabletes de substância análoga à maconha, 01 (uma) submetralhadora artesanal calibre .40 (conhecida como “macaquinha”) com carregador alongado, 02 (dois) carregadores de pistola Glock, 05 (cinco) munições intactas calibre .40, 05 (cinco) munições deflagradas calibre .38, 05 (cinco) munições deflagradas calibre .32 e 01 (uma) balança de precisão." Nessa toada, verifica-se que em relação ao delito de tráfico de drogas, as provas constantes nos autos são insuficientes para comprovar que os fatos ocorreram da forma como narrados na denúncia, mormente diante da divergência dos depoimentos das testemunhas em Juízo, não havendo que se falar em condenação enquanto não caracterizada, com absoluta certeza, eventual culpa atribuível ao réu, e sendo o conjunto probatório frágil, a sua absolvição é medida que se impõe, uma vez que impossibilitada a condenação com base em presunções, de sorte que havendo dúvida quanto a real responsabilidade criminal do acusado, deve-lhe ser aplicado o princípio do ‘in dúbio pro reo’, corolário da presunção de inocência, culminando inexoravelmente com a absolvição do réu, consoante jurisprudência abaixo colacionada: EMENTA: FURTO QUALIFICADO PELO ARROMBAMENTO - PLEITO MINISTERIAL VISANDO A CONDENAÇÃO - MATERIALIDADE EVIDENCIADA - DEPOIMENTO DAS TESTEMUNHAS DIVERGENTES ENTRE SI A RESPEITO DA NARRATIVA FÁTICA - CONJUNTO PROBATÓRIO FRÁGIL QUE NÃO FORNECE A CERTEZA MORAL NECESSÁRIA DA PARTICIPAÇÃO DO ACUSADO NO DELITO - AUTORIA NÃO COMPROVADA - ÉDITO ABSOLUTÓRIO MANTIDO. RECURSO DESPROVIDO. TJ - SC - Apelação Criminal: APR 59341 SC XXXX-1 APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE TRÂNSITO. HOMICÍDIO CULPOSO. ART . 302 DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. SENTENÇA CONDENATÓRIA. DECRETO COM FUNDAMENTO EXCLUSIVO NA PROVA PRODUZIDA EM FASE INQUISITORIAL. PROIBIÇÃO . ART. 155 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PRECEDENTES STJ. APELO CONHECIDO E PROVIDO . 1. Ao se verificar a sentença combatida, bem como o material probatório produzido em juízo, observa-se que a única prova judicializada fora o interrogatório do apelante, e de duas testemunhas que se encontravam com o réu no momento do fato, oportunidade em que os mesmos negam os fatos descritos na denúncia. 2. O réu não fora preso em flagrante, nenhum depoimento apresentado em sede inquisitiva foi refeito, judicializado, não se realizou exame etílico no recorrente . 3. CPP - Art. 155. "O Juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas ." 4. STJ [...] 1. Não se admite, no ordenamento jurídico pátrio, a prolação de um decreto condenatório fundamentado exclusivamente em elementos informativos colhidos durante o inquérito policial, no qual inexiste o devido processo legal (com seus consectários do contraditório e da ampla defesa), sendo certo que o juiz pode deles se utilizar para reforçar seu convencimento, desde que corroborados por provas produzidas durante a instrução processual ou desde que essas provas sejam repetidas em juízo. [...] ( AgRg no AREsp n. 142.591/DF, de minha relatoria, 6ª T., DJe 18/8/2015). destaquei. 5. Bem como, as provas constantes nos autos são insuficientes para comprovar que os fatos ocorreram da forma como narrados na denúncia, não se havendo falar em condenação enquanto não caracterizada, com absoluta certeza, eventual culpa atribuível do apelante. 6 . Recurso a que se dá provimento. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer do recurso para lhe dar provimento, nos termos do voto da Relatora. Fortaleza, 31 de agosto de 2017. DESEMBARGADORA MARIA EDNA MARTINS Presidente do Órgão Julgador e Relatora (TJ-CE - APL: 01352460620128060001 CE 0135246-06 .2012.8.06.0001, Relator.: MARIA EDNA MARTINS, 1ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 31/08/2017). Grifamos. APELAÇÃO CRIMINAL - ACIDENTE DE TRÂNSITO - HOMICÍDIO CULPOSO - CULPA - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO - ABSOLVIÇÃO - CONJUNTO PROBATÓRIO FRÁGIL - PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO - IMPOSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO COM BASE EM PRESUNÇÃO – NÃO HAVENDO CERTEZA DA CULPA, DEVE SER APLICADO O PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO – ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE - RECURSO PROVIDO. 1. Gerando dúvidas quanto a responsabilidade criminal é correta a aplicação do princípio do ‘in dúbio pro reo’, impondo-se a absolvição, máxime em se tratando de homicídio decorrente de circulação de veículo. 2. Para que haja condenação, faz-se imperiosa a certeza acerca da culpa, sendo insuficiente mera probabilidade. 3. Diante de insuperável dúvida quanto a culpa no homicídio, deve prevalecer o princípio universal do in dubio pro reo, isto é, a dúvida deve, sempre, favorecer o acusado. APELAÇÃO CONHECIDA E PROVIDA. (TJPR - 1ª C.Criminal - 0000738-47.2015.8.16.0161 - Sengés - Rel.: DESEMBARGADOR FABIO ANDRE SANTOS MUNIZ - J. 27.11.2021) (TJ-PR - APL: 00007384720158160161 Sengés 0000738-47.2015.8.16.0161 (Acórdão), Relator: Fabio Andre Santos Muniz, Data de Julgamento: 27/11/2021, 1ª Câmara Criminal, Data de Publicação: 29/11/2021). Grifamos. Destarte, tamanhas inconsistências na dinâmica dos fatos em relação ao suposto crime de tráfico de drogas leva à inexorável absolvição do réu por falta de provas suficientes a embasar um édito condenatório (art. 386, VII, do CPP), uma vez que a condenação de qualquer cidadão exige a mais absoluta certeza acerca da autoria e materialidade delitivas, não havendo espaço para qualquer dúvida, por menor que seja. Art. 386. O juiz absolverá o réu, mencionando a causa na parte dispositiva, desde que reconheça: VII – não existir prova suficiente para a condenação. Destarte, não resta outra alternativa a este Juízo que não seja absolver o réu por ausência de lastro probatório suficiente a embasar um édito condenatório, razão pela qual ABSOLVO o acusado ANTONIO JOSÉ PEREIRA DA SILVA da acusação de tráfico de drogas (art. 33 da Lei Federal nº 11.343/2006) ínsita na inicial acusatória ministerial. Entrementes, em relação ao outro delito, a condenação é medida que se impõe: Dispõe o art. 16, §1º, inciso II, da Lei n.º 10.826/03, que: Art. 16. Possuir, deter, portar, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob sua guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição de uso restrito, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar: Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. § 1º Nas mesmas penas incorre quem: I – suprimir ou alterar marca, numeração ou qualquer sinal de identificação de arma de fogo ou artefato. Com tal fórmula, expressas em diversos núcleos, objetivou o legislador ampliar o campo das incriminações e, obviamente, conferir maior efetiva proteção ao bem jurídico visado pela norma. Os dispositivos que hipotisam diversos núcleos ou condutas humanas, como na espécie, foram chamados na doutrina alemã de MISCHGESETZE (LEIS MISTURADAS). DELOGU e SANTORO usam a expressão normas penais conjuntas. MAGALHÃES NORONHA, por sua vez, os considera crimes de ação múltipla. Feitas essas considerações doutrinárias passo à análise das provas constante dos autos – luz guiadora do juiz - em busca de se fazer reluzir a verdadeira justiça, ideal democrático do Estado Social de Direito, porém de já colhendo a grande lição do mestre CARRARA que assim sentenciou: a certeza está em nós; a verdade está nos fatos. Daí ensinar o GUILHERME NUCCI que o objetivo da parte, no processo, não é gerar a verdade objetiva, visto ser uma atividade complexa e nem sempre possível, mas sim construir, no espírito do magistrado, a certeza de que verdade corresponde aos fatos por si alegados. No caso, agora adentrando no mérito, sem nenhuma sombra de dúvida, conseguiu a parte acusadora, com a produção da prova no bojo dos autos, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, demonstrar a certeza de que a verdade corresponde àquilo por si aduzido na peça vestibular, no sentido de que o acusado portava, sim, as armas de fogo descritas no laudo pericial de ID 135480886, dotadas de potencialidade lesiva, consoante se extrai do referido laudo pericial, embora desnecessário, vez que se trata de crime de perigo abstrato. Nesse sentido, diz a jurisprudência: PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. POSSE OU PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO. ATIPICIDADE DA CONDUTA. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. EXAME PERICIAL. DESNECESSIDADE. PRECEDENTES. 2. Os crimes de porte ou posse de arma de fogo de uso restrito são de perigo abstrato, dispensando-se prova de efetiva situação de risco ao bem jurídico tutelado. 3. O simples porte de arma de fogo, acessório ou munição, por si só, coloca em risco a paz social, porquanto o instrumento, independentemente de sua potencialidade lesiva, intimida e constrange as pessoas, o que caracteriza um delito de perigo abstrato. O tipo penal visa à proteção da incolumidade pública, não sendo suficiente a mera proteção à incolumidade pessoal (AgRg no REsp 1.434.940/GO, Rel. Min. Rogerio Schietti, Sexta Turma, DJe 4/2/2016). AgRg no AREsp 1264393/AL 2018/0062457-7. Rel. Min. NEFI CORDEIRO. T6. SEXTA TURMA. 18/09/2018, DJe 25/09/2018. Materialidade, portanto, bem patentada consoante prova pericial colacionada ao feito. No respeitante à autoria resta também bem pateteada, pois as testemunhas PMMA DANIEL JORGE DE CARVALHO, PMMA FRANCISCO YTHALLO GRAÇA FIGUEIREDO e PMMA LAELITON GOMES SOARES JÚNIOR, foram categóricos e uníssonos em afirmarem em seus depoimentos, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa que o réu forma abordado porque trazia consigo um volume suspeito na cintura, bem assim que ao ser abordado foi encontrado com ele os artefatos bélicos descritos no laudo pericial de ID 135480886, consoante consta em seus depoimentos cujas mídas seguem no bojo da audiência de ID 142551355. Provada, pois, a materialidade do referido delito e sua respectiva autoria, não existindo nenhuma causa de exclusão da ilicitude, impõem-se a procedência da denúncia com condenação do acusado, ANTONIO JOSE PEREIRA DA SILVA, nas sanções contidos no art. 16, §1º, inciso II, da Lei n.º 10.826/03 (porte ilegal de arma de fogo de uso restrito - numeração raspada ou suprimida), não calhando a tese sustentada pela Defesa de ilegalidade das provas constantes nos autos, conforme alhures explicitado. Assim, em face de todo o exposto e o mais que dos autos constam, JULGO PROCEDENTE, EM PARTE, a denúncia ministerial e, em consequência, condeno o acusado, ANTONIO JOSE PEREIRA DA SILVA, deveras qualificado, como incurso nas penas do art. 16, §1º, inciso II, da Lei n.º 10.826/03 (porte ilegal de arma de fogo de uso restrito - numeração raspada ou suprimida), ABSOLVENDO-O, com esteio no art. 386, VII, do CPP da imputação ministerial de ter supostamente praticado o delito de tráfico de drogas (art. 33 da Lei de Drogas). Por força do que dispõe o artigo 68 do Código Penal, em observância ao critério estabelecido no artigo 59 do mesmo codex penal, passo à dosimetria da pena e assim fazendo verifico que sua CULPABILIDADE, reconhecida como grau de reprovabilidade da conduta, ressoa normal aos crimes da espécie; nada nos autos existe a desabonar os seus ANTECEDENTES, embora conste um registro criminal, porém sem a mácula do trânsito em julgado, sendo, portanto, tecnicamente, primário e bem assim sua CONDUTA SOCIAL, tida como seu relacionamento no meio social, profissional e familiar, não merecendo ser valorada negativamente, em respeito a súmula 444/STJ; sua PERSONALIDADE, embora ausente laudo formatado por especialista da área, parece ser normal e própria dos homens normais; o MOTIVO do crime não foi esclarecido pelo que, assim, não merece valorização negativa; as CIRCUNSTÂNCIAS em que cometido também se apresentam como normais à espécie; CONCORRÊNCIA DA VÍTIMA se faz indiferente, posto que a sociedade e as CONSEQUÊNCIAS não restaram graves, pelo que fixo a pena base em 03 (TRÊS) ANOS DE RECLUSÃO e MULTA DE 10 (DEZ) DIAS-MULTA. Ingressando na segunda fase da dosimetria penal não vislumbro qualquer atenuante e mesmo que houvesse em nada alteraria a pena diante do inteiro teor da súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça, por sinal mantida vigente em recente julgamento no Supremo Tribunal Federal, e não havendo agravantes, mantenho, ao cabo desta fase, as penas inalteradas. Ingressando na terceira fase não encontro causa de diminuição ou aumento das mesmas, pelo que as torno DEFINITIVAMENTE em 03 (TRÊS) ANOS DE RECLUSÃO e MULTA DE 10 (DEZ) DIAS-MULTA. Considerando a situação econômica do acusado, arbitro o valor do dia-multa em 1/10 (um décimo) do salário-mínimo vigente à época do crime, porém corrigida monetariamente quando do seu efetivo pagamento. A pena privativa de liberdade imposta ao condenado deverá ser cumprida em estabelecimento penal adequado nesta comarca ou em outra qualquer, REGIME ABERTO, mediante as seguintes condições, de conformidade com o artigo 115 da lei de execução penal, sob pena de regressão. Condições do regime, além de outras, a critério do juízo da execução penal. a) recolher-se às dependências do local indicado pela Vara de Execução aos sábados, domingos e feriados, e dele somente sair, nos horários estabelecidos pela direção do referido estabelecimento, b) - não se ausentar desta comarca ou do lugar onde reside sem prévia autorização judicial; c) - comparecer mensalmente em Juízo para informar e justificar suas atividades; d) - exercer atividade laborativa lícita durante o período em que estiver fora da delegacia. A pena privativa será cumprida na forma acima, em caso de inobservância da substituição da mesma por restritivas de direito concernente em PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE e LIMITAÇÃO DE FINAL DE SEMANA, que ora procedo por entender inexistir óbice legal, na forma do contido no artigo 44, incisos I, II e III, do Código penal. A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE consistirá em tarefas gratuitas, junto a entidades assistenciais, escolas ou estabelecimentos congêneres, à razão de uma hora de tarefa por dia, assegurando-se ao condenado cumpri-la em menor tempo, desde que nunca inferior à metade da pena imposta, fixadas de modo a não prejudicar sua jornada normal de trabalho. A LIMITAÇÃO DE FIM DE SEMANA consiste na obrigação do condenado de permanecer aos sábados e domingos, por cinco horas diárias, em casa de albergado ou outro estabelecimento adequado, a critério da Vara de Execução Criminal. A pena de multa deverá ser paga no prazo de 10 (dez) dias depois do trânsito em julgado desta decisão e corrigida monetariamente. Condeno o acusado nas custas processuais, porém por estar assistido pela Defensoria Pública Estadual, presume-se pobre na acepção jurídica do termo, razão pela qual suspendo sua exigibilidade, pelo período de 5 (cinco) anos, quando então estará prescrita, cabendo ao titular do crédito, neste período, provando não mais subsistir as razões acima, adotar as medidas para recebimento de seu crédito. Após trânsito em julgado: a) – comunique-se à Justiça Eleitoral, à Secrataria de Seguranaça Pública Estadual e ao Instituto de Identificação, para os devidos fins, inclusive estatísticos, lançando o nome do réu no rol de culpados; b) – expeça-se a carta de guia, encaminhando-a à Vara de Execução Criminal competente, com a respectiva documentação pertinente. Uma vez que o feito encontra-se devidamente instruído e sentenciado, considerando ainda o quatum de pena aplicada ao réu (3 anos de reclusão), concedo ao ele o direito de recorrer em liberdade, revogando neste ato sua prisão cautelar. Expeça-se Alvará de Soltura, pondo o réu imediatamente em liberdade se por outro motivo não deva quedar-se preso. Façam-se as atualizações/anotações necessárias no BNMP. Junte-se uma cópia desta sentença no feito incidental de nº 0801936-13.2025.8.10.0029 (Pedido de Relaxamento/Revogação da Prisão Preventiva do réu), arquivando-o imediatamente pela perda superveniente de seu objeto. Defiro o pedido de incineração da droga apreendida e devidamente periciada, consoante requerido nos autos pela Autoridade Policial, nos termos do artigo 50, §3º da Lei de Drogas (Lei Federal nº 11.343/06). Determino a remessa ao Exército Brasileiro dos artefatos bélicos apreendidos nos autos e devidamente periciados, consoante determina a Lei Federal nº 10.826/2003 (Estatuo do Desarmamento). Sem custas. Ciência ao Ministério Público e a Defensoria Pública deste Estado. Após o trânsito em julgado, certifique-se e arquive-se este feito, com baixa na distribuição. PUBLIQUE-SE. REGISTRE-SE. INTIMEM-SE e CUMPRA-SE na forma, sob as penas da lei e com urgência, por se tratar de réu preso. Expedientes necessários. Caxias-MA, data do sistema. PAULO AFONSO VIEIRA GOMES JUIZ TITULAR
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