Processo nº 3001594-03.2024.8.06.0070
ID: 327729730
Tribunal: TJCE
Órgão: 2ª Vara Cível da Comarca de Crateús
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 3001594-03.2024.8.06.0070
Data de Disponibilização:
17/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
MARIO KEMPES LACERDA PEREIRA FILHO
OAB/CE XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA COMARCA DE CRATEÚS 2.ª VARA CÍVEL DE CRATEÚS Rua Jonas Gomes de Freitas, s/nº Bairro Campo Velho CEP 63701-235 Crateús - CE telefone (85) 81648265 Nº do pro…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA COMARCA DE CRATEÚS 2.ª VARA CÍVEL DE CRATEÚS Rua Jonas Gomes de Freitas, s/nº Bairro Campo Velho CEP 63701-235 Crateús - CE telefone (85) 81648265 Nº do processo: 3001594-03.2024.8.06.0070 Classe: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Assunto: [Indenização / Terço Constitucional] Promovente: Nome: DARLY KELEM LEITE DA SILVAEndereço: Rua Betrônio Frota, 443, Cidade Nova, CRATEúS - CE - CEP: 63705-886 Promovido(a): Nome: MUNICIPIO DE CRATEUSEndereço: CEL ZEZE, 1141, CENTRO, CRATEúS - CE - CEP: 63700-001 SENTENÇA 1.0) RELATÓRIO DARLY KELEM LEITE DA SILVA ajuizou Reclamação Trabalhista em face do Município de CRATEÚS/CE, objetivando o pagamento de verbas rescisórias que alega não ter recebido, quando de sua exoneração. A demandante alega que foi nomeada para exercer cargo comissionado na Secretaria de Meio Ambiente em 03/04/2017 e que foi exonerada no dia 29/05/2024, não tendo recebido durante todo o período trabalhado férias + 1/3 e 13º salário. Requereu, em razão disso, a condenação do município reclamado ao pagamento das verbas rescisórias. Citado, o município apresentou contestação no id. 112546806, alegando, preliminarmente, a prescrição quinquenal e a inépcia da inicial; no mérito, sustentou a nulidade do contrato e requereu a improcedência dos pedidos ou, subsidiariamente, a compensação com os valores já pagos pelo demandado, além da condenação da autora em litigância de má-fé. A parte autora não apresentou réplica (id. 136246877). Intimadas para dizerem se pretendiam produzir outras provas, as partes deixaram manifestaram desinteresse (ids. 138279004 e 150510812). É o relatório. Decido. 2.0) FUNDAMENTAÇÃO Da inépcia da inicial Rejeito a preliminar de inépcia da inicial, pois, na exordial, a parte autora discrimina as obrigações que pretende controverter, trazendo aos autos os extratos de pagamento (Id. 104681750). Assim, observou integralmente o disposto nos arts. 330, §§ 2º e 3º, do CPC/15, tendo sido igualmente atendidos os requisitos dos arts. 319 e 320 do CPC/15, o que possibilita o amplo exercício do contraditório por parte da ré. Ademais, os pedidos não são genéricos, uma vez que a parte autora especificou sua pretensão na inicial, permitindo, assim, o amplo contraditório. Da prescrição quinquenal No tocante à prescrição aplica-se o prazo de 05 (cinco) anos, de acordo com o previsto no art. 1º do Decreto 20.910/1932, segundo o qual: Art. 1º. As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem. A regra é expressa quanto à aplicabilidade indistinta do prazo prescricional quinquenal às pretensões contra a Fazenda Pública. Trata-se de norma especial que prevalece sobre a geral, mormente em casos como o dos autos, em que a verba postulada é decorrente de relação fundada em vínculo jurídico-administrativo e não de contrato de trabalho regido pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Nesse sentido: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO ORDINÁRIA DE COBRANÇA. VERBAS DECORRENTES DE CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. VÍNCULO JURÍDICO ADMINISTRATIVO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL REGIDA PELO DECRETO 20.910/1932. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS PROPORCIONALMENTE DISTRIBUÍDOS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1- Trata-se de apelação cível interposta pelo Município de Acopiara com o fim de obter a reforma da sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados em ação de cobrança proposta por ex-servidor temporário. 2- O art. 1º do Decreto 20.910/1932 é expresso quanto à aplicabilidade indistinta do prazo prescricional quinquenal às pretensões contra a Fazenda Pública e, por ser tratar de norma especial, prevalece sobre a geral, mormente em casos como o dos autos, em que a verba postulada é decorrente de relação fundada em vínculo jurídico-administrativo regulado por lei local (Lei Municipal n. 1.573/2010 e Decreto n. 002/2013), e não de contrato de trabalho regido pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). 3- O artigo 86 do CPC estabelece que se cada litigante for, em parte, vencedor e vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as despesas. A sentença, todavia, condenou somente o réu ao pagamento da verba honorária, razão pela qual merece reforma nesse ponto. 4- Recurso de apelação parcialmente provido. (TJCE, Apelação nº 0018808-31.2017.8.06.0029, 1ª Câmara de Direito Público, Rel. Des. Fernando Luiz Ximenes Rocha, data do julgamento: 15/07/2019) No caso presente, a ação foi proposta em 12/09/2024, de modo que restam acobertadas pela prescrição apenas as parcelas anteriores a 12/09/2019. Do mérito Na presente demanda, a requerente alega que o ente público municipal deixou de realizar o pagamento de férias + 1/3 e 13º salário, durante todo o período laborado, qual seja, 03/04/2017 a 29/05/2024. Para comprovar o vínculo, colaciona aos autos fichas financeiras e portarias com as nomeações (Ids. 104681748 e 104681750). Da análise dos documentos anexados pela autora, observa-se que há prova suficiente da existência do vínculo de trabalho alegado, bem como o recebimento de salários do ente público municipal. Sem levar em consideração o período abarcado pela prescrição, observa-se que o vínculo com o Poder Público foi do tipo comissionado durante o período reclamado. Inicialmente, destaca-se ser assegurado constitucionalmente aos servidores públicos, mesmo em se tratando de cargo em comissão, o direito ao recebimento de adicional de férias, por se tratar de conquistas sociais de todos os trabalhadores, consagrados no artigo 39, § 3º, da Constituição Federal, o qual determina a aplicação aos detentores de cargos públicos de determinados direitos inerentes aos trabalhadores urbanos e rurais, dentre eles o previsto no inciso XVII do artigo 7º da Carta Magna. Convém ressaltar que "os ocupantes de cargos em comissão, de livre nomeação e exoneração, são servidores públicos, tais quais o servidor efetivo, investidos mediante concurso público, razão pela qual fazem jus aos direitos previstos no art. 39, § 3º da CF/88, dentre os quais, férias, terço de férias e décimo terceiro salário" (Apelação Cível nº 0001393-51.2013.8.06.0069, relator o Desembargador Francisco Gladyson Pontes, Terceira Câmara de Direito Público, julgado em 22/8/2016. A jurisprudência dos tribunais pátrios vem se posicionando no sentido de que devem ser assegurados aos servidores ocupantes de cargos comissionados todos os direitos previstos no art. 39, § 3º, c/c o art. 7º da Constituição Federal, ou seja, os direitos trabalhistas previstos no art. 7º da Constituição Federal consagrados aos servidores públicos em geral. Nesse sentido, destacam-se os seguintes precedentes do TJCE: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL COMISSIONADA. DIREITO A FÉRIAS E TERÇO CONSTITUCIONAL. GARANTIA CONSTITUCIONAL. PRECEDENTES. AUSÊNCIA DE PROVA DO ADIMPLEMENTO PELO MUNICÍPIO. FAZENDA PÚBLICA VENCIDA. MAJORAÇÃO DE HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA PARA 15% (QUINZE POR CENTO) SOBRE O VALOR DA CONDENAÇÃO EM FACE DO NÃO PROVIMENTO RECURSAL (ART. 85, § 11 DO CPC/15). JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA NÃO ESPECIFICADOS EM SENTENÇA. JUROS FIXADOS COM BASE NO ART. 1º-F DA LEI Nº. 9.494/97 E IPCA-E A SER OBSERVADO COMO ÍNDICE DA CORREÇÃO MONETÁRIA. PRECEDENTES STJ E STF. RECURSO E REMESSA CONHECIDOS, APELO DESPROVIDO E REEXAME PARCIALMENTE PROVIDO. DECISÃO REFORMADA APENAS PARA CORRIGIR JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA, ALÉM DA MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Cuidam-se de Reexame necessário e Apelação Cível objetivando reforma da decisão promanada pelo douto Magistrado da 1ª Vara da Comarca de Aracati/CE que julgou parcialmente procedentes os pleitos exordiais, condenando a Municipalidade ao pagamento do décimo terceiro salário e indenizações de férias e 1/3 constitucional durante o período ali destacado (2014 e 2015). 2. Irresignado com o teor da decisão vergastada, o Ente Municipal aduz a possibilidade do não pagamento de férias, em virtude dos servidores comissionados não estarem amparados pelo Regime Jurídico Único, portanto, não havendo se falar em garantia dos direitos previstos no art. 7º da CRFB/88. 3. De pronto, colhe-se dos autos digitalizados que o Autor, ora Apelado, exerceu cargo em comissão junto ao Município de Aracati/CE (Procurador Adjunto), portanto, fazendo jus à percepção do décimo terceiro salário e das férias acrescidas de um terço - em razão de lhe ser aplicável o previsto no § 3º do art. 39 da Constituição da República -, cujo adimplemento, embora alegado, não restou comprovado pelo requerido, aqui Apelante. 4. Ademais, é pacífico na jurisprudência pátria que os direitos previstos no art. 39 e art. 7º da CRFB/88 não fazem qualquer distinção entre servidores efetivos ou aqueles providos em comissão, não havendo plausibilidade e amparo legal para o não pagamento da indenização de férias e 1/3 constitucional. [...] (TJ-CE - APL: 00135640620178060035 CE 0013564-06.2017.8.06.0035, Relator: LISETE DE SOUSA GADELHA, Data de Julgamento: 18/02/2019, 1ª Câmara Direito Público, Data de Publicação: 19/02/2019). CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO DE COBRANÇA. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL OCUPANTE DE CARGO EM COMISSÃO. EXONERAÇÃO. 13º SALÁRIO E FÉRIAS ACRESCIDAS DO TERÇO CONSTITUCIONAL. VERBAS TRABALHISTAS DEVIDAS. DIR EITOS CONSTITUCIONAIS ASSEGURADOS, CONFORME ART. 39, § 3º, DA CF/88. VALOR DA BASE SALARIAL. VARIAÇÃO DA REMUNERAÇÃO RECEBIDA À ÉPOCA. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS. LOCUPLETAMENTO INDEVIDO DO PODER PÚBLICO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. INOCORRÊNCIA. PERCENTUAL DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. FIXAÇÃO NA LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA (INCISO II, DO § 4º, DO ART. 85, DO CPC). JUROS DE MORA. REMUNERAÇÃO OFICIAL DA CADERNETA DE POUPANÇA E CORREÇÃO MONETÁRIA PELO IPCA-E. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. I. O cerne da demanda cinge-se em apreciar se é devido ao autor, que exercia cargo em comissão, o recebimento de 13º salários e férias, acrescidas do terço constitucional, bem como a remuneração relativa aos meses que exerceu sua atividade laboral e não recebeu a contraprestação devida. II. Os servidores ocupantes exclusivamente de cargos em comissão, embora não possuam cargos efetivos, detêm cargo público. A Lei Maior não impôs nenhuma diferenciação nesse ponto, de forma que não pode haver qualquer restrição, mesmo que por lei infraconstitucional, para a aplicação de dispositivos constitucionais. A Constituição Federal, em seu art. 39, § 3º, elenca quais são os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais previstos no art. 7º, que são aplicáveis aos servidores ocupantes de cargo público. Dentre os direitos trabalhistas estatuídos nesse dispositivo constitucional, estão os previstos no art. 7º, incisos VIII e XVII, da CF/88, relativos ao 13º salário e às férias. III. Não merece prosperar a determinação de pagamento com base no salário mínimo vigente à época, quando, a teor das fichas financeiras acostadas aos autos, verifica-se que a remuneração devida era bastante superior ao estabelecido na sentença recorrida. O pagamento nos referidos termos ocasionaria enriquecimento sem causa, bem como grave ofensa ao princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos. IV. Não é razoável que o exercício de cargo público não seja recompensado pela contraprestação correspondente, o que importaria o locupletamento indevido do Poder Público. É direito constitucional de todo trabalhador público o recebimento de salário pelo trabalho que desempenhou. V. O autor decaiu de parte mínima do pedido, de forma que o ente municipal deve suportar integralmente o ônus sucumbencial, nos termos do art. 86, parágrafo único, do CPC, bem como sua fixação, que ocorrerá consoante o disposto no § 3º, do art. 85, do CPC, deverá ser definida quando da liquidação da sentença, nos termos do inciso II, do §4º, do art. 85, do CPC [...] (TJ-CE - APL: 00015805920138060069 CE 0001580-59.2013.8.06.0069, Relator: INACIO DE ALENCAR CORTEZ NETO, Data de Julgamento: 17/12/2018, 3ª Câmara Direito Público, Data de Publicação: 17/12/2018). REMESSA NECESSÁRIA. DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RECLAMAÇÃO TRABALHISTA. INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA OBREIRA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. CARGO COMISSIONADO. EXONERAÇÃO. VERBAS DEVIDAS. ART. 39 § 3º C/C O ART. 7º, INCISOS VIII E XVII, AMBOS DA LEX MAGNA. PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. SENTENÇA A QUO REEXAMINADA E MODIFICADA QUANTO AO PERÍODO DA CONTRATAÇÃO E À ATUALIZAÇÃO DO VALOR DA CONDENAÇÃO. MEDIDA QUE SE IMPÕE. 1. De acordo com o entendimento jurisprudencial firmado pelo Pretório Excelso, através da decisão prolatada na ADI 3.395-MC, competência para processar e julgar as causas instauradas a partir da relação de trabalho firmada entre o Poder Público e o servidor é da Justiça Comum e não da Justiça do Trabalho. 2. O inciso II do art. 37 da Constituição Federal de 1988 prevê, in verbis, que "a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público e provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração". 3. O servidor em tela foi contratado pelo Município de Umari/CE para exercer o cargo comissionado de Diretor de Escola no período de 01º de fevereiro de 2010 a 30 de setembro de 2012. Em havendo exoneração, faz jus o mesmo às verbas constantes do elenco trazido pelo art. 39 § 3º c/c o art. 7º incisos, VIII e XVII do Estatuto Supremo, quais sejam: vencimentos inadimplidos, 13º salário e férias acrescidas do abono constitucional, todas proporcionais ao período da contratação, tendo em vista a inexistência de qualquer óbice para que assim se cumpra, sendo as aludidas verbas devidas pela Municipalidade, sob pena de inobservância do princípio do enriquecimento sem causa da Administração Pública. Precedentes desta egrégia Corte de Justiça Estadual. 4. A alegativa trazida pelo Município de que a relação entre o servidor exclusivamente comissionado e a Administração Pública não gera a obrigação, por parte dessa última, de adimplemento de verbas rescisórias em razão da exoneração, não procede, ante a previsão constitucional supra referida e por ter restado comprovado nos autos a ocupação do cargo em comissão sub examine [...] (TJ-CE - Remessa Necessária Cível: 00000092620158060217 CE 0000009-26.2015.8.06.0217, Relator: SÉRGIO LUIZ ARRUDA PARENTE PORT. 1494/2018, Data de Julgamento: 05/09/2018, 2ª Câmara Direito Público, Data de Publicação: 05/09/2018). Assim, ao servidor ocupante de cargo em comissão são assegurados os direitos constitucionais trabalhistas previstos no art. 39, § 3º, c/c art. 7º, todos da Constituição Federal, entre eles 13º salário, férias e o respectivo adicional, sob pena de enriquecimento indevido da Administração. Atualmente, é pacífico o entendimento de que, nas ações movidas para a cobrança de tais verbas, cabe à parte que proclama a inadimplência do ente público, única e tão somente, demonstrar a existência do vínculo funcional (art. 373, I, do CPC). Já ao ente público, por seu turno, recai o dever de comprovar o pagamento dos respectivos valores ou então a existência de qualquer outro fato extintivo, impeditivo ou modificativo do direito vindicado nos autos (art. 373, II, do CPC). Confira-se a jurisprudência: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. SALÁRIOS ATRASADOS. PROVA DO VÍNCULO. SÚMULA 7/STJ. INVERSÃO ÔNUS PROBANDI. IMPOSSIBILIDADE.1. Existência de vínculo da servidora com o Estado. Efetiva prestação de serviços. Incidência da Súmula 7/STJ.2. De acordo com o art. 333 do Código de Processo Civil, cabe ao autor demonstrar a veracidade dos fatos constitutivos de seu direito(inciso I); e ao réu, invocar acontecimento capaz de alterar ou eliminar as consequências jurídicas do fato invocado pela parte autora.3. Da análise do acórdão recorrido, verifica-se que o Município não trouxe qualquer prova de suas alegações, qual seja, a ausência de prestação de serviços da recorrida nos períodos ora reclamados. Nem uma folha de ponto e frequência, nem recibos de quitação, nada. Agravo regimental improvido.(STJ, 2ª T., AgRg no AREsp n. 30.441/MG, rel. Ministro Humberto Martins, j. 25/10/2011, DJe de 4/11/2011.) Trata-se da aplicação da Teoria da Carga Dinâmica da Prova, segundo a qual o ônus probatório deve ser imputado à parte que, dadas as circunstâncias existentes, tenha melhores condições para dele se desincumbir. De fato, é bem mais simples ao ente público, que deve ter pleno controle dos dados relativos à vida funcional de todos os integrantes de seus quadros, fazer prova da inexistência de direito pleiteado por servidor. Examinando os autos, em especial os documentos anexados à inicial, observa-se que há prova suficiente da existência do vínculo comissionado com o ente público demandado, bem como o recebimento de salários. Da análise, mostra-se incontroversa a admissão da autora pelo Município de Crateús/CE nos anos de 2019 a 2024, fato este não contestado pelo requerido, bem como demonstrado pelos documentos juntados pela parte autora. Entretanto, não há que se falar em direito ao pagamento de verbas exclusivas da relação celetista de trabalho. Nem todos os direitos constitucionalmente reconhecidos ao trabalhador celetista (CF, art. 7º) são extensíveis ao servidor regido por vínculo estatutário, que, ao contrário, somente se beneficia daqueles direitos elementares mencionados no art. 39, § 3º da CF/88. Assim sendo, NÃO HÁ, pois, durante esse período, o direito ao pagamento do dobro das férias não usufruídas, nem FGTS e a respectiva multa, posto que tais verbas constituem direito essencialmente celetista. Não são devidas, também, pelo mesmo motivo, multas como as dos arts. 467 e 477 da CLT e demais verbas típicas da relação empregatícia. Todavia, a condenação do Município réu ao pagamento das verbas referentes às férias simples (integrais e proporcionais) não gozadas, adicionadas do terço constitucional é medida que se impõe, como já mencionado linhas acima (art. 39, § 3º, c/c art. 7º). No caso, incumbia ao ente público demonstrar que realizou o pagamento da integralidade dos valores devidos, no que toca às férias e ao terço constitucional, apresentando comprovantes de quitação ou outros elementos aptos a extinguir, impedir ou modificar o direito vindicado pela ex-servidora, o que, no entanto, não ocorreu no presente feito. Nesse contexto, demonstrado o vínculo entre a parte autora e o ente público (Ids. 104681750), e ante a ausência de prova do pagamento das parcelas supramencionadas, entende-se que a parte autora faz jus ao recebimento do valor referente às férias simples (integrais e proporcionais) não gozadas, adicionadas do terço constitucional referentes ao período laborado entre 03/04/2017 e 29/05/2024 (id. 104681750), ressalvados eventuais valores comprovadamente pagos pelo município e aqueles atingidos pela prescrição (anteriores a 12/09/2019). No caso em comento, o direito de férias da parte autora é regido pela Lei Complementar Municipal nº 665/2018 (Estatuto dos Servidores Públicos do Município de Crateús), que dispõe em seus artigos 56 e 57 o seguinte: Art. 56 - O servidor gozará, anualmente, 30 (trinta) dias de férias. § 1º - Para o primeiro período aquisitivo de férias serão exigidos 12 (doze) meses de exercício. Art. 57 - Após cada período de 12 (doze) meses de vigência do contrato de trabalho, o empregado terá direito a férias, na seguinte proporção: I - 30 (trinta) dias corridos, quando não houver faltado ao serviço mais de 5 (cinco) vezes; II - 24 (vinte e quatro) dias corridos, quando houver tido de 6 (seis) a 14 (quatorze) faltas; III - 18 (dezoito) dias corridos, quando houver tido de 15 (quinze) a 23 (vinte e três) faltas; IV - 12 (doze) dias corridos, quando houver tido de 24 (vinte e quatro) a 32 (trinta e duas) faltas. Conforme disposto no artigo 56, o servidor somente adquire o direito de gozar 30 (trinta) dias de férias se cumpridos os 12 (doze) meses de exercício exigidos na legislação e quando não houver mais de 5 (cinco) faltas em seu registro, conforme o artigo 57 do mesmo diploma. A autora, no presente caso, não possui nenhuma falta registrada, fazendo jus ao período de 30 (trinta) dias anuais para suas férias. Considerando o que dispõe o artigo 56 do Estatuto dos Servidores Públicos do Município de Crateús, o período aquisitivo iniciou-se em 13 de setembro de 2019, implementando-se, em conseguinte, doze meses após (setembro/2020) - e assim sucessivamente. Logo, considerando que a autora foi exonerada em 29 de maio de 2024, ela faz jus à conversão em pecúnia de quatro períodos de férias integrais vencidas e não gozadas e férias proporcionais do ano de 2024, com o acréscimo de 1/3, observada a remuneração na data da implementação do período aquisitivo. Repita-se: o cálculo da indenização deverá considerar a remuneração que o servidor auferia quando adquiriu o direito. No caso dos autos, as remunerações a serem consideradas são as seguintes: a) 2020: R$ 1.248.62 (mil e duzentos e quarenta e dois reais e sessenta e dois centavos); b) 2021: R$ 1.251,27 (mil duzentos e cinquenta e um reais e vinte e sete centavos); c) 2022: R$ 1.566.47 (mil quinhentos e cinquenta e seis reais e quarenta e sete centavos); d) 2023: R$ 2.200.00 (dois mil e duzentos reais); e) 2024: R$ 2.200.00 (dois mil e duzentos reais); Ressalte-se que incumbia ao ente público demonstrar que realizou o pagamento da integralidade dos valores devidos, no que toca às férias e ao terço constitucional, conforme discriminado acima, apresentando comprovantes de quitação ou outros elementos aptos a extinguir, impedir ou modificar o direito vindicado pela ex-servidora, o que, no entanto, não ocorreu no presente feito. No que toca ao 13º salário, embora o vínculo exercido pela autora assegure tal direito, no caso, verifico que apenas não foi realizado o pagamento do 13º salário proporcional do ano de 2024, sendo, portanto, devida referida verba apenas com relação a esse período Nesse contexto, demonstrado o vínculo entre a parte autora e o ente público, e ante a ausência de prova do pagamento das parcelas supramencionadas, entende-se que a parte autora faz jus ao recebimento do valor referente às férias simples (integrais) não gozadas, adicionadas do terço constitucional referentes aos períodos aquisitivos laborados descritos na tabela acima, ressalvados eventuais valores comprovadamente pagos pelo município e aqueles atingidos pela prescrição. Dos consectários legais Conforme Emenda Constitucional nº 113, que entrou em vigor em 09 de dezembro de 2021, a atualização monetária de toda e qualquer condenação que envolva a Fazenda Pública deve observar a taxa do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), única e exclusivamente. Art. 3º Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.(grifei) Tal normatização estabelece o acúmulo da correção monetária e dos juros de mora apenas pelo índice da Taxa SELIC. Importante frisar que os efeitos da lei são imediatos, mas ex nunc. Assim, apenas as parcelas vencidas a partir 09.12.2021 serão atualizadas pelo novel critério. Aos períodos anteriores, de acordo com o Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça, aplicam-se: - IPCA-E à correção monetária; - Índice da caderneta de poupança para os juros de mora; Caso dos autos Na hipótese tablada, não se pode desconsiderar que a citação foi posterior à entrada em vigor da EC 113/21. Sucede que a EC 113/2021 incorporou, na Selic (índice que não pode ser fragmentado), a correção monetária e os juros de mora, conjuntamente. Nessa perspectiva, considerando que a Selic agrega tanto a correção monetária como os juros de mora, é de se reconhecer que ela somente deve incidir quando a Fazenda Pública tiver sido constituída em mora. Não fosse assim, estar-se-ia aplicando um índice - que engloba a correção monetária e a mora - antes mesmo da perfectibilização da mora, o que, por certo, vai de encontro ao próprio objetivo da norma, que é a aglutinação da correção monetária e dos juros na SELIC. Dito de outro modo: tendo em conta o quanto disposto no art. 3° da EC 113/2021, a incidência da Selic, no caso dos autos, pressupõe a citação da Fazenda Pública, por corresponder ao momento em que o ela foi constituída em mora. E não poderia ser diferente, já que, em última análise, a Selic é um índice não passível de fragmentação e que, por força da EC 113, abrange tanto a correção monetária como os juros de mora. Em razão dessas considerações, as parcelas vencidas deverão ser corrigidas monetariamente, pelo IPCA, desde o momento em que deveriam ser sido pagas (vencimento das férias) até a citação da Fazenda Pública. Após a citação (e consequente constituição em mora), as quantias deverão acrescidas unicamente pela SELIC. III - DO DISPOSITIVO Ante o exposto, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido autoral para condenar o Município de Crateús/CE a pagar à parte autora: a) o valor correspondente às férias simples (integrais e proporcionais) não gozadas, adicionadas do terço constitucional referentes ao período laborado entre 03/04/2017 e 29/05/2024 (id. 104681750), ressalvados eventuais valores comprovadamente pagos pelo município e aqueles alcançados pela prescrição quinquenal (12/09/2019) contada do ajuizamento da ação (12/09/2024); b) a quantia devida a título de 13º salário proporcional (janeiro a maio) do ano de 2024 (id. 104681750 - fl. 08). As quantias deverão ser corrigidas pelo IPCA desde a data em que deveriam ter sido pagas até a citação; após a citação, deverá haver a incidência exclusiva da taxa SELIC (que abrange a correção monetária e os juros de mora), tudo a ser apurado em sede de liquidação e cumprimento de sentença. Haja vista a sucumbência recíproca, condeno as partes ao pagamento dos honorários advocatícios recíprocos, cuja porcentagem deverá ser definida quando da liquidação do julgado, com fulcro no art. 85, §4º, II, do CPC. A obrigação da parte autora fica suspensa, haja vista ser beneficiária da gratuidade judiciária. Isenção de custas, conforme art. 5º da lei estadual 16.132/2016. Fica dispensado o reexame necessário, a teor do artigo 11 da Lei 12.153/09). Com o trânsito em julgado, promova-se o arquivamento com baixa definitiva. Publique-se. Registre-se. Intime-se. Expedientes necessários. Crateús, datado e assinado eletronicamente. Jaison Stangherlin Juiz de Direito
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