Processo nº 5714549-97.2024.8.09.0137
ID: 337061846
Tribunal: TJGO
Órgão: 3ª Câmara Criminal
Classe: PROCEDIMENTO ESPECIAL DA LEI ANTITóXICOS
Nº Processo: 5714549-97.2024.8.09.0137
Data de Disponibilização:
29/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
WELLINGTON CAMPOS ALVES
OAB/GO XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
Gabinete do Des. Donizete Martins de Oliveira
3ª Câmara Criminal
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5714549-97.2024.8.09.0137
COMARCA :R…
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça do Estado de Goiás
Gabinete do Des. Donizete Martins de Oliveira
3ª Câmara Criminal
APELAÇÃO CRIMINAL Nº 5714549-97.2024.8.09.0137
COMARCA :RIO VERDE
APELANTE :RONALDO MARTINS ROCHA
APELADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS
RELATOR : Des. DONIZETE MARTINS DE OLIVEIRA
VOTO
Consoante visto no relatório, insurge o apelante RONALDO MARTINS ROCHA contra a sentença que julgou parcialmente procedente a pretensão punitiva deduzida na denúncia absolvendo-o do crime de Associação para o Tráfico e condenou-o nas sanções penais do artigo 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, após aplicada a causa de diminuição (delação premiada art.41 da Lei 11.343/06), à pena privativa de liberdade definitiva total de 1 (um) ano e 1 (um) mês de reclusão, a ser cumprida em regime inicial aberto, substituída posteriormente, por 02 (duas) restritivas de direitos, além do pagamento de 112 dias-multa, com o valor unitário fixado na fração de 1/30 (um trigésimo) do salário-mínimo vigente à época do fato criminoso.
Decretou o perdimento do bem apreendido (um veículo VW/GOLF 2.0 PLUS, placa: JGI0I16, Chassis n: 9BWAB01J544032842).
Pretende a defesa (mov. 181), em preliminar, a nulidade das buscas pessoal e veicular e, de consequência, a sua absolvição por insuficiência de prova (artigo 386, VII, do Cód. Proc. Penal); no mérito, pleiteia a reformulação da dosimetria com a aplicação do tráfico privilegiado; a restituição do bem apreendido (mov. 189).
1. Da admissibilidade:
Recurso próprio (art. 593, inciso I, do CPP) e tempestivamente interposto. Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, dele conheço.
2. Das preliminares:
2.1. Da nulidade da prisão em flagrante e das provas dele advindas por violação da privacidade:
Ressai dos autos que, preliminarmente, a celeuma inicial proposta a este grau recursal reside no reconhecimento da legalidade ou não do procedimento adotado pelos policiais militares durante a prisão em flagrante, ao realizarem busca no domicílio dos recorrentes.
Para fins de contextualização, infere-se da peça acusatória que:
“ … no dia 23 de julho de 2024 (23.07.2024), por volta das 23h30: (a) no estabelecimento comercial situado na Praça Carolina Leão Veloso, Qd. 25, Lt. 08, Conjunto Morada do Sol, neste Município de Rio Verde-GO, os denunciados RONALDO MARTINS ROCHA e RAFAEL ANDRÉ DOS SANTOS JÚNIOR, agindo com consciência e vontade e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, traziam consigo, para fins de difusão ilícita, 02 (duas) porções de "maconha", com massa bruta total de 21,659g (vinte e um gramas e seiscentos e cinquenta e nove miligramas), e 04 (quatro) porções de "maconha", com massa bruta total de 27,516g (vinte e sete gramas e quinhentos e dezesseis miligramas); e, (b) na residência situada na Rua JA-15, Qd. 40, Lt. 06, Conjunto Maurício Arantes, neste Município de Rio Verde-GO, o denunciado RONALDO MARTINS ROCHA, agindo com consciência e vontade e em desacordo com determinação legal ou regulamentar, mantinha em depósito e/ou guardava, para fins de difusão ilícita, 02 (duas) porções de "maconha", com massa bruta total de 16,109g (dezesseis gramas e cento e nove miligramas), e 02 (duas) porções de "maconha", com massa bruta total de 432,848g (quatrocentos e trinta e dois gramas oitocentos e quarenta e oito miligramas), no que concorreu o denunciado RAFAEL ANDRÉ DOS SANTOS JÚNIOR … .
… Aflora-se que no dia 23 de julho de 2024 (23.07.2024), por volta das 23h30, Policiais Militares estavam em patrulhamento pela Praça Carolina Leão Veloso, ocasião em que visualizaram dois indivíduos desembarcarem de um veículo VW/Golf de cor preta em uma distribuidora de bebidas. Nota-se que, ato contínuo, os Agentes Públicos constataram que o referido veículo possuía características coincidentes às de um automóvel furtado na noite anterior. Diante disso, procedeu-se à abordagem dos indivíduos, identificados posteriormente como os denunciados Ronaldo Martins Rocha e Rafael André dos Santos Júnior, para averiguação. Observa-se que, em buscas pessoais, foram encontradas, no interior do bolso da bermuda do denunciado Ronaldo Martins Rocha, 02 (duas) porções de " maconha", cerca de 21,659g (vinte e um gramas e seiscentos e cinquenta e nove miligramas). Encontrada, também, 04 (quatro) porções de "maconha", cerca de 27,516g (vinte e sete gramas e quinhentos e dezesseis miligramas), em poder do denunciado Rafael André dos Santos Júnior, precisamente dentro do bolso da calça . ...” (mov. 58).
É certo que o Poder de Polícia Administrativa autoriza a fiscalização do trânsito, conforme estabelecido especialmente nos arts. 19 a 25-A do CTB e, nesta condição, não depende da existência de indícios da prática de algum ilícito para promover a fiscalização de trânsito, porque a condução de veículos automotores é prática que exige o preenchimento de requisitos regulamentares prévios (por exemplo, a habilitação) e sujeita os motoristas à fiscalização rotineira quanto ao cumprimento dessas condições, diferente da livre circulação de pedestres no espaço público, em que o cidadão para ser abordado deve anteceder a existência da fundada suspeita.
As medidas administrativas de fiscalização diferem das buscas veiculares ou das buscas pessoais em condutores, porque estas se destinam a apurar a eventual posse de corpo de delito e têm fundamento processual penal (art. 244 do CPP) e, para as quais é exigida a fundada suspeita.
Constata-se que a Polícia Militar, no momento da prisão em flagrante do apelante, não exercia uma atividade de fiscalização coletiva, mas sim individual e, mais ainda, não averiguaram, a partir da visualização da placa do veículo suspeito de furto, para constatar se realmente se trata do mesmo veículo e, menos ainda, ao abordarem, ainda que movidos da suspeita de ser o carro furtado, não solicitaram a documentação do motorista e do veículo, ao contrário, executaram, de pronto, a busca pessoal e veicular.
Diante destes fatos, não há como negar a ilegalidade das diligências de busca pessoal e veicular, impondo o reconhecimento da ausência da fundada suspeita.
É certo que a polícia militar tem o poder ostensivo e o dever de preservar a ordem e, neste contexto pode acumular a função de fiscalizar o trânsito (CF/88 art. 144, § 5ª; CTB, art. 23), todavia, este poder não autoriza a abordagem aleatória, com exceção para os casos de blitz, mas ainda nesta situação, não são admitidas a busca pessoal e a veicular motivadas apenas em presunção, exige-se a fundada suspeita.
No caso em apreço, não houve motivação plausível para abordagem, porque não ocorreu em razão da constatação de que se tratava de um carro furtado, mas tão somente pela hipótese ou presunção de que se tratava do mesmo veículo furtado na noite anterior, fato que, por óbvio, poderia e deveria ter sido precedido obrigatoriamente da checagem da documentação ou da consulta da placa do veículo; porém, o contrário se deu e, os policiais admitiram tal situação em seus depoimentos, pois afirmaram que não fizeram a pesquisa do registro do veículo para verificar restrições de furto, mas simplesmente, promoveram a abordagem pelo tão só fato do apelante e de Rafael terem estacionado o veículo na frente da Distribuidora de Bebida, pautando-se na presunção das distribuidoras, da cidade de Rio Verde, serem indistintamente, pontos de tráfico de drogas.
Vejam-se os depoimentos dos policiais Éverton Silva do Nascimento e João Paulo Evangelista:
“… no dia dos fatos, a equipe estava em patrulhamento no Setor Morada do Sol e me lembro que tinha um veículo do modelo que eles tavam usando, se não me engano era um golf, da cor preta, que uns dias antes da nossa abordagem lá, era um caráter geral, que havia sido furtado, ai a gente foi fazer a averiguação do veículo que tinha parado na frente de uma Distribuidora, realizaram abordagem e em busca pessoal encontraram entorpecentes nos bolsos dos denunciados. … quando eles viram a viatura, a gente foi averiguar o golf e quando eles viram a viatura, eles tentaram disfarçar “alguma situação” e aí eles foram dar uma disfarçada na bebida gelada. Ai tipo assim, a gente acho estranho, pelo local que eles pararam ali. Eles pararam o veículo, desceram e focaram do lado de fora e quando eles viram a viatura eles se dirigiram para a bebida gelada e aí ficou mais suspeito ainda, porque a gente foi fazer a averiguação do carro e abordou eles. Uai, por ser uma praça, ali na esquina da praça né, querendo ou não a gente encontra ali, corriqueiro, porque o pessoal usa esses locais de grande movimento e que não chama atenção, facilitando a entrega, eles param ali, fica ali, faz a entrega e saem. Por ser uma praça e ter distribuidora, grande movimentação e fluxo de pessoas, é um local propício para o tráfico. É deu a entender que eles pararam ali e pra gente não abordada eles, foram pra bebida gelada, como se estivessem comprando alguma coisa. A averiguação foi feita com a abordagem, a gente faz a abordagem, verificamos os dados pessoais, os dados do veículo, é claro que depois da busca pessoal, primeiro fazemos a busca pessoal … É, o veículo não era o furtado não. Os réus não eram conhecidos no meio policial. A abordagem ocorreu pra verificar o veículo e, primeiro realizaram a busca pessoal, fizeram a verificação da identidade dos denunciados e, só então, verificaram o veículo ...” (mídia digital mov.137 – Éverton).
“ … no dia dos fatos a gente tava na região de patrulhamento e... na relação de caráter geral, relacionado a furtos e notificação de veículos, tinha a anotação de um veículo marca golf, na cor preta e com as características do que a gente abordo. A gente visualizo eles descendo do veículo, aparentemente com as características evidentes do veículo envolvido a crime, dias anteriores e daí a gente realizou a abordagem dos mesmos. A situação da abordagem ali e a situação de … tinha uma suspeição, o que indicou a equipe policial a abordagem, foi justamente o veículo característico, né, tá envolvendo essa situação de crime em dias anteriores e, na abordagem policial a gente tem um procedimento operacional padrão onde você aborda primeiro a pessoa, faz a busca primeiro, entendeu e, depois a gente qualifica a pessoa, não nós sabemos se a pessoa tem ali um mandado de prisão em seu desfavor … . … É assim, o padrão é, primeiro realiza as buscas pessoais e depois qualificam os abordados. Os acusados foram bem colaborativos ...”(mídia digital mov.137 - João Paulo).
Dos depoimentos acima degravados, percebe-se que nenhum dos policiais detalha a atitude suspeita do Ronaldo e do Rafael, simplesmente, admitem que fizeram a abordagem em razão do carro possuir as mesmas características do veículo furtado dias antes e, porque o local é propício para realizar o tráfico, mas nenhum deles menciona ser um local conhecido como ponto de traficância; e, um dos policiais fala que os suspeitos teriam caminhado até a Distribuidora para tentar disfarçar “alguma situação”.
Os policiais não relatam que Ronaldo e Rafael esboçaram alguma reação emocional ou física e, somente dizem que eles pararam na praça e se digiram para a distribuidora e, por presunção entenderam que seria para disfarçar ou despistar da abordagem.
Assim, constata-se que a abordagem, em análise, adveio de deduções, não de situações concretas, os policiais agiram por presunção, promovendo a busca pessoal do motorista, dos passageiros e a busca veicular e, sequer, antes, verificaram se era o veículo com registro de furto, ou seja, está patente a ausência da fundada suspeita.
Na questão em estudo, impõe-se reconhecer patente a caracterização da busca probatória (“fishing expedition” ou pesca probatória), na qual, ausente a fundada suspeita, exigida para a busca pessoal do condutor e para a busca no veículo, porque não se admite o “vasculhar” para obter provas incriminadoras, sem um objetivo claro, além do propósito de incriminar o sujeito, durante a realização da diligência.
Neste sentido, destaco:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. BUSCA VEICULAR E/OU PESSOAL. NERVOSISMO. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. BLITZ E ABORDAGEM DE TRÂNSITO X BUSCA VEICULAR. TRANCAMENTO DO PROCESSO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Segundo o disposto no art. 244 do Código de Processo Penal, " A busca pessoal independerá de mandado, no caso de prisão ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, ou quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar". 2. Por ocasião do julgamento do RHC n. 158.580/BA (Rel. Ministro Rogério Schietti, 6ª T, DJe 25/4/2022), a Sexta Turma desta Corte Superior de Justiça, à unanimidade, propôs criteriosa análise sobre a realização de buscas pessoais e apresentou como conclusões, no que interessa: a) Exige-se, em termos de standard probatório para busca pessoal ou veicular sem mandado judicial, a existência de fundada suspeita (justa causa) - baseada em um juízo de probabilidade, descrita com a maior precisão possível, aferida de modo objetivo e devidamente justificada pelos indícios e circunstâncias do caso concreto - de que o indivíduo esteja na posse de drogas, armas ou de outros objetos ou papéis que constituam corpo de delito, evidenciando-se a urgência de se executar a diligência [...]. c) Não satisfazem a exigência legal, por si sós, meras informações de fonte não identificada (e.g. denúncias anônimas) ou intuições/impressões subjetivas, intangíveis e não demonstráveis de maneira clara e concreta, baseadas, por exemplo, exclusivamente, no tirocínio policial. Ante a ausência de descrição concreta e precisa, pautada em elementos objetivos, a classificação subjetiva de determinada atitude ou aparência como suspeita, ou de certa reação ou expressão corporal como nervosa, não preenche o standard probatório de "fundada suspeita" exigido pelo art. 244 do CPP [...]. 3. No caso, a busca realizada no automóvel do réu foi justificada com base apenas na alegação vaga de que ele haveria demonstrado nervosismo extremado ao ser parado em fiscalização de rotina, o que por si só, não configura fundada suspeita de posse de corpo de delito apta a validar a revista, conforme entendimento consolidado nesta Corte Superior. 4. As blitzes de trânsito e as buscas veiculares são medidas que têm fundamentos, alcances e regimes jurídicos diversos, de modo que não podem ser equiparadas. Uma blitz de trânsito é a denominação popularmente atribuída a um bloqueio viário policial, que tem fundamento no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) e leva o motorista que o romper a incorrer na prática de infração de trânsito grave ou gravíssima (respectivamente, arts. 209 e 210 do CTB). Sua finalidade é fiscalizar o cumprimento de normas de trânsito, principalmente a vedação a dirigir sob o efeito de álcool ou outras substâncias entorpecentes, embora também possa ter por objeto o controle da observância de outras disposições do CTB. 5. A realização de uma blitz de trânsito, assim como a de abordagens pontuais de condutores no trânsito (isto é, independentes da existência de uma blitz), têm amparo no poder de polícia administrativa para fiscalização do trânsito, conforme estabelecido especialmente nos arts. 19 a 25-A do CTB. Dessa forma, não dependem da existência de indícios da prática de algum ilícito, porque, diferentemente da livre circulação de pedestres no espaço público, a condução de veículos automotores é prática que exige o preenchimento de requisitos regulamentares prévios (por exemplo, a habilitação) e sujeita os motoristas à fiscalização rotineira quanto ao cumprimento dessas condições. Essas medidas, portanto, são diferentes das buscas veiculares ou buscas pessoais em condutores, que se destinam a apurar a eventual posse de corpo de delito e têm fundamento processual penal (art. 244 do CPP). 6. Uma vez que, no caso, não ficou demonstrada a existência de fundada suspeita de posse de corpo de delito para a realização da busca veicular e pessoal, conforme exigido pelo art. 244 do CPP, deve ser reconhecida a ilicitude da apreensão de arma e de munições e, por consequência, de todas as provas derivadas, com o consequente trancamento do processo. 7. Agravo regimental não provido. (AgRg no RHC n. 178.809/GO, relator Ministro Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe de 22/5/2024).
Nessa esteira de considerações, forçoso acolher as súplicas do pleito defensivo pela ilegalidade da busca pessoal e veicular que culminou na apreensão de entorpecente, porque realizadas na ausência de fundadas razões e, portanto, trata-se de procedimento ilegal.
Além do mais, impende salientar encaixilhável, ao caso, a Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada, na qual se tem que a instrução processual não convalida a prova ilícita na origem, tornando nulas as provas dela decorrentes e as subsequentes, nos termos do artigo 157, § 1º, do Código de Processo Penal.
Neste sentido, cito ementa de minha lavra entre outras:
APELAÇÃO CRIMINAL. RECEPTAÇÃO. NULIDADE DAS PROVAS. FALTA DE FUNDADAS RAZÕES PARA REALIZAÇÃO DE BUSCA PESSOAL. VIOLAÇÃO DE GARANTIA CONSTITUCIONAL. DEMAIS TESES PREJUDICADAS. 1. Conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça, deve haver fundadas razões para a abordagem policial e posterior busca pessoal, circunstância não evidenciada nos presentes autos, porque ficou comprovado que o suspeito estava apenas e tão somente com o veículo estacionado para trocar o pneu e, portanto, declarada a nulidade da prospecção da prova, nos termos do artigo 157, § 1º, do Código de Processo Penal e com a aplicação da Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada. Reconhecida a ilegalidade das provas, a absolvição do apelado é medida que se impõe e as demais matérias restam prejudicadas. APELO CONHECIDO E PROVIDO. (TJGO, Apelação Criminal 0099538-80.2018.8.09.0006, Rel. Des. Donizete Martins de Oliveira, 4ª Câmara Criminal, julgado em 19/03/2024, DJe de 19/03/2024).
“APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. NULIDADE PROCESSUAL. ILICITUDE DAS PROVAS. BUSCA PESSOAL E BUSCA VEICULAR. ATITUDES SUSPEITAS. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. AUSÊNCIA DE FUNDADAS RAZÕES. OFENSA AO ARTIGO 5º, INCISO XI, CF/88. ABSOLVIÇÃO. 1. Um processo penal efetivamente garantidor deve trazer ínsita a certeza de que ao acusado, apesar do crime supostamente praticado, deve ser garantido o usufruto de seus direitos previstos especialmente na Constituição Federal/88. 2. Revelam-se inadmissíveis os elementos probatórios a que os órgãos estatais somente tiveram acesso em razão da prova originariamente ilícita. PARECER DESACOLHIDO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARA ABSOLVER O APELANTE EM RAZÃO DA NULIDADE DAS PROVAS OBTIDAS POR MEIO ILÍCITO.” (TJGO, Apelação Criminal 0133095-73.2018.8.09.0001, Rel. Des(a). CARMECY ROSA MARIA ALVES DE OLIVEIRA, Abadiânia - Vara Criminal, DJe de 10/03/2023).
“APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO. POSSE DE ARMA DE FOGO DE USO RESTRITO. USO DE DOCUMENTO FALSO. CORRUPÇÃO ATIVA. NULIDADE DE TODAS AS PROVAS DERIVADAS DO FLAGRANTE ILEGAL. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. 1- Segundo a orientação dos Tribunais Superiores, exige-se standard probatório mínimo para ensejar a revista pessoal e veicular sem mandado judicial, necessária a comprovação de fundada suspeita quanto à existência de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito (CPP; arts. 240, § 2º, e 244). 2- No caso vertente, não tendo sido encontrado nada de ilícito foi em poder dos apelados na primeira revista, conclui-se que não houve justa causa para autorizar uma nova busca, em curto lapso temporal. Assim, evidenciada a nulidade da segunda diligência efetivada e das provas derivadas, impositiva a manutenção da absolvição, nos termos do artigo 386, inciso II, do Código de Processo Penal. 3- Recurso conhecido e desprovido.” (TJGO, Apelação Criminal 0010177-30.2018.8.09.0175, Rel. Des. J. PAGANUCCI JR., 1ª Câmara Criminal, julgado em 08/05/2024, DJe de 08/05/2024).
Verificada a ausência de fundadas razões para as buscas pessoal e veicular, é necessário concluir que todas as provas derivadas da violação de privacidade devem ser consideradas ilícitas, nos termos da teoria dos frutos da árvore envenenada (previsto no art. 5º, LVI, da Constituição Federal), de modo que a absolvição do acusado é medida correta.
A respeito:
“ DIREITO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. BUSCA PESSOAL SEM FUNDADA SUSPEITA. ILICITUDE DA PROVA. NULIDADE DAS PROVAS OBTIDAS E DERIVADAS. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. […]. A mera presença de indivíduos em via pública ou o descarte de objetos não constitui, por si só, motivo suficiente para justificar a medida. 4. A jurisprudência desta Corte é pacífica ao afirmar que a busca pessoal não pode ser baseada em intuições ou impressões subjetivas dos agentes, sendo imprescindível que haja elementos concretos e objetivos que justifiquem a suspeita. No caso concreto, não foi demonstrada qualquer atitude prévia que configurasse fundada suspeita, sendo a abordagem motivada por meras circunstâncias subjetivas e indefinidas, conforme o julgamento no HC n. 158.580/BA. 5. Dada a inexistência de justa causa para a abordagem e a ilicitude da prova originária, todas as provas obtidas em decorrência direta ou indireta dessa busca pessoal devem ser consideradas nulas, conforme o princípio da " teoria dos frutos da árvore envenenada" previsto no art. 5º, LVI, da Constituição Federal. IV. ORDEM CONCEDIDA de ofício para reconhecer a nulidade das provas obtidas na busca pessoal realizada sem fundada suspeita e, por consequência, de todas as provas dela derivadas.” (HC n. 841.347/GO, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, DJe de 29/10/2024).
3. Do mérito
Reconhecida a nulidade da abordagem policial quando da busca pessoal e veicular, forçosa a aplicação da Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada e o reconhecimento de nulidade das provas dela decorrentes e subsequentes, nos termos do artigo 157, § 1º, do Código de Processo Penal e, na ausência de provas lícitas da materialidade delitiva, impõe-se a absolvição do apelante RONALDO MARTINS ROCHA da imputação que lhe foi atribuída na denúncia, com supedâneo no artigo 386, inciso II, do Código de Processo Penal.
Absolvido o apelante RONALDO MARTINS ROCHA, estendo a absolvição ao coautor Rafael André dos Santos Júnior, que não recorreu, nos termos do artigo 580, do Código de Processo Penal, que permite a extensão dos efeitos positivos de um recurso interposto aos coautores que não recorreram.
Acrescento que esta benesse encontra amparo no princípio da isonomia, o qual determina que a extensão dos benefícios do recurso para garantir que todos os envolvidos no mesmo fato sejam tratados de forma igualitária perante a lei, evitando que um seja beneficiado e outro não, quando a situação fática for a mesma.
Assim, absolvo o coautor Rafael André dos Santos Júnior.
Torno sem efeito o decreto de perdimento do bem apreendido, 01(um) Veiculo tipo: AUTOMÓVEL, versão: VW/GOLF 2.0 PLUS, placa: JGI0I16, Chassis n: 9BWAB01J544032842, Renavam nº: 00830135723, Motor n: BER020942, Combustível: GASOLINA, Ano de Fabricação: 2004, Modelo de Fabricação: 2004, Cor: PRETA, devendo ser devolvido ao seu proprietário RONALDO MARTINS ROCHA.
Julgo prejudicadas as demais matérias de mérito levantadas no presente recurso, porque acatada a preliminar, decretada a nulidade das provas e, diante da inexistência de provas da materialidade, a consequente absolvição.
4. Conclusão:
Ao teor do exposto, desacolho o parecer Ministerial de Cúpula, conheço do presente recurso de Apelação Criminal e dou-lhe provimento a fim de reformar a sentença penal e absolver o apelante RONALDO MARTINS ROCHA e estender a absolvição ao coautor Rafael André dos Santos Júnior.
É o meu voto.
Goiânia, datado e assinado digitalmente.
DONIZETE MARTINS DE OLIVEIRA
Desembargador Relator
EMENTA
DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. ILEGALIDADE DE BUSCA E APREENSÃO - AUSÊNCIA DE FUNDADA SUSPEITA. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. ABSOLVIÇÃO. EXTENSÃO DA ABSOLVIÇÃO AO COAUTOR.
I. CASO EM EXAME 1. Trata-se de apelação criminal contra sentença que condenou o apelante por tráfico de drogas, com base em provas obtidas em busca e apreensão veicular e pessoal. O apelante alega a ilegalidade da abordagem policial e requer a nulidade das provas e sua consequente absolvição.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em analisar a legalidade da busca e apreensão realizada pela polícia militar, sem mandado judicial e verificar se a ausência de justa causa enseja a nulidade das provas obtidas e a absolvição do acusado.
III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A abordagem policial ocorreu com base em suspeita alicerçada em presunção e não em fatos concretos, firmando-se na vaga afirmativa de que o veículo seria semelhante a um veículo furtado dias antes, mas que não era, sem a checagem prévia da placa ou outras informações que comprovassem a suspeita, foi realizada a abordagem com a busca pessoal e veicular, sem justa causa, violando direitos fundamentais do acusado. 4. A ausência de fundada suspeita torna ilícitas as provas obtidas na busca pessoal e veicular, conforme o art. 244 do CPP. A Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada determina a nulidade de todas as provas derivadas da ilicitude originária (art. 5º, LVI, CF/1988; art. 157, §1º, CPP). A ausência de provas lícitas impõe a absolvição do acusado, nos termos do art. 386, inc. II, do CPP. 5. A extensão da absolvição ao coautor, que não recorreu, é permitida pelo art. 580 do Cód. Proc. Penal e, em razão do princípio da isonomia.
IV. DISPOSITIVO E TESE 5. RECURSO PROVIDO. ABSOLVIÇÃO DO APELANTE E DO COAUTOR. REVOGADO O PERDIMENTO DO BEM APREENDIDO. "1. É ilegal a busca e apreensão realizada sem justa causa, decorrente mera suposição, contaminando as provas obtidas. 2. A Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada conduz à nulidade das provas derivadas. 3. A ausência de provas lícitas determina a absolvição do acusado e do coautor."
Dispositivos relevantes citados: art. 244 do CPP; art. 5º, LVI, CF/1988; art. 157, §1º, CPP; art. 386, inc. VII, CPP; art. 580 do CPP. Jurisprudências relevantes citadas: AgRg no RHC n. 178.809/GO, relator Ministro Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe de 22/5/2024; HC n. 841.347/GO, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, DJe de 29/10/2024; TJGO, Apelação Criminal 0099538-80.2018.8.09.0006, Rel. Des. Donizete Martins de Oliveira, 4ª Câmara Criminal, julgado em 19/03/2024, DJe de 19/03/2024; TJGO, Apelação Criminal 0133095-73.2018.8.09.0001, Rel. Des(a). CARMECY ROSA MARIA ALVES DE OLIVEIRA, Abadiânia - Vara Criminal, DJe de 10/03/2023; TJGO, Apelação Criminal 0010177-30.2018.8.09.0175, Rel. Des. J. PAGANUCCI JR., 1ª Câmara Criminal, julgado em 08/05/2024, DJe de 08/05/2024.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, ACORDAM os integrantes da Quarta Turma Julgadora de sua Terceira Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, nos termos da Ata de Julgamento.
Presidiu a sessão de julgamento a Desembargador Donizete Martins de Oliveira.
Procuradoria-Geral de Justiça representada conforme extrato da ata.
Goiânia, datado e assinado digitalmente.
DONIZETE MARTINS DE OLIVEIRA
Desembargador Relator
DIREITO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS. ILEGALIDADE DE BUSCA E APREENSÃO - AUSÊNCIA DE FUNDADA SUSPEITA. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. ABSOLVIÇÃO. EXTENSÃO DA ABSOLVIÇÃO AO COAUTOR.
I. CASO EM EXAME 1. Trata-se de apelação criminal contra sentença que condenou o apelante por tráfico de drogas, com base em provas obtidas em busca e apreensão veicular e pessoal. O apelante alega a ilegalidade da abordagem policial e requer a nulidade das provas e sua consequente absolvição.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em analisar a legalidade da busca e apreensão realizada pela polícia militar, sem mandado judicial e verificar se a ausência de justa causa enseja a nulidade das provas obtidas e a absolvição do acusado.
III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A abordagem policial ocorreu com base em suspeita alicerçada em presunção e não em fatos concretos, firmando-se na vaga afirmativa de que o veículo seria semelhante a um veículo furtado dias antes, mas que não era, sem a checagem prévia da placa ou outras informações que comprovassem a suspeita, foi realizada a abordagem com a busca pessoal e veicular, sem justa causa, violando direitos fundamentais do acusado. 4. A ausência de fundada suspeita torna ilícitas as provas obtidas na busca pessoal e veicular, conforme o art. 244 do CPP. A Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada determina a nulidade de todas as provas derivadas da ilicitude originária (art. 5º, LVI, CF/1988; art. 157, §1º, CPP). A ausência de provas lícitas impõe a absolvição do acusado, nos termos do art. 386, inc. II, do CPP. 5. A extensão da absolvição ao coautor, que não recorreu, é permitida pelo art. 580 do Cód. Proc. Penal e, em razão do princípio da isonomia.
IV. DISPOSITIVO E TESE 5. RECURSO PROVIDO. ABSOLVIÇÃO DO APELANTE E DO COAUTOR. REVOGADO O PERDIMENTO DO BEM APREENDIDO. "1. É ilegal a busca e apreensão realizada sem justa causa, decorrente mera suposição, contaminando as provas obtidas. 2. A Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada conduz à nulidade das provas derivadas. 3. A ausência de provas lícitas determina a absolvição do acusado e do coautor."
Dispositivos relevantes citados: art. 244 do CPP; art. 5º, LVI, CF/1988; art. 157, §1º, CPP; art. 386, inc. VII, CPP; art. 580 do CPP. Jurisprudências relevantes citadas: AgRg no RHC n. 178.809/GO, relator Ministro Rogério Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe de 22/5/2024; HC n. 841.347/GO, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, DJe de 29/10/2024; TJGO, Apelação Criminal 0099538-80.2018.8.09.0006, Rel. Des. Donizete Martins de Oliveira, 4ª Câmara Criminal, julgado em 19/03/2024, DJe de 19/03/2024; TJGO, Apelação Criminal 0133095-73.2018.8.09.0001, Rel. Des(a). CARMECY ROSA MARIA ALVES DE OLIVEIRA, Abadiânia - Vara Criminal, DJe de 10/03/2023; TJGO, Apelação Criminal 0010177-30.2018.8.09.0175, Rel. Des. J. PAGANUCCI JR., 1ª Câmara Criminal, julgado em 08/05/2024, DJe de 08/05/2024.
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