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Cavalcante Gestao De Negoci…
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CAVALCANTE GESTAO DE NEGOCIOS LTDA consta em registros encontrados pelo Causa Na Justiça.
ID: 330819044
Tribunal: TJPI
Órgão: 3ª Câmara Especializada Cível
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0800897-70.2024.8.18.0068
Data de Disponibilização:
22/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
SUELLEN PONCELL DO NASCIMENTO DUARTE
OAB/PE XXXXXX
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JAYRO TORRES DOS SANTOS SOARES
OAB/PI XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ GABINETE Da DESEMBARGADORA LUCICLEIDE PEREIRA BELO ORGÃO JULGADOR: 3ª Câmara Especializada Cível APELAÇÃO CÍVEL (198) No 0800897-70.2024.8.18.…
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Processo nº 0817200-06.2025.8.18.0140
ID: 335348947
Tribunal: TJPI
Órgão: 1ª Vara dos Feitos da Fazenda Pública da Comarca de Teresina
Classe: PROCEDIMENTO COMUM CíVEL
Nº Processo: 0817200-06.2025.8.18.0140
Data de Disponibilização:
28/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PIAUÍ 1ª Vara dos Feitos da Fazenda Pública da Comarca de Teresina DA COMARCA DE TERESINA Praça Edgard Nogueira, s/n, Cabral, TERESINA - PI - CEP: 64000-830 PROCESSO Nº:…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PIAUÍ 1ª Vara dos Feitos da Fazenda Pública da Comarca de Teresina DA COMARCA DE TERESINA Praça Edgard Nogueira, s/n, Cabral, TERESINA - PI - CEP: 64000-830 PROCESSO Nº: 0817200-06.2025.8.18.0140 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) ASSUNTO(S): [Oncológico, Padronizado] AUTOR: OHANA ANTAO DE ALENCAR CARVALHO REU: DIRETOR DO IAPEP/PLAMTA, DIRETOR GERAL DO IASPI, IAPEP - INSTITUTO DE ASSISTÊNCIA E PREVIDÊNCIA DO ESTADO DO PIAUÍ, RAIA DROGASIL S/A, AGIL MED COMERCIO DE MEDICAMENTOS LTDA., ONCOEXPRESS COMERCIO DE PRODUTOS FARMACEUTICOS LTDA., INST. DE ASSIST. A SAUDE DOS SERVIDORES PUBLICOS DO EST. DO PIAUI-IASPI SENTENÇA Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE TUTELA DE ANTECIPADA DE URGÊNCIA ajuizada por OHANA ANTAO DE ALENCAR CARVALHO em face do IASPI/PLAMTA, visando o fornecimento de medicação Lynparza (Olaparibe 150mg) – 300mg (2 comprimidos) via oral de 12/12h durante 12 meses. Em síntese, alega-se na inicial que a parte autora foi diagnosticada, em julho de 2024, com câncer de mama triplo negativo (CID C50.4 – ECC IIIB), apresentando mutação genética BRCA1, o que agrava o risco da doença. Após quimioterapia e mastectomia, permanece com doença residual. Diante disso, seu médico prescreveu o uso do medicamento Lynparza (Olaparibe 150mg), 600mg por dia, por 12 meses, como tratamento adjuvante para reduzir risco de recidiva e aumentar a sobrevida. Relata que o medicamento é registrado na ANVISA e indicado em bula para câncer de mama, devendo ser custeado pelos planos de saúde. Apesar de requerimento administrativo feito em 20/03/2025 (protocolo AA.040.1.003090/25), o plano de saúde não respondeu, por sua vez, a autora não possui recursos financeiros para custear o tratamento, cujo valor total estimado é de R$ 482.093,64. Diante da omissão do plano e da urgência do tratamento, buscou a via judicial para obter o fornecimento do medicamento. Nota técnica do NATJUS no id. 73785433. A antecipação da tutela foi deferida no id. 73837272. Citado, o IASPI contestou os argumentos da autora e , em síntese, sustenta que não possui responsabilidade para o fornecimento do medicamento, que não é coberto pelo regulamento do PLAMTA. Parecer ministerial no id. 76251853. É o relatório. Decido. 1. FUNDAMENTAÇÃO Constatada a suficiência dos elementos acostados aos autos para a formação da livre convicção do julgador e desnecessária a produção de outras provas, o Código de Processo Civil prevê a possibilidade do julgamento antecipado da lide, sem que se configure cerceamento de defesa, por força da exegese do artigo 355. É esta, pois, a hipótese da demanda. A matéria objeto da lide dispensa dilação probatória, uma vez que as questões controversas são apenas de direito e de fato passíveis de comprovação documental, prescindindo da produção de outras provas. 1.1 DA NATUREZA JURÍDICA DO PLANO DE SAÚDE EM QUESTÃO E SUA REGULAMENTAÇÃO LEGAL Cumpre destacar, inicialmente, que não se aplicam ao IASPI as normas do Código de Defesa do Consumidor, por se tratar de programa de autogestão, sem fins lucrativos, mantido pelos próprios servidores públicos do Estado do Piauí. A propósito, é esse o entendimento consolidado no STJ, sumulado no enunciado de n. 608: Súmula 608: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão. Ainda segundo a referida corte, tratando-se de plano de saúde mantido por ente público, submete-se às regras dos planos de saúde, vejamos: ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. RECURSO ESPECIAL. SISTEMA DE SAÚDE DOS MILITARES DO ESTADO DE PERNAMBUCO - SISMEPE, CRIADO PELA LEI ESTADUAL 13.264/2007. ADESÃO E CONTRIBUIÇÃO COMPULSÓRIAS. ILEGALIDADE RECONHECIDA PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. RESTITUIÇÃO EM DOBRO. IMPOSSIBILIDADE. INAPLICABILIDADE DO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO DE CONSUMO. SÚMULA 608/STJ. 1. Na forma da jurisprudência desta Corte, "considerando que as pessoas jurídicas de direito privado são mencionadas expressamente no caput do art. 1º da Lei nº 9.656/1998, a utilização do termo 'entidade' no § 2º denota a intenção do legislador de ampliar o alcance da lei às pessoas jurídicas de direito público que prestam serviço de assistência à saúde suplementar" (REsp 1.766.181/PR, Rel. p/ Acórdão Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, DJe 13/12/2019). 2. Sendo possível extrair-se do acórdão recorrido a inexistência de controvérsia no sentido de que o Sistema de Saúde dos Militares do Estado de Pernambuco - SISMEPE não possui fins lucrativos e visa proporcionar assistência médico-hospitalar, odontológica e laboratorial aos seus beneficiários, resta caracterizada uma relação de natureza jurídico-administrativa entre esses dois polos, e não consumerista, o que inibe, em caso de devolução de valores indevidamente descontados, a restituição dobrada, de que cuida o art. 42, § único, do CDC. 3. Incide na espécie, também, o comando gizado na Súmula 608/STJ: "Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde, salvo os administrados por entidades de autogestão". 4. Recurso especial conhecido e provido para excluir da condenação imposta ao Estado de Pernambuco o dever de restituir em dobro os valores descontados da parte recorrida a título de contribuição para o SISMEPE, devendo fazê-lo pela forma simples. (REsp n. 1.812.031/PE, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 7/6/2022, DJe de 10/6/2022.) Assim, as entidades de direito público que optem por prestar serviços de assistência à saúde suplementar não podem ser excluídas da incidência da Lei nº 9.656/98, sob pena de possibilitar o desvirtuamento da intenção legislativa de assegurar aos usuários direitos mínimos. 1.2 DO MÉRITO Conforme relatado, a parte autora postula a condenação do plano de saúde do qual é segurada na obrigação de fazer para cobertura de tratamento médico de câncer de mama, devidamente previsto pelo profissional assistente, dado que, segundo consta, teve o requerimento administrativo não respondido pelo IASPI. Na contestação, o IASPI defendeu que o pleito não se sustenta porque está fora dos tratamentos com cobertura prevista em contrato, de modo que eventual decisão judicial em sentido diverso violaria os princípios da legalidade e da força obrigatória dos contratos, além de gerar desequilíbrio atuarial. No entanto, sua defesa não merece prosperar, porque fortemente rechaçada pela legislação específica e entendimentos jurisprudenciais. A sua própria lei de regência prescreve a obrigatoriedade de garantia de um tratamento mínimo aos usuários, no qual se destaca a cobertura de antineoplásicos ambulatoriais e domiciliares de uso oral, bem como procedimentos radioterápicos para tratamento de câncer e hemoterapia, vejamos: Art. 10. É instituído o plano-referência de assistência à saúde, com cobertura assistencial médico-ambulatorial e hospitalar, compreendendo partos e tratamentos, realizados exclusivamente no Brasil, com padrão de enfermaria, centro de terapia intensiva, ou similar, quando necessária a internação hospitalar, das doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde, respeitadas as exigências mínimas estabelecidas no art. 12 desta Lei, exceto: §1º As exceções constantes dos incisos deste artigo serão objeto de regulamentação pela ANS. § 2o As pessoas jurídicas que comercializam produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei oferecerão, obrigatoriamente, a partir de 3 de dezembro de 1999, o plano-referência de que trata este artigo a todos os seus atuais e futuros consumidores. § 3o Excluem-se da obrigatoriedade a que se refere o § 2o deste artigo as pessoas jurídicas que mantêm sistemas de assistência à saúde pela modalidade de autogestão e as pessoas jurídicas que operem exclusivamente planos odontológicos. § 4º A amplitude das coberturas no âmbito da saúde suplementar, inclusive de transplantes e de procedimentos de alta complexidade, será estabelecida em norma editada pela ANS, que publicará rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar, atualizado a cada incorporação. § 5º As metodologias utilizadas na avaliação de que trata o § 3º do art. 10-D desta Lei, incluídos os indicadores e os parâmetros de avaliação econômica de tecnologias em saúde utilizados em combinação com outros critérios, serão estabelecidas em norma editada pela ANS, assessorada pela Comissão de Atualização do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar, e terão ampla divulgação. § 6º As coberturas a que se referem as alíneas c do inciso I e g do inciso II do caput do art. 12 desta Lei são obrigatórias, em conformidade com a prescrição médica, desde que os medicamentos utilizados estejam registrados no órgão federal responsável pela vigilância sanitária, com uso terapêutico aprovado para essas finalidades, observado o disposto no § 7º deste artigo. (Incluído pela Lei nº 14.307, de 2022) § 7º A atualização do rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar pela ANS será realizada por meio da instauração de processo administrativo, a ser concluído no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, contado da data em que foi protocolado o pedido, prorrogável por 90 (noventa) dias corridos quando as circunstâncias o exigirem. (Incluído pela Lei nº 14.307, de 2022) Art. 12. São facultadas a oferta, a contratação e a vigência dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, nas segmentações previstas nos incisos I a IV deste artigo, respeitadas as respectivas amplitudes de cobertura definidas no plano-referência de que trata o art. 10, segundo as seguintes exigências mínimas:(Redação dada pela Medida Provisória nº 2.177-44, de 2001) I - quando incluir atendimento ambulatorial: a) cobertura de consultas médicas, em número ilimitado, em clínicas básicas e especializadas, reconhecidas pelo Conselho Federal de Medicina; b) cobertura de serviços de apoio diagnóstico, tratamentos e demais procedimentos ambulatoriais, solicitados pelo médico assistente; (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.177-44, de 2001) c) cobertura de tratamentos antineoplásicos domiciliares de uso oral, incluindo medicamentos para o controle de efeitos adversos relacionados ao tratamento e adjuvantes; II - quando incluir internação hospitalar: a) cobertura de internações hospitalares, vedada a limitação de prazo, valor máximo e quantidade, em clínicas básicas e especializadas, reconhecidas pelo Conselho Federal de Medicina, admitindo-se a exclusão dos procedimentos obstétricos;(Redação dada pela Medida Provisória nº 2.177-44, de 2001) b) cobertura de internações hospitalares em centro de terapia intensiva, ou similar, vedada a limitação de prazo, valor máximo e quantidade, a critério do médico assistente;(Redação dada pela Medida Provisória nº 2.177-44, de 2001) c) cobertura de despesas referentes a honorários médicos, serviços gerais de enfermagem e alimentação; d) cobertura de exames complementares indispensáveis para o controle da evolução da doença e elucidação diagnóstica, fornecimento de medicamentos, anestésicos, gases medicinais, transfusões e sessões de quimioterapia e radioterapia, conforme prescrição do médico assistente, realizados ou ministrados durante o período de internação hospitalar; (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.177-44, de 2001) e) cobertura de toda e qualquer taxa, incluindo materiais utilizados, assim como da remoção do paciente, comprovadamente necessária, para outro estabelecimento hospitalar, dentro dos limites de abrangência geográfica previstos no contrato, em território brasileiro; e (Redação dada pela Medida Provisória nº 2.177-44, de 2001) f) cobertura de despesas de acompanhante, no caso de pacientes menores de dezoito anos; g)cobertura para tratamentos antineoplásicos ambulatoriais e domiciliares de uso oral, procedimentos radioterápicos para tratamento de câncer e hemoterapia, na qualidade de procedimentos cuja necessidade esteja relacionada à continuidade da assistência prestada em âmbito de internação hospitalar;(Incluído pela Lei nº 12.880, de 2013) (Vigência) A prescrição médica, portanto, está em conformidade com o permissivo legal, dado que a medicação em questão possui registro válido emitido pela agência com competência nacional e foi indicado segundo a aprovação no registro. Especificamente, há indicação do medicamento no câncer de mama enquanto tratamento adjuvante de pacientes adultos com câncer mamário metastático HER2 negativo, com mutação germinativa no gene BRCA, previamente tratados com quimioterapia. Aliado ao aparato normativo, segundo o entendimento do STJ, o plano de saúde não pode limitar o tipo de tratamento a ser utilizado pelo paciente. Logo, não cabe ao plano de saúde a escolha do exame, tratamento ou procedimento cirúrgico, devendo ser respeitado o pedido formulado pelo profissional médico, que tem a competência decisória: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. TRANSPLANTE DE FÍGADO. OMISSÃO . INEXISTÊNCIA. NEGATIVA DE COBERTURA DE PROCEDIMENTO MÉDICO. DESCABIMENTO. DANOS MORAIS RECUSA INJUSTIFICADA. SÚMULA 83/STJ. RECURSO NÃO PROVIDO. 1 . Havendo cobertura para a doença, consequentemente deverá haver cobertura para procedimento ou medicamento necessário para assegurar o tratamento de doenças previstas no referido plano. Precedentes. 2. 'A jurisprudência do STJ firmou o entendimento no sentido de ser abusiva a cláusula contratual que exclui tratamento prescrito para garantir a saúde ou a vida do segurado, porque o plano de saúde pode estabelecer as doenças que terão cobertura, mas não o tipo de terapêutica indicada por profissional habilitado na busca da cura .' (AgInt no AREsp 1573618/GO, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 22/06/2020, DJe 30/06/2020). 3. "A recusa indevida/injustificada, pela operadora de plano de saúde, em autorizar a cobertura financeira de tratamento médico, a que esteja legal ou contratualmente obrigada, enseja reparação a título de dano moral, por agravar a situação de aflição psicológica e de angústia no espírito do beneficiário . Caracterização de dano moral in re ipsa. Precedentes" (AgRg no AREsp n. 527.140/SP, Relator Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 2/9/2014, DJe 16/9/2014) . 4. Agravo interno não provido. (STJ - AgInt no REsp: 1880040 SP 2020/0145750-7, Relator.: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 25/09/2023, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/09/2023) De fato, há documentação com relatório médico em que registrou que a requerente possui diagnóstico de Neoplasia maligna de mama (CID-10: C50.4 EC IIIB subtipo triplo negativo) tendo realizado quimioterapia neo-adjuvante de 09/08/2024 a 02/01/2025 e mastectomia total e esvaziamento axilar dia 26/02/2025 (LHP - pT3pN3) e ainda apresenta muita doença residual, o que denota agressividade da doença. Além disso, apresenta mutação germinativa do gene BRCA1, conforme teste genético, como justificativa da indicação de novo tratamento como urgente, tendo em vista alto risco de recidiva da doença diante do exposto. Portanto, é evidente que à requerida surge a responsabilidade de custear os insumos indispensáveis ao tratamento de saúde da assistida, conforme a prescrição feita pelo médico assistente. 2. DISPOSITIVO Ante o exposto, com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil, CONFIRMO a liminar (anteriormente deferida no id. 73837272) e JULGO PROCEDENTE os pedidos da inicial para determinar que a parte ré IASPI/PLAMTA, forneça imediatamente, de forma contínua e gratuita, o medicamento Lynparza (Olaparibe 150 mg), na dosagem prescrita de 300 mg ao dia (2 comprimidos, via oral, a cada 12h), conforme prescrição médica constante nos autos. Sem condenação do requerido ao pagamento de custas e despesas processuais em razão da isenção legal. Condeno-o, entretanto, ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais, que restam fixados no valor de R$1.000,00 (mil reais), arbitrados por apreciação equitativa, nos termos do art. 85, §8º do CPC (STJ. 1ª Seção. REsp 2.169.102-AL e REsp 2.166.690-RN, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgados em 11/6/2025 (Recurso Repetitivo - Tema 1313) Sentença NÃO sujeita à remessa necessária (Art. 496, §3º do CPC) P. R. Intimem-se as partes. Havendo interposição de apelação, intime-se para contrarrazões e, em seguida, remetam-se os autos ao 2º Grau. Não havendo, ARQUIVEM-SE após o trânsito em julgado. Finalmente, verifico que há nos autos comprovante de levantamento de valores pela empresa responsável pela venda da medicação, no id.76246197, portanto, INTIME-SE para que apresente a prestação de contas, com a nota fiscal emitida em favor do Estado do Piauí e o comprovante de entrega dos insumos à autora, em 48 horas. LITELTON VIEIRA DE OLIVEIRA Juiz de Direito titular da 2ª Vara dos Feitos da Fazenda Pública da Comarca de Teresina Substituto Legal da 1ª Vara dos feitos de Fazenda Pública de Teresina
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Processo nº 0801117-10.2024.8.18.0152
ID: 335112571
Tribunal: TJPI
Órgão: JECC Picos Anexo II (R-Sá)
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 0801117-10.2024.8.18.0152
Data de Disponibilização:
25/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PIAUÍ JECC Picos Anexo II (R-Sá) DA COMARCA DE PICOS Rua Padre Madeira, 201, Centro, PICOS - PI - CEP: 64600-018 PROCESSO Nº: 0801117-10.2024.8.18.0152 CLASSE: PROCEDIME…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PIAUÍ JECC Picos Anexo II (R-Sá) DA COMARCA DE PICOS Rua Padre Madeira, 201, Centro, PICOS - PI - CEP: 64600-018 PROCESSO Nº: 0801117-10.2024.8.18.0152 CLASSE: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) ASSUNTO(S): [Produto Impróprio, Seguro] AUTOR: IVA MARIA DE MOURA BESERRA REU: MAPFRE SEGUROS GERAIS S.A. S E N T E N Ç A RELATÓRIO Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE RESTITUIR CUMULADA COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS ajuizada por Iva Maria de Moura Beserra em face de Mapfre Seguros Gerais S/A, em razão de suposta falha na prestação de serviço securitário, consistente na negativa de indenização integral após sinistro automobilístico, demora excessiva na conclusão do reparo e entrega do veículo com defeito persistente. A parte Autora requereu a restituição de R$14.400,00 (quatorze mil e quatrocentos reais), referentes à locação de veículo por quatro meses, além de indenização por danos morais no valor de R$10.000,00 (dez mil reais). A Requerida apresentou contestação (id. 59920875), arguindo inexistência de negativa de cobertura, ausência de responsabilidade pela demora na entrega do veículo e inexistência de provas do defeito remanescente. Alegou, ainda, que os danos materiais e morais pleiteados não foram devidamente comprovados. Houve apresentação de réplica (id. 60143532), na qual a Autora rebateu os argumentos da defesa, reafirmando os fatos narrados na inicial. Realizada a audiência de conciliação (id. 59971083), as partes não chegaram a uma composição da lide. Dispensados os demais dados do relatório, a teor do que dispõe o artigo 38, caput, da Lei n° 9.099/95. FUNDAMENTAÇÃO Registro, de partida, que o feito prescinde de outras provas, pois bastam aquelas existentes nos autos para a formação da convicção do julgador. Assim, na medida em que remanescem apenas questões de direito, passo ao julgamento da lide no estado em que se encontra o processo e o faço ao abrigo da disposição inserta no artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil, aplicado analogicamente, por se tratar de questão eminentemente de direito. Efetivamente, versando a causa acerca de tema exclusivamente de direito, mostra-se impertinente a realização da audiência de instrução e julgamento a que alude o artigo 27 e seguintes da Lei nº 9.099/95, sendo de rigor o julgamento do processo no estado em que se encontra; providência essa que, por óbvio, não constitui ato violador do direito à ampla defesa, até mesmo porque todos os elementos necessários ao deslinde da causa já se encontram encartados nos autos. Feito esse registro e existindo preliminares a serem enfrentadas, passo a analisá-las antes de adentrar no mérito da ação. Quanto ao pedido de concessão da justiça gratuita deduzidos na peça exordial, considerando a gratuidade da justiça em primeira instância nos Juizados Especiais, deixo para apreciar o pedido supracitado por ocasião de interposição de eventual recurso. Em preliminar de contestação, a seguradora argumenta que a Autora não teria comprovado os fatos constitutivos do direito alegado, especialmente quanto ao defeito remanescente no veículo e à necessidade de locação de outro automóvel. Porém, trata-se de questão atinente ao ônus da prova e sua distribuição, matéria de mérito, sendo plenamente cabível o prosseguimento da ação com eventual inversão do ônus conforme o art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor. Portanto, rejeita-se como preliminar. Outrossim, não há complexidade capaz de inviabilizar a análise da questão discutida nos autos, a produção de prova documental é suficiente para a resolução da controvérsia. Logo, desnecessária a produção de perícia técnica. Desse modo, afirma-se a competência dos Juizados Especiais, para processar e julgar a presente ação, dada a ausência de complexidade capaz de inviabilizar a análise da questão ora posta. Superadas as preliminares, passo a analisar o mérito. A relação jurídica entre as partes é inequivocamente de consumo, aplicando-se o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), nos termos dos artigos 2º e 3º. Restou incontroverso nos autos que a Autora contratou seguro automotivo junto à ré, apólice nº 0381093925931, vigente entre 10/03/2023 e 10/03/2024. O sinistro ocorreu em 20/09/2023, tendo sido o veículo encaminhado para conserto autorizado pela seguradora. A Autora juntou nota fiscal que comprova a locação de veículo entre outubro de 2023 e fevereiro de 2024 (id. 58376014), totalizando R$ 14.400,00 (quatorze mil e quatrocentos reais), valor que busca restituir sob fundamento de que seu veículo permaneceu em conserto por tempo excessivo, por mais de cinco meses. A Requerida, por sua vez, não apresentou documento que justificasse o prazo excessivo para a conclusão do reparo. A responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços é expressamente prevista no art. 14 do CDC, cabendo à parte Ré demonstrar a excludente de responsabilidade, o que não ocorreu. Ainda, verifica-se que o veículo foi devolvido com defeito persistente no sensor de temperatura do motor, fato que não foi tecnicamente refutado pela Demandada. O defeito compromete o uso regular do bem, acarretando frustração das expectativas contratuais e insegurança à usuária. Quanto ao dano moral, restou caracterizado. A jurisprudência dos Tribunais Pátrios é pacífica ao reconhecer que a demora excessiva na prestação do serviço e a entrega do bem defeituoso ensejam o dever de indenizar. Assim, deve ser parcialmente acolhido o pedido, com a condenação da Ré ao ressarcimento dos danos materiais devidamente comprovados e à indenização por danos morais em quantia razoável, atento às peculiaridades do caso em questão e ao caráter pedagógico da presente indenização, tendo em vista as circunstâncias fáticas e sem premiar o enriquecimento ilícito. Nessa linha intelectiva, entende a jurisprudência dos Tribunais Pátrios: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - RECURSO ADESIVO - AÇÃO INDENIZATÓRIA - CONSERTO DE VEÍCULO - DEMORA EXCESSIVA - FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS CARACTERIZADA - RESPONSABILIDADE DA SEGURADORA - DESPESAS COM ALUGUEL - RESTITUIÇÃO - DANO MORAL - CONFIGURADO - QUANTUM - RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. As relações firmadas com base em contratos de seguro de automóvel devem ser tratadas sob a égide do Código de Defesa do Consumidor. A demora excessiva para conserto de veículo sinistrado importa na falha de serviços da seguradora, ocasionando danos passíveis de serem indenizados. Os gastos comprovadamente despendidos com aluguel de veículo, porquanto a parte autora se viu impossibilitada de fazer uso de seu bem por tempo demasiado, devem ser devidamente ressarcidos . O valor da indenização por dano moral deve ser fixado considerando o grau da responsabilidade atribuída ao réu, a extensão dos danos sofridos pela vítima, bem como a condição social e econômica do ofendido e do autor da ofensa, atentando-se, também, para os princípios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade. (TJ-MG - AC: 50005514320218130446, Relator.: Des.(a) Octávio de Almeida Neves, Data de Julgamento: 19/10/2023, 15ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 25/10/2023) – grifo nosso. APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA . APELO DA SEGURADORA RÉ. INCONTROVERSA A OCORRÊNCIA DE FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PELA DEMORA EXCESSIVA NO CONSERTO DO VEÍCULO DA PARTE AUTORA, BEM COMO PELO CONSERTO INADEQUADO. DANO MORAL CARACTERIZADO, GERANDO O DEVER DE COMPENSAR A PARTE QUE SOFREU O PREJUÍZO. VALOR FIXADO DE R$ 10 .000,00 (DEZ MIL REAIS) REFERENTE À COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA POR DANO MORAL QUE SE APRESENTA PROPORCIONAL PARA A HIPÓTESE DOS AUTOS. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO DO RECURSO. (TJ-RJ - APL: 00245422420218190202 202200193763, Relator.: Des(a) . ALVARO HENRIQUE TEIXEIRA DE ALMEIDA, Data de Julgamento: 13/04/2023, DÉCIMA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 20/04/2023) – grifo nosso APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM DANOS MORAIS – SINISTRO EM AUTOMÓVEL - DEMORA NO CONSERTO DE VEÍCULO - ATRASO INJUSTIFICADO – TERMO DE QUITAÇÃO - INTERPRETAÇÃO RESTRITA - QUITAÇÃO DOS DANOS RELATIVOS AO REPARO DO VEÍCULO – DEMORA NA CONCLUSÃO DO SINISTRO – RESPONSABILIDADE DA SEGURADORA VERIFICADA - DANO MORAL CONFIGURADO – QUANTIFICAÇÃO – RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE – MÁ-FÉ NÃO DETECTADA – RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Conforme entendimento sedimentado no STJ, o prazo razoável é de 30 (trinta) dias para a reparação de veículos sinistrados, contados da data de entrega dos documentos exigidos do segurado, nos termos do art. 33 da Circular Susep nº 256, de 16 de junho de 2004, período o qual a seguradora ultrapassou em muito . Restou evidenciada, portanto, a falha na prestação de serviço da seguradora. 2. Considerando as peculiaridades do caso, mostra-se razoável manter o valor da indenização por danos extrapatrimoniais, na forma como fixado em primeiro grau, no patamar de R$ 10.000,00 . (TJ-MS - Apelação Cível: 08041981720228120018 Paranaíba, Relator.: Des. Ary Raghiant Neto, Data de Julgamento: 25/07/2024, 2ª Câmara Cível, Data de Publicação: 29/07/2024) – grifo nosso EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E MATERIAL. ASSOCIAÇÃO DE PROTEÇÃO VEICULAR. CDC . DEMORA E DEFEITO NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. FALHA COMPROVADA. DANO MATERIAL. RESTITUIÇÃO DO VALOR DESPENDIDO PELA CONSUMIDORA . NECESSIDADE. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. QUANTUM INDENIZATÓRIO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE . SENTENÇA MANTIDA. 1- Aplicam-se as normas constantes do Código de Defesa do Consumidor e do Código Civil específicas do contrato de seguro ao contrato de proteção veicular firmado entre associado e pessoa jurídica constituída em forma de associação que oferece aos seus associados a reparação de danos ocorridos em seus veículos. 2- Resta caracterizada a falha na prestação dos serviços, a demora excessiva e o reparo incompleto realizado no veículo de propriedade da consumidora. O valor despendido com o conserto complementar será restituído à consumidora, a título de dano material . 3- A situação vivenciada pela autora, ao enfrentar dificuldades e demora para ver efetivados os reparos em seu veículo, extrapola os meros aborrecimentos cotidianos. 4- Nos termos da Súmula nº 32 dessa Corte Estadual, a verba indenizatória do dano moral somente será modificada se não atendidos pela sentença os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na fixação do valor da condenação. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA E DESPROVIDA. (TJ-GO - Apelação Cível: 55607238520228090019 BURITI ALEGRE, Relator.: Des(a) . DESEMBARGADORA NELMA BRANCO FERREIRA PERILO, 4ª Câmara Cível, Data de Publicação: (S/R) DJ) – grifo nosso EMENTA: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL. CONTRATO DE SEGURO. DEMORA EXCESSIVA NO CONSERTO DE VEÍCULO. LUCROS CESSANTES. INEXISTÊNCIA DE PROVA. DANO MORAL CONFIGURADO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação cível interposta pelo autor contra sentença que julgou parcialmente procedentes seus pedidos indenizatórios decorrentes de acidente de trânsito. O autor sustenta que, em razão da demora de nove semanas no conserto de seu veículo pela seguradora Azul Companhia de Seguros Gerais, foi impedido de exercer sua atividade profissional, o que lhe ocasionou perdas financeiras (lucros cessantes) e abalo moral, requerendo indenizações no valor de R$ 3.900,00 e por danos morais. A sentença já havia reconhecido a responsabilidade da seguradora pelos danos materiais e determinado seu ressarcimento. O pedido recursal volta-se à majoração da condenação com o reconhecimento dos lucros cessantes e dos danos morais. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) definir se o autor/apelante faz jus à indenização por lucros cessantes decorrentes da impossibilidade de uso do veículo sinistrado durante o período de conserto; (ii) estabelecer se houve dano moral indenizável, em razão da demora excessiva na prestação do serviço pela seguradora. III. RAZÕES DE DECIDIR A caracterização dos lucros cessantes exige prova inequívoca da perda econômica certa e direta decorrente do ato ilícito, nos termos do art. 402 do Código Civil. O autor não comprova, de forma suficiente, o exercício regular da atividade de motorista de aplicativo, tampouco vinculação do veículo acidentado a plataformas de transporte, nem a perda de rendimentos, revelando-se inidôneo o documento de "faturamento mensal" apresentado. A utilização de veículo locado durante o período em que o automóvel do autor esteve indisponível descaracteriza prejuízo efetivo, uma vez que houve continuidade do exercício da atividade profissional. A demora de nove semanas no conserto do veículo caracteriza falha na prestação do serviço pela seguradora, cuja obrigação contratual inclui a reparação célere e eficiente do bem segurado. A privação prolongada do veículo causou sofrimento relevante ao autor, atingindo sua dignidade e integridade psíquica, e ultrapassando o mero aborrecimento cotidiano, configurando dano moral. O valor de R$ 2.000,00 a título de indenização por danos morais mostra-se razoável e proporcional, considerando a extensão do dano, a situação econômica das partes e o caráter compensatório e pedagógico da reparação. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso parcialmente provido. Tese de julgamento: A comprovação de lucros cessantes exige prova inequívoca da perda patrimonial direta e certa, não se admitindo suposições ou documentos genéricos. A continuidade do exercício da atividade laboral com uso de veículo locado descaracteriza a alegada perda econômica. A demora excessiva e injustificada no conserto de veículo segurado caracteriza falha na prestação do serviço e enseja indenização por danos morais, quando evidenciado o abalo relevante aos direitos da personalidade da vítima. Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 389, parágrafo único; 402; 406, § 1º; CPC/2015, art. 1.013; CDC, arts. 6º, VI, e 14; Circular SUSEP nº 621/2021, art. 43. Jurisprudência relevante citada: TJMG, Apelação Cível 1.0000.23.062962-8/001, Rel. Des. Octávio de Almeida Neves, j. 19.10.2023; TJMG, Apelação Cível 1.0000.22.030582-5/001, Rel. Des. Leonardo de Faria Beraldo, j. 23.08.2022. (TJMG - Apelação Cível 1.0000.25.091173-2/001, Relator(a): Des.(a) Shirley Fenzi Bertão , 11ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 28/05/2025, publicação da súmula em 29/05/2025) – grifo nosso Por fim, importa ressaltar que, consoante entendimento jurisprudencial já sedimentado pelo STJ, não está obrigado o magistrado a se manifestar de todos os argumentos apresentados pelas partes em juízo, desde que sua decisão esteja devidamente fundamentada. Ademais, considerando-se os princípios da simplicidade e celeridade previstos na Lei nº. 9.099/95 é inegável que as decisões em âmbito de Juizados sejam as mais dinâmicas e objetivas possíveis. DISPOSITIVO Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por Iva Maria de Moura Beserra em face de Mapfre Seguros Gerais S.A., para: a) Condenar a Ré ao pagamento de R$14.400,00 (quatorze mil e quatrocentos reais), a título de restituição de danos materiais, acrescidos de juros de mora desde a citação (taxa SELIC) e correção monetária pelo IPCA a partir da data do efetivo prejuízo (Súmula 43 do STJ); b) Condenar a ré ao pagamento de R$2.000,00 (dois mil reais), a título de indenização por danos morais. O quantum indenizatório a título de dano moral deve ser monetariamente corrigido desde a data do arbitramento desta decisão (Súmula 362 do STJ) pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor - IPCA (art. 389, p.u., da Lei n. 14.905/2024). Juros moratórios de 1,0% (um por cento) ao mês a partir da citação, a serem corrigidos pelo Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC, deduzido o índice de atualização monetária, IPCA, de que trata o parágrafo único do art. 389 deste Código (Art. 406, parágrafo 1º, da Lei n. 14.905/2024, que alterou o Código Civil); Para fins de recurso inominado: O prazo para recurso é de 10 (dez) dias úteis contados da ciência da sentença (Lei n° 9.099/95, artigo 42). O valor do preparo, nos termos do § 1o, do artigo 42 da Lei no 9.099/95 deve ser efetuado, independentemente de nova intimação, no prazo de 48 horas seguintes à interposição do recurso. Sem condenação em custas, despesas processuais e verba honorária, nesta fase do procedimento, em razão da disposição inserta no artigo 55 da Lei no 9.099/95. Para fins de execução da sentença: após transitar em julgado a sentença, deverá a parte devedora efetuar voluntariamente o pagamento dos valores da condenação, no prazo de 15 (quinze) dias, independentemente de citação ou intimação para este fim, sob pena da incidência da multa de 10% (dez por cento) sobre o valor total da condenação, nos termos do disposto no artigo 52, inciso V, da Lei nº 9.099/95 c/c o art. 523, do CPC. Ocorrendo o descumprimento da obrigação de pagar quantia certa fixada em sentença, a parte credora deverá requerer o início da execução. Cumprida voluntariamente, expeça-se alvará de levantamento em favor da parte demandante e, em seguida, arquivem-se os autos, com baixa no sistema. Caso haja pedido de execução, instaure-se o incidente e, posteriormente, voltem-me conclusos. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Ana Jessyca Dias de Araújo Ferreira Juíza Leiga SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA HOMOLOGO, para que produza seus jurídicos e legais efeitos, o projeto de sentença elaborado pela Juíza Leiga Ana Jessyca Dias de Araújo Ferreira, o que faço com abrigo no artigo 40 da Lei no 9.099/95. PICOS-PI, datada e assinada em meio digital por.: Bel. Adelmar de Sousa Martins Juiz de Direito do JECC Picos Anexo II (R-Sá)
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Maria Dos Santos Lopes Araujo x Banco Ficsa S/A.
ID: 337167819
Tribunal: TJPI
Órgão: 3ª Câmara Especializada Cível
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0801341-94.2022.8.18.0029
Data de Disponibilização:
29/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FERNANDA RAFAELLA OLIVEIRA DE CARVALHO
OAB/PE XXXXXX
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LARISSA BRAGA SOARES DA SILVA
OAB/PI XXXXXX
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poder judiciário tribunal de justiça do estado do piauí GABINETE DO Desembargador AGRIMAR RODRIGUES DE ARAÚJO PROCESSO Nº: 0801341-94.2022.8.18.0029 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO(S): [Emprést…
poder judiciário tribunal de justiça do estado do piauí GABINETE DO Desembargador AGRIMAR RODRIGUES DE ARAÚJO PROCESSO Nº: 0801341-94.2022.8.18.0029 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO(S): [Empréstimo consignado] APELANTE: MARIA DOS SANTOS LOPES ARAUJO APELADO: BANCO FICSA S/A. APELAÇÃO CÍVEL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. CONDENAÇÃO EM LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. AUSÊNCIA DE PROVA DA MÁ-FÉ. TEMA 243 DO STJ. APELAÇÃO CONHECIDA E PROVIDA MONOCRATICAMENTE. DECISÃO MONOCRÁTICA 1. RELATÓRIO Trata-se de Apelação Cível interposta contra sentença que, nos autos da Ação Declaratória de Nulidade de Negócio Jurídico cumulado com Danos Materiais e Morais julgou improcedentes os pleitos autorais, nos termos a seguir transcritos: “Assim, forte nas razões expostas, julgo IMPROCEDENTES todos os pedidos autorais resolvendo assim o mérito do processo, com supedâneo no artigo 487, I, do CPC. Condeno a parte requerente nas custas processuais e nos honorários advocatícios no patamar de 20% (vinte por cento) sobre o valor atribuído à causa. No mais, com fulcro no art. 80, II, e art. 81, ambos do CPC, condeno o(a) requerente, e a advogada solidariamente, uma vez que a parte não possui conhecimentos jurídicos tendo tudo sido aduzido por seu advogado, por litigância de má-fé. Fixo a multa no valor correspondente a 8% (oito por certo) do valor da causa atualizado. Confirmo o pedido de justiça gratuita, razão pela qual fica suspensa a cobrança das custas processuais, pelo prazo de 05 (cinco) anos, nos termos do art. 12 da Lei n. 1.060/50, c/c §3º do art. 93 do NCPC.” Em suas razões recursais, a parte recorrente defende que a condenação por litigância de má-fé é indevida, pois a autora apenas exerceu seu direito de ação diante de descontos que afirmava desconhecer, sem qualquer indício de dolo ou alteração da verdade dos fatos. Ressalta, por fim, a impossibilidade jurídica da condenação do advogado nos próprios autos, uma vez que eventual responsabilização profissional deve ser apurada em processo próprio perante a OAB, conforme entendimento pacificado do STJ. Pugnou, por fim, que o Recurso de Apelação seja conhecido e provido. Contrarrazões apresentadas no Id. N. 22877759. O único ponto controvertido é a possibilidade, ou não, de condenar a parte Autora e a sua advogada ao pagamento de multa por litigância de má-fé. É o que basta relatar. Decido. 2. FUNDAMENTAÇÃO Antemão, verifico que a presente Apelação é tempestiva, preenche todos os requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, sendo dispensado o recolhimento de preparo em razão da gratuidade de justiça. Daí porque conheço do presente recurso. A presente Apelação tem como objetivo apenas afastar a multa por litigância de má-fé arbitrada na sentença a quo. Analisando os argumentos apresentados pela parte autora, depreende-se que o demandante apenas pretendia exercer seu direito de ação, garantido pela Constituição da República, uma vez que não recordava de ter firmado nenhum contrato de empréstimo com a instituição financeira apelada. É possível concluir também que a conduta do autor no presente processo não se amolda a nenhuma das hipóteses previstas no art. 80 do CPC. De saída, é necessário apontar que, especialmente nas regiões mais remotas do Piauí, os consumidores, muitas vezes idosos e com pouca instrução, realizam os empréstimos apenas através de corretoras financeiras multibancárias. Nessa situação, por óbvio, é difícil exigir que pessoa não alfabetizada, ou semialfabetizada (caso em análise), consiga recordar, dentre as diversas operações de crédito contidas em seu extrato bancário, quais foram, ou não, regularmente contratadas. Dito isto, saliento que o entendimento uníssono das Cortes Superiores é que a presunção da boa-fé é princípio geral do direito e que “a boa-fé se presume e a má-fé se prova”, conforme colho dos seguintes julgados: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. CONTRATO DE SEGURO DE VIDA EM GRUPO. INVALIDEZ PERMANENTE. DOENÇA PREEXISTENTE. AUSÊNCIA DE EXAMES PRÉVIOS. NECESSIDADE DE SE PROVAR A MÁ-FÉ DO SEGURADO. SÚMULA 609/STJ. RECURSO DESPROVIDO. 1. Verificada a ausência de elementos concretos para a caracterização de má-fé, deve-se presumir a boa-fé do segurado. "A presunção de boa-fé é princípio geral de direito universalmente aceito, sendo milenar a parêmia: a boa-fé se presume; a má-fé se prova" (REsp 956.943/PR - Repetitivo, Rel. p/ acórdão Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, CORTE ESPECIAL, DJe de 1º/12/2014). 2. Agravo interno desprovido, com o retorno dos autos à origem. (STJ - AgInt nos EDcl no REsp: 1745782 PR 2018/0134778-6, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 13/11/2018, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 29/11/2018). AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. COISA JULGADA. NÃO CONFIGURAÇÃO. RETRIBUIÇÃO DE AÇÕES. NÃO COMPROVAÇÃO. REVISÃO. INVIABILIDADE. NECESSIDADE DE REEXAME FÁTICO. SÚMULA 7/STJ. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. DOLO PROCESSUAL. NÃO VERIFICAÇÃO. MULTA. AFASTAMENTO. AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Não cabe, em recurso especial, reexaminar matéria fático-probatória (Súmula n. 7/STJ). 2. A sanção por litigância de má-fé somente é cabível quando demonstrado o dolo processual, o que não se verifica no caso concreto, devendo ser afastada a multa aplicada. 3. Agravo interno parcialmente provido. (STJ - AgInt no AREsp: 1873464 MS 2021/0107534-9, Relator: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Julgamento: 13/12/2021, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/12/2021). No mesmo sentido o STJ já se manifestou, através do Tema 243, abaixo transcrito: Para fins do art. 543-c do CPC, firma-se a seguinte orientação: (...) 1.3. A presunção de boa-fé é princípio geral de direito universalmente aceito, sendo milenar parêmia: a boa-fé se presume; a má-fé se prova. (...) Mutatis mutandis, apesar da referida tese originalmente tratar de execuções de natureza fiscal, a Corte Cidadã traz a matéria referente à boa e má-fé de forma geral, sem fazer qualquer distinção às demais situações jurídicas, inclusive dispondo do tema como “princípio geral do direito universalmente aceito”, possibilitando, assim, a aplicação inequívoca, por analogia, ao caso em debate. Pelo exposto, considerando a ausência da prova de qualquer dolo processual, é medida de justiça o provimento do recurso para afastar a condenação por litigância de má-fé. Por outro lado, no que versa sobre a condenação dos patronos da parte autora à multa por litigância de má-fé, o parágrafo único do art. 32 da Lei Federal nº 8.906/94 (Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil) impõe a necessidade de ação própria para a aferição da existência de atuação conjunta do causídico e da parte para a postulação de lide temerária. Ainda, urge mencionar que o profissional da advocacia não se encontra elencado no rol taxativos (art. 79 do CPC) de agente processual a ser responsabilizado por quaisquer das condutas estipuladas pelo art. 80 do Código de Processo Civil, vejamos: Art. 32. O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa. Parágrafo único. Em caso de lide temerária, o advogado será solidariamente responsável com seu cliente, desde que coligado com este para lesar a parte contrária, o que será apurado em ação própria. Para além disso, denota-se da leitura dos dispositivos supramencionados a existência da imunidade relativa aos referidos profissionais, a qual tem como objetivo finalístico a garantia da independência entre a parte autora e os legisperitos, de modo que os abusos atinentes aos advogados devem ser apurados e reprimidos pelo órgão de classe, no caso a OAB, competindo, assim, ao Juízo singular, no momento da prolação, oficiar tal órgão e o Ministério Público. Neste ponto, portanto, inexistindo previsão legal e jurisprudencial para imposição de multa por litigância de má-fé ao advogado, compreende-se que o juízo a quo agiu de forma equivocada ao inovar o ordenamento jurídico. Não é outro o entendimento o entendimento desta e. Corte de Justiça, conforme se denota dos recentes precedentes, mutatis mutandis: PROCESSUAL CIVIL. CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DETERMINAÇÃO DE EMENDA À INICIAL NÃO ATENDIDA. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. INDÍCIOS DE LITIGÂNCIA PREDATÓRIA. PODER GERAL DE CAUTELA. RECURSO CONTRÁRIO À SÚMULA Nº 33 DO TJPI. CONDENAÇÃO DA ADVOGADA AO PAGAMENTO DE MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. IMPOSSIBILIDADE. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. I – O Tribunal Pleno deste eg. Tribunal de Justiça, através da aprovação da proposta sumular nº 33, na 141ª Sessão Ordinária Administrativa, consolidou o entendimento de que, em caso de fundada suspeita de demanda repetitiva ou predatória, é legítima a exigência dos documentos recomendados pelas Notas Técnicas do Centro de Inteligência da Justiça Estadual Piauiense, com base no art. 321 do CPC. II – Nesse contexto, a Nota Técnica nº 06, elaborada pelo Centro de Inteligência da Justiça Estadual do Piauí – CIJEPI, prevê que, havendo suspeita de propositura indevida de ações, o Magistrado está autorizado a exigir providências com o intuito de inibir situações fraudulentas, como é o caso das demandas predatórias envolvendo empréstimos consignados, apresentando, dentre outras medidas como sugestão, as adotadas pelo Juiz a quo. III – Posto isso, sendo precisamente esse o entendimento aplicável ao caso dos autos, impõe-se reconhecer que a sentença recorrida está em plena conformidade com a jurisprudência consolidada desta Corte neste ponto (Súmula nº 33 do TJPI). IV – Noutro lado, no que concerne a condenação da advogada da parte Apelante ao pagamento de multa por litigância de má-fé, convém ressaltar que as custas processuais, honorários advocatícios e penalidades por litigância de má-fé, são despesas atribuídas exclusivamente às partes habilitadas no processo, não podendo ser estendidas ao causídico que atuou na causa, o qual, em caso de eventual responsabilidade disciplinar, deve responder em Ação própria, consoante dispõe o art. 32, da Lei nº 8.906/1994. V – Apelação Cível conhecida e parcialmente provida. (TJPI - APELAÇÃO CÍVEL 0802759-91.2023.8.18.0042 - Relator: DIOCLECIO SOUSA DA SILVA - 1ª Câmara Especializada Cível - Data 20/02/2025). DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO DE APELAÇÃO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA DA PARTE E DO ADVOGADO. IMPOSSIBILIDADE DE IMPOSIÇÃO DIRETA AO ADVOGADO. NECESSIDADE DE AÇÃO PRÓPRIA. PARCIAL PROVIMENTO. I. CASO EM EXAME Recurso de Apelação interposto por autora em face de sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados em ação declaratória de nulidade de negócio jurídico cumulada com danos materiais e morais, condenando a parte autora e seu advogado, solidariamente, por litigância de má-fé, ao pagamento de multa de 5% sobre o valor da causa e das custas processuais e honorários advocatícios. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) verificar a legalidade da condenação por litigância de má-fé da parte autora; (ii) analisar se é possível a imposição direta de multa por litigância de má-fé ao advogado da parte autora. III. RAZÕES DE DECIDIR A condenação por litigância de má-fé da parte autora encontra fundamento no art. 80, II e III, do CPC, pois restou configurada a intenção de alterar a verdade dos fatos, evidenciada pela tentativa de declaração de inexistência de contrato que se comprovou regularmente firmado. Quanto à imposição de multa por litigância de má-fé ao advogado, o art. 32, parágrafo único, da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) exige a propositura de ação própria para apuração da conduta dolosa ou temerária do causídico, não sendo possível a imposição direta nos autos do processo principal. O art. 79 do CPC limita a possibilidade de condenação por litigância de má-fé às partes do processo, não alcançando diretamente os advogados. A jurisprudência do STJ é pacífica ao vedar a aplicação de multa por litigância de má-fé ao advogado sem a devida apuração em ação própria (STJ, RMS 71836/MT, Rel. Min. Raul Araújo, T4, j. 26/09/2023). O afastamento da condenação do advogado não afeta a condenação da parte autora, que permanece válida, nos termos da legislação e da fundamentação apresentada. IV. DISPOSITIVO E TESE Recurso de Apelação conhecido e parcialmente provido para afastar a condenação por litigância de má-fé imposta ao advogado da parte autora, mantendo-se a sentença em seus demais termos. Tese de julgamento: A condenação por litigância de má-fé pode ser imposta às partes do processo nos termos do art. 80 do CPC, quando comprovada a alteração intencional da verdade dos fatos ou uso abusivo do processo. A imposição de multa por litigância de má-fé ao advogado exige ação própria, conforme o art. 32, parágrafo único, da Lei nº 8.906/94, sendo vedada sua aplicação direta no processo principal. Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 79 e 80; Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia), art. 32, parágrafo único. Jurisprudência relevante citada: STJ, RMS 71836/MT, Rel. Min. Raul Araújo, T4, j. 26/09/2023, DJe 03/10/2023. (TJPI - APELAÇÃO CÍVEL 0801146-46.2021.8.18.0029 -Relator: JOSE WILSON FERREIRA DE ARAUJO JUNIOR - 2ª Câmara Especializada Cível - Data 19/02/2025). PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA CONTRATUAL C/C PEDIDO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. AUSÊNCIA DE CONDUTA QUE SE ENQUADRA NA PREVISÃO LEGAL. DOLO NÃO DEMONSTRADO. MERO EXERCÍCIO DO DIREITO. CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA DO ADVOGADO AO PAGAMENTO DE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. IMPOSSIBILIDADE. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. I - Na Apelação Cível, a parte Apelante impugnou a sentença, tão somente, no tocante à condenação ao pagamento de multa por litigância de má-fé, razão pela qual, se tornou incontroversa a validade da relação contratual entabulada entre as partes e passo a analisar apenas a condenação da parte Apelante e de seus causídicos, solidariamente, ao pagamento de multa por litigância de má-fé, em obediência à restrição da extensão do efeito devolutivo do recurso, previsto no art. 1.013, caput, do CPC. II - Sobre o tema, o CPC preconiza o dever intersubjetivo das partes de proceder com lealdade, boa-fé, veracidade e cooperação na relação processual. Para tanto, impõe técnicas sancionatórias com o fito de inibir o descumprimento desses encargos, punindo quem se vale do processo judicial para fins escusos ou retarda indevidamente a prestação jurisdicional. III – No caso, o Juiz a quo entendeu pela litigância de má-fé por parte do Apelante, em razão da existência de coisa julgada com o processo nº 0010379-75.2019.8.18.0060. Contudo, entendo que o mero reconhecimento da coisa julgada do feito não é suficiente para presumir a má-fé processual da parte Autora, sobretudo considerando que os advogados que atuaram em ambos os feitos são distintos. IV – De igual modo, no que concerne a condenação solidária do causídico da parte Apelante, convém ressaltar que as custas processuais, honorários advocatícios e penalidades por litigância de má-fé, são despesas atribuídas exclusivamente às partes habilitadas no processo, não podendo ser estendidas ao causídico que atuou na causa, o qual, em caso de eventual responsabilidade disciplinar, deve responder em Ação própria, consoante dispõe o art. 32, da Lei nº 8.906/1994. V - Apelação Cível conhecida e provida. (TJPI - APELAÇÃO CÍVEL 0801555-85.2022.8.18.0029 - Relator: DIOCLECIO SOUSA DA SILVA - 1ª Câmara Especializada Cível - Data 12/02/2025) Assim, afasto a condenação ao advogado, já que não há previsão legal para tanto. Nessa esteira, consigno que o art. 932, V, “b”, do CPC/2015, autoriza o Relator a dar provimento ao recurso quando o decisum combatido for contrário a acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos, como se lê: Art. 932. Incumbe ao relator: (...) V – depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; No caso em análise, sendo evidente a oposição da decisão apelada ao tema 243 do STJ, o provimento do recurso é medida que se impõe. Pelo exposto, dou provimento à Apelação Cível para afastar a multa por litigância de má-fé. 3. DECISÃO Forte nessas razões, dou provimento monocraticamente a presente Apelação, conforme o art. 932, V, “b”, do CPC/2015, reformando a sentença recorrida apenas para afastar a multa por litigância de má-fé à parte autora e a seus advogados. Mantenho o ônus sucumbencial em desfavor da Apelante, nos termos do art. 86, parágrafo único do CPC, contudo, defiro a gratuidade judiciária pleiteada, determinando a suspensão da exigibilidade dos honorários advocatícios. Transcorrido o prazo sem interposição de recurso, arquivem-se os autos e dê-se baixa na distribuição. Desembargador Agrimar Rodrigues de Araújo Relator
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Processo nº 0801355-20.2023.8.18.0037
ID: 338114146
Tribunal: TJPI
Órgão: 2ª Câmara Especializada Cível
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0801355-20.2023.8.18.0037
Data de Disponibilização:
30/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
FELICIANO LYRA MOURA
OAB/PI XXXXXX
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poder judiciário tribunal de justiça do estado do piauí GABINETE DO Desembargador MANOEL DE SOUSA DOURADO PROCESSO Nº: 0801355-20.2023.8.18.0037 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO(S): [Empréstimo …
poder judiciário tribunal de justiça do estado do piauí GABINETE DO Desembargador MANOEL DE SOUSA DOURADO PROCESSO Nº: 0801355-20.2023.8.18.0037 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO(S): [Empréstimo consignado] APELANTE: ANTONIO LOPES DE SOUSA APELADO: BANCO PAN S.A. DECISÃO TERMINATIVA APELAÇÃO CÍVEL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONTRATO ELETRÔNICO ASSINADO. BIOMETRIA FACIAL. COMPROVANTE DE TRANSFERÊNCIA DE VALORES JUNTADO AOS AUTOS. SÚMULA Nº 18 DO TJPI. AUSÊNCIA DE VÍCIO NA CONTRATAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. DECISÃO TERMINATIVA Trata-se de Recurso de Apelação interposto por ANTÔNIO LOPES DE SOUSA contra sentença proferida nos autos da AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO, ajuizada em desfavor de BANCO PAN S/A, cuja pretensão central consistia na declaração de inexistência de contrato de empréstimo consignado, bem como na devolução em dobro dos valores descontados e indenização por danos morais,nos seguintes termos: [...] Ante o exposto, julgo improcedente os pedidos, extinguindo o feito com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo CiviL. Em relação às custas processuais, deixo de condenar a parte autora ao seu pagamento, diante do benefício da gratuidade judiciária deferida e da isenção fiscal prevista na Lei de Custas do Piauí (Lei Estadual nº 6.920/2016, art. 8º, I). Condeno a parte autora ao pagamento dos honorários de sucumbência, os quais arbitro em 10% sobre o valor atualizado da causa, na forma do artigo 85 do CPC. Suspendo a exigibilidade de tal verba, tendo em vista que a parte autora é beneficiária da gratuidade de justiça, o que faço com fundamento no § 3º do artigo 98 do CPC. [...] Inconformada, a parte autora interpôs apelação (id.26114798), alegando, em síntese, que não firmou o contrato objeto da lide e que não autorizou o desconto em seu benefício previdenciário; que o documento acostado pelo banco recorrido não contém assinatura válida e que a imagem utilizada na biometria facial pode ter sido extraída de forma fraudulenta, sem seu conhecimento; que a instituição financeira não apresentou comprovante de TED ou outro meio idôneo a demonstrar o repasse dos valores, contrariando os ditames das Súmulas 18 e 26 do TJPI; que houve dano moral diante da suposta fraude, pleiteando indenização no montante de R$ 5.000,00, nos moldes da jurisprudência local. Ao final, pugna pela reforma integral da sentença, com o reconhecimento da nulidade do contrato, devolução em dobro dos valores e indenização por danos morais. Devidamente intimada, a parte apelada apresentou as contrarrazões (id.26114800), sustentando, preliminarmente, a falta de fundamentação, no mérito, refutou as alegações do recurso e pugnou pela sua improcedência. É o relatório. Decido. 1 - DA ADMISSIBILIDADE RECURSAL Recurso interposto tempestivamente. Ausência preparo recursal da parte autora/apelante, em razão da concessão dos benefícios da Justiça Gratuita. Presentes, ainda, os demais requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, quais sejam: cabimento, legitimidade, interesse para recorrer, inexistência de fato impeditivo ou extintivo e regularidade formal. Desta forma,RECEBO a Apelação Cívelnos efeitos devolutivo e suspensivo, conforme artigo 1012, caput, do Código de Processo Civil. 2–DA PRELIMINAR DE FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DO RECURSO Sustenta a parte apelada, em suas contrarrazões, que há falta de fundamentação no recurso interposto pela parte autora, visto que, em momento algum o apelante trouxe em sua peça recursal os motivos jurídicos que demonstrem que a r. sentença mereça ser modificada, assim como não forneceu as razões do seu inconformismo, no que diz respeito a qualquer vício jurídico da sentença ora combatida. Pois bem. Para que possa ser conhecido, o recurso deve cumprir uma série de requisitos, entre os quais o da regularidade formal. Como é sabido, o Princípio da Dialeticidade Recursal impõe à parte recorrente o ônus de motivar o recurso, expondo as razões hábeis à reforma da decisão recorrida frente ao que nela foi decidido. Em outros termos, o recurso deve ser apresentado com fundamentos que rebatam os argumentos sustentados no julgado, sob pena de não conhecimento. A propósito, assevera Araken de Assis: O fundamento do princípio da dialeticidade é curial. Sem cotejar as alegações do recurso e a motivação do ato impugnado, mostrar-se-á impossível ao órgão ad quem avaliar o desacerto do ato, a existência de vício de juízo (error in iudicando), o vício de procedimento (error in procedendo) ou o defeito típico que enseja a declaração do provimento. (...) É preciso que haja simetria entre o decidido e o alegado no recurso. Em outras palavras, a motivação deve ser, a um só tempo, específica, pertinente e atual.(ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. ps. 95/96). Nesse sentido, também leciona José Carlos Barbosa Moreira: A fundamentação é indispensável para que o apelado e o próprio órgão ad quem fiquem sabendo quais as razões efetivamente postas pelo apelante como base de sua pretensão a novo julgamento mais favorável.(MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. Vol. V (arts. 476 a 565). Rio de Janeiro: Forense. p. 333.). In casu, examinando detidamente as razões do recurso de apelação aviado, vê-se que restaram suficientemente demonstrados e atacados os motivos pelos quais ele entende que a sentença estaria equivocada, dando perfeitas condições para que este juízo ad quem conheça de seu apelo, consoante prescreve o art. 1.010, inciso III, do Diploma Processual Civil de 2015, obedecendo, destarte, o pressuposto de admissibilidade da regularidade formal. Rejeito, pois a preliminar arguida. 3- FUNDAMENTAÇÃO De início, destaco que o artigo 932 do Código de Processo Civil versa sobre a competência delegada ao relator para a prática de atos processuais. Dentre eles, existe a possibilidade de julgamento monocrático do recurso. Dispõe o artigo 932, IV, do Código de Processo Civil o seguinte: Art. 932. Incumbe ao relator: IV - negar provimento a recurso que for contrário a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; Tal previsão encontra-se, ainda, constante no art. 91, VI-A, do Regimento Interno do e. Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, senão vejamos: “Art. 91. Compete ao Relator, nos feitos que lhe forem distribuídos, além de outros deveres legais e deste Regimento: (…) VI-A - negar provimento a recurso que for contrário a súmula ou acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; (Redação dada pelo art. 1º da Resolução nº 21, de 15/09/2016)” Utilizo-me, pois, de tais disposições normativas, uma vez que a matéria aqui trazida já foi amplamente deliberada nesta Corte de Justiça, possuindo até mesmo disposição de súmula. O cerne da controvérsia gira em torno da alegação da parte Apelante quanto à inexistência de contratação válida do empréstimo consignado. Não há dúvida de que a referida lide, por envolver a discussão acerca de falha na prestação de serviços é regida pela ótica do Código de Defesa do Consumidor, o que, inclusive, restou sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme a redação: STJ/SÚMULA Nº297: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras. Nesse contexto, os partícipes da relação processual têm suas situações moldadas às definições jurídicas de consumidor e fornecedor previstas, respectivamente, nos artigos 2º e 3º do CDC. Nas referidas ações, em regra, é deferida em favor da parte Autora a inversão do ônus da prova, em razão da hipossuficiência técnica financeira, a fim de que a Instituição bancária comprove a existência do contrato, bem como o depósito da quantia contratada. Esta é uma questão exaustivamente debatida nesta E. Câmara Especializada Cível, possuindo até mesmo disposição expressa na Súmula nº 26 deste TJPI, in litteris: TJPI/SÚMULA Nº 26 – Nas causas que envolvem contratos bancários, aplica-se a inversão do ônus da prova em favor do consumidor (CDC, art, 6º, VIII) desde que comprovada sua hipossuficiência em relação à instituição financeira, entretanto, não dispensa que o consumidor prove a existência de indícios mínimos do fato constitutivo de seu direito, de forma voluntária ou por determinação do juízo. Nesse contexto, é essencial reconhecer a vulnerabilidade do consumidor. No entanto, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor não implica em favorecimento desproporcional de uma parte em detrimento da outra, pois seu objetivo é justamente assegurar a paridade processual. Destaca-se que, por se tratar de relação de consumo, a controvérsia deve ser analisada à luz da Teoria da Responsabilidade Objetiva, prevista no artigo 14 do CDC. Cabe, portanto, à instituição financeira comprovar a regularidade da contratação, conforme determina o artigo 6º, inciso VIII, do mesmo diploma legal. O contrato de empréstimo consignado vinculado a benefício previdenciário está previsto na Lei nº 10.820/2003, que regula a autorização para descontos em folha de pagamento. Sobre o tema, o artigo 6º da referida lei dispõe: Art. 6º. Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1º e autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS Analisando o contexto da demanda, verifica-se que a instituição financeira juntou aos autos cópia do contrato eletrônico assinado eletronicamente pela parte autora (d.26114780), com a biometria facial. Ademais, foi acostado comprovante de transferência bancária no valor contratado (id. 26114783), evidenciando o repasse do montante à autora. Além disso, o banco réu juntou também dossiê de contratação e cópias dos documentos pessoais daautora (id.26114780 pág 10 e 11), demonstrando, de forma cabal a existência da pactuação do empréstimo entre as partes. Assim, no caso em análise, está comprovado o crédito do valor na conta da parte autora, o que justifica a origem da dívida, conforme demonstrado pelo comprovante de repasse do empréstimo. Tal fato está em consonância com a interpretação a contrario sensu da nova redação da Súmula nº 18 deste Tribunal de Justiça, conforme se observa: TJPI/SÚMULA Nº 18: A ausência de transferência do valor do contrato para conta bancária de titularidade do mutuário enseja a declaração de nulidade da avença e seus consectários legais e pode ser comprovada pela juntada aos autos de documentos idôneos, voluntariamente pelas partes ou por determinação do magistrado nos termos do artigo 6º do Código de Processo Civil. No caso em tela, não há ausência de transferência, sendo demonstrado que o valor foi efetivamente creditado à autora. Portanto, inaplicável a nulidade da contratação, devendo ser mantida a validade do negócio jurídico celebrado entre as partes. No mesmo sentido, preleciona a remansosa jurisprudência dos Tribunais Pátrios, inclusive desta Corte de Justiça, a saber: “CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO, COM DESCONTO EM FOLHA – Reconhecimento: (a) da validade do contrato de cartão de crédito consignado, com desconto em folha de pagamento, celebrado pelas partes, o que permite à parte ré instituição financeira efetuar a reserva da margem consignável, a teor do art. 2º, § 2º, I, da LF 10.820/2003, com redação dada pela LF 13.172/2015, visto que a celebração do contrato, negada pela parte autora, restou demonstrada pela prova documental produzida pela parte ré instituição e inconsistentes as alegações da parte autora consumidora de inexistência de contratação ou de sua nulidade por vício de consentimento e venda casada; e (b) da existência de liberação de crédito, decorrente da contratação, em questão. DÉBITO, RESPONSABILIDADE CIVIL E CESSAÇÃO DE DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO – Válido o contrato de crédito consignado, com liberação de crédito, ainda não satisfeito, no caso dos autos, de rigor, o reconhecimento de que a parte ré instituição financeira tem direito de efetuar a reserva da margem consignável, a teor do art. 2º, § 2º, I, da LF 10.820/2003, com redação dada pela LF 13.172/2015, e, consequentemente, da licitude da conduta da ré e do descabimento de sua condenação ao pagamento de indenização, a título de danos moral e material, porque não existe obrigação de indenizar, uma vez que a parte credora não praticou ato ilícito, nem à repetição de indébito, em dobro ou de forma simples, uma vez que inexistente desconto indevido, por se tratar o exercício regular de seu direito (CC, art. 188, I), com manutenção da r. sentença. Recurso desprovido. (TJ-SP - AC: 10182386120178260032 SP 1018238-61.2017.8.26.0032, Relator: Rebello Pinho, Data de Julgamento: 17/06/2019, 20ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 19/06/2019).” “APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. TEORIA DO DIÁLOGO DAS FONTES. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. PREVISÃO CONTRATUAL DE DESCONTOS EM FOLHA PARA ABATIMENTO DO SALDO DEVEDOR. INSTRUMENTO CONTRATUAL QUE EXPLICITA TODAS AS INFORMAÇÕES ACERCA DA OBRIGAÇÃO ASSUMIDA. CONTRATANTE. PESSOA ESCLARECIDA. INEXISTÊNCIA DE ERRO. DEFEITO DO NEGÓCIO JURÍDICO NÃO COMPROVADO. UTILIZAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO PARA COMPRAS. PAGAMENTO CONSIGNADO DO VALOR MÍNIMO MENSAL. CRESCIMENTO DO MONTANTE DA DÍVIDA. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. INEXISTÊNCIA DE DEVER DE INDENIZAR. APELO CONHECIDO E NEGADO PROVIMENTO. 1. Segundo a teoria do diálogo das fontes às normas jurídicas não se excluem, mas se complementam, de modo que aplico ao presente caso as normas dispostas no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor. 2. Não houve defeito no negócio jurídico no momento da contratação, tendo em vista que o contrato é expresso quanto a modalidade da contratação de cartão de crédito com margem consignável. 3. O contratante é servidor público do Estado do Piauí, pessoa alfabetizada e esclarecida, sendo perceptível a contratação livre e espontânea do negócio jurídico. 4. Há provas nos autos de que o apelante efetuou saque de dinheiro e utilizou o cartão na modalidade crédito, realizando diversas despesas que indicam que seu intento foi efetivamente a contratação de um cartão de crédito com margem consignável. 5. Não constitui ato ilícito o praticado pelo apelado em realizar descontos no contracheque do apelante, tendo em vista que o ato em questão resulta em mero exercício regular de direito, de modo que não há danos morais a serem compensados. 6. Recurso conhecido. No mérito negado provimento. (TJ-PI, Apelação Cível nº. 0706000-70.2018.8.18.0000, Órgão Julgador: 3ª Câmara Especializada Cível, Relator: Desembargador Olímpio José Passos Galvão, Julgamento: 8/11/2018, Publicação DJe 8556: 14/11/2018) Nesse contexto, os documentos apresentados pela instituição financeira demonstram a existência de vínculo jurídico entre as partes, bem como a efetiva disponibilização do valor contratado em favor da parte Apelante. A recorrente, por sua vez, não apresentou qualquer prova em sentido contrário quanto à suposta irregularidade, sendo certo que, mesmo com a inversão do ônus da prova, permanece o dever de quem alega um fato demonstrá-lo (art. 373, I, do CPC). Diante dos fundamentos expostos, não há que se falar em devolução de valores ou indenização por danos morais, uma vez que a contratação foi realizada de forma livre e regular, inexistindo indícios de fraude, erro ou coação que justifiquem a reparação pleiteada. Assim, a r. sentença deve ser mantida em sua integralidade. 5 – DISPOSITIVO Ante o exposto, CONHEÇO do recurso, para, no mérito, NEGAR-LHE PROVIMENTO, com fundamento no art. 932, IV, “a” do CPC, mantendo incólume os termos da sentença vergastada. Nos termos do art. 85, §11, do Código de Processo Civil, majoro os honorários advocatícios em 5% sobre o valor da causa, mantida a suspensão da exigibilidade por força da concessão da gratuidade da justiça. Intimem-se as partes. Preclusas as vias impugnatórias, dê-se baixa na distribuição, e proceda-se com o arquivamento dos autos. Desembargador MANOEL DE SOUSA DOURADO
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Processo nº 0801355-20.2023.8.18.0037
ID: 338114149
Tribunal: TJPI
Órgão: 2ª Câmara Especializada Cível
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0801355-20.2023.8.18.0037
Data de Disponibilização:
30/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
IAGO RODRIGUES DE CARVALHO
OAB/PI XXXXXX
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poder judiciário tribunal de justiça do estado do piauí GABINETE DO Desembargador MANOEL DE SOUSA DOURADO PROCESSO Nº: 0801355-20.2023.8.18.0037 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO(S): [Empréstimo …
poder judiciário tribunal de justiça do estado do piauí GABINETE DO Desembargador MANOEL DE SOUSA DOURADO PROCESSO Nº: 0801355-20.2023.8.18.0037 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO(S): [Empréstimo consignado] APELANTE: ANTONIO LOPES DE SOUSA APELADO: BANCO PAN S.A. DECISÃO TERMINATIVA APELAÇÃO CÍVEL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CONTRATO ELETRÔNICO ASSINADO. BIOMETRIA FACIAL. COMPROVANTE DE TRANSFERÊNCIA DE VALORES JUNTADO AOS AUTOS. SÚMULA Nº 18 DO TJPI. AUSÊNCIA DE VÍCIO NA CONTRATAÇÃO. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. DECISÃO TERMINATIVA Trata-se de Recurso de Apelação interposto por ANTÔNIO LOPES DE SOUSA contra sentença proferida nos autos da AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO, ajuizada em desfavor de BANCO PAN S/A, cuja pretensão central consistia na declaração de inexistência de contrato de empréstimo consignado, bem como na devolução em dobro dos valores descontados e indenização por danos morais,nos seguintes termos: [...] Ante o exposto, julgo improcedente os pedidos, extinguindo o feito com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo CiviL. Em relação às custas processuais, deixo de condenar a parte autora ao seu pagamento, diante do benefício da gratuidade judiciária deferida e da isenção fiscal prevista na Lei de Custas do Piauí (Lei Estadual nº 6.920/2016, art. 8º, I). Condeno a parte autora ao pagamento dos honorários de sucumbência, os quais arbitro em 10% sobre o valor atualizado da causa, na forma do artigo 85 do CPC. Suspendo a exigibilidade de tal verba, tendo em vista que a parte autora é beneficiária da gratuidade de justiça, o que faço com fundamento no § 3º do artigo 98 do CPC. [...] Inconformada, a parte autora interpôs apelação (id.26114798), alegando, em síntese, que não firmou o contrato objeto da lide e que não autorizou o desconto em seu benefício previdenciário; que o documento acostado pelo banco recorrido não contém assinatura válida e que a imagem utilizada na biometria facial pode ter sido extraída de forma fraudulenta, sem seu conhecimento; que a instituição financeira não apresentou comprovante de TED ou outro meio idôneo a demonstrar o repasse dos valores, contrariando os ditames das Súmulas 18 e 26 do TJPI; que houve dano moral diante da suposta fraude, pleiteando indenização no montante de R$ 5.000,00, nos moldes da jurisprudência local. Ao final, pugna pela reforma integral da sentença, com o reconhecimento da nulidade do contrato, devolução em dobro dos valores e indenização por danos morais. Devidamente intimada, a parte apelada apresentou as contrarrazões (id.26114800), sustentando, preliminarmente, a falta de fundamentação, no mérito, refutou as alegações do recurso e pugnou pela sua improcedência. É o relatório. Decido. 1 - DA ADMISSIBILIDADE RECURSAL Recurso interposto tempestivamente. Ausência preparo recursal da parte autora/apelante, em razão da concessão dos benefícios da Justiça Gratuita. Presentes, ainda, os demais requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade, quais sejam: cabimento, legitimidade, interesse para recorrer, inexistência de fato impeditivo ou extintivo e regularidade formal. Desta forma,RECEBO a Apelação Cívelnos efeitos devolutivo e suspensivo, conforme artigo 1012, caput, do Código de Processo Civil. 2–DA PRELIMINAR DE FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO DO RECURSO Sustenta a parte apelada, em suas contrarrazões, que há falta de fundamentação no recurso interposto pela parte autora, visto que, em momento algum o apelante trouxe em sua peça recursal os motivos jurídicos que demonstrem que a r. sentença mereça ser modificada, assim como não forneceu as razões do seu inconformismo, no que diz respeito a qualquer vício jurídico da sentença ora combatida. Pois bem. Para que possa ser conhecido, o recurso deve cumprir uma série de requisitos, entre os quais o da regularidade formal. Como é sabido, o Princípio da Dialeticidade Recursal impõe à parte recorrente o ônus de motivar o recurso, expondo as razões hábeis à reforma da decisão recorrida frente ao que nela foi decidido. Em outros termos, o recurso deve ser apresentado com fundamentos que rebatam os argumentos sustentados no julgado, sob pena de não conhecimento. A propósito, assevera Araken de Assis: O fundamento do princípio da dialeticidade é curial. Sem cotejar as alegações do recurso e a motivação do ato impugnado, mostrar-se-á impossível ao órgão ad quem avaliar o desacerto do ato, a existência de vício de juízo (error in iudicando), o vício de procedimento (error in procedendo) ou o defeito típico que enseja a declaração do provimento. (...) É preciso que haja simetria entre o decidido e o alegado no recurso. Em outras palavras, a motivação deve ser, a um só tempo, específica, pertinente e atual.(ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. ps. 95/96). Nesse sentido, também leciona José Carlos Barbosa Moreira: A fundamentação é indispensável para que o apelado e o próprio órgão ad quem fiquem sabendo quais as razões efetivamente postas pelo apelante como base de sua pretensão a novo julgamento mais favorável.(MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. Vol. V (arts. 476 a 565). Rio de Janeiro: Forense. p. 333.). In casu, examinando detidamente as razões do recurso de apelação aviado, vê-se que restaram suficientemente demonstrados e atacados os motivos pelos quais ele entende que a sentença estaria equivocada, dando perfeitas condições para que este juízo ad quem conheça de seu apelo, consoante prescreve o art. 1.010, inciso III, do Diploma Processual Civil de 2015, obedecendo, destarte, o pressuposto de admissibilidade da regularidade formal. Rejeito, pois a preliminar arguida. 3- FUNDAMENTAÇÃO De início, destaco que o artigo 932 do Código de Processo Civil versa sobre a competência delegada ao relator para a prática de atos processuais. Dentre eles, existe a possibilidade de julgamento monocrático do recurso. Dispõe o artigo 932, IV, do Código de Processo Civil o seguinte: Art. 932. Incumbe ao relator: IV - negar provimento a recurso que for contrário a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; Tal previsão encontra-se, ainda, constante no art. 91, VI-A, do Regimento Interno do e. Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, senão vejamos: “Art. 91. Compete ao Relator, nos feitos que lhe forem distribuídos, além de outros deveres legais e deste Regimento: (…) VI-A - negar provimento a recurso que for contrário a súmula ou acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; (Redação dada pelo art. 1º da Resolução nº 21, de 15/09/2016)” Utilizo-me, pois, de tais disposições normativas, uma vez que a matéria aqui trazida já foi amplamente deliberada nesta Corte de Justiça, possuindo até mesmo disposição de súmula. O cerne da controvérsia gira em torno da alegação da parte Apelante quanto à inexistência de contratação válida do empréstimo consignado. Não há dúvida de que a referida lide, por envolver a discussão acerca de falha na prestação de serviços é regida pela ótica do Código de Defesa do Consumidor, o que, inclusive, restou sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme a redação: STJ/SÚMULA Nº297: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras. Nesse contexto, os partícipes da relação processual têm suas situações moldadas às definições jurídicas de consumidor e fornecedor previstas, respectivamente, nos artigos 2º e 3º do CDC. Nas referidas ações, em regra, é deferida em favor da parte Autora a inversão do ônus da prova, em razão da hipossuficiência técnica financeira, a fim de que a Instituição bancária comprove a existência do contrato, bem como o depósito da quantia contratada. Esta é uma questão exaustivamente debatida nesta E. Câmara Especializada Cível, possuindo até mesmo disposição expressa na Súmula nº 26 deste TJPI, in litteris: TJPI/SÚMULA Nº 26 – Nas causas que envolvem contratos bancários, aplica-se a inversão do ônus da prova em favor do consumidor (CDC, art, 6º, VIII) desde que comprovada sua hipossuficiência em relação à instituição financeira, entretanto, não dispensa que o consumidor prove a existência de indícios mínimos do fato constitutivo de seu direito, de forma voluntária ou por determinação do juízo. Nesse contexto, é essencial reconhecer a vulnerabilidade do consumidor. No entanto, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor não implica em favorecimento desproporcional de uma parte em detrimento da outra, pois seu objetivo é justamente assegurar a paridade processual. Destaca-se que, por se tratar de relação de consumo, a controvérsia deve ser analisada à luz da Teoria da Responsabilidade Objetiva, prevista no artigo 14 do CDC. Cabe, portanto, à instituição financeira comprovar a regularidade da contratação, conforme determina o artigo 6º, inciso VIII, do mesmo diploma legal. O contrato de empréstimo consignado vinculado a benefício previdenciário está previsto na Lei nº 10.820/2003, que regula a autorização para descontos em folha de pagamento. Sobre o tema, o artigo 6º da referida lei dispõe: Art. 6º. Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão do Regime Geral de Previdência Social poderão autorizar o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a proceder aos descontos referidos no art. 1º e autorizar, de forma irrevogável e irretratável, que a instituição financeira na qual recebam seus benefícios retenha, para fins de amortização, valores referentes ao pagamento mensal de empréstimos, financiamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil por ela concedidos, quando previstos em contrato, nas condições estabelecidas em regulamento, observadas as normas editadas pelo INSS Analisando o contexto da demanda, verifica-se que a instituição financeira juntou aos autos cópia do contrato eletrônico assinado eletronicamente pela parte autora (d.26114780), com a biometria facial. Ademais, foi acostado comprovante de transferência bancária no valor contratado (id. 26114783), evidenciando o repasse do montante à autora. Além disso, o banco réu juntou também dossiê de contratação e cópias dos documentos pessoais daautora (id.26114780 pág 10 e 11), demonstrando, de forma cabal a existência da pactuação do empréstimo entre as partes. Assim, no caso em análise, está comprovado o crédito do valor na conta da parte autora, o que justifica a origem da dívida, conforme demonstrado pelo comprovante de repasse do empréstimo. Tal fato está em consonância com a interpretação a contrario sensu da nova redação da Súmula nº 18 deste Tribunal de Justiça, conforme se observa: TJPI/SÚMULA Nº 18: A ausência de transferência do valor do contrato para conta bancária de titularidade do mutuário enseja a declaração de nulidade da avença e seus consectários legais e pode ser comprovada pela juntada aos autos de documentos idôneos, voluntariamente pelas partes ou por determinação do magistrado nos termos do artigo 6º do Código de Processo Civil. No caso em tela, não há ausência de transferência, sendo demonstrado que o valor foi efetivamente creditado à autora. Portanto, inaplicável a nulidade da contratação, devendo ser mantida a validade do negócio jurídico celebrado entre as partes. No mesmo sentido, preleciona a remansosa jurisprudência dos Tribunais Pátrios, inclusive desta Corte de Justiça, a saber: “CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO, COM DESCONTO EM FOLHA – Reconhecimento: (a) da validade do contrato de cartão de crédito consignado, com desconto em folha de pagamento, celebrado pelas partes, o que permite à parte ré instituição financeira efetuar a reserva da margem consignável, a teor do art. 2º, § 2º, I, da LF 10.820/2003, com redação dada pela LF 13.172/2015, visto que a celebração do contrato, negada pela parte autora, restou demonstrada pela prova documental produzida pela parte ré instituição e inconsistentes as alegações da parte autora consumidora de inexistência de contratação ou de sua nulidade por vício de consentimento e venda casada; e (b) da existência de liberação de crédito, decorrente da contratação, em questão. DÉBITO, RESPONSABILIDADE CIVIL E CESSAÇÃO DE DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO – Válido o contrato de crédito consignado, com liberação de crédito, ainda não satisfeito, no caso dos autos, de rigor, o reconhecimento de que a parte ré instituição financeira tem direito de efetuar a reserva da margem consignável, a teor do art. 2º, § 2º, I, da LF 10.820/2003, com redação dada pela LF 13.172/2015, e, consequentemente, da licitude da conduta da ré e do descabimento de sua condenação ao pagamento de indenização, a título de danos moral e material, porque não existe obrigação de indenizar, uma vez que a parte credora não praticou ato ilícito, nem à repetição de indébito, em dobro ou de forma simples, uma vez que inexistente desconto indevido, por se tratar o exercício regular de seu direito (CC, art. 188, I), com manutenção da r. sentença. Recurso desprovido. (TJ-SP - AC: 10182386120178260032 SP 1018238-61.2017.8.26.0032, Relator: Rebello Pinho, Data de Julgamento: 17/06/2019, 20ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 19/06/2019).” “APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR. TEORIA DO DIÁLOGO DAS FONTES. CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL. PREVISÃO CONTRATUAL DE DESCONTOS EM FOLHA PARA ABATIMENTO DO SALDO DEVEDOR. INSTRUMENTO CONTRATUAL QUE EXPLICITA TODAS AS INFORMAÇÕES ACERCA DA OBRIGAÇÃO ASSUMIDA. CONTRATANTE. PESSOA ESCLARECIDA. INEXISTÊNCIA DE ERRO. DEFEITO DO NEGÓCIO JURÍDICO NÃO COMPROVADO. UTILIZAÇÃO DO CARTÃO DE CRÉDITO PARA COMPRAS. PAGAMENTO CONSIGNADO DO VALOR MÍNIMO MENSAL. CRESCIMENTO DO MONTANTE DA DÍVIDA. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO. INEXISTÊNCIA DE DEVER DE INDENIZAR. APELO CONHECIDO E NEGADO PROVIMENTO. 1. Segundo a teoria do diálogo das fontes às normas jurídicas não se excluem, mas se complementam, de modo que aplico ao presente caso as normas dispostas no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor. 2. Não houve defeito no negócio jurídico no momento da contratação, tendo em vista que o contrato é expresso quanto a modalidade da contratação de cartão de crédito com margem consignável. 3. O contratante é servidor público do Estado do Piauí, pessoa alfabetizada e esclarecida, sendo perceptível a contratação livre e espontânea do negócio jurídico. 4. Há provas nos autos de que o apelante efetuou saque de dinheiro e utilizou o cartão na modalidade crédito, realizando diversas despesas que indicam que seu intento foi efetivamente a contratação de um cartão de crédito com margem consignável. 5. Não constitui ato ilícito o praticado pelo apelado em realizar descontos no contracheque do apelante, tendo em vista que o ato em questão resulta em mero exercício regular de direito, de modo que não há danos morais a serem compensados. 6. Recurso conhecido. No mérito negado provimento. (TJ-PI, Apelação Cível nº. 0706000-70.2018.8.18.0000, Órgão Julgador: 3ª Câmara Especializada Cível, Relator: Desembargador Olímpio José Passos Galvão, Julgamento: 8/11/2018, Publicação DJe 8556: 14/11/2018) Nesse contexto, os documentos apresentados pela instituição financeira demonstram a existência de vínculo jurídico entre as partes, bem como a efetiva disponibilização do valor contratado em favor da parte Apelante. A recorrente, por sua vez, não apresentou qualquer prova em sentido contrário quanto à suposta irregularidade, sendo certo que, mesmo com a inversão do ônus da prova, permanece o dever de quem alega um fato demonstrá-lo (art. 373, I, do CPC). Diante dos fundamentos expostos, não há que se falar em devolução de valores ou indenização por danos morais, uma vez que a contratação foi realizada de forma livre e regular, inexistindo indícios de fraude, erro ou coação que justifiquem a reparação pleiteada. Assim, a r. sentença deve ser mantida em sua integralidade. 5 – DISPOSITIVO Ante o exposto, CONHEÇO do recurso, para, no mérito, NEGAR-LHE PROVIMENTO, com fundamento no art. 932, IV, “a” do CPC, mantendo incólume os termos da sentença vergastada. Nos termos do art. 85, §11, do Código de Processo Civil, majoro os honorários advocatícios em 5% sobre o valor da causa, mantida a suspensão da exigibilidade por força da concessão da gratuidade da justiça. Intimem-se as partes. Preclusas as vias impugnatórias, dê-se baixa na distribuição, e proceda-se com o arquivamento dos autos. Desembargador MANOEL DE SOUSA DOURADO
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Processo nº 0800177-28.2025.8.18.0114
ID: 322424457
Tribunal: TJPI
Órgão: Vara Única da Comarca de Santa Filomena
Classe: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CíVEL
Nº Processo: 0800177-28.2025.8.18.0114
Data de Disponibilização:
11/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CASSIO AVELINO GARCIA
OAB/TO XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PIAUÍ Vara Única da Comarca de Santa Filomena DA COMARCA DE SANTA FILOMENA Praça Barão de Paraim, 43, Centro, SANTA FILOMENA - PI - CEP: 64945-000 PROCESSO Nº: 0800177-2…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PIAUÍ Vara Única da Comarca de Santa Filomena DA COMARCA DE SANTA FILOMENA Praça Barão de Paraim, 43, Centro, SANTA FILOMENA - PI - CEP: 64945-000 PROCESSO Nº: 0800177-28.2025.8.18.0114 CLASSE: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) ASSUNTO(S): [Classificação e/ou Preterição] AUTOR: JOSE WASHINGTON LIMA DO AMORIM REU: MUNICIPIO DE SANTA FILOMENA SENTENÇA RELATÓRIO Trata-se de Ação Ordinária com pedido de tutela de urgência ajuizada por JOSÉ WASHINGTON LIMA DO AMORIM em desfavor do MUNICÍPIO DE SANTA FILOMENA – PI. Em síntese aduz que prestou Concurso Público para o cargo de Motorista, obtendo êxito na aprovação, tendo ficado classificado no 10º lugar. O Edital do concurso (Edital nº 01/2023) disponibilizou apenas 01 (uma) vaga imediata. No entanto, alega que o Município réu vem efetuando contratações temporárias de servidores públicos não efetivos para ocupar o cargo para o qual concorreu, em clara preterição, o que garantiria o seu direito de ser nomeado. Ao final pugna pela concessão da tutela antecipada com a imediata convocação e nomeação do autor ao cargo de Motorista, sob pena de multa diária e a confirmação da tutela ao final. Com a inicial acostou os seguintes documentos: Documento de identificação (ID 73814205), Procuração (ID 73813686), comprovante de residência (ID 73814206), Resultado do concurso (ID 73813689), Edital de convocação e posse nº 07/2024, nº 01/2024 e nº 02/2024 (ID 73813679, ID 73813680 e ID 73813683), Relação de servidores (ID 73814200) e Detalhamento de servidores (ID 73814203). Decisão de ID 73830729 que recebeu a inicial pelo rito do procedimento dos Juizados Especiais da Fazenda Pública e marcou audiência de conciliação, instrução e julgamento. Contestação em petição de ID 77330160, na qual o município réu pugna pela improcedência total dos pleitos autorais e pelo indeferimento do pedido de tutela antecipada. Com ela, foram juntados os seguintes documentos: Procuração (ID 77284974), Carta de nomeação de preposto (ID 77284976), Cópia do Decreto nº 01/2025, datado de 03/01/2025 determinando o desligamento coletivo dos cargos demissíveis ad nutum e extinção dos contratos a termo (ID 77284975), Edital de convocação para a prova prática (ID 77330169), Edital do Concurso (ID 77330170) e Resultado da prova prática (ID 77330171). É o breve relato do necessário. Passo a decidir. FUNDAMENTAÇÃO Sustenta o autor que no ano de 2023 prestou Concurso para concorrer ao cargo de Motorista, no município de Santa Filomena – PI, consoante Edital nº 01/2023, com 01 (uma) vaga imediata, tendo obtido êxito na aprovação, ficando classificado no 10º lugar. Aduz que o município vem efetuando constantes designações temporárias para o cargo de Motorista. O Município requerido, em sua peça de defesa, alega preliminarmente a carência da ação em razão da ilegitimidade ativa do autor, que ficou classificado em 10º lugar para a prova teórica mas não foi convocado para a prova prática, haja vista o Edital prever que somente iriam para a segunda fase os candidatos classificados em até três vezes o número de vagas. No mérito, aduz que o autor não tem direito a nomeação, posto que fora classificado fora do número de vagas dispostas no concurso e que não houve preterição, haja vista nenhum candidato abaixo dele ter sido nomeado para o cargo de Motorista. Após detida análise dos autos, entendo não haver razão aos argumentos autorais. Explico. É constitucional a regra inserida no edital de concurso público, denominada cláusula de barreira, com o intuito de selecionar apenas os candidatos melhores posicionados para prosseguir no certame. Sabe-se que a Administração Pública deve reger seus atos em estrita obediência aos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, somados a razoabilidade e proporcionalidade, a fim de se resguardar o interesse público. Ademais, é cediço que o edital do certame constitui lei tanto para a Administração Pública quanto para os próprios candidatos, de tal forma que suas previsões devem ser rigorosamente observadas. Neste exato sentir, a propósito, é a firme jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, in verbis: ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. APRESENTAÇÃO DE ATESTADO MÉDICO. MODELO PREVISTO NO EDITAL. NÃO OBSERVÂNCIA.ELIMINAÇÃO DO CERTAME.POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA VINCULAÇÃO AO EDITAL. 1. Trata-se na origem de Mandado de Segurança, com pedido de liminar, impetrado por Túlio Henrique de Souza contra ato do Secretário de Estado de Defesa Social, do Secretário de Estado de Planejamento e Gestão e do Instituto Brasileiro de Formação e Capacitação, consubstanciado no impedimento de o impetrante realizar a prova de capacidade física referente ao concurso público para o cargo de Agente de Segurança Penitenciário (Edital 8/2013), tendo em vista que, na data da prova, apresentou atestado médico em desconformidade com o edital do certame. 2. Nos termos da jurisprudência do STJ, as disposições do edital que disciplina o concurso público constituem lei interna que obriga os candidatos e o ente administrativo organizador, em razão dos princípios da vinculação ao instrumento convocatório e da legalidade. 3. Da análise dos autos, observa-se que o impetrante foi considerado habilitado na primeira etapa do certame (prova objetiva), mas não participou do teste físico, uma vez que o atestado médico apresentado não estava em conformidade com o Anexo V do Edital, conforme previsão do item 11.7 da norma editalícia. 4. Dessa forma, conforme consignado pelo Tribunal de origem, a conduta da Administração em eliminar o candidato não foi ilegal ou abusiva, porquanto apenas atendeu as disposições editalícias, em homenagem ao princípio da vinculação ao instrumento convocatório. 5. Recurso Ordinário não provido”. (RMS 49.887/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/12/2016, DJe 06/03/2017). (Grifos nossos) Assim, analisando as provas dos autos verifico que o autor não foi convocado para a segunda etapa do certame, haja vista somente os três melhores classificados, segundo a regra prevista no Edital nº 001/2023 terem sido convocados para a prova prática. Senão vejamos: Art. 4º. A seleção para os cargos de que trata este Edital compreenderá as seguintes etapas: 1ª Etapa - Prova Objetiva, de caráter eliminatório e classificatório; 2ª Etapa - Prova de Títulos, de caráter classificatório - SOMENTE PARA O CARGOS DE PROFESSOR 3ª Etapa - Prova Prática, de caráter eliminatório - MOTORISTA E OPERADOR DE MÁQUINAS LEVES Art. 81. ETAPA IlI - Prova Prática - A Prova Prática será realizada para os candidatos ao cargo de Motorista (CNH "Categoria B ou superior”) e Operador de Máquinas leves (CNH "Categoria C ou superior “), dos aprovados na Prova Objetiva, sendo convocados os candidatos classificados em até TRÊS VEZES o número de vagas prevista para os referidos cargos. a) A data prevista para a Prova Prática é dia 15 de outubro de 2023. b) Na Prova Prática, o candidato será submetido a testes de aplicação Individual que avaliarão sua capacidade técnica e habilidades para o desempenho eficaz das atividades relacionadas ao cargo, conforme o quadro abaixo; c) A Prova Prática terá caráter classificatório e eliminatório; d) Após realização da prova o candidato será considerado APTO OU INAPTO; e) A avaliação será pública, podendo os demais candidatos acompanhar o desempenho do candidato avaliado; f) O candidato convocado que não comparecer ou NÃO estiver portando a CNH com Categoria correspondente ao exigido neste Edital, será eliminado; f) O candidato considerado aprovado permanecerá na mesma classificação obtida na prova objetiva; e) Será considerado reprovado o candidato que se mostrar incapaz de realizar as atividades listadas abaixo: CARGO DE MOTORISTA • Controle de embreagem em aclives e declives; • Entrada e salda nas vias preferenciais; • Entrada e saída nas curvas e retorno; • Uso da sinalização por gestos, luzes e som com o veículo parado e em movimento; • Passagem e ultrapassagem de outro veículo em movimento. • Velocidade regulamentar. • Velocidade compatível com a segurança. • Estacionamento e parada. • Partida e parada de veículo. • Uso de pistas com mais de uma faixa d e circulação no mesmo sentido. • Operação de freios. • Operação da embreagem. • Operação de Instrumentos no painel. • Observância da sinalização horizontal e vertical. • Observância da sinalização semafórica . • Engrenagem e Desengrenagem das marchas. • Funcionamento do motor. • Distância de segurança entre o veículo que dirige e o que segue imediatamente . • Mudança de faixa. • Marcha-a-ré (Grifos nossos) Da exegese do edital acima mencionado, denota-se que o requerente atingiu a nota mínima na prova objetiva, mas não foi convocado para a prova prática, conforme pautado na norma editalícia. Essa norma, chamada Cláusula de Barreira, é considerada legal pela jurisprudência. Vejamos: Tema STF nº 376 – Repercussão Geral. É constitucional a regra inserida no edital de concurso público, denominada cláusula de barreira, com o intuito de selecionar apenas os candidatos mais bem classificados para prosseguir no certame. O STF, em julgamento com repercussão geral (RE 635.739/AL), entendeu ser "constitucional a regra inserida no edital de concurso público, denominada cláusula de barreira, com o intuito de selecionar apenas os candidatos mais bem classificados para prosseguir no certame". 3. Hipótese em que os candidatos não obtiveram classificação no certame, não havendo a configuração de nenhuma situação de preterição a ensejar o direito à nomeação." AgInt no RMS 51590/MS “As cláusulas de barreira em concurso público, para seleção dos candidatos mais bem classificados para prosseguir no certame, têm amparo constitucional, consoante a tese de repercussão geral fixada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário 635.739 (Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 3/10/2014, Tema 376). 2. O surgimento, a posteriori, de cargos efetivos durante o prazo de validade do concurso público não gera direito subjetivo à correção da prova discursiva de candidato desclassificado do certame em virtude de cláusula de barreira. 3. O Superior Tribunal de Justiça negou seguimento ao writ originário sob o fundamento de que a nomeação de candidatos aprovados fora do número de vagas não gera direito subjetivo à correção de prova discursiva de candidato desclassificado, posto inexistente qualquer preterição." RMS 36544 AgR Com isso, é patente que não merecerá guarida a pretensão autoral, haja vista ter o requerente se classificado na posição nº 10, não ostentando direito subjetivo à nomeação, tampouco expectativa da ocorrência desse direito, porquanto não ficou enquadrado dentro das vagas que iriam passar para a fase seguinte do concurso. Ademais, ainda que o autor tivesse prosseguido na fase seguinte, é sabido que tanto a doutrina quanto a jurisprudência reconhecem que a ocorrência de direito subjetivo material líquido e certo do candidato aprovado é o de não ser preterido no ato de nomeação, seja por candidatos com classificação inferior ou por outros que não foram aprovados em concurso. O art. 37, inciso IV da Constituição Federal assegura o direito à nomeação dos concursados dentro do número de vagas disponibilizadas no edital, sendo que o direito subjetivo à nomeação surge com a vacância do cargo no prazo de validade do concurso público ou com a quebra da ordem classificatória dos candidatos aprovados no certame, nos termos da Súmula 15 do Supremo Tribunal Federal – STF, a saber: Súmula 15 Dentro do prazo de validade do concurso, o candidato aprovado tem o direito à nomeação, quando o cargo for preenchido sem observância da classificação. (Grifos nossos) Verifica-se que a jurisprudência atual do Superior Tribunal de Justiça – STJ é no sentido de que o candidato aprovado em concurso público dentro do número de vagas previsto no edital tem direito subjetivo de ser nomeado e empossado no prazo de validade do certame. No caso dos autos, observa-se que o concurso regido pelo Edital nº 01/2023 previa a existência de 01 (uma) vaga para o cargo de Motorista. O requerente, segundo os documentos colacionados aos autos, ficou classificado na 10ª colocação, ou seja, não foi classificado dentro do número de vagas. O surgimento de novas vagas ou a abertura de novo concurso para o mesmo cargo, durante o prazo de validade do certame anterior, não gera automaticamente o direito à nomeação dos candidatos aprovados fora das vagas previstas no edital, ressalvadas as hipóteses de preterição arbitrária e imotivada por parte da Administração, caracterizadas por comportamento tácito ou expresso do Poder Público capaz de revelar a inequívoca necessidade de nomeação do aprovado durante o período de validade do certame, a ser demonstrada de forma cabal pelo candidato. Ocorre que a classificação do candidato, fora do número de vagas previstas no edital do concurso público, consubstancia apenas expectativa de direito, a qual só se convola em direito subjetivo ao cargo se existirem cargos efetivos vagos, em número suficiente para alcançar a posição do candidato na lista de espera, e se este for preterido de forma arbitrária e imotivada. O requerente questiona o preenchimento de muitas vagas em caráter de designações temporárias para o cargo de Motorista. O Supremo Tribunal Federal – STF já se decidiu sobre o tema concurso em vários julgados, em sede de Repercussão Geral, a saber: Tema 161 – “O candidato aprovado em concurso público dentro do número de vagas previsto no edital possui direito subjetivo à nomeação.” RE 598099 Tema 683 -"A ação judicial visando ao reconhecimento do direito à nomeação de candidato aprovado fora das vagas previstas no edital (cadastro de reserva) deve ter por causa de pedir preterição ocorrida na vigência do certame." RE 766304 Tema 784 – "O surgimento de novas vagas ou a abertura de novo concurso para o mesmo cargo, durante o prazo de validade do certame anterior, não gera automaticamente o direito à nomeação dos candidatos aprovados fora das vagas previstas no edital, ressalvadas as hipóteses de preterição arbitrária e imotivada por parte da administração, caracterizada por comportamento tácito ou expresso do Poder Público capaz de revelar a inequívoca necessidade de nomeação do aprovado durante o período de validade do certame, a ser demonstrada de forma cabal pelo candidato. Assim, o direito subjetivo à nomeação do candidato aprovado em concurso público exsurge nas seguintes hipóteses: I – Quando a aprovação ocorrer dentro do número de vagas dentro do edital; II – Quando houver preterição na nomeação por não observância da ordem de classificação; III – Quando surgirem novas vagas, ou for aberto novo concurso durante a validade do certame anterior, e ocorrer a preterição de candidatos de forma arbitrária e imotivada por parte da administração nos termos acima. RE 837311 É importante esclarecer que o Município tem a obrigação de nomear o candidato aprovado dentro do número de vagas previstas no Edital, pois tem direito subjetivo à nomeação, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal - STF, o que não é o caso dos autos. Nesse sentido: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. TEMA 784 DO PLENÁRIO VIRTUAL. CONTROVÉRSIA SOBRE O DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO DE CANDIDATOS APROVADOS ALÉM DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL DE CONCURSO PÚBLICO NO CASO DE SURGIMENTO DE NOVAS VAGAS DURANTE O PRAZO DE VALIDADE DO CERTAME. MERA EXPECTATIVA DE DIREITO À NOMEAÇÃO. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS. IN CASU, A ABERTURA DE NOVO CONCURSO PÚBLICO FOI ACOMPANHADA DA DEMONSTRAÇÃO INEQUÍVOCA DA NECESSIDADE PREMENTE E INADIÁVEL DE PROVIMENTO DOS CARGOS. INTERPRETAÇÃO DO ART. 37, IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE 1988. ARBÍTRIO. PRETERIÇÃO. CONVOLAÇÃO EXCEPCIONAL DA MERA EXPECTATIVA EM DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. PRINCÍPIOS DA EFICIÊNCIA, BOA-FÉ, MORALIDADE, IMPESSOALIDADE E DA PROTEÇÃO DA CONFIANÇA. FORÇA NORMATIVA DO CONCURSO PÚBLICO. INTERESSE DA SOCIEDADE. RESPEITO À ORDEM DE APROVAÇÃO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM SINTONIA COM A TESE ORA DELIMITADA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O postulado do concurso público traduz-se na necessidade essencial de o Estado conferir efetividade a diversos princípios constitucionais, corolários do merit system, dentre eles o de que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (CRFB/88, art. 5º, caput). 2. O edital do concurso com número específico de vagas, uma vez publicado, faz exsurgir um dever de nomeação para a própria Administração e um direito à nomeação titularizado pelo candidato aprovado dentro desse número de vagas. Precedente do Plenário: RE 598.099 - RG, Relator Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, DJe 03-10-2011. 3. O Estado Democrático de Direito republicano impõe à Administração Pública que exerça sua discricionariedade entrincheirada não, apenas, pela sua avaliação unilateral a respeito da conveniência e oportunidade de um ato, mas, sobretudo, pelos direitos fundamentais e demais normas constitucionais em um ambiente de perene diálogo com a sociedade. 4. O Poder Judiciário não deve atuar como “Administrador Positivo”, de modo a aniquilar o espaço decisório de titularidade do administrador para decidir sobre o que é melhor para a Administração: se a convocação dos últimos colocados de concurso público na validade ou a dos primeiros aprovados em um novo concurso. Essa escolha é legítima e, ressalvadas as hipóteses de abuso, não encontra obstáculo em qualquer preceito constitucional. 5. Consectariamente, é cediço que a Administração Pública possui discricionariedade para, observadas as normas constitucionais, prover as vagas da maneira que melhor convier para o interesse da coletividade, como verbi gratia, ocorre quando, em função de razões orçamentárias, os cargos vagos só possam ser providos em um futuro distante, ou, até mesmo, que sejam extintos, na hipótese de restar caracterizado que não mais serão necessários. 6. A publicação de novo edital de concurso público ou o surgimento de novas vagas durante a validade de outro anteriormente realizado não caracteriza, por si só, a necessidade de provimento imediato dos cargos. É que, a despeito da vacância dos cargos e da publicação do novo edital durante a validade do concurso, podem surgir circunstâncias e legítimas razões de interesse público que justifiquem a inocorrência da nomeação no curto prazo, de modo a obstaculizar eventual pretensão de reconhecimento do direito subjetivo à nomeação dos aprovados em colocação além do número de vagas. Nesse contexto, a Administração Pública detém a prerrogativa de realizar a escolha entre a prorrogação de um concurso público que esteja na validade ou a realização de novo certame. 7. A tese objetiva assentada em sede desta repercussão geral é a de que o surgimento de novas vagas ou a abertura de novo concurso para o mesmo cargo, durante o prazo de validade do certame anterior, não gera automaticamente o direito à nomeação dos candidatos aprovados fora das vagas previstas no edital, ressalvadas as hipóteses de preterição arbitrária e imotivada por parte da administração, caracterizadas por comportamento tácito ou expresso do Poder Público capaz de revelar a inequívoca necessidade de nomeação do aprovado durante o período de validade do certame, a ser demonstrada de forma cabal pelo candidato. Assim, a discricionariedade da Administração quanto à convocação de aprovados em concurso público fica reduzida ao patamar zero (Ermessensreduzierung auf Null), fazendo exsurgir o direito subjetivo à nomeação, verbi gratia, nas seguintes hipóteses excepcionais: i) Quando a aprovação ocorrer dentro do número de vagas dentro do edital (RE 598.099); ii) Quando houver preterição na nomeação por não observância da ordem de classificação (Súmula 15 do STF); iii) Quando surgirem novas vagas, ou for aberto novo concurso durante a validade do certame anterior, e ocorrer a preterição de candidatos aprovados fora das vagas de forma arbitrária e imotivada por parte da administração nos termos acima. 8. In casu, reconhece-se, excepcionalmente, o direito subjetivo à nomeação aos candidatos devidamente aprovados no concurso público, pois houve, dentro da validade do processo seletivo e, também, logo após expirado o referido prazo, manifestações inequívocas da Administração piauiense acerca da existência de vagas e, sobretudo, da necessidade de chamamento de novos Defensores Públicos para o Estado. 9. Recurso Extraordinário a que se nega provimento. (RE 837311, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 09/12/2015, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-072 DIVULG 15-04-2016 PUBLIC 18-04-2016) Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Administrativo. Concurso público. Candidato aprovado dentro do número de vagas previsto no edital. Direito à nomeação. Desrespeito à ordem de classificação. Não ocorrência. Precedentes. 1. O Plenário do STF, ao apreciar o mérito do RE nº 598.099/MS-RG, Relator o Ministro Gilmar Mendes, concluiu que o candidato aprovado em concurso público dentro do número de vagas previsto no edital tem direito subjetivo à nomeação. 2. É pacífica a jurisprudência da Corte de que não há falar em desrespeito à ordem de classificação em concurso público quando a Administração nomeia candidatos menos bem classificados por força de determinação judicial. 3. Agravo regimental não provido". (ARE 869153 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 26/05/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-118 DIVULG 18-06-2015 PUBLIC 19-06-2015). (Grifos nossos) O art. 37, inciso IX da Constituição Federal estabelece a possibilidade de contratações temporárias em casos de excepcional interesse público, in verbis: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...) IX - a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público; (...) (Grifos nossos) Apesar do autor sustentar que tenha ocorrido a preterição ao seu direito à nomeação e posse, não vejo como prosperar o seu pedido. Explico. O autor alega que ocorreu a preterição ao seu direito à nomeação e posse. O Edital do Concurso Público nº 01/2023 consta claramente a disposição de 01 (uma) vaga para o cargo de Motorista, tendo o demandante ficado na 10ª posição. Em que pese haver a informação de designações temporárias, tal alegação por si só, não é capaz de conceder o direito de nomeação à parte autora, vez que o requerente não se desincumbiu do ônus de demonstrar o fato constitutivo do seu direito, ou seja, a criação de novos cargos, conforme disposição do inciso I do art. 373 do Código de Processo Civil, tendo apenas elencado que existem contratações temporárias, mas sem apresentar, no entanto, as provas concretas que confirmem o surgimento de vagas que caracterizariam a preterição, nos ditames do que dispõe o Supremo Tribunal Federal – STF no RE 837311. Insta destacar que as vagas temporárias podem decorrer de afastamentos legais, como licenças, cessão para outros cargos, ocupação de cargo comissionado, dentre outros. As designações temporárias não preenchem necessariamente cargo vago, mas sim, eventualmente podem vir a substituir os efetivos por alguma razão, não sendo tal encargo permanente, mas sim para atender às necessidades temporárias de excepcional interesse público, plenamente autorizadas, conforme preconiza o inciso IX do art. 37 da Constituição Federal. A mera contratação, em caráter precário, de motoristas, destinados a suprir a falta transitória dos titulares de cargos efetivos, não caracteriza a preterição arbitrária da ordem de chamada do concurso. Nesse sentido, já decidiu o Colendo Superior Tribunal de Justiça-STJ: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONCURSO PÚBLICO. CARGO DE FISCAL FEDERAL AGROPECUÁRIO DO MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO. APROVAÇÃO FORA DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTO NO EDITAL. MERA EXPECTATIVA DE DIREITO CONVOLADA EM DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. PRECEDENTE QUALIFICADO DA SUPREMA CORTE. TEMA 784 DE REPERCUSSÃO GERAL. RE 837.311-PI. COMPROVAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE VAGAS PARA O CARGO ALMEJADO NA LOCALIDADE ESCOLHIDA, DE PRETERIÇÃO ARBITRÁRIA E IMOTIVADA, E DO INTERESSE DA ADMINISTRAÇÃO EM PREENCHER AS VAGAS. DISONÂNCIA DO ACÓRDÃO RECORRIDO COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 568 DO STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. 1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 837.311/PI, Tema 784 do STF de Repercussão Geral, firmou a seguinte tese: "O surgimento de novas vagas ou a abertura de novo concurso para o mesmo cargo, durante o prazo de validade do certame anterior, não gera automaticamente o direito à nomeação dos candidatos aprovados fora das vagas previstas no edital, ressalvadas as hipóteses de preterição arbitrária e imotivada por parte da administração, caracterizada por comportamento tácito ou expresso do Poder Público capaz de revelar a inequívoca necessidade de nomeação do aprovado durante o período de validade do certame, a ser demonstrada de forma cabal pelo candidato. Assim, o direito subjetivo à nomeação do candidato aprovado em concurso público exsurge nas seguintes hipóteses: 1 - Quando a aprovação ocorrer dentro do número de vagas dentro do edital; 2 - Quando houver preterição na nomeação por não observância da ordem de classificação; 3 - Quando surgirem novas vagas, ou for aberto novo concurso durante a validade do certame anterior, e ocorrer a preterição de candidatos de forma arbitrária e imotivada por parte da administração nos termos acima. 2. No caso sub examine, nos termos do julgado do STF em repercussão geral, a mera expectativa de direito da ora agravante convola-se em direito subjetivo à nomeação devido à existência de 7 vagas para o cargo de Fiscal Federal Agropecuário em Curitiba, e a existência de preterição arbitrária e imotivada decorrente de acordos de cooperação técnica em Curitiba, conforme fundamentado pelo Juízo de primeiro grau. 3. O entendimento alcançado no acórdão impugnado está em dissonância com a jurisprudência do STJ, no sentido de que "o candidato aprovado fora do número de vagas previstas no edital possui mera expectativa de direito à nomeação, convolando-se em direito subjetivo somente na hipótese de comprovação do surgimento de cargos efetivos durante o prazo de validade do concurso público, bem como o interesse da Administração Pública em preenchê-las" (AgInt no RMS 58.287/MG, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 04/12/2018, DJe 10/12/2018). 4. Agravo interno não provido. (AgInt no AgInt no REsp n. 1.837.330/PR, relator Ministro Afrânio Vilela, Segunda Turma, julgado em 21/5/2025, DJEN de 27/5/2025.) PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. APLICABILIDADE. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATOS APROVADOS FORA DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. INEXISTÊNCIA. AUSÊNCIA DE PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA DE PRETERIÇÃO ARBITRÁRIA E IMOTIVADA POR PARTE DA ADMINISTRAÇÃO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA POR SI SÓ NÃO INDUZ PRETERIÇÃO. RECURSO IMPROVIDO. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 1973. II - O acórdão recorrido está em consonância com o entendimento desta Corte e do Supremo Tribunal Federal, segundo o qual o candidato aprovado fora do número de vagas previstas no edital possui mera expectativa de direito à nomeação, convolando-se em direito subjetivo somente na hipótese de comprovação do surgimento de cargos efetivos durante o prazo de validade do concurso público, bem como a existência de preterição arbitrária e imotivada por parte da Administração, a ser demonstrada de forma cabal pelo candidato (v.g. RE 837.311/PI, Tribunal Pleno, Rel.Min. Luiz Fux, Dje de 18.04.2016, Repercussão Geral). III - Da acurada análise dos documentos de fls. 57/145 e das informações prestadas pela Autoridade Coatora, constata-se não haver nos autos prova pré-constituída que demonstre a existência de cargos efetivos vagos suficientes para alcançar a posição dos Recorrentes, bem como que comprove a alegada irregularidade das contratações temporárias, não restando evidenciado o direito líquido e certo perseguido pelos Impetrantes, porquanto a dilação probatória é providência vedada na via mandamental. IV - A contratação temporária para atender a necessidade transitória de excepcional interesse público, consoante o art. 37, IX, da Constituição da República, não tem o condão, por si só, de comprovar a preterição dos candidatos regularmente aprovados, bem como a existência de cargos efetivos vagos. V - Agravo Regimental improvido.” (AgRg no RMS 35759 / MA Primeira Turma - Relatora(a) Ministra REGINA HELENA COSTA Dje 30/06/2016). (Grifos nossos). Neste mesmo sentido, o Egrégio Tribunal de Justiça do Piauí: DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO APROVADO FORA DO NÚMERO DE VAGAS. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA DE PROFISSIONAIS. AUSÊNCIA DE DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME Apelação Cível interposta contra sentença que denegou mandado de segurança impetrado por candidata aprovada fora do número de vagas previstas no edital de concurso público para o cargo de Técnico em Enfermagem do Município de Floriano. A apelante sustenta que a municipalidade realizou diversas contratações precárias para o mesmo cargo, configurando preterição e convolação da expectativa de direito em direito subjetivo à nomeação. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A questão em discussão consiste em determinar se a contratação temporária de profissionais para o mesmo cargo em que a apelante foi aprovada, fora do número de vagas previstas no edital, caracteriza preterição arbitrária e imotivada, conferindo-lhe direito subjetivo à nomeação. III. RAZÕES DE DECIDIR A aprovação fora do número de vagas previstas no edital gera mera expectativa de direito à nomeação, salvo se demonstrada preterição arbitrária e imotivada, nos termos da tese firmada pelo STF no RE 837311 (Tema 784 da Repercussão Geral). A preterição ocorre quando há nomeação de candidatos com classificação inferior ou a criação de novas vagas sem justificativa para a não convocação dos aprovados no certame anterior. A contratação temporária de profissionais para suprir necessidades transitórias da administração não se equipara à preterição de candidatos aprovados para cargos efetivos. No caso concreto, a apelante não demonstrou, por meio de prova pré-constituída, a existência de cargo efetivo vago ou a convocação de candidatos em posição inferior à sua, razão pela qual não há direito líquido e certo à nomeação. A administração pública possui discricionariedade para decidir sobre a nomeação de candidatos aprovados fora do número de vagas, observadas as normas constitucionais e os princípios da conveniência e oportunidade. IV. DISPOSITIVO Recurso desprovido. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, II e IX; Lei nº 12.016/2009, art. 25. Jurisprudência relevante citada: STF, RE 837311 (Tema 784 da Repercussão Geral); STJ, RMS 61.771/PR; STJ, AgInt no RMS 35.542/MG; STJ, RMS 62.484/MG. (TJPI - APELAÇÃO CÍVEL 0802074-63.2022.8.18.0028 - Relator: VALDENIA MOURA MARQUES DE SA - 6ª Câmara de Direito Público - Data 07/03/2025) DIREITO ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO CLASSIFICADO FORA DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. INEXISTÊNCIA DE CARGO VAGO. AUSÊNCIA DE DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. APELAÇÃO DESPROVIDA. I. CASO EM EXAME 1. Apelação interposta por candidata classificada em 10.º lugar em concurso público para o cargo de Professor E20 – Educação Infantil e de 1.º ao 5.º ano, cujo edital previa apenas quatro vagas. A candidata sustenta ter direito subjetivo à nomeação, sob o argumento de que o Município de Ipiranga do Piauí realizou contratações temporárias para a mesma função, durante a vigência do certame. O pedido foi julgado improcedente em primeiro grau. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se a realização de contratações temporárias para funções equivalentes à do concurso caracteriza preterição da candidata classificada fora do número de vagas ofertadas no edital; e (ii) estabelecer se a inexistência de cargos vagos impede o reconhecimento do direito líquido e certo à nomeação. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. Candidatos classificados fora do número de vagas previstas no edital possuem mera expectativa de direito à nomeação, que somente se convola em direito subjetivo caso fique demonstrada a preterição arbitrária e imotivada pela Administração Pública. 4. A preterição resta caracterizada quando há contratações precárias para o exercício das atribuições próprias do cargo efetivo, desde que existam cargos vagos e a Administração possua interesse em preenchê-los. 5. No caso concreto, embora tenha havido contratações temporárias, os documentos juntados aos autos demonstram que essas ocorreram em razão do afastamento de servidores efetivos para o exercício de funções pedagógicas e cargos em comissão, sem que houvesse criação de novas vagas para provimento efetivo. 6. A inexistência de cargos públicos vagos impede o reconhecimento de direito subjetivo à nomeação, nos termos da jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Apelação desprovida. Tese de julgamento: 1. Candidatos classificados fora do número de vagas previstas no edital possuem mera expectativa de direito à nomeação, salvo se demonstrada preterição arbitrária e imotivada. 2. A contratação temporária não caracteriza, por si só, preterição de candidato aprovado fora das vagas, sendo necessária a existência de cargos efetivos vagos e o interesse da Administração em preenchê-los. 3. A inexistência de cargo público vago impede a concessão de ordem para nomeação de candidato aprovado fora do número de vagas previstas no certame. Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 37, II; Lei nº 12.016/2009, art. 1º; CPC/2015, art. 85, § 11. Jurisprudência relevante citada: STF, ARE 971251 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em 09/08/2016, DJe 06/09/2016; STJ, AgInt no RMS 70353/BA, Rel. Min. Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 22/05/2023, DJe 25/05/2023. DECISÃO Acordam os componentes da Egrégia 6.ª Câmara Especializada Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, por unanimidade, conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. (TJPI - APELAÇÃO CÍVEL 0800566-04.2022.8.18.0054 -Relator: JOAQUIM DIAS DE SANTANA FILHO 6ª Câmara de Direito Público - Data 07/03/2025) (Grifos nossos) Inexiste nos autos qualquer elemento probatório indicando que a Municipalidade criou cargo efetivo de Motorista dentro da validade do referido certame (Edital nº 01/2023), preterindo assim, o autor. A mera alegação de que existem pessoas supostamente contratadas não induz, por si só, a existência de cargos vagos. Portanto, pelo conjunto fático probatório analisado nos autos, não vislumbro que o autor tenha sido preterido na ordem de convocação do certame ou que o Município vem realizando contratações temporárias em desconformidade com a lei, já que amparado pelo inciso IX do art. 37 da Constituição Federal, razão pela qual não reconheço o direito ora vindicado. DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos contidos na inicial e EXTINGO O PROCESSO COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil. Sem custas e honorários, nos termos dos arts. 54 e 55 da Lei 9.099/1995. Sentença não sujeita ao reexame necessário, nos termos do artigo 11 da Lei 12.153/2009. Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Transcorrido o prazo recursal sem interposição de recursos, CERTIFIQUE-SE o trânsito em julgado. Por fim, nada mais sendo requerido, ARQUIVEM-SE os autos com as devidas baixas. Se for o caso, utilize-se a presente decisão/despacho como mandado/ofício, ou qualquer outro documento necessário ao seu cumprimento, ficando as partes citadas/intimadas/cientes, pelo só recebimento desta, dispensada a elaboração de qualquer outro expediente. SANTA FILOMENA - PI, 3 de julho de 2025. Juiz(a) de Direito da Vara Única da Comarca de Santa Filomena
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Processo nº 0856034-83.2022.8.18.0140
ID: 261702831
Tribunal: TJPI
Órgão: 1ª Câmara Especializada Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 0856034-83.2022.8.18.0140
Data de Disponibilização:
28/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ 1ª CÂMARA ESPECIALIZADA CRIMINAL APELAÇÕES CRIMINAIS Nº 0856034-83.2022.8.18.0140 Órgão Julgador: 1ª CÂMARA ESPECIALIZADA CRIMINAL Origem: 3ª V…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ 1ª CÂMARA ESPECIALIZADA CRIMINAL APELAÇÕES CRIMINAIS Nº 0856034-83.2022.8.18.0140 Órgão Julgador: 1ª CÂMARA ESPECIALIZADA CRIMINAL Origem: 3ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE PARNAÍBA/PI 1º Apelante: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL Apelados: BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO 2° Apelante: BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA Defensora Pública: Francisca Hildeth Leal Evangelista Nunes Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL 3° Apelante: MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO Defensora Pública: Francisca Hildeth Leal Evangelista Nunes Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL Relator: DES. SEBASTIÃO RIBEIRO MARTINS EMENTA APELAÇÕES CRIMINAIS. PROCESSO PENAL. CRIMES DE ROUBO MAJORADO EM CONTINUIDADE DELITIVA. PRELIMINAR MINISTERIAL DE NULIDADE REJEITADA. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS PARA CONDENAÇÃO DE GRIGORIO MENDES FRAZÃO JUNIOR. ABSOLVIÇÃO DE MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO POR AUSÊNCIA DE PROVAS SEGURAS. PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO. CONDENAÇÃO POR ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA INVIÁVEL. MANTIDA A FRAÇÃO DE AUMENTO RELATIVA À CONTINUIDADE DELITIVA. CONCORRÊNCIA DE CAUSAS DE AUMENTO. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO CUMULATIVA. FIXAÇÃO DE VALOR REPARATÓRIO PELOS DANOS MATERIAIS E MORAIS. NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA ESPECÍFICA. RECURSO MINISTERIAL CONHECIDO E DESPROVIDO. RECURSO DE BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA CONHECIDO E DESPROVIDO. RECURSO DE MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO CONHECIDO E PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelações criminais interpostas pelo Ministério Público do Estado do Piauí e pelos réus Bruno dos Santos Oliveira e Marcos Felipe Alves de Macedo contra a sentença da 3ª Vara Criminal da Comarca de Teresina-PI. 2. A sentença condenou Bruno dos Santos Oliveira por seis crimes de roubo majorado (art. 157, §2º, II e §2º-A, I, c/c art. 71 do CP) e Marcos Felipe Alves de Macedo por um crime de roubo majorado (art. 157, §2º, II e §2º-A, I, do CP). O réu Grigorio Mendes Frazao Junior foi absolvido de todas as acusações. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 3. As apelações trazem as seguintes questões a serem analisadas: (i) Preliminar suscitada pelo Ministério Público, alegando cerceamento de acusação devido à negativa de realização de perícia nos vídeos juntados aos autos; (ii) Pedido do Ministério Público para condenação de Grigorio Mendes Frazao Junior pelos crimes de roubo majorado; (iii) Pleito ministerial pela condenação dos réus pelo crime de associação criminosa; (iv) Requerimento para afastamento da continuidade delitiva; (v) Pedido de exasperação da pena-base dos réus Bruno dos Santos Oliveira e Marcos Felipe Alves de Macedo; (vi) Fixação de indenizações por danos materiais e morais em favor das vítimas, requerida pelo Ministério Público, e pedido de exclusão da indenização por parte do réu Bruno dos Santos Oliveira; (vii) Pedido de absolvição formulado por Marcos Felipe Alves de Macedo; (viii) Discussão sobre a aplicação de causas de aumento em cascata na terceira fase da dosimetria da pena; (ix) Pedido de redução da pena de multa e suspensão das custas processuais. III. RAZÕES DE DECIDIR 4. Preliminar. A nulidade por cerceamento de acusação não prevalece, pois o pedido formulado não atende aos requisitos do artigo 402 do CPP, uma vez que a perícia não decorreu de circunstâncias ou fatos novos apurados na instrução, mas sim de diligências previamente conduzidas pelo próprio órgão acusador. 5. A condenação de Grigorio Mendes Frazao Junior pelos crimes de roubo majorado não pode prosperar, pois o reconhecimento fotográfico não foi corroborado por provas colhidas sob o contraditório, sendo insuficiente para fundamentar um decreto condenatório. 6. O crime de associação criminosa exige prova da estabilidade e permanência do grupo criminoso, o que não se verifica nos autos. Ausente o animus associativo, mantém-se a absolvição pelo crime do art. 288 do CP. 7. A tese ministerial de afastamento da continuidade delitiva e reconhecimento do concurso formal/material deve ser afastada, pois os crimes foram praticados no mesmo contexto, com modus operandi semelhante e proximidade temporal, preenchendo os requisitos do art. 71 do CP. 8. O pedido de aumento da pena-base dos réus foi rejeitado, pois os vetores do art. 59 do CP foram adequadamente valorados na sentença. 9. Quanto ao pedido de exclusão da condenação por danos materiais, verifica-se que o pleito já constava da denúncia, sendo que a nota fiscal em nome da vítima foi juntada aos autos antes da audiência de instrução. Além disso, a defesa teve oportunidade de se manifestar, em observância ao contraditório e à ampla defesa. Em relação às indenizações adicionais requeridas pelo órgão ministerial, neste apelo, não restou realizada a instrução específica para a apuração do montante devido, com a indicação de elementos e valores que sustentem a indenização por dano moral e material, sendo inviável que o Apelante arque com o valor aleatoriamente determinado pelo órgão ministerial. 10. A absolvição de Marcos Felipe Alves de Macedo deve ser declarada, pois sua condenação se baseia exclusivamente em um reconhecimento fotográfico e posterior videoconferência realizados em condições que comprometem sua fidedignidade, sem outras provas que corroborem sua participação. Aplicação do princípio do in dubio pro reo. 11. Concorrência de causas de aumento O legislador processual deu ao magistrado a faculdade de aplicar apenas uma causa de aumento ou de diminuição, prevalecendo aquela que mais aumente ou mais diminua. Dessa forma, em sendo uma faculdade judicial, nada impede a incidência de todas as causas de aumento ou diminuição presentes no caso concreto. 12. Entretanto, a Corte de Justiça faz a ressalva acerca da necessidade de fundamentação da aplicação cumulativa das causas de aumento, não bastando que sejam apenas enumeradas. In casu, constata-se que o magistrado a quo apresentou justificativa para sua escolha de aplicar as causas de aumento de forma cumulativa, tendo em vista a dinâmica do delito, a utilização de arma de fogo e o concurso de agentes. 13. Pena de multa. A fixação do número de dias-multa deve ser estabelecida com proporcionalidade à pena privativa de liberdade imposta. No caso em apreço, a pena de multa foi estabelecida em 39 (trinta e nove) dias-multa, valor alcançado a partir da pena mínima em abstrato, sendo tal fixação benéfica ao réu. 14. Isenção de custas processuais. Tendo em vista a alegação da sua condição de hipossuficiência, o apelante faz jus ao benefício da justiça gratuita. No entanto, quanto à eventual isenção de custas, a jurisprudência já está pacificada no sentido de que, mesmo sendo o réu beneficiário da assistência judiciária gratuita, deve ser condenado ao pagamento das custas processuais, nos termos do art. 804 do Código de Processo Penal. A comprovação da situação de miserabilidade jurídica do apelante para fins de pagamento das custas é matéria atinente ao juízo da execução. Precedentes. IV. DISPOSITIVO E TESE 15. Recurso ministerial desprovido. Recurso de Marcos Felipe Alves de Macedo provido para absolvê-lo do crime de roubo majorado. Recurso de Bruno dos Santos Oliveira desprovido. Tese de julgamento: “1. O reconhecimento pessoal de acusado deve observar os requisitos do art. 226 do CPP e ser corroborado por outros elementos de prova para embasar uma condenação; 2. A incerteza sobre a autoria delitiva impõe a aplicação do princípio do in dubio pro reo, determinando a absolvição do réu quando não há provas suficientes; 3. A continuidade delitiva deve ser reconhecida quando há identidade de tempo, lugar e modo de execução dos crimes, nos termos do art. 71 do CP; 4. O crime de associação criminosa exige prova de estabilidade e permanência do grupo criminoso, não se confundindo com o mero concurso eventual de agentes”. Dispositivos relevantes citados: CP, arts. 59, 69, 70, 71, 157, §2º, II e §2º-A, I, e 288; CPP, arts. 226, 386, VII. Jurisprudência relevante citada: STJ, HC 598.886/SC, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, j. 27/10/2020; STJ, AREsp 2.408.401/PA, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, j. 2/4/2024. ACÓRDÃO Acordam os componentes da egrégia 1ª Câmara Especializada Criminal deste Tribunal de Justiça, à unanimidade, em CONHECER dos presentes recursos, e, no mérito, NEGAR PROVIMENTO aos interpostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL e pelo acusado BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e DAR PROVIMENTO ao apelo apresentado por MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO, para absolvê-lo da prática do crime de roubo majorado (art. 157, §2º, II e §2º-A, I, do CP), cometido contra a vítima Robert Antônio dos Santos Alves, ao tempo que determinam a expedição do competente alvará de soltura em seu favor, que deve ser posto, incontinenti, em liberdade, no que toca ao processo 0856034-83.2022.8.18.0140, a menos que esteja preso por outro motivo, mantendo-se os demais termos da sentença condenatória, em dissonância com os pareceres da Procuradoria-Geral de Justiça, na forma do voto do relator. RELATÓRIO O EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO RIBEIRO MARTINS (Relator): Trata-se de APELAÇÕES CRIMINAIS interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PIAUÍ e pelos acusados BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO contra a sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Criminal da Comarca de Teresina-PI. A denúncia apresentada pelo Ministério Público do Estado do Piauí narra que: “(...) Consta nos autos que no dia 14/11/2022, entre 13 h 4 0min e 14h06min, nas proximidades do bairro Cabral, nesta capital, BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA, GRIGORIO MEDES FRAZÃO JUNIOR e LUIS FELIPE ARAUJO DE SOUSA CRUZ subtraíram para si coisa alheia móvel, mediante violência ou grave ameaça, com emprego de arma de fogo, por 03 (três) vezes. Depois, no dia 16/11/2022, às 00h00min, na Rua Capitão Vanderley, nº 2657, bairro Piçarreira, nesta capital BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA, GRIGORIO MEDES FRAZÃO JUNIOR, MARCOS FELIPE ALVES DE MACÊDO e mais um indivíduo subtraíram para si coisa alheia móvel, mediante violência ou grave ameaça, com emprego de arma de fogo 1 . Todos, associaram-se para o fim específico de cometer crimes. No dia 14 de novembro de 2022, às 13h40min, as vítimas LUIS GONZAGA, LUDMILA BARBOSA e DIEGO RODRIGO chegavam em casa, localizada na Rua do Cabral, nº 384, bairro Cabral, nesta capital, com o veículo RENAULT/LOGAN cor marrom, de placa PIE9616, de propriedade de Luis Gonzaga, quando DIEGO (genro de Luis) saiu do carro para abrir o portão. Ocorre que, antes de trancá-lo foi surpreendido por BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA, que chegou a pé com uma arma em punho apontada para a cabeça da vítima rendendo-a. BRUNO DOS SANTOS (descrito pelas vítimas como magro um pouco mais forte, pardo mais escuro, cabelo preto vestindo camisa azul, bermuda jeans e boné vermelho) foi reconhecido pelas vítimas (fl. 12, 17 do ID 39456271 e ID 42140649). BRUNO DO SANTOS estava acompanhado de outros dois indivíduos, quais sejam: LUIS FELIPE ARAUJO DE SOUSA CRUZ, reconhecido pela vítima LUIS GONZAGA (à fl. 21, ID39456271) como quem o abordou e pegou a chave do veículo RENAULT/LOGAN (descrito pelas vítimas como negro, com bigode fino e magro, vestindo camiseta, bermuda e boné); e outro indivíduo descrito pelas vítimas como pardo, magrinho, com bigode ralo e cabelo preto, que vestia camisa cinza e bermuda jeans (mesmas características do denunciado GRIGORIO MEDES FRAZÃO, identificado pelas demais vítimas). Conforme consta nos autos, no primeiro delito os denunciados subtraíram a mochila e carteira de DIEGO RODRIGO e o veículo RENAULT/LOGAN cor marrom, de placa PIE9616, no qual empreenderam fuga em direção à Ponte Estaiada. No mesmo dia, às 13h52min, a vítima FRANCISCO SANTOS SOUSA chegava em seu trabalho, próximo à Praça do Marquês, no bairro Mafuá, nesta capital, quando foi abordada por indivíduos em um veículo RENAULT/LOGAN cor marrom. Um dos indivíduo desceu para lhe abordar, enquanto pelo menos mais um permaneceu no veículo dando cobertura. A vítima descreveu o sujeito que o abordou como pardo mais escuro, magro um pouco mais forte, que puxava da perna e vestia camisa bermuda e boné vermelho, mesma roupa utilizada por BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA no primeiro roubo, ocorrido cerca de 12 minutos antes. A vítima ainda reconheceu GRIGORIO MEDES FRAZÃO JUNIOR como o indivíduo que ficou no veículo dando cobertura (descrevendo-o como pardo mais claro e magro). Conforme consta nos autos, no segundo delito os denunciados subtraíram a mochila, o celular modelo MOTO G6, e a chave da moto da vítima. Em seguida, empreenderam fuga no veículo RENAULT/LOGAN cor marrom. No mesmo dia, às 14h06min, a vítima MARCOS ANTÔNIO DE ALENCAR chegava em casa, na Rua Jonatas Batista, nº 812, bairro Mafuá, nesta capital, com sua moto HONDA/POP100 cor azul, placa PIB1633. E enquanto seu filho, MARCIO KELSON PEREIRA DE ALENCAR, abria o portão ambos avistaram a chegada do veículo RENAULT/LOGAN cor marrom, placa PIE9616, do qual desceram dois indivíduos armados e o motorista permaneceu no veículo. A vítima reconheceu (à fl.32, ID 39456271 e ID 42140649) BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA como o indivíduo que fugiu com sua moto (descrevendo-o como moreno escuro, magro e andava puxando a perna). Enquanto, BRUNO empreendia fuga com a moto da vítima o outro indivíduo regressou ao veículo RENAULT/LOGAN e empreendeu fuga junto ao motorista, em direção ao Mercado do Mafuá. É relevante expor que o filho da vítima, MARCIO KELSON, também reconheceu (à fl.34, ID 39456271) BRUNO DOS SANTOS (descrevendo-o como mago mais forte, moreno mais escuro, puxando da perna, vestindo camisa escura, bermuda, boné vermelho e máscara). Ainda, descreveu o outro indivíduo que desceu do veículo como magro, pardo, de cabelo preto, vestindo camisa cinza e bermuda jeans; mesmas características do indivíduo GRIGORIO MEDES FRAZÃO que participou os dois primeiros delitos, em um intervalo de tempo de aproximadamente 26 minutos. Já no dia 16 de novembro de 2022, às 00h00min, a vítima ROBERT ANTONIO DOS SANTOS ALVES, estava trabalhando, realizando entregas, quando parou sua motocicleta na Rua Capitão Vanderley, nº 2657, bairro Piçarreira, nesta capital. Conforme consta nos autos, a vítima narra a aproximação de um veículo RENAULT/LOGAN cor marrom, do qual desceram 4 indivíduos, dos quais ele conseguiu visualizar 3. A vítima reconheceu GRIGORIO MEDES FRAZÃO JUNIOR (à fl. 51, ID 39456271) como o indivíduo que saiu do banco traseiro do veículo e tomou sua moto; BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA (à fl. 47, ID 39456271) como o condutor do veículo RENAULT/LOGAN que desceu do veículo e lhe deu uma coronhada após tomarem sua moto; e MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO (à fl. 49, ID 39456271)como o indivíduo que derrubou a vítima da moto e disse que lhe daria um tiro, caso continuasse lhe olhando. Conforme consta nos autos, no quarto delito os denunciados subtraíram a moto (HONDA/POP 110i cor vermelha, placa RSK9H83), a bolsa térmica de realizar entregas, a maquineta de cartão, a carteira da vítima com a quantia de R$ 170,00 (cento e setenta reais) e o aparelho celular da marca Motorola, modelo MOTO E. Em seguida, empreenderam fuga no veículo RENAULT/LOGAN cor marrom e na moto da vítima. No mesmo dia, o veículo RENAULT/LOGAN cor marrom, de placa PIE9616, de propriedade de Luis Gonzaga, foi encontrado abandonado em uma rua próximo à Universidade Federal do Piauí, nesta capital”. O réu Luis Felipe Araújo de Sousa Cruz, igualmente denunciado pelos mesmos crimes, não foi localizado para fins de citação, razão pela qual o processo foi cindido em relação a ele, prosseguindo apenas em relação aos demais acusados. Concluída a instrução processual, o MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Criminal da Comarca de Teresina-PI proferiu sentença nos seguintes termos: BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA: condenado pelo crime de roubo majorado, em continuidade delitiva (art. 157, §2º, II e §2º-A, I, c/c art. 71 do CP, por seis vezes), praticado contra as vítimas Luis Gonzaga Ferreira Pereira, Ludmila Barbosa Ferreira, Diego Rodrigo Caldas Sena, Francisco Santos Sousa, Marcos Antônio de Alencar e Robert Antônio dos Santos Alves, com pena fixada em 18 anos, 05 meses e 19 dias de reclusão e pagamento de 39 dias-multa. Absolvido do crime de associação criminosa (art. 288, do CP). MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO: condenado pelo crime de roubo majorado (art. 157, §2º, II e §2º-A, I, do CP), praticado contra a vítima Robert Antônio dos Santos Alves com pena fixada em 10 anos, 06 meses e 20 dias de reclusão e pagamento de 23 dias-multa. Absolvido do crime de associação criminosa (art. 288, do CP). GRIGORIO MENDES FRAZÃO JUNIOR: absolvido de todas as imputações. O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, em suas razões recursais, requer, preliminarmente, a decretação da nulidade da sentença proferida por cerceamento de acusação, com o consequente retorno dos autos para realização de perícia nas mídias acostadas aos autos nos ID’s 53467810; 53467816; 53467821; 53548890 e 53548889. No mérito, pleiteia: a) a condenação dos réus pelo crime de Associação Criminosa (art. 288 do CP); b) a condenação de Grigorio Mendes Frazão Junior quanto aos delitos tipificados nos artigos 157, § 2º, II e §2º-A, I, do CP, por duas vezes (vítimas LUIS GONZAGA e DIEGO), e no art. 157, § 2º, II e §2º-A, I, do CP, c/c art. 14, II, do CP, uma vez (vítima LUDMILA), estes em concurso formal (art. 70 do CP), bem como pelos crimes de roubo (157, § 2º, II e §2º-A, inciso I, do CP, por três vezes), contra as vítimas FRANCISCO SANTOS, MARCOS ANTONIO e ROBERT, todos em concurso material; c) para afastar a continuidade delitiva (art. 71 do CP) e reconhecer o concurso formal (art. 70 do CP) de crimes quanto ao delito tipificado no art. 157, § 2º, II e §2º-A, I, do CP, por duas vezes (vítimas LUIS GONZAGA e DIEGO), e no art. 157, § 2º, II e §2º-A, I, do CP, c/c art. 14, II, do CP, uma vez (vítima LUDMILA) e concurso material (art. 69 do CP) de crimes entre estes e os dispostos no art. 288, do CP, e art. 157, § 2º, II e §2º-A, inciso I, do CP, por três vezes (vítimas FRANCISCO SANTOS, MARCOS ANTONIO e ROBERT), para os recorridos BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e GRIGORIO MENDES FRAZAO JUNIOR; d) a valoração negativa dos vetores da personaliade e das consequências do crime; e) a fixação da quantia de R$ 949,00 (novecentos e quarenta e nove reais), à vítima FRANCISCO SANTOS SOUSA; o valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) à vítima MARCOS ANTÔNIO DE ALENCAR, a serem pagos pelos recorridos BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e GRIGORIO MENDES FRAZAO JUNIOR e o valor de R$ 10.543,10 (dez mil, quinhentos e quarenta e três reais e dez centavos) à vítima ROBERT ANTÔNIO DOS SANTOS ALVES, a ser pago pelos apelados BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA, GRIGORIO MENDES FRAZAO JUNIOR e MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO, para fins de reparação dos danos materiais sofridos em razão dos crimes; f) a fixação da quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a cada uma das vítimas, LUIS GONZAGA PEREIRA FERREIRA, DIEGO RODRIGO CALDAS SENA, FRANCISCO SANTOS SOUSA, MARCOS ANTÔNIO DE ALENCAR e ROBERT ANTONIO DOS SANTOS ALVES, a título de reparação por danos morais, nos termos do art. 91, I, do CP c/c art. 387, IV, do CPP; g) a decretação da prisão preventiva do réu Grigorio Mendes Frazao Junior, com a negativa do direito de recorrer em liberdade. Em contrarrazões, os réus requerem que seja negado provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público Estadual. O apelante Bruno dos Santos de Oliveira, em suas razões recursais, suscita as seguintes teses basilares: a) a aplicação de apenas uma causa de aumento da parte especial, devendo incidir na terceira fase somente a majorante do uso de arma de fogo (art. 157, § 2-A, I, do CP) e o concurso de agentes ser analisado na 1ª fase da dosimetria, por previsão expressa no artigo 68, parágrafo único, do CP; b) a reforma da sentença no que tange à condenação do apelante ao pagamento de danos materiais, por ausência de instrução probatória específica; c) a redução da pena de multa e a suspensão das custas processuais. Já o réu Marcos Felipe Alves de Macedo, em seu apelo defensivo, requereu: a) a absolvição quanto ao crime roubo majorado (Art. 157, §2º, inc. II, §2º-A, inc. I, do Código Penal) tendo em vista a insuficiência de provas para a condenação, com fulcro no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal; b) a aplicação da atenuante da menoridade relativa; c) a aplicação de apenas uma causa de aumento da parte especial, devendo incidir na terceira fase somente a majorante do uso de arma de fogo (art. 157, § 2-A, I, do CP) e o concurso de agentes ser analisado na 1ª fase da dosimetria, por previsão expressa no artigo 68, parágrafo único, do CP; d) a redução da pena de multa e a suspensão das custas processuais. O Ministério Público, em contrarrazões, manifestou-se pelo improvimento do recurso de BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e pelo parcial provimento do recurso de MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO, apenas para reconhecer a atenuante da menoridade relativa. A Procuradoria-Geral de Justiça, em fundamentados pareceres, manifestou-se pelo improvimento do recurso manejado por Bruno dos Santos Oliveira; pelo parcial provimento da apelação de Marcos Felipe Alves de Macedo, visando apenas a incidência da atenuante da menoridade relativa; e pelo parcial provimento do recurso ministerial, para modificar a sentença nos termos do pedido formulado, com exceção da valoração negativa dos vetores na primeira fase de individualização da pena. Tratando-se de crimes punidos com reclusão, submeti os autos à revisão, nos termos do artigo 356, I, do RITJ-PI. Inclua-se o processo em pauta virtual. É o relatório. VOTO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE Presentes os pressupostos gerais de admissibilidade recursal objetivos (previsão legal, forma prescrita e tempestividade) e subjetivos (legitimidade, interesse e possibilidade jurídica), CONHEÇO dos recursos interpostos. PRELIMINARES Do cerceamento de acusação. Inocorrência Preliminarmente, o órgão ministerial pugna pela decretação da nulidade da sentença proferida por cerceamento de acusação, com o consequente retorno dos autos para a realização de perícia nas mídias acostadas aos autos nos ID’s 53467810; 53467816; 53467821; 53548890 e 53548889. Aduz que “(...) requereu, nos autos, a juntada de vídeos e imagens de câmeras de segurança que registraram dois dos delitos descritos na denúncia (ID 53467810; 53467816; 53467821; 53548890 e 53548889), nas respectivas datas de 28/02/2024 e 29/02/2024, a fim de que tais provas fossem submetidas ao contraditório. Posteriormente, finalizada a instrução, requereu este órgão ministerial, em fase de diligências, a realização de perícia nas imagens juntadas, o que foi indeferido pelo MM Juiz, consoante disposto em ata de audiência registrada sob ID Num. 53615667”. Sobre os fatos, ao negar o pleito formulado, consignou o magistrado: “O Ministério Público suscitou como preliminar de mérito o cerceamento de acusação, em decorrência do indeferimento de perícia nas imagens juntadas aos autos (ID 53467810, ID 53467816, ID 53467821, ID 53548890 e ID 53548875). Analisando detidamente os autos, denota-se que as mídias constantes no ID 53467810, ID 53467816 e ID 53467821, foram juntadas em data anterior à audiência de instrução e julgamento. Já as mídias de ID 53548890 e ID 53548875 juntadas no dia da audiência, versam sobre a mesma cena do roubo constante na mídia de ID 53467810 já anexada anteriormente no feito. Logo, a alegada necessidade de perícia não se originou de circunstâncias ou fatos apurados durante a instrução do processo, mas de diligências anteriores realizadas pelo próprio Ministério Público Estadual. De acordo com o 402 do Código de Processo Penal, produzidas as provas, ao final da audiência, o Ministério Público, o querelante e o assistente e, a seguir, o acusado, poderão requerer diligências cuja necessidade se origine de circunstâncias ou fatos apurados na instrução”. Sem razão o órgão ministerial. O pedido formulado não atende aos requisitos do artigo 402 do CPP, pois a perícia não decorreu de circunstâncias ou fatos novos apurados na instrução, mas sim de diligências previamente conduzidas pelo próprio órgão acusador. Conforme destacado, as mídias acostadas nos ID’s 53467810, 53467816 e 53467821, foram juntadas em data anterior à audiência de instrução e julgamento. Já as mídias constantes nos ID’s 53548890 e 53548875, embora juntadas na data da audiência, apenas reprisam as cenas constantes no ID 53467810. Assim, o Ministério Público teve oportunidade de requerer a perícia desde a fase do inquérito, mas não a fez. A propósito, corroborando o entendimento acima demonstrado: PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO PENAL. INDICAÇÃO DE ASSISTENTE TÉCNICO. ART. 402 DO CPP. PRECLUSÃO. 1. O acusado, quando do oferecimento da defesa prévia, já tinha ciência de que Nota Técnica, produzida na fase pré-processual, havia sido utilizada na denúncia e de que os subscritores do referido documento haviam sido arrolados como testemunhas de acusação pelo MPF, razão pela qual caberia à defesa requerer a admissão de eventual assistente técnico no momento da apresentação da defesa prévia. 2. As diligências previstas no art. 402 do CPP somente são admissíveis quando sua necessidade decorre de circunstâncias ou fatos apurados durante a instrução. Não se destinam a reabrir a fase de instrução probatória. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg na APn n. 1.076/DF, relatora Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, julgado em 18/12/2024, DJEN de 9/1/2025.) PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. DILIGÊNCIAS NA FASE DO ART. 402 DO CPP. NECESSIDADE DE QUE SE ORIGINEM DE CIRCUNSTÂNCIAS OU FATOS APURADOS NA INSTRUÇÃO. PEDIDO DE PERÍCIA E OUTRAS DILIGÊNCIAS SEM RELAÇÃO COM A INSTRUÇÃO. REPETIÇÃO DE PEDIDO JÁ INDEFERIDO PELA CORTE ESPECIAL. INDEVIDA TENTATIVA DE PROCRASTINAÇÃO DA INSTRUÇÃO. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO, DANDO POR ENCERRADA A INSTRUÇÃO E INICIANDO PRAZO PARA ALEGAÇÕES FINAIS. 1 - As diligências requeridas na fase do art. 402 do CPP devem guardar relação com eventual necessidade que tenha surgido de circunstâncias ou fatos apurados na instrução. 2 - Os áudios que a defesa pretende ver periciados fazem parte deste autos há mais de uma década. As diligências solicitadas não têm relação com necessidades surgidas durante a instrução, sendo mera repetição de pedidos feitos em outras ocasiões e já expressamente negados. 3 - Agravo a que se nega provimento, dando por encerrada a instrução e iniciando prazo para alegações finais. (AgRg nos EDcl na PET na APn n. 623/DF, relator Ministro Francisco Falcão, Corte Especial, julgado em 20/9/2023, DJe de 29/9/2023.) Assim, rejeito a preliminar suscitada. MÉRITO O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, em suas razões recursais, pleiteia: a) a condenação dos réus pelo crime de Associação Criminosa (art. 288 do CP); b) a condenação de Grigorio Mendes Frazao Junior quanto aos delitos tipificados nos artigos 157, § 2º, II e §2º-A, I, do CP, por duas vezes (vítimas LUIS GONZAGA e DIEGO), e no art. 157, § 2º, II e §2º-A, I, do CP, c/c art. 14, II, do CP, uma vez (vítima LUDMILA), estes em concurso formal (art. 70 do CP), bem como pelos crimes de roubo (157, § 2º, II e §2º-A, inciso I, do CP, por três vezes), contra as vítimas FRANCISCO SANTOS, MARCOS ANTONIO e ROBERT, todos em concurso material; c) para afastar a continuidade delitiva (art. 71 do CP) e reconhecer o concurso formal (art. 70 do CP) de crimes quanto ao delito tipificado no art. 157, § 2º, II e §2º-A, I, do CP, por duas vezes (vítimas LUIS GONZAGA e DIEGO), e no art. 157, § 2º, II e §2º-A, I, do CP, c/c art. 14, II, do CP, uma vez (vítima LUDMILA) e concurso material (art. 69, do CP) de crimes entre estes e os dispostos no art. 288, do CP, e art. 157, § 2º, II e §2º-A, inciso I, do CP, por três vezes (vítimas FRANCISCO SANTOS, MARCOS ANTONIO e ROBERT), para os recorridos BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e GRIGORIO MENDES FRAZAO JUNIOR; d) a valoração negativa dos vetores da personaliadde e consequências do crime; e) a fixação da quantia de R$ 949,00 (novecentos e quarenta e nove reais), à vítima FRANCISCO SANTOS SOUSA; o valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) à vítima MARCOS ANTÔNIO DE ALENCAR, a serem pagos pelos recorridos BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e GRIGORIO MENDES FRAZAO JUNIOR e o valor de R$ 10.543,10 (dez mil, quinhentos e quarenta e três reais e dez centavos) à vítima ROBERT ANTÔNIO DOS SANTOS ALVES, a ser pago pelos apelados BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA, GRIGORIO MENDES FRAZAO JUNIOR e MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO, para fins de reparação dos danos materiais sofridos em razão dos crimes; f) a fixação da quantia de R$ 5.0000,00 (cinco mil reais) a cada uma das vítimas, LUIS GONZAGA PEREIRA FERREIRA, DIEGO RODRIGO CALDAS SENA, FRANCISCO SANTOS SOUSA, MARCOS ANTÔNIO DE ALENCAR e ROBERT ANTONIO DOS SANTOS ALVES, a título de reparação por danos morais, nos termos do art. 91, I, do CP c/c art. 387, IV, do CPP; g) a decretação da prisão preventiva do réu Grigorio Mendes Frazao Junior, com a negativa do direito de recorrer em liberdade. O apelante Bruno dos Santos de Oliveira, em suas razões recursais, suscita as seguintes teses basilares: a) a aplicação de apenas uma causa de aumento da parte especial, devendo incidir na terceira fase somente a majorante do uso de arma de fogo (art. 157, § 2-A, I, do CP) e o concurso de agentes ser analisado na 1ª fase da dosimetria, por previsão expressa no artigo 68, parágrafo único, do CP; b) a reforma da sentença no que tange à condenação do apelante ao pagamento de danos materiais, por ausência de instrução probatória específica; c) a redução da pena de multa e a suspensão das custas processuais. Já o réu Marcos Felipe Alves de Macedo, em seu apelo defensivo, requereu: a) a absolvição quanto ao crime roubo majorado (Art. 157, §2º, inc. II, §2º-A, inc. I do Código Penal) tendo em vista a insuficiência de provas para a condenação, com fulcro no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal; b) a aplicação da atenuante da menoridade relativa; c) a aplicação de apenas uma causa de aumento da parte especial, devendo incidir na terceira fase somente a majorante do uso de arma de fogo (art. 157, § 2-A, I, do CP) e o concurso de agentes ser analisado na 1ª fase da dosimetria, por previsão expressa no artigo 68, parágrafo único, do CP; d) a redução da pena de multa e a suspensão das custas processuais. Passo à análise das teses formuladas. I) Da materialidade e autoria dos crimes de roubo narrados na exordial. Análise dos pedidos de condenação e absolvição formulados No caso dos autos, foram narrados quatro eventos criminosos distintos, todos envolvendo roubo majorado com emprego de arma de fogo e concurso de agentes, conforme o disposto no artigo 157, §2º, inciso II, e §2º-A, inciso I, do Código Penal. O primeiro evento delituoso ocorreu em 14 de novembro de 2022, às 13h40min, tendo como vítimas Luis Gonzaga Ferreira Pereira, Ludmila Barbosa Ferreira e Diego Rodrigo Caldas Sena. Conforme relatado, os agentes abordaram as vítimas mediante grave ameaça, portando arma de fogo, e subtraíram um veículo Renault Logan, placa PIE9616, de propriedade de Luis Gonzaga, além de mochilas, carteira e objetos eletrônicos das vítimas. Poucos minutos depois, por volta das 13h52min do mesmo dia, ocorreu o segundo roubo, vitimando Francisco Santos Sousa, que teve subtraídos sua mochila, seu telefone celular e a chave de sua motocicleta. Para a prática delitiva, os infratores se utilizaram do Renault Logan roubado na ocasião anterior. Já às 14h06min do mesmo dia, deu-se o terceiro evento criminoso, no qual a vítima Marcos Antônio de Alencar teve subtraída sua motocicleta Honda POP 100 azul, placa PIB1633, sendo a ação igualmente perpetrada pelos agentes que utilizavam o veículo Renault Logan. O quarto e último episódio ocorreu na data de 16 de novembro de 2022, por volta das 00h00min, tendo como vítima Robert Antônio dos Santos Alves, que teve subtraída sua motocicleta Honda POP 110i vermelha, placa RSK9H83, além de outros pertences pessoais. Encerrada a instrução processual, o magistrado proferiu sentença condenatória, reconhecendo a participação de Bruno dos Santos de Oliveira em todos os delitos mencionados, nos termos do art. 157, § 2º, inciso II, e § 2º-A, inciso I, c/c art. 71 (seis vezes), ambos do Código Penal. O réu Marcos Felipe Alves de Macedo foi condenado exclusivamente pelo quarto roubo, com fundamento no art. 157, § 2º, inciso II, e § 2º-A, inciso I, do Código Penal. Por sua vez, Grigorio Mendes Frazao Junior foi absolvido de todas as acusações. O Ministério Público interpôs recurso, pleiteando a condenação de todos os réus pelo crime de associação criminosa, previsto no art. 288 do Código Penal, bem como a condenação de Grigorio Mendes Frazao Junior por todos os quatro roubos narrados. Por sua vez, Marcos Felipe Alves de Macedo, em sede de apelação, requereu a sua absolvição do crime de roubo majorado, sob o argumento de insuficiência de provas, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. Passo à análise das provas colhidas. Em relação ao primeiro evento criminoso, as vítimas Luis Gonzaga Ferreira Pereira (63 anos), Diego Rodrigo Caldas Sena, Ludmila Barbosa Ferreira, reconheceram apenas o acusado Bruno dos Santos tanto por fotografia (reconhecimento indireto) quanto por videoconferência. O ofendido Luis Gonzaga Ferreira Pereira, relatou em juízo que, no dia 14 de novembro de 2022, encontrava-se em seu veículo Renault Logan, acompanhado de sua filha, Ludmila Barbosa Ferreira, e de seu genro, Diego Rodrigo Caldas Sena, dirigindo-se à sua residência. Ao chegarem ao local, Diego Rodrigo desceu do automóvel para abrir o portão, enquanto o depoente ingressou com o veículo na garagem. Nesse momento, foi surpreendido por três indivíduos, sendo que um deles apontou uma arma de fogo para sua cabeça, subtraindo seu veículo, sua mochila e a mochila de seu genro, que continha computadores, um HD externo e um cabo de alimentação. Destaca-se aqui, apenas por apego jurídico, as flagrantes contradições no depoimento da vítima Luis Gonzaga Ferreira Pereira quando indagado em juízo acerca dos reconhecimentos efetuados. Embora tenha reconhecido Bruno dos Santos Oliveira no reconhecimento realizado por videoconferência (em junho de 2023), ao realizar primeiro o reconhecimento por fotografia (em dezembro de 2022) indicou apenas o corréu Luis Felipe Araujo De Sousa Cruz como um dos supostos autores do fato. Entretanto, em juízo, disse que apenas teria certeza da autoria quanto ao réu Bruno, em razão de um sinal perto do olho e pela deficiência na perna. As vítimas Diego Rodrigo Caldas Sena e Ludmila Barbosa Ferreira reconheceram o réu Bruno dos Santos Oliveira a partir do procedimento do art. 226 do CPP, tanto por fotografia quanto pessoalmente. O Ministério Público imputa tal fato a Bruno dos Santos Oliveira, Luiz Felipe Araújo de Sousa Cruz e Grigorio Mendes Frazao Junior. Entretanto, as vítimas deste fato não reconheceram o réu Grigorio como um dos autores, e o acusado também negou sua participação. Em relação ao segundo evento delitivo, consta dos autos apenas o reconhecimento fotográfico (reconhecimento indireto) que a vítima Francisco Santos Sousa fez em relação aos acusados Bruno dos Santos e Grigório Mendes Frazão. Na audiência de instrução, a vítima declarou que não fez o reconhecimento pessoal. Conforme consignado na sentença, após encerrada a instrução processual, o órgão ministerial requereu ao Delegado de Polícia a realização de reconhecimento pessoal em face do réu Grigório Mendes, pleito este que já havia sido negado pela autoridade judiciária por afronta ao sistema acusatório e aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Isso porque, desde a apresentação da exordial acusatória, o órgão ministerial tinha conhecimento de que não havia reconhecimento pessoal em face do acusado Grigorio Mendes Frazão Júnior, não fazendo sentido, após a instrução, solicitar novas diligências em relação a fatos preexistentes. Contudo, tais diligências foram acostadas aos autos pelo Delegado, após a audiência de instrução, consignando corretamente o magistrado que tais elementos de prova são imprestáveis. Consta da sentença: “(...) Finalizada a instrução, foi requerido a título de diligência pelo MP, a realização de perícia na mídia de ID 53467380, e que seja oficiado o Delegado de Polícia para proceder com o reconhecimento pessoal dos réus Grigório Mendes e Bruno dos Santos pela vítima Francisco Santos Sousa, dos réus Gregório Mendes e Marcos Felipe pelas vítimas Ludmila Barbosa Ferreira e Diego Rodrigo Caldas Sena, e dos acusados Grigório Mendes e Marcos Felipe pela testemunha Márcio Kelson Pereira de Alencar. (...) As diligências foram indeferidas por este juízo, com fundamento nos artigos 47 e 402 do CPP, e aberto vistas às partes para apresentarem suas respectivas alegações finais escritas.(...) Em 07/04/2024 (ID 53897760 e ID 53897764), foram juntados autos de reconhecimento dos acusados realizados em 06/03/2024, mesmo este juízo tendo indeferido tal diligência que havia sido requerida pelo MP ao final da instrução, com fulcro no art. 47 e 402 do CPP. Logo, uma vez indeferida a diligência juntada de forma intempestiva a pedido do Parquet, os referidos termos de reconhecimento não podem ser levados em consideração, em razão do instituto da preclusão, bem como em respeito aos princípios do devido processo legal e do contraditório”. Destaca-se que a participação de Grigorio em todos os crimes narrados na denúncia, na ótica ministerial, resulta da convergência do suposto reconhecimento por fotografia feito pela vítima do segundo evento, e as roupas utilizadas pelo réu, conforme se observa nas mídias das câmaras de segurança acostadas nos autos. Acontece, que, ainda que considerássemos o reconhecimento por videoconferência feito pela vítima do segundo evento criminoso (acostado aos autos após a instrução), não há outras provas produzidas sob o crivo do contraditório que sustentam a participação do réu Grigório em qualquer das dinâmicas delitivas. Embora se possa deduzir que a pessoa utilizava as mesmas vestimentas no primeiro e no segundo evento criminoso, não há como assegurar que se trata do réu Grigorio Mendes Frazão Júnior. Em relação ao terceiro evento criminoso, que teve como vítima Marcos Antônio de Alencar, os criminosos se valeram do Renault Logan roubado no primeiro crime para executar a ação delitiva, subtraindo uma motocicleta Honda POP 100 azul, placa PIB1633. A vítima Marcos Antônio de Alencar, de 64 anos, relatou em juízo que, no momento do crime, encontrava-se em frente à sua residência, abrindo o portão, quando um veículo Renault Logan de cor marrom parou nas proximidades. Em seguida, foi abordado por dois indivíduos, um dos quais portava uma arma de fogo, sendo subtraída sua motocicleta. Apesar de ter sido rendido por dois agentes, a vítima conseguiu reconhecer apenas um dos infratores por videoconferência, a pessoa do acusado Bruno dos Santos Oliveira. Acrescentou que, no momento do crime, o réu utilizava um boné vermelho, máscara preta, bermuda jeans e apresentava uma aparente deficiência em uma das pernas. O filho da vítima, Márcio Kelson Pereira de Alencar, corroborou a narrativa de seu pai em juízo e procedeu ao reconhecimento indireto do réu Bruno dos Santos Oliveira. Novamente, o órgão ministerial pugna pela condenação de Grigorio Mendes Frazão apenas por inferência, em razão das características físicas narradas pelas vítimas, sendo que elas mesmas não reconheceram o acusado, seja diretamente ou por meio de fotografia. O quarto evento criminoso, ocorrido no dia 16.11.2022, próximo às 00:00h, foi praticado contra a vítima Robert Antônio dos Santos Alves. Em síntese, a vítima relatou que estava realizando entregas quando parou sua motocicleta para atender uma ligação. No momento em que retomava o percurso, foi surpreendido por quatro infratores armados, que desceram de um veículo Renault Logan marrom e subtraíram sua moto, que nunca foi recuperada. Que a rua tinha iluminação, mas estava fraca. Falou que um dos agentes tinha deficiência na perna e o outro tatuagem no braço. Que o reconhecimento na delegacia “se deu por foto e vídeo, pois viu vídeo deles assaltando”, em redes sociais. Ressalta-se que, durante a fase investigativa, a vítima Robert Antônio reconheceu, por fotografias, os acusados Bruno dos Santos Oliveira, Marcos Felipe Alves de Macedo e Grigório Mendes Frazão Júnior. No entanto, ao ser realizado o reconhecimento pessoal por videoconferência, identificou apenas Bruno dos Santos Oliveira e Marcos Felipe Alves de Macedo (ID 20430454). Em audiência, ao rever o reconhecimento fotográfico assinado por ele, não se recordava, naquele momento, qual deles era o acusado Grigório Mendes, por ele apontado na época. Destaca-se que foi realizado o ato de reconhecimento pessoal por videoconferência do réu Grigório Mendes, entretanto a vítima não o identificou como um dos autores do fato. Outro ponto a se destacar é que a vítima, na audiência, relatou que procedeu ao reconhecimento de Bruno dos Santos e Marcos Felipe Alves, após ter visto vídeos nas redes sociais, em que identificou os acusados. Outro fator preocupante do reconhecimento feito pela vítima do quarto fato criminoso (Robert Antônio) é que, ao ser indagada em juízo porque teria reconhecido Grigório por foto e não teria o reconhecido por videoconferência, respondeu que é “porque por foto é uma pessoa diferente, por videochamada é totalmente outra”. Ao final, se contradiz quando concluiu que era mais fácil reconhecer um suspeito por videoconferência. Ou seja, ao fazer o reconhecimento pessoal dos investigados, a vítima não reconheceu Grigório Mendes Frazão Júnior, antes identificado por ela no reconhecimento fotográfico como o suposto autor. Por certo, tal contradição mostra a fragilidade das suas memórias e a necessária ponderação dos atos de reconhecimento por ele realizados enquanto meio de prova. O acusado Bruno dos Santos Oliveira confessou a autoria dos delitos que lhe foram imputados. Marcos Felipe Alves de Macedo nega a sua participação desde a fase inquisitorial, embora tenha sido reconhecido pela vítima Robert Antônio. Grigório Mendes Frazão Júnior também negou a autoria delitiva. In casu, a materialidade delitiva dos crimes está devidamente demonstrada pelo através do Relatório Final do Inquérito Policial nº 15.442/2022; pelo boletim de ocorrência alusivo aos fatos (ID 35237628 - págs. 03/08); pelo termo de declaração das vítimas (ID 35237628 - págs. 09/10; 14/15; 19/20; 27; 28; 41 ); pelos termos de reconhecimento (ID 35237628 -pág. 12, 17, 21, 31, 33; 46; 48; 50; ID 42140649; ID 42140675), além dos depoimentos prestados em juízo. No que tange a autoria, não resta dúvidas da participação de Bruno dos Santos Oliveira nas empreitadas criminosas. O órgão ministerial busca a condenação de Grigorio Mendes Frazão Junior pelos quatro eventos de roubo, sob o argumento de que há elementos suficientes para afirmar sua participação nos delitos. Todavia, conforme exposto, verifica-se que não há provas seguras e inequívocas que sustentem tal imputação. No primeiro evento criminoso, as vítimas não reconheceram o réu Grigorio Mendes Frazão Junior como um dos autores do delito. No segundo evento, seu suposto envolvimento se baseia apenas em um reconhecimento fotográfico não corroborado por outros meios de prova. No terceiro evento, não houve qualquer reconhecimento direto ou indireto de sua pessoa. No quarto evento, a própria vítima não identificou o réu Grigório no reconhecimento pessoal, demonstrando inconsistência em suas declarações. Destarte, a absolvição de Grigorio Mendes Frazão Junior deve ser mantida, uma vez que não há elementos probatórios suficientes para confirmar sua autoria nos crimes imputados. Em relação ao pleito de absolvição de Marcos Felipe Alves de Macedo do quarto evento criminoso, argumentando a Defesa que sua condenação se deu exclusivamente com base no reconhecimento precário realizado pela vítima Robert Antônio dos Santos Alves, entendo que o pleito merece acolhimento. Com efeito, a vítima Robert Antônio, ao fazer o boletim de ocorrência, inicialmente descreveu características físicas distintas das do réu Marcos Felipe, vejamos: “(...) Que então desceram quatro indivíduos desse veiculo, que depois identificou como sendo um RENALT LOGAN marrom; Que os indivíduos lhe renderam utilizando armas de fogo; Que o local estava um pouco escuro, mas pode visualizar 03 (três) nacionais na abordagem, sendo que dois deles conseguiu gravar as características físicas; Que descreve o tal nacional como sendo magro, mais ou menos 1,68 metros de altura, bem moreno; Que o motorista que conduzia o LOGAN tinha barba rala (pouca) e bem moreno”. No reconhecimento fotográfico, a vítima Robert Antônio reconheceu como autor do fato o réu Marcos Felipe, o único de pele clara dentre os constantes nas fotografias (ID 20430430). Ao proceder com o reconhecimento por videoconferência, seis meses após o reconhecimento fotográfico, mais uma vez o réu foi reconhecido pela vítima. Nesse aspecto, cumpre destacar dois pontos relevantes: no procedimento de reconhecimento pessoal por videoconferência (ID 20430456), o réu Marcos Felipe Alves de Macedo foi apresentado ao lado de outros três indivíduos cujas características físicas se mostravam notoriamente distintas das suas, especialmente no que tange à faixa etária, uma vez que os demais aparentavam ser bem mais velhos. No boletim de ocorrência a vítima relatava que “acredita que pelo menos dois dos elementos aparentam serem menores de idade”. Além disso, dentre os indivíduos postos lado a lado, somente o réu possuía tatuagens visíveis, o que pode ter influenciado subjetivamente a percepção da vítima, comprometendo a fidedignidade e a isonomia do procedimento de reconhecimento, tendo em vista a necessidade de observância aos critérios estabelecidos no artigo 226 do Código de Processo Penal. Se ainda não bastasse, a vítima, em audiência de instrução, informou que esse reconhecimento pessoal se deu após ter acessos a outros vídeos em redes sociais do suposto assalto anterior praticado pelo suposto grupo. Nesse momento, insta salientar que, no tocante ao reconhecimento de pessoas e coisas, o Código de Processo Penal dedica três sucintos artigos ao ato do reconhecimento de pessoas e coisas (arts. 226, 227 e 228). “Em relação ao reconhecimento de pessoas, o art. 226 estabelece que o ato deverá ocorrer da seguinte forma: a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever o indivíduo que deva ser reconhecido (art. 226, I); a pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la (art. 226, II); se houver razão para recear que a pessoa chamada para realizar o ato, por intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da pessoa a ser reconhecida, a autoridade providenciará para que esta não veja aquela (art. 226, III); do ato de reconhecimento lavrar-se-á termo pormenorizado, subscrito pela autoridade, pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais (art. 226, IV)” (HC n. 598.886/SC, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 27/10/2020, DJe de 18/12/2020). Sobre o tema, GUILHERME DE SOUZA NUCCI conceitua o reconhecimento de pessoas como "o ato pelo qual uma pessoa admite e afirma como certa a identidade de outra ou a qualidade de uma coisa" (Manual de Processo Penal e Execução Penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 436). Em recente mudança de entendimento, o Superior Tribunal de Justiça, em julgado da Sexta Turma, sedimentou a compreensão de que “O reconhecimento de pessoa, presencialmente ou por fotografia, realizado na fase do inquérito policial, apenas é apto, para identificar o réu e fixar a autoria delitiva, quando observadas as formalidades previstas no art. 226 do Código de Processo Penal e quando corroborado por outras provas colhidas na fase judicial, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa” (HC 598.886/SC, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Sexta Turma, julgado em 27/10/2020, DJe 18/12/2020). No citado julgado, restou consignado, ainda, que: 1) O reconhecimento de pessoas deve observar o procedimento previsto no art. 226 do Código de Processo Penal, cujas formalidades constituem garantia mínima para quem se encontra na condição de suspeito da prática de um crime; 2) À vista dos efeitos e dos riscos de um reconhecimento falho, a inobservância do procedimento descrito na referida norma processual torna inválido o reconhecimento da pessoa suspeita e não poderá servir de lastro a eventual condenação, mesmo se confirmado o reconhecimento em juízo; 3) Pode o magistrado realizar, em juízo, o ato de reconhecimento formal, desde que observado o devido procedimento probatório, bem como pode ele se convencer da autoria delitiva a partir do exame de outras provas que não guardem relação de causa e efeito com o ato viciado de reconhecimento; 4) O reconhecimento do suspeito por mera exibição de fotografia(s) ao reconhecedor, a par de dever seguir o mesmo procedimento do reconhecimento pessoal, há de ser visto como etapa antecedente a eventual reconhecimento pessoal e, portanto, não pode servir como prova em ação penal, ainda que confirmado em juízo. Como bem delimita Aury Lopes Júnior, in Direito processual penal. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 490, às exigências perpetradas pelo Código de Processo Penal, atinentes ao reconhecimento, "constituem condição de credibilidade do instrumento probatório, refletindo na qualidade da tutela jurisdicional prestada e na própria confiabilidade do sistema judiciário de um país". No caso do réu Marcos Felipe, o procedimento do reconhecimento não atingiu sua finalidade precípua, que é a de distinguir, entre pessoas de características físicas semelhantes, aquela responsável pelo ilícito. O réu indicado pela vítima tem características distintas das narradas por ela mesma no boletim de ocorrência. A esse respeito, em caso análogo, consignou o STJ: “a defesa juntou aos autos fotografia atual do paciente, que demonstra que ele teve sensíveis alterações de fisionomia desde o registro fotográfico mencionado e que demonstra, ainda, que ele tinha características distintas daquelas descritas pela vítima à autoridade policial ("branco, magro e baixo"). Tais circunstâncias do caso concreto incrementam ainda mais o risco de erro no reconhecimento pessoal e, consequentemente, o risco de erro judicial material (falso positivo)” (HC n. 948.558/PE, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 10/12/2024, DJEN de 13/12/2024). Destaca-se aqui, apenas para reforçar o argumento, que se trata da mesma vítima que contraditoriamente reconheceu o réu Grigório Mendes Frazão Júnior por fotografias, mas não o apontou por videoconferência (ID 20430454). Ressalta-se que "quando se coloca em dúvida a confiabilidade do reconhecimento feito pela vítima, mesmo nas hipóteses em que ela diga ter 'certeza absoluta' do que afirma, não se está a questionar a idoneidade moral daquela pessoa ou a imputar-lhe má-fé, vale dizer, não se insinua que ela esteja mentindo para incriminar um inocente. O que se pondera apenas é que, não obstante subjetivamente sincera, a afirmação da vítima pode eventualmente não corresponder à realidade, porque decorrente de um 'erro honesto', causado pelo fenômeno das falsas memórias" (HC n. 700.313/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 7/6/2022, DJe de 10/6/2022). Assim, apesar de grave as condutas imputadas na exordial, e mesmo diante da possibilidade de que o réu possa, de fato, ter praticado o roubo narrado no quarto evento, não se identificou prova suficiente para uma condenação criminal. Depois de uma extensa audiência de instrução (cerca de cinco horas), não foi produzida uma única prova que relacione o réu Marcos Felipe aos fatos narrados na denúncia, a não ser o reconhecimento efetuado pela vítima com todas as observações feitas acima. Noutra perspectiva, a forma como se deu a apuração criminal também revela falhas significativas quanto à indicação da autoria delitiva desses eventos criminosos. O crime foi praticado em novembro de 2022, o Relatório do Inquérito foi apresentado em 13.04.2023. Antes de oferecer a denúncia, o órgão ministerial requereu diligências por considerar que “o único indício de autoria acostado aos autos é o termo de reconhecimento por meio de fotografia, o que não é suficiente para imputar aos indiciados a prática dos crimes narrados”. Em 13.06.2023, a autoridade policial apresentou o reconhecimento pessoal e interrogatório dos acusados Marcos Felipe Alves De Macedo, Grigorio Mendes Frazão Junior e Bruno Dos Santos Oliveira. Em 23.06.2023, o órgão ministerial entendeu que os indícios de autoria ainda eram precários e requereu o retorno dos autos para a complementação da diligência (ID 20430463). Sem nova resposta da autoridade policial, o órgão ministerial apresentou denúncia em 19.09.2023. Percebe-se, assim, que houve uma série de contratempos nos reconhecimentos pessoais, colhidos aproximadamente seis meses após os reconhecimentos fotográficos, bem como uma deficiência na seleção de pessoas com características semelhantes. Deve ser observado, também, o depoimento prestado pelo réu Marcos Felipe Alves de Macedo na delegacia, após ser apontado pela vítima Robert Antônio como um dos supostos autores do roubo. Durante sua oitiva, o réu demonstrou aparente surpresa quando informado do reconhecimento feito pela vítima, vindo a informar que não conhecia os corréus e chegou a questionar se, por causa disso, iria responder a um processo judicial (ID 20430458). Ressalta-se, ainda, que desde a fase inquisitiva todos os réus sustentam que não se conhecem. Ao ser indagado pelo magistrado sobre a participação de Marcos Felipe e Grigorio Mendes nesse quarto evento criminoso, o réu confesso Bruno dos Santos Oliveira aduziu que se tratavam de outros dois indivíduos que não podia citar os nomes, e, em relação aos corréus, ressaltou “que eu não conheço eles não, é palavra minha, agora se a vítima tá acusando eles, posso fazer nada não”. Portanto, não há qualquer elemento de prova objetivo que vincule o réu Marcos Felipe ao crime que lhe foi imputado. A única evidência de sua suposta participação advém do reconhecimento feito pela vítima de maneira isolada e contraditória, o que não é suficiente para sustentar um édito condenatório. Nota-se, então, que relevantes incertezas circundam o caso, sendo temerário concluir pela condenação do acusado pela prática do crime em comento, sendo imperiosa a aplicação do in dubio pro reo no que tange à sua participação na infração penal analisada, com fulcro no art. 386, VII, do Código de Processo Penal, conforme preceitua a jurisprudência pátria: PROCESSUAL PENAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REVISÃO CRIMINAL NA ORIGEM. CRIME DE ROUBO MAJORADO, ESTUPRO E ESTUPRO DE VULNERÁVEL. AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO CRIMINAL. ART. 621, III, DO CPP. NOVA PROVA. REVISÃO CRIMINAL. POSSIBILIDADE. DÚVIDA QUANTO À AUTORIA. PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO. VALOR PROBATÓRIO DO DEPOIMENTO DA VÍTIMA. O IMPACTO DAS FALSAS MEMÓRIAS NO RECONHECIMENTO PESSOAL. PROCEDIMENTO DO ART. 226 DO CPP. NULIDADE. AGRAVO CONHECIDO PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. (...) 3. A retratação da vítima e as falhas no procedimento de reconhecimento, especialmente a discrepância física entre os apresentados e o acusado, motivam a reavaliação da condenação. A análise se debruça sobre a valoração do depoimento da vítima em consonância com o corpus probatório e os princípios do in dubio pro reo, enfatizando a influência das falsas memórias na identificação do acusado e a necessidade de alinhamento do procedimento de reconhecimento às diretrizes do art. 226 do CPP. 4. Teses fixadas : 4.1 Em delitos sexuais, a retratação da vítima autoriza a revisão criminal para absolvição do réu, quando o conjunto probatório se limita à sua declaração e a testemunhos, sem outras provas materiais. 4.2 O procedimento de reconhecimento de pessoas, para sua validade, deve assegurar a semelhança física entre o suspeito e os demais indivíduos apresentados, conforme estabelece o art. 226, II, do CPP, evitando-se sugestões que possam influenciar a decisão da testemunha e comprometer o reconhecimento. 5. Agravo conhecido para dar provimento ao recurso especial e absolver o recorrente. (AREsp n. 2.408.401/PA, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 2/4/2024, DJe de 10/4/2024.) PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. ROUBO MAJORADO. CONDENAÇÃO. VIOLAÇÃO AO ART. 155 DO CPP. RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO EXTRAJUDICIAL. INEXISTÊNCIA DE OUTRAS PROVAS SEGURAS DA AUTORIA DELITIVA. REVISÃO. POSSIBILIDADE. DESNECESSIDADE DE REEXAME DE PROVAS. NÃO INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7/STJ. NON LIQUET. APLICAÇÃO DA REGRA DO IN DUBIO PRO REO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. A análise acerca da legitimidade da condenação do ora recorrente não atrai incursão no acervo probatório dos autos, uma vez que a situação fática a ser analisada está delineada no acórd ão recorrido e diz respeito ao exame de violação de normativo federal. 2. Para a imposição de uma condenação criminal, faz-se necessário que seja prolatada uma sentença, após regular instrução probatória, na qual haja a indicação expressa de provas suficientes acerca da comprovação da autoria e da materialidade do delito, nos termos do art. 155 do Código de Processo Penal. 3. Ademais, segundo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, "[...] o reconhecimento de pessoa, presencialmente ou por fotografia, realizado na fase do inquérito policial, apenas é apto, para identificar o réu e fixar a autoria delitiva, quando observadas as formalidades previstas no art. 226 do Código de Processo Penal e quando corroborado por outras provas colhidas na fase judicial, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa (HC n. 598.886/SC, Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 18/12/2020)" (AgRg no HC n. 734.611/PR, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 21/6/2022, DJe de 27/6/2022). 4. Na hipótese, a condenação baseou-se primordialmente no reconhecimento fotográfico extrajudicial, nem sequer confirmado em juízo, sem a indicação de outros elementos de convicção que pudessem respaldar, com segurança, a autoria delitiva. Vale mencionar que o rosto do acusado estava parcialmente coberto por um capuz. Além disso, os dados extraídos das interceptações telefônicas, apontados pelas instâncias antecedentes, configuram meras presunções sobre a responsabilidade penal do réu, não havendo nenhuma referência específica à participação do recorrente na empreitada delituosa. 5. Insta salientar que a avaliação do acervo probatório deve ser balizada pelo princípio do favor rei. Ou seja, remanescendo dúvida sobre a responsabilidade penal do acusado, imperiosa será a sua absolvição, tendo em vista que sobre a acusação recai o inafastável ônus de provar o que foi veiculado na denúncia. 6. Recurso especial provido. (REsp n. 2.109.511/SP, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 6/2/2024, DJe de 14/2/2024.) Diante da ausência de outros elementos probatórios aptos a corroborar a participação do apelante Marcos Felipe no crime, impositiva se revela a sua absolvição, nos termos do art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. II) Da associação criminosa. Pleito de condenação. Ausência do animus associativo No que diz respeito ao delito de associação criminosa, tem-se que o tipo penal está previsto no artigo 288 do Código Penal, que dispõe, in verbis: “Art. 288. Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes” Logo, para sua configuração, o tipo exige o animus associativo com o fim específico da prática de delitos, ao passo em que a mera participação de três ou mais pessoas na prática de um delito não implica, automaticamente, o preceito penal acima citado. O Superior Tribunal de Justiça já consignou o entendimento de que "para caracterização do delito de associação criminosa, indispensável a demonstração de estabilidade e permanência do grupo formado por três ou mais pessoas, além do elemento subjetivo especial consiste no ajuste prévio entre os membros com a finalidade específica de cometer crimes indeterminados. Ausentes tais requisitos, restará configurado apenas o concurso eventual de agentes, e não o crime autônomo do art. 288 do Código Penal" (HC n. 374.515/MS, rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 7/3/2017, DJe 14/3/2017). No caso dos autos, não restou comprovada a associação dos acusados para o cometimento de delitos em nenhum momento dos autos. Na verdade, as provas produzidas em juízo indicam que os réus sequer se conhecem, ou seja, não há elementos probatórios seguros que demonstrem que os três réus tinham uma organização ou ajuste prévio para cometer crimes, estando ausente o elemento subjetivo do tipo. O que há, no caso, é apenas o concurso de pessoas, que não pode ser definido como o delito de associação criminosa. Assim, mais uma vez, diante da dúvida que se instala, por ausência de provas, há que ser mantida a absolvição dos réus, com base no artigo 386, VII, do CPP. III) Do concurso de crimes O órgão ministerial requer o afastamento da continuidade delitiva (art. 71 do CP) e o reconhecimento do concurso formal (art. 70 do CP) em relação ao delito previsto no art. 157, § 2º, II, e § 2º-A, I, do CP, por duas vezes, em razão das vítimas Luis Gonzaga e Diego, bem como no mesmo tipo penal, combinado com o art. 14, II, do CP, uma vez, em relação à vítima Ludmila. Além disso, pleiteia o reconhecimento do concurso material (art. 69 do CP) entre esses crimes e os dispostos no art. 288 do CP, e no art. 157, § 2º, II, e § 2º-A, I, do CP, por três vezes, referentes às vítimas Francisco Santos, Marcos Antônio e Robert, em relação aos recorridos Bruno dos Santos Oliveira e Grigorio Mendes Frazão Junior. Pois bem. A denúncia, quando apresentada, denota em toda a peça a multiplicidade de delitos praticados em mesma condição de tempo, lugar e maneira de execução. Logo, está narrada fáticamente a continuidade delitiva, embora não seja mencionado na exordial se o crime teria sido praticado em concurso formal, material ou continuidade. Na audiência de instrução os fatos foram versados, a todo momento, como caso de continuidade delitiva. O órgão ministerial, apenas em alegações finais, suscitou a tese apresentada. E muito embora os réus se defendam de fatos e não da capitulação jurídica, entendo que não é o caso de acolhimento do pleito. O artigo 71 do Código Penal dispõe que há crime continuado quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie, em condições de tempo, lugar e maneira de execução, devendo os delitos ser considerados como um só para efeito de aplicação da pena. No presente caso, todos os eventos delitivos possuem identidade típica – roubo majorado pelo emprego de arma e concurso de agentes –, foram praticados no mesmo contexto situacional e seguiram um mesmo modo de execução. A continuidade delitiva consiste numa ficção jurídica criada pelo legislador para beneficiar o autor do crime, pressupondo, para o seu reconhecimento, a presença de pressupostos objetivos, que são: mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução, e subjetivo, qual seja: unidade de desígnios. É o que preceitua o artigo 71 do Código Penal: “Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços. Parágrafo único - Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste Código”. Sobre o tema, leciona RICARDO AUGUSTO SCHIMITT, in Sentença Penal Condenatória: Teoria e Prática. 13ª. ed. Salvador: Juspodivm, 2019. p. 315 : “A conceituação legal da espécie de crime continuado nos traz requisitos que também se encontram presentes na espécie do concurso material ou real de crimes, pois ambos ocorrem 'quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes (...)', porém, a continuidade delitiva se diferencia por exigir: 1º) que os crimes cometidos sejam da mesma espécie: crimes da mesma espécie são aqueles que possuem a mesma tipificação legal, não importando se simples, privilegiados ou qualificados, se tentados ou consumados; 2º) que os crimes tenham sido cometidos pelas mesmas condições de tempo: predomina o entendimento na jurisprudência da possibilidade de se reconhecer a espécie de crime continuado entre infrações praticadas em intervalo de tempo não superior a trinta dias (STF, HCs 107636 e 69896); 3º) que os crimes tenham sido cometidos com identidade de lugar: permite-se o reconhecimento da espécie de crime continuado entre os delitos praticados na mesma rua, no mesmo bairro, na mesma cidade ou até mesmo em cidades vizinhas (limítrofes) (RT 542/455); 4º) que os crimes tenham sido cometidos pelo mesmo modo de execução: exige-se que ocorra identidade quanto ao modus operandi do agente ou do grupo; 5º) que os crimes subsequentes sejam tidos como continuação do primeiro: exige-se que as ações subsequentes devam ser tidas como desdobramento lógico da primeira, demonstrando a existência de unidade de desígnios. O artigo 71 do Código Penal nos fornece, portanto, os requisitos indispensáveis à caracterização do crime continuado ou da continuidade delitiva, que se constituem na prática de mais de uma ação ou omissão, tendo como resultado dois ou mais crimes da mesma espécie, que pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, os crimes subsequentes devem ser havidos como continuação do primeiro, o que conduzirá à aplicação da pena de um só dos crimes, se idênticas, aumentadas de 1/6 até 2/3, ou a aplicação da mais graves das penas, se diversas, aumentada de 1/6 até 2/3, ou, ainda, nos crimes dolosos contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, a aplicação da pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a aplicação da mais grave das penas, se diversas, aumentadas em quaisquer hipóteses até o triplo." No caso dos autos, é importante delimitar que a continuidade delitiva é favorável ao réu, e que os crimes são da mesma espécie, praticado mediante mais de uma ação, praticados em sequência, com o mesmo modo de execução. Sob outra perspectiva, a aplicação do concurso formal e material de crimes resultaria em uma penalidade desproporcional, comprometendo a adequada realização das funções preventiva, retributiva e ressocializadora da pena. Dessa forma, rejeito o pleito ministerial. IV) Da análise da primeira fase da dosimetria O órgão ministerial pugna ainda pela valoração negativa dos vetores da personalidade e consequências do crime, na individualização da pena do réu BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA. Neste momento, insta consignar que o ordenamento jurídico brasileiro adota o sistema trifásico de aplicação da pena, destinando a primeira fase para fixação da pena-base, devendo a mesma ser aferida com fulcro nas circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal, quais sejam: a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do sentenciado; os motivos do crime, as circunstâncias e as consequências da infração penal; e, ainda, o comportamento da vítima. Com efeito, o juiz sentenciante, em relação à condenação do recorrente, fundamentou a exasperação da pena-base na valoração negativa dos vetores da culpabilidade e dos antecedentes, previstos no art. 59 do CP. Passo à análise do pedido ministerial. Em relação ao vetor da personalidade, enquanto circunstância judicial do art. 59 do CP, leciona Cleber Masson, em Direito Penal, Parte Geral (Arts. 1º ao 120), 15ª ed., Rio de Janeiro: Forense; Método, 2021, p. 584: “[…] é o perfil subjetivo do réu, nos aspectos moral e psicológico, pelo qual se analisa se tem ou não o caráter voltado à prática de infrações penais. Levam-se em conta seu temperamento e sua formação ética e moral, aos quais se somam fatores hereditários e socioambientais, moldados pelas experiências por ele vividas”. Portanto a personalidade deve ser aferida com base no perfil subjetivo do acusado, tendo em vista seus aspectos morais e psicológicos, com o fito de se identificar a existência de caráter voltado à prática de infração penal, com base nos elementos probatórios dos autos, aptos a inferir o desvio de personalidade de acordo com o livre convencimento motivado. O órgão ministerial requer que se considere a personalidade desvirtuada do agente em razão de ações penais em curso em seu desfavor. Acontece que os precedentes do Superior Tribunal de Justiça pacificam que a valoração desfavorável da conduta social e da personalidade, com base neste fundamento, afigura-se indevida, haja vista que inquéritos e ações penais em curso não se prestam para exasperar a pena-base ao se analisar os vetores do art. 59 do Código Penal. Aliás, este foi o entendimento consolidado na Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça: “Súmula 444, STJ: É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base”. Ademais, uma ação penal transitada em julgado só poderá ser utilizada ou para fins de caracterização de maus antecedentes, na primeira fase da dosimetria da pena, ou para fins de caracterização de reincidência, quando da fixação da pena intermediária. O vetor da conduta social e da personalidade não se relacionam com o histórico criminal do agente. Nesse sentido: A jurisprudência desta Suprema Corte (e a do Superior Tribunal de Justiça) orienta-se no sentido de repelir a possibilidade jurídica de o magistrado sentenciante valorar negativamente, na primeira fase da operação de dosimetria penal, as circunstâncias judiciais da personalidade e da conduta social, quando se utiliza, para esse efeito, de condenações criminais anteriores, ainda que transitadas em julgado, pois esse específico aspecto (prévias condenações penais) há de caracterizar, unicamente, maus antecedentes (STF, RHC 144.337-AgR, Rel. Ministro CELSO DE MELLO, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/11/2019, DJe 22/11/2019). A propósito, é o entendimento igualmente adotado pelo Superior Tribunal de Justiça: PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. ART. 35 DA LEI Nº 11.343/06. PENA-BASE. EXASPERAÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. PROPORCIONALIDADE. REGIME MAIS GRAVOSO. LEGALIDADE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. No tocante à fixação da pena-base acima do mínimo legal, cumpre registrar que a dosimetria da pena está inserida no âmbito de discricionariedade do julgador, estando atrelada às particularidades fáticas do caso concreto e subjetivas dos agentes, elementos que somente podem ser revistos por esta Corte em situações excepcionais, quando malferida alguma regra de direito. 2. As instâncias ordinárias exasperaram a reprimenda, tendo em vista que a associação envolvia considerável quantia em dinheiro (R$ 3.000 a R$ 4.000, por dia - e-STJ fls. 203) e movimentava elevada quantidade de droga, tudo a desbordar do ordinário do tipo, aumentando a reprovabilidade da conduta. 3. É firme o entendimento deste Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, em observância ao princípio da presunção da inocência, a existência de inquéritos policiais e/ou ações penais em andamento não constitui fundamentação idônea para afastar a pena-base do mínimo legal, seja a título de maus antecedentes, conduta social negativa ou personalidade. Incidência da Súmula 444/STJ. No presente caso, possuindo o acusado condenação transitada em julgado, não há qualquer ilegalidade no reconhecimento do desvalor dos antecedentes. (...) 11. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp n. 2.338.824/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 20/6/2023, DJe de 26/6/2023.) No que diz respeito às consequências, os danos causados pela infração, ou as suas consequências, podem ser de ordem material ou moral e deve o Juiz avaliar a menor ou maior intensidade da lesão jurídica causada à vítima ou a seus familiares. O Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que o mero abalo emocional, por si só, não pode ser utilizado como fundamento para o aumento da reprimenda básica, pois trata-se de consequência inerente ao próprio tipo penal. No caso dos autos, o órgão ministerial entende que “a circunstância judicial referente às consequências do crime (efeito maléfico) transcendeu o esperado ao tipo penal, o que demonstra a impossibilidade da manutenção do neutro basilar, razão pela qual há de ser tal vetorial utilizada para majorar a pena base do acusado”. Não assiste razão à acusação. A valoração pleiteada é inidônea, pois não apresenta qualquer motivação reprovável para a prática do ato capaz de exasperar a pena-base, sobrelevando-se que a obtenção de lucro fácil e a não recuperação dos bens é inerente ao crime de roubo. O Superior Tribunal de Justiça compreende que a obtenção de lucro fácil e rápido em prejuízo alheio é circunstância elementar do delito patrimonial. Sobre o tema, encontra-se o seguinte julgado: DIREITO PENAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIME DE ROUBO. DOSIMETRIA DA PENA. CULPABILIDADE E CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. FUNDAMENTOS PARCIALMENTE INVÁLIDOS. BIS IN IDEM. SUBSISTÊNCIA DE OUTROS FUNDAMENTOS SUFICIENTES PARA A NEGATIVAÇÃO. PARCIAL PROVIMENTO. NULIFICAÇÃO PARCIAL DOS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO, SEM EFEITO INFRINGENTE NA PENA FINAL. (...) 5. A fundamentação para negativar as consequências do crime, ao considerar o prejuízo financeiro pela não recuperação dos bens, é inadequada, pois tal consequência é ínsita ao tipo penal de roubo, devendo ser invalidada. 6. A presença de graves abalos e traumas psicológicos nas vítimas é fundamento adequado para negativar as consequências do crime, conforme jurisprudência, mantendo-se a negativação por este motivo. IV. Dispositivo e tese 7. Agravo conhecido e provido. Recurso especial conhecido e parcialmente provido para nulificar a fundamentação de que a culpabilidade é negativa por danos psicológicos e que as consequências são negativas por danos materiais, sem efeito infringente na pena final. (AREsp n. 2.383.059/CE, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 10/12/2024, DJEN de 17/12/2024.) Por conseguinte, rejeito o pedido ministerial. V) Terceira fase da dosimetria da pena Na terceira fase da individualização da pena, existe insurgência da defesa do réu condenado contra a incidência das causas de aumento em cascata. O apelante BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA pugna pela aplicação de apenas uma causa de aumento da parte especial, devendo incidir na terceira fase somente a majorante do uso de arma de fogo (art. 157, § 2-A, I, do CP), e o concurso de agentes deve ser analisado na 1ª fase da dosimetria, por previsão expressa no artigo 68, parágrafo único, do CP. Neste aspecto, convém trazer à baila o artigo 68 do Código Penal, que assim estabelece: “Art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento. Parágrafo único - No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua.” A leitura do artigo suso transcrito revela uma conclusão salutar para o deslinde do feito, a saber: existe a faculdade, e não obrigação, do magistrado aplicar apenas a causa de aumento que mais aumente prevista na parte especial. Desta forma, constata-se que o legislador processual deu ao magistrado a faculdade de aplicar apenas uma causa de aumento ou de diminuição, prevalecendo aquela que mais aumente ou mais diminua. Nesse sentido, é também o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o qual ressalta que “a teor do art. 68, parágrafo único, do Código Penal, é possível aplicar cumulativamente as causas de aumento de pena em concurso, não estando obrigado o julgador somente a fazer incidir a causa que aumente mais a pena, excluindo as demais.” (AgRg no HC 644.572/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 09/03/2021, DJe 15/03/2021). Sobre o tema, encontram-se os seguintes julgados: PENAL. RECURSO ESPECIAL. ROUBO MAJORADO. DOSIMETRIA. AGRAVANTE DE CALAMIDADE PÚBLICA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE NEXO CAUSAL ENTRE A SITUAÇÃO PANDÊMICA RELATIVA AO CORONAVÍRUS E A PRÁTICA DO DELITO. NÃO INCIDÊNCIA. CONCURSO DE AGENTES E EMPREGO DE ARMA DE FOGO. APLICAÇÃO CUMULATIVA DAS CAUSAS DE AUMENTO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. RECURSO PROVIDO. 1. É pacífico, na jurisprudência desta Corte, o entendimento de que "a incidência da agravante do art. 61, inciso II, alínea 'j', do Código Penal - prática do delito durante estado de calamidade pública gerado pela pandemia do coronavírus - exige nexo entre tal circunstância e a conduta do agente" (AgRg no HC n. 717.298/SP, relator Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 22/2/2022, DJe 2/3/2022), o que não foi demonstrado nos autos. 2. Ainda, nos termos da orientação desta Casa, presentes duas causas de aumento, é possível a aplicação das majorantes de forma cumulada na terceira etapa do cálculo da reprimenda. O art. 68, parágrafo único, do Código Penal não obriga que o magistrado aplique apenas uma causa de aumento quando estiver diante de concurso de majorantes. Precedentes. (REsp n. 2.031.972/SP, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 13/12/2022, DJe de 16/12/2022.) AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. CRIME DE ROUBO MAJORADO. CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. NÃO INTERPOSIÇÃO DO RECURSO DE APELAÇÃO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ELEITA. REEXAME DE PROVAS. DOSIMETRIA. INCIDÊNCIA CUMULATIVA DE DUAS CAUSAS DE AUMENTO PREVISTAS NA PARTE ESPECIAL DO CÓDIGO PENAL. POSSIBILIDADE, DESDE QUE DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. ART. 68, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO PENAL. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. (...)3. Quanto à dosimetria da pena, constata-se que a Corte local adotou entendimento que se coaduna com a jurisprudência desta Corte Superior, no sentido de que, a teor do art. 68, parágrafo único, do Código Penal, é possível, de forma concretamente fundamentada, aplicar cumulativamente as causas de aumento de pena previstas na parte especial, não estando obrigado o julgador somente a fazer incidir a causa que aumente mais a pena, excluindo as demais (AgRg no HC n. 644.572/SP, Relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 9/3/2021, DJe de 15/3/2021). 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no HC n. 776.257/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 25/10/2022, DJe de 7/11/2022.) Entretanto, o que se percebe é que a sentença está devidamente fundamentada, já que o magistrado destacou que o crime foi cometido pelo acusado Bruno junto de outros comparsas, em unidade de desígnios, valendo-se da utilização de arma de fogo. Restou destacado, ainda, o acentuado desvalor da conduta do réu, que chegou a dar coronhada em uma das vítimas. Vejamos a fundamentação: “(...) Diante do cenário vislumbrado nos autos, entendo que as circunstâncias do caso concreto exigem a aplicação de forma CONCOMITANTE das majorantes em questão, pois a unidade de desígnios demonstrou evidente premeditação, de modo que se reuniram exclusivamente para a prática de crimes de roubo mediante o emprego de arma letal (arma de fogo) que, inclusive, foi apontada para a cabeça de uma das vítimas. Soma-se a isso, o fato de que se tratavam de, no mínimo, três infratores, de modo que a quantidade de indivíduos indubitavelmente reduziu a zero a possibilidade de resistência/defesa por parte das vítimas que, mesmo não oferecendo qualquer reação, houve lesão à integridade física de um dos ofendidos. Destarte, a quantidade de infratores agindo de forma premeditada; o uso efetivo de arma de fogo sendo apontada ora em direção ao corpo, ora à cabeça; e a lesão à integridade física de um dos ofendidos que sequer ofereceu resistência; são circunstâncias que causam maior reprovação e que justificam, portanto, o emprego das causas de aumento na terceira fase, como forma de garantir a reprovação e prevenção dos crimes, com espeque no art. 59, caput, parte final, do Código Penal”. Ora, diante do exposto, desnecessárias maiores digressões, uma vez que não há como negar que devidamente fundamentada a incidência da dupla majoração na terceira fase dosimétrica. Tendo o magistrado a quo detalhado a conduta do réu de forma individualizada, ponderado acerca do modus operandi apto a majorar duplamente a pena, bem como observada expressamente a jurisprudência pátria. Portanto, não merece respaldo a tese suscitada pela defesa. VI) Do quantum indenizatório. Dos danos materiais e morais Na sentença, o magistrado fixou a reparação de danos, no seguintes termos: “O Ministério Público logrou êxito em comprovar o valor do bem subtraído da vítima Diego Rodrigo Caldas Sena, visto que anexou aos autos cópia da nota fiscal referente ao aparelho (ID 53467803), constando a descrição do celular e o valor pago pela vítima (R$ 2.944,05). Assim, comprovado o valor do prejuízo material suportado pela vítima Diego Rodrigo Caldas Sena e submetida a documentação ao contraditório, fixo o valor de 2.944,05 (dois mil, novecentos e quarenta e quatro reais e cinco centavos), a título de dano material em favor de Diego Rodrigo Caldas Sena, com fulcro no art. 387, inc. VII, do Código Processual Penal. Por outro lado, com relação às demais vítimas, o órgão acusador não anexou aos autos nota fiscal ou outra documentação análoga, sendo notoriamente ilegal a conduta de arbitrar dano material, sem que as partes tenham oportunidade de informar o montante indenizável, o que consistiria em violação aos direitos das vítimas e dos acusados, eis que da mesma forma que estes possuem direito de combater o pleito indenizatório, aqueles necessitam de oportunidade para demonstrar o quanto devem receber e as proporções do dano experimentado. Também descabe a fixação de dano moral na forma requerida pelo Ministério Público, pois, em que pese o constrangimento próprio do tipo penal, não foi juntado pelo órgão acusador qualquer documentação que comprovasse o alegado (art. 156 do CPP), para fins de fundamentar a espécie indenizatória e possibilitar o contraditório e ampla defesa constitucionalmente assegurados (art. 5º, inc. LV, da CF/88)”. Em síntese, a acusação busca a fixação de indenizações por danos materiais no valor de R$ 949,00 para Francisco Santos Sousa, R$ 8.000,00 para Marcos Antônio de Alencar, a serem pagos por Bruno dos Santos Oliveira e Grigorio Mendes Frazao Junior, e R$ 10.543,10 para Robert Antônio dos Santos Alves, a ser pago também por Marcos Felipe Alves de Macedo. Além disso, a determinação de R$ 5.000,00 a cada uma das vítimas Luis Gonzaga Pereira Ferreira, Diego Rodrigo Caldas Sena, Francisco Santos Sousa, Marcos Antônio de Alencar e Robert Antônio dos Santos Alves, a título de danos morais, nos termos do art. 91, I, do CP c/c art. 387, IV, do CPP. Por sua vez, a defesa do réu BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA requer a reforma da sentença no que tange a condenação do apelante ao pagamento de danos materiais, por ausência de instrução probatória específica. Sobre o tema, torna-se importante frisar que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme “no sentido de que a fixação de valor mínimo para indenização dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pela vítima, prevista no art. 387, inciso IV, do CPP, além de pedido expresso na exordial acusatória, pressupõe a indicação de valor e prova suficiente a sustentá-lo, possibilitando ao réu o direito de defesa, com indicação de quantum diverso ou mesmo comprovação de inexistência de prejuízo material ou moral a ser reparado." (AgRg no AREsp n. 2.068.728/MG, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 13/5/2022, grifei). Assim, o magistrado criminal, para a fixação de valores a título de reparação de danos, deve proporcionar ao réu todos os meios de prova admissíveis no processo para que se apure o montante devido, com a indicação de elementos e valores que o sustentem. Caso contrário, inexistindo instrução específica para esse fim, o agente não pode arcar com o valor aleatoriamente determinado, sob pena de ofensa aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Apesar da fixação realizada na origem, considerando a apresentação de nota fiscal em nome da vítima antes da audiência de instrução, os demais danos sofridos pelas outras vítimas não foram devidamente apurados sob o crivo do contraditório. Em relação aos demais valores apontados pelo órgão ministerial, o exame dos autos evidencia que não restou realizada a instrução específica para a apuração do montante devido, com a indicação de elementos e valores que sustentem a indenização por dano moral e material, sendo inviável que o Apelante arque com o valor aleatoriamente determinado pelo órgão ministerial, sob pena de ofensa aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, ressaltando-se que a indenização pode ser pleiteada em ação autônoma. Ora, além de pedido expresso na exordial acusatória, é imprescindível que haja a indicação de valor devido, acompanhado de prova suficiente a sustentá-lo, possibilitando ao réu o direito de defesa, com indicação de quantum diverso ou mesmo comprovação de inexistência de prejuízo material ou moral a ser reparado. Sem a adoção de tais providências no caso concreto, é incabível a condenação na forma pleiteada pelo órgão ministerial. No que tange ao apelo de exclusão do dano material imposto na sentença, entendo que o pleito consta da exordial acusatória, foi apresentada nota fiscal em nome da vítima antes da audiência de instrução e a defesa teve a oportunidade de insurgir-se, em respeito às garantias do contraditório e da ampla defesa. Assim, rejeito os pedidos formulados. VII) Da desconsideração da pena de multa e da suspensão das custas processuais Por fim, a defesa do Apelante Bruno dos Santos de Oliveira requer, ainda, a redução da pena de multa e a suspensão das custas processuais. A pena de multa está prevista no art. 5º, inciso XLVI, alínea "c", da Constituição Federal e no art. 49 do Código Penal, e, seja ela cominada no preceito secundário do tipo penal ou substitutiva da pena privativa de liberdade (art. 44 do CP), constitui espécie de sanção penal patrimonial, consistente na obrigação imposta ao apenado de pagar ao fundo penitenciário determinada quantia em dinheiro. (AgRg no REsp n. 1.990.425/MG, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe de 29/4/2022). Nesse mesmo sentido, CLEBER MASSON entende que a pena de multa é a espécie de sanção penal, de cunho patrimonial, consistente no pagamento de determinado valor em favor do Fundo Penitenciário. (MASSON, Cleber; Direito Penal: parte geral (arts. 1º a 120) – v. 1 – 15 ed. – Rio de Janeiro: Forense; MÉTODO, 2021). Portanto, trata-se de um tipo de pena, prevista de forma cumulativa ou não à outra espécie de pena, como a privativa de liberdade, por exemplo. Ademais, a pena de multa deve ser aplicada em duas etapas, que são: 1) Fixação da quantidade de dias-multa, nos termos do artigo 49 do CP; 2) O valor do dia-multa, levando em conta, principalmente, a situação econômica do réu (art 60, CP). No caso dos autos, o apelante foi condenado à pena de 18 anos, 05 meses e 19 dias de reclusão e ao pagamento de 39 (trinta e nove) dias-multa, no mínimo previsto no §1°, do art. 49, do CP, guardando proporcionalidade com a pena privativa de liberdade aplicada. Ora, a pena de multa foi fixada tomando por base o mínimo legalmente previsto, considerando-se a existência de seis crimes de roubo praticados em continuidade delitiva. Ademais, o Superior Tribunal de Justiça mantém o entendimento de que não é viável a isenção da pena de multa imposta sob o argumento de que os réus não teriam condições econômico-financeiras de efetuar o seu pagamento, uma vez que tal pleito não possui previsão no ordenamento jurídico. Deve-se, ainda, considerar a edição da Súmula 07, aprovada na sessão administrativa ordinária de 16.07.2024, pelo Pleno deste Egrégio Tribunal de Justiça, in verbis: “Súmula 07: Não pode o magistrado, na sentença condenatória, deixar de aplicar a pena de multa cumulativamente cominada, fixada expressamente no preceito secundário, sob o argumento de hipossuficiência do acusado, vez que inexiste previsão legal para tal benefício.” Dessa forma, com base nas razões expendidas, não há possibilidade de isenção/redução da pena de multa imposta ao acusado. No que toca à alegação de hipossuficiência dos réus e suas impossibilidades de arcar com as custas judiciais, tem-se que o benefício da justiça gratuita está previsto na Lei nº 1.060/1950. Os tribunais de todo o Brasil e, em especial, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendem que é suficiente que a parte alegue que está em situação de miserabilidade para que o julgador possa reconhecer o direito da justiça gratuita. Logo, presume-se que não se faz necessário juntar, nos autos, documento capaz de comprovar que a parte não pode arcar com as custas processuais dentro da demanda que tramita em juízo. No entanto, essa presunção é juris tantum, ou seja, admite prova em contrário. Portanto, tendo em vista que a parte alegou a sua condição de hipossuficiência, o recorrente faz jus ao benefício da justiça gratuita, nos termos do art. 99, §4º, do CPC. Todavia, quanto ao pagamento das custas processuais, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgados recentes, entende que a situação de hipossuficiência dos réus não implica em isenção das custas, ficando assim, a exigibilidade do pagamento suspensa por 05 (cinco) anos, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC. Ressalta, ainda, a Corte de Justiça que o momento de verificação da hipossuficiência dos condenados, para fins de suspensão da exigibilidade do pagamento, é na fase de execução, diante da possibilidade de alteração da situação econômica do agente. Nesta esteira de entendimento, traz-se à baila as jurisprudências do Superior Tribunal de Justiça, a seguir colacionada: PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OFENSA REFLEXA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INVIABILIDADE. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO DA DECISÃO AGRAVADA. INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO REGIMENTAL. ERRO GROSSEIRO. INOVAÇÃO RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. TRÁFICO DE DROGAS. PRETENSÃO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE PORTE DE DROGAS PARA CONSUMO PRÓPRIO. PLEITO DE APLICAÇÃO DA MINORANTE DO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/2006. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. DEDICAÇÃO A ATIVIDADES CRIMINOSAS. REVOLVIMENTO DE CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA N. 7/STJ. IMPOSSIBILIDADE. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. CUSTAS PROCESSUAIS. ISENÇÃO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (...) 10. Como é cediço, este Superior Tribunal possui entendimento consolidado no sentido de que "o momento de se aferir a situação do condenado para eventual suspensão da exigibilidade do pagamento das custas processuais é a fase de execução, por tal razão, nos termos do art. 804 do Código de Processo Penal, mesmo que beneficiário da justiça gratuita, o vencido deverá ser condenado nas custas processuais (AgRg no AREsp. 206.581/MG, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 04/10/2016, DJe 19/10/2016)" (AgInt no REsp. 1.569.916/PE, Relator Ministro NEFI CORDEIRO, julgado em 22/3/2018, DJe 3/4/2018). 11. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp n. 2.175.205/CE, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 8/11/2022, DJe de 16/11/2022.) Desse modo, mesmo que o recorrente seja beneficiário da assistência judiciária gratuita, o artigo 804 do Código de Processo Penal estabelece a obrigação de condenação da parte vencida ao pagamento das custas processuais, podendo a exigibilidade do pagamento ser suspensa somente na fase de execução, pelo prazo de cinco anos. A par de tais considerações, embora o réu faça jus ao benefício da justiça gratuita, não há que se falar em isenção das custas nesta fase processual. DISPOSITIVO Em face do exposto, CONHEÇO dos presentes recursos, e, no mérito, NEGO PROVIMENTO aos interpostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL e pelo acusado BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e DOU PROVIMENTO ao apelo apresentado por MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO, para absolvê-lo da prática do crime de roubo majorado (art. 157, §2º, II e §2º-A, I, do CP), cometido contra a vítima Robert Antônio dos Santos Alves, ao tempo que determino a expedição do competente alvará de soltura em seu favor, que deve ser posto, incontinenti, em liberdade, no que toca ao processo 0856034-83.2022.8.18.0140, a menos que esteja preso por outro motivo, mantendo-se os demais termos da sentença condenatória, em dissonância com os pareceres da Procuradoria-Geral de Justiça. Expeça-se o respectivo Alvará de Soltura. Em atenção ao Enunciado nº 24/2022, do Conselho Nacional de Justiça, DETERMINO que o respectivo Alvará de Soltura seja expedido, obrigatoriamente, no Banco Nacional de Medidas Penais e Prisões, sem a necessidade de sua confecção e assinatura no sistema PJE. Restam prejudicados os demais pedidos apresentados no recurso de Marcos Felipe Alves de Macedo, bem como o requerimento ministerial de decretação da prisão preventiva do réu Grigorio Mendes Frazão Junior. É como voto.
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Processo nº 0856034-83.2022.8.18.0140
ID: 261703383
Tribunal: TJPI
Órgão: 1ª Câmara Especializada Criminal
Classe: APELAçãO CRIMINAL
Nº Processo: 0856034-83.2022.8.18.0140
Data de Disponibilização:
28/04/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ 1ª CÂMARA ESPECIALIZADA CRIMINAL APELAÇÕES CRIMINAIS Nº 0856034-83.2022.8.18.0140 Órgão Julgador: 1ª CÂMARA ESPECIALIZADA CRIMINAL Origem: 3ª V…
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ 1ª CÂMARA ESPECIALIZADA CRIMINAL APELAÇÕES CRIMINAIS Nº 0856034-83.2022.8.18.0140 Órgão Julgador: 1ª CÂMARA ESPECIALIZADA CRIMINAL Origem: 3ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE PARNAÍBA/PI 1º Apelante: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL Apelados: BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO 2° Apelante: BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA Defensora Pública: Francisca Hildeth Leal Evangelista Nunes Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL 3° Apelante: MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO Defensora Pública: Francisca Hildeth Leal Evangelista Nunes Apelado: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL Relator: DES. SEBASTIÃO RIBEIRO MARTINS EMENTA APELAÇÕES CRIMINAIS. PROCESSO PENAL. CRIMES DE ROUBO MAJORADO EM CONTINUIDADE DELITIVA. PRELIMINAR MINISTERIAL DE NULIDADE REJEITADA. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS PARA CONDENAÇÃO DE GRIGORIO MENDES FRAZÃO JUNIOR. ABSOLVIÇÃO DE MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO POR AUSÊNCIA DE PROVAS SEGURAS. PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO. CONDENAÇÃO POR ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA INVIÁVEL. MANTIDA A FRAÇÃO DE AUMENTO RELATIVA À CONTINUIDADE DELITIVA. CONCORRÊNCIA DE CAUSAS DE AUMENTO. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO CUMULATIVA. FIXAÇÃO DE VALOR REPARATÓRIO PELOS DANOS MATERIAIS E MORAIS. NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA ESPECÍFICA. RECURSO MINISTERIAL CONHECIDO E DESPROVIDO. RECURSO DE BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA CONHECIDO E DESPROVIDO. RECURSO DE MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO CONHECIDO E PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Apelações criminais interpostas pelo Ministério Público do Estado do Piauí e pelos réus Bruno dos Santos Oliveira e Marcos Felipe Alves de Macedo contra a sentença da 3ª Vara Criminal da Comarca de Teresina-PI. 2. A sentença condenou Bruno dos Santos Oliveira por seis crimes de roubo majorado (art. 157, §2º, II e §2º-A, I, c/c art. 71 do CP) e Marcos Felipe Alves de Macedo por um crime de roubo majorado (art. 157, §2º, II e §2º-A, I, do CP). O réu Grigorio Mendes Frazao Junior foi absolvido de todas as acusações. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 3. As apelações trazem as seguintes questões a serem analisadas: (i) Preliminar suscitada pelo Ministério Público, alegando cerceamento de acusação devido à negativa de realização de perícia nos vídeos juntados aos autos; (ii) Pedido do Ministério Público para condenação de Grigorio Mendes Frazao Junior pelos crimes de roubo majorado; (iii) Pleito ministerial pela condenação dos réus pelo crime de associação criminosa; (iv) Requerimento para afastamento da continuidade delitiva; (v) Pedido de exasperação da pena-base dos réus Bruno dos Santos Oliveira e Marcos Felipe Alves de Macedo; (vi) Fixação de indenizações por danos materiais e morais em favor das vítimas, requerida pelo Ministério Público, e pedido de exclusão da indenização por parte do réu Bruno dos Santos Oliveira; (vii) Pedido de absolvição formulado por Marcos Felipe Alves de Macedo; (viii) Discussão sobre a aplicação de causas de aumento em cascata na terceira fase da dosimetria da pena; (ix) Pedido de redução da pena de multa e suspensão das custas processuais. III. RAZÕES DE DECIDIR 4. Preliminar. A nulidade por cerceamento de acusação não prevalece, pois o pedido formulado não atende aos requisitos do artigo 402 do CPP, uma vez que a perícia não decorreu de circunstâncias ou fatos novos apurados na instrução, mas sim de diligências previamente conduzidas pelo próprio órgão acusador. 5. A condenação de Grigorio Mendes Frazao Junior pelos crimes de roubo majorado não pode prosperar, pois o reconhecimento fotográfico não foi corroborado por provas colhidas sob o contraditório, sendo insuficiente para fundamentar um decreto condenatório. 6. O crime de associação criminosa exige prova da estabilidade e permanência do grupo criminoso, o que não se verifica nos autos. Ausente o animus associativo, mantém-se a absolvição pelo crime do art. 288 do CP. 7. A tese ministerial de afastamento da continuidade delitiva e reconhecimento do concurso formal/material deve ser afastada, pois os crimes foram praticados no mesmo contexto, com modus operandi semelhante e proximidade temporal, preenchendo os requisitos do art. 71 do CP. 8. O pedido de aumento da pena-base dos réus foi rejeitado, pois os vetores do art. 59 do CP foram adequadamente valorados na sentença. 9. Quanto ao pedido de exclusão da condenação por danos materiais, verifica-se que o pleito já constava da denúncia, sendo que a nota fiscal em nome da vítima foi juntada aos autos antes da audiência de instrução. Além disso, a defesa teve oportunidade de se manifestar, em observância ao contraditório e à ampla defesa. Em relação às indenizações adicionais requeridas pelo órgão ministerial, neste apelo, não restou realizada a instrução específica para a apuração do montante devido, com a indicação de elementos e valores que sustentem a indenização por dano moral e material, sendo inviável que o Apelante arque com o valor aleatoriamente determinado pelo órgão ministerial. 10. A absolvição de Marcos Felipe Alves de Macedo deve ser declarada, pois sua condenação se baseia exclusivamente em um reconhecimento fotográfico e posterior videoconferência realizados em condições que comprometem sua fidedignidade, sem outras provas que corroborem sua participação. Aplicação do princípio do in dubio pro reo. 11. Concorrência de causas de aumento O legislador processual deu ao magistrado a faculdade de aplicar apenas uma causa de aumento ou de diminuição, prevalecendo aquela que mais aumente ou mais diminua. Dessa forma, em sendo uma faculdade judicial, nada impede a incidência de todas as causas de aumento ou diminuição presentes no caso concreto. 12. Entretanto, a Corte de Justiça faz a ressalva acerca da necessidade de fundamentação da aplicação cumulativa das causas de aumento, não bastando que sejam apenas enumeradas. In casu, constata-se que o magistrado a quo apresentou justificativa para sua escolha de aplicar as causas de aumento de forma cumulativa, tendo em vista a dinâmica do delito, a utilização de arma de fogo e o concurso de agentes. 13. Pena de multa. A fixação do número de dias-multa deve ser estabelecida com proporcionalidade à pena privativa de liberdade imposta. No caso em apreço, a pena de multa foi estabelecida em 39 (trinta e nove) dias-multa, valor alcançado a partir da pena mínima em abstrato, sendo tal fixação benéfica ao réu. 14. Isenção de custas processuais. Tendo em vista a alegação da sua condição de hipossuficiência, o apelante faz jus ao benefício da justiça gratuita. No entanto, quanto à eventual isenção de custas, a jurisprudência já está pacificada no sentido de que, mesmo sendo o réu beneficiário da assistência judiciária gratuita, deve ser condenado ao pagamento das custas processuais, nos termos do art. 804 do Código de Processo Penal. A comprovação da situação de miserabilidade jurídica do apelante para fins de pagamento das custas é matéria atinente ao juízo da execução. Precedentes. IV. DISPOSITIVO E TESE 15. Recurso ministerial desprovido. Recurso de Marcos Felipe Alves de Macedo provido para absolvê-lo do crime de roubo majorado. Recurso de Bruno dos Santos Oliveira desprovido. Tese de julgamento: “1. O reconhecimento pessoal de acusado deve observar os requisitos do art. 226 do CPP e ser corroborado por outros elementos de prova para embasar uma condenação; 2. A incerteza sobre a autoria delitiva impõe a aplicação do princípio do in dubio pro reo, determinando a absolvição do réu quando não há provas suficientes; 3. A continuidade delitiva deve ser reconhecida quando há identidade de tempo, lugar e modo de execução dos crimes, nos termos do art. 71 do CP; 4. O crime de associação criminosa exige prova de estabilidade e permanência do grupo criminoso, não se confundindo com o mero concurso eventual de agentes”. Dispositivos relevantes citados: CP, arts. 59, 69, 70, 71, 157, §2º, II e §2º-A, I, e 288; CPP, arts. 226, 386, VII. Jurisprudência relevante citada: STJ, HC 598.886/SC, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, j. 27/10/2020; STJ, AREsp 2.408.401/PA, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Quinta Turma, j. 2/4/2024. ACÓRDÃO Acordam os componentes da egrégia 1ª Câmara Especializada Criminal deste Tribunal de Justiça, à unanimidade, em CONHECER dos presentes recursos, e, no mérito, NEGAR PROVIMENTO aos interpostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL e pelo acusado BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e DAR PROVIMENTO ao apelo apresentado por MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO, para absolvê-lo da prática do crime de roubo majorado (art. 157, §2º, II e §2º-A, I, do CP), cometido contra a vítima Robert Antônio dos Santos Alves, ao tempo que determinam a expedição do competente alvará de soltura em seu favor, que deve ser posto, incontinenti, em liberdade, no que toca ao processo 0856034-83.2022.8.18.0140, a menos que esteja preso por outro motivo, mantendo-se os demais termos da sentença condenatória, em dissonância com os pareceres da Procuradoria-Geral de Justiça, na forma do voto do relator. RELATÓRIO O EXMO. SR. DES. SEBASTIÃO RIBEIRO MARTINS (Relator): Trata-se de APELAÇÕES CRIMINAIS interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PIAUÍ e pelos acusados BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO contra a sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Criminal da Comarca de Teresina-PI. A denúncia apresentada pelo Ministério Público do Estado do Piauí narra que: “(...) Consta nos autos que no dia 14/11/2022, entre 13 h 4 0min e 14h06min, nas proximidades do bairro Cabral, nesta capital, BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA, GRIGORIO MEDES FRAZÃO JUNIOR e LUIS FELIPE ARAUJO DE SOUSA CRUZ subtraíram para si coisa alheia móvel, mediante violência ou grave ameaça, com emprego de arma de fogo, por 03 (três) vezes. Depois, no dia 16/11/2022, às 00h00min, na Rua Capitão Vanderley, nº 2657, bairro Piçarreira, nesta capital BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA, GRIGORIO MEDES FRAZÃO JUNIOR, MARCOS FELIPE ALVES DE MACÊDO e mais um indivíduo subtraíram para si coisa alheia móvel, mediante violência ou grave ameaça, com emprego de arma de fogo 1 . Todos, associaram-se para o fim específico de cometer crimes. No dia 14 de novembro de 2022, às 13h40min, as vítimas LUIS GONZAGA, LUDMILA BARBOSA e DIEGO RODRIGO chegavam em casa, localizada na Rua do Cabral, nº 384, bairro Cabral, nesta capital, com o veículo RENAULT/LOGAN cor marrom, de placa PIE9616, de propriedade de Luis Gonzaga, quando DIEGO (genro de Luis) saiu do carro para abrir o portão. Ocorre que, antes de trancá-lo foi surpreendido por BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA, que chegou a pé com uma arma em punho apontada para a cabeça da vítima rendendo-a. BRUNO DOS SANTOS (descrito pelas vítimas como magro um pouco mais forte, pardo mais escuro, cabelo preto vestindo camisa azul, bermuda jeans e boné vermelho) foi reconhecido pelas vítimas (fl. 12, 17 do ID 39456271 e ID 42140649). BRUNO DO SANTOS estava acompanhado de outros dois indivíduos, quais sejam: LUIS FELIPE ARAUJO DE SOUSA CRUZ, reconhecido pela vítima LUIS GONZAGA (à fl. 21, ID39456271) como quem o abordou e pegou a chave do veículo RENAULT/LOGAN (descrito pelas vítimas como negro, com bigode fino e magro, vestindo camiseta, bermuda e boné); e outro indivíduo descrito pelas vítimas como pardo, magrinho, com bigode ralo e cabelo preto, que vestia camisa cinza e bermuda jeans (mesmas características do denunciado GRIGORIO MEDES FRAZÃO, identificado pelas demais vítimas). Conforme consta nos autos, no primeiro delito os denunciados subtraíram a mochila e carteira de DIEGO RODRIGO e o veículo RENAULT/LOGAN cor marrom, de placa PIE9616, no qual empreenderam fuga em direção à Ponte Estaiada. No mesmo dia, às 13h52min, a vítima FRANCISCO SANTOS SOUSA chegava em seu trabalho, próximo à Praça do Marquês, no bairro Mafuá, nesta capital, quando foi abordada por indivíduos em um veículo RENAULT/LOGAN cor marrom. Um dos indivíduo desceu para lhe abordar, enquanto pelo menos mais um permaneceu no veículo dando cobertura. A vítima descreveu o sujeito que o abordou como pardo mais escuro, magro um pouco mais forte, que puxava da perna e vestia camisa bermuda e boné vermelho, mesma roupa utilizada por BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA no primeiro roubo, ocorrido cerca de 12 minutos antes. A vítima ainda reconheceu GRIGORIO MEDES FRAZÃO JUNIOR como o indivíduo que ficou no veículo dando cobertura (descrevendo-o como pardo mais claro e magro). Conforme consta nos autos, no segundo delito os denunciados subtraíram a mochila, o celular modelo MOTO G6, e a chave da moto da vítima. Em seguida, empreenderam fuga no veículo RENAULT/LOGAN cor marrom. No mesmo dia, às 14h06min, a vítima MARCOS ANTÔNIO DE ALENCAR chegava em casa, na Rua Jonatas Batista, nº 812, bairro Mafuá, nesta capital, com sua moto HONDA/POP100 cor azul, placa PIB1633. E enquanto seu filho, MARCIO KELSON PEREIRA DE ALENCAR, abria o portão ambos avistaram a chegada do veículo RENAULT/LOGAN cor marrom, placa PIE9616, do qual desceram dois indivíduos armados e o motorista permaneceu no veículo. A vítima reconheceu (à fl.32, ID 39456271 e ID 42140649) BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA como o indivíduo que fugiu com sua moto (descrevendo-o como moreno escuro, magro e andava puxando a perna). Enquanto, BRUNO empreendia fuga com a moto da vítima o outro indivíduo regressou ao veículo RENAULT/LOGAN e empreendeu fuga junto ao motorista, em direção ao Mercado do Mafuá. É relevante expor que o filho da vítima, MARCIO KELSON, também reconheceu (à fl.34, ID 39456271) BRUNO DOS SANTOS (descrevendo-o como mago mais forte, moreno mais escuro, puxando da perna, vestindo camisa escura, bermuda, boné vermelho e máscara). Ainda, descreveu o outro indivíduo que desceu do veículo como magro, pardo, de cabelo preto, vestindo camisa cinza e bermuda jeans; mesmas características do indivíduo GRIGORIO MEDES FRAZÃO que participou os dois primeiros delitos, em um intervalo de tempo de aproximadamente 26 minutos. Já no dia 16 de novembro de 2022, às 00h00min, a vítima ROBERT ANTONIO DOS SANTOS ALVES, estava trabalhando, realizando entregas, quando parou sua motocicleta na Rua Capitão Vanderley, nº 2657, bairro Piçarreira, nesta capital. Conforme consta nos autos, a vítima narra a aproximação de um veículo RENAULT/LOGAN cor marrom, do qual desceram 4 indivíduos, dos quais ele conseguiu visualizar 3. A vítima reconheceu GRIGORIO MEDES FRAZÃO JUNIOR (à fl. 51, ID 39456271) como o indivíduo que saiu do banco traseiro do veículo e tomou sua moto; BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA (à fl. 47, ID 39456271) como o condutor do veículo RENAULT/LOGAN que desceu do veículo e lhe deu uma coronhada após tomarem sua moto; e MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO (à fl. 49, ID 39456271)como o indivíduo que derrubou a vítima da moto e disse que lhe daria um tiro, caso continuasse lhe olhando. Conforme consta nos autos, no quarto delito os denunciados subtraíram a moto (HONDA/POP 110i cor vermelha, placa RSK9H83), a bolsa térmica de realizar entregas, a maquineta de cartão, a carteira da vítima com a quantia de R$ 170,00 (cento e setenta reais) e o aparelho celular da marca Motorola, modelo MOTO E. Em seguida, empreenderam fuga no veículo RENAULT/LOGAN cor marrom e na moto da vítima. No mesmo dia, o veículo RENAULT/LOGAN cor marrom, de placa PIE9616, de propriedade de Luis Gonzaga, foi encontrado abandonado em uma rua próximo à Universidade Federal do Piauí, nesta capital”. O réu Luis Felipe Araújo de Sousa Cruz, igualmente denunciado pelos mesmos crimes, não foi localizado para fins de citação, razão pela qual o processo foi cindido em relação a ele, prosseguindo apenas em relação aos demais acusados. Concluída a instrução processual, o MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Criminal da Comarca de Teresina-PI proferiu sentença nos seguintes termos: BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA: condenado pelo crime de roubo majorado, em continuidade delitiva (art. 157, §2º, II e §2º-A, I, c/c art. 71 do CP, por seis vezes), praticado contra as vítimas Luis Gonzaga Ferreira Pereira, Ludmila Barbosa Ferreira, Diego Rodrigo Caldas Sena, Francisco Santos Sousa, Marcos Antônio de Alencar e Robert Antônio dos Santos Alves, com pena fixada em 18 anos, 05 meses e 19 dias de reclusão e pagamento de 39 dias-multa. Absolvido do crime de associação criminosa (art. 288, do CP). MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO: condenado pelo crime de roubo majorado (art. 157, §2º, II e §2º-A, I, do CP), praticado contra a vítima Robert Antônio dos Santos Alves com pena fixada em 10 anos, 06 meses e 20 dias de reclusão e pagamento de 23 dias-multa. Absolvido do crime de associação criminosa (art. 288, do CP). GRIGORIO MENDES FRAZÃO JUNIOR: absolvido de todas as imputações. O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, em suas razões recursais, requer, preliminarmente, a decretação da nulidade da sentença proferida por cerceamento de acusação, com o consequente retorno dos autos para realização de perícia nas mídias acostadas aos autos nos ID’s 53467810; 53467816; 53467821; 53548890 e 53548889. No mérito, pleiteia: a) a condenação dos réus pelo crime de Associação Criminosa (art. 288 do CP); b) a condenação de Grigorio Mendes Frazão Junior quanto aos delitos tipificados nos artigos 157, § 2º, II e §2º-A, I, do CP, por duas vezes (vítimas LUIS GONZAGA e DIEGO), e no art. 157, § 2º, II e §2º-A, I, do CP, c/c art. 14, II, do CP, uma vez (vítima LUDMILA), estes em concurso formal (art. 70 do CP), bem como pelos crimes de roubo (157, § 2º, II e §2º-A, inciso I, do CP, por três vezes), contra as vítimas FRANCISCO SANTOS, MARCOS ANTONIO e ROBERT, todos em concurso material; c) para afastar a continuidade delitiva (art. 71 do CP) e reconhecer o concurso formal (art. 70 do CP) de crimes quanto ao delito tipificado no art. 157, § 2º, II e §2º-A, I, do CP, por duas vezes (vítimas LUIS GONZAGA e DIEGO), e no art. 157, § 2º, II e §2º-A, I, do CP, c/c art. 14, II, do CP, uma vez (vítima LUDMILA) e concurso material (art. 69 do CP) de crimes entre estes e os dispostos no art. 288, do CP, e art. 157, § 2º, II e §2º-A, inciso I, do CP, por três vezes (vítimas FRANCISCO SANTOS, MARCOS ANTONIO e ROBERT), para os recorridos BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e GRIGORIO MENDES FRAZAO JUNIOR; d) a valoração negativa dos vetores da personaliade e das consequências do crime; e) a fixação da quantia de R$ 949,00 (novecentos e quarenta e nove reais), à vítima FRANCISCO SANTOS SOUSA; o valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) à vítima MARCOS ANTÔNIO DE ALENCAR, a serem pagos pelos recorridos BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e GRIGORIO MENDES FRAZAO JUNIOR e o valor de R$ 10.543,10 (dez mil, quinhentos e quarenta e três reais e dez centavos) à vítima ROBERT ANTÔNIO DOS SANTOS ALVES, a ser pago pelos apelados BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA, GRIGORIO MENDES FRAZAO JUNIOR e MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO, para fins de reparação dos danos materiais sofridos em razão dos crimes; f) a fixação da quantia de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a cada uma das vítimas, LUIS GONZAGA PEREIRA FERREIRA, DIEGO RODRIGO CALDAS SENA, FRANCISCO SANTOS SOUSA, MARCOS ANTÔNIO DE ALENCAR e ROBERT ANTONIO DOS SANTOS ALVES, a título de reparação por danos morais, nos termos do art. 91, I, do CP c/c art. 387, IV, do CPP; g) a decretação da prisão preventiva do réu Grigorio Mendes Frazao Junior, com a negativa do direito de recorrer em liberdade. Em contrarrazões, os réus requerem que seja negado provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público Estadual. O apelante Bruno dos Santos de Oliveira, em suas razões recursais, suscita as seguintes teses basilares: a) a aplicação de apenas uma causa de aumento da parte especial, devendo incidir na terceira fase somente a majorante do uso de arma de fogo (art. 157, § 2-A, I, do CP) e o concurso de agentes ser analisado na 1ª fase da dosimetria, por previsão expressa no artigo 68, parágrafo único, do CP; b) a reforma da sentença no que tange à condenação do apelante ao pagamento de danos materiais, por ausência de instrução probatória específica; c) a redução da pena de multa e a suspensão das custas processuais. Já o réu Marcos Felipe Alves de Macedo, em seu apelo defensivo, requereu: a) a absolvição quanto ao crime roubo majorado (Art. 157, §2º, inc. II, §2º-A, inc. I, do Código Penal) tendo em vista a insuficiência de provas para a condenação, com fulcro no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal; b) a aplicação da atenuante da menoridade relativa; c) a aplicação de apenas uma causa de aumento da parte especial, devendo incidir na terceira fase somente a majorante do uso de arma de fogo (art. 157, § 2-A, I, do CP) e o concurso de agentes ser analisado na 1ª fase da dosimetria, por previsão expressa no artigo 68, parágrafo único, do CP; d) a redução da pena de multa e a suspensão das custas processuais. O Ministério Público, em contrarrazões, manifestou-se pelo improvimento do recurso de BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e pelo parcial provimento do recurso de MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO, apenas para reconhecer a atenuante da menoridade relativa. A Procuradoria-Geral de Justiça, em fundamentados pareceres, manifestou-se pelo improvimento do recurso manejado por Bruno dos Santos Oliveira; pelo parcial provimento da apelação de Marcos Felipe Alves de Macedo, visando apenas a incidência da atenuante da menoridade relativa; e pelo parcial provimento do recurso ministerial, para modificar a sentença nos termos do pedido formulado, com exceção da valoração negativa dos vetores na primeira fase de individualização da pena. Tratando-se de crimes punidos com reclusão, submeti os autos à revisão, nos termos do artigo 356, I, do RITJ-PI. Inclua-se o processo em pauta virtual. É o relatório. VOTO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE Presentes os pressupostos gerais de admissibilidade recursal objetivos (previsão legal, forma prescrita e tempestividade) e subjetivos (legitimidade, interesse e possibilidade jurídica), CONHEÇO dos recursos interpostos. PRELIMINARES Do cerceamento de acusação. Inocorrência Preliminarmente, o órgão ministerial pugna pela decretação da nulidade da sentença proferida por cerceamento de acusação, com o consequente retorno dos autos para a realização de perícia nas mídias acostadas aos autos nos ID’s 53467810; 53467816; 53467821; 53548890 e 53548889. Aduz que “(...) requereu, nos autos, a juntada de vídeos e imagens de câmeras de segurança que registraram dois dos delitos descritos na denúncia (ID 53467810; 53467816; 53467821; 53548890 e 53548889), nas respectivas datas de 28/02/2024 e 29/02/2024, a fim de que tais provas fossem submetidas ao contraditório. Posteriormente, finalizada a instrução, requereu este órgão ministerial, em fase de diligências, a realização de perícia nas imagens juntadas, o que foi indeferido pelo MM Juiz, consoante disposto em ata de audiência registrada sob ID Num. 53615667”. Sobre os fatos, ao negar o pleito formulado, consignou o magistrado: “O Ministério Público suscitou como preliminar de mérito o cerceamento de acusação, em decorrência do indeferimento de perícia nas imagens juntadas aos autos (ID 53467810, ID 53467816, ID 53467821, ID 53548890 e ID 53548875). Analisando detidamente os autos, denota-se que as mídias constantes no ID 53467810, ID 53467816 e ID 53467821, foram juntadas em data anterior à audiência de instrução e julgamento. Já as mídias de ID 53548890 e ID 53548875 juntadas no dia da audiência, versam sobre a mesma cena do roubo constante na mídia de ID 53467810 já anexada anteriormente no feito. Logo, a alegada necessidade de perícia não se originou de circunstâncias ou fatos apurados durante a instrução do processo, mas de diligências anteriores realizadas pelo próprio Ministério Público Estadual. De acordo com o 402 do Código de Processo Penal, produzidas as provas, ao final da audiência, o Ministério Público, o querelante e o assistente e, a seguir, o acusado, poderão requerer diligências cuja necessidade se origine de circunstâncias ou fatos apurados na instrução”. Sem razão o órgão ministerial. O pedido formulado não atende aos requisitos do artigo 402 do CPP, pois a perícia não decorreu de circunstâncias ou fatos novos apurados na instrução, mas sim de diligências previamente conduzidas pelo próprio órgão acusador. Conforme destacado, as mídias acostadas nos ID’s 53467810, 53467816 e 53467821, foram juntadas em data anterior à audiência de instrução e julgamento. Já as mídias constantes nos ID’s 53548890 e 53548875, embora juntadas na data da audiência, apenas reprisam as cenas constantes no ID 53467810. Assim, o Ministério Público teve oportunidade de requerer a perícia desde a fase do inquérito, mas não a fez. A propósito, corroborando o entendimento acima demonstrado: PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO PENAL. INDICAÇÃO DE ASSISTENTE TÉCNICO. ART. 402 DO CPP. PRECLUSÃO. 1. O acusado, quando do oferecimento da defesa prévia, já tinha ciência de que Nota Técnica, produzida na fase pré-processual, havia sido utilizada na denúncia e de que os subscritores do referido documento haviam sido arrolados como testemunhas de acusação pelo MPF, razão pela qual caberia à defesa requerer a admissão de eventual assistente técnico no momento da apresentação da defesa prévia. 2. As diligências previstas no art. 402 do CPP somente são admissíveis quando sua necessidade decorre de circunstâncias ou fatos apurados durante a instrução. Não se destinam a reabrir a fase de instrução probatória. 3. Agravo regimental não provido. (AgRg na APn n. 1.076/DF, relatora Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, julgado em 18/12/2024, DJEN de 9/1/2025.) PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. DILIGÊNCIAS NA FASE DO ART. 402 DO CPP. NECESSIDADE DE QUE SE ORIGINEM DE CIRCUNSTÂNCIAS OU FATOS APURADOS NA INSTRUÇÃO. PEDIDO DE PERÍCIA E OUTRAS DILIGÊNCIAS SEM RELAÇÃO COM A INSTRUÇÃO. REPETIÇÃO DE PEDIDO JÁ INDEFERIDO PELA CORTE ESPECIAL. INDEVIDA TENTATIVA DE PROCRASTINAÇÃO DA INSTRUÇÃO. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO, DANDO POR ENCERRADA A INSTRUÇÃO E INICIANDO PRAZO PARA ALEGAÇÕES FINAIS. 1 - As diligências requeridas na fase do art. 402 do CPP devem guardar relação com eventual necessidade que tenha surgido de circunstâncias ou fatos apurados na instrução. 2 - Os áudios que a defesa pretende ver periciados fazem parte deste autos há mais de uma década. As diligências solicitadas não têm relação com necessidades surgidas durante a instrução, sendo mera repetição de pedidos feitos em outras ocasiões e já expressamente negados. 3 - Agravo a que se nega provimento, dando por encerrada a instrução e iniciando prazo para alegações finais. (AgRg nos EDcl na PET na APn n. 623/DF, relator Ministro Francisco Falcão, Corte Especial, julgado em 20/9/2023, DJe de 29/9/2023.) Assim, rejeito a preliminar suscitada. MÉRITO O MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL, em suas razões recursais, pleiteia: a) a condenação dos réus pelo crime de Associação Criminosa (art. 288 do CP); b) a condenação de Grigorio Mendes Frazao Junior quanto aos delitos tipificados nos artigos 157, § 2º, II e §2º-A, I, do CP, por duas vezes (vítimas LUIS GONZAGA e DIEGO), e no art. 157, § 2º, II e §2º-A, I, do CP, c/c art. 14, II, do CP, uma vez (vítima LUDMILA), estes em concurso formal (art. 70 do CP), bem como pelos crimes de roubo (157, § 2º, II e §2º-A, inciso I, do CP, por três vezes), contra as vítimas FRANCISCO SANTOS, MARCOS ANTONIO e ROBERT, todos em concurso material; c) para afastar a continuidade delitiva (art. 71 do CP) e reconhecer o concurso formal (art. 70 do CP) de crimes quanto ao delito tipificado no art. 157, § 2º, II e §2º-A, I, do CP, por duas vezes (vítimas LUIS GONZAGA e DIEGO), e no art. 157, § 2º, II e §2º-A, I, do CP, c/c art. 14, II, do CP, uma vez (vítima LUDMILA) e concurso material (art. 69, do CP) de crimes entre estes e os dispostos no art. 288, do CP, e art. 157, § 2º, II e §2º-A, inciso I, do CP, por três vezes (vítimas FRANCISCO SANTOS, MARCOS ANTONIO e ROBERT), para os recorridos BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e GRIGORIO MENDES FRAZAO JUNIOR; d) a valoração negativa dos vetores da personaliadde e consequências do crime; e) a fixação da quantia de R$ 949,00 (novecentos e quarenta e nove reais), à vítima FRANCISCO SANTOS SOUSA; o valor de R$ 8.000,00 (oito mil reais) à vítima MARCOS ANTÔNIO DE ALENCAR, a serem pagos pelos recorridos BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e GRIGORIO MENDES FRAZAO JUNIOR e o valor de R$ 10.543,10 (dez mil, quinhentos e quarenta e três reais e dez centavos) à vítima ROBERT ANTÔNIO DOS SANTOS ALVES, a ser pago pelos apelados BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA, GRIGORIO MENDES FRAZAO JUNIOR e MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO, para fins de reparação dos danos materiais sofridos em razão dos crimes; f) a fixação da quantia de R$ 5.0000,00 (cinco mil reais) a cada uma das vítimas, LUIS GONZAGA PEREIRA FERREIRA, DIEGO RODRIGO CALDAS SENA, FRANCISCO SANTOS SOUSA, MARCOS ANTÔNIO DE ALENCAR e ROBERT ANTONIO DOS SANTOS ALVES, a título de reparação por danos morais, nos termos do art. 91, I, do CP c/c art. 387, IV, do CPP; g) a decretação da prisão preventiva do réu Grigorio Mendes Frazao Junior, com a negativa do direito de recorrer em liberdade. O apelante Bruno dos Santos de Oliveira, em suas razões recursais, suscita as seguintes teses basilares: a) a aplicação de apenas uma causa de aumento da parte especial, devendo incidir na terceira fase somente a majorante do uso de arma de fogo (art. 157, § 2-A, I, do CP) e o concurso de agentes ser analisado na 1ª fase da dosimetria, por previsão expressa no artigo 68, parágrafo único, do CP; b) a reforma da sentença no que tange à condenação do apelante ao pagamento de danos materiais, por ausência de instrução probatória específica; c) a redução da pena de multa e a suspensão das custas processuais. Já o réu Marcos Felipe Alves de Macedo, em seu apelo defensivo, requereu: a) a absolvição quanto ao crime roubo majorado (Art. 157, §2º, inc. II, §2º-A, inc. I do Código Penal) tendo em vista a insuficiência de provas para a condenação, com fulcro no art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal; b) a aplicação da atenuante da menoridade relativa; c) a aplicação de apenas uma causa de aumento da parte especial, devendo incidir na terceira fase somente a majorante do uso de arma de fogo (art. 157, § 2-A, I, do CP) e o concurso de agentes ser analisado na 1ª fase da dosimetria, por previsão expressa no artigo 68, parágrafo único, do CP; d) a redução da pena de multa e a suspensão das custas processuais. Passo à análise das teses formuladas. I) Da materialidade e autoria dos crimes de roubo narrados na exordial. Análise dos pedidos de condenação e absolvição formulados No caso dos autos, foram narrados quatro eventos criminosos distintos, todos envolvendo roubo majorado com emprego de arma de fogo e concurso de agentes, conforme o disposto no artigo 157, §2º, inciso II, e §2º-A, inciso I, do Código Penal. O primeiro evento delituoso ocorreu em 14 de novembro de 2022, às 13h40min, tendo como vítimas Luis Gonzaga Ferreira Pereira, Ludmila Barbosa Ferreira e Diego Rodrigo Caldas Sena. Conforme relatado, os agentes abordaram as vítimas mediante grave ameaça, portando arma de fogo, e subtraíram um veículo Renault Logan, placa PIE9616, de propriedade de Luis Gonzaga, além de mochilas, carteira e objetos eletrônicos das vítimas. Poucos minutos depois, por volta das 13h52min do mesmo dia, ocorreu o segundo roubo, vitimando Francisco Santos Sousa, que teve subtraídos sua mochila, seu telefone celular e a chave de sua motocicleta. Para a prática delitiva, os infratores se utilizaram do Renault Logan roubado na ocasião anterior. Já às 14h06min do mesmo dia, deu-se o terceiro evento criminoso, no qual a vítima Marcos Antônio de Alencar teve subtraída sua motocicleta Honda POP 100 azul, placa PIB1633, sendo a ação igualmente perpetrada pelos agentes que utilizavam o veículo Renault Logan. O quarto e último episódio ocorreu na data de 16 de novembro de 2022, por volta das 00h00min, tendo como vítima Robert Antônio dos Santos Alves, que teve subtraída sua motocicleta Honda POP 110i vermelha, placa RSK9H83, além de outros pertences pessoais. Encerrada a instrução processual, o magistrado proferiu sentença condenatória, reconhecendo a participação de Bruno dos Santos de Oliveira em todos os delitos mencionados, nos termos do art. 157, § 2º, inciso II, e § 2º-A, inciso I, c/c art. 71 (seis vezes), ambos do Código Penal. O réu Marcos Felipe Alves de Macedo foi condenado exclusivamente pelo quarto roubo, com fundamento no art. 157, § 2º, inciso II, e § 2º-A, inciso I, do Código Penal. Por sua vez, Grigorio Mendes Frazao Junior foi absolvido de todas as acusações. O Ministério Público interpôs recurso, pleiteando a condenação de todos os réus pelo crime de associação criminosa, previsto no art. 288 do Código Penal, bem como a condenação de Grigorio Mendes Frazao Junior por todos os quatro roubos narrados. Por sua vez, Marcos Felipe Alves de Macedo, em sede de apelação, requereu a sua absolvição do crime de roubo majorado, sob o argumento de insuficiência de provas, com fundamento no artigo 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. Passo à análise das provas colhidas. Em relação ao primeiro evento criminoso, as vítimas Luis Gonzaga Ferreira Pereira (63 anos), Diego Rodrigo Caldas Sena, Ludmila Barbosa Ferreira, reconheceram apenas o acusado Bruno dos Santos tanto por fotografia (reconhecimento indireto) quanto por videoconferência. O ofendido Luis Gonzaga Ferreira Pereira, relatou em juízo que, no dia 14 de novembro de 2022, encontrava-se em seu veículo Renault Logan, acompanhado de sua filha, Ludmila Barbosa Ferreira, e de seu genro, Diego Rodrigo Caldas Sena, dirigindo-se à sua residência. Ao chegarem ao local, Diego Rodrigo desceu do automóvel para abrir o portão, enquanto o depoente ingressou com o veículo na garagem. Nesse momento, foi surpreendido por três indivíduos, sendo que um deles apontou uma arma de fogo para sua cabeça, subtraindo seu veículo, sua mochila e a mochila de seu genro, que continha computadores, um HD externo e um cabo de alimentação. Destaca-se aqui, apenas por apego jurídico, as flagrantes contradições no depoimento da vítima Luis Gonzaga Ferreira Pereira quando indagado em juízo acerca dos reconhecimentos efetuados. Embora tenha reconhecido Bruno dos Santos Oliveira no reconhecimento realizado por videoconferência (em junho de 2023), ao realizar primeiro o reconhecimento por fotografia (em dezembro de 2022) indicou apenas o corréu Luis Felipe Araujo De Sousa Cruz como um dos supostos autores do fato. Entretanto, em juízo, disse que apenas teria certeza da autoria quanto ao réu Bruno, em razão de um sinal perto do olho e pela deficiência na perna. As vítimas Diego Rodrigo Caldas Sena e Ludmila Barbosa Ferreira reconheceram o réu Bruno dos Santos Oliveira a partir do procedimento do art. 226 do CPP, tanto por fotografia quanto pessoalmente. O Ministério Público imputa tal fato a Bruno dos Santos Oliveira, Luiz Felipe Araújo de Sousa Cruz e Grigorio Mendes Frazao Junior. Entretanto, as vítimas deste fato não reconheceram o réu Grigorio como um dos autores, e o acusado também negou sua participação. Em relação ao segundo evento delitivo, consta dos autos apenas o reconhecimento fotográfico (reconhecimento indireto) que a vítima Francisco Santos Sousa fez em relação aos acusados Bruno dos Santos e Grigório Mendes Frazão. Na audiência de instrução, a vítima declarou que não fez o reconhecimento pessoal. Conforme consignado na sentença, após encerrada a instrução processual, o órgão ministerial requereu ao Delegado de Polícia a realização de reconhecimento pessoal em face do réu Grigório Mendes, pleito este que já havia sido negado pela autoridade judiciária por afronta ao sistema acusatório e aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Isso porque, desde a apresentação da exordial acusatória, o órgão ministerial tinha conhecimento de que não havia reconhecimento pessoal em face do acusado Grigorio Mendes Frazão Júnior, não fazendo sentido, após a instrução, solicitar novas diligências em relação a fatos preexistentes. Contudo, tais diligências foram acostadas aos autos pelo Delegado, após a audiência de instrução, consignando corretamente o magistrado que tais elementos de prova são imprestáveis. Consta da sentença: “(...) Finalizada a instrução, foi requerido a título de diligência pelo MP, a realização de perícia na mídia de ID 53467380, e que seja oficiado o Delegado de Polícia para proceder com o reconhecimento pessoal dos réus Grigório Mendes e Bruno dos Santos pela vítima Francisco Santos Sousa, dos réus Gregório Mendes e Marcos Felipe pelas vítimas Ludmila Barbosa Ferreira e Diego Rodrigo Caldas Sena, e dos acusados Grigório Mendes e Marcos Felipe pela testemunha Márcio Kelson Pereira de Alencar. (...) As diligências foram indeferidas por este juízo, com fundamento nos artigos 47 e 402 do CPP, e aberto vistas às partes para apresentarem suas respectivas alegações finais escritas.(...) Em 07/04/2024 (ID 53897760 e ID 53897764), foram juntados autos de reconhecimento dos acusados realizados em 06/03/2024, mesmo este juízo tendo indeferido tal diligência que havia sido requerida pelo MP ao final da instrução, com fulcro no art. 47 e 402 do CPP. Logo, uma vez indeferida a diligência juntada de forma intempestiva a pedido do Parquet, os referidos termos de reconhecimento não podem ser levados em consideração, em razão do instituto da preclusão, bem como em respeito aos princípios do devido processo legal e do contraditório”. Destaca-se que a participação de Grigorio em todos os crimes narrados na denúncia, na ótica ministerial, resulta da convergência do suposto reconhecimento por fotografia feito pela vítima do segundo evento, e as roupas utilizadas pelo réu, conforme se observa nas mídias das câmaras de segurança acostadas nos autos. Acontece, que, ainda que considerássemos o reconhecimento por videoconferência feito pela vítima do segundo evento criminoso (acostado aos autos após a instrução), não há outras provas produzidas sob o crivo do contraditório que sustentam a participação do réu Grigório em qualquer das dinâmicas delitivas. Embora se possa deduzir que a pessoa utilizava as mesmas vestimentas no primeiro e no segundo evento criminoso, não há como assegurar que se trata do réu Grigorio Mendes Frazão Júnior. Em relação ao terceiro evento criminoso, que teve como vítima Marcos Antônio de Alencar, os criminosos se valeram do Renault Logan roubado no primeiro crime para executar a ação delitiva, subtraindo uma motocicleta Honda POP 100 azul, placa PIB1633. A vítima Marcos Antônio de Alencar, de 64 anos, relatou em juízo que, no momento do crime, encontrava-se em frente à sua residência, abrindo o portão, quando um veículo Renault Logan de cor marrom parou nas proximidades. Em seguida, foi abordado por dois indivíduos, um dos quais portava uma arma de fogo, sendo subtraída sua motocicleta. Apesar de ter sido rendido por dois agentes, a vítima conseguiu reconhecer apenas um dos infratores por videoconferência, a pessoa do acusado Bruno dos Santos Oliveira. Acrescentou que, no momento do crime, o réu utilizava um boné vermelho, máscara preta, bermuda jeans e apresentava uma aparente deficiência em uma das pernas. O filho da vítima, Márcio Kelson Pereira de Alencar, corroborou a narrativa de seu pai em juízo e procedeu ao reconhecimento indireto do réu Bruno dos Santos Oliveira. Novamente, o órgão ministerial pugna pela condenação de Grigorio Mendes Frazão apenas por inferência, em razão das características físicas narradas pelas vítimas, sendo que elas mesmas não reconheceram o acusado, seja diretamente ou por meio de fotografia. O quarto evento criminoso, ocorrido no dia 16.11.2022, próximo às 00:00h, foi praticado contra a vítima Robert Antônio dos Santos Alves. Em síntese, a vítima relatou que estava realizando entregas quando parou sua motocicleta para atender uma ligação. No momento em que retomava o percurso, foi surpreendido por quatro infratores armados, que desceram de um veículo Renault Logan marrom e subtraíram sua moto, que nunca foi recuperada. Que a rua tinha iluminação, mas estava fraca. Falou que um dos agentes tinha deficiência na perna e o outro tatuagem no braço. Que o reconhecimento na delegacia “se deu por foto e vídeo, pois viu vídeo deles assaltando”, em redes sociais. Ressalta-se que, durante a fase investigativa, a vítima Robert Antônio reconheceu, por fotografias, os acusados Bruno dos Santos Oliveira, Marcos Felipe Alves de Macedo e Grigório Mendes Frazão Júnior. No entanto, ao ser realizado o reconhecimento pessoal por videoconferência, identificou apenas Bruno dos Santos Oliveira e Marcos Felipe Alves de Macedo (ID 20430454). Em audiência, ao rever o reconhecimento fotográfico assinado por ele, não se recordava, naquele momento, qual deles era o acusado Grigório Mendes, por ele apontado na época. Destaca-se que foi realizado o ato de reconhecimento pessoal por videoconferência do réu Grigório Mendes, entretanto a vítima não o identificou como um dos autores do fato. Outro ponto a se destacar é que a vítima, na audiência, relatou que procedeu ao reconhecimento de Bruno dos Santos e Marcos Felipe Alves, após ter visto vídeos nas redes sociais, em que identificou os acusados. Outro fator preocupante do reconhecimento feito pela vítima do quarto fato criminoso (Robert Antônio) é que, ao ser indagada em juízo porque teria reconhecido Grigório por foto e não teria o reconhecido por videoconferência, respondeu que é “porque por foto é uma pessoa diferente, por videochamada é totalmente outra”. Ao final, se contradiz quando concluiu que era mais fácil reconhecer um suspeito por videoconferência. Ou seja, ao fazer o reconhecimento pessoal dos investigados, a vítima não reconheceu Grigório Mendes Frazão Júnior, antes identificado por ela no reconhecimento fotográfico como o suposto autor. Por certo, tal contradição mostra a fragilidade das suas memórias e a necessária ponderação dos atos de reconhecimento por ele realizados enquanto meio de prova. O acusado Bruno dos Santos Oliveira confessou a autoria dos delitos que lhe foram imputados. Marcos Felipe Alves de Macedo nega a sua participação desde a fase inquisitorial, embora tenha sido reconhecido pela vítima Robert Antônio. Grigório Mendes Frazão Júnior também negou a autoria delitiva. In casu, a materialidade delitiva dos crimes está devidamente demonstrada pelo através do Relatório Final do Inquérito Policial nº 15.442/2022; pelo boletim de ocorrência alusivo aos fatos (ID 35237628 - págs. 03/08); pelo termo de declaração das vítimas (ID 35237628 - págs. 09/10; 14/15; 19/20; 27; 28; 41 ); pelos termos de reconhecimento (ID 35237628 -pág. 12, 17, 21, 31, 33; 46; 48; 50; ID 42140649; ID 42140675), além dos depoimentos prestados em juízo. No que tange a autoria, não resta dúvidas da participação de Bruno dos Santos Oliveira nas empreitadas criminosas. O órgão ministerial busca a condenação de Grigorio Mendes Frazão Junior pelos quatro eventos de roubo, sob o argumento de que há elementos suficientes para afirmar sua participação nos delitos. Todavia, conforme exposto, verifica-se que não há provas seguras e inequívocas que sustentem tal imputação. No primeiro evento criminoso, as vítimas não reconheceram o réu Grigorio Mendes Frazão Junior como um dos autores do delito. No segundo evento, seu suposto envolvimento se baseia apenas em um reconhecimento fotográfico não corroborado por outros meios de prova. No terceiro evento, não houve qualquer reconhecimento direto ou indireto de sua pessoa. No quarto evento, a própria vítima não identificou o réu Grigório no reconhecimento pessoal, demonstrando inconsistência em suas declarações. Destarte, a absolvição de Grigorio Mendes Frazão Junior deve ser mantida, uma vez que não há elementos probatórios suficientes para confirmar sua autoria nos crimes imputados. Em relação ao pleito de absolvição de Marcos Felipe Alves de Macedo do quarto evento criminoso, argumentando a Defesa que sua condenação se deu exclusivamente com base no reconhecimento precário realizado pela vítima Robert Antônio dos Santos Alves, entendo que o pleito merece acolhimento. Com efeito, a vítima Robert Antônio, ao fazer o boletim de ocorrência, inicialmente descreveu características físicas distintas das do réu Marcos Felipe, vejamos: “(...) Que então desceram quatro indivíduos desse veiculo, que depois identificou como sendo um RENALT LOGAN marrom; Que os indivíduos lhe renderam utilizando armas de fogo; Que o local estava um pouco escuro, mas pode visualizar 03 (três) nacionais na abordagem, sendo que dois deles conseguiu gravar as características físicas; Que descreve o tal nacional como sendo magro, mais ou menos 1,68 metros de altura, bem moreno; Que o motorista que conduzia o LOGAN tinha barba rala (pouca) e bem moreno”. No reconhecimento fotográfico, a vítima Robert Antônio reconheceu como autor do fato o réu Marcos Felipe, o único de pele clara dentre os constantes nas fotografias (ID 20430430). Ao proceder com o reconhecimento por videoconferência, seis meses após o reconhecimento fotográfico, mais uma vez o réu foi reconhecido pela vítima. Nesse aspecto, cumpre destacar dois pontos relevantes: no procedimento de reconhecimento pessoal por videoconferência (ID 20430456), o réu Marcos Felipe Alves de Macedo foi apresentado ao lado de outros três indivíduos cujas características físicas se mostravam notoriamente distintas das suas, especialmente no que tange à faixa etária, uma vez que os demais aparentavam ser bem mais velhos. No boletim de ocorrência a vítima relatava que “acredita que pelo menos dois dos elementos aparentam serem menores de idade”. Além disso, dentre os indivíduos postos lado a lado, somente o réu possuía tatuagens visíveis, o que pode ter influenciado subjetivamente a percepção da vítima, comprometendo a fidedignidade e a isonomia do procedimento de reconhecimento, tendo em vista a necessidade de observância aos critérios estabelecidos no artigo 226 do Código de Processo Penal. Se ainda não bastasse, a vítima, em audiência de instrução, informou que esse reconhecimento pessoal se deu após ter acessos a outros vídeos em redes sociais do suposto assalto anterior praticado pelo suposto grupo. Nesse momento, insta salientar que, no tocante ao reconhecimento de pessoas e coisas, o Código de Processo Penal dedica três sucintos artigos ao ato do reconhecimento de pessoas e coisas (arts. 226, 227 e 228). “Em relação ao reconhecimento de pessoas, o art. 226 estabelece que o ato deverá ocorrer da seguinte forma: a pessoa que tiver de fazer o reconhecimento será convidada a descrever o indivíduo que deva ser reconhecido (art. 226, I); a pessoa, cujo reconhecimento se pretender, será colocada, se possível, ao lado de outras que com ela tiverem semelhança, convidando-se quem tiver de fazer o reconhecimento a apontá-la (art. 226, II); se houver razão para recear que a pessoa chamada para realizar o ato, por intimidação ou outra influência, não diga a verdade em face da pessoa a ser reconhecida, a autoridade providenciará para que esta não veja aquela (art. 226, III); do ato de reconhecimento lavrar-se-á termo pormenorizado, subscrito pela autoridade, pela pessoa chamada para proceder ao reconhecimento e por duas testemunhas presenciais (art. 226, IV)” (HC n. 598.886/SC, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 27/10/2020, DJe de 18/12/2020). Sobre o tema, GUILHERME DE SOUZA NUCCI conceitua o reconhecimento de pessoas como "o ato pelo qual uma pessoa admite e afirma como certa a identidade de outra ou a qualidade de uma coisa" (Manual de Processo Penal e Execução Penal. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 436). Em recente mudança de entendimento, o Superior Tribunal de Justiça, em julgado da Sexta Turma, sedimentou a compreensão de que “O reconhecimento de pessoa, presencialmente ou por fotografia, realizado na fase do inquérito policial, apenas é apto, para identificar o réu e fixar a autoria delitiva, quando observadas as formalidades previstas no art. 226 do Código de Processo Penal e quando corroborado por outras provas colhidas na fase judicial, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa” (HC 598.886/SC, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Sexta Turma, julgado em 27/10/2020, DJe 18/12/2020). No citado julgado, restou consignado, ainda, que: 1) O reconhecimento de pessoas deve observar o procedimento previsto no art. 226 do Código de Processo Penal, cujas formalidades constituem garantia mínima para quem se encontra na condição de suspeito da prática de um crime; 2) À vista dos efeitos e dos riscos de um reconhecimento falho, a inobservância do procedimento descrito na referida norma processual torna inválido o reconhecimento da pessoa suspeita e não poderá servir de lastro a eventual condenação, mesmo se confirmado o reconhecimento em juízo; 3) Pode o magistrado realizar, em juízo, o ato de reconhecimento formal, desde que observado o devido procedimento probatório, bem como pode ele se convencer da autoria delitiva a partir do exame de outras provas que não guardem relação de causa e efeito com o ato viciado de reconhecimento; 4) O reconhecimento do suspeito por mera exibição de fotografia(s) ao reconhecedor, a par de dever seguir o mesmo procedimento do reconhecimento pessoal, há de ser visto como etapa antecedente a eventual reconhecimento pessoal e, portanto, não pode servir como prova em ação penal, ainda que confirmado em juízo. Como bem delimita Aury Lopes Júnior, in Direito processual penal. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2017, p. 490, às exigências perpetradas pelo Código de Processo Penal, atinentes ao reconhecimento, "constituem condição de credibilidade do instrumento probatório, refletindo na qualidade da tutela jurisdicional prestada e na própria confiabilidade do sistema judiciário de um país". No caso do réu Marcos Felipe, o procedimento do reconhecimento não atingiu sua finalidade precípua, que é a de distinguir, entre pessoas de características físicas semelhantes, aquela responsável pelo ilícito. O réu indicado pela vítima tem características distintas das narradas por ela mesma no boletim de ocorrência. A esse respeito, em caso análogo, consignou o STJ: “a defesa juntou aos autos fotografia atual do paciente, que demonstra que ele teve sensíveis alterações de fisionomia desde o registro fotográfico mencionado e que demonstra, ainda, que ele tinha características distintas daquelas descritas pela vítima à autoridade policial ("branco, magro e baixo"). Tais circunstâncias do caso concreto incrementam ainda mais o risco de erro no reconhecimento pessoal e, consequentemente, o risco de erro judicial material (falso positivo)” (HC n. 948.558/PE, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 10/12/2024, DJEN de 13/12/2024). Destaca-se aqui, apenas para reforçar o argumento, que se trata da mesma vítima que contraditoriamente reconheceu o réu Grigório Mendes Frazão Júnior por fotografias, mas não o apontou por videoconferência (ID 20430454). Ressalta-se que "quando se coloca em dúvida a confiabilidade do reconhecimento feito pela vítima, mesmo nas hipóteses em que ela diga ter 'certeza absoluta' do que afirma, não se está a questionar a idoneidade moral daquela pessoa ou a imputar-lhe má-fé, vale dizer, não se insinua que ela esteja mentindo para incriminar um inocente. O que se pondera apenas é que, não obstante subjetivamente sincera, a afirmação da vítima pode eventualmente não corresponder à realidade, porque decorrente de um 'erro honesto', causado pelo fenômeno das falsas memórias" (HC n. 700.313/SP, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 7/6/2022, DJe de 10/6/2022). Assim, apesar de grave as condutas imputadas na exordial, e mesmo diante da possibilidade de que o réu possa, de fato, ter praticado o roubo narrado no quarto evento, não se identificou prova suficiente para uma condenação criminal. Depois de uma extensa audiência de instrução (cerca de cinco horas), não foi produzida uma única prova que relacione o réu Marcos Felipe aos fatos narrados na denúncia, a não ser o reconhecimento efetuado pela vítima com todas as observações feitas acima. Noutra perspectiva, a forma como se deu a apuração criminal também revela falhas significativas quanto à indicação da autoria delitiva desses eventos criminosos. O crime foi praticado em novembro de 2022, o Relatório do Inquérito foi apresentado em 13.04.2023. Antes de oferecer a denúncia, o órgão ministerial requereu diligências por considerar que “o único indício de autoria acostado aos autos é o termo de reconhecimento por meio de fotografia, o que não é suficiente para imputar aos indiciados a prática dos crimes narrados”. Em 13.06.2023, a autoridade policial apresentou o reconhecimento pessoal e interrogatório dos acusados Marcos Felipe Alves De Macedo, Grigorio Mendes Frazão Junior e Bruno Dos Santos Oliveira. Em 23.06.2023, o órgão ministerial entendeu que os indícios de autoria ainda eram precários e requereu o retorno dos autos para a complementação da diligência (ID 20430463). Sem nova resposta da autoridade policial, o órgão ministerial apresentou denúncia em 19.09.2023. Percebe-se, assim, que houve uma série de contratempos nos reconhecimentos pessoais, colhidos aproximadamente seis meses após os reconhecimentos fotográficos, bem como uma deficiência na seleção de pessoas com características semelhantes. Deve ser observado, também, o depoimento prestado pelo réu Marcos Felipe Alves de Macedo na delegacia, após ser apontado pela vítima Robert Antônio como um dos supostos autores do roubo. Durante sua oitiva, o réu demonstrou aparente surpresa quando informado do reconhecimento feito pela vítima, vindo a informar que não conhecia os corréus e chegou a questionar se, por causa disso, iria responder a um processo judicial (ID 20430458). Ressalta-se, ainda, que desde a fase inquisitiva todos os réus sustentam que não se conhecem. Ao ser indagado pelo magistrado sobre a participação de Marcos Felipe e Grigorio Mendes nesse quarto evento criminoso, o réu confesso Bruno dos Santos Oliveira aduziu que se tratavam de outros dois indivíduos que não podia citar os nomes, e, em relação aos corréus, ressaltou “que eu não conheço eles não, é palavra minha, agora se a vítima tá acusando eles, posso fazer nada não”. Portanto, não há qualquer elemento de prova objetivo que vincule o réu Marcos Felipe ao crime que lhe foi imputado. A única evidência de sua suposta participação advém do reconhecimento feito pela vítima de maneira isolada e contraditória, o que não é suficiente para sustentar um édito condenatório. Nota-se, então, que relevantes incertezas circundam o caso, sendo temerário concluir pela condenação do acusado pela prática do crime em comento, sendo imperiosa a aplicação do in dubio pro reo no que tange à sua participação na infração penal analisada, com fulcro no art. 386, VII, do Código de Processo Penal, conforme preceitua a jurisprudência pátria: PROCESSUAL PENAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REVISÃO CRIMINAL NA ORIGEM. CRIME DE ROUBO MAJORADO, ESTUPRO E ESTUPRO DE VULNERÁVEL. AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO CRIMINAL. ART. 621, III, DO CPP. NOVA PROVA. REVISÃO CRIMINAL. POSSIBILIDADE. DÚVIDA QUANTO À AUTORIA. PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO. VALOR PROBATÓRIO DO DEPOIMENTO DA VÍTIMA. O IMPACTO DAS FALSAS MEMÓRIAS NO RECONHECIMENTO PESSOAL. PROCEDIMENTO DO ART. 226 DO CPP. NULIDADE. AGRAVO CONHECIDO PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. (...) 3. A retratação da vítima e as falhas no procedimento de reconhecimento, especialmente a discrepância física entre os apresentados e o acusado, motivam a reavaliação da condenação. A análise se debruça sobre a valoração do depoimento da vítima em consonância com o corpus probatório e os princípios do in dubio pro reo, enfatizando a influência das falsas memórias na identificação do acusado e a necessidade de alinhamento do procedimento de reconhecimento às diretrizes do art. 226 do CPP. 4. Teses fixadas : 4.1 Em delitos sexuais, a retratação da vítima autoriza a revisão criminal para absolvição do réu, quando o conjunto probatório se limita à sua declaração e a testemunhos, sem outras provas materiais. 4.2 O procedimento de reconhecimento de pessoas, para sua validade, deve assegurar a semelhança física entre o suspeito e os demais indivíduos apresentados, conforme estabelece o art. 226, II, do CPP, evitando-se sugestões que possam influenciar a decisão da testemunha e comprometer o reconhecimento. 5. Agravo conhecido para dar provimento ao recurso especial e absolver o recorrente. (AREsp n. 2.408.401/PA, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 2/4/2024, DJe de 10/4/2024.) PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO ESPECIAL. ROUBO MAJORADO. CONDENAÇÃO. VIOLAÇÃO AO ART. 155 DO CPP. RECONHECIMENTO FOTOGRÁFICO EXTRAJUDICIAL. INEXISTÊNCIA DE OUTRAS PROVAS SEGURAS DA AUTORIA DELITIVA. REVISÃO. POSSIBILIDADE. DESNECESSIDADE DE REEXAME DE PROVAS. NÃO INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7/STJ. NON LIQUET. APLICAÇÃO DA REGRA DO IN DUBIO PRO REO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1. A análise acerca da legitimidade da condenação do ora recorrente não atrai incursão no acervo probatório dos autos, uma vez que a situação fática a ser analisada está delineada no acórd ão recorrido e diz respeito ao exame de violação de normativo federal. 2. Para a imposição de uma condenação criminal, faz-se necessário que seja prolatada uma sentença, após regular instrução probatória, na qual haja a indicação expressa de provas suficientes acerca da comprovação da autoria e da materialidade do delito, nos termos do art. 155 do Código de Processo Penal. 3. Ademais, segundo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, "[...] o reconhecimento de pessoa, presencialmente ou por fotografia, realizado na fase do inquérito policial, apenas é apto, para identificar o réu e fixar a autoria delitiva, quando observadas as formalidades previstas no art. 226 do Código de Processo Penal e quando corroborado por outras provas colhidas na fase judicial, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa (HC n. 598.886/SC, Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, DJe 18/12/2020)" (AgRg no HC n. 734.611/PR, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 21/6/2022, DJe de 27/6/2022). 4. Na hipótese, a condenação baseou-se primordialmente no reconhecimento fotográfico extrajudicial, nem sequer confirmado em juízo, sem a indicação de outros elementos de convicção que pudessem respaldar, com segurança, a autoria delitiva. Vale mencionar que o rosto do acusado estava parcialmente coberto por um capuz. Além disso, os dados extraídos das interceptações telefônicas, apontados pelas instâncias antecedentes, configuram meras presunções sobre a responsabilidade penal do réu, não havendo nenhuma referência específica à participação do recorrente na empreitada delituosa. 5. Insta salientar que a avaliação do acervo probatório deve ser balizada pelo princípio do favor rei. Ou seja, remanescendo dúvida sobre a responsabilidade penal do acusado, imperiosa será a sua absolvição, tendo em vista que sobre a acusação recai o inafastável ônus de provar o que foi veiculado na denúncia. 6. Recurso especial provido. (REsp n. 2.109.511/SP, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 6/2/2024, DJe de 14/2/2024.) Diante da ausência de outros elementos probatórios aptos a corroborar a participação do apelante Marcos Felipe no crime, impositiva se revela a sua absolvição, nos termos do art. 386, inciso VII, do Código de Processo Penal. II) Da associação criminosa. Pleito de condenação. Ausência do animus associativo No que diz respeito ao delito de associação criminosa, tem-se que o tipo penal está previsto no artigo 288 do Código Penal, que dispõe, in verbis: “Art. 288. Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes” Logo, para sua configuração, o tipo exige o animus associativo com o fim específico da prática de delitos, ao passo em que a mera participação de três ou mais pessoas na prática de um delito não implica, automaticamente, o preceito penal acima citado. O Superior Tribunal de Justiça já consignou o entendimento de que "para caracterização do delito de associação criminosa, indispensável a demonstração de estabilidade e permanência do grupo formado por três ou mais pessoas, além do elemento subjetivo especial consiste no ajuste prévio entre os membros com a finalidade específica de cometer crimes indeterminados. Ausentes tais requisitos, restará configurado apenas o concurso eventual de agentes, e não o crime autônomo do art. 288 do Código Penal" (HC n. 374.515/MS, rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 7/3/2017, DJe 14/3/2017). No caso dos autos, não restou comprovada a associação dos acusados para o cometimento de delitos em nenhum momento dos autos. Na verdade, as provas produzidas em juízo indicam que os réus sequer se conhecem, ou seja, não há elementos probatórios seguros que demonstrem que os três réus tinham uma organização ou ajuste prévio para cometer crimes, estando ausente o elemento subjetivo do tipo. O que há, no caso, é apenas o concurso de pessoas, que não pode ser definido como o delito de associação criminosa. Assim, mais uma vez, diante da dúvida que se instala, por ausência de provas, há que ser mantida a absolvição dos réus, com base no artigo 386, VII, do CPP. III) Do concurso de crimes O órgão ministerial requer o afastamento da continuidade delitiva (art. 71 do CP) e o reconhecimento do concurso formal (art. 70 do CP) em relação ao delito previsto no art. 157, § 2º, II, e § 2º-A, I, do CP, por duas vezes, em razão das vítimas Luis Gonzaga e Diego, bem como no mesmo tipo penal, combinado com o art. 14, II, do CP, uma vez, em relação à vítima Ludmila. Além disso, pleiteia o reconhecimento do concurso material (art. 69 do CP) entre esses crimes e os dispostos no art. 288 do CP, e no art. 157, § 2º, II, e § 2º-A, I, do CP, por três vezes, referentes às vítimas Francisco Santos, Marcos Antônio e Robert, em relação aos recorridos Bruno dos Santos Oliveira e Grigorio Mendes Frazão Junior. Pois bem. A denúncia, quando apresentada, denota em toda a peça a multiplicidade de delitos praticados em mesma condição de tempo, lugar e maneira de execução. Logo, está narrada fáticamente a continuidade delitiva, embora não seja mencionado na exordial se o crime teria sido praticado em concurso formal, material ou continuidade. Na audiência de instrução os fatos foram versados, a todo momento, como caso de continuidade delitiva. O órgão ministerial, apenas em alegações finais, suscitou a tese apresentada. E muito embora os réus se defendam de fatos e não da capitulação jurídica, entendo que não é o caso de acolhimento do pleito. O artigo 71 do Código Penal dispõe que há crime continuado quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie, em condições de tempo, lugar e maneira de execução, devendo os delitos ser considerados como um só para efeito de aplicação da pena. No presente caso, todos os eventos delitivos possuem identidade típica – roubo majorado pelo emprego de arma e concurso de agentes –, foram praticados no mesmo contexto situacional e seguiram um mesmo modo de execução. A continuidade delitiva consiste numa ficção jurídica criada pelo legislador para beneficiar o autor do crime, pressupondo, para o seu reconhecimento, a presença de pressupostos objetivos, que são: mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução, e subjetivo, qual seja: unidade de desígnios. É o que preceitua o artigo 71 do Código Penal: “Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subseqüentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços. Parágrafo único - Nos crimes dolosos, contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, poderá o juiz, considerando a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, aumentar a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, até o triplo, observadas as regras do parágrafo único do art. 70 e do art. 75 deste Código”. Sobre o tema, leciona RICARDO AUGUSTO SCHIMITT, in Sentença Penal Condenatória: Teoria e Prática. 13ª. ed. Salvador: Juspodivm, 2019. p. 315 : “A conceituação legal da espécie de crime continuado nos traz requisitos que também se encontram presentes na espécie do concurso material ou real de crimes, pois ambos ocorrem 'quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes (...)', porém, a continuidade delitiva se diferencia por exigir: 1º) que os crimes cometidos sejam da mesma espécie: crimes da mesma espécie são aqueles que possuem a mesma tipificação legal, não importando se simples, privilegiados ou qualificados, se tentados ou consumados; 2º) que os crimes tenham sido cometidos pelas mesmas condições de tempo: predomina o entendimento na jurisprudência da possibilidade de se reconhecer a espécie de crime continuado entre infrações praticadas em intervalo de tempo não superior a trinta dias (STF, HCs 107636 e 69896); 3º) que os crimes tenham sido cometidos com identidade de lugar: permite-se o reconhecimento da espécie de crime continuado entre os delitos praticados na mesma rua, no mesmo bairro, na mesma cidade ou até mesmo em cidades vizinhas (limítrofes) (RT 542/455); 4º) que os crimes tenham sido cometidos pelo mesmo modo de execução: exige-se que ocorra identidade quanto ao modus operandi do agente ou do grupo; 5º) que os crimes subsequentes sejam tidos como continuação do primeiro: exige-se que as ações subsequentes devam ser tidas como desdobramento lógico da primeira, demonstrando a existência de unidade de desígnios. O artigo 71 do Código Penal nos fornece, portanto, os requisitos indispensáveis à caracterização do crime continuado ou da continuidade delitiva, que se constituem na prática de mais de uma ação ou omissão, tendo como resultado dois ou mais crimes da mesma espécie, que pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, os crimes subsequentes devem ser havidos como continuação do primeiro, o que conduzirá à aplicação da pena de um só dos crimes, se idênticas, aumentadas de 1/6 até 2/3, ou a aplicação da mais graves das penas, se diversas, aumentada de 1/6 até 2/3, ou, ainda, nos crimes dolosos contra vítimas diferentes, cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, a aplicação da pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a aplicação da mais grave das penas, se diversas, aumentadas em quaisquer hipóteses até o triplo." No caso dos autos, é importante delimitar que a continuidade delitiva é favorável ao réu, e que os crimes são da mesma espécie, praticado mediante mais de uma ação, praticados em sequência, com o mesmo modo de execução. Sob outra perspectiva, a aplicação do concurso formal e material de crimes resultaria em uma penalidade desproporcional, comprometendo a adequada realização das funções preventiva, retributiva e ressocializadora da pena. Dessa forma, rejeito o pleito ministerial. IV) Da análise da primeira fase da dosimetria O órgão ministerial pugna ainda pela valoração negativa dos vetores da personalidade e consequências do crime, na individualização da pena do réu BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA. Neste momento, insta consignar que o ordenamento jurídico brasileiro adota o sistema trifásico de aplicação da pena, destinando a primeira fase para fixação da pena-base, devendo a mesma ser aferida com fulcro nas circunstâncias judiciais previstas no artigo 59 do Código Penal, quais sejam: a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do sentenciado; os motivos do crime, as circunstâncias e as consequências da infração penal; e, ainda, o comportamento da vítima. Com efeito, o juiz sentenciante, em relação à condenação do recorrente, fundamentou a exasperação da pena-base na valoração negativa dos vetores da culpabilidade e dos antecedentes, previstos no art. 59 do CP. Passo à análise do pedido ministerial. Em relação ao vetor da personalidade, enquanto circunstância judicial do art. 59 do CP, leciona Cleber Masson, em Direito Penal, Parte Geral (Arts. 1º ao 120), 15ª ed., Rio de Janeiro: Forense; Método, 2021, p. 584: “[…] é o perfil subjetivo do réu, nos aspectos moral e psicológico, pelo qual se analisa se tem ou não o caráter voltado à prática de infrações penais. Levam-se em conta seu temperamento e sua formação ética e moral, aos quais se somam fatores hereditários e socioambientais, moldados pelas experiências por ele vividas”. Portanto a personalidade deve ser aferida com base no perfil subjetivo do acusado, tendo em vista seus aspectos morais e psicológicos, com o fito de se identificar a existência de caráter voltado à prática de infração penal, com base nos elementos probatórios dos autos, aptos a inferir o desvio de personalidade de acordo com o livre convencimento motivado. O órgão ministerial requer que se considere a personalidade desvirtuada do agente em razão de ações penais em curso em seu desfavor. Acontece que os precedentes do Superior Tribunal de Justiça pacificam que a valoração desfavorável da conduta social e da personalidade, com base neste fundamento, afigura-se indevida, haja vista que inquéritos e ações penais em curso não se prestam para exasperar a pena-base ao se analisar os vetores do art. 59 do Código Penal. Aliás, este foi o entendimento consolidado na Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça: “Súmula 444, STJ: É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base”. Ademais, uma ação penal transitada em julgado só poderá ser utilizada ou para fins de caracterização de maus antecedentes, na primeira fase da dosimetria da pena, ou para fins de caracterização de reincidência, quando da fixação da pena intermediária. O vetor da conduta social e da personalidade não se relacionam com o histórico criminal do agente. Nesse sentido: A jurisprudência desta Suprema Corte (e a do Superior Tribunal de Justiça) orienta-se no sentido de repelir a possibilidade jurídica de o magistrado sentenciante valorar negativamente, na primeira fase da operação de dosimetria penal, as circunstâncias judiciais da personalidade e da conduta social, quando se utiliza, para esse efeito, de condenações criminais anteriores, ainda que transitadas em julgado, pois esse específico aspecto (prévias condenações penais) há de caracterizar, unicamente, maus antecedentes (STF, RHC 144.337-AgR, Rel. Ministro CELSO DE MELLO, SEGUNDA TURMA, julgado em 05/11/2019, DJe 22/11/2019). A propósito, é o entendimento igualmente adotado pelo Superior Tribunal de Justiça: PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. ART. 35 DA LEI Nº 11.343/06. PENA-BASE. EXASPERAÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. PROPORCIONALIDADE. REGIME MAIS GRAVOSO. LEGALIDADE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. No tocante à fixação da pena-base acima do mínimo legal, cumpre registrar que a dosimetria da pena está inserida no âmbito de discricionariedade do julgador, estando atrelada às particularidades fáticas do caso concreto e subjetivas dos agentes, elementos que somente podem ser revistos por esta Corte em situações excepcionais, quando malferida alguma regra de direito. 2. As instâncias ordinárias exasperaram a reprimenda, tendo em vista que a associação envolvia considerável quantia em dinheiro (R$ 3.000 a R$ 4.000, por dia - e-STJ fls. 203) e movimentava elevada quantidade de droga, tudo a desbordar do ordinário do tipo, aumentando a reprovabilidade da conduta. 3. É firme o entendimento deste Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, em observância ao princípio da presunção da inocência, a existência de inquéritos policiais e/ou ações penais em andamento não constitui fundamentação idônea para afastar a pena-base do mínimo legal, seja a título de maus antecedentes, conduta social negativa ou personalidade. Incidência da Súmula 444/STJ. No presente caso, possuindo o acusado condenação transitada em julgado, não há qualquer ilegalidade no reconhecimento do desvalor dos antecedentes. (...) 11. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp n. 2.338.824/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 20/6/2023, DJe de 26/6/2023.) No que diz respeito às consequências, os danos causados pela infração, ou as suas consequências, podem ser de ordem material ou moral e deve o Juiz avaliar a menor ou maior intensidade da lesão jurídica causada à vítima ou a seus familiares. O Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que o mero abalo emocional, por si só, não pode ser utilizado como fundamento para o aumento da reprimenda básica, pois trata-se de consequência inerente ao próprio tipo penal. No caso dos autos, o órgão ministerial entende que “a circunstância judicial referente às consequências do crime (efeito maléfico) transcendeu o esperado ao tipo penal, o que demonstra a impossibilidade da manutenção do neutro basilar, razão pela qual há de ser tal vetorial utilizada para majorar a pena base do acusado”. Não assiste razão à acusação. A valoração pleiteada é inidônea, pois não apresenta qualquer motivação reprovável para a prática do ato capaz de exasperar a pena-base, sobrelevando-se que a obtenção de lucro fácil e a não recuperação dos bens é inerente ao crime de roubo. O Superior Tribunal de Justiça compreende que a obtenção de lucro fácil e rápido em prejuízo alheio é circunstância elementar do delito patrimonial. Sobre o tema, encontra-se o seguinte julgado: DIREITO PENAL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CRIME DE ROUBO. DOSIMETRIA DA PENA. CULPABILIDADE E CONSEQUÊNCIAS DO CRIME. FUNDAMENTOS PARCIALMENTE INVÁLIDOS. BIS IN IDEM. SUBSISTÊNCIA DE OUTROS FUNDAMENTOS SUFICIENTES PARA A NEGATIVAÇÃO. PARCIAL PROVIMENTO. NULIFICAÇÃO PARCIAL DOS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO RECORRIDO, SEM EFEITO INFRINGENTE NA PENA FINAL. (...) 5. A fundamentação para negativar as consequências do crime, ao considerar o prejuízo financeiro pela não recuperação dos bens, é inadequada, pois tal consequência é ínsita ao tipo penal de roubo, devendo ser invalidada. 6. A presença de graves abalos e traumas psicológicos nas vítimas é fundamento adequado para negativar as consequências do crime, conforme jurisprudência, mantendo-se a negativação por este motivo. IV. Dispositivo e tese 7. Agravo conhecido e provido. Recurso especial conhecido e parcialmente provido para nulificar a fundamentação de que a culpabilidade é negativa por danos psicológicos e que as consequências são negativas por danos materiais, sem efeito infringente na pena final. (AREsp n. 2.383.059/CE, relatora Ministra Daniela Teixeira, Quinta Turma, julgado em 10/12/2024, DJEN de 17/12/2024.) Por conseguinte, rejeito o pedido ministerial. V) Terceira fase da dosimetria da pena Na terceira fase da individualização da pena, existe insurgência da defesa do réu condenado contra a incidência das causas de aumento em cascata. O apelante BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA pugna pela aplicação de apenas uma causa de aumento da parte especial, devendo incidir na terceira fase somente a majorante do uso de arma de fogo (art. 157, § 2-A, I, do CP), e o concurso de agentes deve ser analisado na 1ª fase da dosimetria, por previsão expressa no artigo 68, parágrafo único, do CP. Neste aspecto, convém trazer à baila o artigo 68 do Código Penal, que assim estabelece: “Art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento. Parágrafo único - No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua.” A leitura do artigo suso transcrito revela uma conclusão salutar para o deslinde do feito, a saber: existe a faculdade, e não obrigação, do magistrado aplicar apenas a causa de aumento que mais aumente prevista na parte especial. Desta forma, constata-se que o legislador processual deu ao magistrado a faculdade de aplicar apenas uma causa de aumento ou de diminuição, prevalecendo aquela que mais aumente ou mais diminua. Nesse sentido, é também o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o qual ressalta que “a teor do art. 68, parágrafo único, do Código Penal, é possível aplicar cumulativamente as causas de aumento de pena em concurso, não estando obrigado o julgador somente a fazer incidir a causa que aumente mais a pena, excluindo as demais.” (AgRg no HC 644.572/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 09/03/2021, DJe 15/03/2021). Sobre o tema, encontram-se os seguintes julgados: PENAL. RECURSO ESPECIAL. ROUBO MAJORADO. DOSIMETRIA. AGRAVANTE DE CALAMIDADE PÚBLICA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE NEXO CAUSAL ENTRE A SITUAÇÃO PANDÊMICA RELATIVA AO CORONAVÍRUS E A PRÁTICA DO DELITO. NÃO INCIDÊNCIA. CONCURSO DE AGENTES E EMPREGO DE ARMA DE FOGO. APLICAÇÃO CUMULATIVA DAS CAUSAS DE AUMENTO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. RECURSO PROVIDO. 1. É pacífico, na jurisprudência desta Corte, o entendimento de que "a incidência da agravante do art. 61, inciso II, alínea 'j', do Código Penal - prática do delito durante estado de calamidade pública gerado pela pandemia do coronavírus - exige nexo entre tal circunstância e a conduta do agente" (AgRg no HC n. 717.298/SP, relator Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 22/2/2022, DJe 2/3/2022), o que não foi demonstrado nos autos. 2. Ainda, nos termos da orientação desta Casa, presentes duas causas de aumento, é possível a aplicação das majorantes de forma cumulada na terceira etapa do cálculo da reprimenda. O art. 68, parágrafo único, do Código Penal não obriga que o magistrado aplique apenas uma causa de aumento quando estiver diante de concurso de majorantes. Precedentes. (REsp n. 2.031.972/SP, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 13/12/2022, DJe de 16/12/2022.) AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. CRIME DE ROUBO MAJORADO. CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. NÃO INTERPOSIÇÃO DO RECURSO DE APELAÇÃO. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO POR AUSÊNCIA DE PROVAS. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ELEITA. REEXAME DE PROVAS. DOSIMETRIA. INCIDÊNCIA CUMULATIVA DE DUAS CAUSAS DE AUMENTO PREVISTAS NA PARTE ESPECIAL DO CÓDIGO PENAL. POSSIBILIDADE, DESDE QUE DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. ART. 68, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CÓDIGO PENAL. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. (...)3. Quanto à dosimetria da pena, constata-se que a Corte local adotou entendimento que se coaduna com a jurisprudência desta Corte Superior, no sentido de que, a teor do art. 68, parágrafo único, do Código Penal, é possível, de forma concretamente fundamentada, aplicar cumulativamente as causas de aumento de pena previstas na parte especial, não estando obrigado o julgador somente a fazer incidir a causa que aumente mais a pena, excluindo as demais (AgRg no HC n. 644.572/SP, Relator Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, julgado em 9/3/2021, DJe de 15/3/2021). 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no HC n. 776.257/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 25/10/2022, DJe de 7/11/2022.) Entretanto, o que se percebe é que a sentença está devidamente fundamentada, já que o magistrado destacou que o crime foi cometido pelo acusado Bruno junto de outros comparsas, em unidade de desígnios, valendo-se da utilização de arma de fogo. Restou destacado, ainda, o acentuado desvalor da conduta do réu, que chegou a dar coronhada em uma das vítimas. Vejamos a fundamentação: “(...) Diante do cenário vislumbrado nos autos, entendo que as circunstâncias do caso concreto exigem a aplicação de forma CONCOMITANTE das majorantes em questão, pois a unidade de desígnios demonstrou evidente premeditação, de modo que se reuniram exclusivamente para a prática de crimes de roubo mediante o emprego de arma letal (arma de fogo) que, inclusive, foi apontada para a cabeça de uma das vítimas. Soma-se a isso, o fato de que se tratavam de, no mínimo, três infratores, de modo que a quantidade de indivíduos indubitavelmente reduziu a zero a possibilidade de resistência/defesa por parte das vítimas que, mesmo não oferecendo qualquer reação, houve lesão à integridade física de um dos ofendidos. Destarte, a quantidade de infratores agindo de forma premeditada; o uso efetivo de arma de fogo sendo apontada ora em direção ao corpo, ora à cabeça; e a lesão à integridade física de um dos ofendidos que sequer ofereceu resistência; são circunstâncias que causam maior reprovação e que justificam, portanto, o emprego das causas de aumento na terceira fase, como forma de garantir a reprovação e prevenção dos crimes, com espeque no art. 59, caput, parte final, do Código Penal”. Ora, diante do exposto, desnecessárias maiores digressões, uma vez que não há como negar que devidamente fundamentada a incidência da dupla majoração na terceira fase dosimétrica. Tendo o magistrado a quo detalhado a conduta do réu de forma individualizada, ponderado acerca do modus operandi apto a majorar duplamente a pena, bem como observada expressamente a jurisprudência pátria. Portanto, não merece respaldo a tese suscitada pela defesa. VI) Do quantum indenizatório. Dos danos materiais e morais Na sentença, o magistrado fixou a reparação de danos, no seguintes termos: “O Ministério Público logrou êxito em comprovar o valor do bem subtraído da vítima Diego Rodrigo Caldas Sena, visto que anexou aos autos cópia da nota fiscal referente ao aparelho (ID 53467803), constando a descrição do celular e o valor pago pela vítima (R$ 2.944,05). Assim, comprovado o valor do prejuízo material suportado pela vítima Diego Rodrigo Caldas Sena e submetida a documentação ao contraditório, fixo o valor de 2.944,05 (dois mil, novecentos e quarenta e quatro reais e cinco centavos), a título de dano material em favor de Diego Rodrigo Caldas Sena, com fulcro no art. 387, inc. VII, do Código Processual Penal. Por outro lado, com relação às demais vítimas, o órgão acusador não anexou aos autos nota fiscal ou outra documentação análoga, sendo notoriamente ilegal a conduta de arbitrar dano material, sem que as partes tenham oportunidade de informar o montante indenizável, o que consistiria em violação aos direitos das vítimas e dos acusados, eis que da mesma forma que estes possuem direito de combater o pleito indenizatório, aqueles necessitam de oportunidade para demonstrar o quanto devem receber e as proporções do dano experimentado. Também descabe a fixação de dano moral na forma requerida pelo Ministério Público, pois, em que pese o constrangimento próprio do tipo penal, não foi juntado pelo órgão acusador qualquer documentação que comprovasse o alegado (art. 156 do CPP), para fins de fundamentar a espécie indenizatória e possibilitar o contraditório e ampla defesa constitucionalmente assegurados (art. 5º, inc. LV, da CF/88)”. Em síntese, a acusação busca a fixação de indenizações por danos materiais no valor de R$ 949,00 para Francisco Santos Sousa, R$ 8.000,00 para Marcos Antônio de Alencar, a serem pagos por Bruno dos Santos Oliveira e Grigorio Mendes Frazao Junior, e R$ 10.543,10 para Robert Antônio dos Santos Alves, a ser pago também por Marcos Felipe Alves de Macedo. Além disso, a determinação de R$ 5.000,00 a cada uma das vítimas Luis Gonzaga Pereira Ferreira, Diego Rodrigo Caldas Sena, Francisco Santos Sousa, Marcos Antônio de Alencar e Robert Antônio dos Santos Alves, a título de danos morais, nos termos do art. 91, I, do CP c/c art. 387, IV, do CPP. Por sua vez, a defesa do réu BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA requer a reforma da sentença no que tange a condenação do apelante ao pagamento de danos materiais, por ausência de instrução probatória específica. Sobre o tema, torna-se importante frisar que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme “no sentido de que a fixação de valor mínimo para indenização dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pela vítima, prevista no art. 387, inciso IV, do CPP, além de pedido expresso na exordial acusatória, pressupõe a indicação de valor e prova suficiente a sustentá-lo, possibilitando ao réu o direito de defesa, com indicação de quantum diverso ou mesmo comprovação de inexistência de prejuízo material ou moral a ser reparado." (AgRg no AREsp n. 2.068.728/MG, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 13/5/2022, grifei). Assim, o magistrado criminal, para a fixação de valores a título de reparação de danos, deve proporcionar ao réu todos os meios de prova admissíveis no processo para que se apure o montante devido, com a indicação de elementos e valores que o sustentem. Caso contrário, inexistindo instrução específica para esse fim, o agente não pode arcar com o valor aleatoriamente determinado, sob pena de ofensa aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa. Apesar da fixação realizada na origem, considerando a apresentação de nota fiscal em nome da vítima antes da audiência de instrução, os demais danos sofridos pelas outras vítimas não foram devidamente apurados sob o crivo do contraditório. Em relação aos demais valores apontados pelo órgão ministerial, o exame dos autos evidencia que não restou realizada a instrução específica para a apuração do montante devido, com a indicação de elementos e valores que sustentem a indenização por dano moral e material, sendo inviável que o Apelante arque com o valor aleatoriamente determinado pelo órgão ministerial, sob pena de ofensa aos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, ressaltando-se que a indenização pode ser pleiteada em ação autônoma. Ora, além de pedido expresso na exordial acusatória, é imprescindível que haja a indicação de valor devido, acompanhado de prova suficiente a sustentá-lo, possibilitando ao réu o direito de defesa, com indicação de quantum diverso ou mesmo comprovação de inexistência de prejuízo material ou moral a ser reparado. Sem a adoção de tais providências no caso concreto, é incabível a condenação na forma pleiteada pelo órgão ministerial. No que tange ao apelo de exclusão do dano material imposto na sentença, entendo que o pleito consta da exordial acusatória, foi apresentada nota fiscal em nome da vítima antes da audiência de instrução e a defesa teve a oportunidade de insurgir-se, em respeito às garantias do contraditório e da ampla defesa. Assim, rejeito os pedidos formulados. VII) Da desconsideração da pena de multa e da suspensão das custas processuais Por fim, a defesa do Apelante Bruno dos Santos de Oliveira requer, ainda, a redução da pena de multa e a suspensão das custas processuais. A pena de multa está prevista no art. 5º, inciso XLVI, alínea "c", da Constituição Federal e no art. 49 do Código Penal, e, seja ela cominada no preceito secundário do tipo penal ou substitutiva da pena privativa de liberdade (art. 44 do CP), constitui espécie de sanção penal patrimonial, consistente na obrigação imposta ao apenado de pagar ao fundo penitenciário determinada quantia em dinheiro. (AgRg no REsp n. 1.990.425/MG, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe de 29/4/2022). Nesse mesmo sentido, CLEBER MASSON entende que a pena de multa é a espécie de sanção penal, de cunho patrimonial, consistente no pagamento de determinado valor em favor do Fundo Penitenciário. (MASSON, Cleber; Direito Penal: parte geral (arts. 1º a 120) – v. 1 – 15 ed. – Rio de Janeiro: Forense; MÉTODO, 2021). Portanto, trata-se de um tipo de pena, prevista de forma cumulativa ou não à outra espécie de pena, como a privativa de liberdade, por exemplo. Ademais, a pena de multa deve ser aplicada em duas etapas, que são: 1) Fixação da quantidade de dias-multa, nos termos do artigo 49 do CP; 2) O valor do dia-multa, levando em conta, principalmente, a situação econômica do réu (art 60, CP). No caso dos autos, o apelante foi condenado à pena de 18 anos, 05 meses e 19 dias de reclusão e ao pagamento de 39 (trinta e nove) dias-multa, no mínimo previsto no §1°, do art. 49, do CP, guardando proporcionalidade com a pena privativa de liberdade aplicada. Ora, a pena de multa foi fixada tomando por base o mínimo legalmente previsto, considerando-se a existência de seis crimes de roubo praticados em continuidade delitiva. Ademais, o Superior Tribunal de Justiça mantém o entendimento de que não é viável a isenção da pena de multa imposta sob o argumento de que os réus não teriam condições econômico-financeiras de efetuar o seu pagamento, uma vez que tal pleito não possui previsão no ordenamento jurídico. Deve-se, ainda, considerar a edição da Súmula 07, aprovada na sessão administrativa ordinária de 16.07.2024, pelo Pleno deste Egrégio Tribunal de Justiça, in verbis: “Súmula 07: Não pode o magistrado, na sentença condenatória, deixar de aplicar a pena de multa cumulativamente cominada, fixada expressamente no preceito secundário, sob o argumento de hipossuficiência do acusado, vez que inexiste previsão legal para tal benefício.” Dessa forma, com base nas razões expendidas, não há possibilidade de isenção/redução da pena de multa imposta ao acusado. No que toca à alegação de hipossuficiência dos réus e suas impossibilidades de arcar com as custas judiciais, tem-se que o benefício da justiça gratuita está previsto na Lei nº 1.060/1950. Os tribunais de todo o Brasil e, em especial, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendem que é suficiente que a parte alegue que está em situação de miserabilidade para que o julgador possa reconhecer o direito da justiça gratuita. Logo, presume-se que não se faz necessário juntar, nos autos, documento capaz de comprovar que a parte não pode arcar com as custas processuais dentro da demanda que tramita em juízo. No entanto, essa presunção é juris tantum, ou seja, admite prova em contrário. Portanto, tendo em vista que a parte alegou a sua condição de hipossuficiência, o recorrente faz jus ao benefício da justiça gratuita, nos termos do art. 99, §4º, do CPC. Todavia, quanto ao pagamento das custas processuais, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgados recentes, entende que a situação de hipossuficiência dos réus não implica em isenção das custas, ficando assim, a exigibilidade do pagamento suspensa por 05 (cinco) anos, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC. Ressalta, ainda, a Corte de Justiça que o momento de verificação da hipossuficiência dos condenados, para fins de suspensão da exigibilidade do pagamento, é na fase de execução, diante da possibilidade de alteração da situação econômica do agente. Nesta esteira de entendimento, traz-se à baila as jurisprudências do Superior Tribunal de Justiça, a seguir colacionada: PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. OFENSA REFLEXA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INVIABILIDADE. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO DA DECISÃO AGRAVADA. INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO REGIMENTAL. ERRO GROSSEIRO. INOVAÇÃO RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. TRÁFICO DE DROGAS. PRETENSÃO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DE PORTE DE DROGAS PARA CONSUMO PRÓPRIO. PLEITO DE APLICAÇÃO DA MINORANTE DO ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/2006. CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. DEDICAÇÃO A ATIVIDADES CRIMINOSAS. REVOLVIMENTO DE CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA N. 7/STJ. IMPOSSIBILIDADE. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. CUSTAS PROCESSUAIS. ISENÇÃO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA EXECUÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (...) 10. Como é cediço, este Superior Tribunal possui entendimento consolidado no sentido de que "o momento de se aferir a situação do condenado para eventual suspensão da exigibilidade do pagamento das custas processuais é a fase de execução, por tal razão, nos termos do art. 804 do Código de Processo Penal, mesmo que beneficiário da justiça gratuita, o vencido deverá ser condenado nas custas processuais (AgRg no AREsp. 206.581/MG, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 04/10/2016, DJe 19/10/2016)" (AgInt no REsp. 1.569.916/PE, Relator Ministro NEFI CORDEIRO, julgado em 22/3/2018, DJe 3/4/2018). 11. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp n. 2.175.205/CE, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 8/11/2022, DJe de 16/11/2022.) Desse modo, mesmo que o recorrente seja beneficiário da assistência judiciária gratuita, o artigo 804 do Código de Processo Penal estabelece a obrigação de condenação da parte vencida ao pagamento das custas processuais, podendo a exigibilidade do pagamento ser suspensa somente na fase de execução, pelo prazo de cinco anos. A par de tais considerações, embora o réu faça jus ao benefício da justiça gratuita, não há que se falar em isenção das custas nesta fase processual. DISPOSITIVO Em face do exposto, CONHEÇO dos presentes recursos, e, no mérito, NEGO PROVIMENTO aos interpostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL e pelo acusado BRUNO DOS SANTOS OLIVEIRA e DOU PROVIMENTO ao apelo apresentado por MARCOS FELIPE ALVES DE MACEDO, para absolvê-lo da prática do crime de roubo majorado (art. 157, §2º, II e §2º-A, I, do CP), cometido contra a vítima Robert Antônio dos Santos Alves, ao tempo que determino a expedição do competente alvará de soltura em seu favor, que deve ser posto, incontinenti, em liberdade, no que toca ao processo 0856034-83.2022.8.18.0140, a menos que esteja preso por outro motivo, mantendo-se os demais termos da sentença condenatória, em dissonância com os pareceres da Procuradoria-Geral de Justiça. Expeça-se o respectivo Alvará de Soltura. Em atenção ao Enunciado nº 24/2022, do Conselho Nacional de Justiça, DETERMINO que o respectivo Alvará de Soltura seja expedido, obrigatoriamente, no Banco Nacional de Medidas Penais e Prisões, sem a necessidade de sua confecção e assinatura no sistema PJE. Restam prejudicados os demais pedidos apresentados no recurso de Marcos Felipe Alves de Macedo, bem como o requerimento ministerial de decretação da prisão preventiva do réu Grigorio Mendes Frazão Junior. É como voto.
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Alemanha Veiculos Ltda. e outros x Francisco Jose Batista Do Nascimento
ID: 281243335
Tribunal: TJPI
Órgão: 4ª Câmara Especializada Cível
Classe: APELAçãO CíVEL
Nº Processo: 0003835-98.2014.8.18.0140
Data de Disponibilização:
27/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
VICENTE CASTOR DE ARAUJO FILHO
OAB/PI XXXXXX
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JARBAS GOMES MACHADO AVELINO
OAB/PI XXXXXX
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FRANCISCO DE ASSIS LELIS DE MOURA JUNIOR
OAB/PE XXXXXX
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FRANCISCO INACIO ANDRADE FERREIRA
OAB/PI XXXXXX
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ ÓRGÃO JULGADOR : 4ª Câmara Especializada Cível APELAÇÃO CÍVEL (198) No 0003835-98.2014.8.18.0140 APELANTE: ALEMANHA VEICULOS LTDA., BANCO VOLKSWAGEN S.A. Advoga…
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ ÓRGÃO JULGADOR : 4ª Câmara Especializada Cível APELAÇÃO CÍVEL (198) No 0003835-98.2014.8.18.0140 APELANTE: ALEMANHA VEICULOS LTDA., BANCO VOLKSWAGEN S.A. Advogado(s) do reclamante: JARBAS GOMES MACHADO AVELINO REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO JARBAS GOMES MACHADO AVELINO, VICENTE CASTOR DE ARAUJO FILHO REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO VICENTE CASTOR DE ARAUJO FILHO, CAMILA DE ANDRADE LIMA, MANUELA MOTTA MOURA DA FONTE APELADO: FRANCISCO JOSE BATISTA DO NASCIMENTO REPRESENTANTE: BANCO VOLKSWAGEN S.A. Advogado(s) do reclamado: FRANCISCO INACIO ANDRADE FERREIRA RELATOR(A): Desembargador FRANCISCO GOMES DA COSTA NETO EMENTA DIREITO DO CONSUMIDOR. APELAÇÕES CÍVEIS. VÍCIO DE QUALIDADE EM VEÍCULO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. BANCO DA MONTADORA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. REJEIÇÃO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. RECURSOS DESPROVIDOS. 1. Apelação interposta por Banco Volkswagen S.A. e outra parte visando à reforma de sentença que os condenou solidariamente ao pagamento de danos materiais e morais por vícios no veículo adquirido pelo autor, o qual não possuía os itens de segurança especificados no contrato (freios ABS e AIR-BAG). O banco alegou ilegitimidade passiva, argumentando que não participou diretamente da venda, sendo responsável apenas pelo financiamento. 2. Há duas questões em discussão: (i) definir se o Banco Volkswagen S.A. é parte legítima para responder pelos vícios do veículo, considerando que integra o grupo econômico da montadora; e (ii) estabelecer se os vícios no veículo adquiridos e os prejuízos causados ao consumidor justificam a indenização por danos materiais e morais. 3. O Banco Volkswagen S.A. é integrante do mesmo grupo econômico da montadora do veículo, enquadrando-se na cadeia de fornecedores, sendo, portanto, solidariamente responsável pelos vícios do produto, conforme previsto no art. 7º, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor (CDC). 4. O veículo adquirido pelo autor não possuía os itens de segurança especificados no contrato de compra, evidenciando vício de qualidade. O CDC, em seus arts. 18 e 35, assegura ao consumidor o direito de exigir o abatimento proporcional do preço ou a restituição dos valores pagos. 5. A responsabilidade dos fornecedores na cadeia de consumo é objetiva, não se exigindo prova de culpa. Não foi demonstrada nos autos a existência de excludentes de responsabilidade que pudessem afastar a condenação dos apelantes. 6. O dano moral é configurado pelo abalo à confiança do consumidor, que adquiriu um bem de alto valor acreditando em sua qualidade e segurança, mas foi surpreendido com a entrega de um produto defeituoso. A jurisprudência é pacífica no sentido de que tais circunstâncias ensejam indenização por danos morais. 7. Sentença mantida. Recursos desprovidos. ACÓRDÃO DECISÃO: Acordam os componentes do(a) 4ª Câmara Especializada Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, por unanimidade, conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do(a) Relator(a). RELATÓRIO Trata-se de APELAÇÕES CÍVEIS interposta por ALEMANHA VEÍCULOS LTDA (id. 15630356) e por BANCO VOLKSWAGEN S.A. (id.3010010), contra sentença proferida nos autos da ação de indenização por danos materiais e morais (processo 0003835-98.2014.8.18.0140) movida por FRANCISCO JOSÉ BATISTA DO NASCIMENTO. Na sentença impugnada (Id. 3009994), o juízo de primeiro grau julgou parcialmente procedente o pedido autoral, condenando os apelantes ao pagamento de indenização por danos materiais e morais ao apelado nos seguintes termos: a) condenar as requeridas, solidariamente, a restituírem a quantia referente ao valor dos itens faltantes na data da entrega do veículo, quais sejam: AIR BAG e freios ABS, a ser apurado em liquidação de sentença, quantia esta acrescida de correção monetária e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, desde a data do efetivo prejuízo (Súmula n° 43 do STJ); b) condenar as requeridas ao pagamento de danos morais no importe de R$ 2.000,00 (dois mil reais), devendo incidir juros de mora desde a citação e correção monetária a partir da presente data (Súmula 362, STJ); c) condenar as requeridas ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do art. 85, § 2° do CPC. Nas razões recursais (Id. 3010010), a 1ª apelante/ BANCO VOLKSWAGEN S.A. sustenta, em suma: (i) a ilegitimidade passiva do BANCO VOLKSWAGEN S.A.; (ii) a ausência dos requisitos de responsabilidade civil do recorrente por ato de terceiro (inexistência de responsabilidade solidária); (iii) a inexistência de defeitos no produto que justificassem a indenização de danos morais e danos materiais. A 2ª apelante/ ALEMANHA VEÍCULOS LTDA. aduz, nas suas razões recursais (id. 15630356): (i) a não incidência do art. 18, §1º, do CDC; (ii) inexistência de danos morais diante da inexistência de defeitos no produto; (iii) redução do quantum indenizatório referente aos danos morais. O autor apresentou contrarrazões recursais (ids 3010035 e 15630367), defendendo a manutenção da sentença, sob o argumento de que os vícios no produto e os danos sofridos foram devidamente comprovados. O preparo recursal foi devidamente recolhido (Id. 3010012 e 15630357). Vieram-me os autos conclusos. É o relatório. VOTO O Exmo. Senhor Desembargador FRANCISCO GOMES DA COSTA NETO(Relator): I. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE Recursos tempestivos e formalmente regulares. Preenchidos os demais requisitos de admissibilidade, conheço dos recursos. II. DA PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA LEVANTADA PELO 1º apelante/ BANCO VOLKSWAGEN S.A. Preliminarmente,o banco apelante sustenta a ilegitimidade passiva ad causam, sob o fundamento de que não deu causa ao problema relatado, uma vez que não é concessionário e não procedeu com atos de entrega do bem, cumprindo tão somente com seu múnus, qual seja, administrar a cota no período de normalidade contratual. Inicialmente, há de se pontuar que a relação jurídica entabulada entre as partes é regida pelas normas do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que restaram plenamente caracterizadas as figuras da consumidora e dos fornecedores de serviços, previstos respectivamente, nos artigos 2º e 3º da referida lei. Sobre o tema, a jurisprudência do STJ vem decidindo no sentido de que os agentes financeiros (bancos de varejo) que financiam a compra e venda de automóvel não respondem pelos vícios do produto, subsistindo o contrato de financiamento mesmo após a resolução do contrato de compra e venda, exceto no caso dos bancos integrantes do grupo econômico da montadora ("bancos da montadora"), in verbis: AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. COMPRA E VENDA DE AUTOMÓVEL. FINANCIAMENTO . VÍCIO DO PRODUTO. AUSÊNCIA DE VINCULAÇÃO ENTRE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA E REVENDEDORA. SOLIDARIEDADE. INEXISTÊNCIA . 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sedimentou-se no sentido de que, em ações de rescisão de contrato de compra e venda de veículo financiado, somente há responsabilidade solidária entre a instituição financeira e a revendedora de automóveis nos casos em que ambas são vinculadas, atuando a primeira como banco da segunda. Precedentes. 2 . No caso, como o banco agravado apenas realizou o financiamento do veículo, sem vinculação com a revendedora de automóveis, não há como ser reconhecida a sua responsabilidade por eventual vício do produto. 3. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no AREsp: 960264 DF 2016/0201083-8, Relator.: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Julgamento: 27/05/2024, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 04/06/2024) CIVIL. PROCESSO CIVIL. CONSUMIDOR. AGRAVO DE INSTRUMENTO . AÇÃO INDENIZATÓRIA C/C PEDIDO DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. TEORIA DA APARÊNCIA. CONCESSIONÁRIA . VEÍCULO. INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. CADEIA DE CONSUMO. PARCERIA COMERCIAL ENTRE A REVENDEDORA E O BANCO FINANCIADOR . MANUTENÇÃO DA CONCESSIONÁRIA NO POLO PASSIVO DA AÇÃO. 1. O artigo 7º, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor regula a regra geral de solidariedade da cadeia de fornecedores de produtos ou serviços, trazendo a ideia de reparação do consumidor-vítima, independente de quem efetivamente tenha contratado com ele. Nesse passo, a responsabilidade dos fornecedores é, em regra, de caráter objetivo, independente de comprovação de culpa, permitindo que seja visualizada a cadeia de fornecimento e, na hipótese de restar demonstrada a existência de mais de um autor da ofensa ao direito do consumidor, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo . 2. A aplicação dos conceitos, de fornecedor aparente e teoria da aparência, são diretrizes do Código de Defesa do Consumidor que permitem uma interpretação das normas e das situações fáticas em favor da parte mais fraca, no caso, o consumidor, sempre vulnerável e às vezes hipossuficiente. 3. Hipótese em que toda a negociação para a aquisição do veículo se deu nas dependências da concessionária agravada, que atuou na condição de intermediária na aprovação de financiamento bancário, o que demonstra a provável relação de parceria entre a instituição financeira e a concessionária, atraindo, em uma primeira análise, a aplicação da teoria da aparência e a consequente responsabilidade solidária entre os integrantes da cadeia de consumo . 4. Agravo de Instrumento conhecido e provido. (TJ-DF 07235328720238070000 1760206, Relator.: CARMEN BITTENCOURT, Data de Julgamento: 19/09/2023, 8ª Turma Cível, Data de Publicação: 02/10/2023) Assim, observa-se que os apelantes integram o mesmo grupo econômico, e o apelado, como destinatário final do produto (automóvel) e do serviço (financiamento bancário), deve-se ter em mente o art. 7º, parágrafo único, do CDC, que traz a regra geral de solidariedade da cadeia de fornecedores de produtos ou serviços. Destarte, não prospera a alegação de ilegitimidade passiva do banco, pois conforme preceitua os artigos 7º, parágrafo único, 18, 25, § 1º, e o artigo 34, todos do Código de Defesa do Consumidor, trata-se de responsabilidade solidária daqueles que, de alguma forma, participaram da cadeia de consumo. II. FUNDAMENTAÇÃO A controvérsia principal gira em torno da responsabilidade dos apelantes pelos danos materiais e morais suportados pelo autor, em razão de vícios no veículo adquirido. O apelado informou em sua exordial que adquiriu o veículo automóvel GOL, 1.0, ano 2013/2014 completo no valor de R$ 35.330,00 (trinta e cinco mil trezentos e trinta reais), com todos os itens descritos na nota fiscal anexada aos autos, mas que o veículo que lhe foi entregue não apresentava freios ABS e AIR-BAG. Para tanto, o apelado instruiu a exordial com documentação que aponta proposta de venda de 2 (dois) modelos de veículos, conforme se verifica nos Ids 3009987, pág. 48 e 50, de onde se infere que o valor da segunda proposta, um veículo GOL 1.0 completo, inclui os adereços de segurança AIR-BAG e freios ABS, pelo valor de R$ 35.330,00 (trinta e cinco mil trezentos e trinta reais). Depreende-se, assim, que o apelado se desincumbiu do ônus da prova de demonstrar que recebeu o veículo fora dos padrões aos quais as apelantes se comprometeram a entregar, ao passo que as apelantes não produziram provas que infirmassem a documentação amealhada pelo apelado. Ademais, deve-se observar que, em uma relação de consumo, a proposta vincula o proponente, conforme se extrai do art. 35, do CDC, in verbis: Art. 35. Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha: I - exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade; II - aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente; III - rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos. Outrossim, o Código de Defesa do Consumidor (CDC), em seu art. 18, impõe ao fornecedor a responsabilidade pelos vícios de qualidade que tornam os produtos impróprios ao uso a que se destinam, além de determinar que a responsabilidade das requeridas deve ser discutida em termos objetivos, nos termos dos arts. 12 e 14, do CDC, in verbis: Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos. § 1° O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I - sua apresentação; Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas. § 1° Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: I - a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; II - a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; III - o abatimento proporcional do preço. Ademais, uma vez configurada a responsabilidade objetiva dos apelantes, esses somente se eximem de sua obrigação de indenizar pelos danos morais e materiais, caso reste demonstrada a configuração de uma excludente, o que não restou demonstrado nos autos. Desse modo, seja em relação à existência do vício do produto, cujos defeitos não foram sanados no prazo de trinta dias, seja pela ausência de comprovação da causa excludente, merece reprodução a sentença por haver o Juízo a quo equacionado adequadamente a matéria, devendo ser mantida a condenação em danos materiais e morais. Os danos materiais porque ficou comprovado, pelos documentos acostados aos autos, que o automóvel pelo qual o apelado efetivou o pagamento deveria vir com AIR-BAG e freios ABS, estando o seu pedido de abatimento e a consequente devolução dos valores pagos subsumidos no art. 18, §1º, III do CDC. Sobre o dano moral, resta configurado diante do evidente abalo à confiança do consumidor, que adquiriu um bem de alto valor acreditando na sua qualidade e segurança, mas foi surpreendido por receber um veículo desprovido de itens de segurança, os quais não foram devidamente resolvidas pelos apelantes. A jurisprudência pátria é pacífica no sentido de que o descumprimento de obrigações por parte do fornecedor, especialmente em casos de vícios em produtos duráveis, enseja a reparação por danos materiais e morais. Nesse sentido, cito: APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO REDIBITÓRIA C/C INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL – AQUISIÇÃO DE VEÍCULO ZERO QUILÔMETRO – INFILTRAÇÃO DE ÁGUA NO INTERIOR DO VEÍCULO – VÍCIO ORIUNDO DE QUALIDADE RELACIONADO À FABRICAÇÃO – PRAZO DE TRINTA DIAS PARA CONSERTO NÃO RESPEITADO – SUBSTITUIÇÃO DO PRODUTO POR OUTRO NOVO – DIREITO POTESTATIVO – ESCOLHA QUE CABE AO CONSUMIDOR – ARTIGO 18, § 1º, DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – PEDIDO SUCESSIVO EM SEDE RECURSAL DE PAGAMENTO DO VALOR DO BEM, DE ACORDO COM A TABELA FIPE – INOVAÇÃO – ANÁLISE OBSTADA – PRESENÇA DOS REQUISITOS DO DEVER DE INDENIZAR – DANO MORAL COMPROVADO – VALOR MAJORADO – OBSERVÂNCIA AOS CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE – 1º APELO PARCIALMENTE CONHECIDO E DESPROVIDO, 2º APELO CONHECIDO E DESPROVIDO, 3º APELO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. O consumidor que adquire um veículo novo possui a legítima expectativa de que o bem seja confiável e funcione perfeitamente, não apresente problemas dissociados de sua regular utilização e nem falhas que coloquem em risco sua segurança e das demais pessoas. A constatação de vício oculto em veículo zero quilômetro enseja para o comprador o direito de reparação de danos materiais e morais. Consumidor que adquiriu um veículo zero quilômetro, mas poucos meses depois viu que seu veículo não poderia transitar em dias chuvosos, sob pena de se encher de água em decorrência de infiltrações . Com isso, passou a conviver com o mau odor causado pela retirada umidade dentro do veiculo, comparecendo uma série de vezes junto à concessionária para a identificação e solução do problema, os quais não foram sanados no prazo máximo de trinta dias, razão pela qual pode exigir a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso. A alegação trazida somente com as razões de apelação, não deduzida antes da sentença, constitui inovação recursal e não pode ser conhecida. Os transtornos gerados ao consumidor, que acaba de adquirir um veículo zero quilômetro e com defeitos, gera sentimentos de aflição, indignação, impotência e frustração, fatos que fogem da normalidade, impondo-se o dever de indenizar pelo dano moral suportado. A indenização por danos morais deve ser fixada em valor suficiente para reparar os danos causados e impingir ao fornecedor o dever de aprimorar a prestação de seus serviços . Deve ser majorado o valor da indenização por danos morais, a fim de melhor adequar o caráter compensatório, sancionador e dissuasório da indenização aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, à luz do que dispõem os arts. 5º , V , da CF e 944 do Código Civil. (TJ-MT - APELAÇÃO CÍVEL: 00072460520128110015, Relator.: DIRCEU DOS SANTOS, Data de Julgamento: 21/06/2024, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/06/2024) Diante disso, não há reparos a serem feitos à sentença recorrida, uma vez que se encontra em conformidade com as provas produzidas e com a legislação aplicável. III. DISPOSITIVO Com estes fundamentos, nego provimento aos recursos, mantendo a sentença de primeiro grau em todos os seus termos. Majoro os honorários advocatícios para o patamar de 15% (quinze por cento) do valor da condenação, nos termos do art. 85, §11º do CPC. Preclusas as vias impugnativas, dê-se baixa na distribuição de 2º grau com remessa dos autos ao juízo de origem. É como voto. Desembargador FRANCISCO GOMES DA COSTA NETO Relator
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