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Tribunal Regional Federal 1…
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TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 1° REGIAO consta em registros encontrados pelo Causa Na Justiça.
ID: 329693441
Tribunal: TJRR
Órgão: Turma Recursal de Boa Vista
Classe: RECURSO INOMINADO CíVEL
Nº Processo: 0800344-48.2024.8.23.0047
Data de Disponibilização:
21/07/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
RICARDO DE SALES ESTRELA LIMA
OAB/TO XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
TURMA RECURSAL DE BOA VISTA - PROJUDI
Avenida Glaycon de Paiva, 550 - Fórum da Cidadania - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-250 - Fone: (95)31984751
Turma R…
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Processo nº 0804296-49.2024.8.23.0010
ID: 276237579
Data de Disponibilização:
22/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ROBERTA BEATRIZ DO NASCIMENTO
OAB/SP XXXXXX
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JOSÉ LÍDIO ALVES DOS SANTOS
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
A…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida pelo Juízo do 4º
Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa Vista, que julgou
improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de Repactuação de Dívidas
C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte teor (EP 183.1):
Proc. n.° 0804296-49.2024.8.23.0010
SENTENÇA
GRACIANE PASSOS DE SOUZA ajuizou ação de repactuação de dívida por
superendividamento c.c pedido de tutela de urgência em face do BANCO DO BRASIL
S.A, BANCO SANTANDER S.A., CREFISA, FUPRES ADMINISTRADORA DE
CARTOES LTDA, BANCO DAYCOVAL S.A., AVANCARD PROMOÇÃO DE VENDAS
LTDA e BEMOL S/A, alegando, em síntese, que não consegue arcar com as despesas
referente aos contratos de empréstimos consignados realizados e que os descontos em
sua remuneração afetam sua sobrevivência, tendo o seu mínimo existencial
comprometido. Deu à causa o valor de R$ 431.415,81. Juntou documentos (EP's 1.2 a
1.19).
O pedido liminar restou indeferido, sendo concedida a gratuidade processual à parte
autora (EP 6).
Citados (EP's 39, 40, 41), os réus apresentaram contestação.
O BANCO MASTER S/A e PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA. (AVANCARD)
suscitou, em preliminar, a sua ilegitimidade passiva e impugnou a concessão da
gratuidade processual autoral. No mérito, arguiu a ausência de ato ilícito; a ausência dos
requisitos para aplicação da lei que trata do superendividamento; má-fé da autora na
contratação dos empréstimos, requerendo, ao final, o julgamento improcedente dos
pedidos formulados. Anexou documentos (EP 46).
A BEMOL S.A. suscitou, em sede preliminar, a inépcia da inicial. Quanto ao mérito,
sustentou que a parte autora não trouxe provas do direito pleiteado, requerendo o
julgamento de improcedência (EP 49).
A CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS S.A suscitou, em
preliminar, a inépcia da inicial; a falta de interesse de agir; além de impugnar a
gratuidade processual. No mérito, arguiu a legalidade dos contratos firmados, não
havendo que se falar em abusividade das termos pactuados, bem como um possível
aumento da taxa média e a, consequente, redução da oferta em caso de procedência,
diante da eventual insegurança jurídica, requerendo, ao final, o julgamento improcedente
dos pedidos formulados na exordial. Anexou documentos (EP 58).
O BANCO SANTANDER S/A consignou, preliminarmente, a inépcia da inicial, além de
impugnar a gratuidade processual e o valor atribuído à causa. No mérito, sustentou que
a parte autora não trouxe provas da ofensa ao seu mínimo existencial, ausentes,
portanto, as exigências previstas na lei de superendividamento, sendo válidos e
regulares os contratos firmados, invocando o princípio do pacta sunt servanda,
pugnando, ao final, pelo julgamento improcedente da demanda. Anexou documentos (EP
90).
A FUPRES ADMINISTRADORA DE CARTÕES LTDA suscitou, preliminarmente, a
impossibilidade de integração dos contratos; inépcia da inicial, impugnando a concessão
da gratuidade processual. No mérito, sustentou que os valores foram assumidos
voluntariamente pelo autor; a legalidade dos contratos firmados e a ausência das
exigências previstas na lei de superendividamento, pugnando, ao fim, pela
improcedência dos pedidos. Na oportunidade, acostou documentos (EP 93).
O BANCO DAYCOVAL S.A afirmou, em preliminar, a ausência do interesse de agir e a
inépcia da inicial, impugnando o valor da causa; a gratuidade processual e a capacidade
postulatória. No mérito, sustentou que a parte autora não comprovou o
superendividamento; que inexiste ofensa ao mínimo existencial; a legalidade do contrato;
a preservação do princípio do pacta sunt servanda; e a sua boa-fé na celebração dos
empréstimos, requerendo que os pedidos sejam julgados improcedentes. Apresentou
documentos (EP 94).
O BANCO DO BRASIL S.A. sustentou, preliminarmente, a inépcia da inicial, impugnando
a concessão da gratuidade processual, além do valor atribuído à causa. No mérito,
sustentou a improcedência da ação em face da ausência dos requisitos para a aplicação
da lei de superendividamento e a legalidade dos contratos, invocando o princípio do
pacta sunt servanda. Juntou documentos (EP 95).
Designada e realizada audiência de conciliação, a mesma restou frutífera somente em
relação à corré CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, sendo
homologada a transação e, na mesma ocasião, reconhecida a ilegitimidade passiva do
réu PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA (AVANCARD) (EP 121).
A parte autora demonstrou seu interesse na instauração do processo por
superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas
com a apresentação de minuta do plano judicial compulsório (EP 128).
Instadas acerca da produção de outras provas (EP 134), restou indeferido o pedido de
prova documental, anunciando-se o julgamento antecipado da lide (EP 159) sem
oposição pelos litigantes (EP's 175 a 181).
É o relatório.
Fundamento e DECIDO.
Desnecessária maior dilação probatória, a teor do disposto no inciso I do art. 355 do
Código de Processo Civil, sendo certo que, na análise do julgamento antecipado da lide,
vigora a prudente discrição do magistrado no exame da necessidade ou não da
realização de outras provas, ante as circunstâncias de cada caso concreto e a
necessidade de não ofender o princípio do pleno contraditório. No caso em tela, a lide
comporta pronto julgamento, dada pois a questão é eminentemente de direito e os
documentos coligidos aos autos são amplamente suficientes ao deslinde da questão
controvertida.
De proêmio, RECHAÇAM-SE as teses preliminares arguidas pelos requeridos.
Deveras, não prospera a preliminar de inépcia da inicial, uma vez que, da narrativa
contida na exordial, extrai-se que os pedidos formulados são certos e determinados, bem
como que há compatibilidade entre eles, sendo perfeitamente identificável a causa de
pedir e a lógica da narrativa fática. Ademais, registra-se que os requisitos legais para
subsunção da lei de superendividamento (Lei 14.181/21), serão apreciados na análise do
mérito.
Quanto à alegação de falta de interesse de agir, a tese não se sustenta, haja vista o
princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição, conforme preceitua o art. 5°,
inciso XXXV, da Constituição Federal, considerando, ainda, que a parte autora
demonstra a necessidade de buscar a tutela jurisdicional para proteger, resguardar ou
conservar o seu direito (necessidade-adequação), seja no julgamento de mérito
procedente ou não, máxime para eventual repactuação de suas dívidas, haja vista a
impossibilidade de pactuação/transação administrativa.
No que tange a gratuidade processual, mantenho a benesse outrora deferida, haja vista
a ausência de elementos em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Lado outro, quanto à impugnação ao valor da causa, o pedido comporta parcial
acolhimento. Explico.
In casu, a soma dos débitos contratuais com as partes requeridas é R$ 431.415,81,
sendo que a presente repactuação e eventual renegociação das dívidas, nos moldes
apresentados na inicial, o seu proveito econômico corresponderia apenas a
diminuição/abatimento dos valores citados. Destarte, com a minuta do plano de
repactuação, em caso de homologação por este Juízo, a soma total das dívidas da parte
autora não mais seria de seria de R$ 431.415,81, mas sim de R$ 146.704,14, conforme
primeiro plano de repactuação apresentado. Ou seja, o real proveito econômico seria de
R$ 284.711,67, valor este que deve ser atribuído à causa. Nesse sentido, colaciono o
seguinte julgado, verbis: (…)
Em sendo assim, fixo o valor da causa em R$ 284.711,67, proveito econômico
efetivamente buscado pela parte autora com a presente ação. Retifique-se. Anote-se.
No que tange à (im)possibilidade de repactuação/integração dos contratos/dívidas do
consumidor, a matéria confunde-se com o
meritum causae
e com ele será
analisado/decidido.
Por fim, a capacidade postulatória da parte restou comprovada, haja vista estar
representada por advogado habilitado e com instrumento de mandato subscrito
digitalmente, na forma da lei.
Ultrapassadas tais questões, adentrando ao mérito, tenho que os pedidos iniciais não
prosperam.
De proêmio, convém ressaltar tratar-se de inequívoca relação de consumo, pois os
contratos bancários também se submetem à legislação de proteção e defesa dos direitos
do consumidor, por força do que dispõe o artigo 3º, § 2º, da Lei nº 8.078/90. Ademais, é
pacífico que a relação jurídica estabelecida entre as partes está inserida no âmbito das
relações de consumo, conforme corrobora o teor do Enunciado 297 da Súmula do E.
Superior Tribunal de Justiça:
“O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”
A controvérsia cinge-se à repactuação de dívida, na qual a parte autora fundamenta a
sua pretensão nos preceitos da Lei 14.181/21, que alterou dispositivos do CDC. De outra
banda, os credores requeridos, em suma, impugnam a pretensão sob o argumento de
ausência dos requisitos legais.
O superendividamento, conceituado como a “inviabilidade de pagamento da totalidade
dos débitos consumeristas (vencidos e vincendos) sem comprometimento do mínimo
existencial pelo consumidor pessoa natural e de boa-fé” (CDC, 54-A, § 1º), foi
regulamentado a partir da Lei n. 14.181/21, que introduziu modificações esparsas no
CDC e no Estatuto da Pessoa Idosa. Trata-se de instituto fundamentado no princípio da
boa-fé objetiva, mais precisamente nos deveres de cooperação e lealdade para a
evitação da ruína do outro contratante (exceção da ruína).
Ainda, o art. 54-A, do mesmo diploma legal, elucida que:
'Entende-se por
superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de
boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem
comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação'.
A mencionada regulamentação foi realizada por meio do
Decreto Federal nº
11.150/2022, que estipulou como mínimo existencial a renda mensal do consumidor
pessoal natural, estando previsto atualmente, o valor equivalente a R$ 600,00 (caput, art.
3º).
Ademais,
a
aplicabilidade
das
normas
de
prevenção
e
tratamento
do
superendividamento pressupõe a diferenciação entre o superendividamento ativo e o
superendividamento passivo. O primeiro decorre do endividamento voluntário, e pode se
dar de modo consciente (por ação de má-fé, com intenção deliberada de fraude a
credores em razão da prévia ciência quanto à incapacidade de pagamento), hipótese em
que não se aplicam as normas de prevenção e tratamento, ou de modo inconsciente (por
ação negligente/imprudente, em razão da contratação por impulso ou da não fiscalização
de despesas). Já o segundo é oriundo do endividamento involuntário, decorrente de
fatores externos que obrigam o indivíduo a suportar despesas superiores às suas
receitas (desemprego, divórcio, doença, dentre outras).
Registra-se que o processo de repactuação de débitos, regulado no art. 104-A do CDC,
é instaurado pelo juiz a requerimento do consumidor superendividado e visa, em uma
primeira etapa, à conciliação (obtenção de acordo entre o devedor e os credores). Caso
não seja celebrado acordo, passa-se então ao processo por superendividamento,
regulado no art. 104-B do CDC (2ª fase), também instaurado pelo juiz a requerimento do
consumidor superendividado e, nessa segunda etapa, objetiva a (i) revisão ou integração
de contratos; (ii) repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial
compulsório.
Importante anotar que o plano judicial compulsório (CDC, art. 104-B, § 4º) deve
assegurar aos credores, no mínimo, o valor principal do débito, atualizado com o
adimplemento integral em, no máximo 5 (cinco) anos, com a primeira parcela devida no
prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da homologação e as demais
mensais e sucessivas.
Logo, para a repactuação de dívidas e usufruto dos benefícios da lei, a parte autora
superendividada deve preencher os seguintes requisitos: 1) insuficiência de renda; 2) ser
devedor de boa-fé, ou seja, em razão de sua renda ser inferior ao que acumulou em
dívidas; 3) as dívidas devem ser decorrentes de relações de consumo comum, não
podendo incluir aqui consumos luxuosos, de alto valor; 4) em hipótese alguma as dívidas
devem ser decorrentes de má-fé, ou seja, dívidas contraídas com intuito fraudulento; 5) a
petição inicial deve conter um plano detalhado da forma/prazo de pagamento; e 6) a
indicação da renda familiar.
Uma vez firmadas tais premissas, no caso ora em apreço, passa-se ao exame do
preenchimento dos requisitos legais para a repactuação de dívidas.
Da análise dos autos, extrai-se incontroversa a existência de empréstimos adquiridos
pela parte autora junto às instituições financeiras rés.
In casu, verifica-se que parte autora não comprovou sua condição de consumidora
superendividada, deixando de demonstrar a impossibilidade em arcar com o pagamento
dos débitos sem prejuízo do mínimo existencial, bem como ausência de má-fé ou de
fraude na obtenção das dívidas.
Com efeito, não trouxe o(a) requerente cópias das faturas de cartão de crédito e extratos
bancários, com detalhamento de compras realizadas, quando da origem dos débitos,
para comprovação do risco à garantia do mínimo existencial, configurando, outrossim,
contradição, ao menos pela ausência de prova constituída acerca da real e efetiva
condição financeira do(a) requerente.
Ademais, conforme narrado em petição inicial, a requerente, como servidora pública em
atividade, aufere renda bruta de R$ 9.772,62, sendo que após descontos/retenções
legais e empréstimos resta o valor líquido de R$ 875,79.
Portanto, constata-se que remanescem após o pagamento de todos os débitos a
quantia de R$ 875,79, valor que está além da quantia prevista no art. 3º do Decreto
Federal no 11.150/2022 como mínimo existencial, situação incompatível com o rito
das ações de superendividamento (CDC, § 1º, art. 104-A), máxime considerando a
ausência
de
prova,
pelo(a)
demandante,
dos
alegados
gastos
não
consignados/cotidianos.
Destaca-se, ainda, que a parte autora é servidor(a) público(a) em atividade, com fonte de
renda bruta superior a R$ 9.000,00, sendo que, por certo, faz jus ao recebimento dos
beneplácitos de 13º salários e de férias, o que, por si só, consiste em expressivas
quantias complementativas a suas remunerações ordinárias, capazes de afastar
qualquer alegação de ofensa ao seu mínimo existencial. Nesse passo, a renda da parte
autora não pode, sob qualquer métrica, ser caracterizada como comprometedora do
mínimo vital para sua sobrevivência.
Ainda, observa-se a ausência de documentos a demonstrar gastos rotineiros da parte
autora, especialmente se é o(a) único(a) a sustentar sua família (esposo(o) e filhos,
incluindo uma maior de idade - EP 1.13), deixando a demandante de comprovar que é
arrimo/sustento da sua família, sequer comprovando os gastos/repasses/despesas. A
esse respeito, é cediço ser obrigação do pai e da mãe arcar com a manutenção dos
filhos na proporção da capacidade financeira de cada qual (CC, art. 1.703). Ainda,
denota-se da qualificação autoral que esta é casada, sendo que nada foi juntado acerca
da (im)possibilidade de seu companheiro e/ou genitor do(s) seu(s) filho(s), em arcar com
tais custos e em que quantia.
Não se pode perder de vista que também nada trouxe aos autos com relação à renda
familiar. Ocorre que, para a repactuação de dívida pretendida, com a preservação do
mínimo existencial à família seria necessária a apuração de toda a renda familiar e todas
as suas despesas, o que não se extrai dos autos, dada a ausência de documentações
em tal sentido.
Da mesma forma, verifica-se na fatura de cartão de crédito da autora (EP 1.13, 1.14
e 1.15) diversas compras realizadas recentemente e com extenso lapso para
pagamento, sem a efetiva demonstração da sua essencialidade (p. ex. RORAIMA
PISCI PARC 09/12 - R$ 843,00, CACULAO PARC 08/12 - R$ 191,11, dentre outras -
EP 1.16), inclusive em outro Estado da Federação - AIRBNB PAGAM PARC 02/02
SAO PAULO - R$ 293,16 - EP 1.9), mesmo diante de tais fatos serem consignados em
decisão de indeferiu pedido de urgência, fator contraditório para quem afirma ter sua
dignidade financeira atingida.
Acrescenta-se que, a minuta do plano compulsório apresentado pela parte autora (EP
128), em confronto com os demais documentos juntados pelos réus nas contestações
apresentadas, não contempla sequer o pagamento do valor do principal devido, corrigido
monetariamente por índices oficiais de preço, o que reforça a impossibilidade do
acolhimento dos pedidos autorais.
Mais a mais, compulsando os documentos juntados pela parte autora (EP 1.17),
observa-se, logo após o recebimento de seus proventos/remuneração, a realização de
transferências, via pix, e aplicação em conta poupança, inclusive, de valores
consideráveis (R$ 10.000,00 - EP 1.17 - pag. 3), sem, contudo, esclarecer as
destinações/finalidades dos pagamentos, depósitos e recebimentos, bem assim trazer a
Juízo extrato bancário das contas (poupança ou não) a que destinadas as transferências,
não havendo que ser falar em ofensa ao mínimo existencial.
Nesse sentido, observa-se que a parte autora também não trouxe qualquer
elemento para justificar a necessidade/motivo da realização dos empréstimos junto
às instituições financeiras, incluindo um valor superior a R$ 140.000, 00 com
apenas um único requerido (EP 95) fator preponderante a demonstrar sua boa-fé
na contratação das dívidas que pretende repactuar.
Ademais, insta consignar que os documentos apresentados não permitem concluir, com
precisão, o que levou o(a) requerente ao suscitado superendividamento e tampouco do
destino das expressivas quantias levantadas junto ao requerido, restando impossível a
verificação da sua boa-fé para subsunção à lei de superendividamento.
Ainda, a parte autora não comprova qualquer dado externo que tenha lhe acarretado a
alteração patrimonial, tais como redução drástica do salário, perda do emprego,
problemas de saúde ou outro fator que tenha, efetivamente, afetado sua conjuntura
econômica quando da época dos empréstimos/dívidas.
Deveras, cabe ao consumidor evidenciar a sua incapacidade de quitar as obrigações
contraídas, as quais visam atender a uma necessidade pessoal extraordinária decorrente
de infortúnios da vida ou eventos imprevisíveis (endividamento involuntário). Fora dessas
circunstâncias excepcionais, considera-se mero descontrole pessoal das finanças, não
enquadrado nos parâmetros da teoria do superendividamento.
Anota-se que incumbe à parte autora comprovar que tomou os valores para as despesas
básicas de subsistência, pois a repactuação não tem amparo legal quando as dívidas
que ' decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor'
(CDC, § 3º, art. 54-A).
Dito isto, acrescenta-se que pelo contexto da petição inicial, é possível aferir que o
pedido de redução dos descontos dos empréstimos fora baseado no suposto
superendividamento da parte autora e extrapolação do patamar máximo de margem
consignável, qual seja de 30%.
Com efeito, o objetivo da norma protetora ao consumidor (Lei de Superendividamento)
não foi criar uma regra matemática para subsunção aos benefícios previstos na lei, de
modo que a ofensa ao mínimo existencial demanda demonstração inequívoca de ofensa
à dignidade financeira do cidadão, não havendo que se falar em percentual fixo de sua
remuneração.
Deveras, o direito à repactuação das dívidas não possui caráter potestativo,
independente da vontade do credor, autorizando que o consumidor, unilateralmente,
aponte quantia que entende justa e adequada para sua renda, passando a ter direito a
solver somente tal importe. Se assim fosse, a adoção de tal entendimento representaria
uma grande insegurança jurídica, já que o credor estaria condicionado ao assentimento
exclusivo do consumidor, o que comprometeria o recebimento do crédito concedido em
medida verdadeiramente significativa, acabando por desaguar em aumento do custo do
crédito, ou seja, em elevação sistêmica dos juros, bem como em limitação das linhas de
crédito, prejudicando os consumidores de maneira global.
Por esta razão, o legislador estabeleceu rito, critérios e condições para se obter a
repactuação pretendida, disposições que precisam ser respeitadas, sob pena de
subversão do propósito normativo e geração de relevantes efeitos colaterais para o
próprio consumidor. Assim, não se pode, com lastro em tal previsão normativa, restringir
os débitos com lastro apenas na indicação de percentual que o consumidor julga
adequado, pois este deve ser fixado consoante os parâmetros previstos nos art. 104-A e
B do CDC.
Em outras palavras, não se olvide que o cenário é de ENDIVIDAMENTO, jamais de
SUPERENDIVIDAMENTO, nos termos da legislação de regência. E para essa situação
de endividamento, a qual não está acobertada pelas regras excepcionais dos arts. 54-A
e 104-A e seguintes do CDC, deverá a parte buscar as medidas legais para
adequação/renegociação contratual, afastando-se na situação em comento a imposição
de plano compulsório de pagamento ao réu.
Seja como for, ainda que admitidos os números do(a) requerente, e pese a alegada
afetação dos vencimentos às dívidas bancárias, fato é que o remanescente disponível
não implica em risco/ofensa/violação ao 'mínimo existencial', garantindo-se montante
capaz de atender as necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene
e transporte e etc, implicando apenas em redução de sua capacidade financeira, mas
não em vulnerabilidade econômica/financeira, elemento fundamental para a configuração
do superendividamento e embasamento para a concessão do manto protetivo do regime
de excepcionalização do pacta sunt servanda, sob pena de ofensa à segurança jurídica.
Com a devida venia, a intenção do legislador na criação de institutos que beneficiam aos
consumidores, como o enquadramento no conceito de superendividamento (Lei n.
14.181/21), não busca garantir à pessoa superendividada o alto padrão de vida que
detinha antes do endividamento, mas garantir o mínimo existencial para a sua
sobrevivência, o que, no caso em comento, está garantido pelo valor residual pós
descontos dos vencimentos do(a)requerente.
Ademais, não se tem notícia de que o(a) demandante é pessoa idosa, pródiga ou de
precária educação, sendo vedada à aplicação da repactuação de dívidas, aquelas
oriundas de contratos dolosamente celebrados sem o propósito de realizar pagamento,
nos termos do §1º do artigo 104-A do CDC.
A esse respeito, registra-se que a parte autora confirma que celebrou os contratos com o
banco réu, com taxas de juros pactuadas e previamente conhecidas, não alegando em
nenhum momento qualquer vício de consentimento.
Nessa direção, o entendimento jurisprudencial, verbis: (…)
Sendo assim, verifica-se que o(a) requerente deixou de provar o fato constitutivo de seu
direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram juntados aos autos documentos que
deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de pessoa superendividada nos termos
da lei, não havendo que se falar na realização de repactuação de dívidas da forma
pretendida.
Portanto, o(a) autor(a) não trouxe aos autos elementos aptos e suficientes que
comprovem o preenchimento dos requisitos acima elencados, sobretudo o
comprometimento do mínimo existencial, o que implica em óbice ao prosseguimento da
demanda e homologação de eventual plano de repactuação judicial compulsório em
detrimento dos credores.
Com efeito, resta manifesta a ausência no preenchimento dos requisitos legais, em
especial a alegada ofensa ao 'mínimo existencial' e, por conseguinte, a incomprovada
situação de superendividamento, forçoso concluir a inexistência do pressuposto de
procedibilidade para o procedimento especial previsto no art. 54-A, 104-A e seguintes do
CDC, ensejando, pois, a extinção irresolutiva da fase de conhecimento.
ANTE O EXPOSTO e, analisando tudo mais que dos autos consta, com fulcro na
fundamentação supra, julgo EXTINTA a fase de conhecimento, sem resolução do mérito,
reconhecendo a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido
e regular do processo, na forma do art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil.
Em razão da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento de custas processuais
e honorários advocatícios, que ora arbitro no patamar de 10% (dez por cento) sobre o
valor atualizado da causa, nos termos do § 2º do art. 85 do Código de Processo Civil,
contudo, suspensa a exigibilidade, haja vista se tratar de parte beneficiária da gratuidade
processual, mantendo-se a benesse outrora deferida, haja vista a ausência de elementos
em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Retifique-se o valor da causa para R$ 284.711,67.
Certifique a Serventia a existência de agravo de instrumento pendente de julgamento e,
em caso positivo, comunique-se à instância recursal acerca da presente sentença.
Sem prejuízo, considerando a possibilidade de ajuizamento de demandas repetitivas ou
em massa e em atenção a Nota Técnica CIJERR 04/2024, encaminhe-se cópia da
presente sentença ao Centro de Inteligência da Justiça Estadual de Roraima (CIJERR)
para conhecimento e providências que entender cabíveis (via SEI).
Na hipótese de interposição de recurso de apelação, por não haver mais juízo de
admissibilidade a ser exercido pelo Juízo a quo (CPC, art. 1.010), sem nova conclusão,
intime-se a parte contrária para oferecer resposta no prazo de 15 (quinze) dias.
(…) (grifos originais)
Irresignada, nas razões recursais a apelante aduz (EP 198.1), em síntese, […] que
recebe mensalmente a quantia de R$ 431.415,81 (quatrocentos e trinta e um mil, quatrocentos
e quinze reais e oitenta e um centavos); que após os descontos obrigatórios como PRESSEM e
Imposto de Renda no valor de 1.622,39 (mil seiscentos e vinte e dois reais e trinta e nove
centavos). Resta para a parte somente a quantia de R$ 8.150,23 (oito mil cento e cinquenta
reais e vinte e três centavos); que a situação de superendividamento de uma pessoa não se
pode usar fórmulas prontas e moldadas para outras situações; que ficou claro que a parte
Apelante não tem condições financeiras de arcar com todas as suas dívidas e manter um
padrão de vida digno; que a parte Apelante possui encargos nanceiros mensais oriundos de
contratos celebrados junto aos Apelados, que, quando somados, correspondem ao valor de
R$7.274,44 (sete mil, duzentos e setenta e quatro reais e quarenta e quatro centavos),
equivalente a MAIS DE 89% DE SUA RENDA LÍQUIDA; que o valor que resta para parte
Apelante é ínfimo, pois não é suficiente para custear suas despesas básicas, como moradia,
saúde, alimentação, despesas médicas, educação e etc.; que tais dívidas têm comprometido
substancialmente o mínimo existencial da parte Apelante. […]
Calcada nesses argumentos, requer o provimento do recurso para:
a) Seja reconhecida a inconstitucionalidade dos Decretos ns. 11.150/2022 e
11.567/2023, tendo em vista que afronta com a dignidade da pessoa humana;
b) Que a Sentença seja reformada para acolher os pedidos formulados na petição inicial
e torne o plano de pagamento ora apresentado em plano judicial compulsório com o seu
início no mês subsequente à data da sentença;
c) condenar a parte Requerida ao pagamento de custas processuais, despesas e
honorários advocatícios.
Certidão atestando a tempestividade do recurso e a ausência do recolhimento do
preparo (EP 7.1), pois a parte apelante é beneficiária da gratuidade da justiça.
Certidão atestando a tempestividade das contrarrazões contidas nos EPs 212.1, 219.1
e 220.1 (EP 6.1).
O relatado é suficiente.
Inclua-se na pauta de julgamento eletrônico, nos termos do art. 109 do RITJRR.
Intimem-se
Boa Vista - RR, 12 de maio de 2025.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
VOTO
Conforme relatado, trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida
pelo Juízo do 4º Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa
Vista, que julgou improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de
Repactuação de Dívidas C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte
teor (EP 183.1).
Em suma, a apelante requer o provimento do recurso de apelação para que a sentença
de primeiro grau seja reformada.
Os apelados, nas contrarrazões, defendem a manutenção integral da sentença.
Pois bem.
Antes do mais, convém relembrar que não compete ao segundo grau, em regra, julgar
a causa novamente, justamente por se tratar de instância revisora, mas reanalisar a sentença
nos termos da irresignação do apelo.
Dito isso, e após análise detida dos elementos contidos nos autos, constata-se que o
apelo não comporta acolhimento.
Isto porque, em suas razões recursais, a apelante não se insurge contra os
fundamentos da sentença. Ao contrário, a rigor repete ipsis litteris as teses apresentadas na
petição inicial (EP 1.1), que não se presta a atacar a fundamentação que levou o juízo “a quo” a
rejeitar a pretensão inicial.
Dito de outra forma, a parte apelante deixou de apresentar qualquer fundamento capaz
de infirmar a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo, pois ausente a formulação
crítica necessária para se opor aos fundamentos lançados na sentença.
Logo, contra os fundamentos adotados na decisão não existem, nos autos, motivos
pelos quais se possa considerar que o direito não tenha sido bem aplicado.
Ademais, o artigo 1.010, incisos II a IV, do Código de Processo Civil exige que na peça
de apelação constem a exposição do fato e do direito, as razões do pedido de reforma ou de
decretação de nulidade e o pedido de nova decisão.
Da mesma maneira, o pedido não pode ser genérico, mas deve especificar as matérias
decididas que o recorrente reputa devam ser alteradas, de forma que o juízo ad quem possa
julgar o cabimento e provimento do recurso adequadamente.
No caso em exame, contudo, não há nas razões recursais qualquer menção ao que foi
decidido na sentença proferida em primeiro grau de jurisdição, limitando-se a parte apelante a
reproduzir integralmente os argumentos utilizados com o objetivo de contestar a ratio decidendi
utilizada pelo julgador primevo, o que, por óbvio, seria o suficiente para o não conhecimento do
recurso, por violação ao princípio da dialeticidade recursal.
Para corroborar essa afirmação, confira-se a jurisprudência remansosa desta Corte de
Justiça sobre o tema:
PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL.
PRINCÍPIO
DA
DIALETICIDADE.
NÃO
CONHECIMENTO
DO
RECURSO.
HONORÁRIOS MAJORADOS.1. Apelação interposta contra sentença que julgou
improcedentes embargos à execução fiscal promovida pela Fazenda Pública do Estado
de Roraima, fundamentada em multa aplicada pela Agência de Defesa Agropecuária de
Roraima (ADERR) por armazenamento irregular de agrotóxicos sem autorização legal,
no valor de R$ 45.543,20. A sentença afastou a alegação de ilegitimidade passiva ao
entender que a responsabilidade pela infração decorre da guarda indevida dos produtos,
independentemente da sua titularidade.2. A recorrente alega ilegitimidade passiva, sob o
argumento de que os produtos pertenciam a terceiro e foram armazenados por engano
em área anexa à empresa, sem responsabilidade direta da apelante.3. Princípio da
dialeticidade: O recurso deve atacar especificamente os fundamentos da decisão
recorrida. A repetição de argumentos afastados na sentença, sem enfrentamento dos
principais fundamentos, compromete a admissibilidade do apelo, nos termos do art. 932,
III, do CPC.4. No caso, a apelação limita-se a repetir a tese de ilegitimidade passiva sem
enfrentar a essência da decisão: a irrelevância da titularidade dos produtos para a
configuração da infração administrativa, fundada no armazenamento sem autorização.5.
Não se verifica cerceamento de defesa. O indeferimento da oitiva de testemunhas não
prejudicou o julgamento, uma vez que as provas colhidas na fase administrativa e judicial
foram consideradas suficientes. A apelante não demonstrou de forma concreta como a
ausência da prova comprometeria seu direito de defesa.6. Gratuidade de justiça: o
benefício foi concedido na fase inicial e permanece válido no grau recursal, nos termos
do art. 98, § 1º, VIII, do CPC, tornando prejudicado novo pedido formulado pela
apelante.7. Honorários advocatícios recursais majorados de 10% para 15%, conforme
art. 85, § 11, do CPC, observada a gratuidade de justiça já deferida.8. Recurso não
conhecido. Honorários majorados. (TJRR – AC 0810795-83.2023.8.23.0010, Rel. Des.
ERICK LINHARES, Câmara Cível, julg.: 31/10/2024, public.: 31/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C COBRANÇA –
PROGRESSÃO FUNCIONAL – SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. 1ª APELAÇÃO:LEI
N.º 1.611/2015 – APLICAÇÃO – RECONHECIMENTO ADMINISTRATIVO DO DIREITO
POSTULADO – PERDA DO INTERESSE PROCESSUAL – INEXISTÊNCIA DE
DEMONSTRAÇÃO DE ERRO NO REENQUADRAMENTO REALIZADO PELO
MUNICÍPIO DE BOA VISTA – VERBAS RETROATIVAS DEVIDAS - DIFERENÇAS
SALARIAIS NÃO ATINGIDAS PELA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – RECURSO
DESPROVIDO
–
SENTENÇA
MANTIDA.
2ª
APELAÇÃO:
AUSÊNCIA
DE
DIALETICIDADE RECURSAL – RECURSO NÃO CONHECIDO. (TJRR – AC
0802853-97.2023.8.23.0010, Rel. Des. TÂNIA VASCONCELOS, Câmara Cível, julg.:
19/12/2024, public.: 19/12/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. INSCRIÇÃO DO NOME DO SÓCIO NA CDA.
AUSÊNCIA DE SUA PARTICIPAÇÃO NO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO COMO
PARTE. RAZÕES DO APELO QUE REPETEM, EM PARTE, AS MESMAS JÁ
LANÇADAS NA CONTESTAÇÃO. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. INDICAÇÃO DE
PRECEDENTES DO STJ QUE NÃO SE AMOLDAM À HIPÓTESE DOS AUTOS.
RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, DESPROVIDO.
1. A simples repetição, nas razões do apelo, dos argumentos lançados na fase de
conhecimento, impõe o não conhecimento desses argumentos por não observância do
princípio da dialeticidade. 2. Mostra-se escorreita a sentença que reconhece a
ilegitimidade passiva do sócio que não integrou o procedimento administrativo fiscal na
qualidade de parte, conforme precedentes do STJ e do egrégio TJRR acerca do tema.
(TJ-RR - AC: 0831030-13.2019.8.23.0010, Relator: ELAINE BIANCHI, Data de
Julgamento: 25/04/2021, Câmara Cível, Data de Publicação: 26/04/2021)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO - OFENSA AO PRINCÍPIO DA
DIALETICIDADE - NÃO CONHECIMENTO DO INCONFORMISMO. 1. O princípio da
dialeticidade recursal exige a impugnação integral e específica de cada um dos
fundamentos da decisão recorrida, sob pena de não conhecimento do recurso. 2.
Olvidando a embargante de tal ônus, impõe-se o não conhecimento dos declaratórios.
(TJ-RR - EDecAC: 72119027220168230010 7211902-72.2016.8.23.0010, Relator: Des.
Cristóvão Suter, Data de Publicação: DJe 09/10/2019, p.)
No entanto, embora o presente recurso, a rigor não pudesse sequer ser conhecido
porque não atacou os fundamentos da sentença; a fim de evitar argumentos de violação à
ampla defesa e acesso ao duplo grau de jurisdição, conheço do recurso e passo à análise do
mérito da controvérsia.
In casu, o juizo a quo julgou improcedente a demanda por ausência de documentação
apta a comprovar a condição de superendividada, já que a parte autora, ora apelante, “deixou
de provar o fato constitutivo de seu direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram
juntados aos autos documentos que deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de
pessoa superendividada nos termos da lei, não havendo que se falar na realização de
repactuação de dívidas da forma pretendida”.
Ou seja, a parte apelante não forneceu os documentos necessários para que o
magistrado senteciante pudesse aferir, com convicção, a sua alegada condição de
superendividada.
Dito de outra forma, não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o
comprometimento do mínimo existencial, razão pela qual deve ser preservada a autonomia das
vontades, visto que os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e
consciente pelas partes.
Assim, infere-se que a ratio decidendi utilizada pelo magistrado sentenciante para julgar
improcedente a pretensão autoral merece ser mantida por seus próprios fundamentos, a qual
adoto como razão de decidir para conhecer do recurso, mas negar-lhe provimento.
Em reforço à conclusão adotada pelo juízo a quo, confira-se a jurisprudência pátria
sobre o tema:
APELAÇÃO
CÍVEL.
Ação
revisional.
Repactuação
de
dívidas.
Lei
do
Superendividamento. Ausência de comprovação documental ou dos requisitos para a
pretendida limitação nos pagamentos devidos. Higidez contratual reconhecida. Sentença
de improcedência mantida. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJ-SP - Apelação Cível:
0000507-73.2023.8.26.0577 São José dos Campos, Relator: Emílio Migliano Neto, Data
de Julgamento: 21/02/2024, 23ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação:
21/02/2024)
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÉBITO - LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO DE
SUPERENDIVIDADO DO CONSUMIDOR - IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. Nos termos
da Lei nº 14.181/2021, que visa dispor sobre formas de prevenção e solução da situação
de superendividamento dos consumidores, entende-se nessa situação, fazendo jus,
portanto, à repactuação de débitos, a pessoa natural, de boa-fé, que evidencia a total
impossibilidade de adimplir a suas dívidas de consumo sem comprometer seu mínimo
existencial. Ausente as provas de tais circunstâncias, deve ser mantida a improcedência
da pretensão inicial. (TJ-MG - Apelação Cível: 5001170-35.2023.8.13.0241
1.0000.24.174736-9/001, Relator: Des.(a) Arnaldo Maciel, Data de Julgamento:
07/05/2024, 7ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 15/05/2024)
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CIVIL E PROCESSUAL
CIVIL. PROCESSO SOB O RITO ESPECIAL DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
SUPERENDIVIDAMENTO.
AFETAÇÃO
DO
MÍNIMO
EXISTENCIAL
APÓS
DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E EM CONTA CORRENTE. NÃO
DEMONSTRADO. INSTAURAÇÃO DO PROCEDIMENTO DA LEI Nº 14.181/2021.
REQUISITOS
NÃO
PREENCHIDOS.
RECURSO
DESPROVIDO.
SENTENÇA
MANTIDA. 1. A solicitação de repactuação de dívidas pretendida pelo apelante é medida
estabelecida no art. 104-A, § 4º, do CDC, introduzido pela Lei nº 14.181/21, aplicada em
favor do consumidor superendividado. Segundo o art. 54-A, § 1º, do CDC, ocorre o
superendividamento quando o consumidor pessoa física, de boa-fé, não consegue pagar
a totalidade de suas dívidas de consumo (exigíveis e vincendas) sem comprometer o seu
mínimo existencial. 2. O superendividamento está diretamente relacionado com o mínimo
existencial do indivíduo, ou seja, o superendividamento pressupõe o comprometimento
da sobrevivência da pessoa e ameaça o indivíduo e sua família (mínimo existencial), no
caso, verifica-se que o apelante é policial militar do Distrito Federal e está submetido ao
regime jurídico dos servidores públicos distritais, porém, na hipótese, imperioso destacar
a existência de óbice quanto ao pedido de repactuação de dívida, tendo em vista a
necessidade de observância mínimo existencial, elemento previsto como requisitos da
Lei nº 14.181/21. 3. No caso concreto, constata-se, com base nos elementos probatórios,
que o apelante percebe uma renda líquida, após todos os descontos, inclusive, os
realizados em conta corrente, uma renda líquida muito acima do estabelecido pelo
Decreto nº 11.150/22, com redação dada pelo Decreto nº 11.567/2023. Dessa forma o
apelante não conseguiu demonstrar os requisitos para que seja caracterizado o
superendividamento. 4. Por sua vez, a intervenção judicial somente se justifica na
hipótese de situação excepcional se constatado a existência de superendividamento, sob
pena de indevida intervenção judicial na autonomia da vontade. Na hipótese, entretanto,
não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o comprometimento do
mínimo existencial. Nesse contexto, deve ser preservada a autonomia das vontades, pois
os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e consciente pelas
partes. Portanto, não comprovado o comprometimento ao mínimo existencial, não há
como instaurar o procedimento de repactuação de dívidas. 5. Recurso desprovido.
Sentença mantida. (TJ-DF 07238141920238070003 1924958, Relator: ALFEU
MACHADO, Data de Julgamento: 18/09/2024, 6ª Turma Cível, Data de Publicação:
02/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. SUPERENDIVIDAMENTO.
REPACTUAÇÃO DE DÍVIDA. EXCEPCIONALIDADE. MÍNIMO EXISTENCIAL. PODER
REGULAMENTAR. DECRETO 11.150/2022. AUSTERIDADE. PODER JUDICIÁRIO.
INTERVENÇÃO NÃO JUSTIFICADA. IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO. SENTENÇA
MANTIDA. 1. As normas protetivas que regulam o tratamento do superendividamento
garantem a repactuação das dívidas, mediante a preservação do mínimo existencial, nos
termos da regulamentação. Art. 104-A do Código de Defesa do Consumidor. 2. Ainda
carente de debates, o Decreto Presidencial nº 11.150, de 26 de julho de 2022, com
vacatio legis de sessenta dias da após a publicação, traz a delimitação acerca do tema.
3. Nos termos do art. 3º do Decreto 11.150/2022, ?considera-se mínimo existencial a
renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do
salário mínimo vigente na data de publicação deste Decreto?. 4. Embora se possa
questionar a extrema austeridade imposta pela regulamentação do que pode ser
considerado o mínimo existencial, a intervenção do poder judiciário nos contratos regidos
pelo Código de Defesa do Consumidor deve se pautar pela teoria da base objetiva dos
contratos. 5.Na hipótese em que não se constata alteração das circunstâncias
intrínsecas à formulação do vínculo contratual, assim como não se identifica condutas de
incontestável abuso por parte da instituição financeira credora, a intervenção judicial nos
contratos não se justifica. 6. Recurso conhecido e não provido. (TJ-DF
07058375420228070001 1674193, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, Data de
Julgamento: 08/03/2023, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 20/03/2023)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATOS BANCÁRIOS.
REPACTUAÇÃO
DE
DÍVIDAS.
LIMITAÇÃO
DOS
DESCONTOS
EM
CONTA-CORRENTE DO DEVEDOR. PRELIMINARES DE INÉPCIA DA INICIAL E
FALTA DE INTERESSE DE AGIR REJEITADA. CONTRATAÇÃO ESCLARECIDA PELO
CONSUMIDOR. REPACTUAÇÃO. IMPOSSIBILIDAE. VEDAÇÃO DO § 1º DO ART.
104-A DO CDC. PLANO DE PAGAMENTO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
APELAÇÃO CONHECIDA. PRELIMINARES REJEITADAS E NÃO PROVIDA. 1.
Insurge-se o autor, ora apelante, contra sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível de
Samambaia que, na ação de repactuação de dívidas com 4 instituições bancárias,
homologou o acordo de pagamento de dívidas feito entre o autor e o Banco INTER S/A,
revogou a tutela anteriormente concedida de limitação de descontos em conta-corrente a
30% (trinta por cento) dos ganhos mensais líquidos e julgou improcedente o pedido da
inicial, bem como o condenou ao pagamento das custas processuais e dos honorários
advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade restou suspensa
diante da gratuidade de justiça concedida. Pretende o prosseguimento de ação de
repactuação de dívidas de mútuo com a apresentação de plano de pagamento com
prazo superior ao estabelecido legalmente e limitação dos descontos em sua
conta-corrente ao patamar de 30% de sua remuneração mensal líquida
independentemente da modalidade do empréstimo. 2. O juízo sentenciante
compreendeu pela incompatibilidade do plano de pagamento apresentado pelo devedor
com a observância de requisito essencial da Lei do Superendividamento (Lei n.
14.181/2021), a saber, o prazo máximo de pagamento em até 5 anos. Portanto,
descabida a aplicação do art. 104-B da lei citada, para instauração da segunda fase do
procedimento de superendividamento, pois o próprio consumidor já informou a
impossibilidade de adequação da proposta aos termos da legislação. Além disso, foram
verificados fortes indícios da contratação dolosa dos débitos pelo apelante devedor. 3.
Não induz à inépcia da inicial do pedido de repactuação dos contratos a ausência de
efetivo plano de pagamento por não representar vício insanável (art. 337, IV do CPC). 4.
Quanto à questão preliminar de falta de interesse de agir arguida pelo apelado BANCO
BMG SA, ?o interesse de agir, consubstanciado no binômio necessidade-utilidade, busca
alcançar a realização da pretensão deduzida em Juízo, a qual não poderia ser obtida
através de outra forma. Verificando-se que a preliminar suscitada se confunde com o
mérito da questão, há de ser rejeitada de plano? (TJDFT. Acórdão 1617020,
07219987620218070001, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, 5ª Turma Cível, data de
julgamento: 21/9/2022, publicado no DJE: 29/9/2022. Pág.: Sem Página Cadastrada .).
Preliminar rejeitada. 5. É ônus do consumidor provar que se encontra privado do seu
mínimo existencial nos termos do art. 54-A do CDC. No caso em análise, não há provas
hábeis de que, após os descontos realizados e a sobra de R$ 4.000,00 (quatro mil reais),
a quantia remanescente é apta a comprometer-lhe o próprio sustento e o de sua família.
Com efeito, a quantia representa aproximadamente três salários-mínimos, o que é
superior à remuneração mensal média do trabalhador brasileiro. Segundo estatísticas do
IBGE, no trimestre de setembro a novembro de 2022 o salário médio mensal é de
aproximadamente R$ 2.787 (dois mil setecentos e oitenta e sete reais). Há, ainda, de se
salientar quanto a existência de fortes indícios de contratação dolosa dos débitos pelo
apelante consumidor, o que, por si só, tem o condão de excluir os empréstimos aqui
impugnados do processo de repactuação de dívidas conforme o § 1º do art. 104-A do
CDC. 6. Verificado que o plano de pagamento não fora formulado em consonância aos
parâmetros mínimos impostos pela legislação, em especial a previsão do limite temporal
de 05 (cinco) anos para pagamento, a fim de evitar a eternização das obrigações, a
manutenção da improcedência do pedido é medida que se impõe. 7. Apelação
conhecida, preliminares rejeitadas e não provida. Sentença mantida. (TJ-DF
07134365420218070009 1690491, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, Data de
Julgamento: 18/04/2023, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: 28/04/2023)
Portanto, adoto e ratifico a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo para
solucionar a controvérsia; e assim procedo ancorada no entendimento remansoso do Tribunal
da Cidadania que reconhece […] a viabilidade de o órgão julgador adotar ou ratificar o juízo de
valor firmado na sentença, inclusive transcrevendo-a no acórdão, sem que tal medida encerre
omissão ou ausência de fundamentação no decisum (REsp nº 662.272-RS, 2ª Turma, Rel.Min.
João Otávio de Noronha, j. de 4.9.2007; REsp nº 641.963-ES, 2ª Turma, Rel. Min. Castro
Meira, j. de 21.11.2005; REsp nº 592.092-AL, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, j. 17.12.2004
e REsp nº 265.534- DF, 4ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j de 1.12.2003).
Diante do exposto, nego provimento ao recurso.
Em atendimento ao que preconiza o art. 85, § 11, do CPC, majoro em 5% (cinco por
cento) os honorários advocatícios fixados na sentença.
É como voto.
A fim de evitar a oposição de embargos de declaração meramente protelatórios,
considera-se, desde já, prequestionada toda matéria infraconstitucional e constitucional,
observando o entendimento do STJ no sentido de que, para o prequestionamento, é
desnecessária a explícita indicação dos dispositivos de lei que o fundamentaram.
No ensejo, advirto às partes que a interposição de eventual recurso meramente
protelatório ou com escopo de rediscutir esta controvérsia ensejará na aplicação de multa, nos
termos dos arts. 79, 80, 81 e 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil.
Intimem-se.
Com o trânsito em julgado, arquivem-se (art. 1.006 do CPC).
Boa Vista - RR, data constante do sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO.
AUSÊNCIA
DE
IMPUGNAÇÃO
AOS
FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. NÃO COMPROVAÇÃO DA
CONDIÇÃO
DE
SUPERENDIVIDAMENTO.
IMPROCEDÊNCIA
MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. O recurso de apelação deve, nos termos do art. 1.010, incisos II a IV,
do CPC, conter impugnação específica aos fundamentos da sentença, o
que configura o princípio da dialeticidade. A mera repetição das teses
iniciais, sem enfrentamento dos fundamentos do decisum, compromete
sua admissibilidade.
2. Embora a apelação apresentada limite-se a reiterar os argumentos da
petição inicial, sem atacar especificamente a ratio decidendi da sentença,
o recurso foi conhecido a fim de garantir o duplo grau de jurisdição e evitar
prejuízos à parte.
3. A Lei nº 14.181/2021, que alterou o Código de Defesa do Consumidor,
condiciona a instauração do procedimento de repactuação de dívidas à
comprovação de que o consumidor está impossibilitado de pagar a
totalidade de suas dívidas sem comprometer o mínimo existencial (art.
54-A, § 1º, CDC).
4. No caso concreto, a autora não comprovou sua condição de
superendividada nem apresentou documentos suficientes à análise do
comprometimento de sua subsistência, ônus que lhe incumbia nos termos
do art. 373, I, do CPC.
5. Em respeito à autonomia privada, não demonstrada a situação
excepcional de superendividamento, deve-se preservar os pactos
livremente firmados entre as partes.
6. A jurisprudência desta Corte e de outros Tribunais reconhece que a
ausência de comprovação do superendividamento inviabiliza a aplicação
do procedimento previsto na Lei nº 14.181/2021.
7. Recurso conhecido e não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da 2ª Turma Cível do
Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em negar
provimento ao presente recurso, nos termos do voto da Relatora. Participaram do julgamento
os eminentes Desembargadores: Mozarildo Cavalcanti (Presidente e Julgador), Elaine Bianchi
(Relatora) e Cristóvão Suter (Julgador). Sessão Virtual do Egrégio Tribunal de Justiça do
Estado de Roraima, data constante no sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi - Relatora
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Processo nº 0804296-49.2024.8.23.0010
ID: 276237582
Data de Disponibilização:
22/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ROBERTA BEATRIZ DO NASCIMENTO
OAB/SP XXXXXX
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JOSÉ LÍDIO ALVES DOS SANTOS
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
A…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida pelo Juízo do 4º
Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa Vista, que julgou
improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de Repactuação de Dívidas
C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte teor (EP 183.1):
Proc. n.° 0804296-49.2024.8.23.0010
SENTENÇA
GRACIANE PASSOS DE SOUZA ajuizou ação de repactuação de dívida por
superendividamento c.c pedido de tutela de urgência em face do BANCO DO BRASIL
S.A, BANCO SANTANDER S.A., CREFISA, FUPRES ADMINISTRADORA DE
CARTOES LTDA, BANCO DAYCOVAL S.A., AVANCARD PROMOÇÃO DE VENDAS
LTDA e BEMOL S/A, alegando, em síntese, que não consegue arcar com as despesas
referente aos contratos de empréstimos consignados realizados e que os descontos em
sua remuneração afetam sua sobrevivência, tendo o seu mínimo existencial
comprometido. Deu à causa o valor de R$ 431.415,81. Juntou documentos (EP's 1.2 a
1.19).
O pedido liminar restou indeferido, sendo concedida a gratuidade processual à parte
autora (EP 6).
Citados (EP's 39, 40, 41), os réus apresentaram contestação.
O BANCO MASTER S/A e PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA. (AVANCARD)
suscitou, em preliminar, a sua ilegitimidade passiva e impugnou a concessão da
gratuidade processual autoral. No mérito, arguiu a ausência de ato ilícito; a ausência dos
requisitos para aplicação da lei que trata do superendividamento; má-fé da autora na
contratação dos empréstimos, requerendo, ao final, o julgamento improcedente dos
pedidos formulados. Anexou documentos (EP 46).
A BEMOL S.A. suscitou, em sede preliminar, a inépcia da inicial. Quanto ao mérito,
sustentou que a parte autora não trouxe provas do direito pleiteado, requerendo o
julgamento de improcedência (EP 49).
A CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS S.A suscitou, em
preliminar, a inépcia da inicial; a falta de interesse de agir; além de impugnar a
gratuidade processual. No mérito, arguiu a legalidade dos contratos firmados, não
havendo que se falar em abusividade das termos pactuados, bem como um possível
aumento da taxa média e a, consequente, redução da oferta em caso de procedência,
diante da eventual insegurança jurídica, requerendo, ao final, o julgamento improcedente
dos pedidos formulados na exordial. Anexou documentos (EP 58).
O BANCO SANTANDER S/A consignou, preliminarmente, a inépcia da inicial, além de
impugnar a gratuidade processual e o valor atribuído à causa. No mérito, sustentou que
a parte autora não trouxe provas da ofensa ao seu mínimo existencial, ausentes,
portanto, as exigências previstas na lei de superendividamento, sendo válidos e
regulares os contratos firmados, invocando o princípio do pacta sunt servanda,
pugnando, ao final, pelo julgamento improcedente da demanda. Anexou documentos (EP
90).
A FUPRES ADMINISTRADORA DE CARTÕES LTDA suscitou, preliminarmente, a
impossibilidade de integração dos contratos; inépcia da inicial, impugnando a concessão
da gratuidade processual. No mérito, sustentou que os valores foram assumidos
voluntariamente pelo autor; a legalidade dos contratos firmados e a ausência das
exigências previstas na lei de superendividamento, pugnando, ao fim, pela
improcedência dos pedidos. Na oportunidade, acostou documentos (EP 93).
O BANCO DAYCOVAL S.A afirmou, em preliminar, a ausência do interesse de agir e a
inépcia da inicial, impugnando o valor da causa; a gratuidade processual e a capacidade
postulatória. No mérito, sustentou que a parte autora não comprovou o
superendividamento; que inexiste ofensa ao mínimo existencial; a legalidade do contrato;
a preservação do princípio do pacta sunt servanda; e a sua boa-fé na celebração dos
empréstimos, requerendo que os pedidos sejam julgados improcedentes. Apresentou
documentos (EP 94).
O BANCO DO BRASIL S.A. sustentou, preliminarmente, a inépcia da inicial, impugnando
a concessão da gratuidade processual, além do valor atribuído à causa. No mérito,
sustentou a improcedência da ação em face da ausência dos requisitos para a aplicação
da lei de superendividamento e a legalidade dos contratos, invocando o princípio do
pacta sunt servanda. Juntou documentos (EP 95).
Designada e realizada audiência de conciliação, a mesma restou frutífera somente em
relação à corré CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, sendo
homologada a transação e, na mesma ocasião, reconhecida a ilegitimidade passiva do
réu PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA (AVANCARD) (EP 121).
A parte autora demonstrou seu interesse na instauração do processo por
superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas
com a apresentação de minuta do plano judicial compulsório (EP 128).
Instadas acerca da produção de outras provas (EP 134), restou indeferido o pedido de
prova documental, anunciando-se o julgamento antecipado da lide (EP 159) sem
oposição pelos litigantes (EP's 175 a 181).
É o relatório.
Fundamento e DECIDO.
Desnecessária maior dilação probatória, a teor do disposto no inciso I do art. 355 do
Código de Processo Civil, sendo certo que, na análise do julgamento antecipado da lide,
vigora a prudente discrição do magistrado no exame da necessidade ou não da
realização de outras provas, ante as circunstâncias de cada caso concreto e a
necessidade de não ofender o princípio do pleno contraditório. No caso em tela, a lide
comporta pronto julgamento, dada pois a questão é eminentemente de direito e os
documentos coligidos aos autos são amplamente suficientes ao deslinde da questão
controvertida.
De proêmio, RECHAÇAM-SE as teses preliminares arguidas pelos requeridos.
Deveras, não prospera a preliminar de inépcia da inicial, uma vez que, da narrativa
contida na exordial, extrai-se que os pedidos formulados são certos e determinados, bem
como que há compatibilidade entre eles, sendo perfeitamente identificável a causa de
pedir e a lógica da narrativa fática. Ademais, registra-se que os requisitos legais para
subsunção da lei de superendividamento (Lei 14.181/21), serão apreciados na análise do
mérito.
Quanto à alegação de falta de interesse de agir, a tese não se sustenta, haja vista o
princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição, conforme preceitua o art. 5°,
inciso XXXV, da Constituição Federal, considerando, ainda, que a parte autora
demonstra a necessidade de buscar a tutela jurisdicional para proteger, resguardar ou
conservar o seu direito (necessidade-adequação), seja no julgamento de mérito
procedente ou não, máxime para eventual repactuação de suas dívidas, haja vista a
impossibilidade de pactuação/transação administrativa.
No que tange a gratuidade processual, mantenho a benesse outrora deferida, haja vista
a ausência de elementos em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Lado outro, quanto à impugnação ao valor da causa, o pedido comporta parcial
acolhimento. Explico.
In casu, a soma dos débitos contratuais com as partes requeridas é R$ 431.415,81,
sendo que a presente repactuação e eventual renegociação das dívidas, nos moldes
apresentados na inicial, o seu proveito econômico corresponderia apenas a
diminuição/abatimento dos valores citados. Destarte, com a minuta do plano de
repactuação, em caso de homologação por este Juízo, a soma total das dívidas da parte
autora não mais seria de seria de R$ 431.415,81, mas sim de R$ 146.704,14, conforme
primeiro plano de repactuação apresentado. Ou seja, o real proveito econômico seria de
R$ 284.711,67, valor este que deve ser atribuído à causa. Nesse sentido, colaciono o
seguinte julgado, verbis: (…)
Em sendo assim, fixo o valor da causa em R$ 284.711,67, proveito econômico
efetivamente buscado pela parte autora com a presente ação. Retifique-se. Anote-se.
No que tange à (im)possibilidade de repactuação/integração dos contratos/dívidas do
consumidor, a matéria confunde-se com o
meritum causae
e com ele será
analisado/decidido.
Por fim, a capacidade postulatória da parte restou comprovada, haja vista estar
representada por advogado habilitado e com instrumento de mandato subscrito
digitalmente, na forma da lei.
Ultrapassadas tais questões, adentrando ao mérito, tenho que os pedidos iniciais não
prosperam.
De proêmio, convém ressaltar tratar-se de inequívoca relação de consumo, pois os
contratos bancários também se submetem à legislação de proteção e defesa dos direitos
do consumidor, por força do que dispõe o artigo 3º, § 2º, da Lei nº 8.078/90. Ademais, é
pacífico que a relação jurídica estabelecida entre as partes está inserida no âmbito das
relações de consumo, conforme corrobora o teor do Enunciado 297 da Súmula do E.
Superior Tribunal de Justiça:
“O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”
A controvérsia cinge-se à repactuação de dívida, na qual a parte autora fundamenta a
sua pretensão nos preceitos da Lei 14.181/21, que alterou dispositivos do CDC. De outra
banda, os credores requeridos, em suma, impugnam a pretensão sob o argumento de
ausência dos requisitos legais.
O superendividamento, conceituado como a “inviabilidade de pagamento da totalidade
dos débitos consumeristas (vencidos e vincendos) sem comprometimento do mínimo
existencial pelo consumidor pessoa natural e de boa-fé” (CDC, 54-A, § 1º), foi
regulamentado a partir da Lei n. 14.181/21, que introduziu modificações esparsas no
CDC e no Estatuto da Pessoa Idosa. Trata-se de instituto fundamentado no princípio da
boa-fé objetiva, mais precisamente nos deveres de cooperação e lealdade para a
evitação da ruína do outro contratante (exceção da ruína).
Ainda, o art. 54-A, do mesmo diploma legal, elucida que:
'Entende-se por
superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de
boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem
comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação'.
A mencionada regulamentação foi realizada por meio do
Decreto Federal nº
11.150/2022, que estipulou como mínimo existencial a renda mensal do consumidor
pessoal natural, estando previsto atualmente, o valor equivalente a R$ 600,00 (caput, art.
3º).
Ademais,
a
aplicabilidade
das
normas
de
prevenção
e
tratamento
do
superendividamento pressupõe a diferenciação entre o superendividamento ativo e o
superendividamento passivo. O primeiro decorre do endividamento voluntário, e pode se
dar de modo consciente (por ação de má-fé, com intenção deliberada de fraude a
credores em razão da prévia ciência quanto à incapacidade de pagamento), hipótese em
que não se aplicam as normas de prevenção e tratamento, ou de modo inconsciente (por
ação negligente/imprudente, em razão da contratação por impulso ou da não fiscalização
de despesas). Já o segundo é oriundo do endividamento involuntário, decorrente de
fatores externos que obrigam o indivíduo a suportar despesas superiores às suas
receitas (desemprego, divórcio, doença, dentre outras).
Registra-se que o processo de repactuação de débitos, regulado no art. 104-A do CDC,
é instaurado pelo juiz a requerimento do consumidor superendividado e visa, em uma
primeira etapa, à conciliação (obtenção de acordo entre o devedor e os credores). Caso
não seja celebrado acordo, passa-se então ao processo por superendividamento,
regulado no art. 104-B do CDC (2ª fase), também instaurado pelo juiz a requerimento do
consumidor superendividado e, nessa segunda etapa, objetiva a (i) revisão ou integração
de contratos; (ii) repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial
compulsório.
Importante anotar que o plano judicial compulsório (CDC, art. 104-B, § 4º) deve
assegurar aos credores, no mínimo, o valor principal do débito, atualizado com o
adimplemento integral em, no máximo 5 (cinco) anos, com a primeira parcela devida no
prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da homologação e as demais
mensais e sucessivas.
Logo, para a repactuação de dívidas e usufruto dos benefícios da lei, a parte autora
superendividada deve preencher os seguintes requisitos: 1) insuficiência de renda; 2) ser
devedor de boa-fé, ou seja, em razão de sua renda ser inferior ao que acumulou em
dívidas; 3) as dívidas devem ser decorrentes de relações de consumo comum, não
podendo incluir aqui consumos luxuosos, de alto valor; 4) em hipótese alguma as dívidas
devem ser decorrentes de má-fé, ou seja, dívidas contraídas com intuito fraudulento; 5) a
petição inicial deve conter um plano detalhado da forma/prazo de pagamento; e 6) a
indicação da renda familiar.
Uma vez firmadas tais premissas, no caso ora em apreço, passa-se ao exame do
preenchimento dos requisitos legais para a repactuação de dívidas.
Da análise dos autos, extrai-se incontroversa a existência de empréstimos adquiridos
pela parte autora junto às instituições financeiras rés.
In casu, verifica-se que parte autora não comprovou sua condição de consumidora
superendividada, deixando de demonstrar a impossibilidade em arcar com o pagamento
dos débitos sem prejuízo do mínimo existencial, bem como ausência de má-fé ou de
fraude na obtenção das dívidas.
Com efeito, não trouxe o(a) requerente cópias das faturas de cartão de crédito e extratos
bancários, com detalhamento de compras realizadas, quando da origem dos débitos,
para comprovação do risco à garantia do mínimo existencial, configurando, outrossim,
contradição, ao menos pela ausência de prova constituída acerca da real e efetiva
condição financeira do(a) requerente.
Ademais, conforme narrado em petição inicial, a requerente, como servidora pública em
atividade, aufere renda bruta de R$ 9.772,62, sendo que após descontos/retenções
legais e empréstimos resta o valor líquido de R$ 875,79.
Portanto, constata-se que remanescem após o pagamento de todos os débitos a
quantia de R$ 875,79, valor que está além da quantia prevista no art. 3º do Decreto
Federal no 11.150/2022 como mínimo existencial, situação incompatível com o rito
das ações de superendividamento (CDC, § 1º, art. 104-A), máxime considerando a
ausência
de
prova,
pelo(a)
demandante,
dos
alegados
gastos
não
consignados/cotidianos.
Destaca-se, ainda, que a parte autora é servidor(a) público(a) em atividade, com fonte de
renda bruta superior a R$ 9.000,00, sendo que, por certo, faz jus ao recebimento dos
beneplácitos de 13º salários e de férias, o que, por si só, consiste em expressivas
quantias complementativas a suas remunerações ordinárias, capazes de afastar
qualquer alegação de ofensa ao seu mínimo existencial. Nesse passo, a renda da parte
autora não pode, sob qualquer métrica, ser caracterizada como comprometedora do
mínimo vital para sua sobrevivência.
Ainda, observa-se a ausência de documentos a demonstrar gastos rotineiros da parte
autora, especialmente se é o(a) único(a) a sustentar sua família (esposo(o) e filhos,
incluindo uma maior de idade - EP 1.13), deixando a demandante de comprovar que é
arrimo/sustento da sua família, sequer comprovando os gastos/repasses/despesas. A
esse respeito, é cediço ser obrigação do pai e da mãe arcar com a manutenção dos
filhos na proporção da capacidade financeira de cada qual (CC, art. 1.703). Ainda,
denota-se da qualificação autoral que esta é casada, sendo que nada foi juntado acerca
da (im)possibilidade de seu companheiro e/ou genitor do(s) seu(s) filho(s), em arcar com
tais custos e em que quantia.
Não se pode perder de vista que também nada trouxe aos autos com relação à renda
familiar. Ocorre que, para a repactuação de dívida pretendida, com a preservação do
mínimo existencial à família seria necessária a apuração de toda a renda familiar e todas
as suas despesas, o que não se extrai dos autos, dada a ausência de documentações
em tal sentido.
Da mesma forma, verifica-se na fatura de cartão de crédito da autora (EP 1.13, 1.14
e 1.15) diversas compras realizadas recentemente e com extenso lapso para
pagamento, sem a efetiva demonstração da sua essencialidade (p. ex. RORAIMA
PISCI PARC 09/12 - R$ 843,00, CACULAO PARC 08/12 - R$ 191,11, dentre outras -
EP 1.16), inclusive em outro Estado da Federação - AIRBNB PAGAM PARC 02/02
SAO PAULO - R$ 293,16 - EP 1.9), mesmo diante de tais fatos serem consignados em
decisão de indeferiu pedido de urgência, fator contraditório para quem afirma ter sua
dignidade financeira atingida.
Acrescenta-se que, a minuta do plano compulsório apresentado pela parte autora (EP
128), em confronto com os demais documentos juntados pelos réus nas contestações
apresentadas, não contempla sequer o pagamento do valor do principal devido, corrigido
monetariamente por índices oficiais de preço, o que reforça a impossibilidade do
acolhimento dos pedidos autorais.
Mais a mais, compulsando os documentos juntados pela parte autora (EP 1.17),
observa-se, logo após o recebimento de seus proventos/remuneração, a realização de
transferências, via pix, e aplicação em conta poupança, inclusive, de valores
consideráveis (R$ 10.000,00 - EP 1.17 - pag. 3), sem, contudo, esclarecer as
destinações/finalidades dos pagamentos, depósitos e recebimentos, bem assim trazer a
Juízo extrato bancário das contas (poupança ou não) a que destinadas as transferências,
não havendo que ser falar em ofensa ao mínimo existencial.
Nesse sentido, observa-se que a parte autora também não trouxe qualquer
elemento para justificar a necessidade/motivo da realização dos empréstimos junto
às instituições financeiras, incluindo um valor superior a R$ 140.000, 00 com
apenas um único requerido (EP 95) fator preponderante a demonstrar sua boa-fé
na contratação das dívidas que pretende repactuar.
Ademais, insta consignar que os documentos apresentados não permitem concluir, com
precisão, o que levou o(a) requerente ao suscitado superendividamento e tampouco do
destino das expressivas quantias levantadas junto ao requerido, restando impossível a
verificação da sua boa-fé para subsunção à lei de superendividamento.
Ainda, a parte autora não comprova qualquer dado externo que tenha lhe acarretado a
alteração patrimonial, tais como redução drástica do salário, perda do emprego,
problemas de saúde ou outro fator que tenha, efetivamente, afetado sua conjuntura
econômica quando da época dos empréstimos/dívidas.
Deveras, cabe ao consumidor evidenciar a sua incapacidade de quitar as obrigações
contraídas, as quais visam atender a uma necessidade pessoal extraordinária decorrente
de infortúnios da vida ou eventos imprevisíveis (endividamento involuntário). Fora dessas
circunstâncias excepcionais, considera-se mero descontrole pessoal das finanças, não
enquadrado nos parâmetros da teoria do superendividamento.
Anota-se que incumbe à parte autora comprovar que tomou os valores para as despesas
básicas de subsistência, pois a repactuação não tem amparo legal quando as dívidas
que ' decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor'
(CDC, § 3º, art. 54-A).
Dito isto, acrescenta-se que pelo contexto da petição inicial, é possível aferir que o
pedido de redução dos descontos dos empréstimos fora baseado no suposto
superendividamento da parte autora e extrapolação do patamar máximo de margem
consignável, qual seja de 30%.
Com efeito, o objetivo da norma protetora ao consumidor (Lei de Superendividamento)
não foi criar uma regra matemática para subsunção aos benefícios previstos na lei, de
modo que a ofensa ao mínimo existencial demanda demonstração inequívoca de ofensa
à dignidade financeira do cidadão, não havendo que se falar em percentual fixo de sua
remuneração.
Deveras, o direito à repactuação das dívidas não possui caráter potestativo,
independente da vontade do credor, autorizando que o consumidor, unilateralmente,
aponte quantia que entende justa e adequada para sua renda, passando a ter direito a
solver somente tal importe. Se assim fosse, a adoção de tal entendimento representaria
uma grande insegurança jurídica, já que o credor estaria condicionado ao assentimento
exclusivo do consumidor, o que comprometeria o recebimento do crédito concedido em
medida verdadeiramente significativa, acabando por desaguar em aumento do custo do
crédito, ou seja, em elevação sistêmica dos juros, bem como em limitação das linhas de
crédito, prejudicando os consumidores de maneira global.
Por esta razão, o legislador estabeleceu rito, critérios e condições para se obter a
repactuação pretendida, disposições que precisam ser respeitadas, sob pena de
subversão do propósito normativo e geração de relevantes efeitos colaterais para o
próprio consumidor. Assim, não se pode, com lastro em tal previsão normativa, restringir
os débitos com lastro apenas na indicação de percentual que o consumidor julga
adequado, pois este deve ser fixado consoante os parâmetros previstos nos art. 104-A e
B do CDC.
Em outras palavras, não se olvide que o cenário é de ENDIVIDAMENTO, jamais de
SUPERENDIVIDAMENTO, nos termos da legislação de regência. E para essa situação
de endividamento, a qual não está acobertada pelas regras excepcionais dos arts. 54-A
e 104-A e seguintes do CDC, deverá a parte buscar as medidas legais para
adequação/renegociação contratual, afastando-se na situação em comento a imposição
de plano compulsório de pagamento ao réu.
Seja como for, ainda que admitidos os números do(a) requerente, e pese a alegada
afetação dos vencimentos às dívidas bancárias, fato é que o remanescente disponível
não implica em risco/ofensa/violação ao 'mínimo existencial', garantindo-se montante
capaz de atender as necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene
e transporte e etc, implicando apenas em redução de sua capacidade financeira, mas
não em vulnerabilidade econômica/financeira, elemento fundamental para a configuração
do superendividamento e embasamento para a concessão do manto protetivo do regime
de excepcionalização do pacta sunt servanda, sob pena de ofensa à segurança jurídica.
Com a devida venia, a intenção do legislador na criação de institutos que beneficiam aos
consumidores, como o enquadramento no conceito de superendividamento (Lei n.
14.181/21), não busca garantir à pessoa superendividada o alto padrão de vida que
detinha antes do endividamento, mas garantir o mínimo existencial para a sua
sobrevivência, o que, no caso em comento, está garantido pelo valor residual pós
descontos dos vencimentos do(a)requerente.
Ademais, não se tem notícia de que o(a) demandante é pessoa idosa, pródiga ou de
precária educação, sendo vedada à aplicação da repactuação de dívidas, aquelas
oriundas de contratos dolosamente celebrados sem o propósito de realizar pagamento,
nos termos do §1º do artigo 104-A do CDC.
A esse respeito, registra-se que a parte autora confirma que celebrou os contratos com o
banco réu, com taxas de juros pactuadas e previamente conhecidas, não alegando em
nenhum momento qualquer vício de consentimento.
Nessa direção, o entendimento jurisprudencial, verbis: (…)
Sendo assim, verifica-se que o(a) requerente deixou de provar o fato constitutivo de seu
direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram juntados aos autos documentos que
deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de pessoa superendividada nos termos
da lei, não havendo que se falar na realização de repactuação de dívidas da forma
pretendida.
Portanto, o(a) autor(a) não trouxe aos autos elementos aptos e suficientes que
comprovem o preenchimento dos requisitos acima elencados, sobretudo o
comprometimento do mínimo existencial, o que implica em óbice ao prosseguimento da
demanda e homologação de eventual plano de repactuação judicial compulsório em
detrimento dos credores.
Com efeito, resta manifesta a ausência no preenchimento dos requisitos legais, em
especial a alegada ofensa ao 'mínimo existencial' e, por conseguinte, a incomprovada
situação de superendividamento, forçoso concluir a inexistência do pressuposto de
procedibilidade para o procedimento especial previsto no art. 54-A, 104-A e seguintes do
CDC, ensejando, pois, a extinção irresolutiva da fase de conhecimento.
ANTE O EXPOSTO e, analisando tudo mais que dos autos consta, com fulcro na
fundamentação supra, julgo EXTINTA a fase de conhecimento, sem resolução do mérito,
reconhecendo a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido
e regular do processo, na forma do art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil.
Em razão da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento de custas processuais
e honorários advocatícios, que ora arbitro no patamar de 10% (dez por cento) sobre o
valor atualizado da causa, nos termos do § 2º do art. 85 do Código de Processo Civil,
contudo, suspensa a exigibilidade, haja vista se tratar de parte beneficiária da gratuidade
processual, mantendo-se a benesse outrora deferida, haja vista a ausência de elementos
em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Retifique-se o valor da causa para R$ 284.711,67.
Certifique a Serventia a existência de agravo de instrumento pendente de julgamento e,
em caso positivo, comunique-se à instância recursal acerca da presente sentença.
Sem prejuízo, considerando a possibilidade de ajuizamento de demandas repetitivas ou
em massa e em atenção a Nota Técnica CIJERR 04/2024, encaminhe-se cópia da
presente sentença ao Centro de Inteligência da Justiça Estadual de Roraima (CIJERR)
para conhecimento e providências que entender cabíveis (via SEI).
Na hipótese de interposição de recurso de apelação, por não haver mais juízo de
admissibilidade a ser exercido pelo Juízo a quo (CPC, art. 1.010), sem nova conclusão,
intime-se a parte contrária para oferecer resposta no prazo de 15 (quinze) dias.
(…) (grifos originais)
Irresignada, nas razões recursais a apelante aduz (EP 198.1), em síntese, […] que
recebe mensalmente a quantia de R$ 431.415,81 (quatrocentos e trinta e um mil, quatrocentos
e quinze reais e oitenta e um centavos); que após os descontos obrigatórios como PRESSEM e
Imposto de Renda no valor de 1.622,39 (mil seiscentos e vinte e dois reais e trinta e nove
centavos). Resta para a parte somente a quantia de R$ 8.150,23 (oito mil cento e cinquenta
reais e vinte e três centavos); que a situação de superendividamento de uma pessoa não se
pode usar fórmulas prontas e moldadas para outras situações; que ficou claro que a parte
Apelante não tem condições financeiras de arcar com todas as suas dívidas e manter um
padrão de vida digno; que a parte Apelante possui encargos nanceiros mensais oriundos de
contratos celebrados junto aos Apelados, que, quando somados, correspondem ao valor de
R$7.274,44 (sete mil, duzentos e setenta e quatro reais e quarenta e quatro centavos),
equivalente a MAIS DE 89% DE SUA RENDA LÍQUIDA; que o valor que resta para parte
Apelante é ínfimo, pois não é suficiente para custear suas despesas básicas, como moradia,
saúde, alimentação, despesas médicas, educação e etc.; que tais dívidas têm comprometido
substancialmente o mínimo existencial da parte Apelante. […]
Calcada nesses argumentos, requer o provimento do recurso para:
a) Seja reconhecida a inconstitucionalidade dos Decretos ns. 11.150/2022 e
11.567/2023, tendo em vista que afronta com a dignidade da pessoa humana;
b) Que a Sentença seja reformada para acolher os pedidos formulados na petição inicial
e torne o plano de pagamento ora apresentado em plano judicial compulsório com o seu
início no mês subsequente à data da sentença;
c) condenar a parte Requerida ao pagamento de custas processuais, despesas e
honorários advocatícios.
Certidão atestando a tempestividade do recurso e a ausência do recolhimento do
preparo (EP 7.1), pois a parte apelante é beneficiária da gratuidade da justiça.
Certidão atestando a tempestividade das contrarrazões contidas nos EPs 212.1, 219.1
e 220.1 (EP 6.1).
O relatado é suficiente.
Inclua-se na pauta de julgamento eletrônico, nos termos do art. 109 do RITJRR.
Intimem-se
Boa Vista - RR, 12 de maio de 2025.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
VOTO
Conforme relatado, trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida
pelo Juízo do 4º Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa
Vista, que julgou improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de
Repactuação de Dívidas C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte
teor (EP 183.1).
Em suma, a apelante requer o provimento do recurso de apelação para que a sentença
de primeiro grau seja reformada.
Os apelados, nas contrarrazões, defendem a manutenção integral da sentença.
Pois bem.
Antes do mais, convém relembrar que não compete ao segundo grau, em regra, julgar
a causa novamente, justamente por se tratar de instância revisora, mas reanalisar a sentença
nos termos da irresignação do apelo.
Dito isso, e após análise detida dos elementos contidos nos autos, constata-se que o
apelo não comporta acolhimento.
Isto porque, em suas razões recursais, a apelante não se insurge contra os
fundamentos da sentença. Ao contrário, a rigor repete ipsis litteris as teses apresentadas na
petição inicial (EP 1.1), que não se presta a atacar a fundamentação que levou o juízo “a quo” a
rejeitar a pretensão inicial.
Dito de outra forma, a parte apelante deixou de apresentar qualquer fundamento capaz
de infirmar a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo, pois ausente a formulação
crítica necessária para se opor aos fundamentos lançados na sentença.
Logo, contra os fundamentos adotados na decisão não existem, nos autos, motivos
pelos quais se possa considerar que o direito não tenha sido bem aplicado.
Ademais, o artigo 1.010, incisos II a IV, do Código de Processo Civil exige que na peça
de apelação constem a exposição do fato e do direito, as razões do pedido de reforma ou de
decretação de nulidade e o pedido de nova decisão.
Da mesma maneira, o pedido não pode ser genérico, mas deve especificar as matérias
decididas que o recorrente reputa devam ser alteradas, de forma que o juízo ad quem possa
julgar o cabimento e provimento do recurso adequadamente.
No caso em exame, contudo, não há nas razões recursais qualquer menção ao que foi
decidido na sentença proferida em primeiro grau de jurisdição, limitando-se a parte apelante a
reproduzir integralmente os argumentos utilizados com o objetivo de contestar a ratio decidendi
utilizada pelo julgador primevo, o que, por óbvio, seria o suficiente para o não conhecimento do
recurso, por violação ao princípio da dialeticidade recursal.
Para corroborar essa afirmação, confira-se a jurisprudência remansosa desta Corte de
Justiça sobre o tema:
PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL.
PRINCÍPIO
DA
DIALETICIDADE.
NÃO
CONHECIMENTO
DO
RECURSO.
HONORÁRIOS MAJORADOS.1. Apelação interposta contra sentença que julgou
improcedentes embargos à execução fiscal promovida pela Fazenda Pública do Estado
de Roraima, fundamentada em multa aplicada pela Agência de Defesa Agropecuária de
Roraima (ADERR) por armazenamento irregular de agrotóxicos sem autorização legal,
no valor de R$ 45.543,20. A sentença afastou a alegação de ilegitimidade passiva ao
entender que a responsabilidade pela infração decorre da guarda indevida dos produtos,
independentemente da sua titularidade.2. A recorrente alega ilegitimidade passiva, sob o
argumento de que os produtos pertenciam a terceiro e foram armazenados por engano
em área anexa à empresa, sem responsabilidade direta da apelante.3. Princípio da
dialeticidade: O recurso deve atacar especificamente os fundamentos da decisão
recorrida. A repetição de argumentos afastados na sentença, sem enfrentamento dos
principais fundamentos, compromete a admissibilidade do apelo, nos termos do art. 932,
III, do CPC.4. No caso, a apelação limita-se a repetir a tese de ilegitimidade passiva sem
enfrentar a essência da decisão: a irrelevância da titularidade dos produtos para a
configuração da infração administrativa, fundada no armazenamento sem autorização.5.
Não se verifica cerceamento de defesa. O indeferimento da oitiva de testemunhas não
prejudicou o julgamento, uma vez que as provas colhidas na fase administrativa e judicial
foram consideradas suficientes. A apelante não demonstrou de forma concreta como a
ausência da prova comprometeria seu direito de defesa.6. Gratuidade de justiça: o
benefício foi concedido na fase inicial e permanece válido no grau recursal, nos termos
do art. 98, § 1º, VIII, do CPC, tornando prejudicado novo pedido formulado pela
apelante.7. Honorários advocatícios recursais majorados de 10% para 15%, conforme
art. 85, § 11, do CPC, observada a gratuidade de justiça já deferida.8. Recurso não
conhecido. Honorários majorados. (TJRR – AC 0810795-83.2023.8.23.0010, Rel. Des.
ERICK LINHARES, Câmara Cível, julg.: 31/10/2024, public.: 31/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C COBRANÇA –
PROGRESSÃO FUNCIONAL – SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. 1ª APELAÇÃO:LEI
N.º 1.611/2015 – APLICAÇÃO – RECONHECIMENTO ADMINISTRATIVO DO DIREITO
POSTULADO – PERDA DO INTERESSE PROCESSUAL – INEXISTÊNCIA DE
DEMONSTRAÇÃO DE ERRO NO REENQUADRAMENTO REALIZADO PELO
MUNICÍPIO DE BOA VISTA – VERBAS RETROATIVAS DEVIDAS - DIFERENÇAS
SALARIAIS NÃO ATINGIDAS PELA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – RECURSO
DESPROVIDO
–
SENTENÇA
MANTIDA.
2ª
APELAÇÃO:
AUSÊNCIA
DE
DIALETICIDADE RECURSAL – RECURSO NÃO CONHECIDO. (TJRR – AC
0802853-97.2023.8.23.0010, Rel. Des. TÂNIA VASCONCELOS, Câmara Cível, julg.:
19/12/2024, public.: 19/12/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. INSCRIÇÃO DO NOME DO SÓCIO NA CDA.
AUSÊNCIA DE SUA PARTICIPAÇÃO NO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO COMO
PARTE. RAZÕES DO APELO QUE REPETEM, EM PARTE, AS MESMAS JÁ
LANÇADAS NA CONTESTAÇÃO. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. INDICAÇÃO DE
PRECEDENTES DO STJ QUE NÃO SE AMOLDAM À HIPÓTESE DOS AUTOS.
RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, DESPROVIDO.
1. A simples repetição, nas razões do apelo, dos argumentos lançados na fase de
conhecimento, impõe o não conhecimento desses argumentos por não observância do
princípio da dialeticidade. 2. Mostra-se escorreita a sentença que reconhece a
ilegitimidade passiva do sócio que não integrou o procedimento administrativo fiscal na
qualidade de parte, conforme precedentes do STJ e do egrégio TJRR acerca do tema.
(TJ-RR - AC: 0831030-13.2019.8.23.0010, Relator: ELAINE BIANCHI, Data de
Julgamento: 25/04/2021, Câmara Cível, Data de Publicação: 26/04/2021)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO - OFENSA AO PRINCÍPIO DA
DIALETICIDADE - NÃO CONHECIMENTO DO INCONFORMISMO. 1. O princípio da
dialeticidade recursal exige a impugnação integral e específica de cada um dos
fundamentos da decisão recorrida, sob pena de não conhecimento do recurso. 2.
Olvidando a embargante de tal ônus, impõe-se o não conhecimento dos declaratórios.
(TJ-RR - EDecAC: 72119027220168230010 7211902-72.2016.8.23.0010, Relator: Des.
Cristóvão Suter, Data de Publicação: DJe 09/10/2019, p.)
No entanto, embora o presente recurso, a rigor não pudesse sequer ser conhecido
porque não atacou os fundamentos da sentença; a fim de evitar argumentos de violação à
ampla defesa e acesso ao duplo grau de jurisdição, conheço do recurso e passo à análise do
mérito da controvérsia.
In casu, o juizo a quo julgou improcedente a demanda por ausência de documentação
apta a comprovar a condição de superendividada, já que a parte autora, ora apelante, “deixou
de provar o fato constitutivo de seu direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram
juntados aos autos documentos que deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de
pessoa superendividada nos termos da lei, não havendo que se falar na realização de
repactuação de dívidas da forma pretendida”.
Ou seja, a parte apelante não forneceu os documentos necessários para que o
magistrado senteciante pudesse aferir, com convicção, a sua alegada condição de
superendividada.
Dito de outra forma, não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o
comprometimento do mínimo existencial, razão pela qual deve ser preservada a autonomia das
vontades, visto que os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e
consciente pelas partes.
Assim, infere-se que a ratio decidendi utilizada pelo magistrado sentenciante para julgar
improcedente a pretensão autoral merece ser mantida por seus próprios fundamentos, a qual
adoto como razão de decidir para conhecer do recurso, mas negar-lhe provimento.
Em reforço à conclusão adotada pelo juízo a quo, confira-se a jurisprudência pátria
sobre o tema:
APELAÇÃO
CÍVEL.
Ação
revisional.
Repactuação
de
dívidas.
Lei
do
Superendividamento. Ausência de comprovação documental ou dos requisitos para a
pretendida limitação nos pagamentos devidos. Higidez contratual reconhecida. Sentença
de improcedência mantida. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJ-SP - Apelação Cível:
0000507-73.2023.8.26.0577 São José dos Campos, Relator: Emílio Migliano Neto, Data
de Julgamento: 21/02/2024, 23ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação:
21/02/2024)
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÉBITO - LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO DE
SUPERENDIVIDADO DO CONSUMIDOR - IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. Nos termos
da Lei nº 14.181/2021, que visa dispor sobre formas de prevenção e solução da situação
de superendividamento dos consumidores, entende-se nessa situação, fazendo jus,
portanto, à repactuação de débitos, a pessoa natural, de boa-fé, que evidencia a total
impossibilidade de adimplir a suas dívidas de consumo sem comprometer seu mínimo
existencial. Ausente as provas de tais circunstâncias, deve ser mantida a improcedência
da pretensão inicial. (TJ-MG - Apelação Cível: 5001170-35.2023.8.13.0241
1.0000.24.174736-9/001, Relator: Des.(a) Arnaldo Maciel, Data de Julgamento:
07/05/2024, 7ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 15/05/2024)
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CIVIL E PROCESSUAL
CIVIL. PROCESSO SOB O RITO ESPECIAL DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
SUPERENDIVIDAMENTO.
AFETAÇÃO
DO
MÍNIMO
EXISTENCIAL
APÓS
DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E EM CONTA CORRENTE. NÃO
DEMONSTRADO. INSTAURAÇÃO DO PROCEDIMENTO DA LEI Nº 14.181/2021.
REQUISITOS
NÃO
PREENCHIDOS.
RECURSO
DESPROVIDO.
SENTENÇA
MANTIDA. 1. A solicitação de repactuação de dívidas pretendida pelo apelante é medida
estabelecida no art. 104-A, § 4º, do CDC, introduzido pela Lei nº 14.181/21, aplicada em
favor do consumidor superendividado. Segundo o art. 54-A, § 1º, do CDC, ocorre o
superendividamento quando o consumidor pessoa física, de boa-fé, não consegue pagar
a totalidade de suas dívidas de consumo (exigíveis e vincendas) sem comprometer o seu
mínimo existencial. 2. O superendividamento está diretamente relacionado com o mínimo
existencial do indivíduo, ou seja, o superendividamento pressupõe o comprometimento
da sobrevivência da pessoa e ameaça o indivíduo e sua família (mínimo existencial), no
caso, verifica-se que o apelante é policial militar do Distrito Federal e está submetido ao
regime jurídico dos servidores públicos distritais, porém, na hipótese, imperioso destacar
a existência de óbice quanto ao pedido de repactuação de dívida, tendo em vista a
necessidade de observância mínimo existencial, elemento previsto como requisitos da
Lei nº 14.181/21. 3. No caso concreto, constata-se, com base nos elementos probatórios,
que o apelante percebe uma renda líquida, após todos os descontos, inclusive, os
realizados em conta corrente, uma renda líquida muito acima do estabelecido pelo
Decreto nº 11.150/22, com redação dada pelo Decreto nº 11.567/2023. Dessa forma o
apelante não conseguiu demonstrar os requisitos para que seja caracterizado o
superendividamento. 4. Por sua vez, a intervenção judicial somente se justifica na
hipótese de situação excepcional se constatado a existência de superendividamento, sob
pena de indevida intervenção judicial na autonomia da vontade. Na hipótese, entretanto,
não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o comprometimento do
mínimo existencial. Nesse contexto, deve ser preservada a autonomia das vontades, pois
os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e consciente pelas
partes. Portanto, não comprovado o comprometimento ao mínimo existencial, não há
como instaurar o procedimento de repactuação de dívidas. 5. Recurso desprovido.
Sentença mantida. (TJ-DF 07238141920238070003 1924958, Relator: ALFEU
MACHADO, Data de Julgamento: 18/09/2024, 6ª Turma Cível, Data de Publicação:
02/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. SUPERENDIVIDAMENTO.
REPACTUAÇÃO DE DÍVIDA. EXCEPCIONALIDADE. MÍNIMO EXISTENCIAL. PODER
REGULAMENTAR. DECRETO 11.150/2022. AUSTERIDADE. PODER JUDICIÁRIO.
INTERVENÇÃO NÃO JUSTIFICADA. IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO. SENTENÇA
MANTIDA. 1. As normas protetivas que regulam o tratamento do superendividamento
garantem a repactuação das dívidas, mediante a preservação do mínimo existencial, nos
termos da regulamentação. Art. 104-A do Código de Defesa do Consumidor. 2. Ainda
carente de debates, o Decreto Presidencial nº 11.150, de 26 de julho de 2022, com
vacatio legis de sessenta dias da após a publicação, traz a delimitação acerca do tema.
3. Nos termos do art. 3º do Decreto 11.150/2022, ?considera-se mínimo existencial a
renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do
salário mínimo vigente na data de publicação deste Decreto?. 4. Embora se possa
questionar a extrema austeridade imposta pela regulamentação do que pode ser
considerado o mínimo existencial, a intervenção do poder judiciário nos contratos regidos
pelo Código de Defesa do Consumidor deve se pautar pela teoria da base objetiva dos
contratos. 5.Na hipótese em que não se constata alteração das circunstâncias
intrínsecas à formulação do vínculo contratual, assim como não se identifica condutas de
incontestável abuso por parte da instituição financeira credora, a intervenção judicial nos
contratos não se justifica. 6. Recurso conhecido e não provido. (TJ-DF
07058375420228070001 1674193, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, Data de
Julgamento: 08/03/2023, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 20/03/2023)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATOS BANCÁRIOS.
REPACTUAÇÃO
DE
DÍVIDAS.
LIMITAÇÃO
DOS
DESCONTOS
EM
CONTA-CORRENTE DO DEVEDOR. PRELIMINARES DE INÉPCIA DA INICIAL E
FALTA DE INTERESSE DE AGIR REJEITADA. CONTRATAÇÃO ESCLARECIDA PELO
CONSUMIDOR. REPACTUAÇÃO. IMPOSSIBILIDAE. VEDAÇÃO DO § 1º DO ART.
104-A DO CDC. PLANO DE PAGAMENTO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
APELAÇÃO CONHECIDA. PRELIMINARES REJEITADAS E NÃO PROVIDA. 1.
Insurge-se o autor, ora apelante, contra sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível de
Samambaia que, na ação de repactuação de dívidas com 4 instituições bancárias,
homologou o acordo de pagamento de dívidas feito entre o autor e o Banco INTER S/A,
revogou a tutela anteriormente concedida de limitação de descontos em conta-corrente a
30% (trinta por cento) dos ganhos mensais líquidos e julgou improcedente o pedido da
inicial, bem como o condenou ao pagamento das custas processuais e dos honorários
advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade restou suspensa
diante da gratuidade de justiça concedida. Pretende o prosseguimento de ação de
repactuação de dívidas de mútuo com a apresentação de plano de pagamento com
prazo superior ao estabelecido legalmente e limitação dos descontos em sua
conta-corrente ao patamar de 30% de sua remuneração mensal líquida
independentemente da modalidade do empréstimo. 2. O juízo sentenciante
compreendeu pela incompatibilidade do plano de pagamento apresentado pelo devedor
com a observância de requisito essencial da Lei do Superendividamento (Lei n.
14.181/2021), a saber, o prazo máximo de pagamento em até 5 anos. Portanto,
descabida a aplicação do art. 104-B da lei citada, para instauração da segunda fase do
procedimento de superendividamento, pois o próprio consumidor já informou a
impossibilidade de adequação da proposta aos termos da legislação. Além disso, foram
verificados fortes indícios da contratação dolosa dos débitos pelo apelante devedor. 3.
Não induz à inépcia da inicial do pedido de repactuação dos contratos a ausência de
efetivo plano de pagamento por não representar vício insanável (art. 337, IV do CPC). 4.
Quanto à questão preliminar de falta de interesse de agir arguida pelo apelado BANCO
BMG SA, ?o interesse de agir, consubstanciado no binômio necessidade-utilidade, busca
alcançar a realização da pretensão deduzida em Juízo, a qual não poderia ser obtida
através de outra forma. Verificando-se que a preliminar suscitada se confunde com o
mérito da questão, há de ser rejeitada de plano? (TJDFT. Acórdão 1617020,
07219987620218070001, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, 5ª Turma Cível, data de
julgamento: 21/9/2022, publicado no DJE: 29/9/2022. Pág.: Sem Página Cadastrada .).
Preliminar rejeitada. 5. É ônus do consumidor provar que se encontra privado do seu
mínimo existencial nos termos do art. 54-A do CDC. No caso em análise, não há provas
hábeis de que, após os descontos realizados e a sobra de R$ 4.000,00 (quatro mil reais),
a quantia remanescente é apta a comprometer-lhe o próprio sustento e o de sua família.
Com efeito, a quantia representa aproximadamente três salários-mínimos, o que é
superior à remuneração mensal média do trabalhador brasileiro. Segundo estatísticas do
IBGE, no trimestre de setembro a novembro de 2022 o salário médio mensal é de
aproximadamente R$ 2.787 (dois mil setecentos e oitenta e sete reais). Há, ainda, de se
salientar quanto a existência de fortes indícios de contratação dolosa dos débitos pelo
apelante consumidor, o que, por si só, tem o condão de excluir os empréstimos aqui
impugnados do processo de repactuação de dívidas conforme o § 1º do art. 104-A do
CDC. 6. Verificado que o plano de pagamento não fora formulado em consonância aos
parâmetros mínimos impostos pela legislação, em especial a previsão do limite temporal
de 05 (cinco) anos para pagamento, a fim de evitar a eternização das obrigações, a
manutenção da improcedência do pedido é medida que se impõe. 7. Apelação
conhecida, preliminares rejeitadas e não provida. Sentença mantida. (TJ-DF
07134365420218070009 1690491, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, Data de
Julgamento: 18/04/2023, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: 28/04/2023)
Portanto, adoto e ratifico a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo para
solucionar a controvérsia; e assim procedo ancorada no entendimento remansoso do Tribunal
da Cidadania que reconhece […] a viabilidade de o órgão julgador adotar ou ratificar o juízo de
valor firmado na sentença, inclusive transcrevendo-a no acórdão, sem que tal medida encerre
omissão ou ausência de fundamentação no decisum (REsp nº 662.272-RS, 2ª Turma, Rel.Min.
João Otávio de Noronha, j. de 4.9.2007; REsp nº 641.963-ES, 2ª Turma, Rel. Min. Castro
Meira, j. de 21.11.2005; REsp nº 592.092-AL, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, j. 17.12.2004
e REsp nº 265.534- DF, 4ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j de 1.12.2003).
Diante do exposto, nego provimento ao recurso.
Em atendimento ao que preconiza o art. 85, § 11, do CPC, majoro em 5% (cinco por
cento) os honorários advocatícios fixados na sentença.
É como voto.
A fim de evitar a oposição de embargos de declaração meramente protelatórios,
considera-se, desde já, prequestionada toda matéria infraconstitucional e constitucional,
observando o entendimento do STJ no sentido de que, para o prequestionamento, é
desnecessária a explícita indicação dos dispositivos de lei que o fundamentaram.
No ensejo, advirto às partes que a interposição de eventual recurso meramente
protelatório ou com escopo de rediscutir esta controvérsia ensejará na aplicação de multa, nos
termos dos arts. 79, 80, 81 e 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil.
Intimem-se.
Com o trânsito em julgado, arquivem-se (art. 1.006 do CPC).
Boa Vista - RR, data constante do sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
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Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO.
AUSÊNCIA
DE
IMPUGNAÇÃO
AOS
FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. NÃO COMPROVAÇÃO DA
CONDIÇÃO
DE
SUPERENDIVIDAMENTO.
IMPROCEDÊNCIA
MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. O recurso de apelação deve, nos termos do art. 1.010, incisos II a IV,
do CPC, conter impugnação específica aos fundamentos da sentença, o
que configura o princípio da dialeticidade. A mera repetição das teses
iniciais, sem enfrentamento dos fundamentos do decisum, compromete
sua admissibilidade.
2. Embora a apelação apresentada limite-se a reiterar os argumentos da
petição inicial, sem atacar especificamente a ratio decidendi da sentença,
o recurso foi conhecido a fim de garantir o duplo grau de jurisdição e evitar
prejuízos à parte.
3. A Lei nº 14.181/2021, que alterou o Código de Defesa do Consumidor,
condiciona a instauração do procedimento de repactuação de dívidas à
comprovação de que o consumidor está impossibilitado de pagar a
totalidade de suas dívidas sem comprometer o mínimo existencial (art.
54-A, § 1º, CDC).
4. No caso concreto, a autora não comprovou sua condição de
superendividada nem apresentou documentos suficientes à análise do
comprometimento de sua subsistência, ônus que lhe incumbia nos termos
do art. 373, I, do CPC.
5. Em respeito à autonomia privada, não demonstrada a situação
excepcional de superendividamento, deve-se preservar os pactos
livremente firmados entre as partes.
6. A jurisprudência desta Corte e de outros Tribunais reconhece que a
ausência de comprovação do superendividamento inviabiliza a aplicação
do procedimento previsto na Lei nº 14.181/2021.
7. Recurso conhecido e não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da 2ª Turma Cível do
Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em negar
provimento ao presente recurso, nos termos do voto da Relatora. Participaram do julgamento
os eminentes Desembargadores: Mozarildo Cavalcanti (Presidente e Julgador), Elaine Bianchi
(Relatora) e Cristóvão Suter (Julgador). Sessão Virtual do Egrégio Tribunal de Justiça do
Estado de Roraima, data constante no sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi - Relatora
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Processo nº 0804296-49.2024.8.23.0010
ID: 276273322
Data de Disponibilização:
22/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
ROBERTA BEATRIZ DO NASCIMENTO
OAB/SP XXXXXX
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JOSÉ LÍDIO ALVES DOS SANTOS
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
A…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
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APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida pelo Juízo do 4º
Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa Vista, que julgou
improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de Repactuação de Dívidas
C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte teor (EP 183.1):
Proc. n.° 0804296-49.2024.8.23.0010
SENTENÇA
GRACIANE PASSOS DE SOUZA ajuizou ação de repactuação de dívida por
superendividamento c.c pedido de tutela de urgência em face do BANCO DO BRASIL
S.A, BANCO SANTANDER S.A., CREFISA, FUPRES ADMINISTRADORA DE
CARTOES LTDA, BANCO DAYCOVAL S.A., AVANCARD PROMOÇÃO DE VENDAS
LTDA e BEMOL S/A, alegando, em síntese, que não consegue arcar com as despesas
referente aos contratos de empréstimos consignados realizados e que os descontos em
sua remuneração afetam sua sobrevivência, tendo o seu mínimo existencial
comprometido. Deu à causa o valor de R$ 431.415,81. Juntou documentos (EP's 1.2 a
1.19).
O pedido liminar restou indeferido, sendo concedida a gratuidade processual à parte
autora (EP 6).
Citados (EP's 39, 40, 41), os réus apresentaram contestação.
O BANCO MASTER S/A e PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA. (AVANCARD)
suscitou, em preliminar, a sua ilegitimidade passiva e impugnou a concessão da
gratuidade processual autoral. No mérito, arguiu a ausência de ato ilícito; a ausência dos
requisitos para aplicação da lei que trata do superendividamento; má-fé da autora na
contratação dos empréstimos, requerendo, ao final, o julgamento improcedente dos
pedidos formulados. Anexou documentos (EP 46).
A BEMOL S.A. suscitou, em sede preliminar, a inépcia da inicial. Quanto ao mérito,
sustentou que a parte autora não trouxe provas do direito pleiteado, requerendo o
julgamento de improcedência (EP 49).
A CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS S.A suscitou, em
preliminar, a inépcia da inicial; a falta de interesse de agir; além de impugnar a
gratuidade processual. No mérito, arguiu a legalidade dos contratos firmados, não
havendo que se falar em abusividade das termos pactuados, bem como um possível
aumento da taxa média e a, consequente, redução da oferta em caso de procedência,
diante da eventual insegurança jurídica, requerendo, ao final, o julgamento improcedente
dos pedidos formulados na exordial. Anexou documentos (EP 58).
O BANCO SANTANDER S/A consignou, preliminarmente, a inépcia da inicial, além de
impugnar a gratuidade processual e o valor atribuído à causa. No mérito, sustentou que
a parte autora não trouxe provas da ofensa ao seu mínimo existencial, ausentes,
portanto, as exigências previstas na lei de superendividamento, sendo válidos e
regulares os contratos firmados, invocando o princípio do pacta sunt servanda,
pugnando, ao final, pelo julgamento improcedente da demanda. Anexou documentos (EP
90).
A FUPRES ADMINISTRADORA DE CARTÕES LTDA suscitou, preliminarmente, a
impossibilidade de integração dos contratos; inépcia da inicial, impugnando a concessão
da gratuidade processual. No mérito, sustentou que os valores foram assumidos
voluntariamente pelo autor; a legalidade dos contratos firmados e a ausência das
exigências previstas na lei de superendividamento, pugnando, ao fim, pela
improcedência dos pedidos. Na oportunidade, acostou documentos (EP 93).
O BANCO DAYCOVAL S.A afirmou, em preliminar, a ausência do interesse de agir e a
inépcia da inicial, impugnando o valor da causa; a gratuidade processual e a capacidade
postulatória. No mérito, sustentou que a parte autora não comprovou o
superendividamento; que inexiste ofensa ao mínimo existencial; a legalidade do contrato;
a preservação do princípio do pacta sunt servanda; e a sua boa-fé na celebração dos
empréstimos, requerendo que os pedidos sejam julgados improcedentes. Apresentou
documentos (EP 94).
O BANCO DO BRASIL S.A. sustentou, preliminarmente, a inépcia da inicial, impugnando
a concessão da gratuidade processual, além do valor atribuído à causa. No mérito,
sustentou a improcedência da ação em face da ausência dos requisitos para a aplicação
da lei de superendividamento e a legalidade dos contratos, invocando o princípio do
pacta sunt servanda. Juntou documentos (EP 95).
Designada e realizada audiência de conciliação, a mesma restou frutífera somente em
relação à corré CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, sendo
homologada a transação e, na mesma ocasião, reconhecida a ilegitimidade passiva do
réu PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA (AVANCARD) (EP 121).
A parte autora demonstrou seu interesse na instauração do processo por
superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas
com a apresentação de minuta do plano judicial compulsório (EP 128).
Instadas acerca da produção de outras provas (EP 134), restou indeferido o pedido de
prova documental, anunciando-se o julgamento antecipado da lide (EP 159) sem
oposição pelos litigantes (EP's 175 a 181).
É o relatório.
Fundamento e DECIDO.
Desnecessária maior dilação probatória, a teor do disposto no inciso I do art. 355 do
Código de Processo Civil, sendo certo que, na análise do julgamento antecipado da lide,
vigora a prudente discrição do magistrado no exame da necessidade ou não da
realização de outras provas, ante as circunstâncias de cada caso concreto e a
necessidade de não ofender o princípio do pleno contraditório. No caso em tela, a lide
comporta pronto julgamento, dada pois a questão é eminentemente de direito e os
documentos coligidos aos autos são amplamente suficientes ao deslinde da questão
controvertida.
De proêmio, RECHAÇAM-SE as teses preliminares arguidas pelos requeridos.
Deveras, não prospera a preliminar de inépcia da inicial, uma vez que, da narrativa
contida na exordial, extrai-se que os pedidos formulados são certos e determinados, bem
como que há compatibilidade entre eles, sendo perfeitamente identificável a causa de
pedir e a lógica da narrativa fática. Ademais, registra-se que os requisitos legais para
subsunção da lei de superendividamento (Lei 14.181/21), serão apreciados na análise do
mérito.
Quanto à alegação de falta de interesse de agir, a tese não se sustenta, haja vista o
princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição, conforme preceitua o art. 5°,
inciso XXXV, da Constituição Federal, considerando, ainda, que a parte autora
demonstra a necessidade de buscar a tutela jurisdicional para proteger, resguardar ou
conservar o seu direito (necessidade-adequação), seja no julgamento de mérito
procedente ou não, máxime para eventual repactuação de suas dívidas, haja vista a
impossibilidade de pactuação/transação administrativa.
No que tange a gratuidade processual, mantenho a benesse outrora deferida, haja vista
a ausência de elementos em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Lado outro, quanto à impugnação ao valor da causa, o pedido comporta parcial
acolhimento. Explico.
In casu, a soma dos débitos contratuais com as partes requeridas é R$ 431.415,81,
sendo que a presente repactuação e eventual renegociação das dívidas, nos moldes
apresentados na inicial, o seu proveito econômico corresponderia apenas a
diminuição/abatimento dos valores citados. Destarte, com a minuta do plano de
repactuação, em caso de homologação por este Juízo, a soma total das dívidas da parte
autora não mais seria de seria de R$ 431.415,81, mas sim de R$ 146.704,14, conforme
primeiro plano de repactuação apresentado. Ou seja, o real proveito econômico seria de
R$ 284.711,67, valor este que deve ser atribuído à causa. Nesse sentido, colaciono o
seguinte julgado, verbis: (…)
Em sendo assim, fixo o valor da causa em R$ 284.711,67, proveito econômico
efetivamente buscado pela parte autora com a presente ação. Retifique-se. Anote-se.
No que tange à (im)possibilidade de repactuação/integração dos contratos/dívidas do
consumidor, a matéria confunde-se com o
meritum causae
e com ele será
analisado/decidido.
Por fim, a capacidade postulatória da parte restou comprovada, haja vista estar
representada por advogado habilitado e com instrumento de mandato subscrito
digitalmente, na forma da lei.
Ultrapassadas tais questões, adentrando ao mérito, tenho que os pedidos iniciais não
prosperam.
De proêmio, convém ressaltar tratar-se de inequívoca relação de consumo, pois os
contratos bancários também se submetem à legislação de proteção e defesa dos direitos
do consumidor, por força do que dispõe o artigo 3º, § 2º, da Lei nº 8.078/90. Ademais, é
pacífico que a relação jurídica estabelecida entre as partes está inserida no âmbito das
relações de consumo, conforme corrobora o teor do Enunciado 297 da Súmula do E.
Superior Tribunal de Justiça:
“O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”
A controvérsia cinge-se à repactuação de dívida, na qual a parte autora fundamenta a
sua pretensão nos preceitos da Lei 14.181/21, que alterou dispositivos do CDC. De outra
banda, os credores requeridos, em suma, impugnam a pretensão sob o argumento de
ausência dos requisitos legais.
O superendividamento, conceituado como a “inviabilidade de pagamento da totalidade
dos débitos consumeristas (vencidos e vincendos) sem comprometimento do mínimo
existencial pelo consumidor pessoa natural e de boa-fé” (CDC, 54-A, § 1º), foi
regulamentado a partir da Lei n. 14.181/21, que introduziu modificações esparsas no
CDC e no Estatuto da Pessoa Idosa. Trata-se de instituto fundamentado no princípio da
boa-fé objetiva, mais precisamente nos deveres de cooperação e lealdade para a
evitação da ruína do outro contratante (exceção da ruína).
Ainda, o art. 54-A, do mesmo diploma legal, elucida que:
'Entende-se por
superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de
boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem
comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação'.
A mencionada regulamentação foi realizada por meio do
Decreto Federal nº
11.150/2022, que estipulou como mínimo existencial a renda mensal do consumidor
pessoal natural, estando previsto atualmente, o valor equivalente a R$ 600,00 (caput, art.
3º).
Ademais,
a
aplicabilidade
das
normas
de
prevenção
e
tratamento
do
superendividamento pressupõe a diferenciação entre o superendividamento ativo e o
superendividamento passivo. O primeiro decorre do endividamento voluntário, e pode se
dar de modo consciente (por ação de má-fé, com intenção deliberada de fraude a
credores em razão da prévia ciência quanto à incapacidade de pagamento), hipótese em
que não se aplicam as normas de prevenção e tratamento, ou de modo inconsciente (por
ação negligente/imprudente, em razão da contratação por impulso ou da não fiscalização
de despesas). Já o segundo é oriundo do endividamento involuntário, decorrente de
fatores externos que obrigam o indivíduo a suportar despesas superiores às suas
receitas (desemprego, divórcio, doença, dentre outras).
Registra-se que o processo de repactuação de débitos, regulado no art. 104-A do CDC,
é instaurado pelo juiz a requerimento do consumidor superendividado e visa, em uma
primeira etapa, à conciliação (obtenção de acordo entre o devedor e os credores). Caso
não seja celebrado acordo, passa-se então ao processo por superendividamento,
regulado no art. 104-B do CDC (2ª fase), também instaurado pelo juiz a requerimento do
consumidor superendividado e, nessa segunda etapa, objetiva a (i) revisão ou integração
de contratos; (ii) repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial
compulsório.
Importante anotar que o plano judicial compulsório (CDC, art. 104-B, § 4º) deve
assegurar aos credores, no mínimo, o valor principal do débito, atualizado com o
adimplemento integral em, no máximo 5 (cinco) anos, com a primeira parcela devida no
prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da homologação e as demais
mensais e sucessivas.
Logo, para a repactuação de dívidas e usufruto dos benefícios da lei, a parte autora
superendividada deve preencher os seguintes requisitos: 1) insuficiência de renda; 2) ser
devedor de boa-fé, ou seja, em razão de sua renda ser inferior ao que acumulou em
dívidas; 3) as dívidas devem ser decorrentes de relações de consumo comum, não
podendo incluir aqui consumos luxuosos, de alto valor; 4) em hipótese alguma as dívidas
devem ser decorrentes de má-fé, ou seja, dívidas contraídas com intuito fraudulento; 5) a
petição inicial deve conter um plano detalhado da forma/prazo de pagamento; e 6) a
indicação da renda familiar.
Uma vez firmadas tais premissas, no caso ora em apreço, passa-se ao exame do
preenchimento dos requisitos legais para a repactuação de dívidas.
Da análise dos autos, extrai-se incontroversa a existência de empréstimos adquiridos
pela parte autora junto às instituições financeiras rés.
In casu, verifica-se que parte autora não comprovou sua condição de consumidora
superendividada, deixando de demonstrar a impossibilidade em arcar com o pagamento
dos débitos sem prejuízo do mínimo existencial, bem como ausência de má-fé ou de
fraude na obtenção das dívidas.
Com efeito, não trouxe o(a) requerente cópias das faturas de cartão de crédito e extratos
bancários, com detalhamento de compras realizadas, quando da origem dos débitos,
para comprovação do risco à garantia do mínimo existencial, configurando, outrossim,
contradição, ao menos pela ausência de prova constituída acerca da real e efetiva
condição financeira do(a) requerente.
Ademais, conforme narrado em petição inicial, a requerente, como servidora pública em
atividade, aufere renda bruta de R$ 9.772,62, sendo que após descontos/retenções
legais e empréstimos resta o valor líquido de R$ 875,79.
Portanto, constata-se que remanescem após o pagamento de todos os débitos a
quantia de R$ 875,79, valor que está além da quantia prevista no art. 3º do Decreto
Federal no 11.150/2022 como mínimo existencial, situação incompatível com o rito
das ações de superendividamento (CDC, § 1º, art. 104-A), máxime considerando a
ausência
de
prova,
pelo(a)
demandante,
dos
alegados
gastos
não
consignados/cotidianos.
Destaca-se, ainda, que a parte autora é servidor(a) público(a) em atividade, com fonte de
renda bruta superior a R$ 9.000,00, sendo que, por certo, faz jus ao recebimento dos
beneplácitos de 13º salários e de férias, o que, por si só, consiste em expressivas
quantias complementativas a suas remunerações ordinárias, capazes de afastar
qualquer alegação de ofensa ao seu mínimo existencial. Nesse passo, a renda da parte
autora não pode, sob qualquer métrica, ser caracterizada como comprometedora do
mínimo vital para sua sobrevivência.
Ainda, observa-se a ausência de documentos a demonstrar gastos rotineiros da parte
autora, especialmente se é o(a) único(a) a sustentar sua família (esposo(o) e filhos,
incluindo uma maior de idade - EP 1.13), deixando a demandante de comprovar que é
arrimo/sustento da sua família, sequer comprovando os gastos/repasses/despesas. A
esse respeito, é cediço ser obrigação do pai e da mãe arcar com a manutenção dos
filhos na proporção da capacidade financeira de cada qual (CC, art. 1.703). Ainda,
denota-se da qualificação autoral que esta é casada, sendo que nada foi juntado acerca
da (im)possibilidade de seu companheiro e/ou genitor do(s) seu(s) filho(s), em arcar com
tais custos e em que quantia.
Não se pode perder de vista que também nada trouxe aos autos com relação à renda
familiar. Ocorre que, para a repactuação de dívida pretendida, com a preservação do
mínimo existencial à família seria necessária a apuração de toda a renda familiar e todas
as suas despesas, o que não se extrai dos autos, dada a ausência de documentações
em tal sentido.
Da mesma forma, verifica-se na fatura de cartão de crédito da autora (EP 1.13, 1.14
e 1.15) diversas compras realizadas recentemente e com extenso lapso para
pagamento, sem a efetiva demonstração da sua essencialidade (p. ex. RORAIMA
PISCI PARC 09/12 - R$ 843,00, CACULAO PARC 08/12 - R$ 191,11, dentre outras -
EP 1.16), inclusive em outro Estado da Federação - AIRBNB PAGAM PARC 02/02
SAO PAULO - R$ 293,16 - EP 1.9), mesmo diante de tais fatos serem consignados em
decisão de indeferiu pedido de urgência, fator contraditório para quem afirma ter sua
dignidade financeira atingida.
Acrescenta-se que, a minuta do plano compulsório apresentado pela parte autora (EP
128), em confronto com os demais documentos juntados pelos réus nas contestações
apresentadas, não contempla sequer o pagamento do valor do principal devido, corrigido
monetariamente por índices oficiais de preço, o que reforça a impossibilidade do
acolhimento dos pedidos autorais.
Mais a mais, compulsando os documentos juntados pela parte autora (EP 1.17),
observa-se, logo após o recebimento de seus proventos/remuneração, a realização de
transferências, via pix, e aplicação em conta poupança, inclusive, de valores
consideráveis (R$ 10.000,00 - EP 1.17 - pag. 3), sem, contudo, esclarecer as
destinações/finalidades dos pagamentos, depósitos e recebimentos, bem assim trazer a
Juízo extrato bancário das contas (poupança ou não) a que destinadas as transferências,
não havendo que ser falar em ofensa ao mínimo existencial.
Nesse sentido, observa-se que a parte autora também não trouxe qualquer
elemento para justificar a necessidade/motivo da realização dos empréstimos junto
às instituições financeiras, incluindo um valor superior a R$ 140.000, 00 com
apenas um único requerido (EP 95) fator preponderante a demonstrar sua boa-fé
na contratação das dívidas que pretende repactuar.
Ademais, insta consignar que os documentos apresentados não permitem concluir, com
precisão, o que levou o(a) requerente ao suscitado superendividamento e tampouco do
destino das expressivas quantias levantadas junto ao requerido, restando impossível a
verificação da sua boa-fé para subsunção à lei de superendividamento.
Ainda, a parte autora não comprova qualquer dado externo que tenha lhe acarretado a
alteração patrimonial, tais como redução drástica do salário, perda do emprego,
problemas de saúde ou outro fator que tenha, efetivamente, afetado sua conjuntura
econômica quando da época dos empréstimos/dívidas.
Deveras, cabe ao consumidor evidenciar a sua incapacidade de quitar as obrigações
contraídas, as quais visam atender a uma necessidade pessoal extraordinária decorrente
de infortúnios da vida ou eventos imprevisíveis (endividamento involuntário). Fora dessas
circunstâncias excepcionais, considera-se mero descontrole pessoal das finanças, não
enquadrado nos parâmetros da teoria do superendividamento.
Anota-se que incumbe à parte autora comprovar que tomou os valores para as despesas
básicas de subsistência, pois a repactuação não tem amparo legal quando as dívidas
que ' decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor'
(CDC, § 3º, art. 54-A).
Dito isto, acrescenta-se que pelo contexto da petição inicial, é possível aferir que o
pedido de redução dos descontos dos empréstimos fora baseado no suposto
superendividamento da parte autora e extrapolação do patamar máximo de margem
consignável, qual seja de 30%.
Com efeito, o objetivo da norma protetora ao consumidor (Lei de Superendividamento)
não foi criar uma regra matemática para subsunção aos benefícios previstos na lei, de
modo que a ofensa ao mínimo existencial demanda demonstração inequívoca de ofensa
à dignidade financeira do cidadão, não havendo que se falar em percentual fixo de sua
remuneração.
Deveras, o direito à repactuação das dívidas não possui caráter potestativo,
independente da vontade do credor, autorizando que o consumidor, unilateralmente,
aponte quantia que entende justa e adequada para sua renda, passando a ter direito a
solver somente tal importe. Se assim fosse, a adoção de tal entendimento representaria
uma grande insegurança jurídica, já que o credor estaria condicionado ao assentimento
exclusivo do consumidor, o que comprometeria o recebimento do crédito concedido em
medida verdadeiramente significativa, acabando por desaguar em aumento do custo do
crédito, ou seja, em elevação sistêmica dos juros, bem como em limitação das linhas de
crédito, prejudicando os consumidores de maneira global.
Por esta razão, o legislador estabeleceu rito, critérios e condições para se obter a
repactuação pretendida, disposições que precisam ser respeitadas, sob pena de
subversão do propósito normativo e geração de relevantes efeitos colaterais para o
próprio consumidor. Assim, não se pode, com lastro em tal previsão normativa, restringir
os débitos com lastro apenas na indicação de percentual que o consumidor julga
adequado, pois este deve ser fixado consoante os parâmetros previstos nos art. 104-A e
B do CDC.
Em outras palavras, não se olvide que o cenário é de ENDIVIDAMENTO, jamais de
SUPERENDIVIDAMENTO, nos termos da legislação de regência. E para essa situação
de endividamento, a qual não está acobertada pelas regras excepcionais dos arts. 54-A
e 104-A e seguintes do CDC, deverá a parte buscar as medidas legais para
adequação/renegociação contratual, afastando-se na situação em comento a imposição
de plano compulsório de pagamento ao réu.
Seja como for, ainda que admitidos os números do(a) requerente, e pese a alegada
afetação dos vencimentos às dívidas bancárias, fato é que o remanescente disponível
não implica em risco/ofensa/violação ao 'mínimo existencial', garantindo-se montante
capaz de atender as necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene
e transporte e etc, implicando apenas em redução de sua capacidade financeira, mas
não em vulnerabilidade econômica/financeira, elemento fundamental para a configuração
do superendividamento e embasamento para a concessão do manto protetivo do regime
de excepcionalização do pacta sunt servanda, sob pena de ofensa à segurança jurídica.
Com a devida venia, a intenção do legislador na criação de institutos que beneficiam aos
consumidores, como o enquadramento no conceito de superendividamento (Lei n.
14.181/21), não busca garantir à pessoa superendividada o alto padrão de vida que
detinha antes do endividamento, mas garantir o mínimo existencial para a sua
sobrevivência, o que, no caso em comento, está garantido pelo valor residual pós
descontos dos vencimentos do(a)requerente.
Ademais, não se tem notícia de que o(a) demandante é pessoa idosa, pródiga ou de
precária educação, sendo vedada à aplicação da repactuação de dívidas, aquelas
oriundas de contratos dolosamente celebrados sem o propósito de realizar pagamento,
nos termos do §1º do artigo 104-A do CDC.
A esse respeito, registra-se que a parte autora confirma que celebrou os contratos com o
banco réu, com taxas de juros pactuadas e previamente conhecidas, não alegando em
nenhum momento qualquer vício de consentimento.
Nessa direção, o entendimento jurisprudencial, verbis: (…)
Sendo assim, verifica-se que o(a) requerente deixou de provar o fato constitutivo de seu
direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram juntados aos autos documentos que
deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de pessoa superendividada nos termos
da lei, não havendo que se falar na realização de repactuação de dívidas da forma
pretendida.
Portanto, o(a) autor(a) não trouxe aos autos elementos aptos e suficientes que
comprovem o preenchimento dos requisitos acima elencados, sobretudo o
comprometimento do mínimo existencial, o que implica em óbice ao prosseguimento da
demanda e homologação de eventual plano de repactuação judicial compulsório em
detrimento dos credores.
Com efeito, resta manifesta a ausência no preenchimento dos requisitos legais, em
especial a alegada ofensa ao 'mínimo existencial' e, por conseguinte, a incomprovada
situação de superendividamento, forçoso concluir a inexistência do pressuposto de
procedibilidade para o procedimento especial previsto no art. 54-A, 104-A e seguintes do
CDC, ensejando, pois, a extinção irresolutiva da fase de conhecimento.
ANTE O EXPOSTO e, analisando tudo mais que dos autos consta, com fulcro na
fundamentação supra, julgo EXTINTA a fase de conhecimento, sem resolução do mérito,
reconhecendo a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido
e regular do processo, na forma do art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil.
Em razão da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento de custas processuais
e honorários advocatícios, que ora arbitro no patamar de 10% (dez por cento) sobre o
valor atualizado da causa, nos termos do § 2º do art. 85 do Código de Processo Civil,
contudo, suspensa a exigibilidade, haja vista se tratar de parte beneficiária da gratuidade
processual, mantendo-se a benesse outrora deferida, haja vista a ausência de elementos
em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Retifique-se o valor da causa para R$ 284.711,67.
Certifique a Serventia a existência de agravo de instrumento pendente de julgamento e,
em caso positivo, comunique-se à instância recursal acerca da presente sentença.
Sem prejuízo, considerando a possibilidade de ajuizamento de demandas repetitivas ou
em massa e em atenção a Nota Técnica CIJERR 04/2024, encaminhe-se cópia da
presente sentença ao Centro de Inteligência da Justiça Estadual de Roraima (CIJERR)
para conhecimento e providências que entender cabíveis (via SEI).
Na hipótese de interposição de recurso de apelação, por não haver mais juízo de
admissibilidade a ser exercido pelo Juízo a quo (CPC, art. 1.010), sem nova conclusão,
intime-se a parte contrária para oferecer resposta no prazo de 15 (quinze) dias.
(…) (grifos originais)
Irresignada, nas razões recursais a apelante aduz (EP 198.1), em síntese, […] que
recebe mensalmente a quantia de R$ 431.415,81 (quatrocentos e trinta e um mil, quatrocentos
e quinze reais e oitenta e um centavos); que após os descontos obrigatórios como PRESSEM e
Imposto de Renda no valor de 1.622,39 (mil seiscentos e vinte e dois reais e trinta e nove
centavos). Resta para a parte somente a quantia de R$ 8.150,23 (oito mil cento e cinquenta
reais e vinte e três centavos); que a situação de superendividamento de uma pessoa não se
pode usar fórmulas prontas e moldadas para outras situações; que ficou claro que a parte
Apelante não tem condições financeiras de arcar com todas as suas dívidas e manter um
padrão de vida digno; que a parte Apelante possui encargos nanceiros mensais oriundos de
contratos celebrados junto aos Apelados, que, quando somados, correspondem ao valor de
R$7.274,44 (sete mil, duzentos e setenta e quatro reais e quarenta e quatro centavos),
equivalente a MAIS DE 89% DE SUA RENDA LÍQUIDA; que o valor que resta para parte
Apelante é ínfimo, pois não é suficiente para custear suas despesas básicas, como moradia,
saúde, alimentação, despesas médicas, educação e etc.; que tais dívidas têm comprometido
substancialmente o mínimo existencial da parte Apelante. […]
Calcada nesses argumentos, requer o provimento do recurso para:
a) Seja reconhecida a inconstitucionalidade dos Decretos ns. 11.150/2022 e
11.567/2023, tendo em vista que afronta com a dignidade da pessoa humana;
b) Que a Sentença seja reformada para acolher os pedidos formulados na petição inicial
e torne o plano de pagamento ora apresentado em plano judicial compulsório com o seu
início no mês subsequente à data da sentença;
c) condenar a parte Requerida ao pagamento de custas processuais, despesas e
honorários advocatícios.
Certidão atestando a tempestividade do recurso e a ausência do recolhimento do
preparo (EP 7.1), pois a parte apelante é beneficiária da gratuidade da justiça.
Certidão atestando a tempestividade das contrarrazões contidas nos EPs 212.1, 219.1
e 220.1 (EP 6.1).
O relatado é suficiente.
Inclua-se na pauta de julgamento eletrônico, nos termos do art. 109 do RITJRR.
Intimem-se
Boa Vista - RR, 12 de maio de 2025.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
VOTO
Conforme relatado, trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida
pelo Juízo do 4º Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa
Vista, que julgou improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de
Repactuação de Dívidas C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte
teor (EP 183.1).
Em suma, a apelante requer o provimento do recurso de apelação para que a sentença
de primeiro grau seja reformada.
Os apelados, nas contrarrazões, defendem a manutenção integral da sentença.
Pois bem.
Antes do mais, convém relembrar que não compete ao segundo grau, em regra, julgar
a causa novamente, justamente por se tratar de instância revisora, mas reanalisar a sentença
nos termos da irresignação do apelo.
Dito isso, e após análise detida dos elementos contidos nos autos, constata-se que o
apelo não comporta acolhimento.
Isto porque, em suas razões recursais, a apelante não se insurge contra os
fundamentos da sentença. Ao contrário, a rigor repete ipsis litteris as teses apresentadas na
petição inicial (EP 1.1), que não se presta a atacar a fundamentação que levou o juízo “a quo” a
rejeitar a pretensão inicial.
Dito de outra forma, a parte apelante deixou de apresentar qualquer fundamento capaz
de infirmar a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo, pois ausente a formulação
crítica necessária para se opor aos fundamentos lançados na sentença.
Logo, contra os fundamentos adotados na decisão não existem, nos autos, motivos
pelos quais se possa considerar que o direito não tenha sido bem aplicado.
Ademais, o artigo 1.010, incisos II a IV, do Código de Processo Civil exige que na peça
de apelação constem a exposição do fato e do direito, as razões do pedido de reforma ou de
decretação de nulidade e o pedido de nova decisão.
Da mesma maneira, o pedido não pode ser genérico, mas deve especificar as matérias
decididas que o recorrente reputa devam ser alteradas, de forma que o juízo ad quem possa
julgar o cabimento e provimento do recurso adequadamente.
No caso em exame, contudo, não há nas razões recursais qualquer menção ao que foi
decidido na sentença proferida em primeiro grau de jurisdição, limitando-se a parte apelante a
reproduzir integralmente os argumentos utilizados com o objetivo de contestar a ratio decidendi
utilizada pelo julgador primevo, o que, por óbvio, seria o suficiente para o não conhecimento do
recurso, por violação ao princípio da dialeticidade recursal.
Para corroborar essa afirmação, confira-se a jurisprudência remansosa desta Corte de
Justiça sobre o tema:
PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL.
PRINCÍPIO
DA
DIALETICIDADE.
NÃO
CONHECIMENTO
DO
RECURSO.
HONORÁRIOS MAJORADOS.1. Apelação interposta contra sentença que julgou
improcedentes embargos à execução fiscal promovida pela Fazenda Pública do Estado
de Roraima, fundamentada em multa aplicada pela Agência de Defesa Agropecuária de
Roraima (ADERR) por armazenamento irregular de agrotóxicos sem autorização legal,
no valor de R$ 45.543,20. A sentença afastou a alegação de ilegitimidade passiva ao
entender que a responsabilidade pela infração decorre da guarda indevida dos produtos,
independentemente da sua titularidade.2. A recorrente alega ilegitimidade passiva, sob o
argumento de que os produtos pertenciam a terceiro e foram armazenados por engano
em área anexa à empresa, sem responsabilidade direta da apelante.3. Princípio da
dialeticidade: O recurso deve atacar especificamente os fundamentos da decisão
recorrida. A repetição de argumentos afastados na sentença, sem enfrentamento dos
principais fundamentos, compromete a admissibilidade do apelo, nos termos do art. 932,
III, do CPC.4. No caso, a apelação limita-se a repetir a tese de ilegitimidade passiva sem
enfrentar a essência da decisão: a irrelevância da titularidade dos produtos para a
configuração da infração administrativa, fundada no armazenamento sem autorização.5.
Não se verifica cerceamento de defesa. O indeferimento da oitiva de testemunhas não
prejudicou o julgamento, uma vez que as provas colhidas na fase administrativa e judicial
foram consideradas suficientes. A apelante não demonstrou de forma concreta como a
ausência da prova comprometeria seu direito de defesa.6. Gratuidade de justiça: o
benefício foi concedido na fase inicial e permanece válido no grau recursal, nos termos
do art. 98, § 1º, VIII, do CPC, tornando prejudicado novo pedido formulado pela
apelante.7. Honorários advocatícios recursais majorados de 10% para 15%, conforme
art. 85, § 11, do CPC, observada a gratuidade de justiça já deferida.8. Recurso não
conhecido. Honorários majorados. (TJRR – AC 0810795-83.2023.8.23.0010, Rel. Des.
ERICK LINHARES, Câmara Cível, julg.: 31/10/2024, public.: 31/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C COBRANÇA –
PROGRESSÃO FUNCIONAL – SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. 1ª APELAÇÃO:LEI
N.º 1.611/2015 – APLICAÇÃO – RECONHECIMENTO ADMINISTRATIVO DO DIREITO
POSTULADO – PERDA DO INTERESSE PROCESSUAL – INEXISTÊNCIA DE
DEMONSTRAÇÃO DE ERRO NO REENQUADRAMENTO REALIZADO PELO
MUNICÍPIO DE BOA VISTA – VERBAS RETROATIVAS DEVIDAS - DIFERENÇAS
SALARIAIS NÃO ATINGIDAS PELA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – RECURSO
DESPROVIDO
–
SENTENÇA
MANTIDA.
2ª
APELAÇÃO:
AUSÊNCIA
DE
DIALETICIDADE RECURSAL – RECURSO NÃO CONHECIDO. (TJRR – AC
0802853-97.2023.8.23.0010, Rel. Des. TÂNIA VASCONCELOS, Câmara Cível, julg.:
19/12/2024, public.: 19/12/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. INSCRIÇÃO DO NOME DO SÓCIO NA CDA.
AUSÊNCIA DE SUA PARTICIPAÇÃO NO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO COMO
PARTE. RAZÕES DO APELO QUE REPETEM, EM PARTE, AS MESMAS JÁ
LANÇADAS NA CONTESTAÇÃO. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. INDICAÇÃO DE
PRECEDENTES DO STJ QUE NÃO SE AMOLDAM À HIPÓTESE DOS AUTOS.
RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, DESPROVIDO.
1. A simples repetição, nas razões do apelo, dos argumentos lançados na fase de
conhecimento, impõe o não conhecimento desses argumentos por não observância do
princípio da dialeticidade. 2. Mostra-se escorreita a sentença que reconhece a
ilegitimidade passiva do sócio que não integrou o procedimento administrativo fiscal na
qualidade de parte, conforme precedentes do STJ e do egrégio TJRR acerca do tema.
(TJ-RR - AC: 0831030-13.2019.8.23.0010, Relator: ELAINE BIANCHI, Data de
Julgamento: 25/04/2021, Câmara Cível, Data de Publicação: 26/04/2021)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO - OFENSA AO PRINCÍPIO DA
DIALETICIDADE - NÃO CONHECIMENTO DO INCONFORMISMO. 1. O princípio da
dialeticidade recursal exige a impugnação integral e específica de cada um dos
fundamentos da decisão recorrida, sob pena de não conhecimento do recurso. 2.
Olvidando a embargante de tal ônus, impõe-se o não conhecimento dos declaratórios.
(TJ-RR - EDecAC: 72119027220168230010 7211902-72.2016.8.23.0010, Relator: Des.
Cristóvão Suter, Data de Publicação: DJe 09/10/2019, p.)
No entanto, embora o presente recurso, a rigor não pudesse sequer ser conhecido
porque não atacou os fundamentos da sentença; a fim de evitar argumentos de violação à
ampla defesa e acesso ao duplo grau de jurisdição, conheço do recurso e passo à análise do
mérito da controvérsia.
In casu, o juizo a quo julgou improcedente a demanda por ausência de documentação
apta a comprovar a condição de superendividada, já que a parte autora, ora apelante, “deixou
de provar o fato constitutivo de seu direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram
juntados aos autos documentos que deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de
pessoa superendividada nos termos da lei, não havendo que se falar na realização de
repactuação de dívidas da forma pretendida”.
Ou seja, a parte apelante não forneceu os documentos necessários para que o
magistrado senteciante pudesse aferir, com convicção, a sua alegada condição de
superendividada.
Dito de outra forma, não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o
comprometimento do mínimo existencial, razão pela qual deve ser preservada a autonomia das
vontades, visto que os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e
consciente pelas partes.
Assim, infere-se que a ratio decidendi utilizada pelo magistrado sentenciante para julgar
improcedente a pretensão autoral merece ser mantida por seus próprios fundamentos, a qual
adoto como razão de decidir para conhecer do recurso, mas negar-lhe provimento.
Em reforço à conclusão adotada pelo juízo a quo, confira-se a jurisprudência pátria
sobre o tema:
APELAÇÃO
CÍVEL.
Ação
revisional.
Repactuação
de
dívidas.
Lei
do
Superendividamento. Ausência de comprovação documental ou dos requisitos para a
pretendida limitação nos pagamentos devidos. Higidez contratual reconhecida. Sentença
de improcedência mantida. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJ-SP - Apelação Cível:
0000507-73.2023.8.26.0577 São José dos Campos, Relator: Emílio Migliano Neto, Data
de Julgamento: 21/02/2024, 23ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação:
21/02/2024)
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÉBITO - LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO DE
SUPERENDIVIDADO DO CONSUMIDOR - IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. Nos termos
da Lei nº 14.181/2021, que visa dispor sobre formas de prevenção e solução da situação
de superendividamento dos consumidores, entende-se nessa situação, fazendo jus,
portanto, à repactuação de débitos, a pessoa natural, de boa-fé, que evidencia a total
impossibilidade de adimplir a suas dívidas de consumo sem comprometer seu mínimo
existencial. Ausente as provas de tais circunstâncias, deve ser mantida a improcedência
da pretensão inicial. (TJ-MG - Apelação Cível: 5001170-35.2023.8.13.0241
1.0000.24.174736-9/001, Relator: Des.(a) Arnaldo Maciel, Data de Julgamento:
07/05/2024, 7ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 15/05/2024)
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CIVIL E PROCESSUAL
CIVIL. PROCESSO SOB O RITO ESPECIAL DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
SUPERENDIVIDAMENTO.
AFETAÇÃO
DO
MÍNIMO
EXISTENCIAL
APÓS
DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E EM CONTA CORRENTE. NÃO
DEMONSTRADO. INSTAURAÇÃO DO PROCEDIMENTO DA LEI Nº 14.181/2021.
REQUISITOS
NÃO
PREENCHIDOS.
RECURSO
DESPROVIDO.
SENTENÇA
MANTIDA. 1. A solicitação de repactuação de dívidas pretendida pelo apelante é medida
estabelecida no art. 104-A, § 4º, do CDC, introduzido pela Lei nº 14.181/21, aplicada em
favor do consumidor superendividado. Segundo o art. 54-A, § 1º, do CDC, ocorre o
superendividamento quando o consumidor pessoa física, de boa-fé, não consegue pagar
a totalidade de suas dívidas de consumo (exigíveis e vincendas) sem comprometer o seu
mínimo existencial. 2. O superendividamento está diretamente relacionado com o mínimo
existencial do indivíduo, ou seja, o superendividamento pressupõe o comprometimento
da sobrevivência da pessoa e ameaça o indivíduo e sua família (mínimo existencial), no
caso, verifica-se que o apelante é policial militar do Distrito Federal e está submetido ao
regime jurídico dos servidores públicos distritais, porém, na hipótese, imperioso destacar
a existência de óbice quanto ao pedido de repactuação de dívida, tendo em vista a
necessidade de observância mínimo existencial, elemento previsto como requisitos da
Lei nº 14.181/21. 3. No caso concreto, constata-se, com base nos elementos probatórios,
que o apelante percebe uma renda líquida, após todos os descontos, inclusive, os
realizados em conta corrente, uma renda líquida muito acima do estabelecido pelo
Decreto nº 11.150/22, com redação dada pelo Decreto nº 11.567/2023. Dessa forma o
apelante não conseguiu demonstrar os requisitos para que seja caracterizado o
superendividamento. 4. Por sua vez, a intervenção judicial somente se justifica na
hipótese de situação excepcional se constatado a existência de superendividamento, sob
pena de indevida intervenção judicial na autonomia da vontade. Na hipótese, entretanto,
não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o comprometimento do
mínimo existencial. Nesse contexto, deve ser preservada a autonomia das vontades, pois
os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e consciente pelas
partes. Portanto, não comprovado o comprometimento ao mínimo existencial, não há
como instaurar o procedimento de repactuação de dívidas. 5. Recurso desprovido.
Sentença mantida. (TJ-DF 07238141920238070003 1924958, Relator: ALFEU
MACHADO, Data de Julgamento: 18/09/2024, 6ª Turma Cível, Data de Publicação:
02/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. SUPERENDIVIDAMENTO.
REPACTUAÇÃO DE DÍVIDA. EXCEPCIONALIDADE. MÍNIMO EXISTENCIAL. PODER
REGULAMENTAR. DECRETO 11.150/2022. AUSTERIDADE. PODER JUDICIÁRIO.
INTERVENÇÃO NÃO JUSTIFICADA. IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO. SENTENÇA
MANTIDA. 1. As normas protetivas que regulam o tratamento do superendividamento
garantem a repactuação das dívidas, mediante a preservação do mínimo existencial, nos
termos da regulamentação. Art. 104-A do Código de Defesa do Consumidor. 2. Ainda
carente de debates, o Decreto Presidencial nº 11.150, de 26 de julho de 2022, com
vacatio legis de sessenta dias da após a publicação, traz a delimitação acerca do tema.
3. Nos termos do art. 3º do Decreto 11.150/2022, ?considera-se mínimo existencial a
renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do
salário mínimo vigente na data de publicação deste Decreto?. 4. Embora se possa
questionar a extrema austeridade imposta pela regulamentação do que pode ser
considerado o mínimo existencial, a intervenção do poder judiciário nos contratos regidos
pelo Código de Defesa do Consumidor deve se pautar pela teoria da base objetiva dos
contratos. 5.Na hipótese em que não se constata alteração das circunstâncias
intrínsecas à formulação do vínculo contratual, assim como não se identifica condutas de
incontestável abuso por parte da instituição financeira credora, a intervenção judicial nos
contratos não se justifica. 6. Recurso conhecido e não provido. (TJ-DF
07058375420228070001 1674193, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, Data de
Julgamento: 08/03/2023, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 20/03/2023)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATOS BANCÁRIOS.
REPACTUAÇÃO
DE
DÍVIDAS.
LIMITAÇÃO
DOS
DESCONTOS
EM
CONTA-CORRENTE DO DEVEDOR. PRELIMINARES DE INÉPCIA DA INICIAL E
FALTA DE INTERESSE DE AGIR REJEITADA. CONTRATAÇÃO ESCLARECIDA PELO
CONSUMIDOR. REPACTUAÇÃO. IMPOSSIBILIDAE. VEDAÇÃO DO § 1º DO ART.
104-A DO CDC. PLANO DE PAGAMENTO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
APELAÇÃO CONHECIDA. PRELIMINARES REJEITADAS E NÃO PROVIDA. 1.
Insurge-se o autor, ora apelante, contra sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível de
Samambaia que, na ação de repactuação de dívidas com 4 instituições bancárias,
homologou o acordo de pagamento de dívidas feito entre o autor e o Banco INTER S/A,
revogou a tutela anteriormente concedida de limitação de descontos em conta-corrente a
30% (trinta por cento) dos ganhos mensais líquidos e julgou improcedente o pedido da
inicial, bem como o condenou ao pagamento das custas processuais e dos honorários
advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade restou suspensa
diante da gratuidade de justiça concedida. Pretende o prosseguimento de ação de
repactuação de dívidas de mútuo com a apresentação de plano de pagamento com
prazo superior ao estabelecido legalmente e limitação dos descontos em sua
conta-corrente ao patamar de 30% de sua remuneração mensal líquida
independentemente da modalidade do empréstimo. 2. O juízo sentenciante
compreendeu pela incompatibilidade do plano de pagamento apresentado pelo devedor
com a observância de requisito essencial da Lei do Superendividamento (Lei n.
14.181/2021), a saber, o prazo máximo de pagamento em até 5 anos. Portanto,
descabida a aplicação do art. 104-B da lei citada, para instauração da segunda fase do
procedimento de superendividamento, pois o próprio consumidor já informou a
impossibilidade de adequação da proposta aos termos da legislação. Além disso, foram
verificados fortes indícios da contratação dolosa dos débitos pelo apelante devedor. 3.
Não induz à inépcia da inicial do pedido de repactuação dos contratos a ausência de
efetivo plano de pagamento por não representar vício insanável (art. 337, IV do CPC). 4.
Quanto à questão preliminar de falta de interesse de agir arguida pelo apelado BANCO
BMG SA, ?o interesse de agir, consubstanciado no binômio necessidade-utilidade, busca
alcançar a realização da pretensão deduzida em Juízo, a qual não poderia ser obtida
através de outra forma. Verificando-se que a preliminar suscitada se confunde com o
mérito da questão, há de ser rejeitada de plano? (TJDFT. Acórdão 1617020,
07219987620218070001, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, 5ª Turma Cível, data de
julgamento: 21/9/2022, publicado no DJE: 29/9/2022. Pág.: Sem Página Cadastrada .).
Preliminar rejeitada. 5. É ônus do consumidor provar que se encontra privado do seu
mínimo existencial nos termos do art. 54-A do CDC. No caso em análise, não há provas
hábeis de que, após os descontos realizados e a sobra de R$ 4.000,00 (quatro mil reais),
a quantia remanescente é apta a comprometer-lhe o próprio sustento e o de sua família.
Com efeito, a quantia representa aproximadamente três salários-mínimos, o que é
superior à remuneração mensal média do trabalhador brasileiro. Segundo estatísticas do
IBGE, no trimestre de setembro a novembro de 2022 o salário médio mensal é de
aproximadamente R$ 2.787 (dois mil setecentos e oitenta e sete reais). Há, ainda, de se
salientar quanto a existência de fortes indícios de contratação dolosa dos débitos pelo
apelante consumidor, o que, por si só, tem o condão de excluir os empréstimos aqui
impugnados do processo de repactuação de dívidas conforme o § 1º do art. 104-A do
CDC. 6. Verificado que o plano de pagamento não fora formulado em consonância aos
parâmetros mínimos impostos pela legislação, em especial a previsão do limite temporal
de 05 (cinco) anos para pagamento, a fim de evitar a eternização das obrigações, a
manutenção da improcedência do pedido é medida que se impõe. 7. Apelação
conhecida, preliminares rejeitadas e não provida. Sentença mantida. (TJ-DF
07134365420218070009 1690491, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, Data de
Julgamento: 18/04/2023, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: 28/04/2023)
Portanto, adoto e ratifico a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo para
solucionar a controvérsia; e assim procedo ancorada no entendimento remansoso do Tribunal
da Cidadania que reconhece […] a viabilidade de o órgão julgador adotar ou ratificar o juízo de
valor firmado na sentença, inclusive transcrevendo-a no acórdão, sem que tal medida encerre
omissão ou ausência de fundamentação no decisum (REsp nº 662.272-RS, 2ª Turma, Rel.Min.
João Otávio de Noronha, j. de 4.9.2007; REsp nº 641.963-ES, 2ª Turma, Rel. Min. Castro
Meira, j. de 21.11.2005; REsp nº 592.092-AL, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, j. 17.12.2004
e REsp nº 265.534- DF, 4ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j de 1.12.2003).
Diante do exposto, nego provimento ao recurso.
Em atendimento ao que preconiza o art. 85, § 11, do CPC, majoro em 5% (cinco por
cento) os honorários advocatícios fixados na sentença.
É como voto.
A fim de evitar a oposição de embargos de declaração meramente protelatórios,
considera-se, desde já, prequestionada toda matéria infraconstitucional e constitucional,
observando o entendimento do STJ no sentido de que, para o prequestionamento, é
desnecessária a explícita indicação dos dispositivos de lei que o fundamentaram.
No ensejo, advirto às partes que a interposição de eventual recurso meramente
protelatório ou com escopo de rediscutir esta controvérsia ensejará na aplicação de multa, nos
termos dos arts. 79, 80, 81 e 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil.
Intimem-se.
Com o trânsito em julgado, arquivem-se (art. 1.006 do CPC).
Boa Vista - RR, data constante do sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO.
AUSÊNCIA
DE
IMPUGNAÇÃO
AOS
FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. NÃO COMPROVAÇÃO DA
CONDIÇÃO
DE
SUPERENDIVIDAMENTO.
IMPROCEDÊNCIA
MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. O recurso de apelação deve, nos termos do art. 1.010, incisos II a IV,
do CPC, conter impugnação específica aos fundamentos da sentença, o
que configura o princípio da dialeticidade. A mera repetição das teses
iniciais, sem enfrentamento dos fundamentos do decisum, compromete
sua admissibilidade.
2. Embora a apelação apresentada limite-se a reiterar os argumentos da
petição inicial, sem atacar especificamente a ratio decidendi da sentença,
o recurso foi conhecido a fim de garantir o duplo grau de jurisdição e evitar
prejuízos à parte.
3. A Lei nº 14.181/2021, que alterou o Código de Defesa do Consumidor,
condiciona a instauração do procedimento de repactuação de dívidas à
comprovação de que o consumidor está impossibilitado de pagar a
totalidade de suas dívidas sem comprometer o mínimo existencial (art.
54-A, § 1º, CDC).
4. No caso concreto, a autora não comprovou sua condição de
superendividada nem apresentou documentos suficientes à análise do
comprometimento de sua subsistência, ônus que lhe incumbia nos termos
do art. 373, I, do CPC.
5. Em respeito à autonomia privada, não demonstrada a situação
excepcional de superendividamento, deve-se preservar os pactos
livremente firmados entre as partes.
6. A jurisprudência desta Corte e de outros Tribunais reconhece que a
ausência de comprovação do superendividamento inviabiliza a aplicação
do procedimento previsto na Lei nº 14.181/2021.
7. Recurso conhecido e não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da 2ª Turma Cível do
Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em negar
provimento ao presente recurso, nos termos do voto da Relatora. Participaram do julgamento
os eminentes Desembargadores: Mozarildo Cavalcanti (Presidente e Julgador), Elaine Bianchi
(Relatora) e Cristóvão Suter (Julgador). Sessão Virtual do Egrégio Tribunal de Justiça do
Estado de Roraima, data constante no sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi - Relatora
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Processo nº 0804296-49.2024.8.23.0010
ID: 276194374
Data de Disponibilização:
22/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
LÁZARO JOSÉ GOMES JÚNIOR
OAB/MS XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
A…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida pelo Juízo do 4º
Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa Vista, que julgou
improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de Repactuação de Dívidas
C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte teor (EP 183.1):
Proc. n.° 0804296-49.2024.8.23.0010
SENTENÇA
GRACIANE PASSOS DE SOUZA ajuizou ação de repactuação de dívida por
superendividamento c.c pedido de tutela de urgência em face do BANCO DO BRASIL
S.A, BANCO SANTANDER S.A., CREFISA, FUPRES ADMINISTRADORA DE
CARTOES LTDA, BANCO DAYCOVAL S.A., AVANCARD PROMOÇÃO DE VENDAS
LTDA e BEMOL S/A, alegando, em síntese, que não consegue arcar com as despesas
referente aos contratos de empréstimos consignados realizados e que os descontos em
sua remuneração afetam sua sobrevivência, tendo o seu mínimo existencial
comprometido. Deu à causa o valor de R$ 431.415,81. Juntou documentos (EP's 1.2 a
1.19).
O pedido liminar restou indeferido, sendo concedida a gratuidade processual à parte
autora (EP 6).
Citados (EP's 39, 40, 41), os réus apresentaram contestação.
O BANCO MASTER S/A e PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA. (AVANCARD)
suscitou, em preliminar, a sua ilegitimidade passiva e impugnou a concessão da
gratuidade processual autoral. No mérito, arguiu a ausência de ato ilícito; a ausência dos
requisitos para aplicação da lei que trata do superendividamento; má-fé da autora na
contratação dos empréstimos, requerendo, ao final, o julgamento improcedente dos
pedidos formulados. Anexou documentos (EP 46).
A BEMOL S.A. suscitou, em sede preliminar, a inépcia da inicial. Quanto ao mérito,
sustentou que a parte autora não trouxe provas do direito pleiteado, requerendo o
julgamento de improcedência (EP 49).
A CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS S.A suscitou, em
preliminar, a inépcia da inicial; a falta de interesse de agir; além de impugnar a
gratuidade processual. No mérito, arguiu a legalidade dos contratos firmados, não
havendo que se falar em abusividade das termos pactuados, bem como um possível
aumento da taxa média e a, consequente, redução da oferta em caso de procedência,
diante da eventual insegurança jurídica, requerendo, ao final, o julgamento improcedente
dos pedidos formulados na exordial. Anexou documentos (EP 58).
O BANCO SANTANDER S/A consignou, preliminarmente, a inépcia da inicial, além de
impugnar a gratuidade processual e o valor atribuído à causa. No mérito, sustentou que
a parte autora não trouxe provas da ofensa ao seu mínimo existencial, ausentes,
portanto, as exigências previstas na lei de superendividamento, sendo válidos e
regulares os contratos firmados, invocando o princípio do pacta sunt servanda,
pugnando, ao final, pelo julgamento improcedente da demanda. Anexou documentos (EP
90).
A FUPRES ADMINISTRADORA DE CARTÕES LTDA suscitou, preliminarmente, a
impossibilidade de integração dos contratos; inépcia da inicial, impugnando a concessão
da gratuidade processual. No mérito, sustentou que os valores foram assumidos
voluntariamente pelo autor; a legalidade dos contratos firmados e a ausência das
exigências previstas na lei de superendividamento, pugnando, ao fim, pela
improcedência dos pedidos. Na oportunidade, acostou documentos (EP 93).
O BANCO DAYCOVAL S.A afirmou, em preliminar, a ausência do interesse de agir e a
inépcia da inicial, impugnando o valor da causa; a gratuidade processual e a capacidade
postulatória. No mérito, sustentou que a parte autora não comprovou o
superendividamento; que inexiste ofensa ao mínimo existencial; a legalidade do contrato;
a preservação do princípio do pacta sunt servanda; e a sua boa-fé na celebração dos
empréstimos, requerendo que os pedidos sejam julgados improcedentes. Apresentou
documentos (EP 94).
O BANCO DO BRASIL S.A. sustentou, preliminarmente, a inépcia da inicial, impugnando
a concessão da gratuidade processual, além do valor atribuído à causa. No mérito,
sustentou a improcedência da ação em face da ausência dos requisitos para a aplicação
da lei de superendividamento e a legalidade dos contratos, invocando o princípio do
pacta sunt servanda. Juntou documentos (EP 95).
Designada e realizada audiência de conciliação, a mesma restou frutífera somente em
relação à corré CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, sendo
homologada a transação e, na mesma ocasião, reconhecida a ilegitimidade passiva do
réu PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA (AVANCARD) (EP 121).
A parte autora demonstrou seu interesse na instauração do processo por
superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas
com a apresentação de minuta do plano judicial compulsório (EP 128).
Instadas acerca da produção de outras provas (EP 134), restou indeferido o pedido de
prova documental, anunciando-se o julgamento antecipado da lide (EP 159) sem
oposição pelos litigantes (EP's 175 a 181).
É o relatório.
Fundamento e DECIDO.
Desnecessária maior dilação probatória, a teor do disposto no inciso I do art. 355 do
Código de Processo Civil, sendo certo que, na análise do julgamento antecipado da lide,
vigora a prudente discrição do magistrado no exame da necessidade ou não da
realização de outras provas, ante as circunstâncias de cada caso concreto e a
necessidade de não ofender o princípio do pleno contraditório. No caso em tela, a lide
comporta pronto julgamento, dada pois a questão é eminentemente de direito e os
documentos coligidos aos autos são amplamente suficientes ao deslinde da questão
controvertida.
De proêmio, RECHAÇAM-SE as teses preliminares arguidas pelos requeridos.
Deveras, não prospera a preliminar de inépcia da inicial, uma vez que, da narrativa
contida na exordial, extrai-se que os pedidos formulados são certos e determinados, bem
como que há compatibilidade entre eles, sendo perfeitamente identificável a causa de
pedir e a lógica da narrativa fática. Ademais, registra-se que os requisitos legais para
subsunção da lei de superendividamento (Lei 14.181/21), serão apreciados na análise do
mérito.
Quanto à alegação de falta de interesse de agir, a tese não se sustenta, haja vista o
princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição, conforme preceitua o art. 5°,
inciso XXXV, da Constituição Federal, considerando, ainda, que a parte autora
demonstra a necessidade de buscar a tutela jurisdicional para proteger, resguardar ou
conservar o seu direito (necessidade-adequação), seja no julgamento de mérito
procedente ou não, máxime para eventual repactuação de suas dívidas, haja vista a
impossibilidade de pactuação/transação administrativa.
No que tange a gratuidade processual, mantenho a benesse outrora deferida, haja vista
a ausência de elementos em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Lado outro, quanto à impugnação ao valor da causa, o pedido comporta parcial
acolhimento. Explico.
In casu, a soma dos débitos contratuais com as partes requeridas é R$ 431.415,81,
sendo que a presente repactuação e eventual renegociação das dívidas, nos moldes
apresentados na inicial, o seu proveito econômico corresponderia apenas a
diminuição/abatimento dos valores citados. Destarte, com a minuta do plano de
repactuação, em caso de homologação por este Juízo, a soma total das dívidas da parte
autora não mais seria de seria de R$ 431.415,81, mas sim de R$ 146.704,14, conforme
primeiro plano de repactuação apresentado. Ou seja, o real proveito econômico seria de
R$ 284.711,67, valor este que deve ser atribuído à causa. Nesse sentido, colaciono o
seguinte julgado, verbis: (…)
Em sendo assim, fixo o valor da causa em R$ 284.711,67, proveito econômico
efetivamente buscado pela parte autora com a presente ação. Retifique-se. Anote-se.
No que tange à (im)possibilidade de repactuação/integração dos contratos/dívidas do
consumidor, a matéria confunde-se com o
meritum causae
e com ele será
analisado/decidido.
Por fim, a capacidade postulatória da parte restou comprovada, haja vista estar
representada por advogado habilitado e com instrumento de mandato subscrito
digitalmente, na forma da lei.
Ultrapassadas tais questões, adentrando ao mérito, tenho que os pedidos iniciais não
prosperam.
De proêmio, convém ressaltar tratar-se de inequívoca relação de consumo, pois os
contratos bancários também se submetem à legislação de proteção e defesa dos direitos
do consumidor, por força do que dispõe o artigo 3º, § 2º, da Lei nº 8.078/90. Ademais, é
pacífico que a relação jurídica estabelecida entre as partes está inserida no âmbito das
relações de consumo, conforme corrobora o teor do Enunciado 297 da Súmula do E.
Superior Tribunal de Justiça:
“O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”
A controvérsia cinge-se à repactuação de dívida, na qual a parte autora fundamenta a
sua pretensão nos preceitos da Lei 14.181/21, que alterou dispositivos do CDC. De outra
banda, os credores requeridos, em suma, impugnam a pretensão sob o argumento de
ausência dos requisitos legais.
O superendividamento, conceituado como a “inviabilidade de pagamento da totalidade
dos débitos consumeristas (vencidos e vincendos) sem comprometimento do mínimo
existencial pelo consumidor pessoa natural e de boa-fé” (CDC, 54-A, § 1º), foi
regulamentado a partir da Lei n. 14.181/21, que introduziu modificações esparsas no
CDC e no Estatuto da Pessoa Idosa. Trata-se de instituto fundamentado no princípio da
boa-fé objetiva, mais precisamente nos deveres de cooperação e lealdade para a
evitação da ruína do outro contratante (exceção da ruína).
Ainda, o art. 54-A, do mesmo diploma legal, elucida que:
'Entende-se por
superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de
boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem
comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação'.
A mencionada regulamentação foi realizada por meio do
Decreto Federal nº
11.150/2022, que estipulou como mínimo existencial a renda mensal do consumidor
pessoal natural, estando previsto atualmente, o valor equivalente a R$ 600,00 (caput, art.
3º).
Ademais,
a
aplicabilidade
das
normas
de
prevenção
e
tratamento
do
superendividamento pressupõe a diferenciação entre o superendividamento ativo e o
superendividamento passivo. O primeiro decorre do endividamento voluntário, e pode se
dar de modo consciente (por ação de má-fé, com intenção deliberada de fraude a
credores em razão da prévia ciência quanto à incapacidade de pagamento), hipótese em
que não se aplicam as normas de prevenção e tratamento, ou de modo inconsciente (por
ação negligente/imprudente, em razão da contratação por impulso ou da não fiscalização
de despesas). Já o segundo é oriundo do endividamento involuntário, decorrente de
fatores externos que obrigam o indivíduo a suportar despesas superiores às suas
receitas (desemprego, divórcio, doença, dentre outras).
Registra-se que o processo de repactuação de débitos, regulado no art. 104-A do CDC,
é instaurado pelo juiz a requerimento do consumidor superendividado e visa, em uma
primeira etapa, à conciliação (obtenção de acordo entre o devedor e os credores). Caso
não seja celebrado acordo, passa-se então ao processo por superendividamento,
regulado no art. 104-B do CDC (2ª fase), também instaurado pelo juiz a requerimento do
consumidor superendividado e, nessa segunda etapa, objetiva a (i) revisão ou integração
de contratos; (ii) repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial
compulsório.
Importante anotar que o plano judicial compulsório (CDC, art. 104-B, § 4º) deve
assegurar aos credores, no mínimo, o valor principal do débito, atualizado com o
adimplemento integral em, no máximo 5 (cinco) anos, com a primeira parcela devida no
prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da homologação e as demais
mensais e sucessivas.
Logo, para a repactuação de dívidas e usufruto dos benefícios da lei, a parte autora
superendividada deve preencher os seguintes requisitos: 1) insuficiência de renda; 2) ser
devedor de boa-fé, ou seja, em razão de sua renda ser inferior ao que acumulou em
dívidas; 3) as dívidas devem ser decorrentes de relações de consumo comum, não
podendo incluir aqui consumos luxuosos, de alto valor; 4) em hipótese alguma as dívidas
devem ser decorrentes de má-fé, ou seja, dívidas contraídas com intuito fraudulento; 5) a
petição inicial deve conter um plano detalhado da forma/prazo de pagamento; e 6) a
indicação da renda familiar.
Uma vez firmadas tais premissas, no caso ora em apreço, passa-se ao exame do
preenchimento dos requisitos legais para a repactuação de dívidas.
Da análise dos autos, extrai-se incontroversa a existência de empréstimos adquiridos
pela parte autora junto às instituições financeiras rés.
In casu, verifica-se que parte autora não comprovou sua condição de consumidora
superendividada, deixando de demonstrar a impossibilidade em arcar com o pagamento
dos débitos sem prejuízo do mínimo existencial, bem como ausência de má-fé ou de
fraude na obtenção das dívidas.
Com efeito, não trouxe o(a) requerente cópias das faturas de cartão de crédito e extratos
bancários, com detalhamento de compras realizadas, quando da origem dos débitos,
para comprovação do risco à garantia do mínimo existencial, configurando, outrossim,
contradição, ao menos pela ausência de prova constituída acerca da real e efetiva
condição financeira do(a) requerente.
Ademais, conforme narrado em petição inicial, a requerente, como servidora pública em
atividade, aufere renda bruta de R$ 9.772,62, sendo que após descontos/retenções
legais e empréstimos resta o valor líquido de R$ 875,79.
Portanto, constata-se que remanescem após o pagamento de todos os débitos a
quantia de R$ 875,79, valor que está além da quantia prevista no art. 3º do Decreto
Federal no 11.150/2022 como mínimo existencial, situação incompatível com o rito
das ações de superendividamento (CDC, § 1º, art. 104-A), máxime considerando a
ausência
de
prova,
pelo(a)
demandante,
dos
alegados
gastos
não
consignados/cotidianos.
Destaca-se, ainda, que a parte autora é servidor(a) público(a) em atividade, com fonte de
renda bruta superior a R$ 9.000,00, sendo que, por certo, faz jus ao recebimento dos
beneplácitos de 13º salários e de férias, o que, por si só, consiste em expressivas
quantias complementativas a suas remunerações ordinárias, capazes de afastar
qualquer alegação de ofensa ao seu mínimo existencial. Nesse passo, a renda da parte
autora não pode, sob qualquer métrica, ser caracterizada como comprometedora do
mínimo vital para sua sobrevivência.
Ainda, observa-se a ausência de documentos a demonstrar gastos rotineiros da parte
autora, especialmente se é o(a) único(a) a sustentar sua família (esposo(o) e filhos,
incluindo uma maior de idade - EP 1.13), deixando a demandante de comprovar que é
arrimo/sustento da sua família, sequer comprovando os gastos/repasses/despesas. A
esse respeito, é cediço ser obrigação do pai e da mãe arcar com a manutenção dos
filhos na proporção da capacidade financeira de cada qual (CC, art. 1.703). Ainda,
denota-se da qualificação autoral que esta é casada, sendo que nada foi juntado acerca
da (im)possibilidade de seu companheiro e/ou genitor do(s) seu(s) filho(s), em arcar com
tais custos e em que quantia.
Não se pode perder de vista que também nada trouxe aos autos com relação à renda
familiar. Ocorre que, para a repactuação de dívida pretendida, com a preservação do
mínimo existencial à família seria necessária a apuração de toda a renda familiar e todas
as suas despesas, o que não se extrai dos autos, dada a ausência de documentações
em tal sentido.
Da mesma forma, verifica-se na fatura de cartão de crédito da autora (EP 1.13, 1.14
e 1.15) diversas compras realizadas recentemente e com extenso lapso para
pagamento, sem a efetiva demonstração da sua essencialidade (p. ex. RORAIMA
PISCI PARC 09/12 - R$ 843,00, CACULAO PARC 08/12 - R$ 191,11, dentre outras -
EP 1.16), inclusive em outro Estado da Federação - AIRBNB PAGAM PARC 02/02
SAO PAULO - R$ 293,16 - EP 1.9), mesmo diante de tais fatos serem consignados em
decisão de indeferiu pedido de urgência, fator contraditório para quem afirma ter sua
dignidade financeira atingida.
Acrescenta-se que, a minuta do plano compulsório apresentado pela parte autora (EP
128), em confronto com os demais documentos juntados pelos réus nas contestações
apresentadas, não contempla sequer o pagamento do valor do principal devido, corrigido
monetariamente por índices oficiais de preço, o que reforça a impossibilidade do
acolhimento dos pedidos autorais.
Mais a mais, compulsando os documentos juntados pela parte autora (EP 1.17),
observa-se, logo após o recebimento de seus proventos/remuneração, a realização de
transferências, via pix, e aplicação em conta poupança, inclusive, de valores
consideráveis (R$ 10.000,00 - EP 1.17 - pag. 3), sem, contudo, esclarecer as
destinações/finalidades dos pagamentos, depósitos e recebimentos, bem assim trazer a
Juízo extrato bancário das contas (poupança ou não) a que destinadas as transferências,
não havendo que ser falar em ofensa ao mínimo existencial.
Nesse sentido, observa-se que a parte autora também não trouxe qualquer
elemento para justificar a necessidade/motivo da realização dos empréstimos junto
às instituições financeiras, incluindo um valor superior a R$ 140.000, 00 com
apenas um único requerido (EP 95) fator preponderante a demonstrar sua boa-fé
na contratação das dívidas que pretende repactuar.
Ademais, insta consignar que os documentos apresentados não permitem concluir, com
precisão, o que levou o(a) requerente ao suscitado superendividamento e tampouco do
destino das expressivas quantias levantadas junto ao requerido, restando impossível a
verificação da sua boa-fé para subsunção à lei de superendividamento.
Ainda, a parte autora não comprova qualquer dado externo que tenha lhe acarretado a
alteração patrimonial, tais como redução drástica do salário, perda do emprego,
problemas de saúde ou outro fator que tenha, efetivamente, afetado sua conjuntura
econômica quando da época dos empréstimos/dívidas.
Deveras, cabe ao consumidor evidenciar a sua incapacidade de quitar as obrigações
contraídas, as quais visam atender a uma necessidade pessoal extraordinária decorrente
de infortúnios da vida ou eventos imprevisíveis (endividamento involuntário). Fora dessas
circunstâncias excepcionais, considera-se mero descontrole pessoal das finanças, não
enquadrado nos parâmetros da teoria do superendividamento.
Anota-se que incumbe à parte autora comprovar que tomou os valores para as despesas
básicas de subsistência, pois a repactuação não tem amparo legal quando as dívidas
que ' decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor'
(CDC, § 3º, art. 54-A).
Dito isto, acrescenta-se que pelo contexto da petição inicial, é possível aferir que o
pedido de redução dos descontos dos empréstimos fora baseado no suposto
superendividamento da parte autora e extrapolação do patamar máximo de margem
consignável, qual seja de 30%.
Com efeito, o objetivo da norma protetora ao consumidor (Lei de Superendividamento)
não foi criar uma regra matemática para subsunção aos benefícios previstos na lei, de
modo que a ofensa ao mínimo existencial demanda demonstração inequívoca de ofensa
à dignidade financeira do cidadão, não havendo que se falar em percentual fixo de sua
remuneração.
Deveras, o direito à repactuação das dívidas não possui caráter potestativo,
independente da vontade do credor, autorizando que o consumidor, unilateralmente,
aponte quantia que entende justa e adequada para sua renda, passando a ter direito a
solver somente tal importe. Se assim fosse, a adoção de tal entendimento representaria
uma grande insegurança jurídica, já que o credor estaria condicionado ao assentimento
exclusivo do consumidor, o que comprometeria o recebimento do crédito concedido em
medida verdadeiramente significativa, acabando por desaguar em aumento do custo do
crédito, ou seja, em elevação sistêmica dos juros, bem como em limitação das linhas de
crédito, prejudicando os consumidores de maneira global.
Por esta razão, o legislador estabeleceu rito, critérios e condições para se obter a
repactuação pretendida, disposições que precisam ser respeitadas, sob pena de
subversão do propósito normativo e geração de relevantes efeitos colaterais para o
próprio consumidor. Assim, não se pode, com lastro em tal previsão normativa, restringir
os débitos com lastro apenas na indicação de percentual que o consumidor julga
adequado, pois este deve ser fixado consoante os parâmetros previstos nos art. 104-A e
B do CDC.
Em outras palavras, não se olvide que o cenário é de ENDIVIDAMENTO, jamais de
SUPERENDIVIDAMENTO, nos termos da legislação de regência. E para essa situação
de endividamento, a qual não está acobertada pelas regras excepcionais dos arts. 54-A
e 104-A e seguintes do CDC, deverá a parte buscar as medidas legais para
adequação/renegociação contratual, afastando-se na situação em comento a imposição
de plano compulsório de pagamento ao réu.
Seja como for, ainda que admitidos os números do(a) requerente, e pese a alegada
afetação dos vencimentos às dívidas bancárias, fato é que o remanescente disponível
não implica em risco/ofensa/violação ao 'mínimo existencial', garantindo-se montante
capaz de atender as necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene
e transporte e etc, implicando apenas em redução de sua capacidade financeira, mas
não em vulnerabilidade econômica/financeira, elemento fundamental para a configuração
do superendividamento e embasamento para a concessão do manto protetivo do regime
de excepcionalização do pacta sunt servanda, sob pena de ofensa à segurança jurídica.
Com a devida venia, a intenção do legislador na criação de institutos que beneficiam aos
consumidores, como o enquadramento no conceito de superendividamento (Lei n.
14.181/21), não busca garantir à pessoa superendividada o alto padrão de vida que
detinha antes do endividamento, mas garantir o mínimo existencial para a sua
sobrevivência, o que, no caso em comento, está garantido pelo valor residual pós
descontos dos vencimentos do(a)requerente.
Ademais, não se tem notícia de que o(a) demandante é pessoa idosa, pródiga ou de
precária educação, sendo vedada à aplicação da repactuação de dívidas, aquelas
oriundas de contratos dolosamente celebrados sem o propósito de realizar pagamento,
nos termos do §1º do artigo 104-A do CDC.
A esse respeito, registra-se que a parte autora confirma que celebrou os contratos com o
banco réu, com taxas de juros pactuadas e previamente conhecidas, não alegando em
nenhum momento qualquer vício de consentimento.
Nessa direção, o entendimento jurisprudencial, verbis: (…)
Sendo assim, verifica-se que o(a) requerente deixou de provar o fato constitutivo de seu
direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram juntados aos autos documentos que
deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de pessoa superendividada nos termos
da lei, não havendo que se falar na realização de repactuação de dívidas da forma
pretendida.
Portanto, o(a) autor(a) não trouxe aos autos elementos aptos e suficientes que
comprovem o preenchimento dos requisitos acima elencados, sobretudo o
comprometimento do mínimo existencial, o que implica em óbice ao prosseguimento da
demanda e homologação de eventual plano de repactuação judicial compulsório em
detrimento dos credores.
Com efeito, resta manifesta a ausência no preenchimento dos requisitos legais, em
especial a alegada ofensa ao 'mínimo existencial' e, por conseguinte, a incomprovada
situação de superendividamento, forçoso concluir a inexistência do pressuposto de
procedibilidade para o procedimento especial previsto no art. 54-A, 104-A e seguintes do
CDC, ensejando, pois, a extinção irresolutiva da fase de conhecimento.
ANTE O EXPOSTO e, analisando tudo mais que dos autos consta, com fulcro na
fundamentação supra, julgo EXTINTA a fase de conhecimento, sem resolução do mérito,
reconhecendo a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido
e regular do processo, na forma do art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil.
Em razão da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento de custas processuais
e honorários advocatícios, que ora arbitro no patamar de 10% (dez por cento) sobre o
valor atualizado da causa, nos termos do § 2º do art. 85 do Código de Processo Civil,
contudo, suspensa a exigibilidade, haja vista se tratar de parte beneficiária da gratuidade
processual, mantendo-se a benesse outrora deferida, haja vista a ausência de elementos
em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Retifique-se o valor da causa para R$ 284.711,67.
Certifique a Serventia a existência de agravo de instrumento pendente de julgamento e,
em caso positivo, comunique-se à instância recursal acerca da presente sentença.
Sem prejuízo, considerando a possibilidade de ajuizamento de demandas repetitivas ou
em massa e em atenção a Nota Técnica CIJERR 04/2024, encaminhe-se cópia da
presente sentença ao Centro de Inteligência da Justiça Estadual de Roraima (CIJERR)
para conhecimento e providências que entender cabíveis (via SEI).
Na hipótese de interposição de recurso de apelação, por não haver mais juízo de
admissibilidade a ser exercido pelo Juízo a quo (CPC, art. 1.010), sem nova conclusão,
intime-se a parte contrária para oferecer resposta no prazo de 15 (quinze) dias.
(…) (grifos originais)
Irresignada, nas razões recursais a apelante aduz (EP 198.1), em síntese, […] que
recebe mensalmente a quantia de R$ 431.415,81 (quatrocentos e trinta e um mil, quatrocentos
e quinze reais e oitenta e um centavos); que após os descontos obrigatórios como PRESSEM e
Imposto de Renda no valor de 1.622,39 (mil seiscentos e vinte e dois reais e trinta e nove
centavos). Resta para a parte somente a quantia de R$ 8.150,23 (oito mil cento e cinquenta
reais e vinte e três centavos); que a situação de superendividamento de uma pessoa não se
pode usar fórmulas prontas e moldadas para outras situações; que ficou claro que a parte
Apelante não tem condições financeiras de arcar com todas as suas dívidas e manter um
padrão de vida digno; que a parte Apelante possui encargos nanceiros mensais oriundos de
contratos celebrados junto aos Apelados, que, quando somados, correspondem ao valor de
R$7.274,44 (sete mil, duzentos e setenta e quatro reais e quarenta e quatro centavos),
equivalente a MAIS DE 89% DE SUA RENDA LÍQUIDA; que o valor que resta para parte
Apelante é ínfimo, pois não é suficiente para custear suas despesas básicas, como moradia,
saúde, alimentação, despesas médicas, educação e etc.; que tais dívidas têm comprometido
substancialmente o mínimo existencial da parte Apelante. […]
Calcada nesses argumentos, requer o provimento do recurso para:
a) Seja reconhecida a inconstitucionalidade dos Decretos ns. 11.150/2022 e
11.567/2023, tendo em vista que afronta com a dignidade da pessoa humana;
b) Que a Sentença seja reformada para acolher os pedidos formulados na petição inicial
e torne o plano de pagamento ora apresentado em plano judicial compulsório com o seu
início no mês subsequente à data da sentença;
c) condenar a parte Requerida ao pagamento de custas processuais, despesas e
honorários advocatícios.
Certidão atestando a tempestividade do recurso e a ausência do recolhimento do
preparo (EP 7.1), pois a parte apelante é beneficiária da gratuidade da justiça.
Certidão atestando a tempestividade das contrarrazões contidas nos EPs 212.1, 219.1
e 220.1 (EP 6.1).
O relatado é suficiente.
Inclua-se na pauta de julgamento eletrônico, nos termos do art. 109 do RITJRR.
Intimem-se
Boa Vista - RR, 12 de maio de 2025.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
VOTO
Conforme relatado, trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida
pelo Juízo do 4º Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa
Vista, que julgou improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de
Repactuação de Dívidas C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte
teor (EP 183.1).
Em suma, a apelante requer o provimento do recurso de apelação para que a sentença
de primeiro grau seja reformada.
Os apelados, nas contrarrazões, defendem a manutenção integral da sentença.
Pois bem.
Antes do mais, convém relembrar que não compete ao segundo grau, em regra, julgar
a causa novamente, justamente por se tratar de instância revisora, mas reanalisar a sentença
nos termos da irresignação do apelo.
Dito isso, e após análise detida dos elementos contidos nos autos, constata-se que o
apelo não comporta acolhimento.
Isto porque, em suas razões recursais, a apelante não se insurge contra os
fundamentos da sentença. Ao contrário, a rigor repete ipsis litteris as teses apresentadas na
petição inicial (EP 1.1), que não se presta a atacar a fundamentação que levou o juízo “a quo” a
rejeitar a pretensão inicial.
Dito de outra forma, a parte apelante deixou de apresentar qualquer fundamento capaz
de infirmar a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo, pois ausente a formulação
crítica necessária para se opor aos fundamentos lançados na sentença.
Logo, contra os fundamentos adotados na decisão não existem, nos autos, motivos
pelos quais se possa considerar que o direito não tenha sido bem aplicado.
Ademais, o artigo 1.010, incisos II a IV, do Código de Processo Civil exige que na peça
de apelação constem a exposição do fato e do direito, as razões do pedido de reforma ou de
decretação de nulidade e o pedido de nova decisão.
Da mesma maneira, o pedido não pode ser genérico, mas deve especificar as matérias
decididas que o recorrente reputa devam ser alteradas, de forma que o juízo ad quem possa
julgar o cabimento e provimento do recurso adequadamente.
No caso em exame, contudo, não há nas razões recursais qualquer menção ao que foi
decidido na sentença proferida em primeiro grau de jurisdição, limitando-se a parte apelante a
reproduzir integralmente os argumentos utilizados com o objetivo de contestar a ratio decidendi
utilizada pelo julgador primevo, o que, por óbvio, seria o suficiente para o não conhecimento do
recurso, por violação ao princípio da dialeticidade recursal.
Para corroborar essa afirmação, confira-se a jurisprudência remansosa desta Corte de
Justiça sobre o tema:
PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL.
PRINCÍPIO
DA
DIALETICIDADE.
NÃO
CONHECIMENTO
DO
RECURSO.
HONORÁRIOS MAJORADOS.1. Apelação interposta contra sentença que julgou
improcedentes embargos à execução fiscal promovida pela Fazenda Pública do Estado
de Roraima, fundamentada em multa aplicada pela Agência de Defesa Agropecuária de
Roraima (ADERR) por armazenamento irregular de agrotóxicos sem autorização legal,
no valor de R$ 45.543,20. A sentença afastou a alegação de ilegitimidade passiva ao
entender que a responsabilidade pela infração decorre da guarda indevida dos produtos,
independentemente da sua titularidade.2. A recorrente alega ilegitimidade passiva, sob o
argumento de que os produtos pertenciam a terceiro e foram armazenados por engano
em área anexa à empresa, sem responsabilidade direta da apelante.3. Princípio da
dialeticidade: O recurso deve atacar especificamente os fundamentos da decisão
recorrida. A repetição de argumentos afastados na sentença, sem enfrentamento dos
principais fundamentos, compromete a admissibilidade do apelo, nos termos do art. 932,
III, do CPC.4. No caso, a apelação limita-se a repetir a tese de ilegitimidade passiva sem
enfrentar a essência da decisão: a irrelevância da titularidade dos produtos para a
configuração da infração administrativa, fundada no armazenamento sem autorização.5.
Não se verifica cerceamento de defesa. O indeferimento da oitiva de testemunhas não
prejudicou o julgamento, uma vez que as provas colhidas na fase administrativa e judicial
foram consideradas suficientes. A apelante não demonstrou de forma concreta como a
ausência da prova comprometeria seu direito de defesa.6. Gratuidade de justiça: o
benefício foi concedido na fase inicial e permanece válido no grau recursal, nos termos
do art. 98, § 1º, VIII, do CPC, tornando prejudicado novo pedido formulado pela
apelante.7. Honorários advocatícios recursais majorados de 10% para 15%, conforme
art. 85, § 11, do CPC, observada a gratuidade de justiça já deferida.8. Recurso não
conhecido. Honorários majorados. (TJRR – AC 0810795-83.2023.8.23.0010, Rel. Des.
ERICK LINHARES, Câmara Cível, julg.: 31/10/2024, public.: 31/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C COBRANÇA –
PROGRESSÃO FUNCIONAL – SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. 1ª APELAÇÃO:LEI
N.º 1.611/2015 – APLICAÇÃO – RECONHECIMENTO ADMINISTRATIVO DO DIREITO
POSTULADO – PERDA DO INTERESSE PROCESSUAL – INEXISTÊNCIA DE
DEMONSTRAÇÃO DE ERRO NO REENQUADRAMENTO REALIZADO PELO
MUNICÍPIO DE BOA VISTA – VERBAS RETROATIVAS DEVIDAS - DIFERENÇAS
SALARIAIS NÃO ATINGIDAS PELA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – RECURSO
DESPROVIDO
–
SENTENÇA
MANTIDA.
2ª
APELAÇÃO:
AUSÊNCIA
DE
DIALETICIDADE RECURSAL – RECURSO NÃO CONHECIDO. (TJRR – AC
0802853-97.2023.8.23.0010, Rel. Des. TÂNIA VASCONCELOS, Câmara Cível, julg.:
19/12/2024, public.: 19/12/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. INSCRIÇÃO DO NOME DO SÓCIO NA CDA.
AUSÊNCIA DE SUA PARTICIPAÇÃO NO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO COMO
PARTE. RAZÕES DO APELO QUE REPETEM, EM PARTE, AS MESMAS JÁ
LANÇADAS NA CONTESTAÇÃO. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. INDICAÇÃO DE
PRECEDENTES DO STJ QUE NÃO SE AMOLDAM À HIPÓTESE DOS AUTOS.
RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, DESPROVIDO.
1. A simples repetição, nas razões do apelo, dos argumentos lançados na fase de
conhecimento, impõe o não conhecimento desses argumentos por não observância do
princípio da dialeticidade. 2. Mostra-se escorreita a sentença que reconhece a
ilegitimidade passiva do sócio que não integrou o procedimento administrativo fiscal na
qualidade de parte, conforme precedentes do STJ e do egrégio TJRR acerca do tema.
(TJ-RR - AC: 0831030-13.2019.8.23.0010, Relator: ELAINE BIANCHI, Data de
Julgamento: 25/04/2021, Câmara Cível, Data de Publicação: 26/04/2021)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO - OFENSA AO PRINCÍPIO DA
DIALETICIDADE - NÃO CONHECIMENTO DO INCONFORMISMO. 1. O princípio da
dialeticidade recursal exige a impugnação integral e específica de cada um dos
fundamentos da decisão recorrida, sob pena de não conhecimento do recurso. 2.
Olvidando a embargante de tal ônus, impõe-se o não conhecimento dos declaratórios.
(TJ-RR - EDecAC: 72119027220168230010 7211902-72.2016.8.23.0010, Relator: Des.
Cristóvão Suter, Data de Publicação: DJe 09/10/2019, p.)
No entanto, embora o presente recurso, a rigor não pudesse sequer ser conhecido
porque não atacou os fundamentos da sentença; a fim de evitar argumentos de violação à
ampla defesa e acesso ao duplo grau de jurisdição, conheço do recurso e passo à análise do
mérito da controvérsia.
In casu, o juizo a quo julgou improcedente a demanda por ausência de documentação
apta a comprovar a condição de superendividada, já que a parte autora, ora apelante, “deixou
de provar o fato constitutivo de seu direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram
juntados aos autos documentos que deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de
pessoa superendividada nos termos da lei, não havendo que se falar na realização de
repactuação de dívidas da forma pretendida”.
Ou seja, a parte apelante não forneceu os documentos necessários para que o
magistrado senteciante pudesse aferir, com convicção, a sua alegada condição de
superendividada.
Dito de outra forma, não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o
comprometimento do mínimo existencial, razão pela qual deve ser preservada a autonomia das
vontades, visto que os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e
consciente pelas partes.
Assim, infere-se que a ratio decidendi utilizada pelo magistrado sentenciante para julgar
improcedente a pretensão autoral merece ser mantida por seus próprios fundamentos, a qual
adoto como razão de decidir para conhecer do recurso, mas negar-lhe provimento.
Em reforço à conclusão adotada pelo juízo a quo, confira-se a jurisprudência pátria
sobre o tema:
APELAÇÃO
CÍVEL.
Ação
revisional.
Repactuação
de
dívidas.
Lei
do
Superendividamento. Ausência de comprovação documental ou dos requisitos para a
pretendida limitação nos pagamentos devidos. Higidez contratual reconhecida. Sentença
de improcedência mantida. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJ-SP - Apelação Cível:
0000507-73.2023.8.26.0577 São José dos Campos, Relator: Emílio Migliano Neto, Data
de Julgamento: 21/02/2024, 23ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação:
21/02/2024)
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÉBITO - LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO DE
SUPERENDIVIDADO DO CONSUMIDOR - IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. Nos termos
da Lei nº 14.181/2021, que visa dispor sobre formas de prevenção e solução da situação
de superendividamento dos consumidores, entende-se nessa situação, fazendo jus,
portanto, à repactuação de débitos, a pessoa natural, de boa-fé, que evidencia a total
impossibilidade de adimplir a suas dívidas de consumo sem comprometer seu mínimo
existencial. Ausente as provas de tais circunstâncias, deve ser mantida a improcedência
da pretensão inicial. (TJ-MG - Apelação Cível: 5001170-35.2023.8.13.0241
1.0000.24.174736-9/001, Relator: Des.(a) Arnaldo Maciel, Data de Julgamento:
07/05/2024, 7ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 15/05/2024)
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CIVIL E PROCESSUAL
CIVIL. PROCESSO SOB O RITO ESPECIAL DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
SUPERENDIVIDAMENTO.
AFETAÇÃO
DO
MÍNIMO
EXISTENCIAL
APÓS
DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E EM CONTA CORRENTE. NÃO
DEMONSTRADO. INSTAURAÇÃO DO PROCEDIMENTO DA LEI Nº 14.181/2021.
REQUISITOS
NÃO
PREENCHIDOS.
RECURSO
DESPROVIDO.
SENTENÇA
MANTIDA. 1. A solicitação de repactuação de dívidas pretendida pelo apelante é medida
estabelecida no art. 104-A, § 4º, do CDC, introduzido pela Lei nº 14.181/21, aplicada em
favor do consumidor superendividado. Segundo o art. 54-A, § 1º, do CDC, ocorre o
superendividamento quando o consumidor pessoa física, de boa-fé, não consegue pagar
a totalidade de suas dívidas de consumo (exigíveis e vincendas) sem comprometer o seu
mínimo existencial. 2. O superendividamento está diretamente relacionado com o mínimo
existencial do indivíduo, ou seja, o superendividamento pressupõe o comprometimento
da sobrevivência da pessoa e ameaça o indivíduo e sua família (mínimo existencial), no
caso, verifica-se que o apelante é policial militar do Distrito Federal e está submetido ao
regime jurídico dos servidores públicos distritais, porém, na hipótese, imperioso destacar
a existência de óbice quanto ao pedido de repactuação de dívida, tendo em vista a
necessidade de observância mínimo existencial, elemento previsto como requisitos da
Lei nº 14.181/21. 3. No caso concreto, constata-se, com base nos elementos probatórios,
que o apelante percebe uma renda líquida, após todos os descontos, inclusive, os
realizados em conta corrente, uma renda líquida muito acima do estabelecido pelo
Decreto nº 11.150/22, com redação dada pelo Decreto nº 11.567/2023. Dessa forma o
apelante não conseguiu demonstrar os requisitos para que seja caracterizado o
superendividamento. 4. Por sua vez, a intervenção judicial somente se justifica na
hipótese de situação excepcional se constatado a existência de superendividamento, sob
pena de indevida intervenção judicial na autonomia da vontade. Na hipótese, entretanto,
não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o comprometimento do
mínimo existencial. Nesse contexto, deve ser preservada a autonomia das vontades, pois
os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e consciente pelas
partes. Portanto, não comprovado o comprometimento ao mínimo existencial, não há
como instaurar o procedimento de repactuação de dívidas. 5. Recurso desprovido.
Sentença mantida. (TJ-DF 07238141920238070003 1924958, Relator: ALFEU
MACHADO, Data de Julgamento: 18/09/2024, 6ª Turma Cível, Data de Publicação:
02/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. SUPERENDIVIDAMENTO.
REPACTUAÇÃO DE DÍVIDA. EXCEPCIONALIDADE. MÍNIMO EXISTENCIAL. PODER
REGULAMENTAR. DECRETO 11.150/2022. AUSTERIDADE. PODER JUDICIÁRIO.
INTERVENÇÃO NÃO JUSTIFICADA. IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO. SENTENÇA
MANTIDA. 1. As normas protetivas que regulam o tratamento do superendividamento
garantem a repactuação das dívidas, mediante a preservação do mínimo existencial, nos
termos da regulamentação. Art. 104-A do Código de Defesa do Consumidor. 2. Ainda
carente de debates, o Decreto Presidencial nº 11.150, de 26 de julho de 2022, com
vacatio legis de sessenta dias da após a publicação, traz a delimitação acerca do tema.
3. Nos termos do art. 3º do Decreto 11.150/2022, ?considera-se mínimo existencial a
renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do
salário mínimo vigente na data de publicação deste Decreto?. 4. Embora se possa
questionar a extrema austeridade imposta pela regulamentação do que pode ser
considerado o mínimo existencial, a intervenção do poder judiciário nos contratos regidos
pelo Código de Defesa do Consumidor deve se pautar pela teoria da base objetiva dos
contratos. 5.Na hipótese em que não se constata alteração das circunstâncias
intrínsecas à formulação do vínculo contratual, assim como não se identifica condutas de
incontestável abuso por parte da instituição financeira credora, a intervenção judicial nos
contratos não se justifica. 6. Recurso conhecido e não provido. (TJ-DF
07058375420228070001 1674193, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, Data de
Julgamento: 08/03/2023, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 20/03/2023)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATOS BANCÁRIOS.
REPACTUAÇÃO
DE
DÍVIDAS.
LIMITAÇÃO
DOS
DESCONTOS
EM
CONTA-CORRENTE DO DEVEDOR. PRELIMINARES DE INÉPCIA DA INICIAL E
FALTA DE INTERESSE DE AGIR REJEITADA. CONTRATAÇÃO ESCLARECIDA PELO
CONSUMIDOR. REPACTUAÇÃO. IMPOSSIBILIDAE. VEDAÇÃO DO § 1º DO ART.
104-A DO CDC. PLANO DE PAGAMENTO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
APELAÇÃO CONHECIDA. PRELIMINARES REJEITADAS E NÃO PROVIDA. 1.
Insurge-se o autor, ora apelante, contra sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível de
Samambaia que, na ação de repactuação de dívidas com 4 instituições bancárias,
homologou o acordo de pagamento de dívidas feito entre o autor e o Banco INTER S/A,
revogou a tutela anteriormente concedida de limitação de descontos em conta-corrente a
30% (trinta por cento) dos ganhos mensais líquidos e julgou improcedente o pedido da
inicial, bem como o condenou ao pagamento das custas processuais e dos honorários
advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade restou suspensa
diante da gratuidade de justiça concedida. Pretende o prosseguimento de ação de
repactuação de dívidas de mútuo com a apresentação de plano de pagamento com
prazo superior ao estabelecido legalmente e limitação dos descontos em sua
conta-corrente ao patamar de 30% de sua remuneração mensal líquida
independentemente da modalidade do empréstimo. 2. O juízo sentenciante
compreendeu pela incompatibilidade do plano de pagamento apresentado pelo devedor
com a observância de requisito essencial da Lei do Superendividamento (Lei n.
14.181/2021), a saber, o prazo máximo de pagamento em até 5 anos. Portanto,
descabida a aplicação do art. 104-B da lei citada, para instauração da segunda fase do
procedimento de superendividamento, pois o próprio consumidor já informou a
impossibilidade de adequação da proposta aos termos da legislação. Além disso, foram
verificados fortes indícios da contratação dolosa dos débitos pelo apelante devedor. 3.
Não induz à inépcia da inicial do pedido de repactuação dos contratos a ausência de
efetivo plano de pagamento por não representar vício insanável (art. 337, IV do CPC). 4.
Quanto à questão preliminar de falta de interesse de agir arguida pelo apelado BANCO
BMG SA, ?o interesse de agir, consubstanciado no binômio necessidade-utilidade, busca
alcançar a realização da pretensão deduzida em Juízo, a qual não poderia ser obtida
através de outra forma. Verificando-se que a preliminar suscitada se confunde com o
mérito da questão, há de ser rejeitada de plano? (TJDFT. Acórdão 1617020,
07219987620218070001, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, 5ª Turma Cível, data de
julgamento: 21/9/2022, publicado no DJE: 29/9/2022. Pág.: Sem Página Cadastrada .).
Preliminar rejeitada. 5. É ônus do consumidor provar que se encontra privado do seu
mínimo existencial nos termos do art. 54-A do CDC. No caso em análise, não há provas
hábeis de que, após os descontos realizados e a sobra de R$ 4.000,00 (quatro mil reais),
a quantia remanescente é apta a comprometer-lhe o próprio sustento e o de sua família.
Com efeito, a quantia representa aproximadamente três salários-mínimos, o que é
superior à remuneração mensal média do trabalhador brasileiro. Segundo estatísticas do
IBGE, no trimestre de setembro a novembro de 2022 o salário médio mensal é de
aproximadamente R$ 2.787 (dois mil setecentos e oitenta e sete reais). Há, ainda, de se
salientar quanto a existência de fortes indícios de contratação dolosa dos débitos pelo
apelante consumidor, o que, por si só, tem o condão de excluir os empréstimos aqui
impugnados do processo de repactuação de dívidas conforme o § 1º do art. 104-A do
CDC. 6. Verificado que o plano de pagamento não fora formulado em consonância aos
parâmetros mínimos impostos pela legislação, em especial a previsão do limite temporal
de 05 (cinco) anos para pagamento, a fim de evitar a eternização das obrigações, a
manutenção da improcedência do pedido é medida que se impõe. 7. Apelação
conhecida, preliminares rejeitadas e não provida. Sentença mantida. (TJ-DF
07134365420218070009 1690491, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, Data de
Julgamento: 18/04/2023, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: 28/04/2023)
Portanto, adoto e ratifico a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo para
solucionar a controvérsia; e assim procedo ancorada no entendimento remansoso do Tribunal
da Cidadania que reconhece […] a viabilidade de o órgão julgador adotar ou ratificar o juízo de
valor firmado na sentença, inclusive transcrevendo-a no acórdão, sem que tal medida encerre
omissão ou ausência de fundamentação no decisum (REsp nº 662.272-RS, 2ª Turma, Rel.Min.
João Otávio de Noronha, j. de 4.9.2007; REsp nº 641.963-ES, 2ª Turma, Rel. Min. Castro
Meira, j. de 21.11.2005; REsp nº 592.092-AL, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, j. 17.12.2004
e REsp nº 265.534- DF, 4ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j de 1.12.2003).
Diante do exposto, nego provimento ao recurso.
Em atendimento ao que preconiza o art. 85, § 11, do CPC, majoro em 5% (cinco por
cento) os honorários advocatícios fixados na sentença.
É como voto.
A fim de evitar a oposição de embargos de declaração meramente protelatórios,
considera-se, desde já, prequestionada toda matéria infraconstitucional e constitucional,
observando o entendimento do STJ no sentido de que, para o prequestionamento, é
desnecessária a explícita indicação dos dispositivos de lei que o fundamentaram.
No ensejo, advirto às partes que a interposição de eventual recurso meramente
protelatório ou com escopo de rediscutir esta controvérsia ensejará na aplicação de multa, nos
termos dos arts. 79, 80, 81 e 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil.
Intimem-se.
Com o trânsito em julgado, arquivem-se (art. 1.006 do CPC).
Boa Vista - RR, data constante do sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO.
AUSÊNCIA
DE
IMPUGNAÇÃO
AOS
FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. NÃO COMPROVAÇÃO DA
CONDIÇÃO
DE
SUPERENDIVIDAMENTO.
IMPROCEDÊNCIA
MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. O recurso de apelação deve, nos termos do art. 1.010, incisos II a IV,
do CPC, conter impugnação específica aos fundamentos da sentença, o
que configura o princípio da dialeticidade. A mera repetição das teses
iniciais, sem enfrentamento dos fundamentos do decisum, compromete
sua admissibilidade.
2. Embora a apelação apresentada limite-se a reiterar os argumentos da
petição inicial, sem atacar especificamente a ratio decidendi da sentença,
o recurso foi conhecido a fim de garantir o duplo grau de jurisdição e evitar
prejuízos à parte.
3. A Lei nº 14.181/2021, que alterou o Código de Defesa do Consumidor,
condiciona a instauração do procedimento de repactuação de dívidas à
comprovação de que o consumidor está impossibilitado de pagar a
totalidade de suas dívidas sem comprometer o mínimo existencial (art.
54-A, § 1º, CDC).
4. No caso concreto, a autora não comprovou sua condição de
superendividada nem apresentou documentos suficientes à análise do
comprometimento de sua subsistência, ônus que lhe incumbia nos termos
do art. 373, I, do CPC.
5. Em respeito à autonomia privada, não demonstrada a situação
excepcional de superendividamento, deve-se preservar os pactos
livremente firmados entre as partes.
6. A jurisprudência desta Corte e de outros Tribunais reconhece que a
ausência de comprovação do superendividamento inviabiliza a aplicação
do procedimento previsto na Lei nº 14.181/2021.
7. Recurso conhecido e não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da 2ª Turma Cível do
Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em negar
provimento ao presente recurso, nos termos do voto da Relatora. Participaram do julgamento
os eminentes Desembargadores: Mozarildo Cavalcanti (Presidente e Julgador), Elaine Bianchi
(Relatora) e Cristóvão Suter (Julgador). Sessão Virtual do Egrégio Tribunal de Justiça do
Estado de Roraima, data constante no sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi - Relatora
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Graciane Passos De Souza x Banco Daycoval e outros
ID: 276015053
Data de Disponibilização:
22/05/2025
Advogados:
LÁZARO JOSÉ GOMES JÚNIOR
OAB/MS XXXXXX
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LEONARDO ANDRADE ARAGÃO
OAB/AM XXXXXX
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THALITA DA SILVA SANTOS
OAB/AM XXXXXX
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CARLOS FELLIPE DE ANDRADE NOGUEIRA
OAB/AM XXXXXX
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GRACE KELLY DA SILVA BARBOSA
OAB/AM XXXXXX
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DAVID SOMBRA PEIXOTO
OAB/CE XXXXXX
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ROBERTA BEATRIZ DO NASCIMENTO
OAB/SP XXXXXX
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JOSÉ LÍDIO ALVES DOS SANTOS
OAB/SP XXXXXX
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WALDECIR SOUZA CALDAS JUNIOR
OAB/RR XXXXXX
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CARLOS AUGUSTO TORTORO JUNIOR
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
A…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida pelo Juízo do 4º
Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa Vista, que julgou
improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de Repactuação de Dívidas
C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte teor (EP 183.1):
Proc. n.° 0804296-49.2024.8.23.0010
SENTENÇA
GRACIANE PASSOS DE SOUZA ajuizou ação de repactuação de dívida por
superendividamento c.c pedido de tutela de urgência em face do BANCO DO BRASIL
S.A, BANCO SANTANDER S.A., CREFISA, FUPRES ADMINISTRADORA DE
CARTOES LTDA, BANCO DAYCOVAL S.A., AVANCARD PROMOÇÃO DE VENDAS
LTDA e BEMOL S/A, alegando, em síntese, que não consegue arcar com as despesas
referente aos contratos de empréstimos consignados realizados e que os descontos em
sua remuneração afetam sua sobrevivência, tendo o seu mínimo existencial
comprometido. Deu à causa o valor de R$ 431.415,81. Juntou documentos (EP's 1.2 a
1.19).
O pedido liminar restou indeferido, sendo concedida a gratuidade processual à parte
autora (EP 6).
Citados (EP's 39, 40, 41), os réus apresentaram contestação.
O BANCO MASTER S/A e PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA. (AVANCARD)
suscitou, em preliminar, a sua ilegitimidade passiva e impugnou a concessão da
gratuidade processual autoral. No mérito, arguiu a ausência de ato ilícito; a ausência dos
requisitos para aplicação da lei que trata do superendividamento; má-fé da autora na
contratação dos empréstimos, requerendo, ao final, o julgamento improcedente dos
pedidos formulados. Anexou documentos (EP 46).
A BEMOL S.A. suscitou, em sede preliminar, a inépcia da inicial. Quanto ao mérito,
sustentou que a parte autora não trouxe provas do direito pleiteado, requerendo o
julgamento de improcedência (EP 49).
A CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS S.A suscitou, em
preliminar, a inépcia da inicial; a falta de interesse de agir; além de impugnar a
gratuidade processual. No mérito, arguiu a legalidade dos contratos firmados, não
havendo que se falar em abusividade das termos pactuados, bem como um possível
aumento da taxa média e a, consequente, redução da oferta em caso de procedência,
diante da eventual insegurança jurídica, requerendo, ao final, o julgamento improcedente
dos pedidos formulados na exordial. Anexou documentos (EP 58).
O BANCO SANTANDER S/A consignou, preliminarmente, a inépcia da inicial, além de
impugnar a gratuidade processual e o valor atribuído à causa. No mérito, sustentou que
a parte autora não trouxe provas da ofensa ao seu mínimo existencial, ausentes,
portanto, as exigências previstas na lei de superendividamento, sendo válidos e
regulares os contratos firmados, invocando o princípio do pacta sunt servanda,
pugnando, ao final, pelo julgamento improcedente da demanda. Anexou documentos (EP
90).
A FUPRES ADMINISTRADORA DE CARTÕES LTDA suscitou, preliminarmente, a
impossibilidade de integração dos contratos; inépcia da inicial, impugnando a concessão
da gratuidade processual. No mérito, sustentou que os valores foram assumidos
voluntariamente pelo autor; a legalidade dos contratos firmados e a ausência das
exigências previstas na lei de superendividamento, pugnando, ao fim, pela
improcedência dos pedidos. Na oportunidade, acostou documentos (EP 93).
O BANCO DAYCOVAL S.A afirmou, em preliminar, a ausência do interesse de agir e a
inépcia da inicial, impugnando o valor da causa; a gratuidade processual e a capacidade
postulatória. No mérito, sustentou que a parte autora não comprovou o
superendividamento; que inexiste ofensa ao mínimo existencial; a legalidade do contrato;
a preservação do princípio do pacta sunt servanda; e a sua boa-fé na celebração dos
empréstimos, requerendo que os pedidos sejam julgados improcedentes. Apresentou
documentos (EP 94).
O BANCO DO BRASIL S.A. sustentou, preliminarmente, a inépcia da inicial, impugnando
a concessão da gratuidade processual, além do valor atribuído à causa. No mérito,
sustentou a improcedência da ação em face da ausência dos requisitos para a aplicação
da lei de superendividamento e a legalidade dos contratos, invocando o princípio do
pacta sunt servanda. Juntou documentos (EP 95).
Designada e realizada audiência de conciliação, a mesma restou frutífera somente em
relação à corré CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, sendo
homologada a transação e, na mesma ocasião, reconhecida a ilegitimidade passiva do
réu PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA (AVANCARD) (EP 121).
A parte autora demonstrou seu interesse na instauração do processo por
superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas
com a apresentação de minuta do plano judicial compulsório (EP 128).
Instadas acerca da produção de outras provas (EP 134), restou indeferido o pedido de
prova documental, anunciando-se o julgamento antecipado da lide (EP 159) sem
oposição pelos litigantes (EP's 175 a 181).
É o relatório.
Fundamento e DECIDO.
Desnecessária maior dilação probatória, a teor do disposto no inciso I do art. 355 do
Código de Processo Civil, sendo certo que, na análise do julgamento antecipado da lide,
vigora a prudente discrição do magistrado no exame da necessidade ou não da
realização de outras provas, ante as circunstâncias de cada caso concreto e a
necessidade de não ofender o princípio do pleno contraditório. No caso em tela, a lide
comporta pronto julgamento, dada pois a questão é eminentemente de direito e os
documentos coligidos aos autos são amplamente suficientes ao deslinde da questão
controvertida.
De proêmio, RECHAÇAM-SE as teses preliminares arguidas pelos requeridos.
Deveras, não prospera a preliminar de inépcia da inicial, uma vez que, da narrativa
contida na exordial, extrai-se que os pedidos formulados são certos e determinados, bem
como que há compatibilidade entre eles, sendo perfeitamente identificável a causa de
pedir e a lógica da narrativa fática. Ademais, registra-se que os requisitos legais para
subsunção da lei de superendividamento (Lei 14.181/21), serão apreciados na análise do
mérito.
Quanto à alegação de falta de interesse de agir, a tese não se sustenta, haja vista o
princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição, conforme preceitua o art. 5°,
inciso XXXV, da Constituição Federal, considerando, ainda, que a parte autora
demonstra a necessidade de buscar a tutela jurisdicional para proteger, resguardar ou
conservar o seu direito (necessidade-adequação), seja no julgamento de mérito
procedente ou não, máxime para eventual repactuação de suas dívidas, haja vista a
impossibilidade de pactuação/transação administrativa.
No que tange a gratuidade processual, mantenho a benesse outrora deferida, haja vista
a ausência de elementos em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Lado outro, quanto à impugnação ao valor da causa, o pedido comporta parcial
acolhimento. Explico.
In casu, a soma dos débitos contratuais com as partes requeridas é R$ 431.415,81,
sendo que a presente repactuação e eventual renegociação das dívidas, nos moldes
apresentados na inicial, o seu proveito econômico corresponderia apenas a
diminuição/abatimento dos valores citados. Destarte, com a minuta do plano de
repactuação, em caso de homologação por este Juízo, a soma total das dívidas da parte
autora não mais seria de seria de R$ 431.415,81, mas sim de R$ 146.704,14, conforme
primeiro plano de repactuação apresentado. Ou seja, o real proveito econômico seria de
R$ 284.711,67, valor este que deve ser atribuído à causa. Nesse sentido, colaciono o
seguinte julgado, verbis: (…)
Em sendo assim, fixo o valor da causa em R$ 284.711,67, proveito econômico
efetivamente buscado pela parte autora com a presente ação. Retifique-se. Anote-se.
No que tange à (im)possibilidade de repactuação/integração dos contratos/dívidas do
consumidor, a matéria confunde-se com o
meritum causae
e com ele será
analisado/decidido.
Por fim, a capacidade postulatória da parte restou comprovada, haja vista estar
representada por advogado habilitado e com instrumento de mandato subscrito
digitalmente, na forma da lei.
Ultrapassadas tais questões, adentrando ao mérito, tenho que os pedidos iniciais não
prosperam.
De proêmio, convém ressaltar tratar-se de inequívoca relação de consumo, pois os
contratos bancários também se submetem à legislação de proteção e defesa dos direitos
do consumidor, por força do que dispõe o artigo 3º, § 2º, da Lei nº 8.078/90. Ademais, é
pacífico que a relação jurídica estabelecida entre as partes está inserida no âmbito das
relações de consumo, conforme corrobora o teor do Enunciado 297 da Súmula do E.
Superior Tribunal de Justiça:
“O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”
A controvérsia cinge-se à repactuação de dívida, na qual a parte autora fundamenta a
sua pretensão nos preceitos da Lei 14.181/21, que alterou dispositivos do CDC. De outra
banda, os credores requeridos, em suma, impugnam a pretensão sob o argumento de
ausência dos requisitos legais.
O superendividamento, conceituado como a “inviabilidade de pagamento da totalidade
dos débitos consumeristas (vencidos e vincendos) sem comprometimento do mínimo
existencial pelo consumidor pessoa natural e de boa-fé” (CDC, 54-A, § 1º), foi
regulamentado a partir da Lei n. 14.181/21, que introduziu modificações esparsas no
CDC e no Estatuto da Pessoa Idosa. Trata-se de instituto fundamentado no princípio da
boa-fé objetiva, mais precisamente nos deveres de cooperação e lealdade para a
evitação da ruína do outro contratante (exceção da ruína).
Ainda, o art. 54-A, do mesmo diploma legal, elucida que:
'Entende-se por
superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de
boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem
comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação'.
A mencionada regulamentação foi realizada por meio do
Decreto Federal nº
11.150/2022, que estipulou como mínimo existencial a renda mensal do consumidor
pessoal natural, estando previsto atualmente, o valor equivalente a R$ 600,00 (caput, art.
3º).
Ademais,
a
aplicabilidade
das
normas
de
prevenção
e
tratamento
do
superendividamento pressupõe a diferenciação entre o superendividamento ativo e o
superendividamento passivo. O primeiro decorre do endividamento voluntário, e pode se
dar de modo consciente (por ação de má-fé, com intenção deliberada de fraude a
credores em razão da prévia ciência quanto à incapacidade de pagamento), hipótese em
que não se aplicam as normas de prevenção e tratamento, ou de modo inconsciente (por
ação negligente/imprudente, em razão da contratação por impulso ou da não fiscalização
de despesas). Já o segundo é oriundo do endividamento involuntário, decorrente de
fatores externos que obrigam o indivíduo a suportar despesas superiores às suas
receitas (desemprego, divórcio, doença, dentre outras).
Registra-se que o processo de repactuação de débitos, regulado no art. 104-A do CDC,
é instaurado pelo juiz a requerimento do consumidor superendividado e visa, em uma
primeira etapa, à conciliação (obtenção de acordo entre o devedor e os credores). Caso
não seja celebrado acordo, passa-se então ao processo por superendividamento,
regulado no art. 104-B do CDC (2ª fase), também instaurado pelo juiz a requerimento do
consumidor superendividado e, nessa segunda etapa, objetiva a (i) revisão ou integração
de contratos; (ii) repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial
compulsório.
Importante anotar que o plano judicial compulsório (CDC, art. 104-B, § 4º) deve
assegurar aos credores, no mínimo, o valor principal do débito, atualizado com o
adimplemento integral em, no máximo 5 (cinco) anos, com a primeira parcela devida no
prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da homologação e as demais
mensais e sucessivas.
Logo, para a repactuação de dívidas e usufruto dos benefícios da lei, a parte autora
superendividada deve preencher os seguintes requisitos: 1) insuficiência de renda; 2) ser
devedor de boa-fé, ou seja, em razão de sua renda ser inferior ao que acumulou em
dívidas; 3) as dívidas devem ser decorrentes de relações de consumo comum, não
podendo incluir aqui consumos luxuosos, de alto valor; 4) em hipótese alguma as dívidas
devem ser decorrentes de má-fé, ou seja, dívidas contraídas com intuito fraudulento; 5) a
petição inicial deve conter um plano detalhado da forma/prazo de pagamento; e 6) a
indicação da renda familiar.
Uma vez firmadas tais premissas, no caso ora em apreço, passa-se ao exame do
preenchimento dos requisitos legais para a repactuação de dívidas.
Da análise dos autos, extrai-se incontroversa a existência de empréstimos adquiridos
pela parte autora junto às instituições financeiras rés.
In casu, verifica-se que parte autora não comprovou sua condição de consumidora
superendividada, deixando de demonstrar a impossibilidade em arcar com o pagamento
dos débitos sem prejuízo do mínimo existencial, bem como ausência de má-fé ou de
fraude na obtenção das dívidas.
Com efeito, não trouxe o(a) requerente cópias das faturas de cartão de crédito e extratos
bancários, com detalhamento de compras realizadas, quando da origem dos débitos,
para comprovação do risco à garantia do mínimo existencial, configurando, outrossim,
contradição, ao menos pela ausência de prova constituída acerca da real e efetiva
condição financeira do(a) requerente.
Ademais, conforme narrado em petição inicial, a requerente, como servidora pública em
atividade, aufere renda bruta de R$ 9.772,62, sendo que após descontos/retenções
legais e empréstimos resta o valor líquido de R$ 875,79.
Portanto, constata-se que remanescem após o pagamento de todos os débitos a
quantia de R$ 875,79, valor que está além da quantia prevista no art. 3º do Decreto
Federal no 11.150/2022 como mínimo existencial, situação incompatível com o rito
das ações de superendividamento (CDC, § 1º, art. 104-A), máxime considerando a
ausência
de
prova,
pelo(a)
demandante,
dos
alegados
gastos
não
consignados/cotidianos.
Destaca-se, ainda, que a parte autora é servidor(a) público(a) em atividade, com fonte de
renda bruta superior a R$ 9.000,00, sendo que, por certo, faz jus ao recebimento dos
beneplácitos de 13º salários e de férias, o que, por si só, consiste em expressivas
quantias complementativas a suas remunerações ordinárias, capazes de afastar
qualquer alegação de ofensa ao seu mínimo existencial. Nesse passo, a renda da parte
autora não pode, sob qualquer métrica, ser caracterizada como comprometedora do
mínimo vital para sua sobrevivência.
Ainda, observa-se a ausência de documentos a demonstrar gastos rotineiros da parte
autora, especialmente se é o(a) único(a) a sustentar sua família (esposo(o) e filhos,
incluindo uma maior de idade - EP 1.13), deixando a demandante de comprovar que é
arrimo/sustento da sua família, sequer comprovando os gastos/repasses/despesas. A
esse respeito, é cediço ser obrigação do pai e da mãe arcar com a manutenção dos
filhos na proporção da capacidade financeira de cada qual (CC, art. 1.703). Ainda,
denota-se da qualificação autoral que esta é casada, sendo que nada foi juntado acerca
da (im)possibilidade de seu companheiro e/ou genitor do(s) seu(s) filho(s), em arcar com
tais custos e em que quantia.
Não se pode perder de vista que também nada trouxe aos autos com relação à renda
familiar. Ocorre que, para a repactuação de dívida pretendida, com a preservação do
mínimo existencial à família seria necessária a apuração de toda a renda familiar e todas
as suas despesas, o que não se extrai dos autos, dada a ausência de documentações
em tal sentido.
Da mesma forma, verifica-se na fatura de cartão de crédito da autora (EP 1.13, 1.14
e 1.15) diversas compras realizadas recentemente e com extenso lapso para
pagamento, sem a efetiva demonstração da sua essencialidade (p. ex. RORAIMA
PISCI PARC 09/12 - R$ 843,00, CACULAO PARC 08/12 - R$ 191,11, dentre outras -
EP 1.16), inclusive em outro Estado da Federação - AIRBNB PAGAM PARC 02/02
SAO PAULO - R$ 293,16 - EP 1.9), mesmo diante de tais fatos serem consignados em
decisão de indeferiu pedido de urgência, fator contraditório para quem afirma ter sua
dignidade financeira atingida.
Acrescenta-se que, a minuta do plano compulsório apresentado pela parte autora (EP
128), em confronto com os demais documentos juntados pelos réus nas contestações
apresentadas, não contempla sequer o pagamento do valor do principal devido, corrigido
monetariamente por índices oficiais de preço, o que reforça a impossibilidade do
acolhimento dos pedidos autorais.
Mais a mais, compulsando os documentos juntados pela parte autora (EP 1.17),
observa-se, logo após o recebimento de seus proventos/remuneração, a realização de
transferências, via pix, e aplicação em conta poupança, inclusive, de valores
consideráveis (R$ 10.000,00 - EP 1.17 - pag. 3), sem, contudo, esclarecer as
destinações/finalidades dos pagamentos, depósitos e recebimentos, bem assim trazer a
Juízo extrato bancário das contas (poupança ou não) a que destinadas as transferências,
não havendo que ser falar em ofensa ao mínimo existencial.
Nesse sentido, observa-se que a parte autora também não trouxe qualquer
elemento para justificar a necessidade/motivo da realização dos empréstimos junto
às instituições financeiras, incluindo um valor superior a R$ 140.000, 00 com
apenas um único requerido (EP 95) fator preponderante a demonstrar sua boa-fé
na contratação das dívidas que pretende repactuar.
Ademais, insta consignar que os documentos apresentados não permitem concluir, com
precisão, o que levou o(a) requerente ao suscitado superendividamento e tampouco do
destino das expressivas quantias levantadas junto ao requerido, restando impossível a
verificação da sua boa-fé para subsunção à lei de superendividamento.
Ainda, a parte autora não comprova qualquer dado externo que tenha lhe acarretado a
alteração patrimonial, tais como redução drástica do salário, perda do emprego,
problemas de saúde ou outro fator que tenha, efetivamente, afetado sua conjuntura
econômica quando da época dos empréstimos/dívidas.
Deveras, cabe ao consumidor evidenciar a sua incapacidade de quitar as obrigações
contraídas, as quais visam atender a uma necessidade pessoal extraordinária decorrente
de infortúnios da vida ou eventos imprevisíveis (endividamento involuntário). Fora dessas
circunstâncias excepcionais, considera-se mero descontrole pessoal das finanças, não
enquadrado nos parâmetros da teoria do superendividamento.
Anota-se que incumbe à parte autora comprovar que tomou os valores para as despesas
básicas de subsistência, pois a repactuação não tem amparo legal quando as dívidas
que ' decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor'
(CDC, § 3º, art. 54-A).
Dito isto, acrescenta-se que pelo contexto da petição inicial, é possível aferir que o
pedido de redução dos descontos dos empréstimos fora baseado no suposto
superendividamento da parte autora e extrapolação do patamar máximo de margem
consignável, qual seja de 30%.
Com efeito, o objetivo da norma protetora ao consumidor (Lei de Superendividamento)
não foi criar uma regra matemática para subsunção aos benefícios previstos na lei, de
modo que a ofensa ao mínimo existencial demanda demonstração inequívoca de ofensa
à dignidade financeira do cidadão, não havendo que se falar em percentual fixo de sua
remuneração.
Deveras, o direito à repactuação das dívidas não possui caráter potestativo,
independente da vontade do credor, autorizando que o consumidor, unilateralmente,
aponte quantia que entende justa e adequada para sua renda, passando a ter direito a
solver somente tal importe. Se assim fosse, a adoção de tal entendimento representaria
uma grande insegurança jurídica, já que o credor estaria condicionado ao assentimento
exclusivo do consumidor, o que comprometeria o recebimento do crédito concedido em
medida verdadeiramente significativa, acabando por desaguar em aumento do custo do
crédito, ou seja, em elevação sistêmica dos juros, bem como em limitação das linhas de
crédito, prejudicando os consumidores de maneira global.
Por esta razão, o legislador estabeleceu rito, critérios e condições para se obter a
repactuação pretendida, disposições que precisam ser respeitadas, sob pena de
subversão do propósito normativo e geração de relevantes efeitos colaterais para o
próprio consumidor. Assim, não se pode, com lastro em tal previsão normativa, restringir
os débitos com lastro apenas na indicação de percentual que o consumidor julga
adequado, pois este deve ser fixado consoante os parâmetros previstos nos art. 104-A e
B do CDC.
Em outras palavras, não se olvide que o cenário é de ENDIVIDAMENTO, jamais de
SUPERENDIVIDAMENTO, nos termos da legislação de regência. E para essa situação
de endividamento, a qual não está acobertada pelas regras excepcionais dos arts. 54-A
e 104-A e seguintes do CDC, deverá a parte buscar as medidas legais para
adequação/renegociação contratual, afastando-se na situação em comento a imposição
de plano compulsório de pagamento ao réu.
Seja como for, ainda que admitidos os números do(a) requerente, e pese a alegada
afetação dos vencimentos às dívidas bancárias, fato é que o remanescente disponível
não implica em risco/ofensa/violação ao 'mínimo existencial', garantindo-se montante
capaz de atender as necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene
e transporte e etc, implicando apenas em redução de sua capacidade financeira, mas
não em vulnerabilidade econômica/financeira, elemento fundamental para a configuração
do superendividamento e embasamento para a concessão do manto protetivo do regime
de excepcionalização do pacta sunt servanda, sob pena de ofensa à segurança jurídica.
Com a devida venia, a intenção do legislador na criação de institutos que beneficiam aos
consumidores, como o enquadramento no conceito de superendividamento (Lei n.
14.181/21), não busca garantir à pessoa superendividada o alto padrão de vida que
detinha antes do endividamento, mas garantir o mínimo existencial para a sua
sobrevivência, o que, no caso em comento, está garantido pelo valor residual pós
descontos dos vencimentos do(a)requerente.
Ademais, não se tem notícia de que o(a) demandante é pessoa idosa, pródiga ou de
precária educação, sendo vedada à aplicação da repactuação de dívidas, aquelas
oriundas de contratos dolosamente celebrados sem o propósito de realizar pagamento,
nos termos do §1º do artigo 104-A do CDC.
A esse respeito, registra-se que a parte autora confirma que celebrou os contratos com o
banco réu, com taxas de juros pactuadas e previamente conhecidas, não alegando em
nenhum momento qualquer vício de consentimento.
Nessa direção, o entendimento jurisprudencial, verbis: (…)
Sendo assim, verifica-se que o(a) requerente deixou de provar o fato constitutivo de seu
direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram juntados aos autos documentos que
deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de pessoa superendividada nos termos
da lei, não havendo que se falar na realização de repactuação de dívidas da forma
pretendida.
Portanto, o(a) autor(a) não trouxe aos autos elementos aptos e suficientes que
comprovem o preenchimento dos requisitos acima elencados, sobretudo o
comprometimento do mínimo existencial, o que implica em óbice ao prosseguimento da
demanda e homologação de eventual plano de repactuação judicial compulsório em
detrimento dos credores.
Com efeito, resta manifesta a ausência no preenchimento dos requisitos legais, em
especial a alegada ofensa ao 'mínimo existencial' e, por conseguinte, a incomprovada
situação de superendividamento, forçoso concluir a inexistência do pressuposto de
procedibilidade para o procedimento especial previsto no art. 54-A, 104-A e seguintes do
CDC, ensejando, pois, a extinção irresolutiva da fase de conhecimento.
ANTE O EXPOSTO e, analisando tudo mais que dos autos consta, com fulcro na
fundamentação supra, julgo EXTINTA a fase de conhecimento, sem resolução do mérito,
reconhecendo a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido
e regular do processo, na forma do art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil.
Em razão da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento de custas processuais
e honorários advocatícios, que ora arbitro no patamar de 10% (dez por cento) sobre o
valor atualizado da causa, nos termos do § 2º do art. 85 do Código de Processo Civil,
contudo, suspensa a exigibilidade, haja vista se tratar de parte beneficiária da gratuidade
processual, mantendo-se a benesse outrora deferida, haja vista a ausência de elementos
em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Retifique-se o valor da causa para R$ 284.711,67.
Certifique a Serventia a existência de agravo de instrumento pendente de julgamento e,
em caso positivo, comunique-se à instância recursal acerca da presente sentença.
Sem prejuízo, considerando a possibilidade de ajuizamento de demandas repetitivas ou
em massa e em atenção a Nota Técnica CIJERR 04/2024, encaminhe-se cópia da
presente sentença ao Centro de Inteligência da Justiça Estadual de Roraima (CIJERR)
para conhecimento e providências que entender cabíveis (via SEI).
Na hipótese de interposição de recurso de apelação, por não haver mais juízo de
admissibilidade a ser exercido pelo Juízo a quo (CPC, art. 1.010), sem nova conclusão,
intime-se a parte contrária para oferecer resposta no prazo de 15 (quinze) dias.
(…) (grifos originais)
Irresignada, nas razões recursais a apelante aduz (EP 198.1), em síntese, […] que
recebe mensalmente a quantia de R$ 431.415,81 (quatrocentos e trinta e um mil, quatrocentos
e quinze reais e oitenta e um centavos); que após os descontos obrigatórios como PRESSEM e
Imposto de Renda no valor de 1.622,39 (mil seiscentos e vinte e dois reais e trinta e nove
centavos). Resta para a parte somente a quantia de R$ 8.150,23 (oito mil cento e cinquenta
reais e vinte e três centavos); que a situação de superendividamento de uma pessoa não se
pode usar fórmulas prontas e moldadas para outras situações; que ficou claro que a parte
Apelante não tem condições financeiras de arcar com todas as suas dívidas e manter um
padrão de vida digno; que a parte Apelante possui encargos nanceiros mensais oriundos de
contratos celebrados junto aos Apelados, que, quando somados, correspondem ao valor de
R$7.274,44 (sete mil, duzentos e setenta e quatro reais e quarenta e quatro centavos),
equivalente a MAIS DE 89% DE SUA RENDA LÍQUIDA; que o valor que resta para parte
Apelante é ínfimo, pois não é suficiente para custear suas despesas básicas, como moradia,
saúde, alimentação, despesas médicas, educação e etc.; que tais dívidas têm comprometido
substancialmente o mínimo existencial da parte Apelante. […]
Calcada nesses argumentos, requer o provimento do recurso para:
a) Seja reconhecida a inconstitucionalidade dos Decretos ns. 11.150/2022 e
11.567/2023, tendo em vista que afronta com a dignidade da pessoa humana;
b) Que a Sentença seja reformada para acolher os pedidos formulados na petição inicial
e torne o plano de pagamento ora apresentado em plano judicial compulsório com o seu
início no mês subsequente à data da sentença;
c) condenar a parte Requerida ao pagamento de custas processuais, despesas e
honorários advocatícios.
Certidão atestando a tempestividade do recurso e a ausência do recolhimento do
preparo (EP 7.1), pois a parte apelante é beneficiária da gratuidade da justiça.
Certidão atestando a tempestividade das contrarrazões contidas nos EPs 212.1, 219.1
e 220.1 (EP 6.1).
O relatado é suficiente.
Inclua-se na pauta de julgamento eletrônico, nos termos do art. 109 do RITJRR.
Intimem-se
Boa Vista - RR, 12 de maio de 2025.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
VOTO
Conforme relatado, trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida
pelo Juízo do 4º Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa
Vista, que julgou improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de
Repactuação de Dívidas C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte
teor (EP 183.1).
Em suma, a apelante requer o provimento do recurso de apelação para que a sentença
de primeiro grau seja reformada.
Os apelados, nas contrarrazões, defendem a manutenção integral da sentença.
Pois bem.
Antes do mais, convém relembrar que não compete ao segundo grau, em regra, julgar
a causa novamente, justamente por se tratar de instância revisora, mas reanalisar a sentença
nos termos da irresignação do apelo.
Dito isso, e após análise detida dos elementos contidos nos autos, constata-se que o
apelo não comporta acolhimento.
Isto porque, em suas razões recursais, a apelante não se insurge contra os
fundamentos da sentença. Ao contrário, a rigor repete ipsis litteris as teses apresentadas na
petição inicial (EP 1.1), que não se presta a atacar a fundamentação que levou o juízo “a quo” a
rejeitar a pretensão inicial.
Dito de outra forma, a parte apelante deixou de apresentar qualquer fundamento capaz
de infirmar a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo, pois ausente a formulação
crítica necessária para se opor aos fundamentos lançados na sentença.
Logo, contra os fundamentos adotados na decisão não existem, nos autos, motivos
pelos quais se possa considerar que o direito não tenha sido bem aplicado.
Ademais, o artigo 1.010, incisos II a IV, do Código de Processo Civil exige que na peça
de apelação constem a exposição do fato e do direito, as razões do pedido de reforma ou de
decretação de nulidade e o pedido de nova decisão.
Da mesma maneira, o pedido não pode ser genérico, mas deve especificar as matérias
decididas que o recorrente reputa devam ser alteradas, de forma que o juízo ad quem possa
julgar o cabimento e provimento do recurso adequadamente.
No caso em exame, contudo, não há nas razões recursais qualquer menção ao que foi
decidido na sentença proferida em primeiro grau de jurisdição, limitando-se a parte apelante a
reproduzir integralmente os argumentos utilizados com o objetivo de contestar a ratio decidendi
utilizada pelo julgador primevo, o que, por óbvio, seria o suficiente para o não conhecimento do
recurso, por violação ao princípio da dialeticidade recursal.
Para corroborar essa afirmação, confira-se a jurisprudência remansosa desta Corte de
Justiça sobre o tema:
PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL.
PRINCÍPIO
DA
DIALETICIDADE.
NÃO
CONHECIMENTO
DO
RECURSO.
HONORÁRIOS MAJORADOS.1. Apelação interposta contra sentença que julgou
improcedentes embargos à execução fiscal promovida pela Fazenda Pública do Estado
de Roraima, fundamentada em multa aplicada pela Agência de Defesa Agropecuária de
Roraima (ADERR) por armazenamento irregular de agrotóxicos sem autorização legal,
no valor de R$ 45.543,20. A sentença afastou a alegação de ilegitimidade passiva ao
entender que a responsabilidade pela infração decorre da guarda indevida dos produtos,
independentemente da sua titularidade.2. A recorrente alega ilegitimidade passiva, sob o
argumento de que os produtos pertenciam a terceiro e foram armazenados por engano
em área anexa à empresa, sem responsabilidade direta da apelante.3. Princípio da
dialeticidade: O recurso deve atacar especificamente os fundamentos da decisão
recorrida. A repetição de argumentos afastados na sentença, sem enfrentamento dos
principais fundamentos, compromete a admissibilidade do apelo, nos termos do art. 932,
III, do CPC.4. No caso, a apelação limita-se a repetir a tese de ilegitimidade passiva sem
enfrentar a essência da decisão: a irrelevância da titularidade dos produtos para a
configuração da infração administrativa, fundada no armazenamento sem autorização.5.
Não se verifica cerceamento de defesa. O indeferimento da oitiva de testemunhas não
prejudicou o julgamento, uma vez que as provas colhidas na fase administrativa e judicial
foram consideradas suficientes. A apelante não demonstrou de forma concreta como a
ausência da prova comprometeria seu direito de defesa.6. Gratuidade de justiça: o
benefício foi concedido na fase inicial e permanece válido no grau recursal, nos termos
do art. 98, § 1º, VIII, do CPC, tornando prejudicado novo pedido formulado pela
apelante.7. Honorários advocatícios recursais majorados de 10% para 15%, conforme
art. 85, § 11, do CPC, observada a gratuidade de justiça já deferida.8. Recurso não
conhecido. Honorários majorados. (TJRR – AC 0810795-83.2023.8.23.0010, Rel. Des.
ERICK LINHARES, Câmara Cível, julg.: 31/10/2024, public.: 31/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C COBRANÇA –
PROGRESSÃO FUNCIONAL – SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. 1ª APELAÇÃO:LEI
N.º 1.611/2015 – APLICAÇÃO – RECONHECIMENTO ADMINISTRATIVO DO DIREITO
POSTULADO – PERDA DO INTERESSE PROCESSUAL – INEXISTÊNCIA DE
DEMONSTRAÇÃO DE ERRO NO REENQUADRAMENTO REALIZADO PELO
MUNICÍPIO DE BOA VISTA – VERBAS RETROATIVAS DEVIDAS - DIFERENÇAS
SALARIAIS NÃO ATINGIDAS PELA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – RECURSO
DESPROVIDO
–
SENTENÇA
MANTIDA.
2ª
APELAÇÃO:
AUSÊNCIA
DE
DIALETICIDADE RECURSAL – RECURSO NÃO CONHECIDO. (TJRR – AC
0802853-97.2023.8.23.0010, Rel. Des. TÂNIA VASCONCELOS, Câmara Cível, julg.:
19/12/2024, public.: 19/12/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. INSCRIÇÃO DO NOME DO SÓCIO NA CDA.
AUSÊNCIA DE SUA PARTICIPAÇÃO NO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO COMO
PARTE. RAZÕES DO APELO QUE REPETEM, EM PARTE, AS MESMAS JÁ
LANÇADAS NA CONTESTAÇÃO. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. INDICAÇÃO DE
PRECEDENTES DO STJ QUE NÃO SE AMOLDAM À HIPÓTESE DOS AUTOS.
RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, DESPROVIDO.
1. A simples repetição, nas razões do apelo, dos argumentos lançados na fase de
conhecimento, impõe o não conhecimento desses argumentos por não observância do
princípio da dialeticidade. 2. Mostra-se escorreita a sentença que reconhece a
ilegitimidade passiva do sócio que não integrou o procedimento administrativo fiscal na
qualidade de parte, conforme precedentes do STJ e do egrégio TJRR acerca do tema.
(TJ-RR - AC: 0831030-13.2019.8.23.0010, Relator: ELAINE BIANCHI, Data de
Julgamento: 25/04/2021, Câmara Cível, Data de Publicação: 26/04/2021)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO - OFENSA AO PRINCÍPIO DA
DIALETICIDADE - NÃO CONHECIMENTO DO INCONFORMISMO. 1. O princípio da
dialeticidade recursal exige a impugnação integral e específica de cada um dos
fundamentos da decisão recorrida, sob pena de não conhecimento do recurso. 2.
Olvidando a embargante de tal ônus, impõe-se o não conhecimento dos declaratórios.
(TJ-RR - EDecAC: 72119027220168230010 7211902-72.2016.8.23.0010, Relator: Des.
Cristóvão Suter, Data de Publicação: DJe 09/10/2019, p.)
No entanto, embora o presente recurso, a rigor não pudesse sequer ser conhecido
porque não atacou os fundamentos da sentença; a fim de evitar argumentos de violação à
ampla defesa e acesso ao duplo grau de jurisdição, conheço do recurso e passo à análise do
mérito da controvérsia.
In casu, o juizo a quo julgou improcedente a demanda por ausência de documentação
apta a comprovar a condição de superendividada, já que a parte autora, ora apelante, “deixou
de provar o fato constitutivo de seu direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram
juntados aos autos documentos que deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de
pessoa superendividada nos termos da lei, não havendo que se falar na realização de
repactuação de dívidas da forma pretendida”.
Ou seja, a parte apelante não forneceu os documentos necessários para que o
magistrado senteciante pudesse aferir, com convicção, a sua alegada condição de
superendividada.
Dito de outra forma, não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o
comprometimento do mínimo existencial, razão pela qual deve ser preservada a autonomia das
vontades, visto que os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e
consciente pelas partes.
Assim, infere-se que a ratio decidendi utilizada pelo magistrado sentenciante para julgar
improcedente a pretensão autoral merece ser mantida por seus próprios fundamentos, a qual
adoto como razão de decidir para conhecer do recurso, mas negar-lhe provimento.
Em reforço à conclusão adotada pelo juízo a quo, confira-se a jurisprudência pátria
sobre o tema:
APELAÇÃO
CÍVEL.
Ação
revisional.
Repactuação
de
dívidas.
Lei
do
Superendividamento. Ausência de comprovação documental ou dos requisitos para a
pretendida limitação nos pagamentos devidos. Higidez contratual reconhecida. Sentença
de improcedência mantida. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJ-SP - Apelação Cível:
0000507-73.2023.8.26.0577 São José dos Campos, Relator: Emílio Migliano Neto, Data
de Julgamento: 21/02/2024, 23ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação:
21/02/2024)
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÉBITO - LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO DE
SUPERENDIVIDADO DO CONSUMIDOR - IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. Nos termos
da Lei nº 14.181/2021, que visa dispor sobre formas de prevenção e solução da situação
de superendividamento dos consumidores, entende-se nessa situação, fazendo jus,
portanto, à repactuação de débitos, a pessoa natural, de boa-fé, que evidencia a total
impossibilidade de adimplir a suas dívidas de consumo sem comprometer seu mínimo
existencial. Ausente as provas de tais circunstâncias, deve ser mantida a improcedência
da pretensão inicial. (TJ-MG - Apelação Cível: 5001170-35.2023.8.13.0241
1.0000.24.174736-9/001, Relator: Des.(a) Arnaldo Maciel, Data de Julgamento:
07/05/2024, 7ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 15/05/2024)
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CIVIL E PROCESSUAL
CIVIL. PROCESSO SOB O RITO ESPECIAL DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
SUPERENDIVIDAMENTO.
AFETAÇÃO
DO
MÍNIMO
EXISTENCIAL
APÓS
DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E EM CONTA CORRENTE. NÃO
DEMONSTRADO. INSTAURAÇÃO DO PROCEDIMENTO DA LEI Nº 14.181/2021.
REQUISITOS
NÃO
PREENCHIDOS.
RECURSO
DESPROVIDO.
SENTENÇA
MANTIDA. 1. A solicitação de repactuação de dívidas pretendida pelo apelante é medida
estabelecida no art. 104-A, § 4º, do CDC, introduzido pela Lei nº 14.181/21, aplicada em
favor do consumidor superendividado. Segundo o art. 54-A, § 1º, do CDC, ocorre o
superendividamento quando o consumidor pessoa física, de boa-fé, não consegue pagar
a totalidade de suas dívidas de consumo (exigíveis e vincendas) sem comprometer o seu
mínimo existencial. 2. O superendividamento está diretamente relacionado com o mínimo
existencial do indivíduo, ou seja, o superendividamento pressupõe o comprometimento
da sobrevivência da pessoa e ameaça o indivíduo e sua família (mínimo existencial), no
caso, verifica-se que o apelante é policial militar do Distrito Federal e está submetido ao
regime jurídico dos servidores públicos distritais, porém, na hipótese, imperioso destacar
a existência de óbice quanto ao pedido de repactuação de dívida, tendo em vista a
necessidade de observância mínimo existencial, elemento previsto como requisitos da
Lei nº 14.181/21. 3. No caso concreto, constata-se, com base nos elementos probatórios,
que o apelante percebe uma renda líquida, após todos os descontos, inclusive, os
realizados em conta corrente, uma renda líquida muito acima do estabelecido pelo
Decreto nº 11.150/22, com redação dada pelo Decreto nº 11.567/2023. Dessa forma o
apelante não conseguiu demonstrar os requisitos para que seja caracterizado o
superendividamento. 4. Por sua vez, a intervenção judicial somente se justifica na
hipótese de situação excepcional se constatado a existência de superendividamento, sob
pena de indevida intervenção judicial na autonomia da vontade. Na hipótese, entretanto,
não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o comprometimento do
mínimo existencial. Nesse contexto, deve ser preservada a autonomia das vontades, pois
os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e consciente pelas
partes. Portanto, não comprovado o comprometimento ao mínimo existencial, não há
como instaurar o procedimento de repactuação de dívidas. 5. Recurso desprovido.
Sentença mantida. (TJ-DF 07238141920238070003 1924958, Relator: ALFEU
MACHADO, Data de Julgamento: 18/09/2024, 6ª Turma Cível, Data de Publicação:
02/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. SUPERENDIVIDAMENTO.
REPACTUAÇÃO DE DÍVIDA. EXCEPCIONALIDADE. MÍNIMO EXISTENCIAL. PODER
REGULAMENTAR. DECRETO 11.150/2022. AUSTERIDADE. PODER JUDICIÁRIO.
INTERVENÇÃO NÃO JUSTIFICADA. IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO. SENTENÇA
MANTIDA. 1. As normas protetivas que regulam o tratamento do superendividamento
garantem a repactuação das dívidas, mediante a preservação do mínimo existencial, nos
termos da regulamentação. Art. 104-A do Código de Defesa do Consumidor. 2. Ainda
carente de debates, o Decreto Presidencial nº 11.150, de 26 de julho de 2022, com
vacatio legis de sessenta dias da após a publicação, traz a delimitação acerca do tema.
3. Nos termos do art. 3º do Decreto 11.150/2022, ?considera-se mínimo existencial a
renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do
salário mínimo vigente na data de publicação deste Decreto?. 4. Embora se possa
questionar a extrema austeridade imposta pela regulamentação do que pode ser
considerado o mínimo existencial, a intervenção do poder judiciário nos contratos regidos
pelo Código de Defesa do Consumidor deve se pautar pela teoria da base objetiva dos
contratos. 5.Na hipótese em que não se constata alteração das circunstâncias
intrínsecas à formulação do vínculo contratual, assim como não se identifica condutas de
incontestável abuso por parte da instituição financeira credora, a intervenção judicial nos
contratos não se justifica. 6. Recurso conhecido e não provido. (TJ-DF
07058375420228070001 1674193, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, Data de
Julgamento: 08/03/2023, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 20/03/2023)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATOS BANCÁRIOS.
REPACTUAÇÃO
DE
DÍVIDAS.
LIMITAÇÃO
DOS
DESCONTOS
EM
CONTA-CORRENTE DO DEVEDOR. PRELIMINARES DE INÉPCIA DA INICIAL E
FALTA DE INTERESSE DE AGIR REJEITADA. CONTRATAÇÃO ESCLARECIDA PELO
CONSUMIDOR. REPACTUAÇÃO. IMPOSSIBILIDAE. VEDAÇÃO DO § 1º DO ART.
104-A DO CDC. PLANO DE PAGAMENTO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
APELAÇÃO CONHECIDA. PRELIMINARES REJEITADAS E NÃO PROVIDA. 1.
Insurge-se o autor, ora apelante, contra sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível de
Samambaia que, na ação de repactuação de dívidas com 4 instituições bancárias,
homologou o acordo de pagamento de dívidas feito entre o autor e o Banco INTER S/A,
revogou a tutela anteriormente concedida de limitação de descontos em conta-corrente a
30% (trinta por cento) dos ganhos mensais líquidos e julgou improcedente o pedido da
inicial, bem como o condenou ao pagamento das custas processuais e dos honorários
advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade restou suspensa
diante da gratuidade de justiça concedida. Pretende o prosseguimento de ação de
repactuação de dívidas de mútuo com a apresentação de plano de pagamento com
prazo superior ao estabelecido legalmente e limitação dos descontos em sua
conta-corrente ao patamar de 30% de sua remuneração mensal líquida
independentemente da modalidade do empréstimo. 2. O juízo sentenciante
compreendeu pela incompatibilidade do plano de pagamento apresentado pelo devedor
com a observância de requisito essencial da Lei do Superendividamento (Lei n.
14.181/2021), a saber, o prazo máximo de pagamento em até 5 anos. Portanto,
descabida a aplicação do art. 104-B da lei citada, para instauração da segunda fase do
procedimento de superendividamento, pois o próprio consumidor já informou a
impossibilidade de adequação da proposta aos termos da legislação. Além disso, foram
verificados fortes indícios da contratação dolosa dos débitos pelo apelante devedor. 3.
Não induz à inépcia da inicial do pedido de repactuação dos contratos a ausência de
efetivo plano de pagamento por não representar vício insanável (art. 337, IV do CPC). 4.
Quanto à questão preliminar de falta de interesse de agir arguida pelo apelado BANCO
BMG SA, ?o interesse de agir, consubstanciado no binômio necessidade-utilidade, busca
alcançar a realização da pretensão deduzida em Juízo, a qual não poderia ser obtida
através de outra forma. Verificando-se que a preliminar suscitada se confunde com o
mérito da questão, há de ser rejeitada de plano? (TJDFT. Acórdão 1617020,
07219987620218070001, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, 5ª Turma Cível, data de
julgamento: 21/9/2022, publicado no DJE: 29/9/2022. Pág.: Sem Página Cadastrada .).
Preliminar rejeitada. 5. É ônus do consumidor provar que se encontra privado do seu
mínimo existencial nos termos do art. 54-A do CDC. No caso em análise, não há provas
hábeis de que, após os descontos realizados e a sobra de R$ 4.000,00 (quatro mil reais),
a quantia remanescente é apta a comprometer-lhe o próprio sustento e o de sua família.
Com efeito, a quantia representa aproximadamente três salários-mínimos, o que é
superior à remuneração mensal média do trabalhador brasileiro. Segundo estatísticas do
IBGE, no trimestre de setembro a novembro de 2022 o salário médio mensal é de
aproximadamente R$ 2.787 (dois mil setecentos e oitenta e sete reais). Há, ainda, de se
salientar quanto a existência de fortes indícios de contratação dolosa dos débitos pelo
apelante consumidor, o que, por si só, tem o condão de excluir os empréstimos aqui
impugnados do processo de repactuação de dívidas conforme o § 1º do art. 104-A do
CDC. 6. Verificado que o plano de pagamento não fora formulado em consonância aos
parâmetros mínimos impostos pela legislação, em especial a previsão do limite temporal
de 05 (cinco) anos para pagamento, a fim de evitar a eternização das obrigações, a
manutenção da improcedência do pedido é medida que se impõe. 7. Apelação
conhecida, preliminares rejeitadas e não provida. Sentença mantida. (TJ-DF
07134365420218070009 1690491, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, Data de
Julgamento: 18/04/2023, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: 28/04/2023)
Portanto, adoto e ratifico a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo para
solucionar a controvérsia; e assim procedo ancorada no entendimento remansoso do Tribunal
da Cidadania que reconhece […] a viabilidade de o órgão julgador adotar ou ratificar o juízo de
valor firmado na sentença, inclusive transcrevendo-a no acórdão, sem que tal medida encerre
omissão ou ausência de fundamentação no decisum (REsp nº 662.272-RS, 2ª Turma, Rel.Min.
João Otávio de Noronha, j. de 4.9.2007; REsp nº 641.963-ES, 2ª Turma, Rel. Min. Castro
Meira, j. de 21.11.2005; REsp nº 592.092-AL, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, j. 17.12.2004
e REsp nº 265.534- DF, 4ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j de 1.12.2003).
Diante do exposto, nego provimento ao recurso.
Em atendimento ao que preconiza o art. 85, § 11, do CPC, majoro em 5% (cinco por
cento) os honorários advocatícios fixados na sentença.
É como voto.
A fim de evitar a oposição de embargos de declaração meramente protelatórios,
considera-se, desde já, prequestionada toda matéria infraconstitucional e constitucional,
observando o entendimento do STJ no sentido de que, para o prequestionamento, é
desnecessária a explícita indicação dos dispositivos de lei que o fundamentaram.
No ensejo, advirto às partes que a interposição de eventual recurso meramente
protelatório ou com escopo de rediscutir esta controvérsia ensejará na aplicação de multa, nos
termos dos arts. 79, 80, 81 e 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil.
Intimem-se.
Com o trânsito em julgado, arquivem-se (art. 1.006 do CPC).
Boa Vista - RR, data constante do sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO.
AUSÊNCIA
DE
IMPUGNAÇÃO
AOS
FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. NÃO COMPROVAÇÃO DA
CONDIÇÃO
DE
SUPERENDIVIDAMENTO.
IMPROCEDÊNCIA
MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. O recurso de apelação deve, nos termos do art. 1.010, incisos II a IV,
do CPC, conter impugnação específica aos fundamentos da sentença, o
que configura o princípio da dialeticidade. A mera repetição das teses
iniciais, sem enfrentamento dos fundamentos do decisum, compromete
sua admissibilidade.
2. Embora a apelação apresentada limite-se a reiterar os argumentos da
petição inicial, sem atacar especificamente a ratio decidendi da sentença,
o recurso foi conhecido a fim de garantir o duplo grau de jurisdição e evitar
prejuízos à parte.
3. A Lei nº 14.181/2021, que alterou o Código de Defesa do Consumidor,
condiciona a instauração do procedimento de repactuação de dívidas à
comprovação de que o consumidor está impossibilitado de pagar a
totalidade de suas dívidas sem comprometer o mínimo existencial (art.
54-A, § 1º, CDC).
4. No caso concreto, a autora não comprovou sua condição de
superendividada nem apresentou documentos suficientes à análise do
comprometimento de sua subsistência, ônus que lhe incumbia nos termos
do art. 373, I, do CPC.
5. Em respeito à autonomia privada, não demonstrada a situação
excepcional de superendividamento, deve-se preservar os pactos
livremente firmados entre as partes.
6. A jurisprudência desta Corte e de outros Tribunais reconhece que a
ausência de comprovação do superendividamento inviabiliza a aplicação
do procedimento previsto na Lei nº 14.181/2021.
7. Recurso conhecido e não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da 2ª Turma Cível do
Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em negar
provimento ao presente recurso, nos termos do voto da Relatora. Participaram do julgamento
os eminentes Desembargadores: Mozarildo Cavalcanti (Presidente e Julgador), Elaine Bianchi
(Relatora) e Cristóvão Suter (Julgador). Sessão Virtual do Egrégio Tribunal de Justiça do
Estado de Roraima, data constante no sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi - Relatora
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Processo nº 0804296-49.2024.8.23.0010
ID: 275978829
Data de Disponibilização:
22/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
GRACE KELLY DA SILVA BARBOSA
OAB/AM XXXXXX
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DAVID SOMBRA PEIXOTO
OAB/CE XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
A…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida pelo Juízo do 4º
Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa Vista, que julgou
improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de Repactuação de Dívidas
C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte teor (EP 183.1):
Proc. n.° 0804296-49.2024.8.23.0010
SENTENÇA
GRACIANE PASSOS DE SOUZA ajuizou ação de repactuação de dívida por
superendividamento c.c pedido de tutela de urgência em face do BANCO DO BRASIL
S.A, BANCO SANTANDER S.A., CREFISA, FUPRES ADMINISTRADORA DE
CARTOES LTDA, BANCO DAYCOVAL S.A., AVANCARD PROMOÇÃO DE VENDAS
LTDA e BEMOL S/A, alegando, em síntese, que não consegue arcar com as despesas
referente aos contratos de empréstimos consignados realizados e que os descontos em
sua remuneração afetam sua sobrevivência, tendo o seu mínimo existencial
comprometido. Deu à causa o valor de R$ 431.415,81. Juntou documentos (EP's 1.2 a
1.19).
O pedido liminar restou indeferido, sendo concedida a gratuidade processual à parte
autora (EP 6).
Citados (EP's 39, 40, 41), os réus apresentaram contestação.
O BANCO MASTER S/A e PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA. (AVANCARD)
suscitou, em preliminar, a sua ilegitimidade passiva e impugnou a concessão da
gratuidade processual autoral. No mérito, arguiu a ausência de ato ilícito; a ausência dos
requisitos para aplicação da lei que trata do superendividamento; má-fé da autora na
contratação dos empréstimos, requerendo, ao final, o julgamento improcedente dos
pedidos formulados. Anexou documentos (EP 46).
A BEMOL S.A. suscitou, em sede preliminar, a inépcia da inicial. Quanto ao mérito,
sustentou que a parte autora não trouxe provas do direito pleiteado, requerendo o
julgamento de improcedência (EP 49).
A CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS S.A suscitou, em
preliminar, a inépcia da inicial; a falta de interesse de agir; além de impugnar a
gratuidade processual. No mérito, arguiu a legalidade dos contratos firmados, não
havendo que se falar em abusividade das termos pactuados, bem como um possível
aumento da taxa média e a, consequente, redução da oferta em caso de procedência,
diante da eventual insegurança jurídica, requerendo, ao final, o julgamento improcedente
dos pedidos formulados na exordial. Anexou documentos (EP 58).
O BANCO SANTANDER S/A consignou, preliminarmente, a inépcia da inicial, além de
impugnar a gratuidade processual e o valor atribuído à causa. No mérito, sustentou que
a parte autora não trouxe provas da ofensa ao seu mínimo existencial, ausentes,
portanto, as exigências previstas na lei de superendividamento, sendo válidos e
regulares os contratos firmados, invocando o princípio do pacta sunt servanda,
pugnando, ao final, pelo julgamento improcedente da demanda. Anexou documentos (EP
90).
A FUPRES ADMINISTRADORA DE CARTÕES LTDA suscitou, preliminarmente, a
impossibilidade de integração dos contratos; inépcia da inicial, impugnando a concessão
da gratuidade processual. No mérito, sustentou que os valores foram assumidos
voluntariamente pelo autor; a legalidade dos contratos firmados e a ausência das
exigências previstas na lei de superendividamento, pugnando, ao fim, pela
improcedência dos pedidos. Na oportunidade, acostou documentos (EP 93).
O BANCO DAYCOVAL S.A afirmou, em preliminar, a ausência do interesse de agir e a
inépcia da inicial, impugnando o valor da causa; a gratuidade processual e a capacidade
postulatória. No mérito, sustentou que a parte autora não comprovou o
superendividamento; que inexiste ofensa ao mínimo existencial; a legalidade do contrato;
a preservação do princípio do pacta sunt servanda; e a sua boa-fé na celebração dos
empréstimos, requerendo que os pedidos sejam julgados improcedentes. Apresentou
documentos (EP 94).
O BANCO DO BRASIL S.A. sustentou, preliminarmente, a inépcia da inicial, impugnando
a concessão da gratuidade processual, além do valor atribuído à causa. No mérito,
sustentou a improcedência da ação em face da ausência dos requisitos para a aplicação
da lei de superendividamento e a legalidade dos contratos, invocando o princípio do
pacta sunt servanda. Juntou documentos (EP 95).
Designada e realizada audiência de conciliação, a mesma restou frutífera somente em
relação à corré CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, sendo
homologada a transação e, na mesma ocasião, reconhecida a ilegitimidade passiva do
réu PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA (AVANCARD) (EP 121).
A parte autora demonstrou seu interesse na instauração do processo por
superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas
com a apresentação de minuta do plano judicial compulsório (EP 128).
Instadas acerca da produção de outras provas (EP 134), restou indeferido o pedido de
prova documental, anunciando-se o julgamento antecipado da lide (EP 159) sem
oposição pelos litigantes (EP's 175 a 181).
É o relatório.
Fundamento e DECIDO.
Desnecessária maior dilação probatória, a teor do disposto no inciso I do art. 355 do
Código de Processo Civil, sendo certo que, na análise do julgamento antecipado da lide,
vigora a prudente discrição do magistrado no exame da necessidade ou não da
realização de outras provas, ante as circunstâncias de cada caso concreto e a
necessidade de não ofender o princípio do pleno contraditório. No caso em tela, a lide
comporta pronto julgamento, dada pois a questão é eminentemente de direito e os
documentos coligidos aos autos são amplamente suficientes ao deslinde da questão
controvertida.
De proêmio, RECHAÇAM-SE as teses preliminares arguidas pelos requeridos.
Deveras, não prospera a preliminar de inépcia da inicial, uma vez que, da narrativa
contida na exordial, extrai-se que os pedidos formulados são certos e determinados, bem
como que há compatibilidade entre eles, sendo perfeitamente identificável a causa de
pedir e a lógica da narrativa fática. Ademais, registra-se que os requisitos legais para
subsunção da lei de superendividamento (Lei 14.181/21), serão apreciados na análise do
mérito.
Quanto à alegação de falta de interesse de agir, a tese não se sustenta, haja vista o
princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição, conforme preceitua o art. 5°,
inciso XXXV, da Constituição Federal, considerando, ainda, que a parte autora
demonstra a necessidade de buscar a tutela jurisdicional para proteger, resguardar ou
conservar o seu direito (necessidade-adequação), seja no julgamento de mérito
procedente ou não, máxime para eventual repactuação de suas dívidas, haja vista a
impossibilidade de pactuação/transação administrativa.
No que tange a gratuidade processual, mantenho a benesse outrora deferida, haja vista
a ausência de elementos em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Lado outro, quanto à impugnação ao valor da causa, o pedido comporta parcial
acolhimento. Explico.
In casu, a soma dos débitos contratuais com as partes requeridas é R$ 431.415,81,
sendo que a presente repactuação e eventual renegociação das dívidas, nos moldes
apresentados na inicial, o seu proveito econômico corresponderia apenas a
diminuição/abatimento dos valores citados. Destarte, com a minuta do plano de
repactuação, em caso de homologação por este Juízo, a soma total das dívidas da parte
autora não mais seria de seria de R$ 431.415,81, mas sim de R$ 146.704,14, conforme
primeiro plano de repactuação apresentado. Ou seja, o real proveito econômico seria de
R$ 284.711,67, valor este que deve ser atribuído à causa. Nesse sentido, colaciono o
seguinte julgado, verbis: (…)
Em sendo assim, fixo o valor da causa em R$ 284.711,67, proveito econômico
efetivamente buscado pela parte autora com a presente ação. Retifique-se. Anote-se.
No que tange à (im)possibilidade de repactuação/integração dos contratos/dívidas do
consumidor, a matéria confunde-se com o
meritum causae
e com ele será
analisado/decidido.
Por fim, a capacidade postulatória da parte restou comprovada, haja vista estar
representada por advogado habilitado e com instrumento de mandato subscrito
digitalmente, na forma da lei.
Ultrapassadas tais questões, adentrando ao mérito, tenho que os pedidos iniciais não
prosperam.
De proêmio, convém ressaltar tratar-se de inequívoca relação de consumo, pois os
contratos bancários também se submetem à legislação de proteção e defesa dos direitos
do consumidor, por força do que dispõe o artigo 3º, § 2º, da Lei nº 8.078/90. Ademais, é
pacífico que a relação jurídica estabelecida entre as partes está inserida no âmbito das
relações de consumo, conforme corrobora o teor do Enunciado 297 da Súmula do E.
Superior Tribunal de Justiça:
“O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”
A controvérsia cinge-se à repactuação de dívida, na qual a parte autora fundamenta a
sua pretensão nos preceitos da Lei 14.181/21, que alterou dispositivos do CDC. De outra
banda, os credores requeridos, em suma, impugnam a pretensão sob o argumento de
ausência dos requisitos legais.
O superendividamento, conceituado como a “inviabilidade de pagamento da totalidade
dos débitos consumeristas (vencidos e vincendos) sem comprometimento do mínimo
existencial pelo consumidor pessoa natural e de boa-fé” (CDC, 54-A, § 1º), foi
regulamentado a partir da Lei n. 14.181/21, que introduziu modificações esparsas no
CDC e no Estatuto da Pessoa Idosa. Trata-se de instituto fundamentado no princípio da
boa-fé objetiva, mais precisamente nos deveres de cooperação e lealdade para a
evitação da ruína do outro contratante (exceção da ruína).
Ainda, o art. 54-A, do mesmo diploma legal, elucida que:
'Entende-se por
superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de
boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem
comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação'.
A mencionada regulamentação foi realizada por meio do
Decreto Federal nº
11.150/2022, que estipulou como mínimo existencial a renda mensal do consumidor
pessoal natural, estando previsto atualmente, o valor equivalente a R$ 600,00 (caput, art.
3º).
Ademais,
a
aplicabilidade
das
normas
de
prevenção
e
tratamento
do
superendividamento pressupõe a diferenciação entre o superendividamento ativo e o
superendividamento passivo. O primeiro decorre do endividamento voluntário, e pode se
dar de modo consciente (por ação de má-fé, com intenção deliberada de fraude a
credores em razão da prévia ciência quanto à incapacidade de pagamento), hipótese em
que não se aplicam as normas de prevenção e tratamento, ou de modo inconsciente (por
ação negligente/imprudente, em razão da contratação por impulso ou da não fiscalização
de despesas). Já o segundo é oriundo do endividamento involuntário, decorrente de
fatores externos que obrigam o indivíduo a suportar despesas superiores às suas
receitas (desemprego, divórcio, doença, dentre outras).
Registra-se que o processo de repactuação de débitos, regulado no art. 104-A do CDC,
é instaurado pelo juiz a requerimento do consumidor superendividado e visa, em uma
primeira etapa, à conciliação (obtenção de acordo entre o devedor e os credores). Caso
não seja celebrado acordo, passa-se então ao processo por superendividamento,
regulado no art. 104-B do CDC (2ª fase), também instaurado pelo juiz a requerimento do
consumidor superendividado e, nessa segunda etapa, objetiva a (i) revisão ou integração
de contratos; (ii) repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial
compulsório.
Importante anotar que o plano judicial compulsório (CDC, art. 104-B, § 4º) deve
assegurar aos credores, no mínimo, o valor principal do débito, atualizado com o
adimplemento integral em, no máximo 5 (cinco) anos, com a primeira parcela devida no
prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da homologação e as demais
mensais e sucessivas.
Logo, para a repactuação de dívidas e usufruto dos benefícios da lei, a parte autora
superendividada deve preencher os seguintes requisitos: 1) insuficiência de renda; 2) ser
devedor de boa-fé, ou seja, em razão de sua renda ser inferior ao que acumulou em
dívidas; 3) as dívidas devem ser decorrentes de relações de consumo comum, não
podendo incluir aqui consumos luxuosos, de alto valor; 4) em hipótese alguma as dívidas
devem ser decorrentes de má-fé, ou seja, dívidas contraídas com intuito fraudulento; 5) a
petição inicial deve conter um plano detalhado da forma/prazo de pagamento; e 6) a
indicação da renda familiar.
Uma vez firmadas tais premissas, no caso ora em apreço, passa-se ao exame do
preenchimento dos requisitos legais para a repactuação de dívidas.
Da análise dos autos, extrai-se incontroversa a existência de empréstimos adquiridos
pela parte autora junto às instituições financeiras rés.
In casu, verifica-se que parte autora não comprovou sua condição de consumidora
superendividada, deixando de demonstrar a impossibilidade em arcar com o pagamento
dos débitos sem prejuízo do mínimo existencial, bem como ausência de má-fé ou de
fraude na obtenção das dívidas.
Com efeito, não trouxe o(a) requerente cópias das faturas de cartão de crédito e extratos
bancários, com detalhamento de compras realizadas, quando da origem dos débitos,
para comprovação do risco à garantia do mínimo existencial, configurando, outrossim,
contradição, ao menos pela ausência de prova constituída acerca da real e efetiva
condição financeira do(a) requerente.
Ademais, conforme narrado em petição inicial, a requerente, como servidora pública em
atividade, aufere renda bruta de R$ 9.772,62, sendo que após descontos/retenções
legais e empréstimos resta o valor líquido de R$ 875,79.
Portanto, constata-se que remanescem após o pagamento de todos os débitos a
quantia de R$ 875,79, valor que está além da quantia prevista no art. 3º do Decreto
Federal no 11.150/2022 como mínimo existencial, situação incompatível com o rito
das ações de superendividamento (CDC, § 1º, art. 104-A), máxime considerando a
ausência
de
prova,
pelo(a)
demandante,
dos
alegados
gastos
não
consignados/cotidianos.
Destaca-se, ainda, que a parte autora é servidor(a) público(a) em atividade, com fonte de
renda bruta superior a R$ 9.000,00, sendo que, por certo, faz jus ao recebimento dos
beneplácitos de 13º salários e de férias, o que, por si só, consiste em expressivas
quantias complementativas a suas remunerações ordinárias, capazes de afastar
qualquer alegação de ofensa ao seu mínimo existencial. Nesse passo, a renda da parte
autora não pode, sob qualquer métrica, ser caracterizada como comprometedora do
mínimo vital para sua sobrevivência.
Ainda, observa-se a ausência de documentos a demonstrar gastos rotineiros da parte
autora, especialmente se é o(a) único(a) a sustentar sua família (esposo(o) e filhos,
incluindo uma maior de idade - EP 1.13), deixando a demandante de comprovar que é
arrimo/sustento da sua família, sequer comprovando os gastos/repasses/despesas. A
esse respeito, é cediço ser obrigação do pai e da mãe arcar com a manutenção dos
filhos na proporção da capacidade financeira de cada qual (CC, art. 1.703). Ainda,
denota-se da qualificação autoral que esta é casada, sendo que nada foi juntado acerca
da (im)possibilidade de seu companheiro e/ou genitor do(s) seu(s) filho(s), em arcar com
tais custos e em que quantia.
Não se pode perder de vista que também nada trouxe aos autos com relação à renda
familiar. Ocorre que, para a repactuação de dívida pretendida, com a preservação do
mínimo existencial à família seria necessária a apuração de toda a renda familiar e todas
as suas despesas, o que não se extrai dos autos, dada a ausência de documentações
em tal sentido.
Da mesma forma, verifica-se na fatura de cartão de crédito da autora (EP 1.13, 1.14
e 1.15) diversas compras realizadas recentemente e com extenso lapso para
pagamento, sem a efetiva demonstração da sua essencialidade (p. ex. RORAIMA
PISCI PARC 09/12 - R$ 843,00, CACULAO PARC 08/12 - R$ 191,11, dentre outras -
EP 1.16), inclusive em outro Estado da Federação - AIRBNB PAGAM PARC 02/02
SAO PAULO - R$ 293,16 - EP 1.9), mesmo diante de tais fatos serem consignados em
decisão de indeferiu pedido de urgência, fator contraditório para quem afirma ter sua
dignidade financeira atingida.
Acrescenta-se que, a minuta do plano compulsório apresentado pela parte autora (EP
128), em confronto com os demais documentos juntados pelos réus nas contestações
apresentadas, não contempla sequer o pagamento do valor do principal devido, corrigido
monetariamente por índices oficiais de preço, o que reforça a impossibilidade do
acolhimento dos pedidos autorais.
Mais a mais, compulsando os documentos juntados pela parte autora (EP 1.17),
observa-se, logo após o recebimento de seus proventos/remuneração, a realização de
transferências, via pix, e aplicação em conta poupança, inclusive, de valores
consideráveis (R$ 10.000,00 - EP 1.17 - pag. 3), sem, contudo, esclarecer as
destinações/finalidades dos pagamentos, depósitos e recebimentos, bem assim trazer a
Juízo extrato bancário das contas (poupança ou não) a que destinadas as transferências,
não havendo que ser falar em ofensa ao mínimo existencial.
Nesse sentido, observa-se que a parte autora também não trouxe qualquer
elemento para justificar a necessidade/motivo da realização dos empréstimos junto
às instituições financeiras, incluindo um valor superior a R$ 140.000, 00 com
apenas um único requerido (EP 95) fator preponderante a demonstrar sua boa-fé
na contratação das dívidas que pretende repactuar.
Ademais, insta consignar que os documentos apresentados não permitem concluir, com
precisão, o que levou o(a) requerente ao suscitado superendividamento e tampouco do
destino das expressivas quantias levantadas junto ao requerido, restando impossível a
verificação da sua boa-fé para subsunção à lei de superendividamento.
Ainda, a parte autora não comprova qualquer dado externo que tenha lhe acarretado a
alteração patrimonial, tais como redução drástica do salário, perda do emprego,
problemas de saúde ou outro fator que tenha, efetivamente, afetado sua conjuntura
econômica quando da época dos empréstimos/dívidas.
Deveras, cabe ao consumidor evidenciar a sua incapacidade de quitar as obrigações
contraídas, as quais visam atender a uma necessidade pessoal extraordinária decorrente
de infortúnios da vida ou eventos imprevisíveis (endividamento involuntário). Fora dessas
circunstâncias excepcionais, considera-se mero descontrole pessoal das finanças, não
enquadrado nos parâmetros da teoria do superendividamento.
Anota-se que incumbe à parte autora comprovar que tomou os valores para as despesas
básicas de subsistência, pois a repactuação não tem amparo legal quando as dívidas
que ' decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor'
(CDC, § 3º, art. 54-A).
Dito isto, acrescenta-se que pelo contexto da petição inicial, é possível aferir que o
pedido de redução dos descontos dos empréstimos fora baseado no suposto
superendividamento da parte autora e extrapolação do patamar máximo de margem
consignável, qual seja de 30%.
Com efeito, o objetivo da norma protetora ao consumidor (Lei de Superendividamento)
não foi criar uma regra matemática para subsunção aos benefícios previstos na lei, de
modo que a ofensa ao mínimo existencial demanda demonstração inequívoca de ofensa
à dignidade financeira do cidadão, não havendo que se falar em percentual fixo de sua
remuneração.
Deveras, o direito à repactuação das dívidas não possui caráter potestativo,
independente da vontade do credor, autorizando que o consumidor, unilateralmente,
aponte quantia que entende justa e adequada para sua renda, passando a ter direito a
solver somente tal importe. Se assim fosse, a adoção de tal entendimento representaria
uma grande insegurança jurídica, já que o credor estaria condicionado ao assentimento
exclusivo do consumidor, o que comprometeria o recebimento do crédito concedido em
medida verdadeiramente significativa, acabando por desaguar em aumento do custo do
crédito, ou seja, em elevação sistêmica dos juros, bem como em limitação das linhas de
crédito, prejudicando os consumidores de maneira global.
Por esta razão, o legislador estabeleceu rito, critérios e condições para se obter a
repactuação pretendida, disposições que precisam ser respeitadas, sob pena de
subversão do propósito normativo e geração de relevantes efeitos colaterais para o
próprio consumidor. Assim, não se pode, com lastro em tal previsão normativa, restringir
os débitos com lastro apenas na indicação de percentual que o consumidor julga
adequado, pois este deve ser fixado consoante os parâmetros previstos nos art. 104-A e
B do CDC.
Em outras palavras, não se olvide que o cenário é de ENDIVIDAMENTO, jamais de
SUPERENDIVIDAMENTO, nos termos da legislação de regência. E para essa situação
de endividamento, a qual não está acobertada pelas regras excepcionais dos arts. 54-A
e 104-A e seguintes do CDC, deverá a parte buscar as medidas legais para
adequação/renegociação contratual, afastando-se na situação em comento a imposição
de plano compulsório de pagamento ao réu.
Seja como for, ainda que admitidos os números do(a) requerente, e pese a alegada
afetação dos vencimentos às dívidas bancárias, fato é que o remanescente disponível
não implica em risco/ofensa/violação ao 'mínimo existencial', garantindo-se montante
capaz de atender as necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene
e transporte e etc, implicando apenas em redução de sua capacidade financeira, mas
não em vulnerabilidade econômica/financeira, elemento fundamental para a configuração
do superendividamento e embasamento para a concessão do manto protetivo do regime
de excepcionalização do pacta sunt servanda, sob pena de ofensa à segurança jurídica.
Com a devida venia, a intenção do legislador na criação de institutos que beneficiam aos
consumidores, como o enquadramento no conceito de superendividamento (Lei n.
14.181/21), não busca garantir à pessoa superendividada o alto padrão de vida que
detinha antes do endividamento, mas garantir o mínimo existencial para a sua
sobrevivência, o que, no caso em comento, está garantido pelo valor residual pós
descontos dos vencimentos do(a)requerente.
Ademais, não se tem notícia de que o(a) demandante é pessoa idosa, pródiga ou de
precária educação, sendo vedada à aplicação da repactuação de dívidas, aquelas
oriundas de contratos dolosamente celebrados sem o propósito de realizar pagamento,
nos termos do §1º do artigo 104-A do CDC.
A esse respeito, registra-se que a parte autora confirma que celebrou os contratos com o
banco réu, com taxas de juros pactuadas e previamente conhecidas, não alegando em
nenhum momento qualquer vício de consentimento.
Nessa direção, o entendimento jurisprudencial, verbis: (…)
Sendo assim, verifica-se que o(a) requerente deixou de provar o fato constitutivo de seu
direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram juntados aos autos documentos que
deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de pessoa superendividada nos termos
da lei, não havendo que se falar na realização de repactuação de dívidas da forma
pretendida.
Portanto, o(a) autor(a) não trouxe aos autos elementos aptos e suficientes que
comprovem o preenchimento dos requisitos acima elencados, sobretudo o
comprometimento do mínimo existencial, o que implica em óbice ao prosseguimento da
demanda e homologação de eventual plano de repactuação judicial compulsório em
detrimento dos credores.
Com efeito, resta manifesta a ausência no preenchimento dos requisitos legais, em
especial a alegada ofensa ao 'mínimo existencial' e, por conseguinte, a incomprovada
situação de superendividamento, forçoso concluir a inexistência do pressuposto de
procedibilidade para o procedimento especial previsto no art. 54-A, 104-A e seguintes do
CDC, ensejando, pois, a extinção irresolutiva da fase de conhecimento.
ANTE O EXPOSTO e, analisando tudo mais que dos autos consta, com fulcro na
fundamentação supra, julgo EXTINTA a fase de conhecimento, sem resolução do mérito,
reconhecendo a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido
e regular do processo, na forma do art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil.
Em razão da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento de custas processuais
e honorários advocatícios, que ora arbitro no patamar de 10% (dez por cento) sobre o
valor atualizado da causa, nos termos do § 2º do art. 85 do Código de Processo Civil,
contudo, suspensa a exigibilidade, haja vista se tratar de parte beneficiária da gratuidade
processual, mantendo-se a benesse outrora deferida, haja vista a ausência de elementos
em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Retifique-se o valor da causa para R$ 284.711,67.
Certifique a Serventia a existência de agravo de instrumento pendente de julgamento e,
em caso positivo, comunique-se à instância recursal acerca da presente sentença.
Sem prejuízo, considerando a possibilidade de ajuizamento de demandas repetitivas ou
em massa e em atenção a Nota Técnica CIJERR 04/2024, encaminhe-se cópia da
presente sentença ao Centro de Inteligência da Justiça Estadual de Roraima (CIJERR)
para conhecimento e providências que entender cabíveis (via SEI).
Na hipótese de interposição de recurso de apelação, por não haver mais juízo de
admissibilidade a ser exercido pelo Juízo a quo (CPC, art. 1.010), sem nova conclusão,
intime-se a parte contrária para oferecer resposta no prazo de 15 (quinze) dias.
(…) (grifos originais)
Irresignada, nas razões recursais a apelante aduz (EP 198.1), em síntese, […] que
recebe mensalmente a quantia de R$ 431.415,81 (quatrocentos e trinta e um mil, quatrocentos
e quinze reais e oitenta e um centavos); que após os descontos obrigatórios como PRESSEM e
Imposto de Renda no valor de 1.622,39 (mil seiscentos e vinte e dois reais e trinta e nove
centavos). Resta para a parte somente a quantia de R$ 8.150,23 (oito mil cento e cinquenta
reais e vinte e três centavos); que a situação de superendividamento de uma pessoa não se
pode usar fórmulas prontas e moldadas para outras situações; que ficou claro que a parte
Apelante não tem condições financeiras de arcar com todas as suas dívidas e manter um
padrão de vida digno; que a parte Apelante possui encargos nanceiros mensais oriundos de
contratos celebrados junto aos Apelados, que, quando somados, correspondem ao valor de
R$7.274,44 (sete mil, duzentos e setenta e quatro reais e quarenta e quatro centavos),
equivalente a MAIS DE 89% DE SUA RENDA LÍQUIDA; que o valor que resta para parte
Apelante é ínfimo, pois não é suficiente para custear suas despesas básicas, como moradia,
saúde, alimentação, despesas médicas, educação e etc.; que tais dívidas têm comprometido
substancialmente o mínimo existencial da parte Apelante. […]
Calcada nesses argumentos, requer o provimento do recurso para:
a) Seja reconhecida a inconstitucionalidade dos Decretos ns. 11.150/2022 e
11.567/2023, tendo em vista que afronta com a dignidade da pessoa humana;
b) Que a Sentença seja reformada para acolher os pedidos formulados na petição inicial
e torne o plano de pagamento ora apresentado em plano judicial compulsório com o seu
início no mês subsequente à data da sentença;
c) condenar a parte Requerida ao pagamento de custas processuais, despesas e
honorários advocatícios.
Certidão atestando a tempestividade do recurso e a ausência do recolhimento do
preparo (EP 7.1), pois a parte apelante é beneficiária da gratuidade da justiça.
Certidão atestando a tempestividade das contrarrazões contidas nos EPs 212.1, 219.1
e 220.1 (EP 6.1).
O relatado é suficiente.
Inclua-se na pauta de julgamento eletrônico, nos termos do art. 109 do RITJRR.
Intimem-se
Boa Vista - RR, 12 de maio de 2025.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
VOTO
Conforme relatado, trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida
pelo Juízo do 4º Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa
Vista, que julgou improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de
Repactuação de Dívidas C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte
teor (EP 183.1).
Em suma, a apelante requer o provimento do recurso de apelação para que a sentença
de primeiro grau seja reformada.
Os apelados, nas contrarrazões, defendem a manutenção integral da sentença.
Pois bem.
Antes do mais, convém relembrar que não compete ao segundo grau, em regra, julgar
a causa novamente, justamente por se tratar de instância revisora, mas reanalisar a sentença
nos termos da irresignação do apelo.
Dito isso, e após análise detida dos elementos contidos nos autos, constata-se que o
apelo não comporta acolhimento.
Isto porque, em suas razões recursais, a apelante não se insurge contra os
fundamentos da sentença. Ao contrário, a rigor repete ipsis litteris as teses apresentadas na
petição inicial (EP 1.1), que não se presta a atacar a fundamentação que levou o juízo “a quo” a
rejeitar a pretensão inicial.
Dito de outra forma, a parte apelante deixou de apresentar qualquer fundamento capaz
de infirmar a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo, pois ausente a formulação
crítica necessária para se opor aos fundamentos lançados na sentença.
Logo, contra os fundamentos adotados na decisão não existem, nos autos, motivos
pelos quais se possa considerar que o direito não tenha sido bem aplicado.
Ademais, o artigo 1.010, incisos II a IV, do Código de Processo Civil exige que na peça
de apelação constem a exposição do fato e do direito, as razões do pedido de reforma ou de
decretação de nulidade e o pedido de nova decisão.
Da mesma maneira, o pedido não pode ser genérico, mas deve especificar as matérias
decididas que o recorrente reputa devam ser alteradas, de forma que o juízo ad quem possa
julgar o cabimento e provimento do recurso adequadamente.
No caso em exame, contudo, não há nas razões recursais qualquer menção ao que foi
decidido na sentença proferida em primeiro grau de jurisdição, limitando-se a parte apelante a
reproduzir integralmente os argumentos utilizados com o objetivo de contestar a ratio decidendi
utilizada pelo julgador primevo, o que, por óbvio, seria o suficiente para o não conhecimento do
recurso, por violação ao princípio da dialeticidade recursal.
Para corroborar essa afirmação, confira-se a jurisprudência remansosa desta Corte de
Justiça sobre o tema:
PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL.
PRINCÍPIO
DA
DIALETICIDADE.
NÃO
CONHECIMENTO
DO
RECURSO.
HONORÁRIOS MAJORADOS.1. Apelação interposta contra sentença que julgou
improcedentes embargos à execução fiscal promovida pela Fazenda Pública do Estado
de Roraima, fundamentada em multa aplicada pela Agência de Defesa Agropecuária de
Roraima (ADERR) por armazenamento irregular de agrotóxicos sem autorização legal,
no valor de R$ 45.543,20. A sentença afastou a alegação de ilegitimidade passiva ao
entender que a responsabilidade pela infração decorre da guarda indevida dos produtos,
independentemente da sua titularidade.2. A recorrente alega ilegitimidade passiva, sob o
argumento de que os produtos pertenciam a terceiro e foram armazenados por engano
em área anexa à empresa, sem responsabilidade direta da apelante.3. Princípio da
dialeticidade: O recurso deve atacar especificamente os fundamentos da decisão
recorrida. A repetição de argumentos afastados na sentença, sem enfrentamento dos
principais fundamentos, compromete a admissibilidade do apelo, nos termos do art. 932,
III, do CPC.4. No caso, a apelação limita-se a repetir a tese de ilegitimidade passiva sem
enfrentar a essência da decisão: a irrelevância da titularidade dos produtos para a
configuração da infração administrativa, fundada no armazenamento sem autorização.5.
Não se verifica cerceamento de defesa. O indeferimento da oitiva de testemunhas não
prejudicou o julgamento, uma vez que as provas colhidas na fase administrativa e judicial
foram consideradas suficientes. A apelante não demonstrou de forma concreta como a
ausência da prova comprometeria seu direito de defesa.6. Gratuidade de justiça: o
benefício foi concedido na fase inicial e permanece válido no grau recursal, nos termos
do art. 98, § 1º, VIII, do CPC, tornando prejudicado novo pedido formulado pela
apelante.7. Honorários advocatícios recursais majorados de 10% para 15%, conforme
art. 85, § 11, do CPC, observada a gratuidade de justiça já deferida.8. Recurso não
conhecido. Honorários majorados. (TJRR – AC 0810795-83.2023.8.23.0010, Rel. Des.
ERICK LINHARES, Câmara Cível, julg.: 31/10/2024, public.: 31/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C COBRANÇA –
PROGRESSÃO FUNCIONAL – SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. 1ª APELAÇÃO:LEI
N.º 1.611/2015 – APLICAÇÃO – RECONHECIMENTO ADMINISTRATIVO DO DIREITO
POSTULADO – PERDA DO INTERESSE PROCESSUAL – INEXISTÊNCIA DE
DEMONSTRAÇÃO DE ERRO NO REENQUADRAMENTO REALIZADO PELO
MUNICÍPIO DE BOA VISTA – VERBAS RETROATIVAS DEVIDAS - DIFERENÇAS
SALARIAIS NÃO ATINGIDAS PELA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – RECURSO
DESPROVIDO
–
SENTENÇA
MANTIDA.
2ª
APELAÇÃO:
AUSÊNCIA
DE
DIALETICIDADE RECURSAL – RECURSO NÃO CONHECIDO. (TJRR – AC
0802853-97.2023.8.23.0010, Rel. Des. TÂNIA VASCONCELOS, Câmara Cível, julg.:
19/12/2024, public.: 19/12/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. INSCRIÇÃO DO NOME DO SÓCIO NA CDA.
AUSÊNCIA DE SUA PARTICIPAÇÃO NO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO COMO
PARTE. RAZÕES DO APELO QUE REPETEM, EM PARTE, AS MESMAS JÁ
LANÇADAS NA CONTESTAÇÃO. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. INDICAÇÃO DE
PRECEDENTES DO STJ QUE NÃO SE AMOLDAM À HIPÓTESE DOS AUTOS.
RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, DESPROVIDO.
1. A simples repetição, nas razões do apelo, dos argumentos lançados na fase de
conhecimento, impõe o não conhecimento desses argumentos por não observância do
princípio da dialeticidade. 2. Mostra-se escorreita a sentença que reconhece a
ilegitimidade passiva do sócio que não integrou o procedimento administrativo fiscal na
qualidade de parte, conforme precedentes do STJ e do egrégio TJRR acerca do tema.
(TJ-RR - AC: 0831030-13.2019.8.23.0010, Relator: ELAINE BIANCHI, Data de
Julgamento: 25/04/2021, Câmara Cível, Data de Publicação: 26/04/2021)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO - OFENSA AO PRINCÍPIO DA
DIALETICIDADE - NÃO CONHECIMENTO DO INCONFORMISMO. 1. O princípio da
dialeticidade recursal exige a impugnação integral e específica de cada um dos
fundamentos da decisão recorrida, sob pena de não conhecimento do recurso. 2.
Olvidando a embargante de tal ônus, impõe-se o não conhecimento dos declaratórios.
(TJ-RR - EDecAC: 72119027220168230010 7211902-72.2016.8.23.0010, Relator: Des.
Cristóvão Suter, Data de Publicação: DJe 09/10/2019, p.)
No entanto, embora o presente recurso, a rigor não pudesse sequer ser conhecido
porque não atacou os fundamentos da sentença; a fim de evitar argumentos de violação à
ampla defesa e acesso ao duplo grau de jurisdição, conheço do recurso e passo à análise do
mérito da controvérsia.
In casu, o juizo a quo julgou improcedente a demanda por ausência de documentação
apta a comprovar a condição de superendividada, já que a parte autora, ora apelante, “deixou
de provar o fato constitutivo de seu direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram
juntados aos autos documentos que deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de
pessoa superendividada nos termos da lei, não havendo que se falar na realização de
repactuação de dívidas da forma pretendida”.
Ou seja, a parte apelante não forneceu os documentos necessários para que o
magistrado senteciante pudesse aferir, com convicção, a sua alegada condição de
superendividada.
Dito de outra forma, não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o
comprometimento do mínimo existencial, razão pela qual deve ser preservada a autonomia das
vontades, visto que os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e
consciente pelas partes.
Assim, infere-se que a ratio decidendi utilizada pelo magistrado sentenciante para julgar
improcedente a pretensão autoral merece ser mantida por seus próprios fundamentos, a qual
adoto como razão de decidir para conhecer do recurso, mas negar-lhe provimento.
Em reforço à conclusão adotada pelo juízo a quo, confira-se a jurisprudência pátria
sobre o tema:
APELAÇÃO
CÍVEL.
Ação
revisional.
Repactuação
de
dívidas.
Lei
do
Superendividamento. Ausência de comprovação documental ou dos requisitos para a
pretendida limitação nos pagamentos devidos. Higidez contratual reconhecida. Sentença
de improcedência mantida. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJ-SP - Apelação Cível:
0000507-73.2023.8.26.0577 São José dos Campos, Relator: Emílio Migliano Neto, Data
de Julgamento: 21/02/2024, 23ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação:
21/02/2024)
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÉBITO - LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO DE
SUPERENDIVIDADO DO CONSUMIDOR - IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. Nos termos
da Lei nº 14.181/2021, que visa dispor sobre formas de prevenção e solução da situação
de superendividamento dos consumidores, entende-se nessa situação, fazendo jus,
portanto, à repactuação de débitos, a pessoa natural, de boa-fé, que evidencia a total
impossibilidade de adimplir a suas dívidas de consumo sem comprometer seu mínimo
existencial. Ausente as provas de tais circunstâncias, deve ser mantida a improcedência
da pretensão inicial. (TJ-MG - Apelação Cível: 5001170-35.2023.8.13.0241
1.0000.24.174736-9/001, Relator: Des.(a) Arnaldo Maciel, Data de Julgamento:
07/05/2024, 7ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 15/05/2024)
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CIVIL E PROCESSUAL
CIVIL. PROCESSO SOB O RITO ESPECIAL DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
SUPERENDIVIDAMENTO.
AFETAÇÃO
DO
MÍNIMO
EXISTENCIAL
APÓS
DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E EM CONTA CORRENTE. NÃO
DEMONSTRADO. INSTAURAÇÃO DO PROCEDIMENTO DA LEI Nº 14.181/2021.
REQUISITOS
NÃO
PREENCHIDOS.
RECURSO
DESPROVIDO.
SENTENÇA
MANTIDA. 1. A solicitação de repactuação de dívidas pretendida pelo apelante é medida
estabelecida no art. 104-A, § 4º, do CDC, introduzido pela Lei nº 14.181/21, aplicada em
favor do consumidor superendividado. Segundo o art. 54-A, § 1º, do CDC, ocorre o
superendividamento quando o consumidor pessoa física, de boa-fé, não consegue pagar
a totalidade de suas dívidas de consumo (exigíveis e vincendas) sem comprometer o seu
mínimo existencial. 2. O superendividamento está diretamente relacionado com o mínimo
existencial do indivíduo, ou seja, o superendividamento pressupõe o comprometimento
da sobrevivência da pessoa e ameaça o indivíduo e sua família (mínimo existencial), no
caso, verifica-se que o apelante é policial militar do Distrito Federal e está submetido ao
regime jurídico dos servidores públicos distritais, porém, na hipótese, imperioso destacar
a existência de óbice quanto ao pedido de repactuação de dívida, tendo em vista a
necessidade de observância mínimo existencial, elemento previsto como requisitos da
Lei nº 14.181/21. 3. No caso concreto, constata-se, com base nos elementos probatórios,
que o apelante percebe uma renda líquida, após todos os descontos, inclusive, os
realizados em conta corrente, uma renda líquida muito acima do estabelecido pelo
Decreto nº 11.150/22, com redação dada pelo Decreto nº 11.567/2023. Dessa forma o
apelante não conseguiu demonstrar os requisitos para que seja caracterizado o
superendividamento. 4. Por sua vez, a intervenção judicial somente se justifica na
hipótese de situação excepcional se constatado a existência de superendividamento, sob
pena de indevida intervenção judicial na autonomia da vontade. Na hipótese, entretanto,
não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o comprometimento do
mínimo existencial. Nesse contexto, deve ser preservada a autonomia das vontades, pois
os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e consciente pelas
partes. Portanto, não comprovado o comprometimento ao mínimo existencial, não há
como instaurar o procedimento de repactuação de dívidas. 5. Recurso desprovido.
Sentença mantida. (TJ-DF 07238141920238070003 1924958, Relator: ALFEU
MACHADO, Data de Julgamento: 18/09/2024, 6ª Turma Cível, Data de Publicação:
02/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. SUPERENDIVIDAMENTO.
REPACTUAÇÃO DE DÍVIDA. EXCEPCIONALIDADE. MÍNIMO EXISTENCIAL. PODER
REGULAMENTAR. DECRETO 11.150/2022. AUSTERIDADE. PODER JUDICIÁRIO.
INTERVENÇÃO NÃO JUSTIFICADA. IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO. SENTENÇA
MANTIDA. 1. As normas protetivas que regulam o tratamento do superendividamento
garantem a repactuação das dívidas, mediante a preservação do mínimo existencial, nos
termos da regulamentação. Art. 104-A do Código de Defesa do Consumidor. 2. Ainda
carente de debates, o Decreto Presidencial nº 11.150, de 26 de julho de 2022, com
vacatio legis de sessenta dias da após a publicação, traz a delimitação acerca do tema.
3. Nos termos do art. 3º do Decreto 11.150/2022, ?considera-se mínimo existencial a
renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do
salário mínimo vigente na data de publicação deste Decreto?. 4. Embora se possa
questionar a extrema austeridade imposta pela regulamentação do que pode ser
considerado o mínimo existencial, a intervenção do poder judiciário nos contratos regidos
pelo Código de Defesa do Consumidor deve se pautar pela teoria da base objetiva dos
contratos. 5.Na hipótese em que não se constata alteração das circunstâncias
intrínsecas à formulação do vínculo contratual, assim como não se identifica condutas de
incontestável abuso por parte da instituição financeira credora, a intervenção judicial nos
contratos não se justifica. 6. Recurso conhecido e não provido. (TJ-DF
07058375420228070001 1674193, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, Data de
Julgamento: 08/03/2023, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 20/03/2023)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATOS BANCÁRIOS.
REPACTUAÇÃO
DE
DÍVIDAS.
LIMITAÇÃO
DOS
DESCONTOS
EM
CONTA-CORRENTE DO DEVEDOR. PRELIMINARES DE INÉPCIA DA INICIAL E
FALTA DE INTERESSE DE AGIR REJEITADA. CONTRATAÇÃO ESCLARECIDA PELO
CONSUMIDOR. REPACTUAÇÃO. IMPOSSIBILIDAE. VEDAÇÃO DO § 1º DO ART.
104-A DO CDC. PLANO DE PAGAMENTO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
APELAÇÃO CONHECIDA. PRELIMINARES REJEITADAS E NÃO PROVIDA. 1.
Insurge-se o autor, ora apelante, contra sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível de
Samambaia que, na ação de repactuação de dívidas com 4 instituições bancárias,
homologou o acordo de pagamento de dívidas feito entre o autor e o Banco INTER S/A,
revogou a tutela anteriormente concedida de limitação de descontos em conta-corrente a
30% (trinta por cento) dos ganhos mensais líquidos e julgou improcedente o pedido da
inicial, bem como o condenou ao pagamento das custas processuais e dos honorários
advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade restou suspensa
diante da gratuidade de justiça concedida. Pretende o prosseguimento de ação de
repactuação de dívidas de mútuo com a apresentação de plano de pagamento com
prazo superior ao estabelecido legalmente e limitação dos descontos em sua
conta-corrente ao patamar de 30% de sua remuneração mensal líquida
independentemente da modalidade do empréstimo. 2. O juízo sentenciante
compreendeu pela incompatibilidade do plano de pagamento apresentado pelo devedor
com a observância de requisito essencial da Lei do Superendividamento (Lei n.
14.181/2021), a saber, o prazo máximo de pagamento em até 5 anos. Portanto,
descabida a aplicação do art. 104-B da lei citada, para instauração da segunda fase do
procedimento de superendividamento, pois o próprio consumidor já informou a
impossibilidade de adequação da proposta aos termos da legislação. Além disso, foram
verificados fortes indícios da contratação dolosa dos débitos pelo apelante devedor. 3.
Não induz à inépcia da inicial do pedido de repactuação dos contratos a ausência de
efetivo plano de pagamento por não representar vício insanável (art. 337, IV do CPC). 4.
Quanto à questão preliminar de falta de interesse de agir arguida pelo apelado BANCO
BMG SA, ?o interesse de agir, consubstanciado no binômio necessidade-utilidade, busca
alcançar a realização da pretensão deduzida em Juízo, a qual não poderia ser obtida
através de outra forma. Verificando-se que a preliminar suscitada se confunde com o
mérito da questão, há de ser rejeitada de plano? (TJDFT. Acórdão 1617020,
07219987620218070001, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, 5ª Turma Cível, data de
julgamento: 21/9/2022, publicado no DJE: 29/9/2022. Pág.: Sem Página Cadastrada .).
Preliminar rejeitada. 5. É ônus do consumidor provar que se encontra privado do seu
mínimo existencial nos termos do art. 54-A do CDC. No caso em análise, não há provas
hábeis de que, após os descontos realizados e a sobra de R$ 4.000,00 (quatro mil reais),
a quantia remanescente é apta a comprometer-lhe o próprio sustento e o de sua família.
Com efeito, a quantia representa aproximadamente três salários-mínimos, o que é
superior à remuneração mensal média do trabalhador brasileiro. Segundo estatísticas do
IBGE, no trimestre de setembro a novembro de 2022 o salário médio mensal é de
aproximadamente R$ 2.787 (dois mil setecentos e oitenta e sete reais). Há, ainda, de se
salientar quanto a existência de fortes indícios de contratação dolosa dos débitos pelo
apelante consumidor, o que, por si só, tem o condão de excluir os empréstimos aqui
impugnados do processo de repactuação de dívidas conforme o § 1º do art. 104-A do
CDC. 6. Verificado que o plano de pagamento não fora formulado em consonância aos
parâmetros mínimos impostos pela legislação, em especial a previsão do limite temporal
de 05 (cinco) anos para pagamento, a fim de evitar a eternização das obrigações, a
manutenção da improcedência do pedido é medida que se impõe. 7. Apelação
conhecida, preliminares rejeitadas e não provida. Sentença mantida. (TJ-DF
07134365420218070009 1690491, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, Data de
Julgamento: 18/04/2023, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: 28/04/2023)
Portanto, adoto e ratifico a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo para
solucionar a controvérsia; e assim procedo ancorada no entendimento remansoso do Tribunal
da Cidadania que reconhece […] a viabilidade de o órgão julgador adotar ou ratificar o juízo de
valor firmado na sentença, inclusive transcrevendo-a no acórdão, sem que tal medida encerre
omissão ou ausência de fundamentação no decisum (REsp nº 662.272-RS, 2ª Turma, Rel.Min.
João Otávio de Noronha, j. de 4.9.2007; REsp nº 641.963-ES, 2ª Turma, Rel. Min. Castro
Meira, j. de 21.11.2005; REsp nº 592.092-AL, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, j. 17.12.2004
e REsp nº 265.534- DF, 4ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j de 1.12.2003).
Diante do exposto, nego provimento ao recurso.
Em atendimento ao que preconiza o art. 85, § 11, do CPC, majoro em 5% (cinco por
cento) os honorários advocatícios fixados na sentença.
É como voto.
A fim de evitar a oposição de embargos de declaração meramente protelatórios,
considera-se, desde já, prequestionada toda matéria infraconstitucional e constitucional,
observando o entendimento do STJ no sentido de que, para o prequestionamento, é
desnecessária a explícita indicação dos dispositivos de lei que o fundamentaram.
No ensejo, advirto às partes que a interposição de eventual recurso meramente
protelatório ou com escopo de rediscutir esta controvérsia ensejará na aplicação de multa, nos
termos dos arts. 79, 80, 81 e 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil.
Intimem-se.
Com o trânsito em julgado, arquivem-se (art. 1.006 do CPC).
Boa Vista - RR, data constante do sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO.
AUSÊNCIA
DE
IMPUGNAÇÃO
AOS
FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. NÃO COMPROVAÇÃO DA
CONDIÇÃO
DE
SUPERENDIVIDAMENTO.
IMPROCEDÊNCIA
MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. O recurso de apelação deve, nos termos do art. 1.010, incisos II a IV,
do CPC, conter impugnação específica aos fundamentos da sentença, o
que configura o princípio da dialeticidade. A mera repetição das teses
iniciais, sem enfrentamento dos fundamentos do decisum, compromete
sua admissibilidade.
2. Embora a apelação apresentada limite-se a reiterar os argumentos da
petição inicial, sem atacar especificamente a ratio decidendi da sentença,
o recurso foi conhecido a fim de garantir o duplo grau de jurisdição e evitar
prejuízos à parte.
3. A Lei nº 14.181/2021, que alterou o Código de Defesa do Consumidor,
condiciona a instauração do procedimento de repactuação de dívidas à
comprovação de que o consumidor está impossibilitado de pagar a
totalidade de suas dívidas sem comprometer o mínimo existencial (art.
54-A, § 1º, CDC).
4. No caso concreto, a autora não comprovou sua condição de
superendividada nem apresentou documentos suficientes à análise do
comprometimento de sua subsistência, ônus que lhe incumbia nos termos
do art. 373, I, do CPC.
5. Em respeito à autonomia privada, não demonstrada a situação
excepcional de superendividamento, deve-se preservar os pactos
livremente firmados entre as partes.
6. A jurisprudência desta Corte e de outros Tribunais reconhece que a
ausência de comprovação do superendividamento inviabiliza a aplicação
do procedimento previsto na Lei nº 14.181/2021.
7. Recurso conhecido e não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da 2ª Turma Cível do
Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em negar
provimento ao presente recurso, nos termos do voto da Relatora. Participaram do julgamento
os eminentes Desembargadores: Mozarildo Cavalcanti (Presidente e Julgador), Elaine Bianchi
(Relatora) e Cristóvão Suter (Julgador). Sessão Virtual do Egrégio Tribunal de Justiça do
Estado de Roraima, data constante no sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi - Relatora
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Processo nº 0804296-49.2024.8.23.0010
ID: 276032453
Data de Disponibilização:
22/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
LEONARDO ANDRADE ARAGÃO
OAB/AM XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
A…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida pelo Juízo do 4º
Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa Vista, que julgou
improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de Repactuação de Dívidas
C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte teor (EP 183.1):
Proc. n.° 0804296-49.2024.8.23.0010
SENTENÇA
GRACIANE PASSOS DE SOUZA ajuizou ação de repactuação de dívida por
superendividamento c.c pedido de tutela de urgência em face do BANCO DO BRASIL
S.A, BANCO SANTANDER S.A., CREFISA, FUPRES ADMINISTRADORA DE
CARTOES LTDA, BANCO DAYCOVAL S.A., AVANCARD PROMOÇÃO DE VENDAS
LTDA e BEMOL S/A, alegando, em síntese, que não consegue arcar com as despesas
referente aos contratos de empréstimos consignados realizados e que os descontos em
sua remuneração afetam sua sobrevivência, tendo o seu mínimo existencial
comprometido. Deu à causa o valor de R$ 431.415,81. Juntou documentos (EP's 1.2 a
1.19).
O pedido liminar restou indeferido, sendo concedida a gratuidade processual à parte
autora (EP 6).
Citados (EP's 39, 40, 41), os réus apresentaram contestação.
O BANCO MASTER S/A e PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA. (AVANCARD)
suscitou, em preliminar, a sua ilegitimidade passiva e impugnou a concessão da
gratuidade processual autoral. No mérito, arguiu a ausência de ato ilícito; a ausência dos
requisitos para aplicação da lei que trata do superendividamento; má-fé da autora na
contratação dos empréstimos, requerendo, ao final, o julgamento improcedente dos
pedidos formulados. Anexou documentos (EP 46).
A BEMOL S.A. suscitou, em sede preliminar, a inépcia da inicial. Quanto ao mérito,
sustentou que a parte autora não trouxe provas do direito pleiteado, requerendo o
julgamento de improcedência (EP 49).
A CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS S.A suscitou, em
preliminar, a inépcia da inicial; a falta de interesse de agir; além de impugnar a
gratuidade processual. No mérito, arguiu a legalidade dos contratos firmados, não
havendo que se falar em abusividade das termos pactuados, bem como um possível
aumento da taxa média e a, consequente, redução da oferta em caso de procedência,
diante da eventual insegurança jurídica, requerendo, ao final, o julgamento improcedente
dos pedidos formulados na exordial. Anexou documentos (EP 58).
O BANCO SANTANDER S/A consignou, preliminarmente, a inépcia da inicial, além de
impugnar a gratuidade processual e o valor atribuído à causa. No mérito, sustentou que
a parte autora não trouxe provas da ofensa ao seu mínimo existencial, ausentes,
portanto, as exigências previstas na lei de superendividamento, sendo válidos e
regulares os contratos firmados, invocando o princípio do pacta sunt servanda,
pugnando, ao final, pelo julgamento improcedente da demanda. Anexou documentos (EP
90).
A FUPRES ADMINISTRADORA DE CARTÕES LTDA suscitou, preliminarmente, a
impossibilidade de integração dos contratos; inépcia da inicial, impugnando a concessão
da gratuidade processual. No mérito, sustentou que os valores foram assumidos
voluntariamente pelo autor; a legalidade dos contratos firmados e a ausência das
exigências previstas na lei de superendividamento, pugnando, ao fim, pela
improcedência dos pedidos. Na oportunidade, acostou documentos (EP 93).
O BANCO DAYCOVAL S.A afirmou, em preliminar, a ausência do interesse de agir e a
inépcia da inicial, impugnando o valor da causa; a gratuidade processual e a capacidade
postulatória. No mérito, sustentou que a parte autora não comprovou o
superendividamento; que inexiste ofensa ao mínimo existencial; a legalidade do contrato;
a preservação do princípio do pacta sunt servanda; e a sua boa-fé na celebração dos
empréstimos, requerendo que os pedidos sejam julgados improcedentes. Apresentou
documentos (EP 94).
O BANCO DO BRASIL S.A. sustentou, preliminarmente, a inépcia da inicial, impugnando
a concessão da gratuidade processual, além do valor atribuído à causa. No mérito,
sustentou a improcedência da ação em face da ausência dos requisitos para a aplicação
da lei de superendividamento e a legalidade dos contratos, invocando o princípio do
pacta sunt servanda. Juntou documentos (EP 95).
Designada e realizada audiência de conciliação, a mesma restou frutífera somente em
relação à corré CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, sendo
homologada a transação e, na mesma ocasião, reconhecida a ilegitimidade passiva do
réu PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA (AVANCARD) (EP 121).
A parte autora demonstrou seu interesse na instauração do processo por
superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas
com a apresentação de minuta do plano judicial compulsório (EP 128).
Instadas acerca da produção de outras provas (EP 134), restou indeferido o pedido de
prova documental, anunciando-se o julgamento antecipado da lide (EP 159) sem
oposição pelos litigantes (EP's 175 a 181).
É o relatório.
Fundamento e DECIDO.
Desnecessária maior dilação probatória, a teor do disposto no inciso I do art. 355 do
Código de Processo Civil, sendo certo que, na análise do julgamento antecipado da lide,
vigora a prudente discrição do magistrado no exame da necessidade ou não da
realização de outras provas, ante as circunstâncias de cada caso concreto e a
necessidade de não ofender o princípio do pleno contraditório. No caso em tela, a lide
comporta pronto julgamento, dada pois a questão é eminentemente de direito e os
documentos coligidos aos autos são amplamente suficientes ao deslinde da questão
controvertida.
De proêmio, RECHAÇAM-SE as teses preliminares arguidas pelos requeridos.
Deveras, não prospera a preliminar de inépcia da inicial, uma vez que, da narrativa
contida na exordial, extrai-se que os pedidos formulados são certos e determinados, bem
como que há compatibilidade entre eles, sendo perfeitamente identificável a causa de
pedir e a lógica da narrativa fática. Ademais, registra-se que os requisitos legais para
subsunção da lei de superendividamento (Lei 14.181/21), serão apreciados na análise do
mérito.
Quanto à alegação de falta de interesse de agir, a tese não se sustenta, haja vista o
princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição, conforme preceitua o art. 5°,
inciso XXXV, da Constituição Federal, considerando, ainda, que a parte autora
demonstra a necessidade de buscar a tutela jurisdicional para proteger, resguardar ou
conservar o seu direito (necessidade-adequação), seja no julgamento de mérito
procedente ou não, máxime para eventual repactuação de suas dívidas, haja vista a
impossibilidade de pactuação/transação administrativa.
No que tange a gratuidade processual, mantenho a benesse outrora deferida, haja vista
a ausência de elementos em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Lado outro, quanto à impugnação ao valor da causa, o pedido comporta parcial
acolhimento. Explico.
In casu, a soma dos débitos contratuais com as partes requeridas é R$ 431.415,81,
sendo que a presente repactuação e eventual renegociação das dívidas, nos moldes
apresentados na inicial, o seu proveito econômico corresponderia apenas a
diminuição/abatimento dos valores citados. Destarte, com a minuta do plano de
repactuação, em caso de homologação por este Juízo, a soma total das dívidas da parte
autora não mais seria de seria de R$ 431.415,81, mas sim de R$ 146.704,14, conforme
primeiro plano de repactuação apresentado. Ou seja, o real proveito econômico seria de
R$ 284.711,67, valor este que deve ser atribuído à causa. Nesse sentido, colaciono o
seguinte julgado, verbis: (…)
Em sendo assim, fixo o valor da causa em R$ 284.711,67, proveito econômico
efetivamente buscado pela parte autora com a presente ação. Retifique-se. Anote-se.
No que tange à (im)possibilidade de repactuação/integração dos contratos/dívidas do
consumidor, a matéria confunde-se com o
meritum causae
e com ele será
analisado/decidido.
Por fim, a capacidade postulatória da parte restou comprovada, haja vista estar
representada por advogado habilitado e com instrumento de mandato subscrito
digitalmente, na forma da lei.
Ultrapassadas tais questões, adentrando ao mérito, tenho que os pedidos iniciais não
prosperam.
De proêmio, convém ressaltar tratar-se de inequívoca relação de consumo, pois os
contratos bancários também se submetem à legislação de proteção e defesa dos direitos
do consumidor, por força do que dispõe o artigo 3º, § 2º, da Lei nº 8.078/90. Ademais, é
pacífico que a relação jurídica estabelecida entre as partes está inserida no âmbito das
relações de consumo, conforme corrobora o teor do Enunciado 297 da Súmula do E.
Superior Tribunal de Justiça:
“O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”
A controvérsia cinge-se à repactuação de dívida, na qual a parte autora fundamenta a
sua pretensão nos preceitos da Lei 14.181/21, que alterou dispositivos do CDC. De outra
banda, os credores requeridos, em suma, impugnam a pretensão sob o argumento de
ausência dos requisitos legais.
O superendividamento, conceituado como a “inviabilidade de pagamento da totalidade
dos débitos consumeristas (vencidos e vincendos) sem comprometimento do mínimo
existencial pelo consumidor pessoa natural e de boa-fé” (CDC, 54-A, § 1º), foi
regulamentado a partir da Lei n. 14.181/21, que introduziu modificações esparsas no
CDC e no Estatuto da Pessoa Idosa. Trata-se de instituto fundamentado no princípio da
boa-fé objetiva, mais precisamente nos deveres de cooperação e lealdade para a
evitação da ruína do outro contratante (exceção da ruína).
Ainda, o art. 54-A, do mesmo diploma legal, elucida que:
'Entende-se por
superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de
boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem
comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação'.
A mencionada regulamentação foi realizada por meio do
Decreto Federal nº
11.150/2022, que estipulou como mínimo existencial a renda mensal do consumidor
pessoal natural, estando previsto atualmente, o valor equivalente a R$ 600,00 (caput, art.
3º).
Ademais,
a
aplicabilidade
das
normas
de
prevenção
e
tratamento
do
superendividamento pressupõe a diferenciação entre o superendividamento ativo e o
superendividamento passivo. O primeiro decorre do endividamento voluntário, e pode se
dar de modo consciente (por ação de má-fé, com intenção deliberada de fraude a
credores em razão da prévia ciência quanto à incapacidade de pagamento), hipótese em
que não se aplicam as normas de prevenção e tratamento, ou de modo inconsciente (por
ação negligente/imprudente, em razão da contratação por impulso ou da não fiscalização
de despesas). Já o segundo é oriundo do endividamento involuntário, decorrente de
fatores externos que obrigam o indivíduo a suportar despesas superiores às suas
receitas (desemprego, divórcio, doença, dentre outras).
Registra-se que o processo de repactuação de débitos, regulado no art. 104-A do CDC,
é instaurado pelo juiz a requerimento do consumidor superendividado e visa, em uma
primeira etapa, à conciliação (obtenção de acordo entre o devedor e os credores). Caso
não seja celebrado acordo, passa-se então ao processo por superendividamento,
regulado no art. 104-B do CDC (2ª fase), também instaurado pelo juiz a requerimento do
consumidor superendividado e, nessa segunda etapa, objetiva a (i) revisão ou integração
de contratos; (ii) repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial
compulsório.
Importante anotar que o plano judicial compulsório (CDC, art. 104-B, § 4º) deve
assegurar aos credores, no mínimo, o valor principal do débito, atualizado com o
adimplemento integral em, no máximo 5 (cinco) anos, com a primeira parcela devida no
prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da homologação e as demais
mensais e sucessivas.
Logo, para a repactuação de dívidas e usufruto dos benefícios da lei, a parte autora
superendividada deve preencher os seguintes requisitos: 1) insuficiência de renda; 2) ser
devedor de boa-fé, ou seja, em razão de sua renda ser inferior ao que acumulou em
dívidas; 3) as dívidas devem ser decorrentes de relações de consumo comum, não
podendo incluir aqui consumos luxuosos, de alto valor; 4) em hipótese alguma as dívidas
devem ser decorrentes de má-fé, ou seja, dívidas contraídas com intuito fraudulento; 5) a
petição inicial deve conter um plano detalhado da forma/prazo de pagamento; e 6) a
indicação da renda familiar.
Uma vez firmadas tais premissas, no caso ora em apreço, passa-se ao exame do
preenchimento dos requisitos legais para a repactuação de dívidas.
Da análise dos autos, extrai-se incontroversa a existência de empréstimos adquiridos
pela parte autora junto às instituições financeiras rés.
In casu, verifica-se que parte autora não comprovou sua condição de consumidora
superendividada, deixando de demonstrar a impossibilidade em arcar com o pagamento
dos débitos sem prejuízo do mínimo existencial, bem como ausência de má-fé ou de
fraude na obtenção das dívidas.
Com efeito, não trouxe o(a) requerente cópias das faturas de cartão de crédito e extratos
bancários, com detalhamento de compras realizadas, quando da origem dos débitos,
para comprovação do risco à garantia do mínimo existencial, configurando, outrossim,
contradição, ao menos pela ausência de prova constituída acerca da real e efetiva
condição financeira do(a) requerente.
Ademais, conforme narrado em petição inicial, a requerente, como servidora pública em
atividade, aufere renda bruta de R$ 9.772,62, sendo que após descontos/retenções
legais e empréstimos resta o valor líquido de R$ 875,79.
Portanto, constata-se que remanescem após o pagamento de todos os débitos a
quantia de R$ 875,79, valor que está além da quantia prevista no art. 3º do Decreto
Federal no 11.150/2022 como mínimo existencial, situação incompatível com o rito
das ações de superendividamento (CDC, § 1º, art. 104-A), máxime considerando a
ausência
de
prova,
pelo(a)
demandante,
dos
alegados
gastos
não
consignados/cotidianos.
Destaca-se, ainda, que a parte autora é servidor(a) público(a) em atividade, com fonte de
renda bruta superior a R$ 9.000,00, sendo que, por certo, faz jus ao recebimento dos
beneplácitos de 13º salários e de férias, o que, por si só, consiste em expressivas
quantias complementativas a suas remunerações ordinárias, capazes de afastar
qualquer alegação de ofensa ao seu mínimo existencial. Nesse passo, a renda da parte
autora não pode, sob qualquer métrica, ser caracterizada como comprometedora do
mínimo vital para sua sobrevivência.
Ainda, observa-se a ausência de documentos a demonstrar gastos rotineiros da parte
autora, especialmente se é o(a) único(a) a sustentar sua família (esposo(o) e filhos,
incluindo uma maior de idade - EP 1.13), deixando a demandante de comprovar que é
arrimo/sustento da sua família, sequer comprovando os gastos/repasses/despesas. A
esse respeito, é cediço ser obrigação do pai e da mãe arcar com a manutenção dos
filhos na proporção da capacidade financeira de cada qual (CC, art. 1.703). Ainda,
denota-se da qualificação autoral que esta é casada, sendo que nada foi juntado acerca
da (im)possibilidade de seu companheiro e/ou genitor do(s) seu(s) filho(s), em arcar com
tais custos e em que quantia.
Não se pode perder de vista que também nada trouxe aos autos com relação à renda
familiar. Ocorre que, para a repactuação de dívida pretendida, com a preservação do
mínimo existencial à família seria necessária a apuração de toda a renda familiar e todas
as suas despesas, o que não se extrai dos autos, dada a ausência de documentações
em tal sentido.
Da mesma forma, verifica-se na fatura de cartão de crédito da autora (EP 1.13, 1.14
e 1.15) diversas compras realizadas recentemente e com extenso lapso para
pagamento, sem a efetiva demonstração da sua essencialidade (p. ex. RORAIMA
PISCI PARC 09/12 - R$ 843,00, CACULAO PARC 08/12 - R$ 191,11, dentre outras -
EP 1.16), inclusive em outro Estado da Federação - AIRBNB PAGAM PARC 02/02
SAO PAULO - R$ 293,16 - EP 1.9), mesmo diante de tais fatos serem consignados em
decisão de indeferiu pedido de urgência, fator contraditório para quem afirma ter sua
dignidade financeira atingida.
Acrescenta-se que, a minuta do plano compulsório apresentado pela parte autora (EP
128), em confronto com os demais documentos juntados pelos réus nas contestações
apresentadas, não contempla sequer o pagamento do valor do principal devido, corrigido
monetariamente por índices oficiais de preço, o que reforça a impossibilidade do
acolhimento dos pedidos autorais.
Mais a mais, compulsando os documentos juntados pela parte autora (EP 1.17),
observa-se, logo após o recebimento de seus proventos/remuneração, a realização de
transferências, via pix, e aplicação em conta poupança, inclusive, de valores
consideráveis (R$ 10.000,00 - EP 1.17 - pag. 3), sem, contudo, esclarecer as
destinações/finalidades dos pagamentos, depósitos e recebimentos, bem assim trazer a
Juízo extrato bancário das contas (poupança ou não) a que destinadas as transferências,
não havendo que ser falar em ofensa ao mínimo existencial.
Nesse sentido, observa-se que a parte autora também não trouxe qualquer
elemento para justificar a necessidade/motivo da realização dos empréstimos junto
às instituições financeiras, incluindo um valor superior a R$ 140.000, 00 com
apenas um único requerido (EP 95) fator preponderante a demonstrar sua boa-fé
na contratação das dívidas que pretende repactuar.
Ademais, insta consignar que os documentos apresentados não permitem concluir, com
precisão, o que levou o(a) requerente ao suscitado superendividamento e tampouco do
destino das expressivas quantias levantadas junto ao requerido, restando impossível a
verificação da sua boa-fé para subsunção à lei de superendividamento.
Ainda, a parte autora não comprova qualquer dado externo que tenha lhe acarretado a
alteração patrimonial, tais como redução drástica do salário, perda do emprego,
problemas de saúde ou outro fator que tenha, efetivamente, afetado sua conjuntura
econômica quando da época dos empréstimos/dívidas.
Deveras, cabe ao consumidor evidenciar a sua incapacidade de quitar as obrigações
contraídas, as quais visam atender a uma necessidade pessoal extraordinária decorrente
de infortúnios da vida ou eventos imprevisíveis (endividamento involuntário). Fora dessas
circunstâncias excepcionais, considera-se mero descontrole pessoal das finanças, não
enquadrado nos parâmetros da teoria do superendividamento.
Anota-se que incumbe à parte autora comprovar que tomou os valores para as despesas
básicas de subsistência, pois a repactuação não tem amparo legal quando as dívidas
que ' decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor'
(CDC, § 3º, art. 54-A).
Dito isto, acrescenta-se que pelo contexto da petição inicial, é possível aferir que o
pedido de redução dos descontos dos empréstimos fora baseado no suposto
superendividamento da parte autora e extrapolação do patamar máximo de margem
consignável, qual seja de 30%.
Com efeito, o objetivo da norma protetora ao consumidor (Lei de Superendividamento)
não foi criar uma regra matemática para subsunção aos benefícios previstos na lei, de
modo que a ofensa ao mínimo existencial demanda demonstração inequívoca de ofensa
à dignidade financeira do cidadão, não havendo que se falar em percentual fixo de sua
remuneração.
Deveras, o direito à repactuação das dívidas não possui caráter potestativo,
independente da vontade do credor, autorizando que o consumidor, unilateralmente,
aponte quantia que entende justa e adequada para sua renda, passando a ter direito a
solver somente tal importe. Se assim fosse, a adoção de tal entendimento representaria
uma grande insegurança jurídica, já que o credor estaria condicionado ao assentimento
exclusivo do consumidor, o que comprometeria o recebimento do crédito concedido em
medida verdadeiramente significativa, acabando por desaguar em aumento do custo do
crédito, ou seja, em elevação sistêmica dos juros, bem como em limitação das linhas de
crédito, prejudicando os consumidores de maneira global.
Por esta razão, o legislador estabeleceu rito, critérios e condições para se obter a
repactuação pretendida, disposições que precisam ser respeitadas, sob pena de
subversão do propósito normativo e geração de relevantes efeitos colaterais para o
próprio consumidor. Assim, não se pode, com lastro em tal previsão normativa, restringir
os débitos com lastro apenas na indicação de percentual que o consumidor julga
adequado, pois este deve ser fixado consoante os parâmetros previstos nos art. 104-A e
B do CDC.
Em outras palavras, não se olvide que o cenário é de ENDIVIDAMENTO, jamais de
SUPERENDIVIDAMENTO, nos termos da legislação de regência. E para essa situação
de endividamento, a qual não está acobertada pelas regras excepcionais dos arts. 54-A
e 104-A e seguintes do CDC, deverá a parte buscar as medidas legais para
adequação/renegociação contratual, afastando-se na situação em comento a imposição
de plano compulsório de pagamento ao réu.
Seja como for, ainda que admitidos os números do(a) requerente, e pese a alegada
afetação dos vencimentos às dívidas bancárias, fato é que o remanescente disponível
não implica em risco/ofensa/violação ao 'mínimo existencial', garantindo-se montante
capaz de atender as necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene
e transporte e etc, implicando apenas em redução de sua capacidade financeira, mas
não em vulnerabilidade econômica/financeira, elemento fundamental para a configuração
do superendividamento e embasamento para a concessão do manto protetivo do regime
de excepcionalização do pacta sunt servanda, sob pena de ofensa à segurança jurídica.
Com a devida venia, a intenção do legislador na criação de institutos que beneficiam aos
consumidores, como o enquadramento no conceito de superendividamento (Lei n.
14.181/21), não busca garantir à pessoa superendividada o alto padrão de vida que
detinha antes do endividamento, mas garantir o mínimo existencial para a sua
sobrevivência, o que, no caso em comento, está garantido pelo valor residual pós
descontos dos vencimentos do(a)requerente.
Ademais, não se tem notícia de que o(a) demandante é pessoa idosa, pródiga ou de
precária educação, sendo vedada à aplicação da repactuação de dívidas, aquelas
oriundas de contratos dolosamente celebrados sem o propósito de realizar pagamento,
nos termos do §1º do artigo 104-A do CDC.
A esse respeito, registra-se que a parte autora confirma que celebrou os contratos com o
banco réu, com taxas de juros pactuadas e previamente conhecidas, não alegando em
nenhum momento qualquer vício de consentimento.
Nessa direção, o entendimento jurisprudencial, verbis: (…)
Sendo assim, verifica-se que o(a) requerente deixou de provar o fato constitutivo de seu
direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram juntados aos autos documentos que
deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de pessoa superendividada nos termos
da lei, não havendo que se falar na realização de repactuação de dívidas da forma
pretendida.
Portanto, o(a) autor(a) não trouxe aos autos elementos aptos e suficientes que
comprovem o preenchimento dos requisitos acima elencados, sobretudo o
comprometimento do mínimo existencial, o que implica em óbice ao prosseguimento da
demanda e homologação de eventual plano de repactuação judicial compulsório em
detrimento dos credores.
Com efeito, resta manifesta a ausência no preenchimento dos requisitos legais, em
especial a alegada ofensa ao 'mínimo existencial' e, por conseguinte, a incomprovada
situação de superendividamento, forçoso concluir a inexistência do pressuposto de
procedibilidade para o procedimento especial previsto no art. 54-A, 104-A e seguintes do
CDC, ensejando, pois, a extinção irresolutiva da fase de conhecimento.
ANTE O EXPOSTO e, analisando tudo mais que dos autos consta, com fulcro na
fundamentação supra, julgo EXTINTA a fase de conhecimento, sem resolução do mérito,
reconhecendo a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido
e regular do processo, na forma do art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil.
Em razão da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento de custas processuais
e honorários advocatícios, que ora arbitro no patamar de 10% (dez por cento) sobre o
valor atualizado da causa, nos termos do § 2º do art. 85 do Código de Processo Civil,
contudo, suspensa a exigibilidade, haja vista se tratar de parte beneficiária da gratuidade
processual, mantendo-se a benesse outrora deferida, haja vista a ausência de elementos
em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Retifique-se o valor da causa para R$ 284.711,67.
Certifique a Serventia a existência de agravo de instrumento pendente de julgamento e,
em caso positivo, comunique-se à instância recursal acerca da presente sentença.
Sem prejuízo, considerando a possibilidade de ajuizamento de demandas repetitivas ou
em massa e em atenção a Nota Técnica CIJERR 04/2024, encaminhe-se cópia da
presente sentença ao Centro de Inteligência da Justiça Estadual de Roraima (CIJERR)
para conhecimento e providências que entender cabíveis (via SEI).
Na hipótese de interposição de recurso de apelação, por não haver mais juízo de
admissibilidade a ser exercido pelo Juízo a quo (CPC, art. 1.010), sem nova conclusão,
intime-se a parte contrária para oferecer resposta no prazo de 15 (quinze) dias.
(…) (grifos originais)
Irresignada, nas razões recursais a apelante aduz (EP 198.1), em síntese, […] que
recebe mensalmente a quantia de R$ 431.415,81 (quatrocentos e trinta e um mil, quatrocentos
e quinze reais e oitenta e um centavos); que após os descontos obrigatórios como PRESSEM e
Imposto de Renda no valor de 1.622,39 (mil seiscentos e vinte e dois reais e trinta e nove
centavos). Resta para a parte somente a quantia de R$ 8.150,23 (oito mil cento e cinquenta
reais e vinte e três centavos); que a situação de superendividamento de uma pessoa não se
pode usar fórmulas prontas e moldadas para outras situações; que ficou claro que a parte
Apelante não tem condições financeiras de arcar com todas as suas dívidas e manter um
padrão de vida digno; que a parte Apelante possui encargos nanceiros mensais oriundos de
contratos celebrados junto aos Apelados, que, quando somados, correspondem ao valor de
R$7.274,44 (sete mil, duzentos e setenta e quatro reais e quarenta e quatro centavos),
equivalente a MAIS DE 89% DE SUA RENDA LÍQUIDA; que o valor que resta para parte
Apelante é ínfimo, pois não é suficiente para custear suas despesas básicas, como moradia,
saúde, alimentação, despesas médicas, educação e etc.; que tais dívidas têm comprometido
substancialmente o mínimo existencial da parte Apelante. […]
Calcada nesses argumentos, requer o provimento do recurso para:
a) Seja reconhecida a inconstitucionalidade dos Decretos ns. 11.150/2022 e
11.567/2023, tendo em vista que afronta com a dignidade da pessoa humana;
b) Que a Sentença seja reformada para acolher os pedidos formulados na petição inicial
e torne o plano de pagamento ora apresentado em plano judicial compulsório com o seu
início no mês subsequente à data da sentença;
c) condenar a parte Requerida ao pagamento de custas processuais, despesas e
honorários advocatícios.
Certidão atestando a tempestividade do recurso e a ausência do recolhimento do
preparo (EP 7.1), pois a parte apelante é beneficiária da gratuidade da justiça.
Certidão atestando a tempestividade das contrarrazões contidas nos EPs 212.1, 219.1
e 220.1 (EP 6.1).
O relatado é suficiente.
Inclua-se na pauta de julgamento eletrônico, nos termos do art. 109 do RITJRR.
Intimem-se
Boa Vista - RR, 12 de maio de 2025.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
VOTO
Conforme relatado, trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida
pelo Juízo do 4º Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa
Vista, que julgou improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de
Repactuação de Dívidas C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte
teor (EP 183.1).
Em suma, a apelante requer o provimento do recurso de apelação para que a sentença
de primeiro grau seja reformada.
Os apelados, nas contrarrazões, defendem a manutenção integral da sentença.
Pois bem.
Antes do mais, convém relembrar que não compete ao segundo grau, em regra, julgar
a causa novamente, justamente por se tratar de instância revisora, mas reanalisar a sentença
nos termos da irresignação do apelo.
Dito isso, e após análise detida dos elementos contidos nos autos, constata-se que o
apelo não comporta acolhimento.
Isto porque, em suas razões recursais, a apelante não se insurge contra os
fundamentos da sentença. Ao contrário, a rigor repete ipsis litteris as teses apresentadas na
petição inicial (EP 1.1), que não se presta a atacar a fundamentação que levou o juízo “a quo” a
rejeitar a pretensão inicial.
Dito de outra forma, a parte apelante deixou de apresentar qualquer fundamento capaz
de infirmar a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo, pois ausente a formulação
crítica necessária para se opor aos fundamentos lançados na sentença.
Logo, contra os fundamentos adotados na decisão não existem, nos autos, motivos
pelos quais se possa considerar que o direito não tenha sido bem aplicado.
Ademais, o artigo 1.010, incisos II a IV, do Código de Processo Civil exige que na peça
de apelação constem a exposição do fato e do direito, as razões do pedido de reforma ou de
decretação de nulidade e o pedido de nova decisão.
Da mesma maneira, o pedido não pode ser genérico, mas deve especificar as matérias
decididas que o recorrente reputa devam ser alteradas, de forma que o juízo ad quem possa
julgar o cabimento e provimento do recurso adequadamente.
No caso em exame, contudo, não há nas razões recursais qualquer menção ao que foi
decidido na sentença proferida em primeiro grau de jurisdição, limitando-se a parte apelante a
reproduzir integralmente os argumentos utilizados com o objetivo de contestar a ratio decidendi
utilizada pelo julgador primevo, o que, por óbvio, seria o suficiente para o não conhecimento do
recurso, por violação ao princípio da dialeticidade recursal.
Para corroborar essa afirmação, confira-se a jurisprudência remansosa desta Corte de
Justiça sobre o tema:
PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL.
PRINCÍPIO
DA
DIALETICIDADE.
NÃO
CONHECIMENTO
DO
RECURSO.
HONORÁRIOS MAJORADOS.1. Apelação interposta contra sentença que julgou
improcedentes embargos à execução fiscal promovida pela Fazenda Pública do Estado
de Roraima, fundamentada em multa aplicada pela Agência de Defesa Agropecuária de
Roraima (ADERR) por armazenamento irregular de agrotóxicos sem autorização legal,
no valor de R$ 45.543,20. A sentença afastou a alegação de ilegitimidade passiva ao
entender que a responsabilidade pela infração decorre da guarda indevida dos produtos,
independentemente da sua titularidade.2. A recorrente alega ilegitimidade passiva, sob o
argumento de que os produtos pertenciam a terceiro e foram armazenados por engano
em área anexa à empresa, sem responsabilidade direta da apelante.3. Princípio da
dialeticidade: O recurso deve atacar especificamente os fundamentos da decisão
recorrida. A repetição de argumentos afastados na sentença, sem enfrentamento dos
principais fundamentos, compromete a admissibilidade do apelo, nos termos do art. 932,
III, do CPC.4. No caso, a apelação limita-se a repetir a tese de ilegitimidade passiva sem
enfrentar a essência da decisão: a irrelevância da titularidade dos produtos para a
configuração da infração administrativa, fundada no armazenamento sem autorização.5.
Não se verifica cerceamento de defesa. O indeferimento da oitiva de testemunhas não
prejudicou o julgamento, uma vez que as provas colhidas na fase administrativa e judicial
foram consideradas suficientes. A apelante não demonstrou de forma concreta como a
ausência da prova comprometeria seu direito de defesa.6. Gratuidade de justiça: o
benefício foi concedido na fase inicial e permanece válido no grau recursal, nos termos
do art. 98, § 1º, VIII, do CPC, tornando prejudicado novo pedido formulado pela
apelante.7. Honorários advocatícios recursais majorados de 10% para 15%, conforme
art. 85, § 11, do CPC, observada a gratuidade de justiça já deferida.8. Recurso não
conhecido. Honorários majorados. (TJRR – AC 0810795-83.2023.8.23.0010, Rel. Des.
ERICK LINHARES, Câmara Cível, julg.: 31/10/2024, public.: 31/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C COBRANÇA –
PROGRESSÃO FUNCIONAL – SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. 1ª APELAÇÃO:LEI
N.º 1.611/2015 – APLICAÇÃO – RECONHECIMENTO ADMINISTRATIVO DO DIREITO
POSTULADO – PERDA DO INTERESSE PROCESSUAL – INEXISTÊNCIA DE
DEMONSTRAÇÃO DE ERRO NO REENQUADRAMENTO REALIZADO PELO
MUNICÍPIO DE BOA VISTA – VERBAS RETROATIVAS DEVIDAS - DIFERENÇAS
SALARIAIS NÃO ATINGIDAS PELA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – RECURSO
DESPROVIDO
–
SENTENÇA
MANTIDA.
2ª
APELAÇÃO:
AUSÊNCIA
DE
DIALETICIDADE RECURSAL – RECURSO NÃO CONHECIDO. (TJRR – AC
0802853-97.2023.8.23.0010, Rel. Des. TÂNIA VASCONCELOS, Câmara Cível, julg.:
19/12/2024, public.: 19/12/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. INSCRIÇÃO DO NOME DO SÓCIO NA CDA.
AUSÊNCIA DE SUA PARTICIPAÇÃO NO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO COMO
PARTE. RAZÕES DO APELO QUE REPETEM, EM PARTE, AS MESMAS JÁ
LANÇADAS NA CONTESTAÇÃO. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. INDICAÇÃO DE
PRECEDENTES DO STJ QUE NÃO SE AMOLDAM À HIPÓTESE DOS AUTOS.
RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, DESPROVIDO.
1. A simples repetição, nas razões do apelo, dos argumentos lançados na fase de
conhecimento, impõe o não conhecimento desses argumentos por não observância do
princípio da dialeticidade. 2. Mostra-se escorreita a sentença que reconhece a
ilegitimidade passiva do sócio que não integrou o procedimento administrativo fiscal na
qualidade de parte, conforme precedentes do STJ e do egrégio TJRR acerca do tema.
(TJ-RR - AC: 0831030-13.2019.8.23.0010, Relator: ELAINE BIANCHI, Data de
Julgamento: 25/04/2021, Câmara Cível, Data de Publicação: 26/04/2021)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO - OFENSA AO PRINCÍPIO DA
DIALETICIDADE - NÃO CONHECIMENTO DO INCONFORMISMO. 1. O princípio da
dialeticidade recursal exige a impugnação integral e específica de cada um dos
fundamentos da decisão recorrida, sob pena de não conhecimento do recurso. 2.
Olvidando a embargante de tal ônus, impõe-se o não conhecimento dos declaratórios.
(TJ-RR - EDecAC: 72119027220168230010 7211902-72.2016.8.23.0010, Relator: Des.
Cristóvão Suter, Data de Publicação: DJe 09/10/2019, p.)
No entanto, embora o presente recurso, a rigor não pudesse sequer ser conhecido
porque não atacou os fundamentos da sentença; a fim de evitar argumentos de violação à
ampla defesa e acesso ao duplo grau de jurisdição, conheço do recurso e passo à análise do
mérito da controvérsia.
In casu, o juizo a quo julgou improcedente a demanda por ausência de documentação
apta a comprovar a condição de superendividada, já que a parte autora, ora apelante, “deixou
de provar o fato constitutivo de seu direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram
juntados aos autos documentos que deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de
pessoa superendividada nos termos da lei, não havendo que se falar na realização de
repactuação de dívidas da forma pretendida”.
Ou seja, a parte apelante não forneceu os documentos necessários para que o
magistrado senteciante pudesse aferir, com convicção, a sua alegada condição de
superendividada.
Dito de outra forma, não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o
comprometimento do mínimo existencial, razão pela qual deve ser preservada a autonomia das
vontades, visto que os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e
consciente pelas partes.
Assim, infere-se que a ratio decidendi utilizada pelo magistrado sentenciante para julgar
improcedente a pretensão autoral merece ser mantida por seus próprios fundamentos, a qual
adoto como razão de decidir para conhecer do recurso, mas negar-lhe provimento.
Em reforço à conclusão adotada pelo juízo a quo, confira-se a jurisprudência pátria
sobre o tema:
APELAÇÃO
CÍVEL.
Ação
revisional.
Repactuação
de
dívidas.
Lei
do
Superendividamento. Ausência de comprovação documental ou dos requisitos para a
pretendida limitação nos pagamentos devidos. Higidez contratual reconhecida. Sentença
de improcedência mantida. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJ-SP - Apelação Cível:
0000507-73.2023.8.26.0577 São José dos Campos, Relator: Emílio Migliano Neto, Data
de Julgamento: 21/02/2024, 23ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação:
21/02/2024)
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÉBITO - LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO DE
SUPERENDIVIDADO DO CONSUMIDOR - IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. Nos termos
da Lei nº 14.181/2021, que visa dispor sobre formas de prevenção e solução da situação
de superendividamento dos consumidores, entende-se nessa situação, fazendo jus,
portanto, à repactuação de débitos, a pessoa natural, de boa-fé, que evidencia a total
impossibilidade de adimplir a suas dívidas de consumo sem comprometer seu mínimo
existencial. Ausente as provas de tais circunstâncias, deve ser mantida a improcedência
da pretensão inicial. (TJ-MG - Apelação Cível: 5001170-35.2023.8.13.0241
1.0000.24.174736-9/001, Relator: Des.(a) Arnaldo Maciel, Data de Julgamento:
07/05/2024, 7ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 15/05/2024)
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CIVIL E PROCESSUAL
CIVIL. PROCESSO SOB O RITO ESPECIAL DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
SUPERENDIVIDAMENTO.
AFETAÇÃO
DO
MÍNIMO
EXISTENCIAL
APÓS
DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E EM CONTA CORRENTE. NÃO
DEMONSTRADO. INSTAURAÇÃO DO PROCEDIMENTO DA LEI Nº 14.181/2021.
REQUISITOS
NÃO
PREENCHIDOS.
RECURSO
DESPROVIDO.
SENTENÇA
MANTIDA. 1. A solicitação de repactuação de dívidas pretendida pelo apelante é medida
estabelecida no art. 104-A, § 4º, do CDC, introduzido pela Lei nº 14.181/21, aplicada em
favor do consumidor superendividado. Segundo o art. 54-A, § 1º, do CDC, ocorre o
superendividamento quando o consumidor pessoa física, de boa-fé, não consegue pagar
a totalidade de suas dívidas de consumo (exigíveis e vincendas) sem comprometer o seu
mínimo existencial. 2. O superendividamento está diretamente relacionado com o mínimo
existencial do indivíduo, ou seja, o superendividamento pressupõe o comprometimento
da sobrevivência da pessoa e ameaça o indivíduo e sua família (mínimo existencial), no
caso, verifica-se que o apelante é policial militar do Distrito Federal e está submetido ao
regime jurídico dos servidores públicos distritais, porém, na hipótese, imperioso destacar
a existência de óbice quanto ao pedido de repactuação de dívida, tendo em vista a
necessidade de observância mínimo existencial, elemento previsto como requisitos da
Lei nº 14.181/21. 3. No caso concreto, constata-se, com base nos elementos probatórios,
que o apelante percebe uma renda líquida, após todos os descontos, inclusive, os
realizados em conta corrente, uma renda líquida muito acima do estabelecido pelo
Decreto nº 11.150/22, com redação dada pelo Decreto nº 11.567/2023. Dessa forma o
apelante não conseguiu demonstrar os requisitos para que seja caracterizado o
superendividamento. 4. Por sua vez, a intervenção judicial somente se justifica na
hipótese de situação excepcional se constatado a existência de superendividamento, sob
pena de indevida intervenção judicial na autonomia da vontade. Na hipótese, entretanto,
não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o comprometimento do
mínimo existencial. Nesse contexto, deve ser preservada a autonomia das vontades, pois
os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e consciente pelas
partes. Portanto, não comprovado o comprometimento ao mínimo existencial, não há
como instaurar o procedimento de repactuação de dívidas. 5. Recurso desprovido.
Sentença mantida. (TJ-DF 07238141920238070003 1924958, Relator: ALFEU
MACHADO, Data de Julgamento: 18/09/2024, 6ª Turma Cível, Data de Publicação:
02/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. SUPERENDIVIDAMENTO.
REPACTUAÇÃO DE DÍVIDA. EXCEPCIONALIDADE. MÍNIMO EXISTENCIAL. PODER
REGULAMENTAR. DECRETO 11.150/2022. AUSTERIDADE. PODER JUDICIÁRIO.
INTERVENÇÃO NÃO JUSTIFICADA. IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO. SENTENÇA
MANTIDA. 1. As normas protetivas que regulam o tratamento do superendividamento
garantem a repactuação das dívidas, mediante a preservação do mínimo existencial, nos
termos da regulamentação. Art. 104-A do Código de Defesa do Consumidor. 2. Ainda
carente de debates, o Decreto Presidencial nº 11.150, de 26 de julho de 2022, com
vacatio legis de sessenta dias da após a publicação, traz a delimitação acerca do tema.
3. Nos termos do art. 3º do Decreto 11.150/2022, ?considera-se mínimo existencial a
renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do
salário mínimo vigente na data de publicação deste Decreto?. 4. Embora se possa
questionar a extrema austeridade imposta pela regulamentação do que pode ser
considerado o mínimo existencial, a intervenção do poder judiciário nos contratos regidos
pelo Código de Defesa do Consumidor deve se pautar pela teoria da base objetiva dos
contratos. 5.Na hipótese em que não se constata alteração das circunstâncias
intrínsecas à formulação do vínculo contratual, assim como não se identifica condutas de
incontestável abuso por parte da instituição financeira credora, a intervenção judicial nos
contratos não se justifica. 6. Recurso conhecido e não provido. (TJ-DF
07058375420228070001 1674193, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, Data de
Julgamento: 08/03/2023, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 20/03/2023)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATOS BANCÁRIOS.
REPACTUAÇÃO
DE
DÍVIDAS.
LIMITAÇÃO
DOS
DESCONTOS
EM
CONTA-CORRENTE DO DEVEDOR. PRELIMINARES DE INÉPCIA DA INICIAL E
FALTA DE INTERESSE DE AGIR REJEITADA. CONTRATAÇÃO ESCLARECIDA PELO
CONSUMIDOR. REPACTUAÇÃO. IMPOSSIBILIDAE. VEDAÇÃO DO § 1º DO ART.
104-A DO CDC. PLANO DE PAGAMENTO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
APELAÇÃO CONHECIDA. PRELIMINARES REJEITADAS E NÃO PROVIDA. 1.
Insurge-se o autor, ora apelante, contra sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível de
Samambaia que, na ação de repactuação de dívidas com 4 instituições bancárias,
homologou o acordo de pagamento de dívidas feito entre o autor e o Banco INTER S/A,
revogou a tutela anteriormente concedida de limitação de descontos em conta-corrente a
30% (trinta por cento) dos ganhos mensais líquidos e julgou improcedente o pedido da
inicial, bem como o condenou ao pagamento das custas processuais e dos honorários
advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade restou suspensa
diante da gratuidade de justiça concedida. Pretende o prosseguimento de ação de
repactuação de dívidas de mútuo com a apresentação de plano de pagamento com
prazo superior ao estabelecido legalmente e limitação dos descontos em sua
conta-corrente ao patamar de 30% de sua remuneração mensal líquida
independentemente da modalidade do empréstimo. 2. O juízo sentenciante
compreendeu pela incompatibilidade do plano de pagamento apresentado pelo devedor
com a observância de requisito essencial da Lei do Superendividamento (Lei n.
14.181/2021), a saber, o prazo máximo de pagamento em até 5 anos. Portanto,
descabida a aplicação do art. 104-B da lei citada, para instauração da segunda fase do
procedimento de superendividamento, pois o próprio consumidor já informou a
impossibilidade de adequação da proposta aos termos da legislação. Além disso, foram
verificados fortes indícios da contratação dolosa dos débitos pelo apelante devedor. 3.
Não induz à inépcia da inicial do pedido de repactuação dos contratos a ausência de
efetivo plano de pagamento por não representar vício insanável (art. 337, IV do CPC). 4.
Quanto à questão preliminar de falta de interesse de agir arguida pelo apelado BANCO
BMG SA, ?o interesse de agir, consubstanciado no binômio necessidade-utilidade, busca
alcançar a realização da pretensão deduzida em Juízo, a qual não poderia ser obtida
através de outra forma. Verificando-se que a preliminar suscitada se confunde com o
mérito da questão, há de ser rejeitada de plano? (TJDFT. Acórdão 1617020,
07219987620218070001, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, 5ª Turma Cível, data de
julgamento: 21/9/2022, publicado no DJE: 29/9/2022. Pág.: Sem Página Cadastrada .).
Preliminar rejeitada. 5. É ônus do consumidor provar que se encontra privado do seu
mínimo existencial nos termos do art. 54-A do CDC. No caso em análise, não há provas
hábeis de que, após os descontos realizados e a sobra de R$ 4.000,00 (quatro mil reais),
a quantia remanescente é apta a comprometer-lhe o próprio sustento e o de sua família.
Com efeito, a quantia representa aproximadamente três salários-mínimos, o que é
superior à remuneração mensal média do trabalhador brasileiro. Segundo estatísticas do
IBGE, no trimestre de setembro a novembro de 2022 o salário médio mensal é de
aproximadamente R$ 2.787 (dois mil setecentos e oitenta e sete reais). Há, ainda, de se
salientar quanto a existência de fortes indícios de contratação dolosa dos débitos pelo
apelante consumidor, o que, por si só, tem o condão de excluir os empréstimos aqui
impugnados do processo de repactuação de dívidas conforme o § 1º do art. 104-A do
CDC. 6. Verificado que o plano de pagamento não fora formulado em consonância aos
parâmetros mínimos impostos pela legislação, em especial a previsão do limite temporal
de 05 (cinco) anos para pagamento, a fim de evitar a eternização das obrigações, a
manutenção da improcedência do pedido é medida que se impõe. 7. Apelação
conhecida, preliminares rejeitadas e não provida. Sentença mantida. (TJ-DF
07134365420218070009 1690491, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, Data de
Julgamento: 18/04/2023, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: 28/04/2023)
Portanto, adoto e ratifico a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo para
solucionar a controvérsia; e assim procedo ancorada no entendimento remansoso do Tribunal
da Cidadania que reconhece […] a viabilidade de o órgão julgador adotar ou ratificar o juízo de
valor firmado na sentença, inclusive transcrevendo-a no acórdão, sem que tal medida encerre
omissão ou ausência de fundamentação no decisum (REsp nº 662.272-RS, 2ª Turma, Rel.Min.
João Otávio de Noronha, j. de 4.9.2007; REsp nº 641.963-ES, 2ª Turma, Rel. Min. Castro
Meira, j. de 21.11.2005; REsp nº 592.092-AL, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, j. 17.12.2004
e REsp nº 265.534- DF, 4ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j de 1.12.2003).
Diante do exposto, nego provimento ao recurso.
Em atendimento ao que preconiza o art. 85, § 11, do CPC, majoro em 5% (cinco por
cento) os honorários advocatícios fixados na sentença.
É como voto.
A fim de evitar a oposição de embargos de declaração meramente protelatórios,
considera-se, desde já, prequestionada toda matéria infraconstitucional e constitucional,
observando o entendimento do STJ no sentido de que, para o prequestionamento, é
desnecessária a explícita indicação dos dispositivos de lei que o fundamentaram.
No ensejo, advirto às partes que a interposição de eventual recurso meramente
protelatório ou com escopo de rediscutir esta controvérsia ensejará na aplicação de multa, nos
termos dos arts. 79, 80, 81 e 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil.
Intimem-se.
Com o trânsito em julgado, arquivem-se (art. 1.006 do CPC).
Boa Vista - RR, data constante do sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO.
AUSÊNCIA
DE
IMPUGNAÇÃO
AOS
FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. NÃO COMPROVAÇÃO DA
CONDIÇÃO
DE
SUPERENDIVIDAMENTO.
IMPROCEDÊNCIA
MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. O recurso de apelação deve, nos termos do art. 1.010, incisos II a IV,
do CPC, conter impugnação específica aos fundamentos da sentença, o
que configura o princípio da dialeticidade. A mera repetição das teses
iniciais, sem enfrentamento dos fundamentos do decisum, compromete
sua admissibilidade.
2. Embora a apelação apresentada limite-se a reiterar os argumentos da
petição inicial, sem atacar especificamente a ratio decidendi da sentença,
o recurso foi conhecido a fim de garantir o duplo grau de jurisdição e evitar
prejuízos à parte.
3. A Lei nº 14.181/2021, que alterou o Código de Defesa do Consumidor,
condiciona a instauração do procedimento de repactuação de dívidas à
comprovação de que o consumidor está impossibilitado de pagar a
totalidade de suas dívidas sem comprometer o mínimo existencial (art.
54-A, § 1º, CDC).
4. No caso concreto, a autora não comprovou sua condição de
superendividada nem apresentou documentos suficientes à análise do
comprometimento de sua subsistência, ônus que lhe incumbia nos termos
do art. 373, I, do CPC.
5. Em respeito à autonomia privada, não demonstrada a situação
excepcional de superendividamento, deve-se preservar os pactos
livremente firmados entre as partes.
6. A jurisprudência desta Corte e de outros Tribunais reconhece que a
ausência de comprovação do superendividamento inviabiliza a aplicação
do procedimento previsto na Lei nº 14.181/2021.
7. Recurso conhecido e não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da 2ª Turma Cível do
Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em negar
provimento ao presente recurso, nos termos do voto da Relatora. Participaram do julgamento
os eminentes Desembargadores: Mozarildo Cavalcanti (Presidente e Julgador), Elaine Bianchi
(Relatora) e Cristóvão Suter (Julgador). Sessão Virtual do Egrégio Tribunal de Justiça do
Estado de Roraima, data constante no sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi - Relatora
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Processo nº 0804296-49.2024.8.23.0010
ID: 276117187
Data de Disponibilização:
22/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CARLOS AUGUSTO TORTORO JUNIOR
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
A…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida pelo Juízo do 4º
Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa Vista, que julgou
improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de Repactuação de Dívidas
C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte teor (EP 183.1):
Proc. n.° 0804296-49.2024.8.23.0010
SENTENÇA
GRACIANE PASSOS DE SOUZA ajuizou ação de repactuação de dívida por
superendividamento c.c pedido de tutela de urgência em face do BANCO DO BRASIL
S.A, BANCO SANTANDER S.A., CREFISA, FUPRES ADMINISTRADORA DE
CARTOES LTDA, BANCO DAYCOVAL S.A., AVANCARD PROMOÇÃO DE VENDAS
LTDA e BEMOL S/A, alegando, em síntese, que não consegue arcar com as despesas
referente aos contratos de empréstimos consignados realizados e que os descontos em
sua remuneração afetam sua sobrevivência, tendo o seu mínimo existencial
comprometido. Deu à causa o valor de R$ 431.415,81. Juntou documentos (EP's 1.2 a
1.19).
O pedido liminar restou indeferido, sendo concedida a gratuidade processual à parte
autora (EP 6).
Citados (EP's 39, 40, 41), os réus apresentaram contestação.
O BANCO MASTER S/A e PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA. (AVANCARD)
suscitou, em preliminar, a sua ilegitimidade passiva e impugnou a concessão da
gratuidade processual autoral. No mérito, arguiu a ausência de ato ilícito; a ausência dos
requisitos para aplicação da lei que trata do superendividamento; má-fé da autora na
contratação dos empréstimos, requerendo, ao final, o julgamento improcedente dos
pedidos formulados. Anexou documentos (EP 46).
A BEMOL S.A. suscitou, em sede preliminar, a inépcia da inicial. Quanto ao mérito,
sustentou que a parte autora não trouxe provas do direito pleiteado, requerendo o
julgamento de improcedência (EP 49).
A CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS S.A suscitou, em
preliminar, a inépcia da inicial; a falta de interesse de agir; além de impugnar a
gratuidade processual. No mérito, arguiu a legalidade dos contratos firmados, não
havendo que se falar em abusividade das termos pactuados, bem como um possível
aumento da taxa média e a, consequente, redução da oferta em caso de procedência,
diante da eventual insegurança jurídica, requerendo, ao final, o julgamento improcedente
dos pedidos formulados na exordial. Anexou documentos (EP 58).
O BANCO SANTANDER S/A consignou, preliminarmente, a inépcia da inicial, além de
impugnar a gratuidade processual e o valor atribuído à causa. No mérito, sustentou que
a parte autora não trouxe provas da ofensa ao seu mínimo existencial, ausentes,
portanto, as exigências previstas na lei de superendividamento, sendo válidos e
regulares os contratos firmados, invocando o princípio do pacta sunt servanda,
pugnando, ao final, pelo julgamento improcedente da demanda. Anexou documentos (EP
90).
A FUPRES ADMINISTRADORA DE CARTÕES LTDA suscitou, preliminarmente, a
impossibilidade de integração dos contratos; inépcia da inicial, impugnando a concessão
da gratuidade processual. No mérito, sustentou que os valores foram assumidos
voluntariamente pelo autor; a legalidade dos contratos firmados e a ausência das
exigências previstas na lei de superendividamento, pugnando, ao fim, pela
improcedência dos pedidos. Na oportunidade, acostou documentos (EP 93).
O BANCO DAYCOVAL S.A afirmou, em preliminar, a ausência do interesse de agir e a
inépcia da inicial, impugnando o valor da causa; a gratuidade processual e a capacidade
postulatória. No mérito, sustentou que a parte autora não comprovou o
superendividamento; que inexiste ofensa ao mínimo existencial; a legalidade do contrato;
a preservação do princípio do pacta sunt servanda; e a sua boa-fé na celebração dos
empréstimos, requerendo que os pedidos sejam julgados improcedentes. Apresentou
documentos (EP 94).
O BANCO DO BRASIL S.A. sustentou, preliminarmente, a inépcia da inicial, impugnando
a concessão da gratuidade processual, além do valor atribuído à causa. No mérito,
sustentou a improcedência da ação em face da ausência dos requisitos para a aplicação
da lei de superendividamento e a legalidade dos contratos, invocando o princípio do
pacta sunt servanda. Juntou documentos (EP 95).
Designada e realizada audiência de conciliação, a mesma restou frutífera somente em
relação à corré CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, sendo
homologada a transação e, na mesma ocasião, reconhecida a ilegitimidade passiva do
réu PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA (AVANCARD) (EP 121).
A parte autora demonstrou seu interesse na instauração do processo por
superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas
com a apresentação de minuta do plano judicial compulsório (EP 128).
Instadas acerca da produção de outras provas (EP 134), restou indeferido o pedido de
prova documental, anunciando-se o julgamento antecipado da lide (EP 159) sem
oposição pelos litigantes (EP's 175 a 181).
É o relatório.
Fundamento e DECIDO.
Desnecessária maior dilação probatória, a teor do disposto no inciso I do art. 355 do
Código de Processo Civil, sendo certo que, na análise do julgamento antecipado da lide,
vigora a prudente discrição do magistrado no exame da necessidade ou não da
realização de outras provas, ante as circunstâncias de cada caso concreto e a
necessidade de não ofender o princípio do pleno contraditório. No caso em tela, a lide
comporta pronto julgamento, dada pois a questão é eminentemente de direito e os
documentos coligidos aos autos são amplamente suficientes ao deslinde da questão
controvertida.
De proêmio, RECHAÇAM-SE as teses preliminares arguidas pelos requeridos.
Deveras, não prospera a preliminar de inépcia da inicial, uma vez que, da narrativa
contida na exordial, extrai-se que os pedidos formulados são certos e determinados, bem
como que há compatibilidade entre eles, sendo perfeitamente identificável a causa de
pedir e a lógica da narrativa fática. Ademais, registra-se que os requisitos legais para
subsunção da lei de superendividamento (Lei 14.181/21), serão apreciados na análise do
mérito.
Quanto à alegação de falta de interesse de agir, a tese não se sustenta, haja vista o
princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição, conforme preceitua o art. 5°,
inciso XXXV, da Constituição Federal, considerando, ainda, que a parte autora
demonstra a necessidade de buscar a tutela jurisdicional para proteger, resguardar ou
conservar o seu direito (necessidade-adequação), seja no julgamento de mérito
procedente ou não, máxime para eventual repactuação de suas dívidas, haja vista a
impossibilidade de pactuação/transação administrativa.
No que tange a gratuidade processual, mantenho a benesse outrora deferida, haja vista
a ausência de elementos em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Lado outro, quanto à impugnação ao valor da causa, o pedido comporta parcial
acolhimento. Explico.
In casu, a soma dos débitos contratuais com as partes requeridas é R$ 431.415,81,
sendo que a presente repactuação e eventual renegociação das dívidas, nos moldes
apresentados na inicial, o seu proveito econômico corresponderia apenas a
diminuição/abatimento dos valores citados. Destarte, com a minuta do plano de
repactuação, em caso de homologação por este Juízo, a soma total das dívidas da parte
autora não mais seria de seria de R$ 431.415,81, mas sim de R$ 146.704,14, conforme
primeiro plano de repactuação apresentado. Ou seja, o real proveito econômico seria de
R$ 284.711,67, valor este que deve ser atribuído à causa. Nesse sentido, colaciono o
seguinte julgado, verbis: (…)
Em sendo assim, fixo o valor da causa em R$ 284.711,67, proveito econômico
efetivamente buscado pela parte autora com a presente ação. Retifique-se. Anote-se.
No que tange à (im)possibilidade de repactuação/integração dos contratos/dívidas do
consumidor, a matéria confunde-se com o
meritum causae
e com ele será
analisado/decidido.
Por fim, a capacidade postulatória da parte restou comprovada, haja vista estar
representada por advogado habilitado e com instrumento de mandato subscrito
digitalmente, na forma da lei.
Ultrapassadas tais questões, adentrando ao mérito, tenho que os pedidos iniciais não
prosperam.
De proêmio, convém ressaltar tratar-se de inequívoca relação de consumo, pois os
contratos bancários também se submetem à legislação de proteção e defesa dos direitos
do consumidor, por força do que dispõe o artigo 3º, § 2º, da Lei nº 8.078/90. Ademais, é
pacífico que a relação jurídica estabelecida entre as partes está inserida no âmbito das
relações de consumo, conforme corrobora o teor do Enunciado 297 da Súmula do E.
Superior Tribunal de Justiça:
“O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”
A controvérsia cinge-se à repactuação de dívida, na qual a parte autora fundamenta a
sua pretensão nos preceitos da Lei 14.181/21, que alterou dispositivos do CDC. De outra
banda, os credores requeridos, em suma, impugnam a pretensão sob o argumento de
ausência dos requisitos legais.
O superendividamento, conceituado como a “inviabilidade de pagamento da totalidade
dos débitos consumeristas (vencidos e vincendos) sem comprometimento do mínimo
existencial pelo consumidor pessoa natural e de boa-fé” (CDC, 54-A, § 1º), foi
regulamentado a partir da Lei n. 14.181/21, que introduziu modificações esparsas no
CDC e no Estatuto da Pessoa Idosa. Trata-se de instituto fundamentado no princípio da
boa-fé objetiva, mais precisamente nos deveres de cooperação e lealdade para a
evitação da ruína do outro contratante (exceção da ruína).
Ainda, o art. 54-A, do mesmo diploma legal, elucida que:
'Entende-se por
superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de
boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem
comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação'.
A mencionada regulamentação foi realizada por meio do
Decreto Federal nº
11.150/2022, que estipulou como mínimo existencial a renda mensal do consumidor
pessoal natural, estando previsto atualmente, o valor equivalente a R$ 600,00 (caput, art.
3º).
Ademais,
a
aplicabilidade
das
normas
de
prevenção
e
tratamento
do
superendividamento pressupõe a diferenciação entre o superendividamento ativo e o
superendividamento passivo. O primeiro decorre do endividamento voluntário, e pode se
dar de modo consciente (por ação de má-fé, com intenção deliberada de fraude a
credores em razão da prévia ciência quanto à incapacidade de pagamento), hipótese em
que não se aplicam as normas de prevenção e tratamento, ou de modo inconsciente (por
ação negligente/imprudente, em razão da contratação por impulso ou da não fiscalização
de despesas). Já o segundo é oriundo do endividamento involuntário, decorrente de
fatores externos que obrigam o indivíduo a suportar despesas superiores às suas
receitas (desemprego, divórcio, doença, dentre outras).
Registra-se que o processo de repactuação de débitos, regulado no art. 104-A do CDC,
é instaurado pelo juiz a requerimento do consumidor superendividado e visa, em uma
primeira etapa, à conciliação (obtenção de acordo entre o devedor e os credores). Caso
não seja celebrado acordo, passa-se então ao processo por superendividamento,
regulado no art. 104-B do CDC (2ª fase), também instaurado pelo juiz a requerimento do
consumidor superendividado e, nessa segunda etapa, objetiva a (i) revisão ou integração
de contratos; (ii) repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial
compulsório.
Importante anotar que o plano judicial compulsório (CDC, art. 104-B, § 4º) deve
assegurar aos credores, no mínimo, o valor principal do débito, atualizado com o
adimplemento integral em, no máximo 5 (cinco) anos, com a primeira parcela devida no
prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da homologação e as demais
mensais e sucessivas.
Logo, para a repactuação de dívidas e usufruto dos benefícios da lei, a parte autora
superendividada deve preencher os seguintes requisitos: 1) insuficiência de renda; 2) ser
devedor de boa-fé, ou seja, em razão de sua renda ser inferior ao que acumulou em
dívidas; 3) as dívidas devem ser decorrentes de relações de consumo comum, não
podendo incluir aqui consumos luxuosos, de alto valor; 4) em hipótese alguma as dívidas
devem ser decorrentes de má-fé, ou seja, dívidas contraídas com intuito fraudulento; 5) a
petição inicial deve conter um plano detalhado da forma/prazo de pagamento; e 6) a
indicação da renda familiar.
Uma vez firmadas tais premissas, no caso ora em apreço, passa-se ao exame do
preenchimento dos requisitos legais para a repactuação de dívidas.
Da análise dos autos, extrai-se incontroversa a existência de empréstimos adquiridos
pela parte autora junto às instituições financeiras rés.
In casu, verifica-se que parte autora não comprovou sua condição de consumidora
superendividada, deixando de demonstrar a impossibilidade em arcar com o pagamento
dos débitos sem prejuízo do mínimo existencial, bem como ausência de má-fé ou de
fraude na obtenção das dívidas.
Com efeito, não trouxe o(a) requerente cópias das faturas de cartão de crédito e extratos
bancários, com detalhamento de compras realizadas, quando da origem dos débitos,
para comprovação do risco à garantia do mínimo existencial, configurando, outrossim,
contradição, ao menos pela ausência de prova constituída acerca da real e efetiva
condição financeira do(a) requerente.
Ademais, conforme narrado em petição inicial, a requerente, como servidora pública em
atividade, aufere renda bruta de R$ 9.772,62, sendo que após descontos/retenções
legais e empréstimos resta o valor líquido de R$ 875,79.
Portanto, constata-se que remanescem após o pagamento de todos os débitos a
quantia de R$ 875,79, valor que está além da quantia prevista no art. 3º do Decreto
Federal no 11.150/2022 como mínimo existencial, situação incompatível com o rito
das ações de superendividamento (CDC, § 1º, art. 104-A), máxime considerando a
ausência
de
prova,
pelo(a)
demandante,
dos
alegados
gastos
não
consignados/cotidianos.
Destaca-se, ainda, que a parte autora é servidor(a) público(a) em atividade, com fonte de
renda bruta superior a R$ 9.000,00, sendo que, por certo, faz jus ao recebimento dos
beneplácitos de 13º salários e de férias, o que, por si só, consiste em expressivas
quantias complementativas a suas remunerações ordinárias, capazes de afastar
qualquer alegação de ofensa ao seu mínimo existencial. Nesse passo, a renda da parte
autora não pode, sob qualquer métrica, ser caracterizada como comprometedora do
mínimo vital para sua sobrevivência.
Ainda, observa-se a ausência de documentos a demonstrar gastos rotineiros da parte
autora, especialmente se é o(a) único(a) a sustentar sua família (esposo(o) e filhos,
incluindo uma maior de idade - EP 1.13), deixando a demandante de comprovar que é
arrimo/sustento da sua família, sequer comprovando os gastos/repasses/despesas. A
esse respeito, é cediço ser obrigação do pai e da mãe arcar com a manutenção dos
filhos na proporção da capacidade financeira de cada qual (CC, art. 1.703). Ainda,
denota-se da qualificação autoral que esta é casada, sendo que nada foi juntado acerca
da (im)possibilidade de seu companheiro e/ou genitor do(s) seu(s) filho(s), em arcar com
tais custos e em que quantia.
Não se pode perder de vista que também nada trouxe aos autos com relação à renda
familiar. Ocorre que, para a repactuação de dívida pretendida, com a preservação do
mínimo existencial à família seria necessária a apuração de toda a renda familiar e todas
as suas despesas, o que não se extrai dos autos, dada a ausência de documentações
em tal sentido.
Da mesma forma, verifica-se na fatura de cartão de crédito da autora (EP 1.13, 1.14
e 1.15) diversas compras realizadas recentemente e com extenso lapso para
pagamento, sem a efetiva demonstração da sua essencialidade (p. ex. RORAIMA
PISCI PARC 09/12 - R$ 843,00, CACULAO PARC 08/12 - R$ 191,11, dentre outras -
EP 1.16), inclusive em outro Estado da Federação - AIRBNB PAGAM PARC 02/02
SAO PAULO - R$ 293,16 - EP 1.9), mesmo diante de tais fatos serem consignados em
decisão de indeferiu pedido de urgência, fator contraditório para quem afirma ter sua
dignidade financeira atingida.
Acrescenta-se que, a minuta do plano compulsório apresentado pela parte autora (EP
128), em confronto com os demais documentos juntados pelos réus nas contestações
apresentadas, não contempla sequer o pagamento do valor do principal devido, corrigido
monetariamente por índices oficiais de preço, o que reforça a impossibilidade do
acolhimento dos pedidos autorais.
Mais a mais, compulsando os documentos juntados pela parte autora (EP 1.17),
observa-se, logo após o recebimento de seus proventos/remuneração, a realização de
transferências, via pix, e aplicação em conta poupança, inclusive, de valores
consideráveis (R$ 10.000,00 - EP 1.17 - pag. 3), sem, contudo, esclarecer as
destinações/finalidades dos pagamentos, depósitos e recebimentos, bem assim trazer a
Juízo extrato bancário das contas (poupança ou não) a que destinadas as transferências,
não havendo que ser falar em ofensa ao mínimo existencial.
Nesse sentido, observa-se que a parte autora também não trouxe qualquer
elemento para justificar a necessidade/motivo da realização dos empréstimos junto
às instituições financeiras, incluindo um valor superior a R$ 140.000, 00 com
apenas um único requerido (EP 95) fator preponderante a demonstrar sua boa-fé
na contratação das dívidas que pretende repactuar.
Ademais, insta consignar que os documentos apresentados não permitem concluir, com
precisão, o que levou o(a) requerente ao suscitado superendividamento e tampouco do
destino das expressivas quantias levantadas junto ao requerido, restando impossível a
verificação da sua boa-fé para subsunção à lei de superendividamento.
Ainda, a parte autora não comprova qualquer dado externo que tenha lhe acarretado a
alteração patrimonial, tais como redução drástica do salário, perda do emprego,
problemas de saúde ou outro fator que tenha, efetivamente, afetado sua conjuntura
econômica quando da época dos empréstimos/dívidas.
Deveras, cabe ao consumidor evidenciar a sua incapacidade de quitar as obrigações
contraídas, as quais visam atender a uma necessidade pessoal extraordinária decorrente
de infortúnios da vida ou eventos imprevisíveis (endividamento involuntário). Fora dessas
circunstâncias excepcionais, considera-se mero descontrole pessoal das finanças, não
enquadrado nos parâmetros da teoria do superendividamento.
Anota-se que incumbe à parte autora comprovar que tomou os valores para as despesas
básicas de subsistência, pois a repactuação não tem amparo legal quando as dívidas
que ' decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor'
(CDC, § 3º, art. 54-A).
Dito isto, acrescenta-se que pelo contexto da petição inicial, é possível aferir que o
pedido de redução dos descontos dos empréstimos fora baseado no suposto
superendividamento da parte autora e extrapolação do patamar máximo de margem
consignável, qual seja de 30%.
Com efeito, o objetivo da norma protetora ao consumidor (Lei de Superendividamento)
não foi criar uma regra matemática para subsunção aos benefícios previstos na lei, de
modo que a ofensa ao mínimo existencial demanda demonstração inequívoca de ofensa
à dignidade financeira do cidadão, não havendo que se falar em percentual fixo de sua
remuneração.
Deveras, o direito à repactuação das dívidas não possui caráter potestativo,
independente da vontade do credor, autorizando que o consumidor, unilateralmente,
aponte quantia que entende justa e adequada para sua renda, passando a ter direito a
solver somente tal importe. Se assim fosse, a adoção de tal entendimento representaria
uma grande insegurança jurídica, já que o credor estaria condicionado ao assentimento
exclusivo do consumidor, o que comprometeria o recebimento do crédito concedido em
medida verdadeiramente significativa, acabando por desaguar em aumento do custo do
crédito, ou seja, em elevação sistêmica dos juros, bem como em limitação das linhas de
crédito, prejudicando os consumidores de maneira global.
Por esta razão, o legislador estabeleceu rito, critérios e condições para se obter a
repactuação pretendida, disposições que precisam ser respeitadas, sob pena de
subversão do propósito normativo e geração de relevantes efeitos colaterais para o
próprio consumidor. Assim, não se pode, com lastro em tal previsão normativa, restringir
os débitos com lastro apenas na indicação de percentual que o consumidor julga
adequado, pois este deve ser fixado consoante os parâmetros previstos nos art. 104-A e
B do CDC.
Em outras palavras, não se olvide que o cenário é de ENDIVIDAMENTO, jamais de
SUPERENDIVIDAMENTO, nos termos da legislação de regência. E para essa situação
de endividamento, a qual não está acobertada pelas regras excepcionais dos arts. 54-A
e 104-A e seguintes do CDC, deverá a parte buscar as medidas legais para
adequação/renegociação contratual, afastando-se na situação em comento a imposição
de plano compulsório de pagamento ao réu.
Seja como for, ainda que admitidos os números do(a) requerente, e pese a alegada
afetação dos vencimentos às dívidas bancárias, fato é que o remanescente disponível
não implica em risco/ofensa/violação ao 'mínimo existencial', garantindo-se montante
capaz de atender as necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene
e transporte e etc, implicando apenas em redução de sua capacidade financeira, mas
não em vulnerabilidade econômica/financeira, elemento fundamental para a configuração
do superendividamento e embasamento para a concessão do manto protetivo do regime
de excepcionalização do pacta sunt servanda, sob pena de ofensa à segurança jurídica.
Com a devida venia, a intenção do legislador na criação de institutos que beneficiam aos
consumidores, como o enquadramento no conceito de superendividamento (Lei n.
14.181/21), não busca garantir à pessoa superendividada o alto padrão de vida que
detinha antes do endividamento, mas garantir o mínimo existencial para a sua
sobrevivência, o que, no caso em comento, está garantido pelo valor residual pós
descontos dos vencimentos do(a)requerente.
Ademais, não se tem notícia de que o(a) demandante é pessoa idosa, pródiga ou de
precária educação, sendo vedada à aplicação da repactuação de dívidas, aquelas
oriundas de contratos dolosamente celebrados sem o propósito de realizar pagamento,
nos termos do §1º do artigo 104-A do CDC.
A esse respeito, registra-se que a parte autora confirma que celebrou os contratos com o
banco réu, com taxas de juros pactuadas e previamente conhecidas, não alegando em
nenhum momento qualquer vício de consentimento.
Nessa direção, o entendimento jurisprudencial, verbis: (…)
Sendo assim, verifica-se que o(a) requerente deixou de provar o fato constitutivo de seu
direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram juntados aos autos documentos que
deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de pessoa superendividada nos termos
da lei, não havendo que se falar na realização de repactuação de dívidas da forma
pretendida.
Portanto, o(a) autor(a) não trouxe aos autos elementos aptos e suficientes que
comprovem o preenchimento dos requisitos acima elencados, sobretudo o
comprometimento do mínimo existencial, o que implica em óbice ao prosseguimento da
demanda e homologação de eventual plano de repactuação judicial compulsório em
detrimento dos credores.
Com efeito, resta manifesta a ausência no preenchimento dos requisitos legais, em
especial a alegada ofensa ao 'mínimo existencial' e, por conseguinte, a incomprovada
situação de superendividamento, forçoso concluir a inexistência do pressuposto de
procedibilidade para o procedimento especial previsto no art. 54-A, 104-A e seguintes do
CDC, ensejando, pois, a extinção irresolutiva da fase de conhecimento.
ANTE O EXPOSTO e, analisando tudo mais que dos autos consta, com fulcro na
fundamentação supra, julgo EXTINTA a fase de conhecimento, sem resolução do mérito,
reconhecendo a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido
e regular do processo, na forma do art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil.
Em razão da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento de custas processuais
e honorários advocatícios, que ora arbitro no patamar de 10% (dez por cento) sobre o
valor atualizado da causa, nos termos do § 2º do art. 85 do Código de Processo Civil,
contudo, suspensa a exigibilidade, haja vista se tratar de parte beneficiária da gratuidade
processual, mantendo-se a benesse outrora deferida, haja vista a ausência de elementos
em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Retifique-se o valor da causa para R$ 284.711,67.
Certifique a Serventia a existência de agravo de instrumento pendente de julgamento e,
em caso positivo, comunique-se à instância recursal acerca da presente sentença.
Sem prejuízo, considerando a possibilidade de ajuizamento de demandas repetitivas ou
em massa e em atenção a Nota Técnica CIJERR 04/2024, encaminhe-se cópia da
presente sentença ao Centro de Inteligência da Justiça Estadual de Roraima (CIJERR)
para conhecimento e providências que entender cabíveis (via SEI).
Na hipótese de interposição de recurso de apelação, por não haver mais juízo de
admissibilidade a ser exercido pelo Juízo a quo (CPC, art. 1.010), sem nova conclusão,
intime-se a parte contrária para oferecer resposta no prazo de 15 (quinze) dias.
(…) (grifos originais)
Irresignada, nas razões recursais a apelante aduz (EP 198.1), em síntese, […] que
recebe mensalmente a quantia de R$ 431.415,81 (quatrocentos e trinta e um mil, quatrocentos
e quinze reais e oitenta e um centavos); que após os descontos obrigatórios como PRESSEM e
Imposto de Renda no valor de 1.622,39 (mil seiscentos e vinte e dois reais e trinta e nove
centavos). Resta para a parte somente a quantia de R$ 8.150,23 (oito mil cento e cinquenta
reais e vinte e três centavos); que a situação de superendividamento de uma pessoa não se
pode usar fórmulas prontas e moldadas para outras situações; que ficou claro que a parte
Apelante não tem condições financeiras de arcar com todas as suas dívidas e manter um
padrão de vida digno; que a parte Apelante possui encargos nanceiros mensais oriundos de
contratos celebrados junto aos Apelados, que, quando somados, correspondem ao valor de
R$7.274,44 (sete mil, duzentos e setenta e quatro reais e quarenta e quatro centavos),
equivalente a MAIS DE 89% DE SUA RENDA LÍQUIDA; que o valor que resta para parte
Apelante é ínfimo, pois não é suficiente para custear suas despesas básicas, como moradia,
saúde, alimentação, despesas médicas, educação e etc.; que tais dívidas têm comprometido
substancialmente o mínimo existencial da parte Apelante. […]
Calcada nesses argumentos, requer o provimento do recurso para:
a) Seja reconhecida a inconstitucionalidade dos Decretos ns. 11.150/2022 e
11.567/2023, tendo em vista que afronta com a dignidade da pessoa humana;
b) Que a Sentença seja reformada para acolher os pedidos formulados na petição inicial
e torne o plano de pagamento ora apresentado em plano judicial compulsório com o seu
início no mês subsequente à data da sentença;
c) condenar a parte Requerida ao pagamento de custas processuais, despesas e
honorários advocatícios.
Certidão atestando a tempestividade do recurso e a ausência do recolhimento do
preparo (EP 7.1), pois a parte apelante é beneficiária da gratuidade da justiça.
Certidão atestando a tempestividade das contrarrazões contidas nos EPs 212.1, 219.1
e 220.1 (EP 6.1).
O relatado é suficiente.
Inclua-se na pauta de julgamento eletrônico, nos termos do art. 109 do RITJRR.
Intimem-se
Boa Vista - RR, 12 de maio de 2025.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
VOTO
Conforme relatado, trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida
pelo Juízo do 4º Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa
Vista, que julgou improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de
Repactuação de Dívidas C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte
teor (EP 183.1).
Em suma, a apelante requer o provimento do recurso de apelação para que a sentença
de primeiro grau seja reformada.
Os apelados, nas contrarrazões, defendem a manutenção integral da sentença.
Pois bem.
Antes do mais, convém relembrar que não compete ao segundo grau, em regra, julgar
a causa novamente, justamente por se tratar de instância revisora, mas reanalisar a sentença
nos termos da irresignação do apelo.
Dito isso, e após análise detida dos elementos contidos nos autos, constata-se que o
apelo não comporta acolhimento.
Isto porque, em suas razões recursais, a apelante não se insurge contra os
fundamentos da sentença. Ao contrário, a rigor repete ipsis litteris as teses apresentadas na
petição inicial (EP 1.1), que não se presta a atacar a fundamentação que levou o juízo “a quo” a
rejeitar a pretensão inicial.
Dito de outra forma, a parte apelante deixou de apresentar qualquer fundamento capaz
de infirmar a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo, pois ausente a formulação
crítica necessária para se opor aos fundamentos lançados na sentença.
Logo, contra os fundamentos adotados na decisão não existem, nos autos, motivos
pelos quais se possa considerar que o direito não tenha sido bem aplicado.
Ademais, o artigo 1.010, incisos II a IV, do Código de Processo Civil exige que na peça
de apelação constem a exposição do fato e do direito, as razões do pedido de reforma ou de
decretação de nulidade e o pedido de nova decisão.
Da mesma maneira, o pedido não pode ser genérico, mas deve especificar as matérias
decididas que o recorrente reputa devam ser alteradas, de forma que o juízo ad quem possa
julgar o cabimento e provimento do recurso adequadamente.
No caso em exame, contudo, não há nas razões recursais qualquer menção ao que foi
decidido na sentença proferida em primeiro grau de jurisdição, limitando-se a parte apelante a
reproduzir integralmente os argumentos utilizados com o objetivo de contestar a ratio decidendi
utilizada pelo julgador primevo, o que, por óbvio, seria o suficiente para o não conhecimento do
recurso, por violação ao princípio da dialeticidade recursal.
Para corroborar essa afirmação, confira-se a jurisprudência remansosa desta Corte de
Justiça sobre o tema:
PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL.
PRINCÍPIO
DA
DIALETICIDADE.
NÃO
CONHECIMENTO
DO
RECURSO.
HONORÁRIOS MAJORADOS.1. Apelação interposta contra sentença que julgou
improcedentes embargos à execução fiscal promovida pela Fazenda Pública do Estado
de Roraima, fundamentada em multa aplicada pela Agência de Defesa Agropecuária de
Roraima (ADERR) por armazenamento irregular de agrotóxicos sem autorização legal,
no valor de R$ 45.543,20. A sentença afastou a alegação de ilegitimidade passiva ao
entender que a responsabilidade pela infração decorre da guarda indevida dos produtos,
independentemente da sua titularidade.2. A recorrente alega ilegitimidade passiva, sob o
argumento de que os produtos pertenciam a terceiro e foram armazenados por engano
em área anexa à empresa, sem responsabilidade direta da apelante.3. Princípio da
dialeticidade: O recurso deve atacar especificamente os fundamentos da decisão
recorrida. A repetição de argumentos afastados na sentença, sem enfrentamento dos
principais fundamentos, compromete a admissibilidade do apelo, nos termos do art. 932,
III, do CPC.4. No caso, a apelação limita-se a repetir a tese de ilegitimidade passiva sem
enfrentar a essência da decisão: a irrelevância da titularidade dos produtos para a
configuração da infração administrativa, fundada no armazenamento sem autorização.5.
Não se verifica cerceamento de defesa. O indeferimento da oitiva de testemunhas não
prejudicou o julgamento, uma vez que as provas colhidas na fase administrativa e judicial
foram consideradas suficientes. A apelante não demonstrou de forma concreta como a
ausência da prova comprometeria seu direito de defesa.6. Gratuidade de justiça: o
benefício foi concedido na fase inicial e permanece válido no grau recursal, nos termos
do art. 98, § 1º, VIII, do CPC, tornando prejudicado novo pedido formulado pela
apelante.7. Honorários advocatícios recursais majorados de 10% para 15%, conforme
art. 85, § 11, do CPC, observada a gratuidade de justiça já deferida.8. Recurso não
conhecido. Honorários majorados. (TJRR – AC 0810795-83.2023.8.23.0010, Rel. Des.
ERICK LINHARES, Câmara Cível, julg.: 31/10/2024, public.: 31/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C COBRANÇA –
PROGRESSÃO FUNCIONAL – SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. 1ª APELAÇÃO:LEI
N.º 1.611/2015 – APLICAÇÃO – RECONHECIMENTO ADMINISTRATIVO DO DIREITO
POSTULADO – PERDA DO INTERESSE PROCESSUAL – INEXISTÊNCIA DE
DEMONSTRAÇÃO DE ERRO NO REENQUADRAMENTO REALIZADO PELO
MUNICÍPIO DE BOA VISTA – VERBAS RETROATIVAS DEVIDAS - DIFERENÇAS
SALARIAIS NÃO ATINGIDAS PELA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – RECURSO
DESPROVIDO
–
SENTENÇA
MANTIDA.
2ª
APELAÇÃO:
AUSÊNCIA
DE
DIALETICIDADE RECURSAL – RECURSO NÃO CONHECIDO. (TJRR – AC
0802853-97.2023.8.23.0010, Rel. Des. TÂNIA VASCONCELOS, Câmara Cível, julg.:
19/12/2024, public.: 19/12/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. INSCRIÇÃO DO NOME DO SÓCIO NA CDA.
AUSÊNCIA DE SUA PARTICIPAÇÃO NO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO COMO
PARTE. RAZÕES DO APELO QUE REPETEM, EM PARTE, AS MESMAS JÁ
LANÇADAS NA CONTESTAÇÃO. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. INDICAÇÃO DE
PRECEDENTES DO STJ QUE NÃO SE AMOLDAM À HIPÓTESE DOS AUTOS.
RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, DESPROVIDO.
1. A simples repetição, nas razões do apelo, dos argumentos lançados na fase de
conhecimento, impõe o não conhecimento desses argumentos por não observância do
princípio da dialeticidade. 2. Mostra-se escorreita a sentença que reconhece a
ilegitimidade passiva do sócio que não integrou o procedimento administrativo fiscal na
qualidade de parte, conforme precedentes do STJ e do egrégio TJRR acerca do tema.
(TJ-RR - AC: 0831030-13.2019.8.23.0010, Relator: ELAINE BIANCHI, Data de
Julgamento: 25/04/2021, Câmara Cível, Data de Publicação: 26/04/2021)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO - OFENSA AO PRINCÍPIO DA
DIALETICIDADE - NÃO CONHECIMENTO DO INCONFORMISMO. 1. O princípio da
dialeticidade recursal exige a impugnação integral e específica de cada um dos
fundamentos da decisão recorrida, sob pena de não conhecimento do recurso. 2.
Olvidando a embargante de tal ônus, impõe-se o não conhecimento dos declaratórios.
(TJ-RR - EDecAC: 72119027220168230010 7211902-72.2016.8.23.0010, Relator: Des.
Cristóvão Suter, Data de Publicação: DJe 09/10/2019, p.)
No entanto, embora o presente recurso, a rigor não pudesse sequer ser conhecido
porque não atacou os fundamentos da sentença; a fim de evitar argumentos de violação à
ampla defesa e acesso ao duplo grau de jurisdição, conheço do recurso e passo à análise do
mérito da controvérsia.
In casu, o juizo a quo julgou improcedente a demanda por ausência de documentação
apta a comprovar a condição de superendividada, já que a parte autora, ora apelante, “deixou
de provar o fato constitutivo de seu direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram
juntados aos autos documentos que deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de
pessoa superendividada nos termos da lei, não havendo que se falar na realização de
repactuação de dívidas da forma pretendida”.
Ou seja, a parte apelante não forneceu os documentos necessários para que o
magistrado senteciante pudesse aferir, com convicção, a sua alegada condição de
superendividada.
Dito de outra forma, não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o
comprometimento do mínimo existencial, razão pela qual deve ser preservada a autonomia das
vontades, visto que os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e
consciente pelas partes.
Assim, infere-se que a ratio decidendi utilizada pelo magistrado sentenciante para julgar
improcedente a pretensão autoral merece ser mantida por seus próprios fundamentos, a qual
adoto como razão de decidir para conhecer do recurso, mas negar-lhe provimento.
Em reforço à conclusão adotada pelo juízo a quo, confira-se a jurisprudência pátria
sobre o tema:
APELAÇÃO
CÍVEL.
Ação
revisional.
Repactuação
de
dívidas.
Lei
do
Superendividamento. Ausência de comprovação documental ou dos requisitos para a
pretendida limitação nos pagamentos devidos. Higidez contratual reconhecida. Sentença
de improcedência mantida. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJ-SP - Apelação Cível:
0000507-73.2023.8.26.0577 São José dos Campos, Relator: Emílio Migliano Neto, Data
de Julgamento: 21/02/2024, 23ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação:
21/02/2024)
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÉBITO - LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO DE
SUPERENDIVIDADO DO CONSUMIDOR - IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. Nos termos
da Lei nº 14.181/2021, que visa dispor sobre formas de prevenção e solução da situação
de superendividamento dos consumidores, entende-se nessa situação, fazendo jus,
portanto, à repactuação de débitos, a pessoa natural, de boa-fé, que evidencia a total
impossibilidade de adimplir a suas dívidas de consumo sem comprometer seu mínimo
existencial. Ausente as provas de tais circunstâncias, deve ser mantida a improcedência
da pretensão inicial. (TJ-MG - Apelação Cível: 5001170-35.2023.8.13.0241
1.0000.24.174736-9/001, Relator: Des.(a) Arnaldo Maciel, Data de Julgamento:
07/05/2024, 7ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 15/05/2024)
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CIVIL E PROCESSUAL
CIVIL. PROCESSO SOB O RITO ESPECIAL DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
SUPERENDIVIDAMENTO.
AFETAÇÃO
DO
MÍNIMO
EXISTENCIAL
APÓS
DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E EM CONTA CORRENTE. NÃO
DEMONSTRADO. INSTAURAÇÃO DO PROCEDIMENTO DA LEI Nº 14.181/2021.
REQUISITOS
NÃO
PREENCHIDOS.
RECURSO
DESPROVIDO.
SENTENÇA
MANTIDA. 1. A solicitação de repactuação de dívidas pretendida pelo apelante é medida
estabelecida no art. 104-A, § 4º, do CDC, introduzido pela Lei nº 14.181/21, aplicada em
favor do consumidor superendividado. Segundo o art. 54-A, § 1º, do CDC, ocorre o
superendividamento quando o consumidor pessoa física, de boa-fé, não consegue pagar
a totalidade de suas dívidas de consumo (exigíveis e vincendas) sem comprometer o seu
mínimo existencial. 2. O superendividamento está diretamente relacionado com o mínimo
existencial do indivíduo, ou seja, o superendividamento pressupõe o comprometimento
da sobrevivência da pessoa e ameaça o indivíduo e sua família (mínimo existencial), no
caso, verifica-se que o apelante é policial militar do Distrito Federal e está submetido ao
regime jurídico dos servidores públicos distritais, porém, na hipótese, imperioso destacar
a existência de óbice quanto ao pedido de repactuação de dívida, tendo em vista a
necessidade de observância mínimo existencial, elemento previsto como requisitos da
Lei nº 14.181/21. 3. No caso concreto, constata-se, com base nos elementos probatórios,
que o apelante percebe uma renda líquida, após todos os descontos, inclusive, os
realizados em conta corrente, uma renda líquida muito acima do estabelecido pelo
Decreto nº 11.150/22, com redação dada pelo Decreto nº 11.567/2023. Dessa forma o
apelante não conseguiu demonstrar os requisitos para que seja caracterizado o
superendividamento. 4. Por sua vez, a intervenção judicial somente se justifica na
hipótese de situação excepcional se constatado a existência de superendividamento, sob
pena de indevida intervenção judicial na autonomia da vontade. Na hipótese, entretanto,
não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o comprometimento do
mínimo existencial. Nesse contexto, deve ser preservada a autonomia das vontades, pois
os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e consciente pelas
partes. Portanto, não comprovado o comprometimento ao mínimo existencial, não há
como instaurar o procedimento de repactuação de dívidas. 5. Recurso desprovido.
Sentença mantida. (TJ-DF 07238141920238070003 1924958, Relator: ALFEU
MACHADO, Data de Julgamento: 18/09/2024, 6ª Turma Cível, Data de Publicação:
02/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. SUPERENDIVIDAMENTO.
REPACTUAÇÃO DE DÍVIDA. EXCEPCIONALIDADE. MÍNIMO EXISTENCIAL. PODER
REGULAMENTAR. DECRETO 11.150/2022. AUSTERIDADE. PODER JUDICIÁRIO.
INTERVENÇÃO NÃO JUSTIFICADA. IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO. SENTENÇA
MANTIDA. 1. As normas protetivas que regulam o tratamento do superendividamento
garantem a repactuação das dívidas, mediante a preservação do mínimo existencial, nos
termos da regulamentação. Art. 104-A do Código de Defesa do Consumidor. 2. Ainda
carente de debates, o Decreto Presidencial nº 11.150, de 26 de julho de 2022, com
vacatio legis de sessenta dias da após a publicação, traz a delimitação acerca do tema.
3. Nos termos do art. 3º do Decreto 11.150/2022, ?considera-se mínimo existencial a
renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do
salário mínimo vigente na data de publicação deste Decreto?. 4. Embora se possa
questionar a extrema austeridade imposta pela regulamentação do que pode ser
considerado o mínimo existencial, a intervenção do poder judiciário nos contratos regidos
pelo Código de Defesa do Consumidor deve se pautar pela teoria da base objetiva dos
contratos. 5.Na hipótese em que não se constata alteração das circunstâncias
intrínsecas à formulação do vínculo contratual, assim como não se identifica condutas de
incontestável abuso por parte da instituição financeira credora, a intervenção judicial nos
contratos não se justifica. 6. Recurso conhecido e não provido. (TJ-DF
07058375420228070001 1674193, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, Data de
Julgamento: 08/03/2023, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 20/03/2023)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATOS BANCÁRIOS.
REPACTUAÇÃO
DE
DÍVIDAS.
LIMITAÇÃO
DOS
DESCONTOS
EM
CONTA-CORRENTE DO DEVEDOR. PRELIMINARES DE INÉPCIA DA INICIAL E
FALTA DE INTERESSE DE AGIR REJEITADA. CONTRATAÇÃO ESCLARECIDA PELO
CONSUMIDOR. REPACTUAÇÃO. IMPOSSIBILIDAE. VEDAÇÃO DO § 1º DO ART.
104-A DO CDC. PLANO DE PAGAMENTO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
APELAÇÃO CONHECIDA. PRELIMINARES REJEITADAS E NÃO PROVIDA. 1.
Insurge-se o autor, ora apelante, contra sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível de
Samambaia que, na ação de repactuação de dívidas com 4 instituições bancárias,
homologou o acordo de pagamento de dívidas feito entre o autor e o Banco INTER S/A,
revogou a tutela anteriormente concedida de limitação de descontos em conta-corrente a
30% (trinta por cento) dos ganhos mensais líquidos e julgou improcedente o pedido da
inicial, bem como o condenou ao pagamento das custas processuais e dos honorários
advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade restou suspensa
diante da gratuidade de justiça concedida. Pretende o prosseguimento de ação de
repactuação de dívidas de mútuo com a apresentação de plano de pagamento com
prazo superior ao estabelecido legalmente e limitação dos descontos em sua
conta-corrente ao patamar de 30% de sua remuneração mensal líquida
independentemente da modalidade do empréstimo. 2. O juízo sentenciante
compreendeu pela incompatibilidade do plano de pagamento apresentado pelo devedor
com a observância de requisito essencial da Lei do Superendividamento (Lei n.
14.181/2021), a saber, o prazo máximo de pagamento em até 5 anos. Portanto,
descabida a aplicação do art. 104-B da lei citada, para instauração da segunda fase do
procedimento de superendividamento, pois o próprio consumidor já informou a
impossibilidade de adequação da proposta aos termos da legislação. Além disso, foram
verificados fortes indícios da contratação dolosa dos débitos pelo apelante devedor. 3.
Não induz à inépcia da inicial do pedido de repactuação dos contratos a ausência de
efetivo plano de pagamento por não representar vício insanável (art. 337, IV do CPC). 4.
Quanto à questão preliminar de falta de interesse de agir arguida pelo apelado BANCO
BMG SA, ?o interesse de agir, consubstanciado no binômio necessidade-utilidade, busca
alcançar a realização da pretensão deduzida em Juízo, a qual não poderia ser obtida
através de outra forma. Verificando-se que a preliminar suscitada se confunde com o
mérito da questão, há de ser rejeitada de plano? (TJDFT. Acórdão 1617020,
07219987620218070001, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, 5ª Turma Cível, data de
julgamento: 21/9/2022, publicado no DJE: 29/9/2022. Pág.: Sem Página Cadastrada .).
Preliminar rejeitada. 5. É ônus do consumidor provar que se encontra privado do seu
mínimo existencial nos termos do art. 54-A do CDC. No caso em análise, não há provas
hábeis de que, após os descontos realizados e a sobra de R$ 4.000,00 (quatro mil reais),
a quantia remanescente é apta a comprometer-lhe o próprio sustento e o de sua família.
Com efeito, a quantia representa aproximadamente três salários-mínimos, o que é
superior à remuneração mensal média do trabalhador brasileiro. Segundo estatísticas do
IBGE, no trimestre de setembro a novembro de 2022 o salário médio mensal é de
aproximadamente R$ 2.787 (dois mil setecentos e oitenta e sete reais). Há, ainda, de se
salientar quanto a existência de fortes indícios de contratação dolosa dos débitos pelo
apelante consumidor, o que, por si só, tem o condão de excluir os empréstimos aqui
impugnados do processo de repactuação de dívidas conforme o § 1º do art. 104-A do
CDC. 6. Verificado que o plano de pagamento não fora formulado em consonância aos
parâmetros mínimos impostos pela legislação, em especial a previsão do limite temporal
de 05 (cinco) anos para pagamento, a fim de evitar a eternização das obrigações, a
manutenção da improcedência do pedido é medida que se impõe. 7. Apelação
conhecida, preliminares rejeitadas e não provida. Sentença mantida. (TJ-DF
07134365420218070009 1690491, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, Data de
Julgamento: 18/04/2023, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: 28/04/2023)
Portanto, adoto e ratifico a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo para
solucionar a controvérsia; e assim procedo ancorada no entendimento remansoso do Tribunal
da Cidadania que reconhece […] a viabilidade de o órgão julgador adotar ou ratificar o juízo de
valor firmado na sentença, inclusive transcrevendo-a no acórdão, sem que tal medida encerre
omissão ou ausência de fundamentação no decisum (REsp nº 662.272-RS, 2ª Turma, Rel.Min.
João Otávio de Noronha, j. de 4.9.2007; REsp nº 641.963-ES, 2ª Turma, Rel. Min. Castro
Meira, j. de 21.11.2005; REsp nº 592.092-AL, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, j. 17.12.2004
e REsp nº 265.534- DF, 4ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j de 1.12.2003).
Diante do exposto, nego provimento ao recurso.
Em atendimento ao que preconiza o art. 85, § 11, do CPC, majoro em 5% (cinco por
cento) os honorários advocatícios fixados na sentença.
É como voto.
A fim de evitar a oposição de embargos de declaração meramente protelatórios,
considera-se, desde já, prequestionada toda matéria infraconstitucional e constitucional,
observando o entendimento do STJ no sentido de que, para o prequestionamento, é
desnecessária a explícita indicação dos dispositivos de lei que o fundamentaram.
No ensejo, advirto às partes que a interposição de eventual recurso meramente
protelatório ou com escopo de rediscutir esta controvérsia ensejará na aplicação de multa, nos
termos dos arts. 79, 80, 81 e 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil.
Intimem-se.
Com o trânsito em julgado, arquivem-se (art. 1.006 do CPC).
Boa Vista - RR, data constante do sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO.
AUSÊNCIA
DE
IMPUGNAÇÃO
AOS
FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. NÃO COMPROVAÇÃO DA
CONDIÇÃO
DE
SUPERENDIVIDAMENTO.
IMPROCEDÊNCIA
MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. O recurso de apelação deve, nos termos do art. 1.010, incisos II a IV,
do CPC, conter impugnação específica aos fundamentos da sentença, o
que configura o princípio da dialeticidade. A mera repetição das teses
iniciais, sem enfrentamento dos fundamentos do decisum, compromete
sua admissibilidade.
2. Embora a apelação apresentada limite-se a reiterar os argumentos da
petição inicial, sem atacar especificamente a ratio decidendi da sentença,
o recurso foi conhecido a fim de garantir o duplo grau de jurisdição e evitar
prejuízos à parte.
3. A Lei nº 14.181/2021, que alterou o Código de Defesa do Consumidor,
condiciona a instauração do procedimento de repactuação de dívidas à
comprovação de que o consumidor está impossibilitado de pagar a
totalidade de suas dívidas sem comprometer o mínimo existencial (art.
54-A, § 1º, CDC).
4. No caso concreto, a autora não comprovou sua condição de
superendividada nem apresentou documentos suficientes à análise do
comprometimento de sua subsistência, ônus que lhe incumbia nos termos
do art. 373, I, do CPC.
5. Em respeito à autonomia privada, não demonstrada a situação
excepcional de superendividamento, deve-se preservar os pactos
livremente firmados entre as partes.
6. A jurisprudência desta Corte e de outros Tribunais reconhece que a
ausência de comprovação do superendividamento inviabiliza a aplicação
do procedimento previsto na Lei nº 14.181/2021.
7. Recurso conhecido e não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da 2ª Turma Cível do
Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em negar
provimento ao presente recurso, nos termos do voto da Relatora. Participaram do julgamento
os eminentes Desembargadores: Mozarildo Cavalcanti (Presidente e Julgador), Elaine Bianchi
(Relatora) e Cristóvão Suter (Julgador). Sessão Virtual do Egrégio Tribunal de Justiça do
Estado de Roraima, data constante no sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi - Relatora
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Processo nº 0804296-49.2024.8.23.0010
ID: 276116833
Data de Disponibilização:
22/05/2025
Polo Ativo:
Polo Passivo:
Advogados:
CARLOS AUGUSTO TORTORO JUNIOR
OAB/SP XXXXXX
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
A…
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
RELATÓRIO
Trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida pelo Juízo do 4º
Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa Vista, que julgou
improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de Repactuação de Dívidas
C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte teor (EP 183.1):
Proc. n.° 0804296-49.2024.8.23.0010
SENTENÇA
GRACIANE PASSOS DE SOUZA ajuizou ação de repactuação de dívida por
superendividamento c.c pedido de tutela de urgência em face do BANCO DO BRASIL
S.A, BANCO SANTANDER S.A., CREFISA, FUPRES ADMINISTRADORA DE
CARTOES LTDA, BANCO DAYCOVAL S.A., AVANCARD PROMOÇÃO DE VENDAS
LTDA e BEMOL S/A, alegando, em síntese, que não consegue arcar com as despesas
referente aos contratos de empréstimos consignados realizados e que os descontos em
sua remuneração afetam sua sobrevivência, tendo o seu mínimo existencial
comprometido. Deu à causa o valor de R$ 431.415,81. Juntou documentos (EP's 1.2 a
1.19).
O pedido liminar restou indeferido, sendo concedida a gratuidade processual à parte
autora (EP 6).
Citados (EP's 39, 40, 41), os réus apresentaram contestação.
O BANCO MASTER S/A e PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA. (AVANCARD)
suscitou, em preliminar, a sua ilegitimidade passiva e impugnou a concessão da
gratuidade processual autoral. No mérito, arguiu a ausência de ato ilícito; a ausência dos
requisitos para aplicação da lei que trata do superendividamento; má-fé da autora na
contratação dos empréstimos, requerendo, ao final, o julgamento improcedente dos
pedidos formulados. Anexou documentos (EP 46).
A BEMOL S.A. suscitou, em sede preliminar, a inépcia da inicial. Quanto ao mérito,
sustentou que a parte autora não trouxe provas do direito pleiteado, requerendo o
julgamento de improcedência (EP 49).
A CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS S.A suscitou, em
preliminar, a inépcia da inicial; a falta de interesse de agir; além de impugnar a
gratuidade processual. No mérito, arguiu a legalidade dos contratos firmados, não
havendo que se falar em abusividade das termos pactuados, bem como um possível
aumento da taxa média e a, consequente, redução da oferta em caso de procedência,
diante da eventual insegurança jurídica, requerendo, ao final, o julgamento improcedente
dos pedidos formulados na exordial. Anexou documentos (EP 58).
O BANCO SANTANDER S/A consignou, preliminarmente, a inépcia da inicial, além de
impugnar a gratuidade processual e o valor atribuído à causa. No mérito, sustentou que
a parte autora não trouxe provas da ofensa ao seu mínimo existencial, ausentes,
portanto, as exigências previstas na lei de superendividamento, sendo válidos e
regulares os contratos firmados, invocando o princípio do pacta sunt servanda,
pugnando, ao final, pelo julgamento improcedente da demanda. Anexou documentos (EP
90).
A FUPRES ADMINISTRADORA DE CARTÕES LTDA suscitou, preliminarmente, a
impossibilidade de integração dos contratos; inépcia da inicial, impugnando a concessão
da gratuidade processual. No mérito, sustentou que os valores foram assumidos
voluntariamente pelo autor; a legalidade dos contratos firmados e a ausência das
exigências previstas na lei de superendividamento, pugnando, ao fim, pela
improcedência dos pedidos. Na oportunidade, acostou documentos (EP 93).
O BANCO DAYCOVAL S.A afirmou, em preliminar, a ausência do interesse de agir e a
inépcia da inicial, impugnando o valor da causa; a gratuidade processual e a capacidade
postulatória. No mérito, sustentou que a parte autora não comprovou o
superendividamento; que inexiste ofensa ao mínimo existencial; a legalidade do contrato;
a preservação do princípio do pacta sunt servanda; e a sua boa-fé na celebração dos
empréstimos, requerendo que os pedidos sejam julgados improcedentes. Apresentou
documentos (EP 94).
O BANCO DO BRASIL S.A. sustentou, preliminarmente, a inépcia da inicial, impugnando
a concessão da gratuidade processual, além do valor atribuído à causa. No mérito,
sustentou a improcedência da ação em face da ausência dos requisitos para a aplicação
da lei de superendividamento e a legalidade dos contratos, invocando o princípio do
pacta sunt servanda. Juntou documentos (EP 95).
Designada e realizada audiência de conciliação, a mesma restou frutífera somente em
relação à corré CREFISA S/A CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS, sendo
homologada a transação e, na mesma ocasião, reconhecida a ilegitimidade passiva do
réu PROVER PROMOÇÃO DE VENDAS LTDA (AVANCARD) (EP 121).
A parte autora demonstrou seu interesse na instauração do processo por
superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas
com a apresentação de minuta do plano judicial compulsório (EP 128).
Instadas acerca da produção de outras provas (EP 134), restou indeferido o pedido de
prova documental, anunciando-se o julgamento antecipado da lide (EP 159) sem
oposição pelos litigantes (EP's 175 a 181).
É o relatório.
Fundamento e DECIDO.
Desnecessária maior dilação probatória, a teor do disposto no inciso I do art. 355 do
Código de Processo Civil, sendo certo que, na análise do julgamento antecipado da lide,
vigora a prudente discrição do magistrado no exame da necessidade ou não da
realização de outras provas, ante as circunstâncias de cada caso concreto e a
necessidade de não ofender o princípio do pleno contraditório. No caso em tela, a lide
comporta pronto julgamento, dada pois a questão é eminentemente de direito e os
documentos coligidos aos autos são amplamente suficientes ao deslinde da questão
controvertida.
De proêmio, RECHAÇAM-SE as teses preliminares arguidas pelos requeridos.
Deveras, não prospera a preliminar de inépcia da inicial, uma vez que, da narrativa
contida na exordial, extrai-se que os pedidos formulados são certos e determinados, bem
como que há compatibilidade entre eles, sendo perfeitamente identificável a causa de
pedir e a lógica da narrativa fática. Ademais, registra-se que os requisitos legais para
subsunção da lei de superendividamento (Lei 14.181/21), serão apreciados na análise do
mérito.
Quanto à alegação de falta de interesse de agir, a tese não se sustenta, haja vista o
princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição, conforme preceitua o art. 5°,
inciso XXXV, da Constituição Federal, considerando, ainda, que a parte autora
demonstra a necessidade de buscar a tutela jurisdicional para proteger, resguardar ou
conservar o seu direito (necessidade-adequação), seja no julgamento de mérito
procedente ou não, máxime para eventual repactuação de suas dívidas, haja vista a
impossibilidade de pactuação/transação administrativa.
No que tange a gratuidade processual, mantenho a benesse outrora deferida, haja vista
a ausência de elementos em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Lado outro, quanto à impugnação ao valor da causa, o pedido comporta parcial
acolhimento. Explico.
In casu, a soma dos débitos contratuais com as partes requeridas é R$ 431.415,81,
sendo que a presente repactuação e eventual renegociação das dívidas, nos moldes
apresentados na inicial, o seu proveito econômico corresponderia apenas a
diminuição/abatimento dos valores citados. Destarte, com a minuta do plano de
repactuação, em caso de homologação por este Juízo, a soma total das dívidas da parte
autora não mais seria de seria de R$ 431.415,81, mas sim de R$ 146.704,14, conforme
primeiro plano de repactuação apresentado. Ou seja, o real proveito econômico seria de
R$ 284.711,67, valor este que deve ser atribuído à causa. Nesse sentido, colaciono o
seguinte julgado, verbis: (…)
Em sendo assim, fixo o valor da causa em R$ 284.711,67, proveito econômico
efetivamente buscado pela parte autora com a presente ação. Retifique-se. Anote-se.
No que tange à (im)possibilidade de repactuação/integração dos contratos/dívidas do
consumidor, a matéria confunde-se com o
meritum causae
e com ele será
analisado/decidido.
Por fim, a capacidade postulatória da parte restou comprovada, haja vista estar
representada por advogado habilitado e com instrumento de mandato subscrito
digitalmente, na forma da lei.
Ultrapassadas tais questões, adentrando ao mérito, tenho que os pedidos iniciais não
prosperam.
De proêmio, convém ressaltar tratar-se de inequívoca relação de consumo, pois os
contratos bancários também se submetem à legislação de proteção e defesa dos direitos
do consumidor, por força do que dispõe o artigo 3º, § 2º, da Lei nº 8.078/90. Ademais, é
pacífico que a relação jurídica estabelecida entre as partes está inserida no âmbito das
relações de consumo, conforme corrobora o teor do Enunciado 297 da Súmula do E.
Superior Tribunal de Justiça:
“O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”
A controvérsia cinge-se à repactuação de dívida, na qual a parte autora fundamenta a
sua pretensão nos preceitos da Lei 14.181/21, que alterou dispositivos do CDC. De outra
banda, os credores requeridos, em suma, impugnam a pretensão sob o argumento de
ausência dos requisitos legais.
O superendividamento, conceituado como a “inviabilidade de pagamento da totalidade
dos débitos consumeristas (vencidos e vincendos) sem comprometimento do mínimo
existencial pelo consumidor pessoa natural e de boa-fé” (CDC, 54-A, § 1º), foi
regulamentado a partir da Lei n. 14.181/21, que introduziu modificações esparsas no
CDC e no Estatuto da Pessoa Idosa. Trata-se de instituto fundamentado no princípio da
boa-fé objetiva, mais precisamente nos deveres de cooperação e lealdade para a
evitação da ruína do outro contratante (exceção da ruína).
Ainda, o art. 54-A, do mesmo diploma legal, elucida que:
'Entende-se por
superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de
boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem
comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação'.
A mencionada regulamentação foi realizada por meio do
Decreto Federal nº
11.150/2022, que estipulou como mínimo existencial a renda mensal do consumidor
pessoal natural, estando previsto atualmente, o valor equivalente a R$ 600,00 (caput, art.
3º).
Ademais,
a
aplicabilidade
das
normas
de
prevenção
e
tratamento
do
superendividamento pressupõe a diferenciação entre o superendividamento ativo e o
superendividamento passivo. O primeiro decorre do endividamento voluntário, e pode se
dar de modo consciente (por ação de má-fé, com intenção deliberada de fraude a
credores em razão da prévia ciência quanto à incapacidade de pagamento), hipótese em
que não se aplicam as normas de prevenção e tratamento, ou de modo inconsciente (por
ação negligente/imprudente, em razão da contratação por impulso ou da não fiscalização
de despesas). Já o segundo é oriundo do endividamento involuntário, decorrente de
fatores externos que obrigam o indivíduo a suportar despesas superiores às suas
receitas (desemprego, divórcio, doença, dentre outras).
Registra-se que o processo de repactuação de débitos, regulado no art. 104-A do CDC,
é instaurado pelo juiz a requerimento do consumidor superendividado e visa, em uma
primeira etapa, à conciliação (obtenção de acordo entre o devedor e os credores). Caso
não seja celebrado acordo, passa-se então ao processo por superendividamento,
regulado no art. 104-B do CDC (2ª fase), também instaurado pelo juiz a requerimento do
consumidor superendividado e, nessa segunda etapa, objetiva a (i) revisão ou integração
de contratos; (ii) repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial
compulsório.
Importante anotar que o plano judicial compulsório (CDC, art. 104-B, § 4º) deve
assegurar aos credores, no mínimo, o valor principal do débito, atualizado com o
adimplemento integral em, no máximo 5 (cinco) anos, com a primeira parcela devida no
prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da homologação e as demais
mensais e sucessivas.
Logo, para a repactuação de dívidas e usufruto dos benefícios da lei, a parte autora
superendividada deve preencher os seguintes requisitos: 1) insuficiência de renda; 2) ser
devedor de boa-fé, ou seja, em razão de sua renda ser inferior ao que acumulou em
dívidas; 3) as dívidas devem ser decorrentes de relações de consumo comum, não
podendo incluir aqui consumos luxuosos, de alto valor; 4) em hipótese alguma as dívidas
devem ser decorrentes de má-fé, ou seja, dívidas contraídas com intuito fraudulento; 5) a
petição inicial deve conter um plano detalhado da forma/prazo de pagamento; e 6) a
indicação da renda familiar.
Uma vez firmadas tais premissas, no caso ora em apreço, passa-se ao exame do
preenchimento dos requisitos legais para a repactuação de dívidas.
Da análise dos autos, extrai-se incontroversa a existência de empréstimos adquiridos
pela parte autora junto às instituições financeiras rés.
In casu, verifica-se que parte autora não comprovou sua condição de consumidora
superendividada, deixando de demonstrar a impossibilidade em arcar com o pagamento
dos débitos sem prejuízo do mínimo existencial, bem como ausência de má-fé ou de
fraude na obtenção das dívidas.
Com efeito, não trouxe o(a) requerente cópias das faturas de cartão de crédito e extratos
bancários, com detalhamento de compras realizadas, quando da origem dos débitos,
para comprovação do risco à garantia do mínimo existencial, configurando, outrossim,
contradição, ao menos pela ausência de prova constituída acerca da real e efetiva
condição financeira do(a) requerente.
Ademais, conforme narrado em petição inicial, a requerente, como servidora pública em
atividade, aufere renda bruta de R$ 9.772,62, sendo que após descontos/retenções
legais e empréstimos resta o valor líquido de R$ 875,79.
Portanto, constata-se que remanescem após o pagamento de todos os débitos a
quantia de R$ 875,79, valor que está além da quantia prevista no art. 3º do Decreto
Federal no 11.150/2022 como mínimo existencial, situação incompatível com o rito
das ações de superendividamento (CDC, § 1º, art. 104-A), máxime considerando a
ausência
de
prova,
pelo(a)
demandante,
dos
alegados
gastos
não
consignados/cotidianos.
Destaca-se, ainda, que a parte autora é servidor(a) público(a) em atividade, com fonte de
renda bruta superior a R$ 9.000,00, sendo que, por certo, faz jus ao recebimento dos
beneplácitos de 13º salários e de férias, o que, por si só, consiste em expressivas
quantias complementativas a suas remunerações ordinárias, capazes de afastar
qualquer alegação de ofensa ao seu mínimo existencial. Nesse passo, a renda da parte
autora não pode, sob qualquer métrica, ser caracterizada como comprometedora do
mínimo vital para sua sobrevivência.
Ainda, observa-se a ausência de documentos a demonstrar gastos rotineiros da parte
autora, especialmente se é o(a) único(a) a sustentar sua família (esposo(o) e filhos,
incluindo uma maior de idade - EP 1.13), deixando a demandante de comprovar que é
arrimo/sustento da sua família, sequer comprovando os gastos/repasses/despesas. A
esse respeito, é cediço ser obrigação do pai e da mãe arcar com a manutenção dos
filhos na proporção da capacidade financeira de cada qual (CC, art. 1.703). Ainda,
denota-se da qualificação autoral que esta é casada, sendo que nada foi juntado acerca
da (im)possibilidade de seu companheiro e/ou genitor do(s) seu(s) filho(s), em arcar com
tais custos e em que quantia.
Não se pode perder de vista que também nada trouxe aos autos com relação à renda
familiar. Ocorre que, para a repactuação de dívida pretendida, com a preservação do
mínimo existencial à família seria necessária a apuração de toda a renda familiar e todas
as suas despesas, o que não se extrai dos autos, dada a ausência de documentações
em tal sentido.
Da mesma forma, verifica-se na fatura de cartão de crédito da autora (EP 1.13, 1.14
e 1.15) diversas compras realizadas recentemente e com extenso lapso para
pagamento, sem a efetiva demonstração da sua essencialidade (p. ex. RORAIMA
PISCI PARC 09/12 - R$ 843,00, CACULAO PARC 08/12 - R$ 191,11, dentre outras -
EP 1.16), inclusive em outro Estado da Federação - AIRBNB PAGAM PARC 02/02
SAO PAULO - R$ 293,16 - EP 1.9), mesmo diante de tais fatos serem consignados em
decisão de indeferiu pedido de urgência, fator contraditório para quem afirma ter sua
dignidade financeira atingida.
Acrescenta-se que, a minuta do plano compulsório apresentado pela parte autora (EP
128), em confronto com os demais documentos juntados pelos réus nas contestações
apresentadas, não contempla sequer o pagamento do valor do principal devido, corrigido
monetariamente por índices oficiais de preço, o que reforça a impossibilidade do
acolhimento dos pedidos autorais.
Mais a mais, compulsando os documentos juntados pela parte autora (EP 1.17),
observa-se, logo após o recebimento de seus proventos/remuneração, a realização de
transferências, via pix, e aplicação em conta poupança, inclusive, de valores
consideráveis (R$ 10.000,00 - EP 1.17 - pag. 3), sem, contudo, esclarecer as
destinações/finalidades dos pagamentos, depósitos e recebimentos, bem assim trazer a
Juízo extrato bancário das contas (poupança ou não) a que destinadas as transferências,
não havendo que ser falar em ofensa ao mínimo existencial.
Nesse sentido, observa-se que a parte autora também não trouxe qualquer
elemento para justificar a necessidade/motivo da realização dos empréstimos junto
às instituições financeiras, incluindo um valor superior a R$ 140.000, 00 com
apenas um único requerido (EP 95) fator preponderante a demonstrar sua boa-fé
na contratação das dívidas que pretende repactuar.
Ademais, insta consignar que os documentos apresentados não permitem concluir, com
precisão, o que levou o(a) requerente ao suscitado superendividamento e tampouco do
destino das expressivas quantias levantadas junto ao requerido, restando impossível a
verificação da sua boa-fé para subsunção à lei de superendividamento.
Ainda, a parte autora não comprova qualquer dado externo que tenha lhe acarretado a
alteração patrimonial, tais como redução drástica do salário, perda do emprego,
problemas de saúde ou outro fator que tenha, efetivamente, afetado sua conjuntura
econômica quando da época dos empréstimos/dívidas.
Deveras, cabe ao consumidor evidenciar a sua incapacidade de quitar as obrigações
contraídas, as quais visam atender a uma necessidade pessoal extraordinária decorrente
de infortúnios da vida ou eventos imprevisíveis (endividamento involuntário). Fora dessas
circunstâncias excepcionais, considera-se mero descontrole pessoal das finanças, não
enquadrado nos parâmetros da teoria do superendividamento.
Anota-se que incumbe à parte autora comprovar que tomou os valores para as despesas
básicas de subsistência, pois a repactuação não tem amparo legal quando as dívidas
que ' decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor'
(CDC, § 3º, art. 54-A).
Dito isto, acrescenta-se que pelo contexto da petição inicial, é possível aferir que o
pedido de redução dos descontos dos empréstimos fora baseado no suposto
superendividamento da parte autora e extrapolação do patamar máximo de margem
consignável, qual seja de 30%.
Com efeito, o objetivo da norma protetora ao consumidor (Lei de Superendividamento)
não foi criar uma regra matemática para subsunção aos benefícios previstos na lei, de
modo que a ofensa ao mínimo existencial demanda demonstração inequívoca de ofensa
à dignidade financeira do cidadão, não havendo que se falar em percentual fixo de sua
remuneração.
Deveras, o direito à repactuação das dívidas não possui caráter potestativo,
independente da vontade do credor, autorizando que o consumidor, unilateralmente,
aponte quantia que entende justa e adequada para sua renda, passando a ter direito a
solver somente tal importe. Se assim fosse, a adoção de tal entendimento representaria
uma grande insegurança jurídica, já que o credor estaria condicionado ao assentimento
exclusivo do consumidor, o que comprometeria o recebimento do crédito concedido em
medida verdadeiramente significativa, acabando por desaguar em aumento do custo do
crédito, ou seja, em elevação sistêmica dos juros, bem como em limitação das linhas de
crédito, prejudicando os consumidores de maneira global.
Por esta razão, o legislador estabeleceu rito, critérios e condições para se obter a
repactuação pretendida, disposições que precisam ser respeitadas, sob pena de
subversão do propósito normativo e geração de relevantes efeitos colaterais para o
próprio consumidor. Assim, não se pode, com lastro em tal previsão normativa, restringir
os débitos com lastro apenas na indicação de percentual que o consumidor julga
adequado, pois este deve ser fixado consoante os parâmetros previstos nos art. 104-A e
B do CDC.
Em outras palavras, não se olvide que o cenário é de ENDIVIDAMENTO, jamais de
SUPERENDIVIDAMENTO, nos termos da legislação de regência. E para essa situação
de endividamento, a qual não está acobertada pelas regras excepcionais dos arts. 54-A
e 104-A e seguintes do CDC, deverá a parte buscar as medidas legais para
adequação/renegociação contratual, afastando-se na situação em comento a imposição
de plano compulsório de pagamento ao réu.
Seja como for, ainda que admitidos os números do(a) requerente, e pese a alegada
afetação dos vencimentos às dívidas bancárias, fato é que o remanescente disponível
não implica em risco/ofensa/violação ao 'mínimo existencial', garantindo-se montante
capaz de atender as necessidades normais de alimentação, habitação, vestuário, higiene
e transporte e etc, implicando apenas em redução de sua capacidade financeira, mas
não em vulnerabilidade econômica/financeira, elemento fundamental para a configuração
do superendividamento e embasamento para a concessão do manto protetivo do regime
de excepcionalização do pacta sunt servanda, sob pena de ofensa à segurança jurídica.
Com a devida venia, a intenção do legislador na criação de institutos que beneficiam aos
consumidores, como o enquadramento no conceito de superendividamento (Lei n.
14.181/21), não busca garantir à pessoa superendividada o alto padrão de vida que
detinha antes do endividamento, mas garantir o mínimo existencial para a sua
sobrevivência, o que, no caso em comento, está garantido pelo valor residual pós
descontos dos vencimentos do(a)requerente.
Ademais, não se tem notícia de que o(a) demandante é pessoa idosa, pródiga ou de
precária educação, sendo vedada à aplicação da repactuação de dívidas, aquelas
oriundas de contratos dolosamente celebrados sem o propósito de realizar pagamento,
nos termos do §1º do artigo 104-A do CDC.
A esse respeito, registra-se que a parte autora confirma que celebrou os contratos com o
banco réu, com taxas de juros pactuadas e previamente conhecidas, não alegando em
nenhum momento qualquer vício de consentimento.
Nessa direção, o entendimento jurisprudencial, verbis: (…)
Sendo assim, verifica-se que o(a) requerente deixou de provar o fato constitutivo de seu
direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram juntados aos autos documentos que
deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de pessoa superendividada nos termos
da lei, não havendo que se falar na realização de repactuação de dívidas da forma
pretendida.
Portanto, o(a) autor(a) não trouxe aos autos elementos aptos e suficientes que
comprovem o preenchimento dos requisitos acima elencados, sobretudo o
comprometimento do mínimo existencial, o que implica em óbice ao prosseguimento da
demanda e homologação de eventual plano de repactuação judicial compulsório em
detrimento dos credores.
Com efeito, resta manifesta a ausência no preenchimento dos requisitos legais, em
especial a alegada ofensa ao 'mínimo existencial' e, por conseguinte, a incomprovada
situação de superendividamento, forçoso concluir a inexistência do pressuposto de
procedibilidade para o procedimento especial previsto no art. 54-A, 104-A e seguintes do
CDC, ensejando, pois, a extinção irresolutiva da fase de conhecimento.
ANTE O EXPOSTO e, analisando tudo mais que dos autos consta, com fulcro na
fundamentação supra, julgo EXTINTA a fase de conhecimento, sem resolução do mérito,
reconhecendo a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido
e regular do processo, na forma do art. 485, inciso IV, do Código de Processo Civil.
Em razão da sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento de custas processuais
e honorários advocatícios, que ora arbitro no patamar de 10% (dez por cento) sobre o
valor atualizado da causa, nos termos do § 2º do art. 85 do Código de Processo Civil,
contudo, suspensa a exigibilidade, haja vista se tratar de parte beneficiária da gratuidade
processual, mantendo-se a benesse outrora deferida, haja vista a ausência de elementos
em sentido contrário à alegada hipossuficiência.
Retifique-se o valor da causa para R$ 284.711,67.
Certifique a Serventia a existência de agravo de instrumento pendente de julgamento e,
em caso positivo, comunique-se à instância recursal acerca da presente sentença.
Sem prejuízo, considerando a possibilidade de ajuizamento de demandas repetitivas ou
em massa e em atenção a Nota Técnica CIJERR 04/2024, encaminhe-se cópia da
presente sentença ao Centro de Inteligência da Justiça Estadual de Roraima (CIJERR)
para conhecimento e providências que entender cabíveis (via SEI).
Na hipótese de interposição de recurso de apelação, por não haver mais juízo de
admissibilidade a ser exercido pelo Juízo a quo (CPC, art. 1.010), sem nova conclusão,
intime-se a parte contrária para oferecer resposta no prazo de 15 (quinze) dias.
(…) (grifos originais)
Irresignada, nas razões recursais a apelante aduz (EP 198.1), em síntese, […] que
recebe mensalmente a quantia de R$ 431.415,81 (quatrocentos e trinta e um mil, quatrocentos
e quinze reais e oitenta e um centavos); que após os descontos obrigatórios como PRESSEM e
Imposto de Renda no valor de 1.622,39 (mil seiscentos e vinte e dois reais e trinta e nove
centavos). Resta para a parte somente a quantia de R$ 8.150,23 (oito mil cento e cinquenta
reais e vinte e três centavos); que a situação de superendividamento de uma pessoa não se
pode usar fórmulas prontas e moldadas para outras situações; que ficou claro que a parte
Apelante não tem condições financeiras de arcar com todas as suas dívidas e manter um
padrão de vida digno; que a parte Apelante possui encargos nanceiros mensais oriundos de
contratos celebrados junto aos Apelados, que, quando somados, correspondem ao valor de
R$7.274,44 (sete mil, duzentos e setenta e quatro reais e quarenta e quatro centavos),
equivalente a MAIS DE 89% DE SUA RENDA LÍQUIDA; que o valor que resta para parte
Apelante é ínfimo, pois não é suficiente para custear suas despesas básicas, como moradia,
saúde, alimentação, despesas médicas, educação e etc.; que tais dívidas têm comprometido
substancialmente o mínimo existencial da parte Apelante. […]
Calcada nesses argumentos, requer o provimento do recurso para:
a) Seja reconhecida a inconstitucionalidade dos Decretos ns. 11.150/2022 e
11.567/2023, tendo em vista que afronta com a dignidade da pessoa humana;
b) Que a Sentença seja reformada para acolher os pedidos formulados na petição inicial
e torne o plano de pagamento ora apresentado em plano judicial compulsório com o seu
início no mês subsequente à data da sentença;
c) condenar a parte Requerida ao pagamento de custas processuais, despesas e
honorários advocatícios.
Certidão atestando a tempestividade do recurso e a ausência do recolhimento do
preparo (EP 7.1), pois a parte apelante é beneficiária da gratuidade da justiça.
Certidão atestando a tempestividade das contrarrazões contidas nos EPs 212.1, 219.1
e 220.1 (EP 6.1).
O relatado é suficiente.
Inclua-se na pauta de julgamento eletrônico, nos termos do art. 109 do RITJRR.
Intimem-se
Boa Vista - RR, 12 de maio de 2025.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
VOTO
Conforme relatado, trata-se de apelação cível interposta contra a sentença proferida
pelo Juízo do 4º Núcleo de Justiça 4.0 – Ações de Superendividamento - da comarca de Boa
Vista, que julgou improcedentes os pedidos formulados na peça inaugural da “Ação de
Repactuação de Dívidas C/C Pedido Liminar” n.º 0804296-49.2024.8.23.0010, com o seguinte
teor (EP 183.1).
Em suma, a apelante requer o provimento do recurso de apelação para que a sentença
de primeiro grau seja reformada.
Os apelados, nas contrarrazões, defendem a manutenção integral da sentença.
Pois bem.
Antes do mais, convém relembrar que não compete ao segundo grau, em regra, julgar
a causa novamente, justamente por se tratar de instância revisora, mas reanalisar a sentença
nos termos da irresignação do apelo.
Dito isso, e após análise detida dos elementos contidos nos autos, constata-se que o
apelo não comporta acolhimento.
Isto porque, em suas razões recursais, a apelante não se insurge contra os
fundamentos da sentença. Ao contrário, a rigor repete ipsis litteris as teses apresentadas na
petição inicial (EP 1.1), que não se presta a atacar a fundamentação que levou o juízo “a quo” a
rejeitar a pretensão inicial.
Dito de outra forma, a parte apelante deixou de apresentar qualquer fundamento capaz
de infirmar a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo, pois ausente a formulação
crítica necessária para se opor aos fundamentos lançados na sentença.
Logo, contra os fundamentos adotados na decisão não existem, nos autos, motivos
pelos quais se possa considerar que o direito não tenha sido bem aplicado.
Ademais, o artigo 1.010, incisos II a IV, do Código de Processo Civil exige que na peça
de apelação constem a exposição do fato e do direito, as razões do pedido de reforma ou de
decretação de nulidade e o pedido de nova decisão.
Da mesma maneira, o pedido não pode ser genérico, mas deve especificar as matérias
decididas que o recorrente reputa devam ser alteradas, de forma que o juízo ad quem possa
julgar o cabimento e provimento do recurso adequadamente.
No caso em exame, contudo, não há nas razões recursais qualquer menção ao que foi
decidido na sentença proferida em primeiro grau de jurisdição, limitando-se a parte apelante a
reproduzir integralmente os argumentos utilizados com o objetivo de contestar a ratio decidendi
utilizada pelo julgador primevo, o que, por óbvio, seria o suficiente para o não conhecimento do
recurso, por violação ao princípio da dialeticidade recursal.
Para corroborar essa afirmação, confira-se a jurisprudência remansosa desta Corte de
Justiça sobre o tema:
PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL.
PRINCÍPIO
DA
DIALETICIDADE.
NÃO
CONHECIMENTO
DO
RECURSO.
HONORÁRIOS MAJORADOS.1. Apelação interposta contra sentença que julgou
improcedentes embargos à execução fiscal promovida pela Fazenda Pública do Estado
de Roraima, fundamentada em multa aplicada pela Agência de Defesa Agropecuária de
Roraima (ADERR) por armazenamento irregular de agrotóxicos sem autorização legal,
no valor de R$ 45.543,20. A sentença afastou a alegação de ilegitimidade passiva ao
entender que a responsabilidade pela infração decorre da guarda indevida dos produtos,
independentemente da sua titularidade.2. A recorrente alega ilegitimidade passiva, sob o
argumento de que os produtos pertenciam a terceiro e foram armazenados por engano
em área anexa à empresa, sem responsabilidade direta da apelante.3. Princípio da
dialeticidade: O recurso deve atacar especificamente os fundamentos da decisão
recorrida. A repetição de argumentos afastados na sentença, sem enfrentamento dos
principais fundamentos, compromete a admissibilidade do apelo, nos termos do art. 932,
III, do CPC.4. No caso, a apelação limita-se a repetir a tese de ilegitimidade passiva sem
enfrentar a essência da decisão: a irrelevância da titularidade dos produtos para a
configuração da infração administrativa, fundada no armazenamento sem autorização.5.
Não se verifica cerceamento de defesa. O indeferimento da oitiva de testemunhas não
prejudicou o julgamento, uma vez que as provas colhidas na fase administrativa e judicial
foram consideradas suficientes. A apelante não demonstrou de forma concreta como a
ausência da prova comprometeria seu direito de defesa.6. Gratuidade de justiça: o
benefício foi concedido na fase inicial e permanece válido no grau recursal, nos termos
do art. 98, § 1º, VIII, do CPC, tornando prejudicado novo pedido formulado pela
apelante.7. Honorários advocatícios recursais majorados de 10% para 15%, conforme
art. 85, § 11, do CPC, observada a gratuidade de justiça já deferida.8. Recurso não
conhecido. Honorários majorados. (TJRR – AC 0810795-83.2023.8.23.0010, Rel. Des.
ERICK LINHARES, Câmara Cível, julg.: 31/10/2024, public.: 31/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C COBRANÇA –
PROGRESSÃO FUNCIONAL – SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. 1ª APELAÇÃO:LEI
N.º 1.611/2015 – APLICAÇÃO – RECONHECIMENTO ADMINISTRATIVO DO DIREITO
POSTULADO – PERDA DO INTERESSE PROCESSUAL – INEXISTÊNCIA DE
DEMONSTRAÇÃO DE ERRO NO REENQUADRAMENTO REALIZADO PELO
MUNICÍPIO DE BOA VISTA – VERBAS RETROATIVAS DEVIDAS - DIFERENÇAS
SALARIAIS NÃO ATINGIDAS PELA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – RECURSO
DESPROVIDO
–
SENTENÇA
MANTIDA.
2ª
APELAÇÃO:
AUSÊNCIA
DE
DIALETICIDADE RECURSAL – RECURSO NÃO CONHECIDO. (TJRR – AC
0802853-97.2023.8.23.0010, Rel. Des. TÂNIA VASCONCELOS, Câmara Cível, julg.:
19/12/2024, public.: 19/12/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. INSCRIÇÃO DO NOME DO SÓCIO NA CDA.
AUSÊNCIA DE SUA PARTICIPAÇÃO NO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO COMO
PARTE. RAZÕES DO APELO QUE REPETEM, EM PARTE, AS MESMAS JÁ
LANÇADAS NA CONTESTAÇÃO. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. INDICAÇÃO DE
PRECEDENTES DO STJ QUE NÃO SE AMOLDAM À HIPÓTESE DOS AUTOS.
RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NA PARTE CONHECIDA, DESPROVIDO.
1. A simples repetição, nas razões do apelo, dos argumentos lançados na fase de
conhecimento, impõe o não conhecimento desses argumentos por não observância do
princípio da dialeticidade. 2. Mostra-se escorreita a sentença que reconhece a
ilegitimidade passiva do sócio que não integrou o procedimento administrativo fiscal na
qualidade de parte, conforme precedentes do STJ e do egrégio TJRR acerca do tema.
(TJ-RR - AC: 0831030-13.2019.8.23.0010, Relator: ELAINE BIANCHI, Data de
Julgamento: 25/04/2021, Câmara Cível, Data de Publicação: 26/04/2021)
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO - OFENSA AO PRINCÍPIO DA
DIALETICIDADE - NÃO CONHECIMENTO DO INCONFORMISMO. 1. O princípio da
dialeticidade recursal exige a impugnação integral e específica de cada um dos
fundamentos da decisão recorrida, sob pena de não conhecimento do recurso. 2.
Olvidando a embargante de tal ônus, impõe-se o não conhecimento dos declaratórios.
(TJ-RR - EDecAC: 72119027220168230010 7211902-72.2016.8.23.0010, Relator: Des.
Cristóvão Suter, Data de Publicação: DJe 09/10/2019, p.)
No entanto, embora o presente recurso, a rigor não pudesse sequer ser conhecido
porque não atacou os fundamentos da sentença; a fim de evitar argumentos de violação à
ampla defesa e acesso ao duplo grau de jurisdição, conheço do recurso e passo à análise do
mérito da controvérsia.
In casu, o juizo a quo julgou improcedente a demanda por ausência de documentação
apta a comprovar a condição de superendividada, já que a parte autora, ora apelante, “deixou
de provar o fato constitutivo de seu direito (art. 373, I, do CPC), ao passo que não foram
juntados aos autos documentos que deveriam ser acostados à inicial, não se tratando de
pessoa superendividada nos termos da lei, não havendo que se falar na realização de
repactuação de dívidas da forma pretendida”.
Ou seja, a parte apelante não forneceu os documentos necessários para que o
magistrado senteciante pudesse aferir, com convicção, a sua alegada condição de
superendividada.
Dito de outra forma, não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o
comprometimento do mínimo existencial, razão pela qual deve ser preservada a autonomia das
vontades, visto que os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e
consciente pelas partes.
Assim, infere-se que a ratio decidendi utilizada pelo magistrado sentenciante para julgar
improcedente a pretensão autoral merece ser mantida por seus próprios fundamentos, a qual
adoto como razão de decidir para conhecer do recurso, mas negar-lhe provimento.
Em reforço à conclusão adotada pelo juízo a quo, confira-se a jurisprudência pátria
sobre o tema:
APELAÇÃO
CÍVEL.
Ação
revisional.
Repactuação
de
dívidas.
Lei
do
Superendividamento. Ausência de comprovação documental ou dos requisitos para a
pretendida limitação nos pagamentos devidos. Higidez contratual reconhecida. Sentença
de improcedência mantida. RECURSO NÃO PROVIDO. (TJ-SP - Apelação Cível:
0000507-73.2023.8.26.0577 São José dos Campos, Relator: Emílio Migliano Neto, Data
de Julgamento: 21/02/2024, 23ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação:
21/02/2024)
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÉBITO - LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONDIÇÃO DE
SUPERENDIVIDADO DO CONSUMIDOR - IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. Nos termos
da Lei nº 14.181/2021, que visa dispor sobre formas de prevenção e solução da situação
de superendividamento dos consumidores, entende-se nessa situação, fazendo jus,
portanto, à repactuação de débitos, a pessoa natural, de boa-fé, que evidencia a total
impossibilidade de adimplir a suas dívidas de consumo sem comprometer seu mínimo
existencial. Ausente as provas de tais circunstâncias, deve ser mantida a improcedência
da pretensão inicial. (TJ-MG - Apelação Cível: 5001170-35.2023.8.13.0241
1.0000.24.174736-9/001, Relator: Des.(a) Arnaldo Maciel, Data de Julgamento:
07/05/2024, 7ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 15/05/2024)
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CIVIL E PROCESSUAL
CIVIL. PROCESSO SOB O RITO ESPECIAL DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS.
SUPERENDIVIDAMENTO.
AFETAÇÃO
DO
MÍNIMO
EXISTENCIAL
APÓS
DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO E EM CONTA CORRENTE. NÃO
DEMONSTRADO. INSTAURAÇÃO DO PROCEDIMENTO DA LEI Nº 14.181/2021.
REQUISITOS
NÃO
PREENCHIDOS.
RECURSO
DESPROVIDO.
SENTENÇA
MANTIDA. 1. A solicitação de repactuação de dívidas pretendida pelo apelante é medida
estabelecida no art. 104-A, § 4º, do CDC, introduzido pela Lei nº 14.181/21, aplicada em
favor do consumidor superendividado. Segundo o art. 54-A, § 1º, do CDC, ocorre o
superendividamento quando o consumidor pessoa física, de boa-fé, não consegue pagar
a totalidade de suas dívidas de consumo (exigíveis e vincendas) sem comprometer o seu
mínimo existencial. 2. O superendividamento está diretamente relacionado com o mínimo
existencial do indivíduo, ou seja, o superendividamento pressupõe o comprometimento
da sobrevivência da pessoa e ameaça o indivíduo e sua família (mínimo existencial), no
caso, verifica-se que o apelante é policial militar do Distrito Federal e está submetido ao
regime jurídico dos servidores públicos distritais, porém, na hipótese, imperioso destacar
a existência de óbice quanto ao pedido de repactuação de dívida, tendo em vista a
necessidade de observância mínimo existencial, elemento previsto como requisitos da
Lei nº 14.181/21. 3. No caso concreto, constata-se, com base nos elementos probatórios,
que o apelante percebe uma renda líquida, após todos os descontos, inclusive, os
realizados em conta corrente, uma renda líquida muito acima do estabelecido pelo
Decreto nº 11.150/22, com redação dada pelo Decreto nº 11.567/2023. Dessa forma o
apelante não conseguiu demonstrar os requisitos para que seja caracterizado o
superendividamento. 4. Por sua vez, a intervenção judicial somente se justifica na
hipótese de situação excepcional se constatado a existência de superendividamento, sob
pena de indevida intervenção judicial na autonomia da vontade. Na hipótese, entretanto,
não foi demonstrado o superendividamento do apelante, nem o comprometimento do
mínimo existencial. Nesse contexto, deve ser preservada a autonomia das vontades, pois
os pactos e as formas de pagamento foram ajustados de forma livre e consciente pelas
partes. Portanto, não comprovado o comprometimento ao mínimo existencial, não há
como instaurar o procedimento de repactuação de dívidas. 5. Recurso desprovido.
Sentença mantida. (TJ-DF 07238141920238070003 1924958, Relator: ALFEU
MACHADO, Data de Julgamento: 18/09/2024, 6ª Turma Cível, Data de Publicação:
02/10/2024)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. SUPERENDIVIDAMENTO.
REPACTUAÇÃO DE DÍVIDA. EXCEPCIONALIDADE. MÍNIMO EXISTENCIAL. PODER
REGULAMENTAR. DECRETO 11.150/2022. AUSTERIDADE. PODER JUDICIÁRIO.
INTERVENÇÃO NÃO JUSTIFICADA. IMPROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO. SENTENÇA
MANTIDA. 1. As normas protetivas que regulam o tratamento do superendividamento
garantem a repactuação das dívidas, mediante a preservação do mínimo existencial, nos
termos da regulamentação. Art. 104-A do Código de Defesa do Consumidor. 2. Ainda
carente de debates, o Decreto Presidencial nº 11.150, de 26 de julho de 2022, com
vacatio legis de sessenta dias da após a publicação, traz a delimitação acerca do tema.
3. Nos termos do art. 3º do Decreto 11.150/2022, ?considera-se mínimo existencial a
renda mensal do consumidor pessoa natural equivalente a vinte e cinco por cento do
salário mínimo vigente na data de publicação deste Decreto?. 4. Embora se possa
questionar a extrema austeridade imposta pela regulamentação do que pode ser
considerado o mínimo existencial, a intervenção do poder judiciário nos contratos regidos
pelo Código de Defesa do Consumidor deve se pautar pela teoria da base objetiva dos
contratos. 5.Na hipótese em que não se constata alteração das circunstâncias
intrínsecas à formulação do vínculo contratual, assim como não se identifica condutas de
incontestável abuso por parte da instituição financeira credora, a intervenção judicial nos
contratos não se justifica. 6. Recurso conhecido e não provido. (TJ-DF
07058375420228070001 1674193, Relator: GETÚLIO DE MORAES OLIVEIRA, Data de
Julgamento: 08/03/2023, 7ª Turma Cível, Data de Publicação: 20/03/2023)
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CONTRATOS BANCÁRIOS.
REPACTUAÇÃO
DE
DÍVIDAS.
LIMITAÇÃO
DOS
DESCONTOS
EM
CONTA-CORRENTE DO DEVEDOR. PRELIMINARES DE INÉPCIA DA INICIAL E
FALTA DE INTERESSE DE AGIR REJEITADA. CONTRATAÇÃO ESCLARECIDA PELO
CONSUMIDOR. REPACTUAÇÃO. IMPOSSIBILIDAE. VEDAÇÃO DO § 1º DO ART.
104-A DO CDC. PLANO DE PAGAMENTO. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS.
APELAÇÃO CONHECIDA. PRELIMINARES REJEITADAS E NÃO PROVIDA. 1.
Insurge-se o autor, ora apelante, contra sentença proferida pelo juízo da 1ª Vara Cível de
Samambaia que, na ação de repactuação de dívidas com 4 instituições bancárias,
homologou o acordo de pagamento de dívidas feito entre o autor e o Banco INTER S/A,
revogou a tutela anteriormente concedida de limitação de descontos em conta-corrente a
30% (trinta por cento) dos ganhos mensais líquidos e julgou improcedente o pedido da
inicial, bem como o condenou ao pagamento das custas processuais e dos honorários
advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade restou suspensa
diante da gratuidade de justiça concedida. Pretende o prosseguimento de ação de
repactuação de dívidas de mútuo com a apresentação de plano de pagamento com
prazo superior ao estabelecido legalmente e limitação dos descontos em sua
conta-corrente ao patamar de 30% de sua remuneração mensal líquida
independentemente da modalidade do empréstimo. 2. O juízo sentenciante
compreendeu pela incompatibilidade do plano de pagamento apresentado pelo devedor
com a observância de requisito essencial da Lei do Superendividamento (Lei n.
14.181/2021), a saber, o prazo máximo de pagamento em até 5 anos. Portanto,
descabida a aplicação do art. 104-B da lei citada, para instauração da segunda fase do
procedimento de superendividamento, pois o próprio consumidor já informou a
impossibilidade de adequação da proposta aos termos da legislação. Além disso, foram
verificados fortes indícios da contratação dolosa dos débitos pelo apelante devedor. 3.
Não induz à inépcia da inicial do pedido de repactuação dos contratos a ausência de
efetivo plano de pagamento por não representar vício insanável (art. 337, IV do CPC). 4.
Quanto à questão preliminar de falta de interesse de agir arguida pelo apelado BANCO
BMG SA, ?o interesse de agir, consubstanciado no binômio necessidade-utilidade, busca
alcançar a realização da pretensão deduzida em Juízo, a qual não poderia ser obtida
através de outra forma. Verificando-se que a preliminar suscitada se confunde com o
mérito da questão, há de ser rejeitada de plano? (TJDFT. Acórdão 1617020,
07219987620218070001, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, 5ª Turma Cível, data de
julgamento: 21/9/2022, publicado no DJE: 29/9/2022. Pág.: Sem Página Cadastrada .).
Preliminar rejeitada. 5. É ônus do consumidor provar que se encontra privado do seu
mínimo existencial nos termos do art. 54-A do CDC. No caso em análise, não há provas
hábeis de que, após os descontos realizados e a sobra de R$ 4.000,00 (quatro mil reais),
a quantia remanescente é apta a comprometer-lhe o próprio sustento e o de sua família.
Com efeito, a quantia representa aproximadamente três salários-mínimos, o que é
superior à remuneração mensal média do trabalhador brasileiro. Segundo estatísticas do
IBGE, no trimestre de setembro a novembro de 2022 o salário médio mensal é de
aproximadamente R$ 2.787 (dois mil setecentos e oitenta e sete reais). Há, ainda, de se
salientar quanto a existência de fortes indícios de contratação dolosa dos débitos pelo
apelante consumidor, o que, por si só, tem o condão de excluir os empréstimos aqui
impugnados do processo de repactuação de dívidas conforme o § 1º do art. 104-A do
CDC. 6. Verificado que o plano de pagamento não fora formulado em consonância aos
parâmetros mínimos impostos pela legislação, em especial a previsão do limite temporal
de 05 (cinco) anos para pagamento, a fim de evitar a eternização das obrigações, a
manutenção da improcedência do pedido é medida que se impõe. 7. Apelação
conhecida, preliminares rejeitadas e não provida. Sentença mantida. (TJ-DF
07134365420218070009 1690491, Relator: JOÃO LUÍS FISCHER DIAS, Data de
Julgamento: 18/04/2023, 5ª Turma Cível, Data de Publicação: 28/04/2023)
Portanto, adoto e ratifico a ratio decidendi utilizada pelo magistrado primevo para
solucionar a controvérsia; e assim procedo ancorada no entendimento remansoso do Tribunal
da Cidadania que reconhece […] a viabilidade de o órgão julgador adotar ou ratificar o juízo de
valor firmado na sentença, inclusive transcrevendo-a no acórdão, sem que tal medida encerre
omissão ou ausência de fundamentação no decisum (REsp nº 662.272-RS, 2ª Turma, Rel.Min.
João Otávio de Noronha, j. de 4.9.2007; REsp nº 641.963-ES, 2ª Turma, Rel. Min. Castro
Meira, j. de 21.11.2005; REsp nº 592.092-AL, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, j. 17.12.2004
e REsp nº 265.534- DF, 4ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, j de 1.12.2003).
Diante do exposto, nego provimento ao recurso.
Em atendimento ao que preconiza o art. 85, § 11, do CPC, majoro em 5% (cinco por
cento) os honorários advocatícios fixados na sentença.
É como voto.
A fim de evitar a oposição de embargos de declaração meramente protelatórios,
considera-se, desde já, prequestionada toda matéria infraconstitucional e constitucional,
observando o entendimento do STJ no sentido de que, para o prequestionamento, é
desnecessária a explícita indicação dos dispositivos de lei que o fundamentaram.
No ensejo, advirto às partes que a interposição de eventual recurso meramente
protelatório ou com escopo de rediscutir esta controvérsia ensejará na aplicação de multa, nos
termos dos arts. 79, 80, 81 e 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil.
Intimem-se.
Com o trânsito em julgado, arquivem-se (art. 1.006 do CPC).
Boa Vista - RR, data constante do sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi – Relatora
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE RORAIMA
CÂMARA CÍVEL - PROJUDI
Praça do Centro Cívico, 269 - Palácio da Justiça, - Centro - Boa Vista/RR - CEP: 69.301-380
APELAÇÃO CÍVEL N.º 0804296-49.2024.8.23.0010
APELANTE: GRACIANE PASSOS DE SOUZA
APELADOS: BANCO DO BRASIL S/A, CREFISA S/A e OUTROS
RELATORA: DESEMBARGADORA ELAINE BIANCHI
EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REPACTUAÇÃO DE DÍVIDAS. LEI DO
SUPERENDIVIDAMENTO.
AUSÊNCIA
DE
IMPUGNAÇÃO
AOS
FUNDAMENTOS DA SENTENÇA. NÃO COMPROVAÇÃO DA
CONDIÇÃO
DE
SUPERENDIVIDAMENTO.
IMPROCEDÊNCIA
MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. O recurso de apelação deve, nos termos do art. 1.010, incisos II a IV,
do CPC, conter impugnação específica aos fundamentos da sentença, o
que configura o princípio da dialeticidade. A mera repetição das teses
iniciais, sem enfrentamento dos fundamentos do decisum, compromete
sua admissibilidade.
2. Embora a apelação apresentada limite-se a reiterar os argumentos da
petição inicial, sem atacar especificamente a ratio decidendi da sentença,
o recurso foi conhecido a fim de garantir o duplo grau de jurisdição e evitar
prejuízos à parte.
3. A Lei nº 14.181/2021, que alterou o Código de Defesa do Consumidor,
condiciona a instauração do procedimento de repactuação de dívidas à
comprovação de que o consumidor está impossibilitado de pagar a
totalidade de suas dívidas sem comprometer o mínimo existencial (art.
54-A, § 1º, CDC).
4. No caso concreto, a autora não comprovou sua condição de
superendividada nem apresentou documentos suficientes à análise do
comprometimento de sua subsistência, ônus que lhe incumbia nos termos
do art. 373, I, do CPC.
5. Em respeito à autonomia privada, não demonstrada a situação
excepcional de superendividamento, deve-se preservar os pactos
livremente firmados entre as partes.
6. A jurisprudência desta Corte e de outros Tribunais reconhece que a
ausência de comprovação do superendividamento inviabiliza a aplicação
do procedimento previsto na Lei nº 14.181/2021.
7. Recurso conhecido e não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os membros da 2ª Turma Cível do
Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Roraima, à unanimidade de votos, em negar
provimento ao presente recurso, nos termos do voto da Relatora. Participaram do julgamento
os eminentes Desembargadores: Mozarildo Cavalcanti (Presidente e Julgador), Elaine Bianchi
(Relatora) e Cristóvão Suter (Julgador). Sessão Virtual do Egrégio Tribunal de Justiça do
Estado de Roraima, data constante no sistema.
(ae) Desª. Elaine Bianchi - Relatora
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